Funçõesexecutivascriatividade Felinto 2018
Funçõesexecutivascriatividade Felinto 2018
Funçõesexecutivascriatividade Felinto 2018
Natal
2018
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Natal
2018
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BANCA EXAMINADORA
Agradecimentos
Meu caso de amor com as AH/SD não foi à primeira vista. Do contrário, fomos
apresentadas e inicialmente achei que éramos incompatíveis. Mas, por sorte, estava
enganada. É verdade que nosso caso está mais para uma adoção tardia - com todos os seus
encaixes - do que para uma paixão fulminante. Mas ainda assim é amor! Daqueles amores
duradouros, que a cada dia se conhece mais sobre o outro e se apaixona por cada nova faceta
descoberta.
Então, nada mais justo do que iniciar esta seção agradecendo ao nosso sagaz cupido: a
Profa. Dra. Izabel Hazin. Obrigada por conhecer mais de mim do que eu mesma e por
enxergar potencialidade em tudo, especialmente nas coisas que minha visão destreinada só
vê limitações. Sei que esta tarefa está longe de ser concluída, mas espero “ter fôlego” para
Para que esta empreitada interestadual de 2.360 km fosse possível, somente com
muito apoio nos bastidores. Felizmente, este apoio em minha vida tem diversos nomes e
sobrenomes. Agradeço a Hugo, que desde sempre acompanha este meu sonho de ser
pesquisadora, e que por ele encarou uma casa vazia nos nossos primeiros meses de vida a
dois! Obrigada não somente por embarcar comigo nessa ideia, mas por fazê-la tão sua a
Ainda sobre os detrás dos panos, não poderia deixar de agradecer a minha família,
que percebe minhas ausências, e ainda assim acolhe com carinho minhas escolhas. Obrigada
por compreenderem que para atingir esse meu sonho, precisei adiar tantos outros. O orgulho
Um obrigado especial a família LAPEN por ser a ponte invisível Brasília-Natal! Percorri
v
muitas estradas para ser um membro deste grupo. E hoje, mesmo a distância, me sinto parte
Agradeço a cada um de vocês por não esquecer de mim, pois essa minha participação – no
que me fizeram enxergar além da conclusão desta pesquisa, mesmo diante de todas as
dificuldades. Ao longo desses quatro anos (e alguns longos meses), vocês foram casa e
acolhimento nos momentos de insegurança; família e conforto nas etapas vencidas. É muito
gratificante notar que os nomes de vocês estavam nesta mesma seção alguns anos atrás. Pra
mim, isso significa que, apesar de trilharmos nossos próprios caminhos, seguimos juntas!
Toda gratidão também a Sílvia, que não somente cedeu seus dados para esta pesquisa, como
alertaram para o real sentido do perfeito. Menos como impecável e mais como finalizado! A
tranquilidade dessa reflexão tornou qualquer tarefa possível, até mesmo iniciar uma nova
Como não podia deixar de ser, reservo este espaço para agradecer a Nossa Senhora,
que é só presença na minha vida! Esta fé tão minha e que tanto me ajuda a conciliar meus
sonhos. Deu-me confiança necessária para enfrentar tantos fins e tantos (re)começos. Nem
sempre foi fácil entender teus recados, mas a Ti, toda minha gratidão! Finalizo com a melhor
definição de Mario Sérgio Cortella: a palavra “projeto” significa “aquilo que você lança
adiante”. Projetar é, por definição, jogar algo para o futuro. Nas próximas seções está tudo
que investi para o amanhã e estou me preparando para buscar. Aos que me leem com a
empatia de já quem já projetou mais à frente seus próprios sonhos, meu muito obrigada!
vi
Sumário
9.1 Objetivos..........................................................................................................................................71
9.2 Método ............................................................................................................................................71
9.2.1 Participantes...............................................................................................................................71
9.2.2 Instrumentos ..............................................................................................................................72
9.2.3 Procedimentos de coleta de dados ............................................................................................73
9.2.4 Procedimentos de análise de dados ...........................................................................................73
9.3 Resultados .......................................................................................................................................74
9.4 Discussão .........................................................................................................................................99
9.5 Considerações .............................................................................................................................. 104
10. Estudo 2: Desempenho em medidas de memória operacional verbal e visoespacial em
diferentes níveis de inteligência ............................................................................................................. 106
10.1 Modelos de memória operacional ............................................................................................... 107
10.2 Memória operacional e inteligência fluida .................................................................................. 111
10.3 Memória e níveis de inteligência ................................................................................................. 113
10.3.1 Deficiência Intelectual e MO ................................................................................................... 114
10.3.2 Altas habilidades e MO ........................................................................................................... 116
10.4 Objetivos....................................................................................................................................... 119
10.5 Método ......................................................................................................................................... 119
10.6 Resultados .................................................................................................................................... 122
10.7 Discussão ...................................................................................................................................... 131
10.8 Considerações .............................................................................................................................. 135
11. Considerações finais ..................................................................................................................... 138
Referências.............................................................................................................................................. 141
APÊNDICES .............................................................................................................................................. 155
ANEXOS ................................................................................................................................................... 160
viii
Lista de Figuras
Figura 1. Modelo revisado de estrutura do intelecto proposta por Guilford (1988) ................. 12
Figura 2. Representação gráfica da concepção de superdotação dos Três Anéis de Renzulli .. 26
Figura 3. Sequência geral do desenvolvimento das FE ............................................................... 40
Figura 4. Exemplo de estímulos incompletos do teste Pensando Criativamente com Figuras
(PCF) ............................................................................................................................................. 56
Figura 5. Esquema ilustrado das fases do FDT ............................................................................ 59
Figura 6. Fluxograma de coleta de dados dos Estudos 1 e 2 ...................................................... 64
Figura 7. Quantidade média de palavras evocadas e desvio-padrão por grupo no RAVLT ....... 80
Figura 8. Reprodução da tarefa de cópia e memória da Figura Complexa de Rey por
participantes do grupo de estudo ............................................................................................... 78
Figura 9. Distribuição percentual dos participantes quanto à classificação dos resultados no
Índice Criativo Figural 1 (PCF)...................................................................................................... 84
Figura 10. Distribuição percentual dos participantes quanto à classificação dos resultados no
Índice Criativo Figural 2 (PCF)...................................................................................................... 85
Figura 11. Gráficos de dispersão dos percentis de características criativas em razão da
inteligência ................................................................................................................................... 91
Figura 12. Representação dos desenhos do grupo de estudo (GE) –perspectiva incomum ..... 94
Figura 13. Representação dos desenhos nas características extensão de limites e títulos
expressivos................................................................................................................................... 95
Figura 14. Gráfico de tendência da relação entre o índice global de criatividade figural e o
percentil no Matrizes................................................................................................................... 98
Figura 15. Modelo revisado dos múltiplos componentes da memória operacional proposto
por Baddeley (2000) .................................................................................................................. 111
Figura 16. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa na tarefa Blocos de Corsi
(ordem direta e inversa) ............................................................................................................ 125
Figura 17. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa na tarefa FAM (categorias
Semântica e Fonológica)............................................................................................................ 126
Figura 18. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa no escore ponderado do
subteste Dígitos ......................................................................................................................... 127
ix
Lista de Tabelas
Tabela 20. Desempenho dos grupos de pesquisa nas medidas de MO avaliadas ................... 124
Tabela 21. Coeficientes de regressão e dados estatísticos para cada medida incluída no
modelo de regressão linear simples ......................................................................................... 128
Tabela 22. Coeficientes de correlação simples de Spearman entre as medidas de MO ......... 130
xi
Resumo
Apesar da ausência de consenso acerca da definição das AH/SD, os principais teóricos da área
concordam que não se trata de um conceito unitário, mas de um fenômeno multifacetado a
ser inferido a partir de uma constelação de traços ou características. Esta pesquisa adota o
modelo triádico de Renzulli (1986, 2004), que concebe as AH/SD na interação de três fatores:
habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e a criatividade. Pesquisas recentes
apontam as funções executivas (FE) como importantes preditoras do sucesso escolar, com
maior impacto na aprendizagem do que o QI, o nível de leitura ou o raciocínio matemático.
Nesse sentido, a proposta desta tese justifica-se pela necessidade de compreensão avançada
dos processos psicológicos superiores e da capacidade intelectual em populações específicas,
incluindo nessa equação medidas de produção criativa. Esta pesquisa vincula-se ao Programa
Talento Metrópole (IMD/UFRN), cujo objetivo é oferecer a jovens identificados como
talentosos, formação e desenvolvimento de seus potenciais. Objetivos Diante do exposto,
este projeto objetiva investigar as relações entre FE, criatividade e alto potencial intelectual.
Especificamente, se propõe a avaliar o nível de criatividade figural dos grupos; verificar
hipóteses de diferenciação do desempenho da amostra após determinado patamar de
inteligência; e verificar o poder preditivo da inteligência nos domínios investigados.
Pretendeu-se atingir os objetivos citados através de dois estudos transversais: Estudo 1) O
valor preditivo do alto potencial intelectivo nas FE e na criatividade figural (estudo
correlacional) e Estudo 2) Desempenho em medidas de memória operacional verbal e
visoespacial em diferentes níveis de inteligência (pesquisa exploratória). Método A amostra
final é composta por jovens, com idade entre 12 e 23 anos, divididos em três grupos
intelectualmente distintos, a saber: GC) grupo controle formado por jovens com inteligência
média (percentil maior que 25 e inferior a 75); GE) grupo de estudo formado por jovens com
inteligência superior (percentil igual ou superior a 95 no teste das Matrizes Progressivas de
Raven) e GAH) grupo formado por jovens com o perfil de AH/SD. Resultados No que diz
respeito ao Estudo 1, concluiu-se que o grupo com inteligência acima da média tem
desempenho superior na maioria das medidas avaliadas. Na avaliação da criatividade figural,
os grupos diferem em aptidões específicas relacionadas aos fatores 1 e 3 de criatividade
(enriquecimento de ideias e preparação criativa). Os resultados provenientes do Estudo 2
confirmam a participação da inteligência em tarefas de memória operacional, sugerindo
pesos diferenciados entre os subsistemas. Resultados da ANOVA confirmam o melhor ajuste
do modelo com preditores. Identificou-se alta correlação entre medidas de inteligência e o
desempenho em tarefas de maior demanda executiva, corroborando modelos hierárquicos
de organização dessas FE. Foram constatadas correlações positivas e moderadas entre todos
os subcomponentes de memória operacional. Considerações Por fim, conclui-se que a
medida de inteligência adotada prevê as características criativas com maior significância
estatística e magnitude do que as medidas de funcionamento executivo. Em um contexto de
inteligência muito acima da média, a flexibilidade apresenta relação com a capacidade
criativa, notadamente no que se referem às características de perspectiva incomum e
elaboração.
Abstract
Despite the lack of consensus on the definition of giftedness, the main theorists agree that it
is not a unitary concept, but a multifaceted phenomenon to be inferred from a constellation
of traits or characteristics. This research adopts Renzulli's triadic model (1986, 2004), which
conceives gifted behaviors in the interaction of three factors: above average ability, task
involvement and creativity. Recent research points out executive functions (EF)) as important
predictor of school success, with greater impact on learning than IQ, reading level or
mathematical reasoning. In this sense, such a proposal is justified by the need for advanced
understanding of higher psychological processes and intellectual capacity in specific
populations, including in this equation creative production measures. This research is linked
to Talento Metrópole Program (IMD/UFRN), whose objective is to offer young people
identified as talented, training and development of their potential. Purpose statements In this
sense, this project aims to investigate the relationships between EF, creativity and high
intellectual potential. Specifically, it proposes to evaluate the level of figural creativity of the
groups; to verify hypotheses of differentiation of the performance of the sample after a
determined level of intelligence; and verify the predictive power of intelligence in the
domains investigated. The predictive value of high intellectual potential in EF and figural
creativity (correlational study) and Study 2) Performance in verbal and visuospatial working
memory measures at different levels of intelligence (exploratory research). Method The final
sample is composed of adolescents and young adults, aged between 12 and 23 years, divided
into three groups intellectually distinct, namely: CG) control group formed by youngsters with
average intelligence (percentile greater than 25 and inferior to 75); GE) study group formed
by youngsters with superior intelligence (percentile equal or superior to 95 in the Raven
Progressive Matrices test) and GAH) group formed by young people with the AH / SD profile.
Results Concerning Study 1, it was concluded that the group with above-average intelligence
performs better in most of the measures evaluated. In the evaluation of figural creativity, the
groups differ in specific aptitudes related to factors 1 and 3 of creativity (enrichment of ideas
and creative preparation). The results from Study 2 confirm the participation of intelligence in
working memory tasks, suggesting differentiated weights between subsystems. ANOVA
results confirm the best fit of the model with predictors. A high correlation between
intelligence measures and performance in tasks of higher executive demand was identified,
corroborating hierarchical organizational models of these FEs. Positive and moderate
correlations were found among all subcomponents of working memory. Considerations
Ultimately, it is concluded that the intelligence measure adopted provides the creative
characteristics with greater statistical significance and magnitude than the executive
functioning measures. In a context of above-average intelligence, flexibility is related to
creative ability, especially in terms of unusual perspective and elaboration.
Don’t be afraid to fall in love with something and pursue it with intensity.
Know, understand, take pride in practice, develop, exploit, and enjoy your greatest strengths.
Learn to free yourself from the expectations of others
and to walk away from the games they impose on you.
Free yourself to play your own game.
Find a great teacher or mentor who will help you.
Don’t waste energy trying to be well-rounded.
Do what you love and can do well.
Learn the skills of interdependence.
*
Manifesto escrito por Torrance após mais de 40 anos de estudos sobre criatividade.
Torrance o escreveu como uma advertência para retenção e o desenvolvimento do talento na infância.
3
1. Considerações iniciais
Ao longo da história – e, sem dúvida, mesmo antes dos registros – as pessoas sempre
intelectual.
Apesar disso, ainda hoje o estudo e a pesquisa científica em altas habilidades e talento
traços ou características. A definição atual de AH/SD considera que esta pode se dar em
2007).
população e quais critérios utilizam para a sua identificação. Nesse sentido, as taxas de
prevalência são tidas como arbitrárias, uma vez que podem refletir a adoção de critérios mais
Estudos e Pesquisas (Inep) indicava 2.982 alunos com AH/SD no Brasil (Brasil, 2007). Desde
2009, as sinopses estatísticas disponíveis não informam o tipo de necessidade especial dos
alunos atendidos, tornando complexa a tarefa de elaborar políticas públicas abrangentes com
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 3,5 e 5% da população escolar são
alunos que apresentam características de AH/SD. Entretanto, para esse índice foram
estatísticas tendem a ser bem mais expressivas, abarcando uma porcentagem de 15 a 30% da
de 2001 (Brasil, 2011), bem como garantir o acesso a medidas de apoio individualizadas e
Embora se observem avanços nos estudos da educação especial no contexto das altas
No âmbito das AH/SD constata-se que o ensino tradicional falha, na maioria das vezes,
por tornar-se desinteressante, uma vez que tende a ignorar o papel ativo do aluno no
Como resultado, o Brasil termina por desperdiçar os seus talentos, sem que haja programas
metacognitivas) que contribuam para o sucesso profissional, uma vez que a presença de altas
produção criativa figural em seu enfoque, e ainda por explorar as possíveis relações entre
atendimento das necessidades educacionais especiais, conforme previsto pela Lei Nacional
Albert Einstein
com tradição histórica que remete aos estudos de Galton (1822; 1911), Binet e Simon (1857;
ambiente. Atualmente, grande parte dos pesquisadores da área concorda com a definição
e quais seriam estes. Apesar disso, há um relativo consenso de que as habilidades cognitivas,
correlacionam positivamente umas com as outras. Essa variância positiva de correlações (do
fracasso escolar das crianças francesas. Consta que esse trabalho foi uma solicitação do
crianças. O instrumento criado testava habilidades verbais e lógicas e deu origem ao primeiro
8
Nesse modelo, a inteligência é concebida como uma capacidade inata, geral e passível
de ser testada. Permite aos indivíduos um desempenho maior ou menor em qualquer área da
atuação humana, e deve refletir esse desempenho em termos de escores dos testes
(Davidson & Downing, 2000). Essa concepção é um importante marco para o estudo da
das habilidades cognitivas. A teoria bifatorial postulada por Spearman (1927), no início do
século XX, afirma que o desempenho em qualquer medida estaria relacionado ao nível de
inteligência geral (ou fator “g”) seria determinado biologicamente e concebido como uma
fonte comum de diferenças individuais, subjacente a todas as aptidões mentais (Sternberg &
Sternberg, 2016).
Assim, toda atividade mental envolveria, em maior ou menor grau, uma única
atividades mentais. Por sua vez, os fatores específicos (fatores “s”) estariam relacionados às
educáveis (Colom, Abad, Quiroga, Shih, & Flores-Mendoza, 2008; Colom et al., 2004, Stauffer
et al., 1996).
9
internas); e c) edução de correlatos (capacidade de criar novas ideias a partir de uma ideia
e/ou uma relação). Os testes que avaliam o fator “g” comumente se centram nos processos
Por esta razão, esse fator é melhor avaliado por atividades que envolvam raciocínio indutivo e
dedutivo, e não por avaliação de funções cognitivas especificas (Almeida, 2002; Primi, 2003).
fator geral é uma estrutura simplista para definir inteligência (Davidson & Downing, 2000).
de aptidões primárias, diversas quanto à origem e independentes entre si. Esses fatores
compreensão verbal (V); a fluência verbal (W); a aptidão numérica (N); a aptidão espacial (S),
fator “g” da teoria bifatorial de Spearman, Raymond Cattel (1987) propôs uma organização
utilizadas pelo indivíduo em tarefas novas que não podem ser executadas de forma
10
abstratos e realização de inferências (Primi, 2002; Schelini, 2006). Por outro lado, a
problemas cotidianos, sendo conhecida como inteligência social (Horn, 1985; Primi, 2003).
maioria das tarefas escolares, a Gc não pode ser entendida como sinônimo de desempenho
declarativo de fatos, ideias e conceitos baseados na linguagem e raciocínio. Daí decorre o fato
Por ser mais determinada pelos aspectos genéticos, a inteligência cristalizada é mais
sensível às alterações orgânicas, como lesões cerebrais. Provavelmente por estar relacionada
2006).
Ainda sobre as teorias hierárquicas é importante mencionar a Teoria dos Três Estratos
ordem (especializações das capacidades) e de terceira ordem (inteligência geral) (ver Anexo
A). Entre os fatores do primeiro estrato (ou camada) estão 69 habilidades cognitivas e fatores
de velocidade, que indicam a rapidez com que um individuo realiza uma tarefa e sua
acrescentou dez capacidades ao sistema Gf-Gc proposto por Cattell, dando origem a uma
nova estrutura (Anexo B). Este modelo integra as concepções desenvolvidas por Raymond
Cattell, John Horn e John Carroll e é considerado uma evolução da concepção bifatorial de
inteligência (Keith & Reynolds, 2010; Primi, 2003). Devido à semelhança da teoria dos estratos
e do sistema Gf-Gc, foi proposta uma integração dos modelos, que resultou no modelo
três níveis, que segue uma ordem de especialização, variando de uma dimensão geral para
dimensões específicas. No nível mais baixo (Nível I) estão 70 fatores específicos, por sua vez
organizam diversas habilidades específicas, reunidas em um fator geral (Nível III). Atualmente,
2003).
12
Guilford (Structure-of-Intellect - SOI) (Guilford, 1956, 1988). Assim como os demais modelos,
este também concebe a inteligência como formada por várias aptidões. A inovação da
conteúdos, produtos e operações (Figura 1), produz cinco tipos de operações mentais, cinco
tipos de conteúdos e seis tipos de produtos, e resulta em 150 aptidões (ou componentes)
visual
auditivo CONTEÚDOS
simbólico
semântico
comportamental
unidades
classes
PRODUTOS
relações
sistemas
transformações
implicações
avaliações
OPERAÇÕES
produção convergente
produção divergente
memória
cognição
também introduz a noção de inteligência social que, por vezes, reaparece como questão
importante no universo das habilidades cognitivas (Hamdan & Pereira, 2002; Renzulli, 2016).
(1983). Na contramão dos conceitos de inteligência como uma capacidade inata, geral e
com desenvolvimento típico e com perfil de AH/SD. Além disso, baseou-se em estudos de
caso e evidências médicas de lesões cerebrais que não ocasionaram prejuízo na produção
A partir desses achados, Gardner (1983, 1999) propôs incluir um conjunto amplo e
tais competências têm suas origens e limites genéticos próprios, bem como substratos
neuroanatômicos específicos.
criar produtos que sejam valorizados culturalmente. Em suas palavras, a inteligência é como
De acordo com a Teoria das Inteligências Múltiplas (Gardner 1983, 1999), não existem
habilidades intelectuais gerais, mas sistemas simbólicos específicos abreviados em oito tipos
naturalista (Int.N).
sons, ritmos e significados das palavras, além da percepção das diferentes funções da
habilidade para resolver problemas ou criar produtos através do uso de parte ou de todo o
corpo; a musical pode ser definida pela habilidade de para discriminar sons, ritmos, texturas e
A teoria ainda propõe dois tipos de inteligência pessoal (Gardner, 1983): a interpessoal
próprios, para formular uma imagem precisa de si e usar esta imagem para funcionar de
forma efetiva). Alguns anos mais tarde, Gardner (1999) acrescentou ao modelo a inteligência
naturalista, idealizada como a habilidade para reconhecer flora, fauna e fenômenos naturais;
cada uma das inteligências e combinações diferentes das mesmas. Esse destaque para a
No que se refere à superdotação, Gardner (1995) faz um uso disjuntivo de sua teoria
portanto, um dos critérios para relacionar o desempenho excepcional com uma inteligência
Gardner (1995) ilustra essa conclusão com alguns casos notórios de excelência, como
críticos a esta teoria argumentam que, embora cada um desses indivíduos tenha se destacado
em uma inteligência particular, ainda assim haveria um equilíbrio nos níveis das várias
inteligências.
parte, para o isolamento desta teoria dentre as consolidadas teorias fatorais de inteligência,
analítica, de analisar e avaliar as próprias ideias e as dos outros; o potencial criativo para
gerar uma ou mais ideias novas e de alta qualidade e a capacidade prática de convencer as
Anos após a publicação de sua teoria, o autor pondera que os indivíduos superdotados
raramente são um caso puro de qualquer um desses padrões de atributos, e por isso a análise
tripartite de seu modelo seria limitada para explicar essa população (Sternberg, 2000). Desse
modo, propõe uma expansão do modelo, com a premissa de que estes padrões não são fixos,
nem indissociáveis.
de inteligência (analítica, criativa ou prática), mas possui pontos fortes e fracos através dos
podem estar na interseção entre os padrões, e estes últimos podem mudar com o tempo.
aproximam.
conseguinte, elas não são certas ou erradas, apenas são mais ou menos úteis. Tendo isso em
da área, publicada em 1997 pela revista Intelligence. Segundo essa declaração, a inteligência
17
“é uma capacidade mental muito geral que, entre outras coisas, implica a habilidade para
Assim definida, a capacidade intelectual pode ser avaliada em termos mais precisos e
saber como as neurociências (Flores-Mendoza & Saraiva, 2018). Entretanto, menos êxito tem-
caminho. Essa ausência de consenso teórico é definida por Miller (2012) como um estado de
uma análise geral das definições de AH/SD revela algumas posições teóricas antagônicas e até
excludentes. De modo geral, alguns conceitos são mais restritivos e outros mais liberais em
especiais, determinando o grau de excelência que é preciso atingir para ser considerado
é superdotado ou não, já que o talento individual existe como um dom (do inglês “gifted”,
(1985).
uma média - por exemplo: idade, produção ou série escolar (Brasil, 1995). As Diretrizes Gerais
19
mesmo quando acompanhados da expressão altas habilidades, é fato que eles fazem parte da
genialidade.
extraordinário, seja musical, literário ou nas artes plásticas. Sobre esse mito da genialidade,
Fleith (2006) destaca o denominador comum das diversas conotações do termo: a presença
que diferem de seus pares; e c) indicam pessoas com produção ou desempenho superior à
média.
lado da mudança. Assim é o panorama atual das teorias e concepções que embasam os
Não obstante, cabe ressaltar que os modelos e abordagens tradicionais são úteis em
contextos específicos e têm muito a oferecer à medida que os estudiosos da área se movem,
Área/domínio específico
Áreas de talento Todos os domínios cognitivos (competências intelectuais
variáveis)
Testes de aptidão e avaliação Avaliação contínua, inclusão de
Estratégias de
da inteligência medidas comportamentais e de
identificação
(QI como padrão-ouro) criatividade
Diferenciação em sala de aula
Estratégias Programas específicos
regular, aceleração e
educacionais destinados a esta população
enriquecimento curricular
Foco nas necessidades
Foco nas necessidades acadêmicas, intelectuais,
Estratégias de
acadêmicas e intelectuais emocionais e sociais
intervenção
(domínio de conteúdo) (desenvolvimento do pensamento
crítico e criativo)
conceitos, procedimentos e atitudes (Brasil, 2001, Art. 5º, III). Propõe que as pessoas com
AH/SD devem apresentar notável desempenho e/ou elevada potencialidade em qualquer dos
excepcional de observação;
demais;
historicamente reconhecido por transpor a tradicional ênfase acadêmica das AH/SD. Para
desenvolvimento.
identificação dos diferentes padrões nas AH/SD. Outro questionamento diz respeito à forma
2 Em 1972, o Departamento de Saúde, Educação e Bem-Estar dos EUA elaborou o Relatório Marland,
encomendado pelo Congresso daquele país. O documento é considerado um importante marco histórico do
início da educação para superdotados e apresenta uma das primeiras definições multidimensionais de altas
habilidades/superdotação.
23
da área que as pessoas com AH/SD formam um grupo pouco homogêneo, diversificado em
suas habilidades cognitivas e emocionais. Assim como outros grupos de crianças e adultos,
Renzulli, 2009).
entre ideias e pontos de vistas; interesse por livros e outras fontes de conhecimento;
resolver problemas.
Os atributos comuns citados são expressos das mais variadas formas, e por isso não
o potencial.
potenciais que não estão sendo suficientemente desenvolvidos ou desafiados pelo ensino
Segundo Renzulli e Gaesser (2015), não há uma maneira perfeita para identificar
alunos com alto potencial, uma vez que existem muitos caminhos possíveis para definir e
questão.
partida para investigação de habilidades intelectuais superiores. Por essa razão, permanece
um fator relevante a ser avaliado por fornecer informações essenciais, especialmente quando
cruzado com outras variáveis (Fernández, García, Arias-Gundín, Vázquez, & Rodríguez, 2017;
Isto de deve por seu caráter operacional, útil para educadores e demais profissionais, e
comprovável em termos de resultados de pesquisa (Busse & Mansfield, 1980; Virgolim, 2014).
intersecção de três círculos (ou anéis), por isso sua teoria foi batizada “The Three-Ring
Conception of Giftedness” (Figura 2). Segundo esse modelo, altos níveis de produtividade
somente podem ocorrer quando são exercidas sobre um domínio de interesse e na interação
com outros fatores, a saber: habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e a
utilizado para descrever potencial superior em determinada área, que pode apresentar-se de
forma geral ou específica. Em sua forma geral, a habilidade superior consiste em traços que
abstrato, memorização, fluência verbal, raciocínio numérico e espacial. Estas habilidades são
aptidões ainda mais restritas e expressas em situações de vida real - compor músicas,
escrever partituras, reger uma orquestra. De modo geral, estas habilidades são avaliadas por
relacionadas com artes e ciências humanas aplicadas devem ser avaliadas por observadores
qualificados, experts na área para analisar e atestar a qualidade superior das produções.
Esse segundo grupo de fatores refere-se aos traços não intelectivos das AH/SD
(Renzulli, 2016). O envolvimento com a tarefa pode ser definido como altos níveis de
tempo.
atividades, as quais realiza de forma inovadora (Renzulli, 2016). Embora esse grupo de
gerais, elas constituem um componente importante da superdotação e, por isso, devem ser
c. Criatividade
assumir riscos.
Na representação gráfica do modelo dos Três Anéis, na área de intersecção dos anéis
autor utiliza o termo superdotado como adjetivo, ao invés de um perfil cognitivo ou uma
forma de ser5. Cabe salientar ainda que, no trabalho original de Renzulli (1986), o diagrama
está disposto em um fundo do tipo pied-de-poule. Esse padrão visual representa os fatores
Porém, nem sempre a criança apresenta este conjunto de traços desenvolvidos igualmente.
Mas, se lhe forem dadas oportunidades, poderá desenvolver amplamente todo o seu
Segundo o autor, a representação dinâmica dos fatores foi planejada para transmitir a
todos os três grupamentos, mas serem identificados como capazes de desenvolver essas
enriquecimento curricular, pelo menos um destes traços deve estar presente, em um nível
determinados momentos e sob certas circunstâncias (Renzulli, 1986). Nesse sentido, Renzulli
(1978, p. 261) define as crianças superdotadas e talentosas como “aquelas que possuem ou
tarefas que mensuram o coeficiente de inteligência (QI) ou testes que avaliam aptidões
habilidades criativas ou práticas, e por esta razão, os participantes que atingem altos escores
promovem esse tipo de superdotação são aquelas voltadas para a investigação e aplicação do
conhecimento. Devido a essa natureza pragmática, essa superdotação tem caráter temporal e
tipos são importantes e, com frequência, há uma interação entre eles. Ainda assim, há certa
6Renzulli ainda emprega outros sinônimos para designar esse tipo de superdotação, como “test-taking ability” e
“lesson-learning ability”. Em tradução livre, habilidade de responder a testes e habilidade de ensino-
aprendizagem, respectivamente.
31
Por sua vez, jovens com AH/SD de perfil criativo-produtivo têm processos de
(Renzulli & Reis, 2010). Com base na diversidade e idiossincrasias de cada perfil, Renzulli e
seus colaboradores (Renzulli & Reis, 2010) criaram o programa de enriquecimento curricular
nível. Uma justificativa apontada para essa variabilidade no perfil cognitivo das AH/SD foi
elucidada por Spearman (1927) em sua “lei dos retornos decrescentes” (no inglês, referida
como “Spearman's law of diminishing returns”). Segundo o autor, haveria uma diminuição na
implicaria numa relação inversa entre altos escores de QI e baixas correlações entre
Apesar da limitação do modelo dos Três Anéis para explicar a superdotação associada
excepcionalidade7, optou-se por adotá-lo nesta pesquisa pelos seguintes argumentos: (a) seu
AH/SD; (c) pela ênfase na criatividade como um componente essencial do modelo, através do
7Termo derivado do inglês “twice exceptional” e utilizado para designar a coexistência de distúrbios ou
deficiências na pessoa com AH/SD.
32
proposta, que permite a disseminação dos resultados desta pesquisa através de um diálogo
Outro modelo que utiliza três componentes para explicar o perfil de AH/SD é proposto
por Sternberg (2000). De acordo com a Teoria Triárquica de Inteligência, a superdotação está
imaginar, criar, inventar algo. Já a inteligência prática, como o nome sugere, está relacionada
é a que os conceitos teóricos de inteligência são inadequados. Nas palavras do autor, “as
noções de inteligência são, na melhor das hipóteses, incompletas e, na pior das hipóteses,
erradas” (Sternberg, 2000, p.4). Por conseguinte, sugere que os critérios de identificação,
fortes em todos esses aspectos. Em vez disso, eles reconhecem suas forças e compensam
33
suas fraquezas, a fim de se adaptar, moldar e selecionar ambientes do mundo real. Segundo
(Differentiated Model of Giftedness and Talent - DMGT), Françoys Gagné (1985) defende a
naturais excepcionais (ou aptidões), pelo menos em um domínio, em um grau que situa o
indivíduo entre os 10% superiores em comparação com seus pares; e talento para identificar
e o conhecimento de, pelo menos, uma área de atividade humana que situe o indivíduo entre
do matemático pode ser revelado pela rapidez e facilidade com que ele resolve problemas
matemáticos. Já o pintor talentoso será julgado pela qualidade de suas obras. A superdotação
Orientado por essas duas definições, o autor classifica as seis categorias mencionadas
Deve-se notar que a distinção sugerida entre superdotação e talento vai além do
contraste entre os perfis; também implica uma distinção entre habilidades inatas e adquiridas
inteligência e outras habilidades. Na concepção de Gagné (1985, 2005), alguém pode ser
dotado sem, necessariamente, ser talentoso (como no caso dos superdotados com baixo
Essa visão está em contraste com a de Sternberg (1998), que argumentou que todas
talentoso e seu poder explicativo em relação ao desempenho observado, optou-se nesta tese
por não utilizar os termos competência e desempenho como sinônimos. Bem como, será
Dado o reconhecimento da importância das funções executivas (FE) para uma vida
8 Sobre esse aspecto, Gagné (2005) sugere uma solução para o impasse da ausência dos underachievers no
modelo de Renzulli. De acordo com o DMGT, esses alunos são superdotados intelectualmente, mas não
talentosos academicamente.
35
cognitiva (Best & Miller, 2011; Diamond, 2016; Miyake et al., 2000). Alguns autores sugerem
ordem, como o raciocínio lógico, a resolução de problemas e o planejamento (Best & Miller,
2011; Davidson, Amso, Anderson, & Diamond, 2006; Flores-Lázaro & Ostrosky-Shejet, 2012;
adaptativo da espécie humana (Fuentes, Malloy-Diniz, Camargo, & Cosenza, 2008). Por sua
ocorre nos casos de lesão ou disfunção que compromete os lobos frontais (Goldberg, 2002).
& McBride-Chang, 2011; Clark, Pritchard, & Woodward, 2010; Pham & Hasson, 2014).
& Alloway, 2010; Alloway & Elsworth, 2012; Christopher et al., 2012; Clark et al., 2010); e até
maturação dos lobos frontais, mas da emergência gradual de outras capacidades cognitivas,
Alexander, 2000).
iniciando-se por volta dos 12 meses de vida e atingindo seu ápice de maturação neurológica
no início da vida adulta (Papazian, Alfonso & Luzondo, 2006). Davidson e colaboradores
(2006) consideram que esse ápice é alcançado quando o indivíduo é capaz de: (a) armazenar
resistindo a impulsos, e (c) agir de forma rápida e flexível, adaptando-se às situações. Tais
A memória operacional (MO) é a habilidade cognitiva por meio da qual uma pessoa
longo prazo (Fuentes et al., 2008; Lezak, Howieson, & Loring, 2004). Atualmente, o modelo
9A interconectividade única dos lobos frontais permite a coordenação e integração de todas as outras estruturas
cerebrais. Nesse sentido, apesar do papel privilegiado do córtex pré-frontal (CPF) na mediação das FE, é mais
apropriado afirmar que tais funções possuem um sistema neural distribuído, resultado da atividade de
diferentes circuitos (Pires, 2010).
37
Estudo 2.
Jiménez-Miramonte, 2014).
problema. Como consequência, alterações nesta habilidade são expressas por um padrão de
novas respostas ou alternativas mais eficientes e flexíveis para resolver os problemas. Essa
habilidade para alterar o curso das ações ou dos pensamentos de acordo com as exigências
comparadas àquelas que dependem de estruturas neocorticais frontais, como o córtex pré-
desenvolvimento. Em geral, essa progressão não é linear, mas ocorre em distintos períodos
invertido - ∩) (Natale, 2007; Tonietto, Wagner, Trentini, Sperb, & Parente, 2011).
sequencial, especialmente durante a infância e adolescência (Anderson, 2002; Best & Miller,
2011; Diamond, 2002). Habilidades mais simples, como a requerida em uma atividade de
& Ostrosky-Shejet, 2012), parecem ter cursos desenvolvimentais mais curtos e precoces, se
fatorial de Miyake et al. (2000). Esse modelo discute a “unidade e a diversidade” das FE,
identificada por um fator geral e fatores específicos correlacionados entre si, sob os quais se
Ainda sobre a organização processual das FE, cabe apresentar o modelo hierárquico
diferenciação entre funções frontais (FF) e funções executivas (FE), classificadas em quatro
níveis, em ordem crescente de complexidade: nível 1 (funções frontais mais básicas, como
temporais nas trajetórias de desenvolvimento das funções frontais e executivas podem ser
(adolescência-juventude).
pensamento, para analisar os aspectos não visíveis das situações, objetos e informações. Dito
o Geração de
categorias
4
abstratas
o Compreensão
de sentido
figurado
o Fluência verbal
o Planejamento
sequencial
3
o Flexibilidade
visoespacial
o MO visoespacial
sequencial
o MO visoespacial
2 o Controle
inibitório
o Manutenção da
identidade
o Detecção de
1 seleções de
risco
Já a fluência é definida por Fuentes et al. (2008) como a capacidade de emitir uma
desenvolvimental dessas funções ao longo de uma ampla faixa etária, discutidas à luz de
desenvolvimento atípico.
Já no âmbito das AH/SD poucas são as pesquisas que incluem a avaliação dos
componentes centrais das funções executivas, ou ainda que utilizam uma investigação
no âmbito exploratório adotado nesta pesquisa, pode trazer contribuições relevantes não
somente para a compreensão da organização cognitiva nesse perfil, mas também para o
jovens com AH/SD não tem despertado o mesmo interesse dos pesquisadores brasileiros
42
estejam formalmente inclusos nas políticas públicas de educação especial (Brasil, 2001).
6. Criatividade
como habilidades do século XXI (Partnership for 21st Century Skills, 2013). Capacidades como
achados sugerem a revisão de modelos teóricos dos construtos, bem como a ampliação dos
uma criação humana provocadora de algo novo, seja por reflexos de algum objeto do mundo
exterior, de construções do cérebro ou dos sentimentos. Isso significa que a criatividade está
organizadas na relação do indivíduo com o meio social em que está inserido e, portanto,
Historicamente, a criatividade tem sido estudada sob os mais variados enfoques. Essa
suas características e avaliação das realizações de pessoas criativas); da pessoa criativa (suas
A inteligência, por sua vez, tem sido cada vez mais estudada por modelos fatorais,
teoria Cattell-Horn-Carroll (CHC) é amplamente aceita como definição mais abrangente, que
44
criatividade em realizações notáveis, como uma habilidade universal que pode ser
pensamento divergente10.
(Torrance, 1965, 1972, 1990), um grande estudioso da educação para as AH/SD. Torrance
habilidades/superdotação.
10 Capacidade de ver as coisas de maneiras diferentes e imaginativas, através de alternativas pouco usuais (do
inglês “divergent-thinking ability”).
45
que se refere às realizações criativas (Renzulli & Gaesser, 2015). Considerando que a
avaliação da criatividade por meio de figuras ou imagens é de extrema valia para todos
aqueles que buscam identificar e estimular o potencial criativo (Nakano & Wechsler, 2006).
Nesse ponto de vista, a avaliação da criatividade figural é uma estratégia válida para
(1966) constatou características comuns nas produções figurais destas pessoas quando
crianças. Observou ainda que certos traços de personalidade também eram semelhantes em
criativas (Kaufman et al., 2012; Wechsler, Nunes, Schelini, Ferreira, & Pereira, 2010).
criatividade (Torrance & Ball, 1990). Estas novas características correspondem a: expressão
46
Uma medida mais completa para avaliação da criatividade pode ser obtida a partir da
composição das características, tendo-se assim o Índice Criativo I (composto por Fluência,
considerados as medidas mais completas para se avaliar a criatividade verbal e figural, com
traduções e validações para mais de 33 países (Kaufman et al., 2012; Kim, Cramond, &
Uma versão brasileira dos Testes de Pensamento Criativo de Torrance foi desenvolvida
e validada por Nakano & Wechsler (2006). Porém, ainda são escassos os estudos brasileiros
Ferreira & Pereira, 2010). Isto posto, espera-se que os dados oriundos desta pesquisa
inteligência acima da média se relaciona com diferentes componentes das FE e como a alta
7. Objetivos
altas habilidades/superdotação.
8. Método
Diversos conceitos são utilizados para definir quem é a pessoa com AH/SD.
delineados dois estudos transversais independentes, mas que dialogam entre si:
na criatividade figural”
8.2 Participantes
participantes do grupo controle (GC) de ambos os estudos são estudantes dos cursos técnicos
Grande do Norte (UFRN), cujas ações integram a inclusão social e digital de jovens do ensino
básico até a pós-graduação. Foram pareados nas variáveis sexo e média de idade, de modo a
minimizar vieses no comparativo entre grupos. Para critério de inclusão neste grupo, foram
Subgrupos de pesquisa
Estudo 1
Grupo Controle (GC) (n=50) Grupo de Estudo (GE) (n=50)
(n=100)
Grupo altas Grupo déficit
Estudo 2
Grupo Controle (GC) (n=10) habilidades (GAH) intelectivo (GDI)
(n=30)
(n=10) (n=10)
(n=10), são alunos das turmas inaugurais do Programa Talento Metrópole11 (IMD 2015-2016),
11O Instituto Metrópole Digital (IMD) tem como meta fomentar a criação de um polo tecnológico no Estado,
abrangendo iniciativas do setor público, privado e acadêmico. Para tanto, fundou o Programa Talento Metrópole
50
(1986, 2004), cujo objetivo é integrar medidas de inteligência, capacidade cognitiva, aspectos
Natal – RN, recrutados através de chamada pública e encaminhados por escolas, faculdades,
Secretaria Estadual de Educação do Estado, bem como das melhores colocações nas
aos adotados nesta pesquisa. Para composição deste grupo, foram selecionados do banco de
dados apenas os sujeitos com deficiência intelectual idiopática, não associada à outras
alterações congênitas.
para se referir aos participantes com desempenho intelectual superior na comparação com
seus pares de mesma idade cronológica (Estudo 1). No Estudo 2, adotou-se a expressão
AH/SD para referir-se aos participantes que se enquadram no perfil, segundo o modelo
triádico adotado.
voltado para o desenvolvimento de talentos e enriquecimento de altas habilidades no domínio da TI. Para
compor o programa, os participantes são avaliados ao longo de um curso de inverno, com duração média de
uma semana. Neste período, são submetidos a avaliação dividida nas seguintes etapas: a) avaliação da
inteligência e do funcionamento executivo; b) avaliação de competências específicas relacionadas à TI; e c)
avaliação de fatores co-cognitivos e comportamentais, notadamente motivação e criatividade. Após essa
prospecção, são selecionados os alunos que atendem aos seguintes critérios: cursar os dois últimos anos do
Ensino Fundamental II (8o e 9o anos), o Ensino Médio ou os dois primeiros anos da graduação; ter percentil igual
ou superior a 95 no Teste das Matrizes Progressivas de Raven e rendimento acima de 90% em instrumento de
seleção das habilidades e competências em TI .
51
8.3 Instrumentos
protocolo utilizado pelo programa Talento Metrópole, cujo intuito é traçar um perfil cognitivo
dos avaliados. Por essa razão, além dos domínios de inteligência, criatividade e funções
dispostos em um tabuleiro
Teste de Aprendizagem
6 – 92
Auditivo-Verbal de Rey Repetir lista de palavras 40 min
anos
(RAVLT)
Memorizar uma série de
Memória
Teste Pictórico de estímulos figurais
17 a 92
Memória apresentados em uma cena 5 min*
anos
(TEPIC-M) (elementos pictóricos e
verbais)
*aplicação coletiva
conjunto de testes não verbais, que estão disponíveis em três versões: a Escala Geral
(Standard Progressive Matrices - SPM), designada para avaliar faixa etária acima dos 13 anos;
O teste foi elaborado tendo como base o referencial da teoria bifatorial de Charles
Spearman e tem como objetivo avaliar o que o autor define como capacidade intelectual
compreensões, de ir além do que é dado para perceber o que não é imediatamente óbvio, de
problemas divididos em cinco séries (A, B, C, D e E), sendo 12 problemas cada série. A
53
apresentados itens mais fáceis que introduzem um novo tipo de raciocínio, que será exigido
99, cujo valor médio é o percentil 50. O valor do percentil revela a posição do indivíduo em
relação aos elementos do grupo onde está inserido, assim como auxilia na identificação de
b. Teste de Criatividade Figural Infantil (TCFI) e Pensando Criativamente com Figuras (PCF)
Ambos os instrumentos são compostos por três atividades, sendo a primeira tarefa a
atividade deve-se fazer o maior número de desenhos a partir do mesmo estímulo repetido 30
vezes (linhas paralelas), de forma que o instrumento permite ao sujeito a elaboração de até
sendo 5 minutos destinados à resposta da Atividade 1, 10 minutos para cada uma das demais
atividades e o tempo restante para exposição. No caso de aplicação com adolescentes, pode-
se permitir o uso de caneta, desde que salientado as vantagens do uso do lápis e borracha por
escore total e os escores parciais de cada fator são convertidos em resultados padronizados e
avaliação de estudantes com idades entre 6 e 16 anos (Nakano, Wechsler, & Primi, 2011). O
características criativas, apontadas pelo modelo multidimensional Torrance & Ball (1990). São
Tabela 4 abaixo.
O teste Pensando Criativamente com Figuras (PCF), por sua vez, é a versão brasileira
do teste figural de Torrance, desenvolvida para avaliar uma faixa etária abrangente de jovens
e adultos de nível educacional Médio e Superior (a partir dos 14 anos). De modo equivalente
ao TCFI, avalia as mesmas características do pensamento criativo (Figura 4), com adição de
junção ou síntese de estímulos para formar uma única resposta (desenho coerente). Segundo
Wechsler (2004), respostas com combinações são bastante raras e indicam alta criatividade.
56
(PCF)
Atv. 1 Atv. 2
Atv. 3
Título
neuropsicológico para avaliar memória episódica declarativa. De maneira geral, o teste avalia
Para esta pesquisa, foi utilizada a versão em língua brasileira mais recente do
instrumento (Paula & Malloy-Diniz, 2018). Essa versão consiste na apresentação de duas listas
de 15 substantivos (Lista A e B). A primeira etapa da avaliação consiste na leitura das palavras
da Lista A por cinco vezes consecutivas (Listas A1 a A5), cada tentativa é seguida por um teste
substantivos diferentes (Lista de interferência - B), seguida da evocação desta última (B1).
Ao término dessa etapa, é solicitada a recordação das palavras da Lista A, sem que ela
seja reapresentada (A6). Após um intervalo de 20 minutos, que deve ser preenchido com
atividades que não demandem raciocínio verbal, pede-se ao sujeito que se recorde as
palavras da Lista A (A7 – recordação tardia) sem que a lista seja lida novamente. A última
etapa do RAVLT consiste no reconhecimento das palavras da Lista A, entre outros distratores
As Figuras Complexas de Rey são amplamente utilizadas para avaliar memória visual,
geral, analisa o modo como o indivíduo apreende os dados perceptivos que lhe são
com idade entre 5 e 88 anos e a forma “B” pode ser utilizada na avaliação de pré-escolares. O
teste é composto por uma figura geométrica complexa e abstrata (sem significação evidente),
paciente reproduza a cópia da figura, em uma folha branca na posição horizontal. Em seguida,
o avaliando deverá reproduzir de memória a figura copiada. O intervalo entre essas duas
partes do processo de aplicação não deve exceder 3 minutos. A figura da Forma A é composta
por 18 itens, os quais juntos formam o todo da figura, sendo pontuada de 0 a 36 pontos, que
O Teste dos Cinco Dígitos (Five Digits Test – FDT) é um instrumento utilizado para
sobre números e quantidades. É destinado para a faixa etária dos 6 aos 92 anos de idade e o
atenção alternada.
correspondem exatamente a seus valores. Nesta fase, o indivíduo deve reconhecer e nomear
indivíduo deve executar ações controladas e conscientes, como inibir a leitura dos números
apresentados e dizer quantos números existe em cada estímulo, apresentados dessa vez de
forma incongruente (quando o sujeito encontra 2-2-2, deve dizer “três”, ou quando encontra
Por fim, na fase de Alternância, um de cada cinco grupos de dígitos é delimitado por
uma borda mais grossa (último retângulo da Figura 4). Nesta etapa, dentre os 50 quadrados
60
estímulos, dez se diferenciam por apresentar uma borda escura e adicionar uma nova
condição ao teste: nestes estímulos o indivíduo deverá reverter a regra, ao invés de contar a
A pontuação no teste calcula o tempo total gasto, em segundos, para finalizar cada
etapa e os erros não autocorrigidos pelo examinando. O instrumento ainda prevê duas
recuperar uma informação num curto espaço de tempo, ou seja, a memória visual da pessoa
por meio de estímulos figurais, em um curto período de tempo. O teste é composto por um
cartão contendo vários desenhos e detalhes os quais o sujeito deve observar e memorizar. As
figuras são apresentadas em três categorias (céu, terra e água). Após o período de
memorização (1 minuto), o sujeito deve registrar todos os itens e detalhes que conseguir
recordar, no tempo limite. A aplicação pode ser individual ou coletiva, com tempo total de 3
minutos. Para a avaliação é atribuído um ponto para cada item lembrado, após a somatória,
deve-se consultar a tabela de percentil mais adequada. A correção é realizada pelo total de
acertos.
61
designa a capacidade de produzir discurso fluente (Lezak et al., 2004). Apesar de consistir em
uma função essencialmente linguística, suas medidas vêm sendo largamente desenvolvidas e
Nesse sentido, o FAM é considerado uma medida de avaliação das FE, uma vez que
et al., 2016).
número de palavras numa categoria semântica específica. Para esta pesquisa, foi
substantivos com as letras iniciais “F”, “A” e “M”. As crianças foram testadas individualmente
da seguinte forma: para fluência fonológica, foi requerida a evocação do maior número de
palavras iniciando-se com as letras fornecidas (F, A e M), dentro do período de 60 segundos,
seguindo algumas restrições como: derivações de uma mesma palavra (mesmo radical,
participantes são pontuadas a partir do número de palavras corretas produzidas para cada
uma das seis tarefas, seguindo os critérios de correção elaborados por Charchat-Fichman,
série de dígitos, para que o examinando os repita na mesma ordem em que são lidos pelo
examinador (ordem direta) e em ordem contrária (ordem inversa). Tanto na ordem direta
quanto na inversa, a aplicação é suspensa após o fracasso nas duas tentativas do mesmo
item, sem tempo limite. (Wechsler, 2013). A tarefa é composta por oito séries para ordem
direta e sete para ordem inversa, havendo um aumento gradual da quantidade de dígitos em
cada série. A ordem direta é aplicada em primeiro lugar, seguida pela inversa, que é
Com base no modelo ampliado de Baddeley (2000), embora as duas tarefas do subteste
solicitada na ordem inversa apresenta maior grau de complexidade, estando, portanto, mais
i. Blocos de Corsi
no decorrer da aplicação. Após essa tarefa, é solicitado que o sujeito indique os estímulos na
ordem contrária à da que o examinador apontou (ordem inversa). As duas sequências iniciais
são compostas dois blocos e as duas últimas sequências são compostas por nove blocos. A
aplicação é interrompida com dois erros consecutivos na mesma sequência (span) (Pagulayan
et al., 2006).
avaliação destes resultados, foram selecionados os candidatos que atenderam aos critérios de
Matrizes) e para o grupo de estudo do primeiro estudo (percentis maiores ou iguais a 95).
Com os grupos definidos, prosseguiu-se a avaliação dos demais domínios, em duas fases: uma
sessão coletiva de avaliação com os instrumentos que possuem normas para este tipo de
AVALIAÇÃO INICIAL
(aplicação coletiva Matrizes)
(n=276)
ESTUDO 1 ESTUDO 1
Grupo de Estudo (GE) Grupo Controle (GC)
(n=50) (n=50)*
ESTUDO 2
GC GAH
(n=10) (n=10)
GDI**
(n=10)
estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). Foi adotado p<0,05 como nível de
estatística descritiva e inferencial, para avaliar o desempenho dos grupos nos instrumentos
descritos anteriormente.
Student. Para avaliar o poder preditivo da inteligência nas tarefas que compõem o protocolo
preditivo de melhor ajuste foi determinado a partir de análises fatoriais exploratórias. Para
verificar o efeito isolado e de interação das variáveis independentes pesquisadas (sexo, idade,
MANOVA), e posteriores testes post-hoc para identificar quais pares de médias diferiam
significativamente.
formação e desenvolvimento de seus potenciais (Hazin et al., 2015). Por esta razão, possui
anuência institucional para sua execução, que obedeceu às regras do Conselho Nacional de
mas relacionados à temática central de pesquisa e orientados ao objetivo geral desta tese.
São eles:
na criatividade figural”
Nas seções a seguir cada estudo mencionado será apresentado de forma detalhada.
67
criatividade figural
o Artigo (em preparo): “The predictive value of executive functions and creativity in average
entanto, ainda não há consenso de como esses construtos estão relacionados. Nesse longo
poderia ser esperada uma alta relação entre ambos (Kim, 2005; Runco, 2004).
central do perfil (Gagné, 1985; Kaufman, Plucker, & Russell, 2012; Renzulli, 1978; Sternberg,
2000). Pesquisas empíricas recentes sugerem a existência de uma relação entre criatividade e
inteligência, mas a magnitude dessa relação, ainda é bastante discutida (Guignard et al.,
2016; Karwowski et al., 2016; Luria, O’Brien, & Kaufman, 2016; Silvia, 2015).
Teoricamente, podem ser identificados três modelos que tentam explicar essa relação.
abstrações também são aptos a gerar novas ideias e explorá-las (Sternberg, 2001). O segundo
outras palavras, seria possível uma pessoa ser altamente inteligente sem indicativo de
criatividade e, pelo mesmo raciocínio, a criatividade poderia existir sem necessariamente uma
alta capacidade de raciocínio. Se não é preciso ser altamente inteligente para ser criativo e
68
No terceiro modelo, por sua vez, estão os estudos que consideram o nível de
teoria, a relação entre inteligência e criatividade existe somente a partir de um certo limiar de
(Jauk, Benedek, Dunst, & Neubauer, 2013; Preckel, Holling, & Wiese, 2006). Para alguns
teóricos, este limite é bem delimitado e estaria próximo de um QI de 120 (Guilford, 1967;
além desse limiar tornam-se menos importantes. Por essa razão, alguns autores consideram
que a inteligência é uma pré-condição necessária, mas não suficiente, para a criatividade
(necessary condition hypothesis) (Guilford, 1956; Jauk et al., 2013; Karwowski et al., 2016). Ou
ainda, como sugerido anos atrás por Schubert (1973, p. 46), “o que entendemos por
inteligência e o que entendemos por criatividade tende a se tornar mais similar à medida que
De acordo com Virgolim (2005), nem sempre a pessoa mais inteligente é aquela que
apresenta as respostas mais originais, da mesma forma que nem sempre a pessoa mais
criativa é a mais inteligente entre seus pares. Sabemos também que as habilidades
necessárias para se resolver problemas de forma lógica e analítica nem sempre são as
na área (Best & Miller, 2011). Por isso, esforços adicionais a nível conceptual são necessários
Dentre os variados modelos processuais que explicam a atuação das FE, a presente
consequências futuras. Segundo Dias, Menezes, & Seabra (2010), estas habilidades são
variáveis latentes correlacionadas em múltiplas tarefas de avaliação das FE. Essas variáveis
conclusão, os autores sugerem que, embora ligados por processos subjacentes comuns, as FE
Pesquisadores como Huizinga, Dolan e van der Molen (2006) e testaram o modelo de
infância, adolescência e início da idade adulta. Por essa razão, esse modelo multidimensional
Não obstante, modelos desenvolvimentais das FE, como o proposto por Flores-Lázaro
modelo tridimensional adotado nesta pesquisa é mais adequado para amostras a partir de 12
anos de idade.
Arendasy, & Neubauer, 2014; Royall & Palmer, 2014); sendo construtos sobrepostos, qual a
magnitude dessa relação? todas as funções executivas contribuem igualmente para o perfil
de AH/SD? (Friedman et al., 2006; Miyake et al., 2000a); há diferenciação nos perfis de
9.1 Objetivos
Com base no exposto, esse estudo objetiva avaliar em que medida componentes das
não verbal e se essa relação difere em dois grupos intelectualmente distintos. Pretende-se
(Guignard et al., 2016; Jauk et al., 2013; Karwowski et al., 2016) e a hipótese de unidade vs.
diversidade das funções executivas (Friedman & Miyake, 2017; Miyake et al., 2000b) como
preditoras de inteligência.
9.2 Método
9.2.1 Participantes
Foram avaliados 276 sujeitos no Teste das Matrizes Progressivas de Raven (Escala
Geral), dentre os quais 126 cumpriram os critérios de inclusão à amostra com base na
intepretação da escala de percentil do teste (PC≥ 25-75 e PC≥ 95). Nas etapas seguintes de
participantes não concluíram todos os instrumentos propostos, e por esta razão foram
A amostra final é composta por jovens de ambos os sexos, com idade entre 12 e 23
anos, divididos em dois grupos pareados por sexo e média de idade (n=50, por grupo), a
saber: GE) grupo de estudo formado por jovens com inteligência superior (percentil igual ou
superior a 95 no teste das Matrizes Progressivas de Raven) e GC) grupo controle formado por
72
jovens com inteligência média (percentil maior que 25 e inferior a 75). Com base nos critérios
da amostra inicial.
9.2.2 Instrumentos
Domínios
Instrumentos Habilidades-alvo
investigados
Capacidade
Teste das Matrizes Inteligência não verbal
intelectual
Progressivas (Escala Geral) (raciocínio edutivo)
(Triagem)
Visoespacialidade, visoconstrução e
Figura Complexa de Rey
planejamento
Teste de Aprendizagem
Memória verbal
Auditivo-Verbal de Rey
(curva de aprendizagem)
Memória (RAVLT)
Teste Pictórico de Memória
Memória visual de curto prazo
(TEPIC-M)
percentil do teste das Matrizes Progressivas de Raven. Nesta etapa, os candidatos foram
aplicação. Após a avaliação destes resultados, os candidatos que atenderam aos critérios de
heterocedasticidade visível. A diferença entre os grupos foi avaliada pelo teste t de student
desempenho dos grupos nos diferentes instrumentos foi avaliada através do coeficiente de
correlação de Pearson (r). Trata-se de índice com valores situados ente -1,0 e 1.0 que varia
desde a correlação perfeita (positiva ou negativa) entre duas variáveis quantitativas até a
total independência entre elas. Foi adotado como critério para interpretação dos coeficientes
de correlação: 0 a 0,20 (nula); 0,20 a 0,40 (baixa); 0,40 a 0,60 (moderada); 0,60 a 0,80 (alta) e
empregadas para verificar o efeito isolado e de interação das variáveis. Para avaliar o
de limiar de diferenciação foi avaliada pela correlação positiva significativa abaixo de dado
percentil dos participantes no teste das Matrizes Progressivas de Raven e uma correlação
minimizar erros de medição, as medidas de criatividade para faixa etária abaixo de 16 anos e
amostra (somatório dos escores totais padronizados em ambos os testes: TCFI Escore total +
9.3 Resultados
Smirnov e Shapiro-Wilk (ver Anexo E). As médias e desvio-padrão dos participantes do estudo
nas medidas de avaliação adotadas, foram agrupadas por subgrupo de pesquisa, sexo, faixa
sujeitos da amostra está na faixa etária que compreende a adolescência, segundo os limites
medidas de avaliação das funções executivas e da criatividade, como pode ser visualizado na
Tabela 7:
Estudo 1
GE GC
MEDIDAS p
(n=50) (n=50)
Min. Máx. Média DP Min. Máx. Média DP
Corsi
Ordem direta 6 15 9,66 2,361 4 13 8,62 1,926 0,018**
Ordem inversa 5 12 9,10 1,632 3 12 7,94 2,325 0,005**
Escore total 12 27 18,84 3,389 9 23 16,76 3,508 0,003**
Dígitos
Ordem direta 7 16 10,52 2,435 5 16 10,06 2,839 0,529
Ordem inversa 4 14 7,66 2,246 2 13 6,60 2,356 0,023*
Escore total 12 30 18,22 4,225 7 26 16,22 4,391 0,022*
FAM
Semântica 17 53 36,06 8,343 18 41 30,86 5,911 0,001**
Fonológica 15 49 34,88 7,417 10 58 32,22 10,914 0,158
Escore total 14 97 70,58 14,211 37 93 63,08 14,571 0,011**
TEPIC-M
Escore bruto 4 23 14,50 4,639 6 28 16,14 4,815 0,086
Escore total (PC) 5 90 31,40 25,834 5 100 41,16 29,968 0,084
RAVLT
Escore total (Lista A) 34 70 53,04 8,449 27 64 47,78 8,664 0,003*
Escore total (PC) 5 95 65,20 28,589 5 95 47,50 27,926 0,002*
F. Complexa de Rey
Escore bruto (cópia) 16 38 34,21 3,643 17,5 37 31,86 4,434 0,005*
76
significativamente superior nas três medidas (ordem direta, inversa e escore total). No
(p=0,003). Mesmo em termos de escore bruto, é válido ressaltar que a média do GE na ordem
inversa é superior à média do grupo controle na ordem direta. No entanto, devido a ausência
de dados normativos brasileiros que englobem toda a faixa etária do estudo, estes resultados
Com relação à tarefa Dígitos, os dois grupos possuem desempenho similar na ordem
escore bruto total na tarefa, que também se revelou estatisticamente superior para o grupo
de alto potencial intelectual (p= 0,022). Segundo dados da literatura, espera-se que adultos
com inteligência média sejam capazes de reter pelo menos cinco dígitos na ordem direta e
significativa (p=0,001) a favor do GE. Foi identificada alta dispersão em torno da média nos
escores brutos desta tarefa. Apesar dessa alta variabilidade no desempenho dos grupos, a
soma das palavras evocadas nas duas fases é significativamente superior no GE, média de 7
77
Visual (TEPIC-M). De modo geral, este teste apresentou resultados altamente dispersos em
torno da média, mas as análises de escores mínimos e máximos indicam que o grupo de
estatisticamente significativa (p>0,05). Cabe salientar ainda, que de acordo com os dados
normativos do teste para população geral, por faixa etária e escolaridade, os dois grupos
superior ao grupo controle (GC). Essa diferença a favor do grupo de estudo é estatisticamente
resultados (em percentil) do grupo de estudo corresponde à classificação média superior (PC=
Cópia Memória
diferença entre os grupos (GE e GC) em ambos os escores finais, com destaque para a
diferença significativa no escore total de acertos ajustado por idade (p=0,002): percentil
médio de 65,20 média para o grupo de estudo e de 47,50 para o grupo controle. Na Tabela 8,
grupos no RAVLT
GE GC
MEDIDAS DO RAVLT (n=50) (n=50) p
m DP m DP
A1 6,64 2,174 5,98 1,932 0,112
A2 9,70 2,525 7,68 2,343 0,000**
A3 11,22 2,252 10,42 2,711 0,112
A4 12,52 1,898 11,36 2,371 0,008*
A5 12,96 1,737 12,34 2,219 0,123
B1 6,24 1,954 5,92 1,805 0,397
A6 10,70 2,621 9,76 2,918 0,093
A7 10,74 2,448 9,96 2,733 0,136
Escore total 53,04 8,449 47,78 8,664 0,003*
Velocidade de esquecimento 1,02 0,162 1,06 0,340 0,391
Interferência proativa 1,02 0,436 1,05 0,417 0,770
Interferência retroativa 0,82 0,155 0,80 0,198 0,485
Teste de Student para amostras independentes (t)
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
DP (desvio-padrão); p= valor da significância.
refere aos índices de interferência proativa e retroativa, o resultado dos grupos é bastante
nova leitura da lista (A5> A1). Isto posto, é interessante observar que os grupos possuem
curva de aprendizagem crescente, mas ligeiramente paralelas (Figura 7). Essa diferença é
Média (GE)
15 Média (GC)
13 *
RAVLT (Qtd. de palavras evocadas)
11
**
9
1
A1 A2 A3 A4 A5 B1 A6 A7
No que concerne aos resultados dos grupos nas medidas de avaliação direta das
funções executivas, observa-se que no Teste dos Cinco Dígitos (FDT) a diferença entre os
verifica-se desempenho similar entre os grupos, com variações de poucos segundos nas fases.
Ainda assim, há diferença significativa a favor do grupo de estudo (GE) nas últimas duas fases
Tabela 9. Análises descritivas e comparativo entre os grupos no Teste dos Cinco Dígitos (FDT)
GE GC
MEDIDAS p
(n=29) (n=43)
DO FDT
Min. Máx. Média DP PC Min. Máx. Média DP PC
1
Tempos
Leitura 14s 31s 22,14s 4,249s 51,21 13s 35s 22,51s 4,778s 40,35 0,135
Contagem 19s 34s 25,24s 3,888s 54,83 15s 35s 24,81s 4,360s 50,35 0,531
Escolha 25s 48s 35,69s 5,727s 63,45 22s 60s 38,58s 8,956s 42,56 0,005*
Alternância 31s 106s 44,45s 13,308s 64,31 32s 92s 46,63s 14,485s 50,09 0,046*
Escores
Inibição 4 32 13,55 6,544 68,62 -1 95 18,21 13,871 41,63 0,001**
Flexibilidade 7 79 23,00 12,708 65,34 11 95 26,88 15,300 53,77 0,075
figural foi mensurada por dois instrumentos relativamente idênticos quanto às características
Criativamente com Figuras (PCF) e o Teste Criativo Figural Infantil (TCFI). A investigação da
relação entre inteligência e criatividade partiu das análises de correlação entre as médias
percentis dos dois grupos no teste das Matrizes Progressivas de Raven e os escores globais e
consideradas fracas (r=.197 a .358) e variam bastante nos dois instrumentos. Na faixa etária
divergente (índice Criativo Figural 1), e mais expressiva para o Índice Criativo Figural 2, que
corresponde ao escore total do teste, dado pela soma de todas as pontuações parciais nas
Tabela 10. Já no comparativo entre os adultos jovens da amostra nos escores globais de
criatividade no PCF, foram constatadas diferenças significativas nos dois índices criativos
Matrizes
0,292* 0,358** 0,197 0,486** -0,007 0,535** -0,206
(PC)
Teste de correlação de Pearson (r)
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Nota: PC (percentil); 1Todos os escores estão em médias percentis. Foi adotado como critério para
interpretação dos coeficientes de correlação: 0 a 0,20 (nula); 0,20 a 0,40 (baixa); 0,40 a 0,60 (moderada);
0,60 a 0,80 (alta) e 0,80 a 1,00 (muito alta). Em destaque, os coeficientes estatisticamente significativos de
maior magnitude (r≥ 40), correspondentes ao Fator 1 (enriquecimento de ideias) e 3 (preparação criativa) do
TCFI.
83
controle, tanto na média geral quanto no resultado padronizado do Índice Criativo Figural 1
(p= 0,002), representado pela soma das quatro características cognitivas de criatividade
Tabela 11. Análises descritivas dos grupos nos índices e escores totais no teste Pensando
GE GC
MEDIDAS DO PCF (n=31) (n=32) p
Média DP RA* PC Média DP RA* PC
Índices
Criativo Figural 1 87,45 16,786 94,84 45,00 66,16 29,586 86,44 25,97 0,002*
Criativo Figural 2 135,35 23,688 102,39 61,00 97,59 43,787 89,75 35,13 0,000**
Teste de Student de amostras independentes (t).
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Nota. DP (desvio-padrão); RA = resultado padronizado; p= valor da significância.
interpretação dos resultados do PCF, cabe salientar que nenhum participante da amostra (GE
e GC), com mais de 16 anos, obteve percentil igual ou superior a 98, resultado requerido para
participantes quanto a classificação dos resultados no Índice Criativo Figural 1, de acordo com
90% 84,4% GE GC
80%
PCF (índice Criativo Figural 1)
70%
60%
50% 46,9%
43,8%
40%
30%
20% 15,6%
10% 6,3%
3,1%
0,0% 0,0%
0%
Inferior Abaixo da média Média Acima da média
classificação média do índice (84,4%). Os participantes do grupo de estudo, por sua vez,
concentram-se nas classificações abaixo da média (15,6%) e média (46,9%). Nesse índice
grupo de estudo (GC) como irregular, uma vez que há concentração de respondentes ao
longo de toda a escala, inclusive nos extremos de desempenho inferior (6,3%) e acima da
média (3,1%).
Figura 10. Distribuição percentual dos participantes quanto à classificação dos resultados no
80%
70%
60%
53,1%
50%
40,6%
40%
30%
20%
9,4%
10%
3,1% 3,1% 3,1%
0,0%
0%
Inferior Abaixo da média Média Acima da média
favor do grupo de estudo (<16 anos) em quatro das treze características criativas investigadas
(Tabela 12), a saber: elaboração; movimento; perspectiva incomum; perspectiva interna e uso
(DP= 12,966), estatisticamente superior à média do grupo controle (23,88 pontos, p>0,001;
DP=14,66). No critério movimento, o grupo de estudo teve média de 4,87 pontos (DP= 2,907),
e o grupo controle de 2,59 pontos (DP= 2,601). A maior diferença entre os grupos foi
gráfica em ângulos não usuais (ex.: visão aérea, tridimensional, de perfil, etc.).
86
Neste aspecto, o grupo de estudo obteve média percentil de 95,58, resultado acima
da média (PC= 85-97), de acordo com a classificação indicada nas tabelas normativas do
entre os grupos quanto ao uso de contexto nas produções, como pode ser visualizado na
Tabela 12.
Tabela 12. Análises descritivas das características criativas dos grupos no teste Pensando
MEDIDAS DO GE GC
PCF (n=31) (n=32) p
Min. Máx. Média DP PC Min. Máx. Média DP PC
Fluência 7 32 18,97 5,135 53,71 3 39 17,47 9,147 46,09 0,312
Flexibilidade 5 23 15,45 4,048 52,35 3 28 13,44 6,206 42,09 0,170
Elaboração 19 63 41,23 12,966 39,26 1 56 23,88 14,66 14,66 0,000**
Originalidade 5 21 11,81 3,877 73,23 2 24 11,31 5,474 69,25 0,575
Emotividade 0 12 2,45 2,631 64,77 0 9 1,75 1,984 54,50 0,147
Fantasia 0 11 2,35 2,470 87,29 0 4 1,53 1,391 86,28 0,772
Movimento 0 11 4,87 2,907 87,03 0 9 2,59 2,601 73,66 0,014*
Pers. incomum 1 15 8,81 3,081 95,58 0 14 4,44 3,301 67,50 0,000**
Pers. Interna 0 6 2,26 1,788 66,29 0 9 1,59 1,998 52,97 0,049*
Uso de contexto 0 7 2,71 2,132 55,42 0 4 0,88 1,212 38,22 0,002*
Combinações 0 1 0,03 0,180 91,81 0 3 0,31 0,896 92,25 0,495
Ext. de limites 0 13 7,00 2,781 64,39 0 28 6,31 6,388 50,63 0,059
Tít. expressivos 5 39 17,74 8,382 72,58 0 28 11,78 7,906 55,66 0,011
Teste de Student de amostras independentes (t) - igualdade das médias percentis.
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Nota. DP (desvio-padrão); p= valor da significância.
Foi realizada uma análise comparativa do desempenho médio dos grupos nas
por Wechsler (2004). Esta amostra foi composta por 128 indivíduos, com idade entre 18 e 75
anos, reconhecidos por suas produções criativas (em artes gráficas, literatura, educação,
87
esporte, ciências, etc.), aferidas por prêmios e distinções recebidas em nível internacional,
nacional, local e estadual (neste caso, cidades do interior de São Paulo). Mesmo critério
utilizado por Torrance e colaboradores (Torrance & Wu, 1981), nos estudos longitudinais
13).
Criativos GE GC
MEDIDAS DO PCF (Wechsler, 2004) (n=31) (n=32)
Média DP Média DP Média DP
1. Fluência 19,59 8,42 18,97 5,135 17,47 9,147
2. Flexibilidade 15,95 6,28 15,45 4,048 13,44 6,206
3. Elaboração 61,98 33,63 41,23 12,966 23,88 14,66
4. Originalidade 10,59 5,05 11,81 3,877 11,31 5,474
5. Emotividade 2,46 2,04 2,45 2,631 1,75 1,984
6. Fantasia 0,58 0,93 2,35 2,470 1,53 1,391
7. Movimento 2,03 1,93 4,87 2,907 2,59 2,601
8. Perspectiva incomum 4,22 3,11 8,81 3,081 4,44 3,301
9. Perspectiva interna 2,02 1,72 2,26 1,788 1,59 1,998
10. Uso de contexto 2,10 2,38 2,71 2,132 0,88 1,212
11. Combinações 0,42 1,49 0,03 0,180 0,31 0,896
12. Ext. de limites 6,97 4,32 7,00 2,781 6,31 6,388
13. Títulos expressivos 19,75 10,34 17,74 8,382 11,78 7,906
Índice Criativo Figural 1 108,12 44,83 87,45 16,786 66,16 29,586
Índice Criativo Figural 2 148,66 56,65 135,35 23,688 97,59 43,787
Nota. DP (desvio-padrão); as setas indicam desempenho superior ou inferior, em relação ao grupo comparativo
de alta criatividade (coluna cinza); setas azuis ( ) destacam as diferenças mais expressivas.
88
Wechsler (2004). Deve-se considerar a diferença etária de ambos os estudos, ainda assim é
Figural Infantil (TCFI), foi constatada diferença significativa a favor do grupo de estudo (GE)
superior no Fator 2 (PC> 81). Este resultado é um ponto de força em comum entre GE e GC,
faixa etária.
Tabela 14. Análises descritivas dos grupos nos fatores e escore total no TCFI
GE GC
MEDIDAS (n=19) (n=18) p
DO TCFI
Média DP RA1 PC Média DP RA PC
Fator 1 55,05 17,093 102,84 54,79 42,22 18,444 90,11 33,39 0,035*
Fator 2 16,21 10,581 121,47 84,37 16,83 8,773 121,00 85,89 0,847
Fator 3 11,53 5,461 113,74 73,26 6,50 4,985 96,06 41,56 0,006*
Fator 4 54,79 18,621 105,89 59,26 59,44 21,219 110,39 68,72 0,482
Escore total 135,05 35,863 109,89 68,11 125,00 33,979 105,00 59,78 0,388
Teste de Student de amostras independentes (t).
*. A correlação é significativa no nível 0,05.
Nota. DP (desvio-padrão); PC (percentil); RA (resultado padronizado); p= valor da significância.
89
executivas e criatividade estão apresentadas nas Tabelas 15 e 16. De modo geral, identificam-
se correlações positivas fracas ou moderadas na maioria dos subtestes, com destaque para
Criatividade e FE
perspectiva incomum (r=.29; p<0,05), perspectiva interna (r=.27; p<0,05) e extensão de limites
(r=.33; p<0,05).
força de correlação moderada entre tarefas que avaliam as mesmas habilidades executivas a
partir de estímulos diferentes. Por exemplo, na correlação significativa entre o escore bruto
no Dígitos (ordem inversa) e o escore de fluência verbal semântica (r=.47; p<0,001), medidas
consideram as FE não como uma função unitária específica e sim um conjunto de habilidades
distintas, mas interligadas. É o caso de correlações significativas, altas e muito altas, entre
incomuns.
12 Deve-se alertar que algumas variáveis são derivadas e, por isso, relativamente redundantes, como é o caso de
fluência e flexibilidade. Isto porque, nos testes de criatividade utilizados a fluência é a primeira característica a
ser pontuada, e determina se o desenho foi elaborado a partir do estímulo incompleto (regra de partida). A
flexibilidade, por sua vez, é igual ao número de ideias diferentes realizadas pelo indivíduo. Ou seja, uma variável
pontua o número de desenhos válidos, e a outra calcula a quantidade de ideias distintas do total de desenhos.
Por esta razão, pode-se afirmar que uma parcela da magnitude dessas correlações é justificada pela própria
natureza de pontuação do teste.
91
identificou-se alta correlação entre: fluência e extensão de limites (r=.78; p<0,001) e fluência
e originalidade (r=.71; p<0,001). Apesar de serem dados válidos do ponto de vista conceitual,
é natural que as medidas do teste de Torrance não sejam totalmente independentes devido
às altas correlações entre elas, tendo sido mais comum encontrar na literatura descrições
que indica paralelismo, como pode ser analisado no comparativo da Figura 11.
Tabela 15. Matriz de correlação das medidas de inteligência, funções executivas e memória
Medidas 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21
1. Matrizes (EB) —
2. Matrizes (PC) .98** —
3. Corsi (OD) .32** .28** —
4. Corsi (OI) .30** .30** .42** —
5. Corsi (Total) .36** .33** .80** .78** —
6. TEPIC-M (EB) -.29 -.10 .12 .04 .02 —
7. RAVLT (Soma) .25** .25** .11 .01 .10 .16 —
8. Dígitos (OD) .02 .04 -.00 .10 .10 .15 .05 —
9. Dígitos (OI) .24* .23* .28** .11 .23* .11 .17 .55** —
10. Dígitos (EB) .17 .17 .10 .13 .16 .11 .15 .85** .77** —
11. Rey (cópia PC) .30** .32* .13 .22* .20* .10 .04 .06 .20 .10 —
12. Rey (memória PC) .28** .30** .17 .10 .16 .03 .03 .03 .16 .05 .42** —
13. FAM (semântica) .33** .30** .35** .25* .34** .25* .12 .25* .42** .38** .07 .15 —
14. FAM (fonológica) .15 .12 .35** .17 .28** .24** .30** .13 .23* .21* .20* .15 .34* —
15. FAM (Soma) .27* .23* .42** .23** .35** .26* .25** .22* .36** .33** .17 .18 .72** .85** —
16. FDT (Leitura PC) .20 .20 .22 .08 .14 .01 .10 .12 .21 .18 -.04 -.05 .20 .05 .14 —
17. FDT (Cont. PC) .10 .10 .29* .17 .21 -.02 -.01 .22 .15 .21 -.05 -.02 .16 .12 .12 .71** —
18. FDT (Escolha PC) .43** .42** .18 .24* .20 .02 .02 .21 .15 .22 -.06 .06 .30** .06 .16 .47** .65** —
19. FDT (Altern. PC) .30** .29** .20 .08 .17 .15 .12 .20 .13 .20 .00 .07 .25* .17 .22 .36** .52** .72** —
20. FDT (Inibição PC.) .47** .46** .11 .15 .14 .11 -.00 .17 .10 .18 -.10 .22 .29* .05 .13 .03 .30* .80** .57** —
21. FDT (Flexib. PC) .30** .30** .20 .15 .20 .15 .15 .14 .10 .15 .01 .11 .21 .12 .12 .12 .32** .60** .86** .62** —
Teste de correlação de Pearson (r)
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Legenda: PC (percentil); OD (ordem direta); OI (ordem indireta); EB (escore bruto).
Nota. Foi adotado como critério para interpretação dos coeficientes de correlação: 0 a 0,20 (nula); 0,20 a 0,40 (baixa); 0,40 a 0,60 (moderada); 0,60 a 0,80 (alta) e 0,80 a 1,00
(muito alta). Em destaque, os coeficientes estatisticamente significativos de maior magnitude entre medidas/tarefas distintas (r≥ 40).
93
Tabela 16. Matriz de correlação das principais medidas de FE e características de criatividade (PCF > 16 anos)
Medidas 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21
1. Matrizes (PC) —
2. Corsi (OI) .33** —
3. Dígitos (OI) .18 .18 —
4. FAM (Semântica) .30** .25* .47** —
5. FDT (Inibição PC) .48** .15 .05 .35** —
6. FDT (Flexib. PC) .33** .13 .06 .27* .61** —
7. RAVLT (Soma PC) .30** .11 .17 .18 .05 .17 —
8. Rey (memória PC) .24* .10 .13 .14 .21 .12 .06 —
9. PCF (Fluência PC) .03 -.12 .05 .20 .23 .18 .23 .02 —
10. PCF (Flexib. PC) .06 -.14 .14 .30* .10 .11 .28* -.04 .84** —
11. PCF (Elab. PC) .46** .28* .18 .34** .30* .25 .08 .25 .25* .25* —
12. PCF (Origin. PC) -.04 -.13 .12 .18 .22 .13 .14 .10 .71** .63** .22 —
13. PCF (Emot. PC) .14 .34** .14 .27* .03 .08 -.16 .10 .10 .04 .36** .09 —
14. PCF (Fantasia PC) -.01 .05 .18 .10 -.01 -.07 .19 .22 .30* .20 .03 .33** .08 —
15. PCF (Movim. PC) .22 .22 .12 .23 .21 .03 .27* .17 .29* .26* .41** .27* .25* .26* —
16. PCF (P. incom. PC) .48** .15 .18 .31* .40** .29* .26* .30* .60** .57** .42** .50** .13 .24 .39** —
17. PCF (P. inter. PC) .29* .14 .11 .26* .09 .27* .05 .03 .35** .30* .25* .29* .31* .19 .30* .37** —
18. PCF (U. cont. PC) .36** .30* -.05 .16 .14 .25 .34** .24 .16 .13 .52** .04 .16 .02 .55** .22 .12 —
19. PCF (Combin. PC) -.05 .15 -.08 .03 .18 .07 -.24 .05 -.13 .35** -.01 -.16 .02 -.20 -.04 -.18 .04 -.13 —
20. PCF (Ext. limit. PC) .25* -.03 .11 .17 .38** .33* .39** .03 .78** .69** .28* .55** .04 .25* .33** .61** .31* .11 -.10 —
21. PCF (T. exp. PC) .36** .38** .27* .20 .09 .11 .29* .11 .23 .13 .24 .25* .47** .43** .45** .29* .40** .24 .04 .31* —
Teste de correlação de Pearson (r)
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Legenda: PC (percentil); OI (ordem indireta).
Nota. Foi adotado como critério para interpretação dos coeficientes de correlação: 0 a 0,20 (nula); 0,20 a 0,40 (baixa); 0,40 a 0,60 (moderada); 0,60 a 0,80 (alta) e 0,80 a 1,00
(muito alta). Em destaque, os coeficientes estatisticamente significativos de maior magnitude (r≥ 40).
94
perspectiva incomum nas produções do grupo de estudo, que incluem desenhos em visão
Figura 12. Representação dos desenhos do grupo de estudo (GE) –perspectiva incomum
A1 A2
B C
Nota. Figuras A1 e A2 = atividade 1 de construção de imagem a partir de estímulo oval; respostas pontuadas em
originalidade (são consideradas respostas pouco criativas desenhar corpo de inseto ou ovo a partir desse
estímulo). A1 - perspectiva incomum (visão aérea e rotacionada); A2 – perspectiva incomum (visão aérea e
tridimensional); B = atividade 2- perspectiva incomum (3D e pessoa desenhada de costas para o observador); C =
atividade 3 - perspectiva incomum (visão aérea – planta baixa de um corredor).
95
tiveram expressões semelhantes em ambos os grupos (Figura 13), embora sejam mais
Figura 13. Representação dos desenhos nas características extensão de limites e títulos
expressivos
A1 (GC) A2 (GC)
B1 (GE) B2 (GE)
Análises de regressão
atenderam aos pré-requisitos para essa análise estão descritas na Tabela 17:
Tabela 17. Análise de regressão simples entre medidas de FE e criatividade preditas pela
inteligência
R2
Medidas x Inteligência R B p
(% variância)
Blocos de Corsi (ordem inversa) 0,336 0,113** 0,034 0,001
Dígitos (ordem inversa) 0,187 0,035 0,021 0,062
FAM (Semântica) 0,307 0,094* 0,113 0,002
FDT (Escolha) 0,479 0,229** 0,694 0,000
FDT (Alternância) 0,339 0,115* 0,461 0,004
FDT (Inibição) 0,485 0,235** 0,770 0,000
FDT (Flexibilidade) 0,331 0,109* 0,409 0,005
PCF (Perspectiva incomum) 0,454 0,206** 0,537 0,000
PCF (Uso de contexto) 0,369 0,136* 0,385 0,003
PCF (Títulos expressivos) 0,365 0,133* 0,459 0,003
PCF (Índice Criativo Figural 1) 0,292 0,086* 0,339 0,019
PCF (Índice Criativo Figural 2) 0,358 0,128* 0,489 0,004
TCFI (Fator 1) 0,486 0,237* 0,702 0,002
TCFI (Fator 3) 0,535 0,286** 0,876 0,001
A regressão linear simples mostrou que a capacidade edutiva prevê, com significância
estatística de 95%, o desempenho nos seguintes escores: Corsi (ordem inversa) [F(1,98)=
12,492; p= 0,001; R2= 0,113]; FAM (Semântica) [F(1,98)= 10,177; p= 0,002; R2= 0,094]; FDT
Escolha [F(1,70)= 20,804; p<0,001; R2= 229]; FDT (Alternância) [F(1,70)= 9,092; p= 0,004; R2=
0,115]; FDT Inibição [F(1,70)= 21,490; p<0,001; R2= 235]; FDT (Flexibilidade) [F(1,70)= 8,585;
p= 0,005; R2= 0,109]; PCF (Perspectiva incomum) [F(1,62)= 16,076; p= 0, 000; R2= 0,206]; PCF
(Uso de contexto) [F(1,62)= 9,791; p= 0,003; R2= 0,136]; PCF (Títulos expressivos) [F(1,62)=
9,527; p= 0,003; R2= 0,133]; PCF (Índice Criativo Figural 1) [F(1,62)= 5,799; p=0,019; R2=
0,086]; PCF (Índice Criativo Figural 2) [F(1,62)= 9,120; p= 0,004; R2= 0,128]; TCFI (Fator 1)
[F(1,35)= 10,846; p= 0,002; R2= 0,237] e TCFI (Fator 2) [F(1,35)= 14,032; p= 0,001; R2= 0,286].
habilidades executivas são maiores para os escores relacionados à inibição cognitiva: FDT
Inibição (R=0,485; R2= 0,235; p>0,001) e FDT Escolha (R=0,479; R2=229; p>0,001). Menores
R2=0,109; p= 0,005).
criatividade figural infantil (TCFI Fator 1: R=0,535; R2=0,237; p= 0,002 e TCFI Fator 3: R=0,535;
R2=0,286; p= 0,001). Já com relação à variação explicada das características criativas avaliada
provenientes de dois testes, foi calculado um índice com os escores finais de ambos os
Figura 14. Gráfico de tendência da relação entre o índice global de criatividade figural e o
percentil no Matrizes
Índice de criatividade global (TCFIsumIndFig2)
Matrizes (PC)
9.4 Discussão
nível (threshold theory). Ambas as possibilidades alinham este estudo com outros notáveis
relacionadas (Jauk et al., 2013; Karwowski et al., 2016; Kim, 2005; Preckel et al., 2006;
Dentre os pesquisadores que consideram a existência de, pelo menos, alguma relação
entre os construtos, a maior parte das pesquisas investiga essa relação a partir de métodos
100
baixos e moderados entre os construtos, valores médios em torno de r=.0,20 e .37 (Gajda,
2016; Krumm, Arán Filippetti, & Bustos, 2014; Nakano & Brito, 2013; Wechsler et al., 2010).
pesquisas empíricas, uma vez que foram constatados coeficientes de correlação de 0,29 entre
correlação entre inteligência e criatividade figural infantil são superiores ao valor médio
citado, especialmente no que concerne aos fatores 1 e 3 calculados pelo Teste Pensando
Criativamente com Figuras (TCFI). Estes escores tiveram alta magnitude de correlação com a
fenômeno é a “lei dos retornos diminuídos” de Charles Spearman. Essa lei considera que
(Blum & Holling, 2017). Isso significa que as pessoas apresentam maior criatividade à medida
que o seu grau de inteligência aumenta, mas em patamares muito superiores de inteligência
essa correlação tenderia a diminuir. Portanto, pessoas com QI muito elevado poderiam ou
Essa constatação aproxima-se da consideração de, pelo menos, dois perfis diferentes
na confluência entre alto potencial intelectual e criatividade, semelhante ao que foi proposto
habilidades cognitivas ainda é escassa. Uma busca das variações do termo “lei dos retornos
artigos científicos que exploram a lei de Spearman com o potencial criativo. A pesquisa do
termo "lei dos retornos diminuídos" na biblioteca digital brasileira de teses e dissertações
jovens, pode-se afirmar que o poder de predição da inteligência não verbal no desempenho
de regressão do TCFI são mais expressivos do que os índices criativos figurais do PCF). Ainda
com relação aos mais jovens da amostra, cabe destacar que a emotividade, calculada no Fator
2 do TCFI, foi um ponto de força em comum entre os grupos de comparação (GE e GC),
No que diz respeito a avaliação da criatividade figural infantil dos participantes com
de planejamento e organização e a preparação criativa. Por outro lado, para essa parcela da
inteligência.
Inteligência, FE e Criatividade
inteligência não verbal nas habilidades executivas que exigem ações controladas e
conscientes a partir de estímulos conflitantes (no caso do FDT, inibir a tendência involuntária
de ler os números). No Teste dos Cinco Dígitos, as fases Escolha e Alternância mobilizam um
nível superior de recursos mentais e esforço voluntário para inibir respostas automáticas. O
reflete em menor grau nas medidas de flexibilidade (p.: escores de alternância). Uma possível
explicação para esse resultado está na grande variabilidade de desempenho da amostra nesta
Apesar da baixa magnitude nessa relação, esse resultado atesta a favor do envolvimento
desse componente executivo central na produção criativa. Este achado também é reforçado
criatividade figural.
Ainda com relação as FE, cabe ressaltar que as duas primeiras fases do Teste dos Cinco
correlação com a inteligência. O que implica que esta habilidade executiva básica não é
suficiente para distinguir o desempenho dos dois grupos investigados – inteligência média e
acima da média. Os achados de planejamento e organização vão na mesma direção, uma vez
As magnitudes nas correlações entre inteligência e as duas fases do teste das Figuras
Complexas de Rey (cópia e memória) são semelhantes. Este achado aponta para a
diferenciação dos grupos a partir da segunda leitura da lista, também sugerem esforços
9.5 Considerações
maior controle nesta produção e, por consequência, possibilita ao respondente ver o mesmo
nas medidas de inibição. Este resultado sugere uma maior associação entre inteligência e
controle inibitório na faixa etária investigada, como também atesta a imprescindível atuação
Ainda que a magnitude dessas correlações não seja alta, segundo a interpretação dos
coeficientes adotada, este resultado pode indicar que certos tipos de inteligência se
relacionam de forma mais direta a alguns aspectos da criatividade, mas não a outros. Os
diferentes subgrupos, como na população com AH/SD (objetivo do Estudo 2 desta pesquisa).
habilidades executivas avaliadas fazem parte da mesma função superior, as FE. Este achado
105
The brain’s working memory function, i.e., the ability to bring to mind events
in the absence of direct stimulation, may be its inherently most flexible
mechanism and its evolutionarily most significant achievement. At the most
elementary level, our basic conceptual ability to appreciate that an object
exists when out of view depends on the capacity to keep events in mind
beyond the direct experience of those events (Goldman-Rakic, 2011).
Essa definição não se relaciona com nenhuma habilidade acadêmica restrita, mas com
uma ampla dimensão que permite ao ser humano sua sobrevivência, adaptação e a
superação dos desafios (Flores-Mendoza & Saraiva, 2018). No nosso dia-a-dia realizamos
inúmeras atividades nas quais utilizamos vários processos mentais simultaneamente. Por
exemplo, para compreender o sentido dessa frase o leitor deve conservar na lembrança o que
107
aprendeu na abertura do parágrafo, até que seja lido todo o resto e finalmente o trecho faça
sentido.
novas e associar esses conceitos com ideias precedentes, seguir instruções e realizar tarefas
tipo de memória que nos permite manter as informações em um estado ativo, durante um
certo intervalo de tempo. Este tipo de memória foi reconhecida academicamente no século
anterior de memória de curto prazo e os dois ainda são usados de forma intercambiável
(Baddeley, 2012). Desde a década de 60 – época em que a expressão aparece pela primeira
relação entre esse construto e inúmeras habilidades cognitivas (Ackerman, Beier, & Boyle,
2005; Colom, Roberto e Flores-Mendonza, 2006b; Colom et al., 2008; Colom, Flores-
Mendoza, & Rebollo, 2003; Colom et al., 2004; Unsworth, Fukuda, Awh, & Vogel, 2014).
Este sistema múltiplo de memória difere-se da memória de curto prazo (MCP) por
al., 2004).
aprendizagem. Sobre os estudos em neurociência cognitiva da MO, Osaka & Osaka (2007)
traduzido como operativa ou de trabalho, como alternativa aos modelos bimodais e trimodais
de memória propostos na época (Atkinson & Shiffrin, 1968; Warrington & Shallice, 1969). O
área é o introduzido pelos psicólogos Alan Baddeley e Graham Hitch (1974). Em uma
auxiliado por dois subsistemas “escravos”, o esboço visoespacial e a alça fonológica. Segundo
focar a atenção em uma informação relevante enquanto inibe outras informações distratoras
mental); selecionar e executar planos e estratégias; alocar recursos em outras partes da MO;
Por sua vez, a alça fonológica seria um subsistema especializado em reter sequências
verbalmente, sejam elas apresentadas por via auditiva ou visual. Esse subsistema conta com
mantendo-as na MO, para posteriormente, combinar esses códigos fonológicos com outros
(Baddeley, 2003).
110
informação.
informações visuais e espaciais referente aos objetos e às relações espaciais entre eles. Além
disso, atuaria na formação e manipulação de imagens mentais (Baddeley, 2003). Assim como
que as características físicas dos objetos são representadas na consciência. Esse componente
visuais e/ou espaciais. De fato, o esboço visuo-espacial pode ser compreendido como um
15. Ao fazê-lo, o autor fornece uma base mais dinâmica para explicar aspectos mais
Figura 15. Modelo revisado dos múltiplos componentes da memória operacional proposto
Nota: As áreas em destaque representam sistemas cognitivos cristalizados, capazes de acumular conhecimento
de longo prazo (ex.: linguagem e conhecimento semântico). O autor sugere que as demais áreas são capacidades
fluidas, como atenção e armazenamento temporário. Estas últimas seriam inalteradas pela aprendizagem,
exceto indiretamente através dos sistemas cristalizados (Baddeley, 2000).
estudos correlacionais sugerem uma forte relação entre memória operacional e inteligência
fluida (Gf), apontando esse componente da função executiva como a maior relação entre
Miyake et al., 2000b; Nakano, Costa, Lemos, & Mendonça, 2010). Tais evidências sugerem
Para Oberauer, Wilhelm, Schulze, & Süß (2005), a memória operacional é um forte
Prabhakaran, Smith, Desmond, Glover, & Gabrieli (1997) apontaram para forte relação
entre tarefas que avaliam memória operacional e performances no teste das Matrizes
Progressivas de Raven. Eles propuseram que essa relação ocorre porque ambas as tarefas
envolvem sistemas neurais comuns. Segundo os autores, o desempenho nas Matrizes ativaria
também áreas associadas, como os sistemas executivos da MO (Colom et al., 2003). Sabe-se
também que a capacidade da MO aumenta com a idade. Entre os cinco e onze anos de idade,
2008).
De modo geral, observa-se uma tendência a associar a inteligência fluida a pelo menos
mentais simultâneas, (c) monitoramento e supervisão das atividades mentais, (d) controle da
113
inaugural de Carpenter, Just, & Shell (1990) é considerado ponto de partida para o despertar
complexidade do item. Como esperado pelos autores, os sujeitos com maior capacidade de
MO resolveram maior número de itens e, portanto, resolveram itens mais complexos (Colom,
Shih, Flores-Mendoza, & Quiroga, 2006). Tais resultados sugerem, portanto, que o êxito nas
O trabalho inaugural de Carpenter, Just, & Shell (1990) é considerado ponto de partida
para o despertar científico sobre o papel da MO na cognição humana. Nesse trabalho firmou-
complexidade do item. Como esperado pelos autores, os sujeitos com maior capacidade de
MO resolveram maior número de itens e, portanto, resolveram itens mais complexos (Colom
114
et al., 2006). Assim, o êxito nas tarefas cognitivas dependeria da habilidade em manter ativa a
informação e processá-la.
inteligência fluida (Gf), apontando esse componente da função executiva como a maior
relação entre ambos os construtos (Andrade et al., 2017; Colom, Roberto e Flores-Mendonza,
2006a; Miyake et al., 2000b; Nakano et al., 2010). Tais evidências sugerem que as diferenças
fortemente da gravidade do quadro (Henry, 2001; Schuchardt, Gebhardt, & Mäehler, 2010). A
respeito desse papel relevante da memória no perfil cognitivo da DI, Scott, Perou, Claussen, &
Deuel (1997) chegaram a afirmar que "as tarefas de memória parecem ser as primeiras
candidatas a identificar crianças de tenra idade com leve retardo mental" (p. 185).
mnemônico dos sujeitos com deficiência intelectual (DI) (Henry & Winfield, 2010). Segundo os
autores, em crianças com déficits intelectuais limítrofes, essa dificuldade estaria mais
déficits são globais e envolvem diferentes subsistemas da MO, incluindo seus componentes
visuais e verbais.
115
operacional – notadamente em seu processo de ensaio subvocal – como o elo mais fraco na
população com DI (Hulme & Mackenzie, 1992; Rosenquist, Conners, & Roskos-Ewoldsen,
2003; Schuchardt et al., 2010). Essa conclusão provém do fato de não haver efeito do
comprimento das palavras e da similaridade acústica em crianças com DI. Neste caso, sugere-
mas em ensaiar esses códigos, ou mantê-los ativos, para que possam ser utilizados em tarefas
verbais, enquanto que na DI, a memória operacional e de curto prazo são mais influentes,
para problemas não verbais, como os do Teste das Matrizes (Mungkhetklang, Bavin,
Segundo Flores-Mendoza & Colom (2000), à quanto melhor for a capacidade cognitiva
geral do sujeito, melhor o desempenho de sua memória operacional. Essa hipótese parece
nas tarefas de memória de curto prazo, entre outras coisas, a dificuldade em reter na
Apesar do crescente interesse em pesquisas com AH/SD, ainda existe uma quantidade
achados de Alloway & Alloway (2010) sugerem não haver ligação clara entre o escore de QI e
alunos com altas habilidades; com inteligência média e inteligência abaixo da média.
117
intelectual dos avaliados. Ainda segundo os autores, tais resultados indicam que os alunos
com QI alto, mas déficits em memória operacional, são mais propensos ao insucesso
foi comprovada em outros estudos (Abad, Colom, Juan-Espinosa, & García, 2003; Detterman
um traço característico que distingue essas crianças daquelas que simplesmente têm um QI
alto na escala ou uma pontuação superior em algum dos índices (Molinero, Mata, Calero,
acontece com a capacidade de realizar muitas atividades da vida diária. Visto sob essa
aprendizagem (Carretti, Lanfranchi, De Mori, Mammarella, & Vianello, 2014; Conklin, Luciana,
Hooper, & Yarger, 2007; Lanfranchi, Mammarella, & Carretti, 2015; Schuchardt, Bockmann,
refletida na intensidade com que o tema é abordado em publicações científicas dos últimos
anos. Em meados de 2014, a busca pelo termo memória operacional na base de dados
PubMed recuperou 17.597 citações (D’Esposito & Postle, 2015). Em meados de 2018, a
mesma pesquisa resultou em 45.622 publicações, sendo mais de 15 mil estudos apenas nos
subsequentes em leitura, ortografia e matemática (Alloway & Alloway, 2010). Estes achados
acadêmico do que medidas de quociente de inteligência (QI). Uma das explicações teóricas
desse fenômeno aponta que a avaliação da memória operacional investiga a capacidade dos
níveis de capacidade intelectual. Esse debate pode contribuir para o avanço na compreensão
10.4 Objetivos
Isto posto, o estudo teve por objetivo comparar o desempenho dos grupos em função
hipóteses: (a) o grupo formado por crianças e adolescentes com inteligência superior (GAH)
obteria melhores médias de desempenho do que os demais grupos, em especial, nas tarefas
que demandam o processamento ativo de conteúdos visuais e verbais; (b) no grupo formado
por crianças e adolescentes com inteligência limítrofe (GDI), o avanço da idade poderia
interferir negativamente sobre o desempenho geral; e (c) o grupo controle (GC) teria
prazo, mas não nas tarefas de maior demanda do sistema atencional da memória
operacional.
10.5 Método
Participantes
A amostra foi composta por 30 crianças e adolescentes com faixa etária entre 10 e 18
definidos para inclusão nos grupos de pesquisa: o grupo controle (GC) foi composto por
crianças e adolescentes que obtiverem percentil maior que 25 e menor que 75 no Raven
Raven.
120
leve ou (GDI) deveriam ter percentis inferiores a 25 no Teste das Matrizes Progressivas de
Raven – Escala Geral. Além disso adotou-se QI entre 69 e 49 como critério adicional para este
deficiência intelectual de grau leve ou moderado). Os participantes dos grupos GDI e GAH não
avaliada.
Instrumentos
Fluência Verbal (FAM); c) WISC-IV – subteste Dígitos (ordem direta e inversa) e a tarefa dos
(c) Blocos de Corsi (ordem direta e inversa). O teste das Matrizes Progressivas de Raven é
avaliação de inteligência fluida. Já os Blocos de Corsi e o subteste Dígitos são apontadas como
as duas tarefas mais clássicas e utilizadas para a avaliação dos componentes da memória
operacional, conforme revisão sistemática recente (Siquara, Machado Dazzan, & Abreu,
INSTRUMENTOS SUBSISTEMA DA MO
Teste de Fluência Verbal Alça fonológica
121
percentil do teste das Matrizes Progressivas de Raven. Nesta etapa, os candidatos foram
aplicação. Após a avaliação destes resultados, os candidatos que atenderam aos critérios de
independentes e desempenho nos testes. Foi adotado p<0,05 como nível de significância em
todas as análises. A distribuição dos dados foi examinada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov
(K-S) e os dados não atenderam à hipótese de normalidade (p> 0,05). Todavia, quando
Kruskal-Wallis (KW). O teste de Pearson foi utilizado a fim de investigar a correlação entre os
construtos avaliados. Foi adotado como critério para interpretação dos coeficientes de
122
correlação: 0 a 0,20 (nula); 0,20 a 0,40 (baixa); 0,40 a 0,60 (moderada); 0,60 a 0,80 (alta) e
verbal adotada Para verificar se houve interferência significativa das variáveis sexo e idade
dos participantes sobre o desempenho dos testes, inicialmente foi realizada uma análise
post-hoc de Bonferroni.
escore bruto (soma das palavras mencionadas nas etapas de fluência semântica e fonológica).
direta e inversa e a pontuação bruta da soma dos acertos em ambas as etapas. Para o
subteste Dígitos, foram analisadas as pontuações parciais brutas nas duas fases (ordem direta
e inversa), o escore bruto da soma dos acertos em ambas as fases e o escore ponderado por
10.6 Resultados
Os participantes da amostra possuem idade média de 14,63 anos (DP= 1,650). O grupo
de crianças identificadas com alto potencial (GAH) têm, em media, 14,20 anos (DP= 1,751), o
grupo controle (GC) 15,90 anos (DP= 0,316) e o grupo de crianças e adolescentes
diagnosticados com inteligência limítrofe (GDI), 13,80 anos (DP= 1,687). Observa-se na Tabela
19, que os participantes dos grupos de pesquisa são predominantemente do sexo masculino.
123
De modo geral, essa tendência da amostra pode ser atribuída a, pelo menos, dois
exatas e em atividades voltadas para as ciências da computação. Apesar desse viés amostral,
a MANOVA indicou que não há efeito do sexo e da idade dos participantes no desempenho
dos testes.
anteriores com amostras maiores (Colom, Juan-Espinosa, Abad, & García, 2000; Flores-
todas as tarefas de avaliação da memoria operacional, a saber: [X 2(2)= 13,365; p= 0,001] para
Corsi (ordem direta); [X2(2)= 12,652; p<0,05] para Corsi (ordem inversa); [X2(2)= 20,437;
p<0,001] para o teste FAM (categoria Semântica); [X2(2)= 9,160; p<0,05] para o teste FAM
(categoria Fonológica).
124
GAH GC GDI
p
(n=10) (n=10) (n=10)
M DP M DP M DP
Corsi
Ordem direta 10,20 2,936 8,50 1,780 5,00 2,309 0,001**
Ordem inversa 8,90 1,853 6,80 2,486 4,20 2,348 0,002*
Total (soma) 18,00 5,312 15,30 3,683 7,30 5,208 0,001**
Dígitos
Ordem direta 16,50 9,478 11,10 2,807 8,50 3,951 0,019**
Ordem inversa 13,60 13,023 6,40 2,875 5,30 3,433 0,087
Escore ponderado 29,00 22,755 17,50 5,212 10,60 4,222 0,001**
FAM
Semântica 38,30 7,103 32,20 4,917 12,60 6,204 0,000**
Fonológica 36,90 7,279 30,30 11,963 25,00 7,860 0,010**
Total (soma) 75,20 13,365 62,50 14,737 37,60 11,374 0,000**
Teste de Kruskal-Wallis (K-W).
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Legenda: GAH: grupo altas habilidades; GC: grupo controle; GDI: grupo deficiência intelectual.
inversa não apresentou diferença estatisticamente significativa entre os grupos [X2(2) =4,879;
p> 0,005]. Este resultado provavelmente deve-se à alta variabilidade do grupo nesta medida,
que pode ser constatada nos valores de desvio-padrão (Tabela 20). No entanto, foram
deste subteste.
ANOVA de uma via. As comparações múltiplas feitas pelo post-hoc de Bonferroni sugerem
que há diferenças entre o GDI e os demais grupos em ambas as fases do Blocos de Corsi
comparação ao GAH (p<0,001). Nesta tarefa, o grupo controle difere apenas do GDI, não
havendo diferença significativa entre o GC e o GAH, como poder ser analisado na Figura 16.
125
Figura 16. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa na tarefa Blocos de Corsi
**
14,00
10,20
12,00
**
8,90 Corsi (OD) Corsi (OI)
8,50
CORSI (ESCORES MÉDIOS)
10,00
6,80
*
5,00
8,00
*
4,20
6,00
4,00
*
2,00
0,00
GC GAH GDI
GRUPOS
**. A ANOVA de uma via, seguida do post-hoc de Bonferroni, indicaram diferença significativa entre os
grupos no nível 0,01. *. Diferença significativa entre os grupos no nível 0,05. Nas comparações múltiplas
em ambas as fases do teste (OD e OI), a média do GDI difere significativamente do GAH (p<0,001) e do
GC (p<0,05). Legenda: GAH: grupo altas habilidades; GC: grupo controle; GDI: grupo deficiência
intelectual; OD: ordem direta; OI: ordem indireta.
Na comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa no FAM, destaca-se que
houve diferença entre o grupo controle e o GDI apenas na Categoria Semântica (p= 0,024). Na
categoria Fonológica, o GC não difere estatisticamente de nenhum dos outros dois grupos.
Cabe salientar ainda, que as médias dos grupos GAH e GDI diferem significativamente em
ambas as fases do teste de fluência, sendo que o nível de significância é superior na categoria
Figura 17. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa na tarefa FAM (categorias
Semântica e Fonológica)
50,00 **
38,30 36,90 FAM (Sem) FAM (Fon)
45,00
30,30
40,00
32,20
*
FAM (ESCORES MÉDIOS)
35,00 25,00
30,00
25,00
**
20,00 12,60
15,00
10,00
5,00
0,00
GC GAH GDI
GRUPOS
**. A ANOVA de uma via, seguida do post-hoc de Bonferroni, indicaram diferença significativa entre os
grupos no nível 0,01. *. Diferença significativa entre os grupos no nível 0,05. Nas comparações múltiplas
da categoria Semântica, a média do GDI difere significativamente do GAH e do grupo controle p<0,001).
(p<0,05). Na categoria Fonológica, há diferença significativa apenas entre o GAH e o GDI (p<0,05).
Legenda: GAH: grupo altas habilidades; GC: grupo controle; GDI: grupo deficiência intelectual; Sem:
categoria Semântica; Fon: categoria Fonológica.
Com relação às diferenças nos grupos de estudo quanto ao escore ponderado por
(p=0,002), mas não do GAH (p>0,05). No entanto, o GDI e o GAH diferem significativamente
entre si, conforme destaque na Figura 18. Na comparação múltipla utilizando o escore total
Figura 18. Comparação dos escores médios dos grupos de pesquisa no escore ponderado do
subteste Dígitos
**. A ANOVA de uma via, seguida do post-hoc de Bonferroni, indicaram diferença significativa entre os
grupos no nível 0,01. *. Diferença significativa entre os grupos no nível 0,05. Nas comparações
múltiplas, a média do GC difere significativamente do GDI (p<0,001), mas não do GAH. Já o GDI e o GAH
diferem significativamente entre si (p<0,05). Legenda: GAH: grupo altas habilidades; GC: grupo
controle; GDI: grupo deficiência intelectual.
atenderam aos pré-requisitos para esta análise13, estabelecendo-as como variáveis de saída e
a medida de inteligência não verbal (neste caso, o percentil no teste das Matrizes
Progressivas de Raven) como variável previsora. A regressão linear simples mostrou que o
Corsi (ordem direta) [F(1,28)= 22,475; p<0,001; R2=0,445]; no Corsi (ordem inversa) [F(1,28)=
13Resultados da ANOVA confirmam que o ajuste do modelo com preditor é melhor do que o ajuste do modelo
sem previsores. Resíduos independentes aferidos pelo Durbin-Watson (entre 1,159 e 2,250).
128
21,781; p<0,001; R2=0,438]; no FAM (categoria Semântica) [F(1,28)= 78,328; p<0,001; R2=
no desempenho em Dígitos (escore ponderado) pode ser explicado pela inteligência não
verbal, avaliada pelo Matrizes. Esta mesma medida explica 73,7% da variação no desempenho
Tabela 21. Coeficientes de regressão e dados estatísticos para cada medida incluída no
Modelo B t p R2
Corsi (OD) 1 (Constante) 4,608 5,600 0,000
Matrizes
0,059 4,741 0,000 0,445
(percentil)
Corsi (OI) 2 (Constante) 3,646 4,807 0,000
Matrizes
0,053 4,667 0,000 0,438
(percentil)
FAM (SEM) 3 (Constante) 10,925 4,865 0,000
Matrizes
0,300 8,850 0,000 0,737
(percentil)
FAM (FON) 4 (Constante) 23,046 7,441 0,000
Matrizes
0,138 2,941 0,007 0,236
(percentil)
Dígitos (EP) 5 (Constante) 2,916 2,636 0,014
Matrizes
0,101 6,017 0,000 0,751
(percentil)
medidas de memória operacional (ver Tabela 22), o que reforça o modelo teórico que as
agrega como parte de um mesmo construto. Destaca-se a correlação alta e significativa entre
(escore total e ponderado; r> 0.70) e no teste de fluência verbal (FAM), sendo que o
129
p<0,001).
Correlações altas também foram encontradas entre o escore total do FAM e na ordem
direta do Corsi (r=0,703; p<0,001) e Dígitos (r=0.616; p<0,001). As medidas na ordem inversa
Matrizes Corsi Corsi Corsi Dígitos Dígitos Dígitos Dígitos FAM FAM FAM
(PC) (OD) (OI) (Total) (OD) (OI) (Total) (EP) (SEM) (FON) (Total)
Matrizes (PC) 1 0,627** 0,675** 0,658 0,603** 0,488** 0,724** 0,737** 0,802** 0,575** 0,751**
Corsi (OD) 1 0,706** 0,812** 0,459* 0,351 0,592** 0,582** 0,636** 0,536** 0,703**
Corsi (OI) 1 0,906** 0,479** 0,354 0,684** 0,627** 0,546** 0,343 0,576**
Corsi (Total) 1 0,386* 0,235 0,670** 0,634** 0,578** 0,295 0,555**
Dígitos (OD) 1 0,711** 0,836** 0,664** 0,552** 0,527** 0,616**
Dígitos (OI) 1 0,724** 0,534** 0,338 0,555** 0,490**
Dígitos (Total) 1 0,828** 0,657** 0,520** 0,692**
Dígitos (EP) 1 0,688** 0,428* 0,666**
FAM (SEM) 1 0,656** 0,905**
FAM (FON) 1 0,874**
FAM (Total) 1
Teste de correlação de Spearman (r)
**. A correlação é significativa no nível 0,01. *. A correlação é significativa no nível 0,05.
Legenda: PC (percentil); OD (ordem direta); OI (ordem indireta); EP (escore ponderado); SEM (categoria Semântica); FON (categoria fonológica).
131
10.7 Discussão
De maneira geral, destaca-se que não foram identificados efeitos das variáveis sexo e
para população brasileira, utilizando como medida o Teste de Fluência Verbal, Hazin et al.
(2016) também não relataram efeito do sexo nas tarefas de avaliação da fluência verbal
significativa no desempenho das crianças mais velhas, notadamente nas tarefas de fluência
verbal fonológica, com maior número de palavras geradas a partir do critério gramatical de
letra inicial.
Corroborando a tese de Oberauer et al. (2005), foi constatada alta correlação entre
tarefa-dupla, ou seja, aqueles que combinam uma tarefa de armazenamento de curto prazo
com uma tarefa de processamento (por exemplo, Blocos de Corsi e Dígitos na ordem inversa).
De maneira geral, as tarefas de fluência verbal avaliam uma ampla gama de funções
linguagem e habilidades verbais (como gerar e categorizar palavras) (Moura, Simões, &
Pereira, 2013). Em síntese, essas funções cognitivas são empregadas para manter e atualizar
para suas soluções. A evocação de palavras que iniciam pela mesma letra requer a exploração
complexa e exigente, o que implica em uma produção maior no número de respostas pelo
roupas e frutas). No entanto, é interessante destacar que essa diferença entre os grupos não
foi identificada na etapa fonológica do mesmo teste. Apesar disso, o grupo com inteligência
média produziu, em média, cinco palavras a mais do que o grupo intelectualmente deficiente,
Outro estudo encontrou resultados semelhantes ao desta pesquisa (Henry & Winfield,
2010), supondo que indivíduos com inteligência limítrofe apresentam estrutura de memória
que, possivelmente, isto ocorre porque o grupo clínico utiliza conhecimentos armazenados na
De Smedt, 2013; Schuchardt, Maehler, & Hasselhorn, 2011). Nesse caso, haveria redução da
grupo com indicativo de altas habilidades. Contudo, nas comparações múltiplas em ambas as
fases do teste (ordem direta e inversa), a média do grupo com deficiência intelectual leve ou
notadamente inferior.
Resultado semelhante foi encontrado por Pereira, Araújo, Ciasca, & Rodrigues (2015)
Para a análise dos resultados deste subteste foram utilizados os escores ponderados
por idade, fornecidos pelo no manual do instrumento. Os resultados desta pesquisa indicam
que não há diferença significativa na comparação múltipla entre o grupo com inteligência
ressalta-se que a média das crianças e adolescentes com altas habilidades na ordem inversa
fase direta. Esse dado reforça a relação entre memória operacional e inteligência, bem como
O GDI, por sua vez, apresentou desempenho significativamente inferior que os demais
Ciasca, & Rodrigues (2015), os quais também constataram que os grupos classificados com
(competências práticas, sociais e emocionais), tendo seu início antes dos 18 anos de idade.
desempenho deste grupo foi estatisticamente semelhante ao grupo com inteligência média
10.8 Considerações
proposição de Unsworth et al. (2014), a qual sugere que a MO não é um sistema unitário. Ao
para a cognição de ordem superior. Por extensão, também não há um único fator que explica
a relação entre memória operacional e a inteligência fluida. Isto sugere que a relação entre os
(representadas pelas fases inversas em Corsi e Dígitos) Este dado é relevante se consideramos
executivas.
apontado pela literatura, mas também em outros dois componentes da memória operacional
(esboço visoespacial e executivo central). Isto sugere que o sistema de memória operacional
em sua totalidade aparece como uma fragilidade desse grupo clínico e atesta a favor da
136
Neste sentido, sugere-se que as intervenções com esse grupo em questão devem
apresentam impacto positivo em indicadores sociais e educacionais (Alves & Silva, 2017).
Por outro lado, destaca-se que o grupo com altas habilidades obteve desempenho
Pesquisas desenvolvidas com crianças com altas habilidades afirmam que esse subgrupo pode
2002). Esses contrastes entre o desempenho notadamente superior em uma área e déficits
das AH/SD e o tamanho reduzido dos sujeitos por grupo para efeito de comparação. Sobre
137
esse último aspecto, futuros estudos longitudinais podem ampliar a amostra, de modo a
sujeitos mais velhos têm maiores span de memoria, cometam menos erros e precisem de
menos tempo para realizar com sucesso tarefas de memoria visoespacial (Burggraaf, Frens,
Hooge, & van der Geest, 2018). Isto posto, fica em aberto a questão de pesquisa se o
De modo geral, os resultados obtidos pelo presente estudo indicam que as medidas
de memória operacional, mais estritamente relacionadas à memória de curto prazo, são úteis
Sugerem-se estudos adicionais que utilizem tarefas de manipulação da informação com maior
grau de demanda executiva, como as que avaliam conjuntamente inputs verbais (alça
próximos, o que pode ser inferido a partir dos altos coeficientes de regressão entre eles.
De maneira geral, os dados reforçam modelos teóricos que põem a criatividade como
executivas. Verificou-se também que o perfil de alto potencial intelectual se expressa mais
incomum e elaboração de ideias. Essa relação não é tão clara para os critérios de produção
divergente, e menos ainda para a característica criativa de fluência. Isto posto, conclui-se que
Nos desenhos, esse perfil de alta capacidade intelectual é expresso na abstração das
formas, das ideias e dos títulos. Isto sugere o papel das funções executivas de alto nível na
média. Essa conclusão pesa a favor da importância de se avaliar a criatividade em seu caráter
de pensamento divergente.
nas produções criativas fosse um ponto de divergência a favor do grupo de inteligência acima
desempenho intelectual acima da média sugere que este componente executivo é essencial
divergente.
avaliação das funções executivas, por exemplo, no subteste fluência de desenhos do NEPSY-II.
avaliar criatividade à parte de uma determinada área de atuação e interesse em que podem
Com relação aos possíveis limiares de diferenciação da amostra, esse dado tem
produtiva. Sugere-se que os estudos futuros ampliem a avaliação desse perfil acrescentando
140
Para concluir qualquer discussão a respeito dos modelos de AH/SD se faz necessária
uma contextualização no que diz respeito ao porquê de identificá-las. O intuito maior não é a
potencialidades.
objetivos planejados. Um ponto importante a considerar é que a identificação deve ser vista
como um processo contínuo, permitindo o ingresso dos jovens ao programa à medida que
perfil de AH/SD, como liderança, motivação e o próprio potencial intelectual. Este último
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154
APÊNDICES
156
Esclarecimentos
Sua participação é voluntária, o que significa que você poderá desistir a qualquer momento,
retirando seu consentimento, sem que isso lhe traga nenhum prejuízo ou penalidade. Todas
as informações serão sigilosas e você não será identificado em nenhum momento. Os dados
serão guardados em local seguro e a divulgação dos resultados será feita de forma a não
identificar os voluntários. Os resultados obtidos nessa pesquisa podem resultar em benefícios
indiretos para os participantes, na medida em que a produção e divulgação dos achados pode
ser ponto de partida para melhorias em seu curso de formação. Toda a dúvida que você tiver
a respeito desta pesquisa, poderá perguntar diretamente para as pesquisadoras responsáveis,
através dos endereços eletrônicos: [email protected]; [email protected] e
[email protected] ou pelo telefone (84)3342-2216 (ramal 133).
---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Consentimento Livre e Esclarecido
____________________________________
Assinatura
Natal, 2017.
157
Esclarecimentos
Este é um convite para que seu(sua) filho(a) participe da pesquisa “Avaliação
Neuropsicológica: o Programa Talento Metrópole”, coordenada pela Prof.ª Dr. ª Izabel Hazin e
desenvolvida pelas doutorandas Priscila Magalhães Barros Felinto e Juliana Teixeira da
Câmara Reis, do Departamento de Psicologia da UFRN. Essa pesquisa procura avaliar a relação
entre as altas habilidades/superdotação (AH/SD), a criatividade e as funções executivas dos
alunos do programa Talento Metrópole e estudantes com desenvolvimento típico.
Nesta pesquisa serão aplicados testes psicológicos. Esses testes são parecidos com jogos e
tarefas que a criança/adolescente faz na escola. As aplicações duram, em média, uma hora.
Todos os testes serão realizados no Instituto Metrópole Digital (IMD/UFRN), durante o
período escolar regular e após a autorização prévia dos professores e coordenadores.
Informamos que a participação na pesquisa é voluntária e seu filho(a) poderá desistir a
qualquer momento da avaliação. Todas as informações serão sigilosas e será garantido o
anonimato dos participantes. Os dados serão guardados em local seguro e a divulgação dos
resultados será feita de forma a não identificar os voluntários. Os resultados obtidos nessa
pesquisa podem resultar em benefícios indiretos para os participantes, na medida em que a
produção e divulgação dos achados pode ser ponto de partida para melhorias em seu curso
de formação. Toda a dúvida que você tiver a respeito desta pesquisa, poderá perguntar
diretamente para as pesquisadoras responsáveis, através dos endereços eletrônicos:
[email protected]; [email protected] e [email protected] ou pelo
telefone (84)3342-2216 (ramal 133).
---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Consentimento Livre e Esclarecido do Responsável Legal
Eu, ______________________________________________, representante legal do
menor________________________________________________, autorizo sua participação
na pesquisa. Esta autorização foi concedida após os esclarecimentos que recebi sobre os
objetivos desta pesquisa, como ela será realizada, os riscos e os benefícios envolvidos.
Autorizo, ainda, a publicação das informações em congressos e/ou publicações científicas,
desde que os dados apresentados não possam identificá-lo(a).
__________________________________________
Assinatura do responsável
Natal, 2017.
158
APÊNDICE B – Caracterização dos instrumentos utilizados na pesquisa e seus referentes estudos de normatização para população brasileira
Kolmogorov-Smirnova Shapiro-Wilk
Estatística gl Sig. Estatística gl Sig.
Matrizes (escore bruto) 0,163 18 ,200* 0,913 18 ,097
Blocos de Corsi (ordem direta) 0,131 18 ,200 0,953 18 ,481
Blocos de Corsi (ordem inversa) 0,156 18 ,200 0,946 18 ,365
Corsi (escore total) 0,161 18 ,200 0,927 18 ,175
TEPIC-M (escore bruto) 0,116 18 ,200 0,976 18 ,905
TEPIC-M (percentil) 0,176 18 ,146 0,879 18 ,025
RAVLT (Escore Total = A1-A5) 0,179 18 ,134 0,926 18 ,164
RAVLT (Reconhecimento) 0,105 53 ,200 0,974 53 ,206
Dígitos WISC (ordem direta) 0,113 18 ,200 0,939 18 ,277
Dígitos WISC (ordem inversa) 0,180 18 ,130 0,955 18 ,505
Dígitos WISC (escore bruto) 0,192 18 ,078 0,919 18 ,126
FAM (semântica) 0,190 18 ,085 0,948 18 ,391
FAM (fonológica) 0,140 18 ,200 0,969 18 ,777
FAM (escore total) 0,123 18 ,200 0,950 18 ,422
FDT – Escore total (Inibição) 0,193 18 ,076 0,915 18 ,106
FDT – Escore total (Flexibilidade) 0,295 18 ,000 0,585 18 ,065
PCF – Índice Criativo Figural 1 0,075 53 ,200 0,983 53 ,650
PCF – Índice Criativo Figural 2 0,109 53 ,171 0,959 53 ,064
TCFI - Escore total (bruto) 0,111 18 ,200 0,965 18 ,699
*. Este é um limite inferior da significância verdadeira.
a. Correlação de Significância de Lilliefors.
160
ANEXOS
ANEXO A – Os três estratos de capacidades cognitivas (Carroll, 1997)
Estrato II Estrato I
Fatores gerais Fatores específicos
• Raciocínio Sequencial Geral (RG)
• Raciocínio Piagetiano (RP)
Inteligência Fluída (Gf) • Indução (I)
• Velocidade de Raciocínio (RE)
• Raciocínio Quantitativo (RQ)
• Desenvolvimento da Linguagem (LD)
• Produção Oral e Fluência (OP)
• Conhecimento Léxico (VL) • Informação sobre a Ciência (K1)
• Sensibilidade Gramatical (MY)
Inteligência Cristalizada (Gc) • Capacidade Auditiva (LS) • Desempenho em Geografia (A5)
• Proficiência em Língua Estrangeira (KL)
• Informação Geral (K0) • Capacidade de Comunicação (CM)
• Aptidão para Língua Estrangeira (LA)
• Informação sobre a Cultura (K2)
• Conhecimento Matemático (KM)
Conhecimento Quantitativo (Gq)
• Desempenho Matemático (A3)
• Extensão da Memória (MS)
Memória a Curto Prazo (Gsm) • Memória Operacional (WM)
• Capacidade de Aprendizagem (LI)
• Visualização (VZ)
• Relações Espaciais (SR) • Análise Espacial (SS) • Percepção de Ilusões (IL)
Inteligência/Processamento
• Memória Visual (MV) • Integração Perceptual em Série (PI) • Alternações Perceptivas (PN)
Visual (Gv)
• Velocidade de Finalização (CS) • Estimação de Comprimento (LE) • Imagens (IM)
• Flexibilidade de Finalização (CS)
• Discriminação da Duração do Som (U6)
• Codificação Fonética (PC) • Discriminação Geral de Sons (U3)
• Discriminação da Frequência Sonora (U5)
• Discriminação da Linguagem Sonora (US) • Localização Temporal (UK)
• Limiar da Audição e Linguagem (UA, UT,
Inteligência/Processamento Auditivo (Ga) • Resistência a Estímulos Auditivamente • Avaliação e Discriminação musical (U1,
UU)
Distorcidos (UR) U9)
• Tom Absoluto (UP)
• Memória para Padrões de Sons (UM) • Manutenção e Avaliação do Ritmo (U8)
• Localização Sonora (UL)
• Memória Associativa (MA) • Fluência para Expressões (FE)
• Memória para Significados (MM) • Facilidade de nomear (NA) • Sensibilidade p/ Problemas (SP)
Armazenamento e Recuperação Associativa
• Memória Espontânea (M6) • Fluência de Palavras (FW) • Originalidade/Criatividade (FO)
a Longo Prazo (Glr)
• Fluência de Ideias (FI) • Fluência Figural (FF) • Capacidade de Aprendizagem (LI)
• Fluência para Associações (FA) • Flexibilidade Figural (FX)
Velocidade de Processamento Cognitivo • Velocidade Perceptual (P)
• Facilidade Numérica
(Gs) • Velocidade de Resposta ao Teste (R9)
• Tempo de Reação Simples (R1) • Velocidade de Processamento
Tempo/Velocidade de Decisão/Reação (Gt) • Velocidade de Comparação Mental (R7)
• Tempo de Reação para Escolha (R2) Semântico (R4)
• Decodificação da Leitura (RD)
• Conhecimento do uso da Língua Nativa
• Compreensão da Leitura (RC) • Capacidade Ortográfica (SG)
Leitura-Escrita (Grw) (EU)
• Compreensão da Linguagem Verbal (V) • Capacidade de Escrita (WA)
• Velocidade de Leitura (RS)
• Capacidade para Completar Sentenças (CZ)
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ANEXO D – Classificação dos resultados do teste Pensando Criativamente com Figuras (PCF)
Resultados
Interpretação geral Interpretação clínica
(em percentil)
<5 Desempenho inferior Déficit clínico
Entre 5 e 25 Desempenho médio inferior Possível déficit
Entre 25 e 50
Desempenho médio
Entre 50 e 75
Desempenho médio superior Típico
Entre 75 e 95
Desempenho superior
> 95
Fonte: adaptado do Manual: Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey (RAVLT)