Este documento descreve a Doutrina dos Afetos, uma teoria da era barroca segundo a qual a música influencia as emoções do ouvinte de acordo com recursos musicais específicos. A teoria tem suas origens na Grécia antiga, onde a música era vista como capaz de afetar o caráter. Na era barroca, compositores usavam a Doutrina dos Afetos para expressar emoções de forma genérica e transmiti-las ao ouvinte.
Este documento descreve a Doutrina dos Afetos, uma teoria da era barroca segundo a qual a música influencia as emoções do ouvinte de acordo com recursos musicais específicos. A teoria tem suas origens na Grécia antiga, onde a música era vista como capaz de afetar o caráter. Na era barroca, compositores usavam a Doutrina dos Afetos para expressar emoções de forma genérica e transmiti-las ao ouvinte.
Este documento descreve a Doutrina dos Afetos, uma teoria da era barroca segundo a qual a música influencia as emoções do ouvinte de acordo com recursos musicais específicos. A teoria tem suas origens na Grécia antiga, onde a música era vista como capaz de afetar o caráter. Na era barroca, compositores usavam a Doutrina dos Afetos para expressar emoções de forma genérica e transmiti-las ao ouvinte.
Este documento descreve a Doutrina dos Afetos, uma teoria da era barroca segundo a qual a música influencia as emoções do ouvinte de acordo com recursos musicais específicos. A teoria tem suas origens na Grécia antiga, onde a música era vista como capaz de afetar o caráter. Na era barroca, compositores usavam a Doutrina dos Afetos para expressar emoções de forma genérica e transmiti-las ao ouvinte.
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Doutrina dos Afetos
A Doutrina dos Afetos – em alemão Affektenlehre – tem um papel
notável na música barroca. O Dicionário Grove de Música a descreve como “termo utilizado para descrever um conceito teórico da era barroca, derivado das idéias clássicas de retórica, sustentando que a música influenciava os ‘afetos’ (ou emoções) do ouvinte, segundo um conjunto de regras que relacionavam determinados recursos musicais (ritmos, motivos, intervalos, etc.) a estados emocionais específicos.” Para melhor definir tal conceito teórico, é importante que se vá às origens, ou seja, a Grécia. Os gregos deram muita importância à música, no entanto, pouco se conhece dessa arte na Antiguidade. Sabe- se que a música tinha um cunho religioso, ritualístico. Acreditava-se que se teria originado divinamente e que seus primeiros intérpretes teriam sido os deuses e semi deuses como Apolo, Anfião e Orfeu. Além disso, a música tinha um caráter místico. Os gregos cultivavam a crença que a música era capaz de curar doenças, purificar o corpo e o espírito e operar milagres. Com um sentido mais lato do que hoje lhe é atribuido, a palavra música era nada menos que a forma adjetivada de musa – que eram nove deusas irmãs que regiam as artes e as ciências. Utilizava-se da música como algo comum a todas as atividades que diziam respeito à busca do Belo e da Verdade. O Belo para os gregos era um conceito objetivo. Só poderia ser Belo o que fosse dotado de Ordem, Forma e Proporção. Já a Verdade estava intimamente ligada a uma trindade que surgiu pela filosofia grega: o Belo, o Bom e o Justo. Nada é Belo se não for Bom e Justo. Os três elementos caminham juntos. Como já foi dito, a música era ensinada juntamente com outros conteúdos. Pitágoras não a dissociava da aritmética, uma vez que os números eram considerados a chave do universo espiritual e físico. Ptolomeu relacionou música e astronomia, associando alguns intervalos ou notas musicais a alguns planetas. Talvez o maior exemplo de relação entre música e astronomia tenha sido dado por Platão, no mito da “música das esferas”. Segundo esse mito, os planetas produzem uma música, inaudível aos homens. Vários autores voltaram a citar esse mito, como por exemplo Shakespeare e Milton. Além da relação com a matemática e com a astronomia, temos uma relação que é tão ou mais importante: música e poesia. Para os gregos, os termos eram praticamente sinônimos. A poesia lírica, por exemplo, surge da poesia cantada ao som da lira. Muitos termos que designavam gêneros de poesia eram também termos musicais, como ode e hino. As formas de poesia desprovidas de música também eram desprovidas de nome. Essa ligação ressurgiu diversas vezes durante a História da música, como na invenção do recitativo, por volta de 1600 e com as teorias de Wagner a respeito do teatro musical no século XIX. www.salgado.weebly.com
E, se há um elemento grego da música que muito afetou a nossa
música, foi a teoria. A teoria grega dividia-se em duas partes:
1. Doutrinas sobre a natureza da música, o seu lugar no
cosmo, seus efeitos e a forma que melhor convinha usá-la na sociedade; 2. Descrições sistemáticas dos modelos e materiais da composição musical
A primeira parte é onde se localiza o que chamamos de Doutrina
do Etos, que será uma das bases para a Doutrina dos Afetos. A doutrina do Etos trabalhava o efeito moral que a música poderia provocar no Homem. Integrava-se, dessa forma, na concepção pitagórica da música como microcosmo, regida pelas mesmas leis matemáticas do macrocosmo. Nessa concepção, a música de forma alguma é apenas uma imagem passiva – é capaz de afetar o Universo. Mais tarde os gregos passam a estudar a música e seus efeitos no caráter e na conduta do Ser humano com uma abordagem mais científica. Aristóteles procurou explicar esses efeitos no que chamou de Doutrina da Imitação. Segundo essa doutrina, a música imita, ou seja, representa, as paixões ou estados da alma, seja brandura, ira, coragem, temperança, etc. Ao ouvirmos um trecho que representa determinado sentimento, ficamos da mesma forma. Dessa forma, a música é capaz de manipular o homem. Aristóteles ainda afirma que, se ouvirmos música boa ficaremos bons e vice-versa. Portanto, para Aristóteles, a música forma o homem. Platão também exprime sua opinião acerca da música e afirma, juntamente com Aristóteles, que a educação deve consistir na música – para trabalhar o espírito – e na ginástica – para trabalhar o físico. No entanto, para Platão deveria haver o equilíbrio entre ambas as atividades. Se um homem ouve musica demais, tende a tornar-se efeminado ou neurótico. Se faz exercícios físicos demais, torna-se incivilizado, violento e ignorante. Apesar de ambos os filósofos retratarem a importância da música na educação, nem toda música é aconselhável. Melodias que exprimem brandura e indolência deveriam ser evitadas na educação dos indivíduos que fossem preparados para governarem. Dessa forma, os modos Dórico e Frígio eram ideais para os futuros governantes, por exprimirem coragem e temperança, respectivamente. Há ainda algumas diferenças entre ambos os filósofos. Aristóteles dizia que a música também poderia ser ouvida por prazer, enquanto para Platão só tinha função na educação. www.salgado.weebly.com
Para se ter uma idéia do papel que a música tomava na educação,
é interessante lembrar que nas primeiras constituições de Atenas e Esparta haviam leis específicas sobre a música. Portanto, a Doutrina do Etos baseava-se em dois princípios:
1. A música afeta o caráter;
2. Diferentes tipos de música afetarão o Homem de formas diferentes.
Nestas condições, poderíamos dividir as músicas em dois grupos
maiores:
1. Música que provoca a calma e a elevação espiritual
2. Música que provoca a excitação e o entusiasmo
A primeira categoria está associada ao culto de Apolo, deus da
métrica, da medida, da proporção. As formas poéticas relacionadas a esse deus eram a ode e a epopeia. Tinha como instrumento a lira ou kítharis, chamado testudo em latim. A lira clássica, instrumento de cordas dos diletantes, cuja importância foi considerável na Antiguidade. Inicialmente com quatro cordas, teve em seguida sete (séc. VIII a.C.) e onze (séc. V a.C.). A afinação da lira era provavelmente, da mais aguda para a mais grave: la-sol-mi-re-si-la-sol-mi-re-si-la. A segunda categoria, por sua vez, está relaciona ao culto do deus Dionísio, também conhecido como Baco, deus do vinho. Tinha como formas poéticas o ditirambo e o teatro, e como instrumento o aulo, tibia em latim. Trata-se de um instrumento de palheta dupla (como nosso oboé), cilíndrico ou levemente cônico, construído de cana, madeira ou marfim. Sua origem é asiática e remotíssima. Havia vários modelos de texturas diferentes e eram utilizados em geral aos pares. Cada instrumento tinha furos que podiam ser tapados com os dedos ou com anéis metálicos. Sobre a maneira pela qual se tocava o aulo duplo, estamos reduzidos a hipóteses. Séculos depois, na renascença, surge o que chamaremos de musica reservata. Segundo Samuel Quickelberg, erudito e médico holandês residente na corte de Munique, a musica reservata consiste em “Adequar a música ao sentido das palavras, exprimir a força de cada emoção diferente, tornar as coisas do texto tão vivas que julgamos tê- las deveras diante dos olhos” e prossegue “a este tipo de música chama-se musica reservata”. Introduz-se na música cromatismos, variedades modais, ornamentos e contraste de ritmos, buscando sempre dar vida ao texto. Um grande exemplo de musica reservata” é o Moteto Absalon fili mi, de Josquin des Prez, baseado no lamento de David em 2 Samuel, 18,33. www.salgado.weebly.com
No Barroco então, surge o que chamamos de Doutrina dos Afetos.
Baseia-se, de uma certa forma na Doutrina do Etos e também pode ser encarada como uma extensão da musica reservata renascentista. A Doutrina dos Afetos é uma característica comum a quase todos os compositores barrocos, quer na música vocal, quer na música instrumental. Os efeitos musicais são intensificados usando-se contrastes violentos. A música não é composta para exprimir os sentimentos do compositor, mas representa os afetos de uma forma genérica e busca transmitir aquele sentimento ao ouvinte. A partir do século XVII alguns teóricos tentam classificar e sistematizar esses recursos, mas essa tarefa foi realizada principalmente a posteriori e os alemães tiveram uma participação relevante nessa tarefa. Através dessa doutrina, o processo de criação musical já era concebido dentro das regras. Pensava-se na composição em três passos:
1. Invento: “descoberta” de um determinado tema ou idéia
musical de base 2. Despositio: planificação ou exposição das divisões da obra 3. Elaboratio: elaboração do material
Como já foi dito, a Doutrina dos Afetos foi utilizada por
praticamente todos os compositores barrocos. Bach tinha uma apreciação exagerada pela numerologia. Usava, por exemplo, a tonalidade de Eb, já que na armadura de clave teriam três bemóis representando a Santíssima Trindade. Vivaldi, no concerto Primavera (E maior) utiliza-se muito da Doutrina dos Afetos. O primeiro movimento começa com um tema comemorando a chegada da primavera. Em seguida ouve-se o “canto dos pássaros”. Volta ao tema e logo após percebe-se a “doce brisa e murmúrio das águas”. O tema é exposto mais uma vez, seguido pela “Tempestade”, “o canto dos pássaros” outra vez e, por fim encerra-se no tema. No segundo movimento percebe-se os latidos de cães feitos pela viola em molto fort. Finalmente, no terceiro movimento se dá a “dança pastoral”, onde uma ninfa e um pastor saúdam a chegada da Primavera. Percebe-se, dessa forma, que a música de Vivaldi está tão impregnada de significados quanto se possa imaginar. Isso não seria possível se o compositor não tivesse associado elementos musicais aos pássaros, cães, etc. Quando falamos de Doutrina do Etos e dos Afetos, parece que nos transportamos a um passado deveras distante. Essa impressão que temos, no entanto, é falsa. Essas doutrinas nos acompanham no nosso dia-a-dia até hoje. Não fosse assim, as ditaduras fascistas e comunistas www.salgado.weebly.com
do século XX não teriam procurado controlar as músicas que poderiam
ser tocadas. Uma das intenções – e talvez a maior delas – era evitar que o povo se rebelasse contra tais ditaduras, sentimento que pode ser provocado no homem associando-se elementos musicais e letra da música. Também as igrejas não escolheriam as músicas apropriadas para tocar em suas celebrações. Imagine uma missa ou culto onde só se toca funk! Da mesma maneira, é cada vez mais crescente a preocupação dos educadores com o tipo de música que as crianças e jovens ouvem e como essa música os afeta. Mais que um fato histórico que foi importante algum dia, a Doutrina dos Afetos, bem como suas bases (Doutrina do Etos e Musica Reservata) é algo cada vez mais presente em nossas vidas e no nosso cotidiano. Outra grande possibilidade que temos com a Doutrina dos Afetos são os crescentes estudos na área de musicoterapia, uma vez que já provado que a música tem um efeito moral que pode tanto fazer bem quanto mal ao paciente. Ao compositor, a Doutrina dos Afetos permite um verdadeiro diálogo com o futuro ouvinte de sua obra. Ao ouvinte, leva à catarse, remete imagens e provoca sensações físicas e psicológicas, deixa de ser passivo e passa a ser ativo na obra de arte. Pode-se concluir que espírito humano só tem a ganhar ao trabalhar com a Doutrina dos Afetos.