Rogéria de Ipanema - Pedra Litográfica e Museu Do Açude

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GB

lIIstora
deRio de Janeiro
em

ORCANIZAÇAO
PAULO KNAUSS, ISABEL LENZI E MARIZE MALTA

F G V EDITORA JAU
EDITORA
FAPERR
undaç oLaro
a P e s q u l e a do E s a d
Pedra
litográlica MUSEU DO AÇUDE/
MUSEUS CASTRO MAYA
OtCAOA DE 1950

Rogéria de Ipanema

Houve um
tempo em que por de trás Estamparia Colombo, somaria ao seu
dos rótulos das
embalagens havia uma
pedra, ou melhor, havia acervo museológico 478 pedras litográ-
no
várias pedras ficas com imagens de marcas de rótu-
processo de
dos impressão das marcas los de produtos que circularam na ci-
produtos comerciais, como as
se que dade em outros tempos. Hoje, as pedras
encontram expostas no
Açude, no Alto da Boa Museu do expostas na Galeria Debret do Museu
na Vista, instalado do Açude evocam uma época da cida-
antiga casa do
Raymundo Ottonicolecionador
de Castro
de arte de caracterizada pela difusão de deter-

(1894-1968). Em 1956, o rico Maya minado tipo de imagem impressa.


fomentador cultural, ao industrial
c
As pedras participavam do uni-
adquirir a verso gráfico da litografia, que con-

287
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JNONI VE DIHV

GAORD
HISTORIA 0O RIO DE JANEIRO EM 45 09JETOS

siste no processo de impressão sobre preto a última a


passar pela prensa,
papel de uma imagem desenhada so- definindo os contornos e fechando a
bre uma pedra calcária que deve ser estampa. Este processo restringe as
bem polida, evitando a superficie gra- gradações tonais e resulta em uma ar-
nulada, típica das rochas sedimenta- te chapada, de baixa
resoluço de vo-
res. A litografia foi inventada em 1796, lume e
profundidade. Não que isso
na Alemanha, e estabelecida na Eu- seja um
problema em si, já que, no
ropa na primeira década do século campo das artes visuais, os litógrafos
XIX. Lito significa pedra, e grafia sig- exploram exatamente estes efeitos pla-
nifica escrita ou desenho. O processo nos para a sua criação. Contudo, a in-
da litografia aparece no Brasil um dústria gráfica se desenvolveu procu-
pouco antes da década de 1820, ini- rando apresentar as mesmas qualida-
cialmente de forma particularede des da fotografia no que se refere à
uma maneira muito restrita. Em 1825, aparência da imagem real, com volu-
é o governo que instala uma oficina me, profundidade e valores tonais.
litográfica oficial e, a seguir, estabe- Oprocesso foi implementado por
lecimentos litográficos começama volta da década de 1940, a partir de
suprir a reprodutibilidade da imagem uma mídia intermediária entre o ori-
em edições impressas mecanicamen- ginal e a matriz, que é o fotolito. Na
te e iguais a partir de um mesmo ori- litografia, o desenho é realizado di-
ginal. Consolidando-se em meados retamente na pedra, que já é a própria
do século, estes estabelecimentos aten- matriz das futuras impressöes, com
deram a algumas finalidades edito- o fotolito, e este lito advém de litogra-
riais da época -

com imagens em pre- fia, a imagem-referência é subdividi-


to e branco como os álbuns de vis- da em quatro filmes transparentes
tas, costumes e retratos, caricaturas reticulados (retículas -pequenos pon-
em jornais, rótulos de produtos. A tos), correspondentes às quatro tintas

impressäo a cores viria muito depois, de impressão: ciano, magenta, ama


tendo existido
aproximadamente en- relo e preto. Deles são produzidasqua
tre 1900e
1970, necessitando de uma tro matrizes e, pelo método
das qua
cores

as
pedra-matriz para cada cor, sendo o tro impressões sobrepostas,

288
PEORA LITOGAACICA

novamente,
retornando- ainda se encontravam no centro da
reunidas
são cidade, por exemplo,
do original, que pode se as antigas casas
sa, se à imagem
declichs.
o a em cópias às centenas, aos Chegado ao Brasil no final
multiplicar
milhões. Estas matrizes do século XIX, o clichê é uma matriz
as aos
milhares,
de
ser de plástico, de metal, de impressão obtida a partir da gra-
podem
da serigrafia, além
de vação fotomecânica de uma placa de
nylon, nocaso
outros m a t e r i a i s .
metal. Largamente utilizado para a
Aqualidade do suporte depende reprodução de fotografias, principal-
O sistema mente na imprensa do século passado.
rido sistema de impressão.
offset, por exemplo, responde pela Hoje, clichêéo termo empregado pa-
das ra alguma coisa que não é criativa,
impressão de grandes quantidades
formas impressas com as quais con- mais do mesmo, uma cópia, o igual
vivemos, como cartazes, revistas, jor na era digital.
nais, capas de livros, cadernos e CDs, Há mais uma história do Rio de

postais de lembranças, turísticos, co- Janeiro que se revela entre as artesli-


mo as imagens da cidade, panfletos e tográficas e a imprensa. Trata-se da
rótulos. E se a indústria gráfica ino- imprensa artística de humor, que por
vou com o fotolito, o sistema de im- meio da imagem realizou uma critica

pressão offset também é devedor da dos costumes da cidade e dos movi-


velha litografia, que se baseia na in- mentos do poder, revelando-se uma
compatibilidade entre aágua eagor- importante forma de apresentação do
dura das tintas de
impressão. pensamento politico e social urbano,
Mas épreciso pensar que os pro que circulou na segunda metade do
Cessos de
modernização industrial século XIXeatravessou o século XX.
não
chegama todos e nem ao mesmo As revistas e jornais do segundo rei
po,e esta nova era da impressão nado, de D. Pedro II, fizeram da ca-
mundial da
lo
segunda metade do sécu ricatura, como a charge e o cartum
XX
conviveu, também no Rio de dos dias de hoje, uma forte expressåo
Janeiro, com antigos
processos gráfi- visual da cidade que era então a corte
COS,como a
do, até o litografia. Do mesmo mo- do pais. A Vida Fluminense, O Mos-
início da decada de 1990, quito e a Revista llustrada são exem-

- 289 -
WISTORIA 00 AIO O JANEIRO EM 46 0B JETOS

plos de titulos do jornalismo humo- pelo custo relativamente


alto
ristico carioca do período, onde se
população pobre e com umpara uma
destacam otraço e a opinião do litó- número de analfabetos. imenso
grafo Angelo Agostini. Neste tempo, As histórias que vêm das
a oferta e o consumo de
imagens se Ppertencentes ao pedras
Museu do
ampliavameaimprensailustrada pô- latitudes construídas pela Açude são
de alcançar maiores
quantidades com em série da letra reproduçâo
e da
a moderna tecnologia das litografias 1807, a Corte
imagem. Em
a vapor. portuguesa partiu de
Lisboa para o Rio de
Herdeiro direto da imprensa ca- afugen-Janeiro,
tada pelas invasões
ricata do francesas lidera-
Império, outro nome das das por
artes gráficas se destaca na
Napoleão. Como houvera, no
primeira entanto, um determinado
metade de 1900: o carioca da planeja-
gema J. mento para a
Carlos. Em traços econômicos e de governança além-mar,
vieram com o
alta definição, ele observou príncipe regenteD. João
da politi- e a sua família
ca nacional ao
os membros do Con-
cotidiano feminino, selho de Estado e ostrês ministros.
contribuindo com milhares de dese-
nhos para revistas
Um deles, o ministro dos Negócios
ilustradas como O
Malho, Careta, O Tico-Tico, Estrangeiros e da Guerra, Antonio de
Tagarela, Araujo e Azevedo, conde da Barca, trou-
OCruzeiro, Para Todos e Eu sei tudo.
A Fon-Fon carregou o título
xe o
equipamento gráfico da impren-
ao som sa do Estado, para poder publicar os
da buzina do
automóvel a gasolina despachos, cartas e decretos. Hoje. a
que passeava na urbanidade da mo-
derna Avenida mprensa Nacional, responsável pelo
Central, a atual Ave- Diário
nida Rio Branco. Oficial da União, é a descen
seu conceito fez dência da então denominadaImpre
ressoar um
modernismo 15 anos
tes da buzina
an- Sao Régia, estabelecida no Rio de Ja
Klaxon, nome da revis- neiro em 1808, com as mesmas com
ta
paulistana da Semana de Arte Mo- petências de tornar públicos os ato
derna de 22. Os
periódicos com ima- de governo.
gens litografadas eram
cidade viva, mas corpos de uma Com estas prensas
gráficas,
ainda muito seletiva com

Iniciou-se o jornalismo no Brasil


iniciou-se o jornalish
290
LSnONT VODIGV3V3S

EORDRDU
CA 00
o lançamento do pequenino jornal de val da Música Popular
19 x 13,5 cm, a Gazeta do Rlo de Ja- seu palco para abri.
bria Brasileira
neiro, em 10 de setembro de 18O8. De
Caetano
nas bancas de revistasVeloso."O S¢
me
enche
pois, surgiriam várias gazetas: Gaze- alegria e preguiça, quem le tanta de
no.
ta de Notlcias, veleulo da campanha icia? Eu vou!" cantava
abolicionista, Gazeta Operária, Lite no, dissolvido na
ousado baia. o

alegria carioca. Lan


rária, Academica, Agrlcola, dos Tea- çava assim a musica pop, ao
tempo
tros, lHospitais, do Banho, dos Sá-
dos em que as pedras do Museu ainda ro-
bados, dos Domingos, do Brasil, a Ga- tulavam seus produtos, mas com
mui
zeta Suburbana e a Gazeta Universal. ta-muita, Alegria-Alegria. Iniciada
A grande imprensa carioca do século com a guitarra elétrica é com razão
XIX foi construlda de inúmeros títu- que a música torna-se mais um ele
los, todosimportanteseespeciais, mas mento relacionado à pedralitográfica,
é preciso citar o mais antigo jornal pois o mercado das partituras impres

em circulação no Riode Janeiro, a fo- sas difundiu a música pautada no Rio


Iha histórica publicada desde 1827, o de Janeiro desde o século XIX. Hora
de registrar que näo foi um fenómeno
Jornal do Commercio. E a letra e a ima-
gem durante todo oséculo
XX foram do acaso, e sim uma vocação, pois a
potencializadas com uma vigorosa primeira impressäo litográficainven
Sene-
imprensa, demarcando inclusive, que tada pelo escritor teatral Aloys
felder foi de marcha musical!
cidade foi até 1960, a Capital Fede- a uma
re-
ral do país. Enfim, as pedras litográficas
cidade cons
Os veiculos e os sistemas de co- velam histórias de uma

municação nas décadas de 1950 e 1960 truída por imagens e sonseareno


mídias contem
p e r m a n e n t e das
se expandiram para redes locais, na- Sao
no
século XX
porâneas é provocada,
cionais, mundiais, superando o uso
essencialmente v
da pedra calcária para divulgação da por uma cultura
p l u r a l i d a d e
das

imagem. E como a história é constru- sual, confirmada pela


coabitam o
nosso espay
que na dé-
ida por várias vozes, no período em magens
S u b s t i t u i d a s
na
de

cotidianamente.
que a televisäo se popularizava nas
daimpren
os
usos
grandes cidades, em 1967, o I1I Festi- cada de 1970 para

292
PEORALIT0CRAICA
sa e design grafico, como, por exem-
plo, nos rótulos de embalagens,
as
BIBLIOGRAFIA
pedras continuam a ser usadas, no BARBOSA, Marialva.
Marialva Os
poder público. Rio de donos do Rio: imprensa.
e

entanto, nos processos de expressão 2000. Janeiro: Vicio de Leitura.

artística. Hoje as pedras litográficas CARDOSO, Rafael. (org).


são raras enquanto objetos resguar- destaques da históriaImpresso
e
1830): no Brasil (1808-
dados na geografia do Museu do Açu- Biblioteca Nacional. Rio de gráfica no acervo da
2009. Janeiro: Verso
de preservam um patrimônio cultural Brasil
da cidade muito além da sua materia- IPANEMA, Rogéria de.
lo XIX Impressóes arte e
Relações da litografia caricaturasécu-
no

lidadeimediata. Rio de Janeiro: do


e a
no
gênero jornalistico francès à
prensa im
política brasileira. Revista do Instituto
tórico e His
Geográfico do Rio de Janeiro, IHGRI. p.
70, 2010. 52
OLIVEIRA, Cláudia, VELLOSO, Monica
Pimenta,
LINS, Vera. O moderno em revistas:
do Rio de
representações
Janeiro de 1890 a 1930. Rio de Janeiro:
Garamond, 2010.

doutora
ROGERIA DE IPA NEMA Ce protessora
Ieoria da Arte c
do Departamento de Historia
e

Artes
do Programa de Pos Graduação
em

Federal do Re de
Visuais da U'niversidade

Janeiro. F membro
do Instituto Histor
de Janeiro
ieografio do Rio

93

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