Encantos, Encantes e Encantarias

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Encantarias, encantados e encantes


Por Leandro Rocha
Conceito: pouca atenção dos estudiosos
• Uma espécie de categoria conceitual “popular”
• Escassa literatura, em sua maioria proveniente de pesquisas sobre Para,
Maranhão (tambor de mina) e Ne (Jurema) = Nesses estudos os encantados são
referidos como seres que teriam vivido na terra e não morreram, mas se
encantaram, tornaram-se invisíveis (Ferretti M., 2000, 2008; Maués & Villacorta,
2001; Prandi & Souza, 2001); ou que sempre estiveram na condição de
encantados, nunca teriam sido mortais; e haveria mesmo alguns encantados de
origem totalmente desconhecida (Ferretti, S., 1996; Leacock, R. & Leacock, S.,
1972). Segundo R. Leacock e S. Leacock (1972) – que estudaram as religiões
afro-brasileiras de Belém, principalmente o Batuque –, os membros desse culto
apontam a linha da encantaria como sendo um mistério que os homens jamais
entenderam. Seguindo essa mesma perspectiva, os estudos de Mercante (2000)
dos rituais de cura da Barquinha (uma variante do Culto do Santo Daime que tal
como este se originou no Acre) mostraram que os encantados são considerados
“coisas secretas”; sabe-se que são entidades com muitos conhecimentos, habitam
o mundo espiritual, purificando-se ou cumprindo penitência, e são fundamentais
no desenvolvimento dos “trabalhos espirituais”.

Características do encantados
• Um dos “mistérios” relacionado à encantaria é que essas entidades podem
se manifestar na forma humana ou animal (Ferretti, S., 1996; Ferretti, M., 2000,
2008; Maués & Villacorta, 2001).
• moram no “encante”, uma região subterrânea, ou em floresta, ou rio, ou
lago, ou motanha, ou subaquática (Leacock, R. & Leacock, S., 1972), local em que
se “encantaram” quando foram atraídos por outros encantados (Maués, 2005;
Maués & Villacorta, 2001).
• Para Mundicarmo Ferretti (2008), o “encante” é um local afastado dos
homens, descrito como misterioso, de muito poder e “reabastecimento de forças”,
mas quando cercado ou interditado por alguém, isso pode resultar em muitas
mortes.
• Os encantados, por sua imortalidade, são considerados pelos membros da
religião como sendo os verdadeiros proprietários da Terra, enquanto os homens
seriam apenas residentes transitórios (Leacock, R. & Leacock, S., 1972).

As histórias
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• A crença nos encantados derivaria de lendas de origem europeia e


relacionar-se-ia a histórias de príncipes e princesas encantadas, mas também é
influenciada por concepções de origem indígena, tais como a ideia de lugares
situados abaixo da superfície terrestre, nas matas, serras, rios e lagos; e noções
africanas como a de orixá

As famílias de encantados no Maranhão


• a da Ilha de Lençois composta pelo rei Dom Sebastião, a Rainha Barba
Soeira, princesa Tóia Jarina, Duque Marquês de Pombal, etc.
• A Família da Turquia, chefiada pelo rei mouro que travou batalhas contra os
cristãos. Essas famílias são associadas às narrativas míticas das Cruzadas e à
figura de Carlos Magno, que são muito presentes no imaginário popular
maranhense.
• Há ainda as famílias da Bandeira, da Gama, de Codó, da Baía, de
Surrupira, do Juncal, dos Botos, dos Marinheiros etc (Prandi, 2005).

Na umbanda e na Jurema
• os encantados trabalham na linha das águas, porém quando há um
trabalho mais complicado a ser realizado, que envolva, por exemplo, questões de
doenças que possuam uma origem emocional, na linha das matas e florestas, de
índios e caboclos (boiadeiros) , na linha de preto velhos, na linha de marujos,
ciganos...
• Há cidades, reinos e países no mundo astral (ex 7 cidades jurema ou o
país de Aruanda), ou o reino encantado submerso de d. Sebastião....
• Há portais que ligam os encantados com o nosso mundo (serras, rios lagos,
pedras, ilhas, arvores (juremeira), matas, etc.

O contato
• O contato com os encantados geralmente se dá através de consultas, no
caso dos não iniciados.
• Através dos médiuns, das visões, das incorporações, dos chás, ervas,
fumaça/defumação, bebida (jurema)
• a relação dos médiuns com os encantados é extremamente íntima.
Referem-no como mãe, pai ou filho. E, além de ceder seu corpo, há uma série de
obrigações que precisam cumprir, como restrições alimentares e sexuais; ou ainda
providenciar oferendas, roupas, acessórios e objetos rituais para eles e manter um
santuário em casa
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Aspectos etnopsicológicos do encantamento


• Diversas são as histórias e versões a respeito desses seres. Trata-se,
portanto, de um tema com múltiplos sentidos e que comporta ambiguidades,
aberto a ampliações e reconfigurações semânticas.
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