COSTA, Marcella. Ensino de História e Tecnologias Digitais
COSTA, Marcella. Ensino de História e Tecnologias Digitais
COSTA, Marcella. Ensino de História e Tecnologias Digitais
Resumo Abstract
A escola e a universidade, percebidas co- The school and the university, under-
mo espaços de conhecimento, encon- stood as knowledge places, are con-
tram-se permanentemente interpeladas stantly challenged by the new demands
pelas novas demandas da sociedade, en- of society, including the called techno-
tre as quais, aquelas relacionadas à cha- logical revolution. Considering the cur-
mada revolução tecnológica. Conside- rent debates about the digital history,
rando os debates atuais em torno da this article aims show to basic education
história digital, o texto tem por objetivo teachers and professors, the possibilities
apresentar aos professores da educação of work with/about digital technologies
básica e de nível superior possibilidades from activities with pedagogical work-
de trabalho com/sobre tecnologias digi- shops. Will be reflected about the differ-
tais, a partir de atividades com oficinas ences between the workshops and ‘tra-
pedagógicas. Analisam-se as diferenças ditional’ activity, and will be defended
entre as oficinas e as atividades ditas “tra- the point of view that them should be
dicionais”, defendendo-se que aquelas se fixed as space and time of formation
fixam como espaço e tempo de formação and research. The shared experiences
e pesquisa. As experiências partilhadas from the uses of platforms and different
com base no uso de plataformas e ferra- tools, show us the difference and the
mentas diversas evidenciam a distinção e own challenges of ‘talk about’ and ‘to
os desafios próprios do “falar sobre” e do act with’ technology in the field of edu-
“operar com” tecnologia no âmbito de cative process, as well looking for to
processos educativos. Por fim, questio- quest if them, beyond of auxiliary peda-
na-se se a tecnologia, além de recurso gogical resource, can change the rela-
pedagógico auxiliar, pode mudar a rela- tion with historical epistemology.
ção com a epistemologia histórica. Keywords: History teaching; digital
Palavras-chave: ensino de História; tec- technologies; pedagogical workshops.
nologias digitais; oficinas pedagógicas.
Prezad@s colegas,
Esta edição pretende trazer algumas reflexões acerca das práticas educa-
tivas nas aulas de História com uso de tecnologia, a partir de oficinas por mim
realizadas na educação básica e em curso de nível superior. Além do compar-
tilhamento das etapas de produção e execução das referidas oficinas, chamo
atenção para a necessidade de inserção dessa problemática nos currículos aca-
dêmicos de formação.
Ao referir-me às tecnologias digitais de informação e comunicação, acre-
dito que muitos de nós, docentes em exercício, tenhamos casos para partilhar
sobre esse assunto – alguns engraçados, outros nem tanto. Pensando nos alu-
nos do Ensino Fundamental II com os quais tenho contato, sujeitos ativos na/
da cultura digital, trago aqui dois episódios. Vejamos.
O primeiro, que gosto sempre de contar e que já explorei em outros textos,
refere-se a uma frase no dia da prova de História: “Professora, não lembro nem
o que eu comi ontem, como vou lembrar o que a gente viu no início do ano?”.
A colocação feita pelo estudante, aparentemente simples e de múltiplas possi-
bilidades interpretativas, traz, a meu ver, um tema de grande relevância que,
indubitavelmente, ainda estamos longe de esgotar: a relação com a temporali-
dade e seus inúmeros subitens, como a questão da memória, da aceleração, das
rápidas transformações, da abundância e, simultânea e paradoxalmente, da
escassez de dados e de suas respectivas fixações.
Fiquei me perguntando até que ponto a não lembrança do assunto traba-
lhado – no caso, uma questão justamente sobre temporalidade histórica com
base nas palavras de Mário Quintana nos seus escritos sobre “O tempo” – deu-
-se em função de aquele ser um aluno diária e constantemente bombardeado
por inúmeras informações de outros meios que, em grande parte das vezes,
tornam-se mais interessantes do que aquilo (ou da forma como aquilo) que é
trabalhado dentro dos muros da escola.
O segundo episódio, mais uma vez, aconteceu em uma de minhas avalia-
ções. Questionando sobre o principal bem durante a Idade Média, dando como
opções ‘terra’, ‘internet’ e ‘ouro’ e pedindo posterior justificativa da resposta,
qual minha surpresa quando uma de minhas alunas marca a ‘internet’ como
opção! Colocou ela: “Hoje em dia a idade média é muito concentrada na
internet, pois [os jovens] se comunicam por sites, blogs e redes sociais e jogam
muitos games”. A Idade Média, ao que parece, tornou-se Idade Mídia...
Essas situações, sem dúvida, multiplicam-se nas salas de aula, ora trazendo
desconforto a muitos docentes, ora sinalizando-nos que é preciso mudar as for-
mas de educar. Mudar como? Mudar para onde? Aonde queremos chegar?
Estamos fadados a “ter que” usar tecnologia? Para quê, exatamente? Entendo
que precisamos achar um “caminho do meio” quando o assunto é tecnologia:
nem as “lamentações nostálgicas”, nem os “entusiasmos ingênuos” (Chartier,
2002).
Não compreendo que uma aula de História, para ser boa e atrativa, deva,
necessariamente, fazer uso de tecnologia, até porque há muitas limitações nesse
processo que não podem ser desconsideradas (em termos materiais, pedagógicos
e formativos). Todavia, tenho procurado discutir sua potencialidade no processo
do fazer e do ensinar História, e questionado se ela, além de recurso pedagógico
auxiliar, pode mudar a relação com a epistemologia histórica. Será que já para-
mos para pensar nisso e nas implicações disso em nosso ofício diário?
Neste contexto, é primordial diferenciar a noção de história digital
(Carvalho, 2014; Costa, 2015; Lucchesi, 2014; Maynard, 2011; Noiret, 2015) da
história por meios digitais, pois a história digital “não é feita apenas pela utili-
zação de novas ferramentas digitais que facilitam as velhas práticas”, mas se
trata “também do desenvolvimento de uma relação estreita com as tecnologias
suscetíveis em modificar os próprios parâmetros da pesquisa [e de ensino]”
(Noiret, 2015, p.33).
Acredito que estamos em um momento de transição, o que explica a fraca
visibilidade dessas discussões sobre o digital nos currículos de formação de
professores (Costa, 2015). É compreensível, portanto, o depoimento de muitos
de nossos colegas educadores de que “estamos perdidos” em meio a esse mun-
do midiatizado. Muitos docentes, mesmo na Academia, reconhecem a impor-
tância do tema, mas não sabemos bem de que forma os trabalhar; minha in-
tenção aqui, ao partilhar algumas experiências em que estive diretamente
envolvida, não é mostrar o caminho certo e único para problematizar o digital,
mas apresentar possibilidades concretas de trabalho ao professor-leitor.
Por que essas atividades se deram em formato de oficinas? As proposições
de Mediano (1997) e Andrade & Lucinda (2011), dialogando com autores em
E ainda:
Mediano (1997, p.98) afirma que “a oficina é uma realidade complexa, que,
embora privilegie o trabalho de campo, deve integrar num único esforço três
instâncias básicas: um trabalho de campo, um processo pedagógico e uma rela-
ção teórico-prática”. Para a autora, é importante que os participantes saiam com
o novo conhecimento sistematizado e aptos para o que ela chama de uma nova
ação transformadora em relação à anterior. Complementa afirmando que “a
oficina não pode ser apenas um espaço em que se conversa, se conhecem novas
pessoas e se vai para casa satisfeito”, ela “pressupõe que o participante saia dela
capacitado para uma ação mais coerente e consequente, com o seu compromisso
de transformação da realidade em que atua” (Mediano, 1997, p.99).
Já Andrade & Lucinda (2011) trazem algumas concepções sobre oficinas
pedagógicas, comparando-as a um fazer artesanal e valorizando-as como pos-
sibilidade de articulação entre teoria e prática. Podendo ser vistas como espaço
e tempo de formação, comentam que se tornaram uma febre entre os/as edu-
cadores/as, mas que ainda pouco se sabe sobre o que elas são, seu potencial e
o que trazem no sentido de inovar. O olhar histórico permite compreender
que oficinas se constituíram em local de trabalho e como espaço de ensinar e
aprender, sendo que, para aqueles autores, seu produto final é fruto do trabalho
de todos e entre todos. “A oficina é o local da ‘manufatura’ e da ‘mentefatura’,
1. Educação básica
Objetivo geral:
Desnaturalizar as formas de comunicação contemporâneas, compreendendo os
ritmos e durações diferenciados dos processos de transformação das formas de
comunicação.
Objetivos específicos:
Problematizar os consumos e formas de acesso à comunicação; explorar
conscientemente as potencialidades e os limites oferecidos por estas ferramentas
para a formação do aluno;
Operar com a noção de simultaneidade, percebendo as diferentes temporalidades
dentro dos ritmos e durações dos processos de transformação das formas de
comunicação;
Explorar permanências do passado no nosso presente no que tange às formas de
comunicação.
2. Educação Superior
REFERÊNCIAS
NOTAS
1
Programa da Capes voltado para o “aperfeiçoamento e a valorização da formação de pro-
fessores para a educação básica”. Disponível em: http://www.capes.gov.br/educacao-basi-
ca/capespibid; Acesso em: 13 out. 2015.
2
Os trechos selecionados foram das seguintes composições: “Atoladinha” (Bola de Fogo),
“Telegrama” (Exaltasamba) e “Pela Internet” (Gilberto Gil).
3
A dinâmica do telefone sem fio foi uma forma de sensibilizar os alunos para o tema que
seria discutido, evidenciando, mediante a brincadeira, os “ruídos” inerentes aos processos
comunicativos.
4
Essas imagens continham formas inusitadas de comunicação (como lençol, pipa e fuma-
ça), gráficos mostrando como os próprios alunos usam essas novas tecnologias (feitos a
partir dos questionários que serão discutidos no próximo tópico) e montagens sobre os
temas: afeto, viagem, inventores/invenções, poder e memória.
5
Outro programa da Capes que visa investir na educação básica.
6
O site do museu é: http://www.museudapessoa.net/; Acesso em: 5 out. 2015.
7
Essa “nuvem de palavras” foi criada pela equipe mediante a utilização do site http://www.