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volume 7 número 1 p 69-78 •

Comunidade de diatomáceas como bioindicador da Martha Santos1•

qualidade da água: uma atividade prática Mário J Pereira1,2


Ana T Luís2,3
Fernando JM Gonçalves1,2
Atividades como a agricultura, indústria, desenvolvimento urbano e alterações climáticas
Tânia Vidal1,2••
originam sérios impactos nos sistemas de água doce, levando à sua degradação e perda
de biodiversidade. Portanto, é necessário monitorizar e recuperar todas as massas de
água para que estas atinjam um bom estado ecológico. A comunidade de perifiton,
nomeadamente as diatomáceas, revelou ser um excelente bioindicador na monitorização 1 Departamento de Biologia, Universidade
e avaliação da qualidade das águas, devido aos seus ciclos de vida curtos, refletindo
de Aveiro, Aveiro, Portugal.
variações súbitas no ambiente. Estas algas microscópicas possuem características
únicas como as frústulas compostas por sílica, providas de estruturas e ornamentações,
2 CESAM (Centro de Estudos do Ambiente
que apresentam formas e disposições distintas, permitindo, assim, a distinção das
espécies segundo a observação da sua morfologia. As espécies de diatomáceas e do Mar), Universidade de Aveiro, Aveiro,
possuem níveis característicos de tolerância a mudanças ambientais, como ao pH, à Portugal.
condutividade ou à quantidade de nutrientes, o que fornece informação acerca da
3 Departamento de Geociências, Geobiotec
qualidade da água de determinado local em estudo, pela sua presença ou ausência,
essencial para a monitorização dos sistemas aquáticos. Assim, este estudo propõe o uso – Geobiociências, GeoTecnologias e
da comunidade de diatomáceas na avaliação da qualidade de água de um rio, GeoEngenharias, Universidade de Aveiro,
apresentando para isso os diversos procedimentos de amostragem, de preparação de Aveiro, Portugal.
amostras para observação ao microscópio, de identificação de espécimes, através de
uma chave dicotómica elaborada para o efeito, e de cálculo simplificado do valor final de
qualidade.

Palavras-chave
diatomáceas
qualidade da água
monitorização
sistemas de água doce

[email protected]
••[email protected]

ISSN 1647-323X
educação ambiental e ensino experimental das ciências

ENQUADRAMENTO GERAL E OBJETIVO

Os recursos aquáticos são indispensáveis para o desenvolvimento sustentável, não só a água potável é
essencial para a sobrevivência do ser humano, como também é necessária para uma variedade de
atividades, como a produção de energia, produção alimentar, atividades comerciais e extração de recursos
(Biswas e Torjada, 2016). Embora dois terços do planeta Terra sejam constituídos por água, apenas 1% diz
respeito a rios e lagos. Além disso, com o crescimento da população global e o desenvolvimento industrial,
muitos habitats de água doce e a sua biodiversidade tem vindo a sofrer degradação sem que se tenha a
possibilidade de os proteger (McDonald et al., 2011; Gleick, 1993). Esta degradação é a consequência de
descargas de efluentes agrícolas, industriais e urbanos assim como de poluição difusa proveniente de
escorrências de químicos usados na agricultura (Vörösmarty et al., 2010; Salomoni et al., 2006). Nesse
sentido, tornou-se essencial uma monitorização1 e uma gestão dos recursos hídricos de forma a garantir
uma boa qualidade ecológica bem como a conservação dos habitats. Hoje em dia, é fundamental restringir
o tipo e a quantidade de contaminantes que chegam e se depositam nos ambientes lóticos2, melhorar os
métodos de tratamento de águas residuais, de forma a remover os poluentes existentes ou pelo menos
reduzir a sua concentração (Brayner et al., 2011).

Segundo a legislação em vigor em Portugal, definida essencialmente pela Diretiva Quadro da Água (DQA)
(INAG, 2009), o estado das massas de água superficiais baseia-se em análises físico-químicas,
hidromorfológicas e biológicas. Este enquadramento legislativo, acompanhado da definição de critérios de
classificação, tem como objetivo recuperar, proteger e melhorar todas as massas de água, a fim de alcançar
o bom estado ecológico3 dos mesmos (Arle et al., 2016; Brack et al., 2017). A monitorização biológica
propõe a utilização de seres vivos (bioindicadores 4) para determinar condições ou mudanças no ambiente
num período de tempo, dando uma avaliação direta do impacto ecológico 5, que se reflete na diversidade e
composição da comunidade biológica em estudo. De acordo com esse pressuposto será possível classificar
uma massa de água, segundo a DQA, em excelente, bom, razoável, medíocre e mau. Os bioindicadores
são indispensáveis na identificação de alterações provocadas por fatores externos, como mudanças de
temperatura, descargas de matéria orgânica e/ou resíduos industriais (Li et al., 2010; Biswas e Torjada,
2016).

Uma das principais comunidades biológicas usadas na monitorização de ambientes lóticos de água doce é
o perifiton, especialmente as diatomáceas, que são consideradas o melhor bioindicador pela sua resposta
rápida a mudanças ambientais e por integrar as condições do ambiente de forma bastante consistente (Li et
al., 2010; INAG, 2009; Giorgio et al., 2016). Assim, este estudo propõe o uso da comunidade de
diatomáceas na avaliação da qualidade de água de um rio, apresentando para isso os diversos
procedimentos de amostragem, de preparação de amostras para observação ao microscópio, de
identificação de espécimes, através de uma chave dicotómica elaborada para o efeito, e de cálculo
simplificado do valor final de qualidade.

1 Monitorização biológica: processos e análises que caracterizam e supervisionam a qualidade do ambiente.


2 Ambiente lótico: águas que se apresentam em movimento, com corrente (ex: rios, riachos).
3 Bom estado ecológico: ecossistema que se encontra em bom estado de preservação, sem poluição.
4 Bioindicador: espécie ou grupo de espécies que refletem o impacto produzido num habitat.
5 Impacto ecológico: efeito que produz uma variação ambiental, natural ou provocada pelo ser humano.

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DIATOMÁCEAS – O QUE SÃO?

As diatomáceas, pertencentes à classe Bacillariophyceae, são um grupo de algas microscópicas


unicelulares que maioritariamente ocorrem como células isoladas, mas que podem também formar colónias.
São organismos eucarióticos, com características próprias que os tornam exclusivos no mundo das algas.
Essas características incluem as paredes celulares constituídas por sílica, armazenamento de energia
(lípidos e polissacarídeos) e pigmentos carotenoides6 e clorofilas a e c, que lhes dão uma tonalidade
dourada-acastanhada (Taylor et al., 2007; Burliga e Kociolek, 2016). As diatomáceas são compostas por
uma parede celular externa (denominada frústula7) revestida internamente com uma membrana plasmática,
englobando o citoplasma e um conjunto de organelos (Figura 1). A frústula é composta por sílica e a sua
superfície possui poros específicos que permitem a troca de gases e materiais com o ambiente circundante
(Figura 2). O núcleo encontra-se centralizado na célula, rodeado por vacúolos que normalmente ocupam
70% do volume total da célula. Os cloroplastos, por sua vez, encontram-se ligados a estes vacúolos, onde
depositam os seus produtos fotossintéticos (Hildebrand, 2008). Devido à ausência de flagelos, o movimento
ou a sua fixação ao substrato é conseguida através da secreção de mucilagem 8 através dos poros da
parede celular. Estas secreções são também usadas na formação de colónias (Taylor et al., 2007).

FIGURA 1: Organização externa e interna de diatomáceas, com conteúdo citoplasmático não oxidado.

Sendo a parede celular uma estrutura tão distinta e variável entre espécies, a sua classificação taxonómica
é realizada segundo a morfologia da frústula9 (Smol e Stoermer, 2010). Para uma observação adequada
das frústulas, as diatomáceas vivas são sujeitas a várias técnicas de remoção de toda a matéria orgânica,

6 Pigmentos carotenoides: encontrados maioritariamente nas plantas, bastante importantes nos processos de fotossín-
tese (carotenos e xantofilas).
7 Frústula: parede celular dura e porosa, composta por sílica, normalmente constituída por 2 secções sobrepostas,

denominadas valvas.
8 Mucilagem: secreção rica em polissacarídeos, que permite o movimento e a ancoragem das diatomáceas ao

substrato.
9 A morfologia heterovalvar implica frústulas em que as valvas (em relação ao seu eixo transapical) diferem na

morfologia uma da outra; a morfologia isovalvar implica frústulas em que ambas as valvas (em relação ao seu eixo
transapical) têm a mesma morfologia.
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permitindo assim uma adequada observação da morfologia e estrutura ao microscópio. As diatomáceas


podem ser definidas em 2 grupos, segundo a simetria da frústula e os planos que a intersetam, em
diatomáceas pinuladas (simetria bilateral10) e diatomáceas cêntricas (simetria radial10) (Taylor et al., 2007).

FIGURA 2: Estrutura de frústulas observadas em microscopia eletrónica de varrimento. Detalhe da


frústula de diatomácea pinulada: superfície externa e interna (esquerda) ampliada 20000x e em
vista pleural (à direita) ampliada 17500x. A barra de escala corresponde a 5 µm.

QUAL A IMPORTÂNCIA DAS DIATOMÁCEAS NA TEIA ALIMENTAR?

As diatomáceas são um elemento chave nos sistemas aquáticos e constituem uma ligação fundamental
entre a produção primária (autotrófica) e secundária (heterotrófica) (Grady et al., 2007). As suas reservas
lipídicas altamente energéticas são uma fonte de alimento para os níveis tróficos mais elevados,
desempenhando assim um papel fundamental na cadeia alimentar aquática (Arts et al., 2009). Além disso,
são responsáveis pela produção de 20-25% do oxigénio global e têm um papel importante em ciclos
biogeoquímicos, como o ciclo de sílica e de carbono, contribuindo para a fixação de carbono ao
converterem o CO2 em biomassa (Nelson et al., 1995).

As espécies de diatomáceas possuem limites de tolerância diferentes a mudanças ambientais, como por
exemplo condutividade, pH e concentração de nutrientes. Por outro lado, têm uma taxa de reprodução
assexuada elevada, o que torna este organismo um excelente indicador de integridade biológica (Kelly et
al., 2008). O estudo desta comunidade, num determinado local, num dado momento, fornece informação
acerca da qualidade da água. Esta informação é baseada nos limites de tolerância à poluição orgânica,
traduzidos em índices de avaliação de qualidade (ex: IPS, CEE, IBD), cujo valor final está geralmente
dependente da composição e abundância das espécies de diatomáceas (Almeida et al., 1997; Luís et al.,
2016).

10 Simetria radial/bilateral: simetria radial corresponde a diatomáceas cêntricas, com vários eixos de simetria; simetria
bilateral corresponde a diatomáceas com forma alongada, apenas com um eixo de simetria.
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COMO RECONHECER DIATOMÁCEAS EM AMBIENTES NATURAIS?

As diatomáceas fazem parte de um grande grupo de microalgas abundante em praticamente todos os


ambientes (água doce, marinhos e alguns terrestres) (Kale e Karthick, 2015), com aproximadamente 200
géneros e com uma estimativa de 105 espécies existentes (Hasle et al., 1997; Smol e Stoermer, 2010).

As diatomáceas podem ser detetadas pelo aspeto viscoso, ou mucilaginoso ou pelo revestimento fino
dourado que conferem aos substratos (Figura 3). Em determinadas condições ou épocas do ano, esta
película pode tornar-se mais espessa e muito mais visível. Os micro-habitats naturais preferenciais são
substratos sólidos, plantas submersas, sedimentos húmidos, superfície de rochas expostas e também
podem ser encontradas na coluna de água, como um componente suspenso do fitoplâncton (Taylor et al.,
2007).

1 2 3
FIGURA 3: Rochas (1) e vegetação (2) com película de diatomáceas encontradas em ambientes de água doce.
Formação de película mucilaginosa (3) observada em microscopia ótica.

ATIVIDADE PRÁTICA COM DIATOMÁCEAS

Esta atividade tem como objetivo dar a conhecer este grande grupo de microalgas - as diatomáceas - e
perceber de que forma a sua identificação permite chegar a uma classificação do estado ecológico de um
rio. Desta forma, é sugerido, numa primeira fase, uma saída de campo a um rio de pequena dimensão, com
fácil acesso ao seu leito, e que permita recolher organismos aplicando as técnicas de amostragem descritas
(ver mais à frente). Numa segunda fase, é proposta a identificação de diatomáceas, com o auxílio de um
microscópio ótico de fundo claro, usando uma chave dicotómica (ver Anexo I, Figura A1).

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1ª fase: saída de campo

• Material e equipamento de campo


Botas de borracha
Luvas de latex
Escova de dentes dura para remover película de diatomáceas de pedras e/ou seixos
Tabuleiro de plástico
Esguicho com água do local em estudo
Frascos de plástico de 250 mL
Lápis/caneta e fita para etiquetas
Mapa ou GPS
Mala térmica para transportar as amostras
Máquina fotográfica

• Procedimento para recolha de amostras


1. Anotar as principais características do local de estudo, relativamente à profundidade, ao fluxo de água,
ao tipo de sedimento, ao ensombramento, à presença de vegetação, a fontes de poluição e às
modificações do leito e das margens do rio. O registo fotográfico pode tornar-se muito útil na elaboração
de relatórios e/ou discussão dos resultados;
2. Selecionar pedras aleatoriamente (mínimo de 5 pedras submersas, recolhidas em zonas com luz e
corrente) que apresentem película de tonalidade castanha. Recolhê-las para o tabuleiro, colocando-as
com a superfície colonizada voltada para cima;
3. Raspar a superfície colonizada das pedras, uma a uma, com a escova de dentes dura, para dentro do
tabuleiro (Figura 4a), com o cuidado de ir lavando o material raspado com o esguicho (água do local);
4. Homogeneizar a mistura recolhida no tabuleiro e verter para o frasco de plástico, evitando detritos mais
pesados (Figura 4b);
5. Etiquetar todos os frascos com a seguinte informação: local, data e equipa de amostragem;
6. Lavar todo o material utilizado na recolha das amostras com a água do rio, de forma a prevenir uma
possível contaminação das amostras seguintes;
7. Transportar os frascos no frio (mala térmica com termoacumuladores) até ao laboratório.

a b
FIGURA 4: Amostragem de diatomáceas epilíticas. a) Raspagem de
pedras e b) recolha do conteúdo de raspagem para um frasco.

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2ª fase: trabalho laboratorial

• Material e reagentes
Lamparina
Tubos de centrífuga de vidro (20-30 mL) que suportem temperaturas altas (≈ 90˚C) (1 por amostra)
Pipeta de vidro (para medir um volume de 20 mL)
Pipetas de Pasteur
Ácido nítrico (HNO3) (1M)
Dicromato de potássio
Lugol
Lâminas e lamelas
Naphrax11 (esta resina pode ser substituída por outra). Atenção, muito inflamável.
Centrifuga (até 1500 rpm)
Microscópio ótico com objetivas de 20x, 40x

• Procedimento para preparação e observação de amostras vivas

1. No laboratório, imediatamente após a chegada da saída de campo, colocar, entre lâmina e lamela, uma
pequena quantidade de material que se acumulou no fundo do frasco, usado para recolher e transportar
a amostra para o laboratório;
2. Observar a amostra ao microscópio, a baixa ampliação (20x). Pretende-se ter uma perspetiva geral da
composição da comunidade e observação de diferentes características de movimento e forma.

• Procedimento para preparação e observação de amostras oxidadas (contendo apenas as frústulas)


Nota: Todo o procedimento relativo à oxidação das amostras (ver ponto 3 e seguintes) deve ser realizado
numa hotte ou local bem ventilado e/ou equipado com sistema de exaustão de gases, tendo em atenção o
uso de proteção e cuidados necessários aquando do manuseamento de reagentes e aquecimento de
amostras.
3. Depois de sedimentar, transferir 5 a 10 mL dos detritos depositados no fundo do frasco para tubos de
vidro, previamente identificados com o nome da amostra. Após este procedimento, a amostra vinda de
campo, pode ser fixada com Lugol ou outro fixador, e armazenada em local fresco e escuro;
4. Adicionar cerca de 10 mL de ácido nítrico e alguns cristais de dicromato de potássio (cor de laranja) ao
tubo de vidro (ver ponto 3). Seguidamente, aquecer suavemente o tubo de vidro à lamparina, sem causar
ebulição excessiva da amostra. Este procedimento acelera o processo de oxidação da amostra e o
dicromato de potássio funciona como indicador da presença de matéria orgânica. Se a amostra, após
aquecimento, adquirir uma cor verde-azulada, significa que ainda possui muita matéria orgânica. Caso
apresente cor de laranja (dicromato de potássio), indica que a amostra foi oxidada com sucesso;
5. Deixar arrefecer a amostra e centrifugar a 1500 rpm durante 2-3 min. Remover cuidadosamente o
sobrenadante (não esquecer que é ácido forte), sem suspender o pellet, e substituir por água destilada;
6. O processo de lavagem (ponto 5) deve ser repetido 2-3 vezes até que o resíduo do ácido seja removido
por completo;
7. Após agitar os tubos, verificar à contraluz as partículas em suspensão. Se estiver demasiado turva
(muito concentrada), adicionar uns mililitros de água destilada, para diluir a amostra. Se as partículas
não forem visíveis, deixar sedimentar a suspensão durante uma hora e retirar algum líquido em excesso
ou centrifugar como descrito no ponto 5. O excesso deve ser vertido cuidadosamente para não perder o
pellet onde vão estar concentradas as frústulas das diatomáceas;

11 Naphrax: meio de montagem apropriado para o estudo de diatomáceas.


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8. Com uma pipeta de Pasteur, colocar 2 gotas da suspensão homogeneizada, espalhá-la numa lamela e
deixar secar à temperatura ambiente, sem deslocar ou agitar a amostra. A evaporação pode também ser
efetuada num local quente e limpo, de um dia para o outro. Quando o líquido tiver evaporado observa-se
uma camada fina branca-acinzentada. Deve colocar-se a lamela (com a amostra seca voltada para
baixo) em cima de uma lâmina e inspecionar ao microscópio. Se a amostra estiver muito concentrada,
dificultando a observação do material, voltar ao passo 7 e diluir um pouco a amostra;
9. Colocar 2 gotas de Naphrax numa lâmina e pousar a lamela (ver ponto 8) (com a amostra seca voltada
para baixo) em contacto com o Naphrax. Aquecer o conjunto (lâmina e lamela) à chama (lamparina),
com o auxílio de uma pinça de madeira, até borbulhar (libertação do solvente), mantendo uma distância
de segurança de 5cm da chama. Quando borbulhar, parar o aquecimento, pousar a lâmina na bancada e
aplicar levemente pressão na lamela, com uma pinça, para expulsar as bolhas. Deixar secar;
10. As preparações definitivas podem ser observadas ao microscópio. A chave de identificação e imagens
(em anexo) devem ser utilizadas nesta parte da atividade, como suporte à identificação e classificação
ecológica qualitativa dos rios em estudo (ver ponto seguinte).

3ª fase - Identificação de organismos e cálculo do estado de qualidade de água

Para a identificação dos organismos, ao nível do género, deve ser seguida a chave dicotómica (Figura A1 -
anexo), de acordo com a morfologia das diatomáceas observadas ao microscópio. A figura A2 (anexo)
representa os géneros predominantes para cada estado de qualidade da água (excelente, bom, razoável,
medíocre e mau), sendo que o investigador deve associar uma determinada classificação do estado de
qualidade de água aos espécimes que observa na amostra. Existe a possibilidade de, na mesma amostra,
encontrar géneros que correspondem a diferentes estados de qualidade da água (e.g., excelente e bom).
Nesse caso, para facilitar a execução do exercício, deve-se optar pela classificação mais elevada. Para
mais informações, consultar Prygiel e Coste (2000). A proposta aqui apresentada tenta simplificar os
procedimentos de cálculo do estado de qualidade, permitindo apenas uma aproximação à avaliação da
qualidade da água, usando a comunidade de diatomáceas.

A metodologia usada, por exemplo, na DQA é muito mais complexa e requer técnicos altamente
especializados na identificação de diatomáceas até ao nível de espécie e sub-espécie. Por outro lado,
depois da identificação das espécies ou sub-espécies, presentes numa amostra, deve-se atribuir um valor,
consoante a sua sensibilidade à matéria orgânica e a outros contaminantes. Na execução da metodologia
DQA, esta informação é usada, por exemplo, para calcular o índice IPS (Índice de Poluossensibilidade
Específico):

∑𝑛
𝑖=0 𝑎𝑖 𝑠𝑖 𝑣𝑖
IPS=
∑𝑛
𝑖=0 𝑎𝑖 𝑠𝑖

ai - abundância relativa da espécie i;


si -valor da sensibilidade da espécie i face ao grau de perturbação;
vi – valor indicador da espécie;

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Seguidamente, o valor resultante do cálculo obtido para a amostra é comparado com o valor do IPS de
referência, para a tipologia de rio12 em estudo (consultar INAG 2008, 2009) e permite classificar o local de
amostragem na categoria de excelente, boa, razoável, medíocre e má qualidade da água.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A comunidade de perifíton de rios é um bioindicador muito usado na avaliação da qualidade da água,


todavia, como se refere neste estudo, exige um grande conhecimento e experiência para identificar as
várias espécies e sub-espécies de diatomáceas. É uma área científica pouco explorada mas muito
interessante. A simplicidade da atividade prática proposta pretendeu (i) entusiasmar e atrair as novas
gerações para este assunto, (ii) lançar as bases para o conhecimento dos princípios subjacentes à
determinação da qualidade da água e (iii) incrementar a literacia científica nesta área do conhecimento.

agradecimentos • Este trabalho foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), através do projeto
“SHIFT- Avaliação do potencial de ensaios alternativos para a integração nas baterias de análise de risco de poluentes
em sistemas lóticos” (PTDC/ATP-EAM/0063/2014) e de bolsas individuais de Pós-Doutoramento de Tânia Vidal
(SFRH/BDP/94562/2013) e Ana Teresa Luís (SFRH/BPD/99448/2014). Agradecimentos são devidos pelo apoio
financeiro ao CESAM (UID/AMB/50017), por parte da FCT/MEC, através de fundos nacionais, e pelo financiamento pelo
FEDER, no âmbito de Acordo de Parceria PT2020 e Compete 2020.

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12 Tipologia de rios: grupos de rios que apresentam características geográficas e hidrológicas semelhantes entre si, e
diferem entre grupos. O objetivo é poder comparar classificações de estado ecológico dentro de cada grupo de rios com
características idênticas (ex: rios do Norte de pequena dimensão, rios do Sul, etc.) sensu DQA.
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ANEXO I

FIGURA A1: Chave dicotómica de identificação de algumas diatomáceas ao nível do género. Esta chave dicotómica foi adaptada a partir do trabalho desenvolvido por Paul Hamilton,
em colaboração com Museu Canadiano de História Natural, e do layout realizado por Bob Sharp e Yukon Education. Em https://www.yukonenvirothon.com/paleoliminology.html.
Rafe: fenda através da face da valva, geralmente situada ao longo do eixo apical.
Qualidade da água • Excelente Qualidade da água • Bom Qualidade da água • Razoável

FIGURA A2: 1- Ceratoneis; 2- Diatoma; 3- FIGURA A3: 1- Encyonema; 2- Navicula. FIGURA A4: Gyrosigma.
Eunotia; 4- Cymbella

Qualidade da água • Medíocre Qualidade da água • Má

FIGURA A5: 1- Hantzschia; 2- Nitzschia FIGURA A6: 1- Craticula

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