Dissertação para Defesa Final Com Numeração

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“A

QUI JAZEM” MUITAS HISTÓRIAS:


UM ESTUDO ARQUEOLÓGICO DO ACERVO HISTÓRICO DO
CEMITÉRIO SANTO ANTÔNIO EM CAMPO MAIOR – PIAUÍ

(1804-1978)
Universidade Federal do Piauí
Centro de Ciências da Natureza
Programa de Pós- Graduação em Arqueologia

Jéssica Gadelha Morais

“Aqui jazem” muitas histórias: um estudo arqueológico do


acervo histórico do cemitério Santo Antônio em Campo
Maior- Piauí (1804-1978)

Teresina
2016
Jéssica Gadelha Morais

“Aqui jazem” muitas histórias: um estudo arqueológico do


acervo histórico do cemitério Santo Antônio em Campo
Maior- Piauí (1804-1978)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Arqueologia do Centro de
Ciências da Natureza da Universidade Federal
do Piauí, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Arqueologia.

Orientador:

Prof. Dra. Maria do Amparo Alves de


Carvalho

Teresina
2016
Jéssica Gadelha Morais

“Aqui jazem” muitas histórias: um estudo arqueológico do


acervo histórico do cemitério Santo Antônio em Campo
Maior- Piauí (1804-1978)

BANCA EXAMINADORA

________________________________
Prof. Dra. Maria do Amparo Alves de Carvalho-UFPI

Orientador/Presidente

_________________________________
1º Examinador

_________________________________
2º Examinador

_________________________________
3º Examinador (suplente)
Para os meus pais Maria Gorete Ferreira Gadelha e Elias Filho Morais e para minha
irmã Geicyane Gadelha Morais. Amo vocês. Também não poderia deixar de dedicar
à meu amado avô Elias Marcolino Morais que já não está fisicamente entre nós,
mas que nos acompanha todos os dias em nossos corações.
AGRADECIMENTOS

Desde 2012 venho me aventurando no cemitério Santo Antônio


aprendendo a olhá-lo no detalhe, na singularidade, na vida que pulsa no traçado do
epitáfio. O cemitério em si, livros, artigos e pessoas foram e é são o alicerce do
conhecimento acumulado ao longo desses anos e ésão a essas pessoas que aqui
quero agradecer pelo compartilhamento de suas experiências que temtêm
enriquecido as minhas.
Porém, antes de citá-las não poderia deixar de agradecer primeiro a Deus
que sempre me deu ânimo quando sobre mim se abateu o cansaço e a angústia,
próprios do difícil caminho trilhado na produção de uma dissertação, nem por isso
intransponível. Ao senhor Deus meu muito obrigadao.
Essencial colaboração teve Alcelina da Silva Neta, conhecida como Xuxa,
que há 34 anos vive em contato com o cemitério nele realizando os mais diversos
ofícios. Seu interesse e dedicação por ele nos aproximaram bastante, a ela devo
agradecer pelas histórias contadas, pelos alertas dados durante a realização da
pesquisa de campo, a exemplo do cuidado que eu deveria ter com as abelhas que lá
fazem companhia aos que já não se encontram materializado entre nós, e também
pela explicação dada a cada visitante dos entes queridos ali sepultados que ao
verem a numeração pregada nos túmulos atribuídas no momento do inventário se
escandalizavam temendo perder o local.
Em seguida agradeço ao Monsenhor Paulo Mateus dos Santos por ter
permitido o acesso aos Livros de Tombo, os de batismo, de casamento e os de
óbito, todos localizados na secretária da paróquia 1.
As secretárias Maria de Jesus Gomes e Marta que ajudaram na
localização dos livros e na forma de consultá-los.
A professora Dra.Jacionira Coêlho Silva pelo acolhimento no curso, em
especial no primeiro semestre com a disciplina de Atividade de pesquisa I.
A professora Dra. Amparo que tão prontamente aceitou orientar esse
árduo trabalho, com a calma e paciência que lhe é própria. Não precisa agradecer a
sua orientadora, orientar é sua obrigação.

1
Localiza na Praça Bona Primo, 188.
As professoras doutoras Jacionira Coêlho Silva, Francisca Verônica e
Viviane Pedrazzane pelas contribuições dadas durante a banca de qualificação
deste trabalho.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Arqueologia que
utilizando da enorme bagagem de conhecimentos que possuem apontaram as
fragilidades e as potencialidades dos trabalhos em andamento, e com isso nos
apresentaram possibilidades distintas de conduzirmos nossas pesquisas.
Ao professor e amigo mestre e doutorando Domingos Alves de Carvalho
Júnior que sempre se colocou a disposição para ler minhas produções textuais
recomendando ajustes e novas leituras.
Aos colegas de turma e de instituição que muitas vezes compartilhamos
das mesmas inquietações em especial a minha querida amiga Gabriela, que me
acolheu tão bem nesse novo espaço de produção de saber acadêmico e inclusive
abriu para mim as portas de sua casa, e ao querido Mauro pela generosidade do ato
de compartilhar bibliografias e o dom da sua arte de ilustrar.
A minha família que sempre me apóia e que confia nos trabalhos que
venho desenvolvendo, em especial a minha mãe que me acompanhou em todas as
etapas da pesquisa de campo, portanto esse trabalho é tão meu quanto dela. Amo
você.
Ao meu namorado Diego Rocha que sempre me apóia com palavras de
encorajamento e motivação.
Aos meus amigos de longa jornada Jadson Teixeira, Roniel Ibiapina, Ana
Claudia, Anadília Ribeiro e Antônio Serezo, José Sergio e Sâmara.
As minhas companheiras de trabalho na Universidade Estadual do Piauí,
Simone e Izamara.
A todos meu sincero agradecimento.
“Nesse campo, mesmo sem o cheiro da terra e o som da colher de pedreiro,
trabalha-se também com o documento material, quer seja pelos vieses dos textos.” Aqui nõa
está faltando uma parte do texto?

(José Reis)

Então, a morte existe, ela é parte da vida, é angustiante, não se sabe nunca
quando ela vai ocorrer. Eu só peço que ela seja indolor. Não sei se será.
Ninguém sabe como e quando vai morrer. Pessoalmente, tenho mais medo
do sofrimento que leva à morte do que da morte propriamente dita.
Se não é possível ter a pretensão utópica de sobreviver como pessoa física,
é possível ter a aspiração de viver na memória, começando por conviver
com a memória dos que se foram. Isso tem alguma materialidade?
Nenhuma. Isso é científico? Não é. Mas é uma maneira de você acalmar
sua angústia existencial. "Os mortos queridos vivem dentro de nós. Os que
morreram continuam a nos influenciar. Nós é que não podemos mais
influenciá-los".
(Fernando Henrique Cardoso)
RESUMO

O cemitério abriga elementos materiais e imateriais das manifestações do homem


frente aos mais diversos assuntos e, portanto não deve ser visto simplesmente como
o espaço destinado para o sepultamento do corpo sem vida, mas como uma
potencial fonte de informação da sociedade no qual está inserido. Partindo dessa
premissa o questionamento que norteia a presente pesquisa é de que forma o
cemitério Santo Antônio através de sua arquitetura fúnebre e dos seus artefatos
pode informar sobre como viviam as sociedades do passado. Ele está localizado a
80 ou 86 Km da capital Teresina no município de Campo Maior – Piauí e o último
enterramento nele realizado data de 1978. A sua escolha é atribuída ao fato de ter
sido provavelmente a primeira necrópole da cidade. O objetivo da dissertação é
investigá-lo destacando o potencial contido em seu acervo como instrumento para
tecer reflexões sobre o patrimônio funerário piauiense. A investigação é feita através
de descrição e análise interpretativa de seus artefatos e enxoval funerário cuja
ênfase é dada as lápides sepulcrais em virtude da variedade de informações que
agregam. Nela encontram-se os elementos iconográficos (desenhos, gravuras,
signos e etc.) e elementos gráficos (o texto escrito) que revelam ou ocultam a
história dos mortos para os vivos, ou seja, permitem identificar possíveis mudanças
da representação da morte bem como podem ser considerados como documentos
(fontes de informações) que permitem diferentes análises sobre a comunidade a
qual pertence. O percurso metodológico partiu de: pesquisa in loco, com o
levantamento de dados por unidade de sepulturas através de elaboração e
preenchimento de fichas técnicas, cujo trabalho de inventários realizados por Castro
(2014) foi de crucial importância; pesquisa documental, com consulta dos Livros de
Tombo da Freguesia de Campo Maior N°1 e 2, de batismo, de casamento, e de
registro de óbitos; e pesquisa bibliográfica, consistindo no levantamento de
publicações sobre estudos cemiteriais, pela abordagem de distintos campos do
saber (Patrimônio, História, Arqueologia histórica, Artes plásticas e etc), incluindo o
levantamento da produção local sobre o cemitério Santo Antônio. As atitudes e
representações da morte, por serem temas afins, também foram contempladas.
Entre os autores que se destacam por tais publicações estão Reis (199); Lima
(1994); Borges (2002); e Grassi (2014) entre outros apresentados no decorrer do
texto. O caminho percorrido possibilitou evidenciar aspectos singulares desse
espaço funerário em meio a uma história plural (como o seu período de implantação,
iconografias peculiares), além de múltiplas histórias desde as ditas até aquelas que
foram silenciadas.

Palavras-chave: Cemitério. Patrimônio fúnebre. Campo Maior – Piauí.


ABSTRACT

This thesis aims to investigate the Santo Antônio Cemetery highlighting the potential
contained in its collection as a tool to weave reflections of the funerary heritage Piauí.
The same is located 80 km from the capital Teresina in the city of Campo Maior -
Piauí, your choice is attributed to the fact that it had probably been the first necropolis
of the city.Research is done through description and interpretative analysis of their
artifacts and funerary trousseau whose emphasis is on the tombstones because of
the variety of information that add. In it, it is found the iconographic elements
(drawings, prints, signs and etc.) and graphics (written text) that reveal or hide the
story from the dead to the living, that is, identifying possible changes in death
representation and can be regarded as documents (information sources) that allow
different analyzes of the community to which they belong.The methodological route
came from research in loco to the survey data per unit of graves through preparation
and filling techniques chips whose work inventories conducted by Castro (2014) was
of crucial importance; documentary research with consulting Tombo books of the
Parish of Campo Maior No. 1 and 2 of baptism, marriage, and death records; and
literature consisting of the survey of publications on cemeterial studies by the
approach of history and historical archeology including the survey of the local
production on the Santo Antonio cemetery.Attitudes and representations of death,
being related topics, were also addressed. Among the authors that stand out for such
publications are Reis (199); Lima (1994); Borges (2002); and Grassi (2014) among
others presented throughout the article.

Keywords: Cemetery. Funeralheritage.Campo Maior-Piauí


LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Cemitério do Batalhão .......................................................................30
Figura 2 – Localização de Campo Maior ............................................................49
Figura 3 – Distribuição dos edifícios na Vila de Campo Maior............................54
Figura 4 – Planta da vila de Campo maior .........................................................56
Figura 5 – Sepultamento na catedral de Santo Antônio .....................................75
Figura 6 – Vista aérea da cidade de Campo Maior em 1934 .............................77
Figura 7 – Vista aérea do cemitério Santo Antônio.............................................81
Figura 8 – Planta baixa do cemitério...................................................................82
Figura 9 – Muro de pedra de jacaré parcialmente destruído...............................84
Figura 10 – Altar com poste de madeira..............................................................87
Figura 11 – Altar com novo poste de iluminação.................................................87
Figura 12 – Cruz das almas em madeira.............................................................88
Figura 13 – Vista panorâmica da parte frontal, predominância de
covas simples com pedra local.........................................................90
Figura 14 – Telha contendo inscrição..................................................................90
Figura 15 – Sepultamento mais antigo no cemitério Santo Antônio...................97
Figura 16 – Sepultamento mais recente no cemitério Santo Antônio.................98
Figura 17 – Transformações culturais no túmulo da menina Maria Lúcia
Andrade..........................................................................................102
Figura 18 – Painel de fotografias cemiteriais (século XX)..................................107
Figura 19 – Sepultura demarcada com pedra local............................................125
Figura 20 – Painel das representações encontradas nas lápides
e grade de ferro das sepulturas do século XIX(1804-1889)................................135
Figura 21 – Procedência e registro de fabricante gravada na lápide.................146
Figura 22 – Cristo de Thorwaldsen ....................................................................147
Figura 23 – Curral de gado com Cristo ao alto ..................................................149
Figura 24 – Alegoria do principio cristão e sentimental .....................................150
Figura 25 – Archote voltado para baixo..............................................................150
Figura 26 – Ampulheta alada e papoulas...........................................................150
Figura 27 – Desolação- Alegoria do principio sentimental.................................151
Figura 28 – Sepultura no cemitério São José em Teresina-Piauí I....................153
Figura 29 – Sepultura no cemitério São José em Teresina-Piauí II...................154
Figura 30 – Vista posterior das sepulturas encontradas no cemitério
São José em Teresina-Piauí............................................................155
Figura 31 –Morte e lembrança- alegoria do principio cristão e sentimental.......156
Figura 32 –Morte e juízo final- alegoria do principio cristão...............................157
Figura 33– Oração- alegoria do principio cristão................................................158
Figura 34– Outras representações do anjo na primeira metade do século XX. 158
Figura 35 – Suplício de Cristo.............................................................................159
Figura 36 – Placa de metal com inscrição..........................................................159
Figura 37 – Detém-te .........................................................................................160
Figura 38 – Santa Teresinha..............................................................................160
Figura 39 – São José..........................................................................................160
Figura 40 – São Francisco..................................................................................160
Figura 41 – Santo Antônio..................................................................................161
Figura 42 – Túmulo em formato de caixão.........................................................161
LISTA DE TABELA

Tabela 1- Registro de óbito: quantidade de sepultamento por ano do século


XIX (1873 a 1883)................................................................................94
Tabela 2 – Cultura material: Quantidade de sepultamento por ano do século
XX ....................................................................................................95
Tabela 3 – Registro de óbito: sepultamento de crianças por ano do século
XIX ..................................................................................................101
Tabela 4 – Cultura material do século XX: quantidade de sepultamento por
ano...................................................................................................139
Tabela 5 – Procedência das lápides ..................................................................154
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................13
21 PATRIMÔNIO FÚNEBRE: UM LEGADO DA CULTURA DA MORTE
SOB O OLHAR DA ARQUEOLOGIA HISTÓRICA .......................................22
21.1 Sobre o patrimônio ....................................................................................27
21.2 Um destino, múltiplas histórias: Arqueologia histórica e outros
diálogos possíveis nos cemitérios convencionais........................................34
21.3 Arqueologia das práticas mortuárias..........................................................44
32 APRESENTANDO A “PRINCESA DAS CAMPINAS”: SOBRE SUA ORIGEM
E SUAS PRÁTICAS MORTUÁRIAS
.............................................................................................................................48
32.1 Mudança de endereço da morte .................................................................57
32.2 A Irmandade de Santo Antônio ..................................................................65
43 CEMITÉRIO SANTO ANTÔNIO: UM DIÁLOGO ENTRE SEU ACERVO
MORTUÁRIO E AS PALAVRAS
..............................................................................................................................81
43.1 Conhecendo seu acervo mortuário ...........................................................89
43.1.1 Sepultamento de crianças .......................................................................100
43.1.2 Fotografias cemiteriais..............................................................................103
54 CONVERSANDO COM AS LÁPIDES...........................................................111
54.1.1 Lápides do século XIX..............................................................................113
54.1.2 Sepultamento individual do século XIX....................................................113
54.1.3 Sepultamento coletivo do século XIX.......................................................132
54.1.4 Sepultamento coletivo mesclando sepultamentos do XIX COM O XX...133
54.2 Lápides do século XX ................................................................................139
54.2.1 Período de 1900-1950..............................................................................140
54.2.2 Período de 1951-1978..............................................................................159
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................162
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................165
APÊNDICE ...................................................................................................173
13

1. INTRODUÇÃO

Os primeiros contatos com a arqueologia foi no segundo período da


graduação em Licenciatura Plena em História pela Universidade Estadual do Piauí
(UESPI), através da disciplina Introdução à Arqueologia com carga horária de 60 h
ministrada pelo professor. Mestresc. em Antropologia e Arqueologia Domingos Alves
de Carvalho Júnior, o primeiro com formação na área a ministrá-la. Ainda nesse
período foi proporcionada a turma uma viagem para São Raimundo Nonato, onde foi
possível visualizar o universo da arqueologia de forma mais próxima, ao visitar pela
primeira vez o Parque Nacional Serra da Capivara, bem como o Museu do Homem
Americano. Naquele local a sensação foi de regresso no tempo, e foi impossível não
se fascinar com tantos registros do homem pretérito.
A esse professor, amigo e companheiro há uma eterna dívida intelectual,
a ele é atribuída às primeiras noções adquirida nessa área do conhecimento e
algumas de suas possibilidades de abordagem, em virtude da dimensão que ela
abarca e do pouco tempo destinado à disciplina. A ele devem-se ainda os
ensinamentos que mesmo com o término da disciplina não cessaram e em especial
o sincero agradecimento pela apresentação do objeto de estudo da presente
pesquisa, o Cemitério (da Irmandade de) Santo Antônio.
O referido cemitério está localizado à Rua Padre Benedito Portela no
município de Campo Maior - Piauí a 80 ou 86 ? Km da capital Teresina, e se
constitui em importante acervo histórico e arquitetônico. Com mais de dois séculos
de existência, ele reconta através de seus objetos histórias que repousam acima de
sete palmos do chão.
São histórias como do coronel, major e tenente que levaram ou não para
sepultura a opulência que tinham em vida, de homens e mulheres que vieram de
outros estados firmando consórcios nesta cidade e que tiveram muitos filhos ou
nenhum, de criancinhas que no mesmo dia conheceram a vida e a morte, ou apenas
viveram alguns meses ou dias, do poeta que eternizou o padroeiro da cidade em um
hino, do fazendeiro que mesmo com a morte não se separou dos seus currais de
gado, de homens simples que lá repousam no anonimato, dentre eles escravos, de
padres que dedicaram praticamente uma boa parte da vida à cidade, de criancinha
milagrosa que recebe ex-votos como agradecimento pelas graças alcançadas, entre
14

tantas outras como célebres da política que acabaram sendo homenageadas com a
nomeação de ruas, avenidas, praças e escolas da região.
Por conta das transformações naturais e culturais as marcas e os indícios
históricos do cemitério em questão vêm sofrendo um processo de degradação
acelerado. E por esta razão se torna importante inventariá-lo, auxiliando dessa forma
na preservação desse rico patrimônio. Nesta investigação o objetivo principal é
destacar o potencial contido em seu acervo como instrumento que estimula a
reflexões sobre o patrimônio funerário piauiense.
Essa não é a primeira pesquisa realizada sobre o cemitério Santo
Antônio. Em 2012 Jordelson Carvalho de Araújo desenvolveu seu projeto de
conclusão de curso denominado de “A morte contada em vida: um olhar sobre o
espaço cemiterial como fonte histórica no Cemitério Irmandade em Campo Maior”.
Nesse projeto o autor discorre sobre as correntes historiográficas e como cada uma
delas tratou a fonte de informação, desde a Escola Positivista até chegar a Escola
dos Analles, em que há diversificação dos objetos que passam a ser utilizados como
importantes ferramentas na construção histórica de uma época. Nesse contexto, ele
analisa a importância do cemitério como fonte histórica sobre os aspectos da
sociedade campo maiorense, selecionando alguns túmulos, os mais ricos em
detalhes e ornamentos, ao tempo em que relega os mais simples, não buscando
entender os seus não ditos que também se constituem em informação.
Em 2013, Celson Gonçalves Chaves escreveu “O cemitério da Irmandade
Santo Antônio”, aqui nessa obra ele tenta criar um banco de dados, contendo
informações históricas sobre o campo santo e a sociedade que o margeia. Para isso,
ele analisa a distribuição tumbalística, referindo-se a uma divisão geográfica do
espaço entre ricos e pobres, as imagens angelicais, o patriarcalismo dos homens
sisudos, entre outros aspectos, destacando o estado que se encontra algumas
lápides. Tal como o trabalho de Araújo, ele faz uma seleção de alguns túmulos,
possivelmente baseado nos mesmos critérios.
Além desses estudos existem também outras produções nas quais o
cemitério em vez de ser o protagonista aparece como pano de fundo, como no
romance histórico “Pedra Negra” de Halan Kardec Ferreira Silva (2012), no qual o
cemitério é citado logo no início do livro com o enterro do major. A obra refere-se a
um romance entre padre Hermínio e Mocinha, relacionamento ilícito do qual resultou
15

um filho que não chegou a nascer, e de uma relação conturbada entre o major e o
padre que só se encerra com a morte do primeiro.
Outra abordagem sobre o cemitério Santo Antônio é o trabalho de
conclusão de curso de Nara Kerliane de Carvalho Soares (2013) que estuda o
processo de sacralização da alma da menina Maria Lúcia Andrade que faleceu com
7sete anos de idade e desde então é considerada santa pela população. Portanto a
autora estuda um túmulo em específico.
O referido cemitério é mencionado ainda no inventário do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) realizado em 2008, que consistiu
no levantamento do patrimônio histórico da cidade, entre eles consta uma breve
descrição do cemitério abordando a localização, a área do terreno, o uso original e
atual, o proprietário, a técnicas construtivas, os materiais empregados e a data
aproximada de sua construção. De acordo com este inventário, essa data remete ao
final do século XIX, mas, com base no preenchimento das fichas de registro tumular,
realizado durante as pesquisas de campo, percebe-se que ele é do inicio do século
XIX, uma vez que o primeiro sepultamento data de 1804.
A presente pesquisa se configura como sendo de: cunho material,
compreendendo a etapa de campo e laboratório; bibliográfica; e documental. A
pesquisa de campo adota como metodologia a prospecção de reconhecimento ou de
superfície, entendida como uma forma de detecção arqueológica não intrusiva.
Bicho (2006) em seu Manual de Arqueologia Pré-Histórica afirma que “quando se
fala de prospecção aquilo que se procura não é o sitio arqueológico, mas sim um ou
mais elementos, ou seja, os constituintes do sítio. Destes três são detectáveis pela
visão humana: os artefatos, estruturas, e solos antrópicos” (BICHO, 2006, p.92).
No que diz respeito à prospecção arqueológica do período histórico em
muitos casos o constituinte principal é a estrutura. No entanto, no presente estudo
toma-se tanto os artefatos como as estruturas, respectivamente definidas por Orser
Jr (1992) como “itens feitos ou modificados como resultado da ação humana” e
“qualquer evidência de presença humana que não pode ser removida do sitio, mas
que fornece informações abundantes sobre as atividades desenvolvidas no sitio”
(ORSER JR, 1992, p.31-33).
No âmbito da arqueologia independentemente do período, pré-histórico
ou histórico, prospectar consiste em investigar e avaliar o que se tem como objeto
de estudo, embora no primeiro seja freqüente recolherem-se os artefatos
16

encontrados à superfície para proceder com uma avaliação mais detalhada e


aprofundada.
Nas palavras de Bicho não há uma receita pronta de como fazer
prospecção, e em momento algum essa é a sua pretensão. Seu objetivo é lançar
luzes para quem pretende aventurar-se por esse caminho. “A decisão do
investigador é o aspecto mais importante do trabalho arqueológico, e essa só pode
ser tomada tendo em conta cada contexto específico” (BICHO, 2006, p.107).
Uma das luzes lançadas pelo referido autor e que converge com esse
trabalho diz respeito ao entendimento da área prospectada. O cemitério é um
espaço público administrado pela Prefeitura Municipal de Campo Maior, portanto
fez-se necessário procurar o atual prefeito, Paulo Martins, para solicitar a
autorização do desenvolvimento de pesquisa acadêmico – científica (consultar
apêndice). Em contrapartida a sepultura é de propriedade privada e seria inviável 2 a
solicitação de autorização individual de cada familiar. Nesse dualismo público
(cemitério) e privado (sepultura) recorreu-se a Constituição Federal de 1988 em
busca de algum suporte legal, mas nada em especifico foi encontrado. A mesma só
trata que é crime a ocultação de cadáver. É importante ressaltar que nessa pesquisa
em nenhum momento se cogitou a possibilidade de práticas intrusiva como a
escavação.
Por ser um espaço onde descansam seus entes queridos (pais, irmãos,
tios, avós e amigos) uma medida como a escavação poderia ser vista como uma
profanação das sepulturas, e, portanto se ressalta mais uma vez que desde o
princípio não houve a intenção de violação das mesmas.
No contexto da investigação arqueológica o cemitério é entendido como
um sítio arqueológico histórico, onde a sepultura/sepultamento é vista como artefato
e onde os elementos que os adornam (velas, fotografias, alegorias, flores naturais,
flores artificiais, desenhos e gravuras, vasos, epitáfios, ex-votos) são vistos como
enxoval funerário. Entende-se por enxoval funerário como o complemento do
artefato, e consequentemente do corpo que ali jaz. Entre esses elementos do
enxoval como a vela, flores (naturais e artificiais), e culto popular são considerados
ritos, ou seja, as regras e cerimônias próprias da prática de uma religião. Ambos,
2
Diversos fatores caracterizam essa inviabilidade. Entre eles é o fato de que muitas sepulturas estão
sem identificação o que dificulta a localização dos parentes. Quanto as que ainda possuem registros
ocorre que pelo estado de conservação ruim em que se encontra se acredita que a feição de
abandono é devido à ausência ocasionada pelo falecimento das gerações subseqüentes ou pelo fato
da família morar distante de onde jazem seus entes queridos.
17

artefatos e enxoval funerário, são entendidos respectivamente em seus aspectos


construtivos e simbólicos, são tratados como a materialização dos valores e da
organização da sociedade local.
Sepulturas e sepultamentos são termos utilizados de forma indiferenciada
significando o local onde o corpo é guardado, independentemente do tipo de
edificação construída sobre o (a) mesmo (a). As sepulturas e sepultamentos podem
apresentar edificações e materiais construtivos distintos, variando conforme o poder
aquisitivo de cada um e da disponibilidade de material disponível na região.
Partindo do pressuposto de que não há um modelo pronto de como fazer
a prospecção, foi-se adaptando a metodologia de campo, ao tempo em que foi
realizada a coleta dos pontos de acesso do sitio através de um receptor de GPS
(Global Positioning System). A coleta de informações foi feita por unidade de
sepultamento através da elaboração e preenchimento de fichas técnicas, aqui
denominadas de fichas de registro tumular (consultar apêndice). O método utilizado
foi o de inventário geral3 que consiste no levantamento das características do
cemitério como um todo, portanto estando aí incluso o inventário fotográfico, tendo
sido estabelecido duas fotografias por sepultura, mas quando se percebia que
imagens de diferentes ângulos revelavam informações enriquecedoras, optou-se por
mais de duas.
O preenchimento das fichas teve início no lado direito do cemitério,
partindo de seu espaço posterior para a parte frontal. Optou-se por começar por
esse lado porque, no lado esquerdo, a vegetação intrincada impedia a coleta de
importantes informações.
Para fins de localização da sepultura, foi realizada a numeração em
número arábico de um ao infinito, uma vez que não se sabia a quantidade de
sepulturas ali existentes.

3
Os inventários realizados por Castro (2014) principalmente em cemitérios no Sul e Sudeste do Brasil
tem sido referência para muitos países. A autora é Licenciada e Bacharel em História (UDESC),
mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFSC) e Doutora em História Cultural (UFSC), tendo
recentemente publicado dois livros, In Frieden: inventários dos cemitérios de imigrantes alemães de
São Martinho e Ruhe Sanft: inventários dos cemitérios de imigrantes alemães de São Martinho Alto,
ambos do ano de 2014. A ficha inventarial por ela utilizada é composta de informações sobre a
localização, tipos de ornamentos, número de sepulturas e sepultados registrados, estado de
conservação, modelos tumulares, materiais construtivos, ritos e etc. Além de banco de imagens e
transcrição de epitáfios.
18

Em laboratório fez-se a organização do banco de sepulturas, a


organização e análise do banco de fotografias, cujos rostos não passaram por um
trabalho digital, a organização e seleção das lápides a serem analisadas, a
elaboração de lista de sepultados contendo número da ficha inventarial, nome, data
de nascimento, data de falecimento, e idade que o mesmo veio a óbito.
Realizada a pesquisa material e a organização do banco de dados
obtidos definiu-se o recorte temporal que coincidia com a data impressa nas lápides,
uma vez que estas possuem datações precisas. Com esse entendimento, definiu-se
o recorte de tempo a partir do sepultamento mais antigo e do mais recente, que são
respectivamente, 1804 e 1978. Acredita-se que em 1978 o cemitério Santo Antônio
teve suas atividades de sepultamento encerradaso em virtude da superlotação do
espaço e da inexistência de terrenos disponíveis para sua ampliação já tomados por
residências.
Nesse recorte temporal foram encontradas grandes lacunas de
enterramentos, mas mesmo com as ausências seria impossível trabalhar com
tamanho recorte em virtude do pouco tempo destinado para a realização da
pesquisa.
A pesquisa bibliográfica consistiu no levantamento de publicações sobre
estudos cemiteriais, de distintos campos do saber (Patrimônio, História, Arqueologia
histórica, Antropologia, Artes plásticas e etc), incluindo o levantamento da produção
local sobre o cemitério Santo Antônio. Como esse cemitério é considerado um dos
espaços que compõe a paisagem de Campo Maior interessa ainda caracterizar o
processo histórico da constituição da cidade, recorrendo para isso à consulta
bibliográfica referente à historiografia piauiense. Entende-se que não há como
abordar o cemitério sem relacioná-lo com a história da cidade.
No que se refere à pesquisa documental foram consultados os Livros de
Tombo da Freguesia de Campo Maior N° 1 e 2, os livros de batismo, aqueles cujas
lápides forneceram dados suficientes4 que permitiram sua consulta, os livros de
casamento seguindo o mesmo critério do de batismo, e o de registro de óbito. Este
último contempla o nome do falecido, dia, mês e ano do falecimento, a causa da
morte, o estado civil, quando casado traz o nome do cônjuge, a filiação, o local e
data de sepultamento e assinatura do responsável pelo termo. Uma ficha especifica
4
Nome do individuo que recebeu o sacramento, data (dia, mês e ano) e nome dos pais. Os dados
satisfatórios para a consulta no livro de casamento referem-se ao nome dos indivíduos que
contraíram matrimonio e a data (dia, mês e ano).
19

foi elaborada para eles (consultar apêndice) em busca de confrontar com a relação
de sepultados elaborada a partir da coleta individual por sepulturas/sepultamentos.
Todos os livros listados foram localizados na Secretária Paroquial da
Catedral de Santo Antônio. No seu acervo não foram encontrados os primeiros
documentos de batizados, casamentos e de óbito 5. As atas da mesa da Irmandade
de Santo Antônio também não foram encontradas, o que é lastimável já que o
cemitério foi em algum momento pertencente a esta irmandade.
Outra importante fonte foié a história oral que auxilia no levantamento de
dados desta investigação a partir de entrevista com a zeladora do cemitério, dona
Alcelina da Silva Neta mais conhecida como Xuxa, um oficio que passou de sua
mãe, dona Tereza, para ela. A relação que Xuxa tem com o cemitério se iniciou
ainda aos sete anos de idade, uma menina que cresceu ali, casa e cemitério lado a
lado, como se um fosse quintal do outro. Tal relação permanece até hoje.
Através do contato com os trabalhos citados no início desta pesquisa, foi
possível perceber que ainda há um vasto campo a ser pesquisado. A proposta ora
apresentada foi é de fazer uma descrição do seu acervo como um todo e selecionar
alguns de seus elementos para proceder à investigação. Dentre algumas questões
desse trabalho destaca-se a seguinte: de que forma o cemitério Santo Antônio
através de sua arquitetura fúnebre e dos seus artefatos podem informar sobre como
viviam as sociedades do passado? Desta questão surgiramem outras, tais como: em
Em que medida, sob o viés investigativo, o acervo fúnebre revela a história da
sociedade local? Em que consiste essa arquitetura fúnebre nessa sociedade? O que
chegou aos nossos dias como acervo e o que ele representa para a história local?
A dissertação está dividida em seis capítulos. quatro capítulos, além de
introdução e considerações finais. A introdução apresenta o objeto de estudo,
contém os procedimentos metodológicos adotados em campo e laboratório,
menciona alguns autores que deram suporte teórico, além de delinear o plano de
trabalho. Não há necessidade de colocar o destaque em negrito para os capítulos.
Você pode colocá-los no início de parágrafos.
No primeiro capítulo denominado Patrimônio fúnebre: um legado da
cultura da morte sob o olhar da Arqueologia Histórica é apresentado uma
discussão sobre a morte e sua representação, mostrando que ela sempre esteve

5
Conversando com Marcos Paixão, um pesquisador e apaixonado pela história local, ele atribui essa
ausência a um incêndio que teria ocorrido e destruído boa parte dos documentos.
20

presente na vida cotidiana de homens e animais, mas que somente os primeiros são
capazes de estabelecer relações simbólicas com a mesma, produzindo uma
materialidade fúnebre, ou seja, objetos específicos voltados para sua hora última.
Isso se evidencia desde quando a espécie Neandertal passa a enterrar seus entes
queridos em grutas ou cavernas e se estende até os dias atuais nas sociedades
ocidentais cristãs, onde o sepultamento ocorre nos cemitérios extramuros
secularizados ou religiosos, sendo estes o assunto primordial dessa dissertação,
com ênfase em um cemitério do início do século XIX, o cemitério Santo Antônio em
Campo Maior – Piauí, evidenciado nos demais capítulos. A trajetória do homem
diante da morte é apresentado através do olhar de Àries ( 2000).
Em seguida na tentativa de elucidar as características que conferem o
cemitério como fonte geradora de conhecimentos com os grupos sociais em sua
diversidade, a pesquisa inicia-se com a discussão desses espaços enquanto
patrimônios da sociedade onde estão localizados, mostrando que mesmo que um
cemitério não esteja dentro da política de patrimonialização, ou seja, tenha sido
selecionado pelas instituições de preservação, ainda assim ele se constitui como
referência a identidade e a memória dos grupos sociais.
Através de autores como Castro (2008), Gonçalves (2007),,Velho (2007),
Fonseca (2000; 2005) entre outros é apresentada a evolução semântica do termo
patrimônio apontando que o significado atual é imposto pela modernidade ocidental
marcado pelo pensamento cartesiano que rotula e divide o saber. A partir do diálogo
com À luz de Latour (1994), Kuhn (1992) e Costa (2010) foié possível perceber que
a divisão entre os campos de conhecimento (Arqueologia, História, Arqueologia
Histórica e etc) e as diversas modalidades de patrimônio (artístico, histórico,
religioso, arquitetônico, e fúnebre e etc) sãoé uma construção histórica. Portanto
esses autores mostram que a separação entre sujeitos e coisas, mundo natural e
mundo social resulta da vontade humana de compreender o mundo.
É nesse contexto que emerge a Arqueologia Histórica com uma série de
ramificações a exemplo da arqueologia das práticas funerárias. A Arqueologia
Histórica é uma subdisciplina da Arqueologia e conforme Orser Jr (1992)
corresponde a expansão do capitalismo e esta vinculada a formação do mundo
moderno. Trata-se de um campo multidisciplinar, que interage com diferentes tipos
de fontes, proporcionando uma melhor compreensão do passado.
21

A ramificação mencionada acima é aquela que de fato se volta para o


estudo dos cemitérios modernos, este por sua vez só veio a se constituir como
objeto de estudo da arqueologia histórica brasileira na década de 90 do século XX.
Ainda assim a produção de trabalhos é escassa, no entanto vale frisar que a
Arqueologia Histórica é apenas um dos diálogos possíveis que podem ser
estabelecidos com os espaços funerários.
O segundo capítulo Apresentando a“Princesa das campinas”: sobre
sua origem e suas práticas mortuárias se busca através de revisão bibliográfica e
da consulta dos livros de Tombo da Freguesia de Campo Maior o processo de
formação histórica da cidade e a constituição do seu patrimônio fúnebre. Os títulos
dos capítulos não devem vir em negrito nem itálico. O segundo capítulo ficou muito
suscinto em relação aos outros. Se vc estender um pouco mais o parágrafo fica
melhor.
O terceiro capítulo Cemitério Santo Antônio: um diálogo entre seu
acervo mortuário e as palavras, tem como objetivo é documentar osseus
elementos fúnebres que se encontram em vias de destruição, como por exemplo,
estabelecer dar as coordenadas geográficas do sitio, analisar seu aspecto
arquitetônico externo, informar sobre seu conjunto mortuário e do número de
sepultados, e analisar a espacialização dos artefatos. Dessa forma, foi é feita uma
descrição geral do seu acervo e este serviue como pretexto para visualizar o estado
de conservação de outros cemitérios do Piauí.
Ainda através das lembranças de dona Alcelina da Silva Neta procurou-se
ar identificar acréscimos/retiradas no espaço, como por exemplo, a capela que
aparece mencionada no Termo de Visita Pastoral, e segundo conversas informais
durante a realização da pesquisa de campo a existência de um muro fazendo uma
divisão de classes sociais. Dessa forma buscou-sea-se responder qual seria a
função em que consistia da capela? Por que ela não existe mais nesse espaço?
Qual o local que ela ocupava nesse espaço? O muro realmente existiu? Até
quando? Assim como a capela por que ele não existe mais? Seria mesmo sua
finalidade a segregação social? De igual maneira como essas reminiscências foram
evocadas para se oporem àa demolição do cemitério para em seu lugar ser
construída uma praça, a Praça das Almas?
Em virtude da riqueza que trazidaem pelas lápides sepulcrais como fonte
de informação sobre gênero, faixa etária, simbologia religiosa, aspectos econômicos
22

entre outros que acabam revelando aspectos importantes da história da cidade e do


Piauí., propõe-se
Oo quarto capítulo Conversando com as lápides. Desenvolver um
parágrafo pelo menos sobre o quarto capítulo e as considerações finais.
Por fim, nas considerações finais, apresenta-se um balanço do tema e
uma perspectiva em relação ao assunto.
23

21- PATRIMÔNIO FÚNEBRE: UM LEGADO DA CULTURA DA MORTE SOB O


OLHAR DA ARQUEOLOGIA HISTÓRICA

A morte é um fenômeno natural (biológica, chega para todos) e cultural (o


tratamento que lhe é dado), e tratá-la como um fenômeno cultural é único e
específico da espécie humana segundo Torres (1997). As atividades ritualísticas de
sepultamento (aspecto da morte enquanto fator cultural) acontecem desde a pré-
história até os dias atuais e ao longo do tempo se modificaram significativamente
traduzidas nas decisões por inumar, englobando aspectos como as formas de
sepultar6 (direto ou indireto, individual ou coletivo, primário ou secundário) e os locais
de sepultar (se em cavernas, mounds 7, dolmens8, pirâmides, igrejas, nos quintais da
própria residência entre outros) ou se pela decisão de incinerar. Essas observações
entre parênteses você deve desenvolver normalmente explicando dentro do texto.
Assim fica melhor e mais claro.

No período quaternário9 o local da sepultura era onde o corpo caia


revestido por fragmentos de musgos e relvas, ramos de carvalho e loureiro. As
intempéries, os vermes e aves de rapina cabiam o descarnar, o lamber, o lustrar de
seus frios e rígidos corpos arremessando-os aos mais diversos locais, ou seja, o
corpo era deixado à própria sorte. Castro (2008) relata uma explicação lendária para
o que teria impulsionado o primeiro sepultamento da humanidade. Caim após ter se
sentido preterível por Javé em relação a Abel quanto à oferta feita, resolveu se
lançar contra seu irmão Abel, o matando. Precisando esconder o que tinha feito dos
olhos de seus pais, Adão e Eva, e de Deus.
Conta-se que um “gesto” de um corvo próximo a ele inspirou tal ato,
“Caim observou como o pássaro cuidava do corpo morto de um corvo, cavando com
o bico um buraco e jogando terra sobre o mesmo, e assim também fez com o corpo
de seu irmão Abel” (DANNEMANN APUD CASTRO, 2008, p.1). Na Bíblia, livro
6
A maneira ou tipo de sepultamento direto ocorre quando se abre cova e deposita o corpo, no indireto
o corpo é envolvido em algum material antes de ir pra cova, individual ou coletivo se refere a
quantidade de pessoas por sepultura podendo ser uma (individual) ou mais (coletivo), no tipo primário
o ritual ocorre com o corpo ainda articulado geralmente em cova enquanto no secundário o corpo
passa por um segundo processo de inumação em cova ou urna.
7
Montículo artificial de terra, cascalho, areia, rochas ou detritos. O uso mais comum é em referência à
formação de barro natural, como colinas e montanhas. Foram criados por uma variedade de razões
ao longo da história incluindo cerimonial ( montículo de plataforma), o sepultamento( tumulus) e fins
comemorativos.
8
Monumentos megalíticos tumulares coletivos
9
Insira uma nota explicativa sobre o quaternário situando a era geológica.
24

sagrado dos Católicos Apostólicos, em gêneses capítulo 4 versículo 1-16 menciona


Caim matando o próprio irmão, mas não referencia quanto ao sepultamento, nem o
que teria inspirado o agir de sepultar. Talvez o tenha feito para esconder de todos o
seu ato criminoso de matar o próprio irmão por inveja.
Levantando historicamente os achados fósseis humanos, os primeiros
sepultamentos são atribuídos ao homem de Neanderthal durante o período
Paleolítico médio e superior. Conforme Santos Juvandi (2009) foié durante esse
período que ocorreu a fase final do desenvolvimento cognitivo da mente humana.
Essa espécie enterrava cerimoniosamente os filhos e parentes mortos em cavernas,
grutas ou dolmens depositando junto ao corpo instrumentos e alimentos.
Não se sabem os motivos que levaramou o homem desde tempos
remotos a tratar de seus mortos, empregando tempo e energia no empreendimento
de obras colossais de engenharia e arquitetura para guardar os restos dos falecidos.
Terá sido o malmau cheiro? O horror da decomposição? A afetividade pelo morto? A
preservação do corpo para a vida após a morte? O medo do desconhecido? Ou em
decorrência da sociedade cada vez mais complexa que criou novos valores? São
muitas as perguntas, escassas ainda as respostas.
Apesar de existirem registros arqueológicos que evidenciam o hábito de
enterrar os mortos ou cobri-los com pedras desde a pré-história, os cemitérios teriam
sido implantados pelos primeiros cristãos. No ocidente cristão, a crença numa vida
após a morte propiciada pela crença na ressurreição tem assegurado a prática do
enterramento. Desde o século I o sepultamento é a recomendação preferencial para
as ocasiões de morte pelo Cristianismo. A morte é um repouso, é um estágio de
espera para ressuscitar. Para Segundo Caputo (2008, p.75) “é devido a essa crença
que os cristãos há muito tempo enterram os corpos dos defuntos com grandes
escrúpulos”.
Philippe Ariès é um dos estudiosos que traça todo o panorama da morte
no ocidente cristão. Em sua obra “O homem diante da morte” ele traz quatro etapas
para as atitudes ocidentais perante a morte. São elas a morte mansa (do primeiro
milênio da era cristã), a morte pessoal (dos 750 anos seguintes), a vossa morte (que
expressava uma preocupação de família com seu período que foi do século XIX até
o começo do século XX) e a morte proibida (que vigorou nestes últimos trinta e
poucos anos).
25

De tal maneira éÉ importante ressaltar que o comportamento do homem


diante da morte não é tão compartimentado como ele sugere, pois o imaginário é
algo que ocorre de forma gradual e lenta, sujeito a mudanças e permanências o que
explica as críticas que ele tem recebido de outros autores como o sociólogo Nobert
Elias, mas que não exclui de forma alguma a contribuição de Ariès. O que diz
Norbert Elias sobre a morte?
Na antiguidade pagã e mesmo cristã período que transcorre
aproximadamente entre o III milênio a.C e o século IV d.C, os antigos temiam a
morte, por isso o local destinado aos mortos ficavam distante da cidade. “Na tradição
pagã, traziam-se oferendas aos mortos para acalmar e impedir de voltarem para o
seio dos vivos. As intervenções dos vivos não se destinavam a melhorar a sua
estada no mundo atenuado dos infernos” (ARIÈS, 2000, p.174). A maneira de evitar
a volta do defunto era os vivos honrarem os mortos por meio do culto aos mesmos,
os cultos aos mortos, que era feito através das sepulturas individuais com a
identificação e a preservação da memória através das inscrições funerárias, assim
como atender ao desejo dos mortos, de ser enterrado próximo aos mártires.
Dessa forma, É entre a Idade Média e meados do século XVIII que
predominou uma relação de proximidade entre os vivos e mortos, uma vez que foi a
partir do século V, período que marca cronologicamente o início da Idade Média,
quandoque os mortos passaram a ser enterrados nas igrejas e cemitérios
integrados10 àa comunidade; fundamentados na crença de que era necessário ter
uma boa morte, marcada por uma séerie de rituais funerários como a presença de
carpideiras, padres, mortalhas fúnebres, velas, orquestras e enfim o local da
sepultura que era a igreja ou em suas imediações. Nesse contextoE que a
aproximação com o altar mor ajudaria na proteção do defunto contra o inferno. Essa
forma de sepultar ficou conhecida como enterramentos ad sanctos. Seria
interessante a referência do autor para fundamentar.
A representação da morte era algo totalmente controlada, inventada e
explorada pela Igreja Católica durante séculos no cotidiano e mentalidade da
10
Referem-se às sepulturas de adro que se encontravam normalmente espalhadas nos espaços
laterais das igrejas, em alguns casos, encerradas por muros a fim de evitar a profanação desse
espaço sagrado. Mas em outros casos, elas podem manter uma contiguidade visual entre os
túmulos sagrados e a vida profana das urbes, pela ausência de delimitação por muros ou cercas
circundando o cemitério do adro, geralmente, os defuntos enterrados nesse local eram escravos e
pessoas livres pobres. As campas eram sepulturas que se localizavam no interior das igrejas,
consideradas superiores ao adro.
26

população da época. A mentalidade Os pensamentos do homem medieval


encontram-se permeada repletos de pavor supersticioso para com os mortos e com
a própria morte. De acordo com Segundo Ariès (2000) esse período pode ser
compreendido em dois momentos, o primeiro corresponde a Primeira Idade Média
ou Alta Idade Média que vai do século V ao XII, e o segundo denominado de
Segunda Idade Média ou Baixa Idade Média indo do século XII até o XV.
Na Alta Idade Média a representação da morte se tornou é familiar, o que
não quer dizer que o homem não a temesse a morte como o homem da antiguidade,
mas que diferentemente daquela época, os enterramentos passam a ser nas igrejas
e cemitérios integrados à comunidade, fazendo com que os lugares dos mortos
passassem a ser na cidade dos vivos. As sepulturas eramsão coletivas, os corpos
cobertos apenas com sudários eram são enterrados em valas sendo com a
diferença de que os ricos ficavam no interior das igrejas e os pobres no pátio. Essas
sepulturas eram são também anônimas uma vez que a identificação do morto
através das inscrições e retratos desapareceu. Temia-se muito a morte intempestiva
que tirava a oportunidade do sujeito de se preparar para uma boa morte. Os ritos
eram civis e a igreja só intervinha para absolver.
Com a chegada da Baixa Idade Média o homem medievo foi vai perdendo
a capacidade de presidir a própria morte. Tornou-se freqüente apresentar o corpo à
igreja para um ofício, já não é tão legítimo nem tão usual perder o controle de si para
chorar os mortos. Os túmulos antes anônimos por imposição do poder eclesiástico
passaram, pouco a pouco, com a emergência da burguesia a receber identificação
individualizada, este já um indício do culto à sociedade que viria a se consolidar na
Idade Moderna. A propósito a concessão perpétua do túmulo é uma ideia moderna.
Esse parágrafo necessita ser melhor explicitado. Como o homem medievo presidia a
própria morte?
A racionalidade que predominou durante a Idade Média até meados do
século XVI já não atendia aos anseios da burguesia que surgia na Europa sob o
rastro do iluminismo. As explicações já não tinham mais origem no divino e sim na
razão cientifica que passa a produzir os regimes de verdade dando credibilidade ao
discurso que circulava a época. Nesse momento a ciência ganha espaço na vida
cotidiana e com grau de aceitação distinto entre as regiões e nos setores da
população seja européia ou brasileira. Os higienistas passam a ter voz, e para eles
figuravam como espaços insalubres hospitais, hospícios, prisões e cemitérios.
27

Dizia-se que os vivos de fato deveriam temer os mortos, não o regresso


de seus espíritos para os atormentarem, mas os malefícios que aquela forma de
sepultar provocava a saúde tendo como base a teoria dos miasmas 11. Por questões
de práticas higienísticas, sanitaristas e urbanistas os enterros nas igrejas são
proibidos e são criadas recomendações para a criação de cemitérios ordenados.
Entre tais recomendações estavam uma nova localização (afastado da cidade e
onde o ar circulasse), sua organização interna (profundidade e espaçamento das
sepulturas, e a existência de capela mortuária), a observação da altitude do terreno,
a composição do solo e a vegetação. Na França têm-se notícias para a criação de
cemitérios fora das cidades desde 1743. Em Portugal, em 1801, o príncipe regente
D. João VI proibiu os sepultamentos em igrejas, inclusive em suas colônias como a
América portuguesa, embora não tenha tido efeito imediato.
O local da sepultura é apenas um dos aspectos das tradições fúnebres
que foram consideradas inadequadas, pois os ritos funerários que acompanhavam o
morto como os dobres dos sinos, o aparato processional do viático, os enterros com
grande pompa e a encomendação do corpo feito na igreja também foram
consideradas inapropriadas pelo discurso da época.
Depois de empreendido tanto esforço para separar mortos dos vivos, no
século XX novamente eles passam a dividir o mesmo espaço, já que com a
expansão urbana impulsionada por motivos de ordem prática e econômica os vivos
vão ao encontro dos cemitérios. Vivos e mortos estão ao mesmo tempo tão perto e
tão distantes, pois nas concepções mais contemporâneas a morte entra em crise e é
elevada a categoria de tabu.
Já não se morre em casa na presença de parentes, amigos e vizinhos,
mas sozinho na reclusão dos hospitais, os velórios, que outrora ocorriam em casa
agora passam a serem em salões de funerárias ou nas capelas do cemitério, os
rituais fúnebres se tornaram cada vez mais curtos e o homem vive como se fosse
eterno, eufórico com o aumento da expectativa de vida proporcionada pelos avanços
da medicina.
Também se verificou a criação de outros tipos de cemitérios como os
cemitérios jardins que se confundem com a natureza local. Neles os sepultamentos
ocorrem diretamente no solo na qual é sobreposta uma lápide sem a edificação de

11
Diz que a decomposição dos cadáveres produzia gases ou eflúvios pestilenciais, que atacavam a
saúde dos vivos.
28

túmulo propriamente dito. E o cemitério edifício também denominado de vertical ou


gaveta. Eles são construções em andares com gavetas a base de concreto.
Assemelham-se com prédios e condomínios. Observe que nos últimos seis
parágrafo vc não dialoga com nenhum autor. Seria importante fundamentá-los com
os autores que vc certamente leu.
Em síntese a localização dos cemitérios no espaço e os seus tipos estão
atrelados à a concepção de morte. Indiscutivelmente as sepulturas são registros de
uma passagem, são documentos arqueológicos formados pela estrutura mortuária
(aspectos arquitetônicos), artefatos (sepulturas) e enxoval funerário (elementos
encontrados nas sepulturas). A partir do momento em que o homem passa a
enterrar os seus semelhantes construindo seja da mais simples a mais suntuosa
sepultura, ele produz aquilo que aqui se denomina de patrimônio fúnebre. No
entendimento de Castro (2008) o patrimônio fúnebre ou funerário é o conjunto de
elementos materiais e imateriais presente em locais de sepultamento (cemitério não
convencional, mas que pode possuir construções sobre as sepulturas) ou cemitérios.
Ele deve ser compreendido em sua trajetória própria e em sua relação com o
contexto cultural onde são produzidos e por onde circulam.

Dessa forma os cemitérios convencionais 12, onde se verificou a


diversificação de artefatos e elementos funerários tal como se conhece hoje nem
sempre existiu. Seu surgimento está relacionado com um dos comportamentos que
o homem teve perante a morte ao longo do tempo e nas últimas décadas em
algumas cidades brasileiras muitos deles foram retirados, desativados ou
transferidos.

1.1- SOBRE O PATRIMÔNIO

A morte é um fim igual para todos, mas cada sociedade, cultura e tradição
religiosa prevê diferentes concepções, sentidos, rituais e manifestações a este
momento e experiência. Para Carvalho Júnior et al (2011), se a morte é um fim igual
(Vc não tem acesso ao texto original?) para todos por outro lado, a maneira de
sepultar e onde sepultar os mortos não é igual nas distintas sociedades. Isso pode
ser determinado, entre outras causas, pelo prestigio social, econômico e religioso de

12
Esse tipo de cemitério possibilita a edificação de jazigos sobre as sepulturas encomendados pelos
familiares e estar disposto em quadras e lotes. Outras características a ele atribuídas é a presença de
muro delimitando o seu terreno e de um cruzeiro central.
29

cada individuo. É nesse contexto que se situa a constituição do patrimônio funerário


também denominado de fúnebre ou cemiterial.
Segundo Gonçalves (2007) patrimônio é uma categoria de pensamento
bastante familiar ao moderno pensamento ocidental, ou seja, se encontra dentro do
pensamento cartesiano onde o homem é “cortado”, “fatiado”, “separado” para ser
entendido. Nele se cria categorias de análise do que se quer entender, seja a
política, a ciência, a religião entre outras.
Essa separação por categorias de análise ganha corpo no século XVIII,
época das luzes, da racionalidade, marcado, sobretudo pelo pensamento cartesiano
e é regido pela constituição moderna que é um antro de contradições, uma vez que
ela diz que “Nós não criamos a natureza; nós criamos a sociedade; nós criamos a
natureza; nós não criamos a sociedade; nós não criamos nem uma, nem outra Deus
criou tudo; Deus não criou nada, nós criamos tudo” (LATOUR, 1994, p.39). Daí se
tira o quão conveniente é esta constituição moderna.
Trata-se do paradigma cartesiano, paradigma no sentido do termo usado
na obra de Kuhn (1992) sobre as estruturas das revoluções cientificas que designa
um modelo para a prática normal da qual decorre uma tradição de pesquisa. Borges
(s/d13) defende que esse paradigma consiste em dividir tarefas, “assim, os corpos
mortos tornaram-se tarefa da arqueologia, os loucos da psicologia, a cultura da
antropologia e os documentos escritos da história” (BORGES, s/d, p.45).
É o que Costa (2010) denomina essas mudanças de construção moderna
do conhecimento que rotula e divide o saber, apresentando a cada campo do
conhecimento um objeto de estudo absoluto, culminando na construção de um corpo
disciplinar próprio e claro na segmentação da academia. Até hoje essa separação
permanece, mas que fique claro que ela é uma possibilidade de entender o mundo
que os ocidentais criaram e portanto, que ela não é a única, nem a melhor, como o
ego ocidental se apresenta.
Dentro dessa discussão, falar em patrimônio material e imaterial é falar
em categorias de análise no âmbito das ciências e nessa perspectiva que o
patrimônio fúnebre (que abrange os aspectos tangíveis e intangíveis) é apenas mais
uma das modalidades existentes. Definir o que seja patrimônio infere selecionar com
base em certos critérios com variáveis no tempo e no espaço. Abreu (2007, p.266)
coloca que a noção de tempo? “ com a qual nos habituamos, como ela sempre
13
Sem data
30

tivesse existido em todo o tempo e lugar, está diretamente relacionada a uma


concepção linear de tempo”. Nessa citação acima parece está faltando algo para
completar o sentido.
Nas sociedades tradicionais, onde prevalece a concepção cíclica de
tempo a memória está difundida no tecido social. Nelas a dinâmica de esquecer e
lembrar associa-se ao contexto mítico religioso e às as narrativas orais. Os
acontecimentos são reversíveis e repetitivos. Com forte potencial de memória não
há um sentido de guarda, armazenamento ou preservação de objetos, assim como
não há o sentido de herança tal como se conhece hoje.
Em contrapartida, a sociedade ocidental moderna se articula com a
memória social privilegiando a concepção de tempo linear. Nessa concepção os
acontecimentos são irreversíveis, e, portanto associada à noção de história, com
registros escritos, noções de documentos e de monumento. Logo o patrimônio não é
simplesmente uma invenção moderna, mas coube a modernidade ocidental impor os
sentidos específicos que o termo veio assumir. Precisa uma fundamentação sobre
memória, documentos, monumento.
No século XVIII, a noção de patrimônio é uma invenção associada à a
ideia de nação que surgiu na França posteriormente a Revolução Francesa. Nesse
período o significado do termo engloba os elementos artísticos e históricos como as
obras de arte, edifícios e monumentos públicos utilizados na construção e
representação da nação. E onde a lógica de conservação patrimonial privilegia o
coletivo e o público. Essa “associação do patrimônio nacional a um passado glorioso
difundiu-se por todo o Ocidente” (ABREU, 2007, p.268).
No Brasil, a inclusão do tema entre as elites políticas e intelectuais
brasileiros só tomou vulto no início do século XX, pois até então a preocupação era
mais com a modernização das cidades do que com a recuperação dos fragmentos
do passado. E quando eles (Quem?) passaram a se ser preocupar com esses
fragmentos o patrimônio do Brasil foi visto sob a ótica “pedra e cal”. Fonseca (2005)
que pesquisou o processo de construção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
no país identifica dois momentos. O primeiro é o momento fundador (1930-1940) e o
segundo é o momento renovador (1970-1980).
No primeiro momento liderado por Rodrigo de Melo Franco de Andrade
vigoroua uma visão modernista de expressão artística autêntica, ou seja, houve há o
privilegio dos objetos e monumentos representativos da memória nacional. Mais
31

uma vez o público e o coletivo se sobrepõem ao individual e ao privado. Em geral o


que era excepcional estava ligado à a cultura européiaeuropeia do colonizador e
tinha sua integridade assegurada através do instrumento do tombamento, que de
acordo comsegundo Bastos (2010) é uma prática que não tem tido resultados
positivos, se mostrando ao longo do tempo ineficiente para a proteção do patrimônio
arqueológico. Ele considera que,

Desde a edição do decreto lei de tombamento poucos foram os sítios


arqueológicos tombados e os que foram tem resultados, enquanto proteção,
bastante duvidosos a exemplo do sitio arqueológico tipo sambaqui
denominado Pindaí, localizado próximo a São Luiz, no Maranhão, que hoje
ainda tombado tem sobre ele uma rodovia, um loteamento e um bairro.
(BASTOS, 2010, p.1150)

O decreto ao qual que Bastos (2010) se reporta é o Decreto Lei n° 25 de


30 de novembro de 193714, ,nele o valor patrimonial é qualificado quer por sua
vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor
arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou artístico .O tombamento é um instrumento
legal de ação de preservação de um bem, pode ser feito a nível federal pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) ou ainda em âmbito estadual ou
municipal com suas respectivas leis específicas.
A década de 30 e 40 do século XX é, portanto a fase dade “pedra e cal”
onde o alvo de proteção são igrejas, palácios, fortificações, casas de câmara e
cadeia e tudo mais que representasse a relação com o passado e a tradição em
uma mediação entre heróis nacionais e personagens da história brasileira. O
Cemitério do Batalhão15 dado sua importância ligada à história nacional é
reconhecido como patrimônio do Brasil e tombado pela Secretária do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) em 1938. Referenciar o documento sobre o
tombamento.

Figura 1: Cemitério do Batalhão16

14
Ele também institui o instrumento do tombamento que visa regulamentar a proteção dos bens
culturais no país, explicita os valores que justificam a proteção pelo Estado de bens moveis e imóveis,
e busca resolver a questão de propriedades desses bens.
15
Aqui merece uma nota explicativa sobre o Cemitério do Batalhão explicando o referido acontecimento.
16
O Cemitério do Batalhão está inscrito no Livro Histórico e de Belas Artes.
32

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha (2011)

Localizado no município de Campo Maior, ele é o local de sepultamentos


dos piauienses que lutaram em favor dos interesses de Portugal ou pelos interesses
da consolidação da imensidão do território brasileiro na Batalha do Jenipapo
ocorrida a 13 de março de 1823, às margens do Rio Jenipapo ao norte do território
piauiense. Todos os anos nessa data representantes do governo estadual e
municipal se reúnem no local para celebrar tal acontecimento, e que vem
contribuindo para resultados duvidosos quanto à proteção do bem, ainda que de
forma não intencional, mas, sobretudo política.
Sobre essas questões relacionada à valorização do patrimônio Segundo
Castro (2008) relata que já nas primeiras décadas do século XX se pedia (quem
pedia?) a preservação de cemitérios, pois em 1936 o anteprojeto da criação do
SPHAN pensado por Mário de Andrade contemplava monumentos e as jazidas
funerárias, as capelas e cruzes mortuárias de beira de estrada como bens a serem
protegidos. No entanto o anteprojeto sofreu alterações até a elaboração da versão
final do texto que deu origem ao Decreto lei n°25 de 1937 que criou o SPHAN.
Referenciar o documento que vc cita.
NaÉ na década de 70 do século XX, se viueclodir um momento
renovador, no qual que as ideias originais de Mário de Andrade foram são
33

incorporadas (por quem?) e a noção de patrimônio foi ampliada com a idéia de bem
cultural. Para Segundo Fonseca (2005) esse foi é um momento em no qual houve
que há uma noção mais abrangente de memória social, onde se buscoua a
participação da comunidade no processo de identificação e proteção do patrimônio
cultural. A renovação ocorrida teve coube a Aloísio de Magalhães como um dos
seus protagonistas, ele que era artista e designer, marcou sua passagem ao propor
uma definição do patrimônio brasileiro, na qual abarcasser a diversidade cultural,
religiosa e étnica no país. Com essa medida redirecionou o patrimônio brasileiro, até
então visto como pedra e cal, para a noção de bem cultural.
De acordo com Abreu (2007, p.275) “o conceito antropológico de cultura
firmou-se como o condutor de iniciativas relativas ao patrimônio, consagrando a
noção de patrimônio cultural”. Assim como a expressão patrimônio o termo cultura
também foi ressemantizada. Historicamente a sua concepção assumiu dois
significados. O primeiro se referia as artes, as ciências, portanto se liga ao processo
de auto-aperfeiçoamento humano. No segundo momento ela dá deu uma virada
guinada em direção à antropologia, passando a ser pensada fundamentalmente
como expressão da alma coletiva, englobando uma ampla gama de artefatos
(imagens, ferramentas, casas. e etc.) e práticas (conversar, ler, jogar e etc.).
Desnecessário colocar etc.)
Para Santos (1994) ao referir-se ao conceito de cultura considera que, por
cultura se entende muita coisa, em torno desse conceito existehá uma variação de
sentidos e significados, pois a culturaela é a representação da multiplicidade
humana em suas diversas formas de existência, como a linguagem, a vestimenta, a
alimentação, a morte entre outras formas de expressão. Todas as formas de
expressão humana, sejam materiais e/ou imateriais expressam formas específicas
de construir sua cultura, restringi-la é ignorar a multiplicidade dos aspectos da
produção humana. Consoante ao pensamento de Santos (1994), Velho (2007, p.
250) compreende a cultura como “um fenômeno abrangente que inclui todas as
manifestações materiais e imateriais, expressas em crenças, valores, visões de
mundo existentes em uma sociedade”.
É, portanto somente na segunda metade do século XX que ficou evidente
a ampliação da noção de patrimônio. Foi nesse período que houve a conversão de
objetos comuns em bens patrimoniais. “Começavam a ser introduzidas nos
patrimônios as produções dos esquecidos pela história factual, mas que passaram a
34

ser objeto principal de interesses da historia das mentalidades: os operários, os


camponeses, as minorias étnicas etc.” (FONSECA, 2005, p. 70). A semântica da
palavra passoua a atingir ações populares e as suas apropriações, e então se
passoua a preservar fábricas, hospitais, escolas e etc. Um marco nesse sentido foi o
tombamento em 1984 do terreiro de candomblé Casa Branca, em Salvador (Bahia).
Depois dele, além de outros terreiros, diversos monumentos e construções ligadas a
outras tradições não luso brasileira foram reconhecidas.
Foi nesse momento ainda que o cemitério passoua a ser visto enquanto
patrimônio cultural, pois em geral o acervo mortuário é de outra ordem que não
pública. É familiar, pessoal e afetivo ainda que administrado por um gestor público.
O artigo 216 da Constituição Federal de 1988 estabelece que:

Constitui o patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e


imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referencias à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I- as formas de
expressão; II- os modos de criar, fazer e viver; III- as criações cientificas,
artísticas e tecnológicas; IV- as obras, objetos, documentos, edificações e
demais espaços destinados às manifestações artístico culturais; V- os
conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e cientifico. (Constituição Federal do
Brasil, 1988, p. ....)

Nesta perspectiva oO cemitério pode representar parte da história das


cidades. Ele traz as formas de expressão da sociedade vigente, abarcando tanto o
patrimônio tangível, constituído por bens materiais imóveis, e o intangível, que se
refere aos rituais. Depois que o corpo é sepultado, as práticas funerárias continuam
com as orações, missas de sétimo dia, de mês e ano, com a construção do túmulo
com os mais diversos materiais construtivos, colocação de fotografias, painéis,
esculturas e epitáfios. Também é comum o depóosito de flores (artificiais ou naturais
e que pode evidenciar o poder aquisitivo da família, uma vez que as naturais exigem
maior recurso financeiro)(O conteúdo desse parêntese pode está no corpo do texto
de forma explicativa) e outros objetos do morto, assim como o ato de ascender velas
e lavar a sepultura. “Os cemitérios, como elementos que compõem o conjunto da
produção humana, podem assim ser apropriados como representantes ou como
bens de referência cultural para determinado grupo ou lugar” (CASTRO, 2008, p.
82), pois
Ele envolve afeto, emoção, os mais variados interesses, preferências, gostos entre
outras referências aos habitantes de diferentes tipos de localidades. Alguns já são
35

considerados atrativos turísticos como o Père Lachaise na França em Paris e o La


Recoleta em Buenos Aires na Argentina (colocar a referência). Em solo nacional
iniciativa semelhante vem sendo desenvolvida em especial no cemitério da
Consolação em São Paulo com o projeto Vamos passear no cemitério (colocar
referência).
Materializado na paisagem de uma cidade, sua arquitetura fúnebre e seu
acervo mortuário, como sepulturas e enxoval funerário (sepulturas e enxoval
funerário) é são indissociável das relações sociais, morais e mágico religiosas. Em
outras palavras, significa dizer que a materialidade e a imaterialidade são
inseparáveis (Colocar a referência do autor). O túmulo não é simplesmente o
suporte, ele é a própria substância da vida social e cultural.
Todos os cemitérios são testemunhos do tempo, por isso Araujo e Rigo
(2012) concordam colocam que é preciso se desfazer do preconceito em relação a
eles, percebendo sua relevância histórica, cultural e artística, e da ideia de que
patrimônio só existe nas cidades históricas ou distantes de nós. Em cada cidade
brasileira existe pelo menos um cemitério, e, por mais pobres que possam ser os
campos santos, eles revelam um pouco da historia da localidade.
Contudo, diante do exposto se percebe mudanças na forma como o
IPHAN passoua a lidar e qualificar o que é patrimônio. Atualmente seu sentido é a
de ressonância, ou seja, sua condição de emocionar, afetar. Para que funcione
como forma de comunicação social é preciso que haja interlocutores, conhecedores
dos diferentes códigos. Ele deixa de ser elitista na seleção e trato dos bens, deixa
de ser limitado a uma vertente (luso brasileiro) e a determinados períodos históricos
e passa a envolver progressivamente outros atores que não apenas burocratas e
intelectuais. Foi É a partir da busca de uma identificação social mais abrangente que
os cemitérios passaram a compor os bens culturais e patrimoniais 17.
Com as mudanças no IPHAN (Quando e onde se percebeu isso?) além
do Cemitério do Batalhão outros cemitérios ou partes do conjunto funerário como
17
Um bem cultural não necessariamente tem a mesma função funciona como de um bem patrimonial.
O bem cultural ao lado do seu valor utilitário e econômico (valor de uso enquanto habitação, local de
culto, ornamento e etc, valor de troca determinado pelo mercado), enfatiza-se seu valor simbólico,
enquanto referencia a significações da ordem da cultura. Na seleção e no uso dos materiais, no seu
agenciamento, nas técnicas de construção e de elaboração, nos motivos, são apreendidas
referências ao modo e as condições de produção desses bens, a um tempo, a um espaço, a um
sistema simbólico.
Quanto ao bem patrimonial possui a intermediação do Estado através de agentes autorizados e de
práticas socialmente definidas e juridicamente regulamentadas, contribui para fixar sentidos e valores,
priorizam uma determinada leitura. Essa nota explicativa está consfusa.
36

esculturas, túmulos e portões de entrada também foram tombados. Ao todo Castro


(2008) contabilizou 15 tombamentos dos quais dois ainda se encontram sem
inscrição. Outra informação constatada pela autora foi o destaque para as regiões
nordeste (Bahia, Piauí e Rio Grande do Norte) e sudeste com o maior número das
ações de tombamento, sendo 40 % e 33 % respectivamente. (Neste parágrafo senti
falta de uma maior contextualização. Pq vc trouxe estas informaçãoes de Castro?
Em 2011 também foi tombado o Mausoléu Ícaro onde está enterrado o aviador
Alberto Santos Dumont no Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro
(NOGUEIRA, 2013).

1.2- UM DESTINO, MÚLTIPLAS HISTÓRIAS: ARQUEOLOGIA HISTÓRICA E


OUTROS DIÁLOGOS POSSIVÉIS NOS CEMITÉRIOS CONVENCIONAIS

Ao delinear Delineado o contexto no qual como surgiram os cemitérios


convencionais e como esses espaços passaram a fazer parte da discussão do
patrimônio cabe citar algumas das agora múltiplas histórias que esse território dos
mortos pode trazer consigo. Cada uma dessas histórias está relacionada com a
abordagem pela qual são conduzidas as pesquisas.
O artigo de Santos (2011), em seu artigo intitulado “Vida e morte nos
grupos humanos: algumas informações preliminares” mostram as possibilidades
informativas que os cemitérios indígenas podem proporcionar, apontando que estas
possibilidades continuam nos tempos atuais, como mostra o livro do sociólogo
Clarival Prado Valladares (1972) nos em dois volumes dois volumes do seu livro,
“Arte e sociedade nos cemitérios brasileiros”. Este autor O mesmo é pioneiro nos
estudos dos cemitérios em períodos recentes da história humana. O que o autor se
propões neste estudo?
Além do estudo de Valladares existem outros, como o de Tânia Andrade
Lima (1994) intitulado de “De morcegos e caveira a cruzes e livros: a representação
da morte nos cemitérios cariocas do século XIX”. Nele ela propõe verificar prováveis
mudanças no imaginário coletivo sobre a morte, provocada pelo rompimento da
ordem escravocrata e a emergência do sistema republicano. Apesar de fazer o
levantamento gráfico e iconográfico, apenas os elementos não verbais são objeto da
investigação. Ao todo foram levantados e analisados 2.500 sepulturas, cuja
sistemática adotada permitiu constatar 3 padrões dominantes na representação da
37

morte:. É o inaugural (1850 a 1888) onde as representações são escatológicas,


macabras e mórbidas. Nele predomina caveiras, tíbias cruzadas, ampulhetas aladas,
plantas narcóticas entre outras.
O segundo padrão é o de transição (1889 a 1902) onde se inicia o
processo de substituição de uma categoria de signos por outros, ou seja, foices,
morcegos, caveiras cedem espaço a cruzes em múltiplas variações, estas ainda
com conotação medieval, demarcando o local onde jaz o corpo morto e não ao
suplicio de Cristo. OE o último padrão é o de consolidação (1903 a 1930) momento
em que se verifica a inserção de novos materiais nos espaços funerários, como o
bronze e outros metais nobres, além de imagens religiosas cristãs, retratos e
estátuas do morto em vida. Ostentação, luxo e opulência caracterizam esse período.
Em 2002, Maria Elizia Borges escreveu “Arte funerária no Brasil (1890-
1930): oficio de marmoristas italianos em Ribeirão Preto”. Nessa obra ela busca
preencher uma lacuna na historiografia artística brasileira, que se mantém mais
atenta a qualidade estética da obra e a iconografia das elites e dos estetas. Ela
procura reproduzir o cotidiano, os instrumentos e condições de trabalho dos artistas
imigrantes artesãos italianos, cujos trabalhos hoje praticamente desapareceram. E
também fez um inventário tipológico.
O historiador Júlio César Medeiros da Silva Pereira contribuiu em 2007
com “À flor da terra: o cemitério dos pretos novos no Rio de Janeiro”. Partindo da
observação de que a violência contra os escravos vivos são bem conhecidas, mas
que pouco se sabe da violência cultural contra os escravos mortos, o autor aborda o
cemitério com suas múltiplas conexões, (cuja principal é o tráfico negreiro,) além dos
e significados.
Outro esforço exemplar de estudo vinculado ao tema trata-se da obra é
“Cemitérios do Rio Grande do Sul: arte, sociedade e ideologia”. A mesma
compreende Trata-se de uma coletânea de pesquisas, realizadas por acadêmicos
do curso de História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul ,
orientados por Harry Rodrigues Bellomo, publicado em 2008. A obra também
envolve aspectos antropológicos, ideológicos, sociológicos e artísticos.
A arqueóloga Ana Lúcia Herbets e a historiadora Elisiana Trilha Castro,
juntas e, partindo da arqueologia da paisagem publicaram em 2011 a obra
“Cemitérios no caminho: o patrimônio funerário ao longo do caminho das tropas nos
38

Campos de Lages”, no qual traz um detalhado inventário de vinte cemitérios


localizados no entorno do caminho dos tropeiros.
No ano de 2012 seguinte Maristela Carneiro defendeuia sua dissertação
intitulada de “Construções tumulares e representações de alteridade: materialidade e
simbolismo no cemitério municipal São José, Ponta Grossa (1881-2011)”. Para a
autora a alteridade nas construções tumulares pode demonstrar a singularidade dos
sepultados e ainda as trajetórias da coletividade nano qual estavam inseridos.
Basicamente ela consideroua duas escalas para leitura do cemitério, a dos
elementos materiais e a dos elementos simbólicos. A alteridade é o estudo das
diferenças e o estudo do outro, ela assume papel essencial na antropologia. O
estudo de alteridade que Carneiro faz é especialmente a partir da estatuária e da
arquitetura.
Em ano mais recente, 2014, foramsão publicados mais três estudos. Dois
deles de autoria de Castro. O primeiro é “In Frieden: inventário dos cemitérios
alemães de São Martinho”, onde ela inventaria doze cemitérios, sendo oito situados
em território do município de São Martinho, três no município de Armazém e um no
município de São Bonifácio. O segundo é “Ruhe Sanft: inventário do cemitério de
imigrantes alemães de São Martinho Alto”, ainda em pleno uso pela comunidade.
Nele a autora apresenta seu breve histórico e inventário detalhado.
O terceiro é a pesquisa de Clarissa Grassi que atua nessa linha de
investigação faz onze anos. Tanto esforço e dedicação já lhe renderam duas
publicações de livros. “Um olhar... a arte no silêncio” (2006) e “Guia e visitação no
Cemitério Municipal São Francisco de Paula: arte e memória no espaço urbano”
(ano?), este seu trabalho mais recente. O objetivo da obra é promover o resgate de
parte das trajetórias ali enterradas, trazendo informações biográficas, arquitetônicas,
geológicas e sobre simbologia presentes nos túmulos. Tanto esse trabalho como o
de Borges (2002) foram publicados em dois idiomas, português e inglês.
Enquanto alguns autores como Lima (1994), Borges (2002), Pereira
(2006), Bellomo (2008), Herbets e Castro (2011), Carneiro (2012), Castro (2014) e
Grassi (2014) trazem os cemitérios como importantes fontes de informação sob
diferentes abordagens, Silva e Malagutti Filho (2009) os apresenta como potencial
fonte de contaminação, uma abordagem que não atende as finalidades desse
estudo, mas ainda assim uma via de estudo importante.
39

Através dos trabalhos acima mencionados verificoua-se que boa parte


das pesquisas realizadas se concentra na região Sul e Sudeste do país. No
Nordeste que se destaca com 40 % dos tombamentos de patrimônio funerário,
pouco se tem pesquisado sobre o tema. No Piauí são poucas as referências a
pesquisas com enfoque em cemitérios. Tem a de Matos (2009) que fez uma análise
dos jazigos e lápides do cemitério Nossa Senhora de Lourdes. O cemitério é datado
do final do século XIX e está localizado na cidade de São Raimundo Nonato. E a
pesquisa de Morais (2014) que estuda o acervo mortuário do cemitério Santo
Antônio situado na cidade de Campo Maior. Ele remonta ao inicio do século XIX e
também é o objeto deste estudo. Não existe nenhum estudo sobre o Cemitério São
José em Teresina?
A carência de pesquisa sobre o tema em algumas regiões do país pode
ser explicada pelo desconhecimento que gera preconceitos e discriminação. O tema
Patrimônio fúnebre é considerado por muitos como excêntricos ou até mesmo
mórbidos (NOGUEIRA, 2013). São em geral associados acomo lugares de almas
penadas, locais onde se realizam práticas mágicas religiosas do culto não católico,
espaço de tristeza, despedida e dor.
Despidos do preconceito são amplas as possibilidades de abordagens
dos espaços mortuários como fonte de informação das localidades onde estão
situados.

O cemitério é uma fonte de pesquisa geográfica (localização e expansão


das cidades), histórica (antigos hábitos de inumar), sociológica (como a
sociedade lida com a morte e a memória), antropológica (representação
individual da morte), linguística (signos verbais), literária (escritos sobre a
morte), artística (escultura), arquitetônico (construção tumulares),
hidrográficas (águas subterrâneas cemiteriais), pedológica (solo cemiterial),
genealógica e heráldica (famílias, nomes, brasões), demográficas
(imigrantes), nobiliarquia (linhagem de nobres), turística (visita a ilustres) e
outras (BRANDÃO, 2012 ,s/p não paginado).

Entre essas outras possibilidades de pesquisa está a Arqueologia, não


numa perspectiva de “remover ossos secos”, mas ainda sim em busca de um
homem de carne. Trata-se de uma arqueologia que faz uma leitura da distribuição
espacial e orientação das sepulturas, dos aspectos gráficos e iconográficos contidos
nas lápides, dos objetos e construções que constituem o espaço funerário, das
personalidades ali sepultadas e das fotografias cemiteriais. Uma arqueologia sem
40

terra por debaixo das unhas, mas ainda sim uma arqueologia que “escava” nas
palavras (documentos escritos) e nas coisas (documento material) o maior tesouro
que existe, o conhecimento.
É preciso compreender que assim como as divisões de modalidades de
patrimônio são construções históricas, a divisão dos campos do conhecimento
citadas por Brandão (2012) também são, logo nem sempre elas conheceram
fronteiras tão bem delimitadas.
Um desses campos de saber é Arqueologia Histórica, fruto da distinção
que se faz entre a arqueologia do período pré-histórico e a do período histórico
consagradas em alguns continentes do globo terrestre, entre os quais a América,
Oceania e África Subsaariana. Neles a Arqueologia Histórica corresponde à
arqueologia Pós-medieval da Europa.
Vários autores procuraram defini-la: Prous (1992, p.543) a define como o
estudo de vestígios que evidenciam influência européiaeuropeia, para o qual se
dispõe de documentos escritos; Funari (2007) afirma que hoje comumente ela é
definida como estudo dos vestígios materiais de sociedades com registros escritos;
De acordo com Zarankin e Senatore (2002), a Arqueologia Histórica, principalmente
no que se refere à literatura mais recente, vem sendo caracterizado como o estudo
da formação do mundo moderno a partir da expansão européiaeuropeia, coincidindo
desta maneira, com a consolidação do sistema capitalista e de uma nova ordem
social. Na América esta arqueologia esta relacionada ao período posterior ao
contato entre índios e europeus chegados ao Novo Mundo. Para Orser Jr (2000) ela
é o estudo da materialidade em termos culturais dos efeitos do mercantilismo.
No caso especifico do Brasil convencionou-se como marco cronológico
1500 d.C. Mas como já foi mencionado esses conceitos, em especial o destes dois
últimos Zarankin e Senatore(2002) e Orser Jr(2000), não são aceitos por todos os
estudiosos, que alegam que eles sintetizam ou homogeneízam a chegada do
europeu no Novo Mundo. Por exemplo, o marco cronológico estabelecido para o
Brasil é problemática, porque em Porto Alegre, Manaus ou qualquer outro estado
atual do país a presença do europeu não foi no mesmo ano, do que ocorreu em
Porto Seguro (BA).
41

Porém Orser Jr (1992) ao conceituá-la manifesta consciência da


dificuldade de determinar o inicio do período histórico, de sua limitação regional e
sua imprecisão. O que ele claramente fala no seguinte trecho:

O que, em verdade, distingue a arqueologia histórica não é o período


histórico estudado (histórico ou pré-histórico), os povos aborígenes
contatados pelos europeus (vários povos indígenas), os colonizadores
europeus (portugueses, ingleses, franceses e outros) ou nem mesmo
grupos populares (escravos, africanos, trabalhadores migrantes e assim por
diante), mas, ao contrario, como cada elemento se adaptou e foi
transformado pelo processo que de inicio, levou o europeu a estabelecer
assentamentos coloniais em todo o mundo e, posteriormente, a formar
novas nações (ORSER JR,1992, p.22).

Em outras palavras a definição desta variante da arqueologia não tem seu


foco em uma cronologia, não é uma aferição de uma data, mas de um momento
anterior e posterior. Nem tampouco se centra no índio, colonizador ou grupos
populares, o que a determina é um olhar construído com a história.
Hoje seu campo de pesquisa é multidisciplinar, o que lhe confere uma
diversidade de fontes de informação, disponíveis para contribuir para uma
compreensão mais completa da sociedade abordada, trazendo informações inéditas,
complementando o que é dito ou desmentido aquilo que foi escrito. As fontes
utilizadas podem ser de diferentes áreas do saber como a história (documentos
escritos, mapas, a historia oral), a antropologia cultural (etnografias, espécimes, de
museus e testemunhas orais), a história da arte (pinturas, desenhos, fotografias), a
geografia histórica e cultural (mapas, assentamentos e paisagens), a arquitetura
histórica (edifícios), ao folclore (tradição oral e arquitetura vernacular) e arqueologia
(artefatos, estrutura e contexto do sitio).
Os artefatos, definidos por Orser Jr. (1992) como tudo que foi e é
produzido ou modificado pela ação humana, são objeto de estudo tanto da
arqueologia pré-histórica como da arqueologia histórica, a diferença consiste no fato
de que esta última pode valer-se da disponibilidade de determinadas informações
sobre os vestígios arqueológicos do período histórico para datar sítios e estruturas,
tais informações podem ser datas, marcas, registros de fabricantes, catálogos, etc.
Estas informações inclusive podem ser extraídas da cultura material presente na
área de pesquisa em questão. Os túmulos e os elementos que os ornamentam
desde que foramsão edificados permanecem em quase sua totalidade intactos, o
42

que é de grande valia para a investigação arqueológica, principalmente no que se


refere aos “termos de controle de dados”, conforme afirma Lima (1994).
Sendo o cemitério a área de pesquisa em questão, as informações são
encontradas nas lápides sepulcrais que agregam uma variedade de informações.
Nela encontram-se elementos iconográficos (desenhos, gravuras, signos e etc.) e
elementos gráficos (o texto escrito propriamente dito) que revelam ou ocultam a
historia dos mortos para os vivos.
Dada a riqueza dos espaços mortuários, Borges (2013, p.24) comenta
que não dá para pesquisá-lo só dentro de uma vertente. No que se refere
especificamente a Arqueologia, Mello; (ano) Cerqueira (2015) coloca que há uma
escassez de produções acadêmicas, o que explica a dificuldade de citar obras nesse
campo de estudo. Talvez a explicação para essa escassez resida no fato de que é
recente a abordagem dos cemitérios atuais, pois no principio a Arqueologia Histórica
ostinha objetos de estudos e as abordagens pareciambem delimitados.
É possível visualizar esses objetos a partir da ótica de alguns autores que
se debruçaram a estudar a subdisciplina no país. São esses autores André Prous
(1992) em Arqueologia Brasileira, Tânia Andrade Lima (1993) em Arqueologia
Histórica no Brasil: balanço bibliográfico (1960-1991), considerada por Funari como
a revisão mais exaustiva sobre o tema e Symanski (2009) em Arqueologia Histórica
no Brasil: uma revisão dos últimos 20 anos.
Do período em que cada um escreveu havia uma diferença em termos
quantitativos de produções disponíveis. Prous (1992) alertava para isso ao dizer que
sua pretensão não é “apresentar um panorama geral da arqueologia histórica
praticada no Brasil, já que existiahá ainda poucas publicações disponíveis sobre o
assunto” (PROUS, 1992, p.543).
O seu trabalho consiste em destacar as quatro universidades federais
pioneiras (UFPE, UFRS, UFSP e UFMG), os nomes que estiveram à frente das
pesquisas conduzidas em cada uma das instituições acadêmicas anteriormente
citadas (G. Martin e C. Albuquerque, A. Kern, M. Andreatta e C. M. Guimarães), e
algumas direções de pesquisa. Essas são basicamente quatro: estudo de grupos
indígenas influenciados pelos colonizadores; Estudo de núcleos escravos rebeldes
que criaram comunidades independentes; Estudo das comunidades de tradição
européiaeuropeia; e eEstudo arquitetural das cidades antigas, dos fortes ou
monumentos isolados.
43

Lima (1993) ao contrário de Prous (1992) dispunha de publicação


suficiente para proceder com um panorama geral da subdisciplina no Brasil. Era uma
quantidade nem tão pouca, mas também não era em excesso. Era uma quantidade
suficienteo suficiente para ser considerada como uma revisão exaustiva. Seu
trabalho tem servido de ponto de partida para outros autores a exemplo de Maria
Dulce Gaspar (2003) em História da construção da Arqueologia Histórica Brasileira e
do trabalho já citado do Symanski (2009). Esse último autor escreveu em um
período onde houve uma grande quantidade de publicação, em virtude da
proliferação deem curso de graduação e pós-graduação em arqueologia. (Quando?)
É com base nestaem sua revisão proporcionada pelo avanço destes cursos e das
pesquisas na área que ora se apresenta esse desdobramento dessa subdisciplina.
No Brasil de acordo com Symanski (2009) foi somente em 1960 que a
Arqueologia Histórica começou a ser realizada por pesquisadores
institucionalizados, ou seja, é nesse período que ela se torna uma preocupação
acadêmica. Desde então nos últimos 20 anos houve sua expansão, produto de uma
nova geração de arqueólogos que emergiu na década de 90 em decorrência do
fortalecimento dos cursos de pós-graduação e da expansão de arqueologia de
contrato. E que tende cada vez mais a crescer devido à proliferação de cursos de
graduação e scritu sensu. Com seu processo de expansão, as pesquisas crescem
juntamente com seus temas e abordagens, permitindo desta forma a compreensão
de contextos arqueológicos pouco abordados ou relegados a um segundo plano no
desenvolvimento dos trabalhos.
Symanski (2009) a divide em três momentos: o período de formação
(1960-1980); o de consolidação (1980-1990); e o período de novas tendências a
partir de 1991 em diante. Sua divisão parte de quando a subdisciplina emergiu
formalmente reconhecida como campo de pesquisa, isto é no inicio dos anos 60.
Cabe ressaltar que em 1930 já se realizavam pesquisas em sítios históricos, porém
eram investigações assistemáticas, sem corpus teórico definido, aliás, isso valia
para a Arqueologia como um todo (Pré-Histórica e Histórica). Eram pesquisas mais
amadorísticas e ensaístas do que pesquisa propriamente científica, marcadas por
interesses particulares e específicos e sem uma produção acadêmica, de análises
aprofundadas com o compromisso de elaborar ou seja, sem publicaçõesão.
Contudo,E que já em 1950 verificam-se trabalhos voltados para trabalhos de
restauração.
44

Retomando o diálogoVoltando para os momentos estabelecidos porcom


Symanski (2009) verifica-se que o período de formação foié marcado pelo atraso da
subdisciplina no que diz respeito às corrente teóricas. Enquanto em 1960 se
assinala o ápice da Nova Arqueologia, a Arqueologia Histórica brasileira entre a
década de 60 e 70 foi conduzida pelo histórico-culturalismopor aquilo que o
processualismo combatia o Histórico- Culturalismo. Os trabalhos dos históricos-
culturalistas realizados por pré-historiadores eram descritivos realizados por pré-
historiadores quee buscavam sínteses temporais ou regionais do início do século
XX. Entre os objetos de estudo estão as reduções jesuíticas dos séculos XVI, XVII e
XVIII no sul do Brasil e os sítios de contato do século XVI do litoral nordestino.
Ainda na década de 70 ela foi introduzida em projetos de restauração de
monumentos históricos, mas subordinada a Arquitetura e a História perdendo seu
potencial enquanto ciência social, reduzida simplesmente a uma técnica de serviço
caracterizando-se a um nível meramente arqueográfico. Subordinada ao interesse
do Estado ela serviue para corroborar a história oficial e nacionalista.
No período de consolidação, além do estudo da produção dos segmentos
dominantes, ela também se voltou para o estudo da emergência do capitalismo,
estudo das minorias, subalternos e excluídos, introduzidos através do estudo de
quilombos em Minas Gerais, aldeamentos indígenas pós-missioneiros no Rio
Grande do Sul e do arraial de canudos. Acrescenta-se a incorporação de novas
temáticas a atualização de preceitos teóricos e metodológicos. A arqueologia
Histórica amplia seus horizontes apontando sobre o urbano e investigando além do
tempo também o comportamento. Passoua a utilizar-se de conceitos e definições
como cidade-sítio ou padrão deposicional, bem como a aplicação de fórmulas para
datação de cachimbos ou de louças. Cabe lembrar que a maioria dos trabalhos, na
prática, continuou mantendo caráter descritivo das décadas anteriores. Referenciar o
autor.
Por fim, no último momento verifica-se uma grande diversidade de tipos
de sítios históricos desconsiderados nas décadas anteriores que passam a ser
pesquisados. FoiÉ nesse contexto que os cemitérios passaram a integrar o bojo
dessa especialização da arqueologia. Outra característica desse período foié a
atenção dada a outras categorias materiais como a louça, o vidro e o metal. A
subdisciplina se solidificoua com trabalhos (dissertações e teses) seguindo tanto
linhas processualistas como pós-processualistas, principalmente sobre ideologia e
45

simbolismo. Começa aí as abordagens sobre categorias intangíveis como ideologia,


gênero, identidade e poder. Recomenda-se que você fundamente em algum autor o
que vc está afirmando. Certamente vc tem tem alguns.
Dar atenção a outros tipos de sítios não significa dizer que os estudos
sejam suficientes. Um exemplo é apresentado por Symanski (2007). Esse autor
compara a arqueologia da escravidão no Brasil com a historiografia sobre o mesmo
tema, mostrando que há uma discrepância em termos de produção sobre o assunto.
Enquanto na historiografia a produção tem se tornado crescente, na arqueologia
este tema tem sido pouco estudado. Tal situação não se explica de forma alguma
pela inexistência dos restos materiais desse grupo social, mas, sobretudo na
habilidade de diagnosticar as evidencias a eles ligados.
A habilidade de que ele se refere correlaciona-se com a visibilidade, que é
um termo usado na arqueologia para designar “uma classificação hierárquica, na
qual os sítios são categorizados de acordo com a densidade e o grau de
preservação dos vestígios materiais neles presentes como sendo alta, média ou de
baixa visibilidade” (SYMANSKI, 2007, p.216).
Cada categoria destas faz variar as chances dos sítios e artefatos neles
depositados serem descobertos. Faz-se necessário ainda se desviar de ideias
errôneas como correlacionar categoria material com categoria social, aprendendo a
identificar por meio da cultura material uma determinada unidade sociocultural,
partindo sempre do pressuposto de que a principal variável a ser considerada é o
contexto. O contexto refere-se “à localização exata do artefato, em termos verticais e
horizontais, em um sitio arqueológico” (ORSER JR, 1992, p.32).
Trazendo o exposto para os cemitérios atuais se percebe que os estudos
ainda são poucos. Dentre os poucos trabalhos conduzidos por essa área do
conhecimento está à dissertação de Tavares (2012) apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Arqueologia do Museu Nacional. O trabalho intitula-se de
“Cemitério dos Pretos Novos, Rio de Janeiro, século XIX: uma tentativa de
delimitação espacial (2012)”.
Trata-se de uma pesquisa arqueológica histórica que teve como objetivo
delimitar a dimensão espacial do antigo cemitério dos Pretos Novos, para fins de
proteção legal. Segundo o autor a necrópole era utilizada pelo antigo mercado de
escravos do Valongo e recolhia os corpos dos cativos que faleciam ao chegar,
durante o período de quarentena no lazareto (edifício para quarentena de pessoas
46

suspeitas de contagio), ou de exposição no mercado. Os recém-chegados só tinham


dois caminhos: se mortos eram enterrados à flor da terra; se vivos passariam a ser
propriedade de algum senhor, passariam a serem negros novos.
A necrópole foi abandonada em 1930, e posteriormente desapareceu uma
vez que foram construídas pequenas casas sobre seu terreno, depois outras
maiores, e depois outras construções. Enfim, com a especulação imobiliária o que
restou do cemitério ficou no subsolo, invisível em nível de superfície. O
caracterizando como um sítio de baixa visibilidade.
Utilizando das cartografias da época, de relatos de cronistas, de
documentos oficiais, o autor procuroua delimitar o espaço do cemitério através de
sondagens internas (no interior de residências) e sondagens externas (em vias
públicas). Os resultados apontaram que ali havia três tipos de ocupação: Sitio de
contato entre indígenas e europeus; sitio histórico ( louças, faianças inglesas e
portuguesas, , vidro, ossos de animais sobretudo bovinos, e material relacionado ao
cemitério como ossos humanos, alguns cremados, carbonizados, outros mais longo,
como também miçangas brancas e contas de vidro); e um sambaqui. Referência do
autor.
Também foi coletado muito lixo, evidenciando que mesmo durante o
período de uso do cemitério, o mesmo não recebia somente cadáveres mais ainda o
que não mais servia a sociedade, o lixo. O que se percebe durante a leitura de seu
trabalho é que ora as palavras e as coisas se mostrem de forma harmoniosa ora de
forma conflituosa, e que por isso mesmo ajuda na construção daquele passado.

Contudo, esse panorama das pesquisas realizadas no Brasil sobre os


estudos cemiteriais tem mostrado suase concentraçãodo na parte sul e sudeste e
apresentado uma produçãoproduzidos a partir de uma diversidade de campos de
conhecimentos no qual a Arqueologia histórica ainda é tímida. Grande parte dos
nomes citados como Maria Elizia Borges, Clarissa Grassi, Elisiana Trilho Castro e
Harry Rodrigues Bellomo, tem contribuído através da Associação Brasileira de
Estudos Cemiteriais (ABEC) fundada em 2004, na divulgação de trabalhos sob
múltiplos aspectos (arte tumular, fotografias cemiteriais, como potenciais turísticos e
outros etc.).

1.3 - ARQUEOLOGIA DAS PRÁTICAS MORTUÁRIAS


47

A arqueologia das práticas funerárias é apenas mais uma das


ramificações da Arqueologia Histórica. Conforme Ribeiro (2007) ela é uma linha de
pesquisa que visa através da interdisciplinaridade, preencher lacunas existentes
entre Arqueologia e História. Ela é adotada para analisar e interpretar dados
mortuários, informações encontradas no contexto arqueológico que remontam as
praticas mortuárias.
A materialidade da morte tem importância na constituição da memória
social dos que já se foram. Ela estabelece o que deve ou não ser lembrado, tem
sempre carga simbólica. Pode-se falar numa morte biológica sem ter uma morte
social, esta entendida como uma perda de recordação. O não abandono dos mortos
implica em sua sobrevivência.
Em outros países essa linha de pesquisa recebe outras denominações, é
o caso da Inglaterra e Estados Unidos onde se consagrou a expressão arqueologia
da morte. Na França tornou-se usual o termo Arqueologia de cemitérios, funerária e
ainda ideologia funerária. Ribeiro (2007) discorda do uso de quase todos esses
termos, sendo mais tolerante com a arqueologia funerária. Segundo a autora não se
estuda a morte em si, mas os remanescentes das práticas que a envolvem, o
funeral, os restos materiais dos atos que foram praticados no destino escolhido para
o corpo, os vestígios das opções da sociedade e da família do morto para sua
memória, a simbologia que deu lógica as práticas mortuárias. Portanto optou-se por
arqueologia das práticas mortuárias por considerá-lo mais abrangente.
O estudo da representação da morte e tudo mais que esteja atrelado ao
tema durante muito tempo ficou relegado a um segundo plano no campo
historiográfico, vindo a conquistar espaço no século passado quando Marc Bloch e
Lucien Febvre, articuladores da revista Periódica Annalles da qual surge a Escola
dos Analles em 1929, na França. A proposta inicial do periódico era se livrar de uma
visão positivista da escrita da História que havia dominado o final do século XIX e
início do XX. Os integrantes do movimento pretendiam substituir as visões breves
anteriores por anáalises de processos de longa duração com a finalidade de permitir
maior e melhor compreensão das civilizações das mentalidades.
O movimento pôs em cheque a historiografia tradicional e apresentou
novos elementos para o conhecimento das sociedades como a inserção de novos
tipos de fontes de pesquisa e a interdisciplinaridade que aproximou a História das
48

demais ciências sociais. Em especial seu estudo ganhou força na década de 70 do


mesmo século com a Nova História Cultural (NHC).
Para Pesavento (2008), a NHC proporcionou a multiplicação do universo
temático e os objetos, bem como a utilização de novas fontes, o que não implica
dizer que os tipos de fontes anteriormente conhecidas tenham perdido importância,
apenas passoua a ser vista com olhares e questionamentos diferentes. “A Nova
Historia preconiza que os documentos históricos são quaisquer vestígios deixados
pelo homem, não só os escritos” (BORGES, s/d, p.24).
Tendo em vista essa nova corrente historiográfica, questões antes
consideradas secundárias passaram a ocupar um primeiro plano. Com ela o
historiador passoua a estudar o amor, a dança, a alimentação, a morte e outrosetc.
O campo da história tornoua-se amplo e diversificado, abrindo possibilidades para a
reflexão e produção de trabalhos nesta perspectiva no âmbito acadêmico.
Carvalho (2014) aponta uma aproximação entre a Arqueologia e a
Historiografia francesa especialmente a partir da valorização da história das
mentalidades, na qual se concebe o mundo a partir do contexto temporal de curta,
média e longa duração. Essa aproximação veio a contribuir para alargar as
possibilidades do fazer arqueológico. Na Arqueologia a discussão sobre morte foi
reconhecida e ganhou expressividade a partir da década de 70 e 80 do século XX.
Costa citando Williams (vc não tem o texto de Williams, o original?) (2012,
p.106) coloca que a Arqueologia da morte é tão antiga quanto a própria arqueologia,
porém no século XIX e início do XX era um tema ignorado na própria arqueologia
quando esta não se preocupava com o “passado do passado”. Cenário este que vai
ser alterado somente pelas abordagens do espelho etnográfico e comparação
cultural na década de 1970, onde a morte e seu tratamento eram vistos como um
reflexo das regras culturais que aqueles indivíduos praticavam em vida, ou pós-
processualista da “máscara” social e leitura contextual da década de 1980, que
aborda uma leitura atual e relevante sobre as práaticas mortuárias nas sociedades
modernas. Retome esse último trecho do parágrafo acima. A partir da palavra pós-
processualista, o texto carece de algo para completar o sentido, ou vc pode retirá-lo.
No Brasil o desenvolvimento das correntes teóricas e metodológicas do
estudo arqueológico das práticas mortuárias ocorre de forma relativamente lenta.
Como já demonstrado, o estudo do tema tem sido realizado principalmente no
âmbito das ciências sociais.
49

A seguir, partindo do contexto nacional procura-se mostrar como se deu


o processo de implantação dos cemitérios no Piauí, apresentando as
particularidades das suas tradições fúnebres com ênfase para o município de
Campo Maior. Portanto o segundo capíitulo se inicia com a formação histórica da
cidade e concomitantemente se procura construir o caminho até o cemitério Santo
Antônio.
50

32 - APRESENTANDO A “PRINCESA DAS CAMPINAS”: SOBRE SUA ORIGEM


E SUAS PRÁTICAS MORTUÁRIAS

Ainda na graduação um professor fez o seguinte comentário: “O país tem


mania de realeza”. Sua afirmação é perceptível nas telenovelas (Rei do gado e
Rainha da sucata), no campo musical (rei Roberto Carlos e o rei do Baião Luiz
Gonzaga também conhecido como rei lua), no futebol (com o rei Pelé) e ainda na
apresentadora Xuxa consagrada a rainha dos baixinhos.
No entanto essa mania de realeza não para por aí. Na pesquisa
bibliográfica feita para a produção dessa pesquisa constatou-se que a mania
alcançou o nome de cidades ou de locais específicos dela. É o caso da Princesa
Dona Francisca, atual Joinville (CASTRO, 2008), Rainha da fronteira, hoje Bagé
(NOGUEIRA, 2013), Princesa dos Campos, no presente Ponta Grossa (CARNEIRO,
2012) e Princesinha do mar, referindo-se a Copacabana (VELHO, 2007).
No Piauí tem a cidade de Floriano é conhecida como a Princesa do Sul e
Campo Maior mais conhecida como a Terra dos Carnaubais, mas sem fugir a
tradição de realeza também recebeu a alcunha de Princesa das Campinas. A
expressão é atribuída ao campo maiorense Octacílio Eulálio, que entre seus ofícios
estava o de ser poeta, e pode soar um tanto quanto estranha aos leitores tão
acostumados com a já consagrada “Terra dos Carnaubais”. Possivelmente agora já
devem saber que ambas se referem ao mesmo município, diferindo apenas na
freqüênciafrequência com que esses termos são usados.
51

O município localiza-se no norte do Piauí a 04° 49’ 40 de latitude e 42° 10’


2,
07” de longitude, ocupando uma área de 1.699,383 km tendo como limite ao Norte:
Cabeceiras do Piauí, Nossa senhora de Nazaré, Cocal de Telha; ao Sul, Alto Longá,
Coivaras, Novo Santo Antônio; a Leste, Cocal de Telha, Jatobá do Piauí e Sigefredo
Pacheco; a Oeste, José de Freitas, Altos e Coivaras.

Figura 2: Localização de Campo Maior no mapa do Piauí

Fonte: Cristovane Rodrigues da Silva, 2011.

Ela é uma cidade histórica fundada quando o “Brasil” ainda era colônia de
Portugal. Vários atrativos estão incrustados em sua paisagem, alguns, na verdade
muito poucos permaneceram intactos pelas transformações exigidas pela demanda
da sociedade que surgiue e outros elementos desapareceramu por completo em
virtude da ação das intempéries, vindo a perecer os seus materiais construtivos, ou
52

em decorrência da usura dos homens. E com muita sorte são encontrados


registrosados em documentos para que se possa ter conhecimento de sua
existência de algumas particularidades próprias em algum momento da história da
cidade, a exemplo do Pelourinho 18 e da Fazenda Tombador19. Esta última cantada
em verso porde Elmar Carvalho: “Quando literalmente tombaram a Fazenda
Tombador, nenhuma voz se levantou, nem mesmo a voz de alguém, que clamasse
no deserto, clamou. E a Fazenda Tombador literalmente tombou” (CARVALHO,
2012, p.37).
Em Campo MaiorNela há casas de feições (fachadas) coloniais que se
localizam no centro histórico, a Catedral de Santo Antônio, um majestoso e grande
templo, que um dia foi uma simples capela de palha erguida pela comunidade em
torno de Bitorocara20 sob orientação dos missionários da Ibiapaba que por aqui
estiveram em 1697 e com os recursos financeiros de Bernardo de Carvalho 21.
ExisteHá também o Santuário de Nossa Senhora do Rosário (Igreja dos
negros), o Monumento Heróis do Jenipapo erigido em homenagem a um momento
importante no processo da independência do Brasil e seu cemitério, o Cemitério do
Batalhão tombado pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(SPHAN) em 1938 e que em 2013 integrou uma série especial de selos (Cemitérios
Brasileiros - Patrimônio Cultural) lançados pelos Correios, além de fazendas
históricas como Abelheiras, registro da passagem da Casa da Torre, e a Fazenda
Foge Homem, entre outros aspectos que embora sob forma invisível também
componha tal paisagem como a religiosidade do povo que aí vive. Ao falar sobre
esses monumentos religiosos e civis coloque-os dentro do seu contexto histórico.
Nesse caso vc apenas os citou sem constextualizá-los.
Para Borges (2002) a maioria das cidades brasileiras do século XIX
passaram por um ciclo evolutivo comum, “vieram os índios... a primeira capela...a
freguesia... a vila...o primeiro cemitério público da paróquia”(BORGES,2002,p.19).
Esse ciclo também pode ser atribuído a Campo Maior. Os primeiros a ocupar o
território que posteriormente seria concebido como Piauí foi indiscutivelmente o

18
Monumento em forma de pilastra ou coluna construído de pedra e argamassa, segundo Melo (1983)
era erigidos em todas as vilas e cidades como um símbolo de autonomia. Em Campo Maior ele existiu
até 1844, quando já bastante deteriorado foi demolido.
19
Local em que depois da batalha o major e suas tropas acamparam. A época distava três
quilômetros do centro da Vila de Campo Maior.
20
Merece uma nota explicativa....
21
Nota explicativa sobre ele......
53

índio, mas dentro da aferição do momento a qual está circunscrito a presente


pesquisa, a colonização e povoamento dessa parte do território piauiense devem ser
compreendidos dentro do contexto da colonização Portuguesa. Aqui o Brasil e o
Piauí ainda não existiam como nação e estado, daí aparecerem entre aspas,
evitando um posicionamento anacrônico.
O “Brasil” ou ainda colônia da América Portuguesa em seu período
colonial era essencialmente rural, baseava-se numa economia centrada na produção
de cana de açúcar e praticava-se a agricultura e a pecuária para subsistência, ou
seja, voltada para suprir às necessidades da vida nos engenhos como também
abastecimento urbano na região.
Segundo Brandão (1995) a inserção do “Piauí” no contexto colonial
brasileiro ocorreu na segunda metade do século XVII motivadas por uma série de
fatores, entre os quais o crescimento da agromanufaturaagro manufatura açucareira
que demandou a ampliação da área de cultivo, a intensificação do seu aspecto de
monocultura e a interiorização das atividades de subsistência, outro fator foi a
preferência pela mão de obra escrava e, portanto a impossibilidade dos engenhos
absorverem mão-de-obramão de obra livre, e a expulsão dos holandeses que gerou
uma crise açucareira, uma vez que eles eram uma peça fundamental do sistema
econômico vigente, com sua saída era necessário ampliar os canaviais, ampliar a
produção.
FoiÉ nesse contexto que se deuá a “descoberta do Piauí” por volta de
1674, através da busca de novas terras onde se pudesse criar o gado e praticar
atividades de subsistência sem comprometer a economia açucareira.

A conquista e povoamento do Piauí e de outras zonas áridas do Nordeste


foi motivada, sobretudo pela expansão da economia açucareira, dependente
do gado bovino e cavalar não só como elemento básico da população livre e
escrava, mas, sobretudo como transporte e força motriz dos engenhos de
açúcar (MOTT, 2010, p.91).

Vale ressaltar que o povoamento do “Piauí” não foi concomitante a sua


“descoberta”, assim como ocorreu no “Brasil” colonial. E como coloca Mott (2010)
foram às fazendas de gado as sementes da ocupação do solo e do processo de
colonização do território, foram elas as responsáveis pela disseminação dos
colonizadores ao longo dos sertões. Jéssica existem outros estudos, inclusive o do
Padre Claudio Mello “O povoamento do Norte”, onde ele afirma que o povoamento
54

ocorreu pelo litoral, anteriormente à entrada dos membros da Casa da Torre. Vc


poderia acrescentar nesse início do cap. 3 as fazendas de gado do Piauí e já entrar
falando de Campo Maior a partir das fazendas, depois vc via dialogando com os
autores que escreveram a história da cidade.
Pedre Cláudio Melo está eEntre os autores preocupados em escrever os
primeiros momentos da história de Campo Maior esta o Pe Cláudio de Melo, com a
obra “Os primórdios de Nossa História” (1983). Nela o autor teve que convencer a si
mesmo e a outros consagrados como Odilon Nunes e João Gabriel Baptista quanto
aos primeiros desbravadores, à gênese do município e de seus primeiros
proprietários.
No que se refere ao “descobrimento” ele discorda de que o norte do
território do Piauí tenha ocupação mais recente do que a do centro-sul, defendendo
que os desbravadores do São Francisco não foram os primeiros a palmilharem o
Vale do Longá (Campo Maior). Ao aqui chegarem já tinha grupos vindos do
Maranhão. E quando finalmente chegaram o interesse e atenção não era o mesmo
que tinham pelo sul. Neste último o processo de ocupação foi a meta, enquanto que
no norte chegaram como guerreiros na caça ao índio. É fato que alguns voltaram
com o intuito de fixarem-se. Colocar a referência.
Quanto à origem, não foge àa regra das fazendas e de seus currais de
gado, nem aodo descompasso entre descobrimento e povoação. Contrariando
autores como Pereira Costa (1974), Melo (1983) atribui ao português Bernardo de
Carvalho e Aguiar a fundação da Freguesia de Santo Antônio do Surubim, com
povoamento iniciado no século XVII a partir do estabelecimento de uma fazenda
denominada Bitorocara na confluência do Rio Surubim com o Rio Longá. Afinal
localizar-se próximo aos rios era uma das características da ocupação, assim como
dispor de grandes glebas de terra para a criação do gado que era feita de forma
extensiva. Outro defensor de Bernardo de Carvalho e Aguiar como fundador de
Bitorocara, a fazenda que deu origem a Campo Maior é Carvalho (2012).
Carvalho (2012) considera que Bernardo de Carvalho e Aguiar seja o
proprietário da Fazenda que deu origem à cidade de Campo Maior. Ele era natural
de Portugal, precisamente da localidadee “Vila Pouca de Aguiar”, e foi o fundador
não somente de Campo Maior mais ainda de São Miguel do Tapuio (PI), São
Bernardo (MA) e idealizador de Caxias (MA). Era um hHomem rico e de prestígio
que se casou comcontraiu casamento com Mariana da Silva, com a qualela teve
55

dois filhos, Antônia e Miguel de Carvalho e Aguiar, este último considerado o


fundador do município de Barras(PI). Morreu pobre, cercado de uns poucos
escravos e índios que lhe tinham apreço. Quem? O Bernardo ou Miguel?
Para Melo (1983, p. 167), “Campo Maior é a única entre as primeiras
povoações do Piauí, cuja origem urbana é desconhecida. Foi a segunda freguesia
do Piauí, mas a data de sua criação é ignorada, bem como o nome de seus
primeiros vigários”. Em 1713 ela já era conhecida como freguesia, embora sua
instalação só ocorresse em 1715. Atendia por Freguesia de Santo Antônio do
Surubim, assim denominada para se distinguir da Freguesia de Santo Antonio do
Gurgueia (Jeromenha)., Ela também foi conhecida como Freguesia do Longá em
virtude do rio que banha sua sede, posteriormente denominada de Campo Maior.

Logo cedo, em meados de 1750, o Surubim começou a atrair mais gente às


suas margens do que o rio Longá, que é muito mais volumoso, mais
extenso e importante. Ainda no século XVIII constata-se que havia mais
fazendas e sítios nas margens do Surubim do que nas margens do rio
Longá. Tenho certeza que o principal fenômeno de atração do Surubim era
o religioso, a igreja de Santo Antonio, sede da Freguesia. Aliás, ressalto que
a própria igreja foi influenciada pelo rio, lembrada com o nome dele, e não
apenas por Santo Antonio, visto que a igreja era sede da Freguesia de
Santo Antonio “do Surubim”. A documentação jurídica mais antiga de
Campo Maior repetidamente descreve a vila como “Vila de Santo Antonio do
Surubim”. O rio influenciou não só a igreja, também o próprio povoamento.
Seu nome indígena, significando “pintado”, ficou marcado no batismo da
igreja, da Freguesia e da Vila, todos carregando o sobrenome Surubim.
(PAIXÃO, 2015, s/pnão paginado)

Os rios eram utilizados como referências e passavam a integrar o próprio


nome de identificação das igrejas, freguesia e vilas. Santo Antônio, que precede o
termo do Surubim é um santo português que a comunidade nascente escolheu como
padroeiro e protetor. Veja se é necessário essa observação acima.
A Freguesia de Santo Antônio do Surubim foi instalada como vila em 8 de
agosto de 1762 na presença de João Pereira Caldas, o primeiro governador da
capitania do Piauí, que escolheu o nome da cidade que se conserva até hoje.
Segundo Mascarenhas (2012), a escolha refere-se aos extensos campos de
carnaubais, daí a sua alcunha de Terra dos Carnaubais. Lima (2008) acredita que o
nome é uma homenagem a uma cidade portuguesa de mesmo nome.

Para alguns o topônimo de Campo Maior originou-se em virtude dos seus


belos campos e campinas com opulentos carnaubais. Entretanto, o nome
Campo Maior, o que é mais provável, origina-se da “praça de guerra”
fortificada chamada Campo Maior e sede do condado Portalegre, Portugal,
56

com termo foral concedido por D. Manuel I em 1512. Com terras férteis e
próprias para a criação de gado, banhada pelo rio Tejo na separação do
direito de Castelo Branco, na fronteira da Espanha, Campo Maior, vila e
sede do conselho de Portalegre, possivelmente assemelhava-se à Campo
Maior do Piauí (Bitorocara). (LIMA, 1995, p.72)

A designação Campo Maior, a “Princesa das Campinas”, não é uma


exceção em relação às outras seis vilas criadas. Era determinação da coroa que
todas elas recebessem o nome de cidades portuguesas. Há uma exceção quanto à
estruturação urbana, comparada às demais freguesias, a de Santo Antônio do
Surubim apresentava melhores condições que efetivamente lhe proporcionava
elevá-la a condição de vila, como se pode perceber nesse relato,.

Por época da criação da Vila em 1762 o surubim já tinha uma estruturação


urbana das mais atraentes de todo o Piauí. Duas praças em frente e atrás
da matriz, quadro completo de moradias junto às duas praças, uma
pequena quadra de casas, chamada rua dos negros na baixa que fica à
direita da matriz e um esboço de rua da praça do pelourinho em direção ao
Rio Surubim. Possivelmente também havia algumas casas de negros do
lado esquerdo da matriz no largo onde depois se construiu a Igreja do
Rosário (Igreja dos negros), um cemitério junto ao cruzeiro da matriz e outro
junto à Igreja do Rosário (MELO 1983, p.100).

Percebe-sea que o autor menciona as edificações que compõe a


estrutura urbana de Campo Maior e que nela há uma estratificação social no que diz
respeito à localização das moradias dos negros, que se situavam para além das
imediações das duas praças junto a matriz;, se observa também que nela aparecem
dois cemitérios, um deles possivelmente possa ser o que se constitui como alvo da
presente pesquisa. Completa as informações um croqui que contem a distribuição
das mesmas edificações. Como vc chegou a essa conclusão que esse cemitério
seria o de Santo Antonio? Para mim pareceia ser outros que possivelmente esteja
coberto pelascasas e pela praça.
57

Figura 3: Distribuição dos edifícios na Vila de Campo Maior

Foto: Melo, com adaptações de Jessica Gadelha, 1983 .

Infelizmente o autor não designa a qual edificação corresponde cada


uma delas, ele prefere dar ênfase àas direções que conduziam para outras
freguesias da mesma província, como por exemplo, ao Maratoã (Barras), Boa
Esperança (José de Freitas) e outras localidades na cidade como a Serra, conhecida
como Serra Azul ou Serra de Santo Antônio. A não colocação de orientação no
croqui também dificulta a leitura da imagem. No entanto lá está o Rio Surubim, este
que guiou a tantos no passado, e aqui também é o guia.
Supõe-se que as cruzes, circuladaso em vermelho, sejam os cemitérios, o
circulo em amarelo o pelourinho, e a seta indica a matriz de Santo Antonio do
Surubim22, uma vez que nela há uma cruz. Explicitamente ele diz que um dos
cemitérios está junto àa Igreja do Rosário e o outro está junto ao cruzeiro da matriz,
e que ambos estão do lado esquerdo, tendo como ponto de referência a matriz. A
impressão que se tem ao visualizar a imagem é a de que o cemitério está por trás da
matriz. Não passa de uma impressão, observando a paisagem hoje. É fato que a
matriz já não é a mesma em seus aspectos estéticos, mas o local é. Vc tem alguma

22
Significando templo-sede da freguesia.
58

indicação bibliográfica que afirma ter havido um cemitério por traz da Igreja matriz.
Eu sempre ouvi essa história. Penso que não seja apenas impressão.
O que se sabe da gênese da cidade é que ela foi iniciada em torno da
igreja matriz de Santo Antônio. A renda econômica nela investida provinha da
criação de gado que atendia também a outros mercados como o da Bahia (feira
Capoeme) e de Pernambuco. Com a concorrência da carne charqueada
riograndenserio-grandense houve o declínio dessa atividade econômica a levando a
dividir espaço com outros tipos de atividades como o extrativismo vegetal, sobretudo
da carnaúba23, e posteriormente o comércio, atividade hoje predominante.
Referenciar autores. Veja a tese da Júnia. Terezinha Quieroz. Odilon Nunes.
De vila ela é elevada à condição de cidade somente em 28/12/1889.
Tendo como referência a época em que ela é elevada a vila já são mais de 250 anos
de existência com diversidade de histórias que podem ser contadas a partir de seus
diferentes aspectos, de diferentes elementos que integram a sua paisagem. Entre
eles optou-se por falar sobre seu patrimônio edificado, particularmente o cemitério
Santo Antônio.
Silva Filho em sua obra Carnaúba, Pedra e Barro (2007) diz que esse
cemitério é uma das edificações mais importantes na implantação de Campo Maior
juntamente com a Igreja Santo Antônio (matriz), a câmara, a cadeia, a Igreja do
Rosário e o mercado. na implantação de Campo Maior na margem direita do Rio
Surubim. Portanto, se partiu-see do pressuposto de que ele se contituié uma fonte a
mais para contar a história da cidade, e que o seu estudo a partir do viés
arqueológico auxilia na preservação desta fonte histórica.

23
Seu nome científico é Copernica Prunicera, popularmente conhecida como árvore da vida, pois
dela tudo se aproveita, oferecendo muitas utilidades ao homem. Seus frutos são ricos em nutrientes
para a ração animal, o tronco é uma madeira de qualidade para construções, as palhas para a
produção artesanal, adubação do solo e extração da cera usada na composição de remédio,
cosmético, produção alimentícia e outrosetc.
59

Figura 4: Planta da vila de Campo Maior

Fonte: Silva Filho, com adaptações de Jessica Gadelha, 2007.

Dentre essas edificações se destaca aA cadeia, a qualpassou por uma


ressignificação de uso, atualmentehoje sediando uma escola pública da rede
municipal. e Oo lugar que abrigara o antigo mercado cedeu espaço para a
construção da sede administrativa da prefeitura. O cemitério, considerandoVisto a
sua importância na constituição da cidade o cemitério é aliqui a referência na busca
de múltiplas histórias que ali repousam acima de sete palmos do chão, e que trazem
à tona aspectos importantes para compreeender como era a sociedade campo
maiorensecampo-maiorense.
Como fonte de pesquisa foram utilizadas a cultura material, os Livros de
Tombo da Freguesia de Campo Maior, os livros de registro de óbito onde são feitos
os assentos das pessoas que faleciam na freguesia, tendo sido encontrado um livro
exclusivo para o registro de óbitos dos filhos da mulher escrava, entre os anos de
1873 a 1883, livros de batismo e os registros de casamento. Todos localizados na
secretaria paroquial do município.
60

Vale ressaltar que não se recorreu a um paleográfico 24 na leitura e


transcrição dos documentos, e que em ocasiões onde não se conseguiu decifrar a
caligrafia do mesmo foi representado da seguinte forma [...]
No que se refere ao livro de óbito dos filhos da mulher escrava constatou-
se alguns aspectos interessantes que merecem ser evidenciadoscabem ser
colocados. O termo de abertura do livro data de 1842, dessa data para o registro do
primeiro registroassento de óbito transcorreram-se 31 anos. E do primeiro assento
para o último se passaram mais 10 anos. Cada termo menciona o proprietário das
mães das crianças. No total o livro possui 50 registrosassentos de óbito, entre os
quais 49 são descritos como filhos naturais e 1 como filho ilegítimo. Um desses 50
menciona ainda que a cor dae pele eraque é parda.
No ano de 1883, o cemitério aparece mencionado como cemitério
provisório da Irmandade de Santo Antônio. Também data desse ano a menção a
causa da morte, em pelo menos quatro4 registrosassentos estão citadas as doenças
que levaram tais crianças àa sepultura. De forma unânime essa doença era
conhecida como “as bexigas”, nome popular como era conhecida a vulgo da varíola.
O livro termina com várias páginas em branco ainda por serem utilizadas,
demonstrando uma interrupção abrupta nos lançamentos. Diante dessas
observações alguns questionamentos surgiram. Por que o cemitério no ano de 1883
é mencionado como provisório? Seria isso já uma evidencia de sua superlotação?
Ou seria algo relacionado àcom sua localização?
Se o cemitério começou a funcionar conforme atesta a cultura material em
1804, em 1883 (época em que é citado como provisório) ele já contava com 79 anos
de atividade. No entanto ele funcionou até 1978 (data do último sepultamento),
portanto de 1883 até 1978 foram 95 anos de uso a mais.
Se em 1883 ele já estivesse lotado como se pressupõe, como teria
funcionado por mais 95 anos? Essa demora pode estar atrelada com alguma
resistência da população? Ou na demora na escolha de um novo endereço para os
mortos?
Infelizmente nem todas as questões e problemáticas que surgiram ao
longo do percurso puderam ser respondidas. Diante das circunstâncias adversas de
tempo e da necessidade de consultar outras fontes, elas permanecem em aberto

24
Pessoa que possui conhecimento dos escritos antigos e a arte de decifrá-los.
61

provocando os pesquisadores interessados à vontade de dar continuidade da


pesquisa.

3.2.1 - MUDANÇA DO ENDEREÇO DOS MORTOS

São várias as expressões utilizadas para se referir ao local onde são


inumados os corpos sem vida. Cemitério, Necrópole (cidade dos mortos), que já
existia mesmo antes do advento do Cristianismo, Campo Santo, e até mesmo
aparecem eufemizados em termos como “última morada”, “cidade dos pés-juntos” e
“hábitat póstumo”. São várias as expressões utilizadas para se referir ao local onde
são inumados os corpos sem vida. A palavra cemitério vem do grego Koimetérion e
do latim Coemiteriu que significa lugar de dormir, lugar de repouso, ou dormitório.
Colocar referências
A origem dos cemitérios extramuros 25 (privados ou públicos) é um tema
que tem sido investigado pela historiografia Que autores?. Apesar de haver ordens
expressas de D. João VI proibindo o enterramento em igrejas desde 1801 em
Portugal e em suas colônias da América portuguesa, no Brasil eles só são
implantados na segunda metade século XIX por ocasião do deslocamento do
território da morte, em geral atribuída ao redirecionamento de medidas urbanísticas,
higienistas e sanitaristas, também conhecida como a medicalização da morte que
começaram a ser implantadas em 1830. Colocar refereências nos parágrafos.
Até a implantação dos cemitériosdeles os enterramentos eram feitos em
igrejas e em terrenos a elas contigua uma prática herdada do colonizador português
já que este além de colonizar o território colonizou também o campo das ideias.
Desde o início da colonização, no século XVI, houve o predomínio do catolicismo
tradicional, ou seja, leigo, social e familiar. Esse tipo de catolicismo foiera marcado
por práticas religiosas como procissões com imagens, promessas a santos e
inclusive com o local ideal para sepultamento que até então era a igreja considerada
a anti-salaantessala terrestre do paraíso celestial.
Rodrigues (1997) comenta que a cultura funerária dos brasileiros no
século XIX era marcada pela morte barroca, caracterizada como a simbiose entre
sagrado e profano, sua base era o esplendor. No cumprimento dos ritos funerários
havaia a preocupação com alguns itens comoEram itens de preocupação “”os

25
Entende-se por cemitério extramuros aqueles que estão fora dos limites de uma povoação.
62

dobres do sino”, “o aparato da procissãoprocessional do viático”, “o vestuário”, os


cuidados com o caixão, a arrumação ou armação?armação da casa e da igreja e o
local da sepultura. Portanto morrer repentinamente era algo trágico, porque tirava a
oportunidade do sujeito se preparar para morrer.
Vivos e mortos ocupavam o mesmo espaço, cemitério e igreja eram um
só, “não havia separação radical, como hoje temos entre a vida e a morte, entre o
sagrado e o profano, entre a cidade dos vivos e a dos mortos” (REIS, 1991, p14).
Muitos abriam mão de ter uma boa vida para ter uma boa morte. Um exemplo são
alguns escravos que conseguiam juntar algum dinheiro, mas que em vez de
comprarem suas alforrias investiam para ter uma boa morte, se associavam a
irmandades, na esperança de terem um funeral minimamente decente e uma
recompensa além túmuloalém-túmulo. A propósito, o surgimento das diversas
associações religiosas, divididas em confrarias, ordens terceiras e irmandades estão
intimamente relacionadas com o tipo de catolicismo mencionado (referência).
Esse tipo de enterramento que aconteceu no Brasil oitocentista não foi
um caso isolado do que acontecia nos países europeus, “mas o seu reflexo marcado
pelo descompasso cronológico e pela condição de colônia da América portuguesa. À
época de sua colonização, em 1530, os colonizadores trouxeram uma mentalidade
religiosa ainda remanescente do período medieval” (MORAIS, 2014, p.23).
Entretanto, é bem provável que a forma de sepultar em igrejas e terrenos
a elas integrados não tenha sequer existido em outras localidades , assim como é
provável que em locais onde houvesse aquela forma de sepultar, quando da
separação entre vivos e mortos a aceitação tenha ocorrido de forma diferente.
Rodrigues (1997) que estudou as tradições e transformações fúnebres no
Rio de Janeiro aponta que nessa parte do território a implantação dos cemitérios
extramuros ocorreu em 1850 e pode ser atribuída ao saber médico, àa imprensa e
ao poder público. “Tais fatores caminharam paralelamente e estiveram interligados”
(RODRIGUES, 1997, p.54)
Ainda Nno contexto do Rio de Janeiro, Lima (1994) coloca que os
cemitérios extramuros foram implantados em 1850 por uma série de fatores. Um
deles é o fato de que o local de sepultar até então conhecido, já superlotado, passou
a ser considerada como foco de epidemia que assolava a população carioca do
século XIX, somado com a necessidade de dar ares modernos à cidade. Todos
esses aspectos motivaram a separação dos vivos dos mortos, cada um deles
63

passando a ocupar territórios específicos, e o cemitério se constituindo no que a


autora chama de espaço disciplinar, com altura do muro definida de modo que não
pudesse ser transposta, horário de entrada e saída, bem como profundidade e
espaçamento entre as sepulturas.
O convívio entre vivos e mortos no oitocentos em Salvador (BA) também
era comum, mas diferentemente do que ocorreu no Rio de Janeiro a separação
entre eles em 1836 ocorreu diante da resistência da população culminando com o
levante popular conhecido como Cemiterada, onde o campo santo fora quase
totalmente depredado. Reis (1991) é o autor que aborda sobre o levante em sua
obra “A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX”.
Jéssica, aqui não precisa fazer parágrafo, uma vez que vc continua
dialogando com o autor.Ele retrata a sociedade baiana do século XIX mostrando
como essa sociedade se relacionava com a morte e o morrer, onde vivos e mortos
dividiam o mesmo espaço, e como essa vivência se constituiu como um entrave na
aceitação da implantação de cemitérios extramuros em decorrência do processo de
higienização e sanitarização das cidades que já vinham ocorrendo desde o século
XVII em alguns lugares da Europa.
Rodrigues (1997) analisa o porquê de no Rio de Janeiro a sociedade, as
irmandades e ordens terceiras atenderem prontamente as recomendações de saúde
pública enquanto Salvador ocorreu o inverso.

Em Salvador, diferentemente da Corte, tais acontecimentos ocorreram num


período em que o discurso médico - normalizador das práticas funerárias
tivera pouco tempo para sua disseminação - em ambas as cidades, a
faculdade de Medicina fora criada em 1832. Deste período até o
estabelecimento dos cemitérios públicos, passaram-se, em Salvador, quatro
anos, e, na corte, 18 anos. Por outro lado, na cidade do Rio de Janeiro, a
presença do poder imperial, numa época de consolidação e centralização
políticas, constituiu-se, também, em motivo relevante para que as
irmandades da Corte dessem cumprimento às determinações
governamentais. Em Salvador, a presença do poder provincial, num
momento de pouca estabilidade, como o período regencial, teria propiciado
a eclosão de uma reação mais violenta por parte das irmandades e da
população em geral, recusando-se a realizar-serealizarem-se os
sepultamentos no cemitério público. A proibição dos sepultamentos nas
igrejas, em 1850, foi, portanto, visto pelas irmandades e ordens terceiras da
Corte como um benefício para a saúde pública. (RODRIGUES, 1997, p...)

Compreende-se a partirDepreende-se do trecho acima que o levante


popular em Salvador é explicado pelo pouco tempo entre o período que o discurso
64

médico é disseminado no tecido social até o período de implantação do cemitério


público.
As formas de resistência contra a proibição dos enterros nas igrejas eram
percebidas não só em levantes populares, mais também nos túmulos que passaram
a ser construídos nos cemitérios extramuros. Eram reproduzidos nesses espaços
miniaturas de igrejas e capelas, no Rio de Janeiro essas reproduções em miniaturas
também eram percebidas, não como forma de resistência e sim como continuidade.
Segundo Borges (2013), em seus anos iniciais os cemitérios extramuros eram
administrados por entidades eclesiásticas que incentivavam o uso de imagens
devocionais, a posteori por questões políticas, como a secularização que ocorreu em
1890, dessa forma era mais cômodos que os mesmos fossem geridos pelas
respectivas prefeituras. Como exemplos de resistência, estão os túmulos-capelas,
anjos, o portão principal do cemitério, alegorias e entre outras que enchem esses
espaços de simbologias.

Os cemitérios passam então a se localizar distantes dos centros urbanos,


locais que deveriam ser arejados, murados, com determinação de numeração,
profundidade da sepultura e do tamanho da mesma. Em consequência do
crescimento das cidades eles acabaram ficando no perímetro urbano, passaram a
ser um espaço dentro da cidade. Em algumas cidades brasileiras eles foram
removidos para outros locais para atender o processo de reurbanização, é o caso do
cemitério público de Florianópolis que teve a remoção iniciada em 1923, da
cabeceira da Ponte Hercílio Luz para o lugar denominado de Três Pontes, hoje
bairro do Itacorubi, como se pode perceber no seguinte relato:.

No início do século XIX, Florianópolis passava por diversas reformas


urbanas, entre elas, novas redes de água encanada e de esgotos, novas
casas, prédios e avenidas, nova iluminação elétrica, enfim lugares e
espaços pensados para as necessidades de uma nova cidade. [...] O
cemitério público da capital catarinense, instalado em 1841, no alto do
morro na entrada da cidade e, portanto, a vista de todos os moradores e
visitantes, foi um dos alvos das transformações urbanísticas. Para além de
sua localização, o cemitério estava no caminho da ponte Hercílio Luz, obra
considerada de grande importância para o desenvolvimento de
Florianópolis, e deveria ser retirado para a construção da cabeceira da
ponte e das ruas que dariam acesso à mesma. (CASTRO, 2008, p. 10; e 13)

Em outras cidades, mesmo com seu crescimento e remodelagem, alguns


cemitérios permaneceram nos locais em que inicialmente foram implantados. É o
65

que Correa (1989) considera como processo de inércia cuja área correspondente é
a área cristalizada, ou seja, áreas que mantém a “permanência de certos usos em
certos locais, apesar de terem cessado as causas que no passado justificaram a
localização deles” (CORREA, 1989, p.76). O processo de inércia preserva
simultaneamente a forma e o conteúdo, principalmente devido aos quatro fatores
fundamentais que o autor cita, mas dá ênfase somente ao último, destacando:

(a) Uma relocalização poderia implicar custos elevados, os


ganhos adicionais de nova localização não justificando os
riscos de novos investimentos; (b) A criação de novos fatores
de permanência através do aparecimento de economias de
aglomeração, pela criação de unidades de produção e serviços
situadas à montante ou à junsantejusante da unidade em
questão, garantindo vantagens outras que não aquelas
existentes quando da implantação original;(c) Pela inexistência
de conflitos com outros possíveis usuários do solo urbano em
torno, ou pretendentes àquela porção do espaço, ou pelo fato
de que outros usuários não detêm poder para forçar a remoção
daquela unidade; (d) Pela força de sentimentos e simbolismos
que atribui às formas espaciais e ao seu conteúdo (CORREA,
1989, p.76).

Ele justifica sua ênfase ao fato de remeter mais à esfera do bairro, do


cotidiano e ao espaço residencial, onde há reprodução dos grupos sociais. Ainda
chama a atenção ao se definir uma área cristalizada, o que para uns se configuram
como inércia para outros pode ser apenas uma mudança lenta, por isso Correa
(1989) afirma que este processo é o mais relativista que os demais processos
abordados (Centralização, Descentralização, Coesão e Segregação). E problematiza
a “força de sentimentos” que matem a preservação do uso da terra, são sentimentos
compartilhados por todos ou sentimentos imposto pela classe dominante, difundidos
e aceitos como de todos? Essa é uma pergunta interessante e que será
retomada mais a frente desta pesquisa.
Em outras localidades, onde os sepultamentos em igrejas e cemitérios
integrados inexistiram, os cemitérios podem ter sido a regra geral para sepultar
desde sempre, comoé o que coloca Sousa (2011) para os sepultamentos realizados
no interior do Piauí. A autora que estudou como a população de Cocal (PI?) e seus
arredores lidam com a mortemorte; , como tratam seus mortos e o lugar que esses
ocupam, constatou que nessa parte do território brasileiro os sepultamentos nas
igrejas parece não ter sido uma prática comum, o rito da morte se encerra no
cemitério, que ela diz ter origem desconhecida, seré um mistério.
66

Há, no entanto controvérsia ao pensamento de Sousa (2011). Para Silva


Filho (2007) os cemitérios antecedem ao surgimento das cidades, sendo comuns os
sepultamentos nas estradas, nos cemitérios particulares e próximos à residência do
morto. “Antes das primeiras taperas fixadas pelos sertanistas e curraleiros nos
campos e tabuleiros do Piauí, possivelmente uma ou outra sepultura tenha
antecedido às prefixações dos vaqueiros” (SILVA FILHO, 2007, p. 223).
O estudo de Matos (2009) embora tenha tido como enfoque o estudo da
estrutura da sepultura também aborda as práticas mortuárias na cidade de São
Raimundo Nonato. A autoraNele ela reforça a afirmação de Silva Filho ( 2007), ao
comentar que no sertão do Nordeste do Brasil as práticas mortuárias tenham
características próprias. Matos (2009) citando um relato de Paiva e Neiva do ano de
1916 ressalta essas características dizendo:
.
Quando o numero de habitante é grande, controe-se então o cemitério;
trata-se dum cercado de grossas estacas e que não possue porta; para se
entrar, deslocam-se alguns páos; no centro, ergue-se dominando o recinto,
grande cruzeiro de madeira. Cemiterios murados só nas grandes
povoações; em algumas localidades piauhienses e goianas, os
enterramentos das melhores famílias locais são ainda realizadas no interior
das igrejas, como podemos verificar em Jiti, Parnaguá e Descoberto.
(PENNA & NEIVA apud MATOS, 2009, p.11-12)

Percebe-se no relato que os sepultamentos em igrejas foiforam uma


prática restrita às elites locais. Quanto às pessoas que não pertenciam a um
segmento de prestígio ficava como alternativa para sepultar seus mortos, além das
já citadas, o quintal ou pátio da casa ou ainda à margem dos caminhos de muitas
estradas.
Vasculhando o arquivo paroquial de Campo Maior foi encontrado um
documento que dá suporte àa ideia de Silva Filho (2007) e Matos (2009), ele intitula-
se de Sepultamentos nas estradas, dado a riqueza do mesmo optou-se por
transcrevê-lo na integra. Infelizmente o documento 26 não está datado, mas acredita-
se que seja da mesma década da data do termo de abertura do Livro de Tombo no
qual o registro se encontra. No referido documento o bispo expressa o seu
sentimento em relação aos sepultamentos da seguinte forma:

26
Este documento não possui data, portanto se usa como referencia a data de abertura do Livro de Tombo
deque é 1883.
67

Assim sendo, a primeira vista de tristeza que vibrou em nosso coração de


bispo, foi exibido à beira das estradas, semeados a esmo, por aqui, ali e
acolá, sem nenhuma reverência, sepulturas de christãos, cujos cadáveres
parecem ter sido inhumados, não por qualquer sentimento de piedade, tal é
o abandono a que foram atirados, mas unicamente, para serem evitados os
perigos da putrefação e nada mais.
A igreja, necessária irmãos a todos [...] em todos os tempos guardou para
os mortos um respeito profundíssimo, se recomendando [...] adefctos que
eles devem piedosas sepultura.
Bem sabemos que os nossos cooperadores, tem, como nós, os seus
corações dilacerados de dor por esse [...] para com os cadáveres daquelle
que, tendo sido nossos irmãos pela fé e segurados espiritualmente pelo
Santo Sacramento da igreja, jazem hoje abandonados ali pelos caminhos,
sem amparo algum contra as [...]. Mas, amanhã, quando o anjo do senhor
soar a trombeta chamando a vida os mortos, para comparecerem ao juízo
final (João Cor. XV, 52) que dirão aos Paes os filhinhos, os Paes aos filhos,
os maridos ás mulheres, os amigos aos amigos, por havel-os assim
abandonados, após a morte, quando na vida nos cercaram pelos mais puros
affectos para a felicidade dos outros?!
E o que é mais ainda, fomos informados de que esses pobres defunctos,
não so tem os seus corpos abandonados, mas também inteiramente
abandonados as suas almas, que não recebem o [...] nem a encomendação
feita pelo vigário, nem [..] sem obra alguma de piedade por parte dos
parentes, como se fossem seres irracionais!
[...] desgraça, [...] por ser a nossa amada diocese do Piauhy [...], pode-se
diser, exclusivamente de catholicos!
[...] queridos sacerdotes, para o vosso reconhecido que seja semelhante
[...],semelhante sacrilégio quanto possível e rogai, frequentemente [...] fieis
sobre esse assumpto, mostrando-lhes a sua ingratidão para com aqueles
que se não podem mais defender de tão grande ultraje, aconselhar-lhes que
suffraguem caudaramente as almas dos seus mortos, e entendei-vos com
as autoridades locaes para que se multipliquem os campos santos, os
cemitérios devidamente murados, de modo que os mortos fiquem
salvaguardados de qualquer profanação sacrileja. (LIVRO DE TOMBO DA
FREGUESIA DE CAMPO MAIOR N°1, 1883, p. 21-22).

Neste relato o bisbo manifesta seu profundo pesar ao perceber que os


cristãos não estão tratando os mortos de acordo com as recomendações humanas e
cristãs e ele faz um apelo emocionado a partir da relação entre pais e filhos onde o
cuidado com sepultura torna-se uma manifestação de amor e memória aos
antepassados ausêntes. Seu conteúdo é de manifestação contra os sepultamentos
nas estradas e ao mesmo tempo de revolta, dado que estão totalmente fora dos
preceitos cristãos recomendados pela igreja católica. Aos olhos do bispo essa forma
de sepultar é repugnante, é desumano, é desrespeitoso tratar os entes queridos
como seres irracionais. E que aqueles que ali estão sepultados “sofrem” de um
duplo abandono, primeiro pelo tipo de sepultamento e segundo o abandono de suas
almas pelos seus amigos e familiares.
O bispo ainda apela para que os sacerdotes procurem sensibilizar os
parentes dos defuntos levando estes a reverem o abandono a que submeteram o
68

corpo e a alma dos seus entes queridos falecidos, lembrandoapontando que no dia
do juízo final a ausência dos vivos para com seus mortos poderá ser cobrada.
Chama a atenção ainda a recomendação para a criação de mais cemitérios
devidamente murados. O muro, segundo o bispo, com finalidade bem especifica e
definida, salvaguardar os mortos de qualquer profanação sacrílega.
Talvez atendendo a essas recomendações tenha sido feita a petição dos
paroquianos de Campo Maior do Piauí para a criação de um cemitério na localidade
denominada Bom Jesus, atendendo o cemitério pelo mesmo nome do lugar, sendo
autorizado pelos superiores com a caondiçãodesde de que os moradores
mativessem-no em boas condições mantendose achasse em condições, como por
exemplo, ser limpa e asseada sua capela e estar à mesma provida dos paramentos
sagrados e outros objetos necessários e decentes. Além do mais o pároco deveria
responsabilizar-se pelos termos de óbito dos que ali adquirissem sepultura. Um
detalhe importante é que, nem todos os cemitério eram bentos como expressa a
autorização:

Havemos por bem, pelo presente, confirmando aquelle nosso despacho,


auctorisar o mesmo parocho para benzer o dicto cemitério na forma do
Ritual Romano (menos a área destinada para aquelles a quem a Igreja não
permite sepultura em sagrado) á fim de que tenham logar a encomendação
dos corpos, contanto que a inhumação dos cadáveres se faça gratuitamente
na forma da constituição diocesana e sejão remetidos trimensalmente ao
parocho os assentos de óbito em cadernos para serem registrados no livro
da parochia, sem prejuízo dos direitos parochiaes (LIVRO DE TOMBO DA
FREGUESIA DE CAMPO MAIOR N°1,1, 1883,p. 4).

A área que não deveria ser benta corresponde àquela destinada para
pessoas que a igreja não permitia sepultura em sagrado, mas não especifica que
pessoas são essas. Possivelmente, os não católicos, excomungados, supliciados,
suicidas, e dentre outros. A capela parece ter a função de nela se realizar a
encomendação dos corpos, e o enterro deveria ser realizado de forma gratuita. .
Em síntese, em locais como Rio Janeiro e Salvador foram práticas
higienistas e sanitaristas responsáveis pelo deslocamento do território dos mortos,
dando origem aos cemitérios extramuros (privados ou públicos) e com a expansão
urbana elas voltam a fazer parte do seio dos vivos. Em algumas cidades brasileiras,
como ocorreu em Florianópolis, após a reurbanização os cemitérios são removidos
para outros locais.
69

Nas cidades piauienses a regra parece ter sido desde cedo o cemitério.
Em Campo Maior, conforme aponta a data gravada na lápide de um túmulo já em
1804 o cemitério Santo Antônio estava incrustado na paisagem da cidade o que lhe
confere uma singularidade de implantação quando comparada com outras
localidades do país.
Antes de abordar a cultura material do cemitério se buscou um pouco de
sua história. As notícias que se tem sobre ele são escassas e chegam quase que
exclusivamente através dos termos de visita pastoral registradospastoral registrado
nos Livros de Tombo, e dos livros de registro de óbito. Numa tentativa de investigar
sobre Ainda em busca de sua história foi feito um levantamento da produção
acadêmica local, cujo cemitério aqui pesquisado também tenha sido abordado.

32.2- A IRMANDADE DE SANTO ANTÔNIO

AÀ partirluz da obra “Ciladas do inimigo: as tensões entre clericais e


anticlericais no Piauí nas duas primeiras décadas do século XX”, publicada em 2001,
de autoria de Áurea da Paz Pinheiro é possível entender o contexto e em que
ocorriam consistiam as visitas pastorais. A área de interesse da autora é o aspecto
das relações igrejas e sociedade cujo objeto de estudo é compreender as tensões
entre clericais e anticlericais no Piauí nas duas primeiras décadas do século XX.
Essa tensão no Piauí resulta de um processo mais geral que foi o de
secularização da sociedade moderna. A secularização assinala o momento em que
são dfinidos os papéis específicos da igreja e do Estado de tal forma que aigreja
Católica para a não deter mais o poder absoluto sobre a ordem temporal e
atemporal, controlando a vida dos ser humana nos aspectos religiossosperde sua
supremacia doutrinários,a políticoa e social, exercida desde a Idade Média. Dessa
maneira a instituição e alguns membros em particular, e passam a ser criticados
ferozmente, especialmente por possuírem atacada enquanto instituição e também
seus comportamentos considerados inadequados e pouco moralizantes. Procurando
manter sua unidade e o não perder poder sobre seus fiéis ela busca se atualizar
através da restauração de sua autoridade pastoral e doutrinária.
É importantepreciso considerarter em vista que no Brasil, aono final do
século XIX, com a Pproclamação da Rrepública e oficialização do novo regime
ocorreram algumas transformações na estrutura oficial católica, entre os quais o
70

aumento do número de bispados para alargar a influência do catolicismo


combatendo os seus inimigos e suas ideias ao tempo em que os pastores estariam
mais próximos do povo e consequentemente havia um aumento no seu rebanho. É
nesse contexto, da Reforma Católica do século XIX, que é criado o Bispado do Piauí
no inicio do século XX para atender as ideias ultramontanas 27 da Igreja Católica,
mais romanizada e hierarquizada. Até então o Piauí não tinha autonomia
eclesiástica, era subordinado ao Maranhão. Inclusive a distância entre Teresina e a
sede episcopal maranhense foi usada como justificativa para a criação do Bispado
piauiense28.
A proposta desse bispado era a moralização do clero e da igreja, era
ainda um meio para a afirmação do catolicismo no Estado. Para alcançá-la era
necessária a união do Episcopado contando com o compromisso individual de cada
bispo. Dessa forma,
A igreja passou a orientar os bispos em direção a um controle mais efetivo
da vida dos fieis e sacerdotes através de diferentes dispositivos: freqüência
aos Seminários; confissões e comunhões; comunhão pascal e assistência à
miissa; freqüência ao catecismo; devoções e novenas; obras das
associações beneficentes. Os bispos eram orientados a promover visitas
pastorais freqüentes a toda sua diocese, a fim de fiscalizar e orientar as
ações dos párocos e dos fiéis. (PINHEIRO, 2001, p.40)

As visitas pastorais, presididas por bispos e auxiliares, eram parte das


atividades do Bispado, era uma forma deles estarem mais próximos de seus
subordinados imediatos, fiscalizando-os, orientando-os, verificando a presença ou
ausência de abusos dos párocos como, por exemplo, a cobrança de grandes somas
de dinheiro aos fieis para realização de batizados e casamentos, posto que nem
todos eles tivessem essas quantias para pagarem e então passavam a viver em
mancebia. Percebe-se que com a mudança na estrutura oficial católica os bispos
saem da subordinação do governo civil, da figura do administrador e político, e
passam a ser subordinados somente àa Santa Sé, assumindo a figura de pastor
apóstolo e santo.
Pinheiro (2001) comenta ainda que antes da criação do Bispado do Piauí,
em 1906, o Estado contava com a pequena presença do clero católico, predominava
o catolicismo devocional (marcado por rezas, novenas, promessas aos santos,

27
Ideias ultramontadas merece uma explicação....
28
A determinação para a criação desse bispado data de 20 de fevereiro de 1901, mas provavelmente
por desinteresse do Bispado do Maranhão somente em 1903 através da bula Supremum Catolicam
Eclesiam é que se tomou conhecimento da vitória da autonomia do Bispado do Piauí
71

procissões com imagens e outrasetc.), e que as visitas ocorriam de forma


esporádica para administrar sacramentos como batizados e casamentos. Também
inexistia a orientação de práticas religiosas cotidianas.
Com a criação do Bispado houve a intensificação das visitas, onde o
bispo e seus auxiliares procuravam usar de uma linguagem simples tendo em vista
que o povo pouco conhecia as normas oficiais da religião católica, ou seja, do
catolicismo renovado.
As visitas pastorais feitas à cidade de Campo Maior foram registradas
nos livros de tombo da igreja. Neles constam que as visitas eram presididas pelos
bispos auxiliados por padres, um ou mais, e cujo objetivo consistia na instrução
conveniente sobre os fieis e utilidades dela, entre as quais “expedientes e
audiências as geantes, administrando o sacramento da confirmação, e pregando a
noite aos fieis a palavra divina, ensinando-lhes tudo o que é necessário um christão
fazer para salvar-se, combatendo os vícios e pecados mais comuns na parochia”
(LIVRO DE TOMBO N° 1, 1883). Sua missão é civilizar os costumes conforme os
preceitos do Pontificadol Romano.
A recepção dos visitadores era feita à porta da Igreja Matriz com
cerimônias de costumes pelo pároco encarregado da freguesia e preces prescritas
pelo Pontifical Romano. A matriz era por excelência o local mais importante da vila,
nela tomavam-se as mais importantes decisões e nela elas se consolidavam por
meio de ato solene. Quantos sacramentos ali se consumaram? Quantas trezenas do
padroeiro Santo Antônio nela se celebraram? Quantos enterros nela se realizaram?
A igreja cuja importância se torna indiscutível neste contexto que vai
desde a criação da freguesia, passando a vila e cidade. Enquanto povoação Campo
Maior , atualmente comestendeu para além e aquém de quando a cidade ainda nem
era cidade, mas simplesmente vila, hoje tem trezentos anos de existência, e o
cemitério Santo Antônio com mais de dois séculos incrustado na “Princesa das
Campinas”, assim como a igreja acompanhou bem de perto a vivência da sociedade
campo maiorense de outrora. O cemitério por ter sido preservado parte do seu
acervo original pode ser consideradoChega até ser mais rico, enquanto fonte de
informação, uma vez que não foi completamente demolido como foi à igreja matriz o
foi em 194329.

29
Nota explicativa sobre os motivos que levaram a demolição da igreja.
72

Da instalação de Campo Maior como vila em 1762 até 1873, data dos
primeiros registros de óbitos encontrados, há uma perda de informação de 111 anos.
Já nas primeiras páginas do Livro de Tombo é mencionado o atraso de registros e
até mesmo a ausência de livros da Paróquia, como no relato seguinte:.

Do exame a que procedemos nos livros dos registros parochianos achamos


estar Ella feita com limpeza e regularidade, mas notamos que há sempre
nella atraso de muitos annos, como se verifica pelas datas dos termos de
abertura e encerramento de cada um dos livros, comparadas com as datas
dos primeiros registros nelles escripturados, havendo livros que denotam
ser esse atraso de trez, sete, oito e onze annos, e não encontramos o
necessário livro de Tombo da Parochia. Todos os R. dos Parochos que não
tem sua escripturação em dia apresentam sempre a fútil rasão da
dificuldade de que encontram para obterem os livros em tempo, sem
lembrar-se que o meio para remover essa dificuldade é facílimo, mandando
preparar novos livros antes de estarem cheios os que se acham em
trabalho, e de mais essa razão não prevalece de modo algum para justificar
o atraso de onze annos na escripturação. Como proverão os Reverendos
Parochos fornecerem a seus parochianos certidão em forma geral de
baptismo, óbitos e casamentos quando necessitar de taes documentos para
os negócios de particulares (LIVRO DE TOMBO N°1, 1883, p. 3).

Segundo Marcos Paixão essa ausência de documentos é atribuída a um


incêndio ocorrido no acervo paroquial, este incêndio levou consigo parte da história
da cidade. Mas mesmo com atrasos e ausências se procura entender sobre o
cemitério Santo Antônio. Para chegar às ponderações que se seguem foi necessário
costurar os fragmentos e pistas nas fontes dispersas e reduzidas. A princípio, o
cemitério era de propriedade privada (particular) pertencente à Irmandade de Santo
Antônio e posteriormente passa a ser público, portanto de propriedade da
municipalidade.
Tanto as irmandades como as ordens terceiras são divisões de confrarias,
que eram formadas por religiosos e leigos, mas as ordens terceiras se associavam a
ordens religiosas conventuais (franciscana, dominicana, carmelita) dando-lhe maior
prestigio. Ambas realizavam caridade para associados e não associados, desde que
estes últimos fossem carentes. De acaordo comSegundo Reis (1991) elas existiam
em Portugal desde o século XVII, e disseminaram-se por outros países chegando ao
Brasil a partir do século XVI com os primeiros colonizadores.
As irmandades comuns foram bem mais numerosas e cada templo podia
acomodar diversas irmandades em altares laterais, Reis (1991, p.51) a define como
“associações corporativas, no interior das quais se teciam solidariedade fundadas na
hierarquia social”. Para que pudesse funcionar era preciso umade igreja que a
73

acolhesse ou então construíremter sua própria igreja, e ainda ter aprovado seu
estatuto ou compromissos pelas autoridades eclesiásticas. Cabia àa Mesa de
Consciência e Ordens, situada em Portugal, deferir ou indeferir seus compromissos.
Com a transferência da corte para sua colônia na América Portuguesa a referida
mesa também foi transferida.
Nascimento (2006, p.28) afirma que “uma irmandade ou uma confraria
religiosa pode, grosso modo, ser compreendida como uma união de oração e uma
sociedade de socorro”. Ela se sustenta na tríade piedade e vida litúrgica, caridade e
sociabilidade. Cada irmandade possuía seus estatutos, seus funcionários,
assembleias e orçamento próprio.
Tais compromissos que dependiam da aprovação da Mesa de
Consciência e Ordens consistiam em regularizar a administração da Irmandade,
presidida por uma mesa (juízes, presidentes, provedores ou priores) e composta por
escrivães, tesoureiros, procuradores, consultores e mordomos que realizavam
diversas tarefas, estabelecer a condição social ou racial exigida dos sócios, e seus
deveres e direitos. Entre os direitos, em especial, estava o enterro decente para si e
para a família, com acompanhamento de irmãos e irmãs de confraria, e sepultura na
capela da irmandade.
Melo (s/d) atribui a regularização das irmandades de Campo Maior ao Pe.
Manuel Covette ainda no século XVIII, e segundo o autor além da Irmandade de
Santo Antônio havia ainda a do Santíssimo Sacramento, a das Almas e
posteriormente a do Rosário. Ele ressalta,

Em São Luis, junto à Cúria Diocesana fez o termo de sujeição da Irmandade


do Santíssimo Sacramento e conseguiu a aprovação e confirmação do
compromisso da Irmandade de Santo Antônio. Assim, graças a seu zelo,
Campo Maior tinha regulares suas irmandades (Almas, Santíssimo
Sacramento e Santo Antônio). A Irmandade do Rosário só foi instalada
tempos depois, é o que parece (MELO s/d, p. 52).

Na documentação consultada referente à Campo Maior só se encontrou


menção a Irmandade de Santo Antônio, e ao que tudo indica ela esteve atrelada ao
poder da igreja, representado pela figura dos diferentes vigários que estiveram no
comando da matriz. Uma entre várias outras medidas tomadas pelo primeiro bispo
do Piauí, D. Joaquim Antônio de Almeida (1906-1911) foi a reformulação das
irmandades criando novos estatutos. Não se sabe se a Irmandade de Santo Antônio
foi uma delas.
74

Santo Antônio é o padroeiro dos adivinhadores, de acordo com a


screnças populares ele ajuda a encontrar coisas perdidas e até nunca
possuídastidas, como um esposo. Dessa crença surge daí sua associação com um
santo casamenteiro. Foi este o santo especifico escolhido para devoção, que em
troca da proteção aos devotos recebe exuberante festa, celebrada entre os dias 31
de maio a 13 de junho e que se conserva até hoje no município, atraindo fieis e
movimentando a economia local.
Nela (Na Irmandade de Santo Antonio?) não foi encontrada a data de sua
criação, nem daqueles que presidiam a mesa, apenas aparece de forma esporádica
o nome do fabriqueiro em 1930, Coronel Antônio Maria Eulálio Filho, bastante
elogiado pelo cuidado e zelo no asseio, conservação e administração das coisas
eclesiásticas e patrimoniais, o do procurador do patrimônio de Santo Antônio em
1942, o senhor Octacílio Eulálio, aquele a quem atribuímos a autoria da expressão
que abre esse capitulo, e na mesma época era sacristão o Sr. Antônio Maria.
Algumas associações piedosas existentes da paróquia, integrantes e
atribuições foram identificadas ainda que de maneira fortuita. Consta que em 1947,
elas “são numerosas e bem organizadas, merecendo especial atenção os da
Doutrina Cristã e da Obra das Vocações Sacerdotais” (LIVRO DE TOMBO
N°2,1942, p. 27).
Em uma sessão presidida pelos visitadores em 1906 eis que é
mencionada algumas das associações, dentre elas o Apostolado da Oração
caracterizado como o centro que deve reger os centros do Apostolado. Era seus
integrantes zeladoras, cujas atividades a elas competente estava a de visitarem
todas as tardes ao S.S. Sacramento, “uma devoção mui piedosa e uma pratica de
grande amor a Jesus sacramentado” (LIVRO DE TOMBO N°1,1883), o ensino,
administração e instrução de aulas de catecismo para meninas e meninos. De inicio
ela (Quem?) era pertencente à matriz e posteriormente transferida para a capela de
Nossa Senhora do Rosário, logo responsável por ela (Quem?). Já em 1939 a Igreja
do Rosário estava a ela confiada.
Em 1906 data também a criação da Conferência de S. Vicente de Paulo
da qual ficaram fazendo parte cidadãos respeitáveis desta localidade, voltava-se
para obra de caridade e piedade e que tempos depois suspendeu suas sessões
levando os visitadores de 1916 a clamarem por sua reinstalação da seguinte forma:
75

Avaliando as extraordinárias benções que esta Instituição Santa traz para as


parochias, depois de havemos falado para sua reinstalação, com o Revmo
[...] vigário da parochia e os mais rentáveis homens do lugar, repetimos aqui
nosso apello e as nossas instancias para que elles, visíveis[...] sem demora
satisfaçam este nosso ardente desejo que tende ao maior brilho da fé.(
LIVRO DE TOMBO N°1, 1883)

O pedido parece ter sido atendido, uma vez que na visita de 1921, os
visitadores apontam ter sido sucessivamente visitados pelo Apostolado da Oração,
pelos Vicentinos, pelas filhas de Maria, pelo comercio, pela mocidade, pelas
senhoras da cidade, pelas cearenses aqui domiciliadas e pelas crianças. Ainda em
1916 é citado o Apostolado da Oração do Sagrado. Coração de Jesus.
De 1934 tem-se noticias da Obra das vocações, encontradas em:

“lastimável desanimo com apenas quatro zeladoras e dezesetedezessete


sócios contribuintes. Fizemos ver sua importância e sua necessidade e
nomeamos imediatamente mais dez zeladoras, seis dos quais zeladoras do
Apostolado da Oração, que espontaneamente se ofereceram. Dois dos
sócios logo se fizeram protetores” ( LIVRO DE TOMBO N1, 1883).

O desânimo foi o mesmo motivo que levou a Conferência de S. Vicente


de Paulo a suspender suas sessões. Nesse aspecto as visitas pastorais
funcionavam como “injeções de ânimo” incentivando a continuar nas atividades de
misericórdia.
Em 1943 as associações aparecem divididas em femininas e masculinas
embora com os mesmos propósitos, dedicarem-se aos fieis a que se propõem. As
femininas foram especificadas, eram o Apostolado da Oração, Obra das Vocações,
Propagação da fé, Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, Doutrina Cristã e Cruzados.
Nas entrelinhas percebe-se que a de S. Vicente de Paulo era masculina e requeria
um status socioeconômico para dela ser participante (os homens mais rentáveis do
lugar). Não se sabe dizer se essas divisões de sexos sempre prevaleceram, e se
acredita que essa irmandade não discriminava brancos, pardos e negros, porém
tendo por base a de S. Vicente de Paulo ela discriminava classes sociais, pobres e
ricos.
Parte das rendas do patrimônio de Santo Antônio era empregada na
compra de paramentos como ornamentos, alfaias, objetos de culto divino para a
igreja matriz e capelas. Uma das causas que levavam um indivíduo a aderir a uma
irmandade religiosa era a preocupação constante com a iminência da morte, daí
76

entre os bens de seu patrimônio está o cemitério (da Irmandade) de Santo Antônio,
nele eram realizados os sepultamentos dos seus mortos.
Ainda nos termos das visitas pastorais na paróquia de Santo Antônio,
uma datada de 10 de fevereiro de 1883 e o outro do dia 07 de julho de 1906,
apresentam indícios de que o cemitério da Irmandade Santo Antônio, como o próprio
nome denota, esteve em seu primeiro momento sob a propriedade e administração
da igreja, era extramuro e religioso, e depois passou a ser de propriedade da
prefeitura municipal, não se tornando necessariamente responsabilidade da
administração pública. Somente muito tempo depois ele passou a ser de fato lugar
de umana prática secular.
Com a mudança de proprietário podem ter sido feitas alterações no que
se refere ao nome do campo santo. Cemitério da Irmandade de Santo Antônio é
como a Igreja o denominava, hoje a população local o conhece como cemitério
velho, visto que o mesmo foi fechado para sepultamentos e outros foram surgindo
na cidade. Chaves (2013, p. 13) afirma que “há um outro nome para o cemitério, São
Vicente de Paulo, sustentado talvez por alguma lei municipal”, o que não deixa de
poder ter sido uma indicação da igreja ao novo proprietário(gestor municipal) ou uma
atitude independente da municipalidade baseada em associação existente na
paróquia, no caso a associação São Vicente de Paulo, criada em 1906, suspensas
suas atividades por algum período(não determinado) e retomadas em 1921 ou
anteriormente.
A igreja matriz ao longo de sua existência com certeza assistiu inúmeros
sacramentos (casamentos, batismos) e trezenas ao santo padroeiro, quanto aos
sepultamentos tanto na matriz como em outras igrejas e capelas da cidade não se
sabe se foi prática comum ou se foi uma prática restrita a determinado segmento da
sociedade, aos párocos ou qualquer outra função religiosa, como também aos que
tiveram iniciativa particular em erguer as capelas a exemplo do filho de Bernardo de
Carvalho Aguiar, o coronel Miguel de Carvalho Aguiar construtor da Capela de
Nossa Senhora da Conceição de Barras onde foi enterrado conforme disposição
testamentária.
Embora não se saiba se os sepultamentos nas igrejas e capelas da
cidade tivessem sido ou não uma prática comum, documentos mencionam o
77

traslado de crânios30, em pequenos números, encontrados nas ruínas da igreja


Nossa Senhora do Rosário como no seguinte relato.

Em seguida nos dirigimos ao cemitério da parochia que é de propriedade e


administração da irmandade de Santo Antônio, orgão da matriz, visitamos a
capella e altar nele existentes, e achamos tudo sem decencia, limpêsa e
ordem necesarias, e em quanto ali nos achamos fizemos trasladas dois
craneos e alguns ossos humanos que encontrámos nas ruínas da Igreja do
Rozario, e com outros inconvinientemente espalhados pela área do
cemitério mandamos tudo enterrar. É lastimável que no meio de uma
população catholica haja tão pouco cuidado e tanta falta de respeito para
com os restos mortaes de nossos irmãos fallecidos, e o lugar onde devem
eles repousar, cabendo aqui uma grande censura áqueles aquém incumbe
a administração e fiscalização do serviço do dicto cemitério, esquecido de
[...] nelle toma para seus mortos, tem direito a exigir que o cemitério seja
decente e o serviço de enterramentos regularmente feito...(LIVRO DE
TOMBO DA FREGUESIA DE CAMPO MAIOR N° 1883, 10 de fevereiro).

O relatoA citação traz dados de extrema relevância. Deixa de forma


explicita que o cemitério é de propriedade e administração da Irmandade de Santo
Antônio, e que os serviços prestados deixam muito a desejar, uma vez que os
corpos são enterrados “à flor da terra”, ou seja, os corpos eram inumados e que em
suas edificações (capela e altar) considerandocomo o local como um todo que era
destinado aos sepultamentos, também não eramsão os dos melhores. Não tem
decência, limpeza e ordem necessária. Em outro trecho do mesmo documento é
relatado que em geral, o que estava sob a administração das Irmandades
encontrava-se sob péssimas condições.

Sobre o estado desta Igreja, os reparos e melhoramentos de que ella


neccessita, nos limitamos a fazer ao Reverendo Parocho as observações
convenientes, sem entretanto podermos nada prover e determinar
definitivamente por estar a Igreja e o fornecimento do que nella é necessário
para o exercício do culto à cargo da Irmandade de Santo Antônio, orgão da
matriz, e, como é sabido de todos, nesta Diocese todas as Igrejas que estão
entregues aos cuidados das intituladas Irmandades por via de regra, sam as
que se acham sempre em piores condições (LIVRO DE TOMBO N°
1,1883,p.3).

Não era, portanto, exclusividade da Irmandande de Santo Antônio, as


características de precariedade. E que aqueles que buscam aos serviços do dito
cemitério tinham direito a reclamar e exigir melhores condições, para que ele fosse
decente e os sepultamentos regularmente feitos. Como se percebe, o cemitério é o
local do repouso em que os católicos e os responsáveis pela sua administração

30
O documento não menciona a quem pertencia tais crânios.
78

direta deveriam assegurar as condições necessárias para o descanso de seus


mortos.
Além do descontentamento com o serviço e fiscalização do cemitério, tem
a noticia do traslado de crânios e ossos humanos das ruínas da Igreja do Rosário.
Resta saber se é do seu interior ou do cemitério junto à ela que Melo (1983)
descreve. Passagens do termo da visita de 1883 ajudaPassagens do termo da visita
de 1883 ajudam a esclarecer sobre a localização de duas das edificações descritas
pelo padre e escritor campo-maiorense Melo (1983) e reforçar que um dos
cemitérios é aquele aqui estudado. No termo consta que um grande cruzeiro fora
ereto em frente a igreja (Qual?) e que a antiga Igreja de Nossa Senhora do Rosário,
que estava em ruína, se encontrava ao uma lado da vila. Trata-se aqui de um novo
cruzeiro, pois o velho é aquele que hoje está no cemitério. E o lado da vila em que
estáa a Igreja de N. S. do Rosario é o esquerdo, tal como hoje.
Outro sepultamento é relatado, desta vez na igreja matriz, o que ainda
não permite afirmar que os sepultamentos nas igrejas eram frequentes.

Aos vinte nove dias do mez de dezembro do anno de mil novecentos e três
a sete horas da noite falleceu nesta cidade de Campo Maior, freguesia de
Santo Antonio o revereno vigário collado desta mesma freguesia. P e Manoel
Félix Cavalcante de Barros, sendo sepultado no dia seguinte as doze horas
do dia, na capella mor da Igreja matriz desta cidade, em assistência de
sacerdote, o seu corpo foi acompanhado e assistido ate descer a tumba por
grande multidão de pessoas de ambos os cexos. Contava oitenta e cinco
annos de idade, sendo já cesentaannos de parocho desta freguesia. Para
constar fiz este assento, que asseguro.
Campomaior, 30 de janeiro de 1904. Pe José Paulino de Miranda,
Encarregado da Freguesia (LIVRO DE TOMBO DA FREGUESIA DE
CAMPO MAIOR N° 1883, 10 de fevereiro).

Noa relatocitação é revelado o horário e o local do sepultamento e o


nome do corpo que esta sendo sepultado. Trata-se do Padre Manoel Felix
Cavalcante de Barros o que talvez justificasse o seu sepultamento neste espaço,
não era somente pelo fato de ser padre, pois a freguesia tivera muito outros, mais
ainda pelo fato de ter dedicado longo período de tempo de sua vida aos trabalhos na
cidade, de 85 anos de existência, 60 foram de pároco dos campo-maiorenses.
Todos os registrosassentos de óbitos pesquisados trazem sua assinatura.
Já em 1803, Melo (s/d) relata o sepultamento na igreja matriz do Pe.
Francisco Raimundo de Oliveira, nomeado como pároco da Freguesia do Surubim
em 1798 vindo a falecer cinco anos depois. Era ainda jovem quando assumiu esta
79

Freguesia, 32 anos, mas suficientemente instruído e bom. Atribui-se a sua doença a


irregularidade em que deixou o arquivo paroquial, a doença possivelmente exauriu-
lhe as forças deixando-o impossibilitado até mesmo para assinar os registros. Ou
seja, as irregularidades do arquivo paroquial além de ser atribuídas ao incêndio, das
alegações de dificuldade de se obterem novos livros para os registros também é
atribuída às doenças que levavam os encarregados da paróquia a óbito antes de
terem cumprido com suas obrigações para com o arquivo paroquial.
Oliveira (2011) em seu trabalho de conclusão de curso em História,
intitulado de Ver, Viver e Sentir: uma história do patrimônio religioso de Campo
Maior - Piauí aborda as transformações arquitetônicas pelas quais as igrejas
passaram, dentre elas a matriz e a Igreja do Rosário, e em nenhuma delas a autora
menciona a existência do translado de corpos durante as reformas. Os únicos
sepultamentos que ela menciona é do Monsenhor Mateus Cortez Rufino e do Dom
Abel Alonso Nunes, estes feitos muito depois que o novo templo havia sido erguido.
Em seus epitáfios está gravada a importância que tiveram em meio a
sociedade local. O primeiro aparece citado como o construtor da Catedral de Santo
Antônio, e o segundo como o primeiro bispo da cidade.

Figura 5: Sepultamento na catedral de Santo Antônio

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha, 2014.


80

Retomando a discussão de propriedade do cemitério na visita pastoral, do


dia 07 de julho de 1906, é que a mudança de proprietário já havia acontecido, e é
desde o termo de visita desse ano que se percebe maior asseio do cemitério.

Em boa ordem achamos a igreja matriz que embora pequena está limpa, e
em bom estado seus ornamentos, alfaias e mais objetos de culto divino,
como também archivo parochial e cemitério público onde celebrávamos
missa e fizemos preces pelos fieis defunctos (LIVRO DE TOMBO, 1906, p.
13).

O cemitério aparece seguido do termo público, se é público é secular, e


não da irmandade, o que leva supor a transferência. O termo de 1916 reforça a
suposição já que o mesmo atende apenas sob a invocação de cemitério:

Achamos na visita minunciosa que fizemos à matriz, às Igrejas, à residência


do Reverendo Vigário e ao cemitério, tudo em ordem, devendo apenas
observar que varias das imagens sagradas da Igreja Matriz precisam ser
reincarnadas (TERMO DE VISITA PASTORAL 01/06/1916 ATÉ 09/06/1916,
LIVRO DE TOMBO N° 1, 1883, p.27).

O que na prática ele descreve como minuciosa, o mesmo não pode ser
dito na hora de redigir o termo, o visitador é breve em suas palavras pouco
descrevendo os locais por quais visitou. Em 1921, o cemitério vem seguido da
expressão “parochial” e depreende-se que ele seja da paróquia, mas sem
referenciar o proprietário e o gestor.

Visitamos o cemitério parochial, visita que nos deixou a melhor impressão


pela hygiene, asseio e limpesa que encontramos, pela altitude religiosa e
piedosa do povo que em grande massa nos acompanhou (TERMO DE
VISITA PASTORAL 02/06/1921 ATÉ 09/06/1921 LIVRO DE TOMBO N° 1,
1883, p.39).

O que se acreditou ter desvelado veio novamente à tona com um


documento datado de 1930 causando inquietação, e cujas respostas mais clara não
foram alcançadas. Nesta data embora invocado simplesmente sob cemitério ele
ainda é referido como um bem da matriz e administrado por membro de sua
irmandade.

Visitamos a igreja matriz e suas dependências tudo encontrando em boa


ordem, desde o sacrário ate sua pia baptismal; bons e abundantes
paramentos, e o archivo com sua escripturação em dia. Visitamos ainda a
capella do Rosário que se acha em muito bom estado de conservação,
81

embora desprovida, e o cemitério que encontramos convinentemente


zelado.
Em vista do estado de saúde do administrador deste, e pela conveniência
de ficarem todos os bens da matriz aos cuidados de uma só pessoa,
resolvemos passar a administração do cemitério para o senhor C el Antonio
Maria Eulálio Filho, já fabriqueiro, o que fizemos por portaria que será
transcripta neste livro (TERMO DE VISITA PASTORAL 24/05/1930, LIVRO
DE TOMBO N° 1, 1883).

Em virtude da saúde fragilizada do administrador cujo nome não é


revelado, é feita a transferência do cemitério para outro administrador o coronel
Antônio Maria Eulálio Filho que já administrava os outros bens da matriz e segundo
o trecho citado era conveniente que todos eles ficassem sob os cuidados de uma só
pessoa, não especificando tal conveniência. Infelizmente a portaria mencionada não
foi encontrada.
Nas visitas de anos seqüentessequentes o cemitério não mais aparece de
forma especifica e se aparece, são abordados de forma generalizada como na visita
de 17/05/1934 limitando-se a dizer que “Aqui demorando pelo espaço de seis dias
completos, encontrando tudo em boa ordem e asseio”.

Figura 6: Vista aérea da cidade de Campo Maior em 1934

Fonte: Acervo pessoal de Marcos Paixão

A fotografia acima data do ano de 1934, nela identifica-se as edificações


que autores como Melo (1893) e Silva Filho (2007) já haviam mencionado como a
matriz de Santo Antonio, a Igreja do Rosário, o mercado e o cemitério
82

respectivamente marcados na foto através de um circulo em vermelho, em laranja,


em azul e a seta amarela. O cemitério aparece já sendo “engolido” pela expansão
urbana, que pelo visto se dava a passos lentos, uma vez que a cidade aparece com
um aspecto bastante rural, com casas situadas em grandes terrenos devidamente
murados, onde a população que ali residia ou os que ali transitavam tinham a seus
pés chãos em terra batida em vez de ruas e avenidas. De cidade só tinha
propriamente o nome.
Na visita de 14/10/1939 apenas a igreja matriz, a capela de N. S. do
Rosário, à época confiada ao Apostolado da Oração, e o arquivo são visitados. Na
de 27/05/1943 “encontramos tudo em boa ordem e perfeito aceio” (????p.10).
Entretanto o livro de óbito n°03 indica que a transferência se fizera bem
antes que 1906, já em 1893 quando ele é chamado de Santo Antônio apenas.
Foram poucos os campo maiorenses que se dedicaram a pesquisar o
cemitério Santo Antônio, entre eles: Araújo (2012), no trabalho “A morte contada em
vida: um olhar sobre o espaço cemiterial como fonte histórica no Cemitério
Irmandade em Campo Maior” onde ele seleciona alguns túmulos, os mais ricos em
ornamentos para proceder com suas análises, Chaves (2013) com o livro “ O
cemitério da Irmandade Santo Antônio”, que consiste em um levantamento de dados
sem no entanto partir por unidade de sepultamento, a pesquisa de Soares (2013),
Do anonimato à santa do povo: devoção popular em Campo Maior-PI (1968-2010)
cujo enfoque é dado apenas a um de seus túmulos em virtude do culto popular que
ele apresenta, conferindo ao cemitério um aspecto secundário e Morais (2014) com
“A História dos mortos para a história dos vivos: análise do acervo do Cemitério
Santo Antônio em Campo Maior - Piauí” onde foi feito o inventário do acervo
mortuário a partir da coleta de dados individual por sepulturas.
Esse trabalho de Morais (2014) teve inicio em 2012 e a partir dele outros
foram surgindo, alguns em parceria com outros pesquisadores. “Escavando”
estórias: o patrimônio (i) material do Cemitério (da Irmandade de ) Santo Antônio
em Campo Maior - Piauí (MORAIS; CARVALHO JÚNIOR, 2015), Turismo e
paisagem no cemitério do Batalhão em Campo Maior - Piauí (2015), Uma história
com muitas histórias: um passeio pelos cemitérios de Campo Maior - Piauí (2013),
“Aqui jaz”: a saudade dos entes queridos (MORAIS; CARVALHO JÚNIOR, 2013),A
primavera nos cemitérios do Piauí (MORAIS;SOUSA;IBIAPINA; CARVALHO
JÚNIOR, 2014), Retratos de histórias: uma “escavação” do acervo fotográfico do
83

cemitério Santo Antônio em Campo Maior – Piauí (MORAIS; CARVALHO JÚNIOR,


2014) e “Lápides que falam e ajudam a contar histórias: uma análise a partir do
cemitério Santo Antônio de Campo Maior” (MORAIS; CARVALHO JÚNIOR, 2012).
Além desses estudos de produção mais local, há ainda o Romance
Histórico Pedra Negra, de Silva (2012), onde o cemitério é citado logo no inicio do
livro, com o enterro do major, tal como o trabalho de Soares (2013) o cemitério
serve-lhe apenas como um cenário, não é o protagonista da obra. E encerrando a
produção que o contempla, o inventário do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN), que traz como data aproximada de sua construção o
final do século XIX, mas, com base no preenchimento das fichas de registro tumular,
realizado durante as pesquisas de campo por Morais (2014), percebe-se que ele é
do inicio do século XIX, uma vez que o primeiro sepultamento data de 1804.
Desses trabalhos apenas o de Morais (2014) contem brevemente
informações históricas sobre o Cemitério Santo Antônio. Acredita-se que se em
determinado momento ele pertenceu a Irmandade de Santo Antônio este é um ponto
crucial para o seu entendimento. Nesse aspecto os trabalhos anteriores pouco
servem de subsidio para a presente pesquisa, o que confere as linhas desse tópico
acima escritas certo ineditismo, são as primeiras palavras de uma pesquisadora e
curiosa pelos assuntos de sua terra natal, como disse o poeta Azevedo (2007, p.7)
“Desculpai-as. As primeiras vozes do sabiá não têm a doçura dos seus cânticos de
amor”.
Contudo, há evidências de que na “Princesa das Campinas” os
enterramentos em igrejas não foi uma prática comum, e que o local dos mortos já
era o cemitério extramuro cabendo a Irmandade de Santo Antônio, atrelada ao poder
da Igreja, um importante papel social e religioso no momento da morte. Ou ainda
que os mortos tivessem como local derradeiro de seus corpos os cemitérios
particulares, sepulturas próximo a suas residências ou sepultados a esmo à beira
dos caminhos.
Até onde se sabe o tema das irmandades religiosas, em especial da
Irmandade Santo Antônio, das Almas e do Rosário não recebeu tratamento por parte
dos historiadores da cidade, dessa forma enfrenta certa solidão e gera grande
desafio. É uma via de estudo que ainda não foi trilhado.
84

Quanto aos restos mortais na igreja matriz a que a documentação se


reporta não se sabem que destino eles tiveram com a demolição do antigo templo,
se lá permaneceram ou se foram transferidos para o cemitério.
Também não foi possível determinar precisamente quando se deu a
transferência de proprietário e gestão do cemitério, o que não implica dizer que outro
autor não o possa fazer e caso seja do seu interesse ou curiosidade fazer. A
documentação é confusa, de certeza o que ora se apresenta é que já desde 1893 já
se invocava o cemitério simplesmente de Santo Antônio, e desde então se
apresenta ora com ora sem a expressão “Irmandade”.
Apresentada a cidade e suas práticas mortuárias, agora é chegada a hora
de apresentar o cemitério Santo Antônio através do diálogo entre seu acervo e a
documentação escrita.
85

3 - CEMITÉRIO SANTO ANTÔNIO: UM DIÁLOGO ENTRE O SEU ACERVO


MORTUÁRIO E AS PALAVRAS

A cidade de Campo Maior possui três cemitérios, todos eles do tipo


convencional, o cemitério do São João, o da Cidade Nova e o Santo Antônio.
Desses três apenas os dois primeiros estão em funcionamento. O Santo Antônio
desde 1978 que não recebe mais corpos e é a ele que agora se passa investigar.
Três ruas dividem espaço com o cemitério Santo Antônio. Sendo elas a
Rua Padre Benedito Portela onde está o portão de entrada, a Rua Capitão Manoel
86

Oliveira que passa ao seu lado esquerdo (pra pessoa que esta posicionada de frente
para o cemitério) conduzindo a uma praça atrás da matriz e a Rua Coronel Eulálio
Filho que passa por trás do cemitério. Um aspecto em comum entre elas, além do
que já foi citado é o fato de levarem o nome de pessoas que ali jazem. Vale ressaltar
que várias outras ruas da cidade receberam o nome de um dos seus sepultados.

Figura 7: Vista aérea do cemitério Santo Antônio, Campo Maior-PI

Foto: Google Earth (2015)

Do cemitério à igreja matriz são 4 quadras, e há uma rua, Rua Honório


Bona Neto, quase em frente ao seu portão que conduz passagem direta a frente da
matriz. O cemitério Santo Antônio está localizado no eixo comercial antigo da cidade
que conforme Chaves (2014) compreendiam o entorno das praças Bona Primo e Rui
Barbosa, das Ruas Santo Antônio e Capitão Manoel Oliveira. Posteriormente esse
eixo foi transferido para a Avenida José Paulino e, sobretudo para Avenida Demerval
Lobão.
O sítio teve uma ocupação bastante densa, recebeu corpos e mais corpos
durante um século, sete décadas e quatro anos, situado a 4°49’ 36607’’S
42°10’9011’’W, ocupa uma área cujo traçado não possui formato geométrico definido
87

e o único portão de entrada está voltado para a direção em que o sol nasce (o leste),
como pode ser visualizado na planta baixa do inventário do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Fig.8).

Figura 8: Planta baixa do cemitério

Foto: Inventário do IPHAN (2008)

Dentro do estudo de Hertz (1980) sobre a polaridade religiosa entre mão


direita e esquerda, a orientação leste corresponde ao lado direito. “A relação que
une a direita ao leste ou ao sul e a esquerda ao norte ou ao oeste é ainda mais
constante e direta a ponto de, em muitas línguas, as mesmas palavras denotarem os
lados do corpo e os pontos cardeais” (HERTZ, 1980, p.113).
Segundo esse autor se verifica uma preeminência da mão direita sobre a
esquerda e que isso deve ser atribuído tanto a fatores orgânicos mais também
culturais. No que diz respeito aos fatores culturais a direita é associada ao sagrado
enquanto a esquerda se ocupa de tudo que é demoníaco. Sendo o cemitério um
lugar de repouso dos fies cristãos e por isso um edifício sagrado sua posição no
espaço não é indiferente nem arbitrária, portanto direcionado para onde o sol nasce
fonte de toda vida.
Tal como o portão de entrada a grande maioria dos sepultamentos estão
voltados para o leste, conforme Ribeiro (2007, p.56) assume-se que essa é uma
88

orientação das sepulturas que “corresponde a algo bem mais genérico, quais as
ideias de nascente e poente, vida e morte”.
O terreno onde ele está situado muito provavelmente tenha sido doado
por um dos irmãos da irmandade, cabendo a estes ainda providenciar os recursos
financeiros para a aquisição dos materiais construtivos. Paixão (2015) considera a
Irmandade de Santo Antônio a responsável por ter obtido recursos para a ampliação
da igreja matriz. “Em 1779 a irmandade de Santo Antonio solicita diretamente à
rainha recursos para a ampliação da igreja da Vila de Campo Maior, que já não
comportava os fiéis da comunidade” (PAIXÃO, 2015, não paginado). Portanto, é
certeza a participação da irmandade Santo Antônio na construção do espaço para
seus mortos, não se sabe se as suas próprias expensas ou se contaram com a
ajuda da rainha tal como na ampliação da igreja.
Qualquer que seja a construção, ela procura conciliar o seu propósito com
o material disponível na região e das condições climáticas. Observando as
edificações de Campo Maior que remetem ao período colonial elas apresentam
paredes espessas e meias paredes construídas de adobe 31, um excelente material
para manter as temperaturas amenas no interior das residências, bem como
cobertura com telhas vãs facilitando a circulação do ar. “As construções do Piauí
mostram sistemas correntes em toda a colônia, como o adobe, a taipa de varas ou
pau-a-pique, a pedra e barro, as tijoleiras e as alvenarias mistas” (SILVA FILHO,
2007, p. 68).

O muro do cemitério é de pedra com acabamento em sua totalidade feito


de pintura com cal hidratada, que não se sabe exatamente como foi introduzida no
sertão. “Ele é revestido com chapéu de telhas, que pode ser apontada como uma
técnica utilizada para protegê-lo das chuvas” (MORAIS, 2014, p.41). Mesmo com a
baixa incidência pluviométrica e de intenso calor, em boa parte das cidades do Piauí
o muro é rematado “com chapéu de telhas ou lajes intercaladas de telhas bicas”
(SILVA FILHO, 2007, p. 79).
Alguns de seus trechos não resistiram à ação do tempo e suas
intempéries, sendo reerguidos e consequentemente perderam seu traçado original.
Por isso se observa uma parte do muro cujo material construtivo é tijolo de seis furos
31
Material vernacular usado na construção civil, um dos mais antigos, ele foi amplamente usado na
civilização do crescente fértil em especial no Egito Antigo e Mesopotâmia, sendo considerado um d
dos antecedentes históricos do tijolo de barro. Ele é formado de terra crua, água e palha e algumas
vezes fibras naturais, no geral são muitos resistentes, suportando a altas temperaturas.
89

e sem apresentar o revestimento com telhas. Sua finalidade primordial talvez fosse
de delimitar territorialmente a área do campo santo, seguindo muito provavelmente a
recomendação do bispo de evitar a profanação desses espaços, e não se sabe se
ele antecede os sepultamentos ou é posterior a eles.
Quanto a sua altura pode ser facilmente transposta, mas em virtude de
sua destruição parcial por conta das intempéries faz-se desnecessário pulá-lo uma
vez que é possível ter acesso ao acervo através das fissuras que nele se apresenta.

Figura 9: Muro de pedra de jacaré parcialmente destruído

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)

Transpor o muro ou aproveitar-se de suas fissuras tem sido uma ação dos
ladrões de túmulo que buscam aí peças de valor tal como esculturas de bronze e
mármore. Por estar interditado para sepultamentos desde a segunda metade do
século XX, o cemitério permanece fechado e aqueles que desejam visitar os seus
mortos se dirigem a residência de Dona Alcelina da Silva Neta que fica situado ao
lado do mesmo.
Dona Alcelina da Silva Neta conhecida popularmente como Xuxa é a
zeladora do cemitério. Nasceu, a 13 de novembro de 1960, e se criou na cidade de
Campo Maior sendo a única sobrevivente dos treze filhos de sua mãe dona Teresa.
Todos os outros doze (12) irmãos que ela não chegou a conhecer estão sepultados
nesse cemitério.
90

O oficio chegou à sua família depois de uma sucessão de doenças e


morte dos antigos funcionários. O primeiro que ela recorda e cita é o finado Neuta
que era ao mesmo tempo o vigia e o coveiro, com o padecimento deste a
responsabilidade foi atribuída à finada Benedita que segundo a entrevistada morava
na esquina com o cemitério. Depois desta senhora foi que veio sua mãe, dona
Teresa, lá permanecendo de 1967 a 1988. Vale ressaltar que ao contrário dos outros
dois funcionários dona Teresa deixou o cargo com vida, deixou porque a idade
avançada já não era compatível com as atribuições que o cargo demandava. “Xuxa”
que já desde os sete anos ajudava a sua mãe no cemitério foi quem a substituiu e lá
permanece contando já com uma experiência de 34 anos.
Em sua fala é muito forte a presença da denúncia do abandono em que o
cemitério se encontra por parte da atual gestão, e que quando o cemitério estava
sob a administração da ordem religiosa Irmandade Santo Antônio as coisas por lá
eram diferentes. Sua vivência naquele espaço lhe confere uma autoridade para falar
sobre ele, inclusive tem informações que não estão presentes nem na cultura
material nem na documentação escrita.
Muitos foram os aspectos arquitetônicos originais do Cemitério Santo
Antônio que se perderam, como a capela mencionada nos registros da visita
pastoral do dia 10 de fevereiro de 1883, o passeio lateral esquerdo sacrificado para
o alargamento da rua, e o muro interno que segundo dona Alcelina dividia os ricos
dos pobres e que foi derrubado atendendo as ordens do Monsenhor Mateus Cortês
Rufino após flagrar um casal praticando ações que não foram feitas para ser
realizadas no espaço dos mortos. Quanto à capela Xuxa diz que não a alcançou em
pé, mas as histórias que ela ouviu falar é de que se tratava de uma capela pequena
que ruiu por fatores naturais e em seu lugar é onde se encontra hoje o cruzeiro.
Segundo Reis (1991) no processo de separação dos vivos dos mortos em
Salvador (BA) houve as normas prescritas pelos códigos da postura municipal e o
regulamento religioso, no que se refere esse último se recomendava a segregação
por um muro e com uma entrada própria para os não católicos e os excomungados.
No cemitério Santo Antônio o muro segundo Xuxa foi uma realidade, mas a entrada
foi única.
A vista frontal do cemitério não apresenta placa de identificação e sua
fachada encontra-se ornamentada com pedras de ardósia 32, onde somente a parte
32
É uma rocha utilizada na pavimentação, fachadas e decorações.
91

inferior está pintada com cal hidratada. Outro elemento identificado nessa parte é o
portão, a cruz logo acima do portão, e os degraus. O primeiro não apresenta em seu
formato simbologia litúrgica, “embora ele em si próprio, tenha seu simbolismo, que é
o de passagem. A cruz ao alto representa a cristandade e a presença de degraus
faz alusão à ascensão ao plano superior” (MORAIS, 2014, p.42).
A simbologia de cada um desses elementos, portanto, estão atreladas
com a interpretação de fé daqueles que ali jazem e dos vivos inseridos naquele
contexto social. Gregório (s/d) referindo-se aos degraus diz que estes são
recorrentes nas civilizações antigas, como os Zigurarte na Mesopotâmia, as
pirâmides da costa peruana e os antigos templos dos gregos. Todos eles
fundamentados em degraus.
Percorrendo seu interior se encontram um altar, a cruz das almas e a
manilha. O primeiro é destinado para a celebração da missa no dia dos finados, até
o ano passado ao lado desse altar era possível visualizar um poste de madeira com
a finalidade de puxar fios de energia da casa de dona Alcelina. Atualmente ele foi
substituído por um poste de energia permanente. Chaves (2014) aponta que ainda
na década de 40 do século XX a iluminação na cidade era feita em poste de
madeira, e que:

A Rua Santo Antônio foi uma das primeiras vias públicas do centro de
Campo Maior a receber infra-estrutura urbana como calçamento e
iluminação (poste de madeira de carnaúba), porém de forma bastante
precária. As casas na maioria eram de paredes de adobes, pisos de
ladrilhos comum, coberta de telhas, madeira redonda e ripas de carnaúba.
Banheiro e sentina rústicos sem água canalizada. Algumas residências do
centro da cidade possuíam poços artesianos nos quintais (CHAVES, 2014,
p.26).

Considerando a Teoria do Reflexo, a iluminação do espaço dos mortos


refletia a iluminação que havia na cidade dos vivos até a década de 40 do século
XX, e ainda que de forma atrasada venha acompanhando as mudanças que nela
ocorrem. Ainda que se possa afirmar que o sistema de iluminação pública agora
seja existente dentro dos seus limites, ainda assim ela é feita de forma precária.

Figura 10: Altar com poste de madeira


92

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

Figura 11: Altar com novo poste de iluminação

Fonte: Acervo Pessoal de Jessica Gadelha (2015)


Como se pode observar o registro arqueológico funerário não é estático,
passa por transformações culturais (como estas do poste) e naturais (como a
destruição parcial do muro por conta das intempéries). Ainda no grupo das
transformações culturais estão os enterramentos secundários, a ação de ladrões de
túmulos, as ofertas posteriores e a remoção dos cemitérios. Nas naturais
acrescentam-se os abalos sísmicos, solos ácidos, enxurradas entre outras.
A cruz das almas ou cruzeiro “é uma cruz em pedra ou madeira,
normalmente colocada sobre plataforma podendo ter ou não degraus. Os cruzeiros
podem ser de diversas dimensões e encontrados nos adros das igrejas, cemitérios,
93

lugares elevados ou em encruzilhadas de caminhos” (HERBERTS, 2011, p.48). A


que está presente no acervo em questão é de madeira e está em uma plataforma
sem degraus, nela “são acesas as velas pela alma dos mortos, local onde no
passado ficava a capela mencionada no Livro de Tombo da Freguesia de Campo
Maior” (MORAIS, 2014, p.46) e se acredita que ele seja o antigo cruzeiro da matriz
do qual fala Melo (1983). É comum as pessoas que não puderam ,por algum motivo
de força maior, se deslocarem para as cidades onde estão sepultados seus entes
queridos ascenderem velas nos cruzeiros de cemitérios nos municípios onde
residem.
Figura 12: Cruz das almas em madeira

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)


Nela foi encontrado um ritual não católico, “uma faca de mesa com cabo
preto e lilás, sob um pedaço de papel no qual estava escrito o nome de três pessoas
do sexo feminino e uma vela preta” (MORAIS, 2014, p.46). Esses tipos de rituais
reforçam o preconceito em relação a esses espaços, como lugares de assombração,
almas penadas e magias negras “impossibilitando que a população veja além do
visível as singularidades de cada artefato, e como a junção de seus elementos
denúncia a memória coletiva da região” (MORAIS, 2014, p.46).
E um último elemento é a manilha, que consiste no acúmulo de água para
a lavagem das edificações sob as sepulturas. Ela deve ser recente, uma vez que até
94

1940 o serviço de canalização era precário. Tanto o cruzeiro como as manilhas


estão sempre presentes nesses espaços (MORAIS, 2014, p.46).
A forma como o cemitério se encontra atualmente é resultado de
fragmentos representacionais do início do século XIX até os dias atuais, mesmo com
o seu fechamento para sepultamentos os rituais ainda são presentes. Carneiro
(2012) considera que a paisagem contemporânea dos cemitérios é produto da
sobreposição de várias camadas de representação construídas, como novos
sepultamentos, reformas e ampliações nas construções, transferência de
concessões, demolições e intervenções em geral. E que a necrópole sem a cidade
não existiria.

3.1 - CONHECENDO SEU ACERVO MORTUÁRIO


Integra seu acervo mortuário o total de 870 sepulturas e o número de
sepultados chega a 1040, uma vez que há sepulturas com enterramento coletivo.
“Vale ressaltar que o número de sepultados pode ser bem maior, tendo em vista
que, para as sepulturas sem identificação, considerou-se sepultamento individual”.
(MORAIS, 2014, p.46)
Verifica-se que os materiais empregados na construção das edificações
sobre as sepulturas são o metal, a granítica, a alvenaria, azulejos, mármore e as
campas de ardósia, esta última pela ocorrência alta se caracteriza como pedra local.
“As que estão em menor número são a granítica, sendo predominante a pedra local.
Túmulos, amontoados de pedras, gradil de ferro e covas simples formam seu
conjunto tumular, prevalecendo o sepultamento em covas simples”. (MORAIS, 2014,
p.48)

Figura 13: Vista panorâmica da parte frontal mostrando a predominância de covas simples com
pedra local
95

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

As covas simples predominam, sobretudo na parte frontal, como mostra a


figura 13. Do total apenas dois jazigos integram seu acervo, “um deles revestido
parcialmente por suas telhas originais, onde há a inscrição Olaria Veneza”.
(MORAIS, 2014, p.49).
96

Figura 14: Telha contendo inscrição

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

Nos estudos de Oliveira (2011) sobre o patrimônio arquitetônico religioso


de Campo Maior ela cita duas olarias que forneciam materiais para a construção da
nova matriz, a do Caiçara e do Zé Dóia. Eram muitas as olarias existentes e a
Veneza era uma delas. Essas quase inexistem na produção acadêmica local, fica,
portanto como mais uma possibilidade de investigação.

Conforme a cultura material nesse cemitério repousa coronéis, padre,


cônego, capitães, tenentes coronéis, poeta, médico, alferes do exercito, homens e
mulheres que vieram de outros estados firmando consórcios nesta cidade e que
tiveram muitos filhos ou nenhum, de crianças e recém-nascidos que quebraram com
a suposta ordem natural das coisas ao falecerem antes de seus pais, e homens
simples que lá repousam no anonimato. Algumas das figuras de destaque acabaram
sendo homenageadas com nome de ruas e avenidas, nome de escolas e biblioteca
da cidade. A própria rua em que está localizado o portão de entrada do cemitério,
97

como foi visto anteriormente, leva o nome de um dos seus sepultados, que é o padre
Benedito Portela Lima.

Aqui jaz o padre Benedito Portella Lima ordenado a 17 de dezembro de


1887, no seminário de Santo Suplicio em Pariz, foi vigário desta freguezia
durante 14 annos. Nasoeu em Oeiras, deste Estado, a 6 de janeiro de 1862,
vindo a succumbir no dia 24 de julho de 1918, quando em desobriga no
interior deste município. Homenagem cincera dos seus parochianos e
amigos, admiradores das grandes virtudes de que era exemplo. Uma prece
a Deus pelo bondozo e inesquecível parocho. A. M. GONDIM Rua do Sol 15
Maranhão (Lápide-3,1918).

Benedito Portella Lima foi um dos jovens que enveredou para o


sacerdócio, aos 25 anos já era padre e durante 14 anos foi vigário desta Freguesia
de Santo Antônio do Surubim, quando em desobriga faleceu no interior deste
município.
As desobrigas consistiam em cumprir as obrigações da vida religiosa, e
dava-se por meio de campanhas e atividades promovidas na sede e no interior como
pregações, encontro dos casais para estudo e solução dos problemas dos mesmos,
legitimação de uniões e reajuste de outras, visitação de capelas e fazendas. Elas
visavam a intensificação da vida cristã e a defesa da fé contra as heresias. Havia,
portanto desobrigas na zona urbana e na zona rural.
Foi cumprindo o seu sagrado dever que o padre Benedito pagou o forte
tributo a que toda humanidade esta sujeita, teve que submeter-se a lei irrevogável
da natureza! No memorando redigido para comunicar o padecimento deste consta
que o padre a muito tempo padecia de duas traiçoeiras moléstias(não identificadas),
mas mesmo conhecedor de seu precário estado de saúde lançou-se a percorrer o
interior para se fazer cumprir o seu alto dever, se pois a caminho do interior para
atender a necessidade espiritual dos seus paroquianos.

Mas era que este distinto sacerdote e zeloso vigário trazia bem esculpido
em sua bem formada consciência aquellas mensuráveis palavras e judiciosa
recomendação do Príncipe dos Apostolos, em sua primeira epistola, capitulo
quinto e versículo dois e três, em que traçava, em sinthese a summula dos
actos deveres e obrigações, do parocho ou do pastor d’almas
(Memorandum. Livro de Tombo da Freguesia de Campo Maior N°1,1883).

A passagem refere-se a Pedro, aquele em que Cristo edificou a sua


Igreja. O capitulo atende por- Função dos presbíteros-, este é o pastor que
98

testemunha o Cristo a que serve que se coloca a serviço da comunidade de forma


livre e espontânea, com generosidade, como modelo. Os versículos assim dizem:

2
cuidem do rebanho de Deus que lhes foi confiado, mas não por
imposição,mas de livre e espontânea vontade, como Deus o quer; não por
causa de lucro sujo, mas com generosidade; 3 não como donos daqueles
que lhes foram confiados, mas como modelos para o rebanho. (BIBLIA,
Príncipe dos Apostolos, primeira epistola, capitulo quinto e versículo dois e
três).

Com apenas alguns poucos dias que estava no interior, na fazenda


Furnas o presbítero deixou definitivamente seu rebanho. Sua morte é anunciada
como uma fatalidade e seu sagrado corpo recebeu as devidas encomendações.

Seus sagrados despojos foram conduzidos por alguns homens a esta


cidade, onde chegaram na manhã(3 horas da madrugada) do dia seguinte-
vinte e cinco do mesmo mês. Com a noticia do padecimento do digno
vigário, os sinos dobraram logo à finados, e grande foi a aglomeração do
povo, nas ruas até a casa de sua residência .
Revestido das vestes sacerdotais, completamente paramentado, conforme o
disposto na sagrada liturgia, foi elle sacerdote levado à necrópole, tendo um
concorridíssimo acompanhamento. Acha-se sepultado ao lado direito da
porta do cemitério (Memorandum. Livro de Tombo da Freguesia de Campo
Maior N°1,1883).

A passagem revela que a multidão era grande, todos queriam de perto ver
e prestar o último adeus ao homem que dedicou boa parte de sua vida as coisa de
Deus. Ele era uma pessoa muito querida, confirma a assertiva o cortejo fúnebre
concorridíssimo e a dedicatória em sua lápide. Outro aspecto que chama atenção na
passagem acima são os sinos dobrando a finados que revela um pouco da
mentalidade funerária da época.
Além das vestes sacerdotais com qual foi sepultado, outra referência de
sua vida eclesiástica consta na sepultura, um desenho de um brasão em baixo
relevo. A posição de sua sepultura está em conformidade com a cultura material, é a
terceira do lado direito do portão do cemitério.
Outro sepultado no cemitério que compartilhou da vocação para o
sacerdócio foi o Cônego gastão Pereira da Silva, nascido a 16-8-1886. Era filho de
Ludgera Pereira da Silva e do Coronel Lysandro Pereira da Silva, um dos seis
rebentos do casal, e o único que se fez padre. Faleceu em 4-5-1944. Em sua lápide
há uma cruz em alto relevo sob a Bíblia e em sua volta possui a estola, e na estola
em cada extremidade tem uma cruz.
99

Assim como a documentação escrita reforça os dados obtidos em campo,


como foi nesse caso da sepultura do padre Benedito, ela também acrescenta
informações novas e até mesmo a contradiz. Por exemplo, os termos de óbito
apresentam uma diversificação de sujeitos que eram enterrados no cemitério em
questão. Eram assassinos, filhos naturais e transeuntes, que é improvável se
visualizar nos epitáfios, uma vez que estes são cuidadosamente selecionados.
Ainda na consulta dos Livros de óbito foi encontrado um exclusivamente
dedicado para os registros de falecimento dos filhos da mulher escrava, daí os
escravos serem outro segmento social a compor os sujeitos que repousam em seu
espaço. Segundo dona Alcelina foram eles que ergueram o muro do cemitério e
tiveram outras contribuições na construção de edifícios na cidade a exemplo da
Igreja de Nossa Senhora do Rosário.
O encontro desse livro também leva a refletir sob a existência do muro
interno mencionado por Xuxa, pois se havia uma preocupação de separar por escrito
os filhos da mulher escrava dos filhos dos demais homens (livres/ricos,
livres/pobres) é provável que havia uma preocupação de uma segregação física, daí
a justificação para sua existência.
Uma contradição entre ambas documentações diz respeito à relação de
sepultados. Nos livros de óbito (dos filhos da mulher escrava e o livro n°03) os
nomes listados ultrapassam a relação feita com os dados levantados em campo. Só
no período de 23 anos foram 1.098 sepultados como mostra a tabela 1.

Tabela 1: Registro de óbito:


Quantidade de
sepultamento por ano do
século XIX (1873-1883)
1873 a 50
1883
1887 79
1888 71
1889 75
1890 74
1891 78
1892 58
1893 98
1894 86
1895 103
1896 110
1897 111
1898 79
1899 27
Total 1.098
100

Vale ressaltar que a consulta dos registros de óbito do ano de 1899 não
foi concluída, porque o objetivo era mostrar a contradição que há entre a cultura
material e a documentação escrita e não esgotar essa segunda fonte, que inclusive
adentra no século XX. Pois bem, a margem de diferença da segunda pra primeira é
de 58 sepultados a mais, cabe lembrar que essa margem é ainda maior pelo motivo
anteriormente explicado.
O que justificaria um número de sepultados menor para um período de
tempo maior (1804-1978), enquanto em apenas no período de 23 anos o cemitério já
contava com 1098 sepultados? O porquê de nos termos de óbito aparecer nomes de
pessoas cujo local de sepultamento consta o Cemitério da Irmandade Santo Antônio,
no entanto essas pessoas não aparecem no registro da cultura material?
A julgar pela confrontação de fontes é provável que diversas sepulturas
tenham sido reutilizadas para novos sepultamentos, sem com que houvesse
preocupação com a memória dos corpos anteriormente sepultados. Acredita-se que
tal como no Cemitério Bom Jesus, da localidade Bom Jesus, do qual deriva o seu
nome os enterros no Cemitério Santo Antônio eram gratuitos para quem não podia
pagar por ele. Quem podia pagar pelo punhado de chão no qual passariam a jazer
os corpos tinham sepultura perpetua, podendo na morte juntar-se com seus entes
queridos caso fosse de suas respectivas vontades.
Quem não podia pagar dispunha dos enterramentos gratuitos concedidos
pela irmandade, mas sujeitos a terem sobre seus corpos outros corpos com os quais
em vida não tinham nenhuma relação afetiva e familiar, nem mesmo compartilhado
da existência do mesmo século. Sendo que além de suplantados os corpos ainda
também a memória. Para isso bastava que houvesse transcorrido tempo suficiente
para a reabertura da cova ou não. Pelo fato das sepulturas não serem numeradas
acredita-se que não era possível um maior controle da reabertura ou não de covas.
Das 870 sepulturas e dos 1040 sepultados que a cultura material aponta
32 e 33 são respectivamente do século XIX. Das 32 sepulturas 5 possuem tipo de
sepultamento coletivo, onde 4 deles mesclam enterramento do XIX com o XX, e
apenas uma trata-se de sepultamento coletivo com enterramento apenas do XIX.
Partindo da análise dos sepultamentos do século XIX, verifica-se que do
sepultamento mais antigo (1804) ao subseqüente há uma lacuna significativa de 36
101

anos e que até a última data para esse século, conforme a cultura material do
cemitério, a lacuna foi diminuindo em 20, 9, 5, 4, 2 e 1 ano.

Tabela 2: Cultura material:


Quantidade de
sepultamento por ano do
século XIX
1804 1
1840 1
1869 1
1871 1
1872 1
1874 1
1875 1
1879 1
1884 1
1885 1
1886 1
1887 1
1888 1
1889 3
1890 1
1891 1
1892 1
1893 3
1894 1
1895 4
1896 3
1897 2
1899 1

Chama atenção o silenciamento para o ano de 1823, data em que ocorreu


a Batalha do Jenipapo. Ao que tudo indica o cemitério já existia anterior a
deflagração da Batalha, e poderia ter recebido os corpos daqueles que morreram
imediatamente no campo de combate, ou então os do que vieram a falecer anos
depois em decorrência dela. O que aconteceu então com os corpos dos Heróis do
Jenipapo? Foram todos sepultados no campo de batalha, os que tiveram e os que
não tiveram morte imediata? Ou alguns deles podem de fato repousar no Santo
Antônio? Pode ser que sim pode ser que não, mas é fato que os heróis “de que tanto
se fala”, são heróis que pouco se conhecem. Foram homens que viveram e
findaram-se no anonimato, cujas sepulturas são tão anônimas quanto os corpos que
trazem consigo. Que tal silenciamento possa inquietar ao leitor.
A maior regularidade de sepultamentos por ano se inicia a partir do ano
de 1869, entretanto como foi demonstrado na tabela 1 verifica-se que o número de
sepultados por ano é bem maior, reforçando a ideia de reutilização das sepulturas. A
102

hipótese levantada é a de que a grande maioria foi reutilizada sem referenciar


qualquer outro corpo ali sepulto.
O leitor pode se perguntar que se havia a reutilização das sepulturas
então por que seu fechamento em 1978? Um dos fatores pode ter sido a condição
de saturação do solo em decompor os cadáveres, outro pode ser o fato de empurrar
a morte além da vista dos vivos para lugares afastados do centro, não por uma
alegação de saúde pública como fora no XIX, mas na necessidade de escamotear a
morte. No século XX o grande tabu é falar de morte ou qualquer coisa que a ela
esteja atrelada ou que possa lembrar a finitude humana. Porque tudo que é vivo
morre, a única conclusão é morrer como dissera certa vez o pseudônimo do poeta
Fernando Pessoa. Outro fator pode ser pelo crescimento de aquisição de sepulturas
perpetuas e na falta de terreno para ser ocupado.
Quanto à espacialização das sepulturas, de uma forma geral, não há
alinhamento entre elas estando as mesmas situadas em sua maior parte umas
próximas das outras, e distribuídas em quase todo o terreno. A forma como estão
distribuídas a sepultura mais antiga e a mais recente permitem tecer considerações
de como se deu a ocupação do sítio.
“O sepultamento mais antigo data de 1804 (Figura 15), é de uma senhora
chamada Ernestina Roza de Brito, que faleceu com 40 anos de idade”. (MORAIS,
2014, p.51) Vale ressaltar que em 1804 é que está sendo inaugurado por ordens de
Napoleão Bonaparte o cemitério Père Lachaise, em Paris, o mais famoso do mundo
segundo Nogueira (2013). Ainda segundo essa autora devido a recusa da população
em aceitar os novos modelos que orientavam a legislação de sepultamentos, a
necrópole permaneceu sem ser utilizada até 1817. Em cidades brasileiras, como o
Rio de Janeiro e Porto Alegre, por exemplo, os cemitérios extramuros só começam a
ser implantados em 1850.
Na Bahia o levante popular conhecido como cemiterada mostra que já em
1836 havia sido criado um cemitério extramuro denominado de campo santo mas
que a população ainda afeita as suas tradições funerárias o destruiu quase que
completamente.

Figura 15: Sepultamento mais antigo no cemitério Santo Antônio


103

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

Nessa mesma sepultura está enterrado José Pedro da Costa (falecido em


1931), provavelmente seu filho, uma vez que quem lhe dedica à lápide é seu neto,
atendendo por nome José Pedro da Costa Neto. Trata-se de um sepultamento
coletivo. Ela está localizada no lado em que está situada a sepultura do padre
Benedito Portella.
A ordem em que o nome dos sepultados aparecem na lápide é inversa a
essa apresentada, que é utilizada apenas para evidenciar o sepultamento mais
antigo (1804). Muito provavelmente as sepulturas que abrigam corpos de distintas
temporalidades (século XIX e XX) sofreram modificações em suas edificações e
elementos que os ornam devido ao último sepultamento nele realizado, em alguns a
lápide faz referência ao corpo anteriormente sepulto, há uma preocupação com a
memória de seus entes queridos. Nesse contexto dos 3 sepultamentos coletivos, em
todos eles verifica-se essa preocupação.
O mais recente é de 1978, onde jaz os restos mortais de Marion Saraiva
Monteiro, localizado no lado esquerdo (parte posterior esquerda, próximo ao muro) .

Figura 16: Sepultamento mais recente no cemitério Santo Antônio


104

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

O posicionamento de ambas (mais antiga e a mais recente) faz com que


seja descartada a possibilidade de que o sitio foi inicialmente ocupado na parte
frontal, próximo à entrada, e na parte de trás, uma vez que o posicionamento do
sepultamento mais recente está depois do mais antigo. “E leva a acreditar que lotes
de terra eram previamente adquiridos, por quem tinha poder aquisitivo para isso,
provavelmente através da compra, como também na possibilidade de enterramentos
aleatórios” (MORAIS, 2014, p.52). O sentido dos sepultamentos em sua quase
totalidade está voltado para o portão de entrada (leste), havendo um pequeno
número voltado para a cruz das almas, para o muro lateral direito e esquerdo.
O estado de conservação do acervo como um todo é precário, entre seus
principais problemas se pode listar o desmoronamento parcial do muro, destruição
das edificações construídas sob as sepulturas, faltam partes dessas edificações
como “hastes de cruzes, revestimentos de azulejos, partes de inscrições que não
resistiram a ação natural ou a queima de velas que familiares e amigos acenderam
ou acendem provocando seu escurecimento” (MORAIS, 2014, p.49), gradil de ferro
retorcidos, peças saqueadas, letras e números que se desprenderam da lápide,
cruzes, lápides e esculturas avulsas e esculturas decepadas.
Esse estado em que ele se encontra é atribuído tanto a fatores naturais
como culturais. “A pouca arborização no seu interior faz com que as sepulturas
fiquem diretamente expostas a incidência dos raios solares e das chuvas, o que
105

acelera o processo de desgaste dos elementos que o compõe” (MORAIS, 2014,


p.49).
O estado de conservação das construções é influenciado principalmente
pelo material escolhido pelos proprietários para revestimento. Lembrando também
que o tipo de material da construção tumular é fator de diferenciação social.
Evidencia poder econômico, condições econômicas precárias ou como opção de
simplicidade.
O sistema de iluminação precário e a ausência de vigilante torna o
cemitério um alvo fácil para os ladrões de túmulo que além objetos de valor
monetário mais elevado carregam também os ex-votos da única sepultura que
apresentou como rito o culto popular. Já em seu estudo Soares (2013) denúncia o
estado de abandono que o cemitério se encontra, pois na maior parte do ano a
vegetação permanece alta “engolindo as sepulturas”. A limpeza do terreno só é feita
duas vezes ao ano, no dia das mães e dia dos finados.
Para Xuxa o cemitério, por ela invocado sempre de Cemitério da
Irmandade de Santo Antônio, está tomando o mesmo rumo que tiveram outros
edifícios da cidade que materializam parte do processo histórico local, ou seja, o
desaparecimento. E que seu destino tornou-se incerto depois que ele passou a ser
gerido pela municipalidade.O ápice da desorganização para Xuxa foi quando se
cogitou na possibilidade de destruir o cemitério para construção de uma Praça das
Almas.
Por já está desativado desde 1978, ou seja, não possibilitar mais
sepultamentos, as autoridades consideram que o cemitério não consegue mais
cumprir sua função como um aparelho dentro do sistema urbano. Daí a proposta de
sua demolição para construção da praça. Essa tem sido uma prática recorrente no
país. Referindo-se aos três primeiros cemitérios de Ribeirão Preto, Borges (2002)
coloca que nada restou deles, pois com a expansão da cidade foram
descaracterizados. “No lugar dos mortos, nasceram árvores e flores, construíram-se
fontes luminosas, coretos, enfim, praças onde a multidão de vivos se reúne para se
distrair e celebrar a vida”( BORGES, 2002, p.30). O mesmo ocorreu em Florianópolis
(SC) e em Pedro II (PI).
Em Campo Maior o cemitério Santo Antônio não chegou a ser demolido,
porque segundo Xuxa, a família Castelo Branco disse que enquanto for viva
ninguém destrói o cemitério. E também que se depender dela “ali ninguém mexe”.
106

Cabe aqui retornar o questionamento feito no segundo capitulo. A força de


sentimentos que mantém a preservação do uso da terra são sentimentos
compartilhados por todos ou sentimentos impostos pela classe dominante
difundidos e aceitos por todos?
Percebe-se na fala de Xuxa que embora a força de sentimentos pelos
entes queridos ali sepultados seja compartilhada por todos, é um grupo de pessoas
de prestigio econômico e político local que tem assegurado a permanência do uso
da terra como cemitério.

3.1.1 SEPULTAMENTO DE CRIANÇAS

Consoante a cultura material o número de sepultamentos de crianças em


relação ao número total de sepultados é pouco. Morais (2014) traz que dos 1040
sepultados 62 são crianças divididas em infantil e inocentes. Ela considera infantil
aqueles que possuem faixa etária entre 8 e 14 anos e inocentes os que estão entre
0 e 7 anos. “São chamados de inocente porque representam a inocência, a pureza,
deixam a vida sem terem adquirido os vícios e pecados do mundo. Desde o inicio do
século XIX, no Brasil, elas são chamadas de anjinhos” (MORAIS, 2014, p.53).
Destes 62, 19 eram infantis (2 do XIX e 17 do XX), 9 do sexo feminino, 8
homens e 2 não identificados. Dos 43 inocentes (5 do XIX e 21 do XX), 17 não foi
possível delimitar a que século pertencem, 3 deles por não possuírem nem data de
nascimento nem de falecimento, como também pela a abreviação de apenas os dois
últimos algarismos. Destes 43, 26 são do sexo feminino, 16 homens e 1 não
identificado.
Portanto predomina os sepultamentos de crianças do sexo feminino.
Tanto elas como os homens trazem nome de Santos. No Livro de Tombo da
Freguesia de Campo Maior N°1, 1883, verificou-se que a igreja intervinha na escolha
do nome a ser dado à criança no ato de batismo, recomendando que os pais o
retirassem de algum santo, pois deste modo elas teriam um protetor a mais. No
entanto nesta freguesia essa recomendação nem sempre eram seguida recebendo
as crianças nomes que as autoridades denominavam de fúteis e ridículos. Um
abuso, um hábito pagão que os vigários não poderiam permitir que se proliferasse.
Na tentativa de barrá-lo a Igreja determinou que tais nomes não seriam aceitos
quando fossem conferir a Santa Crisma.
107

Não obstante os registros de óbito mostram que só no século XIX a taxa


de mortalidade entre as crianças supera aquela que aparece no acervo do cemitério,
e que os mais afetados era o grupo dos inocentes. Lidera a causa da morte dos
pequenos a febre seguida de várias outras, entre as quais estupor, hidropesia,
ulcera no rosto, sarampo, espasmo, grangrena, esquicencia, sesões, dentição,
aneurisma, tumores, diarréia, vermes, asma, indigestão, convulsões, coqueluche,
veneno de cobra (entre as quais a cascavel), inflamação na garganta, queimadas,
paralisia, moléstia interior, pleuriz, escrófulas, coice de animal, queda e até mesmo
não mencionadas.
Reis (1991) referindo-se aos livros de óbito por ele consultado comenta
que essa expressão moléstia interior “era usada quando não se podia associar os
sintomas do moribundo a uma enfermidade conhecida, muitas vezes os padres
registravam um nome descritivo para a causa da morte”(REIS,1991,p.36).

Tabela 3: Registro de óbito - Sepultamento de crianças por


ano do século XIX
Ano Quantidade Inocente Infantil
1873 a 1883 50 49 1
1887 25 23 2
1888 32 31 1
1889 28 28 0
1890 30 29 1
1891 29 28 1
1892 20 19 1
1893 35 31 4
1894 29 26 3
1895 41 36 5
1896 48 46 2
1897 45 41 4
1898 27 23 4
1899 11 11 0
Total 450 421 29

Esses dados da tabela 3 só vêm reforçar a hipótese levantada na


presente pesquisa. Observem que já entre 1873 a 1883 a quantidade desse tipo de
sepultamento quase atinge a marca de 62, e é obvio que na lacuna entre 1883 até
1887 a mortalidade de crianças não deixou de ocorrer. Além de que a tabela não
apresenta os dados referentes ao século XX.
Entre os sepultamentos de inocentes do sexo feminino do século XX,
destaca-se o túmulo da menina Maria Lúcia Andrade (Figura 17.9) com altar, capela
108

e fotografia da falecida, “que recebe ex-votos 33, principalmente brinquedos, em maior


número bonecas. Foi o único que apresentou como rito o culto popular. Faltavam 14
dias para Maria Lúcia completar 8 anos de idade quando faleceu” (MORAIS, 2014,
p.54) A chamam também de “santinha da eucaristia” e “Lucinha”.
Soares (2013) ao estudar o processo de sacralização popular em torno
da alma milagrosa da menina defende que foram seus atos cotidianos em vida que
ajudaram na sua formação atual como alma milagrosa. Conta-se que ela sofria de
uma doença renal, mas sempre que podia, ou seja, assim que apresentava uma
melhora estava brincando com outras crianças na praça que ficava em frente a sua
residência, a Praça Bona Primo, onde hoje funciona a Academia Piauiense de
Letras. Também gostava de ajudar os outros, a todos que passava pedindo esmola
ela não negava assistência. Um de seus devotos era o senhor Octacilio Eulálio, a
quem é atribuída a expressão “Princesa de Campinas”. Seu túmulo é outro exemplo
de transformação cultural.

Figura 17: Transformações culturais no túmulo da


menina Maria Lúcia Andrade

Fonte: Acervo pessoal de Nara Carvalho Soares (2012) e


acervo pessoal de Jessica Gadelha Morais (2014 e 2015)

A primeira imagem é de quando seu túmulo e os ex-votos ficavam ao


relento, e a capela que segue nas outras imagens foi construída como pagamento
da promessa de um senhor caso sua mulher ficasse boa de um câncer. A capela é

33
O ex-voto é a consagração do voto. Ele da credibilidade ao poder do santo ou alma, pois as
oferendas são provas concretas, materiais desse poder milagroso.
109

de tijolo de seis furos com cobertura de madeira cerrada e telhas vãs.


Posteriormente as paredes foram “chaupiscada”, rebocada e pintada. A cor da tinta
foi escolhida a dedo, era necessário ser uma cor singela, daí um azul que remete a
cor do céu. Dessa forma os ex-votos estavam a salvo das intempéries, mas não da
ação de ladrões de túmulos. Na tentativa de inibir a ação destes foi colocado um
portão com a ajuda financeira dos devotos, mas não adiantou muito, pois metade da
grade já foi arrancada e boa parte das oferendas continua sendo saqueadas.
Anterior a colocação do portão outra medida já havia sido tomada na
tentativa de evitar os furtos. Dona Alcelina passou a guardar os brinquedos em sua
residência “repondo-os no dia da criança e dia de finados” (MORAIS, 2014, p.55).
Nesses dois dias as oferendas se multiplicam.

3.1.2 FOTOGRAFIAS CEMITERIAIS

A fotografia é um dos elementos presentes no cemitério que carrega uma


carga de representação da memória e da identidade da comunidade. Ela é a
memória na imagem, é uma fixação da lembrança. Leite (2001) em “Morte e
fotografia” aponta a foto como um desencadeador da reflexão psicológica. “ O tempo
fotográfico recompõe o tempo da memória, alheio ao tempo cronológico.São
instantâneos irregulares e arbitrários ligados e separados pelo
esquecimento”(LEITE,2001,p.44)
Depreende-se da afirmação da autora que a fotografia é a captura de um
momento significante capaz de agregar vários sentidos como cheiros, sons, e
sensações térmicas. A memória, através de lembrança de sentimentos e
percepções, possibilita a ligação com o tempo presente. Com ela você compartilha
momentos, pensamentos e ainda revela traços e hábitos. Em virtude de sua
reprodução ser polissêmica, ela é capaz de atingir os leitores em diferentes níveis da
percepção e das emoções.
De acordo com Soares (2007) os retratos fotográficos podem ser de dois
tipos: os retratos mortuários e os retratos cemiteriais. O primeiro constitui as
representações de pessoas já sem vida. O segundo dizem respeito a fotografias
realizadas em vida que passam a representar os corpos sepultados, elas são
usadas como elementos que adornam as sepulturas. Vale ressaltar que retratos
mortuários podem ser encontrados nos espaços cemiteriais.
110

Referindo-se aos retratos mortuários Koury (2001) coloca que eles


fizeram sucesso da segunda metade do século XIX até as décadas de 1930 e 1940.
Sua finalidade era retratar a face da boa morte cristã (associada ao sono,
expressando uma morte tranquila), as relações sociais por ela passíveis de serem
verificadas para a posterioridade (demonstração social do prestigio do morto e da
família de que fazia parte), revelar a emoção dos parentes próximo junto ao corpo do
ente querido que se foi e ainda o medo do esquecimento do passado que o morto
representa após sua morte. Esse tipo de retrato era realizado exclusivamente por
fotógrafos profissionais.
Com sua acentuada popularização dos anos 50 em diante ela chega a
todas as classes sociais e categorias sociais, os registros então deixam de ser feitos
exclusivamente por profissionais e em vez dele os amadores que passam a registrar
o cotidiano pessoal e familiar. Também se verifica nesse momento o declínio da
fotografia mortuária, que passa por uma reconfiguração, ou seja, sai do cunho
privado dos álbuns de família e passa a compor os santinhos, que são cartões de
agradecimento e para lembrança do morto, mas retratados em vida.
Ruby (2001) também se reporta aos tipos de fotografias mortuárias que
ela denomina de fotografias pós-morte nos Estados Unidos da América. Até 1900,
segundo a autora os fotógrafos profissionais anunciaram regularmente o trabalho de
retratar pessoas falecidas. E que pelo menos três estilos emergiram durante o
século XIX. Dois deles voltados para negar a morte, com a ideia de último sono e o
terceiro buscava retratar os mortos como um objeto de dor circundado por entes
queridos enlutados. Este terceiro estilo ela denomina de retratos funerais. Apesar de
tais serviços não serem mais anunciados, o costume de retratos pós-morte não foi
abandonado apenas circulam sob forma privada.
Com a atitude de tabu diante da morte, esses tipos de fotografias
ganham sentidos de morbidez, patologia ou de superstição. Independentemente se
do tipo mortuário ou cemiterial, “preservar memórias parece ser inquestionavelmente
uma motivação básica para a criação da fotografia”(RUBY,2001,p.105). A imagem é
algo visível que carrega o invisível e que pode ser velada pelo esquecimento,
revelada por novas lembranças e revelada pela memória alheia.
No cemitério Santo Antônio só foram encontradas as fotografias
cemiteriais, isso quer dizer que os sujeitos tiveram tempo suficiente para escolher
um dado momento para capturar lembranças significativas. Do acervo de 870
111

sepulturas Morais (2014) registrou 24 fotografias, todas elas do século XX. Uma com
local para fotografia e 18 possuindo fotos. Quatro destas 18 com 2 e uma com 3
fotografias, as demais apresentavam apenas uma. Quase todas estão gravadas em
placas de porcelana, revestidas por placa de metal e em bom estado de
conservação “O maior número de retratados são os homens (18), dois deles idosos.
Em seguida, estão as mulheres (5), 2 idosas e uma criança, a única de todo o
acervo fotográfico” (MORAIS,2014,p.56).
Se observa que o túmulo que Morais (2014) traz como o que tinha apenas
o local da fotografia, agora já a possui (Figura 17, número 219), e que com exceção
da 707, que está mais para pintura, o pano de fundo da foto está em tom
escuro(preto) ou claro(branco). A 707 é uma exceção porque não apresenta
tonalidade alguma, ela está mais para uma pintura. Para Borges (2012) pintura e
escultura também são tipos de retratos. E o retrato segundo Pesavento (2002) é
uma possibilidade de visão do real e não de fato o real, e que a representação do
mundo faz parte da realidade.
Quanto à tonalidade mencionada, escura ou clara, podem ser atribuídas
as fotografias realizadas em estúdio o que demonstra que ainda não havia a sua
popularização na cidade. O fotografo do estúdio criava um ambiente, palpitava na
pose a ser assumida pelo retratado. Na Figura 17(número 9) a expressão da menina
parece ser de desconforto, em vez do riso, sua face trás a feição do choro.
A propósito rir parece não ser habitual, pois predomina as expressões de
seriedade e feições jovens. Para Bellomo (2008, p. 22) “As fotos quase sempre
mostram os mortos mais jovens e saudáveis, forma de esconder a realidade da
morte”, assim, eles são lembrados eternamente jovens. A fotografia 730 em placa de
madeira vem acompanhada da inscrição que confirma a assertiva de Bellomo
(2008), ela diz: “Eu nasci no dia 01 de julho de 1942. Não envelheci porque Deus
não quis. No dia 26 de abril de 1967, ele me disse: permanecerás eternamente
jovem”. Nesse contexto chama atenção ainda a de número 150, em que o sujeito
faleceu com 54 anos, mas a fotografia que orna seu túmulo exalta sua aparência de
quando jovem.
A pose assumida pelos sujeitos é frontal ou de perfil o que indica pouca
liberdade para fazer o registro. O vestuário é pouco diversificado, se observa que o
vestuário masculino há predominância do terno em diferentes tonalidades, a
112

exceção é a fotografia de número 463, 676 e 730 que são roupas mais comuns. A
de número 676 também apresenta uma moldura comum comparada com as demais.
O vestido marca o vestuário feminino também com diferentes tonalidades,
com ou sem estampa. “Todas as mulheres usavam o cabelo preso, com exceção da
criança que o penteava solto e enfeitado com um laço” (MORAIS, 2014, p.57)
Os aspectos apresentados nas fotografias do cemitério Santo Antônio se
assemelham com as tipologias apresentadas por Rigo (2008), conforme esse autor
as fotografias cemiteriais são de oito tipos. De cunho social, étnico, de oficio, de
época, etárias, infantis, de casais e de família. Dessas só não se encontrou as de
cunho étnico e infantis.
As de cunho social são aquelas que apresentam tipos de roupas e
acessórios que identificam as pessoas de acordo com o status social, é o caso das
de número 150, 162, 166, 168, 455, 542, 636 e 707. As de ofício apresentam o
falecido com o uniforme de ofício, a foto da formatura ou praticando sua profissão,
como a que aparece na de número 421, reforçada ainda pela abreviação do termo
doutor (Dr.) gravada na própria imagem. Quando as fotografias inserem o individuo
no seu tempo histórico, ou seja, suas roupas, adereços e corte de cabelo tem-se a
fotografia de época. Estão nesse grupo as de número 219, 433, 556 e a 676.
Aquelas que indicam a idade aproximada do falecimento da pessoa são
denominadas de etárias, atendem essas características as fotos de número 9 e 730.
A de número 9 não é considerada como infantil, porque esse tipo de fotografia
apresenta crianças com seus brinquedos, com trajes de festas e até mesmo o
registro fotográfico de seu falecimento, o que não é caso da menina Maria Lúcia
Andrade. Como dito anteriormente, ainda nesse capítulo, ela faleceu quando iria
completar 8 anos de idade.
Nas fotografias de casais é comum eles aparecerem no dia do casamento
ou apenas lado a lado em uma mesma foto. No acervo fotográfico do cemitério
Santo Antônio não foi encontrado os casais no dia do matrimônio e sim apenas lado
a lado, com um detalhe que chama atenção, eles estão em molduras distintas. Elas
são observadas nas fotos de número 69, 446 e 546.
O último tipo é a de família, essa tipologia se refere às fotos que
representam a união e a estabilidade de uma determinada família. A forma como
elas estão dispostas, pode em alguns casos, representar uma perfeita árvore
genealógica. Nesse sentido estão as de número 454 e 463. Quanto essas tipologias
113

apresentadas cabe uma observação. A de que uma fotografia pode apresentar


aspectos que permita inseri-la em mais do que um tipo.

Figura 18: Painel de fotografias cemiteriais34 (século XX)

9 69 150

166
168

162

219 219 421

34
A numeração corresponde a aquela atribuída no momento do inventário
114

454

433 446

542
455

463

546 556 636

676 707 730

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014-2015)


115

Como dito anteriormente as fotografias são apenas um dos elementos do


patrimônio funerário. Além destes foram apresentados nesse capitulo os aspectos
arquitetônicos, o número de sepultamentos e sepultados, a distribuição e orientação
das sepulturas e de que forma a leitura desses aspectos informa os transeuntes.
Contudo assim como outras edificações da cidade, a exemplo da
Fazenda Tombador e o Museu do Couro, daqui a algum tempo o cemitério não
existirá mais, principalmente em decorrência das intempéries e da inércia daqueles
que por ele pode tomar medidas mais energéticas e concretas para moderar a ação
do tempo. Xuxa a sua maneira muito tem feito pela preservação deste patrimônio,
mas sozinha reconhece que não consegue muita coisa e por isso convida a
sociedade a aderir a sua luta, uma luta que é em prol da memória e da história. Sim,
o cemitério é uma excelente fonte histórica, porém em vias de destruição.
Comparada com as lápides os registros fotográficos estão em ótimo
estado de conservação. E são elas o foco do próximo capitulo.
116
117

4- CONVERSANDO COM AS LÁPIDES

Se a Arqueologia Histórica é apenas um dos diálogos possíveis que se


pode estabelecer com o cemitério, as lápides são apenas um dos seus elementos
com a qual o pesquisador busca conversar. E é a partir delas que é construído esse
capitulo. A lápide é uma laje tumular que contempla duas diferentes linguagens, a
imagética e a escrita.
A primeira se refere às gravuras que se apresentam em baixo ou alto
relevo35. Elas podem expressar as representações da morte, a confissão religiosa,
brasões de família ou ainda aspectos singulares dos sujeitos.
A segunda são os epitáfios entendidos como uma “inscrição tumular, a
palavra vem do grego, do prefixo Epi, que significa posição superior (sobre) e
Taphon que significa túmulo. Em latim era escrito Epitafhium” (MORAIS;
CARVALHO JUNIOR, 2012, não paginado). Eles podem ser palavras, frases,
citações bíblicas ou frases celebrativas do morto ou de sua memória. Tais inscrições
são encontradas tanto nas lápides como horizontalmente sobre a edificação erguida
(HERBERTS, 2011). O epitáfio expressa um desejo de recordar o falecido que deixa
de existir de forma física para ter uma nova forma de existência, na memória.
Carneiro (2012) diz que a memória é sempre seletiva, portanto as palavras
colocadas nas lápides passam por um filtro.

O espaço cemiterial, por conseguinte, é privilegiado para a expressão das


práticas identitárias, visto que a individualização das sepulturas e os valores
expressos nas mesmas demonstram o desejo de preservar a identidade e a
memória dos mortos, servem à demonstração e/ou transmissão dos valores
culturais e à própria reconstituição do sentido existencial para os que ficam.
Entende-se que o culto aos mortos passa por um filtro de percepção,
permitindo que somente os valores considerados essenciais pelos vivos,
para a recomposição do sentido da vida, sejam expressos neste espaço
(CARNEIRO, 2012, p.278).

As inscrições podem revelar um desejo do morto ou um desejo dos vivos


sobre o morto e em geral nelas são encontradas sempre as virtudes. Cabe ressaltar
que as inscrições podem retratar os ritos de passagem da vida: nascimento,
batismo, casamento e morte. Esses momentos da vida faziam parte do que Priori
(1997) chama de grandes ritos de existência no Brasil Colônia, que, juntamente com
35
O alto relevo é um processo que consiste em esculpir objeto desejado sobre o plano de fundo, do
qual ele se sobressai em relevo. As que se encontram em baixo relevo são aquelas que sobrelevam
muito pouco o plano que lhe serve de fundo.
118

pequenos ritos cotidianos, compunha o que a autora denomina de ritos da vida


privada, esta entendida como as questões ligadas a assuntos familiares e de
interesses domésticos.
Em virtude das informações que agregam, as lápides permitem
possibilidades de interpretação e reflexão em torno das distinções sociais, dos
estilos artísticos, dos aspectos religiosos e culturais e os sentimentos presentes
nestes espaços. Nesse sentido, serviu de subsidio para interpretação e reflexão aqui
feitas o trabalho de Claudia Barcellos Rezende e Maria Claudia Coelho intitulado de
“Antropologia das emoções” publicado em 2010 e o artigo “Pessoas, genealogias e
lugares mortuários: lógica de nominação, de distinção e de reconhecimento entre
elites brasileiras e portuguesas em cemitérios oitocentistas” de autoria de Antônio
Motta no ano de 2012. Além dos trabalhos já citados nos capítulos anteriores, entre
os quais o de Carneiro (2012), Bellomo (2008), Borges (2002) e Lima (1994).
O epitáfio tem conteúdo, sentido e sentimento (FOCHI, 2011). E é do
sentimento que abordam as autoras Rezende; Coelho (2010). Elas desnaturalizam a
expressão dos sentimentos como um equipamento biológico e inerente a espécie
humana, ou seja, as emoções como o amor, medo, raiva, ódio entre outras não tem
natureza universal, elas não provem espontaneamente do íntimo de cada um.
As autoras defendem que as emoções trazem a marca da cultura nas
quais as pessoas vivem e que as mesmas encontram suporte no corpo e nas
palavras. “No entanto, as palavras nem sempre são vistas como expressando de
fato o que o sujeito sente” (REZENDE; COELHO, 2010, p.24) o que reforça a
distinção entre uma forma de expressão de ordem social (normas para a expressão
das emoções em determinada situação) e o sentimento de natureza individual.
Quanto ao artigo de Motta (2012) aborda sobre duas lógicas de
sepultamento que teve recepção positiva em Portugal e no Brasil a partir de 1870. O
primeiro modelo é o túmulo de família que conheceu seu apogeu durante a segunda
metade do século XIX. Pode ser caracterizado como a nuclearização da família após
a morte. Nele o individuo abre mão de sua individualidade em prol de um sobrenome
da família é a linha paterna que determina a referência tumular.
A nuclearização expressa o desejo de unidade e de continuidade. O
principio que rege está lógica de sepultamento é reproduzir a hierarquia que deveria
reger as relações entre pai, mãe e filhos na casa. Importa o sujeito social genérico,
119

constituído a partir da referência a um antepassado ou a uma herança comum à qual


se liga através de relações com seus ascendentes e descendentes.
No entanto no início do século XX ocorre uma mudança na epigrafia
tumular, onde a família não desaparece, mas predomina o individuo “no túmulo
construído para um único individuo ou casa sobressaia o desejo de valorizar e
enaltecer determinados atributos da pessoa do morto, ocultando-se os indesejáveis”
(MOTTA, 2012, p.127). Trata-se do filtro de percepção de que Carneiro menciona.
Delineados esses aspectos que se inicie o diálogo com as lápides do
cemitério Santo Antônio.

4.1 LÁPIDES DO SÉCULO XIX

Como já citado no capitulo 3 as sepulturas do século XIX presentes no


acervo são 32, todas elas com epitáfios e com iconografias. Chama atenção a
concentração delas na parte posterior do cemitério, em especial no lado esquerdo,
com a quantidade de 26 do total de 32. Cabe lembrar que é na parte posterior que
estava localizada a capela e que posteriormente cedeu espaço para a cruz das
almas, sendo, portanto o local onde circulam mais pessoas. A proximidade com a
cruz das almas já é um indicio de distinção social, uma vez que ela valoriza o local
de sepultamento.
As lacunas do primeiro sepultamento (1804) para o último desse século
(1891), bem como a quantidade ínfima de sepultamentos realizados por ano (o
maior número observado é em 1895 com 4 sepultamentos) não permite estabelecer
uma analise das lápides a partir de recortes cronológicos como fez Lima(1994),
portanto o critério adotado é analisá-las individualmente através da divisão por tipos
de sepultamentos. Esses foram de três tipos: Sepultamento individual do século
XIX(28); Sepultamento coletivo do século XIX(1); Sepultamento coletivo mesclando
enterramento do XIX com o XX(3).

4.1.2 SEPULTAMENTO INDIVIDUAL DO SÉCULO XIX

Segundo Borges (2008, p.2) “as primeiras lápides sepulcrais normalmente


contêm no epitáfio dizeres sobre a história de vida da pessoa, sua condição social e
dados biográficos, completa a lápide com ornatos emblemáticos e florais” . As
120

inscrições que datam desse século no acervo do cemitério Santo Antônio não foi
diferente.
É recorrente os seus epitáfios serem introduzidos pelo termo “Aqui jaz os
restos mortaes”; “ A memória de”, “Aqui descança os restos mortaes”, “Na paz do
senhor aqui descansa os restos mortaes”. Seguem essas expressões o nome do
falecido (a), naturalidade, filiação, rito de nascimento, batismo, casamento e morte,
bem como o número de filhos obtidos do consórcio do matrimônio, inclusive algumas
especificando quanto destes sobreviveram. Dessa forma entende-se que “as lápides
falam e ajudam a contar histórias” (MORAIS, 2014).
Nem todos os termos listados aparecem de uma só vez em uma única
laje tumular, é a partir daí que se começa a selecionar o texto que nela será
“impresso”. Algumas lápides do século XX e os termos de óbito foram aqui utilizados
porque auxiliam a contar as histórias. Também se utilizou dos registros de
casamento e do de batismo, cujas sepulturas trazem os dados que possibilitam guiar
a busca em tais índices.
Nesse tipo de sepultamento verifica-se que a informação dos ritos de
passagem da vida são feitas através de numeral, escrita, e numeral (dia/mês/ ano).
Algumas incoerências foram observadas como pessoas casando antes mesmo de
nascer, e contradições entre a lápide e a documentação escrita para a data de óbito
e a idade com que a pessoa veio a falecer, bem como a idade com que contraiu o
matrimônio.
A lápide 539 (do ano de 1890) e 541(do ano de 1840) são exceções, pois
apesar de estarem incluídas nesse tipo de sepultamento já apontam para o uso da
cruz e da estrela para se referir respectivamente ao nascimento e morte do sujeito,
uma característica predominante do tipo de sepultamento que mescla enterramento
do século XIX com o XX.
O casamento quase sempre era um negócio (daí a palavra consórcio que
aparece em algumas inscrições) e raramente um ato de amor. Este segundo
Rezende; Coelho (2010) como motivação para casamento é uma invenção recente,
onde os sujeitos amam a quem querem e escolhem por questões de foro intimo seu
cônjuge. A palavra consórcio presente nas lápides demonstra que a escolha do
cônjuge estava atrelada a preocupação com o estabelecimento de aliança,
motivação típica das sociedades tradicionais. O ideal de matrimônio era aquele
121

“subordinado aos interesses econômicos de reprodução social do grupo, ao invés da


união conjugal por motivação afetiva” (MOTTA, 2012, p.127).
Os filhos era um legado da existência de seus pais. Ou não tinham
nenhum filho ou se tinham eram muitos, dos quais nem todos sobreviviam e dos
quais nem todos eram legítimos, ou seja, não eram reconhecidos como filhos
constituindo dessa forma uma família natural. Segundo Prado (1985) esse tipo de
família é composta “por mãe e filhos menores sem nenhuma ligação entre estes e o
pai biológico é o caso da quase totalidade dos animais” (p.38). A família natural,
portanto simplesmente reproduz indivíduos.
Pelo que se percebe o legado da existência por meio dos filhos fazia-se
através da mesma profissão do pai, do sobrenome do pai, que era dado também à
esposa quando o filho contraísse o matrimônio e aos netos frutos do matrimônio. E
claro da riqueza deixada pelo pai, ou seja, dos negócios da família. O casamento
endogâmico era uma tentativa de manter as relações de parentesco dentro do
próprio circulo familiar. “O que unia o homem e a mulher acima de tudo, era um
casamento que pudesse assegurar o patrimônio de ambas as famílias e não o amor,
o que explica a endogamia observada” (MORAIS, 2014, p.59).
O sobrenome derivado do pai era levado inclusive para a sepultura
confirmando a assertiva de Motta (2012) quando ele coloca que é a linha paterna
que determina a referência tumular. Esta “geralmente era determinada pela linha
paterna, transmitida aos filhos, netos e bisnetos, podendo o sobrenome vir gravado
muito discretamente ou visivelmente no frontispício do túmulo”(MOTTA,2012,p.119).
Dentre as profissões observadas predomina aquelas dedicadas as
patentes militares (Tenente Coronel, Coronel, Major, Alferes do Exercito, Capitão).
Alguns dos filhos homens que não seguiram profissionalmente os pais se dedicaram
a ser padre ou doutor, não se sabe se por livre e espontânea vontade ou por pura
pressão familiar. A filha ao que tudo indica era instruída para ter um bom casamento,
como preservar sua castidade para dar ao marido filhos legítimos, e uma educação
adequada para exercer seus papeis de esposa e mãe. Ao seguir tais instruções
podia ser considerada uma boa filha. Portanto, homem e mulher tinham papeis
sociais bem definidos.
Todas as inscrições revelam um desejo dos vivos sobre o morto. Ora nela
aparece às virtudes do (a) falecido (a) ora da pessoa que lhe dedicou à laje tumular.
122

Algumas das famílias citadas como natural da cidade Campo Maior até hoje são
tradicionais, como a Bonna e a Costa Araújo.
Também fica evidente a preocupação com uma vida após a morte,
reveladas através da constante súplica de oração pela alma do morto, sobretudo
através de um “padre” nosso e uma ave Maria. Talvez pelo fato de que “uma lágrima
pelos finados se evapora; uma flor sobre seu túmulo fenece; uma prece pela sua
alma recolhe-se a Deus” (Steyer appudy epitáfio do Cemitério Municipal de Rio
Pardo, 2008, p.75).
Essa preocupação pode ser traduzida como o medo do pós morte, bem
como o medo do esquecimento dentro do grupo social a qual pertencia. Sentir medo
faz parte do ser humano, mas medo do quê e de quem são fruto de circunstâncias
históricas e culturais. “O sentimento de medo surge associado a noções de perigo e
risco que ameaçam o individuo seja sua integridade física, sua autoimagem ou sua
posição social ou um determinado grupo social”(REZENDE; COELHO, 2010,p.37).
A sociedade do século XIX é, portanto uma sociedade patriarcal e sempre
preocupada com o gozo da vida eterna, para Prado (1985, p.67) “numa sociedade
pré-industrial, é inconcebível dissociar família e religião”.
Quanto às representações iconográficas predominam as cruzes nos mais
diferentes estilos. Em alto e baixo relevo, com flores e galhos floridos, perpassada
por foice, com anjos em sua volta, com coroa de flores. Além de anjos em alto
relevo, archotes voltados para baixo, ramos de flores em alto revelo.
A cruz perpassada por foice e os archotes segundo Lima (1994) são
representações escatológicas entendidas como representações que remetem a
consumação dos tempos. Elas são macabras e mórbidas. Nos cemitérios por ela
estudados essas representações aparecem entre 1850 a 1888, enquanto no
cemitério Santo Antonio elas aparecem somente em quatro sepulturas e datam
respectivamente de 1879,1899, 1926,1911 36. Quanto à representação da cruz para a
mesma autora tem uma conotação ainda medieval, utilizada para demarcar o local
do morto. Essa marcação segundo Reis (1991) funciona como um pedido de ajuda
aos transeuntes.
A partir de agora será abordada detalhadamente o diálogo com cada uma
dessas lápides onde é possível visualizar as características acima mencionadas

36
1911 é a data em que foi construída a edificação sobre o sepultamento.
123

para esse tipo de sepultamento. De início já se verifica uma incoerência quanto ao


rito de casamento.

Aqui jaz os restos mortaes de D. Maria Joaquina do Nascimento Casou-se


no dia 7 de janeiro de 1817 com o Tenente Coronel Honório Joze Nunes
Bonna de cujo consórcio teve 5 filhos faliceu no dia 15 d’outubro de 1893
com 73 annos de idade mãe extremoza e espoza dedicada A paz seja com
sua alma (LÁPIDE 4,1893)

Se ela faleceu com 73 anos em 1893 é porque ela nasceu em 1820, como
poderia ter casado antes de nascer?Para além desta contradição este epitáfio
menciona o nome do esposo, o Tenente Coronel Honorio Joze Nunes Bonna (lápide
47). Ele era natural da vila de Campo Maior, o ano de seu nascimento (em
dezembro de 1823) reforça a incoerência da data em que contraíram matrimônio.
Com ele teve cinco (5) filhos, mas apenas três (3) foram identificados: Antônio José
Nunes Bonna; José Nunes Bona; e Isaú José Nunes Bona.Como se pode observar
todos os filhos receberam o sobrenome do pai. Ela, no entanto, levou para a lápide
seu sobrenome de solteira. O sobrenome é um atestado de pertencimento a um
grupo familiar
O primogênito, tal como o pai, era Tenente Coronel, casou-se com D. Lina
Fortes Bona e permaneceram unidos até mesmo na morte, uma vez que estão
sepultados juntos (lápide 563). Deram netos a D. Maria Joaquina não se sabe
quantos. É ele que dedica a lápide ao seu pai, o Tenente Coronel Honorio Joze
Nunes Bonna(lápide 47).
Já seu filho José Nunes Bona com sua esposa Roza de Rezende Bona
deu-lhes três (3) netos: Maria; Lili e Raymundo. E Isaú José Nunes Bona que se
casou com Severa Amélia da Silva tendo com ela um filho, Esaú Bona.
Além do nome do cônjuge e do número de filhos do consórcio o epitáfio
exalta os feito da falecida em vida, sua qualidade de mãe e esposa. Orna a laje
tumular uma cruz em alto relevo com flores ao centro. Até hoje a família Bona faz
parte das famílias tradicionais da cidade.
À medida que os filhos vão contraindo matrimônio, ou seja, estabelecendo
novas famílias conjugais, adotam uma referência patronímica secundária, o que
explica a conservação apenas do Bona.
Outras inscrições são bastante simples como as encontradas na lápide
32, 70 e 85 onde se lê respectivamente
124

Na paz do senhor, aqui descansa o alferes do exercito Alvaro Furtado de


Mendonça casado com Dona Candida Furtado de Mendonça Fallecido a 18
de setembro de 1899 com 35 anos de idade em testemunha de sua eterna
saudade sua esposa lhe dedicou esta lapida(LÀPIDE 32,1899).

Aqui jazem os restos mortaes do Tenente Coronel Jose Higino de Souza


nasceu a 11 de janeiro de 1833 e falleceu a 9 de outubro de 1884[...] Pace
Amen(LÁPIDE 70,1884)

Aqui jaz os restos mortaes Abraham Lopes Teixeira nasceu em 1814 e


falleceu a 5 de abril de 1888. Era bom espozo e amigo fiel e dedicado
P.UM.P.N e uma Ave Maria(LÀPIDE 85,1888)

Entre as informações que constam na laje tumular 32 estão o nome da


mulher que tomou para si como esposa, que é quem lhe dedica a lápide, e cujo
sobrenome que aparece é o de casada, além da profissão do falecido. Para Dona
Candida a saudade não cessará, sua saudade é eterna e chega a ser uma espécie
de solidão marcada pelo sentimento de separação do outro. A saudade conforme
Rezende; Coelho (2010) é uma experiência emocional que fala da percepção de
uma falta, de uma ausência. É uma maneira de sentir e refletir sobre o passado.
Na laje aparece ainda uma cruz em alto relevo ornamentada com galhos
floridos.
A identificada com o número 70 é um exemplo de epitáfio que poderia ser
bastante simples se não fosse o termo em latim. A laje contempla os ritos de
nascimento e morte, a profissão, e no que diz respeito à iconografia há uma cruz em
baixo relevo. No gradil de ferro que a cerca tem detalhes pontiagudos nas quatro
extremidades. A grade, colocada em torno de sua sepultura “é a maneira encontrada
para resguardar o espaço individual, além de protegê-la contra invasores. Havia
também uma intenção eminentemente decorativa”(BORGES,2002,p.215).
Na última citação aparecem novamente os ritos de nascimento e morte
bem como a herança espiritual do morto traduzido nas palavras “bom” e “fiel”
exaltando as virtudes do morto em vida. Entre o papel de esposo e amigo, há uma
ênfase no segundo. A palavra “fiel” e “dedicado” demonstra respectivamente a
confiança e a doação ao outro. Também é uma peculiaridade desta inscrição a
súplica de oração feita através de um Padre Nosso e uma Ave Maria. Conforme o
registro de óbito ele era natural da Vila de Campo Maior e filho natural de Claudina
Maria da Natividade. Enquanto sua lápide silencia para seu estado civil, o atestado
de óbito traz que o mesmo se casou com Candida Maria da Natividade e faleceu de
febre aos 74 anos.
125

Assim como a lápide 70, essa sepultura é cercada por grades de ferro
fundido, com o diferencial de que em suas extremidades há vasos, também em
ferro, semicoberto por um manto. Quando vazio o vaso representa a separação
entre corpo e alma, quando coberto pelo manto representa a tristeza que o cobriu.
Foi encontrada também lápides com grafias e representação iconográfica
iguais.
Aqui jaz os restos mortaes de D. Elvina Fortes Castello Branco filha legitima
do Doutor Estevão Lopes Castello Branco e D. Archangela Fortes Castello
Branco.
Nasceu a 2 de fevereiro e baptisou-se a 25 de março de 1867 e falliceu a 11
de dezembro de 1869(LÁPIDE 410,1869).

Aqui jaz os restos mortaes de D.Angela Pia Fortes Castello Branco filha
legitima do Doutor Estevão Lopes Castello Branco e D. Archangela Fortes
Castello Branco. Nasceu a 5 de maio, baptisou-se a 18de junho de 1860 e
falleceu a 25 de novembro de 1872 (LÁPIDE 411,1872).

Essas duas lápides são de duas irmãs Castello Branco, posicionadas uma
do lado da outra e trazem exatamente a mesma ordem de informação. Filiação, rito
de nascimento, batismo e morte. Mesmo não sendo enterradas juntas em uma
mesma sepultura, houve a preocupação da proximidade de sua morada póstuma. A
filiação é um elemento identitário, isso implica dizer que ao citar o nome dos pais
expressa o desejo de perpetuar os vínculos parentais.Também contribui para essa
lógica de enterramento o fato delas terem falecido solteiras, ou seja, não
constituíram novas famílias conjugais.
Quanto ao batismo há em ambas a preocupação da realização desse
rito após um mês de nascida. Chama atenção ainda a abreviação “D.”
provavelmente de dona, o que lhes confere uma certa importância por serem filhas
de quem foram.
D.Angela era a filha mais velha, faleceu aos doze (12) anos de idade,
portanto compõe o grupo infantil do século XIX que repousa no cemitério. Quanto
D.Elvina, seu tempo de vida foi mais curto tendo sobrevivido até os dois (2) anos de
idade pertencendo ao conjunto dos inocentes. Seus pais não foram sepultados no
cemitério e não se sabe se eles tiveram outros filhos. Mesmo os pais não estando aí
sepultados foram referenciados nas lápides de ambas as filhas assegurando a
continuidade mnemônica da linhagem.
No cemitério Santo Antônio apesar dos membros da família não estarem
enterrados numa mesma sepultura constituindo o que Motta (2012) denomina de
túmulo de família há uma preocupação de colocar as sepulturas umas próximas das
126

outras assim como a de fazer menção a filiação na epigrafia tumular. A preocupação


de referenciar a filiação, em geral, aparece quando diz respeito à família conjugal, ou
seja, antes do matrimônio dos filhos. Com o casamento destes as lógicas de
sepultamento se alterava, pois com o estabelecimento de novas famílias conjugais o
que é gravado na lápide é o nome do (a) esposo (a) com o qual contraiu o consórcio
e os filhos dele obtidos. O tipo de filiação, legítima ou ilegítima, é um principio que
deve ser observado na lógica de enterramento.
Na lápide 412 se nota uma a preocupação da referência a filiação legitima
da falecida, “Aqui jaz os restos mortaes de D. Cornelia Julieta Patrazana filha
legitima de Jozé Joaquim gonsalves Patrazana e D. Jozepha Joaquina da Silva
falleceu com 23 annos de idade a 4 de outubro de 1887”(LÁPIDE 412,1887). Os
filhos legítimos eram aqueles concebidos dentro das relações conjugais, portanto
ilegítimos quando oriundos de relações extraconjugais. Os ilegítimos, em geral, não
são sepultados em túmulos de família e não carregam o sobrenome do pai.
Não há nessa data termo de óbito no livro de registro da paróquia.
Encerra a lápide uma cruz com flores no centro em alto relevo.
Semelhante as inscrições das lápides de D. Elvina e D. Angela na lápide
413 novamente o rito do batismo se faz presente assim como a preocupação de
realizá-lo o mais rápido possível quando do nascimento da criança.

Aqui jaz D.Ignez Hygina da Costa Araújo filha legitima do major Antonio da
Costa Araújo Filho e de sua mulher D. Angelica Borges de Lemos natural da
villa de Campo Maior da província do Piauhy nasceo no dia 12 de março de
1873 baptisou-se a 12 de junho do mesmo anno falleceo a 19 de julho de
1874 (LÀPIDE 413,1874).

Das três lápides que trazem impressas esse rito (410, 411 e 413) apenas
a 413 foi encontrada nos livros destinados a esse sacramento.
A lápide traz a filiação, o rito de nascimento e morte. E o registro
documental traz duas informações não contempladas na primeira que é o local onde
ela recebe os santos óleos e quem foram os seus padrinhos.

Aos doze de junho de 1873, nesta vila de Campo Maior, em casa de


residência do Major Antonio da Costa Araujo Filho baptizei e pus os santos
óleos a Ignez, nascida a 12 de março do dicto anno, filha do mesmo Major
Antonio da Costa Araujo Filho, e de sua mulher D. Angelica Borges de
Lemos. Foram padrinhos o Coronel Antonio da Costa Araujo, e sua mulher
D. Ignez da Costa Araujo. E para constar faço este assento que assigno. O
vig. Manoel Félix Cavalcante de Barros. (livro n°3-1871 a 1875)
127

Segundo o trecho acima a pequena recebeu o sacramento em sua própria


residência, e ao que parece foram seus padrinhos os seus avôs paternos. Sendo
seu nome uma homenagem a avó.
A representação iconográfica é rica. A lápide é circundada por um gradil
de ferro que possui uma cruz em ferro e dois anjos de ferro em suas bordas
inferiores em gesto de oração. Há indícios de que esses anjos estavam nas quatro
extremidades, sendo dois deles, muito provavelmente alvo dos ladrões de túmulo.
Na própria laje tumular se encontra a imagem de três anjos em alto relevo, dois
estão coroando o terceiro com uma coroa de flores. O anjo que esta sendo coroado
está sentado em algo semelhante a uma flor que brota.
As Lápides 415 e 416 são de marido e mulher que repousam um ao lado
do outro
Na paz do senhor aqui descança o capitão Antonio Jose da Costa casado
que foi com D. Anna A. Furtado de Mendonça falleceu a 8 de dezembro de
1885 com 50 annos de idade em testemunho de amor e gratidão seus filhos
padre Fábio J. da Costa Doutor Antonio J, da Costa Aqui collocaram esta
lapida Orai por elle(LÀPIDE 415,1885)

Aqui jaz D. Anna A. Furtado de Mendonça espoza do capitão Antoio Jose da


Costa falleceu no dia 30 de junho de 1879 com 35 annos de idade pede-se
um padre nosso e uma ave Maria pelo amor de Deus(LÀPIDE 416,1879).

Na primeira inscrição verifica-se a profissão, o nome de solteira da


esposa, a dedicatória feita pelos filhos do casal e súplica de oração pela alma. A
dedicatória é feita com base em dois sentimentos, o amor e a gratidão.
O sentimento de gratidão seria a expressão afetiva da aceitação desse lugar
de dívida, que é, em última instância, a aceitação de uma relação marcada
por uma hierarquia em que o sujeito entra em relação com alguém que pode
mais: daí a afirmação de que a gratidão teria um gosto de servidão
( REZENDE; COELHO,2010,p.90).

Na relação familiar quem podia mais sem dúvida era a figura do pai. Na
segunda inscrição (lápide 416), assim como a primeira aparece o nome do esposo, o
rito de morte e a súplica de oração dessa vez especificada, um padre nosso e uma
ave Maria. Ela faleceu primeiro que seu cônjuge e em sua lápide não consta
nenhuma dedicatória de seus filhos e esposo. Além dos dois filhos referidos, Padre
Fabio e Doutor Antonio, o casal também tiveram outro filho identificado nos livros de
óbito, trata-se de Alvaro que faleceu com dois (2) meses de idade.
Um aspecto interessante é que essa lápide é uma das poucas voltadas
para a cruz das almas. A iconografia presente é escatológica e em baixo relevo.
128

Nela há uma cruz com uma foice, e em volta de ambos uma coroa de flores
arrematado com uma fita. Nas laterais há arabescos que assumem uma forma de
flor de Lis. No gradil de ferro que a circunda há um vaso de ferro semicoberto por um
manto. De tão singular que é esta iconografia ela foi escolhida para ilustrar a capa
da dissertação.
Na Idade Média a morte comumente era representada por uma caveira e
um de seus atributos era a foice, com a qual ela ceifava a vida, e o cavalo sobre o
qual ela vinha a galope (PAIVA, 2002). Quanto às coroas de flores, segundo Borges
(2002) são indicativas de uma alegria divina, e comumente são empregadas para
representar a vitória da alma humana sobre o pecado e a morte. Elas podem ser
compostas de variadas flores como rosas, lírios, margaridas e azevinhas,
geralmente arrematadas por um laço de fita.
Para Dalmaz (2008) as coroas de flores podem ter dois significados. O de
salvação alcançada, representando assim a vitória sobre as trevas e o pecado,
como também pode ter o significado de saudade, por isso é utilizada com
recorrência nos funerais. Nesse caso da lápide 416 se acredita que elas
desempenham o simbolismo da saudade, pois se a vitória sobre as trevas e o
pecado tivesse assegurada seria desnecessária a súplica de oração. O vaso
semicoberto pelo manto reforça a idéia da saudade uma vez que ele representa a
tristeza.
A flor de Lis que aparece nas quatro extremidades da lápide pode ser
símbolo de poder, soberania, honra e lealdade, assim como de pureza de corpo e
alma. No simbolismo associado aos cemitérios ela significa chama, paixão e ardor.
Dessa forma a representação iconográfica pode ser interpretada como mais uma
vida cristã é ceifada deixando intensas saudades.
Na lápide 417, também voltada para a cruz das almas e cercada por
grades de ferro pontiagudo, se lê “D. Apolonia M.Ceza de Almeida Nascida em 20
de agosto de 1812 e fallecida em 17 de setembro de 1875. Seus filhos o D R Agisilão
P. da Silva e tenente Coronel Lisandro P. da Silva lhe erigiram esta lapide em signal
de eterna memória [...]christãos orae por Ella!(LÁPIDE 417,1875). Nela aparece
quem lhe dedica à lápide e a súplica de oração em um “tom” quase imperativo. O
marido não foi identificado. Dos dois rebentos do seu consórcio só se obteve
informação do Tenente Coronel Lisandro Pereira da Silva (lápide 38). Este se casou
com Ludgera Pereira da Silva (lápide 12) e com ela teve seis (6) filhos:
129

Amelia(encontra-se sepultada do lado do pai, lápide 37)); Francisca; Gastão (P E ) ou


Padre Gastão (encontra-se sepultado ao lado da mãe, lápide 11); Maria Augusta;
Julia; e Gustavo.
Nos livros de registro de óbito constatou-se que além desses seis filhos
legítimos, Lisandro também teve um filho natural chamado Manoel que faleceu de
febre com 5 meses. A mãe do pequeno Manoel chamava-se Ludgera de Macêdo
Costa, como se pode ver o primeiro nome dela era tal como o nome da mãe de seus
irmãos legítimos. Teve, portanto D. Apolonia sete netos sendo um deles ilegítimo.
Está gravada na lápide 418 a profissão, nome da esposa e a data em
que esta veio a falecer deixando-o viúvo. O número de filhos do casal também é
informado, inclusive são estes que lhe dedica à laje tumular. Nenhum dos cinco foi
identificado. A sigla P.N.A.M refere-se ao Padre Nosso e Ave Maria, portanto uma
petição de oração pela alma do morto.
Aqui descancao os restos mortaes do capitão Jose Ribeiro Franco de
Sampaio cazado que foi com D. Roza Lina de Sampaio enviouvou a 26 de
janeiro de 1893 e falleceu a 18 de novembro do mesmo anno, com 62
annos de idade, deixando de seu consorcio cinco filhos que lhe consagrão
esta campa em signal de eterna lembrança amor e respeito a sua memória
P.N.A.M(418,1893)

Ao contrario da laje tumular em seu atestado de óbito não consta


profissão e aponta que a época de seu falecimento ele tinha 64 anos ao invés de 62,
e que realmente era viúvo, apesar do nome de sua esposa está grafado de forma
diferente do que o informado. No livro consta de D. Rosalina de Oliveira Sampaio.
Natural do estado do Piauí José Ribeiro faleceu acometido com hidropesia de peito.
Acrescenta-se a parte gráfica o desenho de uma cruz em alto relevo. A dedicatória
em sinal de eterna lembrança, amor e respeito a sua memória se coloca inclusive
sobre o medo de esquecer.
De todas as lápides encontradas que remetem ao século XIX a lápide
420, voltada para a cruz das almas, é uma das mais completas no quesito
informação.
Jazigo eterno dos restos mortaes do Coronel Francisco José Teixeira filho
legitimo de Ricardo Teixeira e de D. Henriqueta Lúcia da Costa Teixeira
casado a 12 anos com D.Ursúla Maria de Santana Rita Teixeira deste
matrimônio sete filhos maiores que foi sempre bom filho optimo esposo
encomparavel pai sincero irmão amigo dos seus parentes ao mundo soube
respeitar é adorar a religião Nasceu a 28 de fevereiro de 1833 e falleceu a 2
de junho de 1899 As lágrimas da sua família pedem para a caridade da sua
alma um padre nosso e ave Maria(LÁPIDE 420,1899).
130

Aqui jazem os restos mortaes do T E CEL Manoel da Costa Teixeira era filho
de Ricardo José Teixeira D. Henriqueta Lúcia da Costa falleceu em 29 de
julho de 1894 com 34 annos de idade Dedica lhe esta em signal de profunda
saudade de sua esposa Marcia Teixeira. Orai por elle (LÁPIDE 422,1894).

Só na primeira citação se encontra a filiação, onde há a preocupação de


deixar estabelecida de que se trata de uma filiação legitima, o nome da esposa
seguido do sobrenome do marido e a duração da união, o número de filhos que
tiveram o casal, 7 no total todos eles sobrevivendo.Também fica explícita as virtudes
do morto nas diferentes esferas cotidianas (como esposo, pai,irmão, amigo, e na
religião) e a oração do padre nosso e ave Maria revela um preocupação com uma
vida após a morte. Em sua epigrafia tumular há predominância do individuo tendo
seus atributos valorizados e enaltecidos
Neto do ancião Ricardo José Teixeira, filho de Ricardo José Teixeira e D.
Henriqueta Lucia da Costa Teixeira. Sua tia, irmã de seu pai, era Maria Teixeira de
Souza Mendes que contraiu matrimônio com o Conselheiro Antonio de Sousa
Mendes. O Coronel Francisco José Teixeira teve como irmão o Tenente Coronel
Manoel da Costa Teixeira e como esposa D. Ursula Maria de Santana Rita Teixeira
com a qual foi casado 12 anos. Dos sete (7) filhos desse consorcio só se identificou
um que é Ricardo José Teixeira Neto. Este está sepultado juntamente a outras 5
pessoas que carregam como sobrenome o “Teixeira” e o “Castelo Branco”.
Além da parte escrita, a lápide também trás desenhos sendo eles uma
cruz em baixo relevo com flores (antecedendo os epitáfios) e dois archotes
entrecruzados voltados para baixo (sucedendo os epitáfios). Os archotes são signos
escatológicos, representam a vida que passa.
Distingue-se das demais por está abrigada em uma construção de
alvenaria que remete a uma casa e cuja cobertura é feita parcialmente com telhas
que possui o registro de fabricante chamada Olaria Veneza. A alvenaria se refere ao
processo de vedação da estrutura da construção por meio do uso de argamassa,
cal, cimento ou gesso. A este revestimento é possível a adição de pintura e texturas.
Seu acabamento é caracterizado como simplificado e barato, apresentando
vantagens de rapidez na execução e relativa resistência e variabilidade de formas e
concepções arquitetônicas.
O custo de mão de obra é baixo, visto que em geral sua confecção não
exige profissionais com elevado nível de qualificação, além de possuir processos
conhecidos e difundidos no país. No entanto, caso não seja executado em boas
131

condições de plasticidade, adensamento e cura, o revestimento em alvenaria pode


apresentar infiltrações, fissuras, corrosões e baixa resistência à tração. (CARNEIRO,
2012).
A construção que remete a uma casa na sepultura do coronel Francisco
José Teixeira é de tijolo comum, rebocado com cimento e caiado com cal hidratada.
Ela não comporta uma pessoa em pé. Também é válido frisar que mesmo o custo
da alvenaria não ser alto nem todos tinham poder aquisitivo pra isso, o que justifica a
predominância de sepulturas demarcadas apenas com uma pedra local (Figura. 19).
Figura 19: Sepultura demarcada com pedra local

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha (2015)

Sem nome e sem ritos da passagem da vida, o individuo abre mão de sua
individualidade, mas não de sua confissão religiosa, daí a incisão de uma cruz na
pedra.
A segunda inscrição (lápide 422) encontra-se na laje tumular do Tenente
Coronel Manoel da Costa Teixeira, irmão do Coronel Francisco José Teixeira. Ao
contrário do irmão não teve nenhum filho com sua esposa Marcia Teixeira.
132

Assemelha-se ao epitáfio anterior por trazer a filiação e a súplica de oração, apesar


desta não ser especificada.
Segundo o seu termo de óbito ele faleceu antes de sua mulher, D. Marcia
Avelina Teixeira, com 34 anos de idade cuja causa da morte foi uma sincope
cardíaca. O casal residiam em Teresina, no dia de sua morte ele estava na cidade
de Campo Maior.
Mesmo com o estabelecimento de novas famílias conjugais se mantém na
epigrafia a filiação, talvez com a intenção de avigorar as relações de parentesco e
rememorar o grau de prestigio social da família. Portanto, pai e filho, sobrinho e tio
jazem lado a lado.
Compondo as inscrições simples estão ainda as lapides 428, 441, 442 e
444. Na primeira a inscrição resume-se ao rito de nascimento e morte e dedicatória
da lápide “A saudoza memória de D.Carmina da Silva Patrazana nasceu a 17 de
junho de 1866 e falleceu a 21 de dezembro de 1895. Tributo de estima e veneração
de seu esposo uma lágrima de saudade sobre o seu túmulo (LÁPIDE 428, 1895).”
Em seu atestado de óbito consta que ela era natural desta freguesia, filha de Jose
Joaquim Gonsalves Patrazana e D. Josefa Joaquina da Silva. A cultura material
mostra que ela faleceu com 29 anos, em seu atestado de óbito consta 26 anos.
Ainda em vida casou-se com Francisco Figueredo da Silva Duarte. Ao que tudo
indica não tiveram filhos. A iconografia presente é uma cruz em alto relevo com
coroa de flores.
A de número 441 onde consta “A memória de Antonio da Cunha nasceo
no anno de 1818 e falleceu a 20 de julho de 1886 tributo de veneração da sua
espoza e filhos (LÁPIDE 441, 1886)” se apresenta de forma mais simples ainda,
apenas com a dedicatória da esposa e filhos, ambos não identificados. A parte
iconográfica trás uma cruz em baixo relevo.
Nas outras duas se lê “Aqui jaz os restos mortaes de D. Vircilina Furtado
de Azevedo nasceu a 29 de dezembro de 1893 e falleceu a 1° de novembro de
1895, filha legitima de Domingos Rodrigues de Azevedo e D.Celerinda Furttado de
Azevedo Uma lágrima de saudade (LÁPIDE 442,1895) e Aqui descança Custodio
José Albano que falleceu a 28 de outubro de 1889, com 74 anos de idade foi bom
amigo e exemplar esposo De sua mulher saudades Vitoria Clarinda
Trindade(LÁPIDE 444,1889).
133

A primeira revela uma preocupação de mencionar a filiação legitima. Seu


termo de óbito confirma o epitáfio, no entanto não cita sua causa de morte. Encerra
a lápide um ostensório com dois anjos ao seu lado. O ostensório é um objeto
litúrgico usado para a bênção do Santíssimo Sacramento e nele é colocada a hóstia
consagrada para a adoração de Jesus Cristo. Uma de suas características são os
raios, o que significa que a partir da hóstia, a luz de Cristo se espalha pelo mundo.
Comumente esse objeto é usado em duas ocasiões: na adoração ao Santíssimo
Sacramento e na festa do Corpus Christi. Retratado na companhia de anjos
remetem aos anjos da guarda e a santíssima eucaristia.
Os anjos sabendo o quão importante é para eles a Eucaristia, o
sacramento da nova e eterna aliança, não poupa esforços para garantir que o maior
número de fieis se empenhe vigorosamente no sentido de uma prática regular
sacramental. Os anjos da guarda, portanto chamam para que recorram ao
sacramento da reconciliação.
Na outra (lápide 444) aparecem às virtudes do morto quando em vida,
como amigo e esposo. Além da dedicatória feita por sua esposa. Completa a laje
tumular uma cruz com ramos de flores em alto relevo.
Como foi apresentado até o momento é perceptível que informações ora
se repetem ora se apresentam como novas, mas até que seja possível alcançar às
que se apresentam como novas é necessário antes muita conversa com as lápides,
seguindo as histórias que elas contam. É o que acontece, por exemplo, com a lápide
445 onde está gravado “Aqui jaz Maria dos Anjos da Soledade nasceu a 2 D. agosto
de 1802 fallecceu a 29 de março de 1871 Pede-se um padre nosso e uma ave Maria
pelo amor de Deus Homenagem de seu filho Antonio Maria Eulálio(LÁPIDE
445,1871)”.
Entre as informações que se repetem estão à súplica de oração, o padre
nosso e ave Maria. Quem lhe dedica à lápide em homenagem é seu filho Coronel
Antonio Maria Eulálio (lápide 466). Não se sabe se ele era filho único, mas foi o
único identificado. Ornamenta a laje tumular uma cruz em baixo relevo. Ela também
é circundada por um gradil de ferro onde aparece novamente um vaso semicoberto
por um manto em suas extremidades e cujo significado apontado é o de saudade.
O filho de Maria dos Anjos contraiu casamento com D.Josepha Maria de
Jesus Eulálio de cujo consórcio teve sete (7) filhos, mas apenas dois (2) foram
identificados. Um é o Coronel Antônio Maria Eulálio Filho (lápide 446) que se casou
134

com Maria Joaquina do Nascimento Eulálio e teve com ela duas (2) filhas, Maria de
Nazareth (lápide 429) e Alice Eulálio Alves (lápide 433). A primeira faleceu com 2
anos de idade, a segunda vingou e constituiu família, casou-se com Francisco Alves
Cavalcante e com ele teve quatro(4) filhas, Alice,Idalice,Isolete e Alyete(lápide 393).
Segue abaixo a transcrição do registro de enlace matrimonial de Alice
com Francisco Alves Cavalcante.

No dia vinte e dois de julho de mil novecentos e vinte e dois, nesta matriz,
feita as denunciações canônicas sem descobrir-se impedimento em minha
presença e das testemunhas, José Alves Cavalcante e João Cresostomo de
Oliveira e Flavio pereira de Carvalho receberam-se em matrimônio por
palavras de presentes, Francisco Alves Cavalcante, com vinte e quatro anos
de idade e D. Alice Eulálio, com vinte anos de idade. O nubente natural da
freguesia de S. Gonçalo da Batalha e ela desta freguesia onde são
paroquianos, filhos legítimos ele de Raimundo Francisco Alves e D.
Raimunda Alves de Menezes e ela de Antônio Maria Eulalio Filho e Maria
Joaquina do Nascimento Eulalio. E logo lhes dei as bênçãos nupciais. E
para constar, mandei fazer este assento que assino.
O vigário Conego gastão Pereira da Silva (Livro n°6).

Contrapondo a cultura material com o documento escrito verifica-se um


choque de informação quanto a idade com que Alice veio a contrair o matrimônio.
Apesar de em ambos aparecer a data de 22-07-1922 para tal rito, o vigário na hora
de redigir o assento de casamento deixa de forma explicita que a mulher ao se casar
tinha 20 anos de idade. Tomando como referência a cultura material, os dados
apontam para a idade de 27 anos. Os 20 anos pode ter sido um erro acidental ou um
erro proposital, uma vez que talvez não fosse de bom tom a nubente ser mais velha
que o seu marido. Da vida de casa ela pôde desfrutar 4 anos. Acredita-se que ela
tenha falecido em decorrência do parto de Alyete que nasceu e faleceu em
15/07/1926, tendo ela falecido em 30/07/1926.
O outro filho de D. Josepha e do Coronel Antônio Maria Eulálio é o
Capitão Fábio Maria Eulálio que se casou com D. Francisca Castello Branco Eulálio.
Tiveram doze (12) filhos vingando nove (9). Desses nove (9) apenas um foi
identificado. Trata-se de Fábio Maria Eulálio Filho que contraiu matrimônio com sua
prima D. Maria de Lourdes Eulálio.
Aos trinta de novembro de mil novecentos e doze, na matriz desta parochia,
feita as denunciações canônicas, sem outros impedimentos alem do de
consanguinedade em segundo grão simples da linha lateral, de que
foramdispensados, em minha presença e dos testemunhas Pergentino de
Lobão Veras e Moyses Maria Eulalio , uniram-se em matrimônio por
palavras Fabio Maria Eulalio Filho, com 22 annos e Maria de Lourdes
Eulalio, com dezenove annos, naturais e parochianos d’esta freguesia, filhos
135

legítimos, ele o Fabio Maria Eulalio e Francisca Castelo Branco Eulalio e ela
o Antonio Maria Eulalio Filho e Maria Joaquina Nascimento Eulálio, e logo
lhe dei as bênçãos nupciais, de que para constar fiz este assento, que
assigno. O vigr. Benedicto Portela Lima (livro n°50)

A nova informação que se apresenta é o casamento endogâmico. Note-se


através das informações constantes na lápide que Fabio casou-se com a prima aos
21 anos de idade falecendo cinco anos depois. No entanto, teve tempo suficiente
para perpetuar sua existência através da filha. Outra informação se repete a
diferença de idade entre a lápide e o assento redigido pelo pároco com que Fabio
casou-se, na lápide conclui-se que foi com 21 anos e no registro de casamento
aparece 22. O padre que deu a benção aos nubentes é o Benedito Portela Lima.
Confrontando o epitáfio “Aqui descança Aureliano Ferreira Mello falleceu
a 9 de julho de 1889, com 22 annos de idade. Foi bom amigo, optimo filho e irmão.
Saudades de sua irmã Maria Izabel do Nascimento(LÁPIDE 448,1889)” com seu
termo de óbito há algumas incoerências, a começar pela data de seu falecimento e a
terminar com a idade que faleceu. Natural da cidade de Campo Maior, filho de
Custodio Ferreira Mello, já falecido, e de Vitoria Maria do Nascimento, faleceu com
23 anos no dia 10 de julho de 1889, cuja causa da morte foi o estupor.
Solteiro, já sem pai, com uma mãe e uma irmã para lamentar a sua morte.
Um rapaz que em vida foi um bom amigo, ótimo filho e irmão, sendo sua irmã a lhe
dedicar a laje tumular. Esta além de palavras possui um ramo de flor em alto relevo
parcialmente destruída.
De igual forma que algumas das inscrições já mencionadas a 449 trás
dedicatória e a virtude de quem lhe dedica. “Aqui jazem os restos mortaes de Jozé
Félix Machado de Miranda fallecido a 1 de março de 1897, com 12 annos de idade
Manda lhe erigir esta lápide, em signal da mais viva saudade sua extremoza mãe D
Anna M. de Figueiredo (LÁPIDE 449,1897)”. Segundo seu atestado de óbito, ele era
natural da cidade de Parnaíba e morador desta cidade. A época de seu falecimento
seu pai Felix Dias de Miranda já havia falecido, daí somente sua mãe lhe fazer a
dedicatória. A lápide está toda ornamentada nas bordas com ramos de flores em alto
relevo.
As informações que se repetem podem ser vistas como aspectos que
marcam uma época como os dizeres presente na lápide 453
136

Aqui descança os restos mortaes do innocente Alarico Miranda Sampaio,


que nasceu a 20 de janeiro de 1894 e falleceu a 30 de novembro de 1895
filho legitimo do CapM . Benicio Ribeiro de Sampaio e D. Anna Roza de
Miranda Sampaio. Saudade. Não acordeis a tímida criancinha no seu
pequenino túmulo rizonho ditozo o que vive com esperança feliz o que
morre como um sonho (LÁPIDE 453, 1895).

Nela a família reforça a filiação legitima e há a preocupação de deixar dito


que ali repousa um inocente, uma tímida criança que faleceu com 1 ano de idade. A
morte do pequeno é encarada como um sono que ao mais pequeno ruído poderá vir
a despertar. A propósito o silêncio é próprio desses espaços onde jazem corpos
cujos corações não mais palpitam.
Em seu atestado de óbito consta que ele era natural da cidade de Campo
Maior, mas que ao contrário de seu epitáfio faleceu em 15/11/1895 com 1 ano e 10
meses. É um túmulo que imita uma pequena igreja e cujo material construtivo em
que foi esculpida foi a pedra. Ele está direcionado para a cruz das almas.
A lápide 460 onde se lê “Aqui descanção os restos mortaes de D.Lydia
Mendes de Oliveira. Fallecêo no dia 10 de setembro de 1896 O seu extremozo
espozo mandou erigir esta campa em signal de profundo respeito a sua saudoza
memória e eterna recordação REQUIESCAT IN PACE (LÁPIDE 460,1896)” chama a
atenção pelo fato da virtude exaltada ser de quem dedica a lápide e não da falecida,
no caso seu esposo. A expressão em latim lhe confere destaque, uma vez que é
pouco recorrente no acervo. A cruz com raios em alto relevo complementa a lápide.
Conforme seu termo de óbito atesta era o seu esposo o Tenente Coronel
Raphael Arcanjo de Oliveira. Ela filha de Joaquina Rosa de Oliveira, o nome do pai
não é mencionado o que leva a acredita que ela era filha natural.
A idade com que veio a falecer não é precisa, consta que ela tinha 50
anos pouco mais ou menos. Natural de Campo Maior, a causa de sua morte é
atribuída a inflamação nos intestinos.
Há um caso em que as virtudes também aparecem como ornamentos da
laje tumular é o caso da lápide 464.
Aqui descanção os restos mortaes de D. Raimunda baptista da Silva Moura
cazada que foi com o dezembargador João Gabriel Baptista de cujo
consorcio tiveram 16 filhos sobrevivendo-lhe 11. Nasceu a 24 de setembro
de 1855 e falliceu a 12 de julho de 1895 sendo cazada 28 annos e 6 mezes
e 4 dias. Seu espozo, mãe e filhos inconsoláveis lhe mandaram erigir esta
lapida prova da sua dor profunda. A terra lhe seja leve(LÁPIDE,1895)

No epitáfio estão presente o nome do esposo e o número de filhos do


casal, inclusive especificando quanto deles sobreviveram. Ao que tudo indica D.
137

Raimunda faleceu com 39 anos, e que se casou com 11 anos já que dos seus 39
anos de vida 28 foram de casada. Nenhum dos seus 11 filhos sobreviventes foi
identificado.
Quem lhe dedica a lápide é sua esposo, sua mãe e seus filhos,
lamentando profundamente a sua perda. Infelizmente seu termo de óbito não está
presente no livro de registro.
A virtude da falecida, mãe, esposa, filha exemplar, aparece nas bordas
(superiores e inferiores) e nas laterais (esquerda e direita) como “ornamentos” na
laje tumular. O gradil de ferro com detalhes pontiagudos que a circunda possui uma
cruz de ferro edificada.
A 465 é outra inscrição que trás a naturalidade. Ela é bem simples,
poucas são as palavras utilizadas para eternizar o morto. “Aqui jaz os restos mortaes
de Vespaziano José de Salles natural do Estado do Ceará nasceu a 12 de janeiro de
1869 e falleceu a 20 de junho de 1897. A terra lhe seja leve (LÁPIDE 465, 1897)”.
Filho de Graciano Jose de Salles e Luisa Fernandes de Araujo faleceu quando
estava de passagem pela cidade de Campo Maior, ele era casado com Maria
Procosia Chavier. Orna a laje tumular uma cruz em alto relevo.
Quanto à inscrição presente na lápide 502 é um mergulho em metáforas.
Aqui jaz a innocente Joanna Georgina da Paz filha legitima de Pedro
Gonçalves da Silva e Maria Ludgera da paz nasceu a 29 de agosto de 1893
e falleceu a 16 de abril de 1896 saudades de seus Paes e madrinha
Umbelina Augusta Ribeiro
As creancinhas de Deus estas rozas sem espinhos vão-se como uns
passarinhos n’um ai’nos dizem a Deus (LÁPIDE 502,1896).

Verifica-se uma preocupação em mencionar a filiação legítima e a


dedicatória. Conforme seu termo de óbito era natural de Campo Maior e faleceu com
2 anos e 7 meses por causa de uma febre. O contorno da lápide é feito com flores e
folhas em alto relevo.
Segundo Morais (2014) a expressão “As creancinhas de Deus estas
rozas sem espinhos vão-se como uns passarinhos n’um ai’nos dizem a Deus”
metaforiza a idéia de que os pais apesar de serem os geradores da criança, eles
pouco desfrutam do albor de sua existência, pois Deus logo as chama para seu
convívio. As rosa simbolizam o amor divino, sendo as rosas sem espinhos, portanto,
o amor sem pecado, reforçando a pureza e inocência infantil. Dos passarinhos as
criancinhas ganham as asas e tornam-se anjos. Pouco desfrutam de sua vida
terrena, ou seja, depois de um breve suspiro deixam a vida terrena para entrar na
138

vida eterna.Essa mesmo expressão destacada foi encontrada na laje tumular de


Maria Liodora.
Aqui jaz a innocente Maria Liodora da Paz filha legítima de Jose Francisco
da Costa e Angelca Odilia Setima da Paz. Nasceu a 27 de outubro de 1997
e falleceu a 22 de julho de 1901. Saudade e seus Paes madrinha Severa
Liodora da Paz.
As creancinhas de Deus estas rozas sem espinhos vão-se como uns
passarinhos n’um ai’nos dizem a Deus. E sua Irma Odilia da Costa.
(LÁPIDE 798, 1901)

A lápide de numero 502 está localizada na parte posterior esquerda do


cemitério, enquanto a de numero 798 está na parte frontal também do lado
esquerdo. Embora em ambas tenha a presença do sobrenome Paz, não foi possível
identificar se são parentes. No entanto, é notória que a 798 se inspirou na lápide
502, ajustando apenas o nome dos familiares.
Contudo, sem sombra de dúvidas entre as lápides mais simples deste tipo
de sepultamento estão a 539 “Jose Joaquim Avelino 7-1-1890 Saudade e gratidão
de seu filho [...] Avelino” que tem seus dados completados pelas informações do
termo de óbito. Natural do estado do Piauí e morador em Teresina era filho de
Joaquim Jose Avelino (falecido) e D. Senhorinha Antunes da Silva Avelino. Tomou
como esposa D. Josefina Candida de Moraes Avelino vindo a falecer com 74 anos
por padecimento crônico do coração. Sua laje tumular é em forma de papiro e
encontra-se fora do contexto original.
Idem a anterior a 541 se apresenta de forma bastante simples “Jose Luis
Cas[...] *13-4-[...] +5-8-1840 Lembrança de seus padrinhos Francisco Ferreira [...]”
sem no entanto contar com informações complementares. Orna a laje tumular uma
cruz com flores em baixo relevo.

4.1.3 SEPULTAMENTO COLETIVO DO SÉCULO XIX

Este tipo de sepultamento mantém as mesmas características do tipo de


sepultamento anterior, com a diferença de que a proximidade física das sepulturas
foi substituída pelo sepultamento coletivo, ou seja, passa a se ter a nuclearização da
família em um mesmo local de sepultamento.
O único sepultamento coletivo do século XIX traz a seguinte inscrição.
Aqui jazem os restos mortaes do capitão [...] Francisco de Almeida natural
do Estado do ceará fallecido em 22 de fevereiro de 1891 com 74 annos de
idade, e de sua espoza D.Paschoa Francisca de Almeida natural do estado
139

do Maranhão fallecida em 28 de agosto de 1896, com 72 annos de idade de


eternas saudades.Ora [..] por suas almas(LÁPIDE,1896)

Nela consta a profissão do esposo e naturalidade de cada um deles,


sendo ele do Ceará e ela do Maranhão. Apenas o atestado de óbito do marido foi
encontrado, nele além dos dados já informados pela lápide há ainda a menção a sua
filiação. Filho de Francisco Alves Almeida e Maria Vieira de Almeida faleceu em 22
de fevereiro de 1891 de hidropesia geral aos 75 anos, deixando-a viúva. Como se
pode ver há uma contradição entre as duas diferentes fontes consultadas. Encerra a
laje tumular uma cruz em alto relevo.

4.1.4 SEPULTAMENTO COLETIVO MESCLANDO SEPULTAMENTOS DO XIX


COM O XX
Já nesse tipo de sepultamento predomina a estrela e a cruz
respectivamente se referindo ao nascimento e morte dos sujeitos. Também aparece
escultura de santos e cruzes edificadas que vai substituído gradualmente às cruzes
e anjos em baixo e alto relevo. As biografias presente nas lápides do século XIX
(individual e coletivo) vão cedendo espaço para curtas palavras havendo o
empobrecimento das lápides como fonte de informação.
Entre este tipo de sepultamento está a lápide 110 onde se lê “ Aqui jaz
José Pedro da Costa *a 29-6-1864 +a 13-4-1931 Ernestina Roza de Brito + a 26-1-
1804 com 40 anos de idade. Lembrança de seu neto José Pedro da Costa Neto.
Antonio Silva Parnaíba”. Como já mencionado no capítulo 3 esse é o sepultamento
mais antigo, trata-se de um sepultamento coletivo, onde jaz a senhora Ernestina
Roza de Brito, que faleceu com 40 anos de idade, “com a data de seu falecimento e
a idade com que ela veio a falecer, é possível chegar a sua data de nascimento, que
é 1764. Ela assistiu uma Campo Maior como vila, mas não pôde vê-la elevada a
categoria de cidade”(MORAIS,2014,p.51).
O outro sepultado é José Pedro da Costa, provavelmente seu filho, uma
vez que quem lhe dedica á lapide é seu neto José Pedro da Costa Neto. Constam
ainda na laje tumular a dedicatória e a procedência da lápide. Outras do acervo, em
especial do século XX apresenta o local de onde vieram, como será visto logo mais.
Os outros enterramentos desse grupo dizem respeito a “José Ribeiro
Franco de Sampaio *14-10-1829 +18-11-1893 Carolina Rosa de Sampaio *17-9-
1892 +22-12-1956 (LÁPIDE 432). Em seu termo de óbito consta que José Ribeiro
140

era natural deste estado, casou-se com D.Rosalina de Oliveira Sampaio faleceu com
64 anos de hidropesia de peito. Há, portanto conformidade com o que diz o epitáfio.
Encerra esse grupo a lápide de número 435
Aqui jazem os restos mortaes de José Rodrigues de Miranda *11-10-1828
+8-3-1892, de sua legitima esposa D. Candida Rosa de Miranda,*27-2-1838
+1-5-1908 e de seu filho Luiz Rodrigues de Miranda.
*22-4-1876 +3-7-1948
Orai por suas almas
Este tumulo foi mandado eregir em 1952 pela viúva e filhos de Luiz
Rodrigues de Miranda.(LÁPIDE 435,1892-1908-1948)

Observem que permanece aqui uma característica recorrente nos tipos de


sepultamentos anteriores mencionados, que é a súplica de oração revelando ainda
uma preocupação com uma vida após a morte, pois ao contrário seria desnecessário
orar. Segundo a documentação escrita ele era natural de Torem, Reino de Portugal,
filho de Domingos Rodrigues de Azevedo e Maria Rodrigues de Azevedo. Morador
nesta cidade casou-se com D. Candida Rosa de Miranda. Faleceu de hidropesia
com 64 anos.
Outro aspecto interessante é a de que o termo legítimo se refere a esposa
e não aos filhos, como apareceu em outras lápides. No entanto se a esposa era
legítima consequentemente os filhos seriam. Também se verifica que mesmo Luiz
Rodrigues de Miranda tenha como estado civil o de casado, ele foi sepultado junto
de sua família de origem, ou seja, junto de seu pai e de sua mãe, reconstituindo e
atualizando simbolicamente sua casa, de identificação comum e de permanência e
reprodução post mortem do grupo.
Ornamenta o túmulo a imagem do sagrado coração de Jesus,
“representado em sua forma mais célebre, o Detém-te” 37(MORAIS,2014,p.66). As
esculturas são recorrentes no cemitério a partir da segunda metade do século XX.
Observem que o último sepultamento realizado foi em 1948 e que a construção do
túmulo só data de 1952.
Segundo Borges (2002) o sagrado coração de Jesus e o sagrado coração
de Maria são as imagens sacras mais populares na cultura brasileira. Em geral, elas
apresentam fisionomias serenas. Uma característica marcante dessas imagens são

37
Refere-se a uma milagrosa circunstância. Um jovem romano se alistou como combatente voluntário
para defender o papado nas guerras do século XIX. Antes de partir sua mãe lhe pendurou no pescoço
um pedaço de pano no qual havia bordado o Coração de Jesus com a cruz, a coroa de espinhos e as
chamas, assim como fora visto por Santa Margarida. No campo de batalha foi atingido por uma bala
no peito, mas nem o feriu! Ficou cravada na estampa do Coração de Jesus.
141

as mãos apontadas para o local do coração que está situado sobre a aureola,
símbolo da divindade e do poder supremo de Jesus e Maria.

Figura 20: Painel das representações encontradas nas lápides e grade de ferro das
sepulturas do século XIX( 1804-1889)

32

2 4

70

70 85

85 110 110
142

412

410 411

413 413

413

415 416 416

416

417 418
143

420 420

422

428

428 432

435 442

441

444 445

445
144

448 449 453

460 464

464

465

502 539

541

Fonte: Acervo Pessoal de Jessica Gadelha (2015)


145

4.2 “LÁPIDES” DO SÉCULO XX

A outra temporalidade presente no acervo é o século XX. Aqui as


inscrições não são encontradas somente nas lápides mais ainda em placas de metal
ou de alumínio ou ainda horizontalmente sobre o túmulo. Há ainda o caso de
sepulturas que não possui nenhum tipo de identificação e algumas que possui
apenas os dois últimos algarismos não permitindo situá-las precisamente em uma
das temporalidades apresentadas.
O acervo referente a esse século quando comparado ao período anterior
se apresenta de forma mais uniforme, embora se acredite que o número de
sepultados por ano tenha sido maior tal como o XIX. Há a presença de
sepultamentos de 1900 a 1978 quase que interruptamente. Sendo que não há
nenhum registro para 1907 e de 1970 até 1977. É na década de 40 que está o
número mais elevado de sepultamentos como evidencia a tabela abaixo.

Tabela 4: Cultura material do século


XX - Quantidade de sepultamento por
ano
1900-1910 25
1911-1920 32
1921-1930 45
1931-1940 58
1941-1950 73
1951-1960 54
1961-1970 56
1978 1

Em virtude desse século apresentar um número mais elevado de


sepultamentos seria cansativo e monótono descrever individualmente cada “lápide”,
daí a decisão de dividi-lo em 2 períodos, abordando os primeiros 50 anos e a
segunda metade do século. A princípio se pensou em agrupar as análises de 20 em
20 anos, mas atentou-se para o fato de que nesse recorte não é possível identificar
mudanças tão bruscas em relação as representações da morte. No caso de
sepultamentos coletivos de décadas distintas considerou-se a última data de
enterramento. Dessa forma foi estabelecido dois períodos de 1900-1950 e de 1951-
1978.
146

4.2.1 Período de 1900-1950

Os cinquenta primeiros anos do século XX trazem ainda


predominantemente características do século XIX. No entanto, há algumas
variações que acabam por se consolidar como proeminentes no período posterior.
Como exemplo das marcas legadas de um século pro outro estão às inscrições que
seguem estruturadas em inicio, meio e fim.
Marca o inicio a introdução com as expressões “Aqui descansa”, ‘Aqui
jaz”, “Repousa aqui”, “Jazido Perpetuo do”, “Aqui jaz a innocente”, “Na paz do
senhor aqui descança”, “Dorme aqui o derradeiro somno”, “Aqui descança a
innocente”,“ Descansam aqui os restos mortaes de”, “Dorme aqui o eterno somno”,
“Descanso eterno dos restos mortaes”, “Aqui dormem os restos mortaes do
innocente”, “Na paz do senhor”, “Repouso eterno”, “Aqui restos mortaes” , “Aqui” e
“Aqui para sempre adormece”. As visões de morte como se percebe vão desde a
ideia de um estado que poderá cessar, como o repouso, descanso e sono, até a
ideia da morte como o fim de tudo, daí a utilização dos termos “perpetuo” , “eterno” e
“para sempre adormece”.
No caso de sepultamento coletivo verifica-se a expressão “Aqui sepultou-
se também” e “Aqui jazem”, assim como a utilização das expressões já citadas.
Encerrando os dados biográficos de um individuo inicia-se a do outro, ou eles são
feitos de forma concomitante. Há casos em que a introdução da inscrição já se inicia
pelo nome do (a) falecido (a) ou simplesmente suas iniciais.
Contempla o meio a biografia do morto onde consta nome, profissão, rito
de nascimento, de casamento e morte, nome do (a) esposo (a), número de filhos,
filiação, naturalidade e virtude.
Dizem que não há música mais bonita aos ouvidos do que ouvir o próprio
nome. E até há, quando do nome fazem uma forma afetiva de chamamento, de uma
forma carinhosa de se comunicarem com seu amor, amigos ou familiares. É o caso
de José Siqueira Paz, o “querido Zezé” e de Elvira Maria da Conceição, a “Bobó”.
As profissões que aparecem no registro arqueológico desse momento são
a de coronel, capitão, padre, cônego, alferes, tenente coronel, médico e poeta.
Observa-se que todas as profissões identificadas foram atribuídas ao
gênero masculino, o que possibilita afirmar que a “profissão da mulher” é ser filha
147

prendada, bem instruída para exercer o oficio de dona do lar, sendo uma boa
esposa e mãe.
Não se sabe se aqueles que se dedicaram a vida religiosa, padre
Benedito e o cônego Gastão, o fizeram por uma inata vocação ou em cumprimento
de promessa da mãe religiosa que se apega as forças divinas para não perder mais
um filho. Bentinho, personagem da obra Dom Casmurro (1986) de Machado de
Assis é um exemplo clássico na literatura brasileira. Ele foi prometido por sua mãe,
dona Glória, ainda em sua tenra infância ao seminário caso sobrevivesse crescendo
sadio e forte.
Acontece que esse não era o plano traçado pelo jovem rapaz que desde a
infância através das brincadeiras se envolvia cada dia mais com sua vizinha Capitu,
aquela cujos olhos foram denominados pelo agregado José Dias como olhos de
cigana, obliqua e dissimulada. Bentinho a cada dia que se passava desejava tê-la
como esposa, constituir uma vida a dois, a três, enfim quantos filhos fosse possível
ter com ela.
O seminário foi uma ideia de Dona Glória e Bentinho nunca a teve
consigo. Dedicou-se as leis e fez de Capitu sua esposa como almejava. Quanto aos
filhos não tiveram muitos, tiveram apenas um, Ezequiel cuja filiação paterna é a
grande trama do autor. O epitáfio presente na lápide do seu suposto filho que
faleceu de uma febre tifóide e enterrado nas imediações de Jerusalém inquieta
ainda mais o leitor. A mesma diz o seguinte “ Tu eras perfeito nos teus caminhos”,
inscrição tirada do profeta Ezequiel, que na integra diz assim “Tu eras perfeito nos
teus caminhos, desde o dia da tua criação”. A conclusão fica por conta do leitor.
Quanto ao poeta trata-se de Moysés Maria Eulálio autor do Hino do
Glorioso Santo Antônio que anima anualmente os fiéis que acompanham a
procissão, ocorrida no dia 31 de maio, e entoadas durante as trezenas que se
encerram a 13 de junho. Para um Eulálio seu túmulo é simples, e se não fosse o
nome poeta antecedendo seu nome passaria despercebido entre outras sepulturas.
O rito de nascimento quase sempre aparece representado em numeral-
escrita-numeral e ora e outra já aparece antecedida por estrela (*) e representado
todo em numeral e precedido da letra N seguido de numeral. O rito de morte da
mesma forma que o de nascimento é em sua maioria representado por numeral-
escrita-numeral, também se verifica que já há uma tendência em representá-lo
através de cruz (+) acompanhada de numerais, assim como o não uso do rito de
148

nascimento em detrimento somente do rito de morte (numeral-escrita-numeral)


seguido da idade com que o individuo veio a óbito. E ainda precedido de F. seguido
de numeral.
No rito de casamento verifica-se ainda a preocupação da afirmação de ter
deixado um legado da existência, seja através da viúva de que chora a perda do
marido e, sobretudo através dos filhos, um detalhe é de que há uma preocupação
em deixar explicita a filiação legítima. Vale ressaltar que o número de filhos por casal
permanece alto e ao que parece o amor não era o principal responsável pela união
dos esposos, já que o ato de casar-se aparece através da palavra consórcio.
Entre as lápides que apresentam o rito de casamento está a de Horácio
Vieira da Rocha e D. Marciana Maria de Macedo, eles por infelicidade do destino
não tiveram filhos, só tinham um a outro para compartilhar de conquistas cotidianas
ou para chorar a perda daquele que partisse primeiro, tendo sido o seu Horácio.
Em contrapartida outros consórcios resultaram em verdadeiras proles
como o de Manoel Ignacio de Abreu e de D. Luciana Maria de Freitas que tiveram 9
filhos, o do Coronel Antonio Maria Eulálio e de D. Josepha Eulálio, sobrevivendo-
lhes 7 filhos, o de D. Rosa Gonçalves Lima e Luiz José do Valle que faleceram
deixando 6 filhos maiores, de Ludgera Pereira da Silva e Cel.Lysandro Pereira da
Silva, que tiveram igualmente 6 filhos, de Antônio Tito Castello Branco e de D.
Ondina Souza Castello Branco, sobrevivendo-lhes 5 filhos, de Alice Eulalio Alves e
Francisco Cavalcante que tiveram 3 filhas, e com esse mesmo número o de Jose
Nunes Bona e Rosa de Rezende Bona .
A palavra “sobrevivendo-lhes” indica que os números podem ter sido
ainda maiores uma vez que a quantidade indicada é em geral daqueles que
sobreviveram aos primeiros dias de vida. Talvez a taxa de mortalidade infantil fosse
alta impedindo que os pequenos vingassem. Quando a descendência legitima não é
especificada quantitativamente em geral ela aparece no plural, sob a expressão
filhos. É o caso do consórcio entre Silvino V. de Andrade e D.Anna Joaquina dos
Santos. Observando atentamente as inscrições verifica-se que há caso em que a
filiação aponta somente para o nome da mãe, o que significa que a filiação ilegítima
aparece de forma velada como o epitáfio que segue “Aqui jaz os restos mortaes de
Othilia Maria de Jesus filha de Mariana Rosa de Jesus”.
Também se constatou dois casos de adoção, o de Maria de Lourdes
Cardoso, filha de Maria , mas foram seus pais o Capitão Joaquim da Silva Cardoso e
149

D. Candida Marques Cardoso. Quem sabe esses fossem seus padrinhos e na


ausência da mãe tornaram-se seus pais. E o de José Ovidio que teve como mãe
adotiva Lina Monteiro.
Uma união baseada no consórcio não impede que o casal possa vir a ter
uma boa vida a dois, pautada na afetividade, respeito e até quem sabe o amor. Há
casos em que o laço de afetividade é tão extremo que com a perda do (a)
companheiro (a) o sobrevivente não permanecia vivo por muito tempo. É o caso dos
esposos Maria Esmerinda Furtado Livramento e o Alferes Antonio Alves Silva, ela
faleceu a 24 de janeiro de 1920 e ele a 25 de janeiro do mesmo ano. A ausência de
sua mulher foi tamanha que no dia seguinte foi juntar-se a ela.
Outro exemplo é o de D. Luciana Maria de Freitas e de seu marido
Manoel Ignacio de Abreu. Ele faleceu a 14 de julho de 1900 com 53 anos de idade,
casou-se com D. Luciana em 29 de agosto de 1867 com 20 anos de idade. Do
consórcio deixaram nove filhos extremosos. Seis dias depois do falecimento do seu
marido ela também veio a falecer.
Já os esposos Honório José Nunes Bonna e Maria Joaquina Nascimento
ao que tudo indica não tinham uma boa relação.

Aqui jaz [...] Honório José Nunes Bonna nasceu nesta cidade em dezembro
D’1823 casou-se com D. Maria Joaquina do Nascimento Bonna[...] quem
teve de sobreviver e fal[...] 3 de janeiro de 1902. Lembrança eterna Do seu
filho Antonio José Nunes Bonna Primo(lápide 47)

O trecho “quem teve de sobreviver” é o indicio de que eles não se davam


bem, de que o convívio era mantido pela indissociabilidade do casamento, não pela
inexistência da possibilidade, mas pela pressão social. Constatou-se na lápide de
dona Maria Joaquina que eles tiveram 5 filhos, mas observa-se na inscrição acima
que apenas um dos cinco manifesta o sentimento de perda pelo pai. A família Bona
Primo é uma das famílias naturais e tradicionais da cidade de Campo Maior, outras
naturalidades apontadas pelas inscrições pertencem a Lisboa, Oeiras, Santa
Quitéria e Sobral.
As virtudes nem sempre aparecem assim como nem sempre se restringe
ao (a) falecido (a). Estende-se também para quem dedica a lápide como a inscrição
que segue:
150

Aqui jaz os restos mortaes de Jose ferreira Calaça filho legitimo de Joaquim
Ferra Calaça e D. Maria Rosa Santos falleceu a 10 de abril de 1913 com 60
annos de idade deixando sua extremosa espoza Avellina Maria de Calaça
Orai por ele( Lápide 584)

Perceba que a virtude que aparece é atribuída a esposa e não ao marido


falecido. Em geral a mulher é retratada como “esposa exemplar e virtuosa, mãe
extremosa, dedicada e carinhosa”, ou seja, as virtudes desempenhadas por ela no
pacto de relação conjugal e materna. Ao homem além de sua condição de pai e
esposo aparece também a de filho. Dessa forma o homem é referenciado como
“bom esposo e extremoso pai”, “exemplo de bondade como filho, esposo, pae e
amigo sincero”, “exemplo de amor e virtudes viveu e morreu como um justo”. A
morte dignifica!

Dorme aqui o derradeiro somno quem se chamou entre os vivos Antonia


das Neves e Silva filha única de Raimundo das Neves e Silva já falecido e
de D. Justina Maria da Conceição ela nasceu a 14 de maio de 1876 e
falleceu a 10 de outubro de 1903 em pleno albor da existência, integrando a
terra o invólucro de um coração bemfazejo e a Deus um espírito Candido e
bom. Sua extremoza mãe derrama-lhes seu túmulo as lágrimas da saudade.
Orae por Ella.

O epitáfio acima contempla aspectos já abordados anteriormente (filiação,


rito de nascimento e morte, virtudes). Antonia das Neves e Silva, a única filha de
Raimundo das Neves e Silva e de D. Justina Maria da Conceição faleceu com 27
anos, idade considerada por sua mãe como sendo o albor da existência. Quando de
sua morte seu pai já havia falecido. Verifica-se uma distinção entre corpo e alma, a
matéria e o espírito, a terra coube seu coração bemfazejo e a Deus um espírito
candido e bom. A virtude presente refere-se tanto a falecida quanto a sua mãe que é
quem lhe dedica à lápide.
É a dedicatória, a súplica de oração e a procedência da lápide que
encerram em geral as inscrições desse período. A dedicatória é uma última
homenagem dos familiares e amigos, é um testemunho de afeto que não se encerra
com a morte biológica do ente querido. Ela aparece como prova da eterna saudade
dos filhos que choram a perda da mãe carinhosa, como prova da estima que ainda
lhe consagram, como tributo de grata afeição, amor e indelével saudade.
Expressam a saudade do esposo e dos filhos que perderam
precocemente a mulher esposa, mulher mãe e mulher filha. A dor dos pais que
perdeu prematuramente o (a) filho (a) e da madrinha que vê o desaparecimento de
151

seu afilhado. É uma saudade imensa, pungente, eterna, perenal e intérmina.


Contudo, a dedicatória é uma homenagem de amor e eterna recordação dos
familiares e amigos, preito de eterna amizade e viva saudade, apresentam-se desde
a forma mais simples como “Lembrança de seu filho” até as mais elaboradas como
“Sua esposa e filhos o pranteiam, gravam aqui a sua immensa e perennal saudade”.
A súplica de oração consiste em pedir aos vivos que orem pelo falecido
(a), pela alma dos que já se foram, dos que já estão ausentes no convívio diário.
Estão presentes no acervo as seguintes súplicas: “Orai por ella”; “Orai por elle”;
“Christãos piedosos orae por Ella”; “Orai pela sua alma”; “Fazei por elle uma prece a
Deus”; “ Na morte, seja a eterna paz o seu supremo gozo orae por elle”; “Uma prece
a Deus pelo bondozo e inesquecível parocho”; “P.N.A.M”; “Orai por Ella uma
prece”;P.A.M. Dentre elas uma se destaca das demais por estar gravada em
primeira pessoa. “Deste túmulo em que repouso, clamo e suplico-te que oraes por
min”.
A procedência se refere ao local de origem da lápide bem como o registro
de fabricante. Entre as lápides que possuem gravadas nela a procedência aponta
para a cidade de Parnaíba, para o estado do Maranhão e Pará.
Tabela 5:

Procedência das lápides


Estado Variação de nomes da marmoraria
Maranhão A.M. Gondim Rua do Sol 15 Maranhão;
Jen Godim Maranhão; A.M. Godim
Maranhão; A.M. Gondim Maranhão
Pará M. Luzitana-Pará; Marmoraria Luzitana
de A. Pereira dos Santos & F° Pará; M.
Luzitana Pará.

Parnaíba Antonio Silva Parnaíba

Figura 21: Procedência e registro de fabricantes gravadas na lápide


152

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

A ornamentação é outro aspecto que se assemelha com o século XIX. Há


uma profusão de cruzes em alto e baixo relevo acompanhado de coroa de flores,
galhos de folhas e flores, lápides com bordas ornamentadas com flores em alto
relevo. Cruzes edificadas, cruz com Cristo crucificado, e esculturas de santos e
anjos começam a aparecer de forma ainda tímida.
O Cristo crucificado é o Cristo morto também denominado de crucifixo e
simboliza o instrumento da salvação para os cristãos. Cristo ainda que morto
transmite serenidade (BORGES, 2002). Outra representação de Cristo encontrada
no cemitério Santo Antônio foi o Cristo em ascensão. Ela é uma das poucas
esculturas que integra seu acervo e é conhecida segundo os catálogos estatuários
como Cristo de Thorwaldsen, isso porque ele é visto como uma réplica de uma obra
do escultor alemão Bertel Thorwaldsen cujo nome é Cristo dando as chaves de São
Pedro.

Figura 22: Cristo de Thorwaldsen


153

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha (2015)

Cristo é representado já em sua fase adulta, sua face apresenta


expressão serena e o corpo um porte elegante. Os braços estão estendidos e
abertos num gesto de boas vindas. O panejamento todo drapeado cobre-lhes
apenas um dos ombros. Essa mesma réplica é encontrada nos cemitérios de Porto
Alegre e no cemitério Avenida da Saudade em Ribeirão Preto. Conforme Carneiro
(2012) ela é entendida como uma tipologia cristã que apresenta traços fisionômicos
serenos e panejamento que indica sobriedade.
A escultura da figura 22 orna a sepultura do Coronel Antonio Maria Eulálio
Filho. Foi esculpido em mármore branco, um material menos acessível
financeiramente, e possui parte dos dedos decepados. Carneiro (2012) coloca que
uma desvantagem desse tipo de material é a fragilidade nas extremidades, em
especial quando aplicados à confecção de estatuas, cruzes e adornos em geral,
porque pode lascar com muita facilidade e devido a alta porosidade também é
suscetível às manchas e opacidade.
Além da escultura ainda há nessa sepultura desse coronel duas (2)
fotografias, ao que tudo indica uma representa a ele e a outra sua esposa. O
interessante é que na epigrafia tumular não consta que sua esposa esteja sepultada
junto a ele.
Aqui jazem os restos mortais do Coronel Antônio Maria Eulálio Filho, que
em vida, foi um pai de família extremoso e um exemplo de austeridade,
154

fidalguia de trato e honradez. Nasceu a 8 de setembro de 1867, filho do C EL


Antônio Maria Eulálio e D. Josepha Maria de Jesus Eulálio Casou-se a 30
de novembro de 1889, com D. Maria J. Nascimento Eulálio. Faleceu a 24 de
março de 1937. Saudades e lágrimas de sua esposa e filhas. Orai por elle.
(LÁPIDE 446, 1937)

A epigrafia revela ainda os ritos de passagem da vida e que o mesmo


contraiu o matrimônio aos 22 anos de idade tendo falecido aos sessenta e nove
anos (69). Com quase 50 anos de casado, a morte não desfez a imagem do casal,
que é representado lado a lado através das fotografias. As virtudes do morto
abrangiam aspectos ligados a vida em família como o amor conjugal, bem como
aspectos ligados a vida em sociedade, apresentando inteireza de caráter,
severidade e rigor, um homem generoso e nobre, honesto e respeitado.
Encerra a inscrição a procedência e o registro de fabricante da lápide. E
de forma discreta apresenta o nome perpetua. Todos esses aspectos, esculturas,
fotografias, epigrafia tumular revelam o pode aquisitivo e o prestigio político e social
da família Eulálio. Aqui cabe retomar uma menção feita a esse sobrenome no
capitulo 2, a de que em 1930 o Coronel Antônio Maria Eulálio Filho era o fabriqueiro
da Irmandade de Santo Antônio, bastante elogiado pelo cuidado e zelo no asseio,
conservação e administração das coisas eclesiásticas e patrimoniais e o senhor
Octacílio Eulálio que foi procurador do patrimônio de Santo Antônio em 1942.
Alguns elementos ornamentais são menos freqüentes e chamam
atenção como o carneiro em alto relevo, coração com cruz, curral de carnaúba tendo
a sua volta a serra, campos e ao alto Cristo com seu sagrado coração, cruz sob
Bíblia e em sua volta estola, e as representações escatológicas da morte, que não
estão em grande número no acervo mortuário do Santo Antonio, aparecem
esporadicamente no final do século XIX e primeira metade do século XX e das
poucas que aparecem predomina os archotes direcionados para baixo.
A representação do curral de gado com Cristo ao alto é bem peculiar do
cemitério Santo Antônio. Ela faz referência a um dos ciclos econômicos da cidade.
Morais (2014, p.66) coloca que “aos olhos leigos, ela pode ser entendida como a
mescla entre o sagrado e o profano, é uma interpretação”. Entretanto, é mais
provável que o curral represente a prosperidade econômica de quem ali jaz e que as
conquistas econômicas é resultado do trabalho individual que conta com a proteção
de Cristo vinda dos céus.
Figura 23: Curral com Cristo ao alto
155

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha

Essa representação pertence à sepultura coletiva de Clemente Pires


Ferreira e a Lina Carolina Pires Ferreira que faleceram respectivamente em 1933 e
1934. O material usado na edificação do túmulo é o mármore branco, o que revela o
seu poder aquisitivo. Ainda como elemento de distinção social aparece a inscrição
em latim “Requiescant in pace”.
Uma das sepulturas cuja edificação aparece à representação
escatológica é de Jacob de Almendra Freitas, com archote voltado para baixo,
ampulheta alada e papoulas. A ampulheta segundo Borges (2002) é um tipo de
relógio primitivo, é o sinal de escoamento do tempo. Na arte funerária ela vem
sempre acompanhada de asas, símbolo da divina missão. Quanto as papoulas elas
têm uma propriedade narcótica daí a associação da morte com o sono.
156

Figura 24: Alegoria do principio cristão e sentimental

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

Figura 25: Archote voltado para baixo Figura 26: Ampulheta alada e papoulas

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Fonte: Acervo pessoal de Jessica


Gadelha (2014) Gadelha (2014)

Além dessas representações escatológicas está presente ainda a alegoria


de uma mulher chorando sobre o vaso, com uma expressão de profunda tristeza. De
acordo com Carneiro as alegorias são de dois tipos. Tem as de principio cristão que
expressam sentimentos religiosos, e as de principio sentimental que expressam
sentimentos humanos de forma mais sentimental. Entre as de principio cristão estão
o da oração, da morte e do juízo final. E entre as de principio sentimental estão o da
desolação, da esperança, da lembrança entre outras.
157

Figura 27: Desolação: Alegoria de principio sentimental

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2014)

A alegoria acima pertence a de principio sentimental, e denomina-se


desolação “ é uma figura feminina com o corpo debruçado sobre o túmulo com a
expressão de profunda tristeza e consternação” (MORAIS,2014,p.33).
Jacob era filho legitimo de João Manoel de Freitas e Mariana Delfina da
Fonseca Freitas. Nasceu em Lisboa a 3 de agosto de 1850 e faleceu em Campo
maior a 22 de julho de 1908. A edificação sobre seu túmulo foi construída a mando
de sua viúva Lina Leonor de Almendra e data de 1911. Dessa forma a mulher que
chora sobre o vaso pode seu uma representação de Lina Leonor que chora
desolada a perda de seu esposo.
Lina Leonor era uma das cinco filhas do consórcio entre Lina Clara
Castello Branco e Jacob Manoel de Almendra, ela era herdeira de muitas fazendas
entre as quais a Fazenda São Domingos de Campo Maior e com o casamento
ambos foram proprietários do último reduto da casa da torre no Piauí, a Fazenda
Abelheiras. Foram seus irmãos Jacob Manoel de Almendra Junior, Raimunda
Leonor, Antonio de Sampaio e Almendra (gêmeo com Inês Leonor), Inês Leonor e
Lina Leonor.
Os homens faleceram solteiros. Raimunda Leonor casou-se duas vezes,
primeiro com Fernando Aguiar com o qual teve como filho Fernando Antonio de
Aguiar Almendra. Enviuvando contraiu segundas núpcias com José Rodrigues de
Sampaio tendo com ele outro filho, esse chamado Luiz Mariz Sampaio de Almendra.
Segundo Silva (1991) ela faleceu em 13 de agosto de 1889 e encontra-se sepultada
no Cemitério São José em Teresina.
158

Inês Leonor casou-se com Raimundo Jose de Sousa Gaioso tendo com
ele dois filhos, Jacob Almendra de Sousa Gaioso e João Henrique Sousa Gaioso
Almendra falecendo no parto deste segundo filho.
Lina Leonor tomou para si a responsabilidade de cuidar de seus
sobrinhos, tornando-se, portanto seus filhos adotivos. Quando contraiu matrimônio
já contava com mais de 40 anos de idade. Por conveniência familiar casou-se com
seu primo, o já citado Jacob de Almendra Freitas que repousa no Cemitério Santo
Antonio. O casal não teve filhos legítimos.

Da Lina Leonor, a caçula da família, compadecida da sorte e da orfandade


dos sobrinhos, chamou para si a responsabilidade de criá-los com amor e
carinho. Deu-lhes esmerada educação e, quando se deu conta, lembrou-se
que ainda era solteirona, já passando dos quarenta anos de idade. Casou-
se mesmo assim , com separação de bens, visando salvaguardar o
patrimônio dos sobrinhos e filhos adotivos, com o primo Jacob Almendra
Freitas, português de nascimento e neto de D a Maria Francisca de Almendra
Freitas, irmã do padre João Manoel de Almendra. Casamento por
conviniencia familiar que não impediu a felicidade de ambos enquanto
vivera. Não deixando descendetes diretos Jacob e Lina legaram a imensa
fortuna dos Castelo Branco Almendra, compreendendo fazendas de gado,
casas de engenho, residências urbanas de aluguel e dinheiro, aos filhos de
adoção Jacob e João Henrique com exceção do quinhão destinado a
Raimunda Leonor de Sampaio Almendra (SILVA,1991,p.130).

Em visita programada ao Cemitério São José não se encontrou a


sepultura de Raimunda Leonor como afirmou Silva (1991), em compensação
encontrou-se a dos irmãos Jacob Manoel D Almendra e de Antônio Sampaio
Almendra, ambos sepultados juntos. Também se encontrou o de Jacob Manoel
D’Almendra, o pai dos cinco filhos aqui mencionados. Elas estão localizadas uma do
lado da outra e a edificação é idêntica a que está presente no Cemitério Santo
Antônio.

Figura 28: Sepultura no cemitério São José em Teresina-Piauí I


159

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha Morais (2015)

Observa-se que a cruz ao alto está ausente muito provavelmente em


decorrência de transformações naturais. Com exceção do epitáfio e da placa de
metal na base para fins de localização, transcritas ao lado da imagem, tudo é
exatamente igual.

Aqui jazem os restos mortaes de Jacob Manoel D’Almendra, commendador


da ordem de Christo e commandante superior da guarda nacional do
município de Campo Maior filho legitimo de Manoel Caetano de Carvalho e
de D. Maria José D’Almendra já falecidos natural da Freguesia da Trindade
Provincia Atraz os Montes do Arcebispado de Braga Reino de Portugal
nasceo em maio de 1796 e com idade de oito annos veio para o Brazil onde
chegou em 1804 em maio de 1820 desposou-se com D.Lina Clara de
Castello Branco de cujo consorcio deixou cinco filhos Falleceo no dia 24 de
agosto de 1859 tendo de idade de 64 annos incompletos

Christão fiel. Bom filho, esposo amante, pai extremoso, optimo amigo e
cidadão prestimozo sua alma dotada de tam nobres virtudes descance na
paz do senhor

Requiem eternam dona ei. Domine et lux perpetua luciat El requiescat in


pace( TRANSCRIÇÃO DA LÁPIDE.Bloco-01 QD-02 Seção- B cova-116 N°
5279/98)

O epitáfio traz sua trajetória de vida, de quem os gerou e onde foi


concebido, das terras por onde andava, das conquistas alcançadas, da mulher
160

desposada e da descendência deixada. Ao que consta foi um homem presente na


religião, soube ser um bom filho, pai, esposo, amigo e cidadão.
O outro exemplar encontrado está em perfeito estado de conservação,
mas em virtude de está próximo uma árvore a imagem frontal não permite uma boa
visualização.
Figura 29: Sepultura no Cemitério São José em Teresina-Piauí II

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)

Assim como mandou erigir edificação sobre o túmulo de seu esposo,


Dona Lina Leonor também o fez por seus únicos dois irmãos, em testemunho de
suas eternas saudades. A forma idêntica como eles se apresentam evidencia uma
identificação de família o que é reforçado pela inscrição de ambas as lápides.

Aqui repousão os restos mortaes de Jacob Manoel D’Almendra e de Antonio


de Sampaio Almendra, ambos solteiros. Naturaes desta província do
Piauhy, e filhos legítimos do commendador Jacob Manoel D’Almendra e
Dona linna Clara de Castello Branco Almendra. O 1° oficial da imperial
ordem da Roza e coronel commandante superior do município d’esta
capital.Nasceo a 12 de maio de 1828, e falleceo na Villa de Principe Imperial
D’esta mesma província a 12 de setembro de 1861.O 2° era bacharel
formado em direito pela faculdade do Recife, cujo grau foi-lhe conferido no
anno de 1856. Nasceo a 23 de novembro de 1829 e falleceo n’esta cidade a
10 de fevereiro de 1871. Bons filhos, irmãos extremosos, amigos sinceros e
dedicados e cidadãos prestimosos. Suas almas entre os resplendores da luz
perpetua gosemo premio dos predestinados.Requiem ae tornam donaeis
domine, et lux perpetua luceateis.Dona Linna Leonor D’Almendra irmã dos
161

illustres finados em testemunho de eterna saudade mandou erigir-lhes este


mausoleo em o annno de 1873.

Figura 30: Vista posterior das sepulturas encontradas no cemitério São José em
Teresina-Piauí

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)

A outra representação que mescla alegoria do principio cristão com o a de


princípio sentimental está presente no túmulo de Alice Eulalio. Trata-se de uma
figura que tem mais feições humanas do que angelicais. Numa mão ela segura um
archote voltado para baixo, com a outra mão levanta uma cortina, e abaixo desta
está à fotografia da falecida.
O archote significa a chama da vida que se apagou, quanto ao ato de
erguer a cortina dá tanto a idéia de passagem para o desconhecido quanto à ação
de lembrar. Segundo Leite (2008, p.121) quase sempre ela é representada por uma
mulher abrindo uma cortina, e atrás dessa cortina geralmente se encontram as fotos
do morto.
162

Figura 31: Morte e lembrança: alegoria do principio cristão e sentimental

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)

Sustentando a alegoria encontram-se quatro patas de leão. “O leão


representa a força, a firmeza, passando a mensagem de que os familiares e amigos
devem ser fortes mediante a perda do ente querido” (MORAIS, 2014, p.62). Diz-se
também que a pata do felino lembra aqueles que eram os responsáveis pelo
sustento da família, que agora vai precisar de um novo "Rei Leão". Acredita-se que a
simbologia de sustento presente na alegoria acima não tenha vinculo com o sustento
econômico, mas o sustento no sentido dos cuidados de esposa e mãe.
A mulher da fotografia é Alice, primeira dama da cidade por duas vezes
uma vez que seu esposo foi prefeito da cidade [....]..

A Alice, saudades de seu esposo e filhas, Maria Alice, Idalice e Isolete.


Repouso eterno de Alice Eulalio, Alves, filha do C EL Antônio Maria Eulalio
Filho e D. Maria J. N. Eulalio. Nasceu a 26-11-1894; casou-se a 22-7-1922
com Francisco Alves Cavalcante e faleceu a 30-7-1926. (LÁPIDE 433, 1926)

Em sua lápide o seu sobrenome de solteira é encontrado junto ao nome


que adquiriu com o casamento. O nome da filhas segue uma hierarquia assumida na
família, ou seja, são citadas da mais velha para a mais nova. Como demonstrado em
outro momento nesse capitulo o casal teve uma quarta filha, Alyete, que morreu no
mesmo dia e em decorrência de seu parto a mãe, Alice, também veio a falecer.
163

Das 24 fotografias encontradas no acervo, e já trabalhadas no capitulo


anterior, três (3) são da família Eulálio. Sua lápide foi uma das que veio de fora, foi
executada na marmoraria de A. Pereira dos Santos & F o no Pará.
Encerrando as alegorias do principio cristão está um anjinho deitado
sobre o túmulo e junto a ele um anjo com trombeta que representa a alegoria do
juízo final. Na crença cristã, a trombeta é um instrumento que no dia do juízo final ira
acordar os mortos para prestarem conta com Deus. “A sua imagem tem uma
referência direta com a narrativa do apocalipse bíblico, uma vez que é ao som das
trombetas que se estabelece o anuncio do juízo final” (DALMAZ, 2008, p.108).

Figura 32: Morte e juízo final: alegoria do principio cristão

Fonte: Acervo pessoal de Jessica Gadelha (2015)

Outras alegorias do principio cristão foram encontradas, mas estão fora


de contexto ou não possuem data o que inviabiliza afirmar que são da primeira
metade ou da segunda metade do século XX (Figura 32). Os anjos estão em gesto
de oração, a forma como eles a apresentam as mãos fizeram com que os mesmos
ficassem conhecidos nos catálogos estatuários como anjo espreme limão e segundo
Lima (1994) eles foram bastante comuns nos três padrões por ela identificados.
Ainda no que diz respeito a primeira metade do século XX foram
encontrados dois anjos que não se encaixam na classificação de Carneiro (2012).
Um se encontra alado com ombros e pernas a amostra. O outro também alado está
sentado com um livro aberto nas mãos. No túmulo onde este último anjo se encontra
também se verifica a presença de uma estrela. A estrela segundo Dalmaz (2008)
164

assume diferentes significados para a religiosidade cristã. Pode funcionar como


guia, representa os anjos das sete igrejas do apocalipse ou até mesmo representa
cristo.
Figura 33: Oração - Alegoria do principio cristão

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha

Figura 34: Outras representações do anjo na primeira metade do século XX


165

Fonte: Acervo pessoal de Jéssica Gadelha

4.2.2- Período de 1951 a 1978

Outrora as inscrições que eram feitas nas lápides ou gravadas


horizontalmente sobre o túmulo passam a ser feitas em placa de metal. Em virtude
de seu reduzido espaço comporta reduzidas informações sobre o morto. É o nome,
rito de nascimento e morte precedidos respectivamente por * e +, e dedicatória.
Praticamente as expressões introdutórias, biografias, e súplicas de oração
desaparecem. De maneira fortuita, ainda se vê a súplica de oração através de um
simples “Orai por ela”. Há, portanto em relação aos períodos anteriores um
empobrecimento textual onde os epitáfios são sucintos e breves, assim como hoje
são as visitas aos cemitérios.
No entanto os familiares e amigos diante de uma nova forma de se portar
em relação à morte e diante de tão reduzido espaço para gravarem algo, optaram
em prestar a seus entes queridos uma última homenagem, ou seja, a dedicatória.
Dessa forma incrustam ali que sua partida deixou imorredouras saudades de seu
esposo e filhos, uma eterna recordação e lembrança de amigos e familiares. A placa
com a inscrição aparece na cruz ou diretamente sobre o túmulo.
Os ornamentos em baixo e alto revelo dão lugar as cruzes edificadas,
imagem de santos e Cristo crucificado.

Figura 35: Suplicio de Cristo Figura 36: Placa de metal com inscrição

Fonte: Acervo pessoal de Fonte: Acervo pessoal de


Jessica Gadelha (2014) Jessica Gadelha (2014)
166

Figura 37: Detém-te Figura 38: Santa Teresinha

Fonte: Acervo pessoal de Fonte: Acervo pessoal de


Jessica Gadelha (2014) Jessica Gadelha (2014)

Figura 39 : São José Figura 40: São Francisco

Fonte: Acervo pessoal de Fonte: Acervo pessoal de


Jessica Gadelha (2014) Jessica Gadelha (2014)
167

Figura 41: Santo Antônio Figura 42: Túmulo em formato de caixão

Fonte: Acervo pessoal Fonte: Acervo pessoal de


de Jessica Gadelha (2014) Jessica Gadelha (2014)
168

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A área onde o cemitério está situado não possui nenhuma placa de


identificação, cemitério da Irmandade Santo Antônio ou simplesmente Santo Antônio
é como ele aparece referenciado nas fontes consultadas. A população local também
o denomina de cemitério velho em virtude do mesmo está fechado para
sepultamentos desde a segunda metade do século XX, mais precisamente em 1978.
Chaves (2013) aponta ainda a designação de cemitério São Vicente de Paulo, que
ele acredita ser sustentado por alguma lei municipal, embora não cite o que o levou
a levantar tal possibilidade.
Acredita-se que o nome São Vicente de Paulo possa ter tido inspiração
numa associação religiosa de mesmo nome existente na igreja matriz. E entre tantas
possibilidades optou-se por aquelas que as fontes mencionam.
Na cidade de Campo Maior houve uma singularidade geográfica da
morte, uma vez que não teve como local último a igreja (a não ser para alguns
daqueles que se dedicaram ao sacerdócio) como foi em outras localidades a
exemplo do Rio de Janeiro e da Bahia. Já desde 1804 o cemitério (da irmandade de)
Santo Antônio estava incrustado na paisagem da Princesa da Campinas recebendo
corpos e mais corpos cujos corações não mais palpitavam.
Indiscutivelmente lá jazem muitas histórias, desde as ditas até aquelas
que foram silenciadas. Tentaram por algum motivo enterrar definitivamente algumas
dessas histórias no ventre da terra, no silêncio contido na ausência dos epitáfios e
até mesmo na privação de uma sepultura permanente, o local de uma derradeira
memória.
Entre essas histórias ocultas, sonegadas e recônditas estão pessoas que
foram estigmatizadas como escravas pelo tom de pela escura e de tantas outras
pessoas que lá repousam no anonimato. A historiografia piauiense acerca do tema
da escravidão diverge quanto ao tratamento brando ou não que tais grupos
receberam. No contexto investigado os indícios fragmentados das fontes são
insuficientes para tomar um posicionamento da divergência citada, mas cabe
reflexão.
Os senhores aceitaram dividir espaço de morte com aqueles que em vida
foram seus subordinados, mas estabeleceram como critério a existência de um
muro, um marco de separação interna de onde jazeriam seus corpos. E quanto ao
169

fato de a grande maioria dos filhos da mulher escrava ser filhos naturais? Talvez os
pequenos fossem filhos ilegítimos dos senhores de suas mães, que a gosto ou a
contragosto deitaram-se com eles.
Também se verificou que havia uma lógica de sepultamento no sentido de
preservar a nuclearização da família, seja fazendo com que as sepulturas ficassem
próximas uma das outras seja sepultando a família conjugal numa mesma sepultura.
A falta de informação sobre o potencial informativo dos espaços
mortuários é um dos principais entraves para repensar o patrimônio funerário
piauiense. Somente com o esclarecimento sobre o tema é que o cemitério poderá
ser visto como importante fonte de informação para entender a atuação de várias
gerações e do processo histórico local. Dessa forma buscou-se na lápide fria o
pulsar da vida, o risco do epitáfio tornou-se risco de evidência, e o rito e a
iconografia de crença.
Não existe cidade sem passado, povo sem memória. O que há são
capítulos de história e estórias não lidas pelo simples fato de nunca terem sido
contadas. As lápides são então páginas de um livro não lido, em especial a do
século XIX e da primeira metade do século XX onde estão gravadas os grandes ritos
de existência (nascimento, batismo, casamento e morte) e a trajetória individual e
profissional de cada indivíduo e de sua relação com a história da cidade.
Notas sepulcrais, materiais empregados na construção tumular,
fotografias, ornamentos das sepulturas são reveladores de como a população
encara e representa a morte de pessoas próximas e como o morto é visto pelo grupo
familiar e social, além de poder-se ver a ideia de casamento, os modismos, as
relações comerciais, as profissões mais procuradas em uma época, a análise do
corpo por meio das fotografias, as expectativas médias de vida dos grupos:
homens/mulheres/crianças, ricos/pobres.
O casamento era quase sempre um negócio e raramente ato de amor. Os
filhos um legado da existência de seus pais, refletiam o status social e a crença da
família. O batismo uma dupla segurança para a mãe, a certeza de que a madrinha
em sua ausência faria seu afilhado seu filho e uma morte cristã ao filho que partiu
prematuramente. Somente um círculo restrito de pessoas tinha poder aquisitivo para
importar lápides de Parnaíba, Maranhão e Pará, o que justifica o predomínio das
covas simples com pedra local.
170

Constatou-se que na segunda metade do século XX as lápides


gradualmente vão desaparecendo sendo substituídas por placa de metal que pouco
“falam” dos que ali jazem. É nesse período também que os ornamentos de cruzes
com flores e galhos em baixo e alto relevo cedem espaço para cruzes edificadas em
sua maioria remetendo ao suplicio de Cristo assim como a consolidação de imagens
de santos, ainda que apareçam em pequeno número.
Entretanto quase todo potencial informativo do seu acervo material está
em vias de destruição: esculturas e lápides estão avulsas; partes de inscrições
ilegíveis; túmulos destruídos; imagem de santos e anjos deteriorados; estruturas do
muro por ruir. Para Herberts (2011,p.37) “é o rito ou o zelo que mantém vivo o
cemitério, que precisa mais do que sua arquitetura para sobreviver ao tempo”, nesse
aspecto o cemitério está bem vivo, pois não lhe faltam velas, flores naturais e
artificiais, ex-votos entre outros ritos.
A potencialidade e o estado de conservação ruim do acervo não é
exclusividade histórica do cemitério Santo Antônio. O que talvez seja sua
exclusividade histórica é que este agora possui seu acervo material preservado
através desse estudo aqui empreendido, diferentemente dos demais que continuam
a perder parte significativa de seus elementos e, dessa forma, suas histórias e
estórias vão sendo para sempre submersas a sete palmos do chão. Há ainda os que
estão no anonimato, nas veredas dos sertões piauienses.
É censurável que esse patrimônio histórico assim como a cidade já tenha
perdido boa parte do seu aspecto arquitetônico original e parte significativa do seu
acervo. Contudo, este trabalho é um importante instrumento de resgate e
preservação de uma significativa história de mais de um século.
171

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179

APÊNDICE

Relação de sepultados

IDENTIFICAÇÃO IDENTIFICAÇÃO DATA DE DATA DE IDADE


DA DO (A) FALECIDO NASCIMENTO FALECIMENTO
SEPULTURA (A)
1 Sem identificação _____ _____ _____
2 Francisco de Almeida/ 1817/ 22-02-1891/ 74 /
D.Paschoa Francisca de 1824 08-08-1896 72
Almeida
3 Padre Benedicto 06-01-1862 24-07-1918 56
Portella Lima
4 D. Maria Joaquina do 1820 15-10-1893 73
Nascimento
5 Ana Rosa Andrade 28-05-1840/ 18-03-1902/ 61/
Oliveira/ 14-06-1865 14-05-1958 92
Dina Adelaide Oliveira
6 Sem identificação _____ _____ _____
7 D. Ana Rosa de Andrade _____ _____ _____
8 Antonio Felix da Paz/ 17-03-1885/ 10-07-1964/ 79/
Maria da Luz do M. Paz 02-02-1892 15-08-1921 29
9 Maria Lucia Andrade 12-12-1938 26-11-1946 7
10 Severa Amelia da Silva/ 12-02-1854/ 05-08-1935/ 81/
Isaú José Nunes Bona 19-03-1892 12-09-1964 72
11 Padre Gastão Pereira da 16-08-1886 04-05-1944 56
Silva
12 Ludgera Pereira da Silva 26-03-1860 22-12-1932 72
13 Sem identificação _____ _____ _____
14 Genuina Andrade/ _____ 04-07-1948/ _____
Dionisia Andrade/ 12-08-1956
EllesbãoR. de Andrade/
Rosina O. Andrade/
Dionisia Andrade
15 Comerino O. Andrade/
Custodia R. Melo/
João Andrade
Antonio Andrade
03-11-1892 13-02-1961 68
16 Ana Roza Subrinha 24-07-14 22-05-33 18
17 Sem identificação _____ _____ _____
18 C.R.S _____ _____ ______
19 Joaquim Leite Pereira/ 10-11-1873/ 06-01-1967/ 93/
Alexandrina Maria de
Jesus Leite 20-02-1867 03-09-1954 87
20 Sem identificação _____ _____ _____
21 [...] da Maltade 1867/ 20-09-[...]/ _____
Oliveira/
Etelvina Monteiro de 18-04-1902 04-09-1966 64
Oliveira
22 Cornelio N. Rodrigues 14-09-1900 13-04-1934 33
23 Sem identificação _____ _____ _____
24 Jose Alexandre [...] 1839 28-08-1921 82
180

Pereira
25 Sem identificação _____ _____ _____
26 M.J.A _____ _____ _____
27 V.N.S _____ _____ _____
28 Acimara R.D’ Oliveira/ 06-03-1885/ 08-07-1925/ 40/
José R. da Silva
1875 23-03-1935 60
29 M.R _____ _____ _____
30 Aarão Ferreira de 11-10-1883 19-06-1950 66
Santana
31 Os dois irmãozinhos _____ 1911/ _____
Antonio de Padua 1915
32 Alferes do exercito 1864 18-09-1899 35
Alvoro Furtado de
Mendonça
33 Anizia Genuino de 11-12-1860/ 12-03-1904/ 43/
Oliveira Monte/
Sinfronio Olimpio do
Monte
26-07-1855 06-06-1944 88
34 D.Joanna Viana de _____ _____ ______
Noronha
35 R.F.A _____ _____ _____
36 Sem identificação _____ _____ _____
37 João [...] de Oliveira/ 27-01-1879/ 19-09-1957/ 78/
Amelia Pereira da Silva
15-07-1882 05-11-1927 45
38 CELLysandro Pereira da 27-09-1842 01-01-1919 76
Silva
39 _____ 29-12-1894 07-08-1924 29
40 Albertina Monte 13-04-1898 14-05-1940 42
Ferreira
41 Joaquina Delmiro de 1875 1937 62
Oliveira
42 Pedro Celestino Monte 19-04-1864 23-09-1963 99
Ferreira
43 Marcos Pereira de 07-10-1856 18-06-1909 52
Araujo
44 Eudoro Portella Lima 31-12-1873 17-12-1922 48
45 Anna Aurora Sampaio/ 27-07-1920/ 29-09-1943/ 23/
Joana Rosa da Silva
11-05-1861 21-08-1947 86
46 Sem identificação _____ _____ ______
47 Honorio Jose Nunes 12-1823 03-01-1902 78
Bonna
48 R.F.A _____ ______ _____
49 S.O.P _____ _____ _____
50 Luiz A. da Paz/ 22-05-1882/ 02-07-1922/ 40/
Maria Olinda M. Paz
29-07-1887 07-06-1958 70
51 Jose Almeida P[...] [...]-04-1924 [...]-09-1961 37
52 Raimunda Barros Uchoa 25-04-1926/ 31-08-1956/ 30/
Miranda/
Feliciana
_____ 19-04-1941 ______
53 Jose Antônio _____ _____ _____
181

54 [...] Alexandre [...] reira 1839 28-08-1921 82


55 Sem identificação _____ _____ _____
56 Herminia A. da Paz/ 24-12-1897/ 11-09-1965/ 67/
Candido de A.Paz
02-01-1943 27-03-1957 14
57 Sem identificação _____ _____ _____
58 Capitão Jose Thomaz 08-02-1849 [...]-06-1915 66
D’Oliveira
59 Deodata Maria Lustosa 07-11-1918 21-03-1937 18
60 [...] ymunda [...] 11-05-1866/ 31-05-1901/ 35/
mendes [...]/
Maria do Carmo
M.Moura/ 16-07-1876/ 15-09-1954/ 78/

Raimunda Candida de
D. Silva 07-11-1878 13-11-1957 79

61 Ana Joaquina dos 15-01-1845/ 18-10-1925/ 80/


Santos/
Maria Adelaide de 20-08-1848 25-01-1938 89
Andrade

62 Félix Machado dos 1887 30-05-1942 55


Santos
63 [...] _____ _____ _____
64 José Firmino Oliveira/ _____ _____ _____
Maria Floresta da Paz
oliveira/
Cap. Manoel Oliveira
65 Martiniano Alves 12-11-1916 04-08-1948 31
Ferreira
66 Jose Pereira do 30-10-1892/ 18-02-1964/ 71/
Nascimento/
Antonia Barbosa da
Silva 25-08-1918 02-10-1964 46
67 A mesma sua esposa _____ _____ _____
68 Sem identificação _____ _____ _____
69 Jose Felix [...] Pa[...]/ 28-02-1878/ 19-07-1958/ 80/

Vidvina de Araújo
18-09-1896 26-12-1965 69
70 Tenente Coronel Jose 11-01-1833 09-10-1884 51
Higino de Souza
71 Raimundo Valerio da 08-10-[...]/ 01-[...]-[...]/ _____
Silva/
[...] 17-08-18[...] 22-03-19[...]
72 [...] _____ _____ _____
73 Antonio Felix Barbosa/ _____ 1917 _____
Maria Benedita Saraiva
74 Sinha Pereira ______ _____ _____
75 a 77 Sem identificação _____ _____ _____
78 Maria [...] Santos/ 1874/ 20-03-1919/ 45/
Miguel de Souza _____ _____ _____
79 Lourenço Lopes Ribeiro 21-05-1864 04-04-1946 81
80 Sem identificação _____ _____ _____
182

N.A.C _____ _____ _____


81 Sem identificação _____ _____ _____
82 Capitão Antônio Jose de 24-04-1880/ 18-08-1929/ 49/
Oliveira/
[...] Lina de Oliveira 03-08-[...] 14-05-[...] _____

83 [...] _____ _____ _____


84 Sem identificação _____ _____ _____
85 Abraham Lopes Teixeira 1814 05-04-1888 73 ou 74
86 G.M.U _____ _____ _____
87 U.M.J _____ _____ _____
88 Maria Amelia da Silva 26-06-1881 03-01-[...] _____
89 [...] _____ _____ _____
90 Made Nazaré Souza _____ 13-07-1967 _____
Carvalho
91 Ana Rosa do Espirito _____ 20-12-49 75
Santo
92 Antônio Barbosa/ 23-07-1941/ 12-08-1941/ 20 dias/
Raimundo Barbosa 02-02-1945 02-01-1947 1
93 Antonio Conrado de 19-02-1885/ 28-12-1958/ 73/
Andrade/
Ana Oliveira Andrade/ 06-08-1897/ 26-08-1955/ 58/
Maria Jose Oliveira
Andrade 03-11-1924 29-08-1949 24
94 J.B.T _____ _____ _____
95 Idalina de Jesus Lima/ 18-01-1900/ 11-07-1927/ 27/
Maria Jesus Lima
19-09-1912 21-10-1925 13
96 A cerventinha _____ _____ _____
97 Sem identificação _____ ______ _____
98 Tem. José Joaquim de 19-11-1883 21-07-1938 54
Oliveira
99 Jose Francisco de Melo/ 03-07-1870/ 12-11-1928/ 58/
Maria Isabel de Melo
07-09-1876 07-06-1965 88
100 [...] _____ _____ _____
101 Horacio Vieira da Rocha 13-11-1859 24-10-1908 48
102 C [...] aricewiener/ _____ _____ _____
Riaevande
103 Sem identificação _____ _____ _____
104 Antonio B. Saraiva 03-07-1941 18-08-1941 15 dias
105 Isabel Leocadia da _____ _____ _____
Conceição/
Francisco Alves Ferreira
106 Manoel Peres de 28-10-1925 30-03-1944 18
Oliveira
107 [...] Leite Ibiapina 1909 04-11-1942 33
108 Filadelfia da Costa _____ _____ _____
Araujo/
Conrado de Araujo
Chaves
109 Francisco Conrado de 18-08-1893/ 01-09-1952/ 59/
Araújo/
Isaura Maria de A. 26-02-1945 15-11-1964 19
183

Guerreiro
110 José Pedro da Costa/ 29-06-1864/ 13-04-1931/ 66/
Ernestina Roza de Brito
1764 26-01-1804 40

111 [...] _____ _____ _____


112 [...] _____ _____ _____
113 A.F.A 1877 1938 60 ou 61
114 Francisco [...] Assis [...] _____ 28-02-[...] 68
115 M.F.F _____ _____ _____
116 Raimundo da [...] [....]/ [...]/ _____
Araujo/
Agostinho [...] Costa/ _____ _____
Maria José de [...]
117 [...] 1868 24-02-1942 73 ou 74
118 Cacimira R.D. Oliveira/ 06-03-18[...]/ 08-07-1923/ _____
Jose R. da Silva
1875 23-03-1935 60
119 Maria da Paz 1920 23-03-1951 31
120 Sem identificação _____ _____ _____
121 A inocente Marlúcia de _____ _____ _____
Miranda Paz
122 Maria Cordeiro da Silva _____ _____ _____
123 R.M.I/ _____ _____ _____
J.A.I
Arsênio Delmiro de 29-08-1896 03-12-1966 70
Oliveira
124 Ivonete Teixeira da Silva _____ _____ _____
125 Joaquim da Silva _____ _____ _____
126 J.P.Z _____ _____ _____
127 [...] Portela[...] _____ _____ _____
128 Sem identificação _____ _____ _____
129 [...] _____ _____ _____
130 José Alves do _____ _____ _____
Nascimento
131 A.M.W _____ _____ _____
132 a 133 Sem identificação _____ _____ _____
134 Osires Bona 27-07-1907 06-04-1944 36
135 Eremita Roza de Melo 1871 19-05-1918 47
136 D. Thereza Ferreira de 1876 08-12-1920 44
Jesus
137 Fernando T. Sampaio 08-06-44 20-06-44 12 dias
Neto
138 Joaquim de[...] _____ _____ 7
D’Oliveira Carvalho
139 a 140 Sem identificação _____ _____ _____
141 M.J.E _____ _____ _____
142 Sem identificação ______ _____ _____
143 José Lopes Castelo 20-03-86 03-03-52 _____
Branco
144 Joaquim da Silva 07-09-21 24-07-1949 ____
145 José Rodrigues de 10-02-1900 15-04-1940 40
Moura
146 I.M.S _____ _____ _____
184

147 Raimunda NonataPeris 24-02-2[...] 19-09-46 _____


148 Maria Joaquina de 08-10-1848 17-08-1943 94
Sousa
149 Maria [...] _____ _____ _____
150 José Leite Pereira 14-12-1896 09-12-1956 59
Subrinho
151 Luiz Moraes de Abreu 13-12-1925 [...] 1939 13 ou 14
152 [...] _____ _____ _____
153 Cecilia Melo 23-04-1888 05-03-1947 58
154 Ruy Tito de Oliveira 29-01-1906 19-12-1928 22
155 Alcangela Delmiro de 08-05-1900 13-01-1936 35
Oliveira Valle
156 A.J.P _____ _____ _____
157 Sem identificação _____ _____ _____
Pacifico Fortes/ _____ _____ _____
Julio Chaves Bona
158 Cristina de Andrade 22-08-1895/ 11-06-1964/ 68/
Melo/
Dalila de Andrade Melo 11-04-1901 03-11-1945 44
159 Maria Portela Costa 06-06-1880 31-12-1933 53
160 Raimundo de Lima 04-04-1879/ 10-07-1947/ 68/
Ibiapina/
Adelina de Lima 18-01-1869 28-12-1931 62
Ibiapina
161 Porfírio Veras _____ 05-01-1944 _____
162 José Cardoso de Lima 19-09-1909 13-01-1963 53
163 A.A.A.N _____ _____ ____
164 Josefa Francisca do 19-09-1915 29-09-1946 31
Nascimento
165 M.R.C/ ______ 13-11-44 _____
S.F
166 Antonio Siqueira Paz 13-06-1916 08-08-1946 30
167 Maria Marques Ferreira _____ 17-11-[...]47 _____
168 José Siqueira Paz 20-07-1919 26-03-1949 29
169 Francisca Nogueira 27-02-1906/ 17-02-1950/ 43/
Cruz/
Cícero Freire Cruz 10-11-1896 22-11-1968 72
170 A.F.S _____ _____ _____
171 A.S.D/ _____ _____ _____
Francisca B. de Melo
Filho 21-12-56 28-12-56 7 dias
172 Z.M.R _____ _____ _____
173 Sem identificação _____ _____ _____
174 [...] Maria Balbina _____ _____ _____
175 [....]/ _____ _____ _____
F.F.L/
R
176 Sem identificação _____ _____ _____
177 J.S.S.N _____ _____ _____
178 Luiz Rodrigues Freire 21-07-1873 06-08-1964 91
179 Sem identificação _____ _____ _____
180 Maria Rodrigues Pereira 25-09-1918 18-04-1965 46
181 M.P.S _____ _____ _____
182 Manoel Hermogenes 19-04-1895 10-11-1954 59
Vasconcellos
185

183 Edmar Vaz Muniz 29-01-1944 24-12-1953 9


184 Sem identificação ______ ______ _____
185 João Peres da Cunha 27-12-1892 23-09-1956 63
186 Sem identificação _____ _____ _____
187 Joana Lina de Deus 27-01-1884 30-03-1963 79
Carvalho
188 Sem identificação _____ _____ _____
189 Jose Bandeira da Rocha 10-02-1911 29-05-1985 74
190 a 191 Sem identificação _____ _____ _____
192 O.C.A/ _____ _____ _____
A.L.C.A/
J.F.C
193 Sem identificação _____ _____ _____
194 Aristides da silva Braga _____ _____ _____
195 M.J.A/ _____ _____ _____
Francisca da Silva
Braga/
Ursula Maria A. da
Silva/
Ursula Rosa A. da Silva/
Maria Jose Aragão
196 Sem identificação _____ _____ _____
197 Maria Gomes de Souza 22-08-1902 07-12-1939 37
198 Sem identificação _____ _____ _____
199 R.N.A _____ _____ _____
200 Sem identificação _____ _____ _____
201 Antonio M. da Silva/ _____ _____ _____
Antonio J. da Silva
202 Sem identificação _____ _____ _____
203 [...]/ _____ _____ _____
Onofre R. Oliveira
204 M.J.T _____ _____ _____
205 F.P.S/ _____ _____ _____
M.A.S
206 [...] elianoFrancisco[...] 01-05-18[...] 14-08-[...] _____
207 Ciro da Silva Braga/ 04-07-1889/ 08-02-1956/ 66/
Suely Maria S. Braga
28-01-1958 21-09-1958 7 meses
208 Sem identificação _____ _____ _____
209 Francisca das Chagas [...]-1906 [...]-1946 39 ou 40
Oliveira
210 T.F.O _____ _____ _____
211 J.B.C.P _____ _____ _____
212 Sem identificação _____ _____ _____
213 L.P.B _____ 07-09-1957 _____
214 F.C.C _____ _____ _____
215 Sem identificação _____ _____ _____
216 Vicencia Monteiro de 07-09-1932 [...]-1959 26 ou 27
Souza
217 a 218 Sem identificação _____ _____ _____
219 M.G.C _____ _____ _____
220 S.E.M _____ _____ _____
221 F.T.J 03-03-41 05-06-58 17
222 a 224 Sem identificação _____ _____ _____
225 [...] _____ _____ _____
186

226 [...] Pedro _____ _____ _____


227 Sem identificação _____ _____ _____
228 Angelicada Costa Paz 08-08-1959 23-06-1959 I
229 Sem identificação _____ _____ _____
230 Jo[...] Ja[...]/ 17-12-86/ 08-05-4[...]/ _____

João Evangelista da 27-12-1883/ 27-04-1933/ 49/


Paz/
Angélica Pinheiro da 17-12-1886 07-05-1941 54
Paz
231 A.M.M/ _____ _____ _____
M.C.O
232 J.C.E/ _____ _____ _____
E.M.I
233 R.I.[...] _____ _____ _____
234 a 235 Sem identificação _____ _____ _____
236 João Canuto da Silva/ 1860/ 08-06-1922/ 62/

CalzidaRaymunda da
Silva
1867 1924 57
237 Sem identificação _____ _____ _____
238 B.M.G _____ _____ 98
239 M.R.Z _____ _____ _____
240 J.O.S _____ _____ _____
241 a 244 Sem identificação _____ _____ _____
245 Maria José Gomes 31-12-1913 19-01-1946 32
246 [...] _____ _____ _____
247 a 252 Sem identificação _____ _____ _____
253 Maria Canuto Barbosa 02-06-10 09-07-52 42
254 a 256 Sem identificação _____ _____ _____
257 J.C.S _____ _____ _____
258 Antonio do Carmo _____ 27-06-1948 _____
259 S.R.S 1904 1929 24 ou 25
260 Sem identificação _____ _____ _____
261 Tereza S. Fontinele 03-07-1945 15-10-64 19
262 R.[...] _____ _____ _____
263 a 264 Sem identificação _____ _____ _____
265 Raimundo Ribeiro 26-09-1935 04-01-1953 17
M.R.O _____ _____ _____
266 Sem identificação _____ _____ _____
267 Maria do Amparo Vieira 15-06-45 11-01-46 6 meses
268 Sem identificação _____ _____ _____
269 I.O.T _____ _____ _____
270 M.R.C _____ _____ _____
271 a 274 Sem identificação _____ _____ _____
F.A.P _____ _____ _____
275 a 276 Sem identificação _____ _____ _____
277 V.M.L _____ 1951 _____
278 Maria de Lurdes Barros 08-09-1911 29-07-1929 17
279 a 282 Sem identificação _____ _____ _____
283 Maria dos Remédios 1957 1969 11 ou 12
Lima
284 [...] _____ _____ _____
285 Francelina Façanha 1905/ 15-04-1945/ 39 ou 40/
187

Silva/ 3 meses/
Maria de Fátima da 13-10-1954/ 13-01-1955/ 3
Silva/
Maria Gorete da Silva 20-07-59 03-1963
286 Jose de carvalhoBraga 12-11-40 [...]-04-47 _____
287 Raimunda Alves Lima 04-1898 08-10-55 _____
288 a 290 Sem identificação _____ _____ _____
291 Ana Maria de Santana _____ _____ _____
292 C.R.S _____ _____ _____
293 Maria de Lourdes 1911 [...]-07-1929 17 ou 18
Barros
294 Sem identificação _____ _____ _____
295 Antonia Maria da 10-12-1910 03-01-1942 31
Natividade
296 Walda Oliveira Melo 18-08-1963 09-06-1964 10 meses
297 a 298 Sem identificação _____ _____ _____
299 A.C.B _____ _____ _____
300 M.N.B _____ 15-03-44 _____
301 P.P.B _____ _____ _____
302 C.A _____ _____ _____
303 Sem identificação _____ _____ _____
304 A.R.S _____ _____ _____
305 Sem identificação _____ _____ _____
306 Sebastião pereira 06-11-1914 23-06-194[...] _____
Barcelar/
F.A.A
307 Maria das graças _____ 19-09-1955 _____
308 J.A.B _____ _____ _____
309 Maria deodata da 17-10-1892 12-07-1962 69
Conceição Pretinha
310 Sem identificação _____ _____ _____
311 Pedro Martinss Neto 22-11-1953 12-05-1966 12
312 Sem identificação _____ _____ _____
313 [...]P.V 1900 1935 34 ou 35
314 Sem identificação _____ _____ _____
315 M.C.O/ _____ _____ _____
P.O.L/
F.O.S
316 Georgina Maria de [...]-1896 01-01-1966 69 ou 70
Araújo
317 a 319 Sem identificação _____ _____ _____
320 CapMMariano José da 18-07-1838 27-09-1903 65
Paz/
Maria Magdalena _____ _____ _____
321 Sem identificação _____ _____ _____
322 R.N.S _____ _____ ______
323 M.J.P.N ______ 1912 _____
324 a 325 Sem identificação _____ _____ _____
326 Maria de Nazaré Araújo 06-03-1936 16-06-1963 27
327 Sem identificação _____ _____ _____
328 B.M.P _____ _____ _____
329 ARO _____ _____ _____
330 L.L.S _____ _____ _____
331 R.S.C _____ _____ _____
332 L.M.C 1927 1938 10 ou 11
188

333 F.P.N/ _____ _____ _____


A.U.P
334 a 335 Sem identificação ______ _____ _____
336 R.M.J _____ ______ 1903
337 M[...]R _____ ______ _____
338 Francisco das Chagas 16-11-35 23-07-36 _____
339 E.R.P _____ _____ _____
340 Luiz R.Franco 04-01-1906 09-09-1950 44
341 Maria das Graças 01-05-48 08-06-49 _____
342 a 343 Sem identificação _____ _____ _____
344 Sargento Pedro _____ 05-63 _____
Rodrigues
345 Sem identificação _____ ______ _____
346 E.J.M 01-12-1909 15-10-1922 12
347 Sem identificação _____ ______ _____
348 M.J.J _____ _____ _____
349 a 350 Sem identificação ______ ______ _____
351 F.M.A/ _____ _____ _____
M.M.C
352 a 357 Sem identificação _____ _____ _____
358 E.J.S _____ _____ _____
359 a 360 Sem identificação _____ _____ _____
361 V.M.M _____ _____ _____
362 Pedro Braga 30-01-1864 03-08-1931 67
363 Sem identificação _______ ______ _____
364 Antonia Maria de Freita 26-06-1927 24-01-1936 8
365 Sem identificação ______ _____ _____
366 Massimiano de Loiola 26-11-56 29-11-56 ______
Dias
367 a 368 Sem identificação ______ ______ ______
369 Francisca vieira da 09-02-1913 11-04-1951 38
Costa quadro
370 M.F ______ ______ ______
371 Damião Carvalho de 07-10-[...]/ 21-10-[...]/ _____
Brito/
F.C.B _____ _____
372 Maria das Dores de 20-01-1892 26-05-1956 64
Jesus
373 Jose Ribamar Fernandes 15-09-58 08-06-68 _____
374 Umbelina Saraiva de 03-11-1898 15-07-1925 26
Moura
375 J.M.O ______ ______ ______
376 José R.Pinto 28-08-28 11-12-61 ______
377 G.T.L _____ ______ _____
378 _____ _____ _____ _____
379 Zelina Alves de Carvalho 30-03-1925 26-10-1949 24
380 Sem identificação _____ _____ _____
381 F.M.C/ _____ _____ ______
M.J.C
382 a 384 Sem identificação ______ _____ _____
385 Da[...]ina Gomes de 23-08-1935 25-01-1944 8
Araujo
386 Sem identificação _____ ______ ______
387 JozeBibiano de Moura 16-01-1892 22-01-1944 52
388 A.P.M _____ _____ _____
189

389 Sem identificação _____ ______ ______


390 F.C.T _____ _____ _____
391 a 392 Sem identificação _____ _____ _____
393 Alyete 15-07-1926 15-07-1926 0
394 José Ovideo 20-11-1914 08-04-1931 16
395 F.R.P _____ _____ _____
396 a 397 Sem identificação _____ ______ _____
398 M.I.S.S 1856 1934 77 ou 78
399 Sem identificação _____ ______ _____
400 B.L.S _____ _____ _____
401 I.P.C _____ _____ _____
402 A.R.J _____ _____ _____
403 E.F.F _____ _____ _____
404 a 405 Sem identificação _____ _____ _____
406 M.C.P.C 10-05-1936 06-11-1965 29
407 a 408 Sem identificação _____ _____ _____
409 João Antonio [...]/ 1836/ 1920/ 83 ou 84/
66 ou 67
Vicente [...] 1863 1930
410 D. Elvina Fortes Castello 02-02-1867 11-12-1869 2
Branco
411 D.Angela Pia Fortes 05-05-1860 25-11-1872 12
Castello Branco
412 D.Cornelia Julieta 1864 04-10-1887 23
Patrazana
413 D.ignezHygina da Costa 12-03-1873 19-07-1874 1
Araújo
414 [...] ______ ______ _____
415 Capitão Antonio Jose da 1835 08-12-1885 50
Costa
416 D.Anna Furtado de 1844 30-06-1879 35
Mendonça
417 D.ApoloniaM.Ceza de 20-08-1812 17-09-1875 63
Almeida
418 Jose Ribeiro Eramgo de 1831 18-11-1893 62
Sampaio
419 Úrsula da Costa Araújo 26-06-1878/ 20-09-1957/ 79/
Miranda /

Antonio Rodrigues de 23-07-1916 06-09-1949 33


Miranda
420 Coronel Francisco José 28-02-1833 02-06-1899 66
Teixeira
421 Ricardo Jose Teixeira _____ / 18-09-1937/ ______
Netto/

Dr. Jacob J. Castelo 04-02-1908 21-05-1967/ 59/


Branco/

Maria N.M Teixeira/ ______ 15-11-1934/ _____

Benedita L.C.Branco/
______ 11-09-1944/ _____
Antonio João C.Branco
Pedrode A. Teixeira/
______ 06-01-1960/ _____
190

Maria N.C.Branco Lins


19-10-1861/ 03-08-1936/ 74/

24-06-1911 14-09-1964 53
422 TE CEL Manoel da Costa 1860 29-07-1894 34
Teixeira
423 Marion Saraiva 07-12-1902 13-08-1978 75
Monteiro
424 Jose Rodrigues de 02-02-1913 23-06-1925 12
Miranda Primo
425 [....] _____ _____ _____
426 Leopoldo Pacheco/ 24-01-1897/ 10-08-1933/ 36/
Inês da Costa Araújo 10-02-1876 07-12-1949 73
Pacheco
427 Capitão João[...] da Silva 24-08-1861 19-12-[...] _____
428 D.Carmina da Silva 17-06-1866 21-12-1895 29
Patrazana
429 Maria de Nazareth 17-07-1902 28-02-1905 2
430 Maria do Coração de 22-08-1878 [...] _____
Jesus Bonna
431 Francisco Figueiredo _____ _____ _____
Duarte/
Olimpia de Figueiredo
Bastos
432 José Ribeiro Francode 14-10-1829/ 18-11-1893/ 64/
Sampaio/

Carolina Rosa de
Sampaio 19-09-1892 22-12-1956 84
433 Alice Eulálio Alves 26-11-1894 30-07-1926 32
434 Capitão José Rodrigues _____ _____ _____
de Miranda
435 José Rodrigues de 11-10-1828/ 08-03-1892/ 63/
Miranda/

D.Candida Rosa de 27-02-1838/ 01-05-1908/ 70/


Miranda/

Luiz Rodrigues de 22-04-1876 03-07-1948 72


Miranda
436 Antônio Costa Araújo/ _____ 29-12-1927/ _____

Engrácia da Costa
Araújo 25-04-1953
437 [...] 04-05-1880 31-12-[...] _____
438 D.Liduina Rosa de _____ 10-02-1900/ _____
Carvalho Oliveira/

Maria José 26-05-1918 16-03-1920 1


439 Antonio Saraiva de 23-04-1852 05-11-1912 60
Carvalho
440 Ana Joaquina Saraiva _____ 25-08-1947 _____
441 Antonio da Cunha 1818 20-07-1886 67 ou 68
442 D. Virçilina Furtado de 29-12-1893 01-11-1895 1
Azevedo
191

443 Antonio Rodrigues de 12-04-1905/ 04-02-1950/ 44/


Miranda/
Maria de Jesus Pereira/ _____ ______ ______
Joaquim R. de Miranda
444 Custodio José Albano 1815 28-10-1889 74
445 Maria dos Anjos da 02-08-1802 29-03-1871 68
Soledade
446 Coronel Antonio Maria 08-09-1867 24-03-1937 69
Eulalio Filho
447 D.Josepha Maria de 19-03-1836 27-07-1903 67
Jesus Eulalio
448 Aureliano Ferreira 1867 09-07-1889 22
Mello
449 Jozé Felix Machado de 1885 01-03-1897 12
Miranda
450 Laura/ 02-1904/ 33 dias/

Antonio 06-1914 13 meses


451 R.E[...] _____ _____ _____
452 Sem identificação ______ _____ _____
453 Alarico Miranda de 30-01-1894 30-11-1895 1
Sampaio
454 Benicio Ribeiro 19-10-1864/ 07-05-1946/ 81/
Sampaio/
Anna Miranda 15-09-1869/ 16-05-1949/ 79/
Sampaio/
[...] Sampaio 17-08-1914 09-12-1939 25
455 [...] 14-02-1891 12-01-19[...] _____
456 Sem identificação ______ ______ ______
457 Antonio José Monteiro 26-11-1867/ 26-04-1910/ 42/
Filho/
Herminia Alcides 25-12-1876 19-12-1965 89
Saraiva Monteiro
458 Ancião Ricardo José ______ 26-10-1901 _____
Teixeira
459 João Mendes de 25-08-1871 09-05-1908 36
Oliveira
460 D.Lydia Mendes de ______ 10-09-1896 _____
Oliveira
461 Anisio Gomes Campêlo 27-09-1917 22-12-1939 22
462 Capitão Fábio Maria 10-01-1870 12-07-1913 43
Eulálio
463 Francisco Mendes de 15-06-1924/ 13-05-1962/ 37/
Sampaio /
José Mendes da Silva 03-03-1885 01-02-1969 83
464 D.Raimunda Baptista da 24-09-1855 12-07-1895 39
Silva Moura
465 Vespaziano José de 12-01-1869 20-06-1897 28
Salles
466 Coronel Antonio Maria 10-12-1821 02-03-1912 90
Eulalio
467 [...] Eulálio[...] _____ _____ _____
468 José Euzebio de 22-05-1896 02-03-1957 60
Carvalho
469 CapmErnesto de ______ 29-01-[...] 41
Figueirdo[...]
192

470 Sem identificação _____ _____ _____


471 Maria Jose/ 19-03-1893/ 14-08-1918/ 25/
Maria Joaquina da 23-03-1852/ 25-06-1927/ 75/
Anunciação Saraiva/
Corinto Saraiva
Monteiro/ 25-03-1906/ 25-09-1951/ 45/
Anaide Saraiva Portela
20-09-1904 17-09-1966 61
472 D.Alcina Saraiva de ______ ______ ______
Sousa
473 Gonçala de melo Paz/ 17-02-1884/ 01-07-1958/ 74/
Julia Capucho do Vale
10-09-1913 25-04-1925 11
474 [...] _____ ______ _____
475 Antonio Jose Monteiro 26-11-1867 26-04-1910 42
Filho
476 [...] ______ ______ _____
477 Anna Diamantina de _____ 26-11-1873 _____
Carvalho Oliveira
478 [...] _____ ______ _____
479 Domingos Rodrigues de _____ 15-05-1910/ _____
Asevedo/

D.Celerinda Furtado De
Asevedo/ 23-01-19[...]/

CAPM Domingos
Rodrigues de Asevedo
16-05-193[...]
480 Benicio R.Sampaio Neto 01-01-1922 23-08-1926 4
481 Raymunda F. De 11-07-1864/ 30-06-1919/ 54/
O.Mendes/
Maria de Nazareth 26-01-1905 19-06-1925 20/
Mendes Sampaio/
482 [...] _____ _____ _____
483 Silvino V. de Andrade 26-05-1842 18-09-1924 60
484 Raymundo Ferreira da 15-09-1874 31-07-1912 37
Cunha
485 Jacob de Almendra 03-08-1850 22-07-1908 57
Freitas
486 M.J.M _____ _____ _____
487 Adelina Castelo Branco _____ ______ _____
Pacheco
488 Iracema/ 29-09-[...] _____ _____
Maria Eva[...] _____
489 Raimunda Menezes 11-01-1876 17-04-1932 56
Alves
490 Raimundo Francisco 03-08-1863 21-12-1937 74
Alves Cavalcante
491 Dr.Alcides Freitas 04-03-1890 06-05-1913 23
492 Berenice/ _____ _____ 2/
Maria do Socorro 7 meses
493 Clemente Pires 16-04-1847/ 02-04-1933/ 85/
Ferreira/
Lina Carolina Pires 22-08-1854 14-11-1934 80
Ferreira
193

494 José Pires Firmino Neto [...]-1880 16-[...]-1950 69 ou 70


495 Raphael Archanjo de 24-10-1855/ 19-03-1941/ 85/
Oliveira/
Lydia Santana de 29-11-1901 01-02-1916 14
Oliveira
496 Isaias Pereira da Silva 20-12-1877 19-08-1935 57
497 Antonia das Neves e 14-05-1876 10-10-1903 27
Silva
498 D.Constança Rosa da ______ ______ ______
Silva Monteiro
499 José Alvarenga _____ _____ 9
500 E.L [...] [....] ______
501 Alcina Oliveira 05-05-1885/ 12-08-1925/ 40/
Machado/
Maria de Jesus 03-04-1915/ 16-12-1943/ 28/
Machado/
Luiz da Cunha Machado 21-04-1885/ 07-05-1954/ 69/
Filho/

Otavio Oliveira 13-12-1913/ 18-06-1906/ I/


Machado/
Modesto Tito Castelo 26-01-1877 17-08-1917 40
Branco
502 Joanna Georgina da paz 29-08-1893 16-04-1896 3
503 L.J.S _____ _____ _____
504 Candy Castello Branco 19-07-1900 15-02-1929 28
de Oliveira
505 Sem identificação _____ _____ _____
506 Fabio Maria Eulalio 05-11-1891 12-01-1917 25
Filho
507 Coronel Joze Joaquim 1837 07-01-1900 63
Avellino
508 TE CEL Antônio[...] Sousa ______ ______ _____
[...]
Sandra Maria Borges 08-06-[...] 17-06-[...] _____
509 Antonio da C. Machado 27-12-1871 06-02-1940 68
510 Joanna Borges 27-02-1879/ 05-08-1943/ 64/
Machado/
Anita C.Machado _____ 21-11-40 _____
511 Antonio Tito Castello 15-04-[...] 03-02-1912 _____
Branco
512 [...] _____ _____ _____
513 Ana Monteiro Bona 02-08-188[...] 05-07-1953 _____
514 Maria Esmerinda 14-04-1842 24-01-1920 77
Furtado Livramento
515 Alferes Antonio Alves 11-03-18[...] 25-01-1920 _____
Silva
516 Maria de Lourdes 16-10- 10-03-1921 _____
Cardoso
517 Antonia Cardoso 1888/ 1954/ 65 ou 66/
Pereira da Silva
( sinhazinha)/
45 ou 46
Chistina Cardoso de 1894 1940
Morais
518 Valdemar Paulino de 27-07-1907 06-02-1915 7
194

Miranda
519 L.A.P _____ _____ _____
520 Vitória _____ _____ _____
521 Justino _____ _____ _____
522 Sebastião F. do Vale _____ _____ _____
Filho/
Cosma Olímpia do Vale
C.E.S
523 Sem identificação _____ _____ _____
524 Emygdio Herculano 22-03-1887 06-12-1938 51
Lima
525 Clarinda F. de Sampaio/ 23-11-1864/ 24-05-1956/ 91/
Rosa Ercília de Sampaio
02-01-1891 04-05-1927 36
526 M.R.S _____ ______ _____
527 Josefina Clara Lidia 1862 1937 74 ou 75
528 Miguel E. da Silva 12-12-1880 30-04-1950 69
529 M.J.E _____ _____ _____
530 Domingos José da Silva/ 21-08-1877/ 02-10-1939/ 62/
Benedita/
Claudina Barbosa/ 10-06-1907/ 10-02-1931/ 23/
05-08-1876/ 01-07-1939/ 62/
Luiz Gonzaga
18-09-1902 02-06-1928 25
531 F.R.L _____ _____ _____
532 Sem identificação _____ _____ _____
533 Anna manda[...] da Silva 20-04-18[...] 09-[...] _____
534 Sem identificação _____ _____ _____
535 AntonioBona[...] 27-04-1874 26-04-1943 68
536 [...]RaimunfaErnesta[...] _____ _____ _____
537 Joaquina Ximenes de 16-03-1859 18-01-1941 81
Aragão
538 Francisca _____ _____ _____
C.BrancoEulalio/
Afonso C.BrancoEulalio/
José/
Fábio Eulalio Machado/
Francisca C.B Eulalio
machado
539 Jose Joaquim Avelino _____ 07-01-1890 _____
540 Benedito Portela A. _____ _____ _____
Barbosa/
[...]idiaC.B.E.Portela
541 Jose Luiz Cas[...]/ 13-04-[...]/ 05-08-1840/ _____
Francisco Ferreira[...]
_____ _____
542 AntonioF.Mendes 09-10-12 28-04-40 _____
543 MarizethM.S.Lima/ 12-08-1944/ 21-01-1969/ 24/
M.M/ _____ _____ _____
S.L
544 [...] _____ _____ ______
545 D.Marcolina de Brito 12-09-1877/ 23-07-[...]/ ______
Borges/
Nilza _____ ______
546 José Er[...] da Costa/ 07-07-1907/ 08-08-1948/ 41/
Ana Soares da Costa
195

13-08-1906 20-09-1954 48
547 I.M.C _____ _____ _____
548 Antonio Exalto de ______ ______ ______
Araújo/
A.E.A
549 A.M _____ _____ 35
550 Francisco Jose da Rocha 1852 22-09-1923 71
551 W.B.P [...] [...] _____
552 Pergentino Lobão 05-09-1884/ 28-09-1937/ 53/
Néias/
Lina Fortes Lobão [...] 2[...]-11-[...] _____
553 D.Gertrudes M.de Deus _____ 13-11-1910/ _____
e Silva/

J.O.D.S 17-08-25
R.N.J _____ _____ _____
554 D.liduina Maria da _____ _____ 74
Conceição
555 Januaria Lima/ ______ 25-01-1970/ _____
Maria Tomázia Lima 17-10-1943
556 Francisco Napoleão 08-06-1887 [...]8-09-1910 23
557 [....] _____ _____ _____
558 Aldemar Mendes de 08-06-1907 02-07-1941 34
Melo
559 Nicodemos da Silva/ 02-04-1874/ 04-07-1947/ 73/
D.da Silva
01-01-1887 27-07-1933 46
560 João Galdino Aragão 07-11-1886 11-07-1960 73
561 Osvaldo Portela 01-12-1936 27-04-1937 1
Ibiapina
562 Anna Roza Muniz 15-11-1892 24-10-1926 33
563 Lina Fortes Bona/ 15-11-1851/ 24-03-1934/ 82/
TTECELAntonio José 07-11-1847 28-10-1927 79
Nunes Bona Primo

564 José Nunes Bona 15-12-1881 18-01-1921 39


565 a 566 Sem identificação _____ ______ ______
567 Manoel Raymundo Lima 24-11-1868 30-03-1920 52
568 Francisco Carneiro de 1867 08-03-1922 55
Lima
569 Sem identificação _____ _____ _____
570 Moisesu de Andrade/ 25-05-1871/ 10-12-1935/ 64/
Luiz D. de Andrade
25-08-1913 28-09-1941 28
571 João/
Francisco/ _____ _____ _____
Estevão/
Izia Maria
572 A.F.M _____ ______ _____
573 Benedita Neves/ 14-03-1848/ 04-03-1933/ 84/
Angélica da Costa 02-05-1911 20-04-1949 37
Araújo Miranda
574 Francisco Miguel 03-12-1839/ 16-04-1935/ 95/
Pereira Ibiapina/
Ana Maria Ibiapina 26-07-1905 16-11-1965 60
575 Joaquim Miguel 18-10-1868/ 07-12-1920/ 52/
196

Ibiapina/
Maria Quitéria Ibiapina 30-09-1876 02-05-1966 89
576 Sem identificação ______ _____ _____
577 [...] _____ 21-12-1930 _____
578 Manoel Raymundo Lima 30-08-1903/ 05-02-1933/ 29/
Filho/

Frederico Ribeiro 27-05-1862/ 13-09-1939/ 77/


Franco (Babau)/

MA Madalena do 16-10-1881 01-02-1946 64


Rego.R.Franco
579 Moysés Maria Eulálio 30-01-1871 20-09-1931 60
580 J.R[...]/ _____ _____ _____
E[...]
581 Raimundo Felix do 18-09-1870/ 15-04-1936/ 65/
Monte/
Temístocles Murilo de 21-07-1903 11-07-1947 43
Oliveira
582 Sem identificação _____ ______ _____
583 Thome Ferreira de 1848 02-08-1926 78
Andrade
584 Jose Ferreira Calaça 1853 10-04-1913 60
585 José Olanda Cavalcante 1882 11-09-1942 60
586 Sem identificação _____ ______ ______
587 Raimundo Joze Oliveira/ 1861/ 08-12-1920/ 59/
Emilia Roza de Oliveira
_____ 20-05- 71

588 A.P de Aragão/


M.L Pimentel Aragão _____ ______ _____
589 D.Rosa Gonçalves Lima 1850 10-10-1914 64
590 Luis José do Valle 1840 15-10-190[...] _____
591 J.J.V _____ _____ 1900
Luis Correa _____ _____ 21-06-
1970
592 D.Luciana Maria de 09-01-1847 20-07-1900 53
Freitas
593 Manoel Ignácio de 1847 14-07-1900 53
Abreu
594 Sem identificação ______ _____ _____
595 Manoel Barboza Saraiva 25-09-1939 21-02-1940 4 meses
596 a 597 Sem identificação _____ ______ _____
598 Maria Grecia 11-[....] 19-[...] _____
Evangelista
599 Mari de Nazaré e Silva 19-08-1934 06-06-1947 12
600 [...] Correia Jardim/ _____ 08-01-39/ _____
Cervis de Matus Jardim
05-07-43
601 Raimunda Roza de 11-01-1911 04-08-1942 30
Freitas
602 Anna Roza Lopes Araújo _____ _____ _____
603 Florismino Correia
Jardim/ _____ _____ _____
197

Paulo Correia Jardim/


Antonia Rosa da Paz
604 Sem identificação _____ _____ _____
605 Maria Conceição Lima 08-02-1936 17-07-1966 30
606 Antônia Ximenes Lima 12-10-1906 15-06-1948 41
607 F.L.S _____ _____ 65
608 Adelaide Duarte 02-06-1910 07-07-1957 47
609 Elvira Maria da 08-12-1870 20-02-1945 74
Conceição
610 a 611 Sem identificação _____ _____ _____
612 Maria Dilurde Andrade _____ _____ _____
de Melo
613 Raimunda Ramos 07-04-1919 24-04-1957 38
Mousinho
614 Emidia de Sousa Paz 08-03-1907 06-12-1957 50
615 a 616 Sem identificação _____ _____ _____
617 Erasmo Leite 21-11-1900 15-01-1961 60
618 LiracildaP.Leite 17-07-1944 15-01-1961 16
619 Sem identificação _____ _____ _____
620 Antonia Moreira _____ _____ 36
Fernandes
621 [...]rç[...]a de Melo 28-06-1877 25-02-1959 81
Barros
622 Benedita Barboza e 10-06-1891 08-02-1931 39
Silva
623 [...] _____ _____ ____
624 I.M.P.C _____ _____ _____
625 M.L.P _____ _____ _____
626 Sem identificação ______ ______ _____
627 I.A.M _____ ______ _____
628 a 629 Sem identificação _____ _____ _____
630 Carmelita B.Macêdo 09-12-32 03-09-48 _____
631 Sem identificação _____ _____ _____
632 M.U.B/
M.P.S _____ _____ _____

633 a 635 Sem identificação _____ ______ _____


636 Miguel R.Neves/ 26-12-1884/ 25-07-1953/ 68/
AntoniaR.Neves/ 08-06-1892/ 23-01-1939/ 46/
Josefa R.Neves _____ _____ _____
637 Sem identificação _____ _____ _____
638 Bendito Eustaquiode 20-09-1936 28-11-1970 34
Azevêdo
639 Sem identificação _____ _____ _____
640 Mariana Pereira 1883 1953 69 ou 70
Ibiapina
641 Elesbão Pinto de Abreu 1874 1963 88 ou 89
642 Sem identificação _____ _____ _____
643 R.A.Z _____ _____ _____
644 a 646 Sem identificação _____ _____ _____
647 R.C.L _____ _____ _____
648 Maria Amancia _____ 11-07-44 _____
649 A.R.S _____ _____ _____
650 Candida Rosa de Freitas 10-11-1862 13-12-1924 62
651 a 653 Sem identificação _____ _____ _____
198

654 F.P _____ ______ _____


655 V.A.Z ______ 1958 _____
656 CandidaMaria[...] _____ [....]-43 70
657 Sem identificação _____ _____ _____
658 Francisco Pereira da 17-05-38 07-12-1958 _____
Silva
659 Sem identificação _____ _____ _____
660 Pedro Paulo da Silva 29-06-1902 28-03-1940 37
661 Sem identificação _____ _____ _____
662 [...]cisca Sim[...] ______ ______ ______
663 Maria Jose Alves de _____ ______ _____
Sousa
664 a 665 Sem identificação _____ ______ ______
666 D.M.C ______ ______ ______
667 Raimundo de Melo Paz 10-08-1937 19-05-1963 25
668 Paulina Cristo 1927 05-07-1952 24 ou 25
669 Antonio Francisco de 02-04-1953 10-08-1953 4 meses
Paula Cunha
670 a 671 Sem identificação ______ ______ _____
672 Onofre Rodrigues de _____ _____ _____
Oliveira
Francisco C. de Moraes 20-06-1897 28-01-1968 70
673 R.S.M _____ _____ _____
674 R.P.P _____ _____ _____
675 José R.Lima 21-07-1925 14-06-1968 42
676 João Pereira de 14-10-1904 21-09-1964 59
Andrade
677 a 678 Sem identificação _____ ______ _____
679 Maria de Jesus Ibiapina/ 1963/ 1963/ _____
Edilson Raimundo
Ibiapina 1964 1964
680 M.R.I _____ _____ _____
681 Sem identificação ______ ______ _____
682 C.J.S _____ 20-12-86 ______
683 Sem identificação _____ _____ _____
684 R.C.L ______ ______ _____
685 M.R.L.M/ ______ ______ _____
A.M.P.F
686 A.P.B _____ _____ _____
687 Sem identificação _____ _____ _____
688 J.G.Brito _____ 17-05-53 _____
689 Rosa P.Cavalcante/ 05-03-24/ 12-06-59/ _____
MA D. Cavalcante
19-08-41 12-12-44
690 Sem identificação _____ _____ _____
691 M.R.A/ _____ 23-08-1960/ _____
M.R.C _____
692 J.M.C _____ _____ _____
693 M.P.O _____ ____ _____
694 José Antonio Alves 06-08-1863 [...]-01-1923 59
Patriolino
695 M.E.P.S _____ ______ _____
696 Francisco Jose do _____ ______ 89
Carmo
697 a 698 Sem identificação _____ ______ _____
199

699 Clementina de Brito 02-08-1881 04-02-1960 78


Melo Resende
700 R.S _____ _____ _____
701 Luiz Bispo de Deus 10-12-91 07-61 _____
702 Rita Mendes do E.Santo 23-05-1920 18-05-1961 40
703 F.A.B _____ _____ _____
704 a 705 Sem identificação _____ _____ _____
706 [...] _____ _____ 21
707 J.S.C _____ _____ _____
708 M.P.S _____ _____ _____
709 Sem identificação _____ _____ _____
710 D.Antonia Maria da _____ _____ 1945
Conceição
711 a 712 Sem identificação _____ _____ _____
713 A.F.F/ _____ _____ _____
L.R.F
714 a 715 Sem identificação _____ _____ _____
716 A.A.L _____ _____ _____
717 Godofredo Costa 1892 23-03-1948 56
718 R.N.A 27-06-48 26-11-48 5 meses
719 Sem identificação _____ _____ _____
720 M.R.D _____ 03-12-55 _____
721 T.M.C _____ _____ _____
722 C.M.S _____ _____ _____
723 R.M.T _____ ______ ______
724 Sem identificação _____ _____ ______
725 M.F.P _____ _____ _____
726 Josefa[...] _____ _____ _____
727 S.X.A _____ _____ _____
728 Amgelo Jose da Silva 15-08-1882 23-12-1962 80
729 A.M.J 1882 1934 51 ou 52
730 Francisco Ipiapina 01-07-1942 26-04-1967 24
Cavalcante
731 F.F.B _____ _____ _____
732 Ozita Maria da 30-07-1907/ 21-05-1947/ 39/
Conceição Rego/ 03-09-1933 19-06-1934 9 meses
Maria De Lourdes
733 Rita Ibiapina Cavalcante 22-05-1918 22-08-1962 44
734 a 736 Sem identificação _____ _____ _____
737 V.C.R _____ _____ _____
738 a 741 Sem identificação _____ _____ _____
742 U. M. S _____ _____ _____
743 a 744 Sem identificação _____ _____ _____
745 B.C.S _____ _____ _____
746 a751 Sem identificação ______ ______ _____
752 M.U.Z _____ _____ _____
753 S.V.L _____ _____ _____
754 Raimundo Alves
Pereira/
Pedro Luiz Pereira/ _____ _____ _____
Elizabet Pereira Oliveira
755 J.A.M/ _____ _____ _____

M.R.C _____ _____ _____


756 Sem identificação _____ _____ _____
200

757 Maria da saúde Araujo 08-11-62 13-11-62 5 dias


758 Sem identificação _____ _____ _____
759 Sem identificação _____ _____ _____
760 A.L.H.S 28-03-31 22-08-66 _____
761 Sem identificação ______ ______ _____
762 Maria do C. Ferreira 01-08-56 24-07-61 ______
763 a 764 Sem identificação _____ _____ _____
765 R.N.O _____ _____ ______
766 J.D.S _____ _____ _____
767 a 769 Sem identificação ______ _____ _____
770 F.J.L _____ _____ _____
771 A.M.A _____ _____ _____
772 M.V ______ _____ _____
773 a 774 Sem identificação _____ _____ _____
A.S.S _____ _____ _____
M.C.V _____ _____ _____
775 Sem identificação _____ _____ _____
776 Iracema Ibiapina 24-09-1924 04-10-1945 21
777 Maria do Socorro 27-12-35 30-09-58 _____
Uchôa
778 Maria Livramento da 15-06-1907 05-1941 33
Conceição
779 a 782 Sem identificação _____ _____ _____
783 Emanuel Moura 03-04-53 29-09-53 _____
784 a 785 Sem identificação _____ _____ _____
786 J.R.F 09-08-1889 14-07-1956 66
787 Sem identificação _____ _____ _____
788 Joana Maria S.N 27-05-57 07-1962 _____
789 B.A.S _____ _____ _____
790 a 791 Sem identificação _____ _____ _____
792 Felix P. dos Santos/ _____ 11-10-35/ 55/
F.Agustinho dos Santos
07-07-1914 11-10-44 30
793 Mamede Alves da Silva/ _____ 08-09-1924/ _____

Francisco Mamede da
Silva 31-03-1923 09-04-1952 29
794 a 796 Sem identificação _____ ______ ______
797 Mariano Alves da Silva 15-08-1887 04-12-1963 76
798 Maria Liodoria da Paz 27-10-1997 22-07-1901 I
799 F.R.P _____ _____ _____
800 Sem identificação _____ _____ _____
801 Binidito Paulino de 22-02-1886 14-08-1949 63
Macedo
802 R.M.A _____ _____ _____
803 H.M.C.A _____ _____ _____
804 F.C.O _____ _____ _____
805 Raimundo P[...] Loiola 08-08-1932 08-08-1970 38
806 Sem identificação _____ _____ _____
807 F.O.S _____ _____ _____
808 Sem identificação _____ _____ _____
809 L.G.D _____ _____ _____
810 I.A.S _____ _____ _____
811 Sem identificação _____ _____ _____
812 Valentim de Sousa Lima 14-02-1889 10-09-1949 60
201

813 Maçal Martins da Silva/ 08-09-1901/ 26-03-61/ 59/


Antonia Holanda
Martins 13-10-1910 03-02-70 59
814 Sem identificação _____ _____ _____
815 E.P.S _____ _____ _____
816 Sem identificação ______ _____ _____
817 R.N.Z _____ _____ _____
818 Sem identificação _____ _____ _____
819 Jose de Arribamar [...]-10-44/ 09-03-45/ _____
Lopes/
Maria do Socorro Lopes 07-10-44 09-03-45
820 Valentim de Sousa Lima 14-02-1889 10-09-1949 60
821 Izabel Ozorio Lopes 18-11-1895 02-03-1925 29
822 Sem identificação _____ _____ _____
823 C.F.S _____ _____ _____
824 a 825 Sem identificação _____ _____ _____
826 A.A.S _____ 13-03-64 _____
827 A.M.S _____ _____ _____
828 a 829 Sem identificação ______ _____ _____
830 J.R.V 11-10-12 22-07-62 _____
831 a 832 Sem identificação _____ _____ _____
833 A.L.C 1911 28-10-1968 56 ou 57
834 Sem identificação _____ _____ ______
835 C.P.S _____ _____ _____
836 Regina Ferreira Lima 08-09-1888 24-07-1964 75
837 Sem identificação _____ _____ _____
838 José Horacio de Melo/ _____ 13-08-1965/ _____
Maria[...] de Melo
22-02-1944
839 a 840 Sem identificação _____ _____ _____
841 R.P.L _____ _____ _____
842 Sem identificação _____ _____ _____
843 M.L.M _____ _____ _____
844 J.P.S _____ _____ _____
845 Dionizia Maria da Paz 06-03-1913 18-10-45 32
846 P.O.S _____ _____ _____
847 a 851 Sem identificação _____ _____ _____
852 W.A.G _____ _____ _____
853 a 854 Sem identificação _____ _____ _____
855 Ch e Liandro 10-10-1915 16-03-1963 47
856 a 857 Sem identificação _____ _____ _____
858 M.G.A _____ _____ _____
859 Othilia Maria de Jesus 06-01-1929 10-02-1931 2
860 a 861 Sem identificação ______ ______ _____
862 Maria de [...] _____ _____ ____
863 E.P.V.L.S _____ _____ _____
864 Sem identificação _____ _____ _____
865 Francisco Xavier _____ _____ _____
Cordeiro/
Josefa Maria da
Conceição/
Raimundo
Cordeiro/filho/
Antonio Cordeiro/filho
866 AntonioCalace Neto 07-04-13 14-03-36 _____
202
203
204

FICHA DE REGISTRO TUMULAR

IDENTIFICAÇÃO DO TÚMULO:
( ) ABANDONADO ( ) VISITADO ( ) FREQUENTADO
CARACTERISTICAS:
( ) GRANDE ( ) PEQUENO ( ) MÉDIO
CONFISSÃO RELIGIOSA:
( ) CATÓLICA ( ) PROTESTANTE ( ) NÃO IDENTIFICADO
EDIFICAÇÕES:
( ) CRUZ ( ) ALTAR ( ) IGREJA ( ) CAPELA
TIPO DE SEPULTURA:
( ) COVA SIMPLES ( ) JAZIGO ( ) TÚMULO ( ) MAUSOLÉU ( ) AMONTOADO
DE PEDRAS ( ) GRADES ( ) GRANÍTICO ( ) AZULEJO
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL:
( ) ORDENADA ( ) REGULAR ( ) RUIM ( ) ÓTIMA
FATORES DE DESTRUIÇÃO:
( ) MUSGOS ( ) FERRAGEM ( ) VEGETAÇÃO ( ) VANDALISMO ( ) RACHADURA
PERÍODO CRONOLÓGICO:
DATA DE NASCIMENTO: _____ DATA DE FALECIMENTO: _____
RITOS:
( ) VELAS ( ) FLORES NATURAIS ( ) FLORES ARTIFICIAIS ( ) CULTO POPULAR
REGISTRO FOTOGRÁFICO:
N° DE FOTO:
PREENCHIMENTO FICHA: DATA:
LÁPIDE:
205

FICHA DE REGISTRO DE ÓBITO

N° do livro:________________________________

Nome: _________________________________________________________

Filiação:

Pai ____________________________________________________________

Mãe____________________________________________________________

Nasceu em: _________________________

Natural de:___________________________

Estado civil: ( ) Solteiro/a ( ) Casado/a ( ) viúvo/a

Nome do esposo (a):______________________________________________

Faleceu em: _________________________ Sepultado em:_______________

Causa da morte:______________________

Escravo/a: ( ) Sim ( )Não

Propriedade de:____________________________________________________

Local de sepultamento:______________________________________________

Observação:__________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_________________________________________________________________

Responsável pela assinatura do


termo:_______________________________________________________________

Preenchimento da ficha em:______/______/_______

Responsável: ______________________________________________

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