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Ano I - Volume 2

novembro/2020

Arte, Cultura, Africanidades e


Internacionalização

2
Arte, Cultura, Africanidades e Internacionalização

Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira

REITORIA
Arte da Capa
Roque do Nascimento Albuquerque
Reitor pro tempore

Claudia Ramos Carioca


Vice-Reitora pro tempore

Joaquim Torres Filho


Chefe de Gabinete

PRÓ-REITORIAS

Antônio Célio Ferreira dos Santos


Pró-Reitor de Planejamento

Artemisa Candé Monteiro


Pró-Reitora de Relações Institucionais

Carlos Mendes Tavares


Pró-Reitor de Extensão, Arte e Cultura Colagem Vetorial, 2020
Manipulação Digital
Geranilde Costa e Silva Marco David Castro da Silva
Pró-Reitora de Graduação

James Ferreira Moura Junior


Pró-Reitor de Políticas Afirmativas e Estudantis

José Olavo da Silva Garantizado Junior


Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação

Leonardo Teixeira Ramos


Pró-Reitor de Administração

“Dossiê dinâmicas culturais e expressões artísticas em cidades do interior: um olhar a partir da


UNILAB” é pertencente à Batuko: Revista Cadernos de Arte e Cultura da Unilab. Visa – em sentido
geral – ao aprofundamento de reflexões acerca das múltiplas articulações entre Universidade,
comunidade, arte, cultura e educação a partir de miradas diversas.
Sumário
Apresentação ................................................................................................................................... 04

Política de promoção e divulgação das culturas na Unilab-CE:


uma reflexão sobre programa de extensão Vozes d’África e
Projeto Uniculturas: unidos pela integração
Anéximandra da Silva .......................................................................................................................... 06

Firkidja di no kampada na arte, cultura e literatura


Justino Gomes, Lucas Jaime Indi ...................................................................................................... 11

Encenando o livro didático de história: o entusiasmo e o


lúdico como possibilidade pedagógica
Vico Melo, Banuma Alberto Caetano Pinto, Emílio dos Santos Fernandes Júnior ................ 17

O grupo Uniculturas e suas ações de incentivo a integração


na Unilab e na comunidade externa
Antônio Gislailson Delfino da Silva ................................................................................................... 22

Coral Sem Fronteiras da Universidade da Integração Internacional


da Lusofonia Afro-brasileira, Campus dos Malês-BA
Paulo Sérgio de Proença, Xavier S Mendes, Gerson Felemon da S. Less, Piquinina Oliveira ....... 26

O lugar das línguas africanas e sua relação com a


formação de identidades na Unilab
Alexandre António Timbane ............................................................................................................... 33

Colorismo Transatlântico: sobre cabelos e marcas da pele


para mulheres negras africanas e afro-brasileiras
Denise Ferreira da Costa Cruz ........................................................................................................... 39
Apresentação
Tivemos privilegio de receber convite da teatro, dança, desenho, pinturas e entre outras.
PROEX para organizar esse dossiê sobre Vale salientar igualmente que arte e cultura
Arte, africanidades e internacionalização, são atividades indispensáveis na formação
considerando a propostas apresentados intelectual de qualquer cidadão.
por grupos de professores e discentes que
fazem extensão e que se debruçam com Cabe questionar qual é o lugar da universidade
sua pluralidade de olhares sobre diferentes neste cenário? E qual o seu papel na promoção
aspectos de artes e cultura na UNILAB nos de arte e cultura? Em sendo a universidade uma
campus avançados em dois estados e regiões, instituição de educação de Ensino Superior,
o Maciço de Baturité no Ceará e o Recôncavo é preciso considerar também os aspectos
baiano, no estado da Bahia de modo que da sua relação com a cultura. Quais são as
as reflexões trazidas ao público são as condições de preservação, de apropriação
experiências vividas e trabalhos desenvolvidos da cultura, e de reflexão crítica sobre ela?
pelos autores nos seus projetos. Mesmo um diagnóstico superficial da época
em que vivemos é suficiente para mostrar a
Estamos passando, nesse momento, por precariedade destas condições. O ritmo do
múltiplas crises, sendo a maior delas a tempo histórico, marcado pelo círculo perverso
sanitária, mas também política, institucional entre produção e consumo até mesmo daquilo
e civilizacional. Em crise, cabe nos refletir, que entraria na categoria dos “bens culturais”: o
repensar estratégias de (re) existência, inquietar imediatismo e o caráter efêmero e disperso dos
e surpreender, papel que a arte e cultura deve interesses que os indivíduos são encorajados
exercer, sempre. As encruzilhadas da realidade a cultivar, a fragmentação e a distorção da
atual nos levam a pensar que devemos buscar informação, a mercantilização extremada
reinventar os nossos estados de alerta e dos meios de comunicação, a prioridade
confrontação, as gingas e os jogos de corpo da realização de anseios impostos por um
que por agora devem ser macios, disfarçados, processo de racionalidade ideologicamente
mas não menos incisivos que se dá numa comprometido com critérios definidos de forma
ligação afetiva academicamente com mesmo unilateral, estão entre os fatores que tendem a
objetivos e interesse. desagregar a identidade cultural.

A arte é a capacidade ou habilidade que uma Com isso, podemos entender a universidade
pessoa tem de fazer ou de construir algo, porém como um promovedor de espaços e de
ela e a cultura andam de mãos dadas. Portanto ambientes de liberdade de expressão e de
a cultura é conjunta de normas, tradições, arte, diversidade cultural no universo acadêmico,
costumes, de um determinado povo ou grupo como objetivo de fazer com que os
social. Eminentemente ambas têm ligação universitários e os demais nela envolvidos,
importante, a cultura geralmente está coligada tenham contato direto com toda diversidade
em diferentes tipos de artes como a música, que nela se encontra.

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Então, esse dossiê vem no sentido de refletir pesquisa e extensão da UNILAB? Qual o papel
também no contexto de aniversário de da arte e cultura na articulação dos processos
dez anos da UNILAB, a situação política e de interiorização e internacionalização? De
sanitária do país, pensar o lugar da arte e que forma a arte e cultura na UNILAB pode
cultura numa instituição jovem e marcada por contribuir para reposicionar a centralidade
uma dupla e difícil inscrição de sua missão histórica do continente africano na constituição
regimental e territorialidade, a interiorização e a da sociedade brasileira? Qual o lugar da arte
internacionalização do ensino público brasileiro e cultura na luta contra o racismo? De que
que envolve seus campus avançados em dois forma podemos potencializar a arte e cultura
estados e regiões, o Maciço de Baturité no na luta pela igualdade de gênero? Por fim,
Ceará e o Recôncavo baiano, no estado da extrapolando o âmbito das perguntas para
Bahia. além da nossa universidade podemos ainda
nos questionar, qual o lugar e potencial da
Neste contexto, os questionamentos a seguir arte e cultura no ensino universitário no Brasil?
orientaram os textos propostos pelos autores Essas e outras questões serão respondidas nas
como referência nos seus ensaios. De que forma reflexões dos artigos aqui postas.
a arte e a cultura são ou podem ser propositivos
de um modelo diferenciado para uma
universidade como a UNILAB? Qual o lugar da Prof. Ricardo Ossagô de Carvalho1
arte e da cultura na promoção das lutas sociais
Prof. Bas’Illele Malomalo2
dos diferentes atores e agentes sociais de que a
universidade é composta? Como pode a arte e
cultura se articular com os contextos de ensino,

1. Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é docente de Graduação nos Cursos de Bacharelado Interdisciplinar
em Humanidades, Licenciatura em Sociologia e Mestrado Interdisciplinar em Humanidades (MIH) do Instituto de Humanidades (IH) da Universidade da
Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB/CE).
2. Doutor em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita/UNESP, é docente de Graduação nos Cursos das Relações Internacionais,
Ciências Sociais e Mestrado Interdisciplinar em Humanidades (MIH) do Instituto de Humanidades e Letras (IHL) da Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB/BA).

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Anéximandra da Silva1

Política de promoção e divulgação das


culturas na Unilab-CE: uma reflexão sobre
programa de extensão Vozes d’África e
Projeto Uniculturas: unidos pela integração

Introdução pautada na troca de saberes, científico e popular,


no diálogo interno e externo à universidade, que
O artigo busca ressaltar a importância do projeto é regulamentada pela da resolução Nº 27/2011
de extensão numa Universidade política de caris de 12 de dezembro de 2011 (PRÓ-REITORIA DE
de Integração Internacionalização, Interiorização EXTENSÃO ARTE E CULTURA, UNILAB).
e Inclusão. Nesta ótica, apresenta as políticas de
promoção e divulgação de diferentes culturas no Diante disso, o foco da nossa análise incide sobre
seio da Universidade da Integração Internacional projetos de extensão da Unilab como programa
da Lusofonia Afro-Brasileira no Estado do Ceará. Vozes D`África e projeto Uniculturas: Unidos
Assim sendo, pode-se perceber que a extensão pela integração, que estão vinculados ao núcleo
Universitária no Brasil, ocupa um espaço entre da cultura. Em linhas gerais tanto programa
ensino e pesquisa, possibilitando a universidade como projeto, estão voltados para promoção
a cumprir com a sua obrigação de “função social”. de divulgação da cultura dentro e fora da
No Fórum Nacional de Pró - Reitoria de Extensão, Universidade, sendo assim, programa de extensão
criado em 1987, foi definido que a o objetivo Vozes D´África cuja foco central é promover a
da Extensão Universitária é dar o caráter da cultura dos Países africanos que fazem parte da
“democratização do conhecimento” (NOGUEIRA, Unilab e o projeto de extensão Uniculturas: unidos
2003). pela integração propõe divulgar as culturas de
todos os países que compõe a Unilab. Entretanto,
No contexto da UNILAB, Pró - Reitoria de nosso objetivo aqui é de compreender como
Extensão Arte e Cultura (PROEX) foi criada em a promoção e divulgação das manifestações
novembro de 2012, perante ato normativo da culturais dos países que compõem a Unilab
Universidade, tendo como objetivo contribuir podem contribuir para o diálogo intercultural,
com a missão institucional na Unilab, no que se sobretudo no que diz respeito ás diferenças,
refere à integração dialógica com os diversos assim como, a percepção que a comunidade a
segmentos da sociedade nacional e internacional redor da Universidade tem sobre a diversidade
atendendo demandas de formação e produção cultural das sociedades africanas na Universidade
de conhecimentos. Sua base metodológica está a partir dos projetos de extensão. Tendo como

1. Graduada em Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades e Licencianda em Sociologia pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia
Afro Brasileira (UNILAB) e coordenadora do Grupo Cultural Firkidja di nô Kampada

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questionamentos de partida, como os projetos artístico. Diante disso, podemos perceber que
de extensão pode ser pertinente para ajudar programa de extensão Vozes D´África o seu foco
na integração dos estudantes dentro e fora da principal é trabalhar a cultura sobretudo a cultura
Universidade através da promoção e divulgação africana. Neste caso podemos questionar, o que
das culturas? E em que medida o debate em impulsionou a criação desse programa?
torno da cultura nos possibilitará a construção de
uma rede de relação de igualdade na diferença? Podemos dizer que antes da instituição da Unilab-
CE foi instalado no Maciço de Baturité, essa região
Espera-se que este artigo possa contribuir tinha pouca informação sobre a África, ainda
tanto para campo acadêmico assim como social podemos afirmar que os estudantes internacionais
e cultural, para que a comunidade acadêmica testemunharam que os estudantes nacionais
e como também comunidade de Maciço de assim como os residentes das comunidades
Baturité possam usufruir dessa produção e arredores da Universidade quando se tratam as
instigar a comunidade em geral a pensar sobre África, se generalizam como se fosse um País.
a importância do projeto de extensão, sobretudo Portanto, foi nesse sentido tornou-se necessário
no domínio da cultura. Assim como, provocar a criar um projeto de extensão que possa possibilitar
reflexão sobre a diversidade cultural, de como as trocas conhecimentos e experiências culturais.
podemos aprender com as nossas diferenças. Programa Vozes D´África tem como objetivo,

analisar as diversidades culturais em África,


a partir das especificidades de cada país que
Abordagens Teóricas compõem a cooperação na UNILAB, com
vista a fortalecimento dos grupos artísticos
Tendo em vista a análise sobre a diversidade já existentes (...), propor a arte e cultura como
cultural que universidade vem mostrando para fonte, linguagem e metodologia de ensino de
comunidades arredores município do Maciço história africana, contribuindo para pluralidade
de Baturité, é nessa ótica que vem surgindo os de saberes e culturas, a universalização
projetos de extensão com intuito de aproxima- e democratização do conhecimento na
los da Universidade. Nessa ideia foi elaborado os sociedade brasileira (PROGRAMA DE
projetos na qual propomos analisar. Entretanto, o EXTENSÃO VOZES D´ÁFRICA, 2017).
programa de extensão Vozes D´África, foi formado
no ano 2017 e é um programa que agrega vários Diante disso, podemos entender que programa
projetos como dança, música, teatro, poesia, de extensão Vozes D´África não só está a divulgar
gastronomia, estética africanas (turbantes e as culturas africanas, mas também está a
tranças) é composto por estudantes e professores proporcionar um ambiente intercultural que é um
de diferentes cursos e nacionalidades que já fator relevante para proposta da integração no
possuem experiências na área de arte e cultura seio de ambiente acadêmico e nas comunidades/
ou os que pretendem potencializá-los. municípios. Ainda, percebe-se que estas inciativas
vêm tornando espaço de apresentação/diálogo e
Neste sentido, o programa Vozes D´África geração de iniciativas artísticas dos estudantes.
busca “explorar capacidade criativo dos alunos
e professores, que podem a partir de uma Por outro lado, temos o Projetos Uniculturas:
perspectiva interdisciplinar para produção do unidos pela integração, que “é um grupo cultural
conhecimento no espaço acadêmico”. Assim que busca divulgar, valorizar e integrar as culturas
como procura aproximar campo de educação e a existentes dos países membros da Unilab”, que
comunidade de Maciço de Baturité, trabalhando atua nas áreas como dança, moda, teatro, poesia,
assim a cultura a partir de uma linguagem música. Com diferentes grupos de atuação como:

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Grupo de Danças Africanas e Afro-Brasileira, Assim podemos compreender o racismo
Grupo de Desfile e Moda Unifashion, Grupo de segundo Schwarcz (2010), como “naturalização
Teatro - Afrisamé, ainda proporciona Palestras, das diferenças” e é um “fenômeno social mesmo
Oficinas de Línguas e Minicursos tanto para os sendo justificado por fundamentos biológicos”, em
estudantes da Unilab assim como para as escolas outras palavras aponta que o racismo é construído
de ensino médio de municípios de Maciço de nas relações sociais, no meio da convivência, no
Baturité. encontro das culturas. Diante dessa abordagem
podemos perceber que a Unilab pode ser um
Este projeto é baseada no um dos proposito espaço de reprodução do racismo, porém é um
da Unilab que não é menos importante, que espaço de encontro das culturas e para que isso
é promover a integração, com isso o projeto possa ser trabalhado os projetos de extensão
Uniculturas: Unidos pela integração, propõe podem ser pertinentes.
demostrar “o que os Países parceiros da Unilab
tem de melhor e outro lado da África ainda Por outro lado, podemos verificar que nos
pouco conhecida além das suas fronteiras”, dois projetos de extensão é visível o desejo da
com objetivo de integrar os países parceiros da construção de uma sociedade multicultural
Unilab em um espaço de integração cultural e intercultural. Neste caso, percebe-se que,
e desenvolver atividades contínuas nos seus questão de multiculturalismo está relacionada
eixos de atuação, com a finalidade de mostrar as com a construção uma sociedade baseada na
diversidades culturais existentes na Universidade diversidade cultural e nesse relacionamento se
e as possibilidades de conhecer cada umas constrói uma relação intercultural que pode ser
delas, preparando assim o cidadão para viver em entendida como uma relação de igualdade na
sociedades multiculturais. diferença.

Neste caso, podemos fazer paralelo projeto de Neste sentido, que Touranine (1997), na base de uma
Uniculturas: unidos pela integração uma certa perspectiva multicultural foi assertiva á quando
afinidade similar com Programa Vozes D´África no respondeu à questão considerada indispensável
que tem a ver com intuito de divulgar as culturas na promoção de diálogo intercultural. Quando
africanas. Sendo assim, vimos uma grande im- problematiza o seguinte: “como podemos viver
portância nesses projetos de extensão, de certa juntos?”. Para Touranine (1997), podemos viver
forma estão contribuindo para integração, divul- juntos com a “democracia política e da diversidade
gação e promoção da cultura dentro e fora da cultural baseada na liberdade do Sujeito” isso
Unilab, principalmente culturas africanas. mostra que tudo que uma pessoa precisa é ser
livre para que ela possa desenvolver o que tem
Tanto Programa Vozes D´África, assim como para contribuir na sociedade.
Projeto Uniculturas: unidos pela integração, estão
inseridos na resistência em busca de diminuir o
conflito no que diz respeito a questão do racismo e
preconceito dentro da Unilab e nas comunidades Conclusão
de Maciço de Baturité. Sabendo que a pratica
do racismo no contexto brasileiro torna um Em forma de conclusão, podemos compreender
empecilho na aproximação entre os estudantes que a Unilab desde a sua construção aceita o
negros e de outros países. Na mesma ótica que desafio de enfrentar os conflitos que possa existir
o preconceito dentro no seio dos estudantes sobre a ideia de integração, mas essa ideia não se
internacionais (africanos) de diferentes países pode restringir só dentro da Universidade, também
podem reproduzir e isso pode ser vista como um deve chegar as comunidades arredores da Unilab.
desafio de diálogos. Na base disso podemos perceber a importância

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dos projetos de extensão com caráter de
promoção da integração com base na divulgação
das culturas, estes estão a divulgar a riqueza da
diversidade cultural para fora da Universidade.

No entanto, podemos perceber a diferença na


comunidade de Maciço de Baturité a sua mudança
com relação ao conhecimento sobre história da
África e a sua diversidade a partir da atuação dos
projetos de extensão principalmente os que são
citados nesse artigo, podemos verificar isso nas
escolas de ensino médio nessa região. A partir
disso vimos que é necessário que a Universidade
cria um espaço cultural onde esses projetos
vão poder realizar suas atividades, assim como,
buscar a ter uma atenção especial com relação
aos projetos de extensão, com intuito de fazer
com que seja visível a riqueza da diversidade
cultural que há na Universidade e ainda com ajuda
do desenvolvimento dos projetos de extensão na
área de arte e cultura. Portanto, estas inciativas
culturais e artísticas podem contribuir para que
Unilab seja vista como exemplo para o mundo,
mostrar que podemos viver juntos com as nossas
diferenças.

Por outro lado, a Universidade pode levar esses


projetos para serem conhecidos no mundo a
fora. Diante de tudo isso, podemos ver que a
Unilab está formando os jovens não só para
terem preparação acadêmica, mas também está
formando homens e mulheres para atuarem
em diferentes meios sociais e culturais devido a
diversidade dos estudantes que se encontram
nesse espaço e por meio dos projetos e currículos
serão formados suficientemente para enfrentar o
desafio da globalização.

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Referências

NOGUEIRA, Maria das Dores Pimentel, O Fórum de Pró-reitores de Extensão das Universidades Públicas
Brasileiras: um ator social em construção, UFMG, Interfaces - Revista de Extensão, v. 1, n. 1, 2013

PROGRAMA DE EXTENSÃO VOZES D´ÁFRICA. Unilab, Ceará, 2017.

PROJETO UNICULTURAS:UNIDOS PELA INTEGRAÇÃO. Unilab, Ceará, 2017

PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO ARTE E CULTURA, Unilab. Disponivel em: www.unilab.edu.br. Acessado em


03 dez 2018.

SCHWARCZ, Lilian Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, Instituições e questão racial no Brasil – 1870-
1930, São Paulo: Campainha das letras, 1993.

TOUNAINE, Alain, Iguais e Diferentes, podemos viver juntos? Tradução Carlos Aboim de Brito, ed. Peaget,
Lisboa, 1997.

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Justino Gomes1
Lucas Jaime Indi2

Firkidja di no kampada na arte, cultura


e literatura
Introdução espelha o espectro artístico e cultural daquele
país. Uma vez incorporado o prazer literário nos
O grupo Firkidja Di No Kampada foi criado pelos corações desses jovens, a continuidade daquilo
estudantes guineenses de diferentes cursos que, no passado recente, despertou povos
da Universidade da Integração Internacional da ao engajamento grandioso e vitorioso pode
Lusofonia Afro-brasileira - UNILAB, em setembro encontrar a sua força vitalícia. O compromisso
de 2017, no Brasil. Desde os primórdios do grupo, a de assumir o que as gerações anteriores fizeram
seiva que alimenta a sua existência é a promoção na construção das identidades nacionais e na
da cultura e literatura guineense. Mas aberto consolidação das nações dentro das realidades
que seja esta seiva, as culturas e literaturas dos concretas ou socioculturais e que deram origem
povos integrantes da UNILAB respiram, à vontade, às nossas nações modernas, passa entre várias
na essência do grupo sem gemidos. Isto é, as formas, hoje, pela oralidade conjugada com a
culturas e literaturas de CPLP alimentam o espírito escrita, ou seja, a (re)vivência das experiências,
poético de jovens que alicerçam o grupo. Assim, das estórias, e das práticas culturais. Nisto, entra
o macrosistema cultural-literário engendrado pelo os (re)encontros culturais e poéticos que podem
grupo está além da Guiné-Bissau, país da origem ganhar diferentes denominações dependendo
dos seus membros. da opção e do lugar.

A (re)criação literária é uma paixão que explodiu


entre estes estudantes no meio da trilha
acadêmica, embora haja entre eles um longo A literatura na construção das identidades
período de interesse pela literatura desde Guiné-
Bissau. Mas, mesmo assim, compreende-se que É fundamental passear na história para entender
a UNILAB enquanto espaço acadêmico serviu de a importância da criação de espaços culturais
palco para a edificação da (re) criação literária que como os que o grupo Firkidja Di No Kampada

1. Justino Gomes nasceu no sector de São Domingos, Norte da Guiné-Bissau. É Técnico Médio em Administração pelo Centro de Formação Técnico
Profissional São Leonardo Murialdo, Guiné-Bissau; Bacharelado em Humanidades e Licenciando em Sociologia pela Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB). Membro do Conselho Editorial da Revista África e Africanidades; membro do Grupo Literário
Cultural Firkidja Di No Kampada; além de ser um dos organizadores, participou com poemas na primeira coletânea poética do grupo Firkidja Di No
Kampada, intitulada “Nos porões das palavras: primeiro tcholona di tambur” (2019); apresentou a obra literária do Yanique Nanque, intitulada Gritu di
Carnel, lançada pela editora CLASS, Porto Alegre, 2019; É 2º responsável do departamento de redação do grupo Firkidja Di No Kampada e segundo
secretário da Mesa da Assembleia Geral da Associação dos Estudantes Guineenses da UNILAB - AEGU. E-mail: [email protected]
2. Lucas Jaime Indi Gradou-se em bacharelado Interdisciplinar em Humanidades pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira
em 2018, atualmente Licenciando em Sociologia Plena pela mesma instituição. É membro e vice coordenador do grupo cultural Firkidja di no Kampada
da qual participou como escritor e um dos membros organizadores da primeira coletânea (Livro) intitulada - Nos porões das palavras: primeiro tcholona
di Tambur. Já trabalhou como professor de Inglês no projeto “ Ensino Multilíngue e Interculturalidade Lusófona no Maciço de Baturité cadastrado pelo
PIBELP\2017. Foi colaborador interno do projeto: Música e Nação em África: Os Sons da Diversidade Cultural na UNILAB. E-mail: [email protected]

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cria dentro e fora da universidade. No Brasil do sé- as identidades imaginárias santomenses foram
culo XIX, melhor dos anos 1822, a poesia assumiu costuradas “fora” das coloniais que dantes
a (re) construção das caixas identitárias autônomas, abraçavam o pequeno Príncipe (LEITE, 2014;
independentes daquela mãe metropolitana. A ex- CHAVES, 2005).
pressão “Pátria Mãe” Brasil ganhou oxigênio da vida
nas imaginações e recriações poéticas rumo à uma Tudo isto, é o que as gerações anteriores
terra assente no seu misticismo e feiticismo ancora- fizeram para proteger os seus patrimônios
dos na sua natureza exuberante (LIMA, 2016). Ali se culturais, simbólicos e imateriais. É um desafio
encontrava a rebusca da mitologia fundadora da na- que, por mais que fosse difícil, foi encarado
ção por meio da literatura, principalmente, criação e vencido. Porque hoje, estas literaturas são
poética. As bases foram afuniladas no solo brasileiro autônomas que qualquer estudioso atento das
e a nação se ergueu no imaginário desse povo. Literaturas Africanas da Língua Portuguesa não
pode confundi-las. Pois, cada uma carrega a
Deixando a América para África, no séc. XIX, especificidade cultural do seu povo, espaço e
numa temperatura carbonizante insuflada pelo línguas. A universidade pode desempenhar um
colonialismo, romperam a terra, as literaturas dos papel fundamental no incentivo à continuidade
povos que hoje são conhecidos como Países destes exercícios de imaginação e construção
Africanos da Língua Oficial Português (PALOP). Os intelectual das memórias e culturas dos povos.
poetas clariosos caboverdianos (re)descobriram a A forma de o fazer acontecer pode ser pelo
“caboverdianidade” de Cabo-Verde na imaginação incremento dos espaços culturais por meio dos
poética, e atiraram o “caboverdianismo” às águas programas institucionais instando a criatividade
do Atlântico. Os poetas mensageiros angolanos artística e literária.
assumiram decisivamente a nobre missão de (re)
descobrir a Angola por meio do imaginário literário
e foi assim que a “angolanidade” soube saltitar
alegremente para aprumar a reflexão literária dos Realidade incontestável e a necessidade de
poetas e o “angolanismo” recebeu o julgamento repensá-la
encarnado que nem o cartão vermelho que o
sancionou (AUGEL, 2007; SECCO, 2002). A cultura literária, principalmente, a dos países
africanos da língua portuguesa existe e existia
Em Moçambique, a voz poética de seus escritores desde um período longínquo antes da chegada
soprou o mocambicanismo que até então insistia dos aventureiros portugueses nessas paradas.
em explicar, mas que só exibia o vazio, o exógeno As diferentes formas de manifestação cultural
e fez germinar sobre o solo moçambicano a que incluem as oraturas, contação de estórias,
moçambicanidade que expressa a “karingana” provérbios, mitos, fabulas etc., não são de hoje.
moçambicana. Na Guiné-Bissau, no meio do séc. Porém, estas formas de expressão cultural
XX, os djidius da caneta abraçaram freneticamente foram subjugadas pelos ventos fortes da
a resistência colonial na imaginação literária e, opressão colonial. Tão violento e ignorante
sem demoras, a guinendade orientou-se nos foi o sistema colonial que o poeta, contista e
líricos do Vasco Cabral, Amílcar Cabral, Pascoal romancista angolano Manuel Rui Alves Monteiro,
D´Artagnan Aurigemma etc., na busca do feiticismo exterioriza seus lamentos ao patrimônio cultural
e misticismo guineense. (RIBEIRO e SEMEDO, 2011). africano que o colonizador poderia aproveitar,
De outro lado do Atlântico, chega sopros literários mas, infelizmente, este aventureiro preferiu
das Ilhas de São Tomé e Príncipe no mesmo século. menosprezá-lo,
As águas, o azul do céu, o bater da maré nas rochas
e a brisa da frescura das ilhas implantaram-se na quando chegaste, mais velhos contavam
tinta das canetas endógenas dos escritores como estórias. Tudo estava no seu lugar. A água.
José Tenreiro, Alda Espírito dos Santos e outros e O som. A luz. Na nossa harmonia. [...] É certo

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que podias ter pedido para ouvir e ver as estó- da expressão cultural. Pois, isto, o grupo Firkidja
rias que os mais velhos contavam quando che- Di No Kampada tenta fazer na medida do
gaste! Mas não! Preferiste disparar os canhões possível. E as universidades também, sobretudo
(MANUEL, 1987, apud CHAVES, 2005, p. 248). aquelas do espaço violentado pela empresa
colonial, devem encabeçar esta missão.
Obviamente, hoje, não se pode deixar de
perceber que as universidades empenhadas
na descolonização – ou proposta Pós-Colonial3,
como a UNILAB, estão a atender, paulatinamente, Breve apresentação das coordenações e
as lamentações do Rui Manuel que ancoram ações da Firkidja di no Kampada
no aproveitamento das diversidades para
o enriquecimento do aparato cultural da Tem pessoas que no meio da invernia decidiram
Humanidade. No contexto da UNILAB, a criação ser gênios. Andar no íngreme dos tempos
da Pró-Reitoria de Extensão, Arte e Cultura, cuja nostálgicos não lhes encabeçam a mínima
departamentos comprometidos com a valorização, desesperança. Mesmo nos momentos agrestes
promoção e difusão das artes e culturas dos países insuflam, escancaradamente, nos mais distintos
da integração, ou seja, da CPLP, que é visível não corações, amor fraterno. Nossos corações
só na criação dos espaços muito importantes para irrigados de bons exemplos da liderança
a divulgação das artes e culturas, por exemplo, deles: Liliane A. R. Costa, Mamadu Nanque e
Semana das Culturas da UNILAB, é um sinal Anéximandra da Silva, na Firkidja Di No Kampada,
evidente da disponibilidade desta universidade em enaltecem, ao mais alto nível, os consolantes
caminhar diferente daquela do comboio colonial, resultados das suas coordenações.
em que o dito “canibal 4” tinha que ser excluído e
desarticulado da sua base. Foram corações estremecendo de emoções
patrióticos nos auditórios da UNILAB, nosso
Além da existência das manifestações literárias embondeiro, com sexta poética; Foram espíritos
evidenciadas nesta breve citação do texto do Rui longe da terra que atravessaram, à distância,
Manuel, o desastre causado pela violência do o Oceano Atlântico para a Guiné-Bissau na
colonialismo aparece através da desarmonia que o noite poética; de comissões organizadoras dos
espaço viveu e evidenciou: nem águas, nem o som eventos, na UNILAB, vieram inúmeros convites
e ritmos, nem as estórias estão agora em harmonia bem respondidos com cantares poéticos
com as vidas humanas. Canhões ceifaram tudo. Isto dos poetas e das poetisas da Firkidja Di No
é uma metáfora da desestruturação dos sujeitos Kampada; os passos são das novas poetisas a
com a sua experiência prática cultural. Canhões engendrar novos cânticos poéticos no pátio da
existem além dos físicos ou materiais, porque esteira estendida por toda gente e para toda a
as simbólicas que alteraram as cosmovisões, gente, quando o apelo às novas ingressantes
as tradições, as crenças estão presentes. A foi aceito por elas e livremente começaram as
colonização cultural e das mentes são canhões que suas ações na família Firkidja como membros.
ainda persistem no subconsciente e na realidade
intersubjetiva do espaço colonizado. A reparação Desta vez, é a Universidade Federal do Ceará
dos danos causados por estes canhões passa, (UFC) que acolhe imemoráveis participações
entre outras formas, pela valorização e promoção da Firkidja Di No Kampada nos eventos

3. Sabemos que o termo pós-colonial é um termo muito complexo que carrega um conjunto de contextos: histórico, epistemológico, crítico, temporal etc. Mas
aqui o termo pós-colonial deve ser entendido como um conjunto de posicionamento crítico, releitura crítica da literatura colonial em todos os aspectos:
científico, cultural, político e econômico etc. Uma reinterpretação das bases herdadas da configuração da sociedade mundial. Na extensão, aproximação
com a proposta Decolonial do Sul Global.
4. O termo é usado no sentido introduzido pelo poeta e dramaturgo inglês, Willian Shakespeare.

13
caldeados com vozes cristalinos dos poetas e Afinal fala-se de quem? Entenda que se fala
das poetisas da nossa casa; já é o livro Nos Porões do poeta internacional guineense que tropeça
das Palavras: primeiro tcholona di tambur que, na “fidjus” (filhos) da nação num único cabaz “di
linguagem literária, se diz coletânea poética djunta mon” (unir as mãos), Tony Tcheca na
que está publicado, podendo os leitores fixarem homenagem que o grupo patrioticamente soube
seus articuladores linguísticos nos versos e nas hastear à comunidade acadêmica guineense na
estrofes para receber a contribuição dos Firkidjas UNILAB, no ano 2018. É a bandeira das cores
na literatura editorial guineense; de longe fala um Verde, amarela, vermelha e preta (Guiné-Bissau)
dos nossos humos da literatura contemporânea combinada com a das cores azul, branca, amarela
guineense, o nosso Luís Vaz de Camões; José e verde (Brasil) que se casam com a da Angola,
Craveirinha, o nosso Mário Pinto de Andrade, o Cabo-Verde, São Tome e Príncipe, Moçambique,
nosso José Tenreiro, a nossa Alda Espírito dos Timor Leste e Portugal, que de certa forma,
Santos, o nosso Baltazar Lopes, o nosso Machado constituem a bússola da Firkidja nos cantares
de Assis... literários dos seus poetas, poetisas, cineastas,
músicos e teatrólogos.

Imagem I – compilação de apresentações de firkidja di nô kampada

Fotos de algumas
atividades de Firkidja Di No
Kampada na UNILAB.

Autor: Arquivo de firkidja di


nô kampada

Esta voz singular, mas plural


que demonstra ser, por
representar a unida família.

Autor: Arquivo de firkidja di


nô kampada

14
Firkidja, enaltece não apenas a coordenação e Cultura guineense; a Literatura e Cultura da CPLP
do Nanque, porém saudosamente passa pelas na UNILAB e nos espaços além dela.
labaredas do princípio e ziguezaguear ao alto a
primeira coordenação que sabiamente foi capaz De setembro do ano 2017, data da criação do
de erguer esta tão coesa plêiade guineense nas grupo, para junho deste ano 2020, Firkidja Di
silhuetas do embondeiro das nações da CPLP. No Kampada conta-se com três coordenações:
De palavras doces, pois, fraternas canta-se, Duas coordenações cessantes e uma em vigor.
sem cessar, o nome da Liliane Alice Resende A primeira é liderada pela admirável poetisa
Costa, a primeira coordenadora da Firkidja Di engajada, estudante da Engenharia de Energia
No Kampada. É nos ancoradoiros sem fim, na Universidade da Integração Internacional
nem rampa, que arrancou o barco dos poetas, da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), Liliane
navegando nos oceanos que, outrora, foram Alice Resende Costa e a outra foi encabeçada
atormentados por algumas baleias gigantescas, pelo reconhecido Mamadu Nanque graduado
tentando interromper o destino da viagem, não em Humanidades, licenciado em História pela
obstante, cuidadosamente, os tormentos foram UNILAB e, atualmente, Mestrando nas Relações
esfumados e as incursões derrotaram-se nas Internacionais na Universidade Nova de Lisboa. No
fossas marianas, devido ao saber fazer e saber dia 05 de janeiro de 2019, na cidade de Acarape,
coordenar. Ceará, Brasil assiste-se mais uma passação
da coordenação da Firkidja para a sua terceira
Hoje, poetas e poetisas da Firkidja mais que nunca coordenadora, Anéximandra da Silva, poetisa,
agradecem, sem limite, a todos e a todas que no bacharelada em Humanidades e licencianda em
caminhar da turba zelaram-se pelo entendimento, Sociologia pela (UNILAB).
tolerância, compreensão e fraternidade para que
seja possível costurar os contrastes e as mais
diversas opiniões, com vista a uma Firkidja sólida
e consolidada. Construindo e conquistando Considerações Finais
mais espaços culturais com os seus mosaicos
poéticos, porém desafiadores no seu destino de O que se espera deste grupo Cultural e literário é
promover a cultura, literatura guineense e não só, um reforço dos laços de irmandade que ancoram
mas também da CPLP. os povos africanos e o povo brasileiro. Uma vivência
daquilo que aproximou e distanciou essas nações
A revitalidade é importante para uma sociedade. separadas pelo empurrão e o romper das águas
Na nossa Firkidja fala-se da revitalidade que não do Atlântico. Acreditando que o Departamento de
é renascença de um novo membro no lugar do Arte e Cultura da UNILAB foi e será um espaço
outro morto. Aqui não há lugar para modalidade de despertar interesse pela Cultura e Literatura
verbal deôntica e muito menos epistémica, à medida que incrementa abertura de espaços
apreciativa talvez. Do mesmo jeito, a (re)conjugação culturais, artísticos e literários com intuito de
das forças não significa a inutilidade do esforço incentivar mais o exercício artístico e literário.
anterior, mas sim a (re)atualização das esperanças
e desafios que entre interstícios da brisa saudável Espera-se que o navio da Firkidja não faltasse o
os poetas e as poetisas da Firkidja implantam nos combustível, assim como os líricos dos poetas e
corações a abertura de oportunidades para todos poetisas não faltassem vozes para exteriorizar
e todas num clima da irmandade. Neste deslizar os sentimentos e emoções amorosos também
íngreme, pois fácil para andar dos Firkidjas, críticos e revolucionários até no mais ímpeto
enraízam nossos princípios de liderança rotativa circunstância azeda.
e a convivência fraternal saboreada por todas e
todos, trilhando o desafio de promover a Literatura

15
Referências

AUGEL, Parente Moema. O desafio do escombro: nação, identidade, e pós-colonialismo na literatura da


Guiné-Bissau: Rio de Janeiro. Garamond, 2007.

CHAVES, Rita. Angola e Moçambique: experiência colonial e territórios literários. Cotia/SP: Ateliê Editorial,
2005.

LEITE, Eduardo Joaquim Costa da Bessa. A literatura guineense: contribuição para a identidade da nação.
2014. Tese (Doutorado em Letras, área de Línguas e Literaturas Modernas, especialidade de Literaturas dos
Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) – Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, Coimbra,
2014.

LIMA, Rosa Norma Sueli. O ensino das literaturas de língua portuguesa no Brasil. Diadorim, Rio de Janeiro,
revista 18 volume 1, p. 172-184, jan-jun 2016.

SECCO, Tindó Lúcia Carmen. Travessia e Rotas das Literaturas Africanas de Língua Portuguesa: Das
profecias libertárias às distopias contemporâneas. Légua Meia: Revista da Literatura e Diversidade
Cultural, nº 1, 2002.

RIBEIRO, Calafate Margarida; SEMEDO, Costa Odete (Org.) Literatura da Guiné Bissau: cantando os escritos
da história. Porto: Afrontamento, 2011.

16
Vico Melo1
Banuma Alberto Caetano Pinto2
Emílio dos Santos Fernandes Júnior3

Encenando o livro didático de história:


o entusiasmo e o lúdico como
possibilidade pedagógica

Respeitável público: uma breve iniciação respeitando suas diferenças e diversidades


em sala de aula (hooks, 2013). De acordo com
Em tempos de pandemia, crise econômica bell hooks (2013, p. 18), “o entusiasmo é gerado
e social e de cortes sucessivos nos recursos pelo esforço coletivo”, onde a educação possa
referentes à Educação, se faz necessário a cada ter como prática a liberdade: seja ela de
dia se pensar e repensar estratégias pedagógicas, pensamento, de expressão e/ou de culturas.
com intuito de gerar nos/as estudantes um Nesse sentido, ensinar, em si, é um ato teatral
interesse renovado sobre a escola. Com tantas (hooks, 2013).
problemáticas concernentes ao mundo exterior
da escola, que pressionam os jovens a se afastar Com a publicação da Lei 9.934/96 que
do ambiente educacional, cabe aos educadores estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação
compreender tais realidades e transformar de uma Nacional, a forma de ministrar ensino tem como
forma mais atrativa o ambiente escolar. Aqui não se um dos princípios a “liberdade de aprender,
busca colocar a responsabilidade dos problemas ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
socioeconômicos do país nos/as educadores, pensamento, a arte e o saber”, além de ter
mas imaginar e refletir sobre as possibilidades de reconhecido e instituído a arte como área de
atuação na sala de aula. conhecimento no currículo escolar do ensino
básico – fundamental e médio (BRASIL. Lei
A educação e seu processo pedagógico de ensino nº 9.934, de 20 de dezembro de 1996). Esse
passa pela compreensão de que a sala de aula e a reconhecimento das artes, e mais propriamente
própria instituição educacional tem de ser o lugar do teatro, como uma das possibilidades de
do entusiasmo, nunca do tédio. O entusiasmo, ensino na educação básica, se faz importante
enquanto prática de ensino e baseado na valorização no desenvolvimento do estudante, onde pode
da presença de cada um na atividade de ensino, se utilizar de metodologias interdisciplinares
tem a capacidade de transformar a educação, como forma de aprofundar o conhecimento
pois estimula os estudantes a se reconhecerem científico.
enquanto sujeitos ativos perante os demais,

1. Professor do Departamento de Gestão Pública do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (DGP/CCSA) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e ex-
coordenador do projeto de extensão “Encenando o Livro Didático de História”, quando atuou como professor do Instituto de Humanidades da UNILAB.
2. Bacharela em Humanidades pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e licencianda em Sociologia pela
UNILAB. Estudante voluntária do projeto de extensão “Encenando o Livro Didático de História”.
3. Bacharel em Humanidades pela UNILAB, licenciando em Sociologia e mestrando no Programa de Mestrado Interdisciplinar em Humanidades (MIH),
ambas pela UNILAB. Estudante bolsista do projeto de extensão “Encenando o Livro Didático de História”.

17
Baseando-se nesses princípios e concepções é O estado da arte e a arte da teoria
que nós, enquanto grupo engajado no projeto
“Encenando o Livro Didático de História”4, Ao contrário do que o pensamento tradicional
buscamos nos sustentar nos paradigmas do afirma, cada pessoa é um “todo físico-químico-
Teatro do Oprimido, proposto pelo teatrólogo biológico-social-cultural” (CASTRO-GÓMEZ, 2007,
Augusto Boal, e no Teatro Experimental do p. 86), que faz parte de um universo heterogêneo
Negro, proposto por Abdias do Nascimento. com distintas realidades histórico-sociais-raciais-
Dentro dessas duas perspectivas, estão diversas sexuais-culturais-econômicas. Compreender a
modalidades de ação prática e teatral, a partir diversidade da nossa realidade sócio-histórica só
do Teatro-Imagem, Teatro-Fórum, Teatro-Jornal, é possível através de uma ecologia de saberes,
Teatro-Legislativo, Teatro-Invisível e Arco-Iris do baseada na ideia de “que todos os conhecimentos
Desejo, onde são usadas como ferramentas de têm limites internos e limites externos”, onde
participação popular e como forma de discutir “os internos dizem respeito aos limites das
os problemas sociais que nos rondam, a exemplo intervenções no real que permitem”, enquanto
da visibilização da população negra e periférica, “os externos decorrem do reconhecimento de
excluída dos espaços sociais e de representação intervenções alternativas tornadas possíveis por
(BOAL, 1991; NASCIMENTO, 1978). Dessa forma, outras formas de conhecimento” (Santos, 2007,
o teatro se torna um indutor da educação, se p. 26), sendo a interdisciplinaridade uma das
mostrando um importante instrumento didático e possibilidade de agir na produção e ampliação do
de reflexão do meio social e da própria História conhecimento.
– sendo estendida pra Sociologia, Geografia etc.
A arte, envolvida com o processo educativo formal
A História, enquanto disciplina, é extremamente da História, tem a possibilidade de transformar
importante para o desenvolvimento pessoal a percepção dos estudantes acerca do ensino,
do estudante, criando uma consciência de assim como de compreender melhor o seu
responsabilidade cidadã com a sociedade, quando próprio entorno social. O ensino se torna algo mais
aprendemos sobre o nosso passado e presente prazeroso e informal com o teatro, quebrando
através de um processo reflexivo. De acordo estruturas muitas vezes “duras”, daquilo que
com Ciro Flamarion Cardoso (1986, p 28), é parte se convencionou como ensino-aprendizagem
da construção da História enquanto ciência “o (educador-educandos). Paulo Freire chama esse
respeito pelas especificidades históricas de cada modo “formal” de educação como “concepção
época e sociedade”. É buscando respeitar essas bancária”, onde a “narração de conteúdos que, por
especificidades, não só históricas, mas de vida dos isto mesmo, tendem a pretrificar-se ou a fazer-se
participantes do projeto, que ao longo de dois anos algo quase morto, sejam valores ou dimensões
introduzimos uma metodologia interdisciplinar concretas da realidade. (...) Falar da realidade
entre o teatro e a História, em que pudesse como algo parado, estático, compartimentado e
conduzir o próximo num processo formativo e de bem-comportado, quando não falar ou dissertar
aprofundamento do conhecimento, além de se sobre algo completamente alheio à experiência
reconhecerem coetaneamente enquanto sujeitos existencial dos educandos, vem sendo, realmente,
ativos da própria História. A História não só como a suprema inquietação desta educação” (FREIRE,
uma disciplina teórico-abstrata, mas como uma 2014, p. 79). Ou seja, para se romper com essa
“práxis” de vida. concepção bancária é necessário repensar e

4. O projeto de extensão “Encenando o Livro Didático de História” faz parte do “Programa Vozes da África”, que tem como intuito visibilizar e refletir sobre
temáticas referente às realidades e especificidades dos contextos africanos. No “Programa” há vários outros projetos com diversos eixos de atuação
(dança, música, teatro, poesia, gastronomia, turbantes e tranças), tendo o interesse em visar a integração de estudantes de várias nacionalidades e
cursos, com experiência ou interesse em potencializar uma educação transformadora.

18
propor novas formas de ação entre o ensino- A História, por si, tem a possibilidade de nos
aprendizagem. fazer conhecer o nosso passado com intuito de
entendermos o nosso presente e projetarmos o
O teatro se torna possibilidade de método de nosso futuro. Segundo Fernand Braudel (2005),
ensino, pois abre ao estudante novas realidades e a História pode ser dividida em três formas:
perspectivas acerca da educação e do seu lugar uma história entre a humanidade e o meio que
enquanto sujeito na produção do conhecimento. lhe cerca; uma história social, ou dos grupos
São novas experiências de convivência entre e agrupamentos; e por último, uma história do
colegas e professores que o teatro oferece, indivíduo, ocorrencial, com oscilações breves e
reconhecendo na outra sua humanidade, aceitando ultrassensível. Como bem afirma Braudel (2005, p.
as diferenças, semelhanças e contrastes, além de 15), temos marcado, então, “um tempo geográfico,
dirimir possíveis conflitos. Essas múltiplas leituras um tempo social, um tempo individual”.
e diferentes interpretações provocadas pelo teatro
tem a capacidade de oferecer ferramentas que Para além desses tempos históricos propostos
nos permita adquirir a criatividade e a crítica sócio por Braudel, vem se formatando na estrutura
histórica, diante das diferentes situações que a curricular da educação brasileira uma forma mais
vida vais nos proporcionando. É nesse sentido plural de ver e entender a História que fazemos
que se faz necessário basear-se nos princípios parte, trazendo à luz do debate a construção
trabalhados por Augusto Boal no “Teatro de histórica das nossas realidades, a partir daqueles
Oprimido” e por Abdias do Nascimento no “Teatro que foram invisibilizados e silenciados pela
Experimental do Negro”, onde a conscientização História convencional, ao que Jack Goody (2015)
dos sujeitos subalternizados (negros, mulheres, convencionou como “o roubo da História”. A
pobres, etc.) são o centro da ação, promovida Lei 10.639/03, que institui a obrigatoriedade no
através de uma série de jogos, exercícios e currículo oficial da Rede de Ensino a temática
técnicas teatrais entre os participantes com intuito “História e Cultura Afro-Brasileira”, veio consolidar
crítico-reflexivo (NASCIMENTO, 1978; 2004; BOAL, essa nova perspectiva de discutir a História na
1982; 1991). Nas palavras de Abdias do Nascimento educação de base e superior. De acordo com o
(2004, p. 211), “teríamos que agir urgentemente em Artigo 26 da referida lei:
duas frentes: promover, de um lado, a denúncia
dos equívocos e da alienação dos chamados §1o O conteúdo programático a que se refere o
estudos afro-brasileiros, e fazer com que o próprio caput deste artigo incluirá o estudo da História
negro tomasse consciência da situação objetiva da África e dos Africanos, a luta dos negros no
em que se achava inserido”. Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na
formação da sociedade nacional, resgatando
Boal (1982) ainda afirma que o teatro não é uma a contribuição do povo negro nas áreas social,
forma de comunicação estática ou que representa econômica e política pertinentes à História do
a si mesmo como um fim. Na verdade, para Boal Brasil.
(1982, p. 13)
§2o Os conteúdos referentes à História e Cultura
O teatro é uma forma de comunicação Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de
entre os homens; as formas teatrais não se todo o currículo escolar, em especial nas áreas
desenvolvem de maneira autônoma, antes de Educação Artística e de Literatura e História
respondem sempre a necessidades sociais Brasileiras.
bem determinadas e a momentos precisos. O
espetáculo faz-se para o espectador e não o
espectador para o espetáculo; o espectador
muda, logo o espetáculo também terá de
mudar.

19
À guisa de conclusão: refletindo o lúdico e o Portanto, é preciso enfatizar – principalmente
entusiasmo como possibilidades dialógicas/ nesse tempo presente de incertezas, instabilidade,
pedagógicas vulnerabilidade e crise social-econômica-cultura
e de pensamento provocado no cenário nacional
É reconhecendo a importância da História e internacional – que não se pode deixar de lado o
no processo formativo das crianças e jovens universo das relações humanas com a diversidade
do ensino fundamental e médio – baseado e a diferença, em que é justamente nos processos
na Lei 9.934/96 e na Lei 10.639/03 – além da de se fazer-pensando e de pensar-fazendo, junto
necessidade de alargar cada vez mais o campo do ao diferente e/ou contraditório, que se educa
conhecimento, é que se faz necessário produzir para uma verdadeira cidadania, respeitando-se
uma metodologia particularmente interdisciplinar, a pluralidade daqueles/as que são educados/
onde o processo de ensino-aprendizagem entre as. Essa percepção do processo aprendizagem-
o lúdico e a “formalidade” possa ser dialógica. ensino e do fazer-pensando, através do respeito à
Dialógica no sentido de que só se constrói um diversidade e o reconhecimento do outro na sua
conhecimento plural e verdadeiro através de totalidade, se encaixa na filosofia africana Ubuntu,
um processo de horizontalidade e de respeito na afirmação de que eu sou porque nós somos, ou
as várias vivências e experiências existentes em seja, só nos tornamos pessoa (somente) perante
sala de aula. Como bem afirmava Césaire (2006, outras pessoas (RAMOSE, 2009)
p. 84), um conhecimento denso só é possível
através de “um universalismo depositário de todo
o particular, depositário de todos os particulares,
no aprofundamento e na coexistência de todos os
particulares”, representado pelo não desperdício
das experiências concretas.

A teoria dialógica entre o lúdico – aqui


representado pelo teatro – e a educação formal –
representado pela disciplina da História –, da qual
este projeto se delineia, se funda na ação coletiva e
participativa entre educador-educando, em que o
encontro seja um processo de pronúncia (FREIRE,
2014). A História e o teatro têm a possibilidade de
transformar a relação ensino-aprendizagem na
educação, promovendo o entusiasmo enquanto
método de ação e de valorização da presença
de cada um (educador-educando), desinibindo
os estudantes a participarem dos debates em
sala de aula e abrindo novas epistemologias
para o aprofundamento da disciplina da História.
Parafraseando mais uma vez bell hooks (2013),
ensinar é um ato teatral em que a História possa ser
o diálogo para que possamos nos compreender
enquanto sujeitos que pertencem e moldam a
própria História

20
Referências

BOAL, A. 200 exercícios e jogos para o ator e o não-ator com vontade de dizer algo através do teatro. Rio
de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1982

________. Teatro do oprimido e outras poéticas políticas. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1991.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Brasília,
D.F. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/ handle/id/70320/65.pdf -2005>. Acesso
em: 02 Set. 2017.

BRASIL. Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003. Lei que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura
Afro-Brasileira. Brasília, D.F. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.639.htm>.

BRAUDEL, Fernand. Escritos Sobre a História. São Paulo: Perspectiva, 2005.

CARDOSO, Ciro Flamarion. Uma Introdução à História. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.

CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre el colonialismo. Madrid: Akal Ediciones, 2006.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.

GOODY, Jack. O Roubo da História: como os europeus se apropriaram das ideias e invenções do Oriente.
São Paulo: Contexto, 2015.

HOOKS, bell. Ensinando a Transgredir: a educação como prática de liberdade. São Paulo: WMF Martins
Fontes, 2013.

NASCIMENTO, Abdias do. O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um racismo mascarado. Rio de
Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1978.

_________. Teatro Experimental do Negro: trajetória e reflexões. Estudos Avançados, 18, (50), 2004.

RAMOSE, Mogobe. “Globalização e Ubuntu”. Em: SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula.
Epistemologias do Sul. Coimbra: Almedina, 2009

21
Antônio Gislailson Delfino da Silva1

O grupo Uniculturas e suas ações de incentivo a


integração na Unilab e na comunidade externa

Respeitável público: uma breve iniciação momentos de troca e efetiva integração se


amplie, consolidando cada vez maior robustez
Dia 9 de março de 2017, nas dependências da e potência um diálogo entre os sujeitos de
Universidade da Integração Internacional da distintas origens que fazem a UNILAB, bem
Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB, no Campus como com as comunidades e seus respectivos
da Liberdade, surge oficialmente o Grupo Cultural equipamentos que conformam os entornos da
UNICULTURAS. Inquietados/as com a falta de instituição. Importante destacar ainda que o
atividades permanentes pautadas na integração que fundamenta as ações do UNICULTURAS
entre os países parceiros, estudantes de Angola, é uma compreensão alargada das experiências
Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, estéticas, culturais e artísticas que as põe em um
São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, se reúnem regime de centralidade na condução também
com o intuito de criar um grupo que possa, de de reflexões crítico-políticas e epistemológicas.
fato, incentivar e valorizar a diversidade cultural Em outros termos, a motivação cultural que
presente na Universidade. Sendo assim, com 26 anima o grupo é, assim, possibilidade de
estudantes dos respectivos países é fundando na transformação social concreta, nos remetendo,
UNILAB um dos maiores grupos culturais. A partir por exemplo, ao engajamento em lutas sociais
de então, agrupados por temas como dança, como as que objetivam combater o racismo, a
poesia, música, moda e teatro, o UNICULTURAS misógina, a xenofobia e o ódio de classe.
passa atuar por meio de oficinas, seminários,
apresentações e intervenções que tomam como A cultura é sempre diversa, dinâmica e
espaço privilegiado não apenas as dependências plural. Multiplicam-se pelas cidades do
dos campi da UNILAB no CEARÁ, mas igualmente Maciço do Baturité os signos impressos nas
os equipamentos públicos dos munícipios que a falas, nos gestos, nas roupas, na música, na
abrigam e as escolas localizadas nestas mesmas dança. Valorizar e respeitar a diversidade de
cidades. manifestações culturais e artísticas dos espaços
populares é um ato primordial de construção
Assim, o UNICULTURAS, é um projeto que visa de uma sociabilidade renovada. Vislumbra-
fortalecer um conjunto de ações já em curso pela se, como efeito, a ampliação da circularidade
mobilização de um apoio institucional. Com isso, de imaginários, de obras, de bens e práticas
acredita-se que a dinâmica de oficinas e demais culturais nas cidades sob o primado da

1. Mestrando em Estudos Africanos -ISCSP-Universidade de Lisboa-Portugal. Especialista em Relações Internacionais (Faculdade Verbo Educacional),
especialista em Gestão Pública, licenciado em Sociologia e Bacharel em Humanidades pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia
Afro-Brasileira (UNILAB) e representante externo do Grupo Uniculturas. E-mail: [email protected]

22
comunicação entre próximos e distantes. Afinal, Assim, conhecer o outro, nos reporta ao
a cultura se torna mais rica quando expandimos reconhecimento da complexidade do mundo,
as nossas trocas de imaginários, de saberes, de em busca de comunicação, esse movimento
fazeres e convivências. de descoberta grafado através das atividades
propostas no grupo Uniculturas: música, dança,
Favero (1983) é um dos autores que adotou essa de desfiles, de teatro, enfim, buscando sempre a
perspectiva teórica em sua reflexão sobre a invenção de outra forma de registros e trocas que
cultura, tendo definido com grande propriedade contribuam para o exercício pleno da integração.
o conceito em seu trabalho sobre cultura popular Nossa proposta se caracteriza por mobilizar,
e educação. Segundo o autor, através das atividades, as diferentes formas
de se integrar em um novo contexto, tendo
a cultura é tudo o que o homem acrescenta como referência atores/autores sociais em seus
à natureza; tudo o que não está inscrito no territórios de identidade, em especial estudantes
determinismo da natureza e que aí é incluído internacionais e nacionais de espaços culturais
pela ação humana. Distinguem-se na cultura diferentes. Para Silva (2016), “os encontros e
os seus produtos: instrumentos, linguagem, as atividades realizadas buscam incentivar a
ciência, a vida em sociedade; e os modos de integração no ambiente escolar. Procurando
agir e pensar comuns a uma determinada so- ‘desmitificar’ os estereótipos [de pobreza, miséria
ciedade, que tornam possíveis a essa socie- e fome] que a mídia brasileira passou e passa
dade a criação da cultura (FAVERO,1983, p.78). sobre o continente africano” (SILVA, 2016, p.75).

Nesta acepção, pode-se afirmar que a cultura é


um processo dinâmico e ininterrupto, construído
no cotidiano das práxis sociais, a partir da Metodologia de trabalho do grupo
experiência concreta de vida dos sujeitos, sendo
trabalho que se materializa na ação humana. A projeto em questão tem como metodologia
Diante disso, o grupo Uniculturas nasceu da ideia principal, num primeiro momento, a promoção
de criarmos um projeto contínuo de atividades de encontros frequentes entre seus participantes
culturais voltadas para a valorização das culturas com o objetivo de se “apropriarem” tanto teórica
africanas, brasileiras e também, timorenses. A quanto praticamente de suas áreas de atuação,
UNILAB, a cada ano, é contemplada com diversas como as já citadas: música, dança, teatro, poesia
atividades culturais, dentre elas, as atividades etc. Esta relação dialética entre teoria e prática é
alusivas às independências dos países parceiros. o que permite o compromisso com a criticidade
Nossa proposta é realizar mais atividades e a reflexão aguçada, evitando a reprodução
culturais contínuas e apresentar de um modo mecânica das práticas. Há uma postura, assim, de
diversificado um pouco da cultura dos alguns constante “revisitação” das performances culturais
países da UNILAB. que se busca partilhar, bem como o cultivo de uma
sensibilidade para se oferecer formações – no
Com esse projeto, buscamos valorizar a caso de cursos, oficinas e seminários – pautadas
diversidade como princípio de nossa formação pela responsabilidade também técnica. No que
identitárias, promover encontros nos eixos se refere à relação com as comunidades que
citados anteriormente como possibilidade do serão palco de tais apresentações e atividades
respeito à alteridade e promoção da tessitura de de formação, o grupo trabalha em parceria com
acontecimentos e intervenções artístico culturais outros projetos de extensão da própria UNILAB
como mediações necessárias à construção das que já tem inserção em territórios, sobretudo,
narrativas propostas pela comunidade externa e “vulneráveis” ou “sensíveis”, partilhando das
interna. experiências culturais do grupo como forma
de concreta contribuição. Outra via de trabalho

23
concerne ao contato com os cursos de licenciatura funcionamento. Durante esses três anos, a
da instituição, configurando possibilidades de comunidade “unilabiana” e a comunidade externa
trabalho colaborativo nas escolas da região. tiveram a oportunidade de conhecer um pouco
Assim, há no bojo de experiências de estágio, mais das culturas de cada país que fazem parte
PIBID ou Residência Pedagógica a mobilização da Unilab. De acordo com os dados da relatoria do
de uma diversidade cultural operando a favor do grupo, mais de oito mil pessoas participaram das
combate ao racismo e à xenofobia, por exemplo, diversas atividades realizadas pelo grupo (oficinas
ao mesmo tempo em que se oferece uma de danças, moda, música, culinária, línguas
imagem de África e suas expressões para além africanas, teatro), noites culturais, concursos de
dos estereótipos e apreciações petrificadas. danças, exposição e dentre outros. Ainda, o grupo
participou, na comunidade externa, em dezenas
de atividades nas escolas municipais do Maciço
de Baturité e de Fortaleza, além de atividades
Três anos incentivando a integração: alguns desenvolvidas em centros culturais, museus
resultados e em espaços artísticos. No que diz respeito a
quantidade de membros do Grupo, em 2017 o
Conforme citado anteriormente, o grupo grupo contava com 38 membros efetivos, hoje
Uniculturas foi criado em março de 2017, o grupo conta com mais de 140 membros de
completando este ano (2020), três anos de diferentes nacionalidades da Unilab.

Imagem 1 – Alguns/as integrantes do Grupo Uniculturas

FONTE: Arquivo do Uniculturas

Considerações Finais e destaca a sua importância, particularidade e


relevância para a comunidade acadêmica e,
Com base nas informações apresentadas, também, para a comunidade externa. Hoje, a
podemos constatar que grupo Uniculturas é, sem comunidade tem a oportunidade de conhecer um
dúvida, um projeto inovador e que busca incentivar pouco das culturas de cada país que fazem parte
a Integração dos países parceiros da UNILAB. da Unilab, através das atividades desenvolvidas
Como próprio nome já diz, o Uniculturas “une” as pelo Grupo Uniculturas.
mais diversas manifestações artísticas e culturais

24
Referências

FÁVERO, O. (Org.). Cultura popular, educação popular: memória dos anos 60. Rio de Janeiro: Graal, 1983.

SILVA, Antonio Gislailson Delfino da. Trajetórias De Estudantes Guineenses No Brasil: Do Processo De
Integração Ao Regresso/Retorno. /Antônio Gislaison Delfino Da Silva. Redenção, 2016.

25
Paulo Sérgio de Proença1
Xavier Sanca Mendes2
Gerson Felemon da Silva Less3
Piquinina Oliveira4

Coral Sem Fronteiras da Universidade da


Integração Internacional da Lusofonia Afro-
brasileira, Campus dos Malês-BA

Começando a conversa O Projeto começou a funcionar no mês de julho


de 2017, registrado no fluxo contínuo da Pró-
O projeto Coral sem Fronteiras surgiu para contribuir Reitoria de Extensão da Unilab. Em 2018, ano em
para a dinamização das propostas da Unilab, que funcionou a pleno vapor, o projeto passou
principalmente nas questões ligadas à integração. a funcionar sob o amparo do PIBEAC-Programa
O canto coral é uma ferramenta de socialização de Bolsa de Extensão e cultura, quando passou
e de integração capaz de unir diferentes culturas. a contar com duas bolsas.
Essa é a grande motivação por que o Coral foi
criado. Assim, apresentamos o projeto, seus
componentes, suas atividades e desafios.
Trabalhando em conjunto. Como deve ser um
coral

Apresentando o projeto Os componentes da equipe, desde a sua cons-


tituição, foram estes: Xavier Sanca Mendes, gui-
O Coral sem Fronteiras da Unilab Campus dos Ma- neense, Bacharel em Humanidades e graduan-
lês se comprometeu com a integração em seus do em Relações Internacionais, músico, atual
mais diversos níveis de amplitude, que compre- regente do Coral, é monitor bolsista e o ideali-
endem desde parcerias internacionais até envol- zador do grupo; Gerson Felemon da Silva Bless,
vimento de pequenas comunidades interioranas cabo-verdiano, Bacharel em Humanidades e
localizadas no entorno de seus campi. Dentro e graduando em Pedagogia, músico, apoiador e
fora da Universidade, isso se dá por meio da par- monitor bolsista; Piquinina de Oliveira, guineen-
ticipação de alunos e alunas das diferentes nacio- se, Bacharel em Humanidades, graduanda em
nalidades que fazem parte da Unilab em ativida- Pedagogia e monitora voluntária; Paulo Sérgio
des que envolvam a comunidade local, em ensino, de Proença, professor do curso de Licenciatura
pesquisa e extensão. Nesse sentido, as atividades em Letras, coordenador do projeto.
do Coral contribuíram para efetiva integração en-
tre as diferentes culturas que convivem na e com a Os demais componentes do coral foram alunas
universidade, dentro e fora dela. e alunos e membros da comunidade externa à

1. Professor do Curso de Licenciatura em Letras da Unilab-Malês-BA, coordenador do projeto.


2. Estudante guineense de Relações Internacionais, regente do Coral.
3. Estudante cabo-verdiano de Pedagogia, músico.
4. Estudante guineense de Pedagogia, componente da equipe de trabalho do Coral.

26
universidade; em suas diversas fases, o Coral sem importância da música em geral e do canto
Fronteiras chegou a congregar mais de cinquenta coral em particular. Partimos desta reflexão de
participantes. Nascimento (2011, p. 40):

[...] a música é um dos estímulos mais po¬tentes


para ativar os circuitos do cérebro, ajuda a afinar
Organizando Iniciativas a sensibilidade das pessoas, aumenta a sua
capacidade de concentração, desenvolve o
Para atingir os objetivos, foram realizadas estas raciocínio lógico-matemático e a memória, além
ações: de desencadear emoções. Por isso, os benefícios
da música na escola se estendem para todas as
• Curso de formação musical para os áreas da aprendizagem.
componentes, com duração de 3 meses,
com enfoque na leitura rítmica, entoação e A música pode contribuir para estimular e
harmonização das vozes; aprimorar o processo de aprendizagem. Com
isso, deveria ser estimulada em ambientes de
• Aulas de aprendizagem dos hinos nacionais escolarização formal; contudo, pode-se admitir
ou canções nas línguas tradicionais ou que o canto coral não é tão incentivado como
nacionais dos países componentes da deveria, nos diversos segmentos da sociedade em
UNILAB; que poderia ter suas potencialidades exploradas.
Predomina mais em comunidades religiosas e
• Ensaio de cantos representativos da não estranha que nesses ambientes os vínculos
cultura da comunidade onde se encontra a entre os membros do grupo sejam mais fortes
universidade; (isso não se explica, claro, exclusivamente pelo
incentivo à prática do canto coral).
• Participação em eventos dos municípios
local e vizinhos; As universidades, exceto em cursos da área mu-
sical, não incluem em seus currículos discipli-
• Participação em eventos para os quais a nas afins à musica nem ao canto coral; contudo,
UNILAB-Campus dos Malês for convidada; desde que despertaram para a importância das
ações de extensão, têm percebido a importân-
• Apresentação de palestras para cia dessa atividade; ainda assim, apenas 18% das
conscientizar os membros do grupo sobre os uni¬versidades do país têm um coral como ma-
objetivos da UNILAB e reforçar a integração; téria opcional nos seus currí¬culos e, apenas 7%,
oferece algum tipo de benefício para os alunos
• Ação musical conjunta com as secretarias que optam para cantar no coral universitário, se-
de cultura dos municípios próximos e gundo Nascimento (2011, p.43).
parceria com outros grupos musicais já
existentes neles. Já está comprovada ao longo da história a
importância da música para a vida humana. A
Bíblia, por exemplo, fala do valor terapêutico dela;
o rei Davi tocava sua harpa para aliviar o rei Saul de
Buscando apoios teóricos para organizar e seus tormentos, conforme se encontra registrado
orientar a prática no capítulo 16 de 1 Samuel. Além dessa dimensão
pessoal de profundidade psicológica e emotiva,
Embora este trabalho não seja um artigo alcança a música amplitude de natureza social,
acadêmico, no rigor do termo, são apresentadas interativa, com força para criar e manter vínculos
algumas considerações teóricas sobre a interpessoais e comunitários significativos.

27
Dessa forma, estímulos à experiência afetiva e de risco, são algumas das áreas que vêm
à sensibilidade estética se efetivam pessoal e sofrendo a influência dos ensinamentos de
comunitariamente; a socialização promove o Paulo Freire, na busca pela inclusão social e
encontro com o outro e valorização do grupo, pela participação de toda a população nos
além de incentivar a disciplina, o respeito e a diversos seguimentos, contribuindo desse
cooperação. Além disso, há conservação da modo para a democratização de nosso país.
memória cultural sedimentada em sons e ritmos
criados pela música. A autora tem consciência de que o método Paulo
Freire é resultado da forma com que aquele
Como se pode notar, a música é poderosa autor concebia a educação. Em todo caso, para
adjuvante no processo ensino-aprendizagem. entender o método e aplicá-lo em toda plenitude
Não só isso: a música em geral e o canto coral é necessária uma ação de conscientização, de
em particular se constituem relevante ferramenta libertação e de ética humanista (LIMA, 2007, p. 59).
de integração social. É por isso que até empresas E, nesse desafio, a música em todas as múltiplas
com fins lucrativos se empenham em incentivar e formas em que se expressa, é poderoso meio de
patrocinar iniciativas na área musical. construção desse ideal.

Lima (2007) faz interessante e oportuna


combinação entre o método de Paulo Freire e o
canto coral. A combinação é seminal. A motivação Participando em eventos diversos
reside no fato de que, apesar de o método do
eminente educador se aplicar mais diretamente O Coral sem Fronteiras participou de eventos
à área educacional (principalmente na educação diversos, nos quais executou repertório
de adultos), há diálogo proveitoso com diversas diversificado, que incluiu a rica herança musical
áreas do saber (LIMA, 2007, p. 60): das culturas brasileira e africana. A primeira
apresentação do Coral sem Fronteiras ocorreu
A educação musical, as artes plásticas, o na abertura do XVI Encontro de Corais do
teatro, a educação artística, a sociologia, a Recôncavo da Bahia (ECOS), realizado na Câmara
pesquisa participante, as metodologias de de Vereadores de São Francisco do Conde, no
ensino, a política de educação de meninos dia 16 de novembro de 2017.
de rua e de crianças que vivem em áreas

Imagens 1 e 2: Participação no XVI Encontro de Corais do Recôncavo da Bahia, em 16/11/17

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

28
A segunda apresentação do Coral ocorreu no Canô, em Santo Amaro da Purificação, no dia 18
encerramento do XVI ECOS, no teatro Dona de novembro de 2017.

Imagens 3 e 4: Encerramento do XVI ECOS, no Teatro Dona Canô, em 18/11/17

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

O Coral marcou presença na Semana da Cons- Antonio Carlos Magalhães do município Madre de
ciência Negra, organizada pela Escola Municipal Deus-BA, no dia 21 de novembro de 2017.

Imagens 5 e 6: Semana da Consciência Negra, em Madre de Deus-BA, em 21/11/17

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

No final de 2017, o Coral participou na primeira 29 de dezembro de 2017, no Largo do Tanque, em


edição de “Vozes do Natal” da TV Bahia, no dia Salvador.

Imagens 7 e 8: Primeira edição de “Vozes do Natal”, da TV Bahia, em 29/12/17

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

29
Em janeiro de 2018, o Coral participou da primei- Municipal da Educação – SEDUC e do Encontro
ra edição Festival de Arte e Educação de São Municipal da Diversidade Religiosa, organizado
Francisco do Conde, organizado pela Secretaria na Câmara Municipal da mesma cidade.

Imagens 9 e 10: Festival de Arte e Educação de São Francisco do Conde e Encontro Municipal
da Diversidade Religiosa, em janeiro de 2017

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

Em 8 de março de 2018, o Coral participou da Municipal de Educação de São Francisco do


Jornada Pedagógica realizada pela Secretaria Conde.

Imagens 11 e 12: Jornada Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de São Francisco do Conde, em 16/11/17

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

No dia 16 de junho de 2018, pela primeira numa da CPLP. O evento aconteceu na câmara dos
formatura do Campus dos Malês, o Coral sem vereadores de São Francisco do Conde.
Fronteiras cantou os hinos nacionais dos países
Imagens 13 e 14: Formatura da Unilab-Malês, em 16/06/18

FONTE: Acervo do Coral sem Fronteiras

30
Enfrentando desafios

Um primeiro desafio a ser registrado foi a baixa


participação de membros da comunidade. Apesar
de convites diversos e divulgação nos eventos de
que o Coral participa, não contamos com número
expressivo de componentes não universitários.
Uma explicação possível é a sensação que ainda
pode ser sentida de que a universidade não diz
respeito a quem nela não estuda nem trabalha;
essa sensação é forte, mas está sendo superada,
embora muito lentamente.

Outro desafio foi a falta de recursos para aquisição


dos instrumentos necessários aos ensaios e
apresentações, como microfones, caixas de som,
pastas, uniforme e materiais diversos; falta-nos,
também, um espaço próprio para ensaios.

Fechando a conversa

As ações do Coral sem Fronteiras foram exitosas


e os objetivos do projeto foram alcançados: a
Unilab está se fez presente em diversos eventos
e ambientes, na cidade e na região. São muito
importantes as ações extensionistas, que
promovem a inserção da comunidade em seu
entorno, com a convergência de interesses e
ideais. Ganham todos e é confirmado o princípio
de que dentro e fora da Universidade se ensina e
se aprende.

31
Referências

LIMA, Maria José Chevitarese de Souza. O canto coral como agente de transformação sociocultural
nas comunidades do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho: educação para liberdade e autonomia. Tese de
doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro (Instituto De Psicologia), 2007. Disponível em: http://pos.
eicos.psicologia.ufrj.br/wp-content/uploads/mjchevitarese.pdf.

NASCIMENTO, Jurema Lúcia de Jesus; BUSS, Ricardo Niehues. O canto coral como instrumento facilitador
da aprendizagem no ensino superior: o processo de socialização no canto coral. Revista São Luis Orione,
v.1, n. 5, p. 37-59, jan./dez. 2011. Disponível em: http://www.catolicaorione.edu.br/portal/wp-content/
uploads/2015/01/O-Canto-Coral-como-Instrumento-Facilitador-da-Aprendizagem-no-Ensino-Superior-
Revista-S%C3%A3o-Luis-Orione-v-1-n-5-jan-dez-2011.pdf. Acesso em: 23 mar. 2017.

32
Alexandre António Timbane1

O lugar das línguas africanas e sua relação


com a formação de identidades na Unilab

Considerações Iniciais exige cuidados no tratamento, na abordagem,


na comunicação, nas formas de tratamento e
A Universidade de Integração Internacional da sobretudo no respeito.
Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) é uma instituição
pública brasileira de caráter internacional uma Essas questões fazem com que a UNILAB seja
vez que é composta por estudante brasileiros, o lugar das culturas onde brasileiros aprendem
timorenses, angolanos, moçambicanos, bissau- com estudantes estrangeiros e vice-versa,
guineenses, cabo-verdianos e são tomenses. pensando juntos na construção da ciência
A presença de alunos internacionais no espaço sem fazer perder nem aculturar o outro. Desta
da UNILAB o transforma uma universidade forma, “A UNILAB, ao fomentar e concretizar
internacional, de experiência única no mundo. a cooperação Sul-Sul, atende a diretrizes
Segundo UNILAB (2010), a instituição “visa internacionais que apontam tanto a importância
promover, por meio de ensino, pesquisa e extensão de ampliar a oferta de cursos superiores em
de alto nível e em diálogo com uma perspectiva regiões carentes, quanto de ampliar as relações
intercultural, interdisciplinar e crítica, a formação de cooperação com o continente africano”
técnica, científica e cultural de cidadãos aptos a (UNESCO apud UNILAB, 2010, p.17).
contribuir para a integração entre Brasil e membros
da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa O trabalho visa refletir sobre as atividades de
(CPLP) e outros países africanos visando ao extensão realizadas na UNILAB com relação
desenvolvimento econômico e social. ” ao ensino da cultura e de línguas africanas
como propostas de integração internacional
A UNILAB é uma instituição rica sob o ponto de vista entre os Países Africanos de Língua Oficial
da cultura, das línguas e de práticas pedagógicas Portuguesa (PALOP) e o Brasil e o Timor Leste.
versáteis uma vez que os professores adaptam (a Para este trabalho trouxemos um recorte sobre
todo momento) suas metodologias para atender as relações entre as línguas e suas relações
estudantes de culturas diversas, de formações com as culturas africanas em contexto da
iniciais diferentes e de línguas diferentes. A todo UNILAB. Esta reflexão visa incentivar o ensino
momento os professores, funcionários auxiliares e das línguas não oficiais porque elas são a fonte
estudantes em geral lidam com a questão cultura, de identidade dos povos. Não existe uma
o que faz com que a tolerância seja necessária a sociedade sem língua e todas as línguas são
todo momento. Somos todos humanos, mas cada importantes quanto aquelas que são oficiais.
um é proveniente de cultura e tradição o que

1. Professor Adjunto de Instituto de Humanidades e Letras da Unilab-Malês/BA

33
Num primeiro momento (primeira seção) faremos congolesa (com 1436 línguas), afro-asiática (371
um breve historial dos estudos iniciais sobre as línguas), nilo-saariana (196 línguas) e khoisan (35
línguas africanas. Em seguida (segunda seção) línguas), dados que nos levam a estimar em mais
abordaremos o ensino das línguas africanas na de 2000 línguas, segundo Heine e Nurse (2000),
UNILAB, trazendo a experiência de coordenador Ngunga (2015), Maho (2009) e Petter (2015). As
de Projetos de Extensão virados para o ensino das sociedades africanas sempre souberam fazer
línguas africanas na UNILAB. A terceira e última uma política e o planejamento adequado das
seção faremos uma ponte entre as línguas e a suas línguas e, por essa razão, as línguas ficaram
culturas africanas apontando a relevância do seu preservadas ao longo dos séculos mesmo sem
ensino no resgate das identidades. O texto termina tradição escrita. Cada grupo étnico sabe qual
com apresentação de considerações finais e língua usar para cada situação de comunicação,
referências. uma vez que o plurilinguismo corresponde ao uso
comum no continente africano.

A chegada dos colonizadores europeus mudou


Breve historial das línguas Africanas o cenário linguístico de África. Primeiro, porque
falantes da mesma língua ficaram separadas
Os primeiros estudos descritivos sobre a classifi- devido a partilha do continente ocorrida na
cação das línguas africanas foram realizados por Conferência de Berlim em 1884 e 1885; segundo,
americanos e europeus que vieram para África porque as línguas africanas foram proibidas
em missões religiosas e expedições exploratórias, pelo sistema colonial atitude que inibiu o seu
especialmente no século XIX. Desses pesquisado- desenvolvimento ao longo das décadas da
res, pode-se citar Joseph Harold Greenberg (1915- colonização; terceiro, porque as línguas oficiais de
2001), Malcolm Guthrie (1903-1972), Clement Mar- origem europeia ficaram confinadas nas grandes
tyn Doke (1893-1980), Wilnelm Heinrich Immanuel cidades enquanto que as autóctones eram usadas
Bleek (1827-1875) e Carl Friedrich Michael Meinhof nas zonas rurais.
(1857-1944) que contribuíram com estudos des-
critivos sobre diversas línguas. Estudos de Jean Hoje, nos PALOP predomina o português sob o
L. Doneux que resultaram na publicação da obra ponto de vista da oficialidade, mas a vida prática
Histoire de la linguistique africaine: des précurseurs é dominada pelas línguas africanas. Quando
aux années 70 procuraram descrever, comparar, falamos de línguas africanas incluímos o crioulo
localizar geograficamente e identificar o grau de de qualquer base que tenha surgido no espaço
parentesco entre línguas. Esses e outros estudos geográfico chamado África (TIMBANE & MANUEL,
contribuíram para avanços significativos na descri- 2018). Sendo assim, os alunos que chegam na
ção das diversas línguas africanas. UNILAB são provenientes de comunidades
multilíngues. Para além disso, esses alunos
Cabe-nos salientar que a ideologia colonial chegam dominando as variedades de português
defendia que os africanos não tinham línguas, mas do seu grupo social de origem. Isso cria impasse
sim dialetos. A situação linguística africana ficou num primeiro momento porque a variedade
mais complexa no período da colonização porque brasileira de português é diferente da variedade
os africanos deixaram de usar as suas línguas angolana do português exemplo. Os professores
autóctones privilegiando as línguas europeias. Essa se desdobram em compreender
ideologia veio a ser confirmada no período pós-
independência, uma vez que todos países africanos
oficializaram pelo menos uma língua de origem
europeia (ABDULA, TIMBANE & QUEBI, 2017). O ensino das línguas africanas na Unilab

O continente africano possui quatro grandes Alguns estudantes africanos chegam na UNILAB
famílias de línguas, nomeadamente nigero- sem conhecer as línguas faladas nos seus

34
países porque têm o português como primeira proveniente da Guiné-Bissau e falar o guineense
língua. Os alunos brasileiros descobrem a sua (em geral como língua materna). Nos corredores
cultura por meio das línguas africanas porque da universidade e mesmo na cidade de São
o português brasileiro recebeu contribuição de Francisco do Conde, é comum ver os estudantes
diversas línguas africanas sobretudo em nível guineenses se comunicando entre eles em
do léxico (PETTER, 2015). Os diversos cursos de guineense, ininteligível para a maioria dos falantes
línguas africanas dos Cursos de Extensão na de português.
UNILAB despertam a curiosidade em muitos
estudantes porque esses estudantes nasceram Diante desse cenário, o ensino do guineense
e cresceram em ambientes onde se valorizava a permitiu que outros estudantes da UNILAB e
língua autóctone oficial (o português) em prejuízo (inclusive) a comunidade externa conheçam
das línguas autóctones. O projeto desenvolvido um pouco mais da cultura de outro país através
na UNILAB tinha como título: “Diálogos entre da língua. Ademais, para os guineenses, o
Línguas e Culturas africanas e afro-brasileiras no ensino de sua língua no ambiente universitário
campus dos Malês”. Os cursos de Língua e Cultura significa uma valorização dessa língua, que ainda
africanas constituem um espaço de partilha de hoje na Guiné-Bissau é alijada da escola e da
conhecimentos sobre as línguas africanas, em comunicação formal, e o reconhecimento de
especial as línguas do grupo bantu assim como que ela é tão legítima quanto o português, não
as culturas que moldam as mesmas. Muitos sendo defectiva ou inferior (rótulos muitas vezes
estudantes africanos nasceram e cresceram nas atribuídos às línguas crioulas).
grandes cidades dos PALOP e não conhecem as
línguas das suas comunidades. Foram realizados 10 cursos desde 2018 e muitos
alunos tiveram a oportunidade de redescobrir
Sendo assim, estes cursos são uma oportunidade as suas línguas maternas. Falar uma língua é
de aprender, valorizar e preservar essas línguas diferente de saber descrevê-la. Então, mesmo os
para que sejam revitalizadas e ensinadas pelas que falavam crioulo, kimbumdu, umbundo, etc.
futuras gerações. Para os brasileiros, é um tiveram a oportunidade de compreender como
momento de aprender as línguas dos ancestrais funciona a estrutura gramatical das suas línguas.
e conhecer os significados de diversas palavras Para além disso, fenômenos como provérbios,
ainda existentes no Candomblé, nas danças e nas idiofones e reduplicações constituíram um
tradições africanas e afro-brasileiras que resistem momento de descoberta da cultura dos povos
ao tempo. Os cursos não ensinam apenas as originários. De lembrar que os cursos foram
línguas africanas dos PALOP, mas também inclui ministrados por estudantes bolsistas e voluntários
aspetos da cultura que se voltam para essas provenientes dos grupos étnicos dessas línguas.
línguas.

Outro projeto desenvolvido na UNILAB foi


“Ensino-aprendizagem de línguas crioulas de A língua e a cultura africanas
base portuguesa: o guineense”. Este projeto de
extensão objetivou desenvolver atividades de Para o antropólogo inglês Edward Taylor, a cultura
ensino-aprendizagem de línguas crioulas de é um conjunto complexo de conhecimentos,
base lexical portuguesa, mais especificamente crenças, arte, moral e direito, além de costumes
do guineense, falado na Guiné-Bissau e também e hábitos adquiridos pelos indivíduos inseridos
no Senegal (na região de Casamança). numa determinada sociedade. A cultura é o
conjunto de práticas, de técnicas, de símbolos e
Dentre as diversas línguas crioulas, o guineense de valores que devem ser transmitidos às novas
foi escolhido pelo fato de grande parte dos gerações para garantir a convivência social. Para
estudantes estrangeiros da UNILAB ser Santos (2006), a cultura diz respeito a tudo aquilo

35
que caracteriza a existência social de um povo realidades sociais, econômicas e políticas.
ou nação ou então de grupos no interior de uma Todas as manifestações da língua se verificam
sociedade. Mas também pode ser um conjunto (se materializam) na fala, no indivíduo e é lá
de conhecimentos, de ideias e de crenças, onde ocorrem as primeiras manifestações de
assim como as maneiras como esse conjunto de variação e mudança linguísticas. É um processo
conhecimento se manifesta na vida social. de formação de signos linguísticos, estruturas
semânticas, sintáticas, usados pelos falantes
Para Cuche, “o processo que cada cultura sofre (nativos e não nativos) que se relacionam ao
em situação de contato cultural, processo de contexto, ao ambiente em que os indivíduos
desestruturação e depois de reestruturação, é frequentam e/ou aqueles que estão ao seu redor.
em realidade o próprio princípio da evolução
de qualquer sistema cultural. Toda cultura A fala é um ato da faculdade humana, esse
é um processo permanente de construção, saber é depositado na mente de cada indivíduo,
desconstrução e reconstrução” (CUCHE, 1999, p. que necessita inteiramente deste emaranhado
137). Se a cultura é instável, como é que a língua de signos combinatórios para que haja uma
como parte integrante permanecerá estática? É compreensão, fazendo-se inicialmente uma
claro que a língua vai acompanhar esse processo comunicação. Desta forma, o léxico é geral
dinâmico da cultura. Cuche (1999) conclui que e a ampliação lexical num idioma é um
“não existem, conseqüentemente, de um lado as fenômeno natural, embora haja países que
culturas puras e de outro, as culturas mestiças. controlam (através de Comissões e Comitês de
Todas, devido ao fato universal dos contatos julgamento linguístico) a entrada e a integração
culturais, são, em diferentes graus, culturas mistas, de neologismos na língua. A cultura seria, no
feitas de continuidades e de descontinuidades” entanto, o conjunto de práticas sociais, situadas
(CUCHE, 1999, p. 140, grifos do autor). Esta reflexão historicamente, que se referem a uma sociedade
com a cultura nos leva a pensar que com língua e que a fazem diferente de outra. Baseia-se na
acontece a mesma coisa. Não existe uma língua construção social de sentidos a ações, crenças,
pura. Uma língua é uma soma de várias línguas e hábitos, objetos que passam a simbolizar aspectos
sempre está sujeita a influência de outras. da vivência humana em coletividade. Construída
socialmente no cotidiano das relações humanas
Ligando a palavra “léxico” com “cultura” surge o demanda que seja definida no seio das relações
neologismos lexicultura que segundo Timbane sociais e históricas que a amparam e por ela são
(2014, p. 46) é “o conjunto de itens lexicais que caracterizadas.
caracterizam e especificam uma determinada co-
munidade linguística”. A lexicultura se divide em A “nossa língua”, a LP é composta por um conjunto
duas partes: a) A lexicultura geral, aquele conjun- de possibilidades em todos os níveis (fonético-
to de itens lexicais que são identificados por toda fonológico, semântico, lexical, morfológico,
comunidade linguística, neste caso, a comunida- sintático e pragmático) que se ligam e se cruzam
de lusófona; e b) A lexicultura específica, que se no momento da comunicação. Em nível lexical,
refere ao conjunto de itens lexicais que caracte- Timbane (2013) cita diferenças dos termos de
rizam uma variedade ou variante específica, ou futebol no português do Brasil e no português de
seja, pertence a um grupo restrito. Pertencem a Moçambique. Observa-se, por exemplo, que as
este grupo os angolanismos (NEGRÃO & VIOTTI, palavras escanteio, gandula, tira-meta, rodada,
2014), os brasileirismos (MASSINI-CAGLIARI, 2011), cavadinha no português do Brasil correspondem
os moçambicanismos (TIMBANE, 2013) até os dia- a canto, apanha-bolas, ponta-pé de baliza, mão,
letos mais conhecidos como o dialeto caipira, etc. chapéu no português de Moçambique. Para
Timbane (2013) a língua portuguesa falada/escrita
A língua é instável, dinâmica e criativa. A todo hoje é resultado de constantes modificações
o momento, a língua tenta se adaptar às novas ao longo de vários séculos fato que confirma a

36
tese de que as línguas mudam, mas continuam histórico dos africanos que tanto contribuíram
organizadas e oferecendo a seus falantes os para a formação da identidade brasileira.
recursos necessários para a circulação de
significados. O lugar as línguas na UNILAB ainda são respeita-
das pela Pró-Reitoria de Extensão, Arte e Cultura
A língua portuguesa pertence aos falantes (PROEX) que ainda lança editais de projetos que
das variedades e a eles serve para satisfazer aceita cursos de línguas. Geralmente se oferece
as necessidades comunicativas pontuais. Sem uma bolsa apenas para cada professor, o que em
a variedade seria impossível exprimir ideias muitos momentos não é suficiente. A demanda
e realidades próprias dos diversos lugares por cursos de extensão na área de línguas é gran-
geográficos. Segundo Antunes (2009, p.22) a de porque a graduação é o momento em que os
“língua sob a forma de uma entidade concreta, estudantes aproveitam adquirir uma grande gama
não existe. O que existe são falantes; são grupos de conhecimentos que ajudarão na definição do
de falantes”. São estes grupos de falantes que que vão fazer na pós-graduação.
precisam ser respeitados, ser respeitado a sua
história, os seus modos de interpretar o mundo, O lugar das línguas ainda precisa ser maior porque
suas crenças, enfim sua cultura. Toda língua viva só assim é que se vai reduzir o preconceito
tem seus mecanismos de ampliação do léxico, da linguístico com relação às línguas não oficiais. No
semântica, da fonética e da morfossintaxe. Brasil tem várias línguas indígenas que ainda não
têm espaço na Universidade. Isso não é positivo se
A cultura o conjunto complexo que inclui o entendermos a língua como um fenômeno social
conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o que se liga à cultura de um povo. Nos PALOP, as
direito, os costumes e as outras capacidades línguas locais ainda não são meios de ensino. O
ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto preconceito ainda prevalece. Falta uma política
membro da sociedade. Se a cultura é instável linguística que efetivamente valorize e coloque
e dinâmica, então, a língua segue os mesmos em prática o ensino e divulgação nessas línguas
passos mudando e variando ao longo do tempo autóctones. A UNILAB deve se transformar
e no espaço. Se fenômeno variação e mudança num ambiente motivador para que as línguas
não ocorresse no espaço lusófono estaríamos indígenas brasileiras e línguas africanas tenham
falando latim ou galego em vez de português. espaço para expandir. Falta a criação, produção
e publicação de dicionários e gramáticas que
efetivamente descrevem as línguas autóctones.

Considerações Finais

A língua é, sem dúvidas, um instrumento


de comunicação, mas também um meio de
transmissão da cultura e os valores tradicionais. Ao
proibir o ensino de uma língua está-se negando
a transmissão da cultura de um povo e viola a
declaração Universal de Direitos Linguísticos
(UNESCO, 1996). Ao desprezar o uso de uma língua
está-se ferindo com as identidades dos falantes.
O ensino de línguas africanas na UNILAB e em
especial nos Cursos de Extensão, é um momento
importante e rico para todos os estudantes.
É um momento de troca, de volta ás raízes,
de descoberta das identidades e do passado

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Referências

ABDULA, R. A. M.; TIMBANE, A. A.; QUEBI, D. O. As políticas linguísticas nos PALOP e o desenvolvimento
endógeno. Revista Internacional em Língua Portuguesa. IV Série, n. 31, 2017, p. 23-46.

ANTUNES, I. Língua, texto e ensino: outra escola possível. São Paulo: Parábola, 2009.

CUCHE, D. A noção de cultura nas ciências sociais. Trad. Viviane Ribeiro. Bauru: EDUSC, 1999.

DONEUX, J. L. Histoire de La linguistique africaine: des précurseus aux années 70. Paris: PUP, 2003.

HEINE, B.; NURSE, D. African languages: an introduction. Cambridge: CUP, 2000.

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MASSINI-CAGLIARI, G. Discutindo questões de identidade a partir da (não) adaptação fonológica de nomes


próprios de origem estrangeira no Brasil. Estudos Linguísticos. São Paulo, 40 (2): p. 795-807, mai.-ago. 2011.

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NGUNGA, A. Introdução à linguística africana. Maputo: Imprensa Universitária, 2015.

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TIMBANE, A. A. A variação e a mudança linguística da língua portuguesa em Moçambique. (Tese).


Doutorado em Linguística e Língua Portuguesa. Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual
Paulista. Araraquara, 2013.

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18, n. 2, p. 43-59, 2014.

UNESCO. Declaração Universal De Direitos Linguísticos. Barcelona de 6 a 9 de junho de 1996.

UNILAB. Diretrizes Gerais. Ceará: UNILAB, 2010. Disponível em: <http://pdi.unilab.edu.br/wp-content/


uploads/2013/08/Diretrizes_Gerais_UNILAB.pdf>.Acesso em: 02jun.2020.

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Denise Ferreira da Costa Cruz1

Colorismo Transatlântico: sobre cabelos


e marcas da pele para mulheres negras
africanas e afro-brasileiras

“hasta aquí, hasta llegar a mí traços da boca, nariz e formato dos quadris.
(…) você diz reconhecer É o corpo que nos remete à nossa marca no
o gosto de amar que trago na boca mundo. Somos um corpo negro.
os tons de terra que trago na pele
fácil perceber então que Nosso corpo é suporte para a inventividade
atravessamos percorremos e para a arte. Carregamos vários símbolos
os mesmos oceanos os mesmos continentes diacríticos de nosso pertencimento étnico
hasta aquí em nossos corpos. Nos cabelos, essa parte
maleável e emoldurável, imprimimos formas
: somos filhos da África de estar no mundo. Nossos cabelos falam se
e tudo que contamos através dos nossos corpos estamos em uma festa, se nos amamos, se
fala sobre nós, mas no profundo da memória temos dificuldade em lidar com sua textura,
guarda nossos ancestrais.” se optamos por buscar a liberdade. Ademais,
podemos ver nas tatuagens de mulheres
Esse excerto da poesia de Lubi Prates, poeta, negras a expressão de nossa identidade negra,
editora e tradutora negra brasileira de São Paulo, é ligação com a ancestralidade, resistência.
elucidativo daquilo que pretendo trazer nas páginas As intervenções genitais femininas são tema
que seguem: marcas do corpo que caracterizam de debates acalorados em todo o mundo e
o que chamo de colorismo transatlântico. Toda dividem opiniões sobre ser contra ou a favor
marca que nesse corpo encontramos pode ser de suas práticas. As escarificações encontradas
produtora de traumas, força e resistência. “Tudo em alguns povos africanos contam a história
que contamos através de nossos corpos fala sobre das mulheres. Elas foram e são muito tempo
nós”. No corpo guardamos história e imprimimos alvo de variados preconceitos.
no mundo nossa forma de expressão artística.
Corpo se faz importante porque é através deles Variadas formas de conceber o corpo. Estamos
que construímos nossa história diaspórica. Foram falando de corporalidades. No plural. Mesmo
corpos, em sua materialidade, que atravessaram entre você e sua irmã o corpo se configura de
o Oceano Atlântico. É com nossos corpos que forma diferente. Como bem falou Grada Kilomba,
compusemos parte do continente africano em em seu livro Memórias da Plantação, nós
terras estrangeiras. Quando pensamos no que vem sujeites negres nos “tornamos a representação
a ser negre, pensamos em pele, textura do cabelo, mental daquilo que o sujeito branco não quer

1. Professora Adjunta no Instituto de Humanidades da Universidade da integração da Lusofonia Afro-brasileira. Doutora em Antropologia Social pela
Universidade de Brasília. Mestra em Antropologia Social pela Universidade de Brasília. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal
de Minas Gerais.

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parecer”. Assim cabelo crespo é lido como sujo, corpo da África no Brasil. Quando pensarmos em
escarificações são lidas como feias, intervenções uma constituição de povo, devemos incluir nele
genitais femininas são lidas como proibitivas sem o continente africano – nossa Mãe África – e toda
pensar em soluções rituais que as substituam, a diáspora que está por todo espaço do mundo.
tatuagens são lidas como marcas de marginais.
Mas o que significa dizer que África comporta
Minhas palavras farão ecoar as de muitas espaços físicos para além do continente? Quais
mulheres negras que pensaram/pensam o nosso as implicações dessa afirmação? Quando fui pela
corpo negro. Teoricamente, na experiência de primeira vez em Maputo, capital de Moçambique,
vida, espiritualmente. Assim, irei delinear uma eu tinha construído um espelho que precisava ser
reflexão produzida a partir minha experiência ajustado. Um espelho distorcido: depois de anos
como mulher negra na diáspora e minhas negando minha negritude eu a assumi inspirada
investigações sobre as percepções étnicas no por uma estética africana. Ou seja, se quando eu
continente africano. Minha voz não está sozinha. era criança eu não via no espelho o que via na
Falo com e a partir de mulheres negras: nos televisão – corpos de mulheres brancas, muito
Estados Unidos, na América Latina, na Europa; e brancas, muitas delas loiras dos olhos azuis –,
também em Moçambique e a partir de mulheres quando fui me descobrindo negra eu me via em
de Guiné-Bissau. Essas vozes, múltiplas, formam fotografias de mulheres africanas e assim me
um palimpsesto de universos corpóreos que nos identificava com elas esteticamente. Criei para
diz de diferenças e aproximações. É preciso falar mim uma estética a seguir, um espelho onde eu
daquilo que nos separa e nos faz singular, porque finalmente eu poderia me enxergar.
é na diferença que compomos mundos. Mas é
preciso também falar do elo que nos aproxima. Qual não foi a minha surpresa quando minhas
E, malgrado, o colonialismo e seus efeitos sobre interlocutoras de pesquisa em Maputo não
nossos corpos é um deles. me identificaram como uma delas!? Quando
eu descobri que meus cabelos são os mais
Uma dessas mulheres que me ajudam a pensar desejados entre elas. E que ser mestiça em
é a Beatriz Nascimento. Mulher historiadora, uma capital multiétnica e com configurações
negra quilombola, Beatriz, escreveu ideias muito complexas tem seu mel e seu veneno? Precisei
potentes para nossa lida do cotidiano. Lida que olhar para mim novamente, pensar meu corpo
pode ser entendida como o trabalho árduo que e minha identidade e entender que corpo
o corpo escravizado teve que vivenciar. Foi lendo negro é esse o meu nesse mundo que agora
Nilma Lino Gomes, pedagoga, ex-ministra da se tornava ainda mais vasto. O tom de terra que
Secretaria de políticas de promoção da igualdade trago na minha pele me faz uma mulher negra
racial no governo Lula, que percebi que essa no contexto em que nasci. Esse mesmo tom de
lida remete à luta, remete ao esforço, remete terra em solo moçambicano me faz ser lida como
à superação, à resistência. Assim, a diáspora mestiça ou mesmo mulungo (branca). Quando
africana, esse espaço corpóreo formado por penso em meus cabelos penso no sofrimento
homens, mulheres, pessoas negres, enfim, é parte que senti quando era uma criança desprotegida
constitutiva do continente África. Esse continente e que odiava a sua textura capilar. Mas quando
imenso, cheio de histórias. Algumas dessas realizo o projeto de extensão “Tramas e tranças:
histórias interrompidas, outras apropriadas, foi e cabelos e tecidos na construção da identidade
é espaço presente no imaginário negre brasileiro africana e afro-brasileira” vejo que a indústria dos
e latino americano que se transforma e se recria cabelos cacheados elegeu um cabelo que é mais
no fazer, ser e sentir. A diáspora forma aquilo que bonito do que outro. Que existe uma hierarquia
Lélia Gonzales chamou de Améfrica: processo de das texturas. Vivemos o que nomeio colorismo
africanização do continente americano. Assim, é transatlântico.
importante considerar que somos um espaço-

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Há um objeto cuja presença eu ouvia falar muito Muita tinta foi gasta para falar dos efeitos danosos
quando eu era criança: o pente de ferro. Eu início das teorias da democracia racial. Sabemos que
com ele porque sua presença diz sobre uma me- ela não passa de uma farsa que escamoteia as
mória vivas que marcam nossa psique. Presente relações de poder que encontramos no seio da
nas periferias negras do Brasil, no interior dos pa- sociedade brasileira. Ao contrário desse paraíso
íses africanos e na memória das mulheres negras idílico onde pessoas negras e brancas convivem
mundo afora, o pente quente, ou pente de ferro pacificamente gosto de pensar no Apartheid de
é um objeto-sacrifício: com ele deixamos quei- afetos que surgem quando há encontros entre
maduras de nossa pele e com ele lutamos para corpos-mundos: língua, corpo, cor da pele,
termos um cabelo liso. Se puxarmos em nossa textura do cabelo. Se temos em nossas famílias
memória lembraremos que ele fritava o cabelo e pessoas brancas, negras e indígenas sabemos
emitia um cheiro muito ruim, que lembra cheiro que nosso fenótipo vai criar uma relação de
de carne queimada. Quando o utilizávamos, ele rejeição, interdição ou de aceitação. Falando de
soltava uma fumaça e muitas vezes sua memória forma direta, minha mãe ouvia, quando criança
nos remete ao sofrimento. Mas rememorar o uso que era preciso embranquecer a família uma vez
do pente de ferro não é somente nos conectar que ela era a mais preta dentre nós.
à tristeza. Era também um momento de nos en-
contrar entre as pernas das nossas tias ou irmãs e Hoje, muitos movimentos negros têm se alastrado
trocas afetividades na família. pelo país provocando uma verdadeira revolução
interna em corpos e mentes de pessoas negras.
Esse instrumento, nos diz Silva (2008), pode ser Crianças estão aprendendo a amar seus cabelos
lido como objeto de tortura. Isso porque ele desde muito pequenas. Podemos pensar, por
significa a anulação de uma identidade – negra exemplo, na MC Sofia que canta rap sobre sua
- e a imposição de outra - branca. Ele deixa realidade de menina negra. Essa mudança, nada
marcas na pele com queimaduras. Essas marcas silenciosa, pode ser indício de que se construa
nos remetem às marcas que os senhores de não um apartheid de afetos, mas um amálgama
escravo deixavam nas peles dos seus objetos- de sentidos. O corpo negro é positivado, as
gente. Carne marcada como gado, desumanizava pessoas valorizam esse corpo e querem amá-lo.
e desumaniza nossos corpos. O pente de ferro Claro que essa realidade é ainda uma Utopia. Mas
pode ser entendido como extensão dessa o que seria de nós se não fabulássemos sobre os
memória dolorida, pois divide o mundo entre mundos que queremos?
“nós” e “eles”. E apaga nossas diferenças dentro do
nosso próprio universo que é rico e diversificado. Quando fui para Maputo, a capital de
Observe sua família, quantas texturas são Moçambique, eu pude presenciar o cotidiano
possíveis de encontrar na estrutura capilar? de mulheres, sobretudo de classe média e seus
Quantas possibilidades e diferenças temos entre rituais de cuidados com os cabelos. Geralmente
nós mulheres negras? Na textura da pele, nos localizados na parte de fora da casa, no quintal,
traços corporais, na textura do cabelo. O “nós” o momento de cuidar do cabelo era partilhado
que esse tipo de objeto cria remete ao normal, ao com as mulheres da família ouvindo música,
belo e ao desejado. Enquanto “eles” que somos vendo vídeo clipes e conversando. Muitas vezes
nós mulheres negras, somos relegadas ao sujo, bebendo a bebida preferida. Dentre as conversas
ao impuro, ao feio e indesejado. As origens da estavam presentes debates sobre o cuidado com
representação negativa do cabelo crespo nos a família, as relações com os maridos, o cuidado
remetem ao século XVIII. Cientistas evolucionistas com os filhos. Esse momento é vivenciado a
dessa época hierarquizavam as “raças” humanas e partir de variadas trocas: trocas de afetos, do
as categorizava a partir da pigmentação da pele, toque e da suspensão do tempo. O toque é algo
da textura do cabelo e da estrutura do crânio e compartilhado entre mulheres. Uma se acomoda
do corpo. entre as pernas da outra e sente o afago em suas

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cabeças. O tempo dedicado à beleza, suspende
o tempo do trabalho e da dedicação ao trabalho.

Minha inserção entre alunas guineenses e


brasileiras a partir do projeto de extensão
supracitado me permitiu pensar em
representações distintas de formas de perceber
a beleza. A partir disso que chamo de colorismo
transatlântico, a saber, o encontro de cor da terra
que tinge nossos corpos a partir de contatos
intercontinental. Esse encontro produz dilemas
identitários, desencontros e aproximações entre
mulheres que possuem diferentes perspectivas
de negritudes. Como disse Fernando Sanha em
conversas onde pensamos alto em nosso café da
manhã, aqui no Brasil para tudo existe um nome. A
discriminação de raça recebe o nome de racismo,
a discriminação de gênero pode receber o nome
de sexismo. Para todo tempo uma explicação e
teorizamos sobre todas as formas de relações
existentes. Segundo ele, no continente as pessoas
vivem. Simplesmente vivem. E não procuram
explicações para aquilo que praticam.

Minhas alunas do projeto de extensão disseram


se verem como negras apenas a partir da sua
chegada no Brasil. Os signos diacríticos de
diferença em Guiné-Bissau são étnicos, sendo
esses atravessados por signos daquilo que
chamamos de raça. Para pensarmos as formas
de racialidades encontradas no continente
temos que levar em conta não as noções de
raça aqui forjadas, mas as noções étnicas. A
fim de conclusão do texto afirmo que se as
minhas amigas africanas precisam apreender o
significado de ser negra no Brasil nós, mulheres
negras brasileiras, precisamos apreender a
complexidade da composição africana. “Sou
preta, preta penso e sinto assim”.

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Referências

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SILVA, Cláudia Rose Ribeiro. Cabelos e memória no museu da maré: reflexões sobre usos e significados do
pente quente. Anais do Museu Histórico Nacional Vol 1. (1940). Rio de Janeiro. Volume 40, 2008.

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