Sequencia Didática Racismo

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UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA PARA O DEBATE E O COMBATE AO RACISMO

Leandro Regis

Florianópolis/SC
2019
FICHA TÉCNICA DO PRODUTO EDUCACIONAL.

Título: Uma Sequência Didática para o Debate e o Combate ao Racismo.

Vínculo do Produto: Dissertação de Mestrado: A Contribuição do Ensino de História para


a Formação dos Estudantes dos Cursos Técnicos Integrados de Química e de Informática do
IFSC – Câmpus Gaspar: o Racismo em Debate.

Origem do Produto: Produto educacional apresentado ao Centro de Referência e Formação


em EaD (CERFEAD), do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa
Catarina (IFSC), como requisito para a obtenção do grau de Mestre Profissional em Educação
Profissional e Tecnológica em Rede Nacional (ProfEPT).

Autor: Leandro Regis.

Orientador: Prof. Adriano Larentes da Silva, Dr.

Público-alvo: Professores de História e educadores em geral.

Finalidade: Expor propostas para a inserção e o debate em torno do racismo no contexto da


sala de aula.

Registro: eduCAPES.

Local: Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. Ano: 2019.

Palavras-chave: Sequência Didática; Pedagogia Histórico-Crítica; Racismo.


SUMÁRIO

5 30
Apresentação Análise Geral Da Apresentação Dos Vídeos

6 37
Produto Educacional E Sequência Didática: Considerações Finais Relativas À Aplicação
O Que São? Da Sequência Didática: Uma Formação

7 Histórica E Indispensável

Racismo e Teorias Racialistas 37


10 Algumas Dimensões Apreendidas Pelos
Sujeitos Envolvidos Nesta Sequência
Manifestações Racistas Na Região Onde Se Didática, Considerando As Variáveis
Encontra O Ifsc – Câmpus Gaspar Adaptadas De Gasparin, Com Suporte Na
12 Pedagogia Histórico-Crítica

A Valorização Da História E Da Cultura Afro- 41


Brasileira: Dialogando Com a Legislação
Referências
15
Pensando a Sistematização Para a Sequência
Didática: Uma Possibilidade

23
Prática Social Inicial Do Conteúdo,
Problematização E Instrumentalização:
Relato Da Primeira E Segunda Aulas

29
Subtemas Para Os Vídeos a Serem
Produzidos Pelos Estudantes

30
Entre a Catarse e a Prática Social Final
Do Conteúdo: Terceira E Quarta Aulas: A
Apresentação Dos Vídeos Produzidos Pelos
Alunos E Alunas
APRESENTAÇÃO

Este produto educacional é uma adaptação do texto presente na Dissertação a qual este
encarte está vinculado, tendo em vista a perspectiva de possibilitar a apreciação de forma concisa
e didática do produto ora realizado. Dessa forma, este encarte objetiva expor o desenvolvimento
da sequência didática efetuada junto ao IFSC – Câmpus Gaspar, nas turmas de 4ª fase dos
Cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio de Química e de Informática. Eram ao todo, em
ambas as turmas, 63 alunos matriculados nessa fase do curso, no segundo semestre de 2018.
A sequência didática aqui apresentada, trata da temática do racismo e trouxe à tona esse
debate por intermédio da disciplina de História. Ao abordar essa temática vislumbrou-se ampliar
a consciência histórica dos estudantes a respeito dessa mazela que se entremeia no tecido social
ao longo do tempo, e que se mantém viva atualmente, manifestando-se de maneiras diversas.
Trabalhar a formação do pensamento crítico é um dos determinantes do que é chamado
Ensino Médio Integrado. A valorização da integração entre saberes técnicos-profissionais e
formação humanística perpassa a oferta de se realizar atividades que tencionam os sujeitos
a compreender características que tornam nossa sociedade ainda tão desigual, e uma destas
marcas, é o racismo. Nesse sentido, mostramos adiante o processo desde a produção até a
aplicação das atividades.

Prezad@ Professor(a) ou demais educadores, esperamos que esta sequência didática


possa lhe auxiliar no desenvolvimento de atividades que visam inserir e debater a
temática do racismo, no âmbito da sala de aula.

5
PRODUTO EDUCACIONAL E SEQUÊNCIA DIDÁTICA: O QUE SÃO?

O produto educacional é uma recomendação exposta no regulamento do Mestrado


Profissional em Educação Profissional e Tecnológica (ProfEPT) e sua definição é trazida pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que explicita o
seguinte acerca do Mestrado Profissional e dos produtos educacionais:
“O Mestrado Profissional destaca a produção
técnica/tecnológica na área de Ensino,
entendida como produtos e processos
educacionais que possam ser utilizados por
professores e outros profissionais envolvidos
com o ensino em espaços formais e não-
formais. Produtos educacionais podem ser, por
exemplo: [...] Propostas de ensino (sugestões
de experimentos e outras atividades práticas,
sequências didáticas, proposta de intervenção,
roteiros de oficinas, etc.) [...]” (CAPES, 2013).
A sequência didática se apresenta como uma dentre várias formas de se organizar o
planejamento e a implementação de aulas. Essa proposição didático-pedagógica permite que
possam ser trabalhadas atividades diversas, tomando-se por base determinado assunto, em que
a temática central serve de eixo condutor para que, por meio de uma concatenação sequencial
de atividades se possa chegar à uma reflexão, tanto por parte dos alunos, quanto por parte do
próprio docente, mais aprofundada do tema central. A condução dos estudos sobre determinado
assunto pode entrelaçar vários métodos de absorção e debate do conteúdo, tais como: leitura,
aula expositiva e dialogada, produção de vídeos, exibição de reportagens, teatros, debates,
escrita, etc., possibilitando a assimilação, reflexão e ampliação do conhecimento a partir do
encadeamento das atividades executadas. Pois a sequência didática se configura como:

“[...] um conjunto de atividade ordenadas,


estruturadas e articuladas para a realização
de certos objetivos educacionais, que têm um
princípio e um fim conhecidos tanto pelos
professores como pelos alunos” Zabala (1998,
p. 18).
“Ao organizar a sequência didática, o professor
poderá incluir atividades diversas como leitura,
pesquisa individual ou coletiva, aula dialogada,
produções textuais, aulas práticas, etc., pois
a sequência de atividades visa trabalhar um
conteúdo específico, um tema ou um gênero
textual da exploração inicial até a formação de
um conceito, uma ideia, uma elaboração prática,
uma produção escrita” (BARROS-MENDES;
CUNHA; TELES, 2012, p. 21).
6
RACISMO E TEORIAS RACIALISTAS

A definição de etnia e de raça possui uma pluralidade de sentidos, pois seus conceitos
foram determinados de maneira diferente ao longo da história, contudo, não nos cabe, nesse
momento, detalhar tal esquema.
No entanto, como característica geral, o termo raça é usado para a diferenciação entre
os seres humanos a partir de pressupostos morfo-biológicos, isto é, à partir de distinções como
o formato do nariz, do crânio, cor da pele, etc. Em outra ponta, mas no mesmo sentido, o termo
etnia se constrói com base nas propriedades sócio-culturais, históricas e psicológicas, ou seja,
ancestralidade em comum, religião em comum, mesma cultura, etc. Isso dá a dimensão de que
podemos ter várias etnias sob uma mesma “raça” (MUNANGA, 2003).
O racismo está vivamente presente em nosso cotidiano sob um paradigma estigmatizante
vinculado, por exemplo, à cor da pele, em especial, pela própria construção histórica da
sociedade brasileira, num processo de hierarquização entre brancos e negros, sendo os brancos,
a “raça superior” e os negros, a “raça inferior”. Esse assombro se modula como um problema
para o desenvolvimento de uma coletividade que pensa caminhar para a convivência digna,
justa e pacífica entre os sujeitos.

“Numa sociedade regida esteticamente pelo


paradigma branco, conforme o caso brasileiro,
a clareza da pele persiste como uma marca
simbólica de superioridade imaginária, que
atua como estratégia de distinção social ou de
defesa contra as expectativas colonizadoras
de miscigenação. Do mesmo modo como as
elites de hoje rejeitam o racismo doutrinário, a
mídia tende a negar a existência do racismo”
(CANDAU, 2003, p. 22).

“Apesar do discurso que nega ou ameniza a


presença do preconceito e da discriminação
racial no país, não é difícil ver manifestações de
racismo no dia-a-dia da vida social brasileira.
Ora ele é escancarado, como nos massacres
frequentes, ora é silencioso” (NUNES, 2006, p.
96).

7
Adstrito ao racismo estruturalmente conectado à desvalorização do povo negro,
subsidiado pela história escravocrata do Brasil, existe em paralelo à esta situação, outra
substância que permeia as ramificações envolvidas na discriminação racial: as chamadas teorias
racialistas. Essas teorias se compuseram, de maneira genérica, pela perspectiva da cientificidade
como justificativa para embasar a hierarquização entre distintos grupos humanos.
As teorias racialistas se originaram na Europa, por intermédio de estudiosos como,
Joseph Arthur de Gobineau (1816-1882); Herbert Spencer (1820-1903) e Houston Stewart
Chamberlain (1855-1927).

Joseph Arthur de Gobineau (1816 – 1882):


foi um dos principais autores do chamado
racialismo científico. Dizia que a qualidade das
ações humanas era fruto da cor e, por conta
disso, a miscigenação geraria degeneração,
inclusive, falando do Brasil (BARBOSA,
2016).

Darwinismo Social (Herbert Spencer 1820-


1903): “No século XIX, as crenças científicas,
oriundas das concepções do Darwinismo
Social e do Determinismo Racial, alocaram os
africanos nos últimos degraus da evolução das
“raças” humanas. Infantis, primitivos, tribais,
incapazes de aprender ou evoluir, os africanos
deveriam receber a benfazeja ajuda europeia,
por meio das intervenções imperialistas no
Continente” (OLIVA, p. 436 apud ALVES
2016, p. 101).

Houston Stewart Chamberlain (1855 – 1927): em


uma de suas principais obras: “Os fundamentos
do século XIX” – analisa de maneira ampla e
tendenciosa a cultura europeia, onde ele diz que
os arianos eram o auge da evolução da humana
(PIMENTA, 2015).

A teoria de Chamberlain foi fundamental para a o surgimento do ideário nazista de raça


pura, sendo que seu trabalho influenciou diretamente Adolf Hitler e suas concepções de homem
e de mundo.

8
Em nosso país, temos como demonstração de articuladores de teorias racialistas pessoas
como: Sílvio Romero (1851-1914); Nina Rodrigues (1862-1906) e; Oliveira Vianna (1883-
1951).

“Sílvio Romero (1851-1914), advogado,


historiador e membro do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, principal expoente do
branqueamento” (BARBOSA, 2016, p. 266).

Apostava que a mestiçagem faria os sangues negro e índio desaparecerem.

Nina Rodrigues (1862-1906): “Sua visão


pessimista sobre a composição racial brasileira
era apoiada no conceito de degeneração de
Agassiz e Gobbineau, considerando o mestiço
como um degenerado físico e o negro como um
dos fatores de nossa inferioridade como povo.
Opunha-se à ideia de branqueamento, segundo
a qual a miscigenação levaria naturalmente
a uma raça branca, pois achava que a mistura
racial apenas ajudaria na eliminação do sangue
branco na sociedade brasileira” (BARBOSA,
2016, p. 267).

Oliveira Vianna (1883-1951): “[...] o sucesso


do projeto de Vianna baseava-se em causas
tidas como “naturais” da “superioridade da
raça branca”, como: a maior reprodução da raça
branca; a maior taxa de mortalidade dos negros
e mulatos, submetidos à miséria e à fome após
a abolição; e no controle político-ideológico
do projeto eugenista através da imigração
europeia” (BARBOSA, 2016, p. 267).

9
A influência das teorias racialistas, no Brasil, embora com sutilezas distintas daquilo
que estava em voga na Europa, repetiam o discurso da superioridade dos “homens brancos”
perante o povo afrodescendente que vivia em terras brasileiras.
Podemos verificar que as teorias racialistas ainda deixam marcas no cotidiano social
brasileiro, isso está posto tendo em vista que:

“Os reflexos podem ser verificados na


desvalorização da mão-de-obra, que, em última
instância, fundou a ideia de profissões mais
e menos valorizadas, os perfis associados à
criminalidade e outros estereótipos sociais que
reportam a este imaginário criado pelas teorias
racialistas” (PIMENTA, 2015, p. 62).

A afirmação acima descrita, nos dá a medida de como essas teorias seguem, ainda que
tenham sido suplantadas no próprio espectro da Ciência, na sociedade brasileira, e em conjunto
com a herança de desvalorização dos negros por conta da escravatura, a manter estruturas
racistas que vão desde as chacotas “sem maldade” à explicitude dos subempregos e da violência
– em suas mais variadas formas - sofridas por negros e negras. Essa triste realidade não é
diferente na região onde se situa a instituição em que ocorreu a atividade proposta.

MANIFESTAÇÕES RACISTAS NA REGIÃO ONDE SE ENCONTRA O IFSC –


CÂMPUS GASPAR

Do ponto de vista de onde se localiza o IFSC – Câmpus Gaspar e, por consequência os


alunos e o professor de História, as notícias e os diálogos que podemos ouvir em muitos momentos
de nossas vidas, infelizmente, acabam envolvendo o preconceito para com os afrodescendentes,
seja nos meios de comunicação e nas mídias sociais, seja no discurso de antepassados ou nas
piadinhas contadas a todo o momento, o preconceito se encontra naturalizado perante a presença
de discursos estúpidos e repletos de ignorância.

Preconceito étnico-racial em Gaspar-SC

Fonte: adaptado de Pereira (2011).

10
A reportagem que trata do preconceito em Gaspar nos fornece a passagem aqui transcrita:
“eu trabalhava como pedreiro em uma casa na rua Sete e a dona da casa falou para o meu patrão
não deixar eu e os colegas sozinhos na casa dela, pois como éramos negros, poderíamos roubar
alguma coisa”.
Interessante observar a fala, na reportagem, daquele que sofre o preconceito: “isso me
deixou muito sentido. Sou um homem honesto e a cor da minha pele não tem relação com meu
caráter”, segue o personagem... “as pessoas falam que não existe preconceito, mas na minha
opinião existe sim. Acho que ele só está mascarado por causa da Lei”.

Preconceito étnico-racial em Blumenau-SC

Fonte: adaptado de Santa Catarina NSC (2017).

Na imagem acima, podemos observar o fato ocorrido em Blumenau-SC, em que um


advogado negro teve, no poste em frente ao local onde mora e na própria casa, colados cartazes
com ameaças e, não apenas aos negros, mas a grupos religiosos e posições ideológicas de
esquerda. Carregado de símbolos de supremacia branca, tais como as vestes do Klu Klux Klan
e a cruz que representa esse grupo, esta simbologia trazida pelo cartaz, é uma manifestação
subsidiada pelas teorias racialistas.
As reportagens trazem a dimensão aberta do caráter racista, mas não nos esqueçamos de
que as notícias não dão conta do racismo sofrido no cotidiano, o racismo disfarçado e tão ruim
quanto, aquele que acontece quando alguém sai de perto do negro ou negra no ônibus, aquele
percebido pelo olhar de desprezo direcionado alguém que possui a pele escura, dentre outras
formas que não ocupam as manchetes dos jornais.

11
A VALORIZAÇÃO DA HISTÓRIA E DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA:
DIALOGANDO COM A LEGISLAÇÃO

Tratar da temática do racismo não pode deixar de passar pelo o que afirma a Constituição
Federal do Brasil (1988):

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da


República Federativa do Brasil: I - construir
uma sociedade livre, justa e solidária; II -
garantir o desenvolvimento nacional; III -
erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir
as desigualdades sociais e regionais; IV -
promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação” (BRASIL, 1988).

“Art. 5º, inciso XLII. A prática do racismo


constitui crime inafiançável e imprescritível,
sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”
(BRASIL, 1988).

Posto isso, verificamos do que se trata a Lei Federal nº 12.519 de 10 de novembro de 2011.
Ao observarmos o seu Artigo 1º, temos a seguinte redação:

“É instituído o Dia Nacional de Zumbi e


da Consciência Negra, a ser comemorado,
anualmente, no dia 20 de novembro, data
do falecimento do líder negro Zumbi dos
Palmares”.

Zumbi é o nome do personagem negro mais emblemático na luta contra a escravidão, e


Palmares, é o nome dado ao quilombo que representa o espaço conhecido como Quilombo dos
Palmares, tido como maior reduto de resistência negra contra a escravidão, um dos principais
locais para onde os negros fugidos da escravatura se escondiam e, assim, tornando-se um local
de resistência no embate contra as forças brancas e escravistas coloniais, na perspectiva de luta
pela real libertação dos negros e negras, do processo escravocrata. O Quilombo dos Palmares
fora destruído em 1695 e Zumbi, o principal líder quilombola, morto e decapitado (ARAÚJO,
2006).

12
Zumbi (1927), pintura de Antonio Parreiras
(1860 – 1937) / Acervo do Museu Antônio
Parreiras, Niterói.

Fonte: brasilianafotografica.bn.br (2015)


Segundo Pimentel (2018), o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra é uma
data simbólica e que homenageia os afrodescendentes e alude a participação dessa população
na construção do Brasil, enquanto país, nos mais diversos aspectos, tais como social,
econômico, político e cultural. Contudo, ao se reconhecer a população negra como pilar para
o desenvolvimento nacional, não se pode perder de vista que, ademais, “a data faz um alerta
sobre a importância em conscientizar a população sobre o racismo e o preconceito que continua
evidente mesmo após os 130 anos da abolição da escravatura”.
Elencamos à seguir aspectos legais, que tornam obrigatório a inclusão, no âmbito
escolar, da chamada rede oficial de ensino, a temática a respeito da História e da Cultura Afro-
brasileira e Indígena.
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
“Nos estabelecimentos de ensino fundamental
e de ensino médio, públicos e privados, torna-
se obrigatório o estudo da história e cultura
afro-brasileira e indígena. § 1o O conteúdo
programático a que se refere este artigo incluirá
diversos aspectos da história e da cultura que
caracterizam a formação da população brasileira,
a partir desses dois grupos étnicos, tais como
o estudo da história da África e dos africanos,
a luta dos negros e dos povos indígenas no
Art. 26 - A da LDB (1996)
Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e
o negro e o índio na formação da sociedade
nacional, resgatando as suas contribuições nas
áreas social, econômica e política, pertinentes à
história do Brasil § 2o Os conteúdos referentes
à história e cultura afro-brasileira e dos povos
indígenas brasileiros serão ministrados no
âmbito de todo o currículo escolar, em especial
nas áreas de educação artística e de literatura e
história brasileiras (BRASIL, 1996).
“[...] O calendário escolar incluirá o dia 20 de
Art. 79 - B da LDB (1996) novembro como ‘Dia Nacional da Consciência
Negra’” (BRASIL, 1996).
13
O aparecimento dos artigos 26-A, seu preâmbulo e §§ 1º e 2º e 79-B, são resultantes
das seguintes leis:

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de


1996, que estabelece as diretrizes e bases da
Lei nº 10.639, de 9 de educação nacional, para incluir no currículo
janeiro de 2003. oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e
dá outras providências.

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de


1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de
janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes
Lei nº 11.645, de 10 de
e bases da educação nacional, para incluir
março de 2008.
no currículo oficial da rede de ensino a
obrigatoriedade da temática “História e Cultura
Afro-Brasileira e Indígena”.

Após a promulgação da Constituição de 1988,


Diretrizes Curriculares o Brasil busca efetivar a condição de um Estado
Nacionais para a Educação democrático de direito com ênfase na cidadania
das Relações Étnico- e na dignidade da pessoa humana, contudo,
Raciais de 2004, nos ainda possui uma realidade marcada por
aponta que: posturas subjetivas e objetivas de preconceito,
racismo e discriminação aos afrodescendentes.

Tendo em vista os fundamentos teóricos acerca do racismo e os marcos legais para


a discussão a respeito da questão da História e da Cultura Afro-brasileira aqui apresentados,
partimos adiante para a sistematização da sequência didática.

14
PENSANDO A SISTEMATIZAÇÃO PARA A SEQUÊNCIA DIDÁTICA:
UMA POSSIBILIDADE

Importância do planejamento no contexto educacional

A conduta de planejar requer “[...] organização,


sistematização, previsão, decisão e outros
aspectos” Leal (2005, p. 1). Refletir sobre tais
pontos indica a percepção de que o que pode ser
trabalhado no espaço escolar deve ser pensado
e organizado de modo a dar sentido aos temas a
serem trazidos pelos alunos ou pelos professores
ou por ambos em uma decisão regida pelo
diálogo e pela constatação de importância
acerca de determinados debates.

Preparar o desenvolvimento de atividades


escolares requer avançar no entendimento de
que a organização dos momentos e temáticas
a serem contextualizados no processo de
ensino-aprendizagem não se traduzem em
um mero “[...] preenchimento mecânico de
formulários e outros documentos para controle
administrativo” (MATEUS, 2014, p. 115).

Encarar o planejamento no contexto


educacional para além de meras formalidades
sugere, compreender que “[...] do ponto de
vista educacional, o planejamento é um ato
político-pedagógico porque revela intenções e a
intencionalidade, expõe o que se deseja realizar
e o que se pretende atingir” (LEAL, 2005, p. 1).

15
Reunião com o professor
Mateus para planejar a
sequência didática.

Fonte: acervo do autor (2018).

Plano de aulas fornecido pelos professores de História do IFSC - Câmpus Gaspar.

Fonte: adaptado de SIGAA (2018).

Com o auxílio do Plano de Aulas, passou-se a pensar em como realizar o processo


de ensino-aprendizagem mediado pelo pensamento histórico e crítico, com a finalidade
de os estudantes se perceberem enquanto sujeitos históricos e capazes de interpretar os
acontecimentos, com vistas à modificações primordiais em nossa sociedade.

16
Assim, defendemos como base para o desenrolar do processo de aplicação desta
sequência didática, a didática baseada no pressuposto pedagógico de Saviani (2012), chamada
de pedagogia histórico-crítica.

Explicita fenômenos da vida em geral que


passo
podem ser comuns a alunos e professores.
Embora, não se possa perder de vista que o
professor tenda a ter mais elaboradamente a
visão da totalidade da realidade.
Prática Social


Envolve saber que questões precisam ser
resolvidas acerca de determinado assunto
passo junto ao conhecimento fundamental a ser
compreendido.
Problematização

É a apropriação de instrumentos teóricos e


práticos para o entendimento das relações que


passo
levam a certos fenômenos sociais se realizarem
ou não, tal apropriação pode ser estimulada –
transmitida pelo professor – ou este fornecer
elementos para os estudantes buscarem tais
Instrumentalização apropriações.


É o momento em que os conhecimentos
cientificamente elaborados se entrecruzam com
passo as práticas sociais, elevando o entendimento
acerca dos eventos sociais.
Catarse
É o momento em que os estudantes têm a
possibilidade de concretizar, embasados nos
passos anteriores, as pressupostos que visam


passo
rever/remodelar todo o conjunto de ações
perante os fenônemos sociais. Tal concretude
não se restringe apenas às ações empíricas, mas,
também, no próprio pensamento reelaborado à
Prática Social partir de todo o suporte dado pela pedagogia
histórico-crítica.
Fonte: Escola e Democracia (SAVIANI, 2012)

17
Com a intenção de se apresentar de forma prática a proposta da pedagogia histórico-
crítica, esboçaremos adiante, baseados no autor José Luiz Gasparin (2003) e no seu livro: Uma
didática para a pedagogia histórico-crítica, aporte didático para a consecução deste produto
educacional.

Uma possibilidade de debater o racismo junto ao ensino de História, tendo como base a
pedagogia histórico-crítica

Instituição: IFSC – Câmpus Gaspar


Disciplina: História / Unidades: entre o fim do Brasil Império e a I e II Guerras Mundiais
Fase: 4ª / Horas-Aula (Quantidade de aulas): 4
Professor: Mateus Cavalcanti Melo em colaboração com o mestrando Leandro Regis.

Unidade de conteúdo: situa-se entre o fim do


Brasil Império: abolição da escravatura e as I e
II Guerras Mundiais.
Objetivo Geral: observar situações dos negros
pré e pós abolição da escravatura e movimentos
ditos científicos de teorias racialistas e como
tais situações ajudam na predisposição ao
racismo, além de enfatizar a importância do Dia
Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.
Objetivos Específicos: a) fornecer aos alunos
a possibilidade de perceberem nuances que
envolvem a abolição da escravutura, que não
significou a plena dignificação dos negros
Prática Social Inicial e negras; b) possibilitar a percepção de que
do Conteúdo mesmo com a abolição da escravatura, havia,
ao mesmo tempo, a concepção de teorias
racialistas que procuravam embasar uma
pretensa superioridade branca na Europa, e
como tais teorias foram adaptadas ao contexto
brasileiro; c) compreender como até hoje
o racismo encontra-se “vivo” nos diversos
âmbitos da vida humana, seja na vida social
geral ou profissional e; d) fomentar o combate
o ao racismo.

Vivência cotidiana do conteúdo:


- O que os alunos já sabem sobre o conteúdo.
Listagem de conteúdos:
- Explicitar o Dia Nacional de Zumbi e da consciência negra.
- O que significou a abolição da escravatura.
- O que são teorias racialistas.
- Notícias e vídeo-reportagens sobre o racismo na atualidade.
18
Apresentação do problema:
- Discussão sobre como eram tratados os negros
já próximos a abolição e, também, após a Lei
Áurea;
- Como as teorias racialistas chegaram ao Brasil
e ajudaram a prejudicar a visão sobre negros e
Problematização negras, mesmo já não sendo escravos;
- Como se mantem o racismo nos dias de hoje.

Dimensões trabalhadas:
Conceitual: o que é o dia da consciência negra? O que são as teorias racialistas?
Sócio-histórica: como que a escravidão e as teorias racialistas ainda influenciam o racismo
cotidiano?
Econômica: por exemplo; o tratamento no âmbito profissional.
Política: ações governamentais para minimizar/erradicar o racismo.
Cultural: o cotidiano de inferiorização do povo negro e a necessária valorização de sua cultura.
Filosófica: A compreensão e a superação do racismo relaciona-se à formação humana dos
sujeitos.

Ações didático-pedagógicas:
- Exposição oral;
- Diálogo com os alunos e produções dos
próprios alunos (vídeos).
- Recursos humanos e materiais;
- Vídeos;
- Noticias de jornais;
Instrumentalização
- Letras de música;
- Legislação.

19
Síntese mental do aluno:
Perceber que o racismo se manifesta em
diferentes ambientes, se apoia em teorias
longíquas, mas que persistem em formatos,
ora explícitos, ora implícitos e dissimulados.
A prática racista se estrutura com base na
percepção histórica da escravidão, e das teorias
racialistas que buscaram legimitar o racismo
por meio da ciência. Perceber que tais teorias
já foram suplantadas e que a escravidão deve
Catarse ser recordada enquanto atrocidade humana
realizada baseada em pensamentos arcaicos de
hierarquização humana.
Expressão da síntese:
- Diálogo e associação à prática social final do
conteúdo.

Nova postura:
- Participar de momentos voltados ao combate
ao racismo.
- Conhecer como o racismo se manifesta em
diversas situações do dia-a-dia.
- Valorizar, por meio de música, poesia, etc.: a
cultura Afro-brasileira.
- Respeitar, conviver e aprender com negros e
negras.
Ações dos alunos:
- Produzir vídeos que demonstram o racismo
Prática Social Final hoje.
do Conteúdo - Procurar refletir o racismo para auxiliar no
combate a tal mazela social: no cotidiano social
em geral e no profissional.
- Entender e valorizar o conhecimento histórico
como parte de uma formação integral.

Fonte: Proposta elaborada pelo autor a partir dos passos pedagógicos propostos por Gasparin (2003).

Para transpor as fases estipuladas pela pedagogia histórico-crítica para o contexto


da sala de aula, foi elaborado em conjunto com o professor Mateus, um planejamento
apresentado a seguir, para auxiliar as ações a serem executadas em cada aula.

20
Planejamento por aulas; objetivos; atividades e materiais utilizados

1ª Aula - Prática Social Inicial do Conteúdo

Objetivos Atividades e Materiais Utilizados

- Levantar por meio de questionário a - Questionário com perguntas fechadas;


relação dos alunos com a temática do - Demonstração por meio de exposição/ slides
preconceito étnico-racial; e diálogo com os alunos acerca do que
- Inserir a temática do racismo no contexto é o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência
da sala de aula – levando em consideração Negra e da relação do racismo com o período
a proximidade do Dia Nacional de Zumbi e pré e pós abolição da escravatura, bem como
da Consciência Negra; conhecer as teorias racialistas que estavam
- Propiciar a aproximação com conteúdos em voga no mesmo período histórico da Lei
que foram e/ou serão vistos pelos alunos no Áurea (1888), a fim de demonstrar como esta
decorrer das demais aulas do componente lei não foi suficiente para, além da abolição da
curricular História. escravatura, “abolir” a mentalidade racista das
pessoas.

2ª Aula – Problematização e Instrumentalização

Objetivos Atividades e Materiais Utilizados

- Permitir aos alunos visualizarem práticas - Amostra de notícias de jornais da época da


de preconceito no contexto local e nacional escravatura e de jornais locais da atualidade,
e/ou mundial; que apresentam reportagens de práticas
- Possibilitar a compreensão de que o racistas;
preconceito étnico-racial também está - Amostra de vídeo-reportagens de pessoas
presente tanto nas relações sociais em geral, negras que sofreram preconceito no local de
quanto da dimensão profissional, e que trabalho, e de documentário que trata do tema
advém tanto do preconceito propiciado pelo do racismo em vários espaços sociais;
processo escravista, quanto pela pretensa - Dividir os alunos em grupos, para
cientifização de teorias que separavam os apresentarem vídeos acerca da historicidade
humanos em raças. do preconceito étnico-racial, da valorização
da História e da Cultura Afro-brasileira, de
como se manifesta o racismo na atualidade,
com as seguintes temáticas: mulheres negras;
juventude negra; negros e trabalho; haitianos e
convivência social.

21
3ª e 4ª aulas – Catarse e Prática Social Final do Conteúdo

Objetivos Atividades e Materiais Utilizados

- Promover uma atividade em que os alunos, - Imergir em situações reais de preconceito e


por meio da elaboração de vídeos pudessem discriminação;
trazer à tona a temática do racismo, - Deixar, ao final da aula e dos debates
procurando valorizar História e a Cultura entremeados nos vídeos, tocar a música
Afro-brasileira, o combate ao racismo e Lavagem Cerebral de Gabriel O Pensador –
a percepção de diversas manifestações que fala sobre o preconceito;
racistas no momento atual; - Ao final das atividades, a letra da música
- Permitir que os alunos tenham contato impressa foi entregue aos alunos, como
com a tecnologia: neste caso, a produção mensagem final de combate ao racismo.
de vídeos;
- Fomentar o uso: da criatividade; da
capacidade de reflexão; da possibilidade
de pesquisar por si mesmos acerca de
determinado tema; permitir o contato com
negros e negras;
- Possibilitar a apropriação da historicidade
em que está imersa o racismo.
- Oportunizar, por meio dos debates ligados
à história de negros e negras, a ampliação
da consciência histórica relativamente
ao tempo passado, presente e futuro das
relações humanas;
- Apreender que, por estarem em um
curso profissionalizante ligado ao Ensino
Básico, não se pode destituir-se de questões
humanas e históricas prementes.

Avaliação
A avaliação proposta pelo professor Mateus se deu de forma totalizante, desde os diálogos em
sala à apresentação dos videos e debates intercalados, sob os seguintes critérios: atendimento à
proposta da discussão, criatividade e produção dos alunos.
Fonte: o autor em conjunto com o professor Mateus (2018).

22
Com a finalidade de efetivação das aulas a partir do planejamento, os materiais utilizados
foram, basicamente: o questionário – 1ª parte; a projeção de slides para delinear os conteúdos
a serem trabalhados em sala; a orientação para que os estudantes pudessem elaborar vídeos
acerca da temática do racismo; a apresentação dos vídeos elaborados pelos estudantes; a letra
da música Lavagem Cerebral de Gabriel O Pensador.

PRÁTICA SOCIAL INICIAL DO CONTEÚDO, PROBLEMATIZAÇÃO E


INSTRUMENTALIZAÇÃO: RELATO DA PRIMEIRA E SEGUNDA AULAS

Fonte: acervo do autor (2018).

No início da aula em ambas as turmas, fora passado o Questionário - 1ª parte, que


consistia em saber, basicamente, se os alunos correlacionavam o ensino de História às suas
vidas cotidianas, bem como, se tinham informações acerca das práticas racistas e se isso era
importante debater tanto do ponto de vista de sua vida social ampla quanto do profissional
propriamente dito.

23
Questionário – 1ª parte: dados gerais e dados de aproximação dos
alunos com relação ao debate acerca do racismo

Fonte: o autor (2018).

24
Ao se observar o questionário e as respostas, temos a dimensão da importância de
se debater o racismo no âmbito escolar. Alguns pontos chamam a atenção: todos os alunos
respondentes entendem que o ensino de História vincula-se à sua vida, na perspectiva de
entenderem o que acontece no mundo à sua volta; a grande maioria lembra-se de ter visto
notícias que tratavam de casos de racismo, bem como já presenciaram algum ato de preconceito
étnico-racial ou conhecem alguém que tenha sofrido algum tipo de preconceito racial. Por fim,
praticamente todos os alunos e alunas concordam que debater esse tema no ambiente escolar, se
faz importante e, claramente nas aulas de História também, pois reflete nas suas relações sociais
como um todo e podem refletir em suas relações profissionais, ao ter de lidar com pessoas que
não são da mesma origem histórica, cultural ou dar cor de pele que a sua.
Após o questionário, demos seguimento a aula, com os slides propostos e criados
junto ao professor Mateus. Desde aí sucedeu-se um debate aberto com os discentes acerca das
temáticas que iam se desenrolando no decorrer das aulas.
Esse diálogo foi norteado por intermédio da apresentação de slides, que tiveram por
proposta direcionar as discussões entre o professor Mateus e os estudantes ao longo das duas
primeiras aulas. Neles se encontram os assuntos que viabilizaram o debate acerca: do Dia
Nacional de Zumbi e da Consciência Negra; de Zumbi dos Palmares e da Lei Áurea e; das
teorias racialistas que subsidiaram o imperialismo europeu e chegaram até o Brasil. Também,
por intermédio da exposição feita em sala, foram apresentados vídeos e reportagens que
demonstram como o racismo se manifesta atualmente, em nossa sociedade.

Mosaico de apresentação dos slides, que incluem materiais como: leis, vídeo-
reportagens, notícias etc., trabalhados em sala de aula

25
3 4

5 6

7 8

26
9 10

11 12

13 14

Fonte: o autor em conjunto com o professor Mateus (2018).

27
A apresentação dos slides entremeado pelos debates entre professor e estudantes, permitiu as
seguintes discussões:

Refletir a importância da obrigatoriedade do debate a respeito da Cultura Afro-


brasileira advinda da Lei 9.394/1996, Lei 10.639/2003 e da Lei 11.645/2008, no
âmbito da sala de aula.

Dialogar acerca da importância do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra


para a valorização da História e Cultura Afro-brasileira e para a luta contra o racismo.

Rememorar quem foi Zumbi dos Palmares e a sua importância na luta contra a
escravidão. Por consequência, o dialogar a respeito do Dia Nacional de Zumbi e da
Consciência Negra se faz importante em uma região - como a que se situa o IFSC -
Câmpus Gaspar - que possui traços marcantes de racismo - poucos casos noticiados
- perante ao que ocorre de forma velada.

Perceber como os negros e negras eram tratados pouco tempo antes da Lei Áurea, ao
se observar anúncios de jornal que tratavam essas pessoas como objetos/propriedades
fugidos de seus donos.

Tratar do fato de que mesmo após a Abolição da Escravatura, os negros e negras,


no Brasil e, consequentemente, na região onde se localiza o Câmpus Gaspar, não
conseguiram exercer uma vida plena, digna e justa e que isso se conecta, dentre
outros fatores, às teorias racialistas.

Discutir como as teorias racialistas auxiliaram na colonização intensa do continente


africano, tendo por um dos estopins, a Conferência de Berlim, que intensificou a
ideia de que a África devesse ser dominada pelos europeus. E, nesse ínterim, como as
teorias racialistas - pretensamente científicas - acabaram que, mesmo com a Abolição
da Escravidão, impossibilitando aos africanos residentes em seu continente e aos
afrodescendentes recém saídos da escravidão no Brasil, terem deveres e direitos
iguais aos “brancos”.

E, por fim, com o mini-documentário Alguém falou de racismo?; as vídeo-reportagens


- a entrevista com a mulher negra vítima de racismo no trabalho e o vídeo do
Governo do Paraná, que procura perceber como pessoas brancas classificam atitudes
cotidianas iguais, mas efetuadas ora por pessoas brancas, ora por pessoas negras - foi
possível perceber e debater acerca de como a herança do período escravocrata e das
teorias racialistas insistem, em pleno século XXI, criar no imaginário das pessoas a
ideia de que há seres humanos superiores uns aos outros.

28
SUBTEMAS PARA OS VÍDEOS A SEREM PRODUZIDOS PELOS ESTUDANTES

a) Mulheres Negras: a primeira condição de discriminação, o fato de serem negras


e, a segunda, que envolve a desvalorização das mulheres em si - o que, por serem negras e
mulheres, acarreta em um duplo problema de construírem suas trajetórias nas sociedade;
b) Juventude Negra; diz respeito à luta dos jovens na busca por serem reconhecidos e as
dificuldades para se constituírem enquanto sujeitos jovens em meio ao preconceito em diversos
ambientes, tais como no ambiente escolar;
c) Negros e Trabalho – mais especificamente voltado ao mercado de trabalho e às
dificuldades enfrentadas pelos negros no âmbito profissional;
d) Haitianos: que foca no preconceito sofrido pelos imigrantes haitianos no contexto
nacional e na região onde se localiza o IFSC – Câmpus Gaspar e;
e) Convivência Social: aquilo que envolve a convivência num contexto mais geral – por
exemplo, as situações em que negros ou negras são vigiados ao adentrarem em estabelecimentos
do comércio, etc.

Com a finalidade de os alunos desenvolverem seus trabalhos em forma


de vídeo, houve a necessidade de se elencar um breve roteiro de orientação
para a produção dos mesmos.

Roteiro de orientações para a produção dos vídeos

Fonte: o autor em conjunto com o professor Mateus (2018).

29
ENTRE A CATARSE E A PRÁTICA SOCIAL FINAL DO CONTEÚDO: TERCEIRA E
QUARTA AULAS: A APRESENTAÇÃO DOS VÍDEOS PRODUZIDOS PELOS
ALUNOS E ALUNAS

A elaboração dos vídeos pelos alunos se mostrou muito interessante, os fez pesquisar
acerca do tema sem que houvesse, se assim podemos afirmar, a obrigatoriedade de transitar
entre diferentes campos do saber. Entretanto assim o fizeram, tendo em vista: o emprego da arte
em vídeos apresentados em formato de teatro; ao recorrer à música e à poesia para explicitar
ideias; trabalhar com imagens, etc., também, a Língua Portuguesa, posto que, em muitos vídeos,
houve a exibição de citações e, também, do diálogo entre personagens.

ANÁLISE GERAL DA APRESENTAÇÃO DOS VÍDEOS


Adentrando a uma análise geral da apresentação dos vídeos, destacamos alguns fatores:
1) a capacidade criativa dos indivíduos;
2) o envolvimento e a responsabilidade de se produzir debates contextualizados;
3) a noção de que debates que envolvem temas complexos como a questão do racismo, são
importantes e devem se fazer presente no âmbito da sala de aula e, no caso, do ensino de
História;
4) os jovens podem e devem ser levados a pensar para além daquilo que o senso comum tende
a naturalizar, ao permitir que eles estabeleçam relações entre vários aspectos dos temas:
a) percepção de existir o racismo;
b) o que tal prática ocasiona nas relações humanas;
c) em que concepções históricas o racismo se fundamenta e;
d) como mudar isso para o futuro.
Com isso, vê-se que, ao contrário, do que muitas vezes ouvimos “por aí”, os jovens têm
sim capacidade e personalidade para debaterem qualquer assunto, por mais complexo que seja.
Eles têm inteligência e personalidade para serem oportunizados a uma educação que extrapole
a noção de empregabilidade.

Perquirir o conhecimento histórico associado ao momento presente, denota que


situações da vida prática podem ser reinterpretadas e ressignificadas com o auxílio do
conhecimento científico – a História - a fim de produzir novas ações para o futuro – a
consciência histórica ampliada e alavancada por uma concepção educacional de formação
integral.
Imagens da apresentação dos vídeos produzidos pelos alunos

Fonte: acervo do autor (2018).


30
Mosaico com imagens retiradas a partir dos vídeos produzidos pelos alunos e alunas com a
temática: Mulheres Negras

Fonte: acervo do autor (2018).

Com relação às mulheres negras, a grande questão percebida é que, além de sofrerem
por serem mulheres, ainda são estigmatizadas por serem negras, o que eleva as dificuldades
desses seres humanos de terem garantidos e respeitados os seus direitos, bem como, terem
as mesmas oportunidades de tratamento e trabalho das mulheres brancas. Os vídeos com o
tema Mulheres Negras insinuaram diálogos que remeteram às condições das mulheres negras,
especialmente no tocante à violência sofrida pelas mulheres em geral e, sendo que as negras,
a sofriam ainda mais, por conta de sua condição histórica: sempre ocupando as posições de
menor valor, vistas mais como objetos sexuais, dentre outros fatores que as fazem ter que
ser ainda mais fortes no que se refere a luta para poderem viver de forma digna. Outra coisa
que não passou desapercebido em relação à mulheres negras, foi algo relacionado às teorias
racialistas, relativo à branquitude e os padrões de beleza, como exemplos: a questão de alisar
os cabelos e de se vestir no padrão social estabelecido pela “sociedade branca”. Em meio às
apresentações, foi relembrado o preconceito sofrido pela moça que denunciou sua chefia, em
um dos vídeos apresentados pelo professor Mateus e por mim, no ambiente de trabalho, por
manter características de beleza afrodescendente.
Isso demonstra que precisamos de consciência para buscarmos, ao mesmo tempo,
reconhecer a mulher como um ser humano digno e pleno de capacidade, e que deve haver
igualdade de condições em todos os aspectos da vida, entre “brancas” e “negras”.

31
Mosaico com imagens retiradas a partir dos vídeos produzidos pelos alunos e alunas com a
temática: Juventude Negra.

Fonte: acervo do autor (2018).

Envolto no contexto da Juventude Negra, a história de privações de direitos e o alto


índice de violência sofrido por eles se sobressaiu nas exposições dos vídeos. Violência sofrida
nas ruas e, até mesmo, no ambiente escolar. O que requer olhar atento, tendo em vista que sendo
estigmatizados ainda jovens, o futuro desses jovens negros e negras já começa a se desenhar
ainda mais dificultoso nos inúmeros setores da vida, desde ter garantido a oportunidade de
frequentar a escola, passando pela questão da profissionalização e empregabilidade até à
própria batalha para serem respeitados como tais, como jovens negros ou negras, dentro de suas
característica histórico-culturais. Tendo em vista que precisam de espaço para exercerem os
direitos que lhes são afetos e que deveriam ser respeitados como acontece com qualquer outro
jovem. Isso ainda requer muita luta e conscientização, a fim de se eliminar da mente de todos e
todas o olhar, o pensar e o praticar de ações preconceituosas.
Por meio dos vídeos, foi permitido observar que existe, de acordo com as informações
trazidas pelos estudantes, uma grande batalha a ser enfrentada no campo das políticas públicas
para que se enfrente o genocídio dos jovens negros e negras, uma vez que estes estão em maior
condição de vulnerabilidade social em relação os jovens brancos.
Mas, antes de falarmos em políticas públicas, precisamos nós mesmos, alunos,
professores, sociedade em geral, enxergar esse absurdo social que é a violência dirigida a esta
juventude. E isso passa pelo nosso dia-a-dia, com o horizonte de mudar essa conjuntura social.

32
Mosaico com imagens retiradas a partir dos vídeos produzidos pelos alunos e alunas com a
temática: Negros e Trabalho

Fonte: acervo do autor (2018).

A temática Negros e Trabalho, produziu debates importantes a respeito da discriminação


sofrida pelos negros no mercado de trabalho. Os vídeos que abordaram o tema Negros e Trabalho,
enfatizaram muito a questão dos subempregos ocupados pelos negros e negras, aqueles em que
ficam distantes de terem seus direitos trabalhistas garantidos. Não obstante, essa situação vem
desde a época da escravidão e de sua abolição. A desvalorização se dá mesmo quando negros e
brancos possuem mesma escolaridade.
Os vídeos e os diálogos realizados em sala revelaram como é difícil para o negro ou
negra serem valorizados em suas profissões. Resquícios de uma mentalidade escravocrata e
racialista.

33
Mosaico com imagens retiradas a partir dos vídeos produzidos pelos alunos e alunas com a
temática: Haitianos.

Fonte: acervo do autor (2018).

Este é um tema bastante corriqueiro nos últimos anos, também na região onde se localiza
o IFSC – Câmpus Gaspar, tendo em vista a chegada dos haitianos sobreviventes do terremoto
catastrófico ocorrido em 2010 e, igualmente, fugindo do caos político e econômico pelo qual
atravessa o Haiti há décadas.
Os vídeos que trataram de levantar a questão dos Haitianos, foram na mesma direção
daquilo que foi levantado nos vídeos que tratavam do tema negros e trabalho. Nesse caso, com
o agravante do problema relacionado a xenofobia – um preconceito direcionado a imigrantes.
Em uma região que possui um histórico de racismo com os próprios negros e negras brasileiras,
ser negro e estrangeiro torna o indivíduo ainda mais discriminado. Tudo isso se junta a toda
tristeza pelas tragédias naturais e os problemas sociais que assolam o Haiti - a terra natal dessas
pessoas.
Como as próprias imagens retiradas das apresentações trazidas pelos alunos mostram,
os haitianos, apesar de muitos terem formação educacional elevada, sofrem para arrumar um
emprego que venha a equivaler sua capacidade intelectual e profissional junto à atividade
exercida nos postos de trabalho oferecidos a eles.
Ao trazer o debate a respeito dos haitianos e os problemas vivenciados por eles no Brasil
e, por consequência, na região de Gaspar, fica claro que ainda temos uma cultura de desvalorizar
o “outro”, ainda mais se esse “outro” for de fora do Brasil, nos esquecendo que grande parte do
habitantes da região onde se situa o IFSC – Câmpus Gaspar, isto é, a própria cidade de Gaspar
e as que estão ao seu redor, foram colonizadas por pessoas que vieram, em grande maioria de
países da Europa, ou seja, também eram estrangeiras quando chegaram à Gaspar e região.
34
Mosaico com imagens retiradas a partir dos vídeos produzidos pelos alunos e alunas com a
temática: Convivência Social.

Fonte: acervo do autor (2018).

Este tema é mais abrangente e traz um pouco de todos os outros já elencados, mas aqui
se acrescentaram questões como as piadinhas que são faladas, os olhares lançados de desprezo
e asco aos negros, a situação de serem vigiados por onde vão, etc. Neste sentido, os vídeos
se caracterizaram por uma análise mais generalista, que envolve fatores provenientes desde
as desconfianças sofridas por cidadãos negros e negras ao entrarem em um estabelecimento
qualquer e, ainda que nada de errado tenham feito, são seguidos pelos seguranças, passando
por relações amorosas interrompidas por famílias preconceituosas, até o simples fato de algum
negro ou negra estar correndo na rua e já se associar tal imagem à perspectiva de ter havido
algum delito.
Ao se discutir a Convivência Social fica claro que o preconceito étnico-racial perpassa os
variados âmbitos da vida: o próprio social, o cultural, o político, o profissional – falando do caso
específico de cursos que, além de ofertarem o ensino básico, ofertam o ensino profissionalizante
concomitantemente sob um mesmo currículo.

Ao final das aulas de apresentação dos vídeos, foi distribuído para todos os alunos e para
o professor Mateus, uma cópia da letra da música: Lavagem Cerebral, composta pelo artista
Gabriel “O Pensador”. Esta música ficou como mensagem de reflexão sobre o tema do racismo
em uma linguagem “mais próxima” da realidade dos jovens.

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Música Lavagem Cerebral: Gabriel O Pensador
Racismo preconceito e discriminação em geral Que ainda recebe o salário
É uma burrice coletiva sem explicação E o pão de cada dia graças ao negro
Afinal que justificativa você me dá para um povo que Ao nordestino e a todos nós
precisa de união Pagamos homens que pensam que ser humilhado não dói
Mas demonstra claramente O preconceito é uma coisa sem sentido
Infelizmente, Preconceitos mil Tire a burrice do peito e me dê ouvidos
De naturezas diferentes Me responda se você discriminaria
Mostrando que essa gente Um sujeito com a cara do PC Farias
Essa gente do Brasil é muito burra Não você não faria isso não...
E não enxerga um palmo à sua frente Você aprendeu que o preto é ladrão
Porque se fosse inteligente esse povo já teria agido de Muitos negros roubam mas muitos são roubados
forma mais consciente E cuidado com esse branco aí parado do seu lado
Eliminando da mente todo o preconceito Porque se ele passa fome
E não agindo com a burrice estampada no peito Sabe como é:
A “elite” que devia dar um bom exemplo Ele rouba e mata um homem
É a primeira a demonstrar esse tipo de sentimento Seja você ou seja o Pelé
Num complexo de superioridade infantil Você e o Pelé morreriam igual
Ou justificando um sistema de relação servil Então que morra o preconceito e viva a união racial
E o povão vai como um bundão na onda do racismo e da Quero ver essa musica você aprender e fazer
discriminação A lavagem cerebral
Não tem a união e não vê a solução da questão O racismo é burrice mas o mais burro não é o racista
Que por incrível que pareça está em nossas mãos É o que pensa que o racismo não existe
Só precisamos de uma reformulação geral O pior cego é o que não quer ver
Uma espécie de lavagem cerebral E o racismo está dentro de você
Não seja um imbecil Porque o racista na verdade é um tremendo babaca
Não seja um Paulo Francis Que assimila os preconceitos porque tem cabeça fraca
Não se importe com a origem ou a cor do seu semelhante E desde sempre não para pra pensar
O quê que importa se ele é nordestino e você não? Nos conceitos que a sociedade insiste em lhe ensinar
O quê que importa se ele é preto e você é branco? E de pai pra filho o racismo passa
Aliás branco no Brasil é difícil porque no Brasil somos Em forma de piadas que teriam bem mais graça
todos mestiços Se não fossem o retrato da nossa ignorância
Se você discorda então olhe pra trás Transmitindo a discriminação desde a infância
Olhe a nossa história E o que as crianças aprendem brincando
Os nossos ancestrais É nada mais nada menos do que a estupidez se propagando
O Brasil colonial não era igual a Portugal Qualquer tipo de racismo não se justifica
A raiz do meu país era multirracial Ninguém explica
Tinha índio, branco, amarelo, preto Precisamos da lavagem cerebral pra acabar com esse lixo
Nascemos da mistura então porque o preconceito? que é uma herança cultural
Barrigas cresceram Todo mundo é racista mas não sabe a razão
O tempo passou... Então eu digo meu irmão
Nasceram os brasileiros cada um com a sua cor Seja do povão ou da “elite”
Uns com a pele clara outros mais escura Não participe
Mas todos viemos da mesma mistura Pois como eu já disse racismo é burrice
Então presta atenção nessa sua babaquice Como eu já disse racismo é burrice (x4)
Pois como eu já disse racismo é burrice E se você é mais um burro
Dê a ignorância um ponto final:Faça uma lavagem Não me leve a mal
cerebral. É hora de fazer uma lavagem cerebral
Negro e nordestino constróem seu chão Mas isso é compromisso seu
Trabalhador da construção civil conhecido como peão Eu nem vou me meter
No Brasil o mesmo negro que constrói o seu apartamento Quem vai lavar a sua mente não sou eu
ou que lava o chão de uma delegacia É você.
É revistado e humilhado por um guarda nojento
Fonte: Gabriel O Pensador (1992/1993).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS RELATIVAS À APLICAÇÃO DA SEQUÊNCIA
DIDÁTICA: UMA FORMAÇÃO HISTÓRICA E INDISPENSÁVEL
A sequência didática trabalhada no contexto das turmas de Química e de Informática,
que estavam na 4ª fase, no segundo semestre de 2018, demonstrou:

1 – A importância do debate acerca do racismo


e como os jovens possuem capacidade de
percepção crítica dos fatos.

2 – Como o ensino de História é importante para


problematizar situações que perduram por anos
– a exemplo da discussão a respeito do racismo
- desde o processo escravista, passando pelas
teorias racialistas e chegando ao tempo presente
nos mais diversos âmbitos da vida.

3 – Que há espaço para a ampliação da


consciência histórica, a partir do momento
em que é oferecido aos alunos o contato entre o
conhecimento científico e as práticas cotidianas
experimentadas por eles.

ALGUMAS DIMENSÕES APREENDIDAS PELOS SUJEITOS ENVOLVIDOS NESTA


SEQUÊNCIA DIDÁTICA, CONSIDERANDO AS VARIÁVEIS ADAPTADAS DE
GASPARIN, COM SUPORTE NA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA

Conceitualmente: os alunos, com base nos diálogos das aulas e na elaboração de seus vídeos
puderam perceber a importância do debate com base histórica para explicar fenômenos do
tempo presente. A ação de serem levados a refletir as circunstâncias do racismo atual enquanto
estrutura fundamentada em teorias que dividem os humanos em grupos hierarquizados e na
escravidão como parte do processo de desvalorização de negros e negras, os encaminhou para
uma compreensão mais aprofundada dessa mazela social. Dessa forma, puderam perceber que
as notícias que lhes chegam trazendo casos de racismo ou as piadas corriqueiras contadas na
família ou em um círculo de amigos, tem uma dimensão historicamente profunda e enraizada
no fato de que uma pessoa ser negra a faz, na visão de muita gente, ser alguém que, por ter uma
pigmentação de pele escura, deva ser menos valorizada.

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Sócio-historicamente: compreenderam que a abolição da escravidão não significou uma real
melhoria nas condições de vida de negros e negras e, com as teorias racialistas contemporâneas
à Lei Áurea, a situação dos afrodescendentes se manteve difícil, pois a correlação entre ser
um povo que permaneceu durante muito tempo escravizado e tratado como objeto e às teorias
racialistas que, por mais obtuso que possa parecer, se revestiram de ciência, em fins do século
XIX e início do século XX, subjugou os negros às escalas mais baixas da evolução humana.
Por outro lado, se aperceberam que se deve valorizar a Cultura e a História Afro-brasileira,
visto que ela está marcada pela luta pela dignidade e pelo tratamento igualitário entre brancos e
negros, bem como, essa cultura de origem africana possui uma vasta riqueza, seja ela poética,
musical, etc.

Economicamente: conseguiram entender, por exemplo, o porquê da desigualdade que se


espraia no mercado de trabalho entre brancos e negros, seja no nível salarial ou nas próprias
oportunidades para estes e aqueles.

Politicamente: puderam debater a necessidade de haver legislações que garantam a valorização


da cultura negra tornando obrigatório o debate acerca da discriminação e do preconceito étnico-
racial no âmbito escolar, e que políticas públicas que buscam reparar a desigualdade existente
em nosso contexto social não são ações políticas em vão, mas sim, fruto da indispensabilidade
de se buscar equacionar injustiças seculares.

Culturalmente: em síntese, com a produção dos vídeos, os alunos perceberam a riqueza da


Cultura Afro-brasileira ao pesquisarem poesias e canções que exaltam o povo negro, o seu
histórico de lutas e sua contribuição para o desenvolvimento do país e da região onde vivem.

Filosoficamente: puderam perceber que somente uma formação humana integral é capaz de
permitir aos sujeitos pensarem e agirem de forma consciente e reflexiva para que o futuro seja
trilhado com maior respeito entre as pessoas e maior dignidade e justiça social.

38
Essas dimensões são passíveis de serem apreendidas quando embasadas em uma
concepção de ensino integrado, na medida em que a formação dos sujeitos necessita de uma
perspectiva totalizante.
Quanto aos debates ocorridos em sala, decorrentes dos materiais apresentados aos
alunos e aqueles apresentados pelos alunos, ficou perceptível que o processo educacional pode
e deve permear as diversas nuances da vida, a omnilateralidade contida naquilo que é a própria
vida. Diante de perspectivas educacionais que se põem a serviço do capital, como é o caso
da Lei 13.415/2017, existe o risco de se perder de vista a formação humana ampliada, dando
lugar a uma espécie de cultura da empregabilidade, em que as disciplinas da educação básica
subsistem em meio às profissionalizantes, e estas é que garantirão o futuro emprego dos alunos,
numa ideia de que estar empregado seria o suficiente para se viver num mundo tão complexo.
Nesse contexto, a História enquanto componente curricular se mostra imprescindível
ao abrir espaços para discutir as realizações históricas que levam os seres humanos a terem
determinados comportamentos - como é o caso do racismo - seja a nível local ou global.
Arrolado na possibilidade de desvelar os comportamentos construídos historicamente
e que ainda permanecem vivos na sociedade atual, vislumbrou-se a ampliação da consciência
histórica, isto é, a interpretação do passado, para assim descobrir o que causa determinado fato
no presente e como isso pode ser trabalhado para que seja modificado no futuro.
Tais questões encontram eco naquilo que Young (2007) chama de conhecimento
poderoso, ou seja, quando a escola fornece o conhecimento cientificamente elaborado e o faz
correlacionar ao conhecimento prático cotidiano que as pessoas carregam consigo, no intuito de
interpretarem o passado a fim de planejarem o futuro (RÜSEN, 2001), por meio de um ensino
de História comprometido com a formação humana e ampla dos sujeitos, uma formação política
(PLÁ, 2012), os colocando enquanto sujeitos-históricos que podem e devem depreender da
realidade suas nuances mais profundas a fim de entendê-las e modificá-las em benefício coletivo.
Acepções como essas prosperam quando imersas em uma conjuntura de educação que
valorize a integralidade do sujeito enquanto ser humano que observa mas, também, age no
contexto social em que se insere. Essa presunção se apóia na integração entre trabalho, ciência
e cultura, como fontes de formação de indivíduos capazes de se constituírem integralmente
em direção à novas práticas sociais, assim como nos preconiza Ramos (2010), num contexto
escolar em que as facetas entremeadas pelo currículo permitam a inclusão de debates a respeito
de pessoas e culturas marginalizadas (ARROYO, 2013), como é o caso da História e da Cultura
Afro-brasileira.
A reflexão feita acerca do racismo, pelos alunos e pelos demais envolvidos, faz pensar a
respeito da educação como ponte para transformações necessárias no mundo atual e no mundo
vindouro, em que toda prática seja teorizada e toda teorização seja aprofundada e praticada. A
práxis social necessária a fim de não cometermos os mesmos erros do passado, no intuito de
emoldurar um novo futuro sem preconceitos de qualquer espécie, por meio de uma valorização
humana irrestrita.

39
Para finalizar este encarte, registra-se o texto abaixo, que foi retirado de
um dos vídeos produzidos pelos estudantes. Uma poesia, que foi criada por um
dos discentes que participaram das atividades e que nos leva à intensas reflexões.

Infelizmente, ainda não evoluímos a ponto de aceitarmos nossas


diferenças e de entendermos que não somos iguais.
Nossa maldição em padronizar tudo o que vemos e tocamos acaba
afetando aqueles que consideramos diferentes do normal.
Mas qual a definição de diferente?
Qual a definição de normal?
O que te torna normal ou diferente? Nada.
Talvez sejamos ignorantes demais para perceber, mas nunca é tarde
para deixarmos essas tais diferenças e transformarmos o mundo num
lugar mais includente e respeitoso.
Mas isso, só depende de você (ALUNX).

Este breve texto tem como intuito encerrar este produto educacional, primeiramente,
por ser fruto da produção de um estudante e, segundo, por conter elementos importantes na
discussão de uma formação humana integral: quem somos? De onde viemos? E o que podemos
fazer para melhorar o mundo em que vivemos, superando preconceitos e quaisquer outras
mazelas que irrompem em meio às desigualdades?

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