Sobre o Ensino Da Psicanálise Nas Universidades
Sobre o Ensino Da Psicanálise Nas Universidades
Sobre o Ensino Da Psicanálise Nas Universidades
(a)EDIÇÕES ALEMÃS:
(1918Provável data de elaboração.)
(b)TRADUÇÃO INGLESA:
‘On the Teaching of Psycho-Analysis in Universities’
Este artigo foi publicado pela primeira vez em tradução para o húngaro
(provavelmente feita por Ferenczi) no periódico médico de Budapest Gyógyászat, a
30 de março de 1919. O título húngaro significa literalmente: ‘Deve a psicanálise ser
ensinada na universidade?’. Parece ter sido um artigo de uma série, escrita por
diferentes pessoas, tratando das reformas na educação médica. É provável que
Freud o tenha escrito no outono de 1918, aproximadamente na época do Quinto
Congresso Psicanalítico Internacional, em Budapest. Houve então uma
considerável agitação entre os estudantes de medicina de Budapest quando à
inclusão da psicanálise no currículo. Em março de 1919, quando um governo
bolchevique assumiu temporariamente o poder na Hungria, Ferenczi foi de fato
empossado como Professor de Psicanálise na universidade. – A redescoberta do
artigo deveu-se ao esforço do Dr. Ludovico Rosenthal, de Buenos Aires, e a ele
devemos a gentileza de haver colocado uma cópia fotostática da publicação original
à nossa disposição. A presente tradução do húngaro para o inglês é baseada numa
tradução feita por J. F. O’Donovan e Ludovico Rosenthal. Foi revista com a ajuda
do Dr. Michael Balint. Os leitores compreenderão que se trata, na melhor hipótese,
de uma versão em terceira mão das verdadeiras palavras de Freud.
(1)A inclusão da psicanálise no currículo universitário seria sem dúvida olhada com
satisfação por todo psicanalista. Ao mesmo tempo, é claro que o psicanalista pode
prescindir completamente da universidade sem qualquer prejuízo para si mesmo.
Porque o que ele necessita, em matéria de teoria, pode ser obtido na literatura
especializada e, avançando ainda mais, nos encontros científicos das sociedades
psicanalíticas, bem como no contato pessoal com os membros mais
experimentados dessas sociedades. No que diz respeito à experiência prática, além
do que adquire com a sua própria análise pessoal, pode consegui-la ao levar a cabo
os tratamentos, uma vez que consiga supervisão e orientação de psicanalistas
reconhecidos.
(a)Essa formação tem sido muito justamente criticada nas últimas décadas pela
maneira parcial pela qual dirige o estudante para os campos da anatomia, da física
e da química, enquanto falha, por outro lado, no esclarecimento do significado dos
fatores mentais nas diferentes funções vitais, bem como nas doenças e no seu
tratamento. Essa deficiência na educação médica faz-se sentir mais tarde numa
flagrante falha no conhecimento do médico. Essa falha não se manifestará apenas
na sua falta de interesse pelos problemas mais absorventes da vida humana, na
saúde ou na doença, mas também o tornará inábil no tratamento dos pacientes, de
modo que até mesmo charlatões e ‘curandeiros’ terão mais efeito sobre esses
pacientes do que ele.
Essa deficiência óbvia levou, algum tempo atrás, à inclusão, no currículo
universitário, de cursos sobre psicologia médica. Mas, na medida em que essas
aulas se baseiam na psicologia acadêmica ou na psicologia experimental (que lida
apenas com questões de detalhes), não conseguem satisfazer os requisitos da
formação do estudante; nem poderiam aproximá-lo mais dos problemas da vida em
geral ou dos da sua profissão. Por essas razões, o lugar ocupado por esse tipo de
psicologia médica no currículo mostrou-se inseguro.
(b) Outra das funções da psicanálise seria proporcionar uma preparação para o
estudo da psiquiatria. Esta, na sua forma atual, é exclusivamente de caráter
descritivo; simplesmente ensina o estudante a reconhecer uma série de entidades
patológicas, capacitando-o a distinguir quais são incuráveis e quais são perigosas
para a comunidade. Sua única ligação com os outros ramos da ciência médica está
na etiologia orgânica – isto é, nas suas descobertas anatômicas; mas não oferece a
menor compreensão dos fatos observados. Tal compreensão só poderia ser
fornecida por uma psicologia profunda. Nos Estados Unidos, de acordo com as
minhas melhores informações, já se reconheceu que a psicanálise (a primeira
tentativa de uma psicologia profunda) tem feito incursões bem-sucedidas por essa
região inexplorada da psiquiatria. Por conseguinte, muitas escolas médicas daquele
país já organizaram cursos de psicanálise como uma introdução à psiquiatria. O
ensino da psicanálise teria que processar-se em duas etapas: um curso elementar,
destinado a todos os estudantes de medicina, e um curso de aulas especializadas
para psiquiatras.(c) Na investigação dos processos mentais e das funções do
intelecto, a psicanálise segue o seu próprio método específico. A aplicação desse
método não está de modo algum confinada ao campo dos distúrbios psicológicos,
mas estende-se também à solução de problemas da arte, da filosofia e da religião.
Nessa direção já produziu diversos novos pontos de vista e deu valiosos
esclarecimentos a temas como a história da literatura, a mitologia, a história das
civilizações e a filosofia da religião. Assim, o curso psicanalítico geral seria também
aberto aos estudantes desses ramos do conhecimento. Os efeitos fecundadores do
pensamento psicanalítico sobre essas outras disciplinas certamente contribuiriam
muito para moldar uma ligação mais estreita, no sentido de uma universitas
literarum, entre a ciência médica e os ramos do saber que se encontram dentro da
esfera da filosofia e das artes.Para resumir, pode-se afirmar que a universidade só
teria a ganhar com a inclusão, em seu currículo, do ensino da psicanálise. Esse
menino, na verdade, só pode ser ministrado de maneira dogmática e crítica, por
meio de aulas teóricas; isso porque essas aulas permitirão, apenas, uma
oportunidade muito restrita de levar a cabo experiências ou demonstrações
práticas. Para finalidades de pesquisa, seria suficiente que os professores de
psicanálise tivessem acesso a um departamento hospitalar de clientes externos, que
suprisse o material necessário, no que diz respeito a pacientes ‘neuróticos’. Para a
psiquiatria psicanalítica, seria preciso haver também disponibilidade de um
departamento de pacientes mentais internos.Devemos considerar, por último, a
objeção de que, seguindo essa orientação, o estudante de medicina jamais
aprenderia a psicanálise propriamente dita. Isso, de fato, é procedente, se temos
em mente a verdadeira prática da psicanálise. Mas, para os objetivos que temos em
vista, será suficiente que ele aprenda algo sobrepsicanálise e que aprenda algo a
partir da psicanálise. Afinal de contas, a formação universitária não equipa o
estudante de medicina para ser um hábil cirurgião; e ninguém que escolha a
cirurgia como profissão pode evitar uma formação adicional, sob a forma de vários
anos de trabalho no departamento cirúrgico de um hospital.