Objetivos e Métodos de Estudo

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DESENVOLVIMENTO

INFANTIL

Tiago Cortinaz
Objetivos e métodos de
estudo da psicologia
do desenvolvimento
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Definir os principais objetivos da psicologia do desenvolvimento.


 Diferenciar os métodos de estudo da psicologia do desenvolvimento
e suas finalidades.
 Conhecer os principais procedimentos metodológicos utilizados na
psicologia do desenvolvimento: observações e entrevistas.

Introdução
Neste capítulo, você verá como a psicologia do desenvolvimento pes-
quisa a gênese de diferentes estágios do desenvolvimento humano, suas
causas e características principais, por meio de diferentes abordagens.
Você aprenderá que a psicologia do desenvolvimento é uma ciência em
constante evolução e, da mesma forma, seus objetivos têm evoluído.
Além disso, conhecerá os métodos introspectivo, experimental, clínico
e psicanalítico, assim como alguns de seus principais teóricos.

Objetivos da psicologia do desenvolvimento


A psicologia do desenvolvimento é o estudo e a pesquisa de diferentes aspec-
tos do desenvolvimento humano, desde a vida uterina até o envelhecimento.
É uma área do conhecimento que busca compreender como o tempo, a
hereditariedade, a fisiologia, experiências de aprendizagem e diferentes con-
textos (cultural, histórico e social, por exemplo), entre outros fatores, podem
influenciar o desenvolvimento humano (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA,
2002). Em decorrência da abrangência das dimensões do desenvolvimento
20 Objetivos e métodos de estudo da psicologia do desenvolvimento

humano que a psicologia do desenvolvimento estuda, essa disciplina tem


interfaces com outras áreas do conhecimento, como a biologia, a educação,
a sociologia e outras.
A psicologia do desenvolvimento busca atingir três grandes objetivos
gerais. O primeiro objetivo geral pode ser resumido como a identificação da
gênese de aspectos afetivos, cognitivos, motores e sociais do desenvolvimento
humano. O segundo objetivo geral é reconhecer as causas que levam ao sur-
gimento e às mudanças dos aspectos afetivos, cognitivos, motores e sociais
do desenvolvimento humano. O terceiro e último objetivo geral consiste em
distinguir os estágios ou fases do desenvolvimento humano, períodos espe-
cíficos do ciclo de vida em que um conjunto particular de aspectos afetivos,
cognitivos, motores e sociais do desenvolvimento humano se manifesta e se
mantém mais ou menos estável (CAMPOS, 2001).
É possível estabelecer alguns princípios gerais do desenvolvimento humano.
O primeiro deles é que o desenvolvimento humano é composto por diferentes
estágios/etapas/fases e cada uma delas apresenta um conjunto de caracterís-
ticas próprias. Ainda que a definição dos estágios do desenvolvimento e do
período em que ocorrem possa variar de acordo com os diferentes métodos
de estudo, é recorrente nos diferentes métodos de estudo que novos padrões
de desenvolvimento se constituam e se consolidem a partir de padrões esta-
bilizados em um estágio anterior. Outro princípio, relacionado ao anterior, é
que o desenvolvimento é sequencial e resultado de transformações estruturais
em aspectos afetivos, cognitivos, físico-motores e sociais dos indivíduos.
Um exemplo bastante ilustrativo desse segundo princípio é o fato de que a
criança, em um primeiro momento, engatinhe; em seguida, caminhe e, por
fim, consiga correr com destreza. O terceiro princípio que pode ser destacado
é que o desenvolvimento ocorre a partir de aspectos mais gerais para aspectos
mais específicos. Por exemplo, primeiro a criança desenvolve a motricidade
ampla (mexer pernas, braços e mãos, sentar, andar, correr e etc.) para, depois,
desenvolver a motricidade fina (coordenar mãos e olhos em tarefas específicas
como pintar, recortar, ler, escrever e etc) (COLL; MARCHESI; PALÁCIOS,
2004). Por último, pode-se destacar que ainda que os estágios do desenvolvi-
mento sejam constantes nos diferentes métodos de estudos, o desenvolvimento
pode ocorrer em ritmos/velocidades diferentes em indivíduos diferentes. Há
uma constância do desenvolvimento físico-motor (crescimento da cabeça,
tronco e membros superiores e inferiores, por exemplo) ao desenvolvimento
cognitivo (capacidade de raciocínio lógico indutivo/dedutivo, por exemplo),
mas não é possível determinar com precisão absoluta uma idade para que
todos os indivíduos atinjam determinado desenvolvimento.
Objetivos e métodos de estudo da psicologia do desenvolvimento 21

A psicologia do desenvolvimento contribui para uma melhor compreensão dos as-


pectos psicológicos do conhecimento humano, postula que há diferentes fases do
desenvolvimento humano e destaca a relevância das relações sociais e afetivas para
o aprendizado. Você já é capaz de identificar um autor ou uma teoria da psicologia
do desenvolvimento que contribui para o trabalho em sala de aula?

Métodos de estudo da psicologia


do desenvolvimento
Nas pesquisas realizadas na psicologia do desenvolvimento, diferentes mé-
todos de estudo com distintos objetivos e finalidades podem ser utilizados.
Nesta seção, você estudará os métodos introspectivo, experimental, clínico,
psicanalítico, de observação e de entrevistas. Esses métodos se destacam nas
pesquisas realizadas tanto por sua recorrência quanto por sua contribuição para
a consolidação da psicologia do desenvolvimento como área do conhecimento.
O método introspectivo é considerado o primeiro método de estudo utilizado
na psicologia científica. O método foi desenvolvido pelo médico, filósofo e
psicólogo alemão Wilhelm Wundt (1832-1920) e consiste no conhecimento das
emoções, crenças, memórias, pensamentos e etc. por meio de uma autoanálise
relatada pelo próprio indivíduo analisado. Nesse processo, o indivíduo é,
simultaneamente, sujeito do conhecimento (sobre si) e objeto de estudo (do
psicólogo) mediante a auto-observação realizada, já que, para Wundt (apud
SCHULTZ; SCHULTZ, 2016, p. 72), “[...] somente o indivíduo que passa
pela experiência é capaz de observá-la [...]”. O método introspectivo implica
a presença de observadores externos, previamente treinados, que descrevem
os conteúdos dos estados mentais relatados pelo indivíduo observado. Com
base nesse método, o pesquisador foca no estudo do consciente ou da tomada
de consciência acerca de estados mentais.
O método experimental exerce um papel de destaque no conhecimento
do comportamento humano e animal. Nesse método, o pesquisador manipula
determinado fator ou condição (variável independente) e observa as consequên-
cias dessa manipulação no comportamento em estudo (variável dependente). O
objetivo é conhecer comportamentos comuns a um grupo (animal ou humano)
e se divide em três etapas: hipótese prévia, experimentação e generalização
dos resultados. A hipótese prévia estabelece uma relação de causa-efeito
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explicativa para determinado fenômeno. Na experimentação, a variável de-


pendente é estudada a partir da manipulação da variável independente. Por
fim, na generalização, apresentam-se conclusões sobre os dados estudados.
Em linhas gerais, o método clínico pode ser definido como todo proce-
dimento de observação direta e minuciosa de entrevistas ou de situações
experimentais definidas (testes) (SCHRAML, 1973). O método clínico não
se propõe a ser um método de pesquisa acadêmica/científica e tampouco se
propõe a descobrir leis gerais sobre o comportamento humano. Caracteriza-se
como uma série de procedimentos de diagnóstico e tratamento de pessoas com
problemas de comportamento ou emocionais. O estudo se desenvolve sobre um
único indivíduo ao longo de quatro fases: anamnese, entrevista, observação
e testes. A anamnese consiste no levantamento da história do paciente com
base em fontes externas. A entrevista consiste na realização de perguntas ao
paciente, na tentativa de elaborar hipóteses a partir das suas respostas verbais
e não verbais (gestos, reações, etc.). A observação é o estudo dos comporta-
mentos do paciente buscando confirmar a hipótese selecionada. Por fim, os
testes objetivam confirmar as conclusões e também podem ser realizados no
início do método clínico para levantar informações acerca do paciente.
Se o primeiro método de estudo da psicologia científica buscava conhecer
o consciente (método introspectivo), o método psicanalítico busca conhe-
cer o inconsciente. Sigmund Freud foi o criador do método psicanalítico,
que demonstra a “[...] interferência de fatores inconscientes na operação da
racionalidade e sugere que estes opõem obstáculos ao estabelecimento de
um contato satisfatório com a realidade [...]” (BARROS, 2004, p. 22). Para
conhecer o inconsciente, Freud (GURFINKEL, 2008) estabeleceu uma série
de procedimentos, entre eles:

1. hipnose, que consiste em induzir o paciente, com base em intensa su-


gestão, a um estado semelhante ao sono, mas que ainda lhe possibilita
alguma comunicação;
2. interpretação dos sonhos, que consiste em analisar as imagens de re-
calcamentos, ansiedades e medos presentes nos sonhos;
3. atos falhos, fenômenos relacionados a lapsos de linguagem, de escrita
e/ou esquecimentos momentâneos de palavras que são considerados
falhas de caráter insignificantes e de curta duração;
4. transferência, que consiste na transferência inconsciente de sentimentos
de ternura ou de hostilidade (transferência positiva ou negativa) para
o psicanalista.
Objetivos e métodos de estudo da psicologia do desenvolvimento 23

A cocaína já foi utilizada como um analgésico antes da


descoberta de seus efeitos nocivos. Também foi utilizada
na constituição de produtos como refrigerantes e pastilhas
para a garganta. Freud se interessou por seus efeitos e
estudou seu uso para propósitos terapêuticos (GURFINKEL,
2008). Saiba mais sobre esta história no texto disponibili-
zado no link a seguir.

https://goo.gl/s13QpN

Principais procedimentos metodológicos


utilizados na psicologia do desenvolvimento:
observações e entrevistas
As observações e entrevistas são procedimentos metodológicos que podem
ser utilizados em diferentes áreas do conhecimento e analisados a partir de
diferentes métodos de estudos. Nesta seção, você conhecerá os diferentes
tipos de observação (laboratorial e naturalista) e entrevistas (estruturadas,
semiestruturadas e não estruturadas).
A observação com finalidade científica, em geral, é parte de um projeto
de pesquisa e, por isso, tem planejamento, método nos registros e está sujeita
aos objetivos da pesquisa. A observação é recomendada quando se busca
identificar fatores sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que
influenciam seu comportamento. Por isso, é um procedimento metodológico
útil à psicologia do desenvolvimento e especialmente utilizado no estudo de
crianças pequenas (não falantes) e bebês.
Na observação laboratorial, busca-se registrar comportamentos que ocor-
rem em situações criadas pelo pesquisador. O objetivo é que os indivíduos
observados estejam todos nas mesmas condições, sendo possível distinguir
comportamentos decorrentes de estímulos do meio ou próprios de cada in-
divíduo. A observação laboratorial pode ser direta, quando o pesquisador
compartilha o meio com o indivíduo observado e interage com ele diretamente,
e indireta, quando o pesquisador utiliza dispositivos para realizar a observação
(vídeos, áudios, etc.).
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A observação naturalista é um dos procedimentos metodológicos mais uti-


lizados na psicologia do desenvolvimento na contemporaneidade e consiste em
observar e registrar os comportamentos dos indivíduos em seus meios cotidianos,
tais como suas famílias e escolas. Nesse tipo de observação, não há controle e/
ou manipulação de variáveis, o que contribui para a naturalidade da observação.
Em decorrência disso, a observação naturalista talvez não seja a mais adequada
ou compatível com o método de estudo experimental, assim como se diferencia
e se distancia da observação laboratorial. Ao realizar a observação naturalista,
há que se considerar uma possível alteração nos comportamentos observados
em decorrência da presença do pesquisador (por exemplo, ao observar uma sala
de aula em uma pesquisa). Isso pode ser atenuado mediante um tempo maior de
permanência do pesquisador no meio observado e pela habituação dos indivíduos
observados ao pesquisador como parte do meio. A observação naturalista se
interessa pela relação dos indivíduos com o meio em que estão inseridos e, por
isso, tem sido muito utilizada nas pesquisas da psicologia do desenvolvimento.
As entrevistas têm como objetivo obter dados sobre os indivíduos estudados
que permitam ao pesquisador realizar análises fundamentadas em seu método de
estudo e/ou teoria. Destacam-se três tipos de entrevistas nas pesquisas realizadas na
psicologia do desenvolvimento: estruturadas, semiestruturadas e não estruturadas.
Nas entrevistas estruturadas, as perguntas são definidas previamente e são
realizadas a todos os indivíduos entrevistados na mesma ordem; não são acrescidas
e ou suprimidas perguntas nesse tipo de entrevista. O objetivo é garantir que as
respostas possam ser categorizadas e que comparações possam ser realizadas entre
os indivíduos estudados ou entre diferentes períodos de realização das entrevistas.
As entrevistas semiestruturadas são mais flexíveis e permitem o acrés-
cimo de novas questões a partir das respostas dos indivíduos estudados. Nas
entrevistas semiestruturadas, o pesquisador se guia mais por tópicos que
objetiva abordar do que por um conjunto de perguntas previamente definidas.
A entrevista semiestruturada proporciona maior liberdade ao pesquisador, “[...]
ao mesmo tempo que [...] oferece todas as perspectivas possíveis para que o
informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo
a investigação” (TRIVIÑOS, 1987, p. 146).
Por fim, nas entrevistas não estruturadas, há um objetivo geral definido pelo
pesquisador, mas não há perguntas ou tópicos específicos definidos previa-
mente. O pesquisador pode realizar diferentes perguntas, as que lhe pareçam
mais adequadas, para diferentes indivíduos, tendo em conta o objetivo geral
sobre o qual pretende obter dados. O pesquisador se adapta às características
e prioridades do indivíduo estudado.
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A epistemologia genética de Jean Piaget fundamenta muitos estudos realizados em


escolas e, ao mesmo tempo, pode ser um bom exemplo de observação laboratorial. Os
testes desenvolvidos pelo autor para investigar o nível de desenvolvimento cognitivo
das crianças são replicados em diferentes contextos e os resultados são muito similares
aos encontrados por Piaget.

BARROS, E. M. R. Método psicanalítico. Cienc. Cult., São Paulo, v. 56, n. 4, p. 22-25,


Dec. 2004. Disponível em: <http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0009-67252004000400013&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 22 jan. 2018.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo
de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
CAMPOS, D. M. S. Psicologia e desenvolvimento humano. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
COLL, C.; MARCHESI, Á.; PALÁCIOS, J. (Org.). Desenvolvimento psicológico e educação.
2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. (Psicologia da Educação Escolar, v. 2).
GURFINKEL, D. O episódio de Freud com a cocaína: o médico e o monstro. Revista Lati-
noamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, v. 11, n. 3, p. 420-436, set. 2008.
SCHRAML, W. J. Précis de psychologie clinique. Paris: PUF, 1973.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em
educação. São Paulo: Atlas, 1987.

Leituras recomendadas
CORIA-SABINI, M. A. Psicologia do desenvolvimento. 2. ed. São Paulo: Ática. 2004.
FADIMAN, J.; FRAGER, R. Teorias da personalidade. São Paulo: Habra, 1986.
LAKOMY, A. M. Teorias cognitivas da aprendizagem. Curitiba: IBPEX, 2003.
PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 12. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2013.
Schultz, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da psicologia moderna. 10. ed. São Paulo: Cengage
Learning, 2016.

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