AROEIRA SALLES. Tese, Tribunais de Contas PDF
AROEIRA SALLES. Tese, Tribunais de Contas PDF
AROEIRA SALLES. Tese, Tribunais de Contas PDF
PUC-SP
DOUTORADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2016
Alexandre Aroeira Salles
DOUTORADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2016
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
Prof. Doutor Márcio Cammarosano (Orientador) – PUC-SP
____________________________________
Professor (a) convidado (a)
____________________________________
Professor (a) convidado (a)
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Professor (a) convidado (a)
____________________________________
Professor (a) convidado (a)
The Brazilian Constitution of 1988 provided the Brazilian Courts of Accounts with
important competencies for the external control of public expenditures, including the
function of judging the accounts of those who use, collect, store, and administer public
resources, and the power to impose sanctions and order the return of amounts spent
improperly. At the same time, the 1988 Brazilian Constitution, through its Article
5, guarantees to all individuals that the State can only deprive them of their assets and
rights if it faithfully follows certain specific principles (“normas-princípio”) of due legal
process, adversarial system and full defense. Disrespecting directly such principles,
the TCU Organic Law (Law 8.443/92) structured the Federal Court of Accounts in such
a way as to give to thejudges (”Ministers”) of the Court the role of auditing, accusing,
instituting, instructing, administering the evidence and deciding on its accusatory
proceedings against individuals. Moreover, the Law established a process in which the
parties cannot: produce their evidence; analyse the evidence presented by their
accusers/judges; be heard; or even appeal to a forum that has not already reviewed
and decided on their case. Therefore, it is necessary to change Law 8.443/92 to enable
the creation of a structure and process in the Federal Court of Accounts that is fair (as
well as the laws of all other state and municipal Courts of Accounts), including among
the responsibilities of the members of the Public Prosecutor's Office of Accounts
auditing, accusing, and guaranteeing that the parties produce fully their evidence and
counter-evidence, freeing the Ministers to fulfill the exclusive function of judging
impartially, based on the procedural dialectic.
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
1 INTRODUÇÃO
1
São exemplos de recentes decisões do STF: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso
Extraordinário 662458/SP. Relator: Min. Luiz Fux - Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico,
Brasília, 20 jun. 2012; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 28333/DF. Relator:
Min. Ricardo Lewandowski - Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 27 fev. 2012;
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança MS 27760. Relator: Min. Ayres Britto-
Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico, 12 abr. 2012; BRASIL. Supremo Tribunal Federal.
Mandado de Segurança 28061/DF. Relator: Min. Ellen Gracie - Tribunal Pleno. Diário de Justiça
Eletrônico, Brasília, 11 abr. 2011; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança
26393/DF. Relator: Min. Cármen Lúcia. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 19 fev. 2010; BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 25116/DF. Relator: Min. Ayres Britto - Tribunal
Pleno, Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 17 set. 2010.
13
2
Importa transcrever aqui decisão do STF que vem sendo utilizada por maioria da jurisprudência pátria,
proferida no Mandado de Segurança 7280/RJ: “Ao apurar o alcance dos responsáveis pelos dinheiros
públicos, o Tribunal de Contas pratica ato insusceptível de revisão na via judicial, a não ser quanto ao
seu aspecto formal ou tisna de ilegalidade manifesta. Mandado de Segurança não conhecido” (BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 7280/RJ - Tribunal Pleno. Relator: Min. Henrique
D’Avila, Diário de Justiça, Brasília, 17 set.1962).
3
No Brasil os seguintes doutrinadores publicistas se dedicaram mais intensamente sobre esse tema:
FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson. Processo Administrativo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2012;
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Processo Administrativo Disciplinar. 3. ed. São Paulo: Saraiva.
2012; MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2010;
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica Processual e Teoria do Processo. 2. ed. Belo Horizonte: Del
Rey. 2012; LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. 4. ed. Porto Alegre: Síntese, 2001;
MOREIRA, José Carlos Barbosa. A garantia do contraditório na atividade de instrução. Revista de
Processo, n. 35. São Paulo: Revista dos Tribunais,1984 e DINAMARCO, Cândido Rangel.
Instituições de Direito Processual Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
4
Existe uma profusão de doutrinadores europeus e norte-americanos cuidando do tema, podendo citar
aqui: FAZZALARI, Elio. Instituzioni Di Direitto Processuale. 5. ed. Padova: CEDAM, 1989;
FOSCHINI, Gaetano. Sistema del Diritto Processuale Penale. 2. ed. Milano: Milano, 1965; José
CANOTILHO. José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra:
Almedina, 2003; HÄBERLE, Peter, Hermenêutica Constitucional. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor,
1997; PIZZORUSSO, Alessandro. Sistema Instituzionale del Diritto Publico Italiano. 2. ed. Napoli:
Jovene, 1992; AMAN JUNIOR, Alfred; MAYTON, Willian. Administrative Law. Minnesota, West
Publishing Co., 1993 e COMOGLIO, Luigi Paolo. Lezioni sul processo civile. Bologna: Il Mulino, 1995.
14
pelo correspondente Regimento Interno: (i) aquele mesmo órgão que acusa, também
instrui o processo, analisa seus esclarecimentos e defesas, administra o material
probatório e, ao fim, decide; (ii) quando da instauração, seus mesmos órgãos internos
formulam uma hipótese e depois procuram elementos e indícios que irão comprová-
la; (iii) os acusados ou fiscalizados não conseguem a produção de provas periciais
realizadas por peritos imparciais de fora dos quadros do Tribunal; (iv) os acusados
não podem formular quesitos e dependem sempre do espírito dialético e da boa
vontade do julgador; (v) não há audiências orais e nem produção de prova
testemunhal.
De acordo com as pesquisas levantadas no quarto capítulo, esse tipo de
processo é incompatível com os princípios do contraditório e do devido processo legal
no Estado Democrático de Direito, já que esses pressupõem ao menos: (i)
participação dialética e simétrica entre dois sujeitos ou mais; (ii) que esses dois
sujeitos estejam em situação de absoluta equivalência na gestão do discurso e da
prova; (iii) utilização de todos os meios permitidos em direito para a demonstração das
alegações; (iv) não prevalência da prova de uma das partes em relação a de outra
parte; (v) direito à oralidade por meio de audiência com presença física das partes;
(vi) o julgador não ser um interessado no provimento.
Tem-se, portanto, uma situação peculiar. A CRFB/88 entregou importantes
competências ao TCU, concedeu-lhe função de julgar pessoas, interferindo em seus
direitos administrativos (perda de cargo e função) e de propriedade por meio de
condenação de perda de direitos à restituição de dinheiro ao erário e ao pagamento
de multas. Não obstante, o legislador ordinário criou uma lei orgânica muito aquém
desse mister constitucional, acarretando ao fim um desperdício de tempo, dinheiro e
trabalho, pois as decisões terminativas e interlocutórias do TCU não conseguem ser
produzidas sob o manto democrático atual dos princípios do contraditório e da ampla
defesa, acarretando suas inevitáveis nulidades passíveis sempre de anulação pelo
Poder Judiciário.
Conforme demonstrado no capítulo 5, essa situação justifica necessária
reforma na organização e no processo utilizado pelo TCU (Lei n. 8.443/92 e seu
Regimento Interno) para exercício de sua competência de julgamento de contas,
aplicação de sanções e fiscalização de atos e contratos, confrontando-os com o
15
5
Nesse sentido, as Emendas à Constituição n. 19 e n. 20 de 1998.
6
Como estamos em um sistema jurídico desenvolvido, nossa Constituição adota estrutura escalonada
de normas jurídicas, em que a Constituição deve ser o fundamento de validade das leis
infraconstitucionais.
7
O art. 75 da CRFB/88 estabelece que as suas normas previstas para o Tribunal de Contas da União
(TCU) servem para os demais nos Estados e Municípios: “as normas estabelecidas nesta seção
aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos
Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios”.
Portanto, cumpre adiantar que a tese analisará precipuamente as normas envolvendo o TCU, e quando
couber trará alguns comentários sobre as demais cortes de contas.
8
A partir desse momento se referirá à atual Constituição como CRFB/88.
9
“Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das
entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade,
aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante
controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder”
17
10
Ao longo dessas cinco Constituições, que antecedem a de 1988, houve paulatino aperfeiçoamento
das redações e ampliação das atividades a serem exercidas, tendo a Constituição de 1967 alcançado
modelo similar ao atual.
11
Quando o autor, nesta tese, indicar em letras minúsculas a expressão “administração pública”
significará, sempre, a atividade administrativa que pode ser exercida pelos órgãos e agentes de todos
os Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) de todas as esferas de poder (União, Estados,
Municípios e o Distrito Federal).
12
Conforme redação dada pela Emenda Constitucional n. 19 de 04 de junho de 1998.
18
13
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa.
Elaborado pelo Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 900.
14
Utiliza-se o signo ‘Estado’ nesse trabalho como a pessoa jurídica de direito público interno, ou seja,
União, Estados-Membros, Municípios e o Distrito Federal.
15
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 2000,
p. 89.
16
Adota-se aqui o critério bem tratado por Paulo de Barros em que: “a proposição antecedente
funcionará como descritora de um evento de possível ocorrência no campo da experiência social […]”
(CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 132).
17
“A relação jurídica estabelecida com esse consequente é entre Estado e cidadãos, em que o primeiro
tem obrigação de fiscalizar a correta aplicação dos recursos dos cidadãos, e esses têm o direito
subjetivo público de ter seus recursos fiscalizados pelo Estado. Se o Estado não fiscaliza, viola uma
obrigação de fazer, a outra face do direito subjetivo público do cidadão em relação ao Estado
(FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 6. ed.
São Paulo: Saraiva, 1984, p. 147).
19
18
Nesse momento tem-se a obrigação pública da pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que
usou recursos públicos, de prestar contas ao Estado; e esse tem o direito subjetivo público (dever-
poder) de exigir daquela a prestação das contas (FAGUNDES, Miguel Seabra. Ob. cit., p. 173).
19
Interessante notar que o constituinte usou no mesmo art. 70 a estrutura gramatical “quanto à
legalidade, legitimidade e economicidade”. Aparentemente pretendeu que a fiscalização não se
restringisse à lei, indicando que a administração pública devesse prever a melhor escolha a partir
também de critérios de economicidade e de legitimidade.
20
Pode-se aqui adiantar o que à frente se verá quando se interpretar o art. 71 da CRFB/88: Se alguém
usar recurso público – o respectivo uso deve ser correspondente com a lei, a legitimidade e a
economicidade. Se usado o referido recurso, mas não correspondido à lei, à legitimidade e à
economicidade – então deve ser relação sancionatória entre o sujeito do dever e o Estado-Juiz.
21
Desde a Constituição de 1891 institui-se um Tribunal de Contas “para liquidar as contas das receitas
e despesas e verificar a sua legalidade, antes de serem prestadas ao Congresso”, nos termos do seu
art. 89.
22
Carlos Ayres Britto (2002, p. 2) sustentou em artigo publicado no ano de 2002 que a localização do
TCU não seria no Poder Legislativo, em função de o art. 44 dizer que compõe tal Poder apenas o
Senado e a Câmara dos Deputados. Para Britto a melhor localização do TCU seria o próprio Poder
Judiciário, em decorrência de o art. 73 da CRFB/88 determinar a ele as mesmas atribuições entregues
aos órgãos judiciários indicados no art. 96. Não se pode concordar com essas afirmações, pois o art.
73 entrega ao TCU normas de competência, e não de localização do órgão dentro da estrutura do
Estado. Ademais, o art. 92 diz expressamente quais órgãos comporiam o Poder Judiciário, não
indicando ali o TCU. Não se pode confundir localização com competência, conforme será aqui tratado.
Inobstante tal celeuma, é indiferente em qual localização está o TCU, pois todas as suas competências
e funções são próprias e extraídas diretamente da Constituição; esse é um órgão de estatura
constitucional, e não se modificariam suas atribuições caso estivesse no lugar A, B ou C. Merece
destaque que no mesmo artigo mencionado, o autor é claro em evidenciar que o TCU não é subalterno
a qualquer dos Poderes da República, extraindo seu papel do texto constitucional. Nesse sentido, ver
BRITTO, Carlos Ayres. O regime constitucional dos Tribunais de Contas. Revista Diálogo Jurídico,
ano 1, n. 9, Salvador, dez. 2001.
20
23
Muito curiosa situação, pois se não estiver dentro do Legislativo (artigo 44, CRFB), também não
incluído entre os órgãos do Poder Judiciário (artigo 92, CRFB/88) e muito ao menos do Poder Executivo
(artigo 76, CRFB), o Tribunal de Contas poderia ser um pária, ou um novo Poder, o Poder do Controle
Externo, e tão externo seria que nem ao mesmo integraria qualquer dos três grandes órgãos da
República. Por isso apenas se pode aceitar a seguinte interpretação: o Constituinte o colocou dentro
do Capítulo do Poder Legislativo, entregando-lhe competências autônomas e independentes, mas
também um papel de auxiliar o Congresso no controle da Presidência da República. Poderia tê-lo
incluído dentro do Poder Judiciário, como o fez o constituinte português, mas preferiu mantê-lo onde
sempre esteve em nossa história. Isso em nada modifica o conteúdo jurídico de suas atribuições. Sua
localização não é relevante ao ponto de desnaturar suas competências e alcance de suas decisões.
24
A partir desse momento, a fim de facilitar a leitura, utilizar-se-á o símbolo TCU para significar o
referido Tribunal de Contas da União.
25
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 2000,
p.89.
26
Até o presente momento, adota-se para o signo ação o significado “disposição para agir; atividade;
energia” (HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa.
Elaborado pelo Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 24).
21
27
Provavelmente, a corrente majoritária dos doutrinadores pátrios compreende que os Tribunais de
Contas exercem apenas a função administrativa. Essa corrente é formada por juristas de grande relevo,
como: MAZAGÃO, Mário. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1977; MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Tribunais de Contas: natureza, alcance e efeitos de suas
funções. RDP, São Paulo, n. 73, p. 182, 1982; CRETELLA JÚNIOR, José. Natureza das Decisões do
Tribunal de Contas. Revista de Informação Legislativa, v. 24, n. 94, p. 183-198, abr./jun. 1987;
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais,1998. MEDAUAR, Odete. A processualidade no Direito Administrativo. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008; FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de Direito Administrativo. 8. ed. São
Paulo: Malheiros, 2006; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo:
Atlas, 2014. Curso de Direito Constitucional Positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007 e outros.
28
Recentemente foram produzidos cinco ótimas teses sobre esse objeto: PARDINI, Frederico. Tribunal
de Contas da União: órgão de destaque constitucional. 1997. 464f. Tese (Doutorado em Direito) -
Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1997; BUSQUETS,
Cristina Del Pilar Pineiro. A configuração jurídica do Tribunal de Contas: o processo e o tempo.
2010. 280f. Tese (Doutorado em Direito). Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010; PELEGRINI, Márcia. A competência
sancionatória do Tribunal de Contas no exercício da função controladora – contornos
constitucionais. 2008. 331 f. Tese (Doutorado em Direito em Direito do Estado) – Departamento de
Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: 2008 e COSTA,
Luiz Bernardo Dias. Tribunal de Contas: evolução e principais atribuições no Estado Democrático
de Direito. Belo Horizonte: Fórum, 2006. Com exceção de Márcia Pelegrini, todos os demais
compreendem que os Tribunais de Contas exercem também a função jurisdicional quando julgam as
contas daqueles que utilizam recursos públicos.
23
Em que pese tal discussão já ter sido objeto de inúmeros e antigos excelentes
trabalhos acadêmicos, incluindo teses de doutoramento, entende-se relevante aqui
expor apenas rapidamente quais os seus principais doutrinadores e suas respectivas
posições, a fim de facilitar o desenvolvimento do tema nos capítulos vindouros.
29
Para Hely Lopes Meirelles (1998) “por serem atos administrativos, comportam o “controle judiciário
ou judicial” (Ob. cit., p. 62)
30
Segundo Di Pietro “Não se trata de função jurisdicional, porque o Tribunal apenas examina as contas,
tecnicamente, e não aprecia a responsabilidade do agente público, que é de competência exclusiva do
Poder Judiciário” (Ob. cit., p.826).
31
Para José Afonso da Silva, o Tribunal de Contas “não julga pessoas nem dirime conflitos de
interesses, mas apenas exerce um julgamento técnico de contas [...] Estamos, assim, também de
acordo que o Tribunal de Contas é um órgão técnico, não jurisdicional”. (SILVA, José Afonso. Curso
de Direito Constitucional Positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 167).
24
32
Não obstante, utiliza-se essa nota de rodapé para colacionar enxertos importantes do referido
trabalho de José Cretella Junior:
“Francesco Carnelutti, com base no critério orgânico, bem como Piero Calamandrei criticando
Carnelutti, e, por fim, Giovanni Cristofolini estudaram profundamente a diferença entre jurisdição e
administração, concluindo o último Autor que essa distinção repousa menos sobre base lógica do que
sobre base histórico-política, porque "administração é a atividade do Estado dirigida à consecução de
seus fins, mediante a satisfação de interesses que o Estado considera seus, ao passo que jurisdição é
a atividade do Estado dirigida para a consecução do interesse coletivo tendente à composição das
lides, mediante o estabelecimento de comandos concretos, dirigidos aos titulares dos interesses em
litígio. A jurisdição inclui-se, conceitualmente, na administração, de que se desmembrou pela exigência
política de assegurar a necessária independência dos órgãos incumbidos de realizar esse
importantíssimo interesse coletivo" (CRETELLA JUNIOR, Ob. cit., p.197).
33
MUKAI, Toshio. Os Tribunais de Contas no Brasil e a coisa julgada. Revista do Tribunal de Contas
da União, v. 27, n. 70, p. 83–86, out./dez., 1996.
34
Segundo Castro Nunes “A jurisdição de contas é o juízo constitucional de contas. A função é privativa
do Tribunal instituído pela Constituição para julgar as contas dos responsáveis por dinheiros e bens
públicos. O judiciário não tem função no exame de tais contas, não tem autoridade para as rever, para
apurar o alcance dos responsáveis, para liberar. Essa função é ‘própria e privativa do Tribunal de
Contas’ [...] (NUNES, Castro. Teoria e Prática do Poder Judiciário. Rio de Janeiro: Forense, 1943, p.
30). Portanto, existe aí uma primeira questão: as decisões dos Tribunais de Contas, em suas essências,
são imutáveis perante o Poder Judiciário? Cremos que não. Nenhuma lesão de direito pode ser
subtraída da apreciação do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CRFB/88).
35
COSTA, José Rubens. Controle jurisdicional dos atos decisórios dos Tribunais de Contas. Boletim
de Direito Administrativo, São Paulo, v.12, n.6, p.341-356, jun. 1996.
36
GRACIE, Ellen. Notas sobre a revisão judicial das decisões do Tribunal de Contas da União pelo
Supremo Tribunal Federal. Fórum de Contratação e Gestão Pública FCGP, Belo Horizonte, ano 7,n.
82, out. 2008.
25
37
A autora conclui: “De acordo com o artigo 5°, XXXV da Constituição, “a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” e esse princípio encerra o axioma universal segundo o
qual nenhuma questão envolvendo interesse ou direito pode ser subtraída ao reexame do juízo natural
competente. Em outros termos, qualquer pretensão de qualquer pessoa relacionada a direito pode ser
deduzida em juízo. Nessa linha de entendimento, qualquer ação ou comportamento de pessoa privada
ou entidade pública capaz de ameaçar direito ou qualquer deliberação de entidade pública ou privada
com o mesmo intuito pode ser discutida em juízo pelo interessado ainda quando tenha sido ou pudesse
ser objeto de prévia discussão administrativa ou extrajudicial. Vige assim, entre nós, em qualquer
circunstância, o princípio da inafastabilidade do reexame judicial. Ante tal quadro, o controle externo da
atividade contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da
administração direta e indireta quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das
subvenções e renúncia de receitas (art. 70 da Constituição), a cargo do Congresso Nacional e exercido
com o auxílio do tribunal de Contas (art. 71 da Constituição), sujeita-se ordinariamente ao mesmo
regime de controle judicial” (GRACIE, Ellen. Ob. cit., p.26)
38
SALLES, Heráclito. Natureza, autonomia e duplicidade da função dos Tribunais de Contas. Revista
do Tribunal de Contas da União, v. 7, n. 14, p. 2–22, dez., 1976.
39
CAVALCANTI, Themístocles Brandão. O Tribunal de Contas - Órgão constitucional - Funções
próprias e funções delegadas. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 109, p. 1-10, jan.
1972.
40
Em que pese esse autor não concordar em hipótese alguma com as reflexões trazidos por
Themístocles Cavalcanti, pelo valor histórico vale à pena transcrever o enxerto seguinte: “Examinando,
em seu contexto, a competência e atribuições do Tribunal de Contas, poderemos ‘verificar que ele não
está vinculado ao sistema Judiciário mas a uma estrutura administrativa dentro de uma conceituação
moderna que inclui aquilo que os americanos chamam de função “quase judicial”. Na verdade, se a
competência para “julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por bens e valores
26
públicos” significa, de algum modo, o exercício de uma função jurisdicional, não é menos certo que
esta função é puramente administrativa, restrita e hoje ainda mais limitada, de momento que o controle
da legalidade dos contratos foi subtraído ao Tribunal de Contas. A tese da função jurisdicional teve a
sua época, quando o Tribunal de Contas exercia um contencioso no exame da juridicidade e legalidade
dos contratos. Abolido esse controle, a ação fiscalizadora da Corte ficou apenas no exame, no
julgamento das contas, isto é, no resultado aritmético e contábil dessas contas, sem maior preocupação
pelo exame da legalidade de sua aplicação. Este ficou apenas na apreciação das aposentadorias e
pensões. Aí, sim, o controle se exerce em sua plenitude, mas sempre sujeito, quando provocado, à
revisão judicial. [...] Seria uma função jurisdicional no sentido literal porque o julgamento, pelo menos
quando se trata de apreciação da legalidade de aposentadorias, pensões, etc., envolve o exame de
um ato em face do direito vigente. Será, portanto, a rigor, uma função de dizer do direito dos
interessados. Mas, não tem os efeitos dos atos judiciários, notadamente quanto a produzir cousa
julgada, tornando-o insuscetível de revisão judicial. Serão atos administrativos, a que se aplicam todas
as regras relativas à usa eficácia. A única exceção a essa regra é quanto ao exame contábil nas
tomadas de contas, não só porque não importa em exame de legalidade, mas apuração aritmética dos
valores sob a guarda do seu responsável e dos administradores. Além do mais, nos termos da
Constituição, é ato do Tribunal de Contas exercido como auxiliar do Congresso e, portanto, como
função delegada. Responde o Tribunal perante o Congresso (CAVALCANTI, Themístocles Brandão.
Ob. cit., p. 1-10).
41
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. Ob.. cit., p. 1206 e 1211.
42
ZYMLER, Benjamin. Processo Administrativo no Tribunal de Contas da União. Prêmio
Serzedello Corrêa 1996 – Monografias Vencedoras. Brasília: Instituto Sezedello Corrêa, 1997.
27
43
MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1947.
44
FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 6. ed.
São Paulo: Saraiva, 1984.
28
45
PARDINI, Frederico. Tribunal de Contas da União: órgão de destaque constitucional. 1997. 464f.
Tese (Doutorado em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo
Horizonte, 1997; BUSQUETS, Cristina Del Pilar Pineiro. A configuração jurídica do Tribunal de
Contas: o processo e o tempo. 2010. 280f. Tese (Doutorado em Direito). Programa de Estudos Pós-
Graduados em Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.
46
Já a tese de Márcia Pelegrini, em que pese tratar do Tribunal de Contas, tem escopo mais delimitado
em enfocar sua competência sancionatória.
47
SOUZA, Luciano Brandão Alves de. A Constituição de 1988 e o Tribunal de Contas da União. Revista
de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 175, p. 36-46, fev. 1989.
48
LENZ, Carlos Eduardo Thompson Flores. O Tribunal de Contas e o Poder Judiciário. Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 238, p. 265-282, jan. 2004.
29
49
FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Limites à revisibilidade judicial das decisões dos Tribunais de
Contas. Revista do Tribunal de Contas da União, out/dez, n. 70, p. 39-71, 1996.
50
BUGARIN, Bento José. O Tribunal de Contas da União e o controle externo no Brasil. Revista do
Tribunal de Contas da União, Brasília, ano 12, n. 27, p. 25-61, dez. 1982.
51
CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2012
52
ARAUJO, Júlio Cesar Manhães de. Controle da atividade administrativa pelo Tribunal de Contas
na Constituição de 1988. Curitiba: Juruá, 2010.
30
Do que se viu, ressalta o quão debatido vem sendo o tema54. Sem possuir a
pretensão de esgotar a polêmica discussão doutrinária de décadas, esse pesquisador
buscará traçar abaixo quais são as linhas hermenêuticas que o levaram à convicção
de que nossa Constituição da República de 1988 conferiu ambas as competências
aos Tribunais de Contas: a administrativa e a jurisdicional.
53
COSTA, Luiz Bernardo Dias. Tribunal de Contas: evolução e principais atribuições no Estado
Democrático de Direito. Belo Horizonte: Fórum, 2006.
54
O debate sobre o tema é tão complexo que há ainda aqueles que iniciam reflexão no sentido de os
Tribunais de Contas no Brasil não exercerem nenhuma das três funções tradicionais do Estado, mas
uma quarta, que se denominaria de função de controle externo, como Carlos Ayres Brito. Contudo, não
nos parece o caminho hermenêutico correto a percorrer nesse momento.
31
a) a função legislativa seria aquela que produz norma jurídica (geral, abstrata e
obrigatória) de forma inovadora perante a ordem jurídica;
b) a função administrativa teria como escopo aplicar em concreto a norma jurídica
geral e abstrata produzida pela função legislativa;
c) e a função jurisdicional igualmente aplicaria em concreto a norma jurídica geral
criada pela função legislativa, mas traria um qualificador próprio, em relação à
função administrativa, o de aplicar a norma jurídica de forma definitiva.
Para analisar qual ou quais das referidas funções estatais teriam sido entregues
pelo constituinte originário ao órgão TCU, o cientista do direito deve proceder à
interpretação da própria Constituição56, incumbindo, na visão deste autor, seguir o
procedimento hermenêutico proposto por Karl Larenz 57 , qual seja: iniciar pela
interpretação literal, avaliando sua correlação e adequação com a interpretação
sistemática e, ao fim, confirmando pela interpretação histórica e teleológica.
55
FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 6. ed.
São Paulo: Saraiva, 1984.
56
Como o próprio nome diz, a constituição constitui o Estado, dizendo como deve se organizar, quais
funções deve exercer e quais princípios lhe conformarão, como muito bem demonstrado por José
Joaquim Gomes Canotilho e por tantos expoentes da Teoria da Constituição.
57
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3. ed. Trad. José Lamego. Lisboa: Calouste
Gulbenkian, 1997.
32
58
Interessante passagem do texto de Luís Roberto Barroso, segundo o qual, “O intérprete da
Constituição deve partir da premissa de que todas as palavras do texto Constitucional têm uma função
e um sentido próprios. Não há palavras supérfluas na Constituição, nem se deve partir do pressuposto
de que o constituinte incorreu em contradição ou obrou com má técnica. Idealmente, ademais, deve o
constituinte, na medida do possível, empregar as palavras com o mesmo sentido sempre que tenha
que repeti-las em mais de uma passagem. De toda sorte, a eventual equivocidade do Texto deve ser
remediada com a busca do espírito da norma e o recurso aos outros métodos de interpretação”
(BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2003, p.130).
59
A palavra jurisdição foi utilizada na CRFB/88 31 vezes, sendo que em 29 oportunidades foi colocada
para significar atribuição dos Tribunais do Judiciário, uma para o Tribunal de Contas e uma outra única
vez para a administração fazendária. Isto significa para o TCU certa coerência constitucional.
34
60
Segundo o dicionário Michaelis, a palavra judicatura, substantivo feminino, significa “1. Cargo ou
dignidade de juiz. 2 Dir. Exercício da função de juiz; duração desse exercício. 3 Poder de
julgar. 4 Poder judiciário. 5 Tribunal”. Disponível em:
<http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/definicao/judicatura%20_988263.html>. Acesso em:
20 nov. 2016.
61
Para Álvaro Guilherme Miranda, os Tribunais de Contas, diferentemente das auditorias e
controladorias, apresentam estrutura de colegiado formado por membros com cargos vitalícios –
semelhantes ao Poder Judiciário – e que exercem legitimamente poderes jurisdicionais e coercitivos
face aos particulares (MIRANDA, Álvaro Guilherme. Mudança institucional do Tribunal de Contas:
Os oito modelos debatidos na Constituinte de 1988 para o sistema de fiscalização do Brasil.
2009. 154f. Dissertação de Mestrado. Instituto de Economia/UFRJ - Programa de Pós-Graduação em
Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento. Rio de Janeiro, 2009).
62
Quanto à possibilidade de cumulação de funções típicas e atípicas pelos Poderes estatais, tem-se
CANOTILHO. José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra:
Almedina, 2003; SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 29 ed. São Paulo:
Malheiros, 2007; MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009; NOVELINO, Marcelo.
35
Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Método, 2012; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito
Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014 e BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito
Constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
63
De acordo com a CRFB/88, o Tribunal de Contas da União foi alocado dentro do Poder Legislativo,
sem personalidade jurídica própria. Contudo tem suas específicas competências que não podem ser
exercidas por outras entidades, substituindo-o, nem mesmo o Congresso Nacional. Por isso o TCU é
um órgão autônomo e independente, responsável por sua gestão administrativa interna, sem sofrer
interferência de qualquer outro órgão.
64
Marçal Justen Filho reconhece igual divisão em seu Curso de Direito Administrativo (2015, p. 118),
fazendo interessante e corajosa reflexão no sentido de ser necessário evoluirmos do entendimento
setecentista de mera Tripartição de Poderes para incluirmos mais dois Poderes completamente
autônomos e independentes dos demais: o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União. Essa
discussão é por demais rica e realmente merece ser enfrentada. Contudo, o objeto dessa tese é muito
mais simples e não alcança a pretensão de debruçar sobre tamanha reflexão filosófica. Outra questão
correlata é a de que se criarmos mais dois Poderes, seriam por eles também exercidas duas novas
funções? Ou o Ministério Público exerceria uma nova função de fiscalização ampla e o Tribunal de
Contas a função de fiscalização de contas? A função administrativa é correspondente com a função de
fiscalização?
36
65
Assim prelecionam CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16.
ed. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2006; DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Processo Constitucional
e o Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010; CINTRA, Antonio Carlos de
Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO,Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 30. ed.
São Paulo: Malheiros, 2014 e DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Ob. cit.,
66
Destaca-se trecho de recente decisão proferida pelo Min. Marco Aurélio: “A existência de órgãos
pára-jurisdicionais, como o Tribunal de Contas da União, não afasta o fato de que, no Brasil, a jurisdição
é unitária, sendo certo que não dispomos de Contencioso Administrativo, como ocorre em outros
países. 2)Essa unidade – decorrente do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (ou da
ubiquidade da justiça) [art. 5º, XXXV] –, não se contrapõe, todavia, ao caráter soberano e permanente
das decisões dos Tribunais de Contas, quando no exercício da sua específica competência
constitucional (art. 71, da CF). Assim, impende observar a desejável harmonia entre as competências
constitucionalmente estabelecidas” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário
629711/RJ. Relator: Min. Marco Aurélio de Mello. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 11 nov.2015.
Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000246569&base=baseMonocra
ticas>. Acesso em: 03 out. 2016.
67
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 21564. Relator: Octavio Galloti -
Tribunal Pleno. Diário de Justiça, Brasília, 27 ago. 1993. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/sobrestfconhecastfjulgamentohistorico/anexo/ms21564.pdf>.
Acesso em 03 out. 2016
68
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na ADPF 378. Relator: Edson Fachin - Tribunal
Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 08 mar. 2016. Disponível:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10444582>. Acesso em: 03 out.
2016.
37
(CF, art. 52, I; art. 86, § 1º, II), depois de autorizada, pela Câmara dos
Deputados, por dois terços de seus membros, a instauração do processo (CF,
art. 51, I), ou admitida a acusação (CF, art. 86). É dizer: o impeachment do
Presidente da República será processado e julgado pelo Senado. O Senado
e não mais a Câmara dos Deputados formulará a acusação (juízo de
pronúncia) e proferirá o julgamento (CF, art. 51, I; art. 52, I; art. 86, § 1º, II, §
2º) [...]. Assim, em princípio, já se dava no regime anterior, não obstante,
agora, caiba ao Senado Federal, além de julgar, também processar o feito, o
que bem significa ser, na Câmara Alta, onde se realiza instrução do processo,
com a apuração das provas tidas como necessárias ou cabíveis. (BRASIL,
1993).
69
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 16.255/DF. Relator: Min. Evandro
Lins-Tribunal Pleno. Diário de Justiça, Brasília, 05 out.1966. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000152299&base=baseAcordao
s>. Acesso em: 05 dez. 2016.
38
A palavra lei não pode ser interpretada de forma diferente daquela contida no
próprio texto constitucional, quais sejam as normas jurídicas inovadoras produzidas
por meio dos seguintes instrumentos autorizados a veiculá-las: lei complementar, lei
ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto-legislativo, resolução do Senado
Federal (art. 59); tem-se também por expresso comando constitucional as leis
produzidas pelos poderes legislativos dos estados-membros, distrito federal e
municípios.
No máximo se poderia trazer maior reflexão sobre a extensão do símbolo lei
para abranger as emendas à constituição, no sentido de que não caberia uma emenda
excluir do Poder Judiciário a apreciação de lesão ou ameaça a direito. Mas essa
discussão não ajuda ao caso em debate, pois a suposta entrega de função
jurisdicional ao Senado Federal e ao TCU foi realizada pelo Constituinte Originário.
Portanto parece-nos equivocada a posição da doutrina de que haveria no Brasil
monopólio da função jurisdicional70 ao Poder Judiciário. Pode até ser verdade que
esse sempre fora o sentimento corrente das práticas cotidianas nacionais, incluindo
71
vários acórdãos judiciais nesse sentido , mas escorar nisso para afirmar
categoricamente que a CRFB/88 teria delimitado o tal monopólio, não parece se
sustentar perante uma correta hermenêutica constitucional.
70
Destacam-se MEIRELLES, Hely Lopes. Ob. cit.; THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito
Processual Civil. 53. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo;
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Ob. cit.; LEAL, Rosemiro Pereira. Ob. cit.
e MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 30. ed. São Paulo: Malheiros,
2013.
71
Nesse sentido, ver: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1115161/RS. Relator:
Min. Luiz Fux - Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 22 mar.2010; BRASIL. Tribunal
Regional Federal (4ª Região). Processo 2004.71.06.002162-5. Relator: Maria Lúcia Luz Leiria.
Florianópolis, 28 abr. 2010; BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo
2005.34.00.037672-7. Relator: Kassio Nunes Marques. Brasília, 08 ago. 2014; BRASIL. Tribunal
Regional Federal (1ª Região). Processo 0005166-62.2011.4.01.0000. Relator: Fagundes de Deus.
Brasília, 09 set. 2011; BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo 0054331-
44.2012.4.01.0000. Brasília, 30 set. 2013.
72
Essa perspectiva é defendida por Hely Lopes Meirelles, Márcia Pelegrini, Maria Sylvia Zanella Di
Pietro e José dos Santos Carvalho Filho.
73
Tal entendimento é acompanhado pelos Tribunais brasileiros que, raras exceções, reconhecem o
caráter meramente técnico-administrativo as decisões da Corte de Contas e por isso, em tese, não
produziriam coisa julgada face ao Poder Judiciário. Nesse sentido, ver: BRASIL. Superior Tribunal de
Justiça. Recurso Especial 1.032.732/CE. Relator: Min. Benedito Gonçalves - Primeira Turma. Diário
39
de Justiça Eletrônico, Brasília, 08 set. 2015; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial
472.399/AL. Relator: José Delgado - Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 19 dez.
2002; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 28.343/DF. Relator: Min. Marco
Aurélio de Mello – Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 16 out. 2014.
74
Quanto ao tema, entre os doutrinadores nesse sentido pode-se encontrar a exposição de Carlos
Ayres Britto, na qual afirma que decisões dos Ministros do TCU podem sofrer questionamento via
Mandado de Segurança para o Supremo Tribunal Federal (BRITTO, Carlos Ayres. O regime
constitucional dos Tribunais de Contas. Revista Diálogo Jurídico, ano 1, n. 9, Salvador, dez. 2001, p.
8),
40
Também não se pode aceitar esse argumento como suficiente para afastar a
possível função jurisdicional das cortes de contas, pois conforme muito bem
delimitado pelo Constituinte no art. 5º, inciso LXIX:
Até mesmo Ministro do STF ou STJ pode praticar ilegalidade ou abuso de poder
no exercício de sua função jurisdicional. Nesse sentido, vale destacar a decisão
proferida no MS 33412/RS75:
75
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 33412/RS. Relator: Min. Celso De Mello
– Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 12 nov. 2015. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=9772238>. Acesso em 04 out.
2016.
41
76
Não é sem razão, inclusive, que o STF possui inúmeras decisões
esclarecendo os limites do Judiciário para apreciar acórdãos proferidos pelos
ministros do TCU, a exemplo dos trechos abaixo colacionados77:
76
Ver também: BRASIL Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3715. Relator:
Min, Gilmar Mendes - Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 30 out 2014; BRASIL
Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 25763/DF. Relator: Min. Eros Grau – Tribunal
Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 03 ago. 2015; BRASIL Supremo Tribunal Federal.
Mandado de Segurança 28074/DF. Relator: Min. Cármen Lúcia - Tribunal Pleno. Diário de Justiça
Eletrônico, Brasília, 14 jun. 2012; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança
22828/DF. Relator: Min. Néri da Silveira - Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 14
jun. 2002; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 7280/DF. Relator. Min.
Henrique D’avilla - Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 18 ago.1960; BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 25116/DF. Relator. Min. Carlos Ayres Britto -
Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 10 fev. 2011; BRASIL. Supremo Tribunal
Federal. Mandado de Segurança 28333/DF. Relator: Min. Ricardo Lewandowski. Diário de Justiça
Eletrônico, Brasília, 27 fev. 2012.
77
BRASIL Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo 662.458/SP. Relator: Min.
Luiz Fux – Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 20 jun. 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2198521>. Acesso em: 04 out.
2016.
78
FERRAZ, Luciano. Controle da administração pública. Elementos para a compreensão dos
Tribunais de Contas. Belo Horizonte: Mandamentos, 1999.
79
“Decisão recurso extraordinário – Inafastabilidade do controle jurisdicional – Negativa de seguimento.
1. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região negou provimento à apelação, ante os seguintes
fundamentos: Administrativo. Embargos à execução de título extrajudicial. Acórdão do TCU. Natureza.
Ato administrativo vinculado. Controle jurisdicional. Possibilidade. Princípio da ubiquidade da justiça.
Art. 5º, xxxv, da CF. Art. 745, inciso v, do CPC” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal Recurso
Extraordinário 629711. Relator Min. Marco Aurélio Mello, Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 11
dez. 2015).
42
Outros ainda tentam dizer que a CRFB/88 não concedeu aos Tribunais de
Contas competência para julgar pessoas, mas apenas para julgar as contas de
pessoas, por isso não exerceria nem a jurisdição penal e nem a civil, o que afastaria
totalmente o reconhecimento de função jurisdicional.
Esse argumento é de um primitivismo lógico sem fim, pelos motivos seguintes:
a) independentemente de ser jurisdição civil, penal ou de contas, sempre, sempre
e sempre o que um magistrado tem que decidir é se atos praticados por
determinadas pessoas foram ou não aderentes ao ordenamento jurídico.
Simples assim. As pessoas somente são julgadas por Deus. Os homens julgam
seus semelhantes por seus atos, omissivos ou comissivos, por suas escolhas
manifestadas perante o mundo real.
b) A Constituição estabeleceu no inciso VIII do art. 71 a obrigação de os Tribunais
de Contas aplicarem aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou
irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre
outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário”. Ou seja, a
interpretação correta da conjugação do inciso II com o VIII do art. 71 somente
pode ser a de que o Tribunal de Contas julgará a legalidade e a regularidade
das contas prestadas por alguém, se esse alguém tiver agido ilegalmente
sofrerá em sua pessoa ou patrimônio uma sanção, que deverá ser decidida
mediante lei.
c) Somente poder-se-ia aceitar tal despautério caso a norma constitucional
previsse aos Tribunais de Contas a competência para julgar as contas de
alguém, proibindo, não obstante, tais tribunais de aplicar qualquer sanção à
pessoa julgada. Nessa absurda hipótese, caso ocorresse, de fato a função
43
estatal entregue aos Tribunais de Contas não seria mesmo a jurisdicional, pois
serviria apenas como mero parecer, levando algum outro órgão a decidir e
aplicar a sanção cabível.
d) Ocorre que no caso de prestação de contas pelo uso, arrecadação, gestão,
administração e guarda de recursos públicos, quem julga se foram legalmente
aplicados tais recursos são os Tribunais de Contas. Sem sentido o Constituinte
dar esse dever-poder às Cortes de Contas e permitir que outro órgão também
o faça. Se além de não ter usado corretamente o dinheiro do erário, o
responsável também tiver ferido, por exemplo, a lei de improbidade
administrativa, incumbirá ao Ministério Público ou a respectiva Advocacia
Pública promover a ação de improbidade perante o Poder Judiciário. Se
durante o uso do dinheiro pelo responsável, o mesmo o houver subtraído para
si, igualmente deverá sofrer ao mesmo tempo persecução criminal, perante
outro Juízo que não aquele da ação de improbidade. Tudo porque o
responsável violou leis distintas: a de aplicação correta de recursos públicos; a
de improbidade administrativa; e a penal. Não há qualquer dificuldade em se
compreender pela natural divisão entre órgãos do estado.
Por essas singelas razões, não se podem aceitar tais alegações como
fundamento para afastar a clara e evidente norma constitucional indicada no inciso II
do art. 71.
80
Veja o trecho transcrito do artigo: “Contrastando de modo nítido com a atividade administrativa, que
se caracteriza pela aplicação da lei "de ofício", sem provocação, a atividade jurisdicional é provocada,
de iniciativa da parte ou do interessado, razão por que, no Brasil, nenhum juiz prestará tutela
jurisdicional sem requerimento da parte ou do interessado, nos casos e forma legais (art. 2.º do CPC
(LGL\1973\5)), principiando, assim, o processo civil por iniciativa da parte, desenvolvendo-se, depois,
44
a) um mesmo órgão não deveria aplicar a lei de ofício e também julgar eventual
conflito na aplicação da lei;
b) é pressuposto da conceituação da função jurisdicional a atuação inerte do
órgão que a exerce, até que seja chamado a atuar.
Sim, essas duas questões são fundantes de outros dois princípios contidos na
CRFB/88: o do devido processo legal e o do contraditório e ampla defesa. Esse ponto
é inclusive o verdadeiro objeto dessa tese de doutoramento.
É até tentador reconhecer que seria realmente um contrassenso permitir que
os Tribunais de Contas exercessem pura atividade administrativa quando fiscalizam,
apreciam, opinam, inspecionam, sustam, auditam, representam; e logo em seguida,
no exercício de jurisdição, instaurassem um processo e julgassem as contas de
alguém, aplicando-lhe sanção. Por isso é absolutamente compreensível a aparente
indignação de Cretella Júnior (e de tantos outros)81 contra a tese de jurisdição aos
Tribunais de Contas. Veja a transcrição de oportuna passagem desse ilustre
administrativista:
[...] Francesco Carnelutti, com base no critério orgânico, bem como Piero
Calamandrei criticando Carnelutti, e, por fim, Giovanni Cristofolini estudaram
profundamente a diferença entre jurisdição e administração, concluindo o
último Autor que essa distinção repousa menos sobre base lógica do que
sobre base histórico-política, porque "administração é a atividade do Estado
dirigida à consecução de seus fins, mediante a satisfação de interesses que
o Estado considera seus, ao passo que jurisdição é a atividade do Estado
dirigida para a consecução do interesse coletivo tendente à composição das
lides, mediante o estabelecimento de comandos concretos, dirigidos aos
titulares dos interesses em litígio. A jurisdição inclui-se, conceitualmente, na
administração, de que se desmembrou pela exigência política de assegurar
a necessária independência dos órgãos incumbidos de realizar esse
importantíssimo interesse coletivo [...] Quando o Tribunal de Contas aprecia
as contas ou examina a ‘concessão’ inicial de aposentadorias, pensões e
reformas, de modo algum está exercendo ‘atividade dirigida para a
consecução de interesse coletivo tendente à composição de lides, nem diante
o estabelecimento de comandos concretos, dirigidos a titulares de interesses
em litígio, em conflito’, para usar as palavras técnicas e exatas de Cristofolini.
Não; nesses, e em todos os demais casos, o Tribunal de Contas administra,
por impulso oficial (art. 262 do CPC (LGL\1973\5)). "Procedat Administratio ex officio", mas "ne procedat
judex ex officio" - eis os dois princípios que ressaltam a diferença entre a Administração e o Judiciário,
porque, neste último, ninguém pode ser juiz sem que haja autor ("nem o judex sine actore"). A inércia
inicial do Judiciário contrasta com o dinamismo inicial da Administração; sem ajuizamento da actio a
atividade jurisdicional não tem início, ao passo que a atividade administrativa - regra geral - não
depende do interessado.” (CRETELLA JÚNIOR, José. Ob. cit., p.195).
81
Segundo Carlos Ayres Britto (Ob. cit. p. 9), o incômodo de o Tribunal de Contas da União agir de
ofício, contrariamente ao Poder Judiciário, reforça, na visão do autor, o fato de não se conformar com
a função jurisdicional.
45
Para chegar a tal conclusão, o autor reconhece que os julgamentos que fazem
os Tribunais de Contas possuem “a força ou a irretratabilidade que é própria das
82
MARIOTTI, Alexandre. O Devido Processo Legal. 2008. 132 f.Tese (Doutorado em Direito) -
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2008. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/13555/000651057.pdf?1> Acesso em: 01 dez. 2016.
83
Nesse sentido dispõe o art. 6º da Lei n. 8.442/92 “Estão sujeitas à tomada de contas e, ressalvado o
disposto no inciso XXXV do art. 5° da Constituição Federal, só por decisão do Tribunal de Contas da
União podem ser liberadas dessa responsabilidade as pessoas indicadas nos incisos I a VI do art. 5°
desta Lei”.
47
decisões judiciais com trânsito em julgado”84, contudo não é a sua atividade fim, como
o é para o Poder Judiciário, sendo o julgamento de contas para tais Cortes de Contas
um meio para atingir o fim que é o controle externo. Daí sua função não ser nem a
administrativa e nem a jurisdicional.
Conforme premissa adotada como verdadeira nessa tese, o Estado exerce três
funções, sendo a característica da função jurisdicional a de aplicar o direito com
definitividade, ou seja, exatamente essa é a finalidade da jurisdição. Portanto,
compreende-se que adotar um novo critério para qualificar a natureza das funções
estatais é propor profunda reflexão filosófica que pode levar a ciência do Direito a
lugares ainda desconhecidos.
Ademais, em primeiro momento não nos parece adequado tal critério proposto
por Brito, posto a função jurisdicional (assim como as demais) possuir instrumentos
distintos para alcance de finalidades igualmente distintas. Cada diferente tipo de ação
possui ou pode possuir finalidades discrepantes, em especial quando se considera o
grande leque atualmente vigente de instrumentos processuais em ramos distintos do
Direito, como o Processual Penal, Eleitoral, Cível, Trabalhista e Militar, ainda podendo
considerar dentro de cada um deles variáveis como ações de indenização ou de
improbidade, de busca e apreensão ou de crimes contra a vida.
Se mergulhar na finalidade delas poder-se-á alcançar respostas distintas,
transformando em grande confusão a compreensão quanto as funções do estado
moderno85.
84
Ob. cit., p. 08.
85
Importante frisar que não se nega a possibilidade de refletirmos filosoficamente sobre as novas
possíveis funções do Estado no mundo moderno. Contudo, não se compreende útil para os fins da
presente tese de doutoramento.
48
outra para a sua função jurisdicional. Igualmente, a lei orgânica teria que criar dois
procedimentos distintos, um procedimento meramente administrativo para as funções
administrativas e um outro procedimento em contraditório para a sua função
jurisdicional86.
Vejam que essa situação deve ser resolvida pela lei e não, por causa de sua
insuficiência, desfigurar a Constituição.
A frase exponencial do Min. Sepúlveda Pertence, enquanto proferindo
relevante voto no julgamento do Mandado de Segurança 23.550-1/DF 87 , sintetiza
parte das questões trazidas neste tópico, pois denuncia nossa mania de inverter a
ordem da dinâmica jurídica brasileira “de qualquer modo, se se pretende insistir no
mau vezo das autoridades brasileiras de inversão da pirâmide normativa do
ordenamento, de modo a acreditar menos na Constituição do que na lei ordinária”.
Deve-se, portanto, por meio de interpretação sistemática do texto
Constitucional, que se reconhecer aos Tribunais de Contas os exercícios de duas das
funções estatais: a administrativa para competências dos incisos I, III, IV, V, VI, VII,
VIII, IX, X e XI do art. 71; e a jurisdicional para a do inciso II, conjugado com o VIII, do
art. 71.
86
Cumpre lembrar que a persecução criminal possui duas fases tramitando no mesmo juízo natural, a
do inquérito e a da ação penal propriamente dita.
87
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 23.550/DF. Relator: Min. Marco Aurélio
– Tribunal Pleno. Diário de Justiça, Brasília, 31 out. 2001. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=85979>. Acesso em: 05 out.
2016.
49
restando à União apenas ingressar perante o Poder Judiciário com ação de execução,
tendo em vista a certeza e liquidez do título88.
Ademais, o STF vem decidindo reiteradamente que não cabe ao Poder
Judiciário rever o mérito das decisões89 dos Tribunais de Contas, tendo em vista a
especialidade destas cortes para o exercício de suas competências (o juízo natural
para apreciação de contas é o Tribunal de Contas, conforme comando expresso
constitucional).
Pode-se começar tal demonstração com nova citação do voto brilhante do Min.
Sepúlveda Pertence no Mandado de Segurança 23550-1/DF, o qual revelou que as
funções de controle do Tribunal de Contas têm conteúdo quase-jurisdicional:
88
Interessante notar a posição jurisprudencial predominante quanto ao tema: “ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DESVIO DE DINHEIRO PÚBLICO PARA CONTA BANCÁRIA
PARTICULAR. RESSARCIMENTO. CONDENAÇÃO NO ÂMBITO DO TCU. TÍTULO EXECUTIVO.
DESNECESSIDADE DE NOVA CONDENAÇÃO EM JUÍZO [...] 2. Já tendo o apelante sido condenado
pelo Tribunal de Contas da União a ressarcir a totalidade dos prejuízos causados ao erário, em título
executivo líquido e certo apto a ensejar a devida execução (art. 71, § 3º - CF), não deve prosperar, e
não faz nenhum sentido, a pretensão de uma nova condenação, na via judicial. 3. Apelação provida
em parte” (BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo - 0032598-85.2004.4.01.3400.
Relator: Olindo Menezes – Quarta Turma. Brasília, 10 fev. 2015. Disponível em:
<http://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=200434000416833&pA=200434000416833&
pN=325988520044013400>. Acesso em: 03 dez. 2016.
89
Nesse sentido: “Ao apurar a alcance dos responsáveis pelos dinheiros públicos, o tribunal de contas
pratica ato insusceptível de revisão na via judicial a não ser quanto ao seu aspecto formal ou tisna de
ilegalidade manifesta. Mandado de segurança não conhecido” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal.
Mandado de Segurança 7280. Relator: Min. Henrique D'avilla - Tribunal Pleno. Diário de Justiça,
Brasília, 17 set. 1962. Disponível em: <
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000075924&base=baseAcordaos
>. Acesso em: 05 out. 2016. Da mesma forma, “[...] não se pode pretender que o poder judiciário exerça
a competência atribuída pela constituição, em substituição à Corte de Contas. 4. Mandado de
segurança denegado. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 22752.
Relator: Min. Néri Da Silveira - Tribunal Pleno. Diário de Justiça, Brasília, 21 jun. 2002. Disponível
em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000017602&base=baseAcordao
s>. Acesso em: 05 out. 2016.
90
Em que pese haver discussão intensa na jurisprudência, assim como se viu na doutrina, há inúmeros
posicionamentos jurisprudenciais dos Tribunais Regionais Federais no mesmo sentido da do STF. Para
tanto, ver: BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo 0016753-61.2000.4.01.3300.
50
Relator: Selene Maria De Almeida - Quinta Turma. Brasília, 31 mai. 2007; BRASIL. Tribunal Regional
Federal (5ª Região). Processo 432559. Relator: Frederico Pinto de Azevedo - Terceira Turma. Recife,
08 out. 2010; BRASIL. Tribunal Regional Federal (5ª Região). Processo 136258. Relator: Geraldo
Apoliano - Terceira Turma. Recife, 04 mar. 2004.
91
Interessante notar que, provavelmente, por essa razão Sepúlveda Pertence, com inteligência e
perspicácia, denominou as funções dos Tribunais de Contas como “quase-jurisdicionais”, já que o
Judiciário não pode rever o mérito das suas decisões, é jurisdicional; mas como pode rever nos
aspectos formais, é quase.
92
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1947.
51
93
FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Limites à revisibilidade judicial das decisões dos Tribunais de
Contas. Revista do Tribunal de Contas da União, out/dez, n. 70, p. 39-71, 1996.
52
94
Nesse mesmo sentido, há muito interesse estudo de Álvaro Miranda, o qual merece trazer a
transcrição: “Para concluir esse capítulo, podemos sublinhar as seguintes questões. Em primeiro lugar,
o Tribunal de Contas sempre foi marcado por uma trajetória de natureza clientelística desde o início da
República. Essa trajetória caracterizava-se pela circunstância na qual era uma prerrogativa exclusiva
do chefe do Poder Executivo a nomeação dos dirigentes do órgão. Mesmo que essa escolha fosse
submetida ao Senado, como preceituavam as Constituições de 1891, 1934, 1946 e 1967/1969, ou ao
“Conselho Federal, como determinava a Carta de 1937, a indicação (escolha) partia sempre do
Presidente da República. O Senado podia não aprovar o nome indicado, mas não podia também indicar
outro nome, tarefa que cabia somente ao chefe do Poder Executivo. Isso possibilitava forte influência
do Presidente da República na troca de favores para nomeação de políticos apadrinhados em cargos
estratégicos do poder público, um deles a “magistratura” do Tribunal de Contas” [...] Em segundo lugar,
um momento crucial e contraditório para o Tribunal de Contas foi o período do regime militar. Apesar
do texto constitucional de 1967 que ampliara seus poderes, o regime militar os retirou com decretos e
leis infraconstitucionais. É possível que o fortalecimento do órgão a partir da Constituição de 1988 tenha
sido uma reação ao período anterior para recuperar funções que eram inerentes ao trabalho do órgão
(MIRANDA, Álvaro Guilherme. Ob. cit., p. 74)
53
2.3 Dos efeitos jurídicos possíveis decorrentes das decisões dos Tribunais de
Contas
O órgão competente para tanto é (iii) o TCU 96 que deverá, caso identifique
violação (iv) à legalidade, legitimidade e economicidade97 dos atos administrativos
indicados, (v) julgar as contas98 dos administradores e responsáveis e (vi) aplicar-lhes
95
Parágrafo único do art. 70 da CRFB/88.
96
Art. 71, caput da CRFB/88.
97
Art. 70, caput da CRFB/88.
98
Art.71, inciso II da CRFB/88.
54
99
Art. 71, inciso VIII da CRFB/88.
100
Art. 71, inciso IX da CRFB/88.
101
Art. 71, inciso X e parágrafo 1º da CRFB/88.
55
102
Pela norma constitucional não se tem o tempo em que o sujeito deverá prestar contas, isso deve
ser resolvido pela lei, salvo a interpretação de que a prestação de contas deverá ocorrer desde o
primeiro momento em que o sujeito use o recurso público até para sempre, segundo a tese da
imprescritibilidade do art. 37 § 5º da CRFB/88.
103
Art. 71. [...] VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de
contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao
dano causado ao erário”.
104
Veja que a decisão pela sua ilegalidade ou irregularidade poderá ser adotada pelo sistema de
controle interno de cada Poder ou pelo sistema de controle externo, nessa última hipótese pelo tribunal
de contas. Se a decisão advier do controle interno, a sanção será decorrente de ato administrativo
sancionador; se for produzida do controle externo, a sanção decorrerá do comando do inciso II do artigo
71.
57
Ademais, da segunda metade do inciso II do art. 71, cumulado com o seu inciso
VIII, retira-se outra norma jurídica:
105
Se o sujeito passivo for o Presidente da República, o sujeito ativo será o Congresso Nacional, nos
termos do art. 49 da CRFB/88.
106
Os órgãos de controle interno também possuem competência para apreciar as contas dos sujeitos
passivos. Mas como o objeto dessa tese é o controle externo, ater-se-á aos seus respectivos
parâmetros normativos.
107
Atualmente é a Lei n. 8443, de 16 de julho de 1992, que o faz.
108
Depois de anos de discussões, o Tribunal de Contas da União expediu a Súmula 186 que
reconheceu o que Walton Alencar Rodrigues muito bem sintetiza: “Demonstra-se, assim, que não
obstante toda a amplitude do comando constitucional, a jurisdição do Tribunal de Contas da União
concernente à competência para instaurar processos de Tomada de Contas Especial não abrange todo
o universo de possibilidades de dano ao Erário. Há de existir sempre a condição de agente público no
causador do dano à Administração Pública, ou sua ação em conluio com algum agente público, para
justificar a intervenção do Tribunal de Contas da União, tese que, a nosso ver, melhor atende os
interesses da Administração Pública e da coletividade em geral.” (RODRIGUES, Walton Alencar. O
dano causado ao erário por particular e o instituto da Tomada de Contas Especial. Revista do Tribunal
de Contas da União, Brasília, n.77, v. 29, jul/set, 1998, p. 54).
58
109
Nos Mandados de Segurança 23.627-2/DF, 23.875/DF, 24.354/DF, 24.439/DF, 24.471/DF,
24.891/DF, 25.181/DF e MS 25.092/DF, o STF, por maioria, decidiu que a expressão “II – julgar as
contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros públicos da administração direta e
indireta [...]” significa que ‘dinheiros públicos’ sejam realmente de titularidade pública, e que nos casos
em questão, onde o dinheiro era de propriedade do Banco do Brasil em sua atividade fim, atividade
comercial, os dinheiros não pertenciam à União, mas à pessoa jurídica de direito privado, como previsto
no artigo 173 da CRFB/88. O que seria da União na hipótese versada eram as ações do Banco.
Portanto nestes casos não se permitiu ao TCU exercer sua competência prevista no inciso II do artigo
71. Contudo, a partir dos Mandados de Segurança 25092/DF e 25181/DF, o STF, por unanimidade,
mudou o seu entendimento, por entender que os bens das empresas estatais e das sociedades de
economia mistas são bens públicos, bem como por reputar abrangidas nas normas dos artigos 70 e 71
estas empresas estatais, devendo os seus administradores prestarem contas ao controle externo e
submeterem-se às jurisdições dos Tribunais de Contas.
59
110
A redundância se justifica para que não sobrem dúvidas sobre como deveria ser pelo Texto
Constitucional.
60
próprio TCU, incumbindo ao Poder Legislativo deliberar e elaborar tal lei, remetendo-
a à Presidência da República para a sua promulgação.
Além dos nove Ministros, a CRFB/88 ainda previu a figura de Auditores e
membros do “Ministério Público junto ao Tribunal”, sem delimitar quantos seriam. Isso
significa que tal delimitação dependerá de lei própria.
O auditor, conforme parágrafo 4o do art. 73, deverá exercer uma de duas
funções: atribuições próprias de judicatura, a ser definida em lei a partir das
competências delineadas no art. 71; e substituição dos Ministros, quando esses
ausentes.
Já ao Ministério Público junto ao TCU, conforme interpretação sistemática da
CRFB/88 (artigos 73 e 130), incumbiria o exercício das atribuições dos membros do
Ministério Público previstas nos artigos 127 a 130, aplicadas às competências
contidas no art. 71.
A partir dessa organização constitucionalmente estabelecida incumbiria à
legislação infraconstitucional e regimento interno prover com adequação às demais
normas constitucionais, incluindo as do art. 5o, suas competências acima
enumeradas.
a extinção da obrigação via o seu pagamento, devem tais cortes de contas expedir o
respectivo título executivo, entregando certeza e liquidez à obrigação.
Vê-se, portanto, que as suas competências são importantes e extensas,
chegando ao ponto de poder restringir direitos e garantias dos indivíduos, tais como o
direito de propriedade, o de cidadania111 e o de exercício de função pública.
Como se sabe, o art. 5º da CRFB/88 é minucioso ao determinar quais são as
garantias individuais, podendo aqui citar as mais correspondentes ao presente tema:
111
Depois de recente decisão do STF, colocou-se em dúvida a constitucionalidade da norma contida
no art. 91 da Lei n. 8.443/92 cumulada com a norma do art. 1°, inciso I, alínea g e no art. 3°, ambos da
Lei Complementar n. 64/90, em que incumbiria ao Tribunal enviar ao Ministério Público Eleitoral, em
tempo hábil, o nome dos responsáveis cujas contas houverem sido julgadas irregulares nos cinco anos
imediatamente anteriores à realização de cada eleição, para fins de inabilitação para concorrer a cargo
eletivo.
62
112
Cumpre destacar que a Lei Orgânica que rege o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro
(Lei Complementar n. 63/1990) e igualmente do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (Lei n.
2.423/1996) acrescentaram as chamadas “Delegações de Controle” (DCT) como órgãos que compõe
o Tribunal. As DCT’s funcionam diretamente junto às estatais do âmbito estadual e municipal e
apresentam competência para fiscalizar e instaurar processos necessários, podendo, inclusive, aplicar
sanções aos responsáveis.
64
113
O art. 86 da Lei n. 8.443/92 estabelece, como obrigação do servidor que exerce funções específicas
de controle externo no Tribunal de Contas da União, “manter, no desempenho de suas tarefas, atitude
de independência, serenidade e imparcialidade”. Desse modo, na esteira do disposto na Lei Orgânica,
as manifestações são individuais. Sendo, como sabemos, comum, no âmbito de determinada unidade
técnica, haver pareceres e propostas distintas do Auditor, Diretor e do Secretário, advindo do livre
convencimento de cada um. Convém salientar, ainda, que não é raro acontecer dos Ministros
divergirem das propostas encaminhadas pela unidade técnica. Essas propostas das unidades técnicas
não são vinculativas.
114
A Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (Lei n. 79/1993) prevê em seu art. 5º
que, além do Ministério Público, a Procuradoria da Fazenda do Estado igualmente integrará o Tribunal
e com competência para emitir pareceres, interpor recursos e pronunciar-se nos autos.
115
O Regimento do Tribunal de Contas da União previu em seu art. 62 a possibilidade de os referidos
representantes do Ministério Público fiscalizarem, inspecionarem, auditarem e representarem contra
algum de seus órgãos jurisdicionados. Tal previsão amplia positivamente as competências desse
Ministério Público, contudo é de legalidade questionável o Regimento Interno dar o que a lei não
outorgou.
116
Nesta competência - fiscalização de atos e contratos – está abrangida a sua atribuição para apreciar
a legalidade dos atos de admissão de pessoal e concessões de aposentadorias.
65
117
Importante a leitura do art. 43 da Lei Orgânica que estabelece exatamente esse procedimento.
66
a) Tendo o Tribunal, por meio dos mesmos Ministros relatores dos processos
de auditoria e fiscalização respectivos, identificado que houve omissão no
dever de prestar contas, da ocorrência de desfalque ou desvio de dinheiros,
bens ou valores públicos, ou, ainda, da prática de qualquer ato ilegal,
ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao Erário, o Plenário ou a
Câmara, depois de recebido voto do Ministro Relator, determinará a
instauração da tomada de contas especial, fixando prazo para cumprimento
dessa decisão (art. 8º da Lei n. 8.443/92);
b) O Ministro Relator da fase de fiscalização anterior presidirá a instrução do
processo de tomada de contas, determinando a citação dos responsáveis
(art. 11);
c) Citados os responsáveis, esses apresentarão ao Ministro Relator defesa
por escrito;
d) Recebidas as defesas, o Ministro Relator poderá contar com o apoio de uma
de suas secretarias para análise técnica e eventuais diligências visando o
saneamento dos autos;
e) Sem necessária vinculação à análise técnica realizada por sua secretaria
de apoio, o Ministro Relator emite um voto e o encaminha para julgamento
de mérito perante o Plenário ou pela Câmara na qual faz parte;
f) No Colegiado (Plenário ou Câmara) é julgado o mérito, condenando o
responsável e aplicando-lhe sanção ou determinação para ressarcimento
ao erário, ou ainda podendo absolvê-lo.
g) Caberá ao responsável condenado recorrer da decisão por meio de
reconsideração ao mesmo Ministro Relator que proferiu o voto condenatório
(art. 33), o qual analisará o cabimento do recurso e, posteriormente,
encaminhará o processo para sorteio de novo Relator (art. 154 do
Regimento Interno118), nessa hipótese poderá novamente o Ministro contar
com o apoio de alguma de suas secretarias internas;
118
É interessante notar que a Lei Orgânica indica que o recurso deve ser analisado pelo mesmo
Ministro que levou o voto recorrido ao Plenário. Apenas o Regimento do TCU que mais recentemente
previu a hipótese de novo relator para o recurso. Veja o seu art. 154: “O Presidente sorteará, entre os
ministros, relator de cada processo referente a: I – recursos de reconsideração e de revisão e pedido
67
122
Nesse mesmo sentido dispõe o art. 245 do Regimento Interno do TCU.
123
“Art. 41, §1°. As inspeções e auditorias de que trata esta seção serão regulamentadas no Regimento
Interno e realizadas por servidores da Secretaria do Tribunal”.
124
A Lei Orgânica do TCE- TO (Lei n. 1.284/01) garante ao revel a possibilidade de “reassumir como
parte no processo, no estado em que se encontrar, sendo vedado pleitear sobre matéria já preclusa”
(art. 23). Igualmente, a Lei do TCE - AM (Lei n. 2.423/96) autoriza a parte revel intervir no curso do
processo.
69
Ainda, dispõe o art. 41, “para assegurar a eficácia do controle e para instruir o
julgamento das contas, o Tribunal efetuará a fiscalização dos atos de que resulte
receita ou despesa, praticados pelos responsáveis sujeitos à sua jurisdição [...]”.
No entanto, observa-se que não existem previsões legais expressas que
assegurem ao auditado a produção de contraprova, juntada de documentos ou ampla
dilação probatória125. Por meio do cotejo entre os dispositivos, conclui-se que o TCU
ao exercer sua competência fiscalizatória, instrui e conduz o processo de forma
unilateral, com a mínima participação da pessoa submetida ao procedimento.
125
Constatou-se que as leis dos Estados de Pernambuco (Lei n. 12.600/2004) e Tocantins dedicaram
um capítulo/seção específica sobre ampla defesa nos processos perante tais Tribunais. O art. 21 § 1º
da Lei n. 1.284/2001 dispõe que “para o pleno exercício do direito referido no caput deste artigo, será
facultado ao responsável ou interessado o acompanhamento de todos os atos e fases do processo,
independentemente de intimação”. No mesmo sentido, o art. 50, parágrafo único, da Lei n. 12.600/2004
garante “à parte interessada a oportunidade de pronunciar-se sobre o conteúdo do parecer ou relatório
aditivo, nos casos em que forem apresentados fatos novos”.
70
126
Essas disposições são reproduzidas pelo art. 197, caput e art. 197, §1°, do Regimento Interno do
Tribunal.
127
Interessante informar que a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco
determina, por meio do art. 51, a notificação das partes sempre que houver exibição de documentos
novos e manifestações/pareceres que apresentem fatos novos.
71
III - por edital publicado no Diário Oficial da União quando o seu destinatário
não for localizado.
Parágrafo único. A comunicação de rejeição dos fundamentos da defesa ou
das razões de justificativa será transmitida ao responsável ou interessado, na
forma prevista neste artigo (BRASIL, 1992).
E, por fim, o art. 25 dispõe que “o responsável será notificado para, no prazo
estabelecido no Regimento Interno, efetuar e comprovar o recolhimento da dívida”.
Perceba que ao responsável é dado conhecimento apenas da instauração do
processo e da decisão que o condenou, salvo eventual diligência que a ele seja
diretamente dirigida. As fases de instruções internas no TCU não lhe são
comunicadas.
128
O art. 37 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (Lei n. 2.324/1996)
assegura expressamente à parte o direito de defesa, no prazo de vinte dias, sempre que do processo
lhes possa resultar alguma sanção, bem como acompanhar a instrução e produzir a prova. Contudo,
ao mesmo tempo, limita os meios de produção da prova ao dispor que “as provas que a parte quiser
produzir perante o Tribunal devem ser, preferencialmente, apresentadas de forma documental,
inclusive as declarações de terceiros” (art. 37, § 4º). Por outro lado, a norma do Tribunal de Contas do
Piauí (Lei n. 5.888/2009), em seu art. 143 admite ampla produção probatória, de modo que “a parte
poderá, na fase de instrução, juntar documentos e pareceres, requerer diligências, bem como aduzir
alegações referentes à matéria objeto do processo”. Além disso, a referida norma assegura à parte que
os elementos produzidos sejam considerados efetivamente na decisão do Tribunal, conforme o art.
143,§ 1º “Os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório de instrução,
do parecer do Ministério Público de Contas, e da proposta de decisão ou do voto do Relator” e, por fim,
o § 2º arremata que “somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas
propostas pela parte quando sejam intempestivas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias”.
72
Além disso, o art. 87, inciso II, atribui competência aos servidores do TCU para
procederem às diligências necessárias para a instrução do processo, podendo
requerer informações e documentos pertinentes.
129
Destaca-se que os artigos 156 e 160 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Espírito
Santo asseguram nos recursos interpostos pelo Ministério Público, “mediante a concessão de
oportunidade para oferecimento de contrarrazões recursais, quando se tratar de recurso tendente a
agravar a situação do responsável ou do interessado”. Além disso, dispõe que “havendo partes com
interesses opostos, a interposição de recurso por uma delas enseja à outra a apresentação de
contrarrazões, no mesmo prazo do recurso”. Igualmente a norma do Tribunal de Contas do Estado do
Amazonas garante à parte impugnar o recurso (art. 129).
130
A Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Paraná para além desses tipos de recursos,
prevê no art. 65, inciso V e art. 99 § 2º, hipótese de interposição de “Embargos de Liquidação” contra
decisão que liquida valores referentes a multas, reparações e/ou restituições.
131
Nesse sentido, ver art. 35, incisos II e III da Lei n. 8.443/92.
132
A lei que rege o TCE- PI assegura à parte arguir e ver declarada a nulidade de atos processuais é
o que se depreende do art. 110, “pronunciada a nulidade na fase recursal, compete ao Relator do
Recurso declarar os atos a que ela se estende e ordenar as providências para a repetição ou retificação
do ato”.
73
133
Para a Teoria do Processo, a obra de Fazzalari é um marco importante, a qual concebe o processo
como procedimento realizado em contraditório. Aroldo Plínio Gonçalves analisou criteriosamente esta
influência do pensamento daquele autor, tendo sido feliz na síntese seguinte: “Há processo sempre
onde houver o procedimento realizando-se em contraditório entre os interessados, e a essência deste
está na simétrica paridade da participação, nos atos que preparam o provimento, daqueles que nele
são interessados porque, como seus destinatários, sofrerão seus efeitos” (GONÇALVES, Aroldo Plínio.
Técnica Processual e Teoria do Processo. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey. 2012, p. 98).
134
Nas décadas pregressas havia intensa dúvida entre os administrativistas sobre qual denominação
devesse utilizar: procedimento ou processo administrativo. Contudo, depois tanto da CRFB/88 e da Lei
Federal, tal discussão perdeu força, hoje prevalecendo o entendimento de que se houver o risco de um
provimento estatal afetar direitos concretos e específicos de algum cidadão, obrigatoriamente submete-
se o Estado ao Processo, seja ele judicial ou administrativo. Disto não há dúvida mais. O que restaria
certa discussão acadêmica é se as decisões administrativas que podem levar à ampliação de direitos
seriam submetidas a um procedimento ou a um processo. Esse autor não adentrará nesse debate, a
fim de não perder o foco na condução da pesquisa em questão, cuja litigiosidade é evidente ao se
pretender julgar contas e aplicar penalidades. Para maior aprofundamento no tema, recomenda-se a
ótima obra de Sérgio Ferraz e Adilson Dallari, os quais se filiam a corrente da defesa da denominação
processo administrativo, pois “uma “lei fundamental do cidadão, viabilizando sua participação ativa nos
processos decisórios da Administração, não mais ficando relegado à postura de sujeição, de simples
objeto do agir administrativo” (FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson. Ob.cit., p. 58).
135
“A Constituição de 1988 retomou a tradição da Constituição de 1946, anunciando aquelas normas
o
como de eficácia plena (art. 5 , inciso LV [...])” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas
Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 191).
136
Nesse sentido, “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação
imediata”.
137
Em idêntico sentido leciona Romeu Felipe Bacellar Filho (Ob. Cit., p. 53)
77
não se concebem atualmente quaisquer outros princípios que com eles possam
colidir, enfraquecer, retirar-lhes seu poder e validade138. Todos os demais princípios
constitucionais devem com eles conviver. Todas as demais normas
infraconstitucionais deles precisam extrair seus fundamentos de validade.
Pode-se, ainda, dizer que são mantras, proclamados aos quatro ventos, por
Magistrados, Advogados, representantes do Ministério Público, Professores,
Doutrinadores e Sociedade Civil.
Qualquer estudante de Direito mais atento pode repetir inúmeras definições
para eles, todos sabem do que se tratam, mas na vida real, no curso dos processos
judiciais e administrativos, há uma verdadeira Torre de Babel quando se necessita
definir se o pedido de prova pericial, por exemplo, deve ou não ser deferido; se o autor
pode obstar a pergunta do réu à testemunha de defesa; se deveria haver oitiva das
partes naquela audiência em processo administrativo; e tantos e tantas outras
situações concretas que trazem inúmeras dúvidas quanto à efetiva aplicação dos
referidos princípios.
Há dúvidas não apenas pelos aplicadores e intérpretes do Direito, mas também
nossos legisladores não se dão conta do exato conteúdo de tais princípios, a ponto
de demandarem frequentes atualizações legislativas visando mais bem adequar os
processos civil, penal e administrativo aos atuais parâmetros constitucionais. Se não
se consegue esgotar minuciosamente o exato conteúdo jurídico desses princípios, ao
menos se pode, buscando apoio na Teoria do Processo, circunscrevê-los em
parâmetros claros e, provavelmente, incontroversos, de onde se possa dizer:
No atual Estado Democrático de Direito brasileiro, o mínimo que um processo
deve seguir para alcançar atendimento aos princípios constitucionais do devido
processo legal, do contraditório e o da ampla defesa é ...!
138
Adota-se aqui o pensamento de Humberto Ávila explicitado em seu “Teoria dos Princípios: da
definição à aplicação dos princípios jurídicos”. Pode-se citar o seguinte trecho bastante característico
para esse trabalho: “Os princípios são, portanto, normas que atribuem fundamento a outras normas,
por indicarem fins a serem promovidos, sem, no entanto, preverem o meio para a sua realização. […}
no sentido específico de não enumerarem exaustivamente os fatos em presença dos quais produzem
a consequência jurídica ou de demandarem a concretização por outra norma, de modos diversos e
alternativos” (Ob. cit. p. 134-136) [...] “Princípios como normas prescritivas de fins a serem atingidos e
que servem de fundamento para a aplicação de outras. [...]”(ob. cit. p. 139)
78
139
Ou dentro da compreensão moderna sintetizada por Dinorá Grotti: “instrumento de garantia dos
administrados em face das prerrogativas públicas” (GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. “Devido
processo legal e o procedimento administrativo”. In: Revista dos Tribunais. Cadernos de direito
Constitucional e ciência Política, São Paulo, v. 22, p. 118, 1998.)
141
Paulo Bonavides demonstra que o valor que inspira o liberalismo não se volta para a comunidade,
mas para a liberdade criadora do indivíduo dotado de razão. A importância que tem o indivíduo para o
conteúdo do liberalismo clássico manifesta-se, com particular relevo, no fato de que, originariamente,
o valor da personalidade era concebido como ilimitado e anterior ao Estado e à própria sociedade. Este
grande jurista ressalta, ainda, a elevação dos indivíduos frente a qualquer manifestação de poder
estatal, visando, assim, a protegerem-se contra aquele que sempre os sufocou, impingindo-lhes, por
séculos, condutas freqüentemente injustas e amorais: “No liberalismo, o valor da liberdade, segundo
Vierkandt, cinge-se à exaltação do indivíduo e de sua personalidade, com a preconizada ausência e
desprezo da coação estatal. Quanto menos palpável a presença do Estado nos atos da vida humana,
mais larga e generosa a esfera de liberdade outorgada ao indivíduo. Caberia a este fazer e deixar de
fazer o que lhe aprouvesse”. (BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. Rio de
Janeiro: Forense, 1980, p. 31).
79
Antes e entre o período das duas Grandes Guerras Mundiais surgiu o Estado
Social nos países do mundo ocidental, como forma de responder as demandas reais
das populações desprovidas de poder político e econômico. O Estado assume um
papel de atuar com maior força na vida social, prestando serviços públicos,
interferindo no mercado, orientando e dirigindo a economia, regulando os negócios e
até mesmo produzindo bens e serviços que antes estavam com a sociedade civil142.
Não restrito à economia e à Administração Pública, como bem demonstrado
por Mirjan Damaska143, o Estado passou não apenas a usar a jurisdição como forma
de sanar os conflitos existentes entre os cidadãos e entre esses e o Estado, mas
fundamentalmente como maneira de realizar política pública144.
No âmbito processual, o juiz se transforma em principal peça do processo,
aquele que solitário, a partir de sua sabedoria, daria a melhor solução para o caso
concreto, solução essa compreendida por ele como a justa. As partes deixam de ser
importantes no curso do processo, não há necessidade de ouvi-las, mas apenas de
142
Cumpre transcrever parte da dissertação de mestrado do autor “Em suma, o Estado Social que se
forma no referido período possui três flancos fundamentais para a sua implementação. O primeiro é a
concepção econômica da denominada era Keynesiana, caracterizada pela presença forte do Poder
Público na economia, visando a garantir o pleno emprego e atuar em setores importantes e estratégicos
para o desenvolvimento nacional, como os da energia elétrica, mineração, petróleo e
telecomunicações, entre outros. O segundo decorre da preocupação com o social, que buscava conferir
ao cidadão acesso à educação, saúde, previdência social, habitação, transporte, saneamento. E, como
terceiro flanco, necessário o desenvolvimento do funcionamento interno do Estado, para que
conseguisse cumprir o que se propunha”. Isto se fez inclusive no âmbito do processo SALLES,
Alexandre Aroeira. Estado Democrático de Direito e a Reforma Administrativa. 2000. Dissertação
(Mestrado em Direito) - Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2001, p. 62).
143
DAMASKA, Mirjan R. The Faces of Justice and State Authority: A comparative approach to the
legal process. New Haven: Yale University Press, 1986.
144
Para maior aprofundamento sobre o tema, importante conhecer os capítulos 3 e 5 de DAMASKA,
Mirjan R. Ob. cit., de onde se verifica que o Estado não mais se considera um ente neutro para resolver
os conflitos, mas sim como um gestor aplicador de objetivos comuns.
80
145
Esse tema é muito bem tratado por BARROS, Flaviane de Magalhães. O paradigma do Estado
Democrático de Direito e as teorias do processo. Revista Eletrônica da Faculdade Mineira de Direito.
Belo Horizonte, ano 3, n. 1, julho de 2004.
146
Disto decorre também a perspectiva da instrumentalidade do processo a nós apresentada por
Cândido Rangel Dinamarco em 1986 (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instrumentalidade do
Processo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2013.).
147
Há diversas correntes que legitimam o Direito a partir desta perspectiva argumentativa democrática,
devendo dar destaque a HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade.
2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. v. I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2010. Para bom
aprofundamento quanto ao tema, aplicado ao Direito Regulador, também se pode conhecer pela obra
de Luis Henrique Baeta Funghi, com interessante passagem: “Ou seja, o direito deverá englobar os
princípios que tornem possível o seu processo de legitimação. Tais princípios consistem nos direitos
fundamentais, os quais exprimem as condições de possibilidade de um consenso racional acerca da
institucionalização das normas do agir (FUNGHI, Luis Henrique Baeta. Regulação e Legitimidade
Democrática: o caso dos transportes terrestres no Brasil. Dissertação de Mestrado em Direito.
UNB. 2012. p. 31).
81
primeiros artigos da CRFB/88 148 , que vale aqui transcrevê-los com grifos para as
partes que interessam ao presente trabalho:
Democracia é exatamente isto, todo o poder emanar do povo e ser por ele
exercido diretamente, nos termos da Constituição.
É também preocupar-se com a dignidade da pessoa humana149, pessoa aqui
compreendida como indivíduo, sujeito singular de direitos e obrigações, e nunca
pessoa como objeto150, desprovido de personalidade. Isto leva à obrigação de que
todas as pessoas sejam olhadas e ouvidas pelos órgãos públicos despersonalizados
(que são ocupados temporariamente por agentes) quando estes prestam/decidem
atividades essenciais do Estado em prol daquelas como, por exemplo, a jurisdição e
a administração.
148
Marcos Porta, buscando os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello, salienta igualmente
esse pressuposto do artigo 1o da CRFB (PORTA, Marcos. Processo Administrativo e o Devido
Processo Legal. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 122).
149
Cumpre remeter o leitor a JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
150
Quando este autor estava finalizando essa tese, teve a oportunidade de assistir entrevista do
Programa Roda Viva com a Presidente do Supremo Tribunal Federal, Min. Carmen Lúcia Antunes
Rocha, que com precisão explicou: “no mínimo porque, enquanto juízes, estamos tratando da vida de
pessoas, aquilo que pode parecer apenas papel é na verdade a vida de alguém. (…) Nós juízes lidamos
com situações difíceis, que é do humano” (aos 8min e 30 segundos do programa iniciado). No mesmo
sentido, há quase vinte anos, a então advogada e professora Carmem Lúcia escreveu: “por isso, o
processo, como formalização de comportamentos para a reivindicação e efetividade de direitos, põe-
se como uma necessidade da civilização e da civilidade jurídica do homem no Estado” (Princípios
Constitucionais do Processo Administrativo no Direito Brasileiro. Revista de Informação
Legislativa. Brasília a. 34 n. 136 out./dez. 1997).
82
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei;
XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente;
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes. (BRASIL, 1988) (grifos próprios).
Tem-se, portanto, que o processo passa a ser um direito e uma garantia dos
indivíduos contra o abuso ou excesso de Estado, seja no âmbito jurisdicional ou no
administrativo. Na democracia todos os cidadãos são agentes e responsáveis pela
construção da norma jurídica, seja ela geral e abstrata (por meio de representantes
eleitos), seja concreta e específica (diretamente, nos termos da constituição),
provenha da função legislativa, da jurisdicional ou da administrativa151.
151
O capítulo 3 da obra de Romeu Felipe Bacellar Filho (Ob. Cit., p.125) é primorosa em demonstrar
tal paradigma, trazendo ademais o pensamento de diversos importantes jusfilósofos, como Canotilho,
Günter Püttner e Luigi Ferrajoli.
83
Agora, exige-se que o Juiz inverta esse caminho, que ele parta do caso
concreto em direção ao Direito, e identifique as leituras possíveis, não porque
o ordenamento encerra uma carga axiológica, mas porque o Direito em sua
integralidade se apresenta como “um mar revolto de normas em permanente
tensão concorrendo entre si para regerem situações” (CARVALHO NETTO,
2004, p. 40).
152
LEAL, Rosemiro Pereira. Ob. cit., p. 63.
153
MARQUES, Leonardo Augusto Marinho. A exclusividade da função acusatória e a limitação da
atividade do Juiz Inteligência do princípio da separação de poderes e do princípio acusatório. Revista
de Informação Legislativa, Brasília, a. 46 n. 183 julho./set. 2009.
154
CARVALHO NETTO, Menelick de. A Hermenêutica constitucional sob o paradigma do estado
democrático de direito. In: OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de (Coord.). Jurisdição e
hermenêutica constitucional no estado democrático de direito. Belo Horizonte: Mandamentos,
2004.
84
155
Cumpre aqui remeter o leitor à ótima obra de Menelick Carvalho Netto onde em dado momento o
autor, depois de analisar o pensamento de Niklas Luhmann e de Jürgen Habermas, conclui: “O saber
que se sabe limitado funda-se no permanente debate público acerca de seus próprios fundamentos e,
assim, é precário, contingente e sempre aprimorável. Seus fundamentos são históricos e datados”
(CARVALHO NETTO, Menelick. Os Direitos Fundamentais e a (In) Certeza do Direito. A
produtividade das tensões principiológicas e a superação do sistema de regras. Belo Horizonte:
Fórum, 2012, p. 27), ainda, “Aprendemos a duras penas que racional é o saber que sabe da
precariedade de nosso próprio saber e busca lidar racionalmente com os riscos que ela acarreta”
(CARVALHO NETTO. Ob. cit., p. 65).
156
FERRAJOLI. Luigi. Direito e Razão. Teoria do Garantismo Penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2006;
157
Em seu excepcional CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milano: Giuffrè Editore, 2012, no seu
capítulo II, descreve minuciosamente os procedimentos próprios de cada sistema.
158
COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Sistema acusatório: cada parte no lugar
constitucionalmente demarcado. Revista de informação legislativa, v. 46, n. 183, p. 103-115, jul./set.
2009.
159
PRADO, Geraldo. Sistema acusatório. A conformidade constitucional das leis processuais
penais. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
160
LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. v, 2.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
161
ANDRADE, Mauro Fonseca. O sistema acusatório proposto no projeto de novo codex penal adjetivo.
Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 46, n. 183. Jul/set, 2009.
162
Em especial, destaca-se a conclusão de Luigi Ferrajoli: “Pode-se chamar acusatório todo sistema
processual que tem o juiz como um sujeito passivo rigidamente separado das partes e o julgamento
como um debate paritário, iniciado pela acusação, à qual compete o ônus da prova, desenvolvida com
a defesa mediante um contraditório público e oral e solucionado pelo juiz, com base em sua livre
convicção. Inversamente, chamarei inquisitório todo sistema processual em que o juiz procede de ofício
85
1) Modelo Inquisitório:
a. Iniciativa do julgador para a investigação;
b. Iniciativa do julgador para a acusação;
c. Iniciativa do julgador em campo probatório;
d. Confusão entre julgador e acusação;
e. Discrepância de poder entre a acusação e a defesa;
f. Caráter escrito da instrução e das defesas;
g. Ausência de debate oral entre defesa e acusação para convencimento
do juiz;
h. Investigações sem participação das partes.
i. Construção do saber pelo juiz de modo solitário, anunciando o que
entende por verdade real163;
j. Decisões colegiadas.
2) Modelo Acusatório:
a. Separação rígida entre o julgador e a acusação164;
b. Paridade de posição e de armas entre a defesa e a acusação;
c. Gestão da prova precipuamente nas mãos da defesa e da acusação165;
à procura, à colheita e à avaliação das provas, produzindo um julgamento após uma instrução escrita
e secreta, na qual são excluídos ou limitados o contraditório e os direitos da defesa.” (FERRAJOLI.
Luigi. Ob. cit., 2006, p. 519-520).
163
Ver MARQUES, Leonardo Augusto Marinho. Hiper-racionalidade inquisitória. In BONATO, Gilson
[org]. Processo Penal, Constituição e Crítica – Estudos em homenagem ao Prof. Dr. Jacinto Nelson
de Miranda de Coutinho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.p. 475 -485. Igualmente Richard-Paul
Martins Garrel faz profundo estudo sobre o princípio da verdade real, demonstrando o quão é
identificado com o sistema inquisitivo, concluindo: “assim, torna-se imperativa a desconstrução do
processo penal excepcional (presença fantasmagórica entre o autoritarismo e o direito) mediante a
substituição do “princípio” da verdade real, constituído a partir do dogmático hiper-racionalismo
inquisitório, por um princípio da verossimilhança racional, a partir das bases jurídico-epistêmicas da
teoria neoinstitucionalista do processo” (GARREL, Richard-Paul Martins. Reflexos Antidemocráticos
do Princípio da Verdade Real no Processo Penal Brasileiro. Dissertação de Mestrado – PUC-MG.
Belo Horizonte. 2013. p. 145 e 146).
164
O julgador não pode iniciar a investigação e nem instaurar a ação, pois se o faz na prática ele cria
uma hipótese fática antes de essa ser apurada mediante os fatos provados no curso de uma fase
instrutória. Salvo ser um iluminado, o julgador como ser humano médio acaba por manejar o processo
visando confirmar aquela hipótese previamente criada, já que tem responsabilidade pela instauração
do processo. Isto é o que Franco Cordero, seguido por Jacinto Coutinho, muito bem denunciou como
quadro mental paranóico. Em recentes pesquisas, o Professor da Universidade de Munique, Bernd
Schünemann (2013, p. 205 e 239), conseguiu demonstrar que a participação de magistrados alemães
nas investigações preliminares realizadas pelo Ministério Público acaba por vincular o magistrado na
tese criada pelo acusador, levando-o a condenar o réu em proporção muito maior do que se não tivesse
participado da fase investigatória e até mesmo da postulatória.
165
Schünemann (2013, p. 235) também demonstrou que quanto mais responsável e ativo na gestão
da prova, mais o julgador se envolve com a tese da acusação, acabando por condenar o réu em
proporção maior do que se estivesse afastado da incumbência de gerir prova. Sua tese comprova o
86
Está claro que aos dois modelos são associáveis sistemas diferentes de
garantias, sejam orgânicas ou procedimentais: se o sistema acusatório
favorece modelos de juiz popular e procedimentos que valorizam o
contraditório como método de busca da verdade, o sistema inquisitório tende
a privilegiar estruturas judiciárias burocratizadas e procedimentos fundados
quão relevante é para fins de alcance da verdadeira imparcialidade o julgador se colocar como terceiro,
na precípua função de assistir o diálogo entre as partes (SCHÜNEMANN, Bernd. O Juiz como um
terceiro manipulado no processo penal? Uma confirmação empírica dos efeitos perseverança e
correspondência comportamental. In: GRECO, Luís [coord]. Estudos de direito penal, direito
processual penal e filosofia do direito. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 205-239).
166
Relevante decisão do STF reforça para o processo brasileiro atual esse mesmo princípio, valendo
sua transcrição:
“PROCESSO PENAL ACUSATÓRIO - OBRIGAÇÃO DE O MINISTÉRIO PÚBLICO FORMULAR
DENÚNCIA JURIDICAMENTE APTA. - O sistema jurídico vigente no Brasil - tendo presente a natureza
dialógica do processo penal acusatório, hoje impregnado, em sua estrutura formal, de caráter
essencialmente democrático - impõe, ao Ministério Público, notadamente no denominado “reato
societario”, a obrigação de expor, na denúncia, de maneira precisa, objetiva e individualizada, a
participação de cada acusado na suposta prática delituosa. - O ordenamento positivo brasileiro - cujos
fundamentos repousam, dentre outros expressivos vetores condicionantes da atividade de persecução
estatal, no postulado essencial do direito penal da culpa e no princípio constitucional do “due process
of law” (com todos os consectários que dele resultam) - repudia as imputações criminais genéricas e
não tolera, porque ineptas, as acusações que não individualizam nem especificam, de maneira
concreta, a conduta penal atribuída ao denunciado. [...] Não compete, ao réu, demonstrar a sua
inocência. Cabe, ao contrário, ao Ministério Público, comprovar, de forma inequívoca, para além de
qualquer dúvida razoável, a culpabilidade do acusado. Já não mais prevalece, em nosso sistema de
direito positivo, a regra, que, em dado momento histórico do processo político brasileiro (Estado Novo),
criou, para o réu, com a falta de pudor que caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o acusado
provar a sua própria inocência (Decreto-lei nº 88, de 20/12/37, art. 20, n. 5). Precedentes. - Para o
acusado exercer, em plenitude, a garantia do contraditório, torna-se indispensável que o órgão da
acusação descreva, de modo preciso, os elementos estruturais (“essentialia delicti”) que compõem o
tipo penal, sob pena de se devolver, ilegitimamente, ao réu, o ônus (que sobre ele não incide) de provar
que é inocente[...]” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 88875/AM. Relator: Min.
Celso De Mello - Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 12 mar. 2012).
87
167
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Editora JusPodivm. 18a ed.
2016.
168
“Se é certo que dados culturais influenciam a conformação do processo, método de exercício de
poder, não há relação direta entre aumento de poderes do juiz e regimes autocráticos, ou incremento
do papel das partes e regimes democráticos” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 126).
169
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 126.
170
Ob. Cit. p. 127
88
171
Na verdade, esse tema interessa a toda humanidade, pois não bastaram as principais obras
filosóficas do direito, nem as históricas ou as de teoria do processo, há obras ficcionais maravilhosas
discorrendo sobre os processos e suas injustiças, como os clássicos de Kafka, Victor Hugo, Charles
Dickens, Dostoievski, Huxley, Shakespeare, Guimarães Rosa, Dias Gomes, e até obras populares
como as de John Grisham.
89
4.6.1 Breve histórico do devido processo legal e sua razão científica de existir
172
MIRANDA, Pontes de. Ob. cit., 1947.
173
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. O devido processo legal e os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
174
DAVID, René. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo. São Paulo: Martins Fontes,
1998.
175
GALLIGAN, D. J. Due Process and Fair Procedures. Oxford: Clarendon Press Oxford, 2004.
176
FRIEDMAN, Lawrence M. A History of American Law. 3. ed. New York: Simon & Schuster, 2005.
177
SCHWARTZ, Bernard. American Constitutional Law. United Kingdom: Cambridge University
Press, 1955.
178
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. Ob. cit., p.9.
179
Siqueira Castro cita trecho do referido jurisconsulto inglês, cuja transcrição merece ser aqui
reproduzida: “The censors cannot be judges, ministers and parties; judges to give sentence of judgment;
minister to make summons, and parties to have the moiety of the forfeiture, quia aliquis non debet esse
judex in propria causa, imo iniquum est alequem suae rei esse judicem; and one cannot be judge and
attorney for any of the parties […]” (Ob. cit. p. 15).
90
Destes advirão tantos outros direitos com o desenrolar das discussões judiciais
e debates acadêmicos181, tanto nos Estados Unidos, seu principal criador, como nos
países que receberam suas influências, v.g. o Brasil.
Questão interessante que foi possível perceber ao longo dos últimos dois
Séculos é a que informa tal princípio como mantenedor de dois comandos
complementares, um denominado de substantivo e outro de processual. As cortes
jurisdicionais norte-americanas utilizaram o instituto do due process of law como forma
de delimitar quais as garantias individuais deveriam ser respeitadas no curso de um
processo (procedure process of law), assim como exigir que os julgamentos se
pautassem em parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade (substantive process
180
Todos os itens desse parágrafo podem ser encontrados nas emendas constitucionais norte-
americana, que foram ao longo do tempo aperfeiçoando suas regras para organização judiciária e
processo. Adotam-se aqui as traduções livres do autor e de Siqueira Castro (Ob. Cit. p. 28- 29), as
indicadas entre aspas, cujo trabalho é primoroso e merece leitura atenta para melhor compreensão do
instituto do devido processo legal e sua história.
181
Ótima síntese de Humberto Ávila para o conteúdo jurídico de devido processo legal: “nesse sentido,
a expressão composta de três partes fica plena de significação: deve haver um processo; ele deve ser
justo; e deve ser compatível com o ordenamento jurídico, especialmente com os direitos fundamentais”
(ÁVILA, Humberto. O que é “devido processo legal”? Revista de Processo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, ano 33, n. 163, set. 2008, p. 57).
91
182
Para aprofundar no conhecimento desta discussão doutrinária, ver ÁVILA, Humberto. Ob. cit., e
DIDIER JUNIOR, Fredie. Ob. cit.
183
Muitos autores descreveram em tópicos o que abrangeria o referido princípio. Veja por exemplo a
explicitação de Marcos Porta (Ob. Cit., p. 101 a 135) tratando do processo administrativo e o devido
processo legal. Já Egon Moreira descreveu o que não seria um processo devido: “Assim, não será
devido o processo (a) sigiloso ou fechado, a não ser quando indispensável para a segurança nacional
ou para a proteção do direito à intimidade; (b) absolutamente informal (não autuado ou encaminhado
segundo procedimento e sequencia desconhecidos); (c) burocratizado (excessivamente formal,
revestido de formalidades inúteis); (d) não-participativo ( em que o particular não é ouvido e não
consegue influenciar ou interagir com a Administração, ainda que não seja no exercício da ampla
defesa e contraditório); (e) desobediente a prazos mínimos para a prática dos atos; (f) violador ou
aviltante de garantias constitucionais e legais específicas; (g) que não represente um ‘caminhar para
frente’ (princípio da preclusão); (h) que despreze os limites objetivos e subjetivos fixados na peça inicial,
seja ela produzida pela Administração ou pelo particular (à semelhança do ‘princípio do libelo’ ou
‘estabilidade da demanda’); (i) que não busque atingir objetivo público certo, predeterminado e lícito; (j)
ineficiente (tanto o que não busca resultado útil quanto o que se vale de instrumentos inúteis na busca
de resultado útil); (k) ineficaz (não culmina em uma decisão com efeitos concretos ou práticos); (l) que
não preveja ou possibilite revisão dos atos decisórios de primeiro grau; (m) que não permite a atuação
ativa da defesa técnica, a ser exercitada por advogado e/ou peritos; (n) que não tenha início com
notificação, clara e precisa, em que se consigne prazo certo para apresentação de defesa; (o) que não
permite a produção de provas; (p) que não se fundamente única e exclusivamente em provas lícitas; e
(q) oneroso (excessivamente custoso aos cofres públicos ou aos particulares)” (MOREIRA, Egon
Bockmann. Ob. cit., 298). Incumbe salientar que o autor reconhece ser aberto o princípio do devido
processo legal, conforme se retira do seguinte trecho de sua ótima obra sobre o processo
administrativo: “Uma relação jurídica justa e equitativa, desenvolvida com precisão que outorgue
segurança ao administrado, ao mesmo tempo em que respeite sua dimensão moral – esses são traços
que caracteriza, o ‘devido processo legal’. Sem dúvida são expressões abertas, com significado
indefinível de plano. Devem ser compreendidas levando em contra que o sistema da common law é
eminentemente jurisprudencial. Inexiste limitação derivada de conjunto fechado de normas positivas
primárias, a serem aplicadas mediante operação lógica de silogismo – caminho diverso do brasileiro.
A toda evidência, não mais vige no Brasil a concepção mecanicista de aplicação da norma numa
operação automática, mas sim – e cada vez mais – a necessidade de integração dos fatos ao todo do
Ordenamento Jurídico e a construção da norma por parte do intérprete” (Ob. cit., p. 251).
92
Pode-se, portanto, concluir que tal princípio, além de como já visto ser de
eficácia plena e aplicabilidade imediata, direta e integral, funciona como:
184
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 26.358/DF. Relator: Min. Celso de
Mello. Diário de Justiça, Brasília, 02 mar. 2007.
185
THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 53. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2012, p.27.
93
186
Novamente Carmem Lúcia Antunes Rocha (1997, p 28) é precisa ao concluir seu artigo sobre os
princípios constitucionais do processo administrativo: “Muitos cristos tem visto a história humana. De
Sócrates a Dreyffus, a mão do homem tem usado formas de processo para processos sem forma e
argumentos de lei para leis sem argumento”.
187
Nesse sentido, cumpre transcrever decisão do Superior Tribunal de Justiça: “[...] 1. A tutela
jurisdicional não pode ser prestada senão quando requerida e com base na causa invocada pela parte,
tendo em vista que o julgador não pode extrapolar o pedido, pois ao Estado-Juiz é defeso deliberar
sobre questão que não lhe foi dada a resolver. 2. A delimitação do âmbito do recurso, com a
apresentação dos motivos de fato e de direito que justificam a modificação da sentença, exsurge como
corolário do processo acusatório, do princípio do ne procedat judex ex officio [...] 4. Ordem concedida
para proclamar a nulidade do acórdão” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus
178.086/PR. Relator: Min. Celso Limongi – Sexta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 21
fev. 2011).
94
188
Ademais, a própria criação da Tripartição dos Poderes é resultado da percepção que a mesma
pessoa que cria as leis, não deve ser a mesma que a aplica e nem a que a julga. Consectário lógico
inevitável para o Processo.
189
MLODINOW, Leonard. Subliminar. Como o Inconsciente Influencia Nossas Vidas. Rio de
Janeiro: Zahar, 2012.
95
190
A ciência também já demonstrou que o indivíduo tende a buscar aprovação, apoio e amizade do
grupo em que ele está inserido, levando-o inconscientemente a distorcer a realidade para alcançar
essa aprovação do grupo. Para aprofundamento nesses estudos, ver a obra citada de Mlodinow. Nessa
direção alcançou Hannah Arendt, em seu Origens do Totalitarismo (Edição Kindle, Companhia de
Bolso): “O que as massas se recusam a compreender é a fortuidade de que a realidade é feita.
Predispõem-se a todas as ideologias porque estas explicam os fatos como simples exemplos de leis e
ignoram as coincidências, inventando uma onipotência que a tudo atinge e que supostamente está na
origem de todo acaso” (ob. Cit. p. 8037).
191
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
97
4.7 Do Contraditório
192
Na Universidade de Oxford, o Professor D. J. Galligan conduziu estudo minucioso sobre o tema,
denominado “due process and fair procedures”, em que procurou demonstrar o conteúdo da afirmação
acima descrita. Cumpre transcrever a seguinte passage de sua obra: “That is precisely what fair
procedures are about, for the means to fair treatment lie in fair procedures” (GALLIGAN, D. J. Due
Process and Fair Procedures. Oxford: Clarendon Press Oxford, 2004, p. 18).
193
Marcos Porta sintetiza muito bem a posição de que contraditório e ampla defesa são princípios
concretizadores do princípio do devido processo legal (Ob. Cit., p. 124). De fato nem haveria tanta
necessidade de serem conjuntamente explicitados, mas durante o processo constituinte de 1988 houve
intenso debate e decisão de deixá-los evidenciados para que dúvida alguma restasse da intensão do
povo brasileiro de ser partícipe das decisões estatais que interviessem em seus direitos.
98
194
Existe importante discussão doutrinária distinguindo o Processo Civil do Penal quanto à sua
justificação. Há o entendimento de Nelson Nery Jr., pelo qual o principio do contraditório no âmbito do
processo civil não apresenta tanta amplitude como no processo penal. Segundo o autor, no processo
civil basta que as partes sejam ouvidas durante o processo e oportunizada a discussão isonômica da
causa, dessa forma, o contraditório se resumiria em “bilateralidade da audiência”, de modo que o ato
de citação implementa por excelência o contraditório, pois a partir desse momento o réu poderá deduzir
a resposta, nas formas previstas em lei (NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na
Constituição Federal. 6. ed. v. 21. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000).
99
195
Incorporados à ordem jurídico-nacional por meio dos Decretos n. 592/92 e n. 678/92.
100
196
Ob. Cit. p. 428.
197
Idêntico posicionamento atual no Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL -
PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - LICENÇA PARA CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIO -
JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS - AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA PARTE PARA SE
MANIFESTAR - OFENSA AO ART. 398 DO CPC - NULIDADE DO ACÓRDÃO - VIOLAÇÃO AO
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO PARA
DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À CORTE DE ORIGEM. O recurso merece prosperar pela
inequívoca violação ao disposto no artigo 398 do Código de Processo Civil. Com efeito, na hipótese
em exame a Corte de origem não deu oportunidade aos impetrantes de se manifestarem acerca da
juntada de documentos que se mostraram essenciais para a formação da convicção daquele Tribunal,
que, com base neles, deu provimento à apelação da parte contrária. A respeito do tema, pontificam
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery que, "após o deferimento de juntada dos
documentos nos autos, o juiz deve determinar seja ouvida a parte contrária. Se isto não ocorrer e o
documento influir no julgamento do juiz, em sentido contrário ao do interesse da parte preterida, a
sentença que vier a ser proferida é nula e assim deve ser declarada". Na espécie, a juntada dos
documentos novos foi realizada pelo assistente da parte contrária, o que não afasta a aplicação do
artigo 398 do estatuto processual civil, uma vez que a atuação do assistente ocasionou evidente
prejuízo à defesa dos recorrentes. Dessarte, verificado na espécie o cerceamento de defesa, pela
ausência de oportunidade dada à parte para se pronunciar acerca dos documentos novos trazidos aos
autos, resta inafastável a nulidade do acórdão por ofensa ao princípio do contraditório. Recurso
especial provido” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 264660/SP. Relator: Min.
Franciulli Netto – Segunda Turma. Diário de Justiça, Brasília, 03 nov. 2003).
198
NERY JUNIOR, Nelson. Ob. cit., 132.
101
Para que tudo isso se efetive, é igualmente óbvia obrigação a comunicação dos
atos processuais às partes, a fim de que elas possam iniciar o diálogo processual, o
qual será encerrado com o provimento, de onde o julgador estará apto a retirar desse
diálogo a sua síntese, a verdade processual199.
Por conseguinte, “é direito do réu ser comunicado adequadamente sobre a lide
e seu conteúdo, fazendo-se ouvir no tribunal”200. Em conclusão, o autor reafirma que
o princípio do contraditório expressa as mesmas oportunidades e instrumentos
processuais para as partes, permitindo-se ajuizar a ação, deduzir resposta, requerer
e realizar as provas, recorrer das decisões judiciais, tudo isso, em suma, para fazer
valer seu direito.
Posicionamento semelhante quanto ao sentido do princípio do contraditório é
adotado por Humberto Theodoro Jr.201 e por Cintra, Grinover e Dinamarco202, em que
o juiz realiza um processo dialético e as decisões representam uma “síntese” do
contraditório que foi exercido por ambas as partes. Em outros termos, as partes devem
ser ouvidas, devem apresentar provas e influir na formação do convencimento do
magistrado, de modo que uma parte apresenta a “tese” enquanto a outra apresenta a
“antítese”. Para tanto, é necessária a comunicação efetiva de todos os atos
processuais, praticados pelo juiz ou pelo adversário, expressando-se na citação,
intimação ou notificação203.
199
Existem algumas importantes discussões doutrinárias que defendem inexistir a tal verdade real, mas
a única possível é a verdade auferida pelos elementos contidos em um processo, onde o contraditório
esteja presente. Para maior aprofundamento, ver estudo de Richard-Paul Garrel (ob. Cit. p. 70 a 135).
200
NERY JUNIOR, Nelson. Ob. cit., 141.
201
Na mesma direção da doutrina majoritária, reconhece que o princípio do contraditório apresenta
dupla destinação, pois influencia a atuação do magistrado e, ao mesmo tempo, garante às partes o
direito de manifestação antes de qualquer decisão. O autor complementa o entendimento afirmando
que não basta garantir a oportunidade de “dizer e ser ouvido”, mas também cabe à parte ser
devidamente citada/intimada sobre cada ato e, ainda, manifestar-se e apresentar contraprova para
desconstruir as premissas e alegações do outro litigante (THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de
Direito Processual Civil. 53. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012).
202
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel.
Teoria Geral do Processo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
203
Nesse sentido, cumpre destacar decisão do TJDF:
“PROCESSO CIVIL. SEGURO SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. JUNTADA DE DOCUMENTOS.
AUSÊNCIA DO CONTRADITÓRIO. SENTENÇA. APELAÇÃO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE
DEFESA. ACOLHIMENTO. 1. Verificado que o autor não foi intimado para se manifestar sobre
documentos juntados pelo requerido e que esses documentos foram fundamentais à formação do
convencimento do Juízo, a sentença deve ser cassada por cerceamento de defesa e em atenção ao
princípio do contraditório, a teor do que dispõem o artigo 5º, LV, da Constituição Federal e o artigo 398
do Código de Processo Civil. 2. Uma vez que a indenização por dano moral é consequência da prática
de ato ilícito, deve ser cassada integralmente a sentença que não oportuniza o exercício do contraditório
em relação a documentos relevantes para a formação do convencimento do julgador acerca da ilicitude
do ato. 3. Preliminar de cerceamento de defesa acolhida. Sentença cassada” (BRASÍLIA. Tribunal de
102
Em suma, a dimensão deste direito é tão clara que causa tristeza precisar da
pena do STF para clarear às autoridades administrativas suas obrigações de
cumprimento ao contraditório.
Salienta ainda Romeu Felipe Bacellar Filho, completo de razão, que incumbe
respeitar o contraditório até mesmo na fase preparatória do processo administrativo
disciplinar. Ou seja, mesmo antes de se ver instaurado o processo, caso sejam
necessárias medidas que levem o acusador a produzir provas deverá ser comunicado
o interessado para acompanhar os trabalhos e propor o que de direito206.
Justiça. Processo -20130310112819. Relator: Sebastião Coelho – Quinta Turma Cível. Brasília, 16
dez. 2014).
204
LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. v, 2.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
205
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 23.550/DF. Relator: Min. Marco
Aurélio – Tribunal Pleno. Diário de Justiça, Brasília, 31 out. 2001. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=85979>. Acesso em: 05 out.
2016.
206
Ob. Cit. p. 258
103
207
Como exemplo, tem-se a seguinte decisão: “PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. DL 201/67.
TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. MEDIDA EXCEPCIONAL. INDEFERIDA. PEDIDO DE PERÍCIA.
AUSÊNCIA DE CONTRADITÓRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA RECONHECIDO. HABEAS
CORPUS PARCIALMENTE CONCEDIDO. [...] 2. Quanto ao pedido de produção de prova pericial, a
lei concede ao juiz a decisão sobre a necessidade/utilidade da prova, contudo, há que se ponderar a
respeito da produção de prova sob os princípios do contraditório e da ampla defesa. 3. Na hipótese, a
denúncia registra que o paciente não teria realizado a construção de algumas unidades sanitárias no
Município de Lusilândia, como determinado no convênio com a FUNASA nº 477/2002 . Sustenta o
impetrante que teria requerido a perícia in loco nas obras objeto do contrato a fim de aquilatar as
construções realizadas e que não teve conhecimento das vistorias realizadas. 4. Muito embora caiba
ao juiz indeferir as provas impertinentes, impende ressaltar a existência e necessidade de observância,
no nosso ordenamento jurídico, da garantia constitucional da ampla defesa, estabelecida no art. 5º, inc.
LV, da Constituição Federal, segundo a qual, "aos acusados em geral são assegurados o contraditório
e ampla defesa, com os meios e recursos e ela inerentes". 5. Em face da alegação do réu, confirmada
pelo MM. Juízo a quo, de que a perícia foi realizada sem a sua participação, merece ser concedida a
ordem de habeas corpus, para produção da prova pericial, com observância do direito do acusado ao
contraditório e ampla defesa. 6. Concessão da ordem de Habeas corpus em parte” (BRASIL. Tribunal
Regional Federal (1ª Região). Processo - 0063585-07.2013.4.01.0000. Relator: I’talo Fioravanti Sabo
Mendes – Quarta Turma. Brasília, 30 jul. 2014).
208
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habes Corpus 131.469/SP. Relator: Min. Celso Limongi -
Sexta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 06 dez. 2010. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=130216
44&num_registro=200900484215&data=20101206&tipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 01 dez. 2016.
104
O Contraditório impõe que seja dado direito à produção da prova, como já dito,
mas exige também que a outra parte, que não a solicitante ou produtora da prova,
possa acompanhar pari passu a sua produção, com seus advogados e assistentes
técnicos, levantando suas dúvidas e apresentando as suas conclusões.
Prova produzida sem que a parte adversa tenha sido intimada para
acompanha-la é prova nula, por violação ao contraditório, conforme também
posicionamento jurisprudencial209:
209
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Processo - 1.0024.03.885339-6. Relator: Eduardo Mariné da
Cunha - Décima Sétima Câmara Cível. Belo Horizonte, 29 jul. 2014. Disponível em:
<http://www8.tjmg.jus.br/themis/verificaAssinatura.do?numVerificador=1002403885339600220147597
78>. Acesso em: 04 dez. 2016.
210
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2002.
211
O autor esclarece que o magistrado é obrigado a conduzir todo o procedimento por impulso oficial,
independente de requerimento das partes e nos casos previstos em lei. Essa obrigação também implica
105
215
Nesse sentido: “PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – JUNTADA AOS
AUTOS DE DOCUMENTOS A DESPEITO DA OITIVA DA OUTRA PARTE – VIOLAÇÃO DO ARTIGO
398 DO CPC – CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA E VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO
CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. 1. Impõe-se a intimação da parte, em razão
da juntada de novo documento aos autos, cujo teor faz-se essencial para a formação da convicção do
juízo singular (art. 398 do CPC). 2. No caso, os cálculos apresentados pela Fazenda Pública devem
ser submetidos ao contraditório. Em outros termos, indispensável a abertura de vista à parte contrária,
fornecendo-lhe a oportunidade de manifestar-se sobre o montante referente à conversão em renda de
valores depositados em juízo; a resultar, in casu, nulo o decisum singular e reformado o acórdão a quo,
por inobservância do que dispõe o art. 398 do CPC (Princípio do Devido Processo Legal). Recurso
especial provido, para determinar a intimação da parte contrária, quanto aos cálculos ofertados pela
Autoridade Fazendária, nos termos do voto” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial
1086322/SC. Relator: Min. Humberto Martins – Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico,
Brasília, 01 jul. 2009).
216
FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001.
217
Assim é também o entendimento jurisprudencial: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RECURSO QUE NÃO ATACA TODOS OS FUNDAMENTOS DA
DECISÃO AGRAVADA. POLICIAL MILITAR. EXCLUSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. AUSÊNCIA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA
DEFESA.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a ausência de processo
administrativo ou a inobservância aos princípios do contraditório e da ampla defesa torna nulo o ato de
demissão de servidor público, seja ele civil ou militar, estável ou não. Precedentes. Agravo regimental
a que se nega provimento.
((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo 433239. Relator: Min.
Roberto Barroso - Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 10 set. 2014).
218
Ob. Cit. p. 247
107
219
Igual sentido decisão reiterado do STJ:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO.
DEMISSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADE. PRAZO PARA
NOTIFICAÇÃO DO ACUSADO. INOBSERVÂNCIA. PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO
CONTRADITÓRIO CONTRARIADOS. SEGURANÇA CONCEDIDA.
[...] 2. A omissão existente no Regime Jurídico dos Servidores Públicos – Lei 8.112/90 – quanto ao
prazo a ser observado para a notificação do acusado em processo administrativo disciplinar é sanada
pela regra existente na Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração
Pública Federal. 3. O servidor público acusado deve ser intimado com antecedência mínima de 3 (três)
dias úteis a respeito de provas ou diligências ordenadas pela comissão processante, mencionando-se
data, hora e local de realização do ato. Inteligência dos arts. 41 e 69 da Lei 9.784/99 e 156 da Lei
8.112/90. 4. Ilegalidade da audiência de oitiva de testemunhas e, por conseguinte, do processo
administrativo disciplinar em razão do fato de que o impetrante foi notificado desse ato no dia que
antecedeu a sua realização, contrariando a legislação de regência e os princípios da ampla defesa e
do contraditório. 5. Segurança concedida. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de
Segurança 9.511/DF. Relator: Min. Arnaldo Esteves Lima – Terceira Seção. Diário de Justiça, Brasília,
21 mar. 2005).
220
ADMINISTRATIVO. PROCESSO DE REVISÃO DE APOSENTADORIA. NECESSIDADE DE
OBSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. ARTIGO 38 DA LEI 9.784/99.
NULIDADE DOS DESCONTOS. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA.
1. Nos termos do art. 38 da Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo
no âmbito da Administração Pública Federal, o administrado possui o direito de juntar documentos e
pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do
processo antes da tomada da decisão. Tal formalidade não foi observada no caso concreto, pois o ato
administrativo não foi precedido do devido processo legal, uma vez que não se assegurou ao autor a
oportunidade de defesa em momento anterior à revisão de seu benefício. 2 - seria considerado irrisório.
Assim sendo, considerando a possibilidade legal da apreciação equitativa do juiz, o valor fixado a título
de honorários deve ser majorado para R$1.000,00 (mil reais). (SANTA CATARINA. Tribunal Regional
Federal (4ª Região). Processo - 5035033-57.2014.404.7200. Relator: Marga Inge Barth Tessler -
Terceira Turma. Florianópolis, 08 out. 2015).
221
REEXAME NECESSÁRIO - APELAÇÃO CÍVEL - CONCURSO PÚBLICO - GUARDA MUNICIPAL -
TESTE PSICOTÉCNICO - CRITÉRIOS SUBJETIVOS: NULIDADE - IRREPETIBILIDADE - RECURSO
ADMINISTRATIVO - AMPLA DEFESA: INOBSERVÂNCIA. 1. É possível a inserção de exame
psicotécnico como fase de concurso público desde que justificável para o exercício das atividades
inerentes ao cargo e desde que haja previsão legal autorizadora. 2. Ainda que verificado vício no exame
por ausência de objetividade dos critérios de avaliação, não se justifica sua repetição sob pena de
violação ao princípio da isonomia. 3. Estabelecido prazo extremamente exíguo para apresentação de
recurso administrativo, resta desrespeitada a garantia da ampla defesa, o que acarreta a nulidade da
etapa do concurso (MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Processo – 10216080538640001. Relator:
Oliveira Firmino – Sétima Câmara Cível. Belo Horizonte, 08 fev. 2013.
222
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 18.138/DF. Relator: Min. Humberto
Martins - Primeira Seção. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 04 abr. 2014. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=33852486
&num_registro=201200234136&data=20140404&tipo=5&formato=PDF. Acesso em: 28 fev. 2016.
108
223
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 237.696/MG. Relator: Min. José Delgado –
Primeira Turma. Diário de Justiça, Brasília, 22 mai. 2000. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/documento/mediado/?num_registro=199901016894&dt_publicaca
o=22-05-2000&cod_tipo_documento=1&formato=PDF>. Acesso em: 28 fev. 2016.
109
Mesmo na hipótese de terceiro interessado, que não uma das partes, vier a
apresentar algum elemento novo aos autos que sirvam ao convencimento do julgador,
para que se garanta o contraditório, é necessário dar vistas às partes com tempo
suficiente para suas análise, manifestações e confrontações224.
Vale a atenção lançada por Marcos Porta225 no sentido de ser incumbência de
todos os julgadores garantirem que o contraditório se exerça com adequação, sem
que um dos sujeitos da relação processual abuse do direito de produção de provas,
quando o conteúdo dessa se mostrar claramente desnecessário dentro da dialética
processual e a prova solicitada o for com evidente intuito protelatório.
224
Vale destacar trechos de importante decisão do STJ “[...] O recurso merece prosperar pela
inequívoca violação ao disposto no artigo 398 do Código de Processo Civil. Com efeito, na hipótese
em exame a Corte de origem não deu oportunidade aos impetrantes de se manifestarem acerca da
juntada de documentos que se mostraram essenciais para a formação da convicção daquele Tribunal,
que, com base neles, deu provimento à apelação da parte contrária. A respeito do tema, pontificam
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery que, "após o deferimento de juntada dos
documentos nos autos, o juiz deve determinar seja ouvida a parte contrária. Se isto não ocorrer e o
documento influir no julgamento do juiz, em sentido contrário ao do interesse da parte preterida, a
sentença que vier a ser proferida é nula e assim deve ser declarada". Na espécie, a juntada dos
documentos novos foi realizada pelo assistente da parte contrária, o que não afasta a aplicação do
artigo 398 do estatuto processual civil, uma vez que a atuação do assistente ocasionou evidente
prejuízo à defesa dos recorrentes. Dessarte, verificado na espécie o cerceamento de defesa, pela
ausência de oportunidade dada à parte para se pronunciar acerca dos documentos novos trazidos aos
autos, resta inafastável a nulidade do acórdão por ofensa ao princípio do contraditório. Recurso
especial provido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 264660/SP. Relator: Min.
Franciulli Netto – Segunda Turma. Diário de Justiça, Brasília, 03 nov. 2003).
225
Ob. Cit. p. 128
226
PACELLI, Eugênio. Ob. cit., p. 43.
227
BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo - 0000050-07.2013.4.01.0000. Relator:
Hilton Queiroz - Quarta Turma. Brasília, 10 dez. 2013. Disponível em:
<http://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=500720134010000&pA
=&pN=500720134010000>. Acesso em: 01 dez. 2016.
110
[...] 7. Com base nos princípios do devido processo legal e da ampla defesa,
e, considerando, ainda, a previsão contida nos artigos 158 e seguintes do
Código de Processo Penal, o diálogo apresentado deveria ter sido
apresentado previamente em Juízo para que fosse remetido à perícia oficial,
com vistas à realização de laudo pericial, em busca da autenticidade,
continuidade e idoneidade do arquivo. 8. Se por um lado não se afigura ilícito
o momento da apresentação da gravação pela acusação, por outro,
considerando o ineditismo da prova, que fora colhida há 6 (seis) anos, mostra-
se claro o cerceamento de defesa, decorrente da ofensa do devido processo
legal, do contraditório e da plenitude de defesa, face à paridade das armas
entre acusação e defesa. Ressalte-se que as provas, ocultadas há anos, não
interessavam somente à acusação, mas também aos defensores, magistrado
e jurados. 9. Sobre a autossuficiência da cláusula do devido processo legal
para proteção às partes no processo judicial, afirma o constitucionalista
Manoel Jorge e Silva Neto, verbis: o postulado do due process of law seria
suficiente para, por si mesmo, assegurar garantias processuais que
outorgassem às partes um processo "justo", isto é, possibilidade de
contraditório, ampla produção de prova e revisão da decisão judicial. (Curso
de Direito Constitucional, 6ª ed., Rio: Lumen Juris, 2010, p. 727). 10. Ordem
concedida para determinar ao Juízo de origem que solicite à Procuradoria da
República de Belo Horizonte o envio do Gravador Panasonic RR-QR160, a
fim de que possa ser encaminhado à Polícia Federal, de modo que a perícia
oficial possa promover a devida análise técnica de autenticidade e
incolumidade do arquivo de áudio original, bem assim para que possa
promover a degravação da conversa, evitando-se o cerceamento da defesa
(BRASIL, 2013).
228
Da mesma forma compreendeu o STJ: “1. Segundo entendimento desta Corte, a prova idônea para
arrimar sentença condenatória deverá ser produzida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla
defesa, de modo que se mostra impossível invocar para a condenação, somente elementos colhidos
no inquérito, se estes não forem confirmados durante o curso da instrução criminal. 2. Não existindo,
nos autos, prova judicializada suficiente para a condenação, nos termos do que reza o artigo 386, inciso
VII, do Código de Processo Penal, impõe-se a absolvição do recorrente. 3. Recurso especial provido
para, reconhecendo a violação aos artigos 155 e 386, inciso VII, ambos do Código de Processo Penal,
absolver o recorrente. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1253537/SC. Relator:
Min. Maria Thereza De Assis Moura – Sexta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília,19 out.
2011).
111
229
NUNES, Dierle José Coelho et al. Ob. cit., p. 88.
230
O STJ já decidiu proximamente a esse sentido, conforme trechos da ementa transcrita: “[...] 2. Tido
por muitos como o único e verdadeiro princípio de Direito Processual contido na Constituição Federal
de 1988 - art. 5º, LIV -,o princípio do due process of law abrange, como subprincípios ou corolários, a
ampla defesa, contraditório, publicidade dos atos processuais, proibição da prova ilícita, entre outros.
Como se vê, o devido processo legal é a garantia maior do cidadão em face do arbítrio, dando-se a ele
o direito, antes de ser submetido à sanção estatal, de ser submetido a um processo judicial cercado de
garantias e precauções. É incompatível, pois, a democracia com a inexistência de um processo judicial
revestido de garantias individuais. Ademais desses princípios, para o caso, há que se observar,
particularmente, o princípio dispositivo, que decorre da regra geral da disponibilidade do direito material.
Assim, em razão do predomínio do interesse individual, tem de ser deixado ao indivíduo,
consequentemente, a decisão se ele quer ou não efetivar seus direito perante o Poder Judiciário, e em
que medida. Desdobramento do princípio dispositivo é à adstrição do magistrado às alegações das
partes e a medida de sua atuação - decidir conforme o pleiteado no processo, isto é, o juiz deve julgar
a causa com base nos fatos alegados e provados pelas partes, sendo-lhe vedado, portanto, a busca
de fatos não alegados e cuja prova não tenha sido postulada pelas partes. Com efeito, o princípio
dispositivo está consubstanciado, inicialmente, pela necessidade de provocação da jurisdição (CPC,
art. 2º) e pela limitação do juiz à chamada litiscontestatio. Dessa forma, nos termos do art. 128, CPC,
o juiz haverá de decidir a lide nos limites em que foi proposta. 3. E é a partir da concepção dos referidos
princípios e do disposto nos artigos 128 e 264 do Código de Processo Civil que a presente demanda
deve ser analisada, na medida em que, se ao magistrado é vedado conceder mais, menos ou além do
que foi efetivamente pedido, esse deve ser certo e, sempre, submetido ao contraditório, oportunizando,
ao réu, contraditar, com todas as suas armas, o que fora deduzido em juízo. Aliás, é o que se consagra
no princípio da cooperação, que "orienta o magistrado a tomar uma decisão de agente-colaborador do
processo, de participante ativo do contraditório e não mais de mero fiscal de regras" (Fredie DidierJr.
em Curso de Direito Processual Civil). É afirmação corrente e quase dogmática que no processo civil,
em seu rito ordinário, que feita a citação é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem
o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei. No
Processo Civil, pois, há mecanismos aptos a estabilizar a demanda, que privilegiam a segurança
jurídica e o encadeamento lógico-sistemático dos atos processuais. Um desses mecanismos é o
previsto no art. 264, caput, do CPC, que veda ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o
consentimento do réu, após a citação. Pode-se dizer, portanto, que se trata de efeito processual da
citação, cuja regra consagra o chamado princípio da estabilização da demanda e tem como finalidade
impedir que o demandado seja surpreendido, comprometendo, severamente, o pleno exercício do
direito de defesa e do contraditório. Recurso especial não provido” (BRASIL. Superior Tribunal de
Justiça. Recurso Especial 1307407/SC. Relator: Min. Mauro Campbell Marques – Segunda Turma.
Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 29 mai. 2012).
231
NUNES, Dierle José Coelho et al. Ob. cit., p. 93.
232
Igual posição possuem os principais modernos doutrinadores no direito comparado. Depois de citar
diversos juristas ingleses, norte americanos e europeus continentais, Galligan (2004, p.244) conclui:
“These elements combine to form a coherent whole, the distinctive mark of which is, according to Fuller,
112
Idêntica posição é a de Didier Jr.233, que adverte enfaticamente que “não pode
o órgão jurisdicional decidir com base em um argumento, uma questão jurídica ou
fática não postos pelas partes no processo” 234. Fredie Didier Jr. ressalta muitíssimo
a obrigatoriedade, para o alcance do contraditório, de efetivamente a parte ter “poder
de influência, de interferir com argumentos, ideias, alegando fatos” 235 , além,
obviamente, apresentando ou produzindo provas. Se isto não for substancialmente
conferido, o contraditório não terá sido efetivado236.
237
Sérgio Ferraz e Adilson Dallari ensinam que também no processo
administrativo “a decisão final deve fluir da dialética processual, o que significa que
todas as razões produzidas devem ser sopesadas, especialmente aquelas
apresentadas por quem esteja sendo acusado, direta ou indiretamente, de algo
sancionável”238.
the mode of participation of the parties. Each is able to present proofs and reasoned arguments in its
favour, and the decision must be founded on that basis. The adversarial nature of the procedure is its
hallmark” (GALLIGAN, D. J., Ob. cit., 244).
233
O referido autor faz referência a outros 14 doutrinadores, nacionais e estrangeiros, os quais
defendem que Decisão-surpresa é decisão nula, por violação ao princípio do contraditório.
234
Ob. cit., p. 84.
235
DIDIER JUNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 84.
236
Vejam recente decisão do STF acolhendo esse posicionamento:
EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. INTIMAÇÃO IRREGULAR, PROCEDIDA EM
NOME DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. DEFENSORA DATIVA CONSTITUÍDA NOS AUTOS.
NULIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O contraditório e a
ampla defesa são princípios cardeais da persecução penal, consectários lógicos do due process of law.
O devido processo legal é processo pautado no contraditório e na ampla defesa, no intuito de garantir
aos acusados em geral o direito não só de participar do feito, mas de fazê-lo de forma efetiva, com o
poder de influenciar na formação da convicção do magistrado. 2. Nulidade da intimação que se
reconhece, pois direcionada à Defensoria Pública da União, quando patrocinado o ora paciente por
defensor dativo (art. 370, § 4º, do Código de Processo Penal). Necessidade de realização de novo
julgamento, com a intimação da defensora nomeada da data da sessão a ser designada. 3. Habeas
corpus concedido (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 116985. Relator: Min. Rosa
Weber - Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 10 abr. 2014).
237
FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001,
p. 72.
238
Qualquer importante fato novo acrescido aos autos de um processo, mesmo que seja administrativo,
deve ser objeto de vista, análise e contradita por parte dos interessados. Cumpre transcrever esta
importante decisão do STJ:
“A Constituição Federal brasileira explicita no art. 5º, LV, ao dispor que aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral não assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes. 2. A oitiva de nova testemunha no autos do procedimento
administrativo impõe a abertura de prazo para a defesa manifestar-se, na forma escrita, sob pena de
violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 3. Em observância ao princípio do
contraditório e ampla defesa, deve ser oportunizada aos processados a apresentação de defesa com
relação a todos os fatos descritos no relatório final da Comissão Permanente de Disciplina. 5.
Apelações e Remessa Necessária não providas. Unânime. [1] (STJ - MS 9.677/DF, Rel. Ministra
MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), TERCEIRA SEÇÃO, julgado
em 13/08/2014, DJe 22/08/2014).
113
O direito a ser ouvido por juiz imparcial está contido nos já mencionados
tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário – Pacto Internacional de Direitos
Políticos e Civil da ONU e o Pacto de São José da Costa Rica:
o -
Artigo 8 Toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as devidas
garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal
competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por
lei (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 1969).
239
GRECO, Leonardo. Garantias fundamentais do processo: o processo justo. Revista Novos
estudos jurídicos, ano VII, n. 14, p. 9-68, abril, 2002.
240
Ob. cit., p. 18.
241
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Processo – 10155120018215001. Relator: Márcia Milanez –
Sexta Câmara Criminal. Belo Horizonte, 26 jun. 2013. Disponível em:
<http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_resultado2.jsp?listaProcessos=10155120018215001>.
Acesso em: 30 mar. 2016.
114
242
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 7152/DF. Relator: Min. Jorge
Scartezzini - Terceira Seção. Diário de Justiça, Brasília, 06 out. 2003. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=877696&
num_registro=200000913464&data=20031006&tipo=5&formato=PDF. Acesso em: 28 fev. 2016.
115
Além de dar o provimento final, a ele incumbe garantir que o contraditório seja efetivo,
respeitado e atendido em todos os atos processuais243.
As dimensões de garantia do contraditório tanto à acusação quanto à defesa é
bem lembrado por Eugenio Pacelli244 e Julio Mirabete245. O primeiro, dedicando-se
bastante à compreensão do contraditório na perspectiva da teoria geral do processo,
afirma que os ditames e princípios constitucionais são referenciais tanto para a
atividade legislativa, quanto para o exercício do poder jurisdicional, abrangendo todos
os sujeitos processuais:
243
APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RENOVATÓRIA DE CONTRATO DE LOCAÇÃO
COMERCIAL. AGRAVO RETIDO. PROVA PERICIAL. APRESENTAÇÃO DE PARECER DE
ASSISTENTE TÉCNICO. INTIMAÇÃO DE APENAS UMA DAS PARTES. VIOLAÇÃO AOS
PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DA IGUALDADE PROCESSUAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO. SENTENÇA CASSADA. 1. Da redação do artigo
433, parágrafo único, do Código de Processo Civil, verifica-se ser fundamental a intimação das partes
do depósito do laudo pericial em cartório ou secretaria, a partir do que deflui o prazo de 10 (dez) dias
para entrega dos pareceres de seus assistentes técnicos. Ausente a intimação de alguma das partes,
mostra-se ineficaz a r. sentença, salvo se ausente prejuízo. 2. A ausência de intimação de uma das
partes para rebater as conclusões apresentadas em laudo pericial, na exata dimensão do disposto no
artigo 433, parágrafo único, do Código de Processo Civil, configura cerceamento de defesa, em afronta
aos princípios do contraditório, da ampla defesa e da igualdade processual, especialmente se
demonstrado o acolhimento integral da perícia no r. decisum impugnado. 3. Apelo conhecido. Agravo
retido conhecido e provido. Sentença cassada. Prejudicado o mérito do apelo. (BRASÍLIA. Tribunal de
Justiça. Processo - 20120310185298. Relator: Simone Lucindo – Primeira Turma Cível. Brasília, 11
nov. 2015).
244
PACELLI, Eugênio. Ob. cit.
245
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2001.
116
246
Para ilustrar, vale citar o seguinte julgado:
[...] “Em observância aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, acarreta
nulidade absoluta a não abertura de vista à defesa para oferecimento de contra-razões recursais.
Ordem concedida para anular o julgamento proferido pelo e. Tribunal a quo, a fim de que se proceda à
devida intimação da defesa para o oferecimento das contra-razões recursais” (BRASIL. Superior
Tribunal de Justiça. Habeas Corpus 21.847/SP. Relator: Min. Felix Fischer – Quinta Turma. Diário de
Justiça, Brasília, 07 abr. 2003).
247
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 22693/DF. Relator: Min. Gilmar
Mendes - Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 13 dez. 2010. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=617722>. Acesso em: 28 fev.
2016.
117
248
Nesse sentido:
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AUTOS DE INFRAÇÃO. VISTA DOS PROCESSOS
RESPECTIVOS OBSTACULIZADA. CERCEIO DO DIREITO DE DEFESA.
1. Obstaculizado o acesso aos processos administrativos pertinentes a autos de infração lavrados
contra as impetrantes, caracteriza-se cerceamento ao exercício do direito de defesa, assim lesão a
direito líquido e certo a ser reparada na via mandamental. 2. Remessa oficial não provida” (BRASIL.
Tribunal Regional Federal (1ª Região). Processo -003373-91.2012.4.01.3803. Relator: Carlos Moreira
Alves – Sexta Turma. Brasília, 10 mar. 2014.
249
LEAL, Rosemiro Pereira. Ob. cit., p. 104.
250
Ob. cit., p. 105.
251
Novamente com todo o acerto, Romeu Felipe Bacellar Filho (Ob. Cit., p. 317) discorda dos
fundamentos que levaram a Suprema Corte a adotar tal súmula. Igualmente assim compreendem
Marcos Porta (Ob. Cit., p. 130) e Dinorá Grotti (Ob. Cit., p. 118), pelo primeiro citada nos seguintes
termos: [...] “várias justificativas surgem, de regra, quanto à defesa técnica: equilíbrio entre os sujeitos
ou paridade de armas, vinculado à plenitude do contraditório[...]” (2003, p. 130).
252
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 10.837/DF. Relator: Min. Laurita Vaz
– Terceira Seção. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 13 nov. 2006. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=249875
9&num_registro=200501201586&data=20061113&tipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 26 fev. 2016.
118
Vale destacar que a ampla defesa estabelece uma forma organizatória entre
as relações das partes com o juiz, assegurando uma amplitude de argumentação, ou
seja, uma possibilidade de alegar e demonstrar (provar) toda a matéria articulada253.
A presunção de inocência é outra garantia necessária à ampla defesa,
conforme previsto em nossa CRFB/88 e na Declaração Universal dos Direitos do
Homem da ONU, de 1948254, assim como já visto no Pacto de São José da Costa
Rica e no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.
Na perspectiva do julgador, a ampla defesa traz grandes responsabilidades. Se
a parte argui determinado fato, prova ou elemento jurídico para afastar a sua
condenação ou sustentar a sua tese petitória, é dever do magistrado considerá-la na
sentença, enfrentando-a de forma lógico-jurídica, seja para confirmar ou infirmar a
tese posta. Neste sentido também vem se consolidando na jurisprudência255 pátria.
253
Nesse sentido, NUNES, Dierle José Coelho. Ob. cit., p. 95.
254
“Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente, até que a sua
culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido
asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.
255
Para tanto, vale destacar as seguintes decisões:
“APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO QUALIFICADO - PROCESSO PENAL - OMISSÃO DO JULGADOR
QUANTO À TESE DEFENSIVA APRESENTADA EM ALEGAÇÕES FINAIS - NULIDADE ABSOLUTA
- CERCEAMENTO DE DEFESA.
01. A não-apreciação pelo Juiz, na sentença, de tese oferecida pela defesa em alegações finais
constitui causa de nulidade absoluta. 02. A motivação das decisões judiciais é preceito constitucional,
119
além do que, analisar, ainda que seja para refutar as teses defensivas, caracteriza corolário natural do
princípio da ampla defesa” (MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Processo - 10024122755473001.
Relator: Rubens Gabriel Soares - Sexta Câmara Criminal. Belo Horizonte, 02 dez. 2013) e, também,
“PENAL - PROCESSO PENAL - TRÁFICO DE DROGA E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO -
NULIDADE DA SENTENÇA - PRELIMINAR DE OFÍCIO - NECESSIDADE - AUSÊNCIA DE ANÁLISE
DE TESE DEFENSIVA - VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO.
1 É nula a sentença que não examina todas as teses da defesa sustentadas nas alegações finais. 2. A
omissão importa em cerceamento de defesa e ofensa ao princípio do devido processo legal. 3.
Preliminar ex officio. V.V. Não se anula sentença, por ausência de análise de tese defensiva, quando
devidamente fundamentada (MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Processo - 0009307-
08.2014.8.13.0015. Relator: Pedro Vergara - Quinta Câmara Criminal. Belo Horizonte, 20 jul. 201515).
256
MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008.
257
Ob. cit., 310.
120
Veja que não é diferente o conteúdo da ampla defesa para o processo penal
ou o administrativo, pois impõe a “realização efetiva dessa participação, sob pena de
nulidade, se e quando prejudicial ao acusado” 258. Realizando-se por meio da “defesa
técnica, da autodefesa da defesa efetiva e por qualquer meio de prova hábil a
demonstrar a inocência do acusado” 259.
Na essência integra o devido processo legal, compreendido pelo respeito aos
princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa como cláusulas de
garantia do cidadão frente ao Estado, buscando-se um “processo justo e equitativo,
único caminho para a imposição da sanção de natureza penal”260 .
Já Fredie Didier Jr. conclui que devido ao “desenvolvimento da dimensão
substancial/material do contraditório, “pode-se dizer que eles se fundiram, formando
uma amálgama de um único direito fundamental. A ampla defesa corresponde ao
aspeto substancial do princípio do contraditório”261.
Frente ao todo exposto, acredita-se possível concluir quais são os requisitos
mínimos de todo e qualquer processo no Brasil em que haja litigante e acusados em
geral.
258
PACELLI, Eugênio. Ob. cit., p. 45.
259
Ob. cit., p. 47.
260
Ob. cit., p. 44.
261
DIDIER JUNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 89.
121
262
Antônio Scarance Fernandes elenca as discussões doutrinárias quanto ao que seria efetivamente
um processo, apresentando as diferentes visões de Fazzalari, Dinamarco, Araújo Cintra, Grinover,
Watanabe: se procedimento realizado em contraditório, ou se procedimento animado pela relação
jurídico processual (FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 3. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 36-37).
263
Não há nada mais correto e claro do que o pensamento de Celso Antônio Bandeira de Mello sobre
o tema, brilhantemente exposto em seu Curso de Direito Administrativo (2015, p. 60 a 63):
“É que na verdade o interesse público […] nada mais é do que a dimensão pública dos interesses
individuais, ou seja, dos interesses de cada indivíduo enquanto partícipe da Sociedade […]. Pois bem,
é este ultimo interesse o que nomeamos de interesse público. Não é portanto de forma alguma um
interesse constituído autonomamente, dissociado do interesse das partes e, pois, passível de ser
tomado como categoria jurídica que possa ser erigida irrelatamente aos interesses individuais, pois,
em fim de contas, ele nada mais é que uma faceta dos interesses dos indivíduos: aquela que se
manifesta enquanto estes – inevitavelmente membros de um corpo social – comparecem em tal
qualidade”. “Donde, o interesse público deve ser conceituado como o interesse resultante do conjunto
dos interesses dos indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros
da Sociedade e pelo simples fato de o serem”. (ob. Cit. p. 61 e 62)
264
Marçal Justen Filho igualmente assim ensina em seu curso, em que se “reconhece a supremacia
dos direitos fundamentais e a consagração dos procedimentos democráticos de formação e
manifestação da vontade estatal (ob. Cit. p. 159 e 160).
122
i) No início de biênio o Plenário do TCU sorteia qual Ministro será a partir dali
responsável por qual área governamental;
ii) O mesmo Ministro sorteado será, durante no mínimo dois anos, responsável por
iniciar as fiscalizações, as auditorias, as instaurações dos processos de
Tomada de Contas Especial, e suas respectivas instruções e elaboração de
voto para os julgamentos;
iii) Para que o Ministro responsável exerça bem seu papel durante todas estas
etapas, ele poderá contar com apoio de secretarias de controle externo;
iv) Apenas na hipótese de haver interposição do recurso de reexame ou de
reconsideração, depois do crivo de admissibilidade, pelo mesmo Ministro, é que
poderá ser sorteado outro Relator.
Sendo assim, por meio da Lei Orgânica mencionada, verifica-se que a sua
estrutura organizacional e o processo de formação de suas decisões condenatórias e
fiscalizatórias são correspondentes a um processo verticalizado, que concentra
suas decisões no plano orgânico-estatal, e que não consegue valorizar argumentos e
fatos apresentados pelos envolvidos.
Confrontando as conclusões dos Capítulos 2, 3 e 4, podem-se identificar
importantes não conformidades com a CRFB/88, em especial com os princípios do
devido processo legal e do contraditório.
265
E a imprensa logo em seguida publicou (para os casos de repercussão Municipal, Estadual ou
Nacional).
266
Ver o Capítulo 4, em que se demonstra as limitações humanas para conseguir escolher
racionalmente, salvo haver o democrático diálogo processual, em absoluta paridade de argumentos e
gestão de provas, com terceiro não envolvido emocionalmente.
128
267
O Art. 162 do Regimento Interno do TCU é expresso neste sentido, segundo o qual “As provas que
a parte quiser produzir perante o Tribunal devem sempre ser apresentadas de forma documental,
mesmo as declarações pessoais de terceiros”, seguido pelos parágrafos § 1º e 2º, respectivamente
“São inadmissíveis no processo provas obtidas por meios ilícitos” “O relator, em decisão fundamentada,
negará a juntada de provas ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias”.
129
268
Como demonstrado nos Capítulo 2 e 4 do presente trabalho, há inúmeras ações e decisões judiciais
discutindo a ausência de garantia ao contraditório e à ampla defesa aos condenados pelos Tribunais
de Contas.
130
1) o que acusa;
2) o que se defende; e
3) o que garante o contraditório simétrico entre eles e ao final decide com quem
está a razão e o direito.
133
É tão evidente isto que não precisa de maiores esforços hermenêuticos para
reconhecer que tal parâmetro serve para todos os processos em que o resultado pode
interferir no direito de alguma pessoa, basta realizar um cotejo entre os incisos LIV e
LV, do art. 5º:
269
Salvo, obviamente, haver violação exatamente aos princípios do devido processo legal, ampla
defesa e contraditório, como demonstrado no Capítulo 2 deste trabalho.
134
270
O número de quatro é determinado pela Lei n. 12.776/2012.
271
O número de servidores é também decorrente da Lei n. 10.356/2001 e da Lei n.11950/2009 que,
em seu art. 2º, parágrafo único, previu em 2001 o seguinte quantitativo de cargos efetivos da carreira
de especialista do Tribunal de Contas da União, Analista de Controle Externo (1.096); Técnico de
Controle Externo (994); Auxiliar de Controle Externo (30), totalizando 2.120 cargos.
272
Na realidade, o Regimento Interno prevê a possibilidade de um interessado participar do processo,
quase como um assistente, conforme previsão do seu art.146.
135
A fim de mais bem delinear tanto a organização como o processo apto a serem
adotados no TCU (assim como em todos os demais Tribunais de Contas), os capítulos
abaixo serão o exercício do mais bem acabado trâmite processual e manejo dos atuais
agentes públicos ligados à função de controle externo. Espera-se com isto
efetivamente contribuir para a melhora de tão relevante função do Estado brasileiro.
273
Na forma do art. 230, do Regimento Interno, “O Tribunal, no exercício de suas atribuições, poderá
realizar, por iniciativa própria, fiscalizações nos órgãos e entidades sob sua jurisdição, com vistas a
verificar a legalidade, a economicidade, a legitimidade, a eficiência, a eficácia e a efetividade de atos,
contratos e fatos administrativos”.
274
Segundo o art. 237, do Regimento Interno, têm legitimidade para representar ao Tribunal de Contas
da União o Ministério Público da União; os órgãos de controle interno; os senadores da República,
deputados federais, estaduais e distritais, juízes, servidores públicos e outras autoridades que
136
279
Atualmente, o plano de fiscalização é estabelecido pelo Presidente do TCU, a partir de dados
recebidos dos Ministros Relatores, conforme art. 244 do Regimento Interno, segundo o qual, “as
auditorias, acompanhamentos e monitoramentos obedecerão a plano de fiscalização elaborado pela
Presidência, em consulta com os relatores das listas de unidades jurisdicionadas, e aprovado pelo
Plenário em sessão de caráter reservado”. Em complemento dispõe o §1º e § 2º, respectivamente, que
“a periodicidade do plano de fiscalização, bem como os critérios e procedimentos para sua elaboração,
serão estabelecidos em ato próprio do Tribunal”; “os levantamentos e inspeções serão realizados por
determinação do Plenário, da câmara, do relator [...]”.
280
A CRFB/88 os denomina de Auditor, entregando as mesmas atribuições de judicatura dos juízes
dos Tribunais Regionais Federais, nos termos do art. 73 § 4º. Contudo são normalmente chamados de
Ministro substituto.
281
Atualmente, denomina-se este tipo de fiscalização como “auditorias de conformidade” que, segundo
o próprio TCU explica, “objetivam verificar se os atos administrativos estão sendo praticados pelo órgão
ou entidade com a observância da legislação e da jurisprudência que regulamentam a matéria. O
Tribunal, nesses casos, analisa os aspectos contábeis, financeiros, orçamentários e patrimoniais do
respectivo ato de gestão e, se identificada desconformidade, faz determinações corretivas, fixando
prazo para o seu cumprimento” (BRASIL. Tribunal de Contas da União. Relatório Anual de
Atividades: 2015. Secretaria-Geral da Presidência: Brasília, 2016, p. 24). Tal competência do TCU
está prevista no art. 71, inciso IX, da CRFB/88.
138
6.2.2 MPC e as Tomadas de Contas ordinárias dos responsáveis por valores públicos
282
O art. 71, inciso VIII, da CRFB/88 prevê a competência do TCU para “aplicar aos responsáveis, em
caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que
estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário”.
139
283
Seria inclusive ideal que as carreiras fossem distintas, desde a entrada por concurso como pela
progressão. Obviamente, deveria haver uma transição, podendo dar aos atuais analistas (auditores
federais) de controle externo a opção por qual quadro se deslocassem, os lotados com atribuições
próprias de fiscalização juntos ao MPC, ou os lotados como assessores especialistas dos Auditores.
140
Nesta ação seria incumbência do MPC instruir com todos os documentos que
corroboram sua pretensão, bem como fazer as solicitações de provas compreendidas
como necessárias, incluindo o depoimento pessoal dos responsáveis, de testemunhas
e produção de provas periciais. A ação em questão deverá ser proposta perante o
TCU, cuja competência de julgamento seria dos seus Ministros.
284
Boa parte das matérias tratadas no Tribunal de Contas da União são altamente técnicas, como da
ciência da engenharia, economia, contabilidade, matemática financeira etc.
143
contidos no processo, sem poder utilizar-se de fundamento não discutido entre e com
as partes, conforme visto no Capítulo 4 deste trabalho.
Se houvesse identificação de qualquer elemento não trazido pelas partes que
sirva para determinar sua convicção, deveria ser dado às partes o direito de sobre
elas se pronunciarem, em dado prazo igual para ambas.
Dessa decisão terminativa poderia a parte interessada recorrer à Câmara, cuja
composição seria de três Ministros, conforme sugestão abaixo.
285
Além disto, o TCU vem exercendo um importante papel de normalizar a atuação da Administração
Pública, visando auxiliá-la na busca da profissionalização e eficiência, conforme seus relatórios anuais
indicam:
“Nesse aspecto, o Tribunal assume papel fundamental, na medida em que atua na prevenção,
detecção, correção e punição da fraude e do desvio na aplicação de recursos federais, bem como
contribui para a transparência e melhoria da gestão e do desempenho da Administração Pública”
(BRASIL. Tribunal de Contas da União. Relatório Anual de Atividades: 2015. Secretaria-Geral da
Presidência: Brasília, 2016. Disponível em: <
http://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A8182A153D422DA0153E2950D8064
E1>. Acesso em: 01 dez. 2016).
146
286
Nesse sentido, dispõe o art. 290 do Regimento Interno:
“O Tribunal, até o último dia útil de cada exercício, fixará e publicará os coeficientes individuais de
participação dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, no Fundo de Participação dos Estados
e do Distrito Federal (FPE), e no Fundo de Participação dos Municípios (FPM), para vigorarem no
exercício subsequente”. E, em complemento, o seu parágrafo único fixa que “os coeficientes individuais
de participação serão calculados na forma e critérios fixados em lei e com base em dados constantes
da relação que deverá ser encaminhada ao Tribunal até 31 de outubro de cada ano pela Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE”.
147
A análise sobre as contas apresentadas não pode ficar sobre aquele que o
julgará logo à frente, como visto. Assim, deve ser competência de quem poderá acusá-
lo: o Ministério Público.
Se o MPC compreender cabível, apresenta suas razões em cognição sumária
ao TCU, via Auditor Relator (Ministro Substituto), que intimará o responsável para
esclarecimentos. Ao fim decidirá se é caso de estender a fase probatória para uma
Ação de Tomada de Contas Especial ou se os esclarecimentos foram suficientes para
reconhecer como prestadas as contas.
A partir do momento em que o MPC acusar o cidadão pela não prestação total
ou parcial das contas, ao acusado será garantido todos os direitos para a ampla
defesa e para o contraditório, conforme visto acima.
287
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Relatório Anual de Atividades: 2015. Secretaria-Geral da
Presidência: Brasília, 2016.
148
Não apenas aquele que usa, arrecada, guarda, gerencia e recebe recursos
públicos está submetido à jurisdição do Tribunal de Contas, conforme maciça
jurisprudência demonstrada no Capítulo 2 deste trabalho. Aqueles em conluio com os
primeiros podem ser responsabilizados e sancionados pelas Cortes de Contas.
Para estes, mais forte ainda deve ser a garantia ao devido processo legal,
contraditório e ampla defesa quando acusados pelo MPC.
Portanto, todas os requisitos mínimos acima indicados devem lhe ser
garantidos, como presunção de inocência, direito à ampla argumentação, à produção
da prova testemunhal, documental e pericial.
Se o MPC não conseguir provar que este acusado teria agido efetivamente em
conluio com o responsável por bens e valores públicos, não pode haver condenação.
A culpabilidade do responsável público é diferente da do particular que se
relaciona com a Administração Pública, pois aquele não pode agir com negligência e
149
imperícia graves, causando dano ao erário, já este somente responderia caso sua
conduta fosse dirigida intencional e ilegalmente à violação do interesse público288.
288
Esta diferenciação entre as condutas do responsável público e o particular de boa-fé quem com o
Estado, por exemplo, contrata, foi mais detalhadamente tratada em artigo do autor publicado na Revista
de Direito Administrativo (SALLES, Alexandre Aroeira. Ação de improbidade, controle externo e
economicidade: as diferentes consequências jurídicas entre a atuação administrativa ilegal e a
antieconômica (ou irregular). Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 271, p. 223-250,
abr. 2016).
289
PORTUGAL. Constituição da República Portuguesa (1976). Disponível em:
<http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx>. Acesso em:
09 dez. 2016.
290
PORTUGAL. Lei n. 98 de 26 de agosto de 1997. Lei de Organização e Processo do Tribunal de
Contas. Disponível em:
150
291
“Capo I - Attribuzioni in generale (giurisprudenza) 13. (art. 10 sostituito dall'art. 1, regio decreto 18
novembre 1923, n. 2441 e articoli 13 e 34, legge 14 agosto 1862, n. 800; art. 1, legge 11 luglio 1897, n.
256 modificato dall'art. 7, regio decreto-legge 18 giugno 1931, n. 788, art. 90, comma ottavo, regio
decreto 17 ottobre 1922, n. 1401; articoli 63, 81 e seguenti regio decreto 18 novembre 1923, n. 2440;
articoli 11, 18 e 19 legge 3 aprile 1933, n. 255.) - La Corte in conformità delle leggi e dei regolamenti:
fa il riscontro dei decreti reali; fa il riscontro delle spese dello Stato; vigila la riscossione delle pubbliche
entrate; fa il riscontro sui magazzini e depositi di materie e di merci di proprietà dello Stato, e sulle altre
gestioni patrimoniali indicate dalle leggi; fa il riscontro delle cauzioni degli agenti dello Stato che sono
obbligati a prestarle e vigila perché sia assicurata la regolarità della gestione degli agenti dello Stato, in
denaro e in materia; parifica il rendiconto generale consuntivo dell'amministrazione dello Stato e quelli
delle aziende a gestione autonoma soggette al suo riscontro, prima che siano presentati al Parlamento;
giudica i conti che debbono rendere tutti coloro che hanno maneggio di denaro o di valori dello Stato e
di altre pubbliche amministrazioni designate dalla legge; giudica sulle responsabilità per danni arrecati
all'erario da pubblici funzionari, retribuiti dallo Stato, nell'esercizio delle loro funzioni; giudica sui ricorsi
contro i provvedimenti amministrativi in materia di conti e di responsabilità, giusta le disposizioni delle
leggi speciali; giudica sugli appelli dalle decisioni dei Consigli di Prefettura sui conti dei Comuni, delle
Province, delle istituzioni di pubblica beneficenza; giudica sui ricorsi per rimborso di quote inesigibili di
imposte dirette, ai termini della legge di riscossione; giudica sui ricorsi in materia di pensione in tutto o
in parte a carico dello Stato o di altri enti designati dalla legge e sulle istanze tendenti a conseguire la
sentenza che tiene luogo del decreto di collocamento a riposo, ai termini dell'art. 174 del testo unico 21
febbraio 1895, n. 70 (25); giudica su tutti i reclami dei suoi impiegati (25/a); fa le sue proposte e dà
parere nella formazione degli atti e provvedimenti amministrativi indicati dalla legge” (ITALIA. Regio
Decreto 12 luglio 1934, n. 1214. Approvazione del testo unico delle leggi sulla Corte dei conti. Gazzetta
Ufficiale, Itália, 01 ago, 1934. Disponível em:
<http://presidenza.governo.it/USRI/magistrature/norme/RD_1214_1934_n.pdf, 1934>. Acesso em: 11
dez. 2016).
292
Nesse sentido, destaca-se Francesco Garri et al “È nozione di diritto comune che, per la tutela di
diritti che l'ordinamento ritiene di dover sottrarre alla disponibilità dei titolari, in relazione all'interesse di
natura pubblica, è prevista la figura del PM ed ove l'interesse pubblico abbia un massimo grado di
intensità è attribuito, nei termini che si vedranno, al PM un potere autonomo di agire; ove l'interesse
stesso sia meno intenso il PM à visto come intervento re necessario. Ed allora basterà richiamare i
principi affermati dalla giurisprudenza secondo cui il Procuratore generale è parte a difesa dell'
ordinamento nel quale si ricompongono gli interessi dell'erario globalmente inteso e le sue attribuzioni
sono rivolte alla tutela imparziale della buona gestione e non possono essere configurabili contrasti di
interesse tra azione del PM ed enti perché questi agisce nell'interesse obiettivo della legge, tant'è che,
trattandosi di materia non disponibile, egli non può rinunciare all'azione” (GARRI, Francesco et al. I
Giudizi Alla Corte Dei Conti: Reponsabilitá, Conti, Persioni. 4. ed. Milano: Giuffrè, 2007, p. 370).
152
293
“E va tenuto presente (alla Corte dei Conti) che il principio del contradittorio (art. 101 c.p.c) si correla
sul piano costituzionale sia con la regola dell’eguaglianza (art. 3 Cost.) che con quella relative al diritto
di difesa ‘inviolabile in ogni strato e grado del giudizio’ (art. 24 Cost) e involge gli aspetti tecnici della
difesa e garantisce a ciascuno dei destinatari del provvedimento del giudice di poter influire sul
contenuto del medesimo (Ob. cit., p. 368). Para os italianos, assim como para os portugueses, é claro
e evidente que não há meios de o contraditório ser alcançado se o acusador for ao mesmo tempo o
julgador.
294
“La pacifica applicazione dell’art. 100 c.p.c. nei giudizi innanzi ala Corte dei Conti porta a richiedere
quella condizione dell’azione che è l’interesse ad agire, inteso come bisogno di tutela giurisdizionale
che emerge dall'affermazione contenuta nella domanda dei fatti costitutivi e dei fatti lesivi del diritto [...]
Anche la legittimazione, come titolarità attiva o passiva dell’azione, è necessaria, in quanto si possono
far valere innanzi ala Corte soltanto quei diritti che si affermano come propri e la cui titolarità passiva si
afferma in capo a colui contro il quale si propone la domanda” (Ob. cit., p. 367).
295
Ob. cit., p. 262.
296
Ob. cit., 508.
297
“La notifica dell’atto di citazione determina gli effetti processuali comuni della litispendenza con le
conseguenze in tema di perpetuatio iurisdictionis e quella sostanziale della interruzione della
prescrizione” (Ob. cit., p. 517).
153
298
Ob. cit., 536.
299
Importante observar que o texto legal aplicável para a Corte dei Conti italiana é de 1934, claramente
insuficiente para atender ao significativo avanço doutrinário e jurisprudencial quanto à teoria do
processo que a Itália recebeu ao longo das décadas posteriores. Ao invés de eles manterem a aplicação
capenga de lei imprópria para seus valores e princípios, a Jurisprudência e a própria Corte dei Conti
foram ajustando seus procedimentos, resguardando os direitos ao contraditório e à ampla defesa dos
acusados em geral. Adotam para tanto as regras e princípios inscritos no seu código de processo civil,
fazendo inúmeras remissões às suas normas. É isso que se devia esperar de nossas Cortes de Contas.
300
Ob. cit., p. 573.
301
Como bem da cultura francesa, o referido Código é minucioso, e prevê as regras a serem cumpridas
perante o processo e organização da Corte de Contas francês (FRANÇA. Code des juridictions
financières. Disponível em: <
https://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do?cidTexte=LEGITEXT000006070249>. Acesso em: 11
jan. 2016).
154
302
“II.31 Le ministère public, exercé par le Procureur général près la Cour des comptes ou le procureur
financier près la chambre régionale ou territoriale des comptes, est le seul habilité à engager les
poursuites à l’encontre des comptables publics”.
303
“II.33. Le réquisitoire détermine le périmètre de l’instruction en indiquant la période concernée,
l’identité des comptables mis en cause et les faits présomptifs d’irrégularités”.
304
“II.36. Le magistrat rapporteur mène l’instruction en toute indépendance, impartialité et neutralité et
instruit à charge et à décharge, dans le respect des procédures fixées par le code des juridictions
financières.”
305
“II.44. Le magistrat rapporteur expose, pour chaque présomption de charge du réquisitoire, les
propositions argumentées de charge ou de décharge dans un rapport à fin d’arrêt ou de jugement
destiné à la formation délibérante. […]
II.46. Le rapport est rédigé de manière à permettre à la formation délibérante de décider, dans les
meilleures conditions possible, des suites juridictionnelles à donner aux présomptions de charges du
réquisitoire".
306
“II.56. L’audience publique comprend :- la présentation par le magistrat rapporteur de son rapport à
fin d’arrêt ou de jugement; - la présentation des conclusions écrites du ministère public, qui peuvent
être complétées oralement en tant que de besoin ; - les observations des parties à l’instance et de leurs
représentants.
II.57. Le président de la formation délibérante peut, de sa propre initiative ou à la demande d’une partie,
suspendre l’audience publique lorsqu’une nouvelle pièce est produite, un fait nouveau révélé ou un
argument inédit soulevé, si leur importance le justifie".
307
“II.58. Le délibéré a pour objet d’arrêter les décisions juridictionnelles de la Cour ou de la chambre
régionale ou territoriale des comptes.
II.59. Le président de séance organise le délibéré à l’issue de l’audience publique ou le renvoie à une
date ultérieure.
155
II.60. La formation délibère à huis clos, en présence du greffier et sans la présence du magistrat
rapporteur et du représentant du ministère public.
II.61. Si un réviseur a été désigné, après le dépôt du rapport, parmi les membres de la formation
délibérante, il est chargé de la rédaction de l’arrêt ou du jugement. Prise de décisions
II.62. Les décisions sont prises selon les modalités fixées par le code des juridictions financières. En
cas de vote, elles le sont à la majorité des présents qui détiennent chacun une voix. Conformément au
principe d’invariabilité de la formation délibérante, seuls prennent part à la décision les membres ayant
assisté à l’intégralité de l’audience publique et du délibéré.
II.63. Le président note les décisions prises sur chacune des propositions. Les mentions, enregistrées
par le greffe, sont rédigées de manière à permettre le respect des décisions prises lors de la rédaction
de l’arrêt ou du jugement. Elles ne peuvent être modifiées que lors d’un nouveau délibéré.”
308
Conforme dispõe com clareza a Ley Orgánica 2/1982, del Tribunal de Cuentas (ESPANHA. Ley
Orgánica 2/1928 de 21 de maio de 1982. Disponível em: < http://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-
A-1982-11584> . Acesso em: 17 de nov. de 2016).
309
“Artículo doce. Uno. El resultado de la fiscalización se expondrá por medio de informes o memorias
ordinarias o extraordinarias y de mociones o notas que se elevarán a las Cortes Generales y se
publicarán en el «Boletín Oficial del Estado». Cuando la actividad fiscalizadora se refiera a las
Comunidades Autónomas o a Entidades que de ellas dependan, el Informe se remitirá, asimismo, a la
Asamblea Legislativa de la respectiva Comunidad y se publicará también en su «Boletín Oficial». Dos.
El Tribunal de Cuentas hará constar cuantas infracciones, abusos o prácticas irregulares haya
observado, con indicación de la responsabilidad en que, a su juicio, se hubiere incurrido y de las
medidas para exigirla.
156
310
“Art. 15. Um. A acusação de contabilidade, como a jurisdição adequada do Tribunal de Contas, é
exercida sobre as contas para ser quem Aumento de pagamento, intervir, controlar, guardá-los, bens
manipulados ou usados, fundos ou efeitos públicas. Dois. A jurisdição de contabilidade se estende ao
âmbito de fundos públicos ou efeitos, bem como obrigações acessórias estabelecidas na gestão de
garantia. Artigo dezesseis anos. Não corresponde à contabilização jurisdição acusação de: a) As
questões atribuídas à competência do Tribunal Constitucional. b) As matérias sujeitas à jurisdição
administrativa. c) Os actos que constituam um crime ou contravenção. d) As questões cíveis,
trabalhistas ou outro confiada ao conhecimento dos órgãos do Poder Judiciário.”
311
Artículo diecinueve. Son órganos del Tribunal de Cuentas: a) El Presidente. b) El Pleno. c) La
Comisión de Gobierno. d) La Sección de Fiscalización. e) La Sección de Enjuiciamiento. f) Los
Consejeros de Cuentas. g) La Fiscalía. h) La Secretaría General.
312
Art. 57 da Ley 7/1988, 5 de abril. “1. Con arreglo a lo dispuesto en el artículo 47 de la Ley Orgánica
2/1982, la legitimación activa corresponderá, en todo caso, a la Administración o Entidad Pública
perjudicada, que podrá ejercer toda clase de pretensiones de responsabilidad contable ante el Tribunal
de Cuentas sin necesidad, en su caso, de declarar previamente lesivos los actos que impugne, y al
Ministerio Fiscal, que podrá ejercitar las pretensiones de aquella naturaleza que resulten procedentes.
Las restantes Entidades del sector público a que se refiere el artículo 4.º de la Ley Orgánica citada,
estarán legitimadas para el ejercicio de las pretensiones de responsabilidad contable que les competan,
con sujeción a las reglas por que cada una de ellas se rija. 2. Se considerarán legitimados pasivamente
los presuntos responsables directos o subsidiarios, sus causahabientes y cuantas personas se
consideren perjudicadas por el processo”.
313
Artigo 60 “1. La jurisdicción contable juzgará dentro del límite de las pretensiones formuladas por
las partes y de las alegaciones de las mismas. 2. No obstante, si el órgano de dicha jurisdicción, al
157
dictar resolución, estimare que la cuestión sometida a su conocimiento pudiera no haber sido apreciada
debidamente por las partes por existir en apariencia otros motivos susceptibles de fundamentar la
pretensión de responsabilidad contable o su oposición, lo someterá a aquéllas mediante providencia
en que, advirtiendo que no se prejuzga el fallo definitivo, los expondrá y concederá a los interesados
un plazo común no superior a diez días para que formulen las alegaciones que estimen oportunas, con
suspensión, en su caso, del plazo para pronunciar la mencionada resolución”.
314
Cumpre remeter o leitor tanto à referida Ley como ao livro de Francisco Ruiz Risueño (RISUEÑO,
Francisco Ruiz. El processo contencioso-adminstrativo. 9. ed.Madrid: Colex, 2012).
315
REINO UNIDO. Local Audit and Accountability Act 2014. Disponível em:
<http://www.legislation.gov.uk/ukpga/2014/2/pdfs/ukpga_20140002_en.pdf>. Acesso em: 09 dez.
2016.
158
Não se espera aqui adotar qualquer um dos modelos acima referidos, não é
isso que se procurou na tese. O Brasil possui um sistema jurídico-constitucional
próprio, muito bem estruturado, que dá soluções apropriadas para a falta de
contraditório e ampla defesa perante os processos acusatórios nos Tribunais de
Contas.
Não se precisa fundar em experiências estrangeiras para fazer o que é
necessário para atender a CRFB/88. O problema nacional não é o de aperfeiçoar
modelos de controle, mas resolver as graves inconstitucionalidades existentes, com
ajustes no processo de funcionamento do sistema de controle externo, pois, como
visto, a CRFB/88 o previu de uma forma e as leis o estruturaram de outra.
Inobstante, conforme se verificou nas Nações Democráticas acima indicadas
(e poder-se-ia citar inúmeras outras), o que se conclui nessa tese é coerente com o
159
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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