Ano B 1 Advento - Natal - Tempo Comum (Inicio) 2011-2012
Ano B 1 Advento - Natal - Tempo Comum (Inicio) 2011-2012
Ano B 1 Advento - Natal - Tempo Comum (Inicio) 2011-2012
Coições CNS?
C748r Conferência Nacional dos Bispos do Brasil / Ele está no meio de nós!:
Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento - Natal - Tempo Comum —- Ano B - São Marcos
Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012. Brasília, Edições CNBB. 2011.
104 p.:14x21 cm
ISBN: 978-85-7972-107-6
Advento — Palavra de Deus — Jesus Cristo — Natal - Maria Mãe de Jesus;
Preparação -— Liturgia — Sagrada Escritura — Jesus Cristo — Sagrada Família;
on
CDU: 264-041.1
Coordenação:
Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia
Coordenação Editorial:
Mons. Jamil Alves de Souza
Revisão Doutrinal:
Pe. Hernaldo Pinto Farias, SSS
Revisão:
Lúcia Soldera
1º Edição - 2011
Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecâni-
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SUMÁRIO
1º DOMINGO DO ADVENTO
27 de novembro de 201 . . . . . . . . . . e ssceeseeereeseereereaeeerenanros 9
2º DOMINGO DO ADVENTO
4 de dezembro de 2011... iieeeerrrsanes emeeereeseeneereo 16
3º DOMINGO DO ADVENTO
11 de dezembro de 2011............... res reeeerereereresarereraaeão 27
4º DOMINGO DO ADVENTO
18 de dezembro de 201 . . . . . . . . . e ereeereseerererereresererreaanos 34
NATAL DO SENHOR
25 de dezembro de 2011... eeseerreeeseeeesseerssenrerando 40
EPIFANIA DO SENHOR
8 de janeiro de 2012........................
err rrereererererereereerecereraranas 57
BATISMO DO SENHOR
9 de janeiro de 2012... iereeerrerereeararareereneaceanada 63
APRESENTAÇÃO DO SENHOR
2 de fevereiro de 2012..............iieseeereceserareererareesaernesserenceneesaesenesa 81
APRESENTAÇÃO
Ele está no meio de nós! Tomado da liturgia, esse é o tema escolhido
para os atuais Roteiros Hlomiléticos, que contemplam o mistério do
Ciclo do Natal e dos primeiros domingos do Tempo Comum.
À liturgia nos revela que “a Igreja nada considera mais venerável,
após a celebração anual do mistério da Páscoa, do que comemorar o
Natal do Senhor e suas primeiras manifestações, o que se realiza no
Tempo do Natal” (NALC, n. 32). Nesse período, as comunidades
valorizam o Iempo do Advento, especialmente os dias entre 17 e
24 de dezembro, quando a piedosa e alegre expectativa da vinda do
Senhor vai chegando ao seu ponto alto: o Natal. São dias particular-
mente importantes para a leitura da Bíblia e, juntamente com Maria,
Mãe de Deus e nossa, entoar as Antífonas do “Ó”, dentro da Novena
do Natal.
O Concílio Vaticano II afirma na sua Constituição sobre a
Liturgia, Sacrosanctum Concilium, n. 7, que Cristo, para conti-
nuar na história sua obra de salvação, está no meio de nós! Ele
“está sempre presente na sua Igreja, especialmente nas ações li-
túrgicas”. Além de sua presença eucarística, muito arraigada em
nossas comunidades, Cristo “está presente na sua Palavra, pois
é ele que fala ao ser lida na Igreja a Sagrada Escritura”. E está
presente também na comunidade reunida em seu nome, confor-
me sua promessa de estar no meio dos que se reunissem em seu
nome (cf. Mt 18,20).
Ele está no meio de nós! 8]
+ Edmar Peron
Membro da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia
1º DOMINGO DO ADVENTO
27 de novembro de 2011
Situando-nos brevemente
O início do ano litúrgico nos convoca a exercitar uma das grandes
virtudes cristãs: a esperança. Mas embora estejamos no seu começo,
a liturgia, qual uma bússola, nos faz olhar para as realidades do fim,
coma que nos ensinando a direção, apontando a meta e orientando a
nossa existência para Deus. Os cristãos são o povo da esperança, pois
a espera, a confiança e o otimismo em relação ao reinado de Deus e
sua definitiva instauração com a segunda vinda de Jesus tem, para
nós, sabor de realização, plenitude e salvação. Jesus, convocando à
vigilância, nos alerta para que, por desatenção, não sejamos surpre-
endidos enquanto dormimos. O sono, imagem da morte e da noite
do pecado, conota falta de comunhão com o Senhor, o Vigilante por
excelência, que não foi tragado pelo sono da morte.
Mas como fazemos o exercício da espera? Como a esperança
acontece em nós e por quê? À quem aguardamos? Todas essas ques-
tões nos ajudam a compreender a comunidade e a nossa própria vida,
como existência pautada pela expectativa. A vigilância é a couraça
da esperança. Vigia quem espera confiante e alegre, pela vinda do
Senhor, quem trabalha pela construção de um mundo melhor, quem
exercita o amor pelo próximo, sobretudo o mais desvalido, quem
“sintoniza” sua vida na frequência do Evangelho e do Espírito de
Deus, quem promove a paz e a justiça e quem não descura da vida de
Ele está no meio de nós! ENS)
Recordando a Palavra
O trecho do evangelho, marcado por insistentes alertas, focado,
sobretudo no imperativo “vigiai”, é a parte final do capítulo 13 de
Marcos, que antecede a narração da páscoa de Jesus. Neste mesmo
capítulo, Jesus fala da destruição do Templo, dos falsos profetas e
tribulações, das perseguições e até dos sinais da natureza (figuei-
ra, sinais cósmicos). Esses outros trechos, que incluem muitos fatos
“pós-pascais”, bem como o trecho deste domingo, estão em relação
com os acontecimentos sucessivos narrados a partir do capítulo 14:
perseguição, morte e ressurreição de Jesus. Por isso, podemos dizer
que, com a glorificação de Jesus, o final dos tempos já fora inaugura-
do e a comunidade estava sendo convidada a se manter alerta para a
hora da “crise messiânica” de Jesus. Os tempos finais se delinearam
como tempos difíceis, exigindo uma atenção permanente por parte
dos discípulos. Neste contexto o verbo vigiar recebe sentido muito
vinculado à oração e à prática das boas obras. Diante da instabilidade
da situação, o que fazer? Continuar a missão de Jesus: como empre-
gados a quem ele confiou os cuidados da casa, exercendo cada um sua
tarefa. Destaque se dê ao porteiro, imagem da comunidade que está
de prontidão para o retorno do Mestre.
À oração e a missão também comparecem nos demais textos
como desdobramentos da atitude de vigilância. Na primeira leitura,
no salmo, na aclamação ao evangelho e na antífona de entrada, so-
bressai o tom de súplica, muitas vezes marcado pelo arrependimento
e reconhecimento das fragilidades, da necessidade de Deus e da con-
fiança. Também se verifica uma insistência nos temas da prática alegre
da justiça, da fidelidade ao caminho de Deus (12 Leitura) e da graça
EEE PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Atualizando a Palavra
Mas realizar coisas, boas ações ou orações, não diz tudo a respeito da
vida cristã. Existem tantas pessoas que oram e realizam boas coisas
e talvez sejam até melhores do que nós naquilo que fazem... Nossa
experiência de fé é pautada na vida em Jesus Cristo. Mais do que
esperar Jesus, nós esperamos nele (antífona de entrada e 12 leitura)!
As boas ações e a oração que fazemos são frutos de uma comunhão
com ele, índice de nosso vínculo batismal com o Senhor, antecipa-
ção da vida futura que ele nos garante e nos reserva. É por isso que
somos povo da esperança, pois o fato de estarmos tão intimamente
ligados a ele, não só prolonga a sua ação salvadora no mundo, mas
antecipa aquilo que para nós está reservado na vinda do Filho de
Deus. Na aurora de um novo dia, como porteiros, nos postamos no
limiar desse novo tempo que Jesus inaugurou. Vigiar é esperar com
alegria e confiança as realidades futuras que já vivemos, permitindo
que chegue ao mundo pela porta do nosso agir e da nossa oração o
Desejado das nações.
Embora os tempos continuem difíceis e desafiadores, quiçá mais
complexos, não está nos faltando a atenção aos crucificados de hoje,
às perseguições e injustiças, mas também à vida que insiste e resiste,
bem como aos sinais que nos anunciam a chegada do Filho de Deus?
Ele está no meio de nós! 4
Ó Senhor... Aleluia!
Vem Messias... Maranatha!
Ó Justiça... Aleluia!
Mora entre nós... Maranatha!
Misericórdia... Aleluia!
Vive entre nós... Maranatha!
Nossa Força... Aleluia!
Dentro de nós... Maranatha!
Liberdade... Aleluia!
Salva teu povo... Maranatha!
Nossa cura... Aleluia!
Tira a dor... Maranatha!
Ó conforto... Aleluia!
Ele está no meio de nós! EI
Dá esperança... Maranatha!
Nossa alegria... Aleluia!
Nos preenche... Maranatha!
Sabedoria... Aleluia!
Vem, nos renova... Maranatha!
Nosso desejo... Aleluia!
Nosso anseio... Maranatha!
Ó prometido... Aleluia!
Nosso messias... Maranatha!
Voz dos profetas... Aleluia!
Ó Esperado... Maranatha!
Luz das nações... Aleluia!
Luz nas trevas... Maranatha!
Ressuscitado... Aleluia!
Senhor da Glória... Maranatha!
Ó Desejado... Aleluia!
Ó Amado... Maranatha!
Entre nós... Aleluia!
Dentro de nós... Maranatha!”
“EIS QUE EU ENVIO MEU MENSAGEIROÀ TUA FRENTE, PARA PREPARAR O TEU CAMINHO”
Situando-nos brevemente
Um conhecido canto das comunidades por ocasião do Advento diz:
“Uma voz clama no deserto com vigor, preparai hoje os caminhos do Se-
nhor. Tirai do mundo a violência e a ambição, que não nos deixam ver no
outro o nosso irmão”. O tema da Palavra de Deus que irrompe na his-
tória humana pela boca de homens e mulheres em todos os tempos
é central no cristianismo. Diz respeito ao coração da nossa profissão
de fé.
À teologia conhece uma expressão muito feliz recuperada pelo
Papa Bento XVI em sua última Encíclica, Verbum Domini: a Vox Verbi,
a voz do Verbo. Muitas são as vozes da Palavra de Deus, é uma verda-
deira sinfonia (cf. VD, n. 7). Participam, então, da mesma Palavra de
Deus toda uma variedade de vozes. São como “harmônicos” do mes-
mo som que sai da boca do próprio Deus. Vibrações várias da única
Palavra que os cristãos reconhecem encarnada em Jesus de Nazaré,
confessado como Senhor e Messias.
No tempo de João Batista, precursor do Messias, as pessoas sou-
beram reconhecê-lo em sua relação com a Palavra de Deus, a ponto
de o identificarem com ela. Na verdade, João Batista é uma das “vo-
zes” do Verbo de Deus. Quando o povo de Deus celebra reunido em
assembleia, é educado na percepção destas “variantes” da voz divina,
enraizadas, porém, na única Palavra de Salvação. Em tudo e todos
EKA PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Recordando a Palavra
O trecho evangélico da liturgia deste domingo na Bíblia é o prólogo
do evangelho de Marcos. Nele encontramos as informações funda-
mentais para compreender com maior profundidade o anúncio da
boa nova do Reinado de Deus (= evangelho, em grego) que se desen-
volverá ao longo da narrativa de Marcos. Segundo esta ótica, Jesus
deverá ser visto como “Kyrios”, aquele que traz consigo o Governo de
Deus. Mas, o enquadramento que a Lecionário traz com as leituras
de Isaías 40, do Salmo 84, da segunda carta de Pedro e o contexto
litúrgico orientam nossos ouvidos para escutar a Palavra de Deus que
aponta também noutras direções.
Na primeira leitura, temos a citação do Profeta recolhida no
Evangelho de Marcos e assumida na aclamação do Evangelho: “Pre-
parai no deserto o caminho do Senhor, aplainai na solidão a estrada do
nosso Deus (...) endireitai o que é torto.” (Is 40,3-4). Este mesmo ver-
sículo é aproveitado na Aclamação ao Evangelho, mas com a versão
de Lucas: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas. Toda
carne há de ver a salvação de nosso Deus” (Lc 3,4.6). Este se converte
em chave de leitura do Evangelho deste domingo. Não se trata ape-
nas da iminência do Reinado de Deus na pessoa de seu Cristo num
momento histórico preciso, mas na percepção de sua chegada por
parte dos que o aguardam e estão atentos à sua palavra permanente-
mente. Sintoniza-se, assim, com a espiritualidade típica do Adven-
to, consignada na vigilância conforme a liturgia do 1º Domingo do
Advento. Isso é confirmado pelo Salmo Responsorial que nos traz
como refrão: “Mostrai-nos, ó Senhor, vossa bondade e a vossa salvação
nos concedei”, coincidindo com o teor do versículo aleluiático.
Ele está no meio de nós! RES
Aos que esperam com anseio a vinda do Dia de Deus (cf. 2Pd 3,12)
cabe uma vida reta e não tortuosa. O caminho aplainado anunciado
pelo profeta é a própria existência no mundo. À medida que Deus vem
no seu Cristo, a vigilância nos insere numa maneira diferente de se
portar diante da vida. Ouvidos e olhos — os sentidos de recepção e aco-
lhida — tornam-se mais atentos para captar os rumos pelos quais Deus
quer orientar-nos, de modo que façamos a experiência do cumprimento
de suas promessas e sejam inaugurados “novos céus e uma nova terra”
QPd 3,13). João Batista é ícone desta personalidade vigilante que exige
a conversão perante o Dia de Deus. Evidentemente, o cumprir-se das
promessas de Deus não está limitada a uma ordem social e política
que se possa conceber numa ou noutra época e neste ou naquele espa-
ço geográfico. Tem muito mais a ver com a nova condição existencial
dos que são vigilantes quanto à visita de Deus em qualquer tempo
e lugar. Assim, a conclusão do trecho do Evangelho deste domingo
alude o mergulho no Espírito de Cristo — o batismo (cf. Mc 1,8).
Atualizando a Palavra
Os batizados em Cristo são novíssimas criaturas. Irazem consigo o
seu Espírito, o que significa compartilhar de seu modo de vida, de
sua palavra, de seus sentimentos e ações. Como discípulos e discípu-
las que são, têm os ouvidos abertos e os olhos atentos. Captam toda
palavra de paz dita por Deus fazendo-a reverberar nos confins da
terra de modo que ela produza frutos que possam ser colhidos e de-
gustados (cf. Salmo). São também filhos e filhas da glória de Deus,
visibilidade de seu esplendor. Sentem-se manifestação do Cristo na
fidelidade a seu Evangelho.
O Tempo do Advento, da expectativa pelo Dia de Deus, nos faz
assumir um itinerário de conversão, de modo que “nenhuma ati-
vidade terrena nos impeça de correr ao encontro” do seu Filho
(cf. Oração do Dia). No mundo em que vivemos, o trabalho dos
cristãos se insere no contexto de consolidação de ambientes capazes
14 PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
A coleta
Situando-nos brevemente
Como compreender a festa que celebramos? Seria Maria uma pessoa
privilegiada dentre todos os seres humanos e criaturas de Deus? Tal
“posição” poderia encontrar respaldo na saudação do Anjo a Maria,
onde ela é chamada de “cheia de graça”. “kecharitoméne”, palavra grega
que a Vulgata traduziu por “gratia plena”, poderia ser livremente tradu-
zida por “Favorecida, agraciada”. Este termo deriva de “charis”, de onde
vem a palavra “eucaristia”, Seu sentido mais preciso tem a ver com aber-
tura a Deus e se articula com outros conceitos como eleição e aliança.
Estar cheia de graça é condição para responder aos apelos de Deus,
que deseja desposar a humanidade, o que realiza no Filho Jesus. Por
estar “cheia de graça”, Maria acolhe o convite divino e se torna Mãe do
Senhor; simultaneamente, como “Nova Eva”, se faz “esposa” de Deus:
“Es mãe, esposa e filha do Deus que é uno e trino";' consequentemente, faz-
-se também sinal daquilo que a humanidade inteira é chamada a ser, o
que se exprime na prece vespertina: “Deus, autor de tantas maravilhas,
que fizestes a imaculada Virgem Maria participar de corpo e alma da glória
celeste, conduzi para a mesma glória o coração dos vossos filhos”?
Recordando a Palavra
O Lecionário precede cada leitura da Liturgia da Palavra com um
breve versículo retirado do próprio texto bíblio-litúrgico, no intuito
de apontar por onde deve se orientar a interpretação do mesmo. É
uma maneira de assegurar a perspectiva hermenêutica da Liturgia,
que tem seu polo de atração no Evangelho. No caso da I leitura desta
solenidade, extraída do livro do Gênesis, temos o caso da inimizade
entre a serpente e a mulher. À tradição de Israel, ao comentar este
episódio, explica o castigo da serpente pelo seguinte motivo: “Por-
que você pretendia matar Adam (Adão) e tomar Chava (Eva) por espo-
sa, Eu a castigarei estabelecendo ódio entre você e ela”? Evidentemente,
este dado não está presente no texto das Escrituras, mas pertence à
Tradição oral de Israel, que como as Igrejas cristãs, reconhece seu
valor como proveniente da mesma fonte que é a Revelação. Conta
a Hagadá, que a serpente instrui Eva porque quer usurpar o lugar
de Adão, no desejo de ocupar seu posto junto a Eva, elevando por si
mesma sua dignidade em relação a todas as outras criaturas. Ela age
diabolicamente — isto é, separando Adão e Eva e ambos de Deus —
cobiçando sua união com Eva, a despeito dos planos de seu criador
e da sua própria natureza. Não será a serpente a desposar com Eva,
isto é com a humanidade, mas o próprio Deus.
Eis a razão da inimizade entre Eva e a serpente, que no rela-
to se torna figura da perversidade e da inclinação para o mal/pe-
cado. Esta “inimizade” se articula com a proclamação de Maria
como “cheia de graça” no relato evangélico. É uma descendente
de Eva que traz consigo a plenitude da graça — como dom de
Deus — e aí reconhecemos que a sua promessa nela se cumpre.
Ser preservada do pecado das origens — pois é isso que signifi-
ca o título “Imaculada Conceição” — não é apenas “exceção” a
uma regra divina, mas configura-se o anúncio da fidelidade do
Senhor que em Maria, “recordou seu amor sempre fiel pela casa
de Israel”.
Atualizando a Palavra
É em vista da Páscoa de Jesus e seus frutos que a Virgem de Nazaré
foi reservada” do pecado, pois conforme dirá Paulo na segunda leitura:
“Em Cristo, ele nos escolheu, antes da fundação do mundo, para que sejamos
santos e irrepreensíveis sob o seu olhar, no amor. (...) Nele nós recebemos a
nossa parte”? O amor de Deus por nós é a razão última da inimizade
entre a “serpente” e “Eva”, entre o “pecado” e a “Nova Eva” pois seus
pés esmagam “a vil serpente, repele o tentador”.
Segundo a Antífona de Entrada, Maria foi revestida de jus-
tiça e salvação” e é neste fato que radica sua alegria. Júbilo que é
também nosso, pois a mesma graça que a reveste nos alcança pela
encarnação* e a tornamos manifesta por nosso louvor e ação de gra-
ças. À oração depois da comunhão que recolhe os frutos da celebra-
ção eucarística dispondo-os diante dos fiéis, para que o assumam
na vida, suplica para que as “feridas do pecado original, do qual
Maria foi preservada de modo admirável”? sejam curadas. Ão ce-
lebrar o Mistério Pascal de Cristo, por ocasião da comemoração
da Imaculada conceição de Maria, admiramo-nos ao contemplar
o cuidado extremo com que Deus estende “sua mão e o seu braço
forte e santo”? e buscamos reconhecer em nós os traços do Filho
Bem-Amado de Deus.!º
S197,3ab.
OtaR
Ef1,4.11.
Hino do Ofício de Leituras na Solenidade da Imaculada Conceição.
Cf. Is 61,10 e tb. S1 45.
IJ
Cf. Ef 1,6.
O
Cf. S197,1.
"ND
10 Cf. Ef 1,5.
E] PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
"ELE NÃO ERA A LUZ, MAS VEIO PARA DAR TESTEMUNHO DA LUZ”
Situando-nos brevemente
Por tradição, o terceiro domingo do Advento é denominado “Domin-
go Gaudete”, que significa “Domingo da Alegria”. Isso, porque a an-
tífona de entrada começa com esta expressão: “Alegrai-vos sempre no
Senhor” (em latim “Gaudete in Domino semper”). Esta, portanto,
será a chave para a compreensão dos textos bíblico-litúrgicos e eucológi-
cos, assim como dos ritos e símbolos do terceiro domingo.
À alegria de que trata a Liturgia deste domingo liga-se à proximi-
dade da festa da Natividade do Senhor. À percepção de que já atravessa-
mos mais da metade do caminho rumo à noite Santa do Natal ilumina a
celebração da comunidade de fé. Com razão a Oração da Igreja assim se
exprime: “Levantai vossa cabeça, pois a vossa redenção se aproxima”. Por-
tanto, o júbilo não se dá somente por que já se aproxima uma “data
memorável”, mas, sobretudo, porque as consequências do Mistério
que nela se celebra já podem ser sentidas pela Igreja peregrina.
Recordando a Palavra
O texto da primeira leitura é um trecho do livro de Isaías. A compi-
lação de versículos põe no centro da profecia a “exultação do profeta
15 Jo 1,6.
16 CE Is 61,11.
Ha PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Atualizando a Palavra
Tomando os elementos acima descritos, uma leitura litúrgica das Es-
crituras entende que este terceiro Domingo do Advento é momento
de passagem ou transição para a comunidade que celebra, como o
fora para os contemporâneos do Batista. Nós, como eles, somos atra-
ídos para a “beira do Jordão”, a fim de permanecer de prontidão, à
espera da travessia pascal que se inaugura com a revelação de Deus e
se plenifica com a encarnação do Verbo.
Neste sentido, nosso olhar recai sobre o que se augura com a
celebração da Eucaristia: “que estes sacramentos nos purifiquem dos peca-
dos e nos preparem para as festas que se aproximam”. À preparação para
a celebração da natividade e manifestação do Senhor na carne exige
transpor o Jordão, passando pelas águas que nos liberam da maldade,
da corrupção, da morte. Dito de outro modo, ao celebrar o terceiro Do-
mingo do Advento, a Igreja se alegra por estar à “beira” do Jordão, emN
17 Bethania tem uso justificado, por exemplo, em documentos do século III (Papiro 66.75,
sinaítico, etc.), enquanto Bethbara está presente em textos bem mais tardios.
18 Cf. Bíblia de Jerusalém, (nova edição revista e ampliada), nota e de Jo 1,28.
19 Oração depois da comunhão.
Ele está no meio de nós! EM
20 Cf. Antífona do Invitatório no Ofício Divino: Levantem a cabeça, a vossa Redenção está
próxima.
21 Invitatório da Oração Eucarística.
22 Cf. Aclamação ao Evangelho.
23 Cf. Il leitura.
51] PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Amém.
3. Para abrir a Liturgia da Palavra, o responsório “À voz de
Deus se espalha” (ODC, Caderno de Partituras II, Paulus — sete:
www.calbh.com.br) é muito oportuno.
Após a homilia, como conclusão da mesma, pode-se entoar a
Litania do Advento, igualmente disponível no site acima.
4. “Texto para ser publicado no III domingo do Advento, para a
Campanha para a Evangelização:
Hoje é o dia da coleta para a Campanha da Evangelização da CNBB.
Situando-nos brevemente
Já no quarto domingo do Advento e às portas da solenidade do Natal
do Senhor, a liturgia dirige o nosso olhar para o anúncio do Anjo fei-
to a Maria e para sua própria pessoa enquanto imagem da Igreja que
aguarda a chegada do Natal. Para sublinhar em que ponto a celebra-
ção nos situa, recordemos nosso trajeto realizado: nos dois primeiros
domingos do Advento, chamados de Advento escatológico, nossa
expectativa foi reacendida em vista das realidades futuras e dos últi-
mos tempos que Jesus inaugurou a partir de sua vinda histórica e sua
glorificação. A acolhida do anúncio da Palavra de Deus nos preparou
na direção desse evento derradeiro, que o povo da Primeira Aliança
viu realizar na Igreja, como já participante das realidades futuras.
No terceiro domingo, com o olhar mais voltado para a vinda
histórica, a Igreja se alegrou, como que antecipando aquilo a que
se prepara e no canto de Maria, proclamou as maravilhas que Deus
realizou por seu povo e continua a realizar por meio de Jesus e de
seu Espírito. Nesse mesmo período iniciamos a novena do Natal do
Senhor, intensificando a nossa espera e vigilância, enchendo nossas
lâmpadas com o azeite da oração, adentrando no festim do noivo que
veio ao nosso encontro. Cada domingo, como luz a iluminar nossos
passos, nos conduziu a este momento, onde contemplamos a Vir-
gem como a um espelho, onde podemos ver a imagem daquilo que a
EBI PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Recordando a Palavra
O texto da anunciação do anjo a Maria, muito conhecido de todos,
pode sugerir duas interpretações: ele fala da vocação de Maria ou de
Jesus e de sua concepção no seio da Virgem, como Filho do Altís-
simo e Messias esperado pelo povo da Primeira Aliança? À segun-
da opção parece ser a mais correta, embora isso não desqualifique o
papel de Maria na história da salvação. De fato, sua participação é
fundamental, por ser a. Mãe do Senhor. Mas sua maternidade deve
ser compreendida para além da linhagem carnal, pois os evangelhos
valorizam a familiaridade com Jesus a partir da obediência à vontade
de Deus, expressa pela sua Palavra.?” Maria é Mãe de Jesus pelas duas
vias: como primeira discípula e como aquela que o concebe em seu seio.
À aclamação ao evangelho, como que antecipando a narração, orienta
nosso olhar para o mesmo foco: “eis a serva do Senhor, cumpra-se em
mim a tua palavra!”. O que Maria diz de si mesma não é outra coisa
senão sua dependência em relação ao Mistério que abriga. Ela se auto-
denomina “serva do Senhor” e obediente se sujeita à ação de Deus.
Mas o anúncio do anjo, de fato, só pode ser entendido em pauta
cristológica. Uma “chave” de compreensão nos é dada pela oração
do dia que, num belo paralelo, vai ao cerne da leitura messiânica do
texto: “para que, conhecendo pela mensagem do Anjo a encarnação
do vosso Filho, cheguemos por sua paixão e cruz, à glória da ressur-
reição”. Os dois verbos: conhecer e chegar oferecem a mesma idéia:
entrar em comunhão, participar. Conhecer, no próprio texto da
anunciação, tem significado de contato íntimo, neste caso, conjugal:
comunhão de corpos que viabiliza a fecundação. O questionamento
Atualizando a Palavra
À celebração do quarto domingo, como último domingo do Advento
histórico, na mesma dinâmica do terceiro domingo, antecipa a reali-
dade festiva que se desabrocha no Natal. Nesta celebração a Igreja é a
receptora do anúncio do Anjo, participando da encarnação do Verbo
ao acolher a Palavra proclamada, exercendo seu discipulado na escuta
e na obediência e deixando realizar em seu seio a salvação esperada.
26 Cf LEÃO MAGNO, Sermão IV do Natal (4275), in. Antologia Litúrgica. Textos litúrgi-
cos, patrísticos e canônicos do Primeiro Milênio. Fátima: Secretariado Nacional de Liturgia,
2003, p. 1020.
27 Ipem, Sermão VII do Natal (4289), in. Antologia Litúrgica, p. 1022.
EJA PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
25 de dezembro de 2011
Situando-nos brevemente
“Hoje, nasceu o Salvador do mundo!” Com este anúncio feliz tem
início a celebração da Natividade de Jesus. É uma festa antiga. Esta
celebração deita suas raízes na veneração da gruta em que o Senhor
nasceu. No rito romano, como liturgia orgânica e já instituída so-
mente tem-se notícia a partir do século IV, quando aparece pela pri-
meira vez a data de 25 de dezembro, segundo os testemunhos de um
antigo documento chamado Cronógrafo Romano.
O que se celebra nesta liturgia é bem mais do que o aniversário
do nascimento histórico de Jesus. É, em suma, a celebração de sua
Páscoa vista sob a perspectiva de sua entrada no horizonte da história
humana de modo inaudito e admirável, como sugere a bucólica cena
do nascimento narrado no Evangelho de Lucas. Logo, o “hoje” da
antífona de entrada nos insere na perspectiva sempre atual da mani-
festação de Deus. Embora se possa (e deva!) localizar os feitos ma-
ravilhosos do Senhor no âmbito da história humana, que o ocidente
convencionou consignar em “passado — presente — futuro”, a ação di-
vina sempre precede e supera os nossos limites temporais e espaciais.
Por isso, a liturgia divina quando celebrada se torna uma espécie
de parêntesis no tempo cronológico, como momento da história da
GAR PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Recordando a Palavra
Segundo o Apóstolo, “A graça de Deus se manifestou trazendo a
salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Cumpre-se o que o Profeta
anunciou: “nasceu para nós um menino, foi-nos dado um filho; ele
traz aos ombros as marcas da realeza” (Is 9,5). O recém-nascido en-
volto em faixas outrora encontrado pelos pastores é sinal deste acon-
tecimento: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador
que é o Cristo Senhor” (Lc 2,11).
A harmonia dos textos do Lecionário salta à vista. Tudo con-
verge para a compreensão exata e experiência daquela que é a con-
sequência — e fundamento - da iniciativa amorosa de Deus em vir
ao encontro de suas criaturas, revestido de sua fragilidade: “Ao cele-
brarmos com alegria o Natal do nosso Salvador, dai-nos alcançar por
uma vida santa seu eterno convívio” (Oração depois da comunhão).
Deus nos quer com ele, como planejara deste o início dos tempos.
Por essa razão, a palavra “hoje” pulula em diversos textos. É o
“hoje” de Deus. Um termo técnico mais do que um simples advér-
bio temporal que a bíblia e a liturgia empregam para evidenciar a
contemporaneidade da salvação. É como se disséssemos: “Deus nos
alcança”. Não é tanto o esforço humano, mas a total gratuidade e o
interesse divinos que estão em evidência.
Fiel ao espírito profético de Isaías, que na Bíblia está relacionado
com os assuntos políticos de seu país, na luta para que o Reino de
Judá não sucumba perante os interesses estrangeiros, o Lecionário
Ele está no meio de nós! EM
Atualizando a Palavra
Quando, em sua Carta a Tito, Paulo fala da Salvação que alcança to-
dos os homens, temos o desdobramento mais preciso da celebração da
Natividade do Senhor. Nós, hoje, aqui e agora somos testemunhas da
generosidade com que Deus nos trata e podemos, responsavelmente
abandonar a impiedade e as aspirações mundanas (cf. Tt 2,12). Não
se pode esquecer o fato de que a consequência da manifestação e rei-
nado do “Conselheiro admirável, Deus forte, Pai dos tempos futuros,
Príncipe da Paz” (cf. Isaías 9,5) cancela a cobiça em quaisquer de suas
formas, pois ela é fonte de opressão e escravidão. À segunda leitura
45, PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Situando-nos brevemente
A Solenidade do Natal do Senhor se prolonga e se desdobra em
várias comemorações que ajudam a aprofundar o mistério da encar-
nação. Todas essas, em íntima conexão com o nascimento do Filho
de Deus, revelam aspectos importantes de um único acontecimento:
Deus se fez um de nós. É dentro deste horizonte que situa-se a festa
da Sagrada Família. No Evangelho, Maria e José se encaminham
para Jerusalém a fim de cumprir os preceitos da lei: apresentar o pri-
mogênito, oferecer sacrifícios, purificar a mãe... O Filho de Deus
nasceu sujeito à lei, para resgatar aqueles que estavam submetidos à
lei (cf. Gl 4,4). Significa dizer: Deus vem ao encontro da vida huma-
na por inteiro, não se isentando de participar de nada, somente do
pecado, para, em contrapartida conceder a todos a participação na
vida divina. Os antigos chamavam isso de sacrum comercium, isto é,
sagrado comércio, ou divina troca: Deus entra em comunhão com a
vida humana para possibilitar aos seres humanos entrar em comu-
nhão com a vida divina.
Maria e José, os pais de Jesus, levam ao templo, lugar do encon-
tro religioso com Deus, duas pombinhas. É a oferenda dos pobres,
a expressão religiosa de sua condição e pequenez. É no meio dessa
situação onde se situa o Filho de Deus. Na comunicação de dons a
4/| PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Recordando a Palavra
As leituras e o salmo orientam a interpretação do evangelho da apre-
sentação do Menino. Abraão, Sara, Isac são personagens centrais
que perpassam os textos e guardam características muito comuns
ao velho Simeão e à Profetiza Ana. Dois homens e duas mulheres
idosos, todos justos diante de Deus, irmanados pela esperança: um
casal esperando a descendência e outro pela realização das promessas
messiânicas. Mas Abraão, Sara que em Isac veem perdurar a descen-
dência, são retomados na segunda leitura na perspectiva tipológica,
isto é, são figuras que preanunciam a realização na economia neo-
-testamentária. São typos de Simeão e Ana, que no contexto litúrgi-
co, ao seu modo, são os “novos Abraão e Sara”. Eles veem no menino
trazido por Maria e José, realizar a salvação, a luz que alcança a todos
Os povos.
À vida futura, que na Antiga Aliança era compreendida na base
da descendência, tem então nestas perícopes escolhidas para esta li-
turgia, apresentado nestes dois casos, a evolução sofrida ao longo da
história da salvação: Abraão é desafiado a provar sua fé nas promes-
sas divinas, sacrificando sua última esperança, seu próprio filho Isac.
O sacrifício não se efetua, mas a fé se confirma. Tal compreensão
e experiência da vida eterna se amadurece no longo percurso entre
Abraão e a chegada do Menino ao Templo. Neste último se entre-
vê um novo sacrifício a ser realizado e a vida eterna não mais fun-
damentada na descendência, mas na entrega oferente, voluntária e
Ele está no meio de nós! EIS
amorosa de Jesus, gerando a vida eterna para todos com sua ressurreição.
Outrora Deus, para provar a fé do seu servo, pede o sacrifício do seu único
Filho. Na nova economia, Deus aceita a oferenda livre de Jesus, que
gera a fé e confirma a esperança da humanidade.
Atualizando a Palavra
Mas é o contexto litúrgico que se torna decisivo para a compreensão
dos textos bíblicos: a sagrada família é a “lente hermenêutica” pro-
posta pelos textos eucológicos desta festa. À ela acorrem os pastores
(antífona de entrada). É ela modelo de amor e de virtude para as
nossas famílias (orações do dia e da comunhão), bem como interces-
sora em favor das famílias que celebram o sacrifício de reconciliação
(oração sobre as oferendas). Mas a virtude e a piedade conduzem
ao mistério da Igreja. As famílias terrestres, valor inestimável para
as nossas comunidades, são sinais de outras realidades: a comunhão
entre os irmãos e a comunhão com Deus que nos foi alcançada por
Jesus. Os laços de amor aqui vividos no ambiente familiar, conduzem
os fiéis às alegrias da casa de Deus (oração do dia). As famílias são
firmadas na graça divina, e por intercessão de José e da Virgem, con-
servadas na paz de Deus (oração sobre as oferendas).
À graça e a paz nos foram comunicadas no mistério de Cris-
to. Por sinal, esta é uma das saudações mais frequentes do início de
nossas celebrações (cf. 1Cor 1,3). As comunidades celebram perio-
dicamente pedindo, como família cristã, pelas mesmas coisas que a
liturgia desta festa suplica para as nossas famílias. À comunhão da
Igreja encontra seu reflexo nos lares e vice-versa. Não é por acaso que,
por longa tradição, os fiéis se nomeiam “irmãos” e “irmãs” uns dos
outros, pois todos foram irmanados em Cristo, aquele que conviveu
com os homens (antífona da comunhão). A comunhão sacramental
nos refaz para os embates da vida e nos associa à Sagrada Família
(oração depois da comunhão).
EA PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
1º de janeiro de 2012
Situando-nos brevemente
A celebração da Solenidade de Santa Maria, sob o título de Mãe
de Deus — para a tradição Oriental “Theotokos” — é a festa mariana
mais antiga para o rito romano, de que temos notícia. Nasceu como
celebração da oitava do Natal e a reforma conciliar lhe preservou,
recuperando seu sentido mais genuíno.
Uma das antífonas previstas para este dia, presente no Graduale Ro-
manum e mantida pelo Missal, nos concede o tom desta memória solene,
que se centra na manifestação do Filho de Deus como pessoa humana,
isto é, a Encarnação. Esta antífona oincide, inclusive, com a antífona de
entrada da Missa da Aurora do dia 25 de dezembro: “Hoje surgiu a luz
para o mundo: O Senhor nasceu para nós. Ele será chamado admirável,
Deus, Príncipe da Paz, Pai do mundo novo e o seu reino não terá fim”.*
O calendário civil reconhece neste dia a comemoração da paz
universal. Os cristãose cristãs assumem na celebração de 1º de ja-
neiro este aspecto, entendendo que a paz é a nota característica do
Reinado que Cristo Jesus inaugurou por sua natividade.
33 Cf Is 9,2.6; Lc 1,33
Ele está no meio de nós! PH
Recordando a Palavra
Nenhum dos textos bíblico-litúrgicos centra-se na figura de Maria,
mas nos conduzem à percepção da glória de Deus que se manifesta
no recém-nascido deitado na manjedoura a quem foi dado o nome de
Teshua (Jesus = Deus salva).**
O primeiro texto, tirado do livro dos Números com o Salmo
Responsorial (66) estabelece o eixo da Liturgia da Palavra em torno
da bênção. Deus pronuncia uma Palavra de bênção sobre os filhos de
Israel, mediante seu servo Aarão. O detalhe aqui é importante: o tex-
to hebraico reza “O Senhor falou a Moisés, dizendo: ' fala a Aarão e a
seus filhos, dizendo”.** No hebraico falar e dizer tem raízes diferentes
e podem ser empregadas como sinônimas, dependendo do contexto
em que aparecem. Em nosso caso, trata-se do uso simultâneo de duas
raízes verbais distintas. Temos certamente duas informações precio-
sas, dois enfoques que se enriquecem: a) “Deus fala”, ele enuncia, isto
é, se manifesta, comunica-se no que profere e tem uma linguagem,
uma maneira própria de se voltar para fora de si mesmo em direção
aos outros, em nosso caso, Israel; b) “Deus diz”, isto é, ele pronuncia
algo, cujo conteúdo é em si mesmo, importante para quem ouve. No
primeiro caso (falar), o enfoque está na ação, e no segundo caso
(dizer), o enfoque está no conteúdo do que é proferido.
O que Deus diz, segundo o texto de Números é uma fórmula de
bênção. Nesta fórmula que deve ser repetida ritualmente** por seus
ministros (Aarão e filhos) é o próprio Nome de Deus — Ele mesmo,
portanto — que será invocado.” A bênção (fórmula) é reveladora da
presença (Nome). O Salmo que segue à leitura esclarece isso com o
primeiro versículo em paralelismo: “Que Deus nos dê a sua graça e a sua
bênção — que sua face resplandeça sobre nós.
Atualizando a Palavra
O que tudo isso significa para nós e para o mundo no qual vivemos?
A bênção que descrevemos acima, mudando toda a nossa compre-
ensão e atuação, preside nossa consciência e dirige nossas ações. À
salvação eterna é conferida à humanidade inteira, conforme reza a
Oração do dia. O caráter mariano desta celebração liga-se a este fato.
Uma vez habitando o ventre de uma mulher e dela nascendo, a salva-
ção nos alcança e transforma por dentro, elevando à mais alta digni-
dade a nossa humanidade. Por isso se poderá dizer que quanto mais
humanos formos, mais divinos estaremos nos tornando. Mas não por
mérito nosso ou razões humanas, mas pelo querer de Deus. Afinal, é
do seio de uma “Virgem” que nos vem tão grande evento.
38 Cf. Gl4,5-7.
Ele está no meio de nós! pu
A Palavra e a Eucaristia
Maria, lembrada nesta solenidade como Mãe de Deus porque o Ver-
bo nela fez morada, é imagem da Igreja que traz consigo a Palavra de
Deus e a apresenta ao mundo. Assim, é Mãe de Deus, mas também
da Igreja, conforme reza a Oração depois da comunhão. À comu-
nidade dos fiéis, qual Corpo de Cristo, é gerada sempre e de novo
quando celebra a Eucaristia. O que se diz em mistério da Mãe do
Senhor, se cumpre na Igreja em oração.
Quando na ação de graças os olhos dos fiéis se voltam para
Deus e suas mentes nele são postas — Corações ao Alto! O nosso
coração está em Deus — significa que, olhando ao redor, contem-
plando o mundo, esses mesmos olhos reconhecem nele a Palavra de
Deus. Seu falar habita tudo o que é dito como sinônimo de bênção.
À paz proclamada no interior de um mundo cada vez mais violen-
to; a fraternidade afirmada numa sociedade que progressivamente
cultua o individualismo; a solidariedade exercitada em contextos de
severa opressão; a tolerância praticada em situações em que impera
Situando-nos brevemente
“O de casa, ô de fora! Maria vai ver quem é!” Quem não conhece e
não se empolga com estas primeiras linhas da cantiga de reis? Em
muitas partes do Brasil, nesta época do Natal pipocam folias, que
percorrem presépios visitando o Menino-Deus nascido. O costu-
me dos reisados veio para o Brasil com os portugueses. Sua origem
tem a ver com o anúncio feliz, de porta em porta, do nascimento do
Messias.
Como festa litúrgica, a Epifania deita raiz na tradição das Igrejas
do Oriente, onde se identificava com a celebração da Natividade de
Jesus, firmada no Ocidente (Roma) no dia 25 de dezembro. Com o
passar do tempo, entrou para o calendário romano sob o título “Epi-
fania” e também “Teofania”. O aspecto ressaltado, porém, não é mais
a natividade, mas a manifestação da divindade de Cristo a todos os
povos. Assim, entra em jogo a figura dos Reis Magos. Como vere-
mos, a Liturgia da Palavra, a eucologia e demais elementos da prece
litúrgica enfocarão claramente este aspecto.
Recordando a Palavra
A Liturgia da Palavra (LP) se abre com o texto profético de Isaías
(60,1-6). No contexto bíblico, é uma poesia de consolo à comunidade
Ele está no meio de nós! 6.
Atualizando a Palavra
Para esta solenidade, o versículo que abre a Oração da Manhã, quan-
do a esta precede o invitatório, diz exatamente: “A Jesus que se revela,
vinde todos, adoremos”. O que se diz acerca dos Reis de toda terra e
de todas as nações (I leitura e salmo responsorial) se aplica à comu-
nidade dos fiéis em celebração, como sinal do que se espera e deseja
para a humanidade inteira. Com as palavras de Leão Magno, grande
teólogo deste tempo litúrgico, podemos dizer: “Entrem, pois, todos
os povos, entrem na família dos patriarcas, e recebam os filhos da
promessa a bênção da descendência de Abraão (...) que todos os po-
vos, representados pelos três Magos adorem o Criador do universo”.
Seguindo esta perspectiva, podemos citar São Paulo em sua carta
aos Efésios quando afirma: “Este mistério, Deus não o fez conhecer
aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo
Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: os pagãos, membros do
mesmo corpo” (II Leitura). Assim como a glória de Deus paira so-
bre Jerusalém e os poderes de Deus se tornam evidentes no governo
justo do Rei, atraindo a atenção e o reconhecimento de todos os reis
e nações da terra, na Igreja, comunidade dos fiéis e corpo de Cristo,
rebrilha a ação majestosa do Senhor. À imagem que a Igreja tem de
si mesma, segundo o Concílio Vaticano II é exatamente esta: de ser
como que “sacramento da união íntima com Deus e da unidade de
todo o gênero humano” (Lumens Gentium, n. 1). Cristo é a Lumen
Ele está no meio de nós! Jeiy)
Igreja também é revelada, pois fomos chamados das trevas à luz admirável
para ser luz para os irmãos (cf. Bênção Solene da Epifania).
É muito bem-vindo o costume de se anunciar a data da Páscoa
e demais festas do Senhor por ocasião da solenidade da Epifania. O
Ano Litúrgico é uma das maneiras privilegiadas da Igreja manifestar
a luz de Cristo na qual está mergulhada. Aos fiéis que escutam com
atenção a publicação dos mistérios a serem celebrados em datas pre-
cisas do ano civil, segundo o tempo cronológico, deveria ficar patente
a alegria de poderem “acolher com fé e viver com amor o mistério”
que celebram. Afinal, será nas lutas de cada dia do ano que deverão
reconhecer o esplendor da face de Cristo manifestando-se.
"BATIZADO POR JOÃO NO RIO JORDÃO... AO SAIR DA ÁGUA, VIU O CÉU SE ABRINDO”
Situando-nos brevemente
A Festa do Batismo do Senhor situa-se entre o Tempo do Natal e
o início do Tempo Comum. De um lado, vemos o final do ciclo da
Encarnação, período em que a manifestação do Senhor aprofunda o
sentido das comemorações natalinas; de outro, vislumbramos a che-
gada dos primeiros domingos do Tempo Comum, tempo em que a
manifestação do Senhor se prolonga, mas apresentando laços com a
missão de Jesus e o chamamento dos discípulos. Essa primeira parte
do Tempo Comum também nos introduz no mistério da Páscoa. O
Evangelho de João nos ajuda a compreender melhor isso: “A Pala-
vra estava no mundo — e o mundo foi feito por meio dela — mas o
mundo não quis conhecêla. Veio para o que era seu, e os seus não a
acolheram” (Jo 1,10-11). É neste contexto que devemos considerar
as leituras e orações da liturgia, aproximando-nos do mistério que
celebramos nesta festa.
Recordando a Palavra
O batismo de Jesus no Jordão narrado pelo evangelista Marcos tem
como base Is 63,11.19, onde se evoca a figura de Moisés, da páscoa
judaica, e a abertura do céu como imagem da desejada ação divi-
na em favor do seu povo. Em Marcos, Jesus é apresentado como
o novo Moisés e pastor que vai conduzir o povo na nova páscoa a
Ele está no meio de nós! [cu
Atualizando a Palavra
O testemunho de João, mencionado na antífona da comunhão, confes-
sa Jesus como Filho de Deus. Tal afirmação, que também é a síntese do
Evangelho de Marcos (cf. Mc 1,1; 15,39), retoma a proclamação celeste
no evangelho desta festa. À filiação de Jesus é modelo e princípio da filia-
ção dos crentes, chamados a perseverar na sua vocação filial, cumprindo o
mandamento do amor (oração do dia). À segunda leitura insiste neste as-
pecto: crer em Jesus significa fazer fielmente a vontade de Deus, prova de
amor por aquele que nos qualificou como filhos. Guardar o mandamento
do amor é viver a vida em Cristo, razão do nosso batismo e da nossa fé.
Tal comunhão, concedida pelo sacramento primordial que re-
cebemos, faz a comunidade ouvir junto a ele a solene proclamação:
09) PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Situando-nos brevemente
Findou-se o tempo do Natal, mas a sua luz continua a clarear a ex-
periência de Deus que a comunidade é chamada a fazer. O Tempo
Comum se abre como tempo transitório entre o Natal e a Quaresma,
recordando-nos o mistério da revelação de Deus e da rejeição por
parte da humanidade. À luz “veio para os seus, mas os seus não a
acolheram” (Jo 1,11). Este versículo do quarto Evangelho apresenta
bem o caráter desses domingos comuns que antecedem a Quaresma.
Mas o período revela mais coisas do Mistério de Deus: como tempo
que, de certo modo, prolonga a luz do Natal. O mistério de Cristo
vai se manifestando (epifania) à humanidade na pessoa do homem de
Nazaré. Tal manifestação acontece na história da humanidade (era
por volta das quatro da tarde), entre os mais simples (pescadores) e de
modo inteiramente acessível (vinde ver).
Mas a manifestação de Deus nem sempre é clara aos nossos olhos
ou direta: Deus não se impõe! A revelação passa pela mediação das
pessoas, dos sinais e dos acontecimentos. Jesus é o primeiro desses
sinais: um homem da aldeia de Nazaré (igual na raça, na cultura, na
história...) que é apresentado como “Cordeiro de Deus” e Messias. “De
Nazaré pode sair algo de bom?”, nos dirá o Evangelho (cf. Jo 1,46).
Na relação mediada pelos sinais, muito daquilo que se revela, pode
permanecer oculto e o processo de reconhecimento de Deus acaba
Ele está no meio de nós! pes
Recordando a Palavra
Quando Jesus passa diante de João e de seus discípulos, a apre-
sentação “eis o Cordeiro de Deus!” parece supor uma preparação,
única coisa que pode justificar o fascínio e a atração imediata. Já
falavam do Cordeiro de Deus? Já estavam à sua espera? À passa-
gem de Jesus deixa de ser assim casual, tornando-se narrativa sin-
tética de uma preparação mais profunda por parte dos discípulos,
para acolhê-lo. Jesus ao perceber que está sendo seguido, pergunta
o que buscavam? À resposta, mais que um interesse pelo endere-
ço do homem que seguiam, tinha um valor que assim poderia ser
descrito: “qual é a tua vida, o teu modo de existir, o mistério da
tua pessoa?”.'! À resposta de Jesus “vinde ver” responde à demanda
dos discípulos. O verbo “ver” tem significado especial no Evangelho
de João, e o texto deste domingo situa-se entre dois relatos onde o
mesmo verbo ocorre de forma marcante: “e nós vimos a sua glória”
(Jo 1,14), “Verás coisas maiores que estas” (Jo 1,50b). Mas a vida de
Jesus, seu modo de existir e o mistério de sua pessoa se revelam na
medida em que seus discípulos permanecem com ele (cf. v.39). No
quarto Evangelho, os sinais que principiam com as bodas de Caná,
são reveladores da sua pessoa: passam pela visão física e transportam
para uma realidade maior que confirma a fé dos discípulos (visão es-
piritual) e manifesta a glória de Deus. É tal experiência que suscita o
encantamento e a atração por Jesus, pois produzem uma transforma-
ção do discípulo e da comunidade dos seus seguidores.
Atualizando a Palavra
À primeira leitura narra o chamado de Samuel. O insistente chamado
por parte de Deus reforça a dificuldade do jovem em identificar quem o
chama. De fato, o versículo 7 afirma que Samuel ainda não conhecia o
Senhor, muito embora ele estivesse dormindo junto à arca, no Templo.
Aqui está a chave da questão: não o chamado em si, mas o reconheci-
mento de Deus que se dá por meio de outro. Só depois é que o jovem
responde já iniciado pela percepção de Eli. O mesmo se dá com os
discípulos: os primeiros só reconhecem Jesus quando João afirma,
“eis o Cordeiro de Deus”. Em seguida são eles que apresentam Jesus
a Pedro, o conduzido ao Mestre. O anúncio aos demais discípulos
aparece no canto de aclamação ao evangelho: o foco recai sobre quem
é Jesus e não sobre o chamamento ou o seguimento.
A Palavra de Deus nesta celebração chama a atenção para as-
pectos importantes da vida cristã. Nosso encontro com o Messias, o
Cordeiro de Deus, se dá pelas mediações da comunidade, nos ami-
gos, dos sinais e ritos da celebração. Eles nos introduzem no caminho
do seguimento e nos revelam quem é Jesus. Por isso, é importante
avaliar qual a revelação de Deus que a comunidade cristã, a partir da
sua vida e da sua missão, está levando para os outros.
Uma vez inseridos nos caminhos de Jesus, e tomando parte no
seu convívio, o que e a quem buscamos realmente? Como Jesus não
está mais visível entre nós, o reconhecimento da glória de Deus no
sacramento dos irmãos, sobretudo entre os mais sofridos, torna-se
uma exigência do seguimento. O convite de Jesus permanece: “Vinde
e vede”. Não sejamos nós aqueles a dizer: “E algo de bom pode vir
daí?”
fórmula mais usual por outra opção. Entre as demais opções propostas,
consta aquela que retoma o salmo 33(34)9, o mais antigo canto de co-
munhão da Igreja: “Provai e vede como o Senhor é bom, feliz de
quem nele encontra o seu refúgio”. O cálice e a patena com o pão são
sinais humildes e simples da glória de Deus. Mas sua simplicidade
nos remete a uma realidade mais profunda e importante: a glória de
Deus continua a se manifestar em nossa história, onde Jesus nunca
passa casualmente. Na fragilidade do pão partido e do vinho com-
partilhado, ele prolonga seu convite a conhecer sua morada, isto é:
seu modo de viver, o mistério da sua vida. “Provai e vede...”, quase
igual à resposta de Jesus no evangelho (vinde e vede!), tem então no
altar sabor de intimidade e de reconhecimento. Resposta ao nosso
interesse de buscá-lo, segui-lo, conhecê-lo. À visão que contempla o
pão reconhece, pela fé, o Cordeiro de Deus.
Situando-nos brevemente
O Ano Litúrgico é Cristo, afirma Bergamini. Bem mais do que um
calendário que coleciona festividades, é uma realidade sacramental,
símbolo do Cristo que se faz, Ele mesmo, caminho de conversão.
Assim, começamos o Tempo Comum com um apelo firme e exigente
de conversão ao Reinado de Deus.
Vislumbramos durante todo o Ano Litúrgico as passagens de Je-
sus por entre as pessoas, atravessando cidades e povoados, percorrendo
seu país de uma extremidade a outra rompendo fronteiras e criando la-
ços apoiados na fé do Deus a quem chama de Pai. Deste modo, diante
de nossos olhos, o tempo cronológico vai sendo vivido na perspectiva
litúrgica e se torna itinerário para conformar a nossa existência ao Es-
pírito de Jesus no qual fomos mergulhados pelo Batismo.
À cada semana, o Domingo quer ser esta “brecha” de acesso ao
Mistério que impregna tudo e todos, mas que nos escapa em meio às
tribulações cotidianas. Por isso, no intuito de sermos reintroduzidos na
dinâmica do Reinado de Deus ao celebrarmos o Dia do Senhor, a Igre-
ja, através dos ritos iniciais da Eucaristia nos exorta: “No dia em que
celebramos a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte, também nós
somos convidados a morrer ao pecado e ressurgir para uma vida nova”.
Recordando a Palavra
À Tleitura (Jn 3,1-5.10) pode ser lida em chave tipológica: aquilo que
se diz de Jonas se realiza em Jesus. Jonas, a mando de Deus põe-se
a caminho para anunciar a palavra de conversão que lhe é confiada;
Jesus se põe a caminho na Galileia para anunciar a plenitude dos tem-
pos, a iminência do Reinado de Deus e a conversão. Temos, assim,
estabelecido o enfoque da Liturgia da Palavra e o elo entre 1 Leitura
e Evangelho. O Salmo Responsorial aprofunda esta relação quando
insiste no conhecimento das estradas do Senhor, que dão acesso à ver-
dade e à justiça. Mas, a ligação fica mais obvia ao afirmar a misericór-
dia e compaixão divinas que conduzem o pecador ao bom caminho.
A I leitura (1Cor 7,29-31) encaminha o nosso olhar para a noção
do tempo e sua relação com a realização do Reinado de Deus. Por
isso, São Paulo comunica à comunidade de Corinto a urgência da
conversão. Resumiríamos suas preocupações em duas afirmações que
emolduram seus conselhos: irmãos, “o tempo está abreviado (...) pois
a figura deste mundo passa”. Examinando melhor a primeira expres-
são, descobrimos que Paulo não está falando do tempo cronológico, pois
não usa seu equivalente grego “chronos”, mas “kairós” que significa, nos
escritos paulinos, uma relação entre o mundo presente e o seu destino
aos olhos de Deus, isto é, a salvação. À afirmação “o tempo está curto”
refere-se à proximidade da salvação que exige a relativização de todo e
qualquer “esquema” de vida. Neste sentido, nossa atenção recai sobre a
segunda expressão — “a figura deste mundo passa”. À palavra grega usada
para “figura” é “schema”, que pode ser traduzida por esquema, forma mas
também por atitude.** E uma palavra rara no NT, aparece só duas vezes.
Tendo em conta a primeira leitura em que se reconhece a acolhi-
da da palavra de Deus anunciada por Jonas e a conversão dos ninivi-
tas, o mesmo se espera-da comunidade cristã perante a iminência do
43 1Cor 7,29.31
44 Cf. BALZ Horst. SCHNEIDER, Gerard. Diccionario Exegético del Nuevo Testamento.
Volumen II. Salamanca: Ediciones Sigueme, 2002, p. 1630.
Ele está no meio de nós! Es
Atualizando a Palavra
À leitura tipológica dos textos bíblicos nos ajuda a perceber a boa
ação de Deus na história, oferecendo por sua palavra a oportunidade
de regeneração, na qual os seres humanos poderiam voltar à sua con-
dição original, ao “esquema” primordial intuído pelo Criador. Ho-
mens e mulheres de outras épocas souberam captar o interesse divino
de sermos cuidados por Deus e esta percepção os levou a assumir
mudanças fundamentais na maneira de conduzir suas vidas. E isto
se tornou mais claro, pleno e disponível para nós em Jesus Cristo e
sua Páscoa.
À aclamação ao Evangelho, pelo vocativo “irmãos”, nos indica
que esta experiência situada no passado é também uma possibilidade
para nós que estamos no limiar da plenitude dos tempos: “O Reino de
Deus está perto! Convertei-vos, irmãos, é preciso! Credes todos no Evan-
gelho”, À Liturgia deste domingo, nos faz pensar que toda ordem
deve ser posta em crise perante o Evangelho. Todo esquema deve ser
posto sob suspeita, a fim de que se verifique se sua direção está con-
forme o amor de Deus que, de diversas formas se mostrou na história
e em Jesus se tornou tão óbvio que é capaz de modificar nossa vida,
frutificando em boas obras.”
grado.
5. Nos ritos finais, faça-se a oração sobre o povo n. 9 seguida da
bênção final, conforme possibilita o Missal Romano.
4º DOMINGO DO TEMPO COMUM
29 de janeiro de 2012
Situando-nos brevemente
O evangelho narra o início das atividades de Jesus depois do chamado
dos discípulos. Seu ensinamento ressoa de modo diferenciado aos
seus contemporâneos que o reconhecem com admiração e espanto.
O próprio espírito impuro reconhece Jesus como “o santo de Deus”
que veio para destruí-los (os espíritos impuros). Mas sobressai no
pequeno relato a autoridade com que Jesus ensina, expressa pelos seus
admiradores ao fim e ao início desse trecho. À autoridade de Jesus é
colocada em contraste com a autoridade dos mestres da lei, identifi-
cado como ensinamento novo que não repete as coisas do passado, ao
modo dos outros mestres.
Também a figura do homem possuído por um espírito mau, so-
bressai ao relato. É aí que se demonstra a autoridade de Jesus, pois
até ele obedece a Jesus, isto é, Jesus tem poder sobre ele. Seu ensi-
namento produz a libertação do homem e decreta o final do reinado
do mal. Não é um ensino inócuo, vazio, sem frutos, mas um ensino
que se demonstra totalmente novo, realizando a novidade messiâni-
ca. De fato, o messias, segundo a esperança judaica, teria atribuições
apotropaicas. À inauguração desse novo tempo se realiza em Jesus e
o reconhecimento de Jesus por parte do povo se espalha. Contudo,
Jesus rejeita o falso testemunho do espírito impuro, ordenando que
ele se cale.
Ele está no meio de nós! KA
Recordando a Palavra
À primeira leitura torna mais claro o sentido do ensinamento
feito com autoridade: Jesus é o profeta enviado por Deus e por
ele autorizado a falar em seu nome. À profecia o diferirá dos
demais notáveis do povo, pois o situará em atitude não condi-
cionada e livre para ser o legítimo porta-voz de Deus. À leitura
do Deuteronômio ainda diz que tal profeta é uma atenção à so-
licitação do povo que não desejava mais passar pela experiência
do Horeb, quando temia morrer. O profeta, afirma o texto, será
como Moisés (cf. v.15), o legislador soberano de Israel. Toman-
do em consideração o precioso versículo da aclamação ao evan-
gelho (Is 9,1), que recorda a primeira leitura da noite de Natal,
tem-se a exata noção de quem vem a ser esse profeta: o próprio
Filho de Deus. Tais informações concorrem para reforçar o en-
sino autoritativo de Jesus.
Também a oração após a comunhão ajuda a compreender a ex-
tensão do ensinamento autorizado de Jesus: ele nos alcança na cele-
bração por meio dos sacramentos da redenção, produzindo a fé. De
fato, a fé é fruto da escuta da Palavra de Deus (cf. Rm 10,17). Mas
também os sacramentos são frutos da mesma Palavra. É a Palavra
revestida de sinal, ensinamento em gesto, realização e manifestação
do anúncio da salvação. O alimento de que fala a oração é o ensina-
mento autorizado de Jesus que se converte em pão e vinho, alimen-
to da fé autêntica da comunidade cristã. Nesse sentido, o evangelho
narrado prolonga-se na Eucaristia, pois o reconhecimento da auto-
ridade de Jesus demonstrada pela libertação do homem possesso,
isto é, ensinamento que se traduz em fato, que produz vida e liber-
dade, mais uma vez se converte em salvação, renovação, progresso
na fé.
EMA PNt - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Atualizando a Palavra
Aderir a Jesus tem a ver com o reconhecimento dos sinais que
seu ensinamento produz. À comunidade é continuadora desse
anúncio, mas deve se empenhar para que não seja um anún-
cio vazio, ou desautorizado. Por isso, a volta ao Evangelho
deverá ser uma atitude constante para definir essa conexão
com o Mestre. E o empenho deve também estar direcionado
para a realização da libertação e da cessação do mal: tudo o
que desfigura a vida humana, convertendo-a em prisioneira
e vítima dos atuais “espíritos impuros”, deve ser cessado pela
força do Evangelho. Ações que minimizem a fome, a violên-
cia, o egoísmo e a indiferença, bem como todos os efeitos do
mal, são ações do Cristo libertador que continua a expulsar
de nosso meio o fermento da maldade. São concretizações de
seu ensino, comprovam sua eficácia e revelam a autoridade do
Evangelho.
Leituras: MI3,1-4/Sl23
Hb 2,14-18 / Lc 2,22-40
Situando-nos brevemente
À Igreja celebra neste dia uma festa de origem oriental hipapante
(encontro). Já no século IV a peregrina Egéria, uma monja espanho-
la em Jerusalém, dá a descrição mais antiga desta festa: “Aqui (em
Jerusalém) se celebra com grande solenidade o quadragésimo dia após a
Natividade. Nesse dia se faz uma procissão da Anástasis (Igreja do Santo
Sepulcro em Jerusalém) à qual todos vão, e se faz tudo segundo o rito, com
máxima alegria, como na Páscoa. Além disso, todos os sacerdotes pregam o
mesmo que o bispo, comentando a passagem do evangelho em que se conta
que no quadragésimo dia, Maria e José levaram o Senhor ao templo, e que
a ele vieram Simeão e a profetiza Ana, filha de Fanuel, e as palavras que
disseram ao verem o Senhor, e a oferenda que fizeram seus pais. E, depois
de terem feito de forma ordenada todas estas celebrações como se costumava,
se celebravam os mistérios e terminavam a função com a despedida”**
A festa assimilada pela Igreja latina, se acomodou ao contex-
to romano, sobretudo ao substituir as antigas procissões pagãs cha-
madas de “lupercalias”, de caráter lustral (purificatório), tornando-se
grande ocasião de evangelização e de inculturação. Posteriormente,
Recordando a Palavra
À vinda do Senhor ao Templo de Jerusalém, narrado como apresen-
tação e purificação da mãe, dois ritos não necessariamente conexos
na tradição judaica, tem na nossa liturgia um “sabor” de manifesta-
ção de Jesus ao povo da Antiga Aliança. Simeão e Ana são os últimos
que “esticam o pescoço”, já na economia do Novo Testamento, para
testemunhar a realização das promessas. No hino de Simeão (“Ago-
ra, Senhor...”) ressoa o hino angélico e o relato da noite de Natal.
Mas é sobretudo a sua profecia que revela o significado do menino:
sinal de contradição, causa de queda e de soerguimento, revelação do
íntimo dos corações e espada a atravessar o coração da Mãe. Estes
aspectos todos desenham de forma muito específica o perfil messiã-
nico de Jesus. Junto à esperança, alegria e revelação que o encontro
produzem, se apresentam, de forma embrionária a cruz e as durezas
da sua missão, sua paixão e morte.
Mas o menino apresentado é enviado por Deus, chamado na pri-
meira leitura de anjo (mensageiro), ao qual não se pode resistir. Não
se pense aqui, porém, em força militar, embora o salmo pareça suge-
rir isso, pois no dizer do salmo 8, as crianças são de Deus a força que
dobra os seus rivais. É da sua pequenez que emana tal força de atra-
ção e se faz brilhar a sua luz: infância e cruz, neste texto sinalizado,
como aspectos do mesmo mistério da encarnação, revelam por onde
Deus começa a salvar: no meio dos pobres. Dentre os pequenos, para
confundir os sábios e entendidos (sinal de contradição), derrubando
Eee] PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Atualizando a Palavra
O encontro com o Senhor tem ainda outra nuance apontada pelo
Salmo responsorial que convida a abrir as portas para a entrada do
Rei da glória. É a própria comunidade que respondendo se abre ao
Salvador, acolhendo como Simeão e Ana, a luz esperada e a glória de
Deus que retorna ao Templo. As portas do “local” visitado por Jesus
é a própria humanidade, onde a salvação espera ser acolhida. Aquele
que se fez igual para salvar a todos, fez brilhar a glória de Deus ao
edificar o ser humano com sua ressurreição. Essa é a sua glória que
espera ter portas abertas para a sua solene entrada.
Simeão e Ana são imagens de todos os homens e mulheres que
aguardam e reconhecem a chegada de Deus nos sinais pequenos,
onde Deus prefere operar sua revelação. São imagem da Igreja que,
corajosa e profeticamente, entoa o louvor de Deus confessando sua
salvação para todos. São os cristãos que tomam, não só nos braços,
mas acolhem na sua vida inteira, a luz do evangelho que o Menino
Deus nos traz.
Situando-nos brevemente
Nestes primeiros domingos do Tempo Comum, somos convidados a
contemplar Jesus anunciando o Reinado de Deus mediante palavras
e sinais de salvação. À Liturgia relaciona, então, sua Páscoa com o
pleno desenvolvimento humano, ao qual Jesus ordena seu ministério.
Para ele, a glória de Deus é, de fato, “o ser humano de pé”.
À Liturgia da Palavra e a eucologia deste domingo conduzem o
olhar dos fiéis para reconhecer em Jesus o auxílio do Pai. Emblemá-
tico, neste sentido, o prefácio da Oração Eucarística para as diversas
circunstâncias VI-D: “Com a vida e a palavra anunciou ao mundo que
sois Pai e cuidais de todos como filhos e filhas”.
Recordando a Palavra
Se a sinagoga, no domingo precedente, foi o ambiente para a atividade
exorcista de Jesus — com a autoridade da Palavra de Deus ele faz calar
a maldade que habitava um homem presente à reunião da comunida-
de — agora, seu ministério se dá em clima doméstico. Numa breve re-
trospectiva destes três domingos, somos testemunhas do trabalho de
Jesus em três ambientes diferentes: à beira do mar da Galileia (lugar
Atualizando a Palavra
À Igreja conhece profundamente o coração de seu Senhor e assume
seu fardo. Por isso, vemos Paulo assumir com liberdade a “imposi-
ção” de anunciar o Evangelho?. Parece contraditório, mas não é. Sua
liberdade consta de abraçar o encargo sem pretender honras, porque,
como ele próprio afirma “por causa do Evangelho faço tudo, para ter
parte nele”,
À comunidade cristã — a Igreja — existe para dilatar o trabalho
de Cristo Jesus. Como ele, não mede distâncias para transmitir a Boa
Nova. Quem vive num país de dimensões continentais como o nosso,
consegue compreender o esforço e a dedicação de milhares de ho-
mens e mulheres em fazer notável a páscoa de Cristo, mediante seu
apostolado pastoral. Gente anônima, oculta da mídia, mas que — ao
exemplo do Senhor — carrega sobre si as dores dos irmãos, para que
respirem aliviados. À Igreja preconizada pelo Concílio Vaticano II
entende desta forma sua atuação no mundo contemporâneo:
“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos ho-
mens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são
também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos
discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente hu-
mana que não encontre eco no seu coração”.
Sugestões a celebração
1. Como Canto de Entrada, sugerimos “Povos todos louvai ao
Senhor” (Caderno de Partituras do ODC, volume II, Paulus). Ou-
tra opção, igualmente adequada é “De todos os cantos viemos” (CD
cantos de abertura e comunhão).
2. Poderia ser feita uma recordação da vida após a saudação
presidencial, recordando as alegrias e tristezas, esperanças e angús-
tias da comunidade.
3. O Ato Penitencial pode ser feito com o formulário 3 do
Missal Romano, com o texto n.4. Neste caso, escolha-se uma
melodia para cantilar (recitativo livre). O terceiro fascículo do
Hinário Litúrgico da CNBB, à p. 31, oferece uma partitura de
Kyrie, de cujo motivo melódico pode-se compor o recitativo. Ou-
tra possibilidade é recitar as invocações e cantar as aclamação
Kyrie/Christe eleison.
Situando-nos brevemente
A cura do leproso se insere no amplo cenário da manifestação do
Filho de Deus proclamado no ciclo do Natal que se prolonga no
Tempo Comum: “um grande profeta surgiu entre nós e se mostrou...”
(aclamação ao evangelho). Muitos aspectos importantes se mostram
neste texto, revelando sua riqueza, mas, sobretudo, mostrando “a que
veio” o Filho de Deus, e sua identidade. O pedido pela cura já trazia
a afirmação do poder de Jesus. À fé do homem enfermo já o leva a
confessar o poder de Jesus: “Se queres, tens o poder de curar-me”. O
encontro tem por trás a dura situação das pessoas enfermas no tempo
de Jesus, sobretudo em relação à religião. Elas eram consideradas
impuras e, portanto, inaptas para prestar culto a Deus. De fato, a
lei mosaica determinava a exclusão de tais pessoas (primeira leitura).
Elas, por sua vez, deviam se declarar assim, demonstrando com rou-
pas rasgadas, cabelos desgrenhados, avisando aos demais, com gritos,
a sua impureza.
À primeira vista, nossa reação perante tal situação tende a julgar
esse tipo de mentalidade como meramente excludente ou até mesmo
perversa. É porque pensamos a partir das categorias do nosso tem-
po, quando muitas dessas enfermidades são tratáveis e possíveis de
serem curadas, inclusive a hanseníase, ou mesmo a partir das nossas
categorias religiosas. Nesse caso, é bom situar bem o problema em
E&I PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Recordando a Palavra
Por compaixão, Jesus não hesita em conceder a cura ao leproso. Ele
tinha o poder de curar, e mais que isso, ele trazia consigo o desejo
salvífico do Pai. Mas a relação entre puro e impuro se mostra em
perfeito contraste no encontro com o leproso: de um lado, Jesus,
o Filho de Deus, totalmente puro e santo; o leproso, no outro ex-
tremo, era considerado como o impuro e sua impureza era vista
também como pecado. Na relação, que é absolutamente desigual,
o puro e santo se sobrepõe ao impuro e pecador, curando-o, purifi-
cando-o e perdoando-o. À santidade e a pureza divinas “vencem” a
impureza, a doença e o pecado. À vida se restaura diante da atitude
“sacramental” de Jesus: gesto e palavra revelam a salvação de Deus
que supera as limitações humanas, religiosas e sociais. O homem,
reintegrado pela cura operada, foi enviado por Jesus aos sacerdotes,
prova de que Jesus não combate o contexto religioso, mas reenvia o
homem aos sacerdotes, cumprindo a lei mosaica e tornando a cura
reconhecida.
Doutro lado, o totalmente puro e santo, Jesus, cumpre sua traje-
tória pascal neste pequeno relato. Jesus, verdadeiro homem, não he-
sita em tocar o impuro, tornando-se também, por contato, impuro
4a
Ele está no meio de nós!
Atualizando a Palavra
Que significa seguir os passos de Jesus ao ouvir este evangelho? Ser
cristão vai além do viver um rol de preceitos morais. É vida em Cris-
to! Esse modo de vida determina o seguimento dos discípulos e dis-
cípulas de Jesus. O modo de vida daquele que se manifestou como
esperança para os doentes e excluídos, compassivo diante da aflição
alheia, pronto para atender à necessidade do sofredor, solidário na
sua condição e avesso à notoriedade ou fama.
À vida em Cristo supõe permitir que a mesma salvação se opere
em nós e por meio de nós como sinais da nossa filiação divina em Cris-
to, o Filho de Deus. À comunidade será tanto mais de Cristo, tanto
mais unida a ele, quanto mais se fizer aberta e atenta aos desvalidos
da nossa sociedade, presente nos ambientes e lugares onde a suspeita
e o temor de “contaminação”, ou de ser tratado como impuro afastam
os que buscam apenas viver bons preceitos. O Bom Pastor vai em bus-
ca da ovelha que se perdeu e veio para salvar o que estava perdido...
Cristianismo sem cruz, solidariedade e risco, está longe do evangelho
e de Jesus.
Ee PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
Sugestões a celebração
1. O canto “Eis meu povo o banquete” do Hinário Litúrgico 3,
da CNBB ajudará a manifestar e atualizar o sentido da celebração e
sua intrínseca conexão com as atitudes de solidariedade e de identifi-
cação com os necessitados.
2. O ato penitencial seja ocasião de manifestar a misericórdia
e a compaixão que Deus manifestou em Jesus. À opção por algum
dos formulários da terceira fórmula do ato penitencial propostos no
Missal, , revela o real sentido desse momento ritual.
3. As duas opções da primeira leitura ajudam a preparar a ho-
milia. Mas oferecerão diferentes direções hermenêuticas para o mes-
mo Evangelho. É bom estar atento à escolha, sobretudo fazê-la em
comunhão com o homiliasta e demais ministérios.
Ele está no meio de nós! na
Leituras: Is 43,18-19.21-22.24b.25 / SI 40
2Cor 1,18-22 / Mc 2,1-12
Situando-nos, brevemente
Nos domingos precedentes temos acompanhado Jesus atuar como
ministro do Reino de Deus. Uma vez que não se pode mais separar
Cristo da sua Igreja, aquilo que a ele se aplica, por decorrência, apli-
ca-se também aos que a ele estão ligados pelo batismo. Isto porque
vivem num único Espírito, são nutridos num único pão, professam
uma única fé. Se Cristo é garantia do cumprimento das promessas
de Deus, como veremos, à Igreja também não resta alternativa senão
abrir-se como espaço oportuno para que o Pai de Jesus cuide do seu
povo e restabeleça sua saúde.
Esta celebração do 7º Domingo do Tempo Comum ajuda-nos
na percepção da necessária unidade entre palavra e sinal, de modo
que seja integral o anúncio da iminência do Reinado de Deus. A
Igreja ser portadora do perdão divino que absolve o mundo das cul-
pas equivale a ser sinal deste mesmo mundo redimido, reconciliado
e íntegro.
Recordando a Palavra
Seguindo com a leitura semicontínua do Evangelho de Marcos, a
Liturgia da Palavra nos apresenta o trecho introdutório do segun-
do capítulo. À narração tem como ambiente Cafarnaum, sua casa.
Ele está no meio de nós! Ra
60 Mc 2,2b.
61 Era costume entre os escribas a “ordenação” para seu ofício, realizada por meio de imposição
das mãos.
44 PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
lembrarei dos teus pecados“? Com sua fala — “Filho, os teus pecados
estão perdoados” — Jesus só poderia entrar em conflito com os enten-
didos da Torah. Mas o que o trecho do Evangelho insinua é exata-
mente a identidade de Jesus, de onde ele provém e onde radica sua
autoridade. Na verdade, a aclamação ao Evangelho já nos dá esta
evidência quando seu versículo entoa: “Foi o Senhor que me mandou
boas notícias anunciar”.
Atualizando a Palavra
Após “recordar” as Escrituras e harmonizá-las segundo a pers-
pectiva do Lecionário, é possível dizer que em Jesus e por Jesus se
cumpre aquilo que é estabelecido por Deus, segundo a ótica profé-
tica e sapiencial. Mas também em relação à Torah, pois quem fala
no texto de Isaías é o Deus do êxodo, conforme um dos versículos
parcialmente omitidos pelo Lecionário: “Assim diz o Senhor, aquele
que abre um caminho pelo mar”.“º Logo, a totalidade das Escrituras
62 Is 43,25.
63 Is 43,16. Dizemos “parcialmente omitido” porque a introdução do texto de Isaías no Lecio-
nário lança mão do começo do versículo 16: “Assim diz o Senhor” O restante do versículo é
omitido, pois a identidade deste “Senhor”já deve ser de conhecimento dos ouvintes.
Ele está no meio de nós! LESAS
64 Cf. II Leitura.
65 2Cor 1,20.
66 Cf. 2Cor 1,21. Retoma-se aqui o versículo de aclamação ao Evangelho que em seu contexto
de origem (Lc 4,18) fala da unção ordenada ao anúncio da Boa Nova,
LEI PNE - BMC - Roteiros Homiléticos do Tempo do Advento Ano B - Novembro de 2011 / Fevereiro de 2012
67 PASTRO, Claudio. O Deus da beleza. À educação através da beleza. São Paulo: Paulinas,
2008, p. 32.
68 Cf. Oração Eucarística II]: “Que este sacrifício da nossa reconciliação estenda a paz e a
salvação ao mundo inteiro.
Ele está no meio de nós! UNE