Kilza Setti
Kilza Setti
Kilza Setti
UBERLÂNDIA
2011
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
FACULDADE DE ARTES, FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES – MESTRADO
CDU: 781.68:784.9
Aos meus pais Rodrigo Rodrigues de Lima e Líbia Zumpano Rodrigues
Aos meus irmãos Rita Tereza, Rodrigo Otávio e Sílvia Maria
A meu esposo Jorge Rodrigues
A meu filho Jorge Gabriel Rodrigues
Agradecimentos
This work is part of the research area of Fundamentals Reflections of Arts Master
Program at the University of Uberlandia, investigating issues of musical interpretation
through the study of text and line song, within a selection of songs for voice and piano
of the composer Kilza Setti.
The research conducts a review of the scientific interpretation of the musical, the
importance of text and vocal line during this process and the factors that may exceed the
rational knowledge, reaching the intuitive and emotional. Three authors have been
mainstays in elucidating the scope of interpretive questions: STEIN and Spielmann
(1996), which discussed the song form, Bakhtin (1979) about the functions of text and
Polanyi (1996) about the importance of tacit knowledge. The choice of Kilza Setti gives
herself their undoubted importance as a writer and researcher in Brazil. In our view, this
research proves to be as significant as it may, in addition to help understanding the
interpretive process, contribute to the enrichment of the academic literature on the
subject.
Figura 15 – Distâncias 45
Compassos 01 a 09
Figura 16 – Distâncias 46
Compassos 13 a 16
Figura 17 – Trova de muito amor para um amado senhor 47
Compassos 01 a 15
INTRODUÇÃO 12
CAPÍTULO I
1.1-Sobre a interpretação 16
CAPÍTULO II
2.1-Sobre o texto e a linha do canto 25
CAPITULO III
Reflexões sobre as canções 32
3.2-Cantorias Paulistas 40
3. 2.1-Ponto de Terreiro 40
3. 2.2-Samba-lenço 42
3.3-Distâncias 44
3.5-Lua cheia 50
3.6-Raro dom 52
CONSIDERAÇÕES FINAIS 65
REFERÊNCIAS 67
ANEXOS
Entrevista com a compositora Kilza Setti 69
Catálogo das obras de Kilza Setti 86
12
INTRODUÇÃO
Sobre a interpretação de canções, não podemos deixar de atentar para o fato de que,
além da compreensão musical, faz-se necessário perceber a compreensão textual e todas as
nuances que ela contém quando ligadas à música, quer sejam explícitas ou contidas nas
entrelinhas de seu significado.
Embora saibamos que texto e linha do canto se fundem no momento da interpretação,
cada um desses termos deve ser estudado e apreendido dentro de suas reais intenções de
mensagem. A linha do canto pode apresentar as palavras do poeta ou escritor, mas o intérprete
poderá insinuar suas próprias percepções, de modo a afetar a forma como o poema foi escrito.
Os pensamentos e emoções internas do intérprete, aliados à sua bagagem de conhecimentos,
entram a serviço de uma abordagem única, num momento ímpar.
Para Marília Laboissière, “pensar a interpretação musical somente como expressão de
sentimentos é insuficiente, pois interpretar exige uma abordagem mais complexa, que vai
além do puro sentimento, alcança estética, filosofia e história, o que dá ao intérprete, a liberdade
de uma recriação mediante a criação de uma obra teoricamente já existente”, estando sempre
em movimento e modificação, de acordo com o momento vivenciado. Desse modo,
1
Grifo nosso.
14
2
Referimo-nos à linha do canto como o conjunto dos componentes musicais que a constituem (ritmo, altura,
dinâmica, agogia).
3
Nossa referência ao texto diz respeito às palavras enquanto produção de sentido, comunicação.
4
The essence of song, especially of the romantic Lied, is an equality of music and text, a synthesis of a new art
form out of two disparate media. Those who fail to understand the meaning of the poem fail, as well, to
understand the meaning of the music that sets it. Indeed, performers who have not thoroughly studied the poetry
cannot sing or play the Lied with the focus, the imagination, and the vitality that is essential for both the
musicians and their audience (STEIN; SPIELMANN, 1969, p.20) – Tradução nossa do original em inglês.
15
sentido amplo e repleto de signos que podem estar relacionados não só à linguística, mas
também às ciências da arte como, por exemplo, a musicologia, a história das artes, enfim, as
ciências que relacionam palavra e emoção. Para Bakhtin, a palavra não atinge apenas aquilo
que se refere ao intelecto, mas atinge também o emocional:
Dessa forma, estruturando a apresentação desse trabalho pela articulação dos autores
estudados, teceremos no primeiro capítulo, algumas considerações sobre a interpretação e
suas implicações enquanto forma de conhecimento. No segundo, faremos também
observações a respeito do texto e da linha do canto e seu vínculo com as reflexões
anteriormente tecidas. E no terceiro capítulo, as reflexões sobre as canções escolhidas.
Em anexo, apresentaremos uma breve biografia da compositora Kilza Setti,
conhecendo sua história pessoal e reconhecendo os momentos históricos e personalidades que
influenciaram o seu estilo de composição. Aqui também será exposto um catálogo de suas
obras.
16
CAPÍTULO I
Porém, relegá-la a uma forma de expressão dos elementos musicais organizados pelo
compositor, sem a sensibilidade e subjetividade que são ínsitos ao intérprete, é desnudá-la de
sua complexidade maior.
Ainda refletindo sobre essa temática, encontramos em Lima (2005) que:
A análise da relação ciência e arte pode ser um processo muito complexo e é possível
que um dos principais problemas encontrados na busca dessa equiparação, seja também o fato
de a cientificidade ainda não legitimar, no processo de pesquisas, o emocional e o intuitivo.
Mas isso não parece ser um fato distante de ser alcançado.
Com o amplo espaço já dedicado às metodologias qualitativas a partir de meados do
século XX, pode-se constatar que a arte em geral passa a ser estudada sob uma ótica especial:
18
emocional e intuitivo são inseridos num contexto em que sua veracidade e aplicabilidade,
começam a se assentar numa fundamentação epistemológica condizente com o pensamento
científico.
A respeito do pensamento de Cassirer (1977, p. 265) de que “[...] toda obra de arte
possui uma estrutura intuitiva, o que significa um caráter de racionalidade”, Freire; Cavazotti
(2007) também analisam:
... podemos afirmar hoje que o objeto é a continuação do sujeito por outros
meios. Por isso, todo o conhecimento científico é autoconhecimento. A
ciência não descobre, cria, e o ato criativo protagonizado por cada cientista e
pela comunidade científica no seu conjunto tem de se conhecer intimamente
antes que conheça o que com ele se conheça do real (p. 83).
Se a ciência pode ser considerada um ato criativo, que dizer então da interpretação?
Não podemos deixar de reconhecer que a interpretação de uma obra, mesmo
possuindo seu caráter de racionalidade dentro de uma execução previamente estudada através
daquilo que foi escrito pelo compositor, não pode fugir das influências do emocional e
19
intuitivo, emanadas do intérprete. Planos racionais são feitos ao longo das trajetórias de um
músico. Mas é de uma liga entre análises e imaginação que nasce o interpretar que
posteriormente transmitirá a mensagem idealizada. A racionalidade de se reconhecer formas,
estilos, métricas, motivos, tem sua importância. Todavia, sem o fascínio da criatividade e das
emoções, vigora a aridez da mensagem.
Para Winter; Silveira (2006, p. 66) “[...] a partir do momento que o intérprete escolhe
esta ou aquela obra para a execução, ele se envolve afetiva e comportamentalmente com ela
[...]”, num processo em que vão sendo reveladas, não só as particularidades referentes à
feitura dessa obra, mas também particularidades fundamentadas num conjunto de
conhecimentos que esse intérprete estudou para executá-la, embasadas não só na estrutura
musical, mas nos contextos histórico-sociais, nas práticas interpretativas de época e também
na intuição que carrega consigo.
Da mesma forma, Laboissière (2007) considera esse envolvimento emocional entre
intérprete e obra:
...Assim como não podemos deixar de lado o que somos ou o que pensamos
nas relações com o mundo real, da mesma maneira não podemos fazer uma
interpretação musical sem que projetemos nesse ato, circunstâncias e
padrões que nos constituem como intérpretes ou membros de uma
comunidade social [...] ao reatualizar determinada página, o intérprete faz
com que ela passe pelo filtro de sua própria emoção (no sentido da
sensibilidade) e de seu próprio modo de ser, assumindo o poder que tem em
suas mãos e redefinindo, então, a originalidade (p.36).
Ele não considera que a ciência possa tratar somente as legitimações de uma teoria
enxergando nas mesmas o seu cerne principal. Para ele o nosso conhecimento é muito maior
do que o óbvio que conseguimos constatar. Sendo assim, o que se constata está explícito,
5
My search has led me to a novel idea of human knowledge from which a harmonious view of thought and
existence, rooted in the universe, seems to emerge. I shall reconsider human knowledge by starting from the fact
that we can know more than we can tell. This fact seems obvious enough; but it is not easy to say exactly what it
means. Take an example. We know a persons face, and can recognize it among a thousand, indeed among a
million. Yet we usually cannot tell how we recognize a face we know. So most of this knowledge cannot be put
into words. But the police have recently introduced a method by which we can communicate much of this
knowledge. They have may a large collection of pictures showing a variety of noses, mouths, and other features.
From these the witness selects the particulars of the face he knows, and the pieces can then be put together to a
form a reasonably good likeness of the face. This may suggest that we can communicate, after all, our
knowledge of a physiognomy, provided we are given adequate means for expressing ourselves. But the
application of the police method does not change that fact previous to it we did know more than we could tell at
the time. Moreover, we can use the police method only by knowing how to match the features we remember with
those in the collection, and we cannot tell how we do this. This very act of communication displays a knowledge
that we cannot tell. (p.05) – Tradução nossa do original em inglês.
21
porém é mínimo em relação ao tácito, ou seja, é mínimo em relação àquele conhecimento que
faz parte da nossa percepção, da nossa própria história.
Já no trabalho Personal Knowledge (1998) ele analisa a natureza do conhecimento
humano que encontramos nas artes, no mito e na religião. Em sua teoria, Polanyi descreve as
diferenças entre o conhecimento perceptivo comum e o conceitual, o que é encontrado nas
produções especiais realizados pelas artes e pela religião.
Para ele, o conhecimento pessoal é diferente do conhecimento subjetivo. Este não
possui intenção de universalidade. Diz respeito apenas à pessoa envolvida. Não está
comprometido com a verdade.
O conhecimento pessoal é aquele que intuímos, mas sustentando a intenção de que
realmente seja verdadeiro. É através dele que podemos antecipar ou vislumbrar o desfecho de
solução de algum tipo de problema universalmente situado, ou pelo menos, situado num
contexto que diz respeito também a outros interessados.
Polanyi tem como mérito principal, afirmar que um cientista, acima de tudo, é uma
pessoa cujos sentimentos constituem parte integrante do seu conhecimento, de suas
descobertas e da validação dessas descobertas.
Saiani (2004) estudando sua obra, salienta que:
E ainda analisando a questão dos conhecimentos: “[...] a comparação que Polanyi faz
entre 'pessoal ' e 'subjetivo' sublinha o fato de que a ciência '... é feita por um ser humano que
se compromete com uma visão de realidade' [...]” (p.64) e aponta:
Para Polanyi “we can know more than we can tell”, isto é, nós podemos saber muito
mais do que podemos dizer. Em suma, essa frase resumiria sua concepção de conhecimento.
Essa é uma das máximas de Polanyi e uma das frases mais repetidas quando se fala em
conhecimento tácito. O “como sabemos” encontra-se difundido em habilidades corporais e
sensoriais que adquirimos sem poder explicá-las ou sequer percebê-las. Mesmo quando somos
capazes de explicá-las, essa explicação não é suficiente. Faz-se necessário algum tipo de
prática. Essas habilidades podem ser artísticas, atléticas ou técnicas.
E esse conhecimento que nos acompanha é a dimensão tácita que vem contribuir para
a percepção que temos da vida e de tudo mais que nela buscamos. Incluímos aí os atos
criativos e os atos interpretativos.
Na interpretação de uma obra utilizamos, além de tudo, o que o compositor solicita na
forma de escrita musical, aquilo que “achamos”, que sentimos ou o que imaginamos.
Transcursamos o óbvio através da liberdade da intuição.
Laboissière (2007), sobre interpretação musical, analisa as funções da música:
Mas mesmo que esse resultado esteja em constante movimento seja passível de
influências extras não significa que seja desprovido de credibilidade.
Nas artes, o produto de um intento é mutável justamente porque está suscetível da
influência de fatores pessoais inatos daqueles que a realizam. Então, intuição e imaginação
são capacidades que devem ser consideradas extremamente importantes nos processos de
descobertas. A interpretação é um desses processos.
Para Polanyi isso reforça ainda mais a teoria de que também as descobertas científicas
não podem excluir de seu processo o conhecimento tácito indissociável do ser humano.
A respeito disso, Saiani (2004) observa em Polanyi que:
intuição que nos diz quando parar, quando o resultado alcançado é válido
[...] tal ponto final é, digamos, apenas provisório, pois já a imaginação
recomeça o trabalho... (p. 66).
Na esteira de todas essas reflexões, percebemos que a interpretação ultrapassa a
natureza das formas definidas apresentando um simulacro que traz consigo tanto informações
não só de ordem objetiva, mas também de ordem subjetiva evidentemente mediada de
qualidades sensíveis, que são pertencentes ao mundo em que vivemos.
Ela vai além daquilo que é construído em nossa consciência, abrangendo as regiões do
intuitivo que, mesmo para o pensamento científico impossibilitado de ser legitimado, não
pode deixar de ser reconhecido como verídico em sua existência.
Dessa forma, se intuição e imaginação podem levar a novas descobertas no campo da
ciência, então podemos afirmar que o mesmo acontece com a interpretação.
Seja na música, na dança, no teatro, o intérprete traduz uma gama de sentimentos,
emoções e intuições que transcendem o seu nível intelectual e contribuem para a realização de
suas descobertas ou de seu intento.
Também na interpretação de canções, auxiliada pelo texto e pela linha do canto, essas
descobertas acontecem e não podem ser contestadas.
Nas canções para canto e piano, a construção de interligação entre texto e linha do
canto permite ao intérprete todas as manifestações advindas dos conhecimentos adquiridos
pelo mesmo, desde aquelas que norteiam as análises formais de interpretação, até as mais
subjetivas, impregnadas de fortes sentimentos e intuições.
25
CAPITULO II
6
Haben ihm die Worte die Melodie vorgesungen? War diese schon harrend bereit, die Worte liebend zu
umfangen? Trägt die Sprache schon Gesang in sich, oder lebt der Ton erst getragen
von ihr? Eins ist im andern und will zum andern. Musik weckt Gefühle, die drängen zum Worte. Im Wort lebt
ein Sehnen nach Klang und Musik. – Tradução nossa do original em alemão.
7
Capriccio, última ópera do alemão Richard Strauss, com subtítulo “uma conversação para a música”, libreto
em parceria com Clemens Krauss, estreada no München Nationaltheater em 28 de outubro de 1942.
26
8
Grifo nosso.
9
Grifo nosso.
27
individual de seu intérprete que definirá seus aspectos expressivos através de sua bagagem
vivencial. A expressividade da entonação de cada palavra passa a ser um recurso de
manifestação emotivo-valorativa10 desse intérprete com seu propósito de interpretação.
Já vimos que cada palavra carrega consigo seu próprio significado e, portanto, suas
inerentes entonações de expressividade. Mas nem sempre essa palavra deve ser enfatizada de
acordo com seu significado real. O todo onde ela se encontra deve ser analisado para então se
propor um elemento de entonação referente àquele momento. É um detalhe que, se não
observado, pode modificar acentuadamente a mensagem contida no texto.
Para Bakhtin, “A emoção, o juízo de valor, a expressão são coisas alheias à palavra
dentro da língua”. A observação da mesma dentro de um todo é imprescindível:
Esse cuidado deve ser tomado também quando se pretende valorizar na canção os
momentos de maior importância. Texto, linha do canto, interpretação devem funcionar
harmonicamente no sentido de se expressar com fidelidade a mensagem proposta e os elos
existentes entre eles são os fiadores dos sentimentos que uma canção pode nos despertar.
Pela interpretação pode-se perceber texto e linha do canto como elementos integrados,
ouvidos e apreendidos num mesmo tempo. Tornam-se únicos, numa mesma linguagem. Ainda
que determinemos que uma canção seja uma forma constituída apenas por uma “letra
cantada”, sem contar sua harmonia, suas variações e outros elementos mais, tanto o texto
quanto a linha do canto terão muitas informações a serem fundamentalmente interpretadas. As
sensações causadas por uma canção demonstram todas as complexidades inerentes ao
momento da interpretação. A linha melódica aliada ao texto passa a definir uma intensa
prática da emoção cantada.
Ao retomarmos as origens dessa forma canção, desenvolvida em sua plenitude dentro
dos Lieder alemães ao longo do séc.XIX e associada à grande valorização da poesia lírica de
seus escritores, podemos, como sustentam Stein; Spillmann (1996), alegar que o termo
10
Termo usado por Bakhtin para definir funções do texto que afirmam a necessidade de expressividade do
locutor frente ao texto interpretado.
28
“forma” em música pode se tornar confuso quando carrega consigo significados diferentes,
uma vez que a música sempre pode ser vista sob distintos aspectos, bem como a maneira
como é construída: “pode ser analisada em vários níveis, desde a menor unidade até o
conjunto mais vasto de composição”, mas ainda assim, também sustentam que a forma
musical é “uma maneira de organização do som ao longo do tempo” (p. 191).
É no Lied – essa organização explorada por notáveis compositores como Schubert,
Schumann, Wolf, Brahms, dentre outros – que podemos voltar o foco de nossos estudos
através dessa forma musical: uma composição para voz com acompanhamento de piano11,
ilustrando um texto poético com uma maior complexidade harmônica na sua construção. E
aqui, no imo dessa forma, observando sistemas tonais, contrastes, repetições, progressões
melódicas e representações poéticas, podemos atentar também aos cuidados da entonação do
texto poético sugeridos por Bakhtin em seus estudos.
Stein e Spillmann (1996) ao discursarem sobre as formas de análise e interpretação da
forma canção, mais especificamente do Lied alemão, acreditam que, além desses cuidados nas
entonações das palavras, dos momentos importantes do texto, também deva ser bastante
considerada na interpretação a “personalidade poética” oferecida pelo compositor para que
sua obra seja executada.
Para eles, a linha do canto apresenta as palavras do compositor, mas é a interpretação
do cantor que irá afetar a forma como a mensagem será transmitida durante seu desempenho.
Todo o texto deve ser cuidadosamente estudado e questionado antes da execução: quem fala
no poema, quem é o personagem, como ele é, se existe mudança climática de personalidade
poética durante a música, como deve atuar o intérprete frente a essas mudanças, etc. Desse
modo,
11
A partir de Mahler, também apresentado com acompanhamento de orquestra sinfônica.
12
Composers use several devices to emphasize a word or syllabe beyond its normal metric stress, for example,
through agogic emphasis (syncopation or duration) or placing a note in a high or low register. In the same
29
Além disso, sugerem alguns pontos de estudo da canção observando na linha melódica
três abordagens: o “panorama melódico”, a “análise linear” e a “análise motívica”.
No “panorama melódico” pode-se, acima de tudo, identificar o contexto poético e
harmônico da melodia, determinando as características gerais de sua construção: qual a
estrutura tonal da canção, como é seu apoio harmônico, como acontecem poesia e linha do
canto num mesmo desenho rítmico-melódico.
A “análise linear” descreve a existência de uma hierarquia dentro do campo de
estruturação melódica, traçando os relacionamentos entre melodia e harmonia ao longo do
tempo: o que deve ser mais cantado, o texto ou interlúdios do piano; como devem ser
valorizados ao longo da canção; que tipos de entonações devem ter em relação aos seus
momentos específicos.
A “análise motívica” deve estudar as unidades melódicas ou células melódicas
recorrentes dentro da canção: como aparecem, se valorizam o texto, se valorizam a linha
melódica, se desdobram ritmicamente para valorização da linha do canto, ou seja, análise de
elementos individuais melódicos reiterados ao longo da canção.
Todos estes pontos de estudos abordados por Stein e Spielmann só vêm acrescentar
nas nossas reflexões interpretativas, uma vez que, para nosso entendimento, são considerações
que não se desvencilham do nosso objeto de estudo que é a interpretação e que,
posteriormente nos serão úteis nas reflexões sobre canções da compositora Kilza Setti.
Voltando ao fato de que estamos reflexionando a questão da interpretação na forma
canção, e que essa forma na sua origem, é feita para uma voz solista com acompanhamento de
piano, não podemos deixar de dedicar um espaço valoroso à presença daquele que juntamente
com o cantor, participa de seu desempenho performático, sendo também intérprete e não
menos importante que o cantor: o pianista.
Stein e Spielmann dedicam um estudo a esse enlace existente entre a linha vocal e seu
acompanhamento e, considerando esse âmbito, identificam que, em muitas composições, o
acompanhamento também pode “cantar” melodias, seja duplicando a linha do canto, seja
aparecendo como elemento participante de diálogos melódicos (contracanto) dentro dessa
composição.
manner, the performer may decide to underscore one word more than another by making it louder, by stretching
it slightly, or by delaying its onset through the performer’s sense of agogic accent. Thus the subject of accent and
emphasis combines features of texture and temporality with those of performance practice, and calls for a special
sensitivity on the part of performer. For the most part, such interpretative decisions are best used when closely
aligned with the composer’s makings; only rarely does unusual reading of a vocal line lend charm and
personality to a performance. (p.91) – Tradução nossa do original em inglês.
30
13
The melodic elements in piano solos are as important as the vocal line and deserve as much analytical
attention. In addition to the analytical approaches suggest above, the pianist and the singer will want to explore
the personas of these piano melodies, especially interludes that are framed by vocal lines. For example, in “Im
Frühling”, especially with the melodic variation that occurs, help convey the poetic progression; the piano
accompaniment anticipates the singer’s next words, simulating the way an emotion is felt before it is articulated.
In this sense, performers must determine who responds to whom, whether singers prompts the accompaniment or
vice versa. (p.164) – Tradução nossa do original em ingles.
14
The sensitive accompanist will take time to understand the poetic meaning of any accompanimental melody
that differs from the vocal melody. Both performers will want to discuss the roles of various melodies
throughout a song, noting how the entrance of a new melody connotes a new poetic image or persona and being
aware of the converging of poetic issues when two different melodic lines are performed together. (p.164) –
Tradução nossa do original em ingles.
31
CAPÍTULO III
15
Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero(1851-1914) foi crítico literário, ensaísta, poeta, filósofo,
professor e político brasileiro. Sua poesia vincula-se à terceira geração do Romantismo Brasileiro.
33
_____________________________________________________________________________________
Figura 1- Três lembranças do folclore infantil - Jogo do Tantanguê – Kilza Setti – Compassos 1 a 9.
34
A brincadeira continua até que o colega seja encontrado e deve se apresentar – manda
o Rei que tire fora – e tudo culmina numa alegria peculiar (“Ah!”) e inerente aos jogos
infantis.
Figura 2 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo do Tantanguê – Kilza Setti - Compassos 20 a 31
Essas são algumas das reflexões, que nos permitem verificar o quanto texto e linha do
canto caminham juntos no ato da interpretação musical.
É possível que o intérprete, se não tiver o conhecimento do que seja a brincadeira,
possa através apenas da leitura musical, propor uma execução bastante adequada ao que foi
escrito pela compositora. Entretanto, apenas pelo fato de saber que se trata de um jogo
infantil, poderá ser influenciado por conhecimentos que foram adquiridos durante suas
experiências de vida.
35
Figura 3 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo da Lua Nova – Kilza Setti – Compassos - 1 a 10
36
Figura 4 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo da Lua Nova – Kilza Setti – Compassos 11 a 21
Figura 5– Três lembranças do folclore infantil - Jogo da Lua Nova – Kilza Setti – Compassos 22 a 34.
Pra feitiço.
Gente, no mundo há disto?
Figura 6 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo de Varisto – Kilza Setti – Compassos 01 a 10.
39
Figura 7– Três lembranças do folclore infantil - Jogo de Varisto – Kilza Setti – Compassos 11 a 13.
Figura 8 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo de Varisto – Kilza Setti – Compassos 26 a30
40
Figura 9 – Três lembranças do folclore infantil - Jogo de Varisto – Kilza Setti – Compassos 31 a 39.
Frases como “ele é o rei da mata”, no compasso 28 e “sua flecha mata”, no compasso
33, podem ter suas palavras intensificadas pela presença da síncope na linha do canto, bem
como pelos marcatos na linha melódica do piano, valorizando as características marcantes dos
pontos de terreiro.
3.2.2 Samba-Lenço
Êêê... A onça pulô gaiêro...
Quando fizé seus imbrulho imburulho
Tira o meu nome do meio, aê...
3.3 Distâncias
Eu quizera ter azas
Que estreitassem todas as distâncias
Num imenso e longo abraço para ter-te enfim
Bem junto a mim,
Bem junto a mim.
16
Alice Camargo Guarnieri. Poetisa. Exerceu atividades na área de Biblioteconomia e Documentação. Morou
em São Paulo onde se formou pelo Instituto Caetano de Campos. Fez estágio na área de biblioteconomia e
documentação no Instituto de Patologia Del Libro, Centro de Documentação em Paris e Lisboa, em 1969.
Planejou e organizou a Biblioteca do Instituto de Eletrotécnica da Universidade de São Paulo e dele foi diretora
durante trinta anos.
45
As “azas” se abrem numa simbologia de algo amplo,, colocado pela compositora num
intervalo de oitava ascendente,partindo do “ter asas”, que aparece no último tempo do
compasso 03 para o primeiro tempo do compasso 04, tentando demonstrar um largo
46
movimento que viesse diminuir as “distâncias”, citadas pelo poeta – até chegar ao “abraço” –
que se fecha no mesmo intervalo, porém agora, descendente.
Esse “abraço” chega, após um crescendo, ao f (acompanhado do piano que até então
tinha sua atmosfera trabalhada em p), num sentimento de ternura, como quem realmente
pudesse ter acolhido nos braços um amor impossível.
Dessa forma, texto e linha do canto, acompanhados agora do decrescendo das linhas
do piano, caminham para a finalização de algo que não pode ser realizado, passando por um
rallentando até chegar ao ppp.
17
Hilda de Almeida Prado Hilst – Poetisa, escritora e dramaturga brasileira, escreveu por quase cinquenta anos
e foi agraciada pelos principais prêmios literários brasileiros com o Prêmio Anchieta, Prêmio Jabuti, Prêmio
Cassiano Ricardo, Prêmio Moinho Santista, dentre outros. Alguns de seus textos foram traduzidos para o francês,
inglês, italiano e alemão.
47
Figura 17 – Trova de muito amor para um amado senhor – Kilza Setti – Compassos 01 a 15.
O texto sugere que o amor da personagem pelo seu senhor contenha a leveza dos
movimentos de uma nave, de uma ave e também a suavidade com que se move um moinho.
Esses movimentos podem ser encontrados de forma sutil na linha do canto através dos
portamentos que aparecem ora em movimento descendente (compassos 16, 17 e 18), ora em
movimento ascendente (compassos 25-26).
A linha do piano também sugere, de forma alusiva, a presença dos “passos”, numa
forma contínua representada pelo seu movimento ritmico.
48
Figura 18- Trova de muito amor para um amado senhor – Hilda Hilst – Compassos 16 a 21.
Durante toda a peça podemos perceber a linha do canto trabalhada de forma integrada
ao acompanhamento, entretanto, com o cuidado de não perder o caráter respeitoso da
mensagem do texto encontrada na linha do canto, procurando não se sobrepor a ele e, tão
pouco deixar de pertencer a ele.
Podemos ver que, por exemplo, a partir do compasso 26, a linha do canto, mesmo
tentando traduzir a ansiedade do texto nos versos e tudo mais serei, e tudo mais serei dentro
de uma dinâmica mf, não ultrapassa a altura da linha melódica do piano, que simula os passos
firmes do amado, numa dinâmica que varia também de mf a f.
Isso pode traduzir a forma respeitosa falada anteriormente.
49
Figura 19 - Trova de muito amor pra um amado senhor – Kilza Setti – Compassos 26 a 30
Figura 20 - Trova de muito amor pra um amado senhor – Kilza Setti – Compassos 30 a 37.
18
Cassiano Ricardo Leite - Foi jornalista, poeta e ensaísta brasileiro. Representante do modernismo de
tendências nacionalistas, esteve associado aos grupos Verde-Amarelo e Anta. Fundador do grupo da Bandeira,
reação de cunho social-democrata a estes grupos, tendo, sua obra se transformado até o final, evoluindo
formalmente de acordo com as novas tendências dos anos de 1950 e tendo participação no movimento da poesia
concreta. Pertenceu às academias paulista e brasileira de letras.
19
Boião - Recipiente bojudo, arredondado, para conservas.
51
_____________________________________________________________________________Figura
21 - Lua Cheia – Kilza Setti – Compassos 01 a 06.
A compositora Kilza Setti nos oferece a poesia de forma leve, nos compassos de 02 a
05, com uma condução melódica ascendente, que sugere a subida “devagarzinho” da lua ao
céu.
A intensificação de algumas palavras ou expressões junto à linha do canto, como por
exemplo, as “com mãos de trevas” num movimento descendente, podem conduzir o intérprete
a uma realização musical que permitirá ao ouvinte sentir-se realmente abraçado pela noite,
que se torna aqui, o principal cenário.
O acompanhamento do piano apresenta todo o tempo um movimento em sua linha
melódica semelhante a um ostinato, com pouquíssimas variações. Isso pode nos levar ao
tranquilo passar das horas como se realmente fosse um relógio que, na constância de seu
desenho rítmico-melódico, espera o passar da lua cheia e o seu transformar numa nova fase,
cadenciando, junto à linha do canto, num diminuindo de intensidade até alcançar o pp.
52
crescendo que partiu do mp até ao f que culmina de maneira interrogativa com a palavra
“fazer” mas nos deixa um acentuado repouso na valorização da palavra “feliz”, no sexto para
o sétimo compasso. Além dessa característica de intensidade, o texto também foi valorizado
pela sequência ascendente da melodia para se alcançar esse estado de felicidade que o texto
nos insinua.
20
Suzanna de Campos Cintra Leite-Poetisa. Nasceu em São Paulo, a 19/10/1894 e faleceu a 08/07/1945 era
descendente de tradicional família paulistana. Seu livro intitulado “Exílio Harmonioso” recebeu o premio “Olavo
Bilac” da Academia Brasileira de Letras.
54
E quando interpretamos: “tu tens o raro dom de me fazer feliz... num verso
21
meu quando teu22 lábio diz” (compassos 14 a 18), a valorização das expressões pode
enriquecer o romantismo do texto poético.
21
Grifo nosso.
22
Grifo nosso.
55
23
Sobre o mestiçamento, Silvio Romero diz em seu livro História da Literatura Brasileira: “Um dos
fenômenos mais interessantes no estudo das criações populares é o que se poderia chamar o mestiçamento de
todas elas nos países de formação colonial. Sem ser exclusivo das gentes novas, porque o fenômeno se deu
sempre desde a mais remota antiguidade, porque desde esses primórdios os povos se misturaram, é nas terras
modernamente povoadas que o fato se deixa surpreender mais em flagrante. As lendas, as canções, os contos, os
mitos, a língua e até as danças deixam-se misturar de produtos de proveniências diversas.”P.42
56
Logo a seguir, a partir dos compassos 08 e 09, o piano retoma o tempo na intenção de,
juntamente com o canto, participar de um “cantarolar espreguiçando” as palavras em banto
dos compassos 11 a 15 que, por sua vez, como já vimos anteriormente, aludem ao molejo e à
indolência que tantas vezes na história, caracterizaram a cultura afro-brasileira.
24
Geir Nuffer Campos. Poeta, escritor, jornalista e tradutor brasileiro. Estreou em 1950 com Rosa dos Rumos,
após ter publicado em jornais e revistas, especialmente no Diário Carioca, vários poemas, contos e traduções.
58
A linha do piano, mais uma vez alude ao ruflar das asas, num pequeno interlúdio nos
compassos que se seguem (de 20 a 24) e, já no final, cadencia juntamente à da linha do canto,
com um p, reforçando a mensagem de dor, proposta anteriormente.
60
O segundo poema nos parece uma forma descontraída de lidar com os problemas do
dia a dia. É como se o texto recitasse o velho provérbio de que “o que não tem remédio,
remediado está”.
Musicado de forma jocosa por Kilza Setti, como numa dança de lundu, o piano nos é
apresentado o tempo todo de maneira teimosa como quem insiste em resolver uma questão.
A dinâmica, tanto para o piano como para o canto, alterna-se entre mf e f enquanto o
texto oferece as possibilidades de resolução da problemática do poema, que se encontra na
forma de se livrar da estrela:
Cortei as pontas da estrela, joguei as cinco no mar
Onda que veio repôs cada qual em seu lugar
É como podemos notar nos compassos que se seguem de 04 a 15:
62
Logo em seguida, numa retomada de forças, a dinâmica segue do mf até ao ff, dando
ao intérprete a possibilidade de verificar a resolução da mensagem poética.
O ff aparece pela primeira vez na linha do canto num momento decidido: e a faca
joguei no mar!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão da interpretação musical têm sido foco de interesse nos cursos de mestrado
e doutorado em música e, mais especificamente, aos referentes à área da performance
musical.
Este trabalho permitiu-nos abordar questões relativas à interpretação musical
envolvendo a problemática de sua cientificidade, uma vez que, como já dissemos, ainda
aparece no cenário acadêmico de maneira nova e algumas vezes desprovida de credibilidade
por se afirmar como elemento extremamente vinculado a fatores emocionais e intuitivos.
A bibliografia utilizada participou positivamente no sentido de desvendar que, mesmo
os processos mais científicos aparecem acompanhados de uma paixão – sentimento muitas
vezes desvencilhado da racionalidade necessária a tais processos – que move o cientista em
direção às suas metas e descobertas. Dessa forma, pudemos perceber, ainda que baseado em
conhecimentos óbvios na realização da interpretação musical, que o artista jamais poderá se
desvencilhar nesse momento, de toda bagagem vivencial que lhe é cabível ao longo de suas
experiências.
Relacionamos a questão dessa cientificidade às reflexões interpretativas de canções
para canto e piano, buscando verificar os pontos mais importantes na sua condução, através
dos processos de entendimento do texto e da linha do canto, elementos componentes da forma
canção e pertinentes ao nosso estudo.
Mais uma vez aqui, reafirmamos que, tornaram-se indispensáveis as considerações dos
estudiosos: Bakhtin, sobre as funções do texto; Polanyi, acerca do conhecimento tácito e Stein
e Spillmann, sobre a interpretação em canções, enriquecendo o desenvolvimento deste estudo
e promovendo a interligação entre texto e linha do canto, nos permitindo verificar que todas
as manifestações advindas dos conhecimentos adquiridos pelo intérprete, mesmo aquelas que
norteiam as análises formais de interpretação, encontram-se absorvidas de fortes sentimentos
e intuições.
E ainda, a questão da inseparabilidade entre texto e música tornou-se mais intrigante
com todas as considerações já tecidas, promovendo um impulso maior para as reflexões sobre
a interpretação relacionada às obras escolhidas da compositora Kilza Setti.
Pudemos constatar que tanto a linha do canto quanto o texto portam uma riqueza de
elementos que se traduzem em informações para os ouvintes. E encontramos nas obras de
Kilza Setti, uma ligação íntima da construção de suas melodias com as mensagens ofertadas
por cada poeta escolhido. Somaram-se, neste momento, os conhecimentos e vivência dos
66
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 2. ed., São Paulo: Martins Fontes, 1997.
DICIONÁRIO GROVE DE MÚSICA: edição concisa; editado por Stanley Sadie; editora
assistente, Alison Latham; tradução, Eduardo Francisco Alves. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 1994.
GROUT, Donald Jay; PALISCA, Claude. História da música ocidental. Trad. Ana Luiza
Faria. Lisboa: Gradiva, 1994.
JARDIM, Antônio. Música: vigência do pensar poético. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005.
KOBBÉ, Gustave. Kobbé: o livro completo da ópera. Editado pelo Conde de Harewood;
tradução, Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997.
LIMA, Sônia Albano. Uma metodologia de interpretação musical. São Paulo: Musa
Editora, 2005. 212 p.
MARIZ, Vasco. Dicionário biográfico musical. Rio de Janeiro: Philobiblion, INL, 1985.
MATOS, Cláudia Neiva de; MEDEIROS, Fernanda Teixeira de; TRAVASSOS, Elizabeth.
(organizadoras). Ao encontro da palavra cantada – poesia, música e voz. Rio de Janeiro:
7Letras, 2001.
POLANYI, Michael. The tacit dimension. Garden City, NY: Doubleday & Co., 1996.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 5. ed. – São Paulo: Cortez,
2008.
SETTI, Kilza. Entrevista concedida a Sandra Regina Zumpano Rodrigues. São Paulo, 5
set.,2010
SILVA, Ângela Maria; PINHEIRO, Maria Salete de Freitas; FRANÇA, Maira Nani. Guia
para normalização de trabalhos técnicos científicos.
STEIN, Deborah Jane; SPILLMAN,Robert. Poetry into song: Performance and analysis of
Lieder. New York: Oxford University Press,1996.
TATIT, Luiz. Elos de melodia e letra: análise semiótica de seis canções. Cotia, SP: Ateliê
Editorial, 2008.
ANEXOS
O encontro
Tarde fria de outono em São Paulo. Num apartamento do décimo primeiro andar de
um edifício na Rua Tutóia, Kilza Setti nos recebe para a entrevista. Muito cordial e receptiva,
informalmente vai transformando aquele frio que trouxemos da rua num caloroso bate-papo,
acompanhado do pequeno raio de sol que entrava pela janela, de um “fundo musical”
provocado pelo vento a uivar entre os edifícios e pelo calorzinho do aquecedor que ela
gentilmente buscou para esquentar nossos pés.
Falamos da nossa viagem, do frio que fazia, de suas filhas e netos que estiveram com
ela durante alguns dias, das passagens dela por Uberlândia... Tudo sempre muito
descontraído, na intenção de que a conversa pudesse fluir de maneira proveitosa e não
cansativa.
O início musical...
Papai sempre gostou de música, italiano né... de família italiana, ouvia muita ópera,
tinha muitos discos de ópera, tinha coleções... Então eu me lembro dele ali escutando, a gente
fazia barulho... Mas a música sempre esteve presente. Agora, incentivar mesmo, foi a mamãe.
Porque acho que ela era apaixonada mesmo por música, por piano e nunca pode estudar.
Então, me pôs logo cedo pra estudar com uma professora e, naquela altura, nós morávamos
em São Bernardo...
Eu sei que com cinco anos já era aquela menininha prodígio, nem alcançava o
banquinho do piano e já tocava, então todos achavam que eu seria a grande pianista... E
assim... Eu só conheci o piano. Não é como hoje né, que se oferecem mil opções para as
crianças.
Eu trabalhei com educação musical. Eu pedi, lá no colégio onde lecionei: quero
bateria, quero percussão, tímpano, flauta-doce, de tudo pras crianças conhecerem, fazerem
composição coletiva, um outro modo de viver a música... Mas na minha época de criança, era
só piano, né... No máximo, violão que as meninas estudavam. O Mário de Andrade até
71
falava: era a “pianite”... Então, piano... bem, aí eu também me compenetrei que seria
pianista. Sempre estudei, até entrar no Conservatório.
Por que... nós éramos três meninas e a última das meninas morreu com seis anos, foi
um desastre na família, então deixamos a casa aqui da Aclimação, onde morávamos e fomos
de volta pra São Bernardo, até a época em que precisamos estudar, minha irmã na faculdade
de Arquitetura e eu no Conservatório,quando retornamos a São Paulo.
Mas no começo do começo, eu com quatro anos, foi com a professora... era Leonilda
o nome dela. Ela quem me deu as primeiras aulas.
Depois, a mamãe - era muito antenada minha mãe - não sei como, ela conseguiu um
contato com Fructuoso Viana...ele é de Uberaba... não, não,de Itajubá, ele era de Itajubá.
Mas morava aqui em São Paulo. E aí eu comecei a estudar com Fructuoso Viana, compositor
e um grande pianista e... nossa! ...as peças dele são lindas, pra piano, e pra voz também.
Ele era muito amigo lá de casa... Aí, ao me tomar como aluna de piano, ele dizia: “Ih!
Essa menina tem que esquecer tudo que aprendeu, tem muito vício de técnica, sabe...
daquelas professoras de interior”, ele falou.. “esquece tudo, e começa tudo de novo”. Aí
fiquei como sua aluna, até a época em que se mudou para o Rio de Janeiro. Estava muito
difícil a vida deles aqui em São Paulo, as duas filhas eram pequenas, dificuldade de
emprego...
Aí Fructuoso foi pro Rio e me deixou com essa senhora... Tá vendo esse quadro aqui?
Essa foi uma criatura maravilhosa na nossa vida. Era amiga do Fructuoso Viana. Seu nome é
Júlia da Silva Monteiro. Ela era pianista, cantora, foi professora de canto, eu estudei canto
com ela durante quase oito anos, até eu me casar... Uma pessoa que conhecia inglês, alemão,
italiano... uma pessoa muito culta, foi como... era irmã, era mãe, era amiga, era...era tudo
para mim!
Então ele nos deixou com a Julinha... a chamava Julinha. Júlia da Silva Monteiro,
descendente de nobres portugueses. Então foi com ela que eu estudei piano e mais tarde,
canto... Estudei também com a Nair de Lima Tabet, que foi assistente da Tagliaferro. De
modo que eu tive um pouco de orientação técnica e interpretativa da escola Tagliaferro.
Depois eu passei a estudar com Antonio Munhoz, (não sei se vocês conhecem), um
pianista que estudou com a Lili... não a Lili não, a francesa... estudou com a Madame
Long25.Munhoz foi aluno dela.
25
Madame Long - Marguerite Long, pianista e professora francesa.
72
E eu cheguei a ver Madame Long aqui no palco do Municipal. É... ela entrando de
bengalinha, tal, tal, mas ela tocava!!... ela já devia ter seus oitenta anos, eu era meninota.
Então, depois do Professor Munhoz, eu prestei exame vestibular e entrei no
Conservatório. Cheguei a dar alguns concertos como solista e participei de vários cursos de
Interpretação musical com a Tagliaferro. Não sei se vocês lembram... tinha muitos cursos de
Alta Interpretação... (não é do seu tempo, não). Eu fui contemporânea de... nesse tempo era
Tinette, Gilberto Tinette, Caio Pagano, a... a pianista da música brasileira.. que é casada
com Osvaldo Lacerda... a Eudóxia de Barros. A Vera Silvia... foi um pouco depois, a Vera
Sílvia que mais tarde casou-se com Camargo Guarnieri.
Mas foi nesse tempo dos anos 50... 60... aí, toquei um pouco nas aulas da
Tagliaferro.., fui solista em concertos com orquestra, mas eu já tinha um pezinho nas
Ciências Sociais, sabe? Eu sempre estava querendo... eu não me conformava de ficar o dia
inteirinho lá na técnica do piano então eu, eu ficava fazendo técnica pianística e lendo
textos sobre Ciências Sociais.
Camargo Guarnieri...
Eu falei ih!... Acho que eu vou ter que fazer outro curso. Mas nessa mesma altura eu
inventei de fazer jornalismo! E fiz... fiz só um ano. Daí foi quando, em 1954 abriu o curso de
composição, com Camargo Guarnieri, no Conservatório Dramático. Sabe, o da Avenida São
João? Que é o Conservatório mais tradicional daqui, mais antigo.
Quando anunciou esse curso... ah!... pensei: É com ele mesmo que eu quero estudar,
porque eu adoro esta música do Guarnieri. Villa-Lobos ainda era vivo, mas eu sabia que era
impossível estudar com o Villa, que, morava no Rio.
Então, abriu a inscrição para um concurso de composição, e eu me inscrevi. Foi em
1954, no IV Centenário da cidade, inscrição pra curso gratuito, com teste de seleção. Só
tinha homem inscrito, né... E eu!... Naquela altura, em composição --, provavelmente existiam
mulheres compositoras -- mas não havia candidatas inscritas para esse teste. Foram
aprovados o Nilson Lombardi, o Osvaldo... não!(O Osvaldo já era aluno do Guarnieri), o
Sérgio Vasconcelos, o Rudner Schmidt. Almeida Prado foi depois... depois... Almeida Prado
não participou desse curso, não. Eu era a única mulher. Aí nós estudamos com Guarnieri até
terminar a vigência do curso, mantido pela prefeitura de São Paulo.
Quando terminou, no final de 54, Guarnieri nos disse: “olha, vocês todos têm muito
talento, quem quiser estudar comigo, vocês se quotizem aí, paguem o que puderem, se não
puderem não paguem”, sabe, ele era muito assim, muito generoso nesta questão. Aí nós
73
continuamos com ele. Primeiro em grupo, depois cada um tendo sua aula separada, né... Eu
estudei até 1960, quando me casei e fui morar no Rio. Na verdade eu não estudei muitos anos
com ele, foi de 1954 a 1960.
As Ciências Sociais...
Eu parei o curso com Guarnieri porque fui embora pro Rio, mas daí quando voltei, já
estava com a vida complicada, tinha duas filhas. Mas continuei fazendo música... Mas, fiquei
já mais por minha conta. Aí eu tive um intervalo grande, onde fui fazer ciências sociais. Em
meados de 1970. Começou uma questão ideológica na minha cabeça. Eu dizia: mas eu estou
escrevendo música para um grupo de elite intelectual, o que é que está adiantando isso?Não
adianta nada, eu preciso cuidar de coisas que venham mais (dos problemas) da população...
Porque também com essas leituras todas de Ciências Sociais, a gente acaba se
conscientizando de que não adianta ficar naquele mundinho fechado numa torre... Qualquer
escritor ou pintor, qualquer artista sente isso. Acho que foi um pouco demais na minha
cabeça. E aí eu comecei a trabalhar com a população de pescadores, depois com os povos
74
Outras composições...
E daí, em 78 eu ainda fiz uma peça pra piano, meio assim no tranco, eu não tava com
muita vontade de compor, mas o José Eduardo Martins tava organizando um caderno de
obras para piano, em homenagem a Camargo Guarnieri. Ele já havia feito um, em
homenagem a Villa-Lobos. (eu não sei se vocês têm esses cadernos, são publicações da
ECA28. Então ele pedia pra alunos ou admiradores do compositor fazerem músicas em
homenagens publicáveis. Aí quando chegou a vez da homenagem a Camargo Guarnieri,
26
Conservatório Dramático e Musical de São Paulo.
27
A Fundação Calouste Gulbenkian é uma instituição portuguesa, com sede em Lisboa, de direito privado e
utilidade pública, cujos fins estatutários são a Arte, a Beneficência, a Ciência e a Educação.
28
ECA-Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
75
somente alguns aceitaram: Almeida Prado, o Sérgio Vasconcelos, Olivier Toni, aquele
compositor gaúcho já falecido que morreu: ...Breno Blauth... eu não me lembro, acho que
cinco ou seis fizeram. E aí essa peça foi em 78, mas eu não tava muito no pique de escrever
música, eu tava assim, atolada em Ciências Sociais, lendo Sociologia, lendo Marx, lendo
Engels... Falei: bom... Vou fazer, porque se eu não fizer, fica muito desagradável eu não
fazer uma peça em homenagem ao meu professor, foi meu mestre! Então eu fiz, em 78... Fiz
uma peça pra piano que foi gravada agora pela pianista Sylvia Maltese. É a
Multisarabanda... Eu tomei uma peça que eu tocava nos cursos da Tagliaferro, é de uma
suíte de Debussy, sabe aquela Suíte Pour le piano? Prelúdio, Sarabanda e Toccata. Tomei a
Sarabanda, porque a Sarabanda tem vários sentidos... Sarabanda pode ser uma repreensão.
E é também uma dança, mas eu a usei nos dois sentidos, (porque naquela altura, Villa-Lobos
se os ditos nacionalistas tavam meio por baixo sabe?, uma certa campanha contra... Hoje
felizmente mudou! Mas tava assim... certo preconceito. Até Levi-Strauss em meados dos 70,
também caiu meio na... em desgraça, vamos dizer, isso na Academia, na vida acadêmica.
Porque eu tava lá, eu percebi. Eu também era fã de Lévi-Strauss, lia tudo desse autor...
E aí eu tomei a Sarabanda de Debussy, acho que, eu não sei quantos compassos, não
me lembro, dez ou doze iniciais da Sarabanda de Debussy e mantive o mesmo padrão de
valores em seqüência, mas com outra melodia... Mesmo padrão dos valores que Debussy
usou. E fiz uma construção com uma estrutura igual só nos valores...
O Zé Eduardo Martins, quando encomendou a peça, pediu que a gente mantivesse as
letras da palavra GUARNIERI então, G do sol... entendeu? E assim por diante. Com aquela
grafia que os anglo-saxões usam... Nós usamos dó-re-mi-fa-sol, eles usam A, B, C, etc e...
observando esta sequência.
Então como eu coloquei em comentário, não era só uma Sarabanda- dança. Pois é, aí
eu coloquei assim: Multisarabanda, em primeiro lugar, homenagem ao meu mestre Camargo
Guarnieri; em segundo lugar lembrando a Sarabanda da Suíte de Debussy que eu ouvi num
som maravilhoso do Gilberto Tinetti, (ele era meu colega desde então, tocávamos no teatro,
nas aulas da Tagliaferro) e... em terceiro lugar, para que sejam reestudadas e repensadas as
obras de Mário de Andrade e Camargo Guarnieri, que estavam muito malhadas, muito
judiadas, mal compreendidas.
se pode dizer que era o dono da verdade, a tudo que ele dizia. Ele era muito intuitivo, mas
tinha uma cultura bastante grande... Ele lia alemão, lia italiano, francês, inglês... E nunca
saiu do Brasil! Tinha uma intuição muito grande, mas também tinha preparo. Agora, era
ousado, né... E a obra dele, não adianta!... era vanguarda já nos anos 20. Macunaíma, não
sai da pauta!
E uma das coisas que o pessoal da música de vanguarda criticava no Camargo
Guarnieri é que ele dava pros alunos... (você conhece o Ensaio Sobre a Música Brasileira,
né)? Ele dava aquelas melodias pra nós trabalharmos exercícios de contraponto. Ele era
muito exigente no contraponto... Exigente assim, trabalhar em contraponto... então ele dava
temas recolhidos pelo Mário, que depois eu tive a paciência de verificar, que não é maioria
do Nordeste (como muita gente pensa), tem Nordeste, tem Minas, tem muito de São Paulo,
tem muito do Sul... então não era só do Nordeste, porque as pessoas não vão ver direitinho
como é que é, mas eram temas populares recolhidos por Mário. Então nisso, Guarnieri foi
um pouco criticado.
Se fosse na Europa... como é que é mesmo aquele tema? É... Temas populares...
Beethoven trabalhou temas populares, Chopin, Schumann... enfim, não é um crime. Mas o
Guarnieri insistia porque tava ali na mão, né, fácil... Tava lá o Ensaio com uma multidão de
temas. Ele foi muito criticado, por várias razões.
Dizem que ele impunha seu estilo aos alunos. Eu fui aluna dele durante seis anos, eu
não posso dizer isso. Seria injusta se falasse isso. É claro que ele dizia: “você não acha
melhor isto aqui? Ó: isto aqui não tá bom, veja bem... tá soando melhor... aqui tem uma
quinta paralela... você quer usar quinta paralela, usa... mas tem que saber que você tá
usando”. Principalmente no contraponto... Tanto não impunha seu estilo, que Almeida
Prado, Marlos Nobre, eu mesma, fomos pra outros caminhos. Tivemos a base com ele. Eu
também...
Quer dizer, as primeiras peças, principalmente porque eu admirava a obra dele, acho
que no fim você acaba se imbuindo, acaba incorporando, talvez algumas harmonias, alguns
climas sonoros. Quero dizer harmonia no sentido de jogo de sons, de combinações de sons
que ele usava, a gente acaba adotando instintivamente. Mas não que ele impusesse isso...
dissesse “não!, tem que ser assim...” Eu não tive essa experiência.
Eu acho que tudo que um ser humano faz em arte é resultado do que ele ouviu. Até de
consequência das suas vivências anteriores, não é? Inclusive eu acho muito difícil – essa é
opinião pessoal minha, absolutamente empírica – eu acho que hoje, SÉC. XXI, neste ano de
2010, é muito difícil ser original.
77
Sobre a originalidade...
O que é ser original? Você pode ser extravagante... Extravagante tem bastante. Quer
dizer, eu já assisti concertos assim, o pessoal comendo... um no piano, outro comendo pizza
em cima do piano, essas coisas, você sabe o que é, happening... Happening já passou da
moda, não é mais novo. Ou aqueles festivais de música nova, que eram bem interessantes.
Foi... acho que uma iniciativa do Gilberto Mendes, muito importante. Mas aquilo tudo que eu
me lembro, que eu via... até em Santos, num concerto, as pessoas escovando os dentes no
palco... quer dizer, é aquela coisa, é happening mesmo.
Então, nada mais é novo... Eu não quero nunca ser nova, nem ser original. O que eu
acho importante, como compositora, (não sou intérprete mais), é passar, com a maior
sinceridade possível, o que eu sinto. Não interessa se vou pra Vanguarda, se vou pra qual
corrente ideológica, se sou original, se estou fazendo alguma coisa bem gasta, que não se tem
mais interesse, mas acho que o importante é você estar bem consigo mesma. Bom, eu estou
passando isto porque estou sentindo assim, eu vou fazer assim... é a minha verdade. E a
resposta a esse estilo você vai ver com as pessoas... Se ninguém sentir nada com o que você
fez... não valeu nada, né!(risos)
E agora, com as experiências da informática, da eletrônica, não se tem mais
parâmetros. A produção é muito maior que o tempo pra se consumir ou absorver essa
produção.
Eu não me preocupo muito não, com essa história de se vai ser, se vai agradar, ou se
não vai agradar... o que ficou, ficou. Eu vejo que muita gente me procura querendo fazer as
minhas peças... Então essas ficaram porque tiveram algum sentido pra uma pessoa. Então eu
não tenho essa preocupação.
Depois que você começa a escrever, acho que é a mesma coisa com o intérprete... ou
com o professor... depois que você começa nessa atividade, você não quer parar mais, porque
acho que esta é a sua meta, esta é a sua missão, né...
da Secretaria da Cultura (Prof. Dr. Luís Augusto Milanesi29) que me pediu que fizesse uma
Missa Caipira... Já havia uma Missa Afro do Carlos Alberto Fonseca... ele tem uma
Missa...Depois que eu fiz a minha Missa Caiçara, eu ouvi um dia, acho que no rádio... ele
mesmo, me disse que tinha feito a Missa Afro.
A Missa caipira eu não fiz... eu disse: eu tô muito ligada aos pescadores, agora eu
tenho que fazer uma Caiçara! Eu poderia até fazer, porque não há muita diferença digamos,
na estética, entre a estética do mundo caipira e a estética do mundo caiçara... Tô me
referindo à estética num sentido bem popular, sentido vulgar. Não vou entrar em estética,
assim, é complicado... Mas a noção de beleza, a noção do que é bonito pro caiçara e pro
caipira não é muito diferente. O que difere é o ambiente. O caiçara tá ligado ao mar. Você vê
pelos textos das músicas que eles cantam, né... tá ligado ao mar... outro tá ligado ao interior,
ao mundo caipira mesmo, mundo mais confinado... aí acho que é uma diferença, nos textos
você nota bem a linguagem que eles usam, tem a ver com o mundo que está mais próximo da
realidade deles, o mais imediato. E o caiçara é a pesca, é o peixe, as dancinhas que tem a ver
com o caranguejo, com a canoa...
E daí pra adiante, dos anos noventa até agora, eu amadureci mais como pessoa,
fiquei mais velha e tal, e aí as experiências com esses mundos diferentes, do povo Guarani,
por exemplo... do Caiçara, do Guarani e, mais tarde, a partir dos anos noventa e meados de
noventa, os índios lá de cima, os Timbira.
Eu comecei a escrever sempre mais com uma intenção de chamar a atenção... a
própria Missa Caiçara, eu coloquei lá: em homenagem aos pescadores e pela preservação do
litoral paulista. Porque tinha uma ameaça de usina nuclear ali naquele complexo de Iguape
que é a coisa mais linda, é uma das reservas maiores de Mata Atlântica. E nessa altura
tavam com um projeto de... usina nuclear!!. Eu sempre fui fazendo passeata, sabe? Contra
esses projetos grandes, eu sempre me metia nisso...
E aí eu falei, bom... pela preservação! porque foi uma ameaça séria. E que não
estamos livres dela... Como houve em Angra, né?... Eu não quero ser retrógrada, eu sei que é
preciso... agora tem a Belo Monte,... Belo Monte eu tô assim, desesperada com aquele
negócio, porque vai dizimar a vida... não é que vai matar as pessoas, não. Vai acabar com a
vida cultural, social, com o tipo de vida de muita gente. Os ribeirinhos, os índios... já foram
muito prejudicados... Bom, há mais de duzentos anos eles estão sendo prejudicados! Só o
contato com o branco já... né?
29
Luís Milanesi, ex-diretor e professor da ECA/USP
79
Mas aí eu tenho feito o trabalho assim, musical, tudo muito... Com o melhor que eu
posso dar na questão técnica, musical... em geral sempre prá voz porque... umas peças
também com relação aos aborígines australianos que foram dizimados também... houve um
extermínio grande lá... mas ainda existem muitos grupos, né... cada vez que eu vou lá (na
Austrália) eu me encho de livros, leio tudo sobre a.... porque o problema é o mesmo... a
colonização. O processo de colonização leva a isso, como levou na América Hispânica, como
levou na América Portuguesa, como é na Ásia, como é na África então, nem se fala...!
Então eu fiz duas personagens de lá que eu achava importante... uma personagem
importante lá que é na Tasmânia, eu fiz uma peça lembrando essa figura, né... essa obra não
é vocal não... só instrumental... lembrando essa figura e... foi uma tragédia a vida dessa
criatura... e fiz uma outra, com poesia de uma menina, uma indígena (aborígene) de quinze
anos que ganhou um prêmio na escola... eles estudam na escola (alfabetização em inglês)...
como aqui, (nossos índios) já são alfabetizados... e ela ganhou um prêmio lá com essa poesia.
E eu então musiquei, é uma peça prá soprano ou tenor, cantada em inglês, porque o poema é
em inglês. E é sobre a história de uma mineração... os problemas são os mesmos... uma
companhia mineradora que se instalou num lugar sagrado dos aborígines.
Então, o que eu faço? Eu chamo a atenção, só isso, não posso fazer mais nada.
E eu venho fazendo assim, né...
30
Renato Mismetti, barítono brasileiro, diretor artístico da Fundação Apollon-Bremen-Alemanha, de apoio às
Artes.
80
Paisagens Cantantes, Singende Landschaften... essa foi a primeira obra para o projeto
Poesia&Música – Sonoridades Brasileiras..
Eles me convidaram no ano anterior, foi só o Marlos (Nobre)... Eu tava na Austrália,
eu falei... não, eu não vou assumir esse compromisso não, tô no meio de crianças (meus
netos), eu não vou poder assumir (o trabalho de composição..).
É... a peça, série alemã Singende Landschaften, depois eu fiz as peças do Carlos
Drummond, Três canções, aí o Renato pediu. Porque eu sugeri a ele -- era o ano de
comemoração de 100 anos do Carlos Drummond-- teve também poemas de Hilda Hilst,
Carlos Drummond, e os compositores alemães... Foram três edições, aí veio o Acre Noturno.
Eu pedi: Posso fazer o Acre Noturno? (dos Poemas Acreanos de Mário de Andrade) Porque
tem a ver com a Amazônia!Tem muito a ver com a Amazônia.
Aí eu falei: Renato, vamos fazer uma coisa pra vocês. É porque eu vi o jeito, o estilo
dele cantar e eu já peguei o jeito... então... é pra voz, piano, cello trombone e percussão...
Suas produções...
Produções literárias não digo,... o livro é a tese... eu tenho vários artigos. Uma vez o
Tacuchian, sabe?, o Ricardo Tacuchian... ele pediu pra mim mandar, e pra outras pessoas
também, o que eu tinha de artigos, a relação dos artigos. Mas depois disso, já escrevi outros.
Assim, sabe? porque quando você vai a congressos... no fim você tem que escrever a
sua palestra. Aí escreve e torna-se um artigo, né? Alguns foram publicados na Alemanha, em
Viena, alguns foram publicados aqui, na Revista de Arte de Bahia, da Federal da Bahia, na
Revista do IEB/USP Revista de Música (RJ), eu nem me lembro bem... tem coisas no
Paraná... Toda comunicação ou palestra acaba virando um artigo, né?...
Quando os congressos são relacionados com Antropologia ou Etnomusicologia os
assuntos são, digamos, do meu dia-a dia... mas eu não tenho uma obra literária. Mesmo o
livro, a tese, não é uma obra literária é um relato de uma tese... mas eu gosto de escrever,
sempre gostei. Quando eu estava no curso primário, um dia a professora chamou minha mãe
e disse: “sua filha é a literata da classe!” Porque eu gostava de escrever, né... de falar muito
também!
...e a gente teve que dar aula, né... eu não dou mais aula. Mas eu sinto saudades, viu!
Não sei como é que é hoje, né. Como é que é a clientela (os alunos) hoje, parece que é mais
difícil... não há mais parâmetros... eu mesma, se desse aula (ensinasse) hoje, teria que me
ilustrar um pouco sobre o que é o Rap, o Hip-Hop, o que é o... esses ritmos todos, o mang
beat, não sei o quê..., eu não quero mais nem perder tempo. Porque eu não dou mais aulas,
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então eu não vou precisar disso... eu leio no jornal... num dia lá eu dou uma lida, tal... Mas
não vou me aprofundar nesses estilos.
Às vezes me chamam lá... o pessoal de Letras da USP... eu falo:, “gente, mas eu não
sou de Letras...” porque a gente trabalha com os índios também, e tem muito a ver, a língua
com a Antropologia, Etnolinguística... então às vezes quando eu tenho que fazer uma
intervenção, participar de um Congresso, de um Encontro, aí eu preciso me aplicar um pouco
mais né... porque eu não sou dessa área.
Mas sempre me chamam... a oralidade...Oralidade tá muito em moda... Então houve
um encontro lá na USP e eles me chamaram... e eu falei ai, ai ,ai... não sou dessa área... Mas
sabe o que é? É que há uma identificação entre esse professor ou a outra professora que me
chama, com o que eu faço, com a música (refiro-me ao trabalho com os povos Timbira), com
as narrativas cantadas, tudo isso não dá pra separar...
Por exemplo, trabalhar com os índios Timbiras... eles fazem música o dia inteiro, eles
cantam até à noite, de manhã, de madrugada... eles param um pouquinho, vamos dizer das
três às seis da manhã, ou às cinco... porque às cinco já começa um lá que eu chamei de
trovador, aliás não fui eu que chamei. Foi aquele americano lá... o... antropólogo William
Crocker. Um americano que trabalhou vinte e tantos anos com os Timbira e com os Canela,
Canela Apaniekrá, Ramkokamiekrá... Ele chamou o cantador solista Timbira de trovador
porque realmente, você tá na rede lá... e pensa: bom já acabou, então agora eu vou tirar um
soninho...mas aí eles recomeçam a cantar às cinco da manhã, o dia nem clareou, uma coisa
linda, mas linda, linda... um solo vocal, a coisa mais bonita....! Então tem a ver a língua
(linguagem) com a música. Por isso o pessoal de Letras tem uma sintonia comigo, porque
eles precisam de umas ideias e eu preciso das deles também. Então a gente trabalha assim,
meio... não dá pra separar.
O texto e a melodia...
...Vocês que cantam, sabem que não dá pra separar... texto e canto... não dá pra
separar... tem que entender o texto, tem que sentir o texto... já se discutiu bastante sobre isso,
né! Texto e melodia... de vez em quando sai algum artigo.
Eu me lembro que o Milanesi criou os Cadernos de Música da ECA, ele fez uma
pesquisa com alguns compositores e pediu que mostrassem, escrevessem sobre como eles
vêem essa ligação texto-música, então ele entrevistou várias pessoas, até mesmo o
Drummond de Andrade..
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O Milanesi, de jornalismo, mas ele não é músico... (ele vive a música!). Até Carlos
Drummond também deu sua opinião... eu tenho isso publicado. Mas texto, música... muito se
fala!. O Wisnick, o Tatit, eles trabalham muito essa questão, né... mais dentro da Semiótica...
porque é um assunto interessante pra você explorar, ver até que ponto uma coisa influencia a
outra... ou influencia, ou a música mergulha no texto...
Eu, quando escrevo, eu tenho que gostar muito do texto, senão não dá pra escrever...
engraçado, duetos eu nunca fiz... a não ser na Missa Caiçara, porque o Samuel Kerr (que
regeu a estréia da Missa) me pediu: “Kilza vê se você insere aí uns dois duetinhos pra
sopranos... porque não faziam parte da Missa. Mas não sei porque... é a mesma coisa que
dois pianos... aliás eu não tenho quase nada pra piano, e é o meu instrumento... tenho muitos
conjuntos instrumentais... mas vozes é o que eu gosto... essa peça que eu fiz, que foi gravada
junto com a Missa, eu fiz pra Sílvia Tessuto, que é uma mezzo...tem uma voz!!!..
...Eu ouço, eu ouço tudo... bossa nova, jazz, sambão...eu gosto de tudo que seja bom,
eu não tenho esse preconceito, agora tem umas coisas que não dá, é puro mercantilismo
mesmo! Parece que o pessoal faz uma marcação ali, pra ver quanto vai faturar...
Mas a história do texto... quando eu estava pra musicar... não, eu musiquei uma peça
do Carlos Drummond, aliás eram duas... mas uma ficou mais fácil de se passar né, porque o
texto é mais leve... é Memória... e.... eu disse a ele que não estava me achando muito
competente pra trabalhar um texto dele, porque afinal....Carlos Drummond, né...!!! e ele,
muito simpático: “imagina... que bom, que bom!... eu quero ainda viver pra ouvir a sua
música...” aí numa das cartas que ele me escreveu, ele disse... “não, porque as coisas são
independentes, a obra musical é uma e eu fico feliz que ela tenha partido do meu texto”. Mas
na verdade é mesmo. A poesia tá alí. Se você vai musicar essa poesia, você vai construir
outra obra. Embora conjugada com essa poesia, de certa maneira dependente dessa poesia,
já que você usou essa poesia, quer dizer, o texto... uma mas é uma outra coisa! Você deu
outra forma, você deu outro sentido... a história de estrela tão alta, eu dei um sentido longe,
né... mas o que eu quero dizer é isto, eu sinto assim, você constrói uma outra coisa com
aquele texto. É um assunto muito inspirador... texto e som... quer dizer, som da palavra e som
do texto.
...Bandeira, por exemplo, é um poeta que eu acho mais confortável de musicar, não
sei por quê... e Drummond é difícil! Eu suei pra musicar as Três Cantigas, eu chamei de Três
Canções os Três Poemas... é difícil Drummond. Há poetas mais fáceis de musicar, eu não sei
explicar por que... porque já tem um embalo.. só um literato, uma pessoa mais ligada às
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letras poderia entrar na discussão e talvez nos dar mais luzes a essas dúvidas que tem
(existem), né. Porque uns... Bandeira eu acho mais fácil musicar... tanto que ele é muito
musicado, né! Mas Carlos Drummond é mais difícil...
Porque as palavras têm a estrutura sonora e têm a estrutura semântica... você vê,
você fala em estrela, você já imagina lá pra cima... você não pode pensar numa estrela no
chão, ou pode até, mas o lugar comum é a estrela no céu! Então tem o valor semântico e tem
o valor, né?: es-tre-la... e tem palavras, eu me lembro de quando eu era criança, e fica até
hoje essa ideia, Natal pra mim parece uma coisa de cristal... essa coisa que brilha,
natal/cristal. Tem palavra que...
Quando eu estava na escola, bem no primário, vendo a história do descobrimento do
Brasil, então aprendia que chegaram as naus e deram o nome de Monte Pascoal... Quando o
professor falava Monte Pascoal, eu lembrava de chocolate, por quê? Por causa da Páscoa
estar ligada com criança...chocolate...! Então as palavras têm até sabor... pode ter... pra você
um gosto, pra mim outro... então é muito curioso esse negócio de musicar texto...
uma senhora de uns sessenta... morreu com 87. Mas assim, uma pessoa de uma cultura
invulgar... então ela ajudou muito na técnica vocal, e eu fui notando que os sons, pra vocês
que são cantoras, os sons com a vogal aberta... nos sons mais agudos... eu costumo jogar
(para o agudo) a vogal aberta. Nem sempre é assim, mas então a gente pensa na letra, no
sentido de facilitar para o cantor.
Então já vários cantores me falaram “nossa! você tem uma escrita tão confortável pro
cantor”, então acho que é porque estudei canto e um pouco também pela orientação, né...
bem orientada nos trabalhos com o Guarnieri... e também um pouco acho que, intuitivo, né...
Voltando às composições...
Ponto de Terreiro e Samba-lenço foram temas que eu recolhi... nas andanças aí em
São Paulo. Eu não me canso de fazer isso... mas o Guarnieri brigava comigo: “você fica lá,
perdendo seu tempo no meio de pescadores, no meio de índios, pra que? Senta e escreve
música!” Porque eu era meio malandra nisso... eu não trabalhei direito... ele dizia “escreve
uma sonata” “faz não sei o quê”... Tudo que tinha forma, sonata, concerto, quartetos... eu
tinha preguiça de fazer... eu sou sempre gauche, né...sempre fazendo errado, ao contrário. E
ele dizia “pra que é que você tem que se meter lá, no meio dos pescadores...?” Ele achava
que eu perdia muito tempo. De fato, porque o tempo é um só... Você investindo numa aldeia,
você não tá escrevendo música, mas em compensação você está se inteirando de
humanidades, você está se inteirando de coisas que, fechado numa torre, você não aprende.
Aí é uma opção, né?
Eu não me arrependo... eu aprendi muito com esses povos, sabe? Aprendi muito com
eles, foi legal... não acho que eu tenha perdido tempo mas, não usei o tempo que o Guarnieri
queria pra... eu podia ter produzido mais... realmente nunca escrevi uma sonata... fiz peças
mais leves...
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O Acre Noturno foi uma coisa mais comprida, mais densa... esse sim, o texto me
conduziu... cheio de plásticas diferentes, o texto é assim, né... de repente o Mário acorda e diz
“seringueiro dorme”... dá aquela coisa de melancolia, então eu fui seguindo... fui seguindo o
texto... ficou uma coisa entrecortada, não tem uma unidade, porque o texto também não tem.
Eu tô começando a trabalhar há uns oitos anos, a Meditação do Rio Tietê, mas eu não
tô nem anunciando mais porque não consigo terminar (faltam tempo e sossego). É uma peça
enorme, texto enorme sobre o rio Tietê, hoje poluído, judiado, mas é outra coisa complicada.
O Mário é difícil de musicar, porque ele tem momentos. Ele não tem a coisa de uma
unidade...
1- Piano e Canto
1957 Distâncias Voz aguda e 02’00 CMBP Texto: Alice Camargo Guarnieri.
piano Estréia: 1962-Rio de Janeiro,
Auditório do Palácio da
Cultura/MEC.
Tenor: Camilo Michalka; Piano:
Marlos Nobre.
1958 Raro dom Voz aguda e 02’00 CMBP Texto: Suzana de Campos.
piano Estréia: 1961-Salvador/UFBA-
Salão Nobre da Reitoria.
Mezzo-soprano: Maria Manso;
Piano: Carlos Manso.
1959 Você gosta de mim Voz aguda e 03’00 CMBP Texto: Cassiano Ricardo
piano Estréia: 1962-Rio de Janeiro,
Auditório do Palácio da Cultura.
Tenor: CamiloMichalka;
Piano: Marlos Nobre.
1960 Cantiga Voz aguda e 02’00 CMBP Texto: Manuel Bandeira.
piano Estréia: 1961- Salvador. UFBA
Salão Nobre da Reitoria.
Mezzo-soprano: Maria Manso;
Piano: Carlos Manso.
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1961 Três lembranças do Voz aguda e 08’00 CMBP Texto: Sílvio Romero.
folclore infantil piano (série de Estréia: 1961. Rio de Janeiro -
três peças) Rádio MEC.
Soprano: Priscila R. Pereira;
Piano: Maria Silvia Pinto. Menção
honrosa no concurso
"A Canção Brasileira" Rádio MEC
- 1961.
1961 Trova de muito Voz aguda e 03’00 CMBP Texto: Hilda Hilst
amor para um piano Prêmio: 1º Prêmio no Primeiro
amado senhor Concurso "A Canção
Brasileira"'— Rádio MEC, 1961.
Rio de Janeiro.
1962 Dois poemas de Voz aguda e 05’00 CMBP Texto: Geïr Campos; Estréia:
Geïr Campos piano 1961-Rio de Janeiro, Rádio MEC.
Soprano: Priscila Rocha Pereira;
Piano: Maria Silvia Pinto.
Menção Honrosa: 2º. Concurso A
Canção Brasileira, Rádio MEC,
RJ, 1962
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1962 Cantorias paulistas Mezzo-soprano e 07’00 CMBP Temas populares da tradição oral,
piano recolhidos pela autora em S. Paulo.
Estréia: 1963, São Paulo, Teatro
Municipal.
Contralto: Léa Vinocur; Piano:
Fritz Jank. Menção honrosa no
concurso “A canção Brasileira” –
Rádio MEC, 1962.
1962 Poesia da tua luz Voz aguda e 04’00 CMBP Texto: Rossini Camargo Guarnieri
piano
1963 Na palma da mão de Mezzo-soprano e 04’00 Ms Texto: Sérgio Ricardo Tavares de
uma estrela piano Lima.
1965 Serenata Voz aguda e 03’00 CMBP Texto: Vicente de carvalho.
piano
2000 Singende Barítono e piano 35’00 Ms Composto sob encomenda do
Landschaften APOLLON STIFTUNG
Liederziklus nach Bremen, Alemanha
sieben Gedichten
von Margaret Holle Estréias: 23/08/ 01, Bayreuth e
Paisagens cantantes 06/09/01 Salzburg
Sobre ciclo de sete Ciclo dedicado aos intérpretes:
poemas de Margaret Tenor: Renato Mismetti e
Hölle
Pianista: Maximiliano de Brito
I-Grüner Facher
II – Flötenlied
Texto: Margaret Holle.
III – Dir
IV_- Ein Garten In
Der Provence
V – Hasellaub Tanzt
VI – Vom Traum
VII – Vor Dem
Morgen
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2-Voz e instrumentos
2002 Acre Noturno Barítono, Piano 20:00 Com o Texto: Mário de Andrade
Trombone, autor Dois Poemas Acreanos
4tímpanos; Ed. 1-Descobrimento
2mbarakás; eletrônica 2-Acalanto do Seringueiro
Sementes de Encomenda: Apollon Stiftung
seringueiras, Estréia: Berlim em 24/09/2003
Cuíca Renato Mismetti;
Max de Brito;
Carin Levine
Cordula Rohde;
Claudia Sgarbi.
Dedicada a
Renato Mismetti e Maximiliano
de Brito
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3-Coro a capella
4-Conjuntos Instrumentais
5-Coro e Instrumentos
6-Instrumento Solo
7-Duos
8-Quarteto
9-Orquestra de Câmara
10-Orquestra
11-Percussão
12-Percussão e Vozes
A maior parte das partituras foi depositada no CDMC, UNICAMP, onde será possível obtê-las.