Exército de Brizoleone

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OS INCRÍVEIS EXÉRCITOS DE BRIZOLEONE

Em outubro de 1963, Leonel de Moura Brizola, então Governador do Rio Grande do Sul,
considerava que o Brasil estava vivendo momentos decisivos e que, rapidamente, se aproximava
o desfecho que poderia colocar o País numa nova linha política. Nesse momento, raciocinava o
caudilho gaúcho, ele queria estar na crista da onda esquerdista que varreria o País.

Em seis capítulos, F DUMONT mostra as loucuras praticadas pelo infame “EXÉRCITO DE


BRIZALEONE”

CAPÍTULO I
OS GRUPOS DOS ONZE E O EXÉRCITO POPULAR DE LIBERTAÇÃO

Sucessivamente, em 19 e 25 de outubro de 1963, Brizola fez inflamados pronunciamentos à


Nação, através dos microfones de uma cadeia de estações de rádio liderada pela Mairink Veiga,
que detinha, na época, o maior percentual de ouvintes das classes média e baixa. Nesses
pronunciamentos, eivados, como sempre, de metáforas e redundâncias, conclamou o povo a
organizar-se em grupos que, unidos, iriam formar o "Exército Popular de Libertação" (EPL). Com
sua habitual e singular loquacidade, comparou esses grupos com equipes de futebol e os 11
"jogadores" seriam os "tijolos" para "construir o nosso edifício".

Estavam lançados os "Grupos dos Onze" (G-11) que, para Brizola, constituir-se-iam nos núcleos
de seu futuro exército particular, o EPL.

Os documentos posteriormente encontrados em seus arquivos pessoais revelaram os planos


para a formação dos G-11 e do EPL, escritos numa linguagem incisiva mas primária, dramática
mas demagógica.

O documento mais hilariante, se não fosse macabro, era o das "Instruções Secretas", assinadas
por um "Comando Supremo de Libertação Nacional". Ele iniciava-se por um "Preâmbulo Ultra-
Secreto", no qual a morte incidiria sobre aqueles que revelassem os segredos dos G-11:
"Após tomar conhecimento, só a morte libertará o responsável pelo compromisso de honra
assumido com o Comando Supremo de Libertação Nacional ... 0 compromisso de resguardo
deverá ser um tanto solene, para impressionar o companheiro, devendo, antes, verificar as
idéias desse Soldado dos G-11, a fim de que seja selecionado, ao máximo, os autênticos e
verdadeiros revolucionários, os destemerosos da própria morte..."

Os G-11 seriam a "vanguarda avançada do Movimento Revolucionário", a exemplo da "Guarda


Vermelha da Revolução Socialista de 1917 na União Soviética".

Defendendo a tese de que "os fins justificam os meios", fazia veladas ameaças sobre futuros
atos dos G-11:

"Em conseqüência, não nos poderemos deter na procura de justificativas acadêmicas para atos
que possam vir a ser considerados, pela reação e pelos companheiros sentimentalistas,
agressivos demais ou, até mesmo, injustificados".

Os integrantes dos G-11 deveriam considerar-se em "Revolução Permanente e Ostensiva" e seus


ensinamentos deveriam ser colhidos nas "Revoluções Populares", nas "Frentes de Libertação
Nacional" e no "folheto cubano" sobre a técnica de guerrilha (nessa época, os "folhetos
cubanos" sobre a técnica de guerrilhas eram disseminados, no País, pelos denominados
Movimentos de Educação Popular).

Admitiam, essas "Instruções Secretas", que a época era propícia à atuação dos G-11:

"Devemos nos lembrar que, hoje, temos tudo a nosso favor, inclusive, o beneplácito do Governo
e a complacência de poderosos setores civis e militares, acovardados e temerosos de perder
seus atuais e ignominiosos privilégios".

Instruíam os G-11 sobre a aquisição de armas, recomendando "não se esquecer dos preciosos
coquetéis molotov e outros tipos de bombas incendiárias".
Alertavam, também, que:

"A escassez inicial de armas poderosas e verdadeiramente militares será suprida pelos aliados
militares que possuímos em todas as Forças Armadas..."

As "Instruções Secretas" estabeleciam o esquema para o início do movimento insurrecional:

"... os camponeses, dirigidos por nossos companheiros, virão destruindo e queimando as


plantações, engenhos, celeiros, depósitos de cereais e armazéns gerais... A agitação será nossa
aliada primordial e deveremos iniciá-la nos veículos coletivos, à hora de maior movimento, nas
ruas e avenidas de aglomeração de pedestres, próximo às casas de armas e munições e nos
bairros eminentemente populares e operários. Desses pontos e à sombra da massa humana,
deverão convergir os G-11 especializados em destruição e assaltos, já comandando os
companheiros e com outros se ajuntando pelas ruas e avenidas, para o centro da cidade, vila ou
distrito, de acordo com a importância da localidade, depredando os estabelecimentos
comerciais e industriais, saqueando e incendiando, com os molotovs e outros materiais
inflamáveis, os edifícios públicos e os de empresas particulares. Ataques simultâneos serão
desfechados contra as centrais telefônicas, rádio-emissoras e, onde houver, de TV, casas de
armas, pequenos Quartéis Militares ..."

Ciente de que a revolução vinha sendo conduzida pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB),
através da chamada "via pacífica", Brizola reservou um item de suas "Instruções Secretas" para
tratar do "Aliado Comunista":

"Devemos, ..., ter sempre presente que o comunista é nosso principal aliado mas, embora
alardeie o Partido Comunista ter forças para fazer a Revolução Libertadora, o PCB nada mais é
que um Movimento dividido em várias frentes internas em luta aberta entre si pelo poder
absoluto e pela vitória de uma das facções em que se fragmentou".

E prosseguiam, as Instruções, nos seus ataques ao PCB:


"São fracos e aburguesados esses camaradas chefiados pelos que vêem, em Moscou, o único Sol
que poderá guiar o proletariado mundial à libertação Internacional".

Ao mesmo tempo, Brizola apontava o radical Partido Comunista do Brasil (PCdoB) como um
possível aliado:

"Existe uma ala mais poderosa que, dia a dia, está se elevando no conceito do proletariado
marxista, seguidora dos ideais de Mao Tse Tung, de Stalin, e que são, em última análise, os de
Marx e Engels. É nessa ala, hoje muito mais poderosa que a de Moscou, que iremos buscar a
fonte de potencialidade material e militar para a luta de Libertação Nacional".

Mas, o tragicômico das "Instruções Secretas" aparecia, com espantosa nitidez, no item sobre a
"Guarda e Julgamento dos Prisioneiros":

"Para essa tarefa de suma importância, deverão ser escolhidos companheiros de condição
humilde mas, entretanto, de férreas e arraigadas condições de ódio aos poderosos e aos ricos, a
fim de que não discutam ordens severas que poderão ser conhecidas no momento da luta de
Libertação. Estes grupos dos Onze companheiros terão, como finalidade primordial, deter, em
todo o seu raio de ação, municípios, vilas, distritos e povoados, todas as autoridades públicas,
tais como Juízes de Direito, Prefeitos, Delegados de Polícia, Vereadores, Presidente da Câmara,
Políticos influentes e outras personalidades que por acaso estejam dentro de sua esfera de
atribuição e limites de ação, recolhendo-os a locais apropriados, preferentemente no meio do
mato, sob guarda armada e permanente. No caso de derrota do nosso Movimento, o que é
improvável, mas não impossível, dado a certas características da situação nacional, e temos que
ser verdadeiros em todos os nossos contatos com os Comandos Regionais e esta é uma
informação para uso somente de alguns companheiros de absoluta e máxima confiança, os
reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus
aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição".

No início de 1964, Brizola lançou seu próprio semanário, "O Panfleto", que veio se integrar à
campanha agitativa já desenvolvida pela cadeia da Rádio Mairink Veiga.

Em seus sonhos quixotescos, distribuiu diversos outros documentos para a organização dos G-
11, tais como as "Precauções", os "Deveres dos Membros", os "Deveres dos Dirigentes", um
"Código de Segurança" e fichas de inscrição para seus integrantes.

Chegou a organizar 5.304 grupos, num total de 58.344 pessoas, distribuídas, particularmente,
pelos Estados do Rio Grande do Sul, Guanabara, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.

Para Brizola, a revolução estava madura, pronta para ser desencadeada.

Havia um líder, ele mesmo.

Havia as idéias, seus próprios sonhos de poder.

Só faltava algum simples episódio que inflamasse o povo e que fizesse proliferar os Grupos dos
Onze, provocando o surgimento de seu "Exército Popular de Libertação", na verdade, um
pequeno-louco exército de Brizoleone.

CAPÍTULO II
OPERAÇÃO PINTASSILGO

Após a Revolução de 31 de Março de 1964, centenas de comunistas e inconformados políticos


fugiram para o Uruguai. A proximidade do Rio Grande do Sul, então visualizado como o principal
foco de resistência, oferecia condições seguras para que fosse feita uma avaliação da situação e
realizado o planejamento das maquinações revanchistas. A fronteira seca favorecia o contato
permanente entre os asilados e aqueles que, embora atingidos por atos revolucionários, ainda
não se sentiam ameaçados a ponto de se aventurarem a abandonar o Brasil.

O folclore afirma que Brizola fugiu disfarçado de mulher, com uma sainha curta e batom na
boca. A verdade, entretanto, é que, depois de passar todo o mês de abril escondido em
diferentes locais de Porto Alegre, Brizola, disfarçado de soldado da Brigada Militar, foi levado
num fusquinha dirigido por Lenir, esposa do advogado Ajadil de Lemos, até à praia de Pinhal.
Daí, um avião monomotor dirigido por Manoel Leaes ("Maneco") levou-o até Sarandi Grande, já
no Uruguai.

Em pouco tempo, Brizola tornou-se um ponto de referência no Uruguai. A "cadeia da


legalidade", sua frustrada tentativa para conter o movimento de Março, dava-lhe uma
ascendência natural sobre todos os asilados. Sua inegável liderança carismática, associada a
uma verbosidade demagógica, fizeram-no o centro de iradas tertúlias contra o regime militar
que se instalara no Brasil.

Enviava mensagens pelo rádio dizendo que, até dezembro, estaria de volta ao País, na "crista de
um movimento insurrecional". Usando senhas e os intermediários Albery Vieira dos Santos, ex-
sargento da Brigada Militar, e Lucio Soares Costa, recebia muita gente: comunistas, militares,
sindicalistas, políticos, padres e freiras. Fez contatos com agentes cubanos, dentre os quais o
próprio chefe da polícia secreta, Miguel Bruguera del Valle. Elaborou um "Livro de Ouro" para
angariar recursos financeiros no Brasil e no exterior. Os famosos dólares de Cuba estariam entre
eles. Elaborou um "Regulamento Revolucionário", com dez mil exemplares impressos em
Montevidéu.

Não conseguiu, entretanto, unir todas as forças que se opunham ao novo governo
revolucionário. Seu projeto de formar e liderar uma "frente" esbarrou no jogo de interesses e na
inconciliável luta que envolvia a vaidade pessoal dos outros líderes. Num prolongamento das
anteriores fracassadas tentativas de união e refletindo a crise das esquerdas, os asilados
acabaram se dividindo em três grandes grupos, distintos por suas origens: um sindical, um
militar e um liderado por Brizola.

Em novembro, estava em pleno desenvolvimento a crise envolvendo Mauro Borges, governador


de Goiás, acusado de uma tentativa de socialização com a participação de estrangeiros e de
militares cassados.

Nessa época, em clima de aproveitamento da crise de Goiás, foi montada, no Uruguai, a


"Operação Pintassilgo". O plano previa o ataque a diversos quartéis, a tomada da Base Aérea de
Canoas, no Rio Grande do Sul, e a utilização dos aviões da FAB para o bombardeamento aéreo
do Palácio Piratini, visando à morte do Governador Ildo Meneghetti.

A prisão em Porto Alegre, em 26 de novembro de 1964, do capitão-aviador cassado, Alfredo


Ribeiro Daudt, abortou a operação e todos os seus planos caíram em poder da polícia. Diversos
militares da Aeronáutica estavam envolvidos, aliciados pelo tenente-coronel reformado Américo
Batista Moreno e pelo ex-sargento Santana.

Muitos anos mais tarde, em 1982, em entrevista concedida na Assembléia Legislativa do Rio
Grande do Sul, o ex-coronel Jeffersom Cardim de Alencar Osório acusaria Brizola de ter sido o
responsável pela Operação Pintassilgo.

Do Uruguai, no conforto de suas estâncias, Brizola queria enviar os ingênuos para as ações que
ele próprio não tinha coragem de executar.

CAPÍTULO III
O PACTO DE MONTEVIDÉU E A FRENTE POPULAR DE LIBERTAÇÃO (FPL)

Nos últimos meses de 1964, aumentara a revoada de comunistas brasileiros para o Uruguai,
ansiosos em estabelecer alianças com os grupos de asilados políticos os quais, já se dizia,
estavam com os "dólares de Cuba". Foi por esse "singelo" motivo que os grupos sindical e
militar, acrescidos dos comunistas de "carteirinha", isto é, militantes de organizações
subversivas, aceitaram ser tutelados por Brizola.

A primeira tentativa de unificação dos grupos existentes concretizou-se em janeiro de 1965,


com a criação do "Pacto de Montevidéu", assinado por Leonel Brizola, Max da Costa Santos,
José Guimarães Neiva Moreira, Darcy Ribeiro e Paulo Schilling, além de representantes da Ação
Popular (AP), com Aldo Arantes, do Partido Comunista Brasileiro (PCB), com Hércules Correia
dos Reis, do Partido Operário Revolucionário Trotskista (PORT), com Cláudio Antônio
Vasconcelos Cavalcanti, e do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Constituindo-se em uma frente "revolucionária", definiram a insurreição como a forma de luta


para a tomada do poder, sem deixar de contar com a participação da parcela da burguesia
nacional "prejudicada pelos interesses imperialistas". As massas participariam da luta através da
constituição de comitês de empresas, de comitês rurais e de grupos de ação - os "Grupos dos 5".
Brizola, agora mais modesto, trocava o futebol de campo pelo de salão.
Denominada de Frente Popular de Libertação (FPL), a expressão organizada do Pacto de
Montevidéu afirmava que os "atos de guerra", definidos como "atos de sabotagem urbana" e
"focos de guerrilha no campo", deveriam multiplicar-se por todo o território brasileiro, sem
prejudicar a parcela da população não comprometida. Os inocentes deveriam ser ganhos pela
insurreição e serem aproveitados como força de pressão e massa de manobra.

O Pacto previa, também, a formação de um Comando Nacional (CN) da FPL, através da evolução
das estruturas de comando dos grupos de ação e dos comitês de empresas e dos rurais.
Enquanto o CN não fosse constituído, um Comitê de Coordenação, sediado em Montevidéu e
integrado pelos signatários do Pacto, decidiria sobre a participação da FPL em manifestações de
caráter político.

A primeira tentativa de sabotagem idealizada pela FPL ocorreu em fevereiro de 1965.

Ao fazer um tratamento psiquiátrico em Montevidéu, um ex-soldado do 13º Regimento de


Cavalaria, conhecido por Ponciano e que trabalhava com explosivos numa firma de Jaguarão, foi
recrutado por membros da FPL. Prometeram-lhe 1 milhão de cruzeiros para levar 20 caixas de
dinamite para o Uruguai e uma gratificação extra se conseguisse explodir um bueiro na BR-2, em
Capão Reiúno, próximo a Jaguarão, interditando a estrada.

Ponciano chegou a roubar 32 bananas de dinamite. Entretanto, não conseguiu entregá-las, a


explosão não destruíu o bueiro, a BR-2 não foi interditada e o desequilibrado Ponciano, preso,
confessou suas ligações com o grupo de asilados.

Começava, de forma melancólica, a insurreição da FPL. A inescrupulosa utilização de um débil


mental mostrou que, para atingir seus objetivos, tudo era válido para os exércitos de Brizoleone.

CAPÍTULO IV
JEFFERSOM CARDIM E AS ESCARAMUÇAS DAS FORÇAS ARMADAS DE LIBERTAÇÃO NACIONAL
(FALN)
No Uruguai, a incontinência verbal de Brizola deixou-o em situação embaraçosa. A afirmação de
que voltaria vitorioso ao Brasil até dezembro de 1964 ficou comprometida com os freqüentes
insucessos de todas suas iniciativas.

A fim de satisfazer a crescente belicosidade de seus liderados - na maioria, ex-militares cassados


das Forças Armadas e da Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRS) -, Brizola resolveu
desencadear mais um "plano revolucionário infalível".

Sob a designação genérica de "Esquema Geral", a "revolução" brizolista iniciar-se-ia com um


movimento sedicioso no Rio Grande do Sul que se juntaria com forças que iriam penetrar no
Mato Grosso, vindas da Bolívia, sob o comando do ex-Coronel da Aeronáutica, Emanoel Nicoll.
Com a estratégia em forma de pinça, Brizola pretendia que a junção das duas forças fosse
realizada, simbolicamente, em 31 de março de 1965, para "comemorar" o primeiro aniversário
do movimento militar que o compulsara ao ostracismo.

Para a invasão dos pampas gaúchos, dentre as várias opções, Brizola escolheu a "Operação Três
Passos", de autoria do ex-Sargento da BMRS, Albery Vieira dos Santos Júnior. Para comandá-la,
foi escolhido o ex-Coronel de Artilharia do Exército, Jeffersom Cardim de Alencar Osório, que
trabalhava no Loyde Brasileiro em Montevidéu.

Na noite de 12 de março de 1965, na residência de Brizola, localizada na Praça Independência,


em Montevidéu, uma reunião do tipo "estado-maior" decidiu e traçou os detalhes da Operação.

Um manifesto a ser divulgado pela Rádio Difusora de Três Passos, no dia 25 de março, seria a
senha para a "revolução brasileira".

Nessa mesma reunião, foi analisada a necessidade de recursos para a Operação, sendo realizada
uma "vaquinha" entre os presentes: Darcy Ribeiro contribuiu com 500 dólares, o ex-prefeito de
Belo Horizonte, Ivo Magalhães, com 300 mil cruzeiros, o ex-Sargento Albery com 10 mil
cruzeiros e Jeffersom Cardim com 5 mil pesos uruguaios. O único que não contribuiu foi o
próprio Brizola, alegando que ainda não havia recebido os dólares prometidos pelo governo
cubano.
Na noite de 18 de março, Cardim, Albery e Alcindor Aires iniciaram a marcha para a "revolução",
alugando um táxi para levá-los de Montevidéu até Livramento, onde chegaram no dia seguinte.
Um outro táxi levou-os até Santa Maria, onde ficou Alcindor para tentar conseguir mais adeptos
para a empreitada.

Ao atingirem Catuípe, Cardim e Albery observaram que se continuassem fazendo a revolução


viajando de táxi em táxi veriam rapidamente terminar o dinheiro da "vaquinha". Então, a fim de
economizar os "recursos revolucionários", conseguiram um automóvel emprestado por um
amigo de Albery, prosseguindo até Campo Novo, onde pousaram na casa de "Gringo", irmão do
ex-Sargento.

Nessa cidade, contataram com o professor Valdetar Antônio Dorneles, que preparou um croqui
de Três Passos - assinalando os pontos sensíveis - e comprometeu-se a conseguir mais
revolucionários para a ação.

Agruparam-se os reforços: Alcindor trouxe dois homens de Santa Maria, o ex-Sargento Firmo
Chaves chegou de Porto Alegre com mais sete, dentre os quais Adamastor Antonio Bonilha, e
Valdetar arregimentou mais nove.

Realizaram exercícios de tiro, treinaram montagem de acampamento, distribuiram as missões e


chegaram a um impasse: numa falha da logística do planejamento aprovado pelo Comandante
Brizola, não fora previsto o transporte para os combatentes. A solução foi dada por "Zebinho",
pai de Valdetar, que se lembrou de um amigo do PTB, que tinha um velho Ford bigode, modelo
1929. Não seria por falta de transporte que a revolução seria abortada.

Tiveram, entretanto, que fazer uma pequena alteração nos planos. A pequena quantidade de
arregimentados - duas dúzias de homens - não era suficiente para a prevista tomada do quartel
de Ijuí.

Na noite de 25 de março, Cardim e seu incrível "exército" partiram de Campo Novo rumo a Três
Passos, onde chegaram na madrugada do dia seguinte. Sem encontrar resistência, assaltaram o
posto policial da Brigada Militar, levando armamento, fardamento e munição. Ainda nessa
madrugada, tomaram os transmissores da Rádio Difusora, onde Odilon Vieira, com sua voz de
locutor, leu o "Manifesto à Nação", que representava a senha para o início da "revolução
brasileira". No final da proclamação, alguns poucos notívagos, surpresos e sonolentos, tomaram
conhecimento da criação das "Forças Armadas de Libertação Nacional" (FALN).

Ainda em Três Passos, contando com a cumplicidade do sub-delegado local, Cardim trocou o
velho Ford bigode por um caminhão Mercedes Benz apreendido, cor de tijolo. Para melhorar a
"caixinha" revolucionária, assaltaram a agência do Banco do Brasil. Alegando não possuir as
chaves do cofre, o gerente conseguiu repor os frustrados combatentes na sua marcha
revolucionária, todos blasfemando contra o azar de não ter sido encontrada a chave.

Na pequena cidade de Itapiranga, assaltaram os postos policiais da Brigada Militar, aumentando


o seu arsenal.

Supondo que o Brasil ardia em revoltas, causadas pelo seu manifesto da madrugada, Cardim
roubou um rádio-receptor de uma loja comercial. Surpreso pela ausência de notícias, começou a
pensar que o plano fracassara. Restava-lhe, entretanto, a esperança de atingir o Mato Grosso e
realizar a junção com o "exército" de Nicoll, que deveria estar vindo da Bolívia.

Guiados por Virgílio Soares de Lima, tio de Albery, os sediciosos atravessaram Santa Catarina e
penetraram no Paraná.

Ao tomarem conhecimento das estrepolias de Cardim e seu bando e temendo que pudessem se
dirigir a Foz de Iguaçu e perturbar a cerimônia de inauguração da Ponte da Amizade sobre o Rio
Paraná, com a presença dos presidentes do Brasil e do Paraguai, as autoridades militares
determinaram o emprego de tropas da 5ª RM/DE, com o apoio de aviões da FAB e do Núcleo de
Divisão Aeroterrestre.

O tenente de Infantaria Marco Antonio Savio Costa comandava o 1º Pelotão da 1ª Companhia -


sediada em Francisco Beltrão - do 1º Batalhão do 13º Regimento de Infantaria, este sediado em
Ponta Grossa. Recebendo a missão de localizar e prender o bando armado, imediatamente
reuniu seu pelotão, os claros de momento preenchidos com os quadros que pôde encontrar.
Numa viatura de 1/4 Ton do EB e num caminhão basculante preto emprestado pela prefeitura
de Francisco Beltrão, saiu o tenente em busca dos "guerrilheiros".
Cerca das 1115h de 27 de março de 1965, na região de Santa Lúcia, município de Capitão
Leônidas Marques, Cardim ouviu a aproximação de uma viatura com tropas do Exército.
Imaginando que pudesse melhorar o já combalido moral de suas FALN, resolveu realizar uma
emboscada, dispondo seus homens em ambos os lados da estrada, logo após uma curva.
Postando-se fardado de coronel, com um impecável uniforme 4º A e com todas as gemadas a
que tinha direito, Cardim acenou para a tropa que se aproximava. Com isso, provocou uma
ligeira hesitação no tenente Savio Costa, o suficiente para o início da emboscada, com tiros
sobre a viatura. Desembarcando e reagindo violentamente, o pelotão conseguiu equilibrar as
ações e aferrou-se ao terreno.

Foi quando chegou um avião L-19 da FAB, pilotado pelo 1º Ten Av David Branco e que conduzia
um observador aéreo, o capitão Canrobert Lopes Costa, do 18º RI de Curitiba, que, desde o fim
da manhã do dia anterior, cumpria a missão de localizar o bando. Após comunicar o que estava
observando ao 2º Esquadrão de Controle e Alarme, 2º ECA, e dele ter recebido a determinação
de não intervir, o Cap Canrobert, em sucessivos vôos rasantes do L-19, descarregou cinco
carregadores de sua Mtr INA .45, sobre as árvores que encobriam os "guerrilheiros". Apoiado
pelo "fogo aéreo", o pelotão, depois de também abrir cerrado fogo com suas três Mtr Madsen e
fuzis, partiu para o assalto contra o bando inimigo.

A coordenação de fogos e o assalto provocaram a fuga desabalada de 21 "guerrilheiros" que,


embrenhando-se nas matas, só mais tarde seriam capturados, através de operações de cerco
desencadeadas pelos pára-quedistas. Três deles, entretanto, foram presos no momento do
combate: o coronel Jeffersom Cardim e os sargentos Albery e Adamastor Bonilha.

Infelizmente, a ação dos tresloucados seguidores de Cardim fez uma vítima fatal. O 3º Sargento
Carlos Argemiro Camargo, que servia como burocrata na Companhia de Infantaria de Francisco
Beltrão e havia se apresentado voluntariamente para a missão, foi alvejado várias vezes ao
desembarcar da viatura, deixando viúva grávida de 7 meses.

Encerrava-se, tragicamente, mais uma aventura brizoleana.

Após cumprir pena, Jeffersom Cardim, em entrevista concedida a Décio de Freitas, em março de
1980, na Assembléia Legislativa gaúcha, declarou que a "Operação Três Passos" previa a entrada
de Brizola no Brasil, a fim de catalisar e de detonar as revoltas: "Acho que Brizola se acovardou,
foi uma traição, porque em seu apartamento na Praça da Independência, em Montevidéu,
selamos um pacto. Ele não cumpriu este compromisso, que era o de derramar o sangue pelo
povo brasileiro". Cardim veio a falecer em 29 de Janeiro de 1995, no Rio de Janeiro.
Em novembro de 1979, o "Coojornal" publicou uma entrevista concedida um ano antes pelo ex-
Sargento Albery, na qual declarou que o dinheiro para financiar a Operação - um milhão de
dólares - havia sido conseguido em Cuba e levado, até Brizola, por Darcy Ribeiro e Paulo
Schilling. Afirmou, também, sobre Brizola, que: "A traição dele foi ter mandado iniciar o
movimento e, depois, ter-se arrependido e não colocar o plano em execução".

Pouco tempo depois da entrevista, em fevereiro de 1979, o ex-Sargento Albery foi


misteriosamente assassinado - em circunstâncias nunca bem explicadas - no oeste paranaense.

Após mais esse malogro, Brizola afastou-se da FPL e, ainda no Uruguai, conduziria mais um de
seus incríveis exércitos para o fracasso.

CAPÍTULO V
O MOVIMENTO DE RESISTÊNCIA MILITAR NACIONALISTA (MRMN) E A RESISTÊNCIA ARMADA
NACIONALISTA (RAN)

Nos primeiros meses de 1966, a 1ª Conferência Tricontinental de Havana e a criação da


Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS), em janeiro, agitaram os três grupos de
exilados brasileiros no Uruguai, já conscientes do fracasso da Frente Popular de Libertação (FPL)
e das Forças Armadas de Libertação Nacional (FALN) (ver capítulos III e IV).

Em março, esses grupos realizaram diversas reuniões, com a finalidade de formarem uma frente
única.

Entretanto, enquanto que o grupo de Brizola acreditava que dentro do Brasil iria, em curto
prazo, aflorar um movimento contra o governo, o grupo militar não concordava com essa
posição e afirmava que a revolução armada era a única forma de tomada do poder.

Este grupo preconizava a criação de uma estrutura clandestina, conduzida por uma liderança
conhecida e atuando no Brasil. Para eles, a presença física de Brizola era a condição
indispensável para o sucesso do movimento.

Essa posição constituiu-se no ponto de ruptura entre os dois grupos. A convicção revolucionária
de Brizola não era tão grande a ponto de levá-lo a se expor fisicamente. Bem mais tranqüila era
a sua "entusiasmada" participação na revolução brasileira tramada à sombra do asilo político no
Uruguai.

Por outro lado, os ex-militares relutavam em aceitar a liderança de Brizola, em conseqüência


dos repetidos fracassos de suas anteriores tentativas, qualificadas como aventuras
irresponsáveis.

Em 20 de maio de 1966, realizou-se uma reunião do grupo militar na residência do ex-almirante


Cândido de Assis Aragão, em Montevidéu, a fim de ser constituída uma organização que
pudesse atuar clandestinamente no Brasil, o Movimento de Resistência Militar Nacionalista
(MRMN).

Nessa reunião, ficou estabelecido que o MRMN desencadearia, inicialmente, uma série de atos
terroristas contra alvos ligados aos interesses norte-americanos no Brasil. Numa fase seguinte,
partiria para a eliminação física dos membros do "Peace Corps" e de outros norte-americanos,
tachados de "agentes da CIA e do imperialismo". O MRMN apostava que os atos terroristas
provocariam uma repressão violenta que, por sua vez, conduziria ao clima visado pela
organização, denominado de "auto-defesa das massas". O movimento, a partir daí, ganhando
mais adeptos, desaguaria na revolução armada, a partir de um movimento de guerrilhas bem
constituído.

Da reunião de fundação do MRMN, participaram, dentre outros: o ex-almirante Cândido Aragão,


o ex-general Henrique Cordeiro Oest, o ex-capitão da Aeronáutica Alfredo Ribeiro Daudt, o ex-
coronel da Aeronáutica Emanoel Nicoll, Jaime de Araujo, Jacy Pereira Lima e o ex-Sargento da
Aeronáutica Álvaro Moreira de Oliveira Filho.

Inicialmente, a chefia do MRMN coube ao ex-almirante Aragão. Posteriormente, por problemas


de saúde, Aragão entregou o comando a Alfredo Ribeiro Daudt e a Emanoel Nicoll. Integrariam,
o MRMN, os ex-militares exilados no Uruguai e em outros países, ex-militares cassados no Brasil
e, clandestinamente, alguns militares ainda em serviço ativo, recrutados pelo aproveitamento
do mote "nacionalismo", pensamento sempre presente na maioria dos militares. Para este fim,
as bases do movimento seriam levadas ao Rio Grande do Sul, com a idéia de recrutar militares e
civis, que participariam da organização formando "núcleos de resistência" em várias cidades do
Brasil.

Em 26 de maio de 1966, o MRMN deu publicidade ao manifesto "Ao Povo Brasileiro", no qual
transmitiu uma imagem hegemônica e imperialista do Brasil na América do Sul.

No início de junho, os "militares" do MRMN tentaram uma aproximação com o grupo sindical
dos exilados. Os "militares" foram representados por Alfredo Ribeiro Daudt, Emanoel Nicoll e
Jacy Pereira Lima, e os "sindicalistas" por Osvaldo Pacheco, Osmildo Stafford da Silva, Luiz
Cláudio Braga Duarte e Dante Pelacani.

A tentativa não teve êxito. Os sindicalistas acreditavam que a atividade dos ex-militares
prejudicava o trabalho que Dante Pelacani estava realizando em São Paulo, em ligação com
Benedito Cerqueira e com a Federação Sindical Mundial.

Naquele mesmo dia de junho de 1966, o MRMN entrou em contato com o Comitê de Apoio a
Cuba, a fim de obter o seu reconhecimento político.

Em 15 de junho, o ex-presidente João Goulart organizou, em sua residência, uma reunião com o
MRMN, representado por Aragão, Daudt e Nicoll, da qual também participaram Darcy Ribeiro e
Amaury Silva. Jango prometeu auxílio financeiro ao movimento e, tentando ficar acima dos
grupos, criou um Comitê para coordená-los, integrado por Emanoel Nicoll, representando o
grupo militar, por Dante Pelacani, o sindical, por Neiva Moreira, os brizolistas, e Darcy Ribeiro,
representando o próprio Jango.

A movimentação do MRMN obrigou Brizola, que temia perder a sua condição de líder, a aceitar
um novo contato com os ex-militares, no início de julho. E, novamente, o impasse causado pela
idéia do MRMN de exigir a presença física de Brizola no Brasil provocou outro rompimento.

Paralelamente à atuação dos diversos grupos de exilados, uma outra organização destacava-se
na época, a Associação dos Exilados Brasileiros no Uruguai (AEBU), que tinha o objetivo
declarado de, indistintamente, prestar assistência aos refugiados brasileiros. Orientada pelas
liderança de Jango e de Brizola, a AEBU obtinha recursos através da contribuição de alguns
exilados e de colaboradores no Brasil, dentre os quais Doutel de Andrade.

O rompimento de Brizola refletiu-se na AEBU. Em 09 de julho de 1966, nas eleições para a sua
nova diretoria, os elementos ligados a Brizola foram alijados. A nova direção ficou constituída
por Cândido Aragão, na presidência, Alfredo Ribeiro Daudt, na 1ª secretaria, Álvaro Moreira
Filho, na 2ª secretaria, Humberto Menezes Pinheiro como 1º tesoureiro, Arnaldo Magno de
Araújo como 2º tesoureiro e Cesar Augusto Chefitelli como diretor de assistência social.

Debatendo-se em busca de reconhecimento político e de apoio financeiro, o MRMN saiu do


imobilismo realizando, em 21 de outubro de 1966, um atentado à bomba contra o monumento
do Barão do Rio Branco, em Montevidéu, executado por Gualter de Castro Mello, Tito
Guimarães Filho e Arnaldo Magno de Araújo.

Em dezembro de 1966, a direção do MRMN decidiu mudar o nome da organização para


Resistência Armada Nacionalista (RAN), que utilizava, como símbolo, uma rã. Com o objetivo de
angariar o apoio financeiro do Partido Comunista Uruguaio (PCU) e da OLAS, a RAN pretendia
lançar um manifesto assinado por Aragão nas principais capitais brasileiras e pichar muros para
popularizar a nova sigla. Ficou prevista a ida de Aragão, Daudt e Arnaldo Magno de Araújo a
Cuba, a fim de conseguir recursos para enviar seus militantes para realizar cursos de guerrilha
em Cuba e na Coréia do Norte.

A nova RAN lutava para afirmar-se e ser reconhecida.

CAPÍTULO VI
O MOVIMENTO NACIONALISTA REVOLUCIONÁRIO (MNR) E AS GUERRILHAS DE CAPARAÓ E DO
TRIÂNGULO MINEIRO

Para a 1ª Conferência Tricontinental de Havana, realizada em janeiro de 1966, Brizola, aspirando


ser reconhecido como o grande líder da revolução brasileira, enviou um seu representante,
Aluísio Palhano Pedreira Ferreira ("Aquiles", "Aurélio", "Joaquim"), ex-vice-presidente da extinta
Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT).
Rompido com o grupo militar do MRMN e pressionado, de um lado, por Havana - para justificar
os recursos financeiros que vinha recebendo - e, por outro, pelos seus seguidores - descontentes
com a falta de um plano concreto para o retorno - Brizola criou, em 1966, o Movimento
Nacionalista Revolucionário (MNR).

Foi a primeira organização expressiva surgida após a revolução democrática de 31 de março de


1964. Apesar de algumas afinidades ideológicas e o mesmo sentimento de aversão ao governo
revolucionário brasileiro, o MNR surgiu fora do quadro de luta interna das quatro grandes
organizações comunistas então existentes (PCB, PCdoB, POLOP e AP).

Inspirados em Brizola, reuniram-se, para formar o MNR, militares cassados, dentre os quais
muitos simpatizantes comunistas - oficiais e praças, políticos esquerdistas (filiados ou não a
organizações comunistas) e alguns civis cassados. Todos, entretanto, estavam desiludidos com
as opções tradicionais da esquerda brasileira, influenciados pela revolução cubana e
inconformados com a humilhante derrota que as forças democráticas lhes impuseram.

Com a idéia de implantar a guerra de guerrilhas no campo com o apoio de um movimento


urbano, o MNR articulou-se, basicamente, em dois núcleos: o primeiro, sediado em
Montevidéu, que manipulava a organização, e o segundo, no Rio de Janeiro, onde se situaria o
Comando Nacional. Havia, ainda, ligações em São Paulo, em Minas Gerais e no Rio Grande do
Sul.

De Montevidéu, Brizola chefiava as articulações, em companhia do seu assessor militar, o ex-


Coronel do Exército Dagoberto Rodrigues, além de outros como Almino Afonso, Paulo Schilling,
Almir Olimpio de Melo ("Paulo Melo"), José Guimarães Neiva Moreira e Moysés Kupperman.

No Rio de Janeiro, a direção era de Bayard Demaria Boiteaux, assessorado por Amadeu de
Almeida Rocha, no campo político, e pelo ex-Capitão Juarez Alberto de Souza Moreira, no
campo militar.

Havia, ainda, no Rio de Janeiro, um "colegiado de intelectuais" do qual faziam parte, dentre
outros, Amadeu Thiago de Mello, Antonio Carlos Callado, Gabriel Obino, Otto Maria Carpeaux,
Ana Araújo de Arruda Albuquerque e Maria Ignez da Costa Duque Estrada Bastos.

Em São Paulo, o dirigente era Alonso, com codinome "Sergio".

O jornalista Flávio Aristides de Freitas Tavares ("Felix", "Feliciano", "Dr Falcão") funcionava como
pombo-correio entre o Brasil e o Uruguai.

Para a formação dos guerrilheiros, Brizola obteve o apoio de Cuba. O treinamento iniciava-se em
Pando, no Uruguai, numa estância de propriedade de Izidoro Gutierrez, ex-vereador de
Uruguaiana, ligado a Brizola. Os elementos selecionados eram enviados a Paris, via aérea, onde
eram recebidos por Max da Costa Santos, que "legalizava" seus documentos. Daí, seguiam para
Praga, onde um funcionário cubano os embarcava em aviões cubanos, em direção a Havana, via
Islândia e Canadá.

Diversos ex-militares foram treinados em guerrilhas, durante cerca de três meses, na região de
Pinar del Rio, em Cuba. Para o retorno, era utilizado o mesmo itinerário, em sentido inverso. De
Montevidéu, já com documentos falsos, ingressavam no Brasil por ônibus, um a um, por
infiltração.

A idéia inicial do "estrategista" Brizola era instalar três focos de guerrilhas. O primeiro seria no
norte do Rio Grande do Sul, liderado pelo ex-Sargento Amadeu Felipe da Luz Ferreira. O
segundo, no Brasil Central, sob a responsabilidade de Flávio Tavares. O terceiro foco localizar-se-
ia em Mato Grosso, sob a orientação de Dagoberto Rodrigues. A morte do ex-Sargento Manoel
Raimundo Soares, participante do primeiro grupo, provocou a transferência do foco guerrilheiro
para a região de Caparaó, na Serra do Mar, nos limites entre os Estados de Minas Gerais e
Espírito Santo, escolhida pela sua proximidade aos centros políticos e econômicos do País, o que
poderia motivar e insuflar o movimento das massas urbanas.

Iniciada a infiltração dos "guerrilheiros" do MNR em novembro do ano anterior, os primeiros


meses de 1967 constituíram-se num período de difícil sobrevivência. Obrigada a freqüentes
mudanças de acampamentos, por questões de segurança, acossada pelo frio e precariamente
apoiada por uma rede logística deficiente, a "Frente de Caparaó" veio a tornar-se no último
fiasco - nunca assumido - de Brizola.
Após sobreviver com dificuldades, o grupo de menos de duas dezenas de homens que se
encontrava na serra, orbitando em torno do Pico da Bandeira, veio a ser denunciado,
ironicamente, pelos próprios habitantes locais, quando começou a roubar e a abater animais
para não morrer de fome.

Em março, a Polícia Militar do Estado de Minas Gerais começou o cerco aos "guerrilheiros",
assumindo a 4ª Região Militar, em seguida, o controle das operações.

No início de abril, já estavam todos presos, desde o "comandante" Amadeu Felipe da Luz
Ferreira, passando pelo assessor militar Juarez Alberto de Souza Moreira, pelo assessor político
Amadeu de Almeida Rocha, pela rede de apoio constituída de Hermes Machado Neto, Deodato
Batista Fabrício, Itamar Gomes e Gregório Mendonça, até a "força de guerrilha" integrada por
Araken Vaz Galvão, Avelino Bioni Capitani, Amarantho Jorge Rodrigues Moreira, Edval Augusto
de Melo, Josué Cerejo Gonçalves, Gelcy Rodrigues Correia, Milton Soares de Castro, Jorge José
da Silva e João Gerônimo da Silva. Outros quatro "guerrilheiros", José Carlos Bertoncelos, Dario
Viana Reis, Alfredo Nery Paiva e Pedro Espinosa, seriam presos, mais tarde, no Rio Grande do
Sul.

Enquanto isso, o jornalista Flávio Tavares que, pelo "esquema geral" de Brizola, estava
encarregado de organizar as guerrilhas no Brasil Central, havia sido procurado em Brasília, em
dezembro de 1966, por Jarbas Silva Marques, ex-militante do PC do B.

Jarbas dissera-lhe que havia um grupo em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, que havia saído do
PC do B, após a sua VI Conferência de junho de 1966, e que desejava realizar ações de
sabotagem, de guerrilha e de terrorismo. Dirigido pelo dentista Guaracy Raniero, que havia
comparecido à Conferência, o grupo, com cerca de vinte elementos, estava isolado e buscava
novos caminhos para atuar.

Flávio Tavares percebeu que poderia apresentar a Brizola um "grupo guerrilheiro" praticamente
já constituído e desimcumbir-se, quase sem esforço, da missão que recebera. Foi ao Uruguai e,
recebendo o "aprovo" de Brizola, retornou a Brasília, contatou com Jarbas da Silva Marques e,
ambos, dirigiram-se a Uberlândia, na primeira quinzena de fevereiro de 1967.
Apresentado como o "Dr Falcão", Flávio Tavares reuniu-se com o grupo de Uberlândia no
consultório de Guaracy Ribeiro, onde compareceram, além dos três citados, Taylor Silva, Carlos
Maluf Wutke e Edmo de Souza.

Na ocasião, concretizou-se a vinculação do grupo de Uberlândia ao MNR de Brizola. Planejaram


a obtenção de armas, assaltos a quartéis e o roubo de um carro pagador do DNER, a fim de
conseguir recursos financeiros.

Em abril de 1967, Flávio Tavares recebeu, em Brasília, um "instrutor militar" enviado por Brizola,
de nome José Carlos Vidal ("Carlos Mario", "Juca"), e encaminhou-o a Uberlândia, para ministrar
instruções de sabotagem e de guerrilha. Desentendendo-se com o grupo, considerado de baixo
nível político e ideológico, o "instrutor militar", depois de 10 dias, retornou a São Paulo.

Em fins de julho de 1967, o grupo foi desarticulado, com a prisão da maioria de seus
componentes.

Dos dois núcleos - um no Rio de Janeiro e outro em São Paulo - estruturados pelo MNR para
apoiar o "esquema geral" de Brizola, o do Rio foi duramente atingido. Bayard Demaria Boiteaux,
preso, processado e condenado junto com outros "intelectuais de esquerda", assumiu toda a
responsabilidade pelo comando do movimento no País.

Tendo Caparaó como o esforço principal, o MNR não conseguiu implantar os focos guerrilheiros
de Mato Grosso e do Brasil Central.

Após o fracasso de Caparaó e a conscientização de Brizola de que não conseguiria criar ou


apanhar a "onda" insurrecional em cuja crista pensava retornar ao Brasil, o MNR desmoronou e
desarticulou-se.

Mesmo assim, conseguiu enviar dois representantes - Aluisio Palhano e José Anselmo dos
Santos, o "Cabo Anselmo" - na I Conferência de Solidariedade dos Povos da América Latina (I
COSPAL), da Oraganização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS), realizada entre 31 de
julho e 10 de agosto de 1967, em Havana.
Mais tarde, com a liberação pela Justiça Militar de alguns representantes da "Frente de
Caparaó", seria criada, em 1969, a nova Resistência Armada Nacionalista (RAN).

O núcleo de São Paulo, integrado por ex-militares como Darcy Rodrigues, Onofre Pinto, José
Ronaldo Tavares de Lira e Silva, Pedro Lobo de Oliveira e outros, ligar-se-ia a dissidentes da
POLOP e criaria, em 1968, a VPR.

Dos remanescentes do grupo do Triângulo Mineiro, Guaracy Raniero iria ao Uruguai, buscar
contato com Brizola, enquanto que Jarbas Silva Marques integrar-se-ia, em 1969, ao Movimento
de Ação Revolucionária (MAR).

Flávio Tavares, apesar do envolvimento na preparação do grupo guerrilheiro, ficou preso,


apenas, por quatro meses.

F. Dumont

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