Martyn Lloyd-Jones - O Sob Re Natural Na Medicina.

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O Sobrenatural na Medicina

D. M. Lloyd-Jones

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evangélicos
O SOBRENATURAL NA PRÁTICA DA
MEDICINA

D. M. Lloyd-Jones *

O título desta palestra é um tanto pretensioso.


Espero que ele não venha a ser errôneo. Deixem-me
dar uma breve explicação do objetivo deste título. Creio
que tem chegado a hora para reconsiderarmos algumas
de nossas atitudes existentes para com a vida e a
prática; atitudes do crente, em geral, e especialmente
do crente ocupado na prática da medicina, para quem
surgem certas dificuldades. Proponho, particularmente,
reexaminar a questão toda do que chamamos "cura
pela fé", ou, se quiserem, "cura miraculosa".
O título me permitiria examinar mais do que isso,
porém numa só oportunidade não é possível fazer mais
do que isso. Deixem-me debuxar o fundo e explicar-lhes
por que eu estou examinando esta questão. Todos os
médicos cristãos são continuamente questionados
sobre este assunto, seja por um paciente, um parente
ou simplesmente uma pessoa interessada. Há alguém
desesperadamente doente, e a ciência médica, ou a
arte médica, se quiserem assim chamá-la, tem feito o
máximo possível; no entanto, o paciente está piorando
e alguém sugere a possibilidade da "cura pela fé".
Então o médico cristão depara com o problema e é
forçado a tomar uma decisão sobre o mesmo.

*
D. M. Lloyd-Jones, M.D., M.R.C.P., anteriormente pastor da Capela de Westminster. Antes
de entrar no ministério, Dr. Lloyd-Jones havia sido primeiro cirurgião assistente do Sir
Thomas Horder (posteriormente Lorde Horder) na sua equipe médica no Hospital São
Bartolomeu, como também no seu consultório particular.
Um Interesse Especial no Assunto
Eu mesmo tenho lutado com este problema por
muitos anos. Acho que de todas as perguntas que me
foram feitas durante os anos, nenhuma tem sido feita
mais freqüentemente do que esta. Fui subitamente
confrontado pela questão em 1928. Estivera no
ministério cristão durante uns doze meses — isto é,
havia sido pastor de uma igreja — e eu tinha ido pregar
numa pequena cidade no Vale de Glamorgan.
Terminado o último culto, aproximaram-se de mim dois
pastores locais que me perguntaram se eu estaria
disposto a voltar outra vez, com o propósito de liderar
uma conferência sobre a questão da "cura pela fé".
Fiquei um tanto surpreso com o pedido, já que vinha de
pessoas de uma comunidade agrícola, onde não se
costuma encontrar esse tipo de questão, portanto
perguntei-lhes por que tinham interesse nesse assunto.
Responderam, dizendo que um pastor pentecostal
havia estado lá pouco antes da minha visita, liderando
um trabalho missionário por dez dias. Tinham decidido
apoiá-lo e haviam de fato feito isso. Como resultado
desse trabalho missionário por dez dias, sessenta e seis
pessoas foram convertidas. Os pastores continuaram,
dizendo que estava claro para eles que as conversões
não foram devido à pregação. "Então foram devido a
quê?" perguntei. "Bem", disseram, "as conversões
foram devido às curas". Várias pessoas haviam sido
curadas durante as reuniões, e os pastores atribuíam os
sessenta e seis convertidos a isso. Eles mesmos não
acreditavam na "cura pela fé", mas ficaram
impressionados com os resultados da campanha e
ficaram pensando se, talvez, não houvesse algo de
errado com suas próprias perspectivas teológicas sobre
o assunto. Queriam, portanto, essa conferência; e, um
pouco relutante, concordei em estar presente.
Por alguma estranha razão, esqueci
completamente a minha promessa e, já que não recebi
nenhuma comunicação deles, a tal conferência saiu dos
meus pensamentos. Nove meses mais tarde, porém,
recebi outro convite para pregar naquela área e o
aceitei. Enquanto viajava de trem àquele lugar, eu me
lembrei de tudo e fiquei um tanto receoso de como
seria recebido, especialmente por esses pastores! No
entanto, olhando a congregação e notando que os dois
irmãos estavam aí, vi aliviado que eles pareciam como
de sempre. Ao terminar o culto, vieram à frente para
falar comigo. Antes que pudessem dizer qualquer coisa,
comecei com "Bem, estou convencido de que vocês são
dois bons crentes". Responderam: "Por que diz isso?"
Expliquei: "Porque obviamente vocês têm a graça para
perdoar". "O que quer dizer?" — perguntaram. Lembrei-
lhes que haviam me pedido para liderar uma
conferência sobre a "cura pela fé" e que eu não havia
feito isso. Sorriram, dizendo: "Não temos mais interesse
nesse assunto". "E por que não?" indaguei. "Bem", me
disseram, "nenhuma das pessoas alegadamente
curadas continuou curada, e nenhuma das sessenta e
seis pessoas alegadamente convertidas permaneceu na
fé; então não temos mais interesse na cura pela fé".
Devo confessar que pensei então que isso encerrava a
questão.

Interesse Contemporâneo
Entretanto, de fato não encerrou o assunto para
mim; e desde então sempre estive enfrentando esse
problema específico. Além disso, sinto que nestes
últimos anos a questão tem se tornado muita mais
aguda. Há certos fatores novos que têm me obrigado a
pelo menos reconsiderar toda essa questão; portanto
estou expondo os meus pensamentos, merecedores ou
não, para vocês. Hoje em dia, há um novo interesse em
fenômenos. Existe, também, o assim chamado
"Movimento Carismático", no qual fala-se muito sobre a
cura miraculosa além de certas outras manifestações.
Demais disso, há uma recrudescência do que
devemos chamar de possessão demoníaca. Estive
recentemente numa reunião de pastores onde fiquei
surpreendido com o número de homens que se
levantaram para contar sobre casos de possessão,
casos que senti obrigado a aceitar como genuínos.
Também tenho encontrado esse problema noutras
formas. Para muitos pastores surge a séria questão de
como distinguir entre a doença mental e a possessão
demoníaca, e como se deve lidar com tais casos. Um
livrete, publicado pela Fraternidade Missionária Oriental
sob o título Roaring Lion,1 trata especificamente dessa
questão de possessão demoníaca. Considero-o um
excelente livrete. Também me foi dito que o famoso
livro de Nevins sobre Demon Possession 2 está prestes a
ser republicado após estar esgotado durante muitos
anos. Tudo isso indica um novo interesse no assunto.
Também há o livro pelo teólogo alemão, Dr. Kurt
Koch, sobre o Revival in Indonesia,3 no qual são
registrados vários casos de cura miraculosa. Dr. Kurt
Koch é uma pessoa equilibrada, um bom teólogo com
uma boa mente científica, e ele é cauteloso nas suas
afirmações. De fato, às vezes, tem-se o pressentimento
de que ele é cauteloso demais. Seu livro Christian
Counselling and the Occult,4 por exemplo, demonstra
uma grande cautela ao aceitar afirmações como fatos
verídicos. Ele escruta, testa e examina cada relatório.
Ele faz esse relatório sobre o que ele tem visto em duas
1
Roaring Lion (Leão que ruge), Robert Peterson, O.M.F., 1968.
2
Demon Possession (Possessão demoníaca), John L. Nevins, 1897.
3
Revival in Indonesia (Reavivamento na Indonésia), Kurt Koch, Kregel
Publications.
4
Christian Counselling and the Occult (Aconselhamento cristão e o oculto), Kurt Koch,
Kregel Publications, Grand Rapids, U.S.A., 1965.
visitas à Indonésia, onde, durante os últimos cinco ou
seis anos, o país tem conhecido um notável avivamento
espiritual.

Interesse Contemporâneo na América


No entanto, o que tem realmente cristalizado toda
essa questão para mim pessoalmente, foi uma
experiência pela qual passei na América há dois anos.
Estava lá durante uns cinco meses. Certos professores
de um célebre seminário teológico, onde tende-se a ser
intelectual e cético de qualquer coisa que se aproxima
ao entusiasmo, perguntaram-me o que eu pensava
sobre a "cura pela fé" e, especialmente, sobre as
atividades de uma senhora chamada Kathryn Kuhlman.
Acontece que eu tinha lido o livro escrito por Kathryn
Kuhlman, cujo título é I Believe in Miracles (Acredito em
milagres); mas o que me interessava era por que eles
se importavam com esse assunto. A resposta foi que
um pregador americano bem conhecido, Dr. Harold
Ockenga de Boston, havia convidado a Sra. Kathryn
Kuhlman para realizar algumas reuniões na sua igreja.
Desde que foi o Dr. Ockenga que tinha convidado essa
senhora, certo aluno daquele seminário havia
acompanhado um amigo a uma das reuniões.
Chegaram à reunião céticos, mas partiram cheios de
entusiasmo e bem impressionados, e escreveram para
casa sobre suas impressões. Portanto, o problema
ocorrera de forma imprevista e direta para meus
colegas professores. Havia muita discussão sobre o
assunto e queriam conhecer nossa avaliação.
Daí, quando fui a Cincinnati, encontrei novamente
essa mesma questão. Todo outono, há uma convenção
anual que se realiza em Cincinnati e, entre os oradores
que haviam sido convidados para o próximo outubro,
houve um bem conhecido pregador, de Pittsburgh. Tudo
estava correndo bem até que alguém soube que esse
pastor estava emprestando a propriedade da sua igreja
para Kathryn Kuhiman, para que ela pudesse realizar ali
suas reuniões de cura e instrução bíblica. Esse relatório
causou um sério problema para o conselho executivo
dessa convenção, e pediram-me a minha opinião e o
meu aconselhamento. Havia grande divisão entre os
membros do conselho sobre se deveriam permitir que
esse homem falasse na convenção, já que ele apoiava
as reuniões de cura de Kathryn Kuhiman. Assim, foi
necessário que eu enfrentasse novamente a questão; e
o que proponho fazer agora é compartilhar com vocês o
resultado das minhas meditações e deliberações
durante aquele período e desde então até agora.

Duas Atitudes Principais


Creio que estou certo ao dizer que existem dois
pontos de vista principais, entre cristãos, com respeito
a este tópico de "cura pela fé". O primeiro destes
consiste de pessoas que ficam impressionadas demais
com a ocorrência de certos fenômenos., Coloco-o assim
deliberadamente. Creio que o pastor em Pittsburgh, já
citado, seja um exemplo disso. Não estou divulgando
nenhum segredo, porque ele mesmo tem falado sobre
isso em público. Ele é pessoa de boa reputação e de
bom juízo. Ele apóia essas reuniões de Kathryn
Kuhlman e dá suas razões por assim fazer. Ele diz que,
nas igrejas de denominações tradicionais, temos todos
nos esforçado durante muitos anos, porém pouco
parece acontecer. Ele continua, e afirma,
alegadamente, temer que nós que pertencemos às
denominações mais antigas seremos deixados de lado.
Estão acontecendo coisas, pessoas estão sendo
despertadas e comovidas, pessoas do mundo inteiro
têm sido atraídas, convertidas e juntadas à Igreja por
intermédio de pessoas tais como a Kathryn Kuhlman, e
aquele pastor temia que os membros das
denominações mais antigas, nas suas posições
entrincheiradas, estivessem privando-se duma obra
extraordinária que Deus está fazendo. Como resultado,
ele havia mais ou menos abandonado o seu velho ponto
de vista e, de maneira completamente indiferente,
havia dito, "Precisamos entrar nisto; precisamos ver o
que é. Qualquer que tenha sido o nosso ponto de vista
até agora, precisamos estar preparados a reexaminar
tudo". E parecia-me que ele e outros consigo —
incluindo Dr. John A. Mackay e seu patrocínio a David
du Plessis nos círculos do Concílio Mundial de Igrejas —
estavam praticamente dizendo: "O que importa a
teologia quando vê-se acontecendo esse tipo de coisa?"
Essa atitude está se manifestando de outra forma em
conexão com o novo Movimento Carismático; não tanto
com respeito à cura quanto às "línguas" e tais coisas.
Essa atitude está se manifestando em lugares
inesperados. Os católicos romanos estão participando
desse movimento, especialmente nos Estados Unidos e
na América do Sul. Recentemente, foi publicado um
livro chamado Catholic Pentecostalism.1 Esse é um livro
que nos obrigará a pensar nova e urgentemente sobre
estas questões. Nisso tudo, há um elemento muito
perigoso, pois a tese principal parece ser que a teologia
não importa. O que é realmente importante, dizem, é
que se tem tido uma experiência viva com o Espírito
que se manifesta na forma de certos dons. Então pode-
se acreditar em quase qualquer coisa contanto que se
possua tais manifestações. Coloco tudo isso sob o
cabeçalho geral de "capitulação a fenômenos". É a
posição na qual a sua teologia e a sua doutrina são
mais ou menos determinadas por fenômenos. Aqueles
que tomam essa atitude constituem um grupo bem
grande.

1
Catholic Pentecostalism (Catolicismo Pentecostal), Kevin e Dorothy
Ranaghan, Paulist Press: Deus Books, Paramus, New Jersey.
O outro grupo consiste daqueles que tendem a
rejeitar tudo isso "in toto" (totalmente). Consideram
que este assunto não merece muita discussão, que
vimos ouvindo sobre isto durante muitos anos, e que o
quanto menos tenhamos a ver com isto, melhor.

Rejeição das Reivindicações


Quero examinar essas duas atitudes e
começaremos com a segunda. Aqueles que rejeitam as
reivindicações desses fenômenos — cura miraculosa,
demonologia, falar em línguas estranhas, etc. — assim
o fazem, creio, por três razões principais. A primeira
não é tanto uma razão quanto a afirmação de um fato.
Simplesmente recusam-se a considerar o assunto. O
conceito inteiro é descartado por ser psicológico ou,
talvez, algo até pior; geralmente, porém, é considerado
simplesmente psicológico. Essa atitude vem ao
considerar o tipo de pessoa que geralmente está
envolvido com essa espécie de assunto. Por exemplo,
tenho conhecido pessoas que diziam: "Bem, aí está. O
que mais você quer? Aqui está — Kathryn Kuhlman,
uma mulher pregando!" Não se precisa dizer mais. Daí
continuam, recontando certos excessos e aberrações
entre os pentecostais, e outros exemplos de tais coisas.
Tratando da mesma forma os acontecimentos em
Lourdes entre os católicos romanos — acontecimentos
aos quais foram dados muita publicidade — essas
pessoas recusam-se a considerar qualquer possibilidade
de realidade. Por quê? Por causa da própria origem de
Lourdes. Surgiu da experiência da jovem camponesa,
uma ingênua, a qual alegou ter tido uma visão da
virgem Maria. Não é preciso acrescentar mais nada,
dizem; não há verdade nisso; é tudo uma tapeação.
Mesmo que sejam feitas grandes asserções, não podem
ser verdadeiras. É claramente impossível e deve-se
simplesmente descartar o assunto, ou por causa das
pessoas que estão envolvidas, ou devido à origem do
movimento, ou tais considerações.
Também, há os que rejeitam o assunto pelo que
chamariam de bases científicas. Eles mantêm que as
leis da natureza tornam tais coisas totalmente
impossíveis, que a natureza é um sistema fechado e
que a natureza é uma questão de causa e efeito. Por
conseguinte, os milagres são impossíveis.
Essa, é claro, é a velha atitude liberal para com os
milagres. Matthew Arnold a colocou tão bem — "Os
milagres não podem acontecer, portanto não
acontecem, e não têm acontecido". Tal seqüência de
pensamento é bastante lógica. Se os milagres não
podem acontecer, então de fato não aconteceram; e
não há necessidade de dizer mais nada. Tenho até
conhecido muitos evangélicos que aderiram a essa
atitude supostamente "científica" que nega a
possibilidade do miraculoso, por causa de uma
percepção estática da natureza e das suas leis.
Existe ainda um terceiro grupo, que coloco sob o
título de "bíblico". Esse grupo consiste daqueles que
prestam pouca atenção a todas essas afirmações
porque mantêm dogmaticamente o ponto de vista de
que o miraculoso, e todas as tais manifestações
espirituais, cessaram com os apóstolos e que, desde
que recebemos o cânon completo do Novo Testamento,
todos esses tipos de fenômenos extraordinários
acabaram. Essa tem sido uma opinião muito comum
entre nós. Aqueles que a sustentam procuram defender
o argumento em termos de uma exposição do capítulo
13 da Primeira Epístola aos Coríntios, sobre essas
coisas acabarem quando vier o conhecimento (I
Coríntios 13:8-13); e, dizem: "o conhecimento aí
significa a apresentação das Escrituras completas".
Sob este mesmo título geral bíblico, eu colocaria a
atitude expressa claramente num livro escrito por
Keller,1 no qual tenta-se tornar aceitáveis os milagres.
Lembro-me de um exemplo — só para dar-lhes uma
amostra de seu ensino — que diz respeito à ocasião
quando Moisés bateu na rocha e dela saiu água. A
explicação que Keller dá para isso é que durante a
Segunda Guerra Mundial uns soldados britânicos
estavam construindo uma estrada nova. Usavam suas
picaretas e pás quando um dos soldados, ao usar sua
picareta, inclinou-se para trás um pouco mais do que
pretendera e assim bateu numa rocha que estava atrás
dele. Naquele momento, começaram a sair umas gotas
d'água da rocha.
Sugere-se, então, que foi algo parecido com isso
que aconteceu quando Moisés bateu na rocha; portanto
essa espécie de coisa realmente acontece. Dá-se ao
leitor o que aparenta ser uma explicação para milagres.
Noutras palavras, nem era mesmo um milagre!

Os Fatos Aparentes
São essas algumas das maneiras em que as
pessoas têm rejeitado a própria possibilidade de curas
miraculosas hoje em dia. Essas atitudes são o que é
necessário reconsiderar-se, a meu ver. Ao revê-las,
parece claro que, primeiramente, devemos enfrentar os
fatos. Certamente não é científico rejeitar os fatos; e
nem faz parte do nosso propósito, como cristãos, fazer
isso. Obviamente tem havido uma tendência para fazer
isso. Olhem o exemplo de Kathryn Kuhlman. Creio que,
por mais de vinte anos, ela tem sido a pastora de uma
igreja batista em Pittsburgh. Ela é bem conhecida tanto
de pastores naquela cidade quanto de profissionais
médicos, alguns dos quais são presbíteros em igrejas
famosas. Esses não são entusiastas loucos, mas
1
The Bible as History (A Bíblia como história), Werner Keller, Hodde and
Stoughton, 1956
homens sensatos e equilibrados. Não pertencem a
alguma seita estranha ou maluca; ao contrário, são
presbíteros de bom senso. No entanto, eles admitem
francamente que podem confirmar as afirmações de
pessoas com doenças orgânicas, de seu conhecimento,
que têm sido curadas e que é esse conhecimento que
os tem convencido a apoiar o trabalho da Dra. Kathryn
Kuhlman. No seu segundo livro God can do it again,1
publicado em 1969, há casos de curas que são
certificados por médicos, cujos nomes, qualificações
médicas e cargos hospitalares são devidamente
anotados. De fato, em um ou dois dos casos, os
próprios médicos foram os curados.
Com respeito a essas testemunhas, francamente
estou nesta posição: não posso dizer que são
mentirosas e nem acredito que estão enganadas. Tudo
que se conhece sobre essas pessoas ou que se
descobre sobre elas sugere que são testemunhas de
confiança, e que não têm razão para relatar esses fatos,
ou apóia-los, a não ser porque acreditam mesmo que
são fatos e sentem-se obrigados a contá-los.
Também temos o caso de Harry Edwards,o
espiritualista neste país. Não concordo com algumas
das opiniões teológicas de Dr. Leslie Weatherhead,
porém estou disposto a aceitar algumas de suas
afirmações como fatos. Ele tem dito claramente que,
tendo observado Harry Edwards pessoalmente durante
vários dias, está convencido de que novamente há
doenças orgânicas que foram curadas.
No entanto, para mim, o que tem me
impressionado mais no decorrer dos anos foi um
livrinho que li há muitos anos escrito por Alexis Carrel,
um homem cujo nome é familiar em relação à solução

1
God can do it again (Deus pode fazê-lo novamente), Kathryn Kuhlman,
Marshall, Morgan & Scott, 1969.
Carrel-Dakin que foi usada no tratamento cirúrgico de
cortes e feridas logo após a Primeira Guerra Mundial.
Ele escreveu também um famoso livro intitulado
The Phenomenon of Man 1 Bem, Alexis Carrel escreveu
um livrete 2 sobre o assunto da cura miraculosa no qual
ele conta algo que aconteceu na sua própria
experiência. Ele era católico romano, mas não era
praticante. Entretanto, ficara interessado em Lourdes e
as alegações a respeito dela, e decidira visitar e
investigar por si mesmo.
Nesse livrete, Carrel conta como viajou de trem a
Lourdes e como, a bordo, examinou uma pessoa doente
com tuberculose miliar. Começara como tuberculose
intestinal, porém havia chegado então a essa fase
terminal. Descreveu o abdômen distendido e assim por
diante. Examinou o paciente a bordo do trem e sentiu
que esse estava "in extremis". Duvidava até de que o
paciente chegasse a Lourdes vivo. No entanto, no
próximo dia, Carrel viu com seus próprios olhos essa
pessoa sendo curada. Viu aquele abdômen inflamado
aos poucos diminuir e desinchar; e pôde examinar o
paciente posteriormente e não pôde encontrar prova de
qualquer doença. Foi então ao Departamento Médico
que existe em Lourdes, provido de raios X e tudo o mais
que se pudesse desejar, e portanto sem chegar a
conclusão alguma com respeito a uma explicação, ele
simplesmente declarou os fatos. Há também o exemplo
de Dorothy Kerin que foi súbita e dramaticamente
curada durante as últimas fases de tuberculose em 4 de
fevereiro de 1912. A história, bem autenticada,
encontra-se relatada nos seus dois livros, The Living
Touch e Fulfilling.3 Digo então que, se simplesmente
1
Man the Unknown (O Homem, esse Desconhecido), Alexis Carrel, Hamish
Hamilton, 1950
2
Journey to Lourdes (Viagem a Lourdes), Alexis Carrel, Harpers NY, 1939
3
The Living Touch (O toque vivo) e Fulfilling (Realizando-se), D. Kerin,
Justin Powys
dizemos que não acreditamos nisso, adotamos uma
atitude não-científica. Temos que enfrentar os fatos; se
esses concordam ou não com as nossas teorias é outro
assunto. É errado rejeitar os fatos, por qualquer que
seja a razão.

Mudanças nas Atitudes de Cientistas


Mas de ainda maior interesse, parece-me, é a
extraordinária mudança que vem ocorrendo nestes
últimos anos na área do pensamento científico. Há
poucas coisas no campo de pensamento mais
interessantes ou importantes que isso. Não alego
entender tudo nessa área, porém entendo o suficiente
para seguir o argumento. O ponto de vista científico do
século dezenove tem sido abandonado. Esse ponto de
vista ensinava-nos que as leis naturais, ou leis da
natureza, governavam todos os acontecimentos. Era
causa e efeito, "as leis da natureza", e tudo era
governado por isso. Todo acontecimento tinha esse tipo
de explicação. A teoria científica controladora era
determinista, mecanicista e estática na sua
perspectiva. Tinha suas origens com Descartes e Isaac
Newton. Eram os geradores desse ponto de vista e esse
era adotado universalmente. A maioria de nós que
pertencemos à tradição evangélica tinha virtualmente
aceito esse ponto de vista, e acreditava que essa era a
única atitude realmente científica.
De fato, como resultado do trabalho de Einstein —
a teoria da relatividade e a teoria dos quanta, etc. — há
hoje uma abordagem completamente nova. Os
cientistas, os melhores cientistas, dizem agora que o
nosso conhecimento sobre "as leis da natureza" é muito
limitado. O que temos chamado de "leis da natureza"
descrevem somente uma parte da realidade e da
totalidade de fenômenos. Estão corretos, porém
limitados; no entanto, o que fazem é somente
descrever certos padrões comuns. Não é que os
cientistas estejam contestando a existência desses
padrões ou negando que, na extensão abrangida por
esses padrões, não se possa falar de causa e efeito;
mas o que eles têm descoberto é que existem outros
fatores além desses padrões que não podem ser
explicados em termos daquilo que temos estabelecido,
ou reconhecido, como "leis da natureza".
Noutras palavras, estão percebendo cada vez mais
que há limites no observador científico, e que há muito
mais no cosmos do que supunha dogmaticamente o
cientista no passado e especialmente durante o século
dezenove. Há uma nova espécie de humildade nos
círculos verdadeiramente científicos, e todos as
descobertas recentes sobre o ADN e ARN têm
promovido muito essa nova percepção da ciência — de
fato, elas a têm tornado inevitável.
Expresso doutra forma, o conceito moderno é o de
"indeterminação". Não determinação mas
indeterminação. Fala-se hoje em dia sobre
"probabilidade" e não sobre certeza. As pessoas estão
se abrindo para novas idéias. Li um artigo
recentemente no qual o autor, sem hesitação,
apresentava a idéia de que "as leis da natureza", como
as chamamos, estão de fato mudando, que a
velocidade da luz está mudando, e que a rapidez com
que acontecem outros fenômenos também está
mudando. Então, com essa nova perspectiva científica,
não se ensina mais que "as leis da natureza" controlam
os acontecimentos. A nova perspectiva sobre a energia,
e especialmente a energia elétrica, é tal que se pode
falar simplesmente em termos de "probabilidades". Há
todo tipo de possibilidade, e portanto não temos o
direito de ser dogmáticos e de propor como princípio
rígido que sempre haverá causa e efeito.
Essa nova atitude, é claro, pode realizar-se de
muitas maneiras. A mudança é bastante encorajadora
porque, entre outras coisas, o velho conceito científico
significava que, na última análise, não adiantava ter
qualquer opinião, pois até os nossos pensamentos eram
resultados de alguma causa predeterminada que
levaria a um efeito. O processo inteiro era mecanicista,
e os pensamentos de um homem eram vistos como o
resultado de forças além do seu controle. Não existiam
volição nem tal coisa como ação; e finalmente, é claro,
excluía até Deus. Se a natureza é um sistema fechado,
então não há necessidade de Deus, de fato não há
lugar para Deus, e a maioria dos cientistas não
acreditava em Deus. No entanto, nos preocupamos
mais com essa grande mudança na perspectiva
científica pelo efeito que ela tem em relação ao nosso
assunto específico.
Há, então, essa atitude alterada entre os cientistas
— não os cristãos que são cientistas, ou os cientistas
que são cristãos, mas aqueles que são primeira e
essencialmente homens de ciência. As pessoas estão se
abrindo e reconhecendo que existem possibilidades
além daquelas que pensávamos, até agora, constituir
parte de um sistema fechado.

Exagero das Reivindicações Bíblicas


Pois bem, quando se chega à rejeição bíblica (isto
é, a rejeição dos fatos e fenômenos em termos do
ensino supostamente bíblico), pessoalmente nunca fui
capaz de aceitar o ensino bem-conhecido de que tudo
que pertence à área do miraculoso e do sobrenatural,
como manifestado nos tempos do Novo Testamento,
cessou com a era apostólica. Não há uma declaração
sequer nas Escrituras que sugere isso. Não há
declaração específica ou até indireta de tal natureza. A
interpretação de I Coríntios, capítulo 13, que leva a
essa conclusão está completamente errada. As
afirmações de Paulo aí encontradas referem-se ao
estado futuro. Se dissermos que, desde quando foram
redigidas as Escrituras do Novo Testamento e
estabelecido o cânon do Novo Testamento, que temos
"todo o conhecimento" e que conhecemos agora "assim
como somos conhecidos (por Deus)", é certamente
ridículo. O apóstolo Paulo que recebera então a
revelação na qual se baseava a Epístola incluiu a si
mesmo na falta de conhecimento. O propósito e o alvo
daquela argumentação era formar um contraste entre a
nossa situação atual e o nosso futuro estado de
existência. É interessante notar que as mesmas
pessoas demonstram um ceticismo semelhante com
relação a casos relatados sobre "possessão demoníaca"
hoje em dia. Será que é porque pensam que o diabo
também decidiu cessar suas atividades devido os
apóstolos não existirem mais?
Igualmente, não estou satisfeito com a resposta
que B.B. Warfield dá àqueles que alegam que os
milagres continuaram após a era apostólica.1 É bem
conhecido que Tertuliano e Agostinho usaram o
argumento que os milagres aconteciam na sua era e
época, em defesa da fé cristã e como parte da sua
apologética; e nunca estive satisfeito com a resposta de
Warfield a isso. Até entre si, os eruditos não concordam
que as provas podem ser descartadas desse modo
sumário. Não somente isso, mas sendo alguém que tem
tido grande interesse na história dos partidários da
reforma protestante na Escócia, sempre fiquei muito
impressionado com a evidência que vem daqueles
tempos. Há eventos contados sobre a vida de John
Welch, genro de John Knox, onde parece claro que

1
Miracles: Yesterday and Today (Milagres: ontem e hoje), B.B. Warfield,
Eerdman, Michigan, 1953. Publicado primeiro como Counterteit Miracles
(Milagres forjados), Scribner, 1918
milagres foram realizados em certas circunstâncias
estranhas e extremas. Há o famoso partidário
Alexander Peden. Parece-me incontestável que aquele
homem tinha o poder de presciência e profetizou coisas
que chegaram a acontecer posteriormente. Os registros
são autênticos e poderão ser lidos nos dois grandes
volumes de "Biografias Seletas", editadas para a
Sociedade Wodrow que lidam com esse tipo de história.
Portanto, jamais estive satisfeito com essa simples
exclusão, supostamente bíblica, de toda a possibilidade
de milagres, e o ensino de que tudo isso terminou com
os apóstolos, com a confiante conclusão de que tudo
aquilo que alega ser miraculoso agora deve
necessariamente ser espúrio — ou um enorme exagero
ou uma mentira.
Esse ponto de vista também parece-me
extremamente perigoso porque significa que está
sendo apresentado um tipo de novo
dispensacionalismo. Quais partes das Escrituras
aplicam-se a nós? Será que o livro de Atos tem
qualquer mensagem para nós além de seu relato
histórico? Adotando-se essa atitude, fica claro que a
maior parte de 1 Coríntios não teria nada para nos
comunicar. Noutras palavras, creio que aqueles que
adotam esse ponto de vista têm sido culpados,
inconscientemente, de introduzir uma nova espécie de
deismo. A nossa tendência tem sido a de excluir Deus
das atividades de hoje em dia. Temos afirmado que isso
não pode acontecer porque todo fenômeno acabou na
era dos apóstolos. Com certeza, essa é uma atitude que
não temos o direito de adotar. Não tem fundamento
bíblico nem histórico; estamos simplesmente fazendo
uma declaração dogmática. Parece resolver nossos
problemas. Podemos descartar os relatórios que
ouvimos e as alegações que são feitas; e faz com que
sintamo-nos felizes. Mas será que é certo? Será que é
verdade? Sugiro que chegou a hora de reexaminar tudo
isso, caso que nos encontremos defendendo essa forma
de deismo, e especialmente à luz de certas declarações
que encontramos nas Escrituras.

A Verdadeira Natureza das Atitudes Bíblicas


Não tenho mudado, de repente, minhas
perspectivas proféticas. Através dos anos, tenho sido
um amilenista, e sou extremamente cético sobre
pessoas que estão sempre tentando calcular "os
tempos ou as estações" e profetizando o fim do mundo
ou dos tempos. Não tenho subitamente me retratado e
juntado-me àquela companhia; no entanto quando se lê
Mateus 24:24, por exemplo, "Porque surgirão falsos
cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e
prodígios que, se possível fora, enganariam até os
escolhidos", somos obrigados a pensar. Isso trata dos
últimos tempos, o fim da era presente. Não estou
sugerindo que chegamos aí. Talvez seja verdade, não
sei. Simplesmente sugiro que, quando chegar essa
hora, haverá esses "sinais" — "sinais e prodígios" —
que serão tão notáveis que quase chegarão a enganar
os escolhidos.
Noutras palavras, aparecerão fenômenos que terão
caráter sobrenatural. Todavia, se decidirmos
anteriormente que nada desse tipo possa acontecer,
qual será a nossa situação quando esse tipo de coisa
aparecer, caso que ainda estejamos sobre a terra?
Parece-me, por todas essas razões, que é muito errado
descartarmos, por qualquer razão dogmática, tudo o
que se alega nessa área.
Além disso, sugiro que na própria Bíblia há
claramente uma espécie de periodicidade no
surgimento desses acontecimentos sobrenaturais. Por
exemplo, há obviamente uma periodicidade no Velho
Testamento. Tais coisas aconteciam em certas ocasiões
especiais, e por claras e óbvias razões. Vê-se a mesma
coisa, em certa medida, no Novo Testamento; e somos
informados que o Espírito é o Senhor destas questões e
reparte Seus dons particularmente a cada um como
quer (1 Coríntios 12:4-12). Portanto, isso é algo que
pode acontecer a qualquer hora, se assim for a vontade
de Deus. Quem somos nós para determinar quando isso
deva ser?
Parece bem claro que, olhando em geral a era
cristã, houve no início uma abundância de tais
acontecimentos que não tem continuado. Como já
disse, não estou satisfeito de que jamais aconteceram
desde então, porém, falando de modo geral, não têm
acontecido com tanta freqüência. Durante aquelas
grandes épocas de reavivamento que têm acontecido
periodicamente na história da Igreja, os fenômenos não
consistiam tanto na obra de milagres e curas quanto no
poder extraordinário da pregação, na extraordinária
intensidade da convicção e num elemento inesperado
de gozo e júbilo. Tudo isso, parece-me, está dentro do
Senhorio do Espírito. O fato de que isso tem sido,
geralmente, o caso na nossa era cristã não é prova de
que, a qualquer momento, não possa haver uma
reintrodução de outros tipos de fenômenos, e
especialmente ao chegarmos aos últimos tempos. Além
disso, aqueles que se interessam em ler livros como,
por exemplo, Pastor Hsi 1 terão encontrado
acontecimentos e eventos que eu, pelo menos, não
poderia explicar a não ser em termos do sobrenatural e
do miraculoso. Parece que Deus tem permitido esses
acontecimentos nas fases iniciais de certos trabalhos,
ou quando foi necessário uma atestação especial da
verdade.
Nisso há, então, uma revisão geral dessa atitude
negativa em relação às alegações que estão sendo

1
Pastor Hsi Sra. Howard Taylor, O.M.F., 1900 (última edição 1969).
feitas. Ainda estou lidando com aqueles que rejeitam
todas as alegações. Não estou considerando, no
momento, o caso daqueles que têm chegado a
acreditar, e estão tão impressionados pelos fenômenos
que capitulam e tendem a abandonar toda
consideração teológica.

Mudanças nas Atitudes na Área da Medicina


Mais positivamente, e além dessas observações
gerais, creio que há certos outros fatos aos quais ainda
não tem sido dado a importância e a atenção que
merecem. Parece-me que há certos fatos médicos que
temos nos inclinado a ignorar. Refiro-me aos relatórios
de curas espontâneas, e em particular a regressões no
caso de tumores cancerígenos. Tive o prazer de
conhecer em Cincinnati um homem ocupado na
pesquisa médica. Ele estivera trabalhando em Chicago
com duas outras pessoas que tinham selecionado, da
literatura médica nos Estados Unidos, 244 casos de
curas espontâneas do câncer. Mostrou-me um dos seus
artigos em que isso era relatado. Lembro-me de como
um grupo de nós que estávamos pesquisando esse
assunto, sob os auspícios da Fraternidade Médica
Cristã, encontrou vários exemplos na literatura médica
de curas espontâneas do câncer. Este era o tipo de
coisa que tinha acontecido. O paciente é diagnosticado
como tendo um tumor, um tumor abdominal, e o
cirurgião decide operar. Contudo, no momento em que
ele abre o paciente, encontra que o tumor é tão
desenvolvido que não seria possível removê-lo. Ao
encontrar a extensa disseminação do tumor, o cirurgião
decide costurar a incisão no paciente imediatamente.
Literalmente ele nada faz sobre o tumor. No entanto,
desse momento em diante, às vezes o paciente tem
começado a recuperar-se, e depois de um período, não
tem havido mais qualquer prova ou sinal da doença. Tal
caso pode ser raro, porém acontece. Vários dos casos
na América caem nesse grupo — onde um cirurgião tem
feito somente uma laparotomia e nada mais. Outros
casos foram onde pacientes, com um tumor maligno,
alguns com depósitos secundários, contraíram outra
doença ao mesmo tempo — uma febre, ou alguma
doença infecciosa — e desde o momento quando
tinham essa outra doença, a condição cancerígena
começou a desaparecer. Esses médicos, que
selecionaram esses casos, ficaram convencidos que
aconteceram essas curas espontâneas ou regressões
em casos aparentemente sem esperança. Certamente
temos que reexaminar tal evidência e encontrar para
essas uma explicação — por exemplo, dentre os
notáveis mecanismos da imunologia. Isso deveria abrir
nossas mentes e salvar-nos de uma posição dogmática
demais.
Também é interessante observar que uma nova
visão sobre enfermidades, uma nova teoria sobre
doenças, de fato sobre todo o estado de saúde e
doença, está atraindo atenção. Não deveríamos nos
surpreender com isso. Lembrem-se da declaração em 1
Coríntios 11:30, com relação à Ceia do Senhor, onde o
apóstolo diz que devido certas pessoas não terem se
examinado "por causa disto há entre vós muitos fracos
e doentes, e muitos que dormem". O apóstolo aí ensina
claramente que a doença às vezes, nem sempre mas
"às vezes", tem uma causa espiritual — "por causa
disto há entre vós muitos fracos e doentes". Noutras
palavras, condições espirituais podem levar a condições
ou doenças físicas.
Deveríamos já ter sabido disso e dado a isso a
devida importância. No entanto, hoje em dia tal
conceito não apresenta a mesma dificuldade que
antigamente. O ensino com relação a estresse e
medicina psicossomática concorda com isso, e mostra-
nos como observadores, não necessariamente cristãos,
compreendem que infelizmente estivemos ignorando
esse tipo de aspecto psíquico na nossa abordagem da
doença. Nessa posição tem sido demasiadamente
materialística e mecanística. A mudança de perspectiva
na medicina com relação a esse assunto é realmente
surpreendente. Ainda lembro os primeiros dias do
freudismo e da psicanálise. Era a única piada na qual se
pudesse depender quando as outras falhassem. O aluno
que, ao ser questionado sobre a causa ou as causas da
úlcera gástrica, começava por dizer "preocupação ou
ansiedade" era ridicularizado pelo professor e por todos
os outros alunos. Era tudo tão cômico. Pensávamos,
então, somente em termos da quantidade de ácido no
estômago e a possibilidade de vários tipos de
ferimentos à mucosa gástrica. Quão grande tem sido a
mudança desde então!
Além disso, temos lido de vez em quando sobre
casos onde um paciente tem desenvolvido
repentinamente uma doença como resultado de
choque. Um exemplo disso ocorreu na minha própria
família. Uma tia minha, que estivera perfeitamente
sadia, foi informada subitamente que seu filho mais
velho havia sido morto de maneira trágica. De pronto,
ela mostrou os sintomas de diabetes, e foi tratado com
insulina pelo resto de sua vida. Outros casos
semelhantes também tem sido relatados. Muitas vezes
ouve-se esse tipo de coisa.
Há casos em que um tumor maligno parece ter
começado com algum tipo de choque ou
desapontamento ou algo mental ou emocionalmente
traumático. Com relação a esse assunto, é impossível
não recordar os casos de dois eminentes estadistas —
Neville Chamberlain e Aneurin Bevan. Além do mais, há
a tendência hoje de considerar essas doenças não tanto
como condições primariamente locais, quanto de
maneira mais sistemática ou constitucional. Será que o
câncer é somente uma doença local, ou é uma condição
geral com manifestações locais? O ponto de vista hoje
em dia é que é geral, com manifestações locais, e não
somente uma condição local.

Recentes Perspectivas sobre a Cura


Também tem havido especulação quanto ao papel
de processos imunogênicos e outros processos
fisiológicos e patológicos. Discursos versados têm sido
proferidos sobre esse assunto e, para mim, é muito
fascinante, porque indica o fato de que as pessoas
estão compreendendo que é incluído o homem inteiro,
e que não podemos considerar somente as
manifestações locais. Existem outros fatores. Noutras
palavras, a tirania de pensar somente em termos da
mórbida anatomia e patologia está chegando ao fim.
Estávamos familiarizados com isso, até certo
ponto, há anos atrás. Lembro da introdução do
tratamento de choque mediante proteína para a artrite
reumática. De certo modo, aquilo era a aplicação de
uma teoria semelhante. A idéia era que, dando-se
deliberadamente um choque a um paciente a fim de
estimular sua resistência geral, este trataria então da
condição local em particular. Várias vezes, tenho
contado uma historieta, que tem seu elemento cômico,
para ilustrar isso. Lembro-me, quando pregava num
certo lugar, de que por acaso notei durante a canção de
um dos hinos que um pastor da cidade, um homem que
eu conhecia há anos, estava mais ou menos sendo
carregado por duas pessoas, e colocado num assento
reservado para ele. Estava obviamente incapacitado
por artrite reumática. Trouxeram-no para mim, no final
do culto, e ele disse que queria me perguntar algo. Ele
tivera a felicidade de ter conseguido um leito no
Hospital Mineral Real de Bath, e queria ir para lá para
ser tratado. Entretanto, para o seu completo
desapontamento, recebera uma intimação no dia
anterior de que não poderia ser admitido para o leito a
não ser que fosse vacinado. Estava apreensivo sobre
ser vacinado. Tinha medo de que na sua condição frágil
isso o mataria. Qual o meu conselho? Deveria ser
vacinado ou não? A resposta que lhe dei foi que, visto
que conseguira um leito naquele famoso hospital,
deveria ir a qualquer preço. Daí continuei, "Sim, e em
todo caso, você não sabe o bem que essa vacinação
pode lhe fazer. É possível que cure completamente a
sua condição". Deixamos assim. Não vi esse homem
durante uns seis meses mas, quando o vi novamente,
eu o vi andando para mim perfeitamente bem.
Observei, "Obviamente têm bons tratamentos no
Hospital Mineral Real de Bath". Respondeu, "Nunca
cheguei a ir". "Por que",perguntei, "o que lhe
aconteceu?" Replicou,
"Bem, como você disse, tive uma reação tão
violenta à vacina que pareceu me curar". E de fato o
tinha curado.

O Equilíbrio entre a Saúde e a Doença


Há algo aqui que, certamente, deveria ter-nos feito
pensar, e seriamente sobre todo o processo da saúde e
da doença. Será que não está claro que é um
mecanismo muito delicado e sensível, que é uma
questão de equilíbrio? Há um mecanismo no corpo
humano que preserva esse equilíbrio extraordinário
entre a saúde e a doença. Lembro-me de que, há
cinqüenta anos, li um grande livro, cujo título era
Infection and Resistance, 1 que tratava de anticorpos, e
enfatizava a luta constante entre a doença e a defesa
da saúde. Isso acontece não somente no caso de
1
infection and Resistance (Infecção e resistência), Hans Zinsser, N.Y.,
1914. Quinta edição entitulada ImmunoIogy - Principies and Applications in
Medicine and Public Health (Imunologia - princípios e aplicações na
medicina e na saúde pública).
infecções mas também mais geralmente no caso de
doenças tais como aquelas a que me referi. Há forças
que produzem doenças e essas são contidas por outras
forças. É muito provável que tudo isso seja controlado
pelo sistema nervoso. Não deveríamos, pois, concluir
que a doença pode ser causada por muitos fatores,
qualquer uma das quais pode deprimir esse mecanismo
controlador e o abater temporariamente? Poderia ser
um choque, poderia ser um acidente, ou poderia ser
uma infecção; poderia ser um de muitos fatores.
Qualquer que seja, perturba o mecanismo que
normalmente mantém o equilíbrio entre a saúde e a
doença, e favorece o processo da doença. Será que não
temos o direito também de olhar o outro lado e dizer
que as curas podem ser o resultado de muitos fatores?
Existem os meios comuns que usamos, como uma
variedade de medicamentos, ou pode haver um ataque
direto nos organismos infecciosos. Além disso, não
temos abandonado ainda o desenvolvimento da
resistência — ou teríamos? Temos sempre conhecido
esse elemento. Há muitos anos, mandávamos os
tuberculosos à Suíça e a outros centros. Para quê? Bem,
para desenvolver resistência. Não tínhamos nada
naqueles tempos com que podíamos atacar os bacilos
diretamente, então nos concentrávamos em
desenvolver a resistência do paciente. Infecção e
resistência — esse era o equilíbrio. E se aqueles que
tratavam o paciente conseguissem aumentar sua
resistência, a infecção diminuía, e tornava-se possível
restaurar um equilíbrio.
Entretanto, não podemos nos limitar a pensar em
termos dos meios comuns ou bem conhecidos ou
habituais; temos agora que ir adiante. Se um choque
pode causar uma doença, por que um choque
correspondente no outro lado não poderia restaurar a
saúde do paciente, estimulando o mecanismo que
promove a saúde, e assim acabar com a condição
doentia? Como já disse, há exemplos e ilustrações
sendo acumulados na literatura médica que apontam
fortemente nessa direção. E que tal toda a questão
sobre a "vontade de viver"? Estou sugerindo que
tivemos a tendência a ser mecanicista demais na nossa
perspectiva sobre a doença. Temos esquecido o
paciente, e temos nos inclinado a esquecer quão
delicado é o equilíbrio dos processos que mantêm a
saúde.
Em relação a isso, muitas vezes tenho contado o
que aconteceu um dia em "Barts" quando Lorde Horder
fazia visita aos pacientes. Chegamos ao leito dum
homem que era ferreiro. Aí estava ele no leito num
canto, apoiado por travesseiros, com falta de ar, suas
pernas inchadas, ascite e tudo mais — um caso ruim de
arritmia cardíaca. Ele estava incoerente e delirante, e
os dois estagiários e eu havíamos chegado à conclusão
de que ele estava obviamente morrendo, de fato
duvidamos que ele vivesse até o fim do dia. Entretanto,
chegamos ao leito desse homem e, enquanto Lorde
Horder lhe fizesse perguntas, o coitado paciente estava
incoerente e ficava murmurando algo. Estava tornando
o exame quase impossível. Então Horder virou para ele
e perguntou: "O que está dizendo, meu bom homem?"
O homem disse: "Posso levantar-me hoje à noite,
senhor?" E, surpreendendo-nos completamente, Horder
disse: "Sim, é claro".
Devo ter registrado algo no meu rosto, e também o
estagiário e os estudantes. Então Horder nos reuniu e
disse: "Vejo que todos vocês pensam que enlouqueci.
Pois bem", continuou, "deixem-me contar-lhes
exatamente por que falei àquele homem que pudesse
levantar-se. Estão todos de acordo, não estão, de que
esse homem vai morrer?" "Sim, senhor", respondemos.
Ele disse: "Concordo com vocês, portanto deixem-no
levantar-se. Por quê? Bem, não recusem o pedido de
um moribundo. Se têm certeza de que ele vai morrer, o
seu levantar não fará diferença alguma; em todo caso
ele vai morrer — disso vocês têm certeza. Bem, não
recusem o pedido de um moribundo. Essa é minha
razão principal por deixá-lo levantar-se. No entanto",
acrescentou, "vocês sabem que eu tenho outra razão. O
coração é um órgão extraordinário e, mesmo quando às
vezes está muito doente, pode ser também preguiçoso.
Às vezes, encontrarão que o coração doente pode
beneficiar-se de um pouco de atividade. Então, como
em todo caso esse homem vai morrer e vocês não
podem piorar a situação, deixem-no levantar-se, e
esperemos para ver o que irá acontecer." Portanto,
levantamos o homem por uns dez minutos aquela noite,
e ele dormiu melhor naquela noite do que tinha
dormido por muitas noites. De fato, encurtando o
relato, aquele homem melhorou tão significativamente
que lhe demos alta e ele retornava de mês em mês
para vermos como estava. Quando deixei o hospital no
fim de 1926, ele ainda estava retornando de seis em
seis meses para ficarmos de olho nele. Exatamente o
que foi que aconteceu nesse caso? O que foi
responsável por isso? Não houve mudança na
quantidade de digitalina ou qualquer outra coisa;
apresentou-se outro fator que pode ser descrito como a
"vontade de viver". Sinto que não temos dado atenção
suficiente para esse aspecto da saúde e da doença.

O Inesperado na Medicina
Deixem-me contar-lhes mais uma história que
incidentalmente me lembra de um dos maiores erros da
minha vida no sentido médico! Estava pregando numa
pequena capela no Vale de Glamorgan pela primeira
vez em 1928, numa terça-feira à noite e numa quarta-
feira à tarde e à noite. Antes de partir para casa, eu
estava jantando com a idosa senhora com quem
estivera hospedado — ela era realmente uma anciã
merecedora desse título, verdadeira tirana na sua
comunidade local. De repente, inclinou-se sobre a mesa
durante a refeição e perguntou: "Será que o senhor
faria um favor para uma velha?" Eu disse: "Sim, se
puder, ficarei feliz em fazê-lo." "Então", disse ela, "viria
pregar novamente no ano que vem nestas reuniões?"
"Está bem", respondi, "virei". Continuamos comendo.
Logo, inclinou-se novamente e perguntou: "Olhe, será
que o senhor faria outro favor para uma velha?"
Respondi: "Bem, depende qual o favor". "Oh, está tudo
bem", ela disse, "o senhor é capaz de fazê-lo".
Perguntei: "O que é?" "O senhor promete vir e pregar
nestas reuniões todo ano que ambos estivermos vivos?"
Ela já havia me dito que tinha setenta e nove anos, sua
pele era mais como papel pergaminho do que pele, e
eu na minha esperteza cheguei à conclusão de que não
havia nenhum risco em concordar com seu pedido,
portanto fiz o contrato.
Isso aconteceu em 1928. Acredite ou não, tive que
ir para pregar naquele lugar todo ano até 1939; e se
não fosse pela Segunda Guerra Mundial e a retirada
daquela senhora para outro lugar no País de Gales, por
causa de um aeroporto vizinho, teria sido obrigado a ir
até 1942, quando ela morreu! Mas eis a razão da
história: acho que, por volta de 1936, essa pobre
senhora sofreu um terrível ataque de bronquite e
pneumonia bronquial. Não existiam antibióticos
naqueles dias e estava ainda no início do uso das
drogas sulfanilamidas. Ela estava desesperadamente
doente. Dia e noite enfermeiras eram responsáveis por
ela. Mandaram chamar todos os parentes, e estavam
todos convencidos, incluindo os médicos, de que ela
estava morrendo. Uma madrugada, por volta das 3
horas, de repente ela levantou-se na cama e disse: "Dê-
me aquele calendário, aquele almanaque na parede".
Todos pensaram, é claro, que isso fosse parte de seu
delírio. Contudo, ela insistiu em ter o calendário e
deram-no a ela. Ficou olhando e virando as páginas
para lá e para cá durante uns momentos. Isso era típico
do delírio, é claro. De repente, ela disse às enfermeiras
e aos parentes: "Ele estará aqui daqui a seis semanas".
Tinha calculado a data da minha visita anual. A partir
daquele momento, começou a melhorar!
Noutras palavras, estou tentando mostrar que há
tantos fatores que tendemos a ignorar, que podem
influenciar esse delicado mecanismo da saúde e da
doença. E nessa categoria eu colocaria "fé". Quero dizer
fé de qualquer tipo. Se essa visão é correta, qualquer
tipo de fé pode ter efeito. Não devemos limitar esses
fatores. Não mencionei as pessoas que parecem ter um
"dom de cura" natural. É algo que não compreendo;
porém está claro para mim que tantos são os fatores
que podem causar doenças quanto os que podem
produzir curas. Não somente fé cristã, mas qualquer
tipo de fé, fé em personalidades "carismáticas", fatores
psicológicos, forte emoção, choque, a atividade de
espíritos maus — qualquer um desses fatores pode
surtir efeito.

Atitudes e Princípios Básicos


Assim, chego à minha conclusão. Nós crentes
devemos acreditar em milagres não por causa de todas
essas coisas a que tenho me referido, mas porque
acreditamos na Bíblia. O fato de crermos em Deus torna
possível para nós aceitar o miraculoso sem dificuldade
e acreditar que milagres podem acontecer a qualquer
momento segundo a vontade e soberania de Deus. O
que tenho tentado dizer é de valor apologético, porém
nunca deve ser a base da nossa fé. Se dissermos: "Ah,
sim, agora posso acreditar em milagres por causa da
nova perspectiva científica, e por causa de uma nova
maneira de olhar a saúde e a doença" isso seria para
mim uma contradição da fé cristã. Acreditamos em
milagres porque acreditamos nas Escrituras, mas o que
tenho dito deve ser de algum valor e auxílio apologético
para nós, e especialmente da maneira que vou expor a
seguir.
Devemos tomar muito cuidado para não cometer o
mesmo erro que a igreja católica romana cometeu no
caso de Copérnico e Galileu. Os líderes dessa igreja
rejeitaram os fatos que foram apresentados por eles,
vocês se lembram, porque não concordavam com as
teorias dela. Devemos ter muito cuidado para que não
sejamos pegos nesse mesmo ponto, e para que não
recusemos a reconhecer fatos porque nossa teoria os
considera impossíveis. De fato, às vezes tenho tido
medo de que nosso dogmatismo nesses assuntos seja
semelhante demais àquele demonstrado pelos
comunistas e seu tratamento de Lysenko. Não devemos
proibir quaisquer descobertas somente por motivos
teóricos ou doutrinários. Devemos ter mentes abertas e
estar dispostos a aceitar fatos e a examiná-los.
Ao mesmo tempo, devo enfatizar que ainda
precisamos manter uma saudável atitude crítica e
cética para com tudo que nos é relatado. No entanto,
devemos ser críticos de todos os lados, e não
simplesmente de um lado. Devemos ter uma atitude
crítica para com os dogmatismos da ciência, e também
para com as alegações muitas vezes exageradas de
certos grupos religiosos. Os próprios cientistas estão
assim fazendo hoje em dia, como já temos visto,
portanto não devemos ficar para trás. Devemos
reconhecer e estar cientes de todas as imensas
possibilidades que estão se abrindo. Muitas das antigas
e estabelecidas posições dogmáticas dos cientistas
estão sendo questionadas nestes dias, em parte devido
a essas viagens recentes à lua e tais projetos. Tudo é
tão maior do que o homem pensava, as possibilidades
são infinitas. Na verdade, o homem sabe tão pouco.
Posto que temos conhecimento em certa área,
inclinamo-nos a supor que conhecemos tudo.
Entretanto, não conhecemos tudo. "Probabilidade",
lembrem, é a palavra de hoje, não "determinismo".

Fenômenos não devem determinar crenças


No entanto, e para mim essa é a descoberta mais
importante do ponto de vista teológico, não devemos
deixar que nossa doutrina seja determinada por
fenômenos. Esse, parece-me, é o perigo hoje em dia
para muitos bons crentes. Como disse anteriormente,
há muitos hoje que ficam tão impressionados por
resultados que estão preparados a abandonar o que
têm sempre acreditado. Espero que eu tenha
conseguido mostrar que não há necessidade para isso.
O argumento deles é mais ou menos o seguinte: "Bem,
aqui estão essas coisas que Kathryn Kuhlman, por
exemplo, está fazendo. Aqui estão resultados
concretos. Quem sou eu para opor isso? Quem sou eu
para crer no meu modo de pensar e na minha teologia
tradicional?" Aí está o erro. Estão preparados a deixar
que seu modo de pensar seja controlado por resultados
e fenômenos.
Posso dizer-lhes minha resposta para tal
raciocínio? Não devemos decidir se é certo uma mulher
pregar, e ser pastora de uma igreja somente por causa
dos fenômenos que ela pode produzir. Ainda é o ensino
da Bíblia que determina uma questão desse tipo. Nossa
doutrina em todos os aspectos deve ser determinado
pela Bíblia. "Então o que você diz de todos esses
fenômenos, como por exemplo curas e línguas
estranhas?" perguntam-me. Respondo que não tenho
nenhuma dificuldade com esses fenômenos. De
maneira alguma afetam minha teologia. Não nego que
os relatórios sejam fatos, qua (como) fatos, que muitos
podem comprovar. Como vimos, há muitos fatores que
podem produzir tais curas. Daí o fato de uma mulher
ser capaz de produzir curas não comprova sua alegação
de ser pastora, nem significa que tenho de aceitar tudo
que ela ensina. Mas esse é precisamente o tipo de
pensamento que tem prevalecido nestes últimos anos.
Pessoas têm presumido que devido o nome de Cristo
ter sido usado numa reunião, então tudo que acontece
aí deve ser verdadeiramente cristão, e é, portanto, uma
garantia da autenticidade de tudo que é ensinado. Para
essas pessoas, os resultados garantem tudo. Conheci
boas pessoas que, por causa do que têm visto em
"reuniões de cura", têm abandonado o que acreditavam
anteriormente. Por causa do que aconteceu em certa
reunião, essas pessoas têm se submetido a todo o
ensino daqueles que conduziam a reunião.
Há aqueles que têm abraçado o catolicismo
romano, e ainda outros estranhos movimentos
religiosos, por essa mesma razão. Espero que o que
tenho dito nos livre de tal modo errôneo de pensar,
fazendo-nos ver que esses fenômenos podem ser
explicados adequadamente de várias outras maneiras.
Essas maneiras não precisam nem ser cristãs. Posso
aceitá-las como fatos, mas minha posição dogmática,
doutrinária e teológica permanece invariável. Mesmo
assim, preciso recorrer à Bíblia para meus pontos de
vista sobre toda questão de doutrina.

A Regra das Escrituras


A própria Bíblia ensina-nos a extrair a nossa
doutrina somente dela. Janes e Jambres, vocês se
lembram, podiam reproduzir grande parte do que
Moisés e Arão faziam (2 Timóteo 3:8). Nosso Senhor nos
preveniu de que Lhe chegariam pessoas que diriam:
"Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e
em teu nome não expulsamos demônios? e em teu
nome não fizemos muitas maravilhas?" (Mateus 7:21
-23) Ele não disputa a alegação nem os fatos mas
declara que lhes dirá: "Nunca vos conheci; apartai-vos
de mim, vós que praticais a iniqüidade". Em todo lugar,
a Bíblia nos ensina a "provar", a "testar" e a "examinar"
os espíritos. A própria Bíblia nos ensina que há muitas
forças e poderes que podem produzir fenômenos e
resultados; e alguns são "espíritos maus". Bem, como
decidir? Tudo o que digo é que fenômenos não
decidem. Não devemos nos submeter a fenômenos;
chegamos à nossa conclusão com outros fundamentos,
fundamentos bíblicos. Acontecimentos e eventos
miraculosos ou sobrenaturais não dão,
necessariamente, validez a um ministério, e certamente
não devemos permitir que esses determinem nosso
ponto de vista. A advertência do nosso Senhor ainda é
válida: "Surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão
tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora,
enganariam até os escolhidos" (Mateus 24:24).
Pode ser que me perguntem a esta altura: "Bem,
como se decidir em algum caso em particular?" Pode
ser extremamente difícil. Para mim, Kathryn Kuhlman é
um dos casos mais difíceis de todos. Ela prega o Senhor
Jesus Cristo e parece estar correta na sua doutrina — é
isso que torna o caso difícil. Há, porém, certos outros
elementos no seu ministério. Durante vários dias, eu a
ouvi no rádio, nos Estados Unidos em 1969. Há muitos
elementos no seu ministério com os quais eu ficaria
muito preocupado. Há um óbvio e poderoso elemento
psicológico, até uma voz falsa e também muito
artificial. Além disso, há muitas risadas e brincadeiras
nas suas reuniões e ela até se gaba disso. Contudo,
mais básico ainda é a questão do ensino da Bíblia com
respeito ao ministério de mulheres.
O caso com relação à "cura pela fé" que lhes tenho
exposto tem trazido para mim pessoalmente este
conforto, que não me preocupo mais com essa questão.
Minha decisão sobre isso, como sobre toda e qualquer
questão, ainda é uma decisão bíblica e doutrinária. Não
fico impressionado demais ou aflito ou perturbado com
esses fenômenos. Podem ser explicados
adequadamente através de várias outras maneiras.

Uma Comissão para Curar


Então é necessário que voltem a certos princípios
gerais ensinados no Novo — e, de fato, no Velho —
Testamento. Um desses princípios é que nunca se
encontra milagres bíblicos que são anunciados alguns
dias antes de acontecerem. Parece-me muito claro em
todos os casos citados nas Escrituras que o que
acontecia é que uma comissão imediata era dada ao
homem que fazia (ou aos homens que faziam) os
milagres. Por exemplo, vejam o caso de Pedro e João e
o homem à porta do templo, chamada Formosa (Atos
3:1-11). Semelhantemente vejam o caso de Paulo e o
homem em Listra (Atos 14:8-10). Os apóstolos não
sabiam de antemão que iam fazer milagres. Acredito
que foi lhes dado uma comissão imediata. Eles não
experimentavam, e não somos informados de nenhum
fracasso no livro de Atos. Há sempre aí uma espécie de
certeza, segurança e confiança. Acredito que isso foi o
resultado da comissão divina que era dada ao
respectivo homem. Portanto, ele sempre sabia na hora
que o milagre ia acontecer.
Nota-se, também, que o efeito produzido pelos
milagres sobre as pessoas era de enchê-las de
reverência, e às vezes medo. Diriam: "Temos visto
coisas maravilhosas hoje" (Lucas 9:43; Atos 8:13), ou
atribuiriam o poder a Deus (Atos 3:12, 13; Atos 4:7-12).
Nalgumas das populares reuniões de cura de hoje em
dia, no entanto, há risadas e jocosidade. Os líderes até
se orgulham disso. Eu diria que a Bíblia ensina que
qualquer manifestação do poder de Deus impõe
respeito, e exclui qualquer espírito de frivolidade, ou de
leveza de atitude.

A Oração da Fé
Devo dizer só mais uma coisa sobre o significado
de "fé" no termo "cura pela fé". Lembram que na
Epístola de Tiago se diz que "a oração da fé salvará o
doente" (Tiago 5:15). Também há a declaração no
Evangelho de Marcos "E Jesus, respondendo, disse-lhes:
tende fé em Deus; porque em verdade vos digo que
qualquer que disser a este monte: ergue-te e lança-te
no mar; e não duvidar em seu coração, mas crer que se
fará tudo aquilo que diz, tudo o que disser lhe será
feito. Por isso vos digo que tudo o que pedirdes, orando,
crede que o recebereis, e tê-lo-eis" (Marcos 11:22-24).
Todos conhecemos pessoas que têm tentado chegar-se
a essa "fé". Isso, acredito, é errado. Creio que a "fé" a
que se referem nosso Senhor e Tiago como "a oração
da fé", é novamente uma fé "dada". Coloco-a na
mesma categoria que a "comissão" que foi dada aos
apóstolos e a outros que, em minha opinião, têm feito
milagres desde a era dos apóstolos. Não é
experimentar, não é anunciar no domingo que haverá
uma reunião de cura na próxima quinta-feira. Não cabe-
lhes dizer isso porque não sabem de fato se isso
acontecerá. Todo milagre verdadeiramente feito por
Deus é "dado"; e "a oração da fé" é dada. Ninguém
pode produzir isso sozinho; ou possui ou não possui tal
fé. Em parte, depende da espiritualidade geral de um
homem e sua fé geral em Deus, e ainda mais depende
da Sua soberana vontade.
Fenômenos Espíritas
Por último, quero que tomem cuidado. Já devem
ter chegado a todos nós pessoas que foram curadas,
alegadamente, numa reunião espírita, ou como
resultado da atividade dum líder espírita. Em tais casos,
sugiro que é muito errado e tolo dizer, ou dar a
entender, à pessoa diante de você que ela não tem sido
curada! Às vezes, têm havido a tendência de alguns
fazerem isso. Espero que esteja claro que espíritas
podem produzir certos resultados; porém acredito que
nesse ponto temos de advertir as pessoas muito
seriamente. Com certeza não devemos fazê-las ficarem
doentes novamente a fim de mantermos correta a
nossa doutrina! No entanto, o que devemos fazer é
precavê-las que, tendo se submetido naquela ocasião a
um poder que acreditamos ser de espíritos maus, elas
devem tomar muito cuidado para que esses poderes
malignos não aproveitem de sua submissão.
Kurt Koch, em seu livro Christian Counselling and
the Occult, está sempre esclarecendo este ponto, que é
óbvio. Se, a qualquer momento, alguém render-se,
inadvertidamente, a um poder invisível, está
procurando encrencas. A Bíblia nos manda provar "os
espíritos" e testá-los. Ela reconhece a realidade, a
influência e o poder de espíritos maus. Como
evangélicos, temos subestimado, tragicamente, o poder
de espíritos maus. O apóstolo Paulo não tinha dúvida
sobre o assunto — "Porque não temos que lutar contra
a carne e o sangue, mas sim contra os principados,
contra as potestades, contra os príncipes das trevas
deste século, contra as hostes espirituais da maldade,
nos lugares celestiais" (Efésios 6:12). Temos que lidar
com isso e, portanto, devemos acautelar essas pessoas
que, uma vez que têm se submetido por razões de
saúde, há a possibilidade de que correm mais riscos de
ataques subseqüentes da parte dessas influências e
desses poderes.

A Atitude Bíblica
Concluo dizendo isto: devemos continuar usando
os meios habituais no tratamento da enfermidade e da
doença. O meio usual de Deus para lidar com a doença
é através destes meios e métodos — através das
habilidades terapeutas que Ele tem dado a homens e
através das drogas farmacêuticas que Ele tem colocado
em tanta abundância na natureza, e assim por diante.
Respondendo à "oração de fé" é possível que Ele
escolha responder à parte dos meios comuns.
Entretanto, além disso, devemos lembrar que há outro
fator que vimos, não devemos nos surpreender com o
mesmo, de fato devemos estar alertas com respeito a
ele. Não devemos deixar que nossa teologia seja
perturbada, nem devemos abandonar nossas posições
bíblicas por causa de quaisquer fenômenos. Temos que
avaliar e testar todos esses fenômenos. Devemos
explicá-los, se for possível, pelas várias maneiras que
temos visto, posto que é mais fácil fazê-lo hoje em dia,
talvez, do que em anos atrás. Entretanto, ainda
devemos acreditar que "para Deus tudo é possível".
Deus pode fazer milagres hoje, assim como Ele
tem feito no passado. Talvez devêssemos até esperar
isso dEle, já que os tempos estão enegrecendo e as
forças do mal parecem estar emergindo de maneira
extraordinariamente agressiva e potente. Não devemos
descartar, dogmaticamente, como costumávamos a
fazer, a manifestação e a demonstração do poder de
Deus para curar doenças, ou para fazer qualquer coisa
que é de Seu desejo e de Sua vontade. A antiga
exortação do apóstolo Paulo aos Tessalonicenses é
duradoura: "Não extingais o Espírito. Não desprezeis as
profecias; examinai tudo. Retende o bem" (1
Tessalonicenses 5:19-21). Não devemos ficar
amedrontados nem nos tornar crédulos sem qualquer
ressalva; no entanto, igualmente não devemos
"extinguir o Espírito" nem sermos culpados de reduzir o
poder de Deus à medida do nosso entendimento.

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