FICHAMENTO Charlot
FICHAMENTO Charlot
FICHAMENTO Charlot
“Não basta, porém, coletar dados; deve-se também saber exatamente o que se
procura. E isso ainda é mais necessário quando se aborda uma questão antiga
de uma forma relativamente nova.” (p.9)
“Existem, é claro, alunos que não conseguem acompanhar o ensino que lhes é
dispensado, que não adquirem os saberes que supostamente deveriam
adquirir, que não constroem certas competências, que não são orientados para
a habilitação que desejariam, alunos que naufragam e reagem com condutas
de retração, desordem, agressão. É o conjunto desses fenômenos,
observáveis, comprovados, que a opinião, a mídia, os docentes agrupam sob o
nome de ‘fracasso escolar’”. (CHARLOT, 2000, p.16)
“Afirmar que o ‘fracasso escolar’ não existe, é recusar esse modo de pensar
sob o qual insinuam-se as ideias de doença, tara congênita, contágio, evento
fatal. Ao escutarmos tais discursos, temos amiúde o sentimento de que se é
hoje ‘vítima’ do fracasso escolar, assim como outrora éramos da peste. O
fracasso escolar não é um monstro escondido no fundo das escolas e que se
joga sobre as crianças mais frágeis, um monstro que a pesquisa deveria
desemboscar, domesticar, abater. O ‘fracasso escolar’ não existe; o que existe
são alunos fracassados, situações de fracasso, histórias escolares que
terminam mal. Esses alunos, essas situações, essas histórias é que devem ser
analisados, e não algum objeto misterioso, ou alguém vírus resistente,
chamando, ‘fracasso escolar’”. (p.16)
Como analisar o fracasso escolar? – “Essa análise, porém, se defronta com
uma dificuldade particular: a noção de fracasso escolar remete para fenômenos
designados por uma ausência, uma recusa, uma transgressão – ausência de
resultados de saberes, de competência, recusa de estudar, transgressão de
regras... O fracasso escolar é ‘não ter’ ,‘não ser’. Como pensar aquilo que não
é? Não se pode fazê-lo diretamente, pois é impossível pensar o não-ser.”
(p.17)
o fato de que ele ‘tem alguma coisa a ver’ com a posição social da
família – sem por isso reduzir essa posição a um lugar em uma
nomenclatura socioprofissional, nem a família a uma posição;
a singularidade e a história dos indivíduos;
o significado que eles conferem à sua posição (bem como à sua história,
as situações que vivem e à sua própria singularidade);
sua atividade efetiva, suas práticas;
a especificidade dessa atividade, que se desenrola (ou não) no campo
do saber.” (p.23)
“Após ter produzido certo escândalo, a ideia de reprodução foi admitida e até
adquiriu tamanha evidência, que serve amiúde de ‘explicação’ para o fracasso
escolar: se certas crianças fracassam na escola, seria ‘por causa’ de sua
origem familiar; e, hoje, de sua origem ‘cultural’, isto é, ‘étnica’. Essa
interpretação é inteiramente abusiva. Mas isso não permite, em absoluto, dizer-
se que ‘a origem social é a causa do fracasso escolar’!” (p.24)
“A deficiência é uma falta, pois, dada como constitutiva do indivíduo. Mas, falta
de quê? Mais uma vez, é interessante identificar o modo de pensar aí implícito.
Quando um aluno está em situação de fracasso, constatam-se efetivamente
faltas, isto é, diferenças entre esse aluno e os outros, ou também entre o que
se esperava e o resultado efetivo. O aluno não sabe, não sabe fazer, não é
isso ou aquilo. Poder-se-ia então interessar-se pela atividade do aluno e a
do professor e perguntar-se o que foi que aconteceu, no que, onde a
atividade não funcionou. Mas não é assim que se faz, quando se raciocina
em termos de deficiências. Ao constatar-se uma ‘falta’ no fim da
atividade, essa falta é projetada, retroprojetada, para o início dessa
atividade: faltam ao aluno em situação de fracasso recursos iniciais,
intelectuais e culturais, que teriam permitido o aprendizado (e o
professor...) fosse eficaz. Ele é deficiente.” (p.27)
“Mas a origem pode também ser pensada, a partir do vínculo de filiação, como
‘fonte’, como ponto onde é gerado o que seguirá, isto é, como causa. A noção
de origem permite enxertar um princípio de causalidade na noção de falta. A
cadeia da falta pode ser recorrida, portanto, de montante para jusante, dessa
vez em termos de causalidade: a origem familiar produz a deficiência, que
produz o fracasso escolar. Ou seja, a origem familiar é a causa do fracasso
escolar.” (p.28)
Resumindo....
“Compreende-se, então, que essa construção teórica seja tão pregnante e
resista tão bem às críticas que os pesquisadores lhe vem fazendo há vinte
anos. É verdade que ela não está cientificamente fundada e, estritamente
falando, é aberrante, pois apoia-se na ideia de uma causalidade de falta. Mas
seu fundamento não é um enunciado do tipo científico, portanto, refutável.
Arraiga-se numa experiência profissional diária interpretada à luz de princípios
que visam preservar, validar e legitimar o corpo docente. Trata-se de uma
ideologia, no pleno sentido da palavra. Frente a uma ideologia, é inútil
argumentar termo por termo, enunciado por enunciado: a crítica a uma
ideologia deve dirigir-se ao seu modo próprio de ler o mundo e, com isso,
interpretar a experiência diária.” (p.29)
O que é um sujeito?
“um ser humano, aberto a um mundo que não se reduz ao aqui e ao
agora, portador de desejos movidos por esses desejos, em relação com
outros seres humanos, eles também sujeitos;
um ser social, que nasce e cresce em uma família (ou em um substituto
da família), que ocupa uma posição em um espaço social, que está
inscrito em relações sociais;
um ser singular, exemplar único da espécie humana, que tem uma
história, interpreta o mundo, dá um sentido a esse mundo, à posição que
ocupa nele, às suas relações com os outros, à sua própria história, à sua
singularidade.” (p.33)
O móbil não é uma meta. Meta é outra coisa. O móbil, o que te faz mobilizar,
é o desejo, e o resultado permite a satisfação através da atividade.
Em relação ao sentido:
QUANDO ALGO FAZ SENTIDO PARA O ALUNO - “(...) têm sentido uma
palavra, um enunciado, um acontecimento que possam ser postos em
relação com outros em um sistema, ou em um conjunto; faz sentido para um
indivíduo algo que lhe acontece e que tem relações com outras coisas de
sua vida, coisas que ela já passou, questões que ele já se propôs. É
significante (ou, aceitando-se essa ampliação, tem sentido) o que produz
inteligibilidade sobre algo, o que aclara algo no mundo. É significante (ou,
por ampliação novamente, tem sentido) o que é comunicável e pode ser
entendido em uma troca com os outros. Em suma, o sentido é produzido por
estabelecimento de relação, dentro de um sistema, ou nas relações com o
mundo e com os outros.” (p.56)
“Para Leontiev, o sentido de uma atividade é a relação entre sua meta e seu
móbil, entre o que incita a agir e o que orienta a ação, como resultado
imediatamente buscado.” (p.56)
“Quando eu digo ‘isso tem realmente um sentido pra mim’, estou indicando
que dou importância a isso, que para mim isso tem um valor (ou, s isso não
tiver sentido, é porque, como dizem os colegiais, ‘não vale nada’). Mas,
quando digo que ‘não entendo nada’, isso que dizer simplesmente que o
enunciado ou o acontecimento não tem significado.” (p.57)
“O sujeito cuja relação com o saber estudamos (...) um ser humano levado
pelo desejo e aberto para um mundo social no qual ele ocupa uma posição e
do qual é elemento ativo. Esse sujeito pode ser analisado de modo rigoroso:
constitui-se através de processos psíquicos e sociais que podem ser
analisados, define-se com um conjunto de relações (consigo, com os outros
e com o mundo) que pode ser conceitualmente inventariado e articulado.” (p.
57)
“(...) qualquer tentativa para definir ‘o saber’ faz surgir um sujeito que
mantém com o mundo uma relação mais ampla do que a relação de saber.”
(p.59)
“(...) não há saber senão para um sujeito ‘engajado’ em uma certa relação
com o saber” (p.61) (DESEJO?)
“(...) não há saber senão para um sujeito, não há saber senão organizado de
acordo com relações internas, não há saber senão produzido em uma
‘confrontação interpessoal’. Em outras palavras, a idéia de saber implica a
de sujeito, de atividade do sujeito, de relação do sujeito com ele mesmo
(deve desfazer-se do dogmatismo subjetivo), de relação desse sujeito com
os outros (que co-constroem, controlam, validam, partilham esse saber).”
(p.61)
“(...) não há saber em si, o saber é uma relação. Essa relação, acrescentarei
eu, é uma forma de relação com o saber. Ou, ainda: se a questão da relação
com o saber é tão importante, é porque o saber é relação.” (p.62) QUAL É
A RELAÇÃO QUE OS JOVENS FAZEM COM O SABER??? O SABER É
RELAÇÃO ENTÃO É PRECISO DE UMA RELAÇÃO= ATIVIDADE, NA
RELAÇÃO DO SABER
“É verdade que uma prática deve ser aprendida para ser dominada; mas que
se deva aprendê-la não significa que seja um saber; (...) É verdade que a
prática mobiliza informações, conhecimentos e saberes; e, nesse sentido, é
exato dizer-se que há saber nas práticas, mas, novamente, isso não quer
dizer que sejam um saber (Charlot, 1990)” (p.63)
“Se o saber é relação, o processo que leva a adotar uma relação com o
saber com o mundo é o que deve ser o objeto de uma educação intelectual
e, não, a acumulação de conteúdos intelectuais.” (p.64)
“Nobre e grande ambição, louvável exigência ética e política, que nos lembra
que o homem é passível de educação e que o acesso às formas mais
elaboradas da atividade intelectual é virtualmente prometido a todo indivíduo
que pertença a espécie humana.” (p65)
“(...) a análise da reação com o saber enquanto relação social não deve ser
feita independentemente da análise das dimensões epistêmica identitária,
mas, sim, através delas. Segundo, essa análise deve ocupar-se de histórias
socais e não, aprender, de posições ou trajetórias, entendidas como
deslocamentos entre posições. A questão em debate é a do aprender
enquanto modo de apropriação do mundo e, não, apenas, como modo de
acesso a tal ou qual posição neste mundo.” (p.74)
“(...) a ‘influência’ é uma relação e, não, uma ação exercida pelo ambiente
sobre o indivíduo.” (p.78)
“A relação com o saber é a relação com o mundo, com o outro, e com ele
mesmo, de um sujeito confrontado com a necessidade de aprender;”
“A relação com o saber é o conjunto (organizado) das relações que um
sujeito mantém com tudo quanto estiver relacionado com o ‘aprender’ e o
saber;” (p.80)
“(...) a relação com o saber é o conjunto das relações que um sujeito
mantém com um objeto, um ‘conteúdo de pensamento’, uma atividade, uma
relação interpessoal, um lugar, uma pessoa, uma situação, uma ocasião,
uma obrigação, etc., ligados de uma certa maneira com o aprender e o
saber; e, por isso mesmo,é também relação com a linguagem, relação com o
tempo, relação com a ação no mundo e sobre o mundo, relação com os
outros e relação consigo mesmo enquanto mais ou menos capaz de
aprender tal coisa, em tal situação.” (p.81)
“De maneira mais geral, a ‘relação com’ inclui representações que não são
necessariamente as representações daquilo a que relação se refere. Assim
a relação com a escola pode envolver representações da escola, mas,
também, do futuro, da família, presente e futura, do trabalho e do
desemprego na sociedade de amanhã, das tecnologias modernas.” (p.84)
“(...) a relação com o saber, conforme vimos, é uma relação social com o
saber.” (p.85)
CONCLUSÃO
“”