Artigo - Paleontologia em Livro Didático
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¹Programa de Pós-Graduação em Geologia, Departamento de Geologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Av. Athos
da Silveira Ramos, 274, Cidade Universitária, Ilha do Fundão, 21.949-900, Rio de Janeiro, RJ.
²Departamento de Ciências Biológicas, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN, Av. Professor Antônio Campos,
S/N, Costa & Silva, 59.610-090, Mossoró, RN.
E-mail: [email protected]; [email protected]
Recebido em: 20/04/2010 Aprovado em: 29/07/2010
Resumo
Abstract
The textbook is currently one of the main instruments in the process of education and learning. Analyses of the
Biology content in these books are essential in order to show problems contained in these publications and allow a more
informed choice of books for the teaching of specific contents. In this work, an analysis of the Paleontology content in Biology
textbooks was carried out, aiming to evaluate the reability of the presentation of paleontological topics in secondary school
books and to provide crucial information for the choice of better texts for use in biology classes regarding the subject of
Paleontology. Five Biology textbooks currently adopted in Brazilian secondary schools were chosen for the analysis. Among
the textbooks analyzed, four presented a satisfactory approach to paleontological themes, including detailed descriptions of
the main topics and reasonable presentations of key concepts. However, pervasive conceptual errors were found. Moreover,
we found that new concepts and approaches currently adopted by the scientific community have been scarcely incorporated
in these publications. Therefore, we highlight the need to update the books analyzed based on more recent paleontological
textbooks, as well as a better articulation between paleontological and correlated biological concepts. In addition, we
suggest an improvement in the explanations of complex issues, such as “fossil dating” and “fossilization processes”.
Keywords: Biology, textbooks, Secondary School, Paleontology.
1 Introdução
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ISSN 0101-9759 e-ISSN 1982-3908 - Vol. 33 - 1 / 2010 p. 63-72 63
Análise da Abordagem do Tema Paleontologia nos Livros Didáticos de Biologia
Hermínio Ismael de Araújo Júnior & Kleberson de Oliveira Porpino
Gráfico 1 ����������������������������������������������
Somatório dos valores atribuídos à presença e
qualidade dos temas básicos de Paleontologia avaliados nos
livros didáticos.
parte dos alunos (e.g., esquemas, mapas conceituais, porém ossos, dentes e animais conservados no gelo,
fotos, tabelas) constituem ótimas ferramentas para de acordo com as classificações usuais dos tipos de
o aprendizado de conceitos científicos. Elementos fósseis (e.g., Cassab, 2004), são classificados como
desse tipo, como por exemplo, imagens e esquemas “restos”. A coleção 4, no texto do capítulo, define
explicativos, ilustram as informações fornecidas os fósseis e a Paleontologia de modo sumário, por
pelos livros 1, 3 e 5, possibilitando uma melhor outro lado, define os fósseis de maneira clara no
compreensão dos temas paleontológicos analisados. texto complementar.
No entanto, tais elementos estão ausentes no livro
2, o que torna ainda mais limitante o entendimento Um fóssil é uma evidência de vida no passado
dos conteúdos de Paleontologia a partir dessa obra geológico e pode ser representado não apenas
devido aos problemas já apontados. Poucas imagens por ossos, dentes ou conchas mortas há muito
estão presentes na coleção 4, enquanto esquemas tempo, mas também por marcas de pés, como
explicativos estão ausentes. pegadas de dinossauros, ou trilhos de vermes
deixados no fundo lodoso de mares antigos;
pode ser impressões ocasionais de animais
3.2 Conceito de Fósseis de corpo mole, como medusas, no lodo que
mais tarde endurece em rochas. [...] (Paulino,
Os fósseis consistem no registro em rochas 2005 c, p. 156).
da existência de organismos vivos no passado
da Terra (Cassab, 2004; Ridley, 2006). Essas
evidências podem se apresentar sob a forma de A coleção 5 destina um subtópico do capítulo
fósseis corporais (restos) ou apenas vestígios da à conceituação de fósseis. Ao contrário da coleção
atividade dos seres vivos (icnofósseis) (Cassab, 3, as coleções 4 e 5 descrevem corretamente os
2004). A compreensão do conceito de fósseis é um diferentes tipos de fósseis, distinguindo claramente
pré-requisito fundamental para a discussão de temas vestígios de restos. Imagens dos tipos de fósseis
paleontológicos mais específicos incluídos em e de exemplares de organismos fossilizados são
fornecidas pela coleção 5.
tópicos mais abrangentes (e.g., evolução orgânica,
sistemática biológica e origem da vida). Nos livros
1 e 3, o conceito de fósseis é apresentado mais de
3.3 Processos de Fossilização
uma vez, no entanto, no livro 1 ele é apresentado
de forma bastante superficial, negligenciando as Os processos de fossilização são os
diferenças entre os tipos de fósseis existentes (restos responsáveis pela passagem dos restos orgânicos
e vestígios). Porém, imagens são fornecidas nessa da biosfera para a litosfera (Efremov, 1940;
obra mostrando icnofósseis e fósseis corporais. O Behrensmeyer et al., 2000). O tipo de processo de
livro 2 não conceitua fósseis, o que compromete o fossilização ocorrente em cada caso depende de uma
entendimento destes como uma ferramenta que auxilia conjunção de fatores físicos, químicos e biológicos
na compreensão do processo evolutivo. A coleção 3, que atuaram após a morte dos organismos até o
no capítulo referente à Evolução Biológica, define: momento de descoberta dos fósseis (Cassab, 2004;
Medeiros, 2004). Nos livros 1 e 2, os processos de
Fósseis (do latim fossilis, tirado da terra) são fossilização não são mencionados, inviabilizando a
vestígios deixados por seres que viveram no compreensão do contexto envolvido na formação
passado. Esses vestígios podem ser ossos, dentes, dos fósseis, o que prejudica o entendimento do que
pegadas impressas em rochas, fezes petrificadas, esses restos e vestígios representam. No entanto, a
animais conservados no gelo, por exemplo. [...] incompletude do registro fossilífero é reconhecida,
(Amabis & Martho, 2004 b, p. 191). permitindo entrever as restrições da utilização dos
fósseis como ferramentas para o conhecimento de
algumas informações do passado (e.g., interpretações
O termo “vestígios” se refere apenas a paleoecológicas e evolutivas). As coleções 3 e 5 são
evidências da atividade de um organismo, sem a as únicas a apresentarem um texto explicativo sobre
preservação de qualquer parte corporal (Cassab, os processos de fossilização, onde são relatados os
2004). Pegadas impressas em rochas e fezes diferentes tipos de fósseis e como estes se formam.
petrificadas são classificadas como “vestígios”, Por outro lado, os autores da coleção 3 cometem um
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tempo geológico.
Os fósseis e rochas podem ser datados de duas O livro 1 apresenta o tempo geológico através
formas: através da correlação estratigráfica (datação de uma tabela contendo informações a respeito das
relativa) ou de datações absolutas (Ridley, 2006; Press principais modificações físicas ocorridas na Terra
et al., 2006). O tema “Datação de fósseis” é abordado e alguns eventos na história da vida dentro dos
no livro 1 através de um texto complementar ao final períodos de cada era geológicas. Adicionalmente,
do capítulo. Nessa abordagem são definidas as duas são fornecidas informações complementares sobre
formas de datações fossilíferas. No livro 2, não se faz extinções em massa e transformações geográficas e
relato dos processos de datação de fósseis. A coleção biogeográficas ao longo do tempo e uma analogia
3 fornece a melhor abordagem para a datação de (calendário do tempo geológico onde cada dia
fósseis, apresentando um texto complementar dentro representa 150 milhões de anos) é utilizada com o
do capítulo, esquematizando detalhadamente como objetivo de facilitar a compreensão da magnitude do
os fósseis podem ser datados através da radiometria tempo geológico. O livro 2 não faz nenhuma menção
(datação absoluta) e por correlação estratigráfica ao tempo geológico, desassociando a Paleontologia
(datação relativa). A coleção 4 não menciona os da Geologia, o que consequentemente interfere na
processos de datação de fósseis no texto incluso compreensão da organização do registro fossilífero
nas explicações do capítulo, por outro lado, os e na percepção da magnitude de tempo envolvido
descreve no texto complementar, diferenciando na evolução dos seres vivos. Na coleção 3, o tempo
as duas técnicas de datação. A coleção 5 fornece geológico é abordado de forma bastante detalhada,
informações sobre diferentes formas de datação de possibilitando o entendimento dos principais eventos
fósseis, incluindo explicações sobre datação relativa biológicos, geográficos e geológicos ao longo das eras
e duas formas de datação absoluta (datação por C14 e
geológicas. Subtópicos do capítulo são destinados
por determinação da idade de rochas vulcânicas).
à explicação da vida nas eras “Pré-Cambriana”,
Paleozoica, Mesozoica e Cenozoica. Uma tabela é
Explicações de conceitos fundamentais para a
apresentada, a qual contém as divisões do tempo
datação dos fósseis (e.g., conceituação de isótopos,
geológico e seus principais eventos biológicos.
decaimento radioativo, fósseis-guias e biozona)
estão contidas nos livros 1, 3 e 5, facilitando ainda
mais a compreensão desse tema nessas publicações. Dentre as obras analisadas, a coleção 3 é
a única a apresentar uma explicação para a origem
dos nomes de alguns períodos geológicos. Assim
3.6 Tempo Geológico como no livro 1, essa coleção também apresenta
uma analogia que auxilia a explicação da magnitude
A escala do tempo geológico (escala do tempo geológico, onde tal espaço de tempo é
geocronológica) corresponde ao tempo comprimido em um período de 24 horas. A coleção
compreendido entre a formação do planeta Terra 4 não fornece tabela do tempo geológico, porém é
e os dias atuais. Esse tempo é estimado em 4,6 utilizada a analogia clássica do “calendário cósmico”,
bilhões de anos e é dividido sucessivamente em onde os acontecimentos ocorridos desde a origem da
éons, eras, períodos, épocas e idades (Rohn, 2000). Terra aos dias de hoje são condensados no intervalo
Cada unidade geológica foi estabelecida com base de um ano. A coleção 5 é a que dá maior prioridade
em dados paleontológicos e geológicos. ao entendimento do tempo geológico, incluindo uma
tabela em cada volume da coleção, contabilizando 3
Gee (1999) considera o tempo geológico tabelas. Uma delas é a única dentre todas as tabelas
algo complexo para a compreensão humana, pois das obras analisadas a apresentar a real proporção de
sua magnitude não é comensurável com a nossa tempo envolvido na duração de cada era geológica,
experiência cotidiana. Por esse motivo, é fundamental possibilitando a compreensão, sem a utilização de
a utilização de elementos didáticos que transportem analogias, não só da magnitude do tempo geológico,
a magnitude do tempo geológico para um contexto mas também da duração relativa de cada intervalo
capaz de ser experimentado pelo homem. Para geocronológico. Nas demais tabelas da coleção 5,
Figueroa et al. (2003) e Hoffmann & Scheid (2007) são descritos os principais acontecimentos da vida
instrumentos didáticos como as analogias facilitam animal e vegetal ao longo do tempo.
a compreensão de conteúdos complexos, como o 4 Conclusões
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