Carro de Paulista (2011)

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12083491 capa Carro de Paulista.

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Carro de Paulista – Dos Palcos ao
Cinema na TV

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Carro de Paulista – Dos Palcos ao
Cinema na TV

Texto teatral de Mário Viana e Alessandro Marson


Roteiro para o cinema de Dagomir Marquezi

São Paulo, 2010

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Governador Alberto Goldman

Imprensa Oficial do Estado de São Paulo


Diretor-presidente Hubert Alquéres

Coleção Aplauso
Coordenador Geral Rubens Ewald Filho

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No Passado Está a História do Futuro

A Imprensa Oficial muito tem contribuído com


a sociedade no papel que lhe cabe: a democra-
tização de conhecimento por meio da leitura.
A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um
exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas
nela abordados, como biografias de atores, di-
retores e dramaturgos, são garantia de que um
fragmento da memória cultural do país será pre-
servado. Por meio de conversas informais com
jornalistas, a história dos artistas é transcrita em
primeira pessoa, o que confere grande fluidez
ao texto, conquistando mais e mais leitores.
Assim, muitas dessas figuras que tiveram impor-
tância fundamental para as artes cênicas brasilei-
ras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo
o nome daqueles que já partiram são frequente-
mente evocados pela voz de seus companheiros
de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas
histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são
redescobertos e imortalizados.
E não só o público tem reconhecido a impor-
tância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a
Coleção foi laureada com o mais importante
prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti.
Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL),
a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na
categoria biografia.

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Mas o que começou modestamente tomou vulto
e novos temas passaram a integrar a Coleção
ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui
inúmeros outros temas correlatos como a his-
tória das pioneiras TVs brasileiras, companhias
de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e
uma parte dedicada à música, com biografias de
compositores, cantores, maestros, etc.

Para o final deste ano de 2010, está previsto o


lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos
220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi
disponibilizada em acervo digital que pode
ser acessado pela internet gratuitamente. Sem
dúvida, essa ação constitui grande passo para
difusão da nossa cultura entre estudantes, pes-
quisadores e leitores simplesmente interessados
nas histórias.

Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer


parte ela própria de uma história na qual perso-
nagens ficcionais se misturam à daqueles que os
criaram, e que por sua vez compõe algumas pá-
ginas de outra muito maior: a história do Brasil.

Boa leitura.
Alberto Goldman
Governador do Estado de São Paulo

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Coleção Aplauso
O que lembro, tenho.
Guimarães Rosa

A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa


Ofi cial, visa resgatar a memória da cultura
nacional, biografando atores, atrizes e diretores
que compõem a cena brasileira nas áreas de
cinema, teatro e televisão. Foram selecionados
escritores com largo currículo em jornalismo
cultural para esse trabalho em que a história cênica
e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída
de maneira singular. Em entrevistas e encontros
sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e
biografados. Arquivos de documentos e imagens
são pesquisados, e o universo que se recons-
titui a partir do cotidiano e do fazer dessas
personalidades permite reconstruir sua trajetória.

A decisão sobre o depoimento de cada um na pri-


meira pessoa mantém o aspecto de tradição oral
dos relatos, tornando o texto coloquial, como
seo biografado falasse diretamente ao leitor.

Um aspecto importante da Coleção é que os resul-


tados obtidos ultrapassam simples registros bio-
gráficos, revelando ao leitor facetas que também
caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e bio-
grafado se colocaram em reflexões que se esten-
deram sobre a formação intelectual e ideológica
do artista, contextualizada na história brasileira.

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São inúmeros os artistas a apontar o importante
papel que tiveram os livros e a leitura em sua
vida, deixando transparecer a firmeza do pen-
samento crítico ou denunciando preconceitos
seculares que atrasaram e continuam atrasando
nosso país. Muitos mostraram a importância para
a sua formação terem atuado tanto no teatro
quanto no cinema e na televisão, adquirindo,
linguagens diferenciadas – analisando-as com
suas particularidades.

Muitos títulos exploram o universo íntimo e


psicológico do artista, revelando as circunstâncias
que o conduziram à arte, como se abrigasse
em si mesmo desde sempre, a complexidade
dos personagens.

São livros que, além de atrair o grande público,


interessarão igualmente aos estudiosos das artes
cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido
o processo de criação que concerne ao teatro,
ao cinema e à televisão. Foram abordadas a
construção dos personagens, a análise, a história,
a importância e a atualidade de alguns deles.
Também foram examinados o relacionamento dos
artistas com seus pares e diretores, os processos e
as possibilidades de correção de erros no exercício
do teatro e do cinema, a diferença entre esses
veículos e a expressão de suas linguagens.

Se algum fator específico conduziu ao sucesso


da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –,

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é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o
percurso cultural de seu país.

À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um


bom time de jornalistas, organizar com eficácia
a pesquisa documental e iconográfica e contar
com a disposição e o empenho dos artistas,
diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a
Coleção em curso, configurada e com identida-
de consolidada, constatamos que os sortilégios
que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filma-
gem, textos, imagens e palavras conjugados, e
todos esses seres especiais – que neste universo
transitam, transmutam e vivem – também nos
tomaram e sensibilizaram.

É esse material cultural e de reflexão que pode


ser agora compartilhado com os leitores de
todo o Brasil.

Hubert Alquéres
Diretor-presidente
Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

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Um Prefácio a Pelé, na Terceira Pessoa

No início dos tempos, havia o pedido de dois


atores para que o Mário Viana escrevesse uma
comédia para eles. Nasciam Pedrão, Jorginho
e uma primeira versão de Carro de Paulista –
batizada assim por causa de uma piada da hoje
roteirista Gabriela Amaral, carioca da gema.
Quando leu o texto, o ator-autor-diretor Hugo
Possolo sugeriu que os dois rapazes ganhassem
a companhia de outros personagens.

O argumento dele era imbatível: Essa galera não


anda de carro em dois. Precisa encher a barca
pra rachar o gás. Isso e mais a experiência de 11
passar pela Rua Augusta e ver carros lotados de
moleques endiabrados, mexendo até com poste,
serviram de inspiração...

É nessa parte que entra o Alessandro Marson,


de quem o Mário já conhecia alguns textos e,
principalmente, o humor certeiro. Durante um
almoço no centro de São Paulo, nasceram Jú-
nior e Raio de Sol. Daí em diante, as histórias se
misturam e hoje nem os detetives do CSI conse-
guiriam separar o DNA de Mário ou Alessandro
ao analisar cada cena.

Um dia, o ator-diretor Jairo Mattos leu a peça e


quis dirigi-la. Mário, que já estava em contato

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com um grupo de atores jovens, apresentou um
aos outros. Eles somaram seus trocados – 800
reais – e a peça estreou no Centro Cultural São
Paulo em abril de 2003.

De lá pra cá, o Carro já estacionou em diversos


palcos: Sérgio Cardoso, Faap, Cultura Inglesa –
onde começou a virar fenômeno –, Jardim São
Paulo, Santa Cruz, Folha, Maria della Costa, to-
dos os CEUs, Cacilda Becker, Artur Azevedo e o
Ruth Escobar, várias vezes. Sempre provocando
risada, escandalizando alguns e reativando a
memória de outros.

A peça cresceu muito durante a temporada – não


12
apenas com a risada do público e os improvisos
dos atores. Os autores também não se seguraram.
A cena da hostess na porta da balada foi assim.
Surgiu para esticar a história e aumentar a par-
ticipação feminina. As três mulheres do carro,
sempre feitas pela mesma atriz, nem nome rece-
beram. São a Mina do Ônibus, a Porteira – isto é, a
Hostess – e a Puta. E antes que acusem os autores
de machistas (já acusaram), é bom lembrar que
quatro moleques da zona leste, em plena explo-
são hormonal, não se amarram nesses detalhes
de nomes. Eles só têm olhos pra uma coisa.

Prá dar tão certo, o Carro contou com o olhar


atento do vigia do estacionamento, o Mario Ser-

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gio Loschiavo. E teve sempre ótimos passageiros.
Por ordem alfabética, já pegaram carona: Aline
Abovsky, Carlos Baldim, Daniel Dottori, Daniel
Tavares, Davi Campos, Edgard Jordão, Elaine
Dottori, Fabio Neppo, Giulianno Fortes, Junia
Busch, Murilo Salles, Paulo Vinicius, Pedro Gui-
lherme, Rodolfo Valente, Tadeu Pinheiro, Tales
Vinicius, Thiago Catelani, Vinicius Calamari e
Vinicius de Oliveira. Por enquanto.

Mário Viana e Alessandro Marson

13

P.S. O carro de madeira, todo vazado, feito pelo Jorge


Jacques continua o mesmo. Sambado, mas firme.

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Um Carro no Desvio

Quem conhece os percalços da atividade artística


sabe: fila diante de teatro é algo a ser celebra-
do. Deparei-me com uma delas em 2004 ao sair
de uma sessão teatral das 21 horas. Iniciava no
saguão, saía porta afora, serpenteava. Entre
perplexa e curiosa voltei à bilheteria para saber
qual espetáculo atraía tanto público em plena
sexta-feira e em horário não convencional. Era
Carro de Paulista!

Guardo nítida na memória minha sensação de


intrigada surpresa. A montagem dessa peça de
Mário Viana e Alessandro Marson, eu sabia, 15

estreara no ano anterior e já passara por três


outros teatros! Não recebera críticas na grande
imprensa, cotações ou recomendações, nem
apoio institucional significativo, menos ainda
patrocínio para anúncios publicitários e tam-
bém não contava com elenco de famosos. Qual
o ponto de atração? Penso que algumas pistas
para tal magnetismo podem ser detectadas no
texto que o leitor tem agora em mãos.

Somos convidados para uma viagem que pro-


mete ser curta, simples e divertida: a aventura
de quatro garotos saídos da adolescência que,
num carro emprestado, rumam do bairro pobre

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à região nobre da cidade em busca de uma boa
noitada. Sem ceder à pretensão de denunciar o
que todos já sabem os autores tiram efeito cômi-
co de uma espécie de apartheid comum a tantas
metrópoles com seus territórios demarcados
por fronteiras socioeconômicas. Com evidente
talento para o humor negro criam situações hi-
lárias explorando o atrito entre códigos culturais
diferentes. Construir boa dramaturgia sobre essa
base nesses tempos em que deslocamentos são
tão velozes quanto à construção de muros para
evitá-los por si só já justificaria os aplausos e a
presente publicação.

16 O perfil dos quatro garotos – o viril, o tosco, o


tímido e o sensível – é desenhado com poucos
traços numa precisão que remete à eficiência cô-
mica dos tipos da commedia dell’arte e à síntese
poética dos HQs. A partir daí a fricção se traduz
em diálogos ágeis e boas tiradas. Vale frisar que
a peça escapa do maior risco nela embutido, o
de reforçar preconceitos, por exemplo, ao evitar
a batida associação entre periferia e violência
inserindo os personagens naquela parcela da
população que trabalha duro desde cedo. Os
autores ainda potencializam o mote central da
trama – a insegurança de quem se desloca por
terras estrangeiras sem bússola – ao colocarem
na bagagem desses viajantes a urgência de viver

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o rito de passagem da iniciação sexual. Temos aí
elementos suficientes para provocar a empatia
de espectadores de diferentes extratos sociais.

Como desfecho, a edição em livro poderia ser


definida como mais um sinal da semelhança de
trajetória entre personagens e peça. Mas não
seria justo falar de um movimento da periferia
ao centro nobre (da cena?), pois além de questio-
náveis essas categorias baseadas em referenciais
geoeconômicos não são aplicáveis à arte. Carro
de Paulista quebra sim expectativas iniciais de tra-
çado. Porém por meio de um deslocamento bem
mais interessante e subversivo porque sua potên-
cia está em ser desvio. Cavados na superfície dessa 17
comédia há buracos negros que podem tragar o
espectador para o inesperado, canais de acesso
a regiões mais fundas do inconsciente. Entre um
riso e outro pode pesar um silêncio dolorido dian-
te de quatro garotos, postados numa loja de con-
veniência, perplexos com a própria invisibilidade.
Pronto. Ao ser assim tocado o espectador já está
em um lugar inesperado levado por esse Carro
de Paulista. Que inverte eixos em seu itinerário.
E atropela estrelinhas e recomendações.

Beth Néspoli

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Carro de Paulista

De Mário Viana e Alessandro Marson

Personagens:
Pedrão
Jorginho
Júnior
Raio do Sol
Hostess
Mina
Puta

Vozes em Off: Mãe de Jorginho, locutor de rádio,


funcionário da lanchonete, motorista de ônibus,
19
Cenário: variado. O único elemento comum em
todas as cenas é o carro que Pedrão está dirigin-
do, de modelo antigo e cor berrante.

PRIMEIRA PARADA – ZONA LESTE SOMOS NÓS

PEDRÃO e JÚNIOR, impacientes, estão na porta


da casa de JORGINHO. Pedrão buzina.

PEDRÃO – Jorginho!

JORGINHO (voz Off) – Já vai!!!

JÚNIOR (olha o relógio) – Aí, mano, desse jeito


vai ficar muito tarde pra sair, tá ligado?

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PEDRÃO – Dá um tempo, Gilvanilson!

JÚNIOR (alterado) – Porra, não me chama de


Gilvanilson, mano! Meu nome é Júnior! Júnior,
tá ligado?

PEDRÃO – Então tá, Gil...nior. Amanhã é domin-


go, você não vai dar plantão na farmácia.

JÚNIOR – É que eu acostumei a acordar cedo, tá


ligado? Deu seis e meia, pá! Zoião aceso.

PEDRÃO – Até de domingo?

20
JÚNIOR – Até dia de domingo, veio!

PEDRÃO (com desprezo) – Cuzão. (impaciente,


grita) Porra, Jorginho!

JORGINHO (Off) – Já vai!

Jorginho sai de casa com ar zangado. Dá uma


volta em torno do carro.

JORGINHO – Cadê as minas?

PEDRÃO – Que minas?

JORGINHO – Você falou que a gente ia sair com


umas minas aí.

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PEDRÃO – Assim que a princesinha estiver pron-
ta, a gente sai e enche o carro de mulher!

JORGINHO (finalmente, reparando no carro) –


Que carro é esse, Pedrão?

JÚNIOR – Da hora, né mano?

JORGINHO – Ô! De quem é?

PEDRÃO – Do meu primo que veio passar uns


dias lá em casa... E aí, vam’bora logo!!!

JORGINHO – Eu... não vou.

JÚNIOR – Beleza, veio, pela órdi! (percebe a frase


21
do outro) Como é que é, mano?

PEDRÃO – Que papo é esse de não vou? A gente


combinou!

JORGINHO – Não vai dar pra ir.

PEDRÃO – Então vai sem dar, cacete! E as minas


que a gente ia catar na Rua Augusta?

JÚNIOR – E a gasolina? Rachar em três fica mais


barato que em dois, mano! Quer dizer, eu acho,
né? Faz as contas, aí!

JORGINHO – Eu também tô puto! Minha mãe


é foda!

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PEDRÃO – Ela não deixou?

JÚNIOR – Você quer que eu fale com ela? Chego


pra ela e falo, aí, mana, sorta o Jorginho pros
lances, tá ligada? O bagulho vai ser animal, veia,
tipos iradaço, sinistro, da hora, tá ligada? Só vai
dar nós no DVD! Que tá pegando? Seguinte, se
tá com pobrema e tá afim de jogar umas idéia
fora, tô na área, tá ligada, c.b.?

JORGINHO – Nem eu consegui entender isso aí


que você falou.

PEDRÃO – Que tá rolando? Cê tá sem grana?


22
JÚNIOR – Tá de castigo?

JORGINHO – Corta, ô! Eu tenho grana e minha


mãe deixou eu ir.

PEDRÃO – Então deixa de ser cuzão e entra logo


no carro!

JORGINHO – É que o meu primo tem que ir junto!

JÚNIOR – Que primo, mano? Desde quando você


tem primo?

JORGINHO – As pessoas têm primo, Júnior. É


assim, a minha mãe tem uma irmã...

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PEDRÃO – Tá, não precisa explicar. Esse primo
aí é o Raio de Lua?

JORGINHO – Não. O do Sol. O nome dele é Raio


do Sol.

PEDRÃO – Esse moleque é o maior pentelho!

JÚNIOR – É aquele pirralho que vive na sua casa,


mano? Ele nem tem idade pra sair de noite,
tá ligado?

JORGINHO – Com a gente, a minha tia deixa


ele ir.
23
PEDRÃO – Eu quero catar umas minas, não virar
babá de filho de hippie.

JORGINHO – Por isso que eu não vou.

JÚNIOR – Se você não for, a gente também não


pode ir, mano! Você já fez as contas? Dividir por
três não fica mais barato, mesmo, mano?

PEDRÃO – Pode crer. A grana só de dois não dá


pro gás da barca.

JORGINHO – Sem ele, minha mãe não deixa eu


ir. Ela e minha tia vão pro bingo e o Raio não
pode ficar sozinho em casa.

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JÚNIOR – Pô, veio, não sabia que hippie ia no
bingo, tá ligado?

JORGINHO – Cala a boca, Júnior. Hippie é igual


gente. Faz tudo que gente faz, só não toma
muito banho.

JÚNIOR – Ainda por cima a gente vai ter que


ficar ´guentando o cêcê do pirralho! Tô foraço!

PEDRÃO – Porra! Que merda, que merda, que


merda!

RAIO (de fora) – Jorginho!!!! (entra correndo,


24 com um cartucho de videogame na mão) Cê sabe
consertar cartucho? Quebrou!

JORGINHO – Caraca! Raio, o que você fez com o


istrete fire? Essa fita não é minha!

PEDRÃO – Istrete fire?!? É minha!

RAIO – Oi, Pedrão.

PEDRÃO – Você quebrou meu cartucho?

RAIO – Não muito, só um pedaço. Mas dentro tá


bom. (nota o carro) Nossa! Que carrão! (atira o
cartucho longe e corre para alisar o carro)

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PEDRÃO – Meu istrete fire!!! (vai tentar salvar
o cartucho, mas vê o garoto se aproximando do
carro) Tira a mão!!!

RAIO – Da onde?

PEDRÃO – Sai daí! Não encosta um dedo no carro


do meu primo!

JÚNIOR – Ou pelo menos lava a mão antes!

RAIO – É nesse carro que nós vamos sair?

PEDRÃO – Nós quem, pivete?


25
RAIO – Nós quatro, ué. Onde nós vamos? No
Playcenter?

JÚNIOR – Playcenter tá fechado a uma hora


dessas, tá ligado?

RAIO – Então é na sorveteria...

JORGINHO – Minha mãe não deixa eu tomar


sorvete de noite.

RAIO – A gente não conta.

JORGINHO – É que eu fico tossindo sem parar


e ela saca.

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RAIO – Pô, Pedrão, diz aí, onde é que a gente
vai nesse carrão, hein?

PEDRÃO – Num puteiro.

RAIO – Como é?

PEDRÃO – Puteiro, zona, açougue, brega, infer-


ninho, postíbolo, bordel, mangue, casa da luz
vermelha, fudunço... sei lá como fala isso em
língua de hippie.

JORGINHO – Ô, Pedrão, pega leve com o moleque!

PEDRÃO – Lugar cheio de xoxota, perseguida,


26 rachada, pé-de-cabra, xana, xereca, buça, pas-
sarinha... Todas doidinhas pra dar pra gente.

RAIO – Ah, não. Em puteiro eu não vou, não.

JÚNIOR – Aí, mano, além de hippie tu é boiola?


Qualé que é, veio?

RAIO – Não, Gilvanilson...

JÚNIOR – Júnior! Caralho, meu nome é Júnior,


tá ligado?

RAIO – Porque no seu crachá tá escrito Gilvanilson?

Júnior percebe que está com o crachá da farmá-


cia. Guarda rápido.

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JÚNIOR – Esse crachá não é meu, é de um che-
gado. Mas não muda de assunto, não. Por que
você não vai em puteiro, mano?

RAIO – Por que o ato sexual é uma troca de ener-


gia entre duas pessoas! Quando a gente troca
energia vital com alguém que não conhece, isso
prejudica o nosso carma e/

PEDRÃO – Quer ir ou não quer?

RAIO – Não! Em puteiro, eu não vou.

PEDRÃO – Então, você não vai. Chato, hein? Fica


pra próxima! 27

JÚNIOR – Da outra vez, a gente vai na sorveteria.


Faz assim, cê toma um banho e a gente vem aqui
amanhã, tá ligado?

JORGINHO – Pedrão, eu não posso ir sem o Raio!

PEDRÃO (para Jorginho) – Faz o sonso e entra


no carro. (Para Raio) Tchau!

RAIO – Pô, que chato. Justo hoje que minha


mãe me deu um monte de grana, eu não tenho
onde gastar.

Os três param.

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JÚNIOR – Tua mãe deu dinheiro, veio?

RAIO – Prêmio. Ela não foi chamada nenhuma


vez na escola esse mês. É o meu recorde.

JORGINHO – E a tia deu muita grana?

RAIO – Ô! Mais ou menos! Ó! (mostra a carteira,


os três olham e ficam impressionados)

JORGINHO – Nossa!

JÚNIOR – Dá pra pagar a gasolina toda, mano!

PEDRÃO – E ainda sobra troco pra encher a cara!


28 (Pausa) Vamos, Banho de Lua!

RAIO – Raio do Sol! Eu sou o Raio do Sol! Raio


de Lua é a minha irmã!

PEDRÃO – É que eu confundo, desculpa aí.

JORGINHO – É só pensar assim: Sol, menino; lua,


menina. Foi assim que eu decorei.

JÚNIOR – Sol, menino, lua, menina, sol, menino,


lua, menina...

PEDRÃO – Hã-hã. Bom, a gente fica conversando


e vai perder a noite de sábado. Vamos com a
gente, Banho... (Hesita) de Sol?

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RAIO – Tá chegando perto. Mas se vocês forem
no puteiro, eu não vou.

PEDRÃO – A gente vai onde você quiser!

RAIO – Jura?

JÚNIOR – É... mano! Com essa grana toda, a


gente vai até pro Parque da Mônica!

JORGINHO – Vamos entrando no carro, no ca-


minho a gente decide...

Entram todos no carro.


29
VOZ DA MÃE (Off) – Leva uma malha, Jorginho!
Pode esfriar!

JORGINHO (sorri, macho) – Que mané esfriar...

VOZ DA MÃE (autoritária) – A malha, Jorge


Augusto!

JORGINHO (manso, volta para dentro) – Tá bom,


mãe... (Sai, com uma malha nos ombros) Minha
mãe é foda!

JÚNIOR – Vamo’logo, veio! Já tá tarde pra caramba!

RAIO – Pra onde a gente vai, então?

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PEDRÃO – Ih, rapaz, tem um negócio. Ô Rainho,
a gente vai precisar parar num posto de gasolina
e você, como está com o dinheiro mais à mão...

RAIO (desconfiado) – Quanto que é?

PEDRÃO – Só um tanque.

RAIO – Um só?

PEDRÃO – Só.

RAIO – Então tá.

PEDRÃO – Vamos pros Jardins encher essa barca


30 de mulher!!!

TODOS – Ueba!!!!

Carro sai. Eles começam a andar.

JÚNIOR – Aí, mano, Jardins é longe a pampa,


tá ligado?

PEDRÃO – Longe pra quem vai de buzão. Nós


estamos motorizados, se liga! De carro a gente
vai lá, ó, pá, num minuto.

JORGINHO – Eu não sei chegar lá.

JÚNIOR – Mano, eu nunca fui prá queles lado!

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PEDRÃO – É só pegar a Radial.

JORGINHO – E depois?

PEDRÃO – Depois o que, cuzão?

JORGINHO – pra sair da ZL, tem que pegar a


radial de qualquer jeito.

PEDRÃO – Você é o maior otário! Depois da


radial tem a marginal!

JORGINHO (descrente) – E dá pra ir até os Jardins


pela marginal?

PEDRÃO – Dá.
31
JORGINHO – Como?

PEDRÃO (pausa; pensa) – Dá mais volta. Por isso


que eu falei que a gente vai pela Radial. Enten-
deu, ô cuzão?

JORGINHO – E tem muita mulher lá, é?

PEDRÃO – Cara... eu fui levar uns documentos do


meu patrão. Você não bota fé, cara, mas lá tem
cada mulher gostosa! Cabelinho loiro, franjinha,
calça jeans justinha, os peitos bem durinhos!
Tudo mina bacana! Não é esses cadáver da Vila
Formosa, nem essas com cheiro de ônibus de
Guaianases! Lá é tudo perfumada, cheirosinha...

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JÚNIOR – É, elas tomam banho todo dia, viu
Raio? Tem umas que tomam dois.

RAIO – Legal! (Raio levanta os braços. Júnior faz


ele abaixar.)

JORGINHO – Essas minas é tudo maria-gasolina!

PEDRÃO – Por isso nós estamos indo de barca!

JÚNIOR – A gente podia ir pra Práça Sílvio Rome-


ro, veio! Tem uns chegados que vão na farmácia
e falaram que lá é da hora.

PEDRÃO – As minas do Tatuapé é tudo um bando


32 de fresca, que acha que tem o rei na barriga. E
depois você vai ver, elas são de Itaquera, Itaim
Paulista, Jardim Castelo... pra chegar no Tatuapé
elas pega uns três bumba.

O carro segue andando. Black-out.

SEGUNDA PARADA: LANCHONETE

PEDRÃO, JÚNIOR E JORGINHO estão sentados no


carro. Jorginho e Júnior dando risada. Pedrão puto.

PEDRÃO – Pára de reclamar, porra! A gente tá


aqui, não tá?

JÚNIOR (Rindo) – Aí, veio, não fica injuriado, não!

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JORGINHO (Rindo) – Cara! A gente deu mais
volta do que cavalinho de carrossel!

JÚNIOR (imitando Pedrão) – Eu sei chegar, eu


sei chegar!

JORGINHO (Rindo) – Só atrás daquele prédio ver-


melho suspendido a gente passou umas 20 vezes!

PEDRÃO – Tamo aqui, não tamo?

RAIO volta com um saco de papel de mercado


e entra no carro.

PEDRÃO – Orra, até que enfim... Pensei que você


tinha morrido lá dentro. 33

RAIO – É que o cara lá...

PEDRÃO (interrompe) – Passa logo a lata, tô


morrendo de sede.

Todos bebem. Pedrão e Júnior cospem.

JÚNIOR – Que que é isso, veio?!

RAIO – Fanta uva.

PEDRÃO – Tá quente??!!

RAIO – Gelado só tinha guaraná diet.

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PEDRÃO – Eu pedi cerveja!

RAIO – Ah, vá... Fala sério.

PEDRÃO – Eu saí de casa, peguei o carro do meu


primo, vim até os Jardins...

JÚNIOR – pra tomar refrigerante...

JORGINHO – Que é que tem?

PEDRÃO – Sem gelo!

JORGINHO – E daí? Eu não posso tomar gelado.

PEDRÃO – Mina gosta de cara que sabe beber,


34 sacou?

RAIO – Eu sei beber, ué. Olha aqui eu bebendo


meu gatorade!

JÚNIOR – Deixa de ser bobo, pivete. Quando a


gente fala beber é de álcool, tá ligado? Bebida
de macho!

RAIO – Ui, ui, ui... Macho! Há! Tá bom! Você


sabia que beber álcool é negativo pro carma?

PEDRÃO – Eu é que vou perder a carma conti-


go, moleque. Eu quero cerva, que é bebida de
macho, e só macho que sabe beber é que ganha
as minas!

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RAIO – Que minas?

JORGINHO – É mesmo, Pedrão. Que minas?

JÚNIOR – Pode crer... Só tem cueca aqui, veio.

RAIO – Vai ver, é tarde, elas foram dormir.

PEDRÃO – Mina bacana dorme tarde, cuzão.

JORGINHO – Será?

JÚNIOR – Então elas ainda estão em casa, se


emperequetando pro bonitão aqui, tá ligado?
35
RAIO – Coitadas...

JÚNIOR – É que tem gente que toma banho,


tá ligado?

PEDRÃO – Vamos esperar mais um pouco. Agora,


no seco eu não fico. (Para Raio) Vai lá dentro
buscar cer-ve-ja!

RAIO – Eu??!! Já fui, ô!

JÚNIOR – Não discute, mano! Vai lá e pega cer-


veja pra gente! Cê tá com dinheiro, mesmo!

RAIO (sai resmungando) – Saco!

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PEDRÃO – Ge-la-da!!

JORGINHO (grita) – Vê se ainda tem guaraná diet!

JÚNIOR – Noite besta, veio!

PEDRÃO – Fica quieto, cuzão.

RAIO (volta só com o guaraná de Jorginho) – Tó.

JÚNIOR – E a nossa cerveja, mano?

RAIO – O cara não vendeu pra mim. Só porque


eu sou de menor.

36 PEDRÃO – Não acredito.

RAIO – Ih, vai lá e briga com o moço. Comigo, não.

JÚNIOR – Por que você não falou que era de


maior, mano?

RAIO – Eu falei, mas aí ele pediu pra ver o docu-


mento. E eu falei que ia pegar no carro. Só que
eu não tenho documento.

PEDRÃO – E por isso eu vou ficar sem cerveja?

JORGINHO – É melhor você ir lá.

PEDRÃO – Não te mete! Eu tô falando com o Raíto.

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JÚNIOR – Quer saber, veio? Eu vou lá com o Raio
Que Os Parta e vou trazer a cerva. Vem, moleque.

RAIO – Mas você tem documento?

JÚNIOR – Tenho meu crachá.

RAIO – Você não disse que não era seu?

Júnior e Raio saem. Jorginho liga o rádio do carro.

LOCUTOR (Off, apanhado no meio da notícia) –


... frente fria que está chegando traz nuvens
pesadas, com pancadas de chuva. A massa de
ar polar...
37

PEDRÃO – Quem mandou você ligar o rádio?!


(JORGINHO apressa-se e desliga) Cara folgado...

JORGINHO – Foi maus...

PEDRÃO – Fica ouvindo música em vez de prestar


atenção nas minas....

JORGINHO – Não era música, não, era um cara


falando aí... Acho que era horário eleitoral. (tom)
Que minas?

PEDRÃO – Eu te falei que as minas aqui chega-


vam tarde. Olha lá, chegou um monte...

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JORGINHO – É mesmo... Nossa, mano, quanta
mina gostosa!

PEDRÃO – Te falei, cara... Olha aquela loirinha ali...

JORGINHO – A que tá em cima da moto?

PEDRÃO – Aquilo é um cartaz, ô pé de pato! A


loirinha aqui, olha lá, de blusinha preta...

JORGINHO – Ah... Que é que tem ela?

PEDRÃO – Maó gostosa...

JORGINHO – É....
38
PEDRÃO – Olha os peitinhos dela... Não gostou,
mano?

JORGINHO – Meia magrela demais pro meu gosto...

PEDRÃO – Se ela quisesse te dar você dispensava?

JORGINHO – Eu??!!! Imagina! (pausa) Ela nunca


vai querer dar pra mim mesmo....

PEDRÃO – A gente tá com muito papo. Aqui


dentro da barca ninguém vai ver a gente. Temos
que se expor. Vamos ficar lá fora.

JORGINHO – E o sereno?

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PEDRÃO – Porra, Jorginho, deixa de ser cagão!

Jorginho e Pedrão saem do carro. Os dois ficam


sentados no capô . Passagem de tempo. Júnior e
Raio chegam, trazendo cervejas e refrigerantes.
Eles ficam horas ali, sem que ninguém lhes dê
atenção. Não falam nada. O sorriso vitorioso de
Pedrão vai esmorecendo. Jorginho passa a maior
parte do tempo sentido frio. Em determinado
momento, Jorginho toma uma atitude firme.
Apanha a blusa de lã que a mãe o obrigara a tra-
zer e veste. As conversas na loja de conveniência
vão sumindo. Silêncio. Jorginho suspira fundo.
39
PASSAGEM

Volta a luz, em resistência. Jorginho e Raio den-


tro dentro do carro. Raio cochilando. Júnior não
para de olhar para o relógio. Pedrão, volta e
meia, faz pose, paquera, mas não consegue nada.
Jorginho sai do carro. Raio continua dormindo.

PEDRÃO – Noite mixa da porra...

JÚNIOR – Falei que a gente devia ter ido pra


Sílvio Romero, mano!

JORGINHO – Nem a menina que pede esmola


olhou pra nossa cara!

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JÚNIOR – Ainda bem. Tô sem trocado, tá ligado?

JORGINHO – Pelo menos era uma mulher falando


com a gente.

PEDRÃO – Por isso que eu não gosto de sair com


você, Jorginho! Que cara mais pra baixo!

JORGINHO – Melhor a gente ir embora.

JÚNIOR – Aí, mano, vamos pro isnéquibar, na


Vila Prudente.

PEDRÃO – Por quê?


40
Jogam água nos pés dos dois.

JORGINHO – Os caras vão lavar a calçada.

JÚNIOR – Que lazarento!

PEDRÃO – Ô bundão, não tá vendo que tem


gente aqui?!

FUNCIONÁRIO (Off) – Não, cadê?

JORGINHO – Cuzão!

FUNCIONÁRIO (Off, bravo) – Que é que foi,


palhaço?

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JORGINHO – Ih, fodeu.

PEDRÃO (no carro) – Entra, entra! Vam’bora logo!

TERCEIRA PARADA – NA DISCO

Raio continua dormindo. Os três entram no


carro e saem rodando pelo palco. Um tempo
de silêncio.

Passagem de cena. Música. Eles rodam o carro,


param e vêm para a frente do palco. Pedrão,
Jorginho e Júnior ficam em fila indiana. Raio sai.
Passagem de tempo.
41
Jorginho olha os próprios pés.

JORGINHO – Bosta! (os amigos ignoram) Minha


meia tá toda molhada!

Continuam ignorando. Jorginho senta-se no


chão, tira os tênis e massageia os pés. Pedrão,
finalmente, repara nele.

PEDRÃO – Jorginho, que merda é essa?

JORGINHO – Tô com friagem. (olha o pé sem


meia) Olha aí, parece uma uva passa.

PEDRÃO – Calça esse tênis, Jorginho!

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JORGINHO – Mas aí eu fico resfriado!

JÚNIOR – Ih, veio, nada a ver esse lance. Tá todo


mundo calçado na fila.

JORGINHO – Ninguém molhou os pés deles!

PEDRÃO – Se calça! Porra, e essa fila cuzona que


não anda?

Jorginho volta a se calçar.

JÚNIOR – Podi crê. Tamo parado aqui faz uma


cara, mano.

PEDRÃO – E onde foi parar aquele roedor de


42
carne de soja, cacete?

JÚNIOR – Sumiu.

JORGINHO – Nem brinca! Minha mãe nunca mais


deixa eu pôr o nariz na porta de casa!

PEDRÃO – Isso não é nada. O pior mesmo é que


essa porra de fila não sai do lugar!

JÚNIOR – Por falar nisso, veio. Essa fila é pra quê?

PEDRÃO (hesitando) – Ué. Prum lance aí. Vai


dizer que você não sabe?

JÚNIOR – Eu, não. Você sabe, Jorginho?

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JORGINHO (batendo os pés no chão) – Só sei que
meus pés tão congelados! E que meu primo sumiu!

JÚNIOR – Olha ele lá!

Raio de Sol entra.

JÚNIOR – E aí, ô Sem-Banho!

RAIO – Que que é?

PEDRÃO – Foi até o começo da fila?

RAIO – Fui.

JORGINHO – É fila pra quê?


43

RAIO – pra um clãb.

Pausa.

JORGINHO – Um o quê?

RAIO – Clãb.

JÚNIOR – Que porra é essa?

RAIO – Sei lá. A porteira que falou.

PEDRÃO – Vocês são tudo uns maloqueiro, mes-


mo. Clãb é como eles chamam discoteca nos
Jardins, sacou?

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RAIO – Por que eles não chamam de discoteca
mesmo?

PEDRÃO – Porque não é chique, ô baseado am-


bulante.

JORGINHO – Paga pra entrar?

JÚNIOR – Acho que não, veio. Se pagasse, não


ia ter essa filona aí.

PEDRÃO – Nem os cuzão iam ficam duas horas


esperando sem sair do lugar.

44 JORGINHO (para Raio) – Paga ou não paga?

RAIO – Sei lá, a porteira não falou.

PEDRÃO – Essa porteira faz o que lá, cacete?

RAIO – Diz quem entra e quem não entra.

PEDRÃO – Como é que é? Ela embaça a entrada?

RAIO – Ela olha os figura, diz umas coisas esqui-


sitas e diz: você entra. Você não.

JÚNIOR – Um por um?

RAIO – Tem uns que entram sem ela falar nada.

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JORGINHO – Coisa esquisita. Vam’bora, gente.

PEDRÃO – Falou em lugar bacana, o cuzão aí já


quer dar no pé.

JORGINHO – A gente só vai perder tempo aqui,


Pedrão.

PEDRÃO – Como é que você sabe?

JORGINHO (apontando o próprio peito) – Algu-


ma coisa me diz.

JÚNIOR – Ih, veio, vai virar bruxo, é?


45
PEDRÃO – Besteira dele! Vamos lá.

RAIO – Lá onde?

PEDRÃO – Vamos entrar nessa bodega de uma


vez. (para Raio) Você não disse que tem uns que
entram sem nem falar com a porteira?

RAIO – Tem, mas...

PEDRÃO – É só fazer cara de rico. Vamo lá.

JORGINHO – Como é que é cara de rico?

PEDRÃO – É o avesso da tua! Vamo logo.

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Aproximam-se da Hostess, que está fazendo seu
trabalho de triagem. Avançam sem falar nada,
tentando entrar.

HOSTESS – Epa, epa, epa! Vocês vão aonde?

JORGINHO – Entrar.

JUNIOR – No clãb.

PEDRÃO – Muita conversa. Vamo logo.

HOSTESS (esnobe) – Quem manda nessa porta


sou eu!

46 PEDRÃO (cafajeste) – Eu sei, docinho. Agora, deixa


eu ir que tem uns mano me esperando lá dentro...

HOSTESS – Você tem flyer?

JORGINHO (baixo, para Raio e Júnior) – Fodeu.

Pedrão fica sorrindo para Hostess, sem dizer


nada, com olhar perdido.

HOSTESS – Tem flyer ou não tem?

PEDRÃO – Claro.

Ela começa a se divertir com a situação; ele acha


que está agradando e fica ainda mais cafajeste.

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HOSTESS – Tem nada.

PEDRÃO – Você acha que eu ia vir até aqui sem...


sem o ...

HOSTESS – Flyer.

PEDRÃO – Isso. É que me deu um branco...

HOSTESS – Então, você tem flyer?

PEDRÃO – Ô. Eu e os mano aqui (engloba os ami-


gos com um gesto). A gente tem muito.... hã....

HOSTESS – Flyer. 47

PEDRÃO – Isso aí.

HOSTESS – Então mostra.

PEDRÃO – O quê?

HOSTESS – Me mostra o seu flyer.

PEDRÃO – Aqui? Você tá louca!

RAIO – Pedrão, você tá confundindo. Flyer é...

JÚNIOR (puxando Raio) – Ô gambá, vê se fica na


tua, cara, deixa que o Pedrão resolve a parada.

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JORGINHO – Podi crê. Pedrão é o maior esperto.

RAIO – Mas ele nem sabe o que é flyer!

JÚNIOR – E você sabe?

RAIO – Voador.

JORGINHO – Como é que é?

RAIO – Fly, em inglês, é voar. Então, flyer é voador.

JORGINHO – Que esquisito. Ela quer ver o Pe-


drão voar?

48 JÚNIOR – Não, veio! Ela quer que a gente pa-


gue em cheque. Nunca ouviu falar em cheque
voador?

JORGINHO – Fodeu. Eu mal tenho uns trocos


aqui no bolso.

JÚNIOR – Eu também estou no osso.

JORGINHO – É melhor dar um toque no Pedrão,


pra gente não passar mais vergonha.

RAIO – Eu vou lá.

Raio aproxima-se de Pedrão e Hostess, que estão


conversando. Ele acha que está agradando e ela

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está apenas se divertindo. Quando Raio chama,
ela volta ao trabalho.

RAIO – Pedrão! Ô Pedrão!

PEDRÃO – Não atrapalha, moleque.

RAIO – É que o pessoal resolveu ir embora.

PEDRÃO – Tchau.

RAIO – Pô, Pedrão, a gente veio junto!

PEDRÃO – Olha, pivete, eu não sou flor pra an-


dar em buquê, tá ligado? Quer ficar, fica. Quer
49
ir embora, vai tarde.

HOSTESS (voltando, olha Raio com atenção) –


Esse garoto é seu amigo?

PEDRÃO – Não, que é isso! É primo de um ma-


no meu...

HOSTESS – Ele é tudo de bom!

PEDRÃO – O Raíto? Pô, meu chegadaço! Bró-


di mesmo.

HOSTESS (cercando Raio) – Amor, é você quem


faz o seu modelito?

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RAIO – Não, é minha mãe...

HOSTESS – Tô bege, amor! Ela é totalmente hype!

PEDRÃO – Hype, não. Hippie. Puta mina burra.

HOSTESS – Olha, amor. Em quantos vocês são?

RAIO – Quatro.

Pedrão faz sinal e os outros se aproximam. Ela


olha, com certo asco.

HOSTESS – Normalmente, vocês não poderiam fi-


car nem na calçada de um club como o nosso. Mas
50 (aponta Raio) ele é tão tudo de bom, tão hypado...

PEDRÃO – Hippie, mina! Fala direito, pô!

HOSTESS (aponta Pedrão) – E ele é tão... tão...


primitivo! Bronco style puro. E é isso que nós
queremos em nosso club, essa mistura entre New
York, Berlim e ...

RAIO – Eu sou do Embu.

HOSTESS (tenta disfarçar o nojo) – Podem entrar.

JORGINHO – E eu da Vila Matilde.

HOSTESS – Entra logo!

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Hostess franqueia a entrada. Eles passam, ainda
meio aturdidos.

JORGINHO – E agora?

PEDRÃO – Agora a gente entra, mané.

JORGINHO – E o cheque?

JÚNIOR – Podi crê, veio. A mina quer que a gente


pague em cheque.

PEDRÃO – Ela não falou nada de dinheiro. Dei-


xou a gente entrar...
51
JORGINHO – Vai ver que é lá dentro que paga.

PEDRÃO (sorrindo) – Bem se vê que você nasceu


pra ser pobre, Jorginho. Nos Jardins, mano, é só
você ficar bacana que não paga mais nada.

RAIO – Vocês vão entrar ou não vão?

JÚNIOR – Sei não. Se precisar pagar... Vai ver


quanto é, Raio.

RAIO – Eu hein?

PEDRÃO – Vai, pivete. A gente fica esperando


aqui e filmando as minas.

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RAIO – Vocês trouxeram filmadora?

JÚNIOR – É jeito de falar, veio. Vai logo, descobre


se tem de pagar ou é na faixa.

RAIO – Saco. (sai)

JORGINHO – Ih!

PEDRÃO – Que foi?

JORGINHO – A mina da novela.

PEDRÃO – Onde?

52 JORGINHO – Desceu daquele carro.

JÚNIOR – Podi crê. Ela mesma, ó. (pausa) Que


baixinha.

JORGINHO – Na TV, ela parece mais alta.

PEDRÃO (com desprezo) – Magrela! Cadê aque-


les coxão que ela mostrou na revista?

JÚNIOR – Podi crê, veio. Ela tirou aquelas foto-


grafia pelada, lembra?

PEDRÃO – Ô, se lembro.

Os dois suspiram. De repente, arregalam os olhos.

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JORGINHO – Ela deu um beijinho na porteira.

JÚNIOR – Na boca!

JORGINHO – Foi só um selinho.

PEDRÃO – Só um selinho, só um selinho. Você


dá selinho no porteiro do teu prédio?

JORGINHO – Eh, cai fora! Eu moro em casa térrea.

JÚNIOR – Puta mina tarada, veio.

Raio volta.
53
PEDRÃO – E aí?

RAIO – Sessenta.

JORGINHO – Sessenta o quê?

RAIO – Sessenta paus, pra entrar.

PEDRÃO – Tudo isso? Se a gente fizer uma va-


quinha, será que...

RAIO – É sessenta cada um, Pedrão.

JÚNIOR – Caralho! Sessenta paus é metade do


meu salário.

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RAIO – Coitado! Você ganha só 120 por mês?

JÚNIOR – Tá me estranhando, sujismundo? Eu


ganho 200.

RAIO – Então, 60 não é metade...

JÚNIOR – Puta merda, fodeu de vez. É mais da


metade!

JORGINHO – E agora?

JÚNIOR – Vamo embora, veio.

PEDRÃO – Péra aí! Não vai saindo assim, dando


54
bandeira de pobre, não. Tem que sair com classe,
meu filho, com estilo. (vai até a hostess) Oi, linda.

HOSTESS – Não entrou ainda, brucutu?

PEDRÃO – Eh que... Tá dando uma ligeira con-


fusão ali na entrada.

HOSTESS – Que foi?

PEDRÃO – O cara lá na porta, vê se pode, falou


que a gente tem de pagar...

HOSTESS – Tem mesmo.

PEDRÃO – Pô, mas a gente ficou tão amigo, você


foi super com a minha cara...

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HOSTESS – Sabe o que é, meu pré-histórico?
Minha função aqui é filtrar quem entra. Agora,
lá, você paga do mesmo jeito...

PEDRÃO – Pô, mas sessenta paus...

HOSTESS – Sem flyer. Com flyer, é só quarenta.

PEDRÃO – Mas a gente não tem tudo isso.

HOSTESS – Como é que é? Vocês não têm dinheiro?

Os outros se aproximam.

JUNIOR – Nem um puto.


55

JORGINHO – Zeradinho.

RAIO – Ainda sobrou um pouco do que a mi-


nha mãe me deu, mas eles me fizeram gastar
quase tudo...

HOSTESS (no walkie-talkie) – Arrudão, tá na es-


cuta? (ruídos) Arrudão, manda segurança aqui
pra porta. Tem quatro pobres aqui, cara! Pobres!

PEDRÃO – Pô, que trairagem...

JUNIOR – Podi crê. Chamar guarda no radinho,


veio, nada a ver.

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PEDRÃO – E a gente não é pobre, não, sua metida!

HOSTESS (no walkie-talkie) – Manda reforço,


Arrudão!

RAIO (olhando em direção à porta) – Nossa, ca-


da homão!

JUNIOR – Caralho, veio, olha os armário que a


mina chamou!

HOSTESS (apontando com nojo) – Ali, Arrudão,


os pobres são aqueles ali!

PEDRÃO – Vam’bora, vam’bora, cacete!


56
Saem correndo em direção ao carro.

JORGINHO – Eu sabia! Eu sabia! Alguma coisa


me dizia que não ia dar certo.

QUARTA PARADA – TRIANON

PEDRÃO – Puta lugar morto.

JÚNIOR – Aí, veio, esses jardins tão mais pra


jardim de cemitério, tá ligado?

PEDRÃO – Cala a boca!

JÚNIOR – Se a gente tivesse ficado no Tatuapé,


a uma hora dessas...

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PEDRÃO – Porra, Júnior, cê nunca sai da ZL, não?

JÚNIOR – Eu não. E lá é bem mais manero do


que aqui, tá ligado?

JORGINHO – Se a gente tivesse ficado lá na vila...

PEDRÃO – ... ia estar comendo as minass lá de


Itaquera!

JÚNIOR – Aquelas minas é malaca, mas pelo


menos têm buceta, tá ligado?

PEDRÃO – E as minas daqui são aleijada, por acaso?


57
JORGINHO – Não, mas parece que a gente é.
Ficamos parados naquela lanchonete mais de
duas horas e nenhuma olhou pra gente!

JÚNIOR – E esse porra desse hippie, vai ficar


dormindo até que horas, mano?

RAIO – Eu tô acordado. Tô fazendo mentalização.

JÚNIOR – Que mané metalização!? Isso é o que


todo mundo aqui tá querendo, dar uma boa
mentelaziçãozada, tá ligado?

JORGINHO – Ô, Pedrão, vamos voltar pra casa,


vai? Tá tendo uma quermesse na vila.

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PEDRÃO – Nem fodendo! Porra, Jorginho, será
possível que você não tem ambição na vida? Não
sonha alto? Nem parece que você quer comer
uma mina dos jardins, cara!

JORGINHO – Nem as minass de Itaquera dão pra


gente! Você já comeu alguma?

PEDRÃO – Eu sou fino, meu filho. Seleciono meus


abates, entendeu?

JORGINHO – Seleciona tanto que acaba ficando


na mão.

JÚNIOR – Eu tô comendo uma mina que vai lá


58 na farmácia! Um dia ela foi tomar uma injeção
e acabou levando duas, tá ligado?

JORGINHO – Ah, vai, conta outra. Tá na cara que


você é cabação.

JÚNIOR – Que cabação, veio? Sou o maior abri-


dor de concha! A mulher da injeção vai na far-
mácia toda semana... outro dia ela até lambeu
o meu subaco!

JORGINHO – Puta nojo!

PEDRÃO – Papo furado! O cara é maior punhe-


teiro da ZL! Ele e o Raio tão ali, ó, só no cinco
contra um!

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RAIO (abrindo os olhos) – Eu já tive a minha
iniciação sexual na comunidade.

JORGINHO – Você!? Duvido!

RAIO – Então pergunta pra minha mãe.

PEDRÃO – Porra, a sua mãe sabe que você trepou?

RAIO – Claro. Foi com a amiga dela! Uma mu-


lher que eu conheço desde pequeno, com uma
energia superlegal.

JÚNIOR – Que energia, veio? O que tem que ser


legal são os airbag!
59
JORGINHO – Você deve ter sonhado, isso sim!

RAIO – Lá na comunidade a gente tem um ritual


de iniciação sexual quando faz 14 anos. Eu já
tenho 15. Meu ritual foi no fim do ano passado.

PEDRÃO – Até esse pirralho já carcou!

RAIO – Por que, vocês nunca fizeram sexo?

PEDRÃO E JORGINHO – Claro que sim!

PEDRÃO – Um monte de vezes.

JORGINHO – Várias!

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PEDRÃO – É, várias, um monte de vez...

JÚNIOR – Então, diz aí, Pedrão... quando você


trepou da última vez, mano?

PEDRÃO – Ê, que papo besta! Parece coisa de


veadinho, ficar contando essas coisas.

JORGINHO (grita) – Ó o carro, Pedrão!

Pedrão dá uma freada brusca. Os quatro vêm


para a frente.

RAIO – Nossa, quase que você acerta a traseira


do carro!
60
PEDRÃO – Também, esse filho da puta para sem
mais nem menos. Aí, ó, parou pra ficar conver-
sando com um cara! (Grita) Babaca!

JÚNIOR – Mano, vamos chegar que essa parada


tá maior chocha.

RAIO – Chegar! Mas a gente já chegou faz tempo.

JORGINHO – Não, ô mané! Chegar quer dizer


ir embora.

RAIO – Ah bom...

PEDRÃO – Eu não vou embora porra nenhuma!


Hoje eu quero é comer uma buça!

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O carro anda mais um pouco. Silêncio.

JORGINHO – Que saco! A gente vai ter que ficar


a noite olhando um pra cara do outro.

PEDRÃO – Olha pra rua.

JORGINHO (olha pro outro lado) – Ih, olha lá.


Quanto cara parado.

PEDRÃO – Onde, onde?

JORGINHO – Ali, naquela calçada.

PEDRÃO – Aqui é o canal.


61
RAIO – Canal do quê?

JÚNIOR – Porra, tu é muito burro mesmo, veio!


(P) Canal do que, Pedrão?

PEDRÃO – Esses caras parados aqui só quer dizer


uma coisa. Deve passar mulher pra caramba aqui!

JORGINHO – Hããããã....

RAIO – Eu não tô vendo nenhuma.

JÚNIOR – Mano, já sei. Deve ser que nem é no


interior. Os caras ficam parados e as minas ficam
dando volta em volta, tá ligado?

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JORGINHO – Não é ao contrário?

PEDRÃO – Aqui nos jardins é diferente. O que


você acha que esses caras tão fazendo parados
aí? Daqui a pouco deve chegar a mulherada!

JORGINHO – É, tá certo. Os caras não iam ficar


aí parados à toa.

PEDRÃO – Demorou pra cair a ficha, hein!? Va-


mos descer do carro!

JORGINHO – A troco de quê?

PEDRÃO – Vamos ficar que nem eles!


62
JÚNIOR – Manero. Daqui a pouco a mulherada
vai chegar, tá ligado?

JORGINHO – A gente vai ficar parado na calçada


feito poste?!

PEDRÃO – Faz que nem eles e não enche o saco.


Se tem tanta gente assim aqui é porque dá certo.

Os quatro descem do carro. Ficam na calçada,


olhando para os lados, tentando sorrir para os
outros. Buzina.

JORGINHO – Ah lá, um cara pedindo informação.


Tá chamando você, Pedrão.

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JÚNIOR – Puta lance errado, veio. Por que o
mano quer falar com o Pedrão?

PEDRÃO – Por que tá na cara que eu manjo das


coisas, né? Não sou que nem vocês, com essa
cara de ZL.

RAIO – O cara tá fazendo sinal.

PEDRÃO – Eu vou lá. (Vai até o carro, fica aga-


chado conversando com o motorista) Tudo
bem. Pois é. Noite quente mesmo. Tem cerveja
aí? Oba, valeu. Eu, novo por aqui!? Não... Quer
dizer... É... Um pouco, né!?... Quanto o quê?
Como assim, passivo? Eu o quê?! (levanta-se)
63
Tá maluco!? Tá me estranhando!? Vá à merda,
ô! (carro sai na disparada, cantando pneu) Ó a
do cara, mano! Queria me comer! (gritando pro
carro) Sou veado, não! Tá ouvindo?

Os três caem na gargalhada. Pedrão volta, putís-


simo.

PEDRÃO – Ó o cara, a maior estampa de macho,


bigodão, blusão de couro da hora, uma pulseiro-
na de couro... (gritando pro carro) Boiola! (Para
Jorginho) Para de rir, seu bosta!

JÚNIOR – Aí, o veio achou que o Pedrão era


frutinha, tá ligado?

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JORGINHO – Aí, Pedrão, vai queimar a rosca?

JÚNIOR – Tá afim de sentir a unha no calcanhar,


veio?

JORGINHO – Ó o cara, vai morder a fronha!

PEDRÃO – Vou, sim, vou dar o rabo pra tua irmã,


aquela arrombada do caralho!

JORGINHO – Olha aqui, não fala da minha irmã,


não! (agarra Pedrão pelos colarinhos) Tá ouvin-
do? Não fala da minha irmã!!!

RAIO – Jorginho, você é filho único...


64

JÚNIOR – Tava estranhando, mesmo, tá ligado?

JORGINHO – O que vale é a intenção.

JÚNIOR – Aí, ó, o mano lá tá chamando.

PEDRÃO – Será que esse também é veado?

JORGINHO – Que nada, o cara é fortão.

RAIO – Ele tá parado ali faz um tempão.

JÚNIOR – Vai lá, Pedrão.

PEDRÃO – Nem fodendo. Vai lá, Raio.

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RAIO – Eu!? Eu sou de menor. Vai você que tá
de crachá, Júnior.

JÚNIOR – Ele tá chamando o Jorginho, tá ligado?

JORGINHO – Cês são tudo cuzão, mesmo.

Jorginho vai até o cara.

JORGINHO (de fora) – Tá pensando que eu sou


palhaço, é? Vai se catar!

Jorginho volta. Os três apreensivos.

JÚNIOR – O que que o mano queria?

JORGINHO – O cara me chama lá pra dizer que 65

nós invadimos o ponto dele!

PEDRÃO – E o que você respondeu?

JORGINHO – pra ele deixar de ser cuzão, porque


a gente tá aqui há um tempão e eu não vi passar
um ônibus!

JÚNIOR – É, nos jardins nem passa ônibus. Todo


mundo tem carro, tá ligado?

PEDRÃO – Pode crer, só passa carro, carro... (al-


guém atira uma pedra dos bastidores) Ô veado,
quase me acerta! (atiram outra) Ai, acertou! Ô
fi’da puta!

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JORGINHO – Caralho, Pedrão, aqueles caras tão
jogando pedra na gente!

RAIO – (grita) Violência gera violência, tá ouvin-


do? O carma de vocês vai aumentar... Ai!

Raio leva uma pedrada. Começam a chover pedras.

PEDRÃO – Vai, seus marica do caramba, atira


pedra, atira! Por que vocês não vêm aqui brigar
feito macho, bando de queima-rosca?

JORGINHO – Ih, eles tão vindo!

JÚNIOR – Eles tão vindo! Eles tão vindo, mano!


66
PEDRÃO – Corre!!!!

Os quatro saem correndo do palco, as pedras


continuam a ser atiradas.

QUINTA PARADA – A MINA DA CONSOLAÇÃO

Carro vem andando. Os quatro em silêncio, enver-


gonhados. Jorginho olha para o lado. Uma garo-
ta, com uma bolsa, parada, esperando o ônibus.

JORGINHO – Pedrão, olha lá!

PEDRÃO – Não enche.

JORGINHO – É sério, Pedrão! Olha lá!

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PEDRÃO – Não enche o saco!

JÚNIOR – Tem mulher ali, mano!

PEDRÃO – Onde, onde, onde?

JORGINHO – No ponto de ônibus.

RAIO – Ué, aqui tem ônibus ou não tem ônibus?

JÚNIOR – Aqui tem, né? Se tem ponto é porque


tem bumba, tá ligado?

RAIO – E a gente pode ficar nesse ponto ou vão


dar pedrada na gente?
67
PEDRÃO – Cala essa boca, ô filhote de bicho-grilo!

JORGINHO – Peraí, a gente tá de carro... por que


vai parar no ponto?

PEDRÃO – Porra, ponto de ônibus é legal. O


buzão não vem, as minas ficam impacientes, a
gente oferece carona, elas aceitam, aí elas dão
pra gente e a gente come elas, entendeu?

RAIO – Rá, quero só ver...

JÚNIOR – Vai ver, mesmo! E o papai aqui já sabe


o que vai fazer. Vou buscar umas cerva pra nós,
tá ligado? Dá a grana aí, Raio.

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RAIO (dando dinheiro para Júnior) – Eu quero
Gatorade.

PEDRÃO – Ó, Júnior, eu vou parar o carro lá no


ponto. Traz uma cerva a mais, pra gente oferecer
pras minas.

JÚNIOR – Pela órdi, tá ligado?

Pedrão para o carro e Júnior desce e sai de cena.


Eles continuam andando.

RAIO – Jorginho, eu quero fazer xixi.

JORGINHO – E eu com isso?!?


68

RAIO – O que que eu faço?

PEDRÃO – Ué, tira o coisinho pra fora e mija!

RAIO – Aqui!? Na rua? Na frente de todo mundo?

PEDRÃO – Faz o seguinte, mija ali naquele jardim


e depois encontra a gente no ponto.

Pedrão para. Raio desce do carro e sai correndo


de cena. Pedrão e Jorginho sozinhos no carro.
Vão andando em direção ao ponto e param o
carro. A mina fica parada, ignorando. Jorginho
pega a chave do contato e coloca no bolso.

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PEDRÃO (para a mina) – Ooooiiii.... (nada; aumen-
ta o sorriso e a extensão do oi) Oooooooiiiiiii!!!!!
Ô, gata! Ô, mina! Tô falando com você! Ô!!!

MINA – Ô é breque de burro!

JORGINHO – Então é por isso que você tá parada?

PEDRÃO – Cala a boca, Jorginho!

JORGINHO – A mina é a maior metida!

PEDRÃO (para Mina) – Desculpa aí, o meu amigo


é meio crianção!

MINA – Meio?! pra ser criança inteira só faltava


69
usar fraldão!

JORGINHO – Qual é, ô sua bobona... Eu sou é


muito homem, viu?

MINA – Se não usa fralda, tá cagando nas calças


mesmo!

JORGINHO – Vá se ferrar, baranga!

PEDRÃO – Que é isso, Jorginho?

JORGINHO – Ela que começou!

MINA – Pega o rumo, vai! Vocês parados aí estão


atrapalhando os bumbas!

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PEDRÃO – Ah, não vai dizer que você ficou
mordida com o Jorginho. É zoeira dele! Ele é da
hora, mano de fé...

MINA – Então, por que você não fica com ele?

PEDRÃO – Pô, péra aí! Não sou veado, não!

MINA – Não amola! Sai voado, vai. Vai encher o


pacuçá de outra!

PEDRÃO – Aqui ó, você é maó metida! Tá aí, fo-


dida, esperando ônibus que nem uma favelada
e fica toda posando de bacana!

70 MINA – Vai ver se eu tô lá na esquina!

PEDRÃO – Deve estar, aquilo ali na esquina é


um puteiro.

MINA – Pois é, quem me contratou lá foi tua mãe!

JORGINHO – Ih, Pedrão, ela tá chamando tua


mãe de puta!

PEDRÃO – Você é muito da folgada, viu, mina?

JORGINHO – É maior folgada, olha aí...

MINA – Folgado é teu rabo de tanto dar pros


guardas da Febem!

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JORGINHO – Você viu o que ela falou? Viu o que
ela falou? Viu? Você viu o que ela falou?

PEDRÃO – Não, eu não vi! Eu só ouvi, tá bom!?


E você, ô sua piranhinha...

MINA (firme) – Piranhinha é tua irmã, que não


consegue cobrar muito porque já tá muito gasta
até em puteiro de beira de estrada!

PEDRÃO – Eu devia era sair daqui e te encher


de porrada!

MINA – Sai, sai do carro pra você ver o que é


bom pra tosse. Sai! 71

A mina abre a bolsa e tira uma faca. Começa a


ameaçar os dois. Os dois fecham o vidro do carro.

JORGINHO – Caralho, olha a faca que a mina


carrega na bolsa!

MINA – Desce do carro que eu te capo, seu filho


da puta! Desce, que eu te capo!

PEDRÃO – Você é louca! Doida! Devia estar


presa! (tenta ligar o carro, não consegue) Sua...
sua... sua doida! Cadê a chave do carro, caralho?!

JORGINHO – Eu escondi!

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PEDRÃO – Escondeu onde?!

MINA (batendo no carro deles) – Sai do carro,


seu veado! Seu frouxo! Sai!!! Eu perco o ônibus,
mas deixo você sem os dois ovos! Sai!!!

PEDRÃO – Não bate no capô do carro!!! Caralho,


Jorginho, onde você enfiou as chaves?

JORGINHO – Tá aqui no meu bolso.... (procura)


Ih, caiu! Onde será que foi parar?

Malabarismos. Jorginho e Pedrão procuram as


chaves do carro, sem sair de dentro dele. En-
quanto isso, a mina continua batendo no capô
72 do veículo.

PEDRÃO – Não bate no carro!!

MINA – Sai daqui vocês dois, que meu bumba vai


passar e o motorista não gosta de carro parado
aqui, não!

JORGINHO – Achei! Achei! (exibe as chaves)

PEDRÃO (tenta apanhá-las à força, sem sucesso) –


Dá aqui elas! Dá aqui elas!

JORGINHO – Por favor o quê?

PEDRÃO – Isso lá é hora pra falar de etiqueta!


(Liga o carro e abre um pouco o seu vidro) Ufa!

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Tchau aí, ô cruzamento do capeta com o mapa
do inferno!

MINA – Vai tarde!

PEDRÃO – Se você não fosse tão besta podia


pegar uma carona....

JORGINHO – E depois pegar os nossos pintos!!!


(os dois gargalham)

MINA (dando mais pancadas no carro) – Ah, vão se


foder, vocês dois!!!! (ela começa a chutar o carro).

PEDRÃO – O carro do meu primo! Não chuta o


carro do meu primo!!! 73

MINA – Seus bundas-sujas do caralho, por que


não vão encher o saco da turma de vocês, hein?
Sai daqui, rápido! Passa, chispa!!!

PEDRÃO – Não chuta o carro, sua puta!

MINA – Puta é a fodida que te pôs no mundo,


seu monte de bosta fedorenta!

JORGINHO – Vam’bora, Pedrão! Vam’bora logo!

PEDRÃO – Não chuta o carro!!!

MINA – Vai tomar no rabo, cuzão! (faz gestos


obscenos, enquanto eles saem)

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JORGINHO – Puta mina boca suja!!!

PEDRÃO – Você só me fode, Jorginho.

JORGINHO – Eu??!! Tá louco?

PEDRÃO – Você que viu a mina no ponto de


ônibus. Vamos lá falar com ela, vamos lá, vamos
lá! Parece que nunca viu mulher!

O carro anda mais um pouco. Silêncio. A mina


continua parada no ponto de ônibus.

JORGINHO – Caralho, a gente tem que voltar!

74 PEDRÃO – Tá doido?

JORGINHO – O Raio ficou lá! E o Júnior também!

PEDRÃO – Fodeu! Eu é que não volto lá!

JORGINHO – Larga de ser cagão! Tá com medo


da mina, é?

PEDRÃO – Que medo o quê?

JORGINHO – Então volta!

PEDRÃO – Volta você!

JORGINHO – De a pé?

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PEDRÃO – E se aquela maloqueira chutar a barca
de novo?

JORGINHO – Então, para que eu vou lá.

Pedrão para o carro. Jorginho desce.

JORGINHO – Você vai ficar aí?

PEDRÃO – Vou, né? Não posso deixar o carro


sozinho.

JORGINHO – Cagão!

Jorginho sai, puto. Pedrão fica dentro do carro.


75
Jorginho vai andando, com medo. Júnior chega
ao ponto de ônibus e conversa com a Mina. Jor-
ginho se esconde, tenta fazer sinais para Júnior,
mas ele não o vê.

JÚNIOR – O que você tá fazendo por aqui?

MINA – Ah, sei lá... vim dar uns rolês... pra esses
lados têm um monte de farmácia 24 horas.

JÚNIOR – Pô, achei que você só fosse tomar in-


jeção lá comigo!

MINA – Ah, Gilvanzinho, você é o melhor apli-


cador de injeção que eu conheço.

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JÚNIOR – E aí, cê tá indo pra que lado?

MINA – Lá pra vila... o ônibus já tá vindo. (in-


sinuante) Eu não consegui tomar nenhuma
benzetacilzinha hoje. Aqui é bem mais caro. Cê
vai ficar aí?

JÚNIOR – É, sei lá... acho que eu vou pra vila


também. Amanhã eu falo com os manos.

Júnior e a Mina entram no ônibus e saem de cena.


Jorginho, apavorado, vai correndo até o carro.

JORGINHO – A mina, ela levou o Júnior embora,


76
Pedrão! A gente tem que salvar o cara! Anda,
liga o carro.

PEDRÃO – O que você tá falando, maluco?

JORGINHO – A mina boca de esgoto. Ela sequestrou


o Júnior. Obrigou ele a entrar no busão com ela...
roubou as nossas cervas... apontou a faca pra ele...
acho que ela sacou que ele era nosso chegado!

PEDRÃO – Fodeu! E agora?!? O que a gente faz?

JORGINHO – Vamos chamar os ómi! Vamos se-


guir o busão!

Os dois entram no carro, desesperados. Um tempo.

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PEDRÃO – E o Raio? A gente vai largar ele aqui?

JORGINHO – Puta que o pariu! Esqueci do moleque!

PEDRÃO – E agora? O que a gente faz?

JORGINHO – É... é... não sei.

PEDRÃO – Nem eu.

Os dois saem do carro e ficam andando de um


lado para o outro. Raio chega e fica observando.
Demora um tempo para eles notarem que ele
está ali.

RAIO – E aí? 77

PEDRÃO – Que merda! Deu tudo errado!

RAIO – O quê?

JORGINHO – A bandidona levou o Júnior e o


Raio sumiu!

RAIO – Sumi nada!

PEDRÃO E JORGINHO – Raio!?

RAIO – Ué, estavam esperando quem?

JORGINHO – Onde você estava?

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RAIO – Fazendo xixi. Fui procurar um banheiro.
Cadê o Júnior?

PEDRÃO – A mina levou ele embora.

RAIO – Que mina?

PEDRÃO – Ah, deixa pra lá...

JORGINHO – Pedrão! A gente não vai fazer nada


pra salvar o Júnior? E se ela capar o cara?

PEDRÃO – Fazer o quê?!?

JORGINHO – É... fazer o quê?


78

RAIO – E aí, vamos embora?

PEDRÃO – Eu já falei mais de mil vezes que eu


não vou embora sem comer uma buça! Se vocês
quiserem, fodam-se. Vão embora de lotação, de
a pé, vão voando!

Pedrão entra no carro. Jorginho e Raio entram,


em silêncio.

SEXTA PARADA – RUA AUGUSTA

JORGINHO – Onde é que nós estamos, hein?


(Olhando a placa) Rua... rua... A ... A ... Au... Agosto.

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PEDRÃO – Augusta.

JORGINHO (olhando melhor) – Ah, é. Rua Augusta.

PEDRÃO – Porra, legal, cara! Essa rua é cheia


dos puteiro!

JORGINHO – É mesmo?

RAIO – Por isso! Tô sentindo mesmo uma energia


pesada. Olha aqui, eu não vou entrar em puteiro
nenhum, hein?

JORGINHO – Então você fica olhando o carro.

PEDRÃO – Olha só, as putas ficam tudo na rua, 79


os caras passam e mexem com elas...

Passagem de tempo. O trânsito anda lentamente.

JORGINHO – Porra, tá tudo parado, cara!

PEDRÃO – Eu tenho medo é que acabe a gasolina!

RAIO – Eu não coloco mais nada. Já enchi o tan-


que uma vez.

JORGINHO (pondo a cabeça fora da janela) –


Vamo’logo, seus cornos do caramba!

PEDRÃO – Jorginho, para com isso! Puta vergonha!

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JORGINHO – Você conhece os caras da rua?

PEDRÃO – Não.

JORGINHO – Eles te conhecem?

PEDRÃO – Não.

JORGINHO – Então.

PEDRÃO (reflete rapidamente; coloca a cabeça


pra fora do carro também) – Bando de roda
presa do caramba!

JORGINHO – Anda logo, seus quase morto!


80
PEDRÃO – Ih, andou, olha aí... (andam um pou-
co; param novamente; tédio) Nossa mãe! Olha
só, Jorginho!

Uma puta parada na rua, bem perto deles.

JORGINHO – Puta que pariu, que mulherão!

PEDRÃO – Olha as pernas da mina!

JORGINHO – Precisa de escada pra subir nisso tudo!

PEDRÃO – Que tetona!

RAIO – Será que ela é prostituta?

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JORGINHO – Não, ela tá rodando a bolsa pra
espantar mosquito.

PEDRÃO – Com ela num quarto eu começava a


chupar desde a maçaneta da porta.

JORGINHO – Tanta carne e eu aqui roendo osso!!!

PEDRÃO – Fala com ela!

JORGINHO – Falar o quê?

RAIO – Cuidado, hein, Jorginho? Essas pessoas


têm uma carga de energia pesada.
81
PEDRÃO – Pesada é a minha mão, moleque. Vai
Jorginho, sei lá, ela é puta, fala qualquer coisa.

JORGINHO – Eu nunca falei com puta!

PEDRÃO – Puta é igual às minas que a gente


conhece. A única diferença é que ela cobra.

JORGINHO – Hã... Mas eu não sei falar com as


outras minas também...

PEDRÃO – Fala qualquer merda, o importante é


puxar conversa. Vai!

JORGINHO – Tá. (para Mulher) Oi.

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MULHER – Oi.

JORGINHO (pausa; sem graça; olha, sorri, pensa) –


Você é puta?

MULHER (irritada) – O que é que foi?

JORGINHO (para Pedrão) – Fala você com ela!


Você é mais experiente.

PEDRÃO (para Mulher) – Nada, não... É que... O


meu amigo... Sabe como é...

MULHER – Sei. Tchau. (anda um pouco).

82 PEDRÃO – Peraí, não vai embora... (armando-se


de coragem) Quanto é?

MULHER – Cem. Mais o hotel.

JORGINHO – Cem paus?!

RAIO – Você faz sexo com as pessoas por cem


reais? Você acha que essa quantia é suficiente?
Sabia que o ato sexual é uma troca de energias
entre seres que/

PEDRÃO (tapando a boca de Raio) – Precisa ser


em hotel?

MULHER – Você tem lugar pra gente ir?

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Pedrão olha para Jorginho.

JORGINHO – Nã-nã... Lá em casa minha mãe não


vai deixar.

PEDRÃO (para Mulher) – O hotel, quanto é?

MULHER – Cinquenta o período. Paga adiantado.

PEDRÃO – Cinquenta.... Mais os seus cem...

MULHER – Vou facilitar pra você, queridinho.


Cinquenta mais cem dá cento e cinqüenta. Qual
dos três que vai?
83
JORGINHO – Cem paus é um só?!

MULHER – Claro. Eu não sou a rainha do atacado.

JORGINHO – Porra, mas cem paus...

MULHER – Mais o hotel, não esquece.

PEDRÃO – Nós três por cem...?

JORGINHO – Eu sou rapidinho!

RAIO – Eu não vejo sentido em pagar para se ter


relação sexual com uma pessoa da qual eu nem
conheço. A aura dela/

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PEDRÃO – Cala a boca, sujismundo. (para a mu-
lher) Então, cem pros dois?

MULHER – Nem vem que não tem.

JORGINHO – E se só um de nós fizer o serviço, os


outros podem pelo menos ficar olhando?

MULHER – Você é tarado, hein, moleque? Cai


fora, vai!

RAIO – Você é feliz assim?

MULHER – O quê?!
84
RAIO – É, você é feliz assim, usando seu corpo
para satisfazer as vontades de pessoas que você
não conhece? Isso pode trazer um carma pesado
pra sua próxima vida, sabia?

MULHER – Eu... olha aqui, pivete, você nem tem


idade pra entender dessas coisas! E da licença,
que vocês tão me fazendo perder tempo. E tem-
po é dinheiro.

Pedrão desce do carro. Se arruma, confiante.

PEDRÃO – Peraí, gata. A gente pode conversar.

Jorginho e Raio também descem.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 84 4/4/2011 12:50:20


MULHER – Que porra é essa, abriram o portão
do Jardim da Infância?

RAIO – Há quanto tempo você não conversa com


um amigo?

MULHER – Bom... outro dia eu liguei pra uma


colega e a gente conversou um monte. Quiquié,
você é crente ou o quê?

RAIO – Não, eu sou neobudista tibetano.

MULHER – Ah... tá.

RAIO – Eu tô vendo que você tem uma aura legal,


85
mas está com as cores meio turvas, por causa da
sua atividade.

MULHER – Fazer o quê, meu bem... tenho contas


pra pagar!

RAIO – Lá na minha comunidade, a gente vive


superbem. Ninguém faz o que não quer, nin-
guém tem que pagar aluguel, a gente planta a
nossa comida, toma banho no riacho... tudo em
harmonia com a natureza. E de graça.

MULHER – Não brinca! Onde fica esse paraíso?

RAIO – É logo ali, perto de Embu... quer conhecer?

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MULHER – Tá brincando? Amanhã mesmo a
gente vai pra lá. Adorei esse papo de harmonia
com a natureza e banho de riacho! Mas, hoje,
a gente vai lá pro meu apê... Quero te mostrar
umas coisinhas... Você é uma belezinha, sabia?

RAIO – Se você quiser, eu te faço uma massagem


energizadora que vai reconstituir a gama de
cores da sua aura.

MULHER – Não brinca? Sempre quis fazer isso!


Eu também sei fazer umas massagens ótimas!

Saem de cena. Pedrão e Jorginho ficam olhando,


incrédulos. Vão para o carro e seguem.
86
JORGINHO – E agora, o que eu falo pra minha tia?

PEDRÃO – Cala a boca! Se você tocar no nome


daquele pirralho folgado, te largo aqui. (pausa)
Olha lá, olha lá, mais puta, olha lá...

JORGINHO (gritando pela janela) – Eta monte


de puta!!!

PEDRÃO – Ih, cara... Não é puta, não. É travesti.

JORGINHO – Tá brincando? Aquela gostosa ali


é macho?

PEDRÃO – Traveco, no duro. Vai lá, vai. Vai, que


você enche a mão!!!

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JORGINHO – Eu, hein? Tô fora! (gritando para os
travestis) E aí, bichona? Fala, boneca!!!

PEDRÃO – Florzinha! Mimosa! Delicadinha!

JORGINHO – Ai, ai, ai, ui, ui, ui....

Ficam mexendo com os travestis. Param subita-


mente, olhos arregalados. Continuam andando
de carro, emudecidos, olhando fixo para a frente.

JORGINHO – Que pintão!

PEDRÃO – Deve ser de mentira.


87
JORGINHO – Parecia de verdade.

PEDRÃO – Ah, vai, ninguém tem um pau daque-


le tamanho.

JORGINHO – É, impossível. Ninguém tem...

Os dois olham para seus respectivos volumes e


ficam meio decepcionados.

SÉTIMA PARADA: DRIVE-IN PARADISE

Pedrão e Jorginho no carro.

JORGINHO – pra onde a gente tá indo, Pedrão?

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PEDRÃO – Pegar a Radial.

JORGINHO – Tamos indo pra casa?

PEDRÃO – Antes que acabe a gasolina e a gente


fique aqui, no meio do nada....

JORGINHO – Gasolina a gente põe, ora! Qual-


quer cinco conto dá pra alegrar o carro.

PEDRÃO – Não é grana o problema, Jorginho. É


que... Ah, quer saber, eu fiquei de saco cheio! A
gente sai do nosso pedaço, vem até onde todo
mundo diz que tem as minas mais bacanas e
88
volta de mão abanando!!! Pô, que merda!!!

JORGINHO – Pô, Pedrão, não fica assim...

PEDRÃO – Não fica como? Porra, Jorginho, você é


meu mano, cara, meu chapa, meu melhor amigo,
mas desculpa aí. Hoje eu queria trepar, entendeu?

JORGINHO – Trepar?

PEDRÃO – É. Foder. Dar uma metida. Um fincão.


Um picote. Trocar o óleo. Bimbar. Passar a régua.
Pitocar. Fazer neném, fazer fuque-fuque, fazer
totinha... Caralho, eu só queria tre-par!!!

JORGINHO – Perder o cabaço!

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PEDRÃO – Quê? Não, isso não...

JORGINHO – Eu sou cabaço, Pedrão. Nunca saí


com mulher nenhuma. E você também, eu tô
achando que você ó... é fogo de palha...

PEDRÃO – Tá é muito enganado.

Trovão, relâmpagos.

JORGINHO – Xiiii, vai chover....

PEDRÃO – Já tá chovendo lá pros nossos lados.


Olha lá longe os raios.

JORGINHO – Tomara que não dê enchente. 89

PEDRÃO – Vira essa boca pra lá.

JORGINHO – Mas é! Lá na minha rua, neguinho


deu um espirro, pronto, inunda tudo. Maior merda.

Começa a chuva forte.

PEDRÃO – Inundação! Era só o que faltava. Saí


de casa, perdi tempo, não comi ninguém e ainda
volto pra casa com um macho! Não me faltava
mais nada, faltava? Hein? Faltava? (o carro para
de repente) Que é que foi? Que merda é essa?
(Tenta ligar o carro) Pega, filho da puta! Pega!!!
(carro não funciona).

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JORGINHO – E agora?

PEDRÃO – Tem que descer pra empurrar.

JORGINHO – Nessa chuva?!

PEDRÃO – Não. Espera melhorar o tempo! Cla-


ro que é nessa chuva, mané, já pensou se vem
um carro e.... (buzina, luzes, barulho de ônibus,
freada brusca)

MOTORISTA DE ÔNIBUS (Off) – Ô seu corno,


tira essa lata velha do caminho! (arrancada do
ônibus; espirra água no carro)
90
JORGINHO – Melhor descer e empurrar...

Descem e empurram com dificuldade. Chove


muito. Conversam aos gritos.

JORGINHO – pra onde a gente vai?

PEDRÃO – Quê?!

JORGINHO – pra onde a gente vai?

PEDRÃO – Vamos entrar ali, ó... (letreiro lumi-


noso) Ih, caralho....

JORGINHO – Que que foi?

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PEDRÃO – É um drive-in.

JORGINHO – E daí?

PEDRÃO – Tem graça, dois machos entrarem


num drive-in...

JORGINHO – Tá chovendo lá dentro?

PEDRÃO – Não...

JORGINHO – Então, não enche o saco.

Entram. Estacionam o carro. Jorginho sai. Volta


com duas coca-colas. Entra no carro.

PEDRÃO – Coca-cola? 91

JORGINHO – Não tem nada alcoólico. Eu per-


guntei. Na TV do cara deu que a nossa região tá
toda inundada. Não tem como chegar lá. Pelo
menos enquanto estiver chovendo.

PEDRÃO – Bosta. Merda. Caralho. Puta que pa-


riu. Cacete.

JORGINHO – Pô, Pedrão, calma aí...

PEDRÃO – Terminar a noite num drive-in com um


macho tomando coca-cola! Porra, que merda!!!
(banco cai) Hã... Que é isso? Bom, pelo menos o
banco dessa lata-velha deita!

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JORGINHO – É mesmo! (inclina seu banco) Já dá
pra ficar mais confortável.

PEDRÃO – Belo conforto. (vira de lado, de costas


pra Jorginho)

JORGINHO – Vou ligar o rádio.

PEDRÃO – Liga o que você quiser.

JORGINHO – Pô, musiquinha esperta. O barulhi-


nho da chuva. Não tá tão ruim.

Jorginho vira-se de lado, voltado para o amigo.


92
Aproxima-se. O outro se afasta. Ele se aproxima
de novo. O outro se afasta. Ele se aproxima.

PEDRÃO – Qual é, Jorginho?

JORGINHO – Relaxa, Pedrão. Curte o som. Ouve


a chuvinha caindo! Gostosa....

PEDRÃO – Jorginho, olha esse dedo bobo aí, cara!

JORGINHO – Ah, vá, Pedrão! Você queria tanto


trepar!

PEDRÃO – Não desvirtua minhas palavras!

JORGINHO – Relaxa, cara, relaxa...

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PEDRÃO – Nem vem, Jorginho! Nem vem!

JORGINHO – Pô, Pedrão! Tamo só nós dois aqui,


veio!

PEDRÃO – E daí?

JORGINHO – Daí que eu não vou contar pra


ninguém.

Pausa. Jorginho se encosta mais e Pedrão já não


se afasta.

JORGINHO – E aí?

PEDRÃO (conformado) – Fazer o quê, né? O 93


drive-in já tá pago mesmo!

BLACK-OUT

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Claquete

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O Carro – da Peça ao Roteiro

Temos o edital de telefilmes. Quer ir ver amanhã


comigo a peça Carro de Paulista, com este fim?

O e-mail (postado no dia 10 de outubro de 2008)


era do cineasta e amigo Ricardo Pinto e Silva. A
gente trabalhava na época na reformulação do
roteiro do longa-metragem Dores & Amores.
E também em busca de um novo projeto. Uma
das possibilidades era um edital de telefilmes
para a TV Cultura com o tema São Paulo, Essa
Metrópole. A idéia era assistir à peça e verificar
se seria adaptável para a tela da TV.
95
Até aquele e-mail, eu nunca tinha ouvido falar
de Carro de Paulista. Muito menos que era uma
peça com tantos anos em cartaz. A sinopse me
animou. Carro era uma comédia leve, longe do
papo cabeça. Ri muito com ela. Adorei o esforço
cômico daqueles quatro homens e uma mulher
contracenando com um carro imaginário. Saí de
lá com idéias na cabeça para a adaptação.

Na segunda feira eu estava com o texto da peça


de Mario Viana e Alessandro Marson num arqui-
vo PDF. Li a peça, pensei bem na sua estrutura,
anotei mentalmente o que deveria ser cortado
e o que poderia ser ampliado. Tudo o que eu

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pude preservar do texto original eu preservei.
Não se deve mexer muito num texto vencedor.

As principais mudanças:

1) A tarefa mais urgente foi limpar a peça de seus


muitos palavrões. Elas cabem perfeitamente num
palco, mas não num telefilme de emissora aberta.
Tornei a cena final com Jorginho e Pedrão menos
explícita e mais sutil pela mesma razão.

2) No palco, os quatro personagens masculinos


estão quase o tempo todo juntos, gritando
uns com os outros e se exibindo como galos
da mesma granja. No roteiro foi possível de-
96
senvolver um pouco mais as personalidades
de cada um deles em cenas mais intimistas.
Desde a primeira vez que assisti à peça achei
o Pedrão um personagem fascinante, que me
lembrava o imortal Carlos Bronco Dinossauro
de Ronald Golias. Um líder que ninguém segue,
um malandro que faz tudo errado. No roteiro,
explorei um pouco mais seu lado blefador (na
cena do Club, quando todos dizem que vieram
da zona leste, Pedrão diz que é do Morumbi).
Jorginho continua um cara bastante indeciso
sobre sua própria sexualidade sufocado pela
mãe possessiva. No filme pudemos desenvolver
a relação com a prima Lua, que o desafia a ser
homem. Gilvanilson Junior continua um bobo

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quando se junta com os amigos (homens são
assim mesmo). Mas se revela um sedutor de
primeira com a Mina da Injeção. Leva jeito com
as mulheres e mostra com elas uma maturidade
que abandona na balada. O hippie Raio de Sol
no filme ficou mais malandro. Com sua conversa
sobre budismo tibetano e limpeza de carma, ele
conquista a mulher mais cobiçada.

4) Das 3 personagens femininas da peça (in-


terpretadas por uma única atriz), uma ficou
praticamente igual: a Hostess. Mas a Mina da
Injeção cresceu e faz uma cena bem erótica
com Gilvanilson na cabina de farmacêutico. A
Prostituta ganhou nome (Kelly de noite, Grace 97
de dia, numa das boas idéias do colaborador
no roteiro Ricardo Pinto e Silva). Grace/Kelly
também cresceu como personagem no seu
não menos bizarro relacionamento com Raio
de Sol.

5) Alguns personagens são apenas citados na


peça e se materializaram no telefilme. Como
Raio de Lua, a provocativa irmã de Raio de Sol
e prima de Jorginho. Como toda a ação dramá-
tica da peça é iniciada por Reinaldo, o primo de
Pedrão (com o empréstimo do carro), eu abri
o roteiro com ele. É a primeira cena do filme:
Reinaldo, balançando a chave do carro para a
câmera. Esta abertura serviu para estabelecer

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a foco da ação: ganhe as mulheres que quiser,
mas devolva o carro inteiro. As mães de Raio
de Sol e Jorginho, apenas sugeridas na peça,
também ganharam vida na adaptação. A cena
em que Jorginho encontra a mãe e a tia num
bar de lésbicas foi inspirada por uma experi-
ência real acontecida comigo e dois amigos.
Outro que adquiriu personalidade própria foi
seu Bibi, o paranóico dono de farmácia e pa-
trão de Junior.

Outras mudanças da peça para o filme foram


mais estruturais. No palco, a ação é linear. A pla-
teia acompanha as aventuras dos rapazes como
98
se estivesse o tempo todo com eles. No filme eu
pude (especialmente na metade final) alternar
entre sequências que aconteciam em lugares
diferentes. Outro aspecto importante: na peça,
o único objeto em cena é um carro esquemático
feito de madeira. No filme, a cidade de São Paulo
aparece como personagem. É uma cidade exótica
para quem não costuma sair da zona leste.

Com o aperto no prazo do edital, entreguei as 52


páginas da primeira versão do roteiro em 11 dias.
O script seria, claro, muito modificado durante as
filmagens pelo diretor e também pelos cacos dos
atores. Quando o telefilme foi ao ar no fim do ano
seguinte, a gente já estava pensando na criação de
uma série Carro de Paulista. Onde os personagens

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mostrariam ainda mais nuanças de personalidade
e possibilidades de ação. Para quem achava que a
peça de Viana & Marson era um simples besteirol,
suas criaturas se revelam cada vez mais complexas
e dramaticamente promissoras.

Dagomir Marquezi
DM – SP – 09 junho 2010 – 04:52

99

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Ricardo Pinto e Silva

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Carro de Paulista na TV

Quando a Secretaria de Estado da Cultura de São


Paulo institui, em setembro de 2008, o concurso
para a produção de Telefilmes inéditos, o Edital
ProAc n° 6, Programa de Ação Cultural, em ce-
rimônia na sede da Secretaria, surgiu o impulso
em participar, com empolgação, mas com uma
amarra: o concurso estabelecia um tema: São
Paulo essa Metrópole. De todas as ideias, sinop-
ses e roteiros que eu já tinha trabalho e que,
prontos, aguardavam por uma oportunidade
de fomento, talvez nada fosse especificamente
enquadrado no tema sugerido. E o prázo para 101
inscrições seria curto, de 12 de setembro a 29 de
outubro de 2008. A realização deveria ser feita e
o telefilme entregue até 31 de outubro de 2009.

O que mais me atraiu e, posteriormente, de-


monstrou ser o melhor modelo de produção
que possa existir para um cineasta, foi o fato
de o Edital contemplar com 100% dos custos de
produção por intermédio da verba do concurso,
acrescido dos benefícios da parceria estabelecida
com a TV Cultura, mantida pela Fundação Padre
Anchieta, a saber: o uso de 12 diárias de estú-
dios, equipamentos de câmera e iluminação e
a garantia da exibição no final do ano de 2009.

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Ibirapuera

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E assim foi. Saindo da cerimônia na sede da
Secretaria, no bairro da Luz, no centro de São
Paulo, comecei a olhar ao redor: a Estação Fer-
roviária, o Viaduto do Chá, o Anhangabaú, a
23 de maio. E me perguntei : que história se
passaria por aquelas ruas. Ao checar em casa,
no bairro da Vila Progredior, nos arredores do
Butantã, já tinha me lembrado da sinopse que
vez ou outra via publicada na seção de roteiro
de teatro: Carro de Paulista.

Pesquisei e descobri que a peça de Mario Viana e


Alessandro Marson ainda se mantinha em cartaz
e percebi do que se tratava: um sucesso cultua-
do por plateias adolescentes há mais de 6 anos 103
em cartaz (e permanece anda hoje, em 2010)
com sessão para o próximo sábado. Fui assistir
e achei ótima, divertida e adequada para o meu
próximo projeto. Na semana seguinte procurei o
Mario Sergio Loschiavo, produtor teatral, solici-
tei convites e voltei acompanhado do roteirista
Dagomir Marquezi, já tendo contatado, durante
a semana, o co-autor Mário Viana e exposto
nossa intenção. Mário prontamente assinalou
sua concordância para a inscrição do seu texto
visando ao concurso mas alertou, que nem ele,
nem o Alessandro Marson, ambos com contratos
em vigor com outras emissoras, poderiam partici-
par da adaptação. Com o Dagomir ao meu lado,

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Estação da Luz

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em poucas semanas, estávamos escrevendo o
roteiro e o texto de defesa do Carro de Paulista.

Todo edital segue um mesmo tipo de estrutura


e nos exige o roteiro, o orçamento, o plano de
trabalho e, entre o material a ser entregue para
sua avaliação, o texto de apresentação, onde o
proponente expõe seus objetivos e a justificativa
para a realização daquela ideia. Auxiliado pelo
Dagomir, escrevemos as poucas páginas, que se
mostrariam eficiente para a nossa futura seleção
para as fases seguintes de seleção e contratação
do concurso de Telefilmes:

Carro de Paulista conta a divertida história de


105
quatro jovens da zona leste de São Paulo que
saem de carro em um sábado à noite dispostos
a paquerar meninas dos Jardins, bairro nobre da
capital paulista.

Esse é o início de uma série de aventuras hila-


riantes pela noite da cidade. Desavisados, e des-
conhecendo os códigos locais, Pedrão, Jorginho,
Júnior e Raio de Sol encontram muita confusão
pelo caminho, nesta comédia de linguajar api-
mentado e ritmo de videoclip.

Objetivos
Nosso objetivo é a produção e comercialização
de um telefilme, no formato HD, cor, 1.1.85, som

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digital, com a duração de 52 minutos, gênero
comédia e classificação etária para 12 anos. A
direção estará a cargo do cineasta Ricardo Pinto
e Silva. Realizamos a primeira etapa do projeto
entre março e abril de 2009 e finalizaremos para
levá-lo ao ar em outubro.

Abordagem e Justificativa
O roteiro do telefilme CARRO DE PAULISTA é
baseado na comédia teatral de Mário Viana e
Alessandro Marson, que faz sucesso há 6 anos
nos palcos paulistas.

Ao nos determos sobre os dados do mercado


audiovisual no Brasil, temos frequentemente
106
constatado que a dicotomia diversão/buscas
de informação é o que motiva o espectador a
escolher, entre as centenas de filmes lançados
anualmente, o seu filme preferido. Em atenção
aos hábitos de consumo de produtos audiovi-
suais é que selecionamos a comédia CARRO DE
PAULISTA.

As comédias humor ácido têm obtido excelente


receptividade de público, alcançando as me-
lhores médias de espectadores entre todos os
gêneros. Elas satisfazem ao público que prefere
ver filmes com a premissa de entreter-se, antes
ou acima do interesse de informar-se; que vem a
ser a motivação básica daqueles que procuram o

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Fabio Neppo

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segmento do cinema de arte. Nossas plateias são
cada vez mais jovens, sendo assim constituídas:

Público-alvo – Salas de Exibição Tradicionais

Classes Sociais; A/B 49%; C 23%; D/E 9%

Faixas Etárias: 12-17 anos 34%; 18 a 24 anos 40%;


25-44 anos 26%; 45 anos e mais 14%.

Sexos: equilibra-se o número de espectadores


por sexo, mas a decisão de escolha é predomi-
nante com o público feminino. Fonte: TGI Ibope
(fev-jul/2005)

108 Apontaríamos, portanto, a adequação de nosso


projeto ao público jovem e adulto, entre 12 e 40
anos, de todas as classes sociais, que têm presti-
giado produções nacionais de alto padrão artísti-
co e fácil comunicação, qualificando-o como um
provável filme de grande popularidade.

O desejo de ascensão social, o conformismo, o


ar perdido e submisso e a cultura alternativa dos
personagens são alguns dos aspectos reconhe-
cíveis no universo de Office-boys, estudantes,
rappers e outros jovens que percorrem diaria-
mente a Cidade de São Paulo, fazendo com que
boa parte do público também possa identificar-
se com os personagens da comédia.

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Achamos que o audiovisual deve entreter e edu-
car. E expandir as suas fronteiras.

Esta é a nossa meta com o projeto CARRO DE


PAULISTA. O jornalista e dramaturgo Dagomir
Marquezi também está engajado no projeto
colaborando na versão final do roteiro.

A adolescência e os espaços urbanos


São Paulo não é só uma grande metrópole.
Representa vários mundos diferentes que mal
se cruzam. Ao contrário do Rio de Janeiro ou
outras capitais, a própria geografia esparramada
da capital paulista deixa suas regiões distantes
e isoladas umas das outras. Um habitante da
109
zona norte pode passar seus dias trabalhando
e se divertindo na mesma região. A zona leste
da cidade apresenta a mesma característica.
É uma região com vida e linguagem próprias.
Possui baixo índice de desenvolvimento social e
econômico, mas nada que se compare à miséria
abissal do extremo sul da cidade. Sua paisagem
não atrai ninguém pela beleza, mas a zona leste
possui sua própria cultura e por que não dizer,
seu charme característico.

Quando os personagens de Carro de Paulista


decidem ganhar mulher nos Jardins, estão dando
um salto muito maior do que suas pernas. Eles
são submetidos a um choque social e cultural que

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Tadeu, Rodolfo e Dagomir Marquezi

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geram situações trágicas para uns e boas opor-
tunidades para os outros. Por não entenderem
o novo mundo que exploram, correm riscos – e
percorrem no carro emprestado os duros cami-
nhos do amadurecimento.

Nessa aventura por um mundo desconhecido, o


mais ansioso (Pedrão) acaba sendo o mais frus-
trado. E o que viaja sem querer (Raio de Sol) é o
mais recompensado. Nessa contradição, aquele
que está mais aberto à vida ganha mais dela.

Pedrão simboliza o adolescente com os hormô-


nios em chamas, obcecado por conquistar uma
mulher. O desespero em ser recompensado se- 111
xualmente o transforma em um desastre ambu-
lante, principalmente pela pretensão de querer
conquistar uma garota de outra classe social. A
busca dessa fêmea em território hostil acaba com
o próprio prazer da sexualidade. Para Pedrão, a
conquista é tudo. A mulher é nada.

No outro extremo, Raio de Sol é o adolescente


que quer sair apenas para tomar um sorvete, mas
que conquista uma mulher pela sua inocência e
sinceridade. Ironicamente, o pirralho Raio é o
único que já teve uma experiência sexual. E por
não estar tão obcecado em sexo, é o único que
conquista alguém.

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Os outros dois personagens são os que mais se
prendem ao universo da zona leste. Junior volta
para casa com uma mulher que ele já conhecia
da farmácia onde trabalha. E Jorginho pede o
tempo todo para retornar por estar ainda preso
à rede de proteção maternal.

Carro de Paulista trata metaforicamente a di-


ferença entre a zona leste e os Jardins como a
distância entre a adolescência e a maturidade.
Nesse salto, nem sempre o mais preparado é o
mais ansioso e o mais pretensioso. Os inimigos
que eles colecionam pelo caminho (a hostess, os
garotos de programa, a garota do ponto) são a
112
representação de seus próprios fantasmas pesso-
ais numa fase conturbada da vida. Representam
também os elementos de hostilidade num mun-
do que não pertence a eles. Vai ter quermesse
na Vila (como lembra Jorginho) é a esperança
da volta ao confortável mundo de onde vieram,
mas que precisam abandonar nem que seja por
uma única noite se quiserem crescer.

Após a primeira etapa de habilitação e seleção


dos projetos, ficamos entre os dez pré-selecio-
nados e tivemos que fazer a sua defesa oral,
em pitching perante a comissão que escolheria
os quatro projetos que seriam produzidos. Para
esta últma etapa me preparei com a elaboração
de uma apresentação visual do projeto, já tendo

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discutido com a equipe que formei para o filme,
que me ajudou a treinar a defesa oral: o autor
Mário Viana, a diretora de fotografia Kátia Coe-
lho, a assistente de direção Claudia Pinheiro (que
posteriormente não poderia fazer o projeto, por
coincidir com a data de filmagem de seu primei-
ro filme) e o companheiro e roteirista Dagomir
Marquezi. Não esteve presente o diretor de arte
e figurinista Luis Carlos Rossi, mas já tinha falado
com ele longamente.

Faltava retornar à zona leste para tirar fotos,


visando à apresentação do pitching. Peguei um
ônibus do Butantã até a Estação Santa Cruz
do metrô e fui até o final da linha vermelha, 113
em Itaquera, por sugestão do Dagomir, que
já tinha feito a travessia quando realizou uma
reportagem sobre todas as estações do Metrô
e arredores para uma revista. Parti para minha
viagem de ambientação na zona leste. Foram um
sábado e um domingo reveladores. Sem ter po-
dido contar com a ajuda de meus colaboradores,
decidi fotografar com a câmera do meu celular,
o que se revelou muito oportuno para poder
obter, dissimuladamente, vários registros sobre
os jovens na zona leste, a ZL, sem importuná-los.

Menos de um ano depois, chegaria a TV o te-


lefilme Carro de Paulista, realizado em apenas
12 diárias de filmagens, com muitas noites frias

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Tadeu, Fabio, Ricardo, Thiago

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e divertidas, marcando a vida da nossa equipe
e elenco, com a inesquecível experiência de
revelação das faces de nossa metrópole e sua
desvairada juventude.

A todos os companheiros desta aventura, meu


muito obrigado.

Ricardo Pinto e Silva


São Paulo, 29 de julho de 2010

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Carro Paulista V4

Roteiro de Dagomir Marquezi.

Com a colaboração de Ricardo Pinto e Silva.

Baseado na peça teatral de Mário Viana e Ales-


sandro Marson.

Zabumba Cinema e Video Ltda.

1 EXT. DIA – RUA ZONA LESTE – PENHA


1
Em superclose numa cena desfocada, surge len-
tamente uma chave de carro num chaveiro. A 117
chave brilha em slow motion, como um objeto
mágico. Ela está sendo oferecida por REINAL-
DO ao seu primo mais novo, PEDRÃO. Pedrão
arregala os olhos, que se movem em direção ao
carro oferecido por Reinaldo. O carrão vermelho
brilha ao sol em todos seus detalhes restaurados.

REINALDO
Você quer, Pedrão? Eu não vou usar. Vou
ficar em casa o sabadão inteiro.

PEDRÃO
Primo, cê tá falando sério?! Esse carrão?
Na minha mão?!

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Marco Furlan

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REINALDO
Quer ou não quer?

PEDRÃO
Mas é claro, Reinaldão!

REINALDO
Primo Pedro, esse carro não é meu. É
de um cliente lá da oficina. O cara vem
buscar na segunda-feira. Eu te empresto
com duas condição: devolve com alguma
gasolina, e no estado que eu estou te
entregando. E bico calado!

PEDRÃO
119
Um túmulo! E a barca vai voltar melhor
do que foi!

REINALDO
Menos, Pedrão. E bota nessa cachola: eu
vou ficar muito, mas muito, mas muito
boladão mesmo se esse carro voltar com
um risquinho ou um amassado, por me-
nor que seja. Estamos entendidos?

PEDRÃO
Dexa comigo, Reinaldão! Eu nem vou
beber nem água pra não ter erro.

Reinaldo entrega a chave para o Pedrão, que

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Tadeu Pinheiro

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a recebe com os olhos arregalados pelo êxtase.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 2.

REINALDO (MALICIOSO)
Então, é hoje primo!

Reinaldo ri e Pedro corresponde animado.

2 EXT. DIA – FRENTE DE FARMÁCIA 2


Imagem do movimento na rua.

3 INT. DIA – FARMÁCIA 3


O telefone toca. DONO DA FARMÁCIA atende.
121

SEU BIBI

Drogaria Bifarma, boa tarde, Bibi falando, em


que posso ser útil? O Junior está aplicando nesse
momento, quem gostaria?

4 INT. DIA – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 4


Uma SENHORA de idade faz cara de alívio e
quase prázer. JUNIOR termina de aplicar uma
injeção.

SENHORA DA INJEÇÃO
Mmmm... Você está ainda melhor, Gil-
vanilson.

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JUNIOR
Junior. (sai de trás da senhora com a se-
ringa vazia na mão) Meu nome é Junior!

SEU BIBI (OFF)


Gilvanilson, telefone!

SENHORA DA INJEÇÃO
Eu não troco de aplicador nem morta!
Você é o melhor da zona leste, Gilvanilson!

5 INT. DIA – FARMÁCIA 5


Junior e a senhora saem da sala. Ela passa a
Junior uma nota de 2 reais amassada com uma
122 piscadinha. O Seu Bibi dá um sorriso de agra-
decimento à freguesa, que sai. Olha feio para
Junior e passa o telefone.

SEU BIBI
Telefone pra você, Gilvanilson. Eu já te
disse que aqui não é

(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 3.

SEU BIBI (...CONT.)


lugar para papinhos particulares. Você
sabe: coisas acontecem...

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Fabio Neppo

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JUNIOR
Pode deixar, seu Bibi. (Atende) Alô?

ALTERNA COM

6 EXT. DIA – VIADUTO ARICANDUVA – ZONA


LESTE 6
Pedrão dirige o carro do primo com uma lata de
cerveja numa mão e um celular na outra.

PEDRÃO
Tamo motorizado, mano! É hoje que a gen-
te vai ganhar uma porrada de mulheres!

Um GUARDA DE TRÂNSITO emparelha sua mo-


124
tocicleta com o carro de Pedrão, encarando-o.
Ele para de beber.

JUNIOR
U-hú! Tô nessa! Vai chamar o bundão do
Jorginho também?

O guarda encara novamente, Pedrão para de


falar, afasta o celular e sorri amarelo para o
guarda. O guarda acelera.

7 INT. DIA – FARMÁCIA 7


Na FARMÁCIA, reação de Junior sem entender
o súbito silêncio do amigo. Seu Bibi o encara,
desconfiado.

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8 EXT.DIA – CASA JORGINHO 8
Fachada da casa. RAIO DE SOL descarrega um
cesto de legumes frescos de um carro muito
estropiado.

9 EXT.DIA – CASA JORGINHO (COZINHA) 9


A MÃE DE JORGINHO abre uma sacola com hor-
taliças e frutas que a MÃE DE RAIO trouxe. RAIO
DE LUA a cumprimenta, com beijos.

MÃE DE JORGINHO
Tudo bem, com você, De Lua? Cadê o Sol?

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 4. 125

RAIO DE LUA
Tá pegando mais cenouras no carro, tia.

MÃE DE RAIO
É tudo orgânico...nós que plantamos!

Telefone toca, Lua corre para atender.

RAIO DE LUA
É pro Jorginho. A cobrar...Ele tá lá em
cima?

Mãe de Raio faz cara feia e berra com o andar


superior.

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MÃE DE JORGINHO
Jorginho!! Telefone! Atende e vai logo
que eu preciso usar! (Para a irmã) Esse
menino não tem um amigo que preste.
(Para Lua) Você leva pra ele?

10 INT. DIA – CASA JORGINHO (ESCADA) 10


Lua sobe correndo e para na porta do banheiro.
Escuta um som estranho, respiração afobada,
pequenos gemidos.

11 INT. DIA – CASA JORGINHO (BANHEIRO) 11


JORGINHO faz uma série de flexões de braço,
de pontacabeça, sem camisa. A cada contagem,
126 geme. A prima abre a porta.

JORGINHO
Pô, num sabe batê não?!

RAIO DE LUA
Atende aí, primo bundão. Atrapalhei a
malhação?

Lua cutuca a barriga de Jorginho que, com có-


cegas, sobe na privada, refugiando-se dela. Lua
o provoca, estende a mão com o telefone.

RAIO DE LUA
É um daqueles seus amigos que sua mãe
adora.

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JORGINHO
Me dá...

Jorginho tenta pegar o telefone, Lua o afasta,


virando o bumbum para ele.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 5.

RAIO DE LUA
Não dou... (sorrindo com malícia) Tá fi-
cando fortinho hein, primo?

JORGINHO (ARRANCA O TELEFONE)


Não enche, sua pentelha! (Senta na pri-
127
vada) Alô? Fala Pedrão. Carro? Hoje?!
Mmmmm... Preciso perguntar se eu posso.

RAIO DE LUA (SENTA NA BANHEIRA)


Tá confirmado: é bundão!

12 EXT. DIA – ZONA LESTE 12


CRÉDITOS ABERTURA
Com MÚSICA TEMA destaque para o carro diri-
gido por Pedrão.
Primeiro bem em destaque, vai misturando-se
ao trânsito.
CLIPE de imagens rápidas mostrando os manos e
as minas da zona leste. Mostra também marcos
da região, placas de trânsito, imagens do metrô

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Gabriella e Thiago Catelani

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Thiago Catelani

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e do trem, lugares badalados, lugares bonitos
da zona leste.
CRÉDITOS

13 EXT. DIA – PRÁÇA SÍLVIO ROMERO 13


Do clipe, voltamos a destacar o carro de Pedrão.
Ele dá voltas na praça Sílvio Romero, olha as
minas, paquera, exibindo o carrão. Elas sorriem
de volta. Estaciona o carro em frente à farmácia
e surge Junior, de camiseta, crachá. Os dois se
cumprimentam com uma longa sequência de
sinais particulares (soquinhos, tapinhas, cotove-
ladas) do tipo high-5.

130 JUNIOR
Mas que beleza de carango, hein Pedrão?
Carro de patrão! É hoje que nois se dá bem!

PEDRÃO
Nóis se dá bem? Nois? Eu pode ser, mas
você com essa ropa de maloqueiro não
sei não.

JUNIOR
Eu me garanto, Pedrão. Hoje rola mulher
pro Juninho aqui!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 6.

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PEDRÃO
Você eu não sei. Mas eu não durmo sozi-
nho hoje. Juro.

Junior entra no carro. Pedrão parte cantando


os pneus.

14 EXT. DIA RUAS ZONA LESTE 14


Imagens do carro acima da velocidade permitida.

15 INT. DIA – RADIAL LESTE – METRO CARRÃO


– CHROMA 15
Pedrão e Júnior cantam a música tema.
131
16 EXT. DIA – FRENTE CASA DE JORGINHO 16
O carro para, Pedrão e Junior descem, anima-
dões. Pedrão toca a campainha.

PASSAGEM DE TEMPO
Pedrão e Junior ainda esperam, desanimados,
encostados no carrão..

JUNIOR
O cara não desce! Desse jeito vai ficar
muito tarde pra sair, tá ligado?

PEDRÃO
Dá um tempo, Gilvanilson!

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JUNIOR
Não me chama de Gilvanilson, mano!
Meu nome é Júnior! Júnior, tá ligado?

PEDRÃO
Então tá, Gil...nior. Mas amanhã é do-
mingo.

JUNIOR
Amanha tem plantão na farmácia, tá
ligado? Deu seis e meia, pá! Zoião aceso.

Jorginho sai de casa meio enfezado e circula o carro.

JORGINHO
132
Cadê as minas?

PEDRÃO
Que minas?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 7.

JORGINHO
Você falou que a gente ia sair com umas
minas aí.

JUNIOR
E a princesa queria que a gente já chegasse
com as minas na sua casa? Tipo delivery?

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PEDRÃO
Vamo embarcar logo, Jorginho. É hoje!
Tô sentindo!

JORGINHO
Eu não vou.

JUNIOR
Como é que é, mano?!

JORGINHO
Minha mãe é osso.

PEDRÃO
Ela não deixou você ir?
133

JORGINHO
Só se levar meu primo.

JUNIOR
Que primo, mano?

JORGINHO
As pessoas têm primo, Júnior. É assim, a
minha mãe tem uma irmã, ela veio visitar
nois no fim de semana...

PEDRÃO
Tá! Não precisa explicar! Esse primo é o
Raio de Lua?

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Thiago

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JORGINHO
Raio de Lua é a minha prima. O meu pri-
mo é o Raio de Sol.

JUNIOR
Esse moleque é o maior pentelho! Por
que a gente não leva sua prima, que é
mó gostosa?

PEDRÃO
Eu quero catar umas minas, não virar
babá de filho de hippie.

JORGINHO
Por isso que eu não vou. Minha mãe vai 135

sair com a mãe dele. E a

(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 8.

JORGINHO (...CONT.)
De Lua é a queridinha da família, e aí
sobrou pra mim...

Raio de Sol aparece todo alegre.

RAIO DE SOL
Que carrão! É nesse que a gente vai sair?

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Rodolfo Valente

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PEDRÃO
Sai daí pivete! Não encosta!

RAIO DE SOL
Onde a gente vai? Na sorveteria?

JORGINHO
Não! Minha mãe não deixa eu tomar
sorvete de noite.

RAIO DE SOL
Diz aí, PEDRÃO – aonde a gente vai com
esse carrão?

PEDRÃO 137
Num puteiro. Zona, açougue, inferninho,
prostíbolo, bordel...

RAIO DE SOL
Em prostíbulo eu não vou não.

JUNIOR
Alem de hippie é boiola?

RAIO DE SOL
O ato sexual é uma troca de energia entre
duas pessoas. Quando a gente troca ener-
gia vital com alguém que não conhece,
isso prejudica o nosso carma.

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Thiago e Tadeu

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PEDRÃO
Então faz o seguinte, pirralho: fica em
casa, põe um pijaminha, vai pra cama e
deixa os adultos divertir-se.

Raio de Sol se conforma, fecha o portão e cami-


nha de volta para a casa. Disfarçadamente saca
um bolinho de notas.

RAIO DE SOL
Tá legal... Pô, que chato. Justo hoje que
minha mãe me deu um monte de grana
pra sair com vocês.

Junior, Pedrão e Jorginho olham para Raio de


Sol. Eles pulam o portão e invadem o jardim. 139

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 9.

PEDRÃO
Pera lá! Dexa o pijaminha na gaveta! Tá
na hora do meninão sair com os adultos!

Eles põem o menino nos ombros do primo. A


Mãe de Jorginho põe a cabeça para fora da
janela no andar de cima.

MÃE DE JORGINHO
Jorginho! Cuidado com seu primo. Eu te
amo, Nê!.

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Mãe joga casaco para Jorginho, que cai na sua ca-
beça. Ele começa a sair, a mãe espera a resposta.

MÃE DE JORGINHO
Jorginho?...

JORGINHO
Eu também te amo, mãe...

Risadas contidas dos outros três. Por trás da mãe de


Jorginho aparece Lua, apontando para Jorginho e
movendo os lábios para dizer sem som: Bundão!

17 EXT. FIM DE TARDE – RADIAL LESTE/CHROMA 17


Pedrão dirige com Jorginho ao lado. No banco
140
de trás, Junior e Raio de Sol.

RAIO DE SOL
... mas se vocês forem no bordel, eu não
vou! E nem pago!

PEDRÃO
A gente vai aonde você quiser, ô magnata!

JUNIOR
É, mano! Com essa grana toda a gente te
leva até pro Parque da Mônica!

PEDRÃO (RINDO EXAGERADAMENTE)


Boa! Boa! Boa!

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JORGINHO
Toma cuidado com a direção, veio!

PEDRÃO
Qualé, mano? Tu tá querendo dizer que
eu não sei dirigir?

O carro muda de faixa, quase bate em outro, ao


voltar para sua faixa dá uma fechada em outro
carro, todos buzinam e se xingam.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 10.

RAIO DE SOL
A gasolina tá acabando... 141

PEDRÃO
Quê?!

RAIO DE SOL
Tem aquele posto ali. É bom parar.

PEDRÃO
Eu paro quando eu decidir moleque!

RAIO DE SOL
Eu dou 20 pilas para a gasolina.

PEDRÃO
Tá decidido.

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18 EXT. ENTARDECER – POSTO DE GASOLINA 1
ZONA LESTE 18
Imediatamente o carro sai da pista (provocan-
do mais protestos de outros motoristas, com as
buzinas e as xingações).
O carro já está sendo abastecido e os quatro estão
fora dele, cada um com uma latinha de cerveja
(Raio de Sol com suquinho). Uma FRENTISTA
Raimunda de calça justa, atende os manos.

JORGINHO
Sério, pra onde a gente vai? Tem quer-
messe na Vila Matilde!

142 PEDRÃO
Mas você pensa pequeno, né Jorginho?
Nós vai pros Jardins encher essa barca de
mulher fina, saca?

JUNIOR
Jardins? Ueba!!!

JORGINHO
Aí, mano, Jardins é longe pra caramba!

PEDRÃO
Longe pra quem vai de buzão. De carro
a gente vai num minuto.É Radial e Mar-
ginal. Pá e bola.

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Rodolfo, Janaína e Fábio

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(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 11.

JORGINHO
Se é só pra catar mulher, tá cheio de gor-
delícia aqui na ZL.

PEDRÃO
Ê pobreza! Vai querer comparar?! Mulher
dos jardins tem cabelinho loiro, franjinha,
calça jeans justinha, peitinhos empinadi-
nhos... Não é esse cadáver com cheiro de
ônibus da Vila Formosa!

144 JUNIOR
As minas do Tatuapé acham que têm o
rei na barriga. E depois você vai ver, elas
são de Itaquera, Itaim Paulista, Jardim
Castelo... Só pra chegar no Tatuapé elas
pega uns três bumbas.

Frentista entrega a chave, Pedrão, Junior e Jorgi-


nho entram eufóricos e excitados no carro. Raio
de Sol paga o frentista, depois também entra no
carro. O carro sai cantando pneu.

19 EXT. ENTARDECER/NOITE – ZONA LESTE 19


Várias passagens mostram o carro e pontos de
vista da ZL, câmera acelerada. Música Tema.

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20 EXT. NOITE – POSTO DE GASOLINA 2 ZONA
LESTE OMITIDA 20

21 EXT. NOITE – AVENIDA 23 DE MAIO/CHROMA


21
Pedrão dirige invocado. Junior e Jorginho não
se importam.

PEDRÃO
Sabe o que tá faltando aqui? Bebum!
Breja! Quem paga uma rodada?

RAIO DE SOL
Você sabia que beber álcool também é
negativo pro carma? 145

PEDRÃO
Eu é que vou perder a carma contigo,
moleque. Eu quero cerva, que é bebida
de macho e só macho que sabe beber é
que ganha as minas! Você vai pagar umas
brejas lá nos Jardins, Banho de Lua!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 12.

RAIO DE SOL
Eu já paguei a gasolina.E meu nome é
Raio de Sol!

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JUNIOR
Eu tenho 30 (procura a gorjeta amassada)
e duas pilas pra noite inteira.

JORGINHO
Ganhou. Tenho 25.

Pedrão faz cara feia.

PEDRÃO
Você sai de casa com 25 reais? Como você
vai se divertir com 25 reais nos Jardins?

JORGINHO
Dá pra duas brejas e a condução de volta.
146

Jorginho liga o rádio.

ATOR RÁDIO (OFF)


Aí mano, precisa falar nada, mano... Aí,
mano: que ser gay, mano? Cê seje gay, tá
ligado? Aí mano, deixa eu falar, mano!

PEDRÃO (DESLIGA)
Quem mandou ligar o rádio? Cara fol-
gado... eu quem arrumei este carro, eu
quem mando...Fica ouvindo música em
vez de prestar atenção nas minas.... Es-
tamos na zona dos Jardins, macacada.
A partir de agora é temporada de caça.

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Novamente explodem em alegria, dão tiros
com os dedos para o alto. Entra a música tema,
instrumental.

22 EXT. NOITE – RUAS DA VILA MADALENA 22


Montagem (a la Jogo do Amor em Las Vegas) de
clip de passagem do carro por bares lotados, e
eles observam algumas LINDAS MULHERES nas
mesas das ruas. Alterna com diálogos soltos e
termina com a coreografia dos Manos cantando
o refrão da música. Imagens das minas achando
o grupo o fim da picada. Pagam o maior mico
na coreografia sem graça.
147
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 13.

JORGINHO
Nossa mano... Nunca vi tanta mina boa-
zuda...

JUNIOR
Mó gostosa...

PEDRÃO
Não te falei? Mina de Jardins é outro papo...

RAIO DE SOL
Aqui não é Jardins. É Vila Madalena.

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JORGINHO
Aqui dentro da barca ninguém tá vendo
a gente.

PEDRÃO
Temos que se expor lá fora.

JORGINHO
E o sereno?

PEDRÃO
A gente exibe o charme da zona leste pra
essa mulherada...

148 JORGINHO
Tô com frio...

JUNIOR
Cada breja custa 15 pau.

PEDRÃO
Nossa! Quinze pau?

JORGINHO
Vamos pra casa?

PEDRÃO
Vai te catar, meu! Se num enxerga não?
As minas tá tudo olhando pra nois!

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JORGINHO
Elas não estão olhando pra nós, Pedrão.
Elas tão rindo de nós.

Corta para mesinha onde estão Raio de Lua e


uma AMIGA.
Elas estão bem distantes dos quatro manos.
Amiga aponta para o grupo, que dança na rua.

AMIGA DA LUA
É seu irmão, Lua! E seu primo! Olha lá!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 14.
149
RAIO DE LUA (ESCONDE O
ROSTO, ENVERGONHADA)
Você tá enganada. Nunca vi esses palha-
ços na minha vida.

23 OMITIDA 23

24 EXT. NOITE – AVENIDA JARDINS/CHROMA 24


O carro segue. Pedrão está ainda mais bravo. Jor-
ginho, de agasalho, tira uma maçã embrulhada
em papel alumínio da pochete. Raio contempla
as ruas. Junior contrariado.

PEDRÃO
Noite mixa até agora...

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JUNIOR
Falei que a gente devia ter ido pra Sílvio
Romero, mano!

JORGINHO
Nem a menina que pede esmola olhou
pra nossa cara!

JUNIOR
Ainda bem. Tô sem trocado, tá ligado?

JORGINHO
Pelo menos era uma mulher falando com
a gente.
150
25 EXT.NOITE – RUA DA BOATE 25
Pedrão estaciona o carro de repente, dando um
susto em todo mundo.

JUNIOR
Vai com calma, mano! Tá maluco?!

PEDRÃO
Tá vendo aquela fila ali cheia de mulher?
É nessa fila que eu vou entrar. Quem vem
com o papai?

Ao fundo uma boate com uma extensa FILA.


15.

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26 EXT. NOITE – FRENTE DE DISCO 26
Com Pedrão na liderança, Junior e Jorginho, que
ajeita o agasalho, seguem o fim da fila, onde se
colocam muito agitados.

JORGINHO
Afinal prá que é essa fila?

JUNIOR
Já sei: eu vou lá e pergunto. Sempre eu.

PEDRÃO
Tá louco?! Vamo demonstrá que tamos
por fora? Depois não ganha mulher e não
sabe por quê!
151
JORGINHO
Só sei que a fila não anda, e eu pisei numa
poça dágua. (senta na calçada) Minha
meia tá congelando... Cadê meu primo?

Jorginho levanta-se e procura por Raio de Sol.

27 EXT. NOITE – ENTRADA DO CLUB 27


Raio de Sol vem curiosamente checar o que
acontece na porta. Vê uma HOSTESS selecio-
nando os que entram e os que são barrados. Um
SEGURANÇA indica-lhe o fim da fila.

RAIO DE SOL
E ai, grande, pra que é essa fila?

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SEGURANÇA
É um clâb.

RAIO DE SOL
O quê?

SEGURANÇA
Um clâb, discoteca...

RAIO DE SOL
Ahnnn...Valeu. (faz sinal de paz e amor)
Fica na paz...

16.
152
28 EXT. NOITE – FRENTE DE DISCO 28
Os três amigos chateados esperam. Rio de Sol che-
ga perto deles. Pedro não percebe a sua chegada.

PEDRÃO
Essa fila bundona não anda?

RAIO DE SOL
Aqui é um clâb.

JUNIOR
Um o que?! Crãbs?

RAIO DE SOL
Um clâb. É tipo uma discoteca dos Jardins.

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JORGINHO
E paga pra entrar?

PEDRÃO
Você acha que se pagasse ia ter essa fila
toda?

JORGINHO
Paga ou não paga?

RAIO DE SOL
Tem uma porteira que olha os figura, e
diz: você entra. Você não. Tem uns que
entra sem ela falar nada.
153
PEDRÃO
Então! É só fazer cara de rico!

JORGINHO
E como é cara de rico?

PEDRÃO
É o contrário dessa sua, mané. Vamo.

Liderados por Pedrão, os quatro furam a fila e


são vaiados por outros FREQUENTADORES.

29 INT. NOITE – ENTRADA DA DISCO 29


Os quatro chegam perto da hostess e Pedrão ten-
ta entrar sem falar nada, fazendo cara de rico.

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Rodolfo, Tadeu e Thiago

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HOSTESS
Epa! Onde vocês pensam que vão?

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 17.

JORGINHO
Entrar.

JUNIOR
No clâb.

HOSTESS
Quem decide quem entra sou eu!

PEDRÃO 155
Tem uns mano esperando nois lá dentro.

Eles acenam para supostos amigos. Chamam por


um deles: – e aí, Pezão!

HOSTESS
Você tem flyer?

JUNIOR
Acuma?!

Eles trocam olhares confusos, tentando descobrir


o que é flyer. Pedrão blefa.

PEDRÃO
Claro que temo.

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HOSTESS
Tem nada.

A fila pressiona para entrar.

HOSTESS
Bom, já me diverti muito com vocês, ago-
ra por favor se mandem porque a fila,
vocês sabem, anda.

Hostess escolhe outros da fila para entrar. Pedrão


puxa os outros três para um canto.

PEDRÃO
Alguma idéia?
156

JORGINHO
Vamo pra casa?

PEDRÃO
Vai te catá, bundão! Lá dentro tá cheio de
mulher gostosa e eu não não vou voltar
pra casa sozinho! Quem quiser ir pra casa
vai firme. De busão!

RAIO DE SOL
Pô, mas a gente veio junto...

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 18.

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PEDRÃO
Olha, pivete, eu não sou flor pra andar
em buquê, tá ligado? Quer ficar, fica.
Quer ir embora, vai tarde.

Pedrão se vira e vai decidido na direção da


Hostess. Os outros três ficam indecisos por um
segundo e seguem atrás. De novo, Pedrão tenta
passar pela Hostess com cara de rico, mas ela
percebe e o interrompe.

HOSTESS
Epa! Eu ainda não liberei vocês!

JUNIOR 157

Se falou ainda, é porque vai liberar!

Junior atira-se no sofá. Os outros o imitam.

HOSTESS
Vocês são muito... exóticos.

RAIO DE SOL
Eu sou de Pederneiras.

HOSTESS
Humm...É isso que eu quero aqui. Essa
mistura de gente hypada, up to date, tipo
gente... (aponta Raio) ... de Pederneiras.

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JORGINHO
Eu sou da Vila Matilde!

JUNIOR
Vila Joia!

PEDRÃO
Eu sou do Morumbi.

HOSTESS
Rá! Morumbi. Percebe-se. Sangue azul. Tá
legal. Entra logo antes que eu mude de
idéia. Paga ali no caixa. Bebidas à parte.

PEDRÃO
158 Paga?!

HOSTESS
Sessenta.

JUNIOR
Sessenta pila?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 19.

HOSTESS
Cada um.

A hostess vai em direção a uma celebridade que


chega, faz todo o charme para passá-la à frente
dos outros da fila.

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Garotos decepcionados. A Hostess e a ARTISTA
trocam beijinhos na boca. Junior fica chocado.

JUNIOR
Olha aquela artista! Poca vergonha...

JORGINHO
Foi só um selinho.

PEDRÃO
E por acaso você dá selinho no porteiro
do seu prédio?

Pedrão avança sobre Jorginho com fúria.


159
JORGINHO
Que que é? Que que é?! Tá tirando uma
comigo?! Vai querê?!

PEDRÃO
Carma, Jorginho...

Chega o segurança grandão.

SEGURANÇA
Que é que tá acontecendo aqui?

JORGINHO
Num rela em mim! Num rela em mim!

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JORGINHO
Eu moro em casa, mané. Sobrado não
tem porteiro.

Jorginho sai invocado e atravessa a rua atrope-


lando os carros. Os outros três vão atrás, atra-
palhados. Junior comenta.

JUNIOR
Moio, melhor sartá fora.

30 EXT. NOITE – MARQUISE IBIRAPUERA 30


Os quatro amigos caminham sob a marquise do
Parque do Ibirapuera. Patinadores, skatistas e
jogadores de hockey.
160
JUNIOR
Se a gente tivesse ficado no Tatuapé...

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 20.

PEDRÃO
Nasceu pra ser pobre mesmo... Vocês não
percebe? Se é pra ficar na Zona Leste, a gen-
te nunca vai ter nada na vida. A gente pre-
cisa se arriscar pra conseguir coisa melhor.

JORGINHO
Tá tendo uma quermesse no A.E.Carvalho,
vamos pra lá?

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Tadeu e Thiago

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PEDRÃO
Já falei. Hoje ou eu durmo acompanhado
ou não durmo.

JORGINHO
Nem as minas de Itaquera dão pra gente.
Vai dizer que já comeu alguma...

PEDRÃO
Eu sou fino. Seleciono bem os meus abates.

Pedrão sai na frente em direção ao estaciona-


mento. Depois de uma pausa, os outros vão atrás.

EXT.NOITE – JARDIM DAS ESCULTURAS (OCA) 31


162 Os quatro seguem em direção ao estacionamento.
Raio sobe nas esculturas redondas e anda meio
pulando como se fosse um jogo de amarelinha.

JORGINHO
Você não abate nada, Pedrão. Aqui nin-
guém comeu ninguém.

RAIO DE SOL
Eu já tive minha iniciação sexual na co-
munidade.

Pedrão leva susto.

PEDRÃO
Conta outra, moleque!

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RAIO DE SOL
Então pergunta pra minha mãe.

JORGINHO
Pera lá! Você já trepou... e sua mãe já
sabe?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 21.

RAIO DE SOL
Claro. Foi com uma amiga dela. Uma
mulher que eu conheço desde pequeno,
com uma energia superlegal.
163
Junior acompanha sua exclamação com um gesto.

JUNIOR
Viche!

PEDRÃO
Vai te catá! Vai te catá! Não quero saber
mais nada! Cala essa boca!

O silêncio dura alguns segundos. Eles se aproxi-


mam do carro e Pedrão à frente.

RAIO DE SOL
Lá na comunidade a gente tem um ritual
de iniciação sexual quando faz 14 anos.

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Eu já tenho 15. Meu ritual foi no fim do
ano passado.

PEDRÃO
Eu falei pra calar a boca!

Pedrão fica realmente muito bravo, entra no


carro e bate a porta com força. Trava as portas.
Os outros tentam entrar, não conseguem. Batem
nos vidros, nas maçanetas e voltam para o vidro
com velocidade cada vez maior. Mas Pedrão
continua imóvel no volante.

32 EXT.NOITE – SAIDA DO PARQUE IBIRAPUERA


164
(OBELISCO) 32
O carro passa pelo obelisco e segue para o via-
duto para a 23 de maio.

33 INT. NOITE – OBELISCO/CHROMA 33


Pedrão já está normal, como se nada tivesse
acontecido.

PEDRÃO
... uta lugar morto, meu!

JORGINHO
Olha lá!

PEDRÃO
O quê? O quê?

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(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 22.

JUNIOR
Um monte de homem parado!

PEDRÃO
Isso só pode significar uma coisa.

JORGINHO
O quê?

PEDRÃO
Se tem um monte de homem parado, isso
quer dizer que deve passar um monte de
mulher por aqui!
165
Os quatro explodem de novo em alegria e exci-
tação dentro do carro.

34 EXT.NOITE – PRAÇA EM FRENTE AO IBIRA-


PUERA 34
Estacionam. Os quatro desembarcam e cami-
nham em direção aos homens da calçada. Ve-
mos os GAROTOS DE PROGRAMA e CLIENTES
na calçada. No escuro, não se notam bem dois
TRAVESTIS e uma DRAGQUEEN.

JUNIOR
Deve ser que nem no interior. Os caras
ficam parado e as minas ficam dando
volta em volta, tá ligado?

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RAIO DE SOL
Em Pederneiras é assim! Chama footing!

PEDRÃO
Com tanto homem aí é que daqui a pouco
deve chegar a mulherada!

JORGINHO
É, tá certo. Os caras não iam ficar parado
à toa.

Os quatro caminham mais um pouco e param


numa esquina. Algum tempo se passa e um carro
para ao lado deles.
166
JORGINHO
Acho que o cara quer informação. Eu não
conheço nada dessas ruas!

PEDRÃO
Deixa comigo. Vou sou saber mais deta-
lhes da mulherada aqui. Ocês não servem
pra nada de útil, cambada!

Pedrão vai até o carro e se agacha para falar com


o motorista. Dentro do carro está WANDERLEY.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 23.

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Ale Freitas e Tadeu Pinheiro

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PEDRÃO
E aí, mano? Beleza?...

WANDERLEY
Oi, você é novo por aqui?

PEDRÃO
É, eu sou do Morumbi.

WANDERLEY
Tá calor né? Quer uma cerveja?

PEDRÃO
Tá geladinha?

168
Pedrão disfarça e faz um sinal para sua turma
dizendo que está se dando bem. Wanderley
entrega a cerveja para Pedrão.

PEDRÃO
Valeu, meu chapa. Me diz aí, e a mulhe-
rada aqui quando é que chega?

WANDERLEY
A mulherada não sei. Mas e você, é libe-
ral passivo?

PEDRÃO
Eu não se ligo nessas coisa de política não.

WANDERLEY
Quanto você cobra?

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PEDRÃO
Epa! Tá pensando o quê?

WANDERLEY
Fala seu preço. Achei você um gato.

Pedrão se assusta e cospe um chafariz de cerveja


sobre Wanderley. Começa a berrar com ele.

PEDRÃO
Tá me achando com cara do quê?! Sou
muito do macho, falou?! Te pego de pau,
vagabundo. Vai te catar! Chibungo!

Wanderley faz sinal de que está de olho em


169
Pedrão e sai cantando o pneu. Pedrão mira a
cerveja na direção do carro.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 24.

PEDRÃO
Pederasta! Frescão! Homossexual!

JUNIOR (GESTO)
Viche!!

Pedrão joga a lata de cerveja, ela faz uma curva e


cai em pés aparentemente femininos. CAM sobe,
e percebemos que pertencem à DRAG QUEEN.

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DRAG QUEEN
Viche...

Pedrão se volta indignado aos amigos.

PEDRÃO
Vê se pode! Ó a do cara! O cara queria
me comer!

Os outros três caem na gargalhada. A Drag con-


tinua assustada.

JUNIOR
Quanto ele queria te pagar? Quem sabe
não dava pra gasolina?
170
JORGINHO
O Pedrão dava sim! Ô se dava!

RAIO DE SOL
Eu acho válido qualquer forma de relacio-
namento entre pessoas do mesmo sexo...

DRAG QUEEN (IMITA GESTO DE JUNIOR)


Viiiiche...

PEDRÃO
Que válido o que, pirralho?! Vão se catar
oceis tudo!

JUNIOR
E ainda bebeu a cerveja do cara!

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JORGINHO
No gargalo!

Pedrão se toca, cospe, limpa a boca com a manga


da camisa.

JORGINHO
Putz, é mesmo! E se tiver contaminado,
veio?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 25.

PEDRÃO
Contaminado com quê?!
171
Os três amigos e a Drag riem da ingenuidade
de Pedro.

35 INT. NOITE – PROXIMIDADES PRÁÇA DA SÉ/


CHROMA 35
O carro desce lentamente em direção ao centro.
Pedrão indignado.

PEDRÃO
Eu queria ter enchido tudo aqueles via-
dos de porrada. Chibungada! Bando de
pederasta.

JUNIOR
Êpa! To vendo mulher!

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PEDRÃO
Não enche o saco, mora! Com a nossa
sorte deve ser traveco.

JUNIOR
To falando, cara! Lá no ponto do bumba!

JORGINHO
Putz. É gostosa pra caramba.

PEDRÃO
Vou chegar junto.

RAIO DE SOL
Não é certo estacionar em ponto de ônibus.
172

PEDRÃO
Cala a boca, baseado ambulante. A gente
estaciona no ponto e acabou. O busão
demora, a mina fica impaciente. A gente
oferece carona. Ela aceita. Aí em agra-
decimento ela dá pra gente e a gente
come ela. Deu pra entender, o Raio Que
os Parta?

RAIO DE SOL
Quem paga a multa? Seu primo?

PEDRÃO
Não enche meu saco moleque!

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Pedrão para o carro.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 26.

PEDRÃO
Descola mais uma grana que o Junior vai
fazer o corre de umas breja.

JUNIOR
Às ordem, chefe!

Júnior desce do carro.

36 EXT.NOITE – VIA DE ACESSO AO PÁTIO DO


COLÉGIO 36 173
Pedrão estaciona o carro. Júnior chega à janela
onde esta Raio de Sol e aponta a arma imaginá-
ria sob o casaco.

JUNIOR
Vamo lá riponga, solta a bufunfa.

RAIO DE SOL (DANDO O DINHEIRO)


Eu quero Chá Verde.

PEDRÃO (PARA JUNIOR)


Trás uma cerva a mais pra gente oferecer
pra mina.

Junior sai de cena com o dinheiro.

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RAIO DE SOL
Jorginho, eu preciso fazer xixi.

JORGINHO
E eu com isso?!

RAIO DE SOL
O que que eu faço?

PEDRÃO
Ué, tira o coisinho pra fora e mija. Nin-
guém te ensinou ainda?

RAIO DE SOL
Aqui? Na rua? Na frente de todo mundo?!
174

PEDRÃO
Faz o seguinte. Vai ali naquele jardim. De-
pois encontra a gente no ponto do busão.

Raio de Sol também sai rapidinho do carro em


direção do jardim. Lentamente, Pedrão (com
Jorginho do lado) vai em direção ao ponto.

27.

37 EXT. NOITE – PÁTIO DO COLÉGIO – PONTO


DE ÔNIBUS 37
Pedrão encosta. De dentro do carro, puxam con-
versa com a MINA DO PONTO, que usa um MP3.

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PEDRÃO
Oooiiiiiiiiiiiiiiii...

A Mina do Ponto não se mexe.

PEDRÃO
Tô falando com você, ô.

MINA
Ô é breque de burro.

JORGINHO
Então é por isso que você tá parada?

PEDRÃO 175
Cala a boca, Jorginho. Assim você espanta
a mina.

MINA
Eu não sou mosca pra ser espantada.

JORGINHO
Pô, a mina é a maior metida.

PEDRÃO
Desculpe aí, meu amigo aqui é meio
crianção... Escuta, pra onde você vai?

Pedrão anda em direção à Mina.

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MINA
Não amola! Sai voando, vai. Vai encher o
pacuçá de outra!

PEDRÃO
Sabe do que mais? Meu amigo crianção
aqui tá certo. Cê é a maior metida, mina.
Esperando ônibus que nem favelada e
posando de bacana...

MINA
Ah, vai ver se eu tô lá na esquina, vai!

PEDRÃO
176
Deve estar, aquilo lá na esquina é um
puteiro!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 28.

MINA
Pois é, quem me contratou lá foi sua mãe.

JORGINHO
Ih, Pedrão, ela tá chamando sua mãe de
vagabunda!

PEDRÃO
Tu é folgada. Na zona leste não durava
nem 10 minuto.

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MINA
Folgado é teu rabo. Vaza.

JORGINHO
Você viu o que ela falou?! Você viu o que
ela falou?!!

PEDRÃO
Eu não vi o que ela falou, eu ouvi. E es-
cuta aqui, seu projeto de piranha. Você
tá querendo entrar na porrada? Tá? Eu
vou aí e te cubro!

Pedrão puxa a saia da Mina e ela fica atônita,


177
tenta vestir a saia novamente e parte para cima
dele. Ele dá uma volta em torno do carro. A mina
o persegue. Ele entra e se tranca.
Neste momento Jorginho sai e da outro puxão
na saia da Mina. Corre para o carro mas tropeça
junto ao meio-fio, ela o chuta no chão. Ele ca-
pengando entra no carro. A Mina do Ponto saca
uma faca da bota e vai para a frente do carro.

MINA
Então vem! Sai do carro pra você ver o
que é bom pra macho. (Aproxima-se da
lateral do carro) Vem se é homem! Vem
os dois de uma vez!

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Ela cospe neles. Assustados, Pedrão e Jorginho
fecham as janelas e o teto solar do carro.

PEDRÃO
Não, o carro não!

JORGINHO
Eu falei que a gente devia ter ido em-
bora!

MINA
Vem! Desce do carro! Vem, covardão!
Vêm os dois que eu capo os dois!

(CONTINUA...)
178
...CONTINUANDO: 29.

PEDRÃO
Essa mulher é louca! Doida! Devia estar
internada!

MINA
Vem! Vem, seus froxos! Eu perco o ônibus
mas não perco a chance de capar vocês!

JORGINHO
Ela é obcecada em capar!

PEDRÃO
Não! O carro não!

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Pedrão observa com horror os dois punhos da
Garota do Ponto segurado o punhal lá fora e
fechando unidas lá fora e baixando com força em
slow motion. Da expressão assustada de Pedrão

CORTA PARA

38 EXT. DIA – RUA ZONA LESTE 38


FLASH BACK da primeira cena. Um flash da en-
trega da chave, imagem e som distorcidos. Na
imaginação de Pedrão, Reinaldo ameaçador:

REINALDO
... eu vou ficar muito, mas muito, mas
muito boladão mesmo se esse carro voltar 179
com um risquinho ou um amassado, por
menor que seja. Estamos entendidos?

VOLTA PARA

39 EXT. NOITE – PÁTIO DO COLÉGIO (PONTO DE


ÔNIBUS) 39
O punho da Mina do Ponto continua sua
lenta descida em slow motion e danifica
o capô e a lateral do carro.

PEDRÃO
Nããããããããõooo!!! Não faz isso! Meu
primo...

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JORGINHO
Mal educada!

30.

40 EXT. NOITE – ANHANGABAU 40


Raio de Sol entoa um mantra enquanto faz o
longo xixi. Ele não ouve o bate boca entre os ami-
gos e a Mina do Ponto. Passam dois SKATISTAS.

SKATISTA
Mijão!

41 EXT. NOITE – AVENIDA CONSOLAÇÃO PONTO


DE ÔNIBUS 41
180
A Mina quebra o farol do carro.

MINA
Vocês mexeram com a mina errada!

PEDRÃO
Pára de bater no carro, sua piranha!

Pedrão e Jorginho ficam apavorados. A Mina do


Ponto aponta a própria faca.

MINA
Ó a piranha aqui! Xispa daqui, seus bos-
tinhas! Volta pro mato de onde vocês
vieram!

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JORGINHO
Se não fosse tão malcriada podia ter pe-
gado uma caroninha...

Pedrão acelera e sai cantando o pneu. Garota mos-


tra o dedo médio e em seguida retoca o batom.

42 EXT.NOITE – LARGO DE SÃO BENTO 42


Vê-se o carro virando à esquina, acelerando.
Jorginho gritando.

JORGINHO
Para, para, para!

43 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 43


181
O carro faz a curva acelerando ao máximo. De
repente, para e estaciona.

PEDRÃO
Você pode me explicar por que eu tive
que parar?

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 31.

JORGINHO
A gente não pode deixar o Raio e o Junior
pra trás.

PEDRÃO

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Você tá confundindo balada com filme
de guerra. Sim, a gente pode deixar os
bostinhas pra trás. Eles são adultos e sabe
se virar!

JORGINHO
O Raio tem 15 anos!

PEDRÃO
Com 15 anos eu já tava trampando!

JORGINHO
Então eu também fico.

Jorginho sai primeiro, nervoso. Pedrão sai depois


182
para verificar os estragos.

JORGINHO
Minha mãe me mata se acontecer alguma
coisa com o Raio. E é sacanagem largar
o Junior com aquela mina doida solta!

PEDRÃO
Saco! Saco! Saco! Então vai lá!

JORGINHO
E você?

PEDRÃO
Alguém tem que cuidar do carro.

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JORGINHO
Bundão! Covarde!

Pedrão avalia os danos.

PEDRÃO
Na hora de entregar o carro todo deto-
nado pro meu primo você não vai estar
comigo, né?! Covarde! Bundão!

Jorginho bate a porta do carro e sai. Volta em


direção ao ponto de ônibus, com muita vontade.
Em contraste, Pedrão sai lentamente.

32.
183
44 EXT. NOITE – SUBIDA DE ACESSO AO PÁTIO
DO COLÉGIO 44
CAM acompanha Jorginho e quanto mais ele
se aproxima do ponto, mais devagar e receoso
vai ficando.

45 EXT. NOITE – BANCA DE JORNAL E RUA FREN-


TE AO PONTO DE ÔNIBUS 45
Quando chega lá, Jorginho se esconde atrás
de uma banca de jornal para observar o ponto
a uma distância segura. Ele vê que a Mina do
Ponto continua esperando o ônibus, como se
nada tivesse acontecido. Em seguida, observa
assustado que Junior se aproxima do ponto com
um saco de supermercado.

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JORGINHO (SUSSURRA PARA SI MESMO)
Sai fora, Gilvanilson! Essa mina é psico-
pata! Sai fora, sai fora...

Sem dar muita bola para a Mina do Ponto, Junior


chega ao ponto e procura pelo carro de Pedrão.
A Mina se aproxima dele por trás.
PDV Jorginho. À distância, ele observa a garota
dando uma gravata em Junior por trás. Tenta
fazer sinais para o amigo.

JORGINHO (SUSSURRA)
Tá morto. O Gilvanilson tá morto! Eu
sabia que a gente não devia ter saído
184
de casa!

De perto, vemos que Jorginho se assustou com


a gravata.

MINA
E não é que encontro o melhor farma-
cêutico da cidade?

JUNIOR
Olha quem tá aqui... A Mina da injeção...
O que você tá fazendo por essas bandas?

MINA
Vim dá um rolê. E você?

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JUNIOR
Eu to na barca de uns chegados... Você
não viu não?

Junior descreve o carro de Pedrão. A Mina co-


meça a rir.
PDV JORGINHO – garota mostra a faca para Junior.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 33.

JORGINHO (SUSSURRA)
Ela vai furar ele! Ela vai furar ele!
185
Subitamente um alarme começa a tocar numa
moto ao lado de Jorginho, que sai correndo por
trás da banca.
De perto, a Mina abraça Junior, que ri. Vê-se
Jorginho correndo no fundo.

46 EXT. NOITE – DESCIDA DO ACESSO AO PÁTIO


DO COLÉGIO 46
Jorginho corre. Saca a bombinha de asma. Borrifa.

47 EXT. NOITE – VIADUTO SANTA IFIGÊNIA 47


Junior e a Mina do Ponto bebem as cervejas e
caminham pelo viaduto. Ao fundo, a escultura
do gatinho.

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Mina e Fabio

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MINA
Seus amigos mexeram comigo... e eu fui
obrigada a dar uma surra...

JORGINHO
Surra?! Neles?!

MINA
Não, no carro! Doi mais!

JUNIOR
Gatinha malvada. Você tá voltando pra
Vila?

MINA (SEDUTORA) 187


To... e trago uma penis...cilinazinha aqui
na bolsa. Você não quer aplicar sua...
seringa... em mim?

JUNIOR
Pode ser lá em casa?

MINA
Não! Eu quero na farmácia. Só funciona
na farmácia.

JUNIOR
Então eu volto com você pra Vila. Depois
eu converso com os truta.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 187 4/4/2011 12:50:30


34.

48 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 48


Jorginho chega correndo e reencontra Pedrão,
que tenta encaixar o farol quebrado. Fala esba-
forido, usa a bombinha.

JORGINHO
A mina... a psicopata... ela sequestrou o
Gilvanilson. Roubou nossas cervas. Vamo
chamá os ómi! E o Raio?! O cara sumiu!!
Minha mãe vai me matar! Minha tia vai
cuspir no meu túmulo!

188 Pedrão larga as ferramentas (ou o esparadrapo)


no chão.

PEDRÃO
Calma cara! Você tá histérico. A gente
precisa refretir. Deixa eu pensar!

Jorginho expectante. Pedrão decidido.

PEDRÃO
Pensei. Vamos procurar um lugar calmo
pra gente pensar melhor.

49 EXT. NOITE – RUAS DIVERSAS 49


Clipe de transição. A noite fervendo.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 188 4/4/2011 12:50:30


50 EXT. NOITE – BAR MULHERES 50
O carro para diante do Tom Jazz. No totem: Sá-
bado – As Perigosas. Jorginho e Pedrão entram.

51 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES 51


Uma CANTORA toda tatuada é acompanhada
por MULHERES MUSICISTAS ao piano, contrabai-
xo, bateria e trumpete (ou pistom). Jorginho e
Pedrão olham o bar em panorâmica.
Todas as mesas estão ocupadas por MULHERES.
As GARÇONETES são mulheres. É um bar basica-
mente de lésbicas, mas Jorginho e Pedrão não
percebem esse detalhe.

PEDRÃO (DISCRETAMENTE) 189


Mano... Acho que a gente se deu bem.

JORGINHO (DISCRETAMENTE)
Só tem mulher! E só nós de homem!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 35.

Pedrão e Jorginho se sentam, chamam a GAR-


ÇONETE.

PEDRÃO
Cara... Nenhuma concorrência!

JORGINHO
Vamos sair cada um com duas...

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 189 4/4/2011 12:50:30


Fazem o gesto do revolvinho. A garçonete apa-
rece muitíssimo mal encarada.

PEDRÃO
Epa, manda uma breja geladinha pros
sortudos aqui...

A garçonete se vira e sai sem dizer uma palavra.


Quando está bem longe, Jorginho faz seu pedido
baixinho.

JORGINHO
... e uma porção de fritas pra mim!

190
PEDRÃO
Invocada, hein?

JORGINHO
Eu nunca vi tanta perereca à disposição.

PEDRÃO
Se a gente perder essa chance...

JORGINHO
Olha aí do seu lado...

Pedrão vê uma GAROTA sozinha na mesa ao lado.

PEDRÃO (PARA A GAROTA)


Sozinha? Quer levar um papo?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 190 4/4/2011 12:50:30


A garota tem um sorrizinho misterioso na cara.

GAROTA DO BAR
É? Que tipo de papo?

PEDRÃO
Qual é seu signo?

GAROTA DO BAR
Vem cá, você surgiu de onde?

PEDRÃO
Do Morumbi.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 36. 191

GAROTA DO BAR
E você quer me levar para seu apartamen-
to chique do Morumbi?

PEDRÃO
Na minha máquina turbinada!

Pedrão faz ruídos de motor. A garota ri. Nesse


momento outra mulher, sua ACOMPANHANTE,
se senta ao seu lado e encara Pedrão com fúria
no olhar. Pedrão deixa a garota de lado.

PEDRÃO
Aí, Jorginho, qualé a dessa outra?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 191 4/4/2011 12:50:30


JORGINHO
Vai ver que é irmã dela, sei lá...

Nesse momento a garçonete traz a cerveja,


que deposita com violência na mesa, junto de
dois copos e a porção de fritas. A garçonete sai
olhando feio. Pedrão pega a cerveja.

PEDRÃO
Ei! Tá quente!

JORGINHO
O serviço aqui é ruim pra caramba...

PEDRÃO
192 Não sei como pode juntar tanta mulher
com um chope quente desse..

JORGINHO
Vou dar um mijão. Pede pra trocar a breja.

PEDRÃO
Aproveita pra dar uma investigada.

JORGINHO
Investigada no quê?

PEDRÃO
Nas mulher, ô xarope! Nas muguegadas!

37.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 192 4/4/2011 12:50:30


52 INT. NOITE BAR DAS MULHERES – BANHEIRO
MASCULINO 52
Jorginho faz xixi sozinho no banheiro vazio.
Depois lava as mãos, se olhando no espelho.
Percebe que faltou tirar um fio da sobrancelha
e tenta arrancar lá mesmo no banheiro. Cheira
o sovaco. Tenta cheirar o próprio hálito.

53 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES – ANDAR


SUPERIOR 53
Em slow motion, Jorginho observa outras mesas
no andar superior. Foca em dois pares de per-
nas que consegue ver por baixo de uma mesa.
Faz cara de paquerador e vai na direção dessa
mesa, de olho nas pernas, nos sapatos das duas 193
mulheres. Chega mais perto, ajusta a camisa. E
sem olhar no rosto das duas vai soltando sua
frase-chaveco.

JORGINHO
Oi... tudo bem? Vocês sabem que horas
são agora?

Uma das mulheres consulta casualmente o relógio.

MÃE DE JORGINHO
Onze e dez... Jorginho!

Jorginho empalidece ao ver quem são as duas


mulheres.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 193 4/4/2011 12:50:30


Thiago no banheiro

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 194 4/4/2011 12:50:31


JORGINHO
Mãe! Tia!

Caras de espanto dos três.

54 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 54


Júnior e a Mina andam pelo viaduto, romanti-
camente.

MINA
Eu nunca vi gente tão malas quanto os
galinhas desses seus amigos! Os caras são
lost pra caramba.

JUNIOR
195
Você detonou o carro total?

MINA
Nem sei. Eles me tiraram do sério. Quise-
ram me cantar.

JUNIOR
Eu não ponho culpa neles. Um mulherão
desse porte...

Junior vai se insinuando e tocando na Mina. Ela


o repele.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 38.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 195 4/4/2011 12:50:31


MINA
Ainda não! Só na farmácia.

JUNIOR
Mas... por quê?

MINA
Porque sim. Só funciona lá.

JUNIOR
Nem um beijinho?

MINA
É melhor nem olhar muito pra mim.

196
Junior se arrisca, ressabiado. A Mina aceita o beijo.

55 EXT. NOITE – BAR MULHERES – ANDAR SU-


PERIOR 55
Continua o diálogo entre Jorginho, sua mãe e
sua tia.

MÃE DE JORGINHO
O que você tá fazendo nesse lugar a essa
hora, Jorge Augusto?!

JORGINHO
Eu posso explicar, mãe, mas é uma longa
história...

MÃE DE RAIO
E o Raio? Cadê meu filhote?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 196 4/4/2011 12:50:31


JORGINHO
O Raio? De Sol?!

MÃE DE RAIO
Ele mesmo. Cadê?

JORGINHO (IMPROVISA)
Ele a gente... deixou em casa.

MÃE DE JORGINHO
Sozinho?!

JORGINHO
Claro que não!

MÃE DE RAIO 197


Então quem está com ele?

JORGINHO (VACILANTE)
O... Junior.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 39.

MÃE DE JORGINHO
Que Junior?!

JORGINHO
Meu amigo farmacêutico. Ele me devia
um favor, deixei o Raio dormindo, e o
Junior vai ficar lá até eu chegar.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 197 4/4/2011 12:50:31


MÃE DE RAIO
Eu não acredito... Meu filho, dormindo
com um desconhecido.

JORGINHO
Mas eu conheço ele, tia.

MÃE DE JORGINHO
Sabe o que você vai fazer agora? Vai
direto pra casa cuidar do seu primo. Que
irresponsabilidade.

JORGINHO
Sim senhora...
198
MÃE DE JORGINHO
Cadê seu agasalho?

JORGINHO
No carro.

MÃE DE JORGINHO
Que carro?!

JORGINHO
Carro?

56 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES 56


Pedrão brinca com a contrabaixista, que sola.
Joga charme para a cantora, as mulheres no plec-

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 198 4/4/2011 12:50:31


Rachel Ripani e Viviane Araújo

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 199 4/4/2011 12:50:31


plec, acompanham a percussão com os dedos.
Jorginho interrompe Pedrão.

JORGINHO
Vaza, mano, sai fora, sai fora, ripa, veio.

PEDRÃO
Mas agora que eu to me dando bem?!

JORGINHO
Vai logo, mano!

Jorginho arrasta Pedrão pelo braço. Deixa todo


o troco que tem no bolso com a garçonete, a
conta de 25 reais.
200
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 40.

JORGINHO
Minha mãe tá aí!

PEDRÃO
Sua mãe?! O que ela tava fazendo nesse
inferninho?!

JORGINHO
Conversando com minha tia! A mãe do
Raio de Sol!

PEDRÃO
Aqui?!

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 200 4/4/2011 12:50:31


57 EXT. NOITE – BAR DAS MULHERES 57
Pedrão e Jorginho esperam a chegada do carro.
Jorginho tá desesperado.

JORGINHO
Aí eu disse que a gente deixou o Raio
dormindo em casa. E que o Junior tava
tomando conta.

PEDRÃO
Aí você se ferrou... Eu vou voltar pras
perigosas!

JORGINHO
Agora ela me mandou ir pra casa. E eu
não tenho a menor idéia de onde tá meu 201
primo! Sem o Raio, eu nem volto mais!

PEDRÃO
E o que que você quer que eu faça?!

JORGINHO
Sei lá! Sei lá!

O VALET traz o carro e apresenta a conta de 15 reais.


Pedrão raspa os bolsos. Sem que os dois perce-
bam, Raio de Sol está sentado no banco de trás.

JORGINHO
O Raio pode estar sendo estuprado em
algum mato por aí!

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 201 4/4/2011 12:50:31


RAIO DE SOL
Que horas são?

Pedrão e Jorginho levam um tremendo susto.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 41.

JORGINHO
Que você tá fazendo aí?!

RAIO DE SOL
Eu fui fazer xixi, aí vocês sumiram, aí eu
saí andando, aí eu vi esse tio estacionan-
do o nosso carro lá em baixo, aí eu en-
202
trei... E olha, acho que ele bateu o carro,
tá tudo quebrado...

Jorginho dá uns tapas na nuca de Raio de Sol.

JORGINHO
Que puta susto que você me deu! Nunca
mais me dá um susto desses seu pentelho.

A mesma mão que dá o tapa aproxima Raio para


um rápido abraço.

JORGINHO
Que bom que você tá aqui primo! Putsa,
você não sabe do que eu me livrei!

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 202 4/4/2011 12:50:31


Jorginho sai do abraço e subitamente se apavora
de novo.

JORGINHO
E o Junior?

RAIO DE SOL (BOCEJANDO)


Que que tem o Junior?

JORGINHO
O Junior pode estar morto com 15 facadas
e 3 tecos na testa!

RAIO DE SOL
Como é que é?
203

PEDRÃO
Ah, vai. Você tá exagerando.

JORGINHO
Melhor a gente ir pro IML.

PEDRÃO
Nem a pau! Eu já falei mais de mil vezes
que eu não vou embora sem arranjar
uma rachada. Eu não volto sem arriar
a bandeira do mastro! Hoje eu dou um
picote! Esta noite o Junior...

(CONTINUA...)

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 203 4/4/2011 12:50:31


...CONTINUANDO: 42.

PEDRÃO
(aponta um revólver imaginário) ...morreu!

Jorginho se apavora.

58 EXT. NOITE – LARGO DO PAISSANDU – GA-


LERIA DO ROCK 58
Junior e a mina do Ponto dividem o MP3 e co-
reografam uma música. O ônibus chega e eles
embarcam, felizes.

59 EXT.NOITE – PASSAGEM DR. ARNALDO 59


204 O carro no mergulhão da Doutor Arnaldo para
a Paulista.

60 EXT. NOITE – RUA AUGUSTA/CHROMA 60


Detalhe: placa da Rua Augusta. Apesar da hora
o movimento é grande e o trânsito, lento.
No interior do carro (em chroma), Raio de Sol
medita, como se estivesse roncando. Ele abre
os olhos e se vê pelo vidro da frente sob seu PV
muita gente e carros parados em fila dupla.

JORGINHO
O Pedrão, faz uma hora que nós estamos
parados nesta Rua Augusta e nada, mano.
Cadê as minas?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 204 4/4/2011 12:50:31


PEDRÃO
Que minas?...

JORGINHO
As de programa. Ai só tem as metida.

PEDRÃO
Assim que terminas as metida começas as
dama. Aí vai ser o paraíso!

Jorginho se anima e grita para fora do carro.

JORGINHO
Vamos logo seus cornos do caramba!

PEDRÃO
205
Para com isso, mano! Que vergonha!

JORGINHO
Você conhece os caras da rua?

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 43.

PEDRÃO
Não.

JORGINHO
Eles te conhece?

PEDRÃO
Não.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 205 4/4/2011 12:50:31


JORGINHO
Então...

PEDRÃO (PAUSA. ABRE A JANELA E GRITA)


Bando de roda presa!

JORGINHO
Anda logo, seus quase morto!

RAIO DE SOL
A gasolina tá acabando...

PEDRÃO
Não falei?! Não falei?! O cara é o maior
baixo-astral! Só roga praga...Que bosta
206
essa Augusta...

Pedrão começa a manobrar para sair da fila. Raio


de Sol volta a meditar.

61 EXT. NOITE – FRENTE DA FARMÁCIA 61


Junior e Mina do Ponto chegam excitados e em
atitude suspeita. Junior tira um monte de chaves
do bolso.

MINA
Vamo logo!

JUNIOR
Calma! Tá duro...

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 206 4/4/2011 12:50:31


A Mina se adianta e levanta a porta com força
e entra.
Junior ouve um apito de guarda noturno. Faz
sinal de silêncio para a garota. Com cuidado, ten-
ta fechar a porta da farmácia mas não alcança.
Vai atrás da Mina, a CAM enquadra um display
com uma promoção tipo na comprá de 10 fraldas
descartáveis, ganhe mais dois preservativos.

62 EXT. NOITE – FUNDOS DA FARMÁCIA 62


Detalhe da ampola de penicilina. A Mina sorri
sedutoramente para Junior, que a segue. Entram
na sala de aplicação.

44. 207

63 INT. NOITE – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 63


Lá dentro, a Garota do Ponto entrega a ampola
de penicilina para Junior. Os dois passam a falar
com voz sexy como num filme pornô.

JUNIOR
É no braço ou no bumbum?

MINA
O de sempre...

A garota do ponto fica de costas para Junior,


empinando o quadril. Junior coloca a agulha e
preenche a seringa.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 207 4/4/2011 12:50:31


JUNIOR
Tô preparando...

MINA
Ai, que medo...

Junior deposita a seringa. Pega um chumaço


de algodão e molha de álcool perto do rosto
da garota.

MINA
Esse cheiro de álcool... eu fico doida!

Junior levanta a saia da garota. Passa o algodão.


208
JUNIOR
Algodãozinho, algodãozinho

Ela geme e vira os olhos de prazer.

MINA
Ai, que geladinho...

Junior espreme o algodão cheio de álcool.

JUNIOR
Chuvinha, chuvinha...

MINA
Vem, vem...

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 208 4/4/2011 12:50:31


JUNIOR
Olha a picadinha de mosquito.

MINA
Pica, pica, mosquitão...

Não vemos que tipo de picada Junior deu, mas


vemos em close a expressão de prazer da Mina
do Ponto e ouvimos seu grito de excitação. A
CAM desce por sua tatuagem e encontra Junior
olhando o símbolo do Corinthians na calcinha
da Mina. Ele a morde e ela grita.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 45. 209

MINA
Ai, meu pitbull!

64 EXT. NOITE – ESTAÇÃO DA LUZ 64


Fachada da Estação da Luz.
Closes sucessivos de Pedrão, Jorginho e Raio de
Sol, assombrados. PDV carro localiza KELLY uns
metros à frente. Uma deslumbrante mulher,
trajando roupas muito sensuais.

RAIO DE SOL
Vocês têm certeza de que ela é prostituta
mesmo?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 209 4/4/2011 12:50:31


O carro se aproxima da Estação da Luz, em cujo
passeio vaga Kelly.

JORGINHO
Agora dá! Agora dá! Encosta!

PEDRÃO
Vai lá, mano, fala com essa anja!

JORGINHO
Eu nunca falei com prostituta!

PEDRÃO

Elas é igual às mina que a gente conhece. A única


210
diferença é que elas cobram.

JORGINHO
Mas eu não falo com as outra minas tam-
bém?!

PEDRÃO
Diz qualquer coisa! Puxa conversa!

O carro estaciona. Jorginho abre a janela e fala


com Kelly.

JORGINHO
Oi.

KELLY
Oi.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 210 4/4/2011 12:50:31


JORGINHO
Você é puta?

KELLY (IRRITADA)
Quê?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 46.

JORGINHO (PARA PEDRÃO)


Fala você.

PEDRÃO (SE ESTICA NO CARRO PARA


FALAR COM KELLY)
Desculpe meu amigo. Ele é meio inexpe-
riente... 211

KELLY
Sei. Tchau.

Kelly começa a andar. Raio de Sol toma coragem


e desce do carro, anda em direção a Kelly.

PEDRÃO
Pera aí! Não vai embora! Quanto é?

KELLY
Cem. Mais o hotel.

RAIO DE SOL (PARA KELLY)


Você faz sexo com pessoas desconhecidas
por cem reais? Você acha que essa quan-

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 211 4/4/2011 12:50:31


Thiago, Tadeu e Gianne Albertoni

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 212 4/4/2011 12:50:32


Thiago, Tadeu, Rodolfo e Gianne

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 213 4/4/2011 12:50:32


tia compensa? Sabia que o ato sexual é
uma troca de energias entre seres que
mmmmppfpff...

Jorginho agarra o braço de Raio de Sol e tapa


sua boca.

PEDRÃO (PARA KELLY)


O hotel quanto é?

KELLY
Cinquenta o período. Paga adiantado.

JORGINHO
Cinquenta mais cem...
214

KELLY
Vou facilitar pra você, queridinho. Nem
vou usar calculadora. Cem mais cinquenta
dá... cento e cinquenta. Não aceito che-
que nem cartão. Qual dos três vai?

JORGINHO
Cem conto é pra um só?!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 47.

KELLY
Claro. Eu não trabalho no atacado.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 214 4/4/2011 12:50:32


PEDRÃO (APONTA JORGINHO)
E nós dois por cem?

JORGINHO
Eu sou rapidinho!

KELLY
Nem pensar. Dá licença pra quem pode
pagar.

RAIO DE SOL
Você é feliz assim?

KELLY
O quê?!!
215
RAIO DE SOL
Você é feliz assim, usando seu corpo para
satisfazer quem você nem conhece? Isso
pode trazer um carma pesado pra sua
próxima vida, sabia?

KELLY
Sai fora, vocês estão me fazendo perder
tempo. E tempo aqui é dinheiro.

Kelly começa a se afastar, Pedrão sai do carro e


se arruma, confiante.

PEDRÃO
Pera aí, gata, a gente pode conversar...

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 215 4/4/2011 12:50:32


Jorginho também desce do outro lado.

KELLY
Que que é isso?! Abriram as portas da
perua escolar?

RAIO DE SOL
Há quanto tempo você não conversa com
um amigo?

KELLY
Que que é, você é evangélico ou o quê?

RAIO DE SOL
Sou neobudista tibetano.
216

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 48.

KELLY
Entendi...

RAIO DE SOL
Eu to vendo que você tem uma aura super-
legal, mas está com as cores meio opacas,
por causa da sua atividade profissional...

KELLY
Fazer o que, meu bem? Tenho conta pra
pagar.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 216 4/4/2011 12:50:32


RAIO DE SOL
Lá na minha comunidade, a gente vive
superbem. Ninguém faz o que não quer,
ninguém tem que pagar aluguel. A gente
planta a nossa comida, toma banho no
riacho... tudo em harmonia com a natu-
reza. E de graça.

KELLY
Jura, não brinca! Adoro cachoeira. Prin-
cipalmente de graça.

RAIO DE SOL
É logo ali, perto do Embu. Quer conhecer?
217
KELLY
Quer saber? Fui com sua cara. Vou levar
você pro meu apê pra você me explicar
melhor esse lance de sítio grátis. Tem
cavalo? Adoro andar de poney...

Kelly pega Raio pela mão e começa a puxá-lo,


levando-o para a calçada da Estação. Jorginho
demonstra preocupação pelo primo. Raio fica à
vontade e passa o chaveco.

RAIO DE SOL
Legal. Se você quiser, eu te faço uma mas-
sagem energizadora que vai reconstituir
a gama de cores da sua aura. Quer ver?

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 217 4/4/2011 12:50:32


Thiago, Tadeu, Rodolfo e Gianne

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 218 4/4/2011 12:50:33


Raio de Sol pega a mão de Kelly e aperta num
ponto que a deixa em êxtase. Do outro lado da
rua, Pedrão tenta se impor.

PEDRÃO
Epa! Pera aí! Os homens aqui somos nós.
Esse cara é um pivetinho!

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 49.

KELLY (PARA RAIO)


Que legal, eu também sei fazer umas mas-
sagens ótimas! Vamos logo que vai chover...
219
JORGINHO
Mas ... o que eu falo pra sua mãe?!

RAIO DE SOL
Fala que eu apareço amanhã na comuni-
dade com uma candidata nova...

Kelly se afasta com Raio, de mãos dadas, enquan-


to Pedrão e Jorginho permanecem pasmados
sobre a calçada.

65 INT. NOITE – ESTAÇÃO DA LUZ 65


Kelly e Raio de Sol andam pela passarela da
Estação da Luz.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 219 4/4/2011 12:50:33


KELLY
Como você se chama?

RAIO DE SOL
Raio de Sol.

KELLY
Que nome lindo...

Ela se encosta na grade. Ao fundo uma compo-


sição de trem.

RAIO DE SOL
E o seu?
220
KELLY
Pode me chamar de Kelly...

Ela sorri para ele e passa os dedos nos lábio de Raio.


Raio arrisca um beijo, Kelly deixa-se beijar. Beijo
inocente, de namoradinhos adolescentes.

66 EXT. NOITE – PONTE ESTAIADA – CHROMA 66


O carro segue sem rumo, eles novamente perdi-
dos. O astral a bordo é péssimo. Pedrão destila
rancor. Jorginho está preocupado.

JORGINHO
... e ainda vou ter que chegar em casa e
explicar pra minha tia que eu levei o filho

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 220 4/4/2011 12:50:33


dela de 15 anos pra uma noitada barra
pesada...

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 50.

PEDRÃO
Para de reclamar, mano! Meu ouvido não
é penico pra tanta choradeira!

Pausa de silêncio.

JORGINHO
Pô, Pedrão, não adianta ficar com essa cara.

PEDRÃO 221
Jorginho, você é meu mano, meu chapa,
meu melhor amigo. Mas hoje eu queria
trepar. Eu acordei com essa vontade. Dar
um fincão. Trocar o óleo. Passar a régua.
Fazer fuque-fuque.

JORGINHO
Deixa de ser virgem.

PEDRÃO
Vai te catar! Que virgem o quê?!

JORGINHO
Você é. Eu sou. Nunca transei com mulher
nenhuma. E nem você.

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 221 4/4/2011 12:50:33


Mais uns segundos de silêncio constrangido
entre os dois.

PEDRÃO
Mas ia ser hoje! Eu tinha certeza!

JORGINHO
Então por que chamou um monte de
homens pra ir junto?

PEDRÃO
Ah... vai te catar.

Mais silêncio.
222
67 INT. NOITE – BECO COM GRAFITES 67
O carro entra num beco, muito escuro.

PEDRÃO
Que inferno! Num acho a saída nessas
ruas do inferno! O que mais de ruim falta
acontecer nessa bosta dessa noite?!

Nesse exato momento acaba a gasolina.

(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 51.

PEDRÃO
Não... não... não!

12083491 Carro de Paulista miolo.indd 222 4/4/2011 12:50:33


Pedrão tenta ligar uma, duas, três vezes. Nem
um sinal.

PEDRÃO
Pega! Pega!

JORGINHO
O jeito é empurrar!

PEDRÃO
Que cê tá esperando?

68 EXT. NOITE – BECO COM GRAFITES 68


Jorginho empurra o carro, a luz do freio acende.

JORGINHO 223
Tira o pé do freio, Pedrão...

Jorginho arria e Pedrão é forçado a estacionar


no escuro.
Pedrão desliga o farol. Trevas. Jorginho encosta
no carro.

JORGINHO
Eu falei que a gente devia ter voltado.

PEDRÃO
Ah, vai te catar! Empurra isso aí, molenga...

CAM se afasta do carro, que some no escuro da


noite.

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FADE OUT

69 EXT. AMANHECER – PANORÂMICA DE SÃO


PAULO 69
FADE IN
O sol nasce.

70 EXT. DIA – FRENTE DE FARMÁCIA ZL 70


Seu Bibi chega e percebe que a farmácia está
aberta. Fica alarmado. Entra na farmácia com
todo cuidado.

71 INT. DIA – FARMÁCIA 71


O dono da farmácia entra em silêncio e inspe-
ciona tudo.
224
Vestígios de uma bagunça no chão. Perto do
caixa, pega a barra de ferro da porta. Observa
que a porta da Sala de Aplicação está aberta.

52.

72 EXT. DIA – FUNDOS FARMÁCIA 72


Seu Bibi, pé ante pé, já com a barra levantada se
aproxima da sala de aplicação e dá um chutão
na porta.

73 INT. DIA – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 73


Junior está largado no chão, dormindo pesado
e acorda com o chute. Dá de cara com o chefe o
ameaçando com a barra.

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JUNIOR
Oi! Sou eu! O Juniorrrrrrr!

SEU BIBI
O que você tá fazendo aqui, Junior?!
Dormindo?

JUNIOR
Eu posso explicar! Eu... eu... eu cheguei
muito cedo. E resolvi tirar uma soneca.

SEU BIBI
E deixou a porta aberta! (dando uma ge-
ral na sala, tira os olhos do chão) Gostei
que você tenha chegado tão cedo. Eu
225
reconheço o esforço desinteressado de
um funcionário. Mas dá uma arrumada
nessa sala. Tá uma bagunça!

O chefe tira os olhos de Junior, que encontra


uma calcinha no chão, a guarda disfarçadamente
no próprio bolso, antes que o dono da farmácia
volte a olhar para ele.

SEU BIBI
Recomponha-se, Junior porque hoje vai
ser um longo domingo. Nós dois só saímos
daqui à noite.

O Dono da Farmácia sai e fecha a porta. Junior


finalmente consegue respirar e esfregar os olhos

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vermelhos. Ele começa a arrumar a salinha. En-
contra uma injeção espetada sobre dois papéis
no pacote de algodão. Junior apanha o primeiro.
É uma receita médica: Danofloxanil-20, uma apli-
cação intramuscular por semana, durante cinco
semanas. O segundo papel é um bilhete: Você
quer me ajudar nesse tratamento? Sábado que
vem eu volto para a segunda dose. Junior sorri
orgulhoso de si mesmo.

53.

74 EXT. DIA – RUA MAUÁ 74


Raio de Sol sai de um Hotel fuleiro com Kelly.
Em total contraste com as roupas de trabalho
226 da noite anterior,
Kelly se veste como uma hippie de cara limpa.

RAIO DE SOL
Cê tá linda, meu...

KELLY
Essa aqui sou eu de verdade, a Grace. A
Kelly é só pra noite.

RAIO DE SOL
Minha princesa.

75 EXT. DIA – ESTAÇÃO DA LUZ 75


O trem chega na plataforma. Kelly e Raio do Sol
se embarcam e o trem parte. O sol está forte.

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76 EXT. DIA – RUA PERTO DO DETRAN 76
Uma placa de proibido parar e estacionar bem
em frente ao local onde o carro está estacionado.
Pela janela do carro, veem-se os pés de Pedrão
e Jorginho embaralhados, sugerindo que eles
dormiram de conchinha, dividindo o casaco de
Jorginho, meio descoberto.

JORGINHO
Pedrão?

PEDRÃO
Fala.

JORGINHO 227
Devolve meu casaco?

PEDRÃO
Num enche, retardado.

Pausa.

JORGINHO
Pedrão...

PEDRÃO
Fala, pentelho.

JORGINHO
Lembra da sua promessa de ontem à noite?

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(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: 54.

PEDRÃO
Que promessa?

JORGINHO (IMITA PEDRÃO)


Hoje ou eu durmo acompanhado ou não
durmo!

PEDRÃO
Vai te catar, mano! E vê se desencosta, veio!

JORGINHO
228 Tá frio, Pedrão!

PEDRÃO
Desencosta!

Do interior do carro ouvimos um estrondo.


Pedrão e Jorginho tomam um tremendo sus-
to. Com um solavanco, o carro é erguido. Sem
entender o que está acontecendo, Jorginho e
Pedro se agarram apavorados. Neste momento
o carro começa a andar. Pedrão olha para fora.
Jorginho surge por trás dele, tipo cena român-
tica de casal despertando.

CORTA PARA

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Plano geral onde se vê o carro sendo rebocado
por um guincho da CET tendo ao fundo o prédio
do Detran.

Entram os CRÉDITOS FINAIS

229

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Índice
No Passado Está a História
do Futuro – Alberto Goldman 5
Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7
Um Prefácio a Pelé, na Terceira
Pessoa – Mário Viana e Alessandro Marson 11
Um Carro no Desvio – Beth Néspoli 15
Carro de Paulista 19
O Carro – da Peça ao
Roteiro – Dagomir Marquezi 95
Carro de Paulista na TV – Ricardo Pinto e Silva 101
Carro Paulista V4 117

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Crédito das Fotografias
Icaro Limaverde 94, 100, 102, 104, 107, 110, 114, 120,
123, 134, 136, 138, 154, 161, 167, 199, 212, 213, 218
Demais fotografias pertencem ao acervo de Ricardo
Pinto e Silva

A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para


identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é
de autoria conhecida de seus organizadores.
Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa
à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos,
para que sejam devidamente creditados.

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Coleção Aplauso
Série Cinema Brasil
Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma
Alain Fresnot
Agostinho Martins Pereira – Um Idealista
Máximo Barro
Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino
Alfredo Sternheim
O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias
Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert
e Cao Hamburger
Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro
Luiz Carlos Merten
Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma
Rodrigo Murat
Ary Fernandes – Sua Fascinante História
Antônio Leão da Silva Neto
O Bandido da Luz Vermelha
Roteiro de Rogério Sganzerla
Batismo de Sangue
Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton
Bens Confiscados
Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos
Reichenbach
Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida
Sérgio Rodrigo Reis
Cabra-Cega
Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo
Kauffman

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O Caçador de Diamantes
Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro
Carlos Coimbra – Um Homem Raro
Luiz Carlos Merten
Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver
Marcelo Lyra
A Cartomante
Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis
Casa de Meninas
Romance original e roteiro de Inácio Araújo
O Caso dos Irmãos Naves
Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person
O Céu de Suely
Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias
Chega de Saudade
Roteiro de Luiz Bolognesi
Cidade dos Homens
Roteiro de Elena Soárez
Como Fazer um Filme de Amor
Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José
Roberto Torero
O Contador de Histórias
Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e
José Roberto Torero
Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e
Generosidade
Luiz Antonio Souza Lima de Macedo
Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade
Org. Luiz Carlos Merten

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Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção:
Os Anos do São Paulo Shimbun
Org. Alessandro Gamo
Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão –
Analisando Cinema: Críticas de LG
Org. Aurora Miranda Leão
Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser
Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak
De Passagem
Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias
Desmundo
Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui
Djalma Limongi Batista – Livre Pensador
Marcel Nadale
Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro
Jeferson De
Dois Córregos
Roteiro de Carlos Reichenbach
A Dona da História
Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho
Os 12 Trabalhos
Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias
Estômago
Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade
Feliz Natal
Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto
Fernando Meirelles – Biografia Prematura
Maria do Rosário Caetano

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Fim da Linha
Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards
de Fábio Moon e Gabriel Bá
Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil
Luiz Zanin Oricchio
Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas
Celso Sabadin
Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior
Klecius Henrique
Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta
Cinéfilo
Luiz Zanin Oricchio
Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas
Pablo Villaça
O Homem que Virou Suco
Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane
Abdallah e Newton Cannito
Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir
Remier
João Batista de Andrade – Alguma Solidão
e Muitas Histórias
Maria do Rosário Caetano
Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera
Carlos Alberto Mattos
José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina
Marcel Nadale
José Carlos Burle – Drama na Chanchada
Máximo Barro
Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção
Renata Fortes e João Batista de Andrade

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Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema
Alfredo Sternheim
Maurice Capovilla – A Imagem Crítica
Carlos Alberto Mattos
Mauro Alice – Um Operário do Filme
Sheila Schvarzman
Máximo Barro – Talento e Altruísmo
Alfredo Sternheim
Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra
Antônio Leão da Silva Neto
Não por Acaso
Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski
e Eugênio Puppo
Narradores de Javé
Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu
Olhos Azuis
Argumento de José Joffily e Jorge Duran
Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas
Onde Andará Dulce Veiga
Roteiro de Guilherme de Almeida Prado
Orlando Senna – O Homem da Montanha
Hermes Leal
Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela
Rogério Menezes
Quanto Vale ou É por Quilo
Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi
Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar
Rodrigo Capella
Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente
Neusa Barbosa

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Salve Geral
Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade
O Signo da Cidade
Roteiro de Bruna Lombardi
Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto
Rosane Pavam
Viva-Voz
Roteiro de Márcio Alemão
Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no
Planalto
Carlos Alberto Mattos
Vlado – 30 Anos Depois
Roteiro de João Batista de Andrade
Zuzu Angel
Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende

Série Cinema
Bastidores – Um Outro Lado do Cinema
Elaine Guerini

Série Ciência & Tecnologia


Cinema Digital – Um Novo Começo?
Luiz Gonzaga Assis de Luca
A Hora do Cinema Digital – Democratização
e Globalização do Audiovisual
Luiz Gonzaga Assis De Luca

Série Crônicas
Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças
Maria Lúcia Dahl

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Série Dança
Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal
Sérgio Rodrigo Reis

Série Música
Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos
Alfredo Sternheim
Rogério Duprat – Ecletismo Musical
Máximo Barro
Sérgio Ricardo – Canto Vadio
Eliana Pace
Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação
Beatriz Coelho Silva

Série Teatro Brasil


Alcides Nogueira – Alma de Cetim
Tuna Dwek
Antenor Pimenta – Circo e Poesia
Danielle Pimenta
Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral
Alberto Guzik
Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio
Org. Carmelinda Guimarães
Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e
Uma Paixão
Org. José Simões de Almeida Júnior
Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito
Antonio Gilberto e José Mauro Brant
Ilo Krugli – Poesia Rasgada
Ieda de Abreu

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João Bethencourt – O Locatário da Comédia
Rodrigo Murat
José Renato – Energia Eterna
Hersch Basbaum
Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher
Eliana Pace
Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba
Adélia Nicolete
Maurice Vaneau – Artista Múltiplo
Leila Corrêa
Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem
Rita Ribeiro Guimarães
Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC
Nydia Licia
O Teatro de Abílio Pereira de Almeida
Abílio Pereira de Almeida
O Teatro de Aimar Labaki
Aimar Labaki
O Teatro de Alberto Guzik
Alberto Guzik
O Teatro de Antonio Rocco
Antonio Rocco
O Teatro de Cordel de Chico de Assis
Chico de Assis
O Teatro de Emílio Boechat
Emílio Boechat
O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo
Clássicos
Germano Pereira

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O Teatro de José Saffioti Filho
José Saffioti Filho
O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera
Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso –
Pólvora e Poesia
Alcides Nogueira
O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um tea-
tro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos
de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro
Ivam Cabral
O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona
Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma
Noemi Marinho
Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar
Neyde Veneziano
O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista –
O Fingidor – A Terra Prometida
Samir Yazbek
O Teatro de Sérgio Roveri
Sérgio Roveri
Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas
em Cena
Ariane Porto

Série Perfil
Analy Alvarez – De Corpo e Alma
Nicolau Radamés Creti
Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo
Tania Carvalho
Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção
Alfredo Sternheim

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Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros
Rogério Menezes
Berta Zemel – A Alma das Pedras
Rodrigo Antunes Corrêa
Bete Mendes – O Cão e a Rosa
Rogério Menezes
Betty Faria – Rebelde por Natureza
Tania Carvalho
Carla Camurati – Luz Natural
Carlos Alberto Mattos
Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício
Tania Carvalho
Celso Nunes – Sem Amarras
Eliana Rocha
Cleyde Yaconis – Dama Discreta
Vilmar Ledesma
David Cardoso – Persistência e Paixão
Alfredo Sternheim
Débora Duarte – Filha da Televisão
Laura Malin
Denise Del Vecchio – Memórias da Lua
Tuna Dwek
Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas
Reinaldo Braga
Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida
Maria Leticia
Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz
Erika Riedel
Etty Fraser – Virada Pra Lua
Vilmar Ledesma

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Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte:
Memória e Poética
Reni Cardoso
Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério
Neusa Barbosa
Fernando Peixoto – Em Cena Aberta
Marília Balbi
Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira
Eliana Pace
Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar
Sérgio Roveri
Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema
Maria Angela de Jesus
Ilka Soares – A Bela da Tela
Wagner de Assis
Irene Ravache – Caçadora de Emoções
Tania Carvalho
Irene Stefania – Arte e Psicoterapia
Germano Pereira
Isabel Ribeiro – Iluminada
Luis Sergio Lima e Silva
Isolda Cresta – Zozô Vulcão
Luis Sérgio Lima e Silva
Joana Fomm – Momento de Decisão
Vilmar Ledesma
John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida
Neusa Barbosa
Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão
Nilu Lebert

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Jorge Loredo – O Perigote do Brasil
Cláudio Fragata
José Dumont – Do Cordel às Telas
Klecius Henrique
Leonardo Villar – Garra e Paixão
Nydia Licia
Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral
Analu Ribeiro
Lolita Rodrigues – De Carne e Osso
Eliana Castro
Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa
Vilmar Ledesma
Marcos Caruso – Um Obstinado
Eliana Rocha
Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária
Tuna Dwek
Marisa Prado – A Estrela, O Mistério
Luiz Carlos Lisboa
Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição
Renato Sérgio
Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão
Vilmar Ledesma
Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra
Alberto Guzik
Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família
Elaine Guerrini
Nívea Maria – Uma Atriz Real
Mauro Alencar e Eliana Pace
Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras
Sara Lopes

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Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador
Teté Ribeiro
Paulo José – Memórias Substantivas
Tania Carvalho
Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro
e Eu Não Sei Ler
Eliana Pace
Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado
Tania Carvalho
Regina Braga – Talento é um Aprendizado
Marta Góes
Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto
Wagner de Assis
Renata Fronzi – Chorar de Rir
Wagner de Assis
Renato Borghi – Borghi em Revista
Élcio Nogueira Seixas
Renato Consorte – Contestador por Índole
Eliana Pace
Rolando Boldrin – Palco Brasil
Ieda de Abreu
Rosamaria Murtinho – Simples Magia
Tania Carvalho
Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro
Nydia Licia
Ruth de Souza – Estrela Negra
Maria Ângela de Jesus
Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema
Máximo Barro

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Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes
Nilu Lebert
Silnei Siqueira – A Palavra em Cena
Ieda de Abreu
Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte
Vilmar Ledesma
Sônia Guedes – Chá das Cinco
Adélia Nicolete
Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro
Sonia Maria Dorce Armonia
Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana?
Maria Thereza Vargas
Stênio Garcia – Força da Natureza
Wagner Assis
Suely Franco – A Alegria de Representar
Alfredo Sternheim
Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra
Sérgio Roveri
Theresa Amayo – Ficção e Realidade
Theresa Amayo
Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza
Tania Carvalho
Umberto Magnani – Um Rio de Memórias
Adélia Nicolete
Vera Holtz – O Gosto da Vera
Analu Ribeiro
Vera Nunes – Raro Talento
Eliana Pace
Walderez de Barros – Voz e Silêncios
Rogério Menezes

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Walter George Durst – Doce Guerreiro
Nilu Lebert
Zezé Motta – Muito Prazer
Rodrigo Murat

Especial
Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso
Wagner de Assis
Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta
Elmo Francfort
Beatriz Segall – Além das Aparências
Nilu Lebert
Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos
Tania Carvalho
Célia Helena – Uma Atriz Visceral
Nydia Licia
Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos
Musicais
Tania Carvalho
Cinema da Boca – Dicionário de Diretores
Alfredo Sternheim
Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira
Antonio Gilberto
Eva Todor – O Teatro de Minha Vida
Maria Angela de Jesus
Eva Wilma – Arte e Vida
Edla van Steen
Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do
Maior Sucesso da Televisão Brasileira
Álvaro Moya

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Lembranças de Hollywood
Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim
Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida
Warde Marx
Mazzaropi – Uma Antologia de Risos
Paulo Duarte
Ney Latorraca – Uma Celebração
Tania Carvalho
Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias
Gomes – História de um Personagem Larapista e
Maquiavelento
José Dias
Raul Cortez – Sem Medo de se Expor
Nydia Licia
Rede Manchete – Aconteceu, Virou História
Elmo Francfort
Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte
Nydia Licia
Tônia Carrero – Movida pela Paixão
Tania Carvalho
TV Tupi – Uma Linda História de Amor
Vida Alves
Victor Berbara – O Homem das Mil Faces
Tania Carvalho
Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem
Indignado
Djalma Limongi Batista

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© 2010

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação


Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

Viana, Mário
Carro de paulista: dos palcos ao cinema na TV / Texto
teatral de Mário Viana e Alessandro Marson; roteiro para
cinema de Dagomir Marquezi com a colaboração de Ricardo
Pinto e Silva – São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo ,2010.
256p. : Il. – (Coleção Aplauso. Série Cinema Brasil/
Coordenador geral Rubens Ewald Filho).

ISBN 978-85-7060-935-9

1. Cinema - Roteiros 2. Filmes brasileiros – História


e crítica 3. Carro de paulista (Filme cinematográfico) I.
Marson, Alessandro. II. Marquezi, Dagomir. III. Silva, Ricardo
Pinto IV. Ewaldo Filho, Rubens. V. Título. VI. Série.

CDD 791.437 098 1

Índices para catálogo sistemático:


1. Filmes cinematográficos brasileiros : Roteiros :
Arte 791.437 098 1
2. Roteiros cinematográficos: Filmes brasileiros :
Arte 791.437 098 1

Proibida reprodução total ou parcial sem autorização


prévia do autor ou dos editores
Lei nº 9.610 de 19/02/1998

Foi feito o depósito legal


Lei nº 10.994, de 14/12/2004
Impresso no Brasil / 2010

Todos os direitos reservados.

Imprensa Oficial do Estado de São Paulo


Rua da Mooca, 1921 Mooca
03103-902 São Paulo SP
www.imprensaoficial.com.br/livraria
[email protected]
SAC 0800 01234 01
[email protected]

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Coleção Aplauso Teatro Brasil

Coordenador Geral Rubens Ewald Filho


Coordenador Operacional
e Pesquisa Iconográfica Marcelo Pestana
Projeto Gráfico Carlos Cirne
Editor Assistente Claudio Erlichman
Assistente Charles Bandeira
Editoração Aline Navarro
Tratamento de Imagens José Carlos da Silva
Revisão José Vieira de Aquino

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Formato: 12 x 18 cm

Tipologia: Frutiger

Papel miolo: Offset LD 90 g/m2

Papel capa: Triplex 250 g/m2

Número de páginas: 256

Editoração, CTP, impressão e acabamento:


Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

Nesta edição, respeitou-se o novo


Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

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Coleção Aplauso | em todas as livrarias e no site
www.imprensaoficial.com.br/livraria

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