IISPHist09 Bertonedeousa
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Identitária
Introdução
1
A CGADB foi fundada em 1930 e registrada em 1946. Entre os líderes religiosos que participaram desse
processo estavam Samuel Nystron e Paulo Leivas Macalão.
2
ortodoxia doutrinária.” 2 O site destaca ainda a crença no “batismo com o Espírito Santo” e
na “segunda vinda de Cristo” como dogmas essenciais de seu credo.
De acordo com Corten (1996, p. 44 e seq.), o Batismo no Espírito Santo é uma
experiência religiosa marcada por forte intensidade de um sentimento místico, advindo da
crença de o fiel estar em contato com Deus. Sua principal manifestação é o “falar em
línguas”, estado de transe em que os fiéis crêem-se tomados (possuídos) pelo Espírito
Santo, emitindo espontaneamente longas seqüências de sons, cujos sentidos se dão apenas
na esfera do campo místico. Não é necessária preparação prévia, pode ocorrer no ato da
conversão ou muito tempo depois dela.
Historicamente, o movimento pentecostal remonta ao ano de 1906 nos Estados
Unidos e uma das suas características é a crença de seus fiéis de estarem voltando às
“origens” do que havia sido a igreja primitiva. Pentecostes, dogma que norteia este
movimento, significa “cinquenta”, em alusão ao relato bíblico3 de que, no quinquagésimo
dia após a ressurreição de Jesus, o Espírito Santo teria se manifestado aos apóstolos
reunidos no cenáculo, por meio de línguas de fogo, ocasião em que teriam entrado em
estado de transe, falando diversas línguas. Este relato, retomado por facções protestantes no
século XX, constitui-se no cerne doutrinário do movimento aqui estudado.
Nos Estados Unidos, o movimento pentecostal esteve inicialmente relacionado a
questões raciais. Um de seus personagens centrais é William Joseph Seymour (1870-1922),
que, por ser negro, foi expulso da igreja de Charles Fox Parham, simpatizante da Ku Klux
Klan e que ensinava sobre a experiência religiosa do batismo no Espírito Santo. Em 1906,
Seymour passou a realizar cultos em um armazém na Rua Azuza Street, Los Angeles, que
depois recebeu o nome de Church of God in Christ (Igreja de Deus em Cristo), com a
participação majoritária de negros e mulheres.
Freston (in ANTONIAZZI et al, 1994, p. 75) enfatiza que inicialmente o movimento
se caracterizou pela crença no retorno iminente de Cristo, valorizando mais a divulgação de
ideais salvacionistas do que a construção de igrejas. Posteriormente, a glossolalia ganhou
destaque em sua incipiente teologia e seu caráter proselitista logo se tornou notável, devido
à rápida expansão do movimento. Missionários norte-americanos e imigrantes radicados
nos Estados Unidos foram enviados ao exterior em campanhas de evangelização.
Daquele país vieram os dois missionários suecos que fundaram a AD no Brasil:
Daniel Berg e Gunnar Vingren. Chegaram ao Brasil em 19 de novembro de 1910. Seu
sustento no país foi garantido por doações que vinham do exterior, pela venda de Bíblias e
pelo trabalho de fundição que Berg exercia. Inicialmente, frequentavam a igreja Batista, de
onde foram expulsos porque tentaram incluir o “pentecostes” na liturgia. Juntamente com
mais dezesseis pessoas fundaram outra igreja com o nome de “Missão de Fé Apostólica”,
que era como se chamava uma das primeiras igrejas pentecostais nos Estados Unidos. A
igreja fundada por eles em Belém recebeu o estatuto de pessoa jurídica em 11 de janeiro de
1918, quando foi registrada oficialmente como Assembleia de Deus. (VINGREN, 1982, p.
97) No entanto, sua fundação no Brasil data de 1911, quando o grupo se separa da igreja
Batista.4
2
Disponível em: http://igrejaassembleiadedeus.org/principal.htm . Acesso em 12/11/2008
3
Descrito em Atos dos Apóstolos capítulo 2.
4
A Congregação Cristã no Brasil foi a primeira de linha pentecostal a ser fundada aqui, em 1910.
3
ainda vive-se, segundo o autor, o tempo da fronteira, da expansão populacional sobre terras
ainda não ocupadas e ela é marcada precipuamente por uma situação de conflito social.
O autor destaca que a fronteira é o lugar também de elaboração de “Esperança” (com
“E” maiúsculo), “atravessada pelo milenarismo da espera no advento do tempo novo, um
tempo de redenção, justiça, alegria e fartura. O tempo dos justos.” (p. 11) Martins assinala o
caráter religioso, amiúde milenarista, das populações camponesas que migram para
melhorar de vida, amalgamando elementos da frente de expansão com uma visão mística de
mundo. Estas, ao fixarem-se em uma região, podem tornar-se receptivas às religiões
também milenaristas, como, por exemplo, o pentecostalismo da Assembleia de Deus; essa
perspectiva perpassa a própria trajetória junto às comunidades camponesas que se
estabeleceram no sudoeste maranhense, mediante o trabalho de divulgação de seus ideais e
fundação de igrejas.
A construção da rodovia Belém-Brasília, no início dos anos 1960, impulsionou o
crescimento de Imperatriz, fazendo com que, num período de vinte anos, a população
aumentasse em cerca de 450%, quando se tornou a segunda maior cidade do Estado. Essa
obra foi acompanhada da realização de um projeto de construção, na cidade de Estreito, de
uma ponte sobre o rio Tocantins, ligando os Estados do Maranhão e Goiás. A obra foi
inaugurada por Juscelino Kubitschek, quatro dias após a conclusão da rodovia, em 29 de
janeiro de 1961. A rodovia também impeliu a expansão da igreja, que se estabeleceu em
aldeias, cidades e vilarejos vizinhos. Sebastião Alves (2002, p. 57-58) aponta esse
acontecimento como fator catalisador da ampliação da quantidade de templos e fiéis:
5
Localizado no município de Curionópolis, no Sul do Estado do Pará. Antes era uma povoação da cidade
vizinha de Marabá, mas foi elevado à condição de município em 1988. O garimpo situa-se a
aproximadamente 330 Km de Imperatriz. Apesar da distância, impactou fortemente a dinâmica sócio-
econômica imperatrizense em toda a década de 1980.
6
6
Segundo Freston (In ANTONIAZZI et al., 1994, pp. 70-71), o pentecostalismo brasileiro pode ser dividido
em três ondas de implantação: a primeira na década de 1910, com a chegada da Congregação Cristã no Brasil
(1910) e da Assembleia de Deus (1911); a segunda, nas décadas de 1950 e 1960, com o surgimento da Igreja
do Evangelho Quadrangular (1951), Igreja Brasil Para Cristo (1955) e Igreja Pentecostal Deus é Amor (1961);
a terceira onda ocorre nas décadas de 1970 e 1980, com o surgimento das chamadas igrejas neopentecostais:
Igreja Universal do Reino de Deus (1977) e Igreja Internacional da Graça de Deus (1980) e Igreja Apostólica
Renascer em Cristo (1986).
9
população). Nenhuma outra denominação, sozinha, contava com mais de dez mil
membros7. Em 2002, de acordo com a Enciclopédia de Imperatriz, a IEADI possuía cerca
de 35.000 fiéis (SANCHES, 2002, p. 43).
Na década de 1990 foi implantado um amplo projeto de evangelização de metas
ambiciosas, visando, sobretudo, ampliar substancialmente o número de pentecostais
assembleianos. O projeto denomina-se “década da colheita” e tem mobilizado todos os
departamentos e igrejas-satélite a fim de atingir seus objetivos. Este projeto foi lançado pela
CGADB, um plano de proselitismo religioso que mobilizou todas as convenções do país, o
que levou a instituição a afirmar, orgulhosamente que “O censo do IBGE de 2000 mostrou,
em comparação com último censo de 1991, o quando a AD cresceu nos últimos dez anos do
século 208”. Para alcançar os objetivos, é estabelecido um conjunto de metas que cada
departamento deve alcançar anualmente, atividades que deve realizar, assim como
quantidade de pessoas que deve converter.
No campo protestante, o pentecostalismo é a vertente que mais tende à fragmentação,
pela facilidade de fundar igrejas e pelo próprio caráter proselitista de seus seguidores. A
rápida expansão destas também facilita esse processo. Apesar disso, possui algumas
características comuns: crença no Espírito Santo como entidade presente nos cultos, na
glossolalia, prática de batizar apenas adultos, a conversão como rito de passagem para que
o não protestante seja aceito na comunidade, teologia milenarista, ascetismo puritano,
marcado por uma rígida moralidade em oposição aos valores da cultura profana, crença de
que as doenças são flagelos do mal, crença em Satanás e na prática do exorcismo. Seu
crescimento tem sido, em parte, facilitado pelo uso dos meios de comunicação.
Como muitas outras cidades brasileiras, Imperatriz nasce e se desenvolve sob a égide
religiosa. Como ressaltado, a partir da década de 1970 a alteração do espaço urbano, com
sua expansão, confere às relações sociais um caráter dessacralizado. O fluxo migratório, o
desenvolvimento de instituições sociais laicas e o incremento do comércio alteraram o
cotidiano e a percepção de mundo, matizando as crenças religiosas. A AD se insere nesse
contexto, conduzindo uma propaganda religiosa conversionista, formando uma identidade
pentecostal.
Não se trata aqui de uma identidade social dada, étnica ou familiar, mas adquirida por
meio de uma opção salvacionista. O estudo das identidades ganhou espaço no campo das
ciências sociais como resultado das mudanças históricas operadas nas últimas décadas. Tal
estudo tornou-se referencial de compreensão e explicação dessas transformações, marcadas
por complexa heterogeneidade social e culturas híbridas. Percebe-se uma fragmentação das
coesões sociais, outrora escamoteadas sob unidades territoriais, políticas e sócio-culturais.
7
O censo caracteriza como “Evangélicas de Missão” um grupo composto por Igreja Presbiteriana, Luterana,
Batista, Adventista do Sétimo Dia e outras, que juntas, somavam 11.592 fiéis (5.0% da população). Destas, a
maior era a Igreja Batista (tanto as de confissão tradicional como pentecostal), com 7.014 membros. O grupo
de pessoas que se declararam sem religião ficou em 15.169 (6.5%) (IBGE, censo 2000).
8
Disponível em http://cgadb.org.br/home/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=27
Acesso em 28/03/2009
10
É precisamente porque as identidades são construídas dentro e não fora do discurso que
nós precisamos compreendê-las como produzidas em locais históricos e institucionais
específicos, no interior de formações e práticas discursivas específicas, por estratégias e
iniciativas específicas. Além disso, elas emergem no interior do jogo de modalidades
específicas de poder e são, assim, mais o produto da marcação da diferença e da
exclusão do que o signo de uma unidade idêntica [...], isto é, [...] uma mesmidade que
tudo inclui, uma identidade sem costuras, inteiriça, sem diferenciação interna.
Hall enfatiza que, longe de serem discursos neutros, as identidades estão em constante
competição; por isso, atuam num “jogo de modalidades específicas de poder”, pois estão
inseridas em contextos específicos de contradição e conflito. Assim, há a necessidade de
estarem constantemente reelaborando suas estratégias de competição, o que ocorre tanto no
âmbito do discurso como das práticas que adotam.
No caso do avanço da Assembleia de Deus, é importante compreender tal fenômeno
no contexto da modernização latino-americana, que ocorreu em sentido diferente ao vivido
11
10
O fundamentalismo é uma postura religiosa que surgiu na segunda metade do século XIX nos Estados
Unidos, como reação à teologia liberal, ao darwinismo e às religiões comparadas. Em contraposição a esses
princípios afirma a literalidade da Bíblia, sua infalibilidade e inerrância, o nascimento virginal de Jesus
Cristo, sua ressurreição e a autenticidade de todos os milagres que teria realizado, descritos nos Evangelhos.
(AZEVEDO, 1999, p. 205). O fundamentalismo é uma invenção da modernidade e está relacionado aos
embates teológicos gestados na era moderna. A Assembleia de Deus absorveu, em sua totalidade, os
princípios dessa doutrina.
11
CHEVITARESE, L. As “Razões” da Pós-Modernidade. Análogos. Anais da I SAF-PUC-RJ. Disponível
em: <http://www.saude.inf.br/filosofia/posmodernidade.pdf >. Acesso em 13/05/2009.
13
12
Idem.
14
estruturas interiorizadas”, que não devem ser entendidas como produto de obediência aos
dogmas, mas como mecanismo de regulação do comportamento individual e coletivo dos
fiéis, sua “matriz de percepção do mundo”, via das quais suas práticas são estruturadas e
suas experiências são vividas no interior da comunidade de culto (MICELI, in
BOURDIEU, 2007).
Trata-se, aqui, não de um habitus interiorizado pela educação familiar (no caso dos
que não nasceram como assembleianos), mas reformulado e atualizado pela trajetória social
dos indivíduos, nesse caso, pela experiência da conversão e constante (re)aprendizado do
dogma. Para Bourdieu (2007, p. 57), as instituições religiosas
Podem lançar mão do capital religioso na concorrência pelo monopólio da gestão dos
bens de salvação e do exercício legítimo do poder religioso enquanto poder de
modificar em bases duradouras as representações e as práticas dos leigos, inculcando-
lhes um habitus religioso, princípio gerador de todos os pensamentos, percepções e
ações, segundo as normas de uma representação religiosa do mundo natural e
sobrenatural, ou seja, objetivamente ajustados aos princípios de uma visão política do
mundo social. [grifos do autor]
Além das doações, após a oração de lançamento da pedra fundamental feita pelo
pastor, os fiéis realizaram ainda mutirões com mais de 300 pessoas para limpar o terreno.
Também foram organizados para ajudar na construção do Templo aos sábados e domingos,
o que teve duração de aproximadamente cinco anos. Os que foram contratados para
trabalhar regularmente somavam cerca de 60, entre pedreiros, ajudantes e carpinteiros
13
O primeiro encontra-se em Cuiabá-MT.
15
(ALVES, 2002, p. 229). A obra, que “consumiu cerca de 13 mil sacas de cimento e
aproximadamente 200 toneladas de ferro, abrangendo uma construção de 4.620 Km2 de
uma área total de 6.000 Km2” (p. 230), com capacidade para aglomeração para mais de
12.000 pessoas assentadas, foi concluída em dezembro de 1999.
A construção de uma obra de tais proporções, a ênfase na capacidade de mobilização
dos membros, no sentido de mantê-los dispostos e entusiasmados, é não apenas um fator de
crescimento vegetativo, mas, também, de poder, sobretudo simbólico. Para Bourdieu
(2000), o poder simbólico engendra um modo homogêneo de entender o tempo, de modo a
possibilitar a concordância entre o grupo e se fundamenta na cumplicidade dos que a ele
estão sujeitos e dos que o exercem.
Segundo Bourdieu, esse poder se constitui por seu efeito de mobilização e se exerce
no interior do campo onde a crença é produzida e reproduzida, no qual as relações de força
são escamoteadas pelas relações de sentido, pela capacidade de “fazer ver e fazer crer”,
direcionando, dessa forma, a ação e a visão da coletividade sobre o mundo. Por isso, há
uma luta simbólica entre os grupos para imporem (validarem) uma definição do mundo
social conforme seus interesses.
Nesse sentido, os sistemas simbólicos se diferenciam pela forma em que são
produzidos e apropriados pelo grupo e refletem a estrutura organizacional de uma
sociedade; eles legitimam uma forma de dominação e se reproduzem de forma
irreconhecível; por isso, se trata de um poder subordinado, ou seja, existe porque há outras
formas de poder que o legitimam e o tornam irreconhecível. O poder simbólico se constitui
em poder de construção da realidade, gerando um sentido para o mundo e, por extensão, o
mundo social.
O campo de poder pentecostal atua no sentido de mobilizar os indivíduos à luta pelo
monopólio do poder, nesse caso, religioso, à disputa pela autoridade em sujeitar e
disciplinar os “pecadores”, oferecendo-lhes a salvação e levando-os a aceitarem e seguirem
um corpo de doutrinas (dogmas), a partir dos quais sua vida será (re)direcionada. É um
campo que busca atrair a “clientela” das religiões concorrentes e demarcar um território de
atuação e manifestação próprio.
Nesse caso, número (quantidade de féis) se revela como poder de capacidade
agregadora, templos demarcam território de influência e unidade (como, por exemplo,
mutirões de limpeza, doações vultosas, dedicação em atividades promovidas pela igreja)
delimitam transubstanciação de relações de força em poder simbólico, legitimando a
autoridade exercida pelo discurso dos pregadores. A crença na legitimidade das palavras é o
alicerce sobre o qual se apóia o poder simbólico. Por isso também engendra uma identidade
em torno da qual gravitam as relações de força no interior da instituição e por meio da qual
os membros norteiam sua prática social.
Antoniazzi (et. al., 1996, p. 18) chega mesmo a qualificar o pentecostalismo como
agressivo, dadas as suas formas de propagação e de lidar com outros credos, adjetivo
assumido pela própria igreja: “A evangelização agressiva, ao estilo apostólico, é necessária.
Esse princípio foi praticado, na íntegra pelos pioneiros14”.
Segundo Weber (1974, p. 176), as religiões de salvação, que se caracterizam pelas
promessas de libertação do sofrimento aos seus fiéis por meio da inculcação de hábitos que
14
Disponível em http://igrejaassembleiadedeus.org/futuro_da_ad.htm Acesso em 18/11/2008
16
garantam a salvação, vivem em estado constante de tensão com o mundo. Seu caráter
soteriológico e congregacional, possibilitou a formação de uma elite sacerdotal que, no caso
de instituições cristãs como a AD, reivindicam para si a autoridade de pastorear o rebanho
de Deus e zelar por seu comportamento e espiritualidade.
Certamente alguns aspectos da modernidade se apresentam como grandes problemas
aos pentecostais, tais como: ecumenismo, divórcio, homossexualismo e casamento gay,
aborto, eutanásia, secularismo, humanismo, ateísmo, feminismo, contestação do modelo
patriarcal de organização familiar, etc. Todos eles são fortemente combatidos pela retórica
assembleiana. Fora da comunidade de culto, o mundo pertence ao demônio.15 Por isso é
necessário, na pregação pentecostal, atuar nele em santificação e testemunho, a fim de
torná-lo evangélico. Disseminar a pregação também é uma forma de apressar o retorno de
Cristo. Ao ver-se como portadora da mensagem da salvação, sem a qual o restante
encontra-se perdido, a Assembléia de Deus nega a alteridade, a pluralidade e a diferença.
Nesse sentido se evidencia pelo fechamento identitário, isto é, pela resistência em dialogar
com outras religiosidades, embora reconheça que não deve olvidar completamente de
outras igrejas protestantes.
A rejeição ao diálogo inter-religioso se materializa pela própria rejeição à
modernidade e como reação à hibridação, à heterogeneidade, à desterritorialização dos
costumes e à diluição dos laços de lealdades nacionais; por isso há reativação, no interior
do grupo, de laços comunitários e de pertencimento. Por isso, também, pode-se falar em
identidade: há um discurso, um modo de viver, uma visão de mundo, que, mesmo não
sendo evidentemente homogênea, busca dar unidade a esse grupo e norteia o cotidiano de
dezenas de milhares de fiéis.
Mariano (2005, p. 116) enfatiza que essa atitude dos pentecostais de estar na posse
exclusiva da salvação consiste em uma forma de afirmar-se e defender sua identidade
religiosa. Tais atitudes os impedem de relativizar sua visão religiosa, uma vez que o caráter
absoluto da doutrina foi o que os levou a reordenarem sua personalidade e recompor sua
integridade psíquica, ao mesmo tempo que lhes deixaram alheios às formulações teológicas
que os conduziu até ali. Por isso, para eles, “a relativização de sua fé representaria o perigo
de retorno à dolorosa experiência pré-conversão, quando os referenciais de sentido, as
regras e normas de conduta encontravam-se subjetivamente em frangalhos”. Por isso,
também a negação da alteridade é uma forma de desqualificá-los como possuidores dos
bens de salvação. Para tanto, retiram-lhes a legitimidade bíblica, o que, nessa visão
15
O mesmo princípio não se aplica às igrejas neopentecostais, que se diferenciam das pentecostais por
afirmarem o mundo e possuírem um código moral de ajustamento aos padrões sociais seculares. Também se
caracterizam pela exacerbação do maniqueísmo, manifestado na sua guerra santa contra o Diabo, o que
justifica sua atitude belicosa para com as religiões afro-brasileiras, também pela ênfase maior dada à teologia
da prosperidade, movimento surgido nos Estados Unidos com o nome de prosperity gospel ou the health-and-
wealth gospel . As mais conhecidas nacionalmente são Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), Igreja
Internacional da Graça de Deus e Igreja Renascer em Cristo. Mais recentemente, tem se destacado o
crescimento vertiginoso da Igreja Mundial do Poder de Deus, fundada por um bispo dissidente da IURD. As
duas primeiras foram as principais responsáveis pela popularização da Teologia da Prosperidade entre as
classes baixa e média (FRESTON, 1994, p. 146). Elas romperam, portanto, com a rigidez legalista do
pentecostalismo clássico e introduziram elementos de afirmação e positivação do mundo, enfatizando menos
o ideal de salvação no além. Em Imperatriz, muitas denominações protestantes adotam a teologia da
prosperidade e romperam com o ascetismo legalista da Assembléia de Deus.
17
no uso de roupas que cobriam todo o corpo, costume que também passou a ser adotado no
Brasil. No que diz respeito ao não uso de jóias por parte das mulheres, Almeida (2007, p.
70) enfatiza que este aspecto está relacionado à iniciativa do Estado sueco de melhorar sua
capacidade bélica no conflito contra a França no século XIX, e que por isso “confiscou todo
o ouro, prata e jóias em geral que seus cidadãos possuíam para a compra de armas, sendo
que, essa proibição se prolongou por um período de aproximadamente cem anos. Desta
maneira a aparência das mulheres brasileiras deveria ser semelhante a das mulheres
suecas”.
O padrão estético de seus usos e costumes é simultaneamente rígido e simbólico: se as
mulheres não usam minissaia ou calça comprida, os homens usam preferencialmente roupa
social, camisa de manga comprida e gravata, em todas as faixas etárias, o que, segundo
Camargo (apud MARIANO, 2005, p. 195-196) traz a ambivalência da rejeição ao mundo e
de sua afirmação, na medida em que a imposição legalista de um modelo de vestuário
renega a pluralidade de estilos da sociedade e simboliza “aspirações de ascensão social”,
uma vez que o padrão aceitável de vestuário masculino na IEADI
Não é necessário copiar. Nós somos pentecostais clássicos. Isso significa que somos
modelo para os outros. São eles, portanto, que devem aprender com as Assembléias de
Deus e não nós com eles, em matéria de doutrina pentecostal. É muita falta de bom
senso e de respeito para com nossa denominação copiar de grupos neopentecostais, que
sequer sabemos quem são, nem de onde vêm e nem para onde vão. Com a avalanche de
igrejas neopentecostais, liturgias e crenças para todos os gostos têm levado alguns de
nossos líderes a se fascinarem por esses movimentos, imitando e copiando seu sistema
litúrgico. Ora, quem pertence à nossa igreja não está enganado, são crentes que sabem o
que querem, que conhecem nossa doutrina, tradição, usos e costumes e com a nossa
19
forma de adoração. (...) As tentativas de mudança são sempre um fiasco, porque quem
não gosta da nossa maneira de cultuar a Deus, já foi embora para outras denominações.
Por que imitar e copiar outros movimentos? (...) Quem procura imitar esses
movimentos não se identifica com a nossa denominação e nem com a deles. Imitação é
sempre imitação. Não conquista os pecadores para Cristo, pois não tem público alvo
definido. Não conquista outro público porque essas pessoas já conhecem a Assembléia
de Deus. Por mais que se queira provar que são outros costumes, que as coisas
mudaram, não persuade as pessoas, porque as marcas das Assembléia de Deus são
muito fortes. (CPAD, 2004, p. 583-584)
Considerações Finais
Referências