Habilidades Fonológicas em Crianças

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Adriana Príncipe dos Reis Albuquerque Ramos

Habilidades metafonológicas e conhecimento do nome das letras na alfabetização:


estudo longitudinal com crianças do primeiro ano do ensino fundamental

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

São Paulo

2017
Adriana Príncipe dos Reis Albuquerque Ramos

Habilidades metafonológicas e conhecimento do nome das letras na alfabetização:


estudo longitudinal com crianças do primeiro ano do ensino fundamental

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, –
PUC-SP, como exigência parcial para obtenção do
título de mestre em Educação: Psicologia da
Educação, sob orientação da Professora Dra. Maria
Regina Maluf

São Paulo

2017
Banca Examinadora

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_________________________________________
Dedico este trabalho aos meus pais por me
ensinarem o valor dos estudos, ao meu
esposo e à minha filha por todo carinho que
me sustentaram neste percurso.
Agradeço ao povo brasileiro que por meio do pagamento de impostos, possibilitou ao
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) o financiamento da
presente pesquisa.
Agradecimentos

À minha querida orientadora, professora Dra. Maria Regina Maluf por todos os
momentos de orientação e dedicação à esta pesquisa. Agradeço por seus valiosos
apontamentos e por sua sinceridade. Gosto de pessoas sinceras e a senhora com certeza é uma
dessas pessoas! Obrigada por acreditar em mim e por sempre me incentivar a prosseguir como
pesquisadora. Saber que a senhora acredita em mim significa muito! Sou grata por sua luta
constante em garantir uma alfabetização de qualidade à todas as crianças e por me permitir
fazer parte dela. Com certeza a senhora é uma pessoa admirável!

Ao professor Dr. Sérgio Vasconcelos de Luna, por aceitar participar da banca


examinadora desta pesquisa trazendo contribuições valiosas à mesma, por se importar com a
aprendizagem de cada um de seus alunos de modo peculiar, pelos seus feedbacks e
comprometimento com as aulas. O senhor é um excelente professor!

À professora Dra. Sylvia Domingos Barrera, por aceitar participar da banca


examinadora desta pesquisa compartilhando seu profundo conhecimento sobre o tema
abordado. Seus apontamentos foram essenciais para conclusão deste estudo. Obrigada!.

A meu marido Anderson Souza Ramos, por me apoiar em tudo desde o momento em
que te fiz a proposta de ingressar no mestrado. Por cuidar da nossa pequena quando eu estava
ausente, por me esperar após as aulas só para me ouvir, por seu ombro quando precisei, por
me fazer sorrir quando eu queria chorar, por sonhar este sonho comigo. Te amo!

À minha filha Ana Luísa Príncipe Albuquerque Ramos, por ser a menina mais
compreensiva do mundo, por seus abraços apertados e por seus sorrisos incansáveis que
sempre enchem meu coração de alegria. Te amo gatinha!

À minha família amada, Alexandre Reis Albuquerque, Eliane Ambrósio Albuquerque,


Eduardo Reis Albuquerque, Marcela Medeiros Albuquerque, Salvador Ferreira Ramos, Luzia
Ramos, Meire Adriane Ramos Scriptori, Eliane Souza Ramos da Saudade, Sulamita Souza
Ramos Crespo, Rute Souza Ramos da Silva, cunhados e sobrinhos, por todo amor, apoio,
incentivo e compreensão nas ausências. Agradeço em especial aos meus pais, Joaquineide
Príncipe dos Reis Albuquerque e José Otaviano de Albuquerque pelas orações constantes e
por sempre me mostrarem o valor dos estudos. Vocês são especiais!

À minha querida amiga Joice de Lima Arruda da Silva por todas as suas contribuições
na realização desta pesquisa. Amiga, você tem sido meu alicerce acadêmico desde a época do
vestibular! Acho que desde sempre posso contar com você na vida e nos estudos. Não tenho
palavras para agradecer a sua ajuda. Que Deus te retribua com porção dobrada de sabedoria e
contentamento! Te amo!

À minha amiga Eliane Pinheiro Fernandes por me incentivar a ingressar no mestrado


e por seu apoio em todo tempo. Obrigada!

A todos os amigos do grupo de pesquisa EIDEP, pela oportunidade de aprender com


vocês, em especial às amigas Karina Alves dos santos, Lilian Meibach Brandoles de Matos e
Noemi Tamar Américo de Souza por todas as conversas acompanhadas de milho verde tão
esclarecedoras e acolhedoras.

Aos amigos Renan Almeida Sargiani e Flávia Renata Alves da silva por todas as dicas
de artigos, instrumentos e análise de dados. Por ajudarem com as muitas dúvidas que
apresentei ao longo da pesquisa. Obrigada!

Aos alunos participantes da pesquisa, às professoras e à equipe gestora da unidade


escolar por permitirem e viabilizarem a realização deste projeto. Agradeço o acolhimento e
toda ajuda ofertada. Muito obrigada!

Ao amigo Robson Nascimento que se dispôs a ler minha pesquisa fazendo


apontamentos muito pertinentes e que me fizeram refletir bastante. Obrigada!

À Yara Castro, por suas contribuições na análise dos resultados.

A todos os professores do Programa de Pós-Graduação: Psicologia da Educação por


todos os momentos em que compartilharam os seus saberes comigo e pela excelência de suas
aulas. Aprendi muito com todos vocês nestes dois intensos anos!

Ao secretário Édson Aguiar de Melo, do Programa de Pós-Graduação em Educação:


Psicologia da Educação por sempre estar disposto a ajudar respondendo às minhas muitas
dúvidas sempre de modo gentil e atencioso.

À Deus por sonhar este sonho comigo, por ser meu refúgio e fortaleza na hora da
angústia. Que toda Glória seja dada a ti sempre!
A leitura e a escrita são armas não violentas de compreensão e intervenção política,
no sentido da defesa da equidade, do bem-estar geral e da oposição a todas as formas de
discriminação e exploração.
José Morais
Ramos, A. P. R. A. (2017). Habilidades metafonológicas e conhecimento do nome das letras
na alfabetização: estudo longitudinal com crianças do primeiro ano do ensino fundamental.
86 f. (Dissertação Mestrado) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

Resumo

Há evidências na literatura de que a aprendizagem da leitura e da escrita é facilitada pela


consciência fonológica e pelo conhecimento do nome das letras. Estudos atuais investigam
qual dos componentes da consciência fonológica melhor prediz as habilidades de leitura e
escrita. Esta pesquisa teve como objetivo analisar as relações entre a leitura e escrita de
palavras com as variáveis de consciência fonológica, (medida pelo conhecimento de rimas,
segmentação silábica e deleção fonêmica) e conhecimento do nome das letras em crianças que
ingressam no Ensino Fundamental. Para tal, foi realizado um estudo longitudinal breve
acompanhando os alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental durante o ano letivo. O
estudo foi composto por três sessões de coleta de dados, nas quais os escolares foram
avaliados por um conjunto de tarefas de consciência fonológica, conhecimento do alfabeto,
leitura e escrita de palavras. Os resultados mostraram correlação positiva e significativa entre
o conhecimento de letras, conhecimento de rimas e deleção fonêmica nos três momentos de
coletas com a leitura de palavras. A segmentação silábica obteve correlação positiva
significativa somente na segunda coleta. Todos os componentes da consciência fonológica,
assim como o conhecimento de letras demonstraram correlações positivas e significativas com
a escrita de palavras nos três momentos da pesquisa. Os resultados dos testes de Regressão
Linear Múltipla Stepwise (por etapas) permitiram identificar o conhecimento do nome das
letras e o conhecimento de rimas como preditores de leitura e escrita de palavras quando a
deleção fonêmica não obteve resultado mensurável. No entanto, quando as crianças iniciaram
a aprendizagem da leitura, os componentes deleção fonêmica e segmentação silábica
passaram a predizer a leitura de palavras com um alto grau de significância, sendo a deleção
fonêmica também preditora da escrita de palavras, acompanhada pelo conhecimento do nome
das letras.

Palavras- chave: Preditores de alfabetização; consciência fonológica; conhecimento do nome


das letras.
Ramos, A. P. R. A. (2017). Metaphonological skills and knowledge of the name of the letter in
literacy: a longitudinal study of first year elementary school children.86 f. (Masters
Dissertation). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

Abstract

There are evidences in the literature that the learning of reading and writing is facilitated by
phonological awareness and by the knowledge of the name of the letters. Current studies
investigate which components of phonological awareness best predict reading and writing
skills. The aim of this research was to analyze the relationship between the reading and
writing of words with the variables of phonological awareness (measured by the knowledge of
rhymes, syllabic segmentation and phonemic deletion) and knowledge of the name of the
letters in children entering Primary School. For this, a brief longitudinal study was carried out
accompanying the first year students of Elementary School during the school year. The study
was composed of three data collection sessions, in which the students were evaluated by a set
of tasks of phonological awareness, knowledge of the alphabet, reading and writing of
isolated words. The results showed a positive and significant correlation between letter
knowledge, rhyme knowledge and phonemic deletion in the three collection moments with
word reading. The syllabic segmentation obtained significant positive correlation only in the
second collection. All components of phonological awareness, as well as letter knowledge,
showed positive and significant correlations with word writing in three moments of the
research. The results of Multiple Regression tests (Stepwise) allowed the identification of
knowledge of letter name and the knowledge of rhymes as predictors of reading and writing
of words when the phonemic deletion did not obtain a measurable result. However, when the
children started learning to read, the components of phonemic deletion and syllabic
segmentation began to predict the reading of words with a high degree of significance, being
the phonemic deletion also a predictor of word writing, accompanied by the knowledge of the
names of the letters.

Keywords: Predictors of literacy; Phonological awareness; Knowledge of the name of the


letters.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Desenvolvimento Metalinguístico .......................................................................... 17


Figura 2 - Aprendizagem implícita e explícita da leitura ........................................................ 18
Figura 3 - Modelo de ativação interativa ................................................................................. 33
LISTA DE TABELAS

Tabela 1- Distribuição dos participantes por turma e sexo ...................................................... 42


Tabela 2 - Tarefas realizadas por coleta ................................................................................... 45
Tabela 3 - Descrição do desempenho dos escolares nos três momentos de coleta de dados ... 47
Tabela 4 – Correlação de Pearson ............................................................................................ 50
Tabela 5 – Correlação de Pearson ............................................................................................ 51
Tabela 6 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) LP 3ª coleta x Variáveis
independentes 1ª Coleta ............................................................................................................ 52
Tabela 7 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) LP 3ª coleta x Variáveis
independentes 2ª Coleta ............................................................................................................ 53
Tabela 8 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) EP 3ª coleta x Variáveis
independentes 1ª Coleta ............................................................................................................ 54
Tabela 9 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) EP 3ª coleta x Variáveis
independentes 2ª Coleta ............................................................................................................ 54
SUMÁRIO

Introdução ................................................................................................................................. 7
1 Psicologia Cognitiva e Linguagem Escrita ................................................................... 11
1.1 Psicologia Cognitiva .................................................................................................. 11
1.2 Psicologia Cognitiva e Preditores de Alfabetização .................................................. 12
2 Habilidades Metalinguísticas como Facilitadoras da Aprendizagem da Linguagem
Escrita ...................................................................................................................................... 16
2.1 Consciência Fonológica. ............................................................................................ 18
3 Aprender a ler no sistema alfabético de escrita ........................................................... 25
3.1 Conhecimento do som e do nome das letras. ............................................................. 27
3.2 Bases cerebrais e diferentes modelos explicativos para a leitura de palavras. .......... 30
3.3 Como se dá a leitura de palavras: teoria de fases de Linnea Ehri. ............................. 36
4 Objetivo e Hipóteses ....................................................................................................... 40
5 Método ............................................................................................................................. 41
5.1 Local e participantes .................................................................................................. 41
5.2 Instrumentos e Procedimentos ................................................................................... 42
5.2.1 Tarefa de conhecimento do nome das letras ....................................................... 42
5.2.2 Tarefas de Consciência Fonológica .................................................................... 43
5.2.3 Tarefa de Leitura de Palavras Isoladas ............................................................... 44
5.2.4 Tarefa de Escrita de Palavras Isoladas ................................................................ 45
6 Apresentação e análise dos resultados .......................................................................... 47
6.1. Análise descritiva dos resultados ............................................................................... 47
6.2. Resultados das correlações entre as variáveis independentes (Conhecimento de
Letras, Conhecimento de Rimas, Segmentação Silábica e Deleção Fonêmica) e a variáveis
dependentes Leitura de Palavras e Escrita de Palavras ........................................................ 49
6.2.1 Correlações entre as variáveis independentes Conhecimento de Letras (CL),
Conhecimento de Rima (CR), Segmentação Silábica (SS) e Deleção Fonêmica (DF) e a
variável dependente Leitura de Palavras (LP) .................................................................. 49
6.2.2 Correlações entre as variáveis independentes Conhecimento de Letras (CL),
Conhecimento de Rima (CR), Segmentação Silábica (SS) e Deleção Fonêmica (DF) e a
variável dependente Escrita de Palavras (EP) .................................................................. 51
6.3. Resultados das análises de Regressão Linear Múltipla entre as variáveis
independentes (CL, CR, SS, DF) e as variáveis dependentes (EP e LP) acompanhadas das
análises de variância correspondentes .................................................................................. 52
6.3.1 Regressão Linear Múltipla com relação à variável dependente Leitura de
Palavras (LP) .................................................................................................................... 52
6.3.2 Regressão Linear Múltipla com relação à variável dependente Escrita de
Palavras (EP) .................................................................................................................... 54
7 Discussão dos Resultados ............................................................................................... 55
Referências .............................................................................................................................. 60
Apêndices ................................................................................................................................. 66
Apêndice 1 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido à Escola ...................................... 67
Apêndice 2 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aos Pais ...................................... 68
Apêndice 3 – Tarefa de Intruso de Rimas ................................................................................. 69
Apêndice 4 – Tarefa de Segmentação Silábica ......................................................................... 70
Apêndice 5- Tarefa de Deleção Fonêmica ................................................................................ 71
Apêndice 6 – Leitura de palavras isoladas – 1ª coleta.............................................................. 72
Anexos ...................................................................................................................................... 74
Anexo 1 – Teste de conhecimento do nome das letras ............................................................. 75
Anexo 2 – Escrita de palavras isoladas – 1ª coleta ................................................................... 76
Anexo 3 - Escrita de palavras isoladas – 2ª e 3 ª coletas. ......................................................... 77
Introdução

Ter o domínio da leitura e da escrita é condição facilitadora ao exercício da cidadania,


possibilitando entre outras coisas o acesso aos recursos tecnológicos, ao conhecimento da
ciência, da cultura e da história, sendo um instrumento relevante à emancipação dos
indivíduos. No entanto, o ensino da leitura e da escrita não tem obtido resultados animadores
no interior das escolas brasileiras.
Os resultados divulgados pelo Ministério da Educação por meio do INEP (Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira) em 2015 sobre a Avaliação Nacional da
Alfabetização (ANA), demostraram mais uma vez que a aquisição do princípio alfabético não
tem sido garantida a um grande número de crianças brasileiras. Esta avaliação compõe um dos
eixos do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que em 2012, reuniu o
compromisso do Governo Federal, dos Estados e Municípios em alfabetizar todas as crianças
até os oito anos de idade.
Os resultados apresentados foram divididos em Língua Portuguesa, com medidas de
leitura e escrita, e Matemática. Conforme relatório, 22,21% das crianças brasileiras
encontravam-se no nível 1 de proficiência de leitura, ou seja, nível no qual elas leem apenas
palavras, mas não frases e textos. Nos níveis 2 e 3 ficaram 66,59% das crianças. Nestes níveis
elas conseguiram ler apenas frases e textos curtos, retirando do texto informações explícitas e
apenas 11,02% das crianças foram capazes de ler textos de grande extensão, reconhecendo
informações implícitas e fazendo inferências.
Na escrita a situação não é diferente, 11,64% das crianças brasileiras se encontraram
no nível 1, no qual os estudantes se dividiram naqueles que deixaram em branco, não
conseguiram escrever ou representaram a escrita por meio de desenhos. O nível 4 concentrou
a maior parte dos alunos, 56,66%, momento em que o texto começa a apresentar uma síntese
de ideias, porém com inadequações e somente 9,88% das crianças no final do ciclo de
alfabetização (3º ano) foram capazes de produzir textos em níveis adequados, ou seja, com
poucos desvios, sendo estes ligados principalmente ao domínio das convenções ortográficas.
(Brasil, 2015).
Dominar a representação ortográfica correta das palavras é imprescindível para que os
aprendizes alcancem a leitura eficiente, sendo também condição necessária para a produção
de textos adequados. Salles e Correa (2014) escrevem que não ter domínio correto e
automatizado no reconhecimento de palavras tem consequências diretas na produção textual.
7
Dentre as consequências elencadas encontra-se o fato de que o tempo e o gasto cognitivo
empregado na identificação das correspondências entre grafemas e fonemas e das convenções
ortográficas levam as crianças a esquecerem o que se propunham a escrever, deixando seus
textos desconexos. As dificuldades nas convenções ortográficas das palavras também
implicam na desmotivação dos alunos para escrever, deixando-os muitas vezes envergonhados
diante de seus pares e professores, culminando na esquiva da escrita. Por outro lado, Morais
(2013) destaca que na leitura este processo não é diferente, o esforço cognitivo depreendido
para realizar a correspondência grafema-fonema pelas crianças que não possuem a
representação ortográfica das palavras automatizadas na memória leva-as a não terem espaço
na memória de trabalho disponível para a compreensão do texto lido. Assim, sintetizando os
autores citados, pode-se afirmar que o domínio automatizado das correspondências
grafofonêmicas, ou seja, o reconhecimento automatizado da representação ortográfica das
palavras é o primeiro passo para que as crianças brasileiras possam ler e escrever textos com
eficiência.
O reconhecimento automatizado de palavras se dá pela descoberta do princípio
alfabético, ou seja, pela compreensão da correspondência grafema-fonema. Há evidências na
literatura de que esta compreensão é facilitada por diversas habilidades cognitivas que
interferem na aquisição da linguagem escrita, tais como as habilidades de processamento
fonológico - memória de trabalho fonológica, velocidade de nomeação, vocabulário e
consciência fonológica e, ainda o conhecimento do nome das letras (Seabra & Dias, 2012;
Andrade, Andrade & Capellini, 2014; Bowey, 2013; Cardoso- Martins & Batista, 2005).
Dentre estas, a consciência fonológica e o conhecimento do nome das letras se destacam.
A consciência fonológica é um constructo multidimensional, utilizado para significar
que o sujeito toma consciência dos sons da fala aprendendo a refletir sobre eles e manipulá-
los. É compreendida em três níveis de reflexão: a consciência no nível da sílaba, no nível das
rimas e aliterações (intrassilábico 1) e no nível do fonema (Barrera & Maluf, 2003; Melo,
Roazzi, Minervino & Nascimento, 2015). Há um grande número de evidências na literatura de
que a consciência fonológica se constitui como um importante preditor das competências
futuras de leitura e escrita (Goswami, Ziegler, Dalton & Schneider, 2003; Duncan, Seymon, &
Hill, 1997; Gombert, 1996; Cardoso-Martins, 1995; Martins, 2010; Melo & Correa, 2013,

1
No nível intrassilábico temos os correspondentes aos termos onset e rime que se referem à divisão da sílaba em
duas unidades. Onset (aliterações) corresponde à consoante inicial ou grupo de consoantes iniciais e rime (rima)
corresponde à vogal e às demais consoantes que se seguem à vogal. Conforme escreveram Barrera e Santos
(2014, p. 28) “Alguns exemplos em português seriam: mar (onset=m; rime=ar; três (onset=tr; rime=ês).
8
Bowey, 2013; Faísca, Araújo & Reis, 2015). Esta contribuição, por sua vez, é aprofundada na
literatura com relação aos diferentes graus em que cada habilidade da consciência fonológica
contribui para a alfabetização. Algumas habilidades como a rima e a aliteração apareceram
correlacionadas à alfabetização em línguas com ortografias mais opacas 2 como o inglês
(Goswami, 2002; Goswami et al, 2003) enquanto que em línguas transparentes como é o caso
da língua espanhola e do português brasileiro as consciência silábica e fonêmica parecem
exercer maior influência sobre a alfabetização (Melo & Correa, 2013; Spinillo, Mota &
Correa, 2010).
A consciência fonológica também se constitui como elemento facilitador para a
aprendizagem das letras, pois leva as crianças a refletirem sobre o som que estas produzem.
Scliar-Cabral (2015) esclarece que para que a criança possa se alfabetizar é preciso que esta
compreenda o som das letras, relacionando os fonemas aos grafemas correspondentes. Desse
modo, “crianças que não conseguem discriminar e lembrar as letras individuais não
conseguem ler uma escrita alfabética, ao passo que crianças que conseguem nomear letras
individuais sem muito esforço, devem ter facilidade para aprender a associar valores sonoros
a elas (Bowey 2013, p. 183)”.
Nesta perspectiva, o período da Educação Infantil é fundamental para o
desenvolvimento das habilidades de consciência fonológica. Sargiani (2016) afirma que os
primeiros cinco anos de vida são cruciais para o desenvolvimento das atividades neuronais da
criança. Neste período as crianças aprendem várias habilidades que serão os pilares para seu
sucesso na aprendizagem ulterior da linguagem escrita, sendo a consciência fonológica uma
aprendizagem crucial. O autor discrimina o papel de cada habilidade de consciência
fonológica, argumentando que no português brasileiro a consciência fonêmica é a habilidade
da consciência fonológica com maior relação com a leitura e a escrita podendo ser ensinada já
na Educação Infantil por meio de atividades lúdicas que impulsionem o desenvolvimento
infantil.
Neste contexto insere-se esta pesquisa com o objetivo de analisar a relação entre a
leitura e escrita de palavras com as variáveis de consciência fonológica, (medida pelo
conhecimento de rimas, segmentação silábica e deleção fonêmica) e conhecimento inicial do
nome das letras em crianças que ingressam no Ensino Fundamental. Procurou-se verificar se o
melhor desempenho inicial nas habilidades de consciência fonológica e conhecimento do

2
O termo opaco está sendo empregado para representar a língua cuja ortografia da maioria das palavras não está
determinada por regras claras, mas dependem muitas vezes do contexto. O oposto, a ortografia transparente,
seria a língua cuja maioria das palavras são determinadas por regras (Morais, 2013).
9
nome das letras se correlacionaria ao melhor desempenho em leitura e escrita de palavras.
Buscou-se ainda contribuir com a discussão sobre qual das habilidades da consciência
fonológica seriam preditoras da leitura e escrita no português brasileiro, ampliando o
conhecimento já existente.
Com esse objetivo, foi realizada uma revisão de literatura tomando-se como base os
conhecimentos produzidos pela Psicologia Cognitiva.
Assim, no capítulo 1 foi realizada uma apresentação da Psicologia Cognitiva e das
principais habilidades cognitivas consideradas como preditoras do bom desenvolvimento da
leitura e da escrita, com o propósito de justificar o motivo pelo qual foram escolhidas para
este estudo as habilidades da consciência fonológica e o conhecimento do nome das letras
No capítulo 2 foi realizada uma análise das contribuições das habilidades
metalinguísticas para a alfabetização, tendo como ênfase a contribuição da consciência
fonológica.
No capítulo 3 foi feita uma exposição sobre como se dá a aquisição do princípio
alfabético na perspectiva da Psicologia Cognitiva da Leitura. Investiga-se qual a relação que
o conhecimento do som e do nome das letras exerce sobre a aprendizagem da escrita
alfabética e quais os principais modelos teóricos para o reconhecimento automatizado de
palavras.
No capítulo 4 são expostos o problema, hipóteses e objetivos.
No capítulo 5 é apresentada a metodologia adotada para o estudo, seu delineamento,
local, participantes e instrumentos de coletas de dados.
No capítulo 6 são apresentados os resultados obtidos no estudo por meio das análises
estatísticas e no capítulo 7 a discussão dos mesmos.

10
1 Psicologia Cognitiva e Linguagem Escrita

1.1 Psicologia Cognitiva

A psicologia cognitiva constitui uma das abordagens teóricas mais recentes da história
da psicologia moderna, tendo início aproximado na década de 1950. É definida como a
“ciência que estuda como as pessoas pensam, aprendem, organizam e utilizam o
conhecimento” (Sternberg, 2010, p. 10). Esta abordagem tem como objeto de investigação
uma ampla variedade de temas, dentre eles encontram-se a memória, a linguagem, a formação
de conceitos, a resolução de problemas e a percepção.
Os estudiosos da psicologia cognitiva destacam em seus estudos os processos mentais,
relacionando-os aos aspectos comportamentais. Nesta perspectiva, a mente é responsável por
organizar as experiências vividas pelos sujeitos e, estes, por sua vez, são capazes de participar
intencionalmente da aquisição de conhecimentos novos, embora grande parte de seus
conhecimentos sejam aprendidos por processos não conscientes.
O termo não consciente empregado pelos psicólogos cognitivos não se relaciona com a
ideia de inconsciente defendida pela psicanálise. Para a psicologia cognitiva os aspectos não
conscientes se referem aos conhecimentos adquiridos sem atenção deliberada por parte do
sujeito (Schultz & Schultz, 2014).
Diferentes procedimentos metodológicos podem ser utilizados para estudar os
fenômenos cognitivos, tais como experimentos controlados, observação naturalística,
autoavaliações, inteligência artificial e simulações por computadores. Acredita-se que os
computadores imitem procedimentos semelhantes aos da mente humana, assim a influência da
inteligência artificial e da simulação por computadores desenvolve um grande papel nesta
abordagem (Sternberg, 2010).
De acordo com Sternberg (2010, p. 25), as principais ideias desta abordagem são
refletidas nos seguintes princípios: os dados da psicologia cognitiva só podem ser
interpretados relacionando teoria explanatória e dados empíricos, a cognição é algo que
geralmente se adapta às diferentes situações, “portanto, os seres humanos representam uma
adaptação altamente eficiente, porém imperfeita dos ambientes que enfrentam”, os processos
cognitivos estão em interação entre si e também com processos não cognitivos, a cognição
precisa ser estudada por diferentes métodos científicos, pois quando métodos diferentes
convergem para a mesma resposta, esta se apresenta com um maior grau de credibilidade e,
11
finalmente, considera-se que toda pesquisa básica pode levar a situações de aplicação, assim
como toda pesquisa aplicada contribui para a elaboração de conhecimentos básicos (Sternberg,
2010).
Atualmente, a psicologia cognitiva insere-se em um grupo mais amplo de disciplinas
preocupadas em conhecer os processamentos mentais, pois nenhuma ciência é capaz de
explicar sozinha todos os aspectos da mente humana. Deste modo, participa do grupo das
“ciências cognitivas”, unindo-se à linguística, antropologia, filosofia, ciências da computação,
inteligência artificial e neurociências (Schultz & Schultz, 2016).

1.2 Psicologia Cognitiva e Preditores de Alfabetização

Nos últimos trinta anos a Psicologia Cognitiva produziu muitos estudos sobre as
variáveis cognitivas envolvidas na alfabetização. Alguns destes (Capovilla, Gutschow &
Capovilla, 2004; Sénéchal, 2011; Bowey, 2013; Capellini, Sampaio, Fukuda, Oliveira, Fadini,
& Martins, 2009) buscaram identificar quais destas variáveis seriam preditoras da
aprendizagem da leitura e da escrita, tendo como objetivo intervir precocemente em crianças
de risco para futuros problemas de leitura.
Capovilla, Gutschow e Capovilla (2004) destacam que inicialmente, nos períodos de
1920 a 1970, acreditava-se que as principais causas das dificuldades de leitura relacionavam-
se a dificuldades no processamento visual. No entanto, desde a década de 1970 com os
estudos em psicologia cognitiva, foi possível identificar o processamento fonológico como
principal aspecto cognitivo ligado à aprendizagem do princípio alfabético.
O processamento fonológico envolve a velocidade de nomeação, que corresponde à
capacidade de o indivíduo buscar na memória, para nomear o mais rápido possível, unidades
simbólicas como objetos, números ou letras; a memória fonológica, que envolve o
armazenamento, durante um curto período de tempo, de material relativo à oralidade na
memória (curto prazo) e, permite que as crianças consigam relacionar as letras aos sons; o
vocabulário receptivo (aquele que a criança recebe desde que nasce) e expressivo (aquele que
a criança expõe) e, a consciência fonológica (Seabra & Dias, 2012).
Referindo-se à velocidade de nomeação Puliezi e Maluf (2012) encontraram forte
correlação entre esta habilidade e o desenvolvimento da leitura e da escrita. As autoras
fizeram um estudo com crianças do primeiro ano do Ensino Fundamental investigando a
diferença de desempenho de bons e maus leitores nas habilidades de consciência fonológica,

12
velocidade de nomeação e memória de trabalho. Destacaram que somente a memória de
trabalho não contribuiu de forma significativa para o desenvolvimento da leitura, ou seja, não
se mostrou diferente entre bons e maus leitores. Muitos estudos associam a velocidade de
nomeação à leitura e escrita, no entanto, embora haja um consenso na literatura de que esta
habilidade cognitiva participa do processo de leitura e escrita, parece não haver consenso
sobre sua função preditora destes processos. Alguns estudos (Germano, Pinheiro, Padula,
Lorencetti & Capellini, 2012; Puliezi & Maluf, 2012; Andrade, Andrade, Capellini, 2014,
Justi e Roazzi, 2012) identificaram a velocidade de nomeação como forte preditora das
habilidades de leitura e escrita, ao passo que outros a identificaram como preditora somente
quando associada às habilidades de consciência fonológica, mas não quando esta última foi
retirada nas análises de regressão (Faísca, Araújo, Reis, 2015; Corrêa & Cardoso-Martins,
2012).
A memória fonológica é designada como “um sistema de processamento que armazena
e manipula informações em um curto período de tempo, as quais se mantêm ativadas pela
repetição ou por transferência à memória de longo prazo (Cárnio, Sá, Jacinto & Soares, 2015,
p. 459). Ela desempenha um papel importante do processamento fonológico, pois, permite
que palavras novas sejam lidas pelo processo de decodificação, principalmente no caso de
palavras longas, pois é ela que armazena fonemas e pedaços das palavras enquanto todos os
fonemas são segmentados e distribuídos na formação da palavra a ser lida (Pires & Estivalet,
2014). Esta habilidade cognitiva não se apresentou em várias pesquisas como um preditor
independente da aprendizagem da leitura e da escrita. De modo geral, a memória fonológica
aparece relacionada à consciência fonológica, como aspectos inter-relacionados (Cárnio, Sá,
Jacinto & Soares, 2015).
O vocabulário, medido geralmente pela compreensão auditiva (receptivo) e pela
exposição oral por parte da criança (expressivo) constitui outra habilidade cognitiva que
também aparece correlacionada à linguagem escrita. Sua participação na literatura revisada
apresentou resultados controversos com relação a seu poder preditivo de leitura de palavras.
Assim, no estudo realizado por Capovilla, Gutschow, Capocilla (2004) no qual se avaliou em
um estudo longitudinal, que habilidades, dentre as habilidades cognitivo-mnemônicas,
metalinguísticas, verbais e visoespaciais seriam capazes de predizer o desempenho ulterior em
leitura e escrita, o vocabulário receptivo se mostrou como preditor da leitura de palavras 10
meses após a realização da coleta de dados na Educação Infantil. Pazeto (2016) encontrou
resultado semelhante ao verificar se funções executivas, linguagem oral, habilidades

13
preliminares de leitura e escrita, variáveis socioeconômicas, biológicas e visão do professor
avaliadas na Educação Infantil prediziam o desempenho de crianças em leitura, escrita e
matemática no Ensino Fundamental. Em sua pesquisa o vocabulário foi preditor da leitura de
palavras, sendo acompanhado pela consciência fonológica, o conhecimento de letra-som e
leitura e escrita preliminares. Em outros estudos, porém, o vocabulário apareceu mais
relacionado aos processos de fluência e compreensão de textos do que para a escrita de
palavras isoladas (Sénéchal, 2011; Seabra & Dias, 2012).
Nesta perspectiva, Seabra e Dias (2012) objetivaram identificar dentre as habilidades
de linguagem oral e memória de trabalho, quais destas mais se relacionavam com o
reconhecimento automatizado de palavras e com a compreensão em leitura. Estudaram a
compreensão auditiva, o vocabulário, a consciência fonológica, consciência sintática,
discriminação fonológica, nomeação, o conhecimento de letras e a memória de trabalho
auditiva e visual em uma amostra de 284 crianças de 1º ao 4º ano do Ensino Fundamental. Os
resultados evidenciaram que embora leitura e compreensão sejam habilidades que
compartilham componentes cognitivos, seus preditores são distintos. O reconhecimento
automatizado de palavras teve como preditores a compreensão auditiva, a consciência
fonológica, o conhecimento de letras e as memórias de trabalho visual e auditiva. O
vocabulário se mostrou preditivo da compreensão de leitura, acompanhado pela compreensão
auditiva, conhecimento do nome das letras e de forma pouco significativa, da memória de
trabalho.
Judith A. Bowey (2013) realizou uma revisão bibliográfica abarcando pesquisas que
demonstravam resultados de estudos sobre preditores de bom desempenho em alfabetização.
Como resultado de sua pesquisa, encontrou na literatura frequentes correlações ligadas à
capacidade cognitiva geral da criança, a capacidade verbal (relacionada à aquisição
vocabulários receptivo e expressivo), a sensibilidade fonológica, em especial a consciência
fonêmica, o conhecimento do nome das letras e a nomeação automática rápida. Bowey
explica que a sensibilidade fonológica e o conhecimento do nome das letras se apresentam
como os principais preditores do desenvolvimento da leitura e da escrita. A autora refere um
estudo publicado por ela em 1995 no qual o conhecimento do nome das letras no jardim de
infância previu 34% da variância de leitura ao final do primeiro ano, desta variância 21%
eram compartilhadas pela sensibilidade fonológica.
A consciência fonológica, por sua vez, aparece nas pesquisas como o componente do
processamento fonológico que mais se relaciona à aprendizagem da leitura e da escrita

14
(Bowey, 2013, Roazzi, Roazzi, Justi & Justi, 2013, Pazeto, 2016; Barrera & Maluf, 2003;
Seabra & Dias, 2012; Barrera & Santos, 2014). Faísca, Araújo e Reis (2015) também
encontraram forte participação da consciência fonológica na aprendizagem da leitura e da
escrita. Após avaliarem 770 crianças distribuídas entre os 1º, 2º, 3º e 4º anos do Ensino
Fundamental nas tarefas de escrita de palavras, leitura de palavras, eliminação de fonemas,
prova de correspondência letra-som, nomeação automática rápida, prova de memória de
dígitos e prova de vocabulário, objetivando conhecer se estas competências se
desenvolveriam no decorrer dos quatro primeiros anos de escolaridade, os autores
identificaram que estas evoluem com a escolaridade, mas que apenas a consciência fonológica
e o conhecimento de letras-som obtiveram uma contribuição constante para a escrita de
palavras ao longo dos anos escolares.
Outro estudo recente teve como objetivo caracterizar o Perfil Cognitivo-Linguístico de
escolares com dificuldade de leitura e escrita (Andrade, Andrade & Capellini, 2014).
Realizaram uma pesquisa de delineamento caso-controle longitudinal com 45 escolares do 2º
ano do Ensino Fundamental, sendo divididos em dois grupos: grupo de risco para transtorno
de leitura e grupo sem risco para transtorno de leitura. Os alunos foram avaliados nas tarefas
de conhecimento do alfabeto, consciência fonológica, memória de trabalho fonológica,
memória de trabalho visual e nomeação rápida. Os resultados demonstraram que o déficit na
consciência fonológica foi o sintoma prevalente para os alunos do grupo de risco para
transtornos de leitura. Esta habilidade vinha acompanhada por déficits atencionais e
velocidade de nomeação, que segundo os autores corroboram os resultados presentes na
literatura que apontam para déficits múltiplos ligados aos transtornos de leitura “embora o
prejuízo na consciência fonológica responda pela variância na leitura mais do que outras
funções cognitivas” (p. 366).
Como foi possível observar em todos os trabalhos referidos a consciência fonológica e
o conhecimento do nome das letras foram as habilidades cognitivas que mais se mantiveram
constantes em relação à sua participação com o reconhecimento de palavras, sendo o motivo
pelo qual foram adotadas como objeto de investigação desta pesquisa. Desse modo, nos
próximos capítulos estudaremos de modo mais detalhado estas habilidades. Inicialmente
abordaremos a consciência fonológica como uma das habilidades metalinguísticas e em
seguida investigaremos qual a influência que o conhecimento do som e do nome das letras
exercem sobre a aprendizagem da escrita alfabética e quais os principais modelos teóricos
para o reconhecimento automatizado de palavras.

15
2 Habilidades Metalinguísticas como Facilitadoras da Aprendizagem da
Linguagem Escrita

O ser humano é capaz de aprender por toda vida, adquirindo novos saberes por meio
de conhecimentos implícitos e explícitos. De acordo com Paula e Leme (2010), seria uma
imprudência conceber a aprendizagem humana exclusivamente como implícita ou explícita,
pois a destituiria ou de seu caráter filogenético ou de seu caráter cultural.
Uma das competências básicas que se faz necessária à aprendizagem da linguagem
escrita e que ocorre de modo implícito é o domínio da linguagem oral. Muitos estudos no
campo da Psicologia Cognitiva evidenciam que desde os primeiros meses de vida as crianças
são capazes de distinguir os sons da fala, apropriando-se pouco a pouco de forma implícita da
estrutura da sua língua nativa identificando, por exemplo, o plural, as relações semânticas
possíveis, ao passo que a diferencia de outras línguas (Maluf & Sargiani, 2013; Moura &
Paula, 2013; Barrera & Maluf, 2003). Quando ingressam na escola, por volta dos 5 a 7 anos,
as crianças já dominam de modo não controlado a linguagem oral e a utilizam no processo de
comunicação.
No entanto, somente os conhecimentos implícitos não são suficientes para a
aprendizagem do sistema de escrita alfabética. Como já foi demostrado, o cérebro humano
não foi criado para ler, mas adaptado para isto, tornando-se necessária a reflexão consciente e
controlada sobre a linguagem oral para que o indivíduo a relacione à linguagem escrita.
Segundo Gombert (2013, p.111) “o desenvolvimento da linguagem oral está, em parte,
sob a dependência de pré-programações inatas, de processos biologicamente determinados”.
Estes processos são automaticamente acionados com o contato da criança com a fala, no
entanto, a linguagem escrita, ao contrário, surge a partir de um sistema de convenções criado
pelo homem e que, portanto, não faz parte da estrutura genética do sujeito, sendo a reflexão
sobre a mesma efetivada por meio das habilidades metalinguísticas.
As habilidades metalinguísticas envolvem uma atenção deliberada do indivíduo acerca
dos diferentes aspectos da língua, tais como: a consciência fonológica, ligada às unidades
sonoras, consciência morfológica, que observa as menores unidades de significado das
palavras (morfemas) as unidades de ortografia e significado, que representam a consciência
lexical, a estrutura gramatical das sentenças, refletida na consciência sintática e a reflexão
sobre os usos sociais da língua, representada pela consciência pragmática (Moura & Paula,
2013).
16
Em 1990, Jean Emile Gombert elaborou um modelo teórico explicando os diferentes
níveis de controle cognitivo que as pessoas possuem sobre a linguagem. De acordo com esta
primeira elaboração do autor acreditava-se que a criança evoluía de conhecimentos implícitos,
chamados pelo autor de epilinguísticos, para conhecimentos metalinguísticos, ou seja, que
dependem de reflexão deliberada sobre a fala (Gombert, 2013). A Figura 1 apresenta o
modelo proposto pelo autor na ocasião.

Figura 1 - Desenvolvimento Metalinguístico

Habilidades linguísticas primárias Fase 1: Cada forma linguística, ouvida e depois utilizada, é
associada a seu contexto.

Habilidades epilinguísticas Fase 2: Os conhecimentosf acumulados durante a fase 1 são


organizados na memória de longo prazo. Estas organizações
controlam os comportamentos linguísticos, mas não são
+
acessíveis à consciência.

Pressão ambiental Fase 3: Uma pressão externa (p. ex., o ensino da leitura e
ortografia) é necessária para que a criança faça os esforços
cognitivos que permitam o acesso consciente aos
Capacidades metalinguísticas conhecimentos implicitos (isto é, epi-) da fase 2. Sobre essa
base, a criança pode então construir conhecimento explícitos
sofisticados.

Fonte: (Gombert, 2013, p. 110)

Como se pode observar na Figura 1, nesta primeira compreensão, ocorre uma pressão
externa sobre a criança para que esta passe a refletir intencionalmente sobre a linguagem em
um processo no qual as habilidades metalinguísticas superavam as epilinguísticas,
considerando que a criança não se utilizava mais destas últimas quando se tornava um leitor
proficiente. No entanto, este modelo foi revisto pelo próprio autor. Gombert (2013, p. 121)
esclarece que “a emergência de habilidades metalinguísticas não leva ao desaparecimento das
habilidades epilinguísticas das quais resultam: estas últimas continuam a evoluir sob o efeito
da repetição e da manipulação da escrita quando as pessoas leem ou escrevem”. Assim,
segundo o autor, tanto as aprendizagens implícitas como as explícitas são importantes para o
desenvolvimento do leitor proficiente, sendo necessário ensinar aos alunos a elaboração de
procedimentos conscientes sobre a linguagem escrita, mas também o acesso à manipulações
frequentes da leitura que ajudam a ampliar os conhecimentos implícitos da linguagem escrita
que, por sua vez, facilitam a compreensão do material lido como um todo.
A Figura 2 apresenta o modelo reformulado pelo autor, no qual se observa a relação de
reciprocidade entre as aprendizagens explicitas e implícitas.
17
Figura 2 - Aprendizagem implícita e explícita da leitura

1° contato com a escrita Conhecimentos e hipóteses sobre as


letras e sobre a escrita

Aprendizagem implícita das


regularidades do sistema
Efeito de
Aprendiz. Explícita
aceleração
Ensino (dos códigos e regras
de conversão)

Conhecimentos
conscientes

Automatístmo de leitura controle Processamentos da atenção

Fonte: (Gombert, 2013, p. 120)

Desse modo, neste novo modelo, o autor esclarece que a automatização dos processos
controlados de leitura acontece paralelamente à ampliação dos processos implícitos. Nas
palavras do autor “é na interface dos conhecimentos não conscientes e dos conhecimentos
refletidos que se constroem as competências de manipulação da escrita” (Gombert, 2013,
p.122).
Dentre as habilidades metalinguísticas, aquela que possui mais evidências na literatura
de sua contribuição para as aprendizagens da leitura e da escrita é a consciência fonológica. O
próximo tópico se propõe a explicá-la.

2.1 Consciência Fonológica.

A literatura refere ser importante a consciência fonológica para o processo de


alfabetização. Segundo Moura e Paula (2013, p.7), no período de 2005 a 2010 foram
realizados 187 estudos no Brasil sobre as habilidades metalinguísticas, sendo a consciência
fonológica o aspecto mais estudado. Grande parte destas pesquisas encontrou uma relação de
reciprocidade entre a consciência fonológica e a aquisição do princípio alfabético. Em
pesquisa anterior, Maluf, Zanella e Pagnez (2006, p. 75), encontraram 157 pesquisas
brasileiras que se referiam às habilidades metalinguísticas, nas quais também identificaram a
predominância dos estudos em consciência fonológica, “posto que é sobre o papel da
18
consciência fonológica na aprendizagem da linguagem escrita que foram produzidas maiores
evidências empíricas”.
A consciência fonológica é identificada nas pesquisas como uma das funções do
processamento fonológico que mais predizem a aprendizagem do sistema de escrita alfabética
(Faísca, Araújo & Reis, 2015; Seabra & Dias, 2012; Soares, Jacinto & Cárnio, 2012; Spinillo,
Mota & Correa, 2010; Melo & Correa, 2013; Bowey, 2013; Corrêa & Cardoso-Martins, 2012).
De acordo com Seabra e Dias (2012, p. 46), “o perfil cognitivo de maus leitores têm
apontado para déficits, sobretudo, em consciência fonológica, além de outras habilidades
como vocabulário, memória fonológica e nomeação”. Segundo as autoras “há evidências de
que problemas de processamento fonológico prejudicam os processos de decodificação pela
estratégia alfabética e, consequentemente, o desenvolvimento e consolidação da estratégia
ortográfica, sendo o fator causal mais frequente nos distúrbios de leitura”.
A consciência fonológica se refere à capacidade de identificar, analisar, manipular,
segmentar de forma intencional as unidades de sons que compõem a fala. É composta por um
conjunto de habilidades, tais como, a aliteração, a identificação de rimas, a segmentação e
subtração de sílabas; identificação, segmentação e subtração de fonemas (consciência
fonêmica), tratando-se de um constructo não homogêneo, pois inclui competências que
variam tanto em nível de dificuldade como de sua aprendizagem. A consciência fonológica
seria, assim, um conjunto de habilidades que evoluem da identificação de unidades mais
evidentes na fala (suprafonêmicas), para unidades menos evidentes (intrassilábicas) e
fonêmicas (Cárnio, Sá, Jacinto & Soares, 2015; Melo & Correa, 2013; Spinillo, Mota &
Correa, 2010; Santos & Maluf, 2010).
Na percepção suprafonêmica está o conhecimento no nível da sílaba, no qual as
crianças aprendem a segmentar as palavras em sílabas e fazer o inverso, ou seja, aglutinar as
sílabas formando as palavras. Esta habilidade é uma tarefa considerada fácil para as crianças,
já que a literatura refere ser a consciência silábica algo que se desenvolve naturalmente no
contato com a linguagem falada. No nível intrassilábico ocorre a compreensão de que existem
unidades que são menores que as sílabas, mas maiores que os fonemas, são unidades do tipo
ataque e rima. Nas palavras de Valente e Martins (2004, p.194) “o ataque refere-se à
consoante inicial ou ao grupo de consoantes iniciais e a rima é composta pelos fonemas que se
seguem”. Um exemplo de ataque seria a letra “c” na palavra cat (gato) enquanto que a vogal
“a” seguida pela consoante “t” (at) representariam a rima. O nível dos fonemas é o mais
sofisticado e corresponde à compreensão de que a palavra é constituída por um conjunto de

19
fonemas. A consciência fonêmica é essencial para a compreensão do princípio alfabético
(Puliezi, 2010).
Há um considerável número de evidências na literatura de que existe uma relação de
causalidade recíproca entre consciência fonológica e as habilidades futuras de leitura e escrita,
assim como, de que estas habilidades auxiliam não apenas crianças de desenvolvimento típico,
mas também crianças com dificuldades de aprendizagem e distúrbios de leitura (Spinillo,
Mota & Correa, 2010; Sargiani, 2016). Destacando sua importância, Roazzi, Roazzi, Justi e
Justi (2013) relatam que foi realizado um estudo seminal sobre o papel da consciência
fonológica para a aquisição da linguagem escrita, na Inglaterra em 1985, por Bryant e Bradley.
Na ocasião os pesquisadores acompanharam 400 crianças desde a pré-escola, momento no
qual nenhuma das crianças estava alfabetizada, até o Ensino Fundamental quando as crianças
já estavam nas idades de 8 ou 9 anos. A proposta dos pesquisadores foi investigar o poder
preditivo de tarefas de rima e aliteração e encontraram como resultado que estas habilidades
foram precursoras das habilidades da linguagem escrita três ou quatro anos mais tarde, mesmo
sendo controladas outras variáveis, tais como a educação materna, a inteligência e a memória
de trabalho fonológica.
Este estudo estimulou vários pesquisadores em diversas partes do mundo a
pesquisarem sobre a temática da consciência fonológica, e no Brasil não foi diferente. Assim,
em 1995, Cardoso-Martins examinou a relação entre os níveis de consciência fonológica e a
aprendizagem da linguagem escrita do português do Brasil. Em um delineamento longitudinal,
foram avaliadas 105 crianças de 6 anos de idade, em tarefas que verificavam diferentes níveis
de consciência fonológica quando estas ainda não tinham recebido instrução formal em leitura
e escrita. As medidas de consciência fonológica apresentadas no início do ano foram
correlacionadas com medidas de leitura e escrita no meio e no final do ano letivo,
encontrando como resultado uma forte contribuição da consciência fonológica no processo de
compreensão do princípio alfabético. A consciência fonêmica obteve maior influência na
aprendizagem do princípio alfabético, sendo acompanhada da consciência silábica. Segundo a
autora, diferentemente do que foi encontrado na aprendizagem do princípio alfabético em
outras ortografias, como por exemplo, o inglês, a consciência silábica obteve um impacto,
embora menor na predição da aprendizagem da leitura e da escrita no português brasileiro.
De fato, a contribuição de cada habilidade da consciência fonológica para a
alfabetização é ainda discutida pelos autores, sendo influenciada pela natureza do sistema
ortográfico aprendido. Assim, algumas habilidades como a rima e a aliteração aparecem com

20
mais frequência correlacionadas a línguas mais opacas, como o inglês (Goswami, 2002,
Goswami et al, 2003), enquanto que em línguas transparentes como é o caso da língua
espanhola e do português brasileiro a consciência silábica e fonêmica parecem exercer maior
influência sobre a alfabetização (Melo & Correa, 2013; Spinillo, Mota & Correa, 2010;
Morais, 2013). É considerada uma língua transparente, a língua cuja escrita da maior parte de
suas palavras é guiada por regras claras de ortografia, por exemplo, no português brasileiro há
a regra de que a letra “G” seguida de “E” e “I” deve ser pronunciada com o som de “J” e isto
se repete para todas as palavras em que esta sequência de letras aparecer. As exceções da
língua, como é o caso do som do “X” que possui quatro tipos diferentes de pronúncia são
raras. Opaca é a língua cujas palavras não são guiadas por regras claras em sua maioria, a
pronúncia da palavra dependerá de análise de contexto para ser identificada (Morais, 2013).
A discussão sobre quais as habilidades da consciência fonológica são mais salientes
em cada língua é realizada há bastante tempo. Duncan, Seymor e Hill (1997) destacam que
nas teorias de maiores-unidades considera-se que as crianças farão uso naturalmente de
sílabas, ataques e rimas para estruturar suas primeiras impressões sobre o sistema de escrita
alfabética, enquanto que nas teorias de unidades menores o contato com as letras leva a
consciência fonêmica e esta, por sua vez, à descoberta do princípio alfabético.
Hulme, Hatcher, Nation, Brow, Adams e Stuart (2002) se propuseram a esclarecer o
poder preditivo das medidas de ataque-rima versus consciência fonêmica como preditores de
habilidades de leitura em crianças de 5 e 6 anos de idade. Os autores questionaram estudos
que traziam a consciência de rimas como uma habilidade que obtém vantagem em relação à
consciência fonêmica, pois estes estudos não teriam investigado as diferentes habilidades,
com os mesmos instrumentos e ao mesmo tempo. Assim, por meio de atividades de supressão,
detecção e intruso de fonema inicial, fonema final, ataque e rima, os autores compararam
estas habilidades da consciência fonológica em um estudo longitudinal. Os resultados da
análise de regressão identificaram a consciência fonêmica como preditor único de leitura após
o ataque e a rima terem sido controlados.
O detalhe deste estudo está no fato de que foram realizados testes de leitura inicial
com as crianças, que as dividiram em dois grupos: crianças que leram de 0 a 7 palavras na
Escala de Habilidades Britânicas (BAS-II) de leitura e que foram identificados como leitores
na casa de uma idade média de 5 anos e outro que leu entre 7 e 58 palavras, grupo para o qual
se declarou a idade média de 6 anos. De modo que os próprios autores levantam a hipótese de
que se outros estudos fossem realizados em crianças que não conseguissem ler nenhuma

21
palavra, ou seja, com idade média de leitura de 4 anos, talvez a consciência de rimas
aparecesse como preditora de leitura de palavras, ampliando, deste modo, o debate na
comunidade científica.
Em um estudo realizado por Melo e Correa (2013) as autoras se propuseram a
examinar o papel de diferentes habilidades de consciência fonológica para a aprendizagem da
leitura e da escrita em jovens e adultos brasileiros. Os alunos foram avaliados no início e no
final do ano letivo em tarefas de leitura, escrita, conhecimento de letras, julgamento de rimas,
julgamento de semelhança de som inicial, segmentação silábica, levando-se em consideração
as habilidades verbais e o nível de leitura inicial dos alunos quando ingressaram na Educação
de Jovens e Adultos. Os resultados mostraram que os indicadores de leitura inicial e a
segmentação silábica foram os melhores preditores do desempenho em leitura e da escrita ao
final do ano. De acordo com as autoras “levando em conta as características da língua
portuguesa falada no Brasil, talvez seja possível obter vantagem inicialmente em atividades de
segmentação de palavras em sílabas e depois em unidades intrassilábicas, por ser a sílaba uma
unidade saliente em nossa língua (p. 473)”.
No entanto, em outros estudos realizados com o português do Brasil, a consciência
silábica não mostrou correlação significativa com o desenvolvimento da linguagem escrita.
Isto foi justificado na literatura por que esta habilidade pode ser aprendida de forma implícita
por meio do contato do indivíduo com pessoas que compartilham da linguagem oral, enquanto
que as habilidades de ataque, rima, e consciência fonêmica obtiveram contribuição
significativa para a aquisição do princípio alfabético, mesmo em línguas transparentes como a
língua portuguesa (Andrade, Andrade & Capellini, 2014; Germano & Capellini, 2015).
A consciência fonêmica, por sua vez, tem sido frequentemente referenciada como o
mais importante preditor da aprendizagem da linguagem escrita, possuindo certo consenso nas
pesquisas revisadas de sua contribuição. Sénéchal (2011, p. 3) relata que os resultados de
estudos longitudinais realizados no Canadá sobre preditores de bom desempenho em
alfabetização, demostraram importância da consciência fonêmica e do vocabulário para a
aquisição da linguagem escrita. De acordo com a autora, “a consciência fonêmica avaliada na
educação infantil é um dos melhores preditores isolados de leitura ao final do primeiro ano do
ensino fundamental”, sendo o vocabulário um dos melhores preditores de compreensão da
leitura no terceiro e no quarto anos da mesma etapa de ensino. Seus estudos são corroborados
pela literatura nacional e estrangeira, que também têm identificado a consciência fonêmica
como fator essencial na aprendizagem do princípio alfabético (Morais, 2013; Sargiani, 2013;

22
Morais, 2014; Germano & Capellini, 2015; Cárnio, Sá, Jacinto & Soares, 2015).
Para que haja a aprendizagem da leitura e da escrita em um sistema de escrita
alfabética, é necessário que a criança aprenda a identificar as menores unidades sonoras que
compõem a fala, ou seja, os fonemas e passe a associá-los a um grafema. Esta tarefa não é
simples já que os fonemas não correspondem a um único grafema de forma regular. Assim,
para o fonema /ᶴ/ de chapéu são utilizadas duas letras que formam um único grafema (ch),
sendo que o português brasileiro possui 57 grafemas. Desse modo, evidencia-se que enquanto
algumas habilidades da consciência fonológica como a segmentação silábica, a aliteração e a
rima podem se desenvolver por meio do contato com ambientes oralmente favoráveis, a
consciência fonêmica só se desenvolve por meio de instrução explícita do sistema de escrita
alfabética (Morais, 2013; Morais, 2014; Dehaene, 2012; Sargiani, 2013).
Sargiani (2016, p.52), destaca que a aprendizagem dos fonemas possui duas grandes
fontes de dificuldades: sua natureza abstrata e a não correspondência biunívoca entre os
fonemas e grafemas. “A primeira dificuldade está no fato de que os fonemas não são unidades
sonoras percebidas facilmente, pois são produzidos por coarticulações no fluxo da fala, o que
dificulta sua percepção isolada”. De acordo com o autor, estudos demonstram que são os
gestos motores, representados pelos gestos articulatórios que o indivíduo faz ao produzir os
fonemas, os maiores responsáveis pelo armazenamento destes na memória.
Neste sentido, foi realizado pelo mesmo autor um estudo para verificar o grau de
influência que a compreensão de sílabas e fonemas exercem no desenvolvimento inicial do
princípio alfabético. O estudo tinha dois objetivos: investigar se no início da aprendizagem da
linguagem escrita as crianças se beneficiam mais do mapeamento ortográfico de sílabas ou de
fonemas e verificar se a inclusão de gestos articulatórios no mapeamento ortográfico de
fonemas seria superior ao ensino destes sem os gestos. Com um delineamento de caráter
experimental com pré-teste e pós-teste, participaram da pesquisa 90 crianças da Educação
Infantil, com uma média de idade de 4 anos e 5 meses. Os participantes foram distribuídos em
4 grupos de treinamento, a saber: um grupo que treinava o mapeamento ortográfico de
fonemas com articulações, um grupo com mapeamento ortográfico de fonemas sem
articulações, um grupo com mapeamento ortográfico de sílabas e um grupo que realizava
desenhos diversos (controle). Ao final do treinamento as crianças foram avaliadas em tarefas
de aprendizagem de palavras e tarefas de leitura, escrita segmentação fonêmica e segmentação
silábica. Obteve-se como resultado, que as crianças treinadas com a combinação de
mapeamento ortográfico de fonemas mais gestos articulatórios superaram os demais grupos,

23
tendo como segundo melhor desempenho aquelas treinadas somente com o mapeamento
ortográfico de fonemas. Deste modo, o autor destaca a importância dos gestos articulatórios
para fixar a compreensão dos fonemas na memória e deste na compreensão do princípio
alfabético.
Nesta mesma perspectiva, Santos e Maluf (2010) esclarecem que há um grande
número de evidências na literatura que apontam que a análise de fonemas pode ser mais útil
na aprendizagem do que as outras habilidades da consciência fonológica para a aquisição do
princípio alfabético. De acordo com as autoras, crianças pré-escolares que foram ensinadas a
reconhecer a identidade de fonemas foram capazes de generalizar estas aprendizagens para
outros fonemas não aprendidos, mostrando que o ensino do fonema não precisa
necessariamente cobrir todos os fonemas da fala.
É importante destacar que, embora as pesquisas apontem para uma relação forte e
bidirecional entre a consciência fonêmica e a aprendizagem da leitura e da escrita, a primeira
não pode ser considerada como um pré-requisito para a iniciação da criança no processo de
alfabetização, posto que “muitos novatos à escola que apresentam escores no piso em
manipulação fonêmica, se tornam bons leitores” mediante instrução explícita das relações
grafema-fonema (Bowey, 2013, p. 181).

24
3 Aprender a ler no sistema alfabético de escrita

Aprender a ler é diferente de ler para aprender. O leitor proficiente é aquele que utiliza
a leitura como ferramenta para adquirir novos conhecimentos, divertir-se, trabalhar e
emocionar-se. Por outro lado, o leitor iniciante ainda precisa compreender o sistema de escrita
alfabética, ou seja, descobrir como ele pode na escrita codificar a fala e na leitura decodificar
a escrita. Assim, “aprender a ler refere-se a um primeiro estágio de um longo processo de ler
para aprender” (Souza, 2013, p.18).
A leitura é algo recente na história da humanidade. Os primeiros sistemas de escrita
completos, aqueles que conseguiam representar todas as palavras, surgiram há cerca de 5 mil
anos, entre os povos egípcios e sumérios. O sistema egípcio marcava palavras inteiras e
também as consoantes, enquanto que o sumério marcava as sílabas. A escrita alfabética, por
sua vez, é mais recente, cerca de 3800 anos, sendo considerada uma das principais invenções
da humanidade, pois com um número reduzido de caracteres (apenas 26 letras e alguns
diacríticos3) permitiu ao homem representar todos os sons da fala. Alfabetizar é, portanto,
ensinar a ler e escrever em um sistema de escrita alfabética e esta tarefa tem suas
peculiaridades, dada a própria natureza deste sistema de escrita (Souza, 2013).
Morais, Leite e Kolinsky (2013, p.22) explicam que o sistema de escrita alfabética
representa a linguagem ao nível de sua estrutura fonêmica. Os fonemas, de acordo com os
autores “não são sons, mas entidades abstratas de que a criança não está consciente e de que
ela tem que tomar consciência quando aprende a ler em uma escrita alfabética”. Assim, os
autores estabelecem três condições sequenciais a serem consideradas para a aprendizagem da
leitura e da escrita: descobrir o princípio alfabético, adquirir progressivamente o
conhecimento ortográfico do código da língua aprimorando o procedimento de decodificação
e, finalmente, constituir um léxico mental ortográfico.
A primeira condição se refere à descoberta da correspondência entre os grafemas e
fonemas da língua, ou seja, a relação entre as representações gráficas e mentais dos sons da
fala. Guimarães (2003) considera que para aprender a ler faz-se necessário conhecer o nome
das letras, como agrupá-las em unidades funcionais que são os grafemas, entender que estes
simbolizam os fonemas, compreender as combinações possíveis entre grafemas e fonemas
que resultam em palavras reconhecíveis.

3
Os diacríticos são sinais gráficos adicionados às letras utilizados para modificar os sons. São exemplos de
diacríticos a cedilha, os acentos agudo e circunflexo. (Souza, 2013).
25
A segunda condição consiste em se apropriar das regras do código ortográfico da
língua. Geralmente os sistemas alfabéticos de escrita não possuem correspondência biunívoca
para todas as palavras escritas, ao contrário, nos sistemas de escrita alfabética muitas regras
de escrita são contextuais, de modo que “a mesma letra pode corresponder a diferentes
fonemas, e diferentes letras, ao mesmo fonema” (Morais, Leite, & Kolinsky, 2013, p. 22).
Neste momento, é preciso garantir que o processo de decodificação esteja ocorrendo com
eficiência.
A terceira condição corresponde à construção de um léxico mental ortográfico, ou seja,
à condição de ter no cérebro a representação mental da ortografia das palavras, de modo que
estas possam ser acessadas num processo automatizado e sem a consciência desta operação
por parte do leitor, permitindo que sua atenção esteja voltada para a compreensão dos textos.
Estas três condições, no entanto, não são processos que ocorrem de modo espontâneo.
Maluf (2013, p. 4) destaca que “aprender a ler e escrever é um tipo de aprendizagem que não
deriva da simples exposição a materiais escritos”. Compreender os fonemas exige um nível de
abstração elevado, no qual a criança toma consciência de que a fala é representada em uma
ordem sequencial de segmentos fonéticos, e que estes segmentos fonéticos são representados
na escrita por grafemas (consciência fonêmica), sendo esta compreensão realizada somente
mediante instrução explícita do princípio alfabético.
De acordo com Morais (2014) esta instrução deve ser realizada numa ordem
sequencial que vai do mais simples para o mais complexo. Assim, começa-se primeiro de
letras cujos sons são mais perceptíveis na fala como as fricativas F e V, para depois as letras
oclusivas, de correspondências biunívocas para correspondências mais complexas, sendo esta
posição referendada pelos estudos das neurociências sobre como o cérebro aprende.
Para tornar mais didática a explicação da sequência, referimos aqui os sete princípios
necessários ao ensino da leitura e da escrita propostos por Stanilas Dehaene, tal como
referidos por Maluf e Sargiani (2015).
1- Ensino explícito do código alfabético – correspondências grafema-fonema;
2- Progressão racional – ensinar as crianças do mais simples para o mais complexo –
primeiro os aspectos fonológicos da língua, seguido dos fonemas e grafemas, etc.;
3- Aprendizagem ativa associando a leitura à escrita – explorar ativamente a escrita e a
leitura das palavras – ler e escrever são processos que se auxiliam mutuamente;
4- Transferência do explícito ao implícito – refletir de forma controlada e consciente
sobre a linguagem.

26
5- Escolha racional dos exemplos e dos exercícios – de preferência não usar palavras
com irregularidades grafofonêmicas, sem que as crianças tenham o domínio das
palavras regulares;
6- Engajamento ativo, atenção e prazer – a criança precisa estar motivada para aprender,
de modo que sua atenção esteja realmente deslocada para a tarefa realizada, pois esta
exige grande esforço cognitivo. Deve ser encorajada a elaborar respostas, mesmo
erradas, no entanto estas devem ser corrigidas. Seu esforço deve ser recompensado por
meio de elogios, notas e aprovação dos professores e familiares.
7- Adaptação ao nível da criança – princípio norteador de todos os anteriores – é preciso
conhecer o nível de aprendizagem no qual a criança está, ou seja, sua compreensão
sobre o sistema de escrita alfabética e adequar as atividades a serem utilizadas de
modo conveniente.

3.1 Conhecimento do som e do nome das letras.

A literatura refere ser o conhecimento do nome das letras um importante preditor da


aprendizagem da leitura e escrita em diferentes ortografias alfabéticas (Cardoso-Martins &
Batista, 2005; Georgiou, Torppa, Manolitsis, Lyytinen, & Parrila, 2012; Barrera & Santos,
2016). De acordo com Cardoso-Martins e Batista (2005, p. 330), dois são os motivos para que
o conhecimento de letras se correlacione significativamente com os processos de leitura e
escrita: primeiro, o nome das letras geralmente corresponde ao som que elas representam e,
segundo, “o nome das letras são, com frequência, escutados na pronúncia das palavras”. Em
estudo realizado com crianças brasileiras, as autoras constataram que as crianças falantes do
português brasileiro utilizam seus conhecimentos acerca do nome das letras para conectar a
escrita à fala, utilizando, principalmente, os sons mais perceptíveis na oralidade, como as
vogais e letras familiares. Por ser a capacidade de processamento de informações da criança
ainda limitada, as autoras destacam que é provável que as primeiras tentativas de
representação dos fonemas audíveis na fala se pautem na saliência das relações letra-som
perceptíveis no início e no fim das palavras.
Em um estudo semelhante Barrera e Santos (2016) objetivaram analisar as relações
entre o conhecimento do nome das letras, escrita inventada de palavras e habilidades em
consciência fonológica em crianças brasileiras que frequentavam a pré-escola. Foram
administradas tarefas de conhecimento do nome das letras, síntese silábica, rima, aliteração,
27
manipulação silábica e fonêmica, transposição silábica e escrita de palavras sob ditado em 35
crianças com idades entre 5 e 6 anos de idade. Os resultados mostraram correlação
significativa entre o conhecimento do nome das letras e a escrita de palavras. Verificou-se no
estudo, que as crianças obtiveram mais acertos na escrita de palavras que começavam com
sons correspondentes ao nome de letras conhecidas, como por exemplo: beijo, dedo, do que
em palavras como bicicleta, dado, em que o nome da letra não aparece claramente na
pronúncia da palavra.
O conhecimento do nome das letras “implica em um conhecimento semelhante ao da
leitura, uma vez que ambos os processos estão associados às mesmas habilidades de
processamento fonológico: a consciência fonológica, a memória de trabalho fonológica e a
velocidade de acesso às informações fonológicas” (Moraes & Capellini 2010, p. 326). Este
conhecimento induz a criança a observar as relações grafofonêmicas nas palavras, de modo
que se propõe a diminuir a tendência das mesmas em observar as grafias visuais ou
contextuais apenas, chamando sua atenção às relações fonéticas existentes. Barrera e Santos
(2016, p. 12) sugerem que “as crianças utilizam seus conhecimentos do nome das letras para
avançar em sua competência em estabelecer relações entre letras e sons, o que auxilia na
compreensão do princípio alfabético”, de modo que conhecer o nome das letras, conseguindo
acessar esta informação facilmente na memória, é considerado um facilitador da
aprendizagem da leitura.
Esta correlação entre o conhecimento do nome das letras e o processamento
fonológico foi identificada tanto na literatura nacional, como estrangeira (Ehri, 2013; Bowey,
2013; Moraes & Capellini, 2010; Cardoso-Martins & Batista, 2005), pois a capacidade de
recodificação fonológica, pressupõe por si só a compreensão de que as letras representam
sons, trazendo consigo a existência de um certo grau de consciência fonológica. De acordo
com Bowey (2013, p. 184), “crianças que conseguem nomear as letras com facilidade e que
possuem alguma compreensão pelo menos da aliteração devem ter mais facilidade para
entender o princípio alfabético quando ensinado explicitamente”. A autora destaca que mesmo
em crianças que ainda não foram expostas ao ensino explícito do princípio alfabético, como é
o caso da Educação Infantil, há importante correlação entre o conhecimento do nome das
letras e a sensibilidade fonológica. Segundo a autora, é produtivo considerar o
desenvolvimento da consciência fonológica e conhecimento do nome das letras como
codeterminantes da aprendizagem do princípio alfabético, do que estas habilidades
separadamente.

28
Estudos demonstraram ainda, que o ensino do princípio alfabético é facilitado quando
se ensinam os valores sonoros das letras e não apenas seus nomes (Scliar-Cabral, 2015;
Bowey, 2013; Santos & Maluf, 2010). Ao ensinar os sons das letras as crianças são levadas a
relacionar os fonemas emitidos pela fala aos grafemas transcritos, desenvolvendo a
consciência fonêmica. Programas de intervenção que combinavam o ensino do valor sonoro
das letras ao apoio visual das mesmas quando foram levadas a pensar em palavras e
segmentá-las, tiveram um melhor desempenho do que crianças que não tiveram estes recursos,
esta situação corrobora a ideia de mapeamento ortográfico que une a grafia das letras ao som
(fonema-grafema), sendo um facilitador para a aprendizagem. Há, ainda, evidências na
literatura de que a relação grafema-fonema é facilitada quando o ensino do princípio
alfabético é associado a gestos articulatórios envolvidos na produção dos fonemas (Sargiani,
2016).
Leonor Scliar-Cabral (2015, p. 32) afirma que além de ensinar os sons das letras, faz-
se necessário que os traços que compõem as letras estejam automatizados na memória. De
acordo com a autora a não automatização da relação fonema-grafema promove apagamento
das informações na memória de trabalho não permitindo extrair da decodificação seu
significado, para simplificar, “se o leitor usar a soletração, na palavra pato, do tipo pê-a-pa-tê-
o-to, quando chegar a última sílaba, a informação da primeira já se apagou e ele estará
impedido de reconhecer a palavra escrita e, em consequência seu significado”, deste modo a
automatização das relações letra-som, fonema-grafema se tornam essenciais.
É pertinente compreender ainda que, a aprendizagem das letras constitui uma tarefa de
difícil realização pelas crianças, posto que são pequenos traços ou mudanças de direção que
distinguem uma letra de outra, esta situação tornou-se evidente dados os estudos em
neurociências.
Uma informação interessante trazida por estes estudos diz respeito à escrita em
espelho. De acordo com as neurociências todas as crianças por volta dos 5 anos, sejam elas
japonesas, chinesas ou brasileiras passam por um momento em que a escrita em espelho
aparece. Esta situação, por sua vez, não representa um transtorno de leitura, mas uma
característica evolutiva da espécie humana que é denominada invariância visual. Assim,
reconhece-se que o cérebro se adaptou a operar com base na simetria visual necessária para
que o indivíduo pudesse reconhecer sua própria imagem. Na história da humanidade a
invariância visual era necessária para a sobrevivência. Quando um de nossos ancestrais se
deparava com um predador refletido na água, por exemplo, não lhe era pertinente observar se

29
este estava à direita ou a esquerda, sua reação deveria ser a de fugir imediatamente, levando o
cérebro a reforçar o mecanismo da simetria. Neste caso, ao aprender as letras, como por
exemplo p, d, b, P, as crianças provavelmente passarão por um momento no qual representem
as letras em espelho justamente pela estrutura cerebral, sendo necessário levar o cérebro a
desaprender este mecanismo mediante a instrução explícita no curso da aprendizagem do
sistema alfabético (Dehaene, 2012; Maluf & Sargiani, 2015).

3.2 Bases cerebrais e diferentes modelos explicativos para a leitura de palavras.

Ler é saber reconhecer todas as palavras escritas, independente de qual padrão de


letras esteja exposto (manuscrito, imprensa, caixa alta ou baixa, etc). Esta tarefa não é fácil,
pois o cérebro humano não foi criado para a atividade da leitura em sua estrutura primitiva
como o foi para o desenvolvimento da oralidade. Como vimos, a leitura é algo recente na
história da humanidade, de modo que o cérebro do Homo Sapiens não possuía áreas
específicas em sua filogenia para esta atividade. A leitura só é possível, porque o cérebro
possui algo conhecido como plasticidade neuronal, no qual adapta áreas cerebrais destinadas
anteriormente a outras atividades, tais como o reconhecimento de objetos e rostos, para
utilizá-las no reconhecimento especializado de palavras. A área cerebral que se especializou
no reconhecimento de palavras tem sido chamada pelos cientistas de Visual Word Form Area,
(VWFA), e corresponde à uma pequena região do córtex occiptotemporal esquerdo, na qual,
independentemente do idioma falado, a mesma região cerebral é acionada mediante a
atividade de leitura (Dehaene, 2012, Morais, 2013; Dehaene e Pegado, 2012; Pegado, 2015;
Scliar- Cabral, 2013).
Os estudos realizados por Dehaene e Pegado (2012) demostraram que a atividade da
leitura altera o funcionamento cerebral mais do que os cientistas imaginavam. Os autores
descobriram por meio de estudos com ressonância magnética (IMR) comparando o cérebro de
adultos letrados desde a infância, analfabetos e ex-analfabetos, que aprender a ler não
aumenta apenas as respostas da área ortográfica do cérebro (VWFA), mas também as
respostas relativas à oralidade. De acordo com os autores “a leitura aumenta igualmente as
respostas na linguagem falada no córtex auditivo , no chamado planum temporale, uma região
envolvida na codificação de fonemas (p. 11)”. Eles explicam que provavelmente a leitura seja
responsável por um refinamento do código fonético na região do planum temporale. Assim, a
VWFA além de estar relacionada ao reconhecimento das palavras, liga-se a outras regiões
30
cerebrais que se ocupam de distintos processos que intervém na linguagem, tais como,
processamento fonológico, sintático e semântico, demonstrando que aprender a ler modifica
várias estruturas cerebrais.
Dehaene (2012) explica que a leitura começa na retina, onde ao olhar para uma
palavra, esta é identificada por apenas cerca de 15% do campo visual, mais precisamente pela
região central da retina, chamada fóvea, que é composta por células fotorreceptoras chamadas
cones. Nesta região, ao se olhar para uma palavra é como se a retina escaneasse o texto a ser
lido, mas não o faz por inteiro e sim por pequenos movimentos (sacadas), o captor visual não
percebe as extremidades, apenas o lugar onde o olhar se fixa, ou seja, palavra por palavra, daí
a importância do reconhecimento automatizado das palavras.
Este processo ocorre pelo reconhecimento da invariância das letras e não por sua
forma global, assim independente do formato que a letra se apresente (itálico, cursiva,
manuscrita, etc) o cérebro a reconhece porque a sequência de letras não varia na palavra, o
que é chamado de reconhecimento ortográfico. Ao entrar em contato com uma palavra o
sistema visual, de forma muito rápida passa a desmembrá-la em várias formas de análise,
começando pelo reconhecimento das letras. De acordo com o autor “reconhecer uma palavra
consiste, primeiramente, em analisar essa cadeia de letras e aí descobrir as combinações das
letras (sílabas, prefixos, sufixos, radicais das palavras), para enfim, associá-las aos sons e aos
sentidos” (Dehaene, 2012, p. 21).
O processo de reconhecimento de palavras tem sido associado em um modelo clássico
ao percurso de duas rotas de leitura paralelas, a fonológica, responsável pela decodificação
das palavras no que concerne à relação grafema-fonema e a lexical, que corresponde à
identificação da forma ortográfica das palavras.
A rota de leitura fonológica seria responsável por transformar informação visual em
informação fonológica. Nesta rota a leitura seria realizada por meio das correspondências
grafema- fonema, em um processo que “passa desde o início do grafema às imagens acústicas
e delas a seu significado”, permitindo que palavras novas possam ser aprendidas e gravadas
na memória (Dehaene, 2012, p. 55).
No entanto, só a existência de uma via fonológica de reconhecimento de palavras não
seria suficiente para explicar o reconhecimento de todas as palavras vistas. Para palavras
homófonas como, por exemplo “cela” e “sela”, apenas o reconhecimento da pronúncia geraria
grande confusão de significados. É o fato de cada leitor reconhecer a forma ortográfica destas
palavras por uma espécie de dicionário mental, denominado léxico mental, que permite que

31
este tipo de palavras, ou palavras irregulares, como “taxi”, possam ser lidas corretamente.
Este acesso direto ao léxico mental, nos modelos clássicos de reconhecimento de palavras, foi
denominado de rota de leitura lexical.
No processo de reconhecimento das palavras alguns autores destacam, portanto, que
existiam dois caminhos possíveis, ou seja, palavras regulares seriam lidas por uma via
fonológica enquanto palavras irregulares por uma via de acesso direto ao léxico ortográfico
(Dehaene, 2012; Faísca, Araújo & Reis, 2015; Salles & Correa, 2014).
No entanto, esta dicotomia entre fonologia (rota fonológica) e ortografia (rota lexical)
representada por duas vias de leitura é motivo de controvérsia na literatura. Os modelos de
dupla rota receberam críticas por considerarem que o acesso ao léxico mental, ativado para a
leitura de palavras irregulares e homófonas não se vale em nenhum momento do processo de
decodificação. As palavras são lidas de modo automático como se existisse uma identidade
fixa da palavra no cérebro, uma espécie de caixinha onde a palavra e seu significado
estivessem armazenados. Desse modo, tem-se a hipótese de que a mediação da fonologia
exercida pelo processo de decodificação tem um atraso em relação ao acesso direto ao léxico
ortográfico, demonstrando que em leitores hábeis esta rota não seria utilizada para a maioria
das palavras. Estudos sobre mascaramento retrógrado e priming questionam esta concepção.
O mascaramento refere-se ao tempo no qual as palavras ficam visíveis ao serem
apresentadas no computador em experiências de leitura. O priming envolve a maneira como
uma sequência de letras, por exemplo GATO, pode afetar outra palavra alvo (PATO) (Orden
& Kloss, 2013).
Orden e Kloss (2013) fizeram uma revisão de literatura sobre a relação entre a
fonologia e o reconhecimento de palavras e identificaram que dependendo do modo como a
pesquisa é conduzida há evidências a favor ou contra o processo de decodificação na leitura
das palavras. Assim, os estudos de priming realizados por Ferrand e Grainger (1992; 1993;
1994 apud. Orden & Kloss, 2013) revelaram uma facilitação superior da ortografia em relação
à fonologia, sugerindo que diante de uma ativação prévia de palavras similares, a ortografia
da palavra é acionada num intervalo de 29 milissegundos sugerindo que o acesso direto teria
prioridade sobre o acesso mediado pela decodificação fonológica.
Por outro lado, os estudos de Berent e Perfetti (1995, apud. Orden & Kloss, 2013)
sobre mascaramento retrógrado revelaram que a fonologia está disponível por cerca de 20 a
40 milissegundos logo após o sujeito enxergar uma palavra, sugerindo que a fonologia e a
ortografia são ativadas ao mesmo tempo o que demonstraria a participação do processo de

32
decodificação mesmo para o acesso ao léxico mental ortográfico.
Orden & Kloss (2013) destacam que há historicamente um impasse representado pelo
papel da fonologia como mediadora do processo de reconhecimento de palavras e o acesso
direto somente por uma rota lexical gerando diferentes modelos explicativos para o
reconhecimento de palavras.
Ao fazer uma revisão da literatura sobre os modelos de leitura identificou-se que um
dos primeiros modelos a abordar o reconhecimento de palavras foi proposto por McClelland e
Rumelhart em 1981, e recebeu o nome de modelo de ativação interativa. Este modelo propõe
que existem três níveis hierárquicos de ativação das palavras no cérebro: o nível da
característica das letras, no qual cada neurônio é sensível a um traço que possa representá-la,
o nível da letra e, por fim, o nível da palavra. Neste modelo, as informações passam de um
nível para o outro bidirecionalmente, ou seja, numa ordem ascendente tendo como início os
dados sensoriais obtidos ao visualizar a palavra, começando pelo traçado das letras, passando
pelas letras e palavras, mas também de ordem descendente, na qual a representação das
palavras, obtida por meio de uma cognição de ordem elevada, identifica as experiências
anteriores do indivíduo com aquela palavra influenciando as escolhas de ordem inferior, ou
seja, a escolha das letras e traços (Dehaene, 2012; Sternberg, 2010; Lukper, 2013). A Figura 3
representa o modelo de ativação interativa para melhor compreensão.

Figura 3- Modelo de ativação interativa

Fonte: Sternberg (2010, p. 343)

33
Dehaene (2012, p.59) explica que o sistema nervoso humano é composto por
aproximadamente 100.000 milhões de neurônios, sendo “um arquétipo de um sistema
maciçamente paralelo, no qual múltiplos elementos efetuam, em paralelo, operações simples e
formam coalizões que entram em competição umas com as outras por meio de sinapses
excitantes e inibidoras”.
Ao visualizar uma palavra, neurônios são ativados numa espécie de voto pelas
melhores letras que a compõe, assim sinapses excitantes identificam os diferentes traços que
podem compor aquela letra enquanto conexões inibidoras detectam os traços que não as
compõem. De forma dinâmica, ocorre uma disputa na rede neuronal, numa espécie de jogo
em que as letras e as palavras “ou se sustentam, ou se censuram ou se eliminam mutuamente
(Dehaene, 2012, p. 60)”.
Embora o modelo tenha obtido êxito em explicar como o cérebro reconhece as
palavras, este recebeu críticas, pois representava apenas o reconhecimento ortográfico da
palavra, mas não sua relação com a semântica, assim outros modelos surgiram para tentar
superá-lo.
Os novos modelos tinham como princípio a ideia de que “nosso sistema lexical são
códigos subsimbólicos distribuídos que representam os atributos das palavras que
conhecemos (Lupker, 2013, p.67)”, recebendo o nome de modelos de processamento
distribuído em paralelo (PDP). Dentre estes modelos, Plaut (2013) destaca o modelo proposto
por Seidenberg e McClelland em 1989. Neste modelo considera-se que as informações sobre
as palavras estavam distribuídas no cérebro e compartilhavam de representações de ordem
ortográfica, fonológicas e semânticas, este modelo ficou conhecido como modelo triangular.
O modelo traz a ideia de que as unidades de cada tipo mencionadas são ligadas às outras
unidades estabelecendo as conexões apropriadas para a representação da palavra na memória.
Quando uma palavra é vista, as três unidades começam a se ativar e inibir mutuamente,
procurando por padrões aceitáveis para a palavra. No início os padrões demoram a ser
encontrados, passando a ser mais rápidos e exatos com o nível de exposição à palavra.
Sargiani (2016) destaca que nos modelos de processamento paralelo e distribuído as
informações não são processadas de modo linear, mas que o cérebro extrai regularidades da
realidade vivida por cada indivíduo, fazendo conexões que são mais previsíveis para cada um.
Neste sentido, Orden e Kloss (2013, p. 89) completam que cada leitor tem um histórico
singular de variação entre ortografia, fonologia e semântica de palavras. “As pronúncias
podem ter vínculos fortes ou fracos com a semântica, com base no grau diferente de

34
familiaridade de diferentes leitores com diferentes palavras”.
O modelo de processamento distribuído paralelo representa um modelo conexionista
de leitura. Nestes modelos considera-se que há uma relação de retroalimentação entre os
circuitos que operam a fonologia, a ortografia e a semântica e que todos são ativados muito
rapidamente frente à palavra e ao mesmo tempo. Sargiani (2016) explica que os modelos
conexionistas trabalham com a exploração de redes neurais artificiais que imitam as
propriedades neuronais do cérebro, sendo modelos que possuem validação dos estudos em
neurociências.
Nessa mesma perspectiva conexionista, Linnea Ehri (2013) propõe a teoria do
mapeamento ortográfico como forma de reconhecimento das palavras. Por ser adotado como
referencial teórico desta pesquisa, será melhor detalhado a seguir.

35
3.3 Como se dá a leitura de palavras: teoria de fases de Linnea Ehri.

Ehri (2013, 2014) afirma que quando os leitores decodificam uma palavra extraindo os
fonemas na relação grafema-fonema, conexões são ativadas em seu cérebro, que unem a
sequência de letras e sons a seu significado e garantem a permanência das grafias na memória,
este processo é denominado mapeamento ortográfico. O mapeamento conecta a grafia das
palavras à sua pronúncia como uma espécie de cola que gruda as letras usadas para escrever
as palavras ao som que elas produzem, levando a memória a associar seu significado sempre
que se deparar com aquela sequência de letras e sons. Este processo ocorre numa espécie de
rota visual-fonológica cuja eficiência “depende da qualidade da representação ortográfica
estocada na memória (Guimarães, 2003, p. 158)”.
Nesta teoria considera-se que os indivíduos já possuem as identidades fonológicas,
sintáticas e semânticas das palavras da sua língua materna armazenadas na memória devido ao
contato que possuem com a língua nativa. Este armazenamento ocorre de modo implícito, de
modo que o cérebro adquire as informações acústicas, articulatórias, fonêmicas e de
significado das palavras ao ouvi-las. Quando inicia o processo de alfabetização uma nova
identidade é adicionada à palavra - a identidade ortográfica, que ao fundir-se com as demais,
não como uma figura global, mas como uma sequência organizada de letras, formam uma
única identidade da palavra que será guardada no léxico mental como uma amalgama
(Guimarães, 2003).
Morais (2013) esclarece que em um processo inconsciente as ortografias das palavras
vão pouco a pouco sendo armazenadas na memória decorrentes do processo de decodificação
grafema-fonema, estando também relacionada ao número de vezes de exposição às mesmas.
Ao decodificar a palavra a criança ensina a si mesma as representações ortográficas e
fonológicas que a compõe, combinando sua decodificação ao aumento progressivo do
vocabulário vai formando seu léxico mental ortográfico que será responsável pela leitura
automatizada de palavras.
Desse modo, destaca-se a relação de reciprocidade entre a grafia das palavras e sua
pronúncia, evidenciando que a escrita não é algo que está representado somente papel, ao
contrário, há no cérebro a representação das grafias das palavras armazenadas na memória e,
portanto, estas exercem um papel importante no processo de alfabetização. Em pesquisa
realizada por Ehri (2013), crianças do 2º ano aprenderam palavras novas por meio de dois
métodos distintos: o grupo experimental aprendia as palavras ouvindo-as e tendo acesso à sua
36
escrita por meio de cartões com sua forma ortográfica, enquanto o grupo controle somente
ouvia as palavras em um número de vezes mais elevado para compensar a falta da escrita.
Após o treinamento as crianças foram solicitadas a escreverem as palavras aprendidas, sendo
a resposta do grupo experimental significativamente superior ao do grupo controle. Esta
situação é explicada pela autora por meio da importância do mapeamento ortográfico, ou seja,
da relação de amalgamação existente entre os grafemas e fonemas que colam a grafia das
palavras na memória e a associam a seu significado e pronúncia, facilitando a aprendizagem
de palavras novas. Sargiani (2016, p.43) completa que a instrução do sistema de escrita
alfabética que prioriza o acesso das crianças à grafia das palavras, “ajuda a aprender melhor
as palavras, tanto a sua grafia, quanto a pronúncia e significados, do que somente quando
ouvem e repetem as palavras do vocabulário em voz alta”.
O processo de reconhecimento de palavras é explicado por Ehri (2013, 2014) mediante
quatro procedimentos distintos: predição, analogia, decodificação e reconhecimento
automatizado.
A predição representa uma leitura que se vale de informações contextuais, podendo
apoiar-se em imagens, logos, uma letra inicial, que levam o leitor a prever (adivinhar) o que
pode estar escrito. A analogia é uma estratégia de leitura na qual parte de palavras conhecidas
são usadas para o reconhecimento de palavras desconhecidas que possuem semelhança
ortográfica. Por exemplo, ao tentar ler palhaço, a criança pode deduzir que está escrito pato,
pois reconheceu o “PA” inicial e inferiu o restante. Na decodificação a leitura se dá pela
compreensão da relação grafema-fonema, ou seja, a criança começa a compreender a relação
entre o som e a grafia das palavras. E, a leitura por reconhecimento automatizado ocorre
quando a exposição à palavra ativa na memória seu significado e pronúncia sem precisar do
recurso das demais estratégias citadas.
De acordo com Ehri (2013), cada um destes modos de realizar a leitura é importante
para a aprendizagem das crianças e atende a situações de leitura específicas, mas o
reconhecimento automatizado de palavras torna-se prioritário, já que é necessário para o
desenvolvimento do leitor hábil, permitindo que sua atenção se desloque do processo de
decodificação, que exige uma atenção deliberada e consciente às relações fonema-grafema,
voltando-se para a compreensão das sentenças e do significado do texto.
Para chegar à leitura automatizada, as crianças passam por diferentes fases de
compreensão do sistema de escrita alfabética, nas quais várias estratégias de leitura e escrita
podem ser usadas concomitantemente, ocorrendo, no entanto, o predomínio de uma sobre as

37
outras. A analogia a fases de desenvolvimento da leitura se contrapõe à ideia de estágios de
desenvolvimento, os quais supõem que em cada estágio a criança utiliza somente um tipo de
estratégia para solucionar problemas, semelhante às ideias propostas por Jean Piaget (Piaget,
2015). De acordo com Sargiani (2016, p. 36) as teorias conexionistas utilizam a metáfora de
ondas, pois estas permitem uma explicação mais aprimorada das estratégias que as crianças
utilizam para solucionar problemas. O autor explica que “em diferentes momentos
predominam tipos distintos de estratégias, mas é sempre possível retornar a estratégias
anteriores se for necessário, por exemplo, quando a situação é nova ou quando se tem pouca
experiência”.
Ehri (2013, 2014) identificou quatro fases de leitura que se caracterizam pelo tipo de
conexões predominantes que são realizadas quando o leitor se depara com a palavra escrita:
pré-alfabética, alfabética parcial, alfabética completa e alfabética consolidada.
Na fase pré-alfabética os leitores se valem de pistas visuais, contextuais ou
visuográficas, para realizar o reconhecimento de palavras. Muitas vezes utilizam-se das letras
do próprio nome, ou da letra inicial de um familiar que são conhecidas para adivinharem o
que está escrito (visuográficas), ou ainda de logos, imagens ou figuras que lhes permite uma
resposta aceitável na leitura da palavra (contextuais). Nesta fase, ainda não foram
estabelecidas na memória conexões grafofonêmicas, ou seja, as crianças apresentam mais
correspondência entre a escrita e seus significados do que na correspondência entre escrita e
som.
A fase parcialmente alfabética inicia-se com o conhecimento do alfabeto, identificando
os sons que algumas letras produzem ao tentar reconhecer as palavras. São formadas as
primeiras conexões na memória entre letra e som, mas estas ainda são parciais, geralmente
reconhecendo os sons mais salientes da palavra (primeira ou última letra). Pelo
reconhecimento de sons iniciais, geralmente, nesta fase, as crianças abandonam a leitura por
pistas visuais e passam a adotar as pistas fonéticas no reconhecimento das palavras embora
ainda não possam decodificá-las (Ehri, 2013).
A fase alfabética completa caracteriza-se pela habilidade de decodificação das palavras,
que se dá pela conexão das grafias das palavras com sua pronúncia estabelecida pela relação
grafema – fonema. Cada nova palavra lida fixa um lugar específico na memória, estando
relacionada a seu significado como uma palavra única que não é confundida com outra
homófona. Os novos leitores tomam consciência dos fonemas (consciência fonêmica), sendo
esta a principal habilidade que lhes permitirá aprender novas palavras pela segmentação

38
fonêmica.
Na medida em que novas palavras são aprendidas e com um período curto de
exposição às mesmas, estas já podem ser lidas de modo automatizado, caracterizando a fase
alfabética consolidada. Nesta fase as crianças adquirem maior conhecimento sobre a
ortografia das palavras, sabendo manipular os morfemas e as sílabas, habilidades que as
ajudam no reconhecimento rápido das palavras escritas, podendo lê-las com pouco ou nenhum
esforço, dedicando sua atenção à compreensão do texto.

39
4 Objetivo e Hipóteses

Foi objetivo desta pesquisa analisar a aprendizagem inicial da leitura e da escrita de


palavras em suas relações com o conhecimento do nome das letras e o desenvolvimento de
habilidades metafonológicas em crianças que ingressam no Ensino Fundamental.
A leitura e a escrita foram tomadas como variáveis dependentes enquanto que o
conhecimento do nome das letras e a consciência fonológica foram tomados como variáveis
independentes, esta última medida pelo conhecimento de rimas, de segmentação silábica e de
deleção fonêmica.

Pergunta-se:

1- O melhor desempenho inicial nas habilidades de consciência fonológica apresenta-se


correlacionado ao melhor desempenho em leitura e escrita de palavras ao final do ano
letivo? Qual das três variáveis da consciência fonológica estudadas melhor prediz a
aprendizagem da leitura e da escrita de palavras?

2- O melhor desempenho inicial no conhecimento de letras apresenta-se correlacionado


ao melhor desempenho na leitura e escrita de palavras ao final do ano letivo,
mostrando assim um potencial preditivo destas habilidades?

A literatura aponta para a ideia de que as habilidades metafonológicas e o


conhecimento do nome das letras são facilitadores da aprendizagem da linguagem escrita e
que a consciência fonêmica é a habilidade metafonológica que melhor prediz a aprendizagem
da leitura e da escrita (Barrera & Maluf, 2003; Guimarães, 2003; Maluf & Sargiani, 2015;
Andrade, Andrade & Capellini, 2014). Neste sentido, tem-se como hipótese que as crianças
que já ingressarem com um bom desenvolvimento das habilidades metafonológicas e
conhecimento do nome das letras terão sua aprendizagem da leitura e da escrita facilitada.
Acredita-se, também que a consciência fonêmica será a habilidade da consciência
fonológica que melhor prediz a aprendizagem da linguagem escrita (Sénéchal, 2011; Bowey,
2013; Morais, 2014).

40
5 Método

Trata-se de um estudo longitudinal realizado no período de um ano escolar. O projeto


contou com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice 1) que foi entregue à
instituição escolar e aos pais dos alunos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética sob o número
67869617.8.0000.5482.

5.1 Local e participantes

O estudo foi realizado em uma escola da rede municipal de São Paulo, situada no
bairro de Itaquera, Zona Leste. O local foi escolhido devido à facilidade de acesso da
pesquisadora, pois a mesma trabalhava na unidade escolar com o 3º ano do Ensino
Fundamental.
A instituição atendia a 940 alunos que, segundo dados de seu Projeto Político
Pedagógico obtidos em 2016, eram oriundos de famílias de classe popular, das quais 60%
viviam com renda de até mil reais, 28% de até dois mil reais, 9% de até 3 mil reais e 3%
acima de três mil reais. Destas famílias, 28% eram beneficiadas pelo programa Bolsa Família
e 3% pelo programa Renda Mínima. Ainda, de acordo com o PPP da unidade, o grau de
escolaridade dos responsáveis que contribuem com a maior parte da renda familiar era
representado por 18% de pais com o Ensino Fundamental incompleto, 8% com o Ensino
Fundamental completo, 15% com o Ensino Médio incompleto, 40% com o Ensino Médio
completo, 11% com Ensino Superior incompleto, 7% Ensino Superior completo e 1%
cursaram Pós-Graduação.
O quadro de professores da unidade escolar é estável, contando com muitos
professores efetivos de cargo e poucas remoções, o que permite uma continuidade no trabalho
pedagógico. Na ocasião de realização da pesquisa a escola possuía três primeiros anos,
totalizando 90 alunos. Participaram desta pesquisa alunos das três turmas cujos pais aceitaram
sua participação mediante o preenchimento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
no qual foram detalhados os objetivos da mesma e as atividades a serem realizadas,
caracterizando, desta forma, uma amostragem por conveniência
Assim, a turma “A” possuía 30 alunos, dos quais 13 participaram da pesquisa. A
turma “B” possuía 30 alunos, sendo 16 o número de participantes do estudo. Na turma “C”,
dos 30 alunos, 14 foram os participantes. A distribuição dos alunos por turma, assim como por
41
sexo pode ser observada mais adequadamente na tabela a seguir:

Tabela 1- Distribuição dos participantes por turma e sexo

Sexo Turma A Turma B Turma C Total


Masculino 8 13 9 30
Feminino 5 3 5 13
Total 13 16 14 43

A idade das crianças foi tomada como uma variável discreta, sendo que uma criança
tinha 5 anos, uma 7 anos e as demais 6 anos completos.

5.2 Instrumentos e Procedimentos

O estudo foi composto por três seções de coleta de dados realizadas nos meses de
março, agosto e novembro de 2016, nas quais os escolares foram avaliados por um conjunto
de tarefas de consciência fonológica, conhecimento do alfabeto, leitura e escrita de palavras.
Todas as coletas foram realizaram em ambientes reservados pela unidade escolar que
não contavam com ruídos ou distrações para as crianças. Assim, a primeira coleta foi
realizada na sala de Apoio Pedagógico e as demais na sala de vídeo.
Para a coleta dos dados foram adotados os seguintes instrumentos e procedimentos,
que foram aplicados individualmente, em sessões de aproximadamente 20 minutos, seguindo
sempre a mesma ordem de aplicação e realizados pela própria pesquisadora.

5.2.1 Tarefa de conhecimento do nome das letras

A tarefa consiste no reconhecimento das letras do alfabeto pelos alunos. Assim, com o
recurso do programa PowerPoint, as letras do alfabeto foram apresentadas de modo aleatório,
solicitando que as crianças as nomeassem. Foram apresentadas somente letras maiúsculas
com as quais as crianças já estavam habituadas de acordo com os procedimentos da Unidade
Escolar.
Se a criança não sabia uma letra a pesquisadora dizia que não tinha problema, pois ela

42
ainda iria aprender.
Para análise foi adotado o critério de um ponto para acerto e zero para erro, sendo o
escore máximo 26. (Anexo 1)

5.2.2 Tarefas de Consciência Fonológica

Para avaliar a consciência fonológica foram realizadas as tarefas de Intruso de Rimas,


Segmentação Silábica e Deleção Fonêmica. As tarefas de Intruso de Rimas e Segmentação
Silábica foram adaptadas dos instrumentos utilizados por Puliezi (2010). Da tarefa original de
Intruso de Rimas foram modificadas algumas imagens que estavam em escala de cinza,
optando-se por apresentar todas as figuras de teste coloridas, ficando em escala de cinza
apenas as pranchas de treino. Na tarefa de Segmentação silábica foram retiradas as imagens
de palavras que representavam monossílabos por serem considerados difíceis para crianças
ingressantes do Ensino Fundamental.
A tarefa de Deleção Fonêmica foi adaptada de Sargiani (2013). A tarefa original
contava com dois itens de treino e 20 itens de teste. No entanto, por ser uma tarefa
considerada de muita dificuldade, optou-se pela aplicação de apenas 10 itens de teste, tendo
como propósito não cansar as crianças.

Intruso de Rimas (Apêndice 3): consistiu em identificar entre três palavras diferentes
(ex: girafa, alicate, tomate) aquela que não rimava com as demais. Assim, para evitar
problemas com a memória as palavras foram apresentadas por figuras. Cada conjunto de três
figuras foi apresentado na tela do computador, no programa PowerPoint. A pesquisadora
perguntava à criança qual a palavra que apresentava o som final diferente, ou seja, aquela que
não rimava com as demais. A tarefa foi composta por 3 pranchas de treinamento e 10 itens de
teste.
Para análise foi atribuído um ponto para acerto e zero para erro, sendo o escore
máximo 10 pontos.

Segmentação Silábica (Apêndice 4): foi composta por 13 palavras, sendo três itens de
ensaio e 10 de teste. Foram apresentadas 13 figuras no programa PowerPoint para os alunos
com o objetivo de que identificassem quantos “pedacinhos” tinham as palavras, ou seja,
43
quantas sílabas. À medida que as imagens apareciam, as crianças deveriam pegar um grão de
feijão para cada pedacinho da palavra, de modo que percebessem as sílabas. Assim,
apontando com seus dedos as crianças repetiam as palavras mostrando cada pedacinho que as
compunham.
Para análise foi atribuído um ponto para acerto e zero para erro, sendo o escore
máximo 10 pontos.

Deleção Fonêmica (Apêndice 5): consistiu na subtração do fonema inicial de uma


lista de palavras. Assim, foram apresentadas oralmente uma série com 12 palavras, sendo 2
itens de treino e 10 palavras de teste, pedindo que a criança repetisse a palavra subtraindo o
som inicial. Todas as palavras foram pensadas para formarem novas palavras quando retirado
o fonema inicial (ex: luva – uva), desse modo, tinha-se como objetivo fazer parecer para a
criança um jogo de descoberta de novas palavras, que estão escondidas dentro das palavras
ditadas. No momento de iniciar a tarefa a pesquisadora dizia às crianças:
- Agora nós vamos brincar de um jogo de encontrar palavras mágicas. Elas são
mágicas, pois têm uma palavra escondida dentro da outra. Nós temos que descobrir qual é a
palavra escondida. Eu vou te dar o exemplo: Se eu tirar o sonzinho do começo da palavra
Luva vai ficar (...)? Esperava-se a resposta da criança e se ela errasse apresentava-se lhe
oralmente a resposta certa nos dois itens de treino.
Para análise foi atribuído 1 ponto para acerto e zero para erro, obtendo um escore
máximo de 10 pontos. Após três erros consecutivos a tarefa foi interrompida e atribuída a
pontuação zero para as palavras restantes.

5.2.3 Tarefa de Leitura de Palavras Isoladas

A tarefa foi adaptada da realizada por Sargiani (2013) para qual algumas alterações
também foram realizadas. A tarefa original contava com uma lista de 120 palavras distribuídas
por diferentes critérios: 20 palavras regulares de alta frequência, ou seja, palavras sem grandes
dificuldades ortográficas e que fazem parte do cotidiano das crianças, 20 palavras irregulares
de alta frequência, 20 palavras regulares de baixa frequência, 20 palavras irregulares de baixa
frequência e 40 pseudopalavras. Optamos pela redução da lista novamente com o propósito de
não fadigar as crianças.

44
Desse modo, a tarefa aplicada consistiu na leitura de três listas de palavras pelos
alunos, listas estas que se diferenciaram ao longo da pesquisa aumentando em número de
palavras e grau de dificuldade.
A primeira lista foi composta por 10 palavras regulares de alta frequência (ex; duas,
fala), aplicadas utilizando-se cartões individuais, com escritas em letra maiúscula, permitindo
que os alunos pudessem se apoiar no acompanhamento dos dedinhos ao fazerem a leitura.
Para a segunda e terceira coleta de dados a lista foi composta por 30 palavras, sendo 10
regulares de alta frequência, 10 irregulares de alta frequência (ex: onça, amanhã) e 10
pseudopalavras que, semelhantemente, foram apresentadas em cartões individuais em letra
maiúscula (Apêndices 6 e 7).
Para análise foi atribuído 1 ponto para acerto e zero para erro, sendo o escore máximo
da primeira coleta 10 pontos e das demais 30.

5.2.4 Tarefa de Escrita de Palavras Isoladas

Esta tarefa foi retirada da tarefa realizada por Pinheiro (2006) e consistiu na escrita de
palavras pelos alunos sob a orientação da pesquisadora (Anexo 2). Foram realizadas três
seções de ditado com as crianças, que assim como na tarefa de leitura aumentaram em número
de palavras. Desse modo, a primeira coleta foi composta apenas por 10 palavras regulares de
alta frequência, sendo acrescentadas para a segunda e terceira coletas outras 20 palavras,
alternadas entre regulares e irregulares, que faziam parte do cotidiano das crianças.
Foi orientado às crianças que escrevessem do melhor modo possível.
Para análise foram atribuídos pontos para cada palavra de acordo com os seguintes
critérios: 3 pontos para acerto (alfabético consolidado, ex: GELADO, CASAMENTO), 2
pontos para escrita da palavra mesmo contendo erros ortográficos (alfabético completo, ex:
GLADO, KASAMENTO), 1ponto para escrita de parte da palavra com correspondência
sonora (alfabético parcial, ex: GLO, KASTO) e zero para escritas com base em pistas
contextuais (fase pré-alfabética, ex: SXTK, METSD), sendo o escore máximo 30 pontos para
a primeira coleta e 90 pontos para as demais. A escrita dos alunos e, portanto, sua pontuação,
foi analisada de acordo com as fases de escrita de Linnea Ehri, (2013).

A Tabela 2 sintetiza as tarefas que foram realizadas no decorrer do estudo:

Tabela 2 - Tarefas realizadas por coleta

45
1ª Coleta 2ª Coleta 3ª Coleta
Conhecimento do nome das letras Conhecimento do nome das letras Conhecimento do nome das letras
Intruso de rimas Intruso de rimas Intruso de rimas
Segmentação silábica Segmentação silábica Segmentação silábica
Deleção fonêmica Deleção fonêmica Deleção fonêmica
Leitura de palavras isoladas ¹ Leitura de palavras isoladas ² Leitura de palavras isoladas ²
Escrita de palavras isoladas ¹ Escrita de palavras isoladas ³ Escrita de palavras isoladas ³
¹ 10 palavras regulares de alta frequência
² 30 palavras, sendo 10 palavras relugares de alta frequência, 10 palavras irregulas de alta frequência e 10 pseudopalavras
³ 30 palavras, alternada entre relugares e irregulas de alta frequência

Após realizadas as três seções de coleta de dados, o material bruto obtido foi tabulado
e submetido a procedimentos de análise estatística apresentados no próximo capítulo.

46
6 Apresentação e análise dos resultados

Primeiramente foram calculadas as medidas descritivas do desempenho das crianças


com relação às variáveis independentes (Conhecimento de Letras, Conhecimento de Rimas,
Segmentação Silábica e Deleção Fonêmica) e dependentes (Leitura de Palavras e Escrita de
Palavras) nos três momentos de coleta de dados. Com esta análise buscou-se verificar como se
apresentavam estas variáveis na ocasião do ingresso no Ensino Fundamental e sua evolução
ao longo do ano escolar.
Em seguida, foram realizados testes de correlação de Pearson e Regressão Linear
Múltipla, os quais permitiram analisar a relação entre as variáveis estudadas na pesquisa,
assim como esclarecer quais das variáveis independentes se apresentariam como preditoras da
leitura e da escrita de palavras ao final do ano letivo. Os dados obtidos nas coletas foram
processados pelo programa SPSS (Statistical Package of Social Sciences) 20.0, sendo o nível
de significância adotado nesta pesquisa de 0,05.

6.1. Análise descritiva dos resultados

A Tabela 3 descreve os resultados dos desempenhos dos alunos nos três momentos de
coleta de dados com relação à média e desvio padrão.

Tabela 3 - Descrição do desempenho dos escolares nos três momentos de coleta de dados
1ª Coleta 2ª Coleta 3ª Coleta
Variável N Desvio Desvio Desvio
Média Mínimo Máximo Média Mínimo Máximo Média Mínimo Máximo
Padrão Padrão Padrão
CL 43 18,02 7,43 0 26 23,16 4,44 5 26 23,79 4,50 8 26
CR 43 4,44 2,23 0 10 6,14 2,32 2 10 6,98 2,11 2 10
SS 43 8,07 1,86 2 10 9,07 0,94 6 10 9,53 0,85 6 10
DF 43 0,67 1,41 0 7 3,60 3,96 0 10 5,56 3,97 0 10
LP 43 0,42 1,38 0 8 12,30 12,55 0 30 18,86 12,00 0 30
EP 43 6,47 5,21 0 23 53,74 27,57 0 88 62,93 24,66 11 90
Legenda: Conhecimento do nome das letras (CL); Conhecimento de Rima (CR); Segmentação Silábica (SS); Deleção Fonemica (DF); Leitura de
Palavras (LP) e Escrita de Palavras (EP).

Conforme observado na Tabela 3, foi possível perceber que ao ingressarem no Ensino


Fundamental os alunos da amostra já apresentavam um bom conhecimento do nome das letras
com média de 18,02 letras, o que representa 69% do conhecimento do alfabeto. O desvio
padrão apresentado (DP = 7,43) na primeira coleta de dados, demonstra uma grande
variabilidade entre os alunos, evidenciando que a amostra não era homogênea quanto ao
conhecimento que apresentavam do alfabeto. Sobre este aspecto, destaca-se que dentre os 43
47
alunos, dois não reconheceram nenhuma letra do alfabeto na ocasião do ingresso no Ensino
Fundamental.
Observa-se na mesma Tabela que o conhecimento de letras apresentado pelas crianças
progride durante o ano letivo. Contudo, nota-se que mesmo ao final do ano letivo algumas
crianças não conseguiram adquirir o conhecimento de todas as letras do alfabeto, sendo o
desempenho médio das crianças de 23,79 letras na ocasião da terceira coleta de dados.
Observando a Tabela 3 no que diz respeito ao Conhecimento de Rimas, é possível
afirmar que as crianças ingressaram no Ensino Fundamental com algum conhecimento de
rimas, obtendo um desempenho médio de 4,44 acertos. Este conhecimento apresentou
melhora discreta no decorrer do ano, alcançando ao término deste, média de 6,98.
A variável Segmentação Silábica foi a tarefa na qual as crianças apresentaram melhor
desempenho desde a primeira coleta de dados. No início do ano a média foi de 8,07 acertos
(DP= 1,86), chegando no final do ano a um resultado de teto com média de 9,53 e desvio
padrão de 0,85 demonstrando que não havia muita variabilidade entre as crianças, ou seja, as
crianças, em sua maioria, conseguiram realizar esta tarefa sem muita dificuldade desde o
ingresso no Ensino Fundamental.
A Deleção Fonêmica, por sua vez, mostrou-se como a mais difícil tarefa realizada
pelas crianças. Na ocasião da primeira coleta observa-se um desempenho muito baixo, sendo
a média de acertos do grupo de 0,67. É possível observar que quase nenhuma criança
conseguiu realizar a tarefa, pois o desvio padrão foi de apenas 1,41, ou seja, o baixo
desempenho das crianças não apresentou grande variabilidade.
Com o ensino sistemático da linguagem escrita esta tarefa passou a ser realizada com
melhor desempenho pelos alunos, mas não deixou de ser o aspecto da consciência fonológica
no qual as crianças apresentaram maior dificuldade em comparação com os demais, com
média de 5,56 ao final do ano. Observa-se ao examinar o desvio padrão (DP=3,97) que,
embora algumas crianças possam ter chegado ao final do ano dominando bem esta habilidade,
apresentaram - se outras que não conseguiram realizar 50% da tarefa mesmo ao final do ano
letivo.
No que se refere à variável dependente Leitura de Palavras Isoladas nota-se que ao
ingressarem no Ensino Fundamental poucas crianças conseguiram ler palavras, sendo a média
apresentada 0,42, com um desvio padrão de 1,38 que indica um desempenho homogêneo da
amostra. No decorrer das coletas (agosto e novembro) este resultado apresentou evolução
significante. No entanto, a amostra passa a apresentar uma grande variabilidade em seu

48
desempenho evidenciada pelo desvio padrão de 12,55 e 12,00 respectivamente.
A variável dependente Escrita de Palavras apresenta grande variação entre a primeira e
a terceira coletas, este cenário é compatível com a evolução esperada. A média na primeira
coleta corresponde a 6,47 acertos (DP= 5,21) o que demostra certa homogeneidade da
amostra na ocasião quanto a seu baixo desempenho, já que neste momento a escrita variava de
0 a 30 pontos. Na coleta realizada no meio do ano observa-se um salto significativo da média
de acertos (53,74) assim como do desvio padrão (DP=27,57). Compreende-se, desse modo,
que melhorou a média de desempenho da amostra, porém, este se tornou muito heterogêneo.
A terceira coleta, por sua vez, apresenta uma evolução discreta dos resultados em relação à
coleta anterior, o que permite afirmar que no segundo semestre não se obteve grandes avanços
no desempenho da Escrita de Palavras.

6.2. Resultados das correlações entre as variáveis independentes (Conhecimento de


Letras, Conhecimento de Rimas, Segmentação Silábica e Deleção Fonêmica) e a
variáveis dependentes Leitura de Palavras e Escrita de Palavras

Com o objetivo de identificar se o melhor desempenho inicial em consciência


fonológica e conhecimento do nome das letras estaria associado ao melhor desempenho em
leitura e escrita de palavras buscou-se verificar a correlação entre as variáveis independentes
(Conhecimento de Letras, Conhecimento de Rima, Segmentação Silábica, Deleção Fonêmica)
nos três momentos de coleta de dados e as variáveis dependentes Leitura de Palavras e Escrita
de Palavras ao final do ano letivo, ou seja, terceira coleta de dados. Esse trabalho foi realizado
por meio do cálculo do Coeficiente de Correlação de Pearson uma vez que as variáveis
envolvidas são quantitativas.

6.2.1 Correlações entre as variáveis independentes Conhecimento de Letras (CL),


Conhecimento de Rima (CR), Segmentação Silábica (SS) e Deleção Fonêmica
(DF) e a variável dependente Leitura de Palavras (LP)

A Tabela 4 apresenta as correlações entre as variáveis independentes (CL, IR, SS, DF)
e a variável dependente LP considerando nos três momentos de coleta de dados.

49
Tabela 4 – Correlação de Pearson

Variável
Leitura de Palavras 3ª Coleta
Dependente
N = 43 1ª Coleta 2ª Coleta 3ª Coleta
Variáveis
r p r p r p
Independentes
CL ,591** 0,000 ,534** 0,000 ,628** 0,000
CR ,445** 0,001 ,484** 0,001 ,631** 0,000
SS 0,192 0,109 ,454** 0,001 0,175 0,132
DF ,314* 0,020 ,714** 0,000 ,882** 0,000
Legenda: Conhecimento do nome das letras (CL); Conhecimento de Rima (CR);
Segmentação Silábica (SS); Deleção Fonemica (DF).
A correlação é significativa no nível 0,01 (**) e no nível 0,05 (*)

Ao olhar a Tabela percebe-se que três das variáveis independentes observadas na


primeira coleta de dados correlacionaram-se de modo positivo e significativo com o
desempenho em Leitura de Palavras ao final do ano letivo. O Conhecimento de Letras
correlacionou-se significativamente com a LP (p<,001), seguido pela variável Conhecimento
de Rimas (p<,001) e Deleção Fonêmica (p<,020). Desse modo, identificou-se que quanto
maior o desempenho em CL, CR e DF na primeira coleta, também se apresentou maior o
desempenho em LP na última coleta de dados.
Na segunda coleta verificou-se uma correlação positiva e significativa entre todas as
variáveis independentes e a variável dependente LP. As variáveis Deleção Fonêmica e
Conhecimento de Letras apresentaram um alto grau de significância (p<,001), seguidos pelas
variáveis Conhecimento de Rimas e Segmentação Silábica (p<,001). Percebe-se, nesta coleta,
que a variável Deleção Fonêmica foi a que obteve a correlação mais forte (r=,714) com a
variável dependente, demonstrando que com a inserção no ensino sistemático da linguagem
escrita esta habilidade passa a ser aquela com maior grau de associação com a Leitura de
Palavras.
Na terceira coleta verifica-se correlação positiva e significativa entre as variáveis CL,
CR e DF (p<,001) com a LP. Destaca-se a Deleção Fonêmica (r= ,882), demonstrando que
esta foi novamente a habilidade da Consciência Fonológica que obteve a correlação mais forte
com a Leitura de Palavras. Na primeira e terceira coletas a SS não apresentou correlação com
o desempenho em Leitura de Palavras.

50
6.2.2 Correlações entre as variáveis independentes Conhecimento de Letras (CL),
Conhecimento de Rima (CR), Segmentação Silábica (SS) e Deleção Fonêmica
(DF) e a variável dependente Escrita de Palavras (EP)

A Tabela 5 apresenta as correlações entre as variáveis independentes (CL, CR, SS, DF)
e a variável dependente EP considerando os resultados das três coletas de dados com a última.

Tabela 5 – Correlação de Pearson

Variável
Escrita de Palavras 3ª Coleta
Dependente
N = 43 1ª Coleta 2ª Coleta 3ª Coleta
Variáveis
r p r p r p
Independentes
CL ,603** 0,000 ,581** 0,000 ,653** 0,000
CR ,378** 0,006 ,491** 0,000 ,710** 0,000
SS ,327* 0,016 ,361** 0,009 ,397** 0,004
DF ,313* 0,020 ,683** 0,000 ,740** 0,000
Legenda: Conhecimento do nome das letras (CL); Conhecimento de Rima (CR);
Segmentação Silábica (SS); Deleção Fonemica (DF).
A correlação é significativa no nível 0,01 (**) e no nível 0,05 (*)

Conforme observa-se na Tabela 5, o desempenho em Escrita de Palavras verificado no


final do ano letivo, correlacionou-se de modo positivo e significativo com todas as variáveis
independentes desde a primeira coleta de dados. Destaca-se, na primeira coleta a correlação
apresentada pela variável CL (r=,603; p< ,001), pois neste momento, esta foi a variável da
Consciência Fonológica que demonstrou maior índice de correlação com a variável
dependente ao final do ano letivo.
Na segunda coleta observa-se que todas as variáveis independentes mantiveram
correlações positivas e significativas com a variável dependente EP. Nota-se que com o ensino
sistemático da linguagem escrita a variável DF passou a ser a variável com maior grau de
correlação com a variável dependente (r=,683; p<,001), sendo acompanhada pelo
Conhecimento de Letras (r=,581; p<,001) e das demais habilidades da Consciência
Fonológica.
Na terceira coleta de dados todas as variáveis independentes mantiveram correlações
positivas significativas com a EP, assim como observado na coleta anterior. Semelhantemente
à segunda coleta, a tarefa de Deleção Fonêmica permanece como a variável da Consciência
51
Fonológica que mais se correlaciona com o desempenho em Escrita de Palavras ao final do
ano letivo (r=, 749; p<,001), seguida pelas variáveis CR (r=,710) e CL (r=,653) que também
apresentaram correlações positivas e fortes com a variável dependente. Nota- se que a tarefa
de Segmentação Silábica, foi a variável que apresentou menor correlação, embora sempre
significativa, com a variável dependente em todas as coletas realizadas.

6.3. Resultados das análises de Regressão Linear Múltipla entre as variáveis


independentes (CL, CR, SS, DF) e as variáveis dependentes (EP e LP)
acompanhadas das análises de variância correspondentes

O teste de Regressão Linear Múltipla foi realizado com o objetivo de verificar quais
das variáveis independentes se mostrariam como preditoras da aprendizagem da leitura e da
escrita de palavras isoladas, assim como explicar melhor o grau de contribuição de cada uma
delas para estas aprendizagens. Foi realizado o teste de multicolinearidade, o qual permitiu
verificar que não havia interferência de uma variável sobre a outra, ou seja, verificou-se que
as variáveis contribuíram de modo independente dentro dos modelos explicativos.

6.3.1 Regressão Linear Múltipla com relação à variável dependente Leitura de


Palavras (LP)

Foi utilizado o método de Regressão Múltipla Stepwise (por etapas) com o propósito
de chegar ao melhor modelo que explica a variabilidade das variáveis dependentes. Assim,
considerando os dados obtidos na primeira coleta com os resultados da terceira, o modelo que
melhor explicou a variabilidade da LP, foi aquele que considerou apenas a contribuição das
variáveis Conhecimento de Letras e Conhecimento de Rimas conforme observa-se na Tabela
6.

Tabela 6 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) LP 3ª coleta x Variáveis


independentes 1ª Coleta

R-
Variáveis Variável Erro
R quadrado F Sig (F) β t p
Independentes dependente Padrão
ajustado
CL1 LP 0,522 4,402 0,000
0,678 0,433 9,042 17,008 0,000
CR1 (3ª Coleta - Nov) 0,340 2,864 0,007
Variáveis Independentes: Conhecimento do Nome das Letras - 1ªcoleta (CL1); Conhecimento de Rima - 1ª coleta (CR1)
Variável dependente: Leitura de Palavras - 3ª Coleta (LP)

52
Na ocasião de ingresso dos alunos no Ensino Fundamental, ou seja, momento no qual
se avalia o conhecimento trazido pelas crianças da Educação Infantil, o Conhecimento do
Nome das Letras e o Conhecimento de Rimas foram as variáveis que se mostraram como
preditoras da aprendizagem da LP explicando juntas 43,3% da variabilidade da LP ao final do
ano. Observa-se também que dentro do modelo explicativo a variável CL foi aquela que mais
contribuiu (p<,001), explicando sozinha 52% da variabilidade dos resultados.
Tinha-se como hipótese que a Deleção Fonêmica seria uma das variáveis que
contribuiriam de modo significativo com a aprendizagem da leitura. No entanto, seus valores
na primeira coleta apresentaram um resultado de piso com média 0,64, demonstrando que este
conhecimento não estava presente em praticamente todos os alunos na ocasião do ingresso no
Ensino Fundamental. Assim, foi realizado outro cálculo de Regressão Linear Múltipla (por
etapas) referente à segunda coleta de dados, momento em que a Deleção Fonêmica obteve um
resultado mensurável, a fim de verificar, tendo agora todas as variáveis com pontuações
mensuráveis, qual das variáveis independentes explicaria melhor a variabilidade LP ao final
do ano letivo.
Na segunda coleta, o modelo de regressão que melhor explicou a variabilidade dos
resultados sugere que a Deleção Fonêmica e a Segmentação Silábica são as variáveis que
melhor predizem o desempenho em LP ao final do ano, juntas estas variáveis explicaram
54,3% da variância da leitura de palavras. Destaca-se que a variável DF apresentou uma
contribuição muito elevada dentro do modelo (p<,001) explicando sozinha 63,3% de sua
variância, como é possível observar na Tabela 7.

Tabela 7 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) LP 3ª coleta x Variáveis


independentes 2ª Coleta

R-
Variáveis Variável Erro
R quadrado F Sig (F) β t p
Independentes dependente Padrão
ajustado
DF2 LP 0,633 5,731 0,000
0,751 0,543 8,119 25,903 0,000
SS2 (3ª Coleta - Nov) 0,246 2,231 0,031
Variáveis independentes: Deleção Fonêmica - 2ªcoleta (DF2); Segmentação Silábica - 2ª coleta (SS2).
Variável dependente: Leitura de Palavras - 3ª Coleta (LP)

Estes resultados sugerem que com a inserção da criança no ensino sistemático da


linguagem escrita, a consciência fonêmica torna-se a habilidade da Consciência Fonológica
que melhor prediz o desempenho em Leitura de Palavras.

53
6.3.2 Regressão Linear Múltipla com relação à variável dependente Escrita de
Palavras (EP)

Para a variável dependente EP também foram escolhidos somente os modelos que


melhor explicaram a variabilidade das variáveis dependentes. A Tabela 8 apresenta os
resultados obtidos considerando a primeira coleta de dados.

Tabela 8 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) EP 3ª coleta x Variáveis


independentes 1ª Coleta

R-
Variáveis Variável Erro
R quadrado F Sig (F) β t p
Independentes dependente Padrão
ajustado
CL1 EP 0,549 4,512 0,000
0,657 0,404 19,047 15,206 0,000
CR1 (3ª Coleta - Nov) 0,268 2,201 0,034
Variáveis independentes: Conhecimento do Nome das Letras - 1ªcoleta (CL1); Conhecimento de Rima - 1ª coleta (CR1)
Variável dependente: Escrita de Palavras - 3ª Coleta (EP)

De acordo com o modelo, as variáveis CL e CR foram as habilidades da Consciência


Fonológica que se mostraram preditoras do desempenho em EP ao final do ano letivo,
explicando juntas 40,4% da variância da leitura de palavras. Neste modelo, a contribuição da
variável CL é bastante significativa (p<,001), explicando sozinha 54, 9% da variabilidade do
modelo.
Na segunda coleta, o modelo sugere que juntas as variáveis DF e CL são aquelas que
melhor predizem o desempenho em escrita de palavras isoladas ao final do ano, explicando 52,
9% da variabilidade, conforme se observa na Tabela 9.

Tabela 9 – Regressão linear múltipla por etapas (Stepwise) EP 3ª coleta x Variáveis


independentes 2ª Coleta

R-
Variáveis Variável Erro
R quadrado F Sig (F) β t p
Independentes dependente Padrão
ajustado
DF2 EP 0,526 4,363 0,000
0,742 0,529 16,931 24,556 0,000
CL2 (3ª Coleta - Nov) 0,331 2,747 0,009
Variáveis independentes: Deleção Fonêmica - 2ªcoleta (DF2); Conhecimento do Nome das Letras - 2ªcoleta (CL2)
Variável dependente: Escrita de Palavras - 3ª Coleta (EP)

54
7 Discussão dos Resultados

Esta pesquisa teve como finalidade analisar a relação entre a leitura e escrita de
palavras com as variáveis de consciência fonológica, (medida pelo conhecimento de rimas,
segmentação silábica e deleção fonêmica) e com o conhecimento inicial do nome das letras
em crianças que ingressaram no Ensino Fundamental. Teve o propósito de responder as
seguintes perguntas: o melhor desempenho inicial nas habilidades de consciência fonológica
apresentado pelas crianças estaria correlacionado ao melhor desempenho em leitura e escrita
de palavras ao final do ano letivo? Qual das três variáveis da consciência fonológica
estudadas seria melhor preditora da aprendizagem da leitura e da escrita de palavras? O
melhor desempenho inicial no conhecimento de letras se correlacionaria ao melhor
desempenho na leitura e escrita de palavras ao final do ano letivo, obtendo um potencial
preditivo destas habilidades?
Tinha-se como hipótese que as crianças que já ingressassem com um bom
desenvolvimento das habilidades metafonológicas e conhecimento do nome das letras teriam
sua aprendizagem da leitura e da escrita facilitada. Acreditava-se, também que a consciência
fonêmica seria a habilidade da consciência fonológica que se apresentaria como melhor
preditora da aprendizagem da linguagem escrita.
Observando os dados obtidos nas análises descritivas verificou-se melhora
significativa em todas as habilidades avaliadas inicialmente, ou seja, as crianças progrediram
em sua capacidade de refletir sobre os segmentos sonoros da fala (consciência fonológica), no
conhecimento do nome das letras, assim como na leitura e escrita de palavras. Este progresso
era previsto dada a inserção das crianças no Ensino Fundamental, momento no qual passam a
refletir mais sobre o sistema alfabético de escrita em contexto escolar. Outros estudos
longitudinais obtiveram resultados semelhantes (Moraes & Capellini, 2010; Barbosa,
Medeiros & Vale, 2016).
Os resultados obtidos por meio das análises de correlação permitiram identificar uma
associação significativa entre o desempenho inicial nas habilidades de conhecimento de letras,
conhecimento de rimas e deleção fonêmica com o desempenho em leitura ao final do ano
letivo e de todas as habilidades da consciência fonológica, assim como do conhecimento do
nome das letras com o desempenho em escrita de palavras.
No que se refere ao conhecimento do nome das letras este resultado vem corroborar
vários outros já referidos na literatura (Cardoso-Martins & Batista, 2005; Santos & Maluf,
55
2010; Moraes & Capellini, 2010; Bowey, 2013; Scliar-Cabral, 2015; Faísca, Araújo & Reis,
2015; Barrera & Santos, 2016; Barbosa, Madeiros & Vale, 2016) que destacam ser o
conhecimento do nome das letras forte preditor da aprendizagem da leitura e da escrita , pois
dentre outras coisas, este conhecimento leva as crianças a observarem as relações
grafofonêmicas nas palavras, diminuindo a tendência à observação de pistas visuais apenas,
procedimento este característico das crianças que estão na fase pré-alfabética de escrita.
Barreira e Santos (2016) destacam que as crianças utilizam o conhecimento que possuem
sobre os nomes das letras para ampliarem seu conhecimento sobre o princípio alfabético,
assim, concordando com a teoria de fases de Linnea Ehri (2013), as autoras escrevem que
conhecer o nome das letras levaria as crianças a uma transição para a fase parcialmente
alfabética, ou seja, momento no qual são formadas as primeiras conexões na memória entre
letra e som, geralmente reconhecendo os sons mais salientes da palavra, por exemplo, a
primeira ou última letras.
Nesta pesquisa, os resultados das análises de regressão demonstraram que o
conhecimento do nome das letras mostrou-se também como um importante preditor tanto da
leitura como da escrita de palavras, corroborando as afirmações de Bowey (2013, p. 184),
quando diz que “crianças que conseguem nomear as letras com facilidade e que possuem
alguma compreensão pelo menos da aliteração devem ter mais facilidade para entender o
princípio alfabético quando ensinado explicitamente”. Reafirma também os resultados obtidos
em um estudo recente realizado por Barbosa, Medeiros e Vale (2016) em Montes Claros- MG,
Brasil no qual após serem investigados os impactos da consciência fonológica e do
conhecimento do nome das letras na alfabetização, este último foi identificado como a
variável que melhor predisse a escrita dos alunos ao final do ano letivo.
No que se refere ao conhecimento de rimas os resultados das correlações permitiram
verificar uma associação significativa entre este conhecimento e o desempenho em leitura e
escrita de palavras. Os resultados das análises de regressão identificaram o conhecimento de
rimas como preditor tanto da leitura como da escrita de palavras ao final do ano letivo. Nota-
se que estes dados contrariam a hipótese inicial que pressupunha ser a consciência fonêmica a
habilidade da consciência fonológica com melhor poder preditivo longitudinalmente. No
entanto, corroboram outros estudos (Goswami, 2002, Goswami et al, 2003) que enfatizam o
papel das rimas na aprendizagem inicial da leitura quando sugerem que este conhecimento
beneficia a aprendizagem da leitura em crianças que aprendem a ler em ortografias mais
opacas como o inglês sendo preditora da leitura e da escrita nestas ortografias. Em ortografias

56
mais transparentes vem de encontro aos resultados obtidos por Martins (2010) sobre os
preditores de alfabetização em português europeu, estudo no qual também foi encontrado o
conhecimento de nível intrassilábico (ataque e rimas) como preditor da leitura e da escrita,
sendo condizente com os achados desta pesquisa com o português brasileiro.
De acordo com Goswami (2002) em crianças pré-leitoras não é possível encontrar a
consciência fonêmica como preditora da aprendizagem da leitura e da escrita, pois estas
crianças não são capazes de manipular os fonemas ainda, sendo esta manipulação usualmente
decorrente da aprendizagem explícita do sistema alfabético. A autora destaca que em crianças
que ainda não foram alfabetizadas a manipulação consciente das unidades fonológicas da
linguagem escrita se dá em unidades maiores como as sílabas, o ataque e a rima. Charles
Hulme et al (2002) questionaram este argumento de Goswami, e realizaram um estudo
longitudinal com crianças pré-leitoras já citado na introdução da presente pesquisa, o qual
identificou a consciência fonêmica como o mais importante preditor da aprendizagem da
leitura e da escrita em crianças pré-escolares. No entanto, como foi citado anteriormente,
mesmo no grupo de crianças que foram consideradas pelos autores como leitores com baixo
rendimento (idade de leitura de 5 anos na escala BAS) verificou-se que estas já conseguiam
ler palavras, portanto, já manipulavam os fonemas. Os próprios autores abrem para outras
pesquisas a investigação das habilidades da consciência fonológica em crianças com idade de
leitura menor, ou seja, que não conseguem manipular fonemas a fim de verificar se as rimas
se mostrariam como preditoras.
O presente estudo contribuiu com esta discussão ao passo em que foram analisadas
regressões no momento em que as crianças obtiveram um escore de piso em consciência
fonêmica na primeira coleta e foi realizada outra regressão quando, no meio do ano, obteve-se
resultado mensurável desta habilidade. Assim, os resultados desta pesquisa corroboram as
afirmações de Goswami (2002) sugerindo que em crianças pré-leitoras o conhecimento de
rimas é preditor da aprendizagem da linguagem escrita. E assim, como encontrado por Hulme
e colaboradores (2002) e Hulme (2002), quando as crianças passam a ter a consciência dos
fonemas esta passa a ser a variável da consciência fonológica com maior grau de associação
com a leitura e escrita de palavras. Ou seja, quanto à nossa hipótese inicial sobre o poder
preditivo da consciência fonêmica, verificamos que uma vez que esta é manifesta, ela se
mostra como principal preditora tanto da leitura quanto da escrita de palavras, corroborando
vários estudos já relatados (Morais, 2013; Sargiani, 2013; Morais, 2014; Germano &
Capellini, 2015; Cárnio, Sá, Jacinto & Soares, 2015). Verificou- se, ainda no presente estudo

57
uma contribuição que reforça a evidência de pesquisas anteriores de que enquanto algumas
habilidades da consciência fonológica como a segmentação silábica, a aliteração e a rima
podem se desenvolver por meio do contato com ambientes oralmente favoráveis, a
consciência fonêmica só se desenvolve por meio de instrução explícita do sistema de escrita
alfabética , o que parece ter ocorrido com os alunos da pesquisa quando ingressaram no
Ensino Fundamental (Morais, 2013; Morais, 2014; Dehaene, 2012; Sargiani, 2013).
No que se refere à consciência silábica esta foi a variável da consciência fonológica
que apresentou menor grau de associação com a leitura e escrita de palavras embora sendo
esta associação quando observada, sempre positiva e significativa. Nota-se, contudo, que
quando é realizada a segunda regressão o conhecimento das sílabas se mostra como preditor
da leitura de palavras. Estes resultados vêm de encontro aos resultados obtidos por Melo e
Correa (2013) que ao avaliarem jovens e adultos brasileiros encontraram o nível de leitura
inicial e a segmentação silábica como os principais preditores de leitura e escrita ao final do
ano no português brasileiro. As autoras levantam novamente a discussão sobre os tipos de
habilidades da consciência fonológica mais importantes em cada ortografia alfabética. Como
afirmam “determinadas unidades fonológicas são mais salientes em uma língua do que em
outras, e as mesmas unidades fonológicas não podem predizer o desempenho da leitura e da
escrita em diferentes línguas (p. 463)”. Neste ponto resgata-se os resultados obtidos por
Cardoso-Martins 1995 que anteriormente identificaram o conhecimento dos fonemas
juntamente com o conhecimento das sílabas como preditores da leitura e da escrita, sendo que
a detecção de sílaba previu significativamente o desempenho em leitura e escrita mesmo após
a segmentação fonêmica ter sido controlada. Os resultados de Martins (2010) no português
europeu também identificaram o ataque e a sílaba como os mais importantes preditores de
leitura e escrita. De acordo com Martins (2010), o fato de o ataque e a sílaba terem sido
identificados como preditores supõe o papel do ensino de alfabetização, já que no primeiro
ano de aprendizagem costuma-se enfatizar as primeiras letras das palavras ou os pedaços
iniciais. Nesta mesma linha de raciocínio, Valente e Martins (2004, p. 208), escreveram que a
importância da consciência silábica na leitura teria uma origem na estrutura da língua, assim
como uma origem instrucional. De acordo com as autoras existe a “hipótese de que a estrutura
silábica consoante-vogal inserida em sequências silábicas possa construir a base fonológica
para a elaboração do léxico ortográfico em português”.
Verifica-se, no entanto, que a discussão referente às sílabas ainda não foi encerrada no
contexto científico. O estudo de Sargiane (2016), por exemplo, um estudo experimental

58
realizado com crianças pré-escolares não identificou as sílabas como mais influentes na
aprendizagem da leitura e da escrita quando comparadas à consciência fonêmica. Assim, mais
pesquisas devem ser realizadas no português brasileiro a fim de buscar mais evidências sobre
as habilidades metalinguísticas mais importantes na alfabetização das crianças brasileiras.
Num contexto geral foi possível verificar um impacto positivo tanto das habilidades
metafonológicas quanto do conhecimento do nome das letras na aprendizagem de leitura e
escrita. Desse modo, confirmou-se a hipótese inicial que previa que as crianças que
ingressassem com melhor desempenho em consciência fonológica e conhecimento do nome
das letras teriam sua aprendizagem facilitada por estas habilidades. Verifica-se, desse modo, a
importância de ser realizado um trabalho já na Educação Infantil que propicie às crianças a
aquisição destes conhecimentos com vistas a contribuir para o ingresso das mesmas no mundo
letrado.
Algumas limitações em relação a este estudo devem ser consideradas. Em primeiro
lugar este estudo não contou com variáveis de controle, como por exemplo, teste de
inteligência não-verbal, comumente utilizado em pesquisas que investigam preditores de
alfabetização. Pode-se supor que diante de variáveis de controle os resultados das regressões
se mostrariam diversos. No entanto, cabe salientar que em estudos anteriores, como por
exemplo, o de Gombert (1996), não foi encontrada interferência significativa da inteligência
não-verbal na aprendizagem da leitura e da escrita. Em segundo lugar o número de
participantes do estudo é pequeno para pensar em possíveis generalizações para as crianças
brasileiras. Estudos com um maior número de crianças devem ser realizados, a fim de
verificar no português brasileiro, quais habilidades metalinguísticas são mais discriminantes
da aprendizagem da leitura e da escrita.

59
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65
Apêndices

66
Apêndice 1 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido à Escola

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA - PUC-SP


CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

A______________________________________________________________,
representada por____________________________________, aceita participar do estudo
realizado pela pesquisadora Adriana Príncipe dos Reis Albuquerque Ramos, aluna do curso de
Mestrado em Educação: Psicologia da Educação da PUC-SP, tendo como orientadora a
professora Dra. Maria Regina Maluf, dando seu consentimento livre e esclarecido para que a
coleta de dados seja realizada nesta instituição escolar e com seus alunos. A pesquisadora está
realizando um estudo intitulado: A inserção da criança de seis anos no ensino fundamental e o
processo de alfabetização: fatores facilitadores e limitadores. O objetivo deste estudo é
levantar conhecimentos sobre a inserção da criança de 6 anos no ensino fundamental
mapeando as habilidades metalinguísticas, o vocabulário e a compreensão sobre o sistema de
escrita alfabética que possuem ao ingressarem nesta modalidade de ensino.
A escola autoriza a pesquisadora a coletar dados em ambiente escolar e está ciente de
que as crianças realizarão algumas provas que avaliarão o conhecimento das mesmas sobre
letras, o nível de leitura e a consciência fonológica (conhecimento dos sons da fala).
A pesquisadora assegura que a participação nesta pesquisa, por parte da escola, dos
pais ou responsáveis e das crianças, será de caráter voluntário e sem ônus, estando garantido o
sigilo, a confidencialidade e a utilização dos dados obtidos somente para fins científicos. Os
participantes não estarão expostos a desconfortos ou riscos. As informações obtidas nas
avaliações serão utilizadas para análise estatística e posterior publicação dos resultados. Todos
estão informados de que a participação poderá ser suspensa a qualquer momento sem prejuízo
a ninguém.
Caso sejam necessários maiores esclarecimentos a respeito do estudo ou seus
participantes desejem cancelar sua participação, poderão entrar em contato pessoal com a
pesquisadora.

______________________________ ______________________________
ass. Pesquisadora. ass. Responsável.
São Paulo, _______/_________/2016

Contato com a pesquisadora:


Fones: (11)2056-4387, (11)994590393.
Email: [email protected]

67
Apêndice 2 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aos Pais

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA - PUC-SP


CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

A pesquisadora Adriana Príncipe dos Reis Albuquerque Ramos, aluna do curso de


Mestrado em Educação: Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica - PUC-
SP, tendo como orientadora a professora Dra. Maria Regina Maluf está desenvolvendo um
estudo sobre a inserção da criança de seis anos no ensino fundamental.
Neste estudo a pesquisadora fará algumas atividades com as crianças em ambiente
escolar. As crianças realizarão algumas provas individuais e uma tarefa coletiva que avaliarão
os conhecimentos sobre a leitura e escrita que as crianças trazem consigo quando ingressam
nesta modalidade de ensino.
Este trabalho pode trazer boas contribuições para os pesquisadores da área no que se
refere a compreensão de fatores cognitivos que podem facilitar o processo de alfabetização.
A participação nesta pesquisa, por parte dos pais ou responsáveis e das crianças é de
caráter voluntário e sem ônus. Fica garantido o sigilo, a confidencialidade e a utilização dos
dados obtidos somente para fins científicos. Os participantes não estarão expostos a
desconfortos ou riscos. As informações obtidas nas avaliações serão utilizadas para análise
estatística e posterior publicação dos resultados. Afirmo também, que a participação poderá
ser suspensa a qualquer momento sem prejuízo a sua pessoa.
Caso sejam necessários maiores esclarecimentos a respeito do estudo ou seus
participantes desejem cancelar a sua participação, poderão entrar em contato pessoal com a
pesquisadora.
Para que este estudo seja realizado, necessito de sua colaboração, no sentido de
fornecer sua autorização, após devidos esclarecimentos, para a participação de seu (sua) filho
(a) neste estudo.

Eu__________________________________________________________ estou
esclarecido (a) e ciente das finalidades do estudo, realizado pela pesquisadora Adriana
Príncipe dos Reis Albuquerque Ramos e, portanto, dou meu consentimento para que meu
(minha) filho (a) ________________________________________________________, que
está no 1º ano do ensino fundamental, participe da pesquisa.

_____________________________ ___________________________
ass. Pesquisadora ass. Responsável.
São Paulo, ______/_______/2016

Contato com a pesquisadora:


Fones: (11)2056-4387/ (11)994590393
Email: [email protected]

Contato com a orientadora:


Fone: (11) 3670-8527

68
Apêndice 3 – Tarefa de Intruso de Rimas
Treinamento Treinamento

Treinamento

1 2

3 4

5 6

7 8

9 10

FOLHA DE RESPOSTA - INTRUSO DE RIMA

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta
1) janela bolo panela
2) pipa caneta chupeta
3) sapato rato xícara
4) avião barata tubarão
5) cadeira chuteira suco
6) girafa alicate tomate
7) lua rua moto
8) boneca macaco peteca
9) galinha abacaxi rainha
10) leão espelho coelho

Escore:

69
Apêndice 4 – Tarefa de Segmentação Silábica

Treinamento Treinamento Treinamento

1 2 3 4 5

6 7 8 9 11

FOLHA DE RESPOSTA - SEGMENTAÇÃO SILÁBICA

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta leitura da criança


A bicicleta
B bola
C sorvete
1 mamadeira
2 médico
3 melancia
4 jacaré
5 dado
6 vaca
7 lapis
8 coração
9 sanobete
10 chinelo

Escore:

70
Apêndice 5- Tarefa de Deleção Fonêmica

DELEÇÃO FONÊMICA
PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Lista de Resposta Nº de
Nº Respotas Fonemas
palavras correta acertos
I A casa asa /k/
Itens de treino
t B Luva Uva /l/
e 1 Anão Não /a/
n 2 Povo Ovo /p/
s 3 Laço Aço /l/
4 Bela Ela /b/
d 5 Mato Ato /m/
e 6 Sobra Obra /s/
7 Filha Ilha /f/
t 8 Cidade Idade /s/
e 9 Cantiga Antiga /k/
s 10 Canta Anta /k/
t
Pontos brutos
e

Porcentagem

71
Apêndice 6 – Leitura de palavras isoladas – 1ª coleta

FOLHA DE RESPOSTA - LEITURA DE PALAVRAS ISOLADAS

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta
1) duas
2) fala
3) café
4) água
5) chuva
6) festa
7) porta
8) papai
9) depois
10) letras

Escore:

72
Apêndice 7 – Leitura de palavras isoladas – 2ª e 3 ª coletas.

FOLHA DE RESPOSTA - LEITURA DE PALAVRAS ISOLADAS - 2ª Coleta

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta
1) duas
2) fala
3) café
4) água
5) chuva
6) festa
7) porta
8) papai
9) depois
10) letras
11) hoje
12) azul
13) onça
14) feliz
15) homem
16) texto
17) amanhã
18) fazendo
19) resposta
20) exercício
21) puas
22) zala
23) isda
24) chuda
25) posdava
26) saliz
27) hodem
28) açute
29) atanhã
30) lepeça

Escore:

73
Anexos

74
Anexo 1 – Teste de conhecimento do nome das letras

FOLHA DE REGISTRO DO CONHECIMENTO DO NOME DAS LETRAS

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:
Pré-escola: Onde:
Conhecimento do nome das letras
M
R
E
D
F
U
J
T
G
Z
I
C
A
V
N
X
O
P
Q
S
B
H
L
W
K
Y

O pesquisador irá circular as letras que forem respostas corretas.


Escore:

75
Anexo 2 – Escrita de palavras isoladas – 1ª coleta

FOLHA DE RESPOSTA - ESCRITA DE PALAVRAS ISOLADAS

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta
1) gelado
2) telefone
3) casa
4) queijo
5) zebra
6) estudante
7) girafa
8) tartaruga
9) casamento
10) beterraba

Escore:

76
Anexo 3 - Escrita de palavras isoladas – 2ª e 3 ª coletas.

FOLHA DE RESPOSTA - ESCRITA DE PALAVRAS ISOLADAS - 2ª Coleta

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO

Nome:
Idade: meses: Série:
Sexo Data:

Itens Resposta
1) cavalo
2) girafa
3) cabelo
4) bicicleta
5) dedo
6) casamento
7) detetive
8) casa
9) esquilo
10) piano
11) gelado
12) estudante
13) tartaruga
14) faca
15) estudo
16) limonada
17) coqueiro
18) gelatina
19) cereja
20) telefone
21) batata
22) caramelo
23) geladeira
24) beterraba
25) abacaxi
26) bigode
27) queijo
28) cerveja
29) zebra
30) sereia

Escore:

77

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