PINTO, Sobral. Por Que Defendo Comunistas PDF

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Copyright 1979 by
Sobral Pinto

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UNIVERSIDADE CATdLlCA
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André Carvalho trO
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Carlos Ferreira

Direitos da presente edição reservados à í'lj

EDtTORA
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COMUNICAÇAo \;
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EDITORA
COMUNICAC;:Ao
Rua Tobias Barreto, 255 - tel: 332-0641 •
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Nova Suiça - Belo Horizonte - Minas Gerais
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Não encontrando este livro em sua livraria preferida
l peça pelo Reembolso Postal ao endereço acima.
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OBRAS: (
de Sobral Pinto: Lições de Liberdade, Editora Comunicação, Belo Horizonte, (
1977; 2~ed. 1978

de Ary Ouintella: Combati iJ Bom Combate - romance - l~ed. Editora Sonde,


"
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(
Rio, 1971; 2~ed., Livraria José Olympio Editora, Rio, 1973; ed. Polonesa, Wyda·
vvnictwo Literackie, Cracóvia, 1976. (
CARTA DE SOBRAL PINTO A ARY QUINTELLA.
(
Um Certo Senhor Tranqüilo - contos - l~ed., Editora Sonde, Rio, 1971; 2~ed.,
Editora Comunicação, 8elo Horizonte, 1976. (
Rio de Janeiro, 7 de março de 1979.
(
Retrospectiva - çontos ensaios, crônicas - 1~ed., Livraria José Olympio Editora, Ary Quintel/a. ( Ii
Rio, 1972; 2~ed., Editora Comunicação, 8elo Horizonte, 1977.
('
Qualquer Coisa é a Mesma Coisa - contos e alegorias - 1~ed., Impacto Editorial, Bom dia, desejando-lhe e à Therezinha, saúde, paz e 6xitos crescentes em (
Rio, 1975; 2~ed., Editora Comunicação, Selo Horizonte, 1979. suas respectivas atividades culturais e diplomáticas.
/ Quando estive em dezembro, em 8elo Horizonte, pedi ao André que espe- (
Sanc/ra, Sandrinha - novela - Editora Comunicação, Selo Horizonte, 1977. rasse até a segunda quinzena de janeiro para iniciarmos a organização do livro (
"PORQUE DEFENDO OS COMUNISTAS", para que eu tivesse tempo c/e dar
Cão Vivo, Leão Morto - juvenil - Editora Comunicação, 1979. buscas no meu alucinantemente desorganizado arquivo com o objetivo de encon· (
trar trabalhos importantes de minha atuação no patroc(nio de Harry Berger e Luiz (
in Antalogiá de Contistas Brasileiros - ed. da Wydawnictwo Uterackie, Cracóvia, Carlos Prestes.
1977: A Torre de Menagem, Um Certo Senhor Tranqüilo. Foi deste modo que pude enviar para' Belo Horizonte alguns de meus traba- (
lhos. C'
in O Papel do Amor - ed. fora do comércio da Indústria de Papel Simão, São Agora, desde que você comigo se comunicou, dizendo estar no Rio, inten-
Paulo, 1979: Caçando Paca - Como conto na ed. comercial da Editora Cultura, sifiquei estas buscas com o sacrif(cio de meu sono. Tenho dormido, sistematica· C
São Paulo, 1979. mente, quase às tr6s horas da madrugada, levantando-me às cinco e quarenta e cin- ( ,

co. ii
in Lições de Liberdade - de Sobral Pinto, a organização e a apresentação: Fé mais Nesta madrugada encontrei trabalhos importantes, que precisam de figurar ( ~'
Lei - Editora Comunicação, Selo Horizonte, 1977. no livro. São eles: Alegações Finais em defesa de Harry Berger; R.zões c/e Apelação (
do mesmo acusado; requerimento ao Ministro Relator da Apelação Crime número
(
4.899 pedindo providências sobre o tratamento a ser dispensado a Harry Berger;
requerimento de Luiz Carlos Prestes ao Presidente do Tribunal de Segurança Na·
cional requerendo o estabelecimento de um regime carcerário, na sua qualidade de
preso polftico, de acordo com as leis reguladoras da matéria.
A leitura destes trabalhos lhe revelará a importância da inclusão deles no li·
vro.
Além desses trabalhos, entrego·lhe, também, a petição quo dirigi ao Juiz do
Tribunal de Segurança Nacional, Dr. Raul Machado, pedindo autorização para en· \, i
tregar ao Prestes uma carta da Mãe dele e outra da Senhora dele à Mãe dele, reque· l'i,
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rendo, simultaneamente, que fosse estabelecida uma correspondência semanal en-
tre mãe e filho, sem mais a. necessidade de estar solicitando autorização para ser
o portador permanente desta correspondência.
Não sei se já lhe entreguei cópia de petiǧo onde eu ofereci embargos ao
Acórdão do Supremo Tribunal Militar, que confirmou a sentença de condenação
proferida pelo Tribunal de Segurança Nacional. Esses embargos são valiosos por EM PORTO NOVO DO CUNHA,
que demonstram que não havia o propósito de fazer justiça aos rebeldes e sim de NA ZONA DA MATA .
esmagá-Ios.- I: que o crime a eles imputado desaparecera com a destruição, pelo Ge-
túlio, da Constituiǧo Federal de 1934. Desaparecida taTConstituição, desaparece·
ria, igualmente, o crime de Prestes, Berger e Agildo Barata.
Reputo esta petição de.embargos como um dos documentos de maior rele·
vo na histôria da repressão política em nossa Pátria.
Esses embargos, como as Razões de Apelação, de. Eurico Natal, precisam o GAROTO morava numa casa,
de figurar no livro, uma vez que são documentos que, a lei não existe para os co- a casa tinha quintal, onde
munistas. vivia vasta, velha mangueira.
Ao voltar do colégio, o
Cordialmente, seu amigo e seu admirador, agradecido, garoto puxava sua.mãe pela
mão. Vamos ver a mangueira?
Sobral. Naquele dia, contemplavam a
mangueira. A zoada che.qa da
rua: três homens arrastavam
o tipo, que se debate debaixo
das pancadas incessantes. A
mãedo garoto treme e o garoto
berra: seus covardes I
Os policiais param. Miram
desdenhosamente o garoto e
, prosseguem. O garoto sente o frOmito
percorrer seu corpo. Estamos
em 1903, acaba de nascer o
patrono da legalidade,
HERÁCLITO FONTOURA
SOBRAL PINTO.

de Lições de Liberdade,
Sobral Pinto,
Editora Comunicação, Belo Horizonte, 1977
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PANO DE FUNDO
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Em 23 de novembro de 1935, o sargento Clementino Diniz Henriques!e·
vanta o 21'? Batalhão de Caçadores, sediado em Natal, Rio Grande do Norte. No {
dia 25, os capitães Silo Meireles e Dtacílio Lima. e o tenente Lamartine Coutinho ( !
levantam o 29'? Batalhão de Caçadores, na cidade de Recife.
No dia 27 de novembro, Agildo Barata, Álvaro de Souza e José Leite Brasil (I
levantam o :F. Regimento de Infantaria, sediado na Praia Vermelha, Rio de Janeí~
to. Os três movimentos visavam a implantação de um governo comunista no pals,
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liderado por Luiz Carlos Prestes.
Porque Defendo os Comunistas tem como objetivo mostrai os processos (I
contra Luiz Carlos Prestes e Harry Berger iniciados após o levante, historicamente C !
conhecido como Intentona Comunista de 35. As Razões de Apelação,de Eurico
Natal foram anexadas ao texto para mostrar a constdncia da atuação de Sobral (
Pinto. (-
Em Cavaleiro da Esperança, uma biografia de Luiz Carlos Prestes, Jorge
Amado retrata a ambiência cultural, intelectual e social do país àquela época, mos· (
trando como Prestes - oficial do Exérci~o extremamente respeitado por seus cole- (
gas e her6i nacional - se transforma em Secretário Geral do Partido Comunista
Brasileiro. (
Além de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, este livro tem um terceiro per-
sonagem, Sobral Pinto, um advogado residente no Rio de Janeiro, que acaba de
\-
merecer o t(tulo de intelectual do ano, ao receber o Prêmio Juca Pato, na cidade \
de São Paulo. Sobral Pinto já completou 85 anos de idade. ~.
Lições de Liberdade,também editado pela Comunicação, em 1977, inclui
uma biografia de Sobral Pinto e notas a respeito das décadas de 20, 30 40 e 50, 'L
sendo aS de 60 e 70 documentadas nas cartas ali transcritas. Porque Defendo os l~i
Comunistas baseia-se nos autos arquivados no Superior Tribunal Militar, bem como I
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em cartas de Sobral Pinto e entrevistas a mim concedidas.

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Além de peças dos dois processos, coloquei neste livro cartas demonstrati-
vas do próprio estado de espírito de. Sobral Pinto ao aceitar as causas de Luiz
Carlos Prestes e Harry Berger como advogado ex-officio deles. Entre elas; a carta
para sua irmã Natalina, prova de seu perfeito sentimento de dever.
Gostaria de lembrar: Sobral Pinto é o primeiro detentor da Medalha Ruy
Barbosa, institufda pela Ordem dos Advogados do Brasil em 1970, e da Medalha
Teixeira de Freitas, conferida pelo Instituto dos Advogados Brasileiros.

Ary Quintella

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CONTA SOBRAL PINTO: (


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Inicialmente, a República, através de sua lei processual, entregou o julga- <'
mento dos crimes po/{ticos ao júri pOpular. Por isso o atentado contra o Presiden- (
te Prudente de Moraes foí julgado pelo júri do Ria de Janeiro, o mesmo aconte-
cendo com a chamada Conspiração Monárquica, atribuída ao eminente Conselheiro (
Andrade Figueira. (
Posteriormente, o Governo da República entendeu de transferir o julga-
mento destes crimes para o Júri Federal. Eis porque a Revolução político-militar (
de 1922, que visava depor o Presidente Epftácio Pessoa e, deste modo, impedir a (
posse do Sr. Arthur Bernardes, eleito para sucedê-lo em novembro do mesmo ano,
(,
foi julgada pelo Juiz Federal da 1é! Vara do Distrito Federal. Esta decisão me pare-
ceu acertada, porque se esse crime fosse entregue ao julgamento do júri, os milita- li.
res e os políticos nele envolvidos seriam fatalmente absolvidos. Nessa época, a
(
população do Rio de Janeiro era indiscutivelmente favorável aos rebeldes, mergu-
lhados num clima de simpatia generalizada, sobretudo pela campanha pregada
abertamente por grande parte da imprensa carioca, com repercussão marcante na
Ctimara dos Deputados.
A opinião pública do Rio foi sempre indisciplinada. Daí haver o Poder (
Público cuidado de transferir a competência do julgamento dos crimes políticos da (
esfera do" íúri popular para a dos JuIzes singulares. Estes julgariam o acontecimen~
to tão somente em face das provas e dos preceitos legais claros, precisos e insofis- (
máveis. O Juiz examina, com serenidade e imparcialidade, se os fatos, argüidos pe- 1,-
lo Ministério Público, se enquadr::Jm no texto da Lei Penal, e se os acusados de re-
beldia são apontados, com precisão e clareza, pelas provas materíais e pelas teste- \
munhais trazidas aos autos, pelo órgão da acusação. l.
Deste modo, a Revolução de 1922, no Rio de Janeiro, a de São Paulo, em
1924, e a de Aracaju, no mesmo ano, foram apurãdas e julgadas por Ju/zes Fede-
rais com sede nas referidas cidades.

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Ao irromper, em 1935, a Revolução Comunista, surgIu, embora cruelmen- não havia a menor necessidade de se criar o Tribunal de Segurança Nacional. Os
te, no meio militar da Nação, a convicção falsa de que só a Justiça Militar oferece- Juízes Federais teriam julgado com eficiência, serenidade, imparcialidade a Revo-
ria a garantia de exata punição dos comunistas, civis e militares, que teriam parti- lução Comunista de 35.
cipado daquele movimento. O meio polt"fÍco, sob a orientação rBl!cionária de Getú-
lio Vargas, aderiu a esta convicção, apesar da forte oposição de numerosos con- MAIS TRIBUNAL DE SEGURANÇA NACIONAL
gressistas.
Foi, então, assentada a criação do Tribunal de Segurança Nacional, como
órgão de Primeira Instância da Justiça Militar. A.O. - O que d(ziaa Constituição de 1891?
O Tribunal seria constituído de juIzes civis e julzes milita.res. Os civis se·
riam um Magistrado e dois Advogados. Os militares seriam dois Oficiais superiores, S.P. - A Constituição de 1891 não estabelecia nenhuma forma de julgamento, a
um representando o Exército e outro, a Marinha. Nessa época não havia, ainda; o não ser. a distinção entre crimes militares e crimes comuns~ Os crimes mi-
Ministério da Aeronáutica. litares eram de competência da Justiça Militar. Os crímf!s comuns, da Jus-
Os acusados sl!riam divididos em quatro processos, cada um com o seu Juiz tiça Civil. Os crimes pol/ticos eram, portanto, de competência daJusr/ça
Preparador. Uma vez terminado o preparo do processo, ele seria levado ao plená- Comum. Os tribunais eram regulados pela lei processual, que flodia ser
rio, constiturdo pelos cinco Magistrados. Estes, examinimdo acusado por acusado modificada. Inicialmp.nte, ojúri é que julgava os criines poltticos.
profeririam, como Tribunal, a sentença de condenação ou de absolvição. Da sen-
tença cabia apelação para o Superior Tribunal Militar. A. O. - Ah, foi o Congresso Nacional que mudou isso?
O Tribunal de Segurança Nacional dividiu, primeiramente, os acusados em
duas categorias: os que pegaram em armas e ,os que não pegaram e.m armas. Houve, S.P. - Sim, foi o Congresso que "!udou isso, mudaram a competência do julga-
ainda, uma outra categoria: os que teriam participado da conspiração. mento; qf!e era do júri e passou ao Juiz singular.
O Tribunal de Segurança Nacional foi criado pela Lei nq 244 de setembro
de 1936, func/onando como parte integrante da Justiça Militar, na· categoria de A. O. - A través de Lei Ordinária?
6rgão de Primeira Instância, até dezembro de 1937. Como foi instalado em outu-
bro de 1936, manteve-se dentro dessa estrutura durante quatorze meses. S.P. - Sim, de Lei Ordinária.
Desferido, em la de novembro de 1937, o Golpe de Estado que aboliu o
regime democrático, instituindo um regime autoritário denominado Estado Novo, A.O. Não houve emendá da Constituição?
o Poder Público resolveu elevar o Tribunal de Segurança Nacional à categoria de
Tribunal de Exceção, incumbido de defender a estabilidade das novas instituições, S.P. Não, Lei Ordinária~ Eu sustentei, na época, com um recurso bem desen-
quando hostilizadas por seus adversários. volvido, que em matérIa processual é lícito fazer-se aplicação retroativa.
O Tribunal de Segurança Nacional foi, então, desvinculado da Justiça Mili- Se um crime foi praticado numa época em que o Juiz competente era o
tar. Ele foi acrescido de mais um Juiz Civil. júri, e depois do crime praticado vem uma Ifti declarando que o Juiz é
Cada processo que entrasse no Tribunal seria distri6uldo a um de seus Jul- singular, eu sustentava, com base na doutrina reguladora da matéria, que
zes, que funcionaria ao mesmo tempo como Magistrado Preparador e Magistrado a lei processual se aplica retroativamente. A lei pode mudar.
Julgador, isto é, cabia-lhe receber a denúncia do Ministério Público, recolher as Então. estabeleceu-se que os criminosos pal/ticos seriam julgados pelo
provas e proferir a sentença. Desta cabia Recurso de Apelação para o Tribunal Ple- Juiz da I? Vara Federal. Havia no Rio de Janeiro apenas 3 Varas Fede-
, no, constitut"do de cinco Ju(zes, porque o Juiz; cuja sentença ia ser apreciada, era rais. Esse foi a regime que vigorou durante os Governos Bernardes e
\
impedido na Segunda Instância em relação a tal processo. • Washington Luiz. Quando veio a Revolução Comunista, já no regime da
~
Com tal estrutura, o Tribunal-de Segurança Nacional funcionou de dezem- Constituição de 1934, o Governo entendeu que a Justiça Comum não da-
\. bro de 1937 até fins de 1945, quando, em virtude de deliberação das Forças Ar- ria conta, como· ele esperava, da situação. E resolveu passar o julgamento
madas, sob o comando do General Goés Monteiro, então Ministro da Guerra, foi dos crimes poltticos da Justiça Comum para a Justiça Militar. Foi ai' que
destrutdo o Estado Novo, l..'Om a deposição de Getúlio Vargas. No seu entender, surgiu a criação do Tribunal de Segurança Naciof!al.

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o Tribunal de Segurança Nacional funcionou primeiramente como que seja o motivo. Os comunistas não se defendiam porque não acredita- ('
Juízo de 1~ Instância. Da sentença do Tribunal de Segurança Nacional ca- vam na imparCIalidade dos Juizes burgueses, mas há outros que não se de- (
beria apelação para o Superior Tribunal Militar. O Tribunal de Segurança fendem por outros motivos.Nessa hipótese os Julzes se dirigem à Ordem
(
era, portanto, um Tribunal da Justiça Militar, mas funcionando na depen- dos Advogados para que ela designe um advogado. Onde não há a.Ordem
dnncia do Superior Tribunal Militar. dos Advogados, o Juiz mesmo designa, como era feito anteriormente no (
Era um Tribunal misto: tinha 3 ministros civis e 2 ministros militares. Brasil.
Acredito que o Targino Ribeiro tenha pensado no meu nome por (
O Presidente seria um Juiz efetivo, um Juiz de carreira, e era integrado
ainda por dois. juristas civis e mais um representante do Exército (Coro- dois motivos: primeiro, porque eu fui, no começo da minha carreira, um (
nel) e um representante da Marinha rCapitão-cle-Mar-e-Guerra). E assim advogado ex-officio dos Juizes criminais, que tinham dificuldades para
(
foi constituído o Tribunal de Segurança, que, no processo dos comunis- encontrar advogados para defesa dos réus. Mas a/ os advogadas faziam a
tas, funcionou como Tribunal de 1? Instância. Daí a apelação para o Su- mímica do dever. O comum era fazerem a mímica do dever: compare- (
o perior Tribunal Militar. ciam ao julgamento, sem examinara processo, sem fazer de fato nem de- (
Ouando veio o golpe de 1937, o Tribunal de Segurança Nadonal foi fesa. Chamado pelo Juiz pela primeira vez, disse a ele: Sr. Juiz, eu não
transformado em Tribunal autônomo e ele passou a ser um Tribunal de posso funcionar porque não conheço o processo. El:J peço a Vossa I;xce- (
1~ e 2'1 Instâncias nos. crimes políticos, mediante a seguinte engrenagem: lência que adie o julgamento para daqui a 2 ou 3 dias, para que eu possa (
como Juiz de· 1í1 Instância, funcionava um membro do Tribunal. Da sen- levar os autos. examiná-los e fazer realmente a defesa.
tença desse Juiz,. cabia' apelação para o Tribunal Pleno. Então, aquele O Juiz imediatamente' atendeu ao meu pedido. Peguei os autos,
Jui~ que funcionava na 1í1 Instância ficava impedido de funcionar neste examinei-os e, como as palavras voam e os escritos ficam, compareci com (
segundo processo. Para esse fim, houve necessidade de mais um Juiz, que a minha defesa escrita, Os Juizes começaram a solucionar a minha inter-
foi um Juiz civíl. Quatro civis e dois militares, portanto. Mais tarde, com venção. E isso ficou mais ou menos conhecido no Fpro do Rio, que à (
a criação do Ministério da Aeronáutica, acrescentou-se mais um Juiz mili- época era muito menor, havendo apenas seis Juizes criminais. Fiquei sen- I:
tar. Nesses processos de que estamos tratando aqui, o Tribunal funcionou do um advogado com a noção do que é a advocacia, que não é a mímica
do dever. Obtive êxito, muitas vezes obtive a absolvição. E mais, passei a (
como de 1? Instância. Não tinha havido ainda a formação do Tribunal
como de 2i1 Instância_ funcionar desde o sumário. Duando o réu dizia: naô tenho advogado, as (.
testemunhas. ..
Acredito, pois, que o Targino Ribeiro, muito mais velho do que eu, Í.
ADVOGADO EX-OFFICIO verificou que, na realidade, eu era capaz de fazer uma defesa. Segundo, \
eu fui o Procurador Criminal da República, ao tempo do Bernades. E
A.O. Isso foi, então, antes do golpe de 1937.
através da Procuradoria, mostrei a minha competência em materia crimi-
nal. Ele sabia portanto que estava indicando um advogadO que tinha com- (
S.P. Sim, antes do golpe. A sentença que condenou os comunistas é anterior a
petência e capacidade para aceitar uma defesa, para fazê-Ia, e não para
novembro de 1937. Mas, quandO o Tribunal foi apreciar, já tinha havido (
fingir que iria fazê-Ia. Mas eu estava recomeçando a minha vida, porque
o golpe. Todavia, os comunistas não aceitavam os Tribunais especiais or- (
tinha deixado a Procuradoria Geral do Distrito Federal, que exerci depois
ganizados para julgá-los. Então, os organizadores do Tribunal de Seguran-
da Procuradoria Criminal. Ele sabia que ia me criar muitas dificuldades.
ça previram - e previram bem - que os comunistas não iam aceitar o \
Ele vacilou, mas não teve outro jeito, pois ninguém aceitou. Ninguém
Tribunal. Intimados a se defenderem e designarem advogados da sua con-
quis defender nem o Prestes nem o Harry Berger. "
fiança, eles não o fizeram, porque não aceitavam o Tribunal. Então, co-
mo julgá-los? Se não tinha advog~dos ... Assim, na organização do Tri- • \
bunal, o advogado é ex~officio~ É o advogado que o próprio Juiz nomeia_ (
A.O. - Uma vez o senhor me disse: entre as pessoas que recusaram fazer a defe-
E o Juiz nomeia em duas hipóteses: ou porque o réu não tem recursos pa- sa de Prestes e Berger havia inclusive advogados conhecidos como esquer- (,
ra pagar· advogado ou quando o acusado não quer se defender, qualquer
distas . ..
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A.O. E isso era cumprido?
s.P. _ Ah,havía.
Era. O Alceu foi convidado para ser Ministro do Trabalho no Estado No·
S.P.
Oue advogados? vo e não aceitou. Se um dirigente da Ação Católica tivesse qualquer ativi-
A.O.
dade pol/tica, imediatamente era dispensado. Dom Sebastião Leme cha-
S.P. Não, isso não. Não devo dizer. mava e dizia: uma coisa ou outra
~ claro, é evidente, que nós, os dirigentes, tivem,os uma atividade pall-
A.O. - Por que não? Já é um fato histórico. tica, mas na Liga Eleitoral Católica. Mas era uma Liga fora e acima dos
Partidos. Dom Sebastião Leme imaginou formar um corpo eleitoral cató-
_ Não, não é correto. lico. Os católicos todos se inscreveram como eleitores e deram seus no-
S.P.
• mes para. a Ação Çatólica. De modo que os bispos sabiam com quantos
Por que não é correto? Os tais advogados não recusavam. votos iaf!i contar nas suas Dioceses. De modo que iam aos candidatos e
A.O.
diziam: nós temos esses princípios, de modo que se os senhores aceita-
S.P.
Mas não podiam recusar. Não podiam e não deviam recusar, não é? Sendo rem esses princípios. esse corpo eleitoral nosso, que é de cem mil eleito·
que de alguns eu era amigo, grande amigo. Um dos considerados alegou res.;. Porque você sabe, aqui no Rio chegamos a ter cem mil eleitores.
ser católico, não podendo - hum ,-- defender um inimigo da Igreja.

A.O. Em que ano foi isso?


POROUE DEFENDO OS COMUNISTAS
S.P. Isso foi em 33,- para a Constituinte.
A.O.
Então como é que o senhor defendia um inimigo da sua,/greja?
A.a. _ E nesse tempo o Rio era uma cidade com menos de um milhão de habi-
S.P. _ Por uma razão muito simples: o principio que todo católico tem de seguir tantes. Ou seja, o eleitorado católico registrado era praticamente dez por
é o que está no Evangelho e que Santo Agostinho definiu nessa fórmula cento da população do Rio. Espantoso.
maravilhosa: odiar o pecado e amar o pecador. O comunismo nega Deus,
afronta Deus. Mas eu compreendo que o comunista faça isso por ser peca- S.P. _ Isso ocorreu em todas as Dioceses.
dor. Afinal, todo pecador afronta Deus, pois o pecador é quem não obe·
dece aos mandamentos de Deus. Mas é uma afronta decorrente da fraque-
za da nossa natureza. Nós somos frágeis, logo podemos pecar por fragili· A.a. _ Então, realmente, se o eleitorado católico era praticamente dez por cento
dade, não porque nio amemos a Deus, não estimemos a Deus, não tenha- da população do R ia de Janeiro daquela época. como é que a Liga Eleito'
mos a noção de que é nosso dever aceitar os mandamentos de Deus. Mas ral Católica permitiu que houvesse a Constituição de 34 e o Golpe de 37?
nós obedecemos a Deus. Já o materialista afronta a Deus: Deus não exis-
te, Deus é uma quimera. Bem, dentro dessa orientação, eu é que estava S.P. Veja bem: a Constituição de 34 foi votada de acordo com os nossos pos-
certo, tanto assim que, quando se anunciou que eu ia fazer a defesa do tulados. Nos querlamos uma Constituição promulgada em nome de Deus.
Prestes e do Berger, sendo eu a segunda pessoa da Ação Católica Brasilei· Foi promulgada em nome de Deus. Nós quedamos o ensino religioso nas
ra _ porque a primeira pessoa era o Alceu Amoroso Lima, que era o Pre- escolas, conseguimos. Nós quedamos assistência espiritual nas Forças Ar-
sidente da Ação Católica • •. madas, conseguimos. Nós querlamos a mesma assistência nos hospitais,
conseguimos. Todas as nossas reivindicações foram-aprovadas, graças exa-
A.O. - A Ação Católica tinha alguma característica fascista? tamente à Liga Eleitoral Católica, em todo o Brasil. Portanto, veja, nós
não ttnhamos uma polltica, votávamos par qualquer Partido. Nós estáva-
S.P. _ Não, nenhuma. Era proibido aos membros da direção católica ter qual· mos preocupados é com-o Deputado 10 Senador, não com os Partidos.
quer vinculação polltica. Era expressamente proibido.
25

24
LUIZ CARLOS PRESTES
C
( .. 1
cismo do que o capitalismo. Mas a Igreja, entretanto ~ acha que o pobre
pode ter uma compensação, pode ter um prêmio muito maior, no sobre-
A.a. - Como era Prestes fisicamente?
natural, no além. Ao passo que o comunismo acha que isso é apenas um
ri
S.P. - O Prestes era um homem baixo, mas forte, de corpo bem feito, um olhar
engodo, para fazer com que o povo não se revolte. Dal eles hostilizarem a
Igreja, por acharem que a Igreja. tira ao povo o desejo de se revoltar. E
c
enérgico, falando com muita precisão, muito inteligente. Foi um grande eles estão convencidos de que os capitalistas, os burgueses, enfim, a classe
matemático, 19 aluno do Colégio Militar e da Escola Militar. Tinha a dominante, não entrega o poder senão vencida pela força. Dal a teoria da (
convicção firme, decidida, de que o comunismo é a salvação do mundo, violência: sem revolução não se coloca o povo no poder.
sem nenhum interesse pessoal. (

A.O. - Quando Prestes recusou que·o senhor fosse advogado dele, o que ocorreu (
AO. -
Há Um livro do Jorge Amado, que o senhor deve conhecer, chamado Ca~ em funcão de o senhor ter sido nomeado advogado ex~officio de Prestes,
valeiro da Esperança ... (
e de Berge':, o que e/e alegou?
(
S.P. Nesse livro há uma página sobre mim e a descrição daquela incrf'vel cam- S.P. Ele alegou que eu, com a minha mentalidade burguesa~ com a minha (
panha ...
mentalidade de advogado, não teria capacidade, nem mesmo o desejo de
(
AO. defendê-lo. Além disso, ele achava Que eu era um simples advogado, sem
Isso. A Longa Marcha que se fez no Brasil, antes da Longa Marcha de força, sem meios de a ele acudir e amparar. Daí então ele não querer que (
Mao Tsé-Tung. Jorge Amado diz .que Prestes se tornou comunista depois eu o defendesse. Mas ele mudou. Primeiro porque ele verificou a minha
da· Coluna Prestes, quando ele se refugiou na Bolt'via e começou a ler li. fidelidade, a minha permanência como advogado. Toda semar;a eu ia lá
(
vros marxistas. Prestes chegou a fálar alguma coisa como senhor a respei- perguntar: quer alguma coisa, precisa de alguma coisa? Estou ãs suas or- (
to dissv?
dens. Ele se impressionou. Se impressionou porque eu inclusive transcre-
(
S.P. vi um (recho do Lenine em uma petição. É um trecho terrível; aquela
Não, o Prestes declarava que a preocupação dele sempre foi uma preocu- (
carta do Lenine sobre Stasova, uma revolucionária de 1905. Na primeira
pação científica. A formação dele é matemática e para ele a grande ciên-
vez que estive com Prestes, ele gritou hora e meia dizendo horrores . .. \
cia é a matemática. Então, a mentalidade dele toda era formada nesse
sentido. Afinal, ele lê bastante e fica convencido de que a ciência social
I.
não podia se afastar do comunismo, que era, na realidade, a realização· da AO. - Por exemplo, lembra?
(
ciência no campo social. Por isso é que ele adotou o comunismo. Além
do mais, ele acreditava que o comunismo é a opção dos trabalhadores, da- S.P. - Ah, ele dizia que era um Tribunal de empreitados, que os advogados não (
queles que criavam a riqueza. Então ele quis implantar no Brasl'l esse regi- tinham alma para penetrar no pensamento dos comunistas, querendo ape-
me que estava dando bons resultados na Rússia, onde realmente eles ti- nas arranjar sua vida, que o Governo é um Governo de violência e de for p

nham acabado com a burguesia. Ele quis implantar no Brasil um regime ça e todos nós abaixávamos a cabeça para o Governo. Além das coisas (

que fosse, de fato, o regime em que o po.vo tivesse seus direitos reconhe- que ele dizia de todos os pollticos. Coisas tremendas! Eu ouvi aquilo (
cidos, porque o povo é que criava a riqueza e não aproveitava dela. tudo em silêncio, porque compreendi que um homem que passou dez me·
ses num isolamento total, sem livros, sem jornais, sem um lápis, entregue
dia e noite a seu próprio pensamento e com seis olhos sobre si ... Porque
4. Q. - Isso não tem uma vaga semelhança com a doutrina social da Igreja?
em cada portal havia uma sentinela. E no muro, na muralha que cerca.va
Com a Rerum Novarum, por exemplo? \
o quartel, estava sentado um policial. E a janela do quarto aberta, com
grade, a luz acesa. Compreenda bem: esse homem, que não vê ninguém, \
S.P. - Bem. Aquele aspecto, na realidade, aproxima o comunismo do catolicis- não fala com ninguém, quando se encontra com uma pessoa que diz que·
mo. Por isso, certa vez, declarei; o co·munismo está mais perto do catoU. rer defendê·lo .. , Você pode imaginar a indignação, a revolta dele.
26
27

\.
A.a. - Prestes não chegou a ser torturado fisicamente, confere? Foi torturado A.O. Isso antes da Revolução?
psiquicamente.
Sim, antes da Revolução de 35. Então • .• Eu falava com ele com muita
S.P.
dificuldade porque necessitava de intérpreta. Ele só falava alemão. À vis·
S.P. - Não lhe encostaram a mão. Mas é desagradável, não é? A gente quer de·
ta disso, eu pedi ao Mlnistro da Justlça, o Agameno n Magalhães, para me
fender uma pessoa e ela . .. Então, na segunda vez em que fui lá, para le-
autorizar ir com o Justo falar com Berger. O Agamenon não me deu essa
var cópia dessa petição . .. Mas não fui ao quarto dele. Escrevi um cartão:
autorização. Eu então pedi essa autorização ao Juiz e o Juiz me deu. Eu
"Capitão Prestes, aqui vai. .. eu estou aqui no Gabinete, estou às suas
pedi então ao Justo que fosse lá comigo. Mas ele duvidou da autenticida~
ordens, se quiser alguma coisa irei falar com o senhor . .. " Ele leu e disse
para o soldado: "eu gostaria de estar com o Dr. Sobral". Então a praça de do Justo.
veio perguntar ao comandante se poderia trazê-lo para falar comigo. Ele
veio, cumprimentei-o, ele me faz essa pergunta: "0 senhor realmente A.O. Como assim?
entrou com essa petição?" Mas é claro, eu não seria capaz de fazer uma Quando oJusto chegou comigo, ele achou-que não era o Justo.
coisa dessas: entregar ao senhor a cópia de um documento que eu não en- S.P.
treguei ao Juiz , sobretudo a um homem como o senhor que não tem
meios de apurar se isso é realmente verdade. Porque se o senhor tivesse A.O. Por q'ue, o Berger já estava com problemas?
contado com sua família, com alguém, poderia pedir para ir ao Tribunal
ver se entrou. Mas o senhor não tem esses meio·s, assim que há de com- _ Já estava muito prejudicado . .. Ele foi piorando sempre. E o Justo então
S.P.
preender bem que seria um ato de uma indignidade indescritível fazer is- tirava a carteira de advogado do bolso e mostrava a ele.
so com o senhor.
A.O. - A nacionalidade do Bergerera realmente alemã?

Al diz ele assim: unão, eu. perguntei porque está muito bem feito e sobretudo S.P. _ Alemã. Ele era alemão.
muito corajoso. Meus parabéns". Esse documento foi publicado em O Radical.
porque o DIP não tinha censores nos jornais. Um comunista pegou a matéria e a A.Q. _ E porque ele foi conduzido para a Rússia, num navio russo, em 1946?
remeteu para Dona Leocádia, que estava em Paris. Ouando o Prestes foi preso, ela
e as· filhas estavam na Rússia. Ela foi então para Paris a flm de faz~r um movimen, S.P. Ah, porque era personagem importante da revolução mundial. Ele foi
to internacional em-favor de Prestes. Ela recebe esse doc~mento e fica entusiasma- membro do Comintern, assim tinha real importância naquela ocasião.
da. Então _me escreve uma -çarta, dizendo que até que enfim encontrara alguém
que se debruçava sobre o filho e que era capaz de fazer alguma coisa por ele. E es~
creve uma carta para o filho dizendo: "tenha confiança no Dr. Sobral". Ar é que
A.O. - Ele morreu na Rússia? Em 46?
tudo mudou...

S.P. - Eu não sei . ..


HARRY BERGER
A.O. - Mas ele saiu daqui em 46?
A.O. - E pelo Berger, alguém se interessou? Sim, quando houve o eclipse solar que fol visto de maneira total na região
S.P.
de Montes Claros, em Minas Gerais. A Rússia trouxe cientistas, astrôno~
S.P. Só a irmã. Diretamente, só ela. Alnda há um episódio. O Berger não quis mos, num navio, a fim de acompanharem o eclipse. Quando o navio esta-
conversar comigo. Suspeltava . .• Então, eu soube que ele teria procurado va indo embora, o Berger foi embarcado nele, a pedido do Prestes. Tinha
" ver o Justo Mendes de Moraes. E o Justo deu bons conselhos a ele, que
ele não segulu ...
havido a anistia do Getúlio, em 45, lembra-se?

29
28

"
( ..
/-1
A.O. Ele estava solto - pela anistia - vivendo onde? A.O. - E Berger foi torturado na Polícia Especial?

Estava internado numa casa. de saúde da Gávea, que era do Cunha Bueno.
(I
S.P. S.P. - -Não, na Polfcia Especial não foi não. Deve ter sido na Pol/eia Civil. A
('
Berger,- era mantido lá pelo Partido Comunista" Então o apanharam e o tortura foi na prisão. E inutilmente, pois a policia pegou o arquillo todo.
levaram para a Rússia. E morreu na Rússia, segundo informações que re- A palleia pegou o arquivo completo do Berger, o arquivo completo do {
I
cebi. Prestes, o arquivo completo do Bonfim, secretário do Partido Comunista.
Pegaram tudo. Não havia necessídáde de torturar ninguém para saberem (
as coisas. <'
( ,
MAIS LUIZCARLOS PRESTES E HARRY BERGER
A.O. Então por que torturaram o Berger?
,.
i
S.P. - Crueldade. Pura crueldade.
A. a. - O senhor depois acabou se tornando amigo pessoal do Prestes? (

(
S.P. - Muito amigo.
(
A.O. E até hoje ele se corresponde c.0m o senhor? Belo Horizonte, Bras/lia,
Rio de Janeiro, 1978, 1979. /
I
S.P. - Agora mesmo, em jáneiro de 19, mandou uma procuração para defendê-
lo nesses processos que estãó a,: (
(
A.O. - -Cartas pessoais dele, o senhor tem recebido?
(
S.P. - Não.

A. O. - E das irmãs dele? (


(
S.P. - As irmãs me procuram pessoalmente, elas saõ muito minhas amigas.
(
A.O. - E a Anita Leocádia, alguma vez procurou o senhor? l,
S.P. - Eu a defendi em São Paulo. (
(
A. O. - O Berger chegou a ser torturado?
(
S.P. - Ah, o Berger foi muito torturado.

À. Q. - Por que ele foi torturado e o Prestes não foi? \


I.
S.P. - Porque o Prestes era militar. O Fi/inta Müller não permitiu nenhum mau
I
trato a militar. Nenhum das militares foi maltratado, nenhum.

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AUTO DE DECLARAÇÕES PRESTADAS PELO CAPITÃO LUIZ
(
CARLOS PRESTES EM 9/3/36.
(

(
Cópia autêntica do Auto de Declarações prestadas pelo capitão LUIZ CARLOS (
PRESTES. (
~

Juízo ESPECIAL DO ESTADO DE SITIO (


(art. 175 § 10 da Constituição Federal)
I
AUTO DE DECLARAÇÕES de LUIZ CARLOS PRESTES: (

Aos nove dias do mês de março do ano de mil novecentos e trinta e seis, nesta ci· (
dade do Rio de Janeiro. Distrito Federal, Capital da República ,dos Estados Unidos
(
do Brasil, e no Quartel da Polícia Especial, onde se achava em diligência o Douto.r
Frederico de Barros Barreto, Juiz Comissionado para exercer as funções concer- (
nentes ao Estado de Sítio, nos termos do artigo cento e setenta e cinco ·parágrafo
(
dez da Constituição Federal, comigo escrivão ad·hoc, adiante nomeado, aí presente
LUIZ CAR LOS PRESTES, foi o mesmo interrogado, prestando as declarações, co- \
mo se segue: Nome - LUIZ CARLOS PRESTES. Filiação - Antônio Pereira Pres- (
tes e de Leocádia Prestes. Estado civil- casado. Idade - Trinta e oito anos de ida-
de - Profissão - Militar - Lugar do nascimento - Estado do Rio Grande do Sul- (
Residência - Rua Honório, duzentas e setenta e nove, Meyer. Local da prisão - (
Em sua residência. Data da prisão - Dia cinco de março corrente, cerca de oito
horas. Tem alguma declaração a fazer? Disse que as idéias polrticas do depoente ,
<'

têm sido devidamente externadas por publicações numerosas, entre as quais o ma~
nifesto de cinco de julho do ano findo da autoria do depoente, sendo portanto in-
teiramente solidário com os movimentos revolucionários de novembro do ano fin-
do e todos aqueles que se relacionarem com o programa da Aliança Nacional Liber-
tadora, visando a indepedência do Pals e a emancipação de seu povo; que é mem-
bro do Partido Comunista do Brasil e da Aliança Nacional Libertadora, da qual é o \
seu presidente de honra,' que não pode responder onde se encontrava por ocasião \
do movimento que irrompeu nesta Capital em vinte e sete de novembro último,
bem como nos dias anteriores e nos que se seguiram, até a data de sua prisão; que
\.
35 C

\
se nega a declarar se ao chegar ao Brasil- servia-se de um passaporte com o nome de
Antônio Vlllar, fazendo-se acompanhar de uma senhora com o nome de Maria
Bergner Villar; que por enquanto se nega a fazer qualquer declaração, reservando-
se para fazer oportunamente, relativamente ao bilhete dirigido ao capitão Trifino
Corr6a, como ainda ao salvo. conduto à Harry Berger; que asssume inteiramente a
responsabilidade polltica dos movimentos irrompidos em novembro do ano findo,
na Capital Federal e no Norte do Pafs; qué, vê na sua prisão o ato de um governo a
CARTA DE SOBRAL PINTO A SUA IRMÃ NATALINA
serviço do capital financeiro internacional, dos interesses de todos os seus lacaios
naciol)ais e que só se podemanterno poder encarcerando,perseguindoe martirizan· Rio, 11 de janeiro de 1937.
do os brasileiros que lutam pela independência do Brasil, pelo progresso do Pais;
que o depoente, como membro do Partido Comunista, está naturalmente na van-
guarda de todos os lutadores pela independência do Pafs, motivo pelo qual se en·
contra presentemente preso; que oportunamente, quando cessada a sua incomuni- Natalina,
cabilidade e verificar as acusações que pesam sobre o depoente, cuidará de fazer a
sua defesa e esclarecer a sua situação: que tendo sido preso foi conduzido para a Não fOI nenhuma surpresa para mim as informações que você me deu, na
Policia Central e na mesma data, à tarde, recolhido à Policia Especial; que não tem sua carta de 9 do corrente, sobre o carinho com que a estão tratando aí. Todos
qualq.uer outra declaração a prestar. E assim o M. M. Juiz mandou encerrar o pre- nós conhecemos, de ciência própria a'generosidade da família dos' nossos saudosos
sente depoimento que depois de !.ido e achado conforme vai assinado pelo M. M. Lean e Mariquinhas.
Juiz, por mim Ivane Evaristo de Oliveira, _escrivão ad-hoc e pelo depoente. Rio de Justa é a melancolia que desceu, incoercível, sobre esse lar de trabalho, de
Janeiro, Distrito-Federal, Quartel da Polícia Especial, aos nove dias do mês de onde nunca desertou a austeridade e a caridade; Viviam todos na mais completa
março do ano de mil novecentos e trinta e seis. (ass. ) F. de Barros Barreto. - Luiz harmonia, estimulados pelO exemplo paterno, que numa represel)tação viva a
Carlos Prestes. - Ivane Evaristo de Oliveira. Eu,Jairo Alves de Barros, todos indicava a lei do trabalho como sendo a principal fonte da prosperidade
escrevente o. datilogr~fei. exterior, e da tranqüilidade da consciência.

CONFERE É natural ~ssim, que os filhos ao verem desaparecer para sempre aquele que
lhes foi, no curso da vida, o guia previdente, leal, e s~lícito deixem-se tomar de
uma quase invencível tristeza.
Não tenho a menor dúvida, porém, que não tardarâ"o em voltar todos à
alegria primitiva. O Leon, com a sua têmpera de lutador indomável, imprimiu-lhes
Anôr Margarido da Silva na alma a sadia convicção de que deviam encarar a morte dos entes queridos como
Escrivão um episódio necessário na existência do cristão. Estou ce'rto de Que ele se magoa-
ria, nos últimos anos da sua vida, se alguém lhe ousasse dizer que, com a sua mor~
te, os filhos se declarassem in consoláveis.
Penso, Natalina, que você deverá contribuir, na medida das suas energias,
para incutir estes nobres pensamentos na mente destas nossas amigas, a quem to-
dos queremos tanto bem.
Aproveite, por outro lado, e no que diz respeito ~ você, os bons areS de
Vassouras, e a sadia alimentação que a-í se pode ter, para melhorar bastante a sua
saúde. E não se preocupe com as coisas que, ultrapassando os seus conhecimentos
práticos, têm de ser sempre mal apreciadas e julgadas por você.
Nota: a Constituição Federal mencionada é a de 1934.

, 37
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36
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Que tem vod:!, por exemplo que se envolver com o meu gesto de aceitação os mais sedutores. A tudo resistiu, porém, para ficar fiel ~s suas idéias, erradas e ( .
da defesa do Luiz Carlos Prestes? Longe de merecer eu censura dos corações bem
formados, como o seu, deverei deles recolher aplausos e louvores. Nunca me afir-
funestas, é verdade, mas adotadas e seguidas com rara sinceridade.
Depois, minha cara irm'ã, se você se mostra tão hostil a esse homem, cujo
r
mei homem TÃO NíTIOAMENTE CRISTÃO como na hora em que declarei ao patrocfnio, GRATUITO foi agora confiado ã minha modesta capacidade, é porque (
Conselho da Ordem dos Advogados no Distrito Federal que aceitaria o patrocínio os jornais estabeleceram em torno dos seus propósitos uma campanha de sistemáti-
f
da causa de Luiz Carlos Prestes. ca desmoralização.
Não há, minha cara irmã. ninguém que não tenha direito a uma palavra de Mas, podem os jornais constituir, entre pessoas sensatas, como você, ele- (
amparo, de conforto, e de defesa, ante o Tribunal dos homens. Deus, que tudo mento sério de cc;mvicção?
sabe e- tudo pode, antes de proferir a sua sentença contra Caim, que acabava de Se as notícias dos jornais valessem~ qual o juízo que você faria de mim?
derramar o sangue de seu irmão, quis ouvi-lo, como narra-explicitamente a Sagrada Quanta infâmia,_qualÍta calúnia, quanta miséria não publicaram os jornais a meu (
Escritura, dando aos homens, com este seu exemp_lo, a indicação irremediável de respeito!
que o direito da defesa é,-~ntre todos, o mais. sagrado e o mais inviolável. E, no entretanto, como, para você, que me conhece até o fundo da alma,
Nada ilustra melhor esta verdade do que a carta, que se segúe, escrita por eu sou diferente daquilo que os jornais disseram que eu era!
S. Francisco de'Salles ao Duque de Nemours, que condenara dois irmãos do Santo Não lhe parece lógico que a mesma coisa deva ocorrer com Luiz Carlos (
Bispo sem admitir que se ~efendessem: "Os Papas e os Príncipes", - diz o Santo Prestes?
(
que a Igreja venera -, "têm tribunais de justiça, aos quais enviam acusações a fim AI' tem.você,nestas palavras simples que o meu afeto ditou para o seu cora-
de que sejam examinadas a fundo, e para que, pela audiência das partes e das ção, os motivos que me levaram a aceitar a causa desse homem, cuja alma foi tam- (
testemunhas, se possa discernir de que lado está a verdade ou a mentira: é este um bém resgatada pelo sangue generoso de Jesus Cristo.
(
caminho que eles são obrigados a seguir, sob pena de danação eterna; dê outra ma- Inquieta, e cheia de solicitude pelo meu futuro, você pergunta agoniada:
neira não haveria mais justiça sobre a terra. Recebendo acusações contra meus "E as conseq9ências deste seu gesto?"
irmãos fizestes bem de ouvHas; mas se nelas acreditastes, perdoa-me, a mim, que Não me interessam, Natalina. Você sabe que só uma coisa me preocupa
sou não somente vosso fiel servidor, mas também vos_so dileto ainda que indigno
(
neste mundo: o cumprimento dos meus deveres. Aceitando esta causa ingrata jul-
Pastor, de vos dizer que ofendestes a Deus e que sois obrigado de vos arrepender, go, de boa fé, que estou me submetendo aos deveres da minha profissão. (
AINDA MESMO QUE AS ACUSAÇÕES FOSSEM VERDADEIRAS: POIS Assim como quem não tem coragem de renunciar aos prazeres não deve de (
NENHUMA PALAVRA CONTRA O PRÓXIMO DEVE SER ACREDITADA se fazer sacerdote, do mesmo modo como, quem tem medo da morte não pode se
ANTES DE SER PROVADA, ELA NÃO PODE SER PROVADA SENÃO PELO fazer militar, assim também quem não dispõe de coragem cívica, e de energia rno- l
EXAME E A AUDIENCIA DAS PARTES. Quem quer que vos fale de modo con- ral não deve de ingressar nos quadros da advocacia. ( !
trário, Senhor, está traindo a vossa alma. Por mais dignos de fé que sejam os acusa,. Estando de boa fé, e aceitando este patroc(nio em nome da caridade cristã, I
dores, É PRECISO SEMPRE QUE OS ACUSADOS SEJAM ADMITIDOS A SE
DEFENDEREM: os homens mais dignos de crédito podem se enganar, ou serem
espero que Deus me protegerá e amparará aos meus. (I
~
Abraçando-a e a todos dar, receba o meu beijo amigo fraternal.
levados por alguns motivos humanos a enganar." (HAMON - Vie de Saint Fran-
çois de Sales, vai 2Q, págs. 159/160),
j
~I
Sobral Pinto
Deixar, nestas condições, de patrocinar a causa de Luiz Carlos Prestes seria,
Natalina, atentar contra a caridade cristã. Ninguém, que se· honre com o magn(fico
nome de cristão. tem o direitó de não estender sua mão amiga a quem, como Luiz
Carlos Prestes, se vê insultado, injuriado, e escorraçado do convívio dos seus se-
melhantes. -
'\
Por maiores que sejam as suas culpas há nele alguma coisa de grande e de
elevado. Se ele tivesse pensado somente em si, como aconteceu com o Góes Montei~ l,
ro, o Getólio, o Juarez, e tantos outros, seria a estas horas General-do-Exército (
brasileiro, e, quiçá, Ministro da Guerra. Em 1930 não lhe faltaram oferecimentos

38
39
"
"
",--

\.
L.
. dicados ao meu patrocrnio, a par de erroS funestfssimas, alimentam·se, também,
! de verdades generosas, para a difusão das quais são capazes de grandes e respeitá-
veis renúncias.
Adotando, na defesa que irei fazer, essa orientação, penso, meu caro pre-
sidente, trabalhar para a manutenção, entre nós, das "tradições" de desinteresse
e amor às liberdades públicas, hoje em dia tão esquecidas no nosso meio.
Com estima e alto apreço, sempre ao seu inteiro dispor,
CARTA DE SOBRAL PINTO A TARGINO RIBEIRO, PRESIDENTE
Heráclito Sobral Pinto.
DO CONSELHO DA OAB.
Rio de Janeiro. 12 de janeiro de 1937.

Prezado colega,
Dr. Targino Ribeiro

A minha designação, pelo Conselho da Ordem, ao Tribunal de Segurança


Nacional, para -defender os acusados Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest Ewert
ou Harry. Berger, de que me dá nodeia no seu Ofício n9 20 (vinte), de 8 do cor-
rente, somente ontem recebido, eu a aceito como dever indeclinável de nossa no·
bre profissão.
Lamento apenas não dispor dos dotes de inteligência necessários ao desem-
penho de tão árdua, penosa, e diUcil missão, que o Conselho da Orderri achou, na
sua soberania, que devia de lançar sobre os meuS frágeis ombros.
O que me falta em capacidade, sobra-me, porém. em boa vontade, para me
submeter às imposições do Conselho da Ordem; e em compreensão humana, para,
fiel aos impulsos do meu cora·ção cristão, situar, no meio da anarquia contemporâ-
nea, a atitude destes dois semelhantes, criados, como eu e todos nós, à imagem de
Deus.
Quaisquer que sejam aS minhas divergências, do comunismo materia-
lista, _ e elas são profundas -, não me esquecerei, nesta delicada investidura que o
Conselho da Ordem me impõe, que simbolizo, em face da coletividade brasileira
exaltada e alarmada, A DEFESA.
Espero que Deus me ampare nesta hora grave da minha vida profissional,
dando forças ao meu esprrito conturbado para mostrar aos Jurzes do Tribunal de
Segurança Nacional que Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest Ewert ou Harry Ber-
ger são membros, também, desta vasta e tão atribulada famOia humana.

~limento a fundada esperança de que encontrarei, neste reservatório


imenso que é a caridade cristã, recursos dignos e apropriados para, sem renegar
os princrpios básicos da civilização brasileira, demonstrar que os acusados, ora in-
41
40
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CARTA DE SOBRAL PINTO A DOM SEBASTIÃO LEME, REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO, (
CARDEAL DO RIO DE JANEIRO, DE 14.1.37. JUIZ DO TRIBUNAL DE SEGURANÇA NACIONAL, DE 15.01.37.
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Eminência,
(
Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional.
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/I.d...a.+ . . . . h
Eu não me permitiria a indelicadeza, imperdoável, de deixar o meu Bispo (
,.- .... 0(,\--
na ignorância dos· motivos superiores que me levaram a acei~ar o patrocínio gra~
t~ito da c~~sa de Luiz Carlos Prestes e de Harry Berger. A -... - r --.~ /.. ...; ~ -v. '171-._' (
Tal patrocínio não é um gesto puramente profissional. Ele transcende, pela ..,.,.. •. ~ ~ t ~ ~ .R.. _,;;;.... d. c;. ~. .,.&...,
(
significação de que se reveste, o campo puramente jurídico, para atingir as esferas
superiores da moral social, da qual V. Eminência, por investidura Divina, é, e tem
J -
f?'r. C_ .... - - . $ _ k c;b.. -.j,
""'" 4·.....
I t. - (

de ser, no séio da coletividade brasileira, um dos guardas mais autorizados e I'.~. .. ~ co. ,.-,.r.:
~ .....
, . ..( .. .L;:.,
-
--", (
zelosos. (/_/;..., ........ -./-:. <f-. eo'l-L -I-.S 1- (
Na .carta que dirigi ao Conselho da Ordem dos Advogados, neste Distrito

. 9~;--7i
Federal, e na que mandei à minha boa ir'mã, que me escreveu, inquieta e agoniada, (
de Vassouras onde se acha, procurei, na medida das minhas forças, explicar os mó- (
veis que atuaram sobre a minha consciência.
(
Para conhecimento de V. Eminência remeto-lhe, por cópia, o texto integral
destas cartas no que se refere ao assunto em questão. HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, defensor de Luiz Carlos (
Nutro a esperança de que o meu amado Pastor não desaprovará o gesto Prestes, por nomeação de V. Exa., vem expor e requerer, no processo a que res-
desinteressado da humilde ovelha que, em todos os seus atos profissionais, se es- ponde este acusado:
força, dentro das suas possibilidades, por cumprir apenas cristãmente os seus deve- Munido da competente autorização do Comandante Queiroz, dirigi-me ao t.
res de estado. Quartel da Polícia Especial para me entender com Luiz Carlos Prestes sobre· a (
~ bem provável que o mundo, com a sua inesgotável mal ícia, não me defesa que estou incumbido de apresentar, no momento oportuno.
poupe às sUaS contundentes censuras. Mas tenho a certeza de que V. Eminência A autorização, que me foi entregue em mão por V. Exa., dizia: "De or-
não se esquecerá, neste transe delicado da minha vida profissional, de orar com dem do Sr. Juiz Raul Machado, autorizo ao Dr. Sobral Pinto que deverá identifi- (
-fervor a Deus Nosso Senhor para que dê luzes e conforto a este seu filho em car-se, a ouvir em separado EM MEU GABINETE os presos Luiz Carlos Prestes
Jesus Cristo, que lhe beija, respeitosamente, as mãos sagradas. \
e Harry Berger ,
O chefe de dia achou - e muito bem - que, em face dos termOS claros da I.
Sobral Pinto ordem recebida, só poderia permitir a minha entrevista com Luiz Carlos Prestes no
(
Rio, 14.L1937 gabinete do comandante.
\
4:1 43 \

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Por isto, determinou a condução desse acusado ao aludido gabinete, deven-
do, antes, entretanto, ser informado dos motivos da minha visita.
Tomando conhecimento desses motivos, o acusado Luiz Carlos Prestes
mandou me dizer que não lhe interessava tratar do assunto, que constituía o obje-
to da minha presença aí, não lhe cabendo, nestas condições, vir ao meu encontro.
Entretanto, se de algum modo me parecesse - a mim, e não a ele - útil
ir até à presença dele, não teria a menor dúvida em me receber na sua célula.
É evidente que considero dever indeclinável da minha condição de defen-
REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO. DE
sor ir ao encontro do acusado Luiz Carlos Prestes, ao menos para expor·lhe a 15.01.37.
orientação que pretenda imprimir à sua defesa.
Mas, como a ordem escrita dada ao chefe de dia, e da qual em mesmo fui
Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional.
o portador, determinava que a minha entrevista com o acusado Luiz Carlos Prestes
se deveria realizar "no Gabinete do Comandante", não me fo.i possível penetrar na
célula do acusado acima referido.
cYhA.
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_ 'li,,?' _
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Assim, venho requerer a V. Exa. que se digne tomar as provid~ncias ne- !fR .... ~ .... ---- f_O ........ A·_·~, p .......

cessárias para que me seja outorgada a autorização, que reputo indispensável ao "..r-r '" k....... "". ~<"', "j~ ~~ ...
~ ~}-o,t_ ~ ~g.. <j- ,...- ""?lo.
cumprimento do meu dever, de me entender livremente, com as cautelas que o 7J..;J<.,t.;: u-".A ;..., .:.-. .. <-...:~~".., .p. ......
...... ~ t? .. ~....:.~,.7 .... ~.Li. .... ~_<.-<./
Poder Público julgar necessárias, com o acusado Luiz Carlos Prestes. ('U'-- ~~"7;:.,.'~ • ...,.. ~ /~-I.-1-J:'X -
, GJ--t"]~-7
NeStes termos, I tI-;;
P. Deferimento. HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO. defensor de Arthur Ernest
Ewert ou Harry Berger, por nomeação de V. Exa.,vem expor e requerer, no pro'
Distrito Federal, 15 de janeiro de 1937. cesso a que responde este acusado:
Como é de seu conhecimento o art. 53 do Regimento Interno deste Tribu-
a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto nal de" Segurança Nacional dispõe: "Os acusados ficarão à disposição do Tribunal
Defensor l Iex-officio" OU DO JUIZ PREPARADOR, conforme o caso, não sendo permitido à autorida-
de, sob cuja guarda estiverem, transferi-los ou removê·los de presídio, durante o
processo; e, quando faça por motivo relevante, deverá dar imediata comunicação
ao Tribunal". •
Decorre deste preceito que incumbe a V. Exa., na qualidade de Juiz Prepa-
rador do processo do acusado Arthur Ernas1i Ewert ou Harry Berger, atender às
necessidades mais imediatas da sua instalação e reclusão no presídio a que o referi·
do acusado estiver recolhido.
Achando-se, pois, o acusado Arthur Emest Ewert ou Harry Berger preso à
disposição de V. Exa., incumbe-lhe, Exmo. Sr. Juiz, providenciar para que o trata·
menta a lhe ser ministrado, nas nossas prisões de Estado, esteja em equação perfei·
ta com os postulados da nossa civilização, que é, no dizer autorizado do Sr. Presi-
dente da República, de caráter nitidamente cristão.
Discursando aos brasileiros, em 1 de janeiro de 1936, declarava o Exmo.
Sr. Presidente da RepÇEblica: "Alicerçado no conceito materialista da vida, o comu,

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44
(
nismo constituiu~se o inimigo mais perigoso da civilização cristã. À luz da vo"ssa (
formação espiritual, só podemos concebê-lo como o aniquilamento absoluto de to~
das as conquistas da cultur~ ocidental, sob o império dos baixos apetites e das ín~ (
fimas paixões da humanidade - espécie de regresso'ao primitivismo, às formas (
elementares de organização social, caracterizadas pelo predoml'nio do instinto gre~
gário e cujos exemplos trpicos são as antigas tribos do interior da Ásia" (Edição do C
Departamento Nacional de Propaganda, pág. 4). (
Como vê V. Exa., o Chefe da Nação se esforçou por distinguir os métodos RESPOSTA DE EUZEBIO DE.QUEIROZ FILHO, COMANDANTE
e processos usados pelo comunismo do~ métodos e processos preconizados pela ci- (
DA POL[CIA ESPECIAL, AO JUIZ RAUL MACHADO, EM 25.01.37.
vilização cristã. Enquanto que aqueles se revestem de características de indisfarça- (
da violência, estes se ostentam pacíficos e humanitários, quaisquer que sejam os R ia de Janeiro 25 de janeiro de 1937.
domínios da atividade da criatura racional. Do Sr. Comandante da Polícia Especial. (
Nos povos que se criaram sob o influxo do cristianismo já não se compre- Ao Sr. Juiz do Tribunal de Segurança Nacional. (
ende, hoje em dia, um regime carcerário que desconheça ao próprio condenado de Exmo. Sr. Dr. Raul Machado (
delito comum o direito a um regime adequado a sua condição de ente racional e
pensante. Em resposta ao ofício desse Juízo nÇ 67 -'C.A. de 18 do corrente cum~ (
Fundado nestes imperativos da nossa consciência coletiva é que· venho, pre-me informar:
(
Exmo. Sr. Juiz, pedir, na qualidade de defensor de Arth.ur Ernest Ewert ou Harry (1) - o acusado Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger, encontra~se de fato
Berger, imediatas e apropriadas providências para que seja ministrado a esse acusa- recolhido ao local indicado pelo Dr. Sobral Pinto que é. a Pagador ia desta Corpora- (
do, no presídio onde se acha, um tratamento à altura da sua condição de homem. ção, visto não dispormos de outro local mai~ apropriado, pois o único lugar exis- (
Basta lançar a vista sobre esse acusado para. que se verifique, desde logo, o tente capaz de proporcionar conforto e. segurança, foi destinado ao preso Luiz
seu precário estado desaúde. Sua magreza e palidez não deixam de pairar a menor Carlos Prestes. Em virtude da incomunicabilidade deste último não nos foi possí~ (
dúvida, a respeito da fragilidade atual da sua saúde a quem quer que d tenha na vel colocá-los juntos, tendo, portanto, este comando lançado mão ~aquele lugar (
sua presença. que oferece uma certa segurança;
O 19cal que lhe foi designado para presídio é o menos indicadO para um
(
(11) - o tratal'!lento dispensado a Harry Berger é em tudo idêntico ao pro-
homem dominado por essa pobreza fisiológica que acabo de descrever. Esse local é porcionado a Luiz Carlos Prestes, continuando a alimentação a ser fornecida pelo \
um acanhado vão inferior de uma das escadas que dão aces~o ao pavimento supe- Restaurante Reis, como o era quando os referidos presos se encontravam à disposi-
(
rior do Ouartel da Pol(cia Especial. ção da D.E.S.P.S. por quem eram custeadas, visto não termos recebido qualquer
Nestas condições, cabe~me requerer a V. Exa., no exerdcio do mandato ordem que revogasse ou modificasse a primitiva. O estado de debilidade física em (
que me foi confiado, que se digne de providenciar não só para um local apropriado que se encontra Harry Berger, é provavelmente originário da abstinência a que o
a tão rigorosa reclusão, como também para que lhe seja ministrado um tratamento mesmo, de vez em quando, se submete voluntariamente. De uma feita, esse preso
que mostre que nós brasileiros somos· aquilo que o Exmo. Sr. Presidente da Repú- levou 17 dias consecutivos sem consumir qualquer alimento, pois quando estes lhe (
blica disse que constitui a nossa característica por excelência, isto é, um povo "de eram apresentados, recusava-os, tendo essa ocorrência sido comunicada à Inspeto- (
alma sempre aberta à ternura e aos comovidos anseios de paz e de fraternidade" ria Geral de Polícia, em of(eio desta P.E. n9 2.09g·de 21.07.1936.
(I bid., pág. 3). Tal greve, que só terminou por sua livre e expontânea vontade, repetiu~se
Nestes termos, algumas vezes mais, com duração, porém, menor, isto é, de 3 a 5 dias. (
P. Deferimento. Outrossim, este Comando consulta \I. Exa. sobre para quem deverão ser
remetidos os vales e contas referentes à alimentação fornecida aos dois citados
Distrito Federal, 15 de janeiro de 1937. presos, visto os mesmos já não mais se encontrarem à disposição da D.E.S.P.S. \
Heráclito Fontoura Sobral Pinto
Respeitosas .Saudações.
Defensor "ex-officio"
Euzébio de Oueiroz Filho. Cmt.
\
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47 \
\.

\
de uma ordem social que-se alicerce em valores inteiramente opostos aos que fo-
ram até agora adptados e seguidos..
Mirabeau, Brissot, Vergniaud, Danton, Saint-Just, Robespierre, Napoleão,
organizadores todos de uma ordem social liova no mundo ocidental, desaparece-
ram, afastados no turbilhão da morte, da guilhotina e do exílio; mas, o ideal
revolucionário, que os inspirou, e _de que foram, em certos momentos, os s(mbolos
legítimos, a todos sobreviveu, continuando a alimentar as gerações que lhes suce-
DEFESA PRÉVIA DE HARRY BERGER deram, para acabar afinal.por se infiltrar na mente daqueles mesmos que se viram
derrubados em nome dele. E o que é mais surpreendente, estes vencidos de outro·
ra, voltando mais tarde ao poder, cuidaram de consolidar no próprio seio de suas
respectivas nações, esse ideal revolucionário que provocara, anos' antes, a destruição
da velha ordem social, de que tais vencidos tinham sido os mais graduados repre-
sentantes!
Mas, para que recuar tão longe, se bem perto de nós a i?loqüência dos fatos
contemporâneos nos fornece idêntico testemunho?
o que ora se inicia não é s6 o julgamento de um homem. Efêmero instru- Onde está Lenine, e o que é feito de Trotsky? Conduzido aquele ao tú-
mento de uma causa, que se vem afirmando, enérgica e destemerosa, no seio mesmo mulo, e·levando esta vida de "judeu errante", o comunismo continuou, entretan·
da civilização ocidental, como_simbolizadora da aspiração generalizada das massas to, - orientado por outras mãos possantes - a se:guir a sua rota implacável, desvi-
proletárias contemporâneas, Harry Berger não se ilude com a insignificância de seu ando inteligências- lúcidas, envenenando corações generosos,. e armando braços
destino pessoal em face do grande drama em que essa causa joga os seus destinos vigorosos, na sua faina m(stica de tentar a construção de um -mundo novo, sem
históricos. classes, sem propriedade individual, sem códigos, e sem moral, escudado apenas
Simples obreiro de um ideal, que não criou, mas a que aderiu com firmeza, num tipo científico de homem até hoje inédito, mas por cuja criação trabalha,
não desconhece que a sua pessoa nada representa no tumulto desta agitação, hoje num esforço continuamente gigantesco, a pedagogiá soviética.
incoercível, que abala até os seus mais profundos alicerces da organização social, Que vale, pois, ante estes exemplos decisivos da história, a liberdade de
que o século XIX, alheio aos direitos imprescrit(veis do trabalhador, legou, orgu- uma figura apagada do mundo comunista, como Harry Berger? A 'certeza da ver-
lhosamente individualista, ao egorsmo satisfeito das classes' dirigentes da nossa dade de sua doutrina, a frieza dos seus propósitos revolucionários, e a firmeza so-
geração. branceira com que aceita as conseqüências do seu procedimento, acabarão, apenas,
Nem no dornrnio do pensamento, nem no da ação, Harry Berger avultou por provocar o respeito dos que, no meio da tibieza e do ego(smo dos nossos dias,
jamais, entre nós, ou em estranhas terras, como figura de alta expressão do movi- sabem apreciar o valor das convicções arraigadas.
mento comunista contemporâneo. A chama, assim, desse seu ideal, que, empu- O julgamento, assim, de Harry Berger passa a ser, em processo desta natu-
nhado por outros em diferentes quadrantes da terra, convulsiona povos inteiros; - reza, um episódio secundário, tão insignificantes são.as suas conseqüências sobre o
levandp-os até à sangueira da guerra civil, que nada respeita nem Jesus Cristo e desenvolvimento ulterior, mesmo entre nós, da causa de que ele se fez o pregoeiro
seus templos, nem as crianças e os velhos, não desaparecerá do coração de muitos impenitente e convicto.
dos brasileiros pelo fato de ter sido condenado Harry Berger à pena de 10 anos de O que interessa, portanto, antes de tudo, é examinar a r:'atureza mesma
prisão. Outras individualidades, incomparavelmente bem mais representativas do. desta causa e o sistema de combate que os nossos governantes contra ela organiza-
que a sua, e outros pa(ses, de projeção desmedidamente bem mais importantes do ram, para ver se este combate, ora em pleno. desenvolvimento, se inspira. num supe-
. que o nosso no cenário mundial, permanecerão de pé, atuando, - com a dureza rior princ(pio de justiça.
dos seus argumentos impressionàntes e com a força compressora de seus exércitos Que causa é esta? Como surgiu, e quais os seus processos?
imensos _, sobre a mente conturbada dos intelectuais do Ocidente e sobre a cons- A causa, - não nos iludamos - é a da ascensão social e polftica das massas.
ciência 'irritada das massas mundiais insatisfeitas, convocadas, ambas, deste modo, Imposs(vel seria negar, hoje em dia, a verdade deste asserto. Esp(ritos serenos, que
sem cessar, para trabalharem pela implantação, no seio da humanidade sofredora, se vêm debru,çando, há longos anos, sobre a realidade social, para desvendar-lhe a

48 49

"
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trama interior da contextura, proclamam, corajosos e verídicos lIVivemos debaixo tural do século XIX, é a conseqüência lógica e necessária das bases falsas em que se
do brutal império das massas" (Ortega YGasset - LA REBE LlON DE LAS MASAS~ assenta o edifl'cio social moderno. (
pág. 22). Outro depoimento, não menos autorizado, atesta: "Forças novas entra- As classes dirigentes, em vez de examinarem_ com atenç~o desinteressada, (
ram na história. Há muito tempo que a democratização da sociedade começou. e com ânimo objetivo, os dados do problema, encarando-o como do dom"tnio da
Mas,não foi senão depois da guerra que a irrupção das massas sobre o cenário da sociologia aplicada, definiram-no como uma simples questão de psicologia. Dentro
história se tornoU aparente. Eis o fator fundamental da história do nosso tempo. deste estreito ponto de vista, os movimentos sociais das massas não nascem, na sua (
Até aqui, as massas estiveram afastadas de um papel ativo e visfvel" (Nicolas maior parte, da má distribuição da "riqueza produzida pelo trabalho, mas da perver-
(
Berdiaeff - DESTI N DE L'HOMME - pág. 57). são da yontade do" homem, desejoso este de ser aquilo que, pela ausência de
Atentem os Srs. Jufzes para a realidade deste fato: o esforço das massas qualidades adequadas,_ ele nunca poderia pensar em obter numa sociedade elemen~ (
trabalhadoras para empunhar, com firmeza e decisão, o governo das nações. Todas tarmente organizada.
(
as lutas que o nosso século viu, e está vendo desencadearem-se no cenário das cole- Deste modo, classes conservadoras e proletárias se erguem, na estrutu-
tividades humanas, têm a sua verdadeira explicação neste esforço impetuoso e gi- ra social contemporânea, uma em face da outra, numa .luta feroz, e sem hu- (
gantesco. manidade. Aquelas tudo empreendendo para conservar, nas suas mãos possantes, (
De que derivou, entretanto, na mente das massas, a preocupação persisten- a direção da pol(tica governamental, onde se 'manterão no-primeiro plano -os seus
te de tal esforço? Foi a mera ambição do poder? Foi, outrossim, o estimulante in- interesses; estas, num esforço oposto, buscando escalar os postos do governo, para
confessáve_1 da inveja? Foi, ainda, a torpe cupidez da riqueza? inaugu.rar um regime polftico e social, que melhor se ajuste às suas indubitáveis (
É" possfvel que o coração dos trabalhadores, tal como o dos dirigentes pri- necessidades.
(
vilegiados, não se mostre puro e isento destas concupiscências inferiores. Onde o Ninguém ousa, atualmente, negar a realidade deste" ·conflito, pavoroso no
homem está não se compreende" que não apareçam, também, todas as paixões, sa- seio das coletividades humanas. Jacques Maritain-, prefaciando a obra de Briefs, - (
dias e perversas, que se aninham na sua alma contraditória. há pouco citada - trouxe; para o cenário da cultura universal, o seu depoimento, (,
Mas, a origem imediata do movimento social das massas se encontra, no forma"1 e categórico: A existência, na ~ociedade moderna, de duas ·formações com
I'

inferesses adversos, é um fato histórico que, como todos os fatos da história, pres- (
dizer de todos- os competentes, nos princfpios sociais do próprio capitalismo. "Nos
sistemas anteriores, ou bem havia associaç~o do trabalho e da propriedade, - neste supõe antes dele, com condições dadas independentes da vontade humana, longas (
caso o trabalhador gozava da liberdade cfvica - ou bem o -trabalhador não era cadeias de acontecimentos contingentes e de ato de liberda.de que neles produzem
(
proprietário, mas, então, ele não era também um cidadão livre. A alternativa era o seu fruto; a estrutura econômica e social da qual ele depende uma vez obtendo a
clara para a época pré·capitalista. Mas, o capitalismo empreendeu a grande aventu- existência, não poderia desaparecer senão com a substituição desta estrutura por (
ra de a"ssociar r em massas de homens incessantemente crescentes, a ausência de outra totalmente diferente" (lbid., pág. IX).
(
propriedade a uma inteira liberdade pessoal e a uma inteira igualdade política. Ho- Outro cristão, Nicolas Berdiaeff, tendo feito a mesma verificação procedi-
je podemos dizer que o propósito de unir a liberdade a uma ausência permanente da por Jacques Maritain, adverte: "Qual a atitude que deve adaptar a consciência \
de propriedade não era uma solução própria para assegurar a paz social. O pro- cristã a respeito deste fato? Ela pode manifestar a respeito dele a sua apreciação (
b;ema surgiu de novo: em que condições a libérdade do trabalhador é compat(vel pessoal, mas não pode de maneira alguma repelHo. O dever que as impõe a todos
os cristãos é de olhar a realidade na face, e de ser dela plenamente conscientes. Na- (
Ç,2-r.l um regime em que as massas são desprovidas de propriedade? Como procurar
a segurança da existência e garantir a liberdade? ~ mister sacrificar a liberdade, e da é mais oposto ao cristianismo do que a "idealização" da realidade; parece bem
~he proferir a submissão do trabalhador ao Estado para obter uma paz social com- que é ele, precisamente, que deve ignorar o medo, quando se trata de desmascarar
parável à paz que reina nurT'! cemitério? Ou, então, é poss(vel instituir garantias e de condenar a realidade mais funesta e mais pecadora. A luta das classes é um fa- \
econômicas que ponham termo ao que há de malfazejo num regime onde o traba- to irrefutável, ela desempenha na história um papel preponderante, e é sobretudo \,
lhador é desprovido de propriedade e submetido aos azareS do mercador' (Goetz a nossa época que traz a marca decisiva do seu desencadeamento" (LE CHRIS·
Brie!s - LE PROL~TARIAT INDUSTRIEL - pág. 3). TIANISME ET LA LUTTE DES CLASSES - pág. 12).
Não nos paguemos de-palavras. O que os Srs. Ju(zes têm diante de si, trans-
"
O que vem ocorrendo,assim, no mundo contemporâneo contra a estabilida-
pondo a secundária individualidade de Harry Berger, é a própria causa do prole-
\.
de das instituições pol!'ticas e sociais, que nos foram legadas pelo pensamento cul·

50
51
,
'-o
(
tariado. Não se deix.em empolgar pelos diagnósticos apressados dos incompeten- nw'am, e o movimento operário se mostrou tanto mais radical quanto a condição
tes, que procuram estabelecer distinção entre o proletariado brasileiro e o proleta- proletariana se fazia mais rigorosa. O que cria o problema, é, então, menos a qua-
riado europeu, dizendo que o trabalhador nacional não carrega no seu coração ge- lidade do operário salariado do que a qualidade proletariana do operário salaria.
neroso.o pesado volume de ódios rancorosos, que vêm acumulando, de ano para do" (lbid., pág. 261).
ano, na alma revoltada do trabalhador europeu. Em toda a parte, assim, no mundo civilizador a questão vem sendo posta,
O problema, tal como foi posto diante do pensamento moderno, é destes ante-a mentalidade displicente das classes conservadoras, pelos pensadores mais re-
que não conhece fronteiras nem territórios. Ele se assemelha, em muito de' seus presentativos das doutrinas soCiais. que disputam, entre si, a preferência das massas.
aspectos, ao das ciências experimental e sobrenatural. Assim como, para estas, Ninguém, porém, .. neste terreno, leva a palma a05 representantes do marxismo.
onde quer que esteja o homem, ali elas estarão com seus postulados, os seus méto- Voz insuspeita (Robinot Marcy S.J. -AUX PRISES AVEC L'APOSTASIE DES
dos, e a sua técnica; assim também, onde quer que surja uma indústria vasta e MASSES - pág. 9) informa, a tal respeito, aos observadores atentos do movimen-
adiantada, ali também aparecerá o problema proletário com os seus reclamos, que to social contemporâneo: "Cada ano, novos ácréscimosrvindos das classes traba-
têm, na justiça absoluta, as fontes imperecíveis das suas reivindicações. lhadoras, aumentam as fileiras dos revolucionários. A d.outrina social e econô-
Este problema" já está, desde muito, posto diante do pensamento brasilei- mica marxista lhes parece, com efeito, atender às suas aspiraçõe~ de fraternidade
ro. Urge" pois, resolvê-lo. Nsnhum povo furtar-se-á ao exame desta questão. Há e de mais bem-estar. As melhorias trazidas; no curso daS' duas últimas gerações, à
quase 70 anos Karl Marx (LA GUERRE CIVI LE EN FRANCE - trad. de Char- sorte dos trabalhadores, não foram devidaf:, por uma parte, à atividade dos eleitos
les Languet, págs. 86 e 87) anunciava convicto e verdadeiro: "O espírito burgúês socialistas?"
impregnado que. é de noções policiai!', julga naturalmente que a Internacional age À so mbra destes serviços inegáveis, vai o mandsmo se apoderando, pouco
à maneira das sociedades secretas e d05 conspiradores, ordenando o seu órgão cen- a pouco, do coração sofredor e resoluto da parte mais numerosa do gênero hu-
trai, de tempo em tempo, explosões popUlares em diferentes países. A nossa asso- mano. Tanto mais fácil é esta tarefa do marxismo nivelador quantq nele nem
ciação não é, na realidade, senão um laço que liga uns aos outros os operários mais tudo é falso e mentiroso, como o próprio Berdi••ff (PROBLEME DU COMMU·
avançados entre os povos diversos do mundo civilizado. Em qualquer lugar, debai- NISME - pág. 32), não pode deixar de reconhecer: "O comunismo é uma manifes·
xo de quaisquer formas e cDndições que a luta de classes chegue a tomar consciên- tação complexa à qual não se poderia responder por "sim" ou por "não". Vimos
cia, é bem natural que os membros da nossa. associação se encontrem na primeira que a verdade e a mentira estão nele estreitamente lígàdas. Se as colocasse nos pra-
fila. tos da balança verdade e mentira: perceber~se-ía que, no co'munismo as verdades
O solo de onde ela ,ai, onde ela mergulha suas raízes, ~ A PRÓPRIA SO- são numerosas, e que a mentira é uma. Mas eSta única mentira é tão pesada que ela
CIEDADE MODERNAI I~enhum morticínio, por mais imenso que seja, poderá prevalece sobre as verdades".
arrancá-lo dali. Enquanto, porém, as verdades são palpáveis para a inteligência inculta das
Para triturá-Ia, os governos-deveriam triturar o poder despótico do capital massas, essa mentira, ao contrário, requer, para Ser percebida, uma 'cultura de con-
sobre o trabalho, - condição mesma de sua própria existência parasitária". ceitos quase sempre ausente da mentalidade, descurada, dos homens do trabalho.
Não há como repelir esta verificação de Karl Mal'x, quando, presentemente, Tal mentira, que nos enche de horror, outra não é senão o materialismo.
outro pensador r vindo do quadrante cristão" chegou à mesma conclusão. Estudan- Discfpulo submisso de Jesus Cristo, cujos ensinamentos me esforço, por entre as
dar com espfrito de verdade, a estrutura sOG.ial da nossa época, Goetz Briefs, adver- fraquezas da minha vontade, em seguir em todas as manifestações da minha vIda,
te: "O que é certo, é que o problema proletário se exprimiu historicamente por não me posso solidarizar com os atentados praticados, no mundo contemporâneo,
uma agitação permanente do mundo operário desde que o regime das usinas acar- pelo marxismo, duro e implacável, contra o que de mais arraigado e profundo
retou a pro!etarização de uma parte consideráv~1 da população. Não é, - para falar existe no meu ser: a Fé católica.
com propriedade - à qualidade do operário salariado que é preciso ligar a agita- Mas, a reprovação que me merecem tais desafies orgulhosos à bondade
ção sooial e o movimento operário: a atitude do proletariado americano mostrou divina é de molde a toldar a serenidade do meu julgamento a ponto de não encon-
suficientemente que isto s;eria um erro. Enquanto largas possibilidades de ascenção trar ele uma expliqação humana para essas demências coletivas das maSsas aposta-
social se -ofereciam ao operário, enquanto pelo menos a esperança de um ergui u
tadas? Não. Como cristão eu reconheço a minha parcela de responsabHidade nestes
mento social não lhe era interdita, não houve movimento operário; o mundo ope· desatinos. Nesta raiva satânica, que explode em blasfêmias contra Jesus Cristo e a
(, rário se pós em movimento na medida em que as possibilidades de ascensão dimi- sua verdade, devemos nóS cristãos "ver, antes de tudo, O resultado da nossa cump!i-.

, 52 53

(
(
cidade para com o paganismo dos nosSos governantes. Ninguém, melhor do que por um poder que o povo repele e odeia" (1905 - ed. de L'HUMANIT~ - pág. (
Sertillanges (SOCIALlSME ET CHRISTIANISME, págs. 276/277), diagnosticou 283). ,
esta cumplicidade, que se verificou tanto na Fran~ do século XI X, quanto no Estas palavras só impressionàram pelo que nelas havia de arrogante e de .'
Brasil independente: "O primeiro culpado aqui, é esta preciosa burguesia volteria· ofensivo. Ninguém nelas quis pressentir a advertência, cheia de Ó9io, mas grave e (
na de 1830, que tendo-se aproveitado da revolução de 89, quis se manter onde real, que emanava do seu Contexto geral. Os governantes de então, - tais como os
de hoje - se obstinaram, na sua cegueira impressionante, em encarar o movimen- (
estava; achava que tudo ia bem no melhor dos governos parlamentares; declara~
va·se pela ordem, entendendo por ordem a tranqüilidade gozadora dos besti possi· to das massas como o resultado_ apenas da ação demagógica de pol{ticos ambicio- (
dentes enriquecidos com os despojos do antigo regime. sos de poder e de mando. Já A. Comte a encontrara no seu tempo. Da{ esta sua
A religião, ninguém a queria para si; mas pagava-se o Bispo e o Cura para impressionante afirmação (SISTEME DE POLlTIQUE POSITIVE - 4~ ed., vol. í
19, pág. 152): "O comunismo, - que não traz o norne de ninguém - não'é um (
pregá-Ia ao povo. A religião era necessária "para o povo"; sem o que ele-não seria
sábio, não tendo, para bem se conduzir, as altas razões do "Constitucional" e do produto acessório duma situação excepcional. É mister nele ver o progresso es-
pontâneo, antes afetivo do que racional, do verdadeiro esp{rito revolucionário. (
"Século" .
que tende hoje a. se preocupar sobretudo com as questões morais, e que repele (
O mesmo motivo qúe vos fazia ateu ou livre pensador não vos fazia menos
para o segundo plano as questões pol(ticas propriamente ditas."
crente ... para os outros; pois, esta crença que se repelia como importuna, impor.; ('
tunando também o povo e o mantendo tranqüilo, faria que se seria, assim, dupla· Nada adianta, assim conduzir perante Tribunais Especiais os pregoeiros re-
(
mente menos incomodado, duplamente mais tranqüilo. volucionários das reivindicações proletárias no mundo contemporâneo. O movi-
Apresentava-se, assim, a religião de amor sob o aspecto de um gendarme, e mento das massas não é- a conseqüência da rebeldia dos espúitos. Não o desenca- (
o que deveria acontecer, aconteceu. O povo, mais altivo do que se pensou, ouvin- deou, também, no seio das_ coletividades modernas, a louca ambição de desconhe- (
do raciocinar estes pomposos egoístas, vendo que se lhe jogava a Fé cómo se lança cer o princ{pio de autoridade.
um cabresto, não quis !,"ais para ele isto que se tratava nas altas camadas com Certamente, na desordem moral dos no.ssos tempos. essas duas circunstân- (
menosprezo tão soberbo". cias terão concorrido, e não pouco para a_agravação do mal-estar geral. Mas, cami- (
Como se vê, o problema oferece uma complexidade excepcionalmente in- nho errado seguirá, sem dúvida, aquele governo que, impenetrável às lições inca-
trincada,_ que não pode ser- destrin~ada pela ação,_ simplista e primária, de um sis- (
erc{veis ,da experiência sociar, teimar em ,não enxergar que o problema do co-
tema de repressão polltica, organizado sobre a base caduca de um Tribunal de munismo já não- comporta nem soluções meramente pol(ticas ou jur(dicas, nem (
Exceção. repressões exclusivamente nacionais. É que b homem moderno vive, em grande
Não se deixem Os Srs. Ju(zes tomar do aparente ambiente de eficiência do (
parte, de tendências fundamentais do nosso tempo, uma das quais é, no dizer justo
atual aparelho repressor, organizado pelo Governo Federal e do qual são SS. Exas. de Maurics Paz (in LE RAJEUNISSEMENT DE LA POLlTIQUE, págs. 243/244), (
dignos e ilustres membros. "a tendência ao universal. Não mais economia nacional, não mais mesmo economia
A Rússia tzarista também conheceu este sistema de repressão. Quando, em (
continental. Todos os pa{ses, todos os continentes são cada vez mais solidários uns
1905, o marxismo russo, ainda incipiente, começou a agitar os meios proletários, o com os outros. Há cada vez menos, no fim das contas, - a crise atual demonstra ~
poder público, não confiando na ação dos seús agentes normais, criou, então, um - conjuntura própria de cada pa{s. Todos sofrem, em graus diferentes, a mesma
Tribunal Especial. \.
conjuntura. A produção é anárquica, mas ela tem um caráter mundial em virtude
Trotsky, que era um dos indiciados, compareceu perante os seus ju{zes, de tbdas as matérias-primas e das mercadorias essenciais. As trocas tendem igual- (
para dizer-lhes: "O processo do Soviat dos Deputados Operários não é senão um mente a transbordar os quadros antigos. O mundo se comporta d'ora em diante
episódio na luta da revolução contra a conspiração governamental de Peterhef. Na l
como um corpo economicamente único, cujas partes componentes estão em rela-
magistratura policial imaginou-se verdadeiramente que o julgamento dos membros ção de interdependência cada vez mais estreitas . \.
. do Soviet seria um ato juridicamente motivado? Podia-se pensar que o processo
Todo particularismo, toda tendência ao isolamento aparece já como um \.
fosse instaurado e prosseguido pela iniciativa de um Poder Judiciário independen-
te? Que a cau~ fosse denominada de direito estrito? Isto é mais do que duvidoso. anacronismo idiota. A etapa do nacional que constituiu, outrora, um progresso, \,

Cada um compreende muito bem que a prisão do Soviet foi um ato de arbitrário foi largamente ultrapassada: hoje; é se fazer reacionário quem pensa só como eu-
ropeu. Mas, como sempre, a ideologia se atrasa em relação ao fato". \
poJ(tico-militar, que ela- marca um momento da campanha.sangrenta empreendida
~.
54 55
~ .

(,.-

l.
Quando os aeroplanos eliminaram as distâncias, quando o rádio dá ao ho- elas se julgam, também, com o direito de realizar no seu seio. E, deste modo,
mem o dom da ubiqüidade, quando o cinema revela diariamente às màssas prole- quando menos esp'eramos, vemo-nos em frente de casos como o de Harry Berger.
tárias o bem-estar da burguesia, e quando a indústria universaliza a produção, não Tais são, Srs. Ju{zes, as reflexões, profundamente meditadas, que O dever
é poss(vel encarar os fatos sociais como fenômenos puramente nacionais. O mun- de defensor ex-offício me impõe oferecer ao seu exame, à guisa de defesa prévia
do, ligado entre si em todos os aspectos da sua atividade multiforme, não pode de Harry Berger, ante processo que lhe move a Justiça Especial.
admitir mais soluções eivadas de caracter(sticas puramente territoriais. Nelas deixei estampada a orientação que irei seguir nas razões finai.s que
As pátrias continuarão a existir. Por elas hão de se bater, generosos e herói- terei de desenvolver, em mome~to oportuno, com ânimo sereno, e espírito seden- "
cos, os seus filhos mais estremecidos. O homem, ligado à terra sobre cujo céu os to de justiça.
seus olhos viram pela primeira vez a luz, sentirá o seu coração pulsar, tal como o Habituei~me, no meu já longo contato com os homens, a olhar, antes de
de seus pais, em anseios de ternura e de grande em prol daquele torrão que foi a tudo, para o interior das suas almas; Só assim poderemos aproximar uns dos ou-
morada a~olhedora dos seus antepassados. tros os corações dos nossos semelhantes. Os gestos exteriores raramente traduzem,
Mas, o comunismo, mesmo o russo, não desconhece os imperativos deste na sua objetividàde fria, o mundo de emoções que tumultuam no peito, aparente-
sentimento. Lenine, e.m plena guerra européia, perguntava: "Somos nós, proletá- mente graníticO, dos revolucionáros mais impetuosos. Identificados com a causa
rios gran-russos, estranhos ao orgulho nacional? Certamente não. Amamos a nossa de que se fazem os órgãos indomáveis, muitas vezes, um só aspecto de~a basta,
I(ngua e o nosso pa(s. Nós trabalhamos sobretudo para elevar as massas trabalhado· pela sua maldade inequ(voca, para dar-lhes, através deste, uma fisionomia que não
ras de nosso pa(s (isto é, os nove décimos de sua população) à vida consciente dos corresponde à realidade.
democratas e dos socialistas. Sofremos sobretudo ao ver e sentir que arbitrário, Este é certamente, o caso de Harry Berger, que, olhado mais de perto e
que julgo, que. humilhações os carrascos imp~riais, os nOQres e os capitalistas, com menos superficialidade," em nada se distingue" de tantos outros estrangeiros
fazem sofrer à nossa tão bela pátria. Somos orgulhosos de que este arbitrário sus- revolucionários, que o" governo brasileiro, em outras eras, homenageou com as ma-
citou, entre nós, gran-russos, resistências; somos orgulhosos de, que o noSSo meio nifestações do seu apreço. .
produziu Raditchef, os Decembristas, os Revolucionários desclassificados de 1870·
1880; somos orgulhosos de que a classe operária gran·russa, constituiu, em 1905, Distrito Federal, 29 de janeiro de 1937.
um possante partido revolucionário de massas e de que o "móujik" gran-russo
começou, na mesma época, a se tornar um democrata, a se libertar moralmente do a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto
"pape" e do proprietário" (N. Lenine o G. Zinovief - CONTRE LE COURANT - Defensor ex-officio
Buro.u d'Éditions, vai. 19 pág. 43).
O comunismo, assim, não desconhece a idéia de pátria. A pátria que seja
constiturda pelos trabalhadores, pelas massas, pelos produtores, e que lhes estenda
a mão generosa, esta ele respeita e reconhece. Tenhamos a coragem de ser justos,
se é que queremos vencer e dominar esta doutrina, dura e cruel pelo materialismo
em que assenta os seus postulados. Mas, não pratiquemos a deslealdade de distin-
guir. sob certos aspectos, o seu internacionalismo, do internacionalismo capitalis-
ta. Um e outro aceitam e provocam colaborações internacionais. Um e outro pro-
curam, nas suas respectivas classes, o apoio de forças estrangeiras.
O capitalismo estrangeiro, que aqui veio colaborar com as nossas classes
dirigentes, tem Junto delas os seus representantes confessos e autorizados. Não
raro os interesses desse capitalismo usurário colidem com os interesses das nossas
masSas trabalhadoras. E, nem por isto, deixa'm de ser acatados, e tidos comó ami-
gos do pa(s.
A mentalidade das massas é muito mais capaz de lógica do que ordinaria-
mente pensamos. Aquilo que elas vêem ser praticado nas camadas conservadoras,

56 57
(~
d
Assim agindo, conforma-se o Suplicante com aS' tradições e a prática ime- r~
mOTíais da sua profissão, como passa a mostrar, escudado em fontes autorizadas.
Na verdade, examinando a hipótese, ora em apreço, Saillard (LE RÔLE DE
(~
L'AVOCAT EN MATIÊRE CRIMINELLE,págs.225/226). esclarece: "Vimos, que, (-.tl
em certos casos, o acusado ou indiciado deve de ser provido de um defensor, na
.I
audiência, sob pena de nulidade, ainda mesmo que ele não tivesse feito o pedido,
,
~

ou que recusasse a sua assistência:. qual é, nesta última hipótese, o dever do advo- (l
EXPOSiÇÃO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO,
DE 29.1.37.
gado?
Foi decididà, por ocasião do processo da alta Corte de Bourges, que bas-
r
,
Ii
tava, para o advogado, escrever ao seu cliente na véspera da audiência, a fim de lhe (I
proporcionar a oportunidade de aceitar ou de recusar o seu ministério; a isto se
(
limita o dever do defensor.
Nós preferimos a solução inversa, admiti<;la por quase _todos os autores, (
pela qual o advogado designado deve de assistir até o fim_os· d.ebates; se o seu (
Exmo. Sr. Or. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional cliente não Ih'o permite, ele deve- guardar o silênCio; mas, desde que ele recebe a
sua missão da lei, deve por consideração a ela, continuar junto do acusado a sua
(
HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, tendo sido intimado por V.
assistência material". (
Exa., no ofício nq 8S-C.A., de 26 do corrente, para apresentar até esta data, a de-
Idêntica é, a este respeito, a lição de Cresson (USAGES ET REGLES DE (
fesa prévia do acusado Luiz Carlos Prestes, vem expor os motivos por que não se
LA PROFESSION O'AVOCAT, vol. ,q, pág. 364: Recusa o acusado o advogado
desobriga desta tarefa: (
que lhe foi indicado por uma nomeação de ofício? Proibe-o de pleitear? O defen·
Tanto que recebeü de V. Exa., a por indicação anterior do Conselho da
sor não pode deixar de comparecer à audiência; ele deve acompanhá-Ia; mas tem o (
Ordem dos Advogados da Seção deste Distrito Federal, a nomeação de advogado
direito de se abster de pleitear".
ex-officio do acusado- Luiz Carlos Prestes,_o Suplicante procurou e conseguiu com (
este ter livre comunicação. Outra grande autoridade na matéria, Mollot (RÊGLES DE LAPROFES·
Avistando-se, assim, com o seu cliente, o Suplicante dele ouviu a declara- SION O'AVOCAT - vol. W, págs.79/80) se pronuncia no mesmo sentido: ..... (
ção, formal e categórica, de que repelia qualquer defesa, que seria por ele futura- eu não julgo que o advogado possa ser obrigado a prestar o seu ministério ... quan- (
mente desautorizada, caso fosse apresentada. Acrescentou, então, que totalmente do o cliente o recusa obstinadamente (o que tem acontecido), quer na audiência,
segregado do convívio humano, sem o mais longínquo contato com o mundo quer nas comunicações anteriores. A lei concede um defensor ao acusado, mas não
exterior, impedido de fazer quaisquer leituras tanto de jornais quanto de livros, Ih'o impÕe. Além disto, se o desinteresse exige que o advogado se devote à defesa (
não dispondo de papel, lápis, ou caneta, e cercado só de policiais, não aceitava a do pobre, ele isto não exige em face da recusa deste último, que tem também a sua
apresentação de uma defesa, que, nesta conjuntura, não pode ser considerada nem
(
independência". E logo abaixo, esclarece este consagrado codifieador dos costu-
ampla, nem livre, nem independente. Além disso - exclamou ainda - se o sena- mes, regras e deveres do advogado (lbid., pág. 80) :"0 Conselho tem todavia decio (
dor Abel Chermont, apesar de suas imunidades parlamentares, foi preso só por ter
requerido um habeas-corpus a favor de Berger, como adimitir-se que outro advoga-
dido que, em todas as causas criminais, o advogado nomeado de of(eio será obri-
gado a comparecer e a permanecer na audiência, até a leitura da sentença, pois o
,
do, que não goza de tão altas garantias, possa usar livremente da palavra, e empre- acusado pode mudar de resolução e a ele recorrer".
gar os meios adequados a uma defesa eficiente? Estes preceitos não variaram até hoje. Um dos mais recentes tratados sobre a (
Ora, o Suplicante não pode, não deve, e nem quer desatender às determina- profissão de advogado (Payen et Ouveau - LES RÊGLES DE LA PROFISSION
ções, para ele sagradas e respeitáveis, de Luiz Carlos Prestes. Não oferecerá, por O'AVOCAT, pág. 209), prevendo expressamente o caso, confirma, em todos os l
isto, defesa prévia, limitando-se a ficar à disposição· do mesmo_acusado para, em pontos, as decisões da tradição. Eis como, a respeito, se pronunciam estes autores:
qualquer tempo, e caso mude, ulteriormente, de deliberação, intervir em favor "Pode acontecer que o indiciado, sem escolher ele próprio um advogado, recusa o
dele. que lhe foi indicado. Este deve, então, pedir ao bastonário que designe um dos
\
68 59
l
l..
l ..
seus confrades. Se, no último instante, o indiciado proibisse ao advogado de plei- Requerendo a juntada· da presente aos respectivos autos, para que deles
tear, este deveria de se abster, mas·deveria assistir à audiência." fique constando a deliberação que' o Suplicante adotou, e da qual nesta data, dá
Tais são os usos e costumes da profissão, quando um dos seus órgãos tem conhecimento ao Presidente do Conselho da Ordem dos Advogàdos da Seção deste
diante de si um réu de crime comum, que está sendo processado na forma da legis- Distrito Federal,
lação normal, e perante um Tribunal Ordinário.
Mais delicada, porém, se torna para o advogado ex-officio a sua situação, já P. Deferimento.
de si diUcil, quando ele tem de agir perante um órgão judiciário, que, além de se
afastar de todas as tradições da vida jurídica do país, contraria, na sua organiza- Distrito Federal, 29 de janeiro de 1937.
ção, toda a sistemática da legislação penal co"mum, como é o caso deste Tribunal
de Segurança Nacional, e qa forma processual nele seguida. ai Heráclito Fontoura Sobral Pinto
Na realidade, tudo, na criação e regulamentação definitiva deste Tribunal, Advogado ex·offício
é de molde a inquietar aOS que, como os advogados, têm o dever de pugnar intran-
sigentemente pela liberdade ampla da defesa. Pois, sem falar no direito outorgado
aos Ju(zes de realizarem sessõeS de julgamento, dentro dos próprios presídios
(art. 49 do Regimento Internol, fora das vistas da opinião pública (arts. 73 e
74 do citado Regimento);sem aludir ao arbítrio dados aos Juízes Preparadores
de secionar a instrução do processo em tantos atos judiciais autônomos quan-
tos forem os réus, ou grupos de réus que eiltenqerem de formar (art. 57 do Re-
gimento citado);urge focalizar a proscrição absoluta do exercício da palavra
oral da ~efesa, por ocasião do julgamento, estabelecendo·se, entretanto, uma situa-
ção privilegiada para o orgão da ~cusação, que, ante a defesa amordaçada, poderá
falar, desembaraçadamente e sem peias~a t(tu!o de esclarecer o seu parecer· emitido
nos autos (art. 86 do citado Regimento.1
Acrescente-se a tudo isto a circuntância de que o processo é de inequívoco
caráter político, para que se tenha, desde logo, a noção exata da posição extrema-
mente grava do Suplicante em face de Luiz Carlos Prestes, que insiste na delibera-
ção, já manifestada a V. Exa., de não se defender.
Aliás, dentro dos postulados sociais que o acusado esposou, não é de estra~
nhar este seu procedimento, que é aconselhado e sugerido por Lenine (OEUVRES
COMPLETES - Edits. Sociales Internationales, vol. XXI, pág. 361, através desta
ponderação: "0 S Tribunais são órgãos do poder. Os liberais esquecem· no algumas
vezes. O marxista não o deve esquecer nunca. A ditadura militar age. Seria, então,
rid(culo falar neste caso de "tribunais" regulares. Não se trata de j~stiça, mas de
um episódio de guerra civil. Os partidários do comparecimento diante dos tribu-
nais erram em não querer compreendê·io ... O de que o poder precisa, não é de
um processo, é de perseguição dos internacionalistas. Prendê· los sob chaves, eis
o que é preciso ... ".
Nestas condições, o que o dever profissional impÕe ao Suplicante, como
advogado de Luiz Carlos Prestes, é a obrigação formal de se manter dentro do mais
absoluto silêncio, em face do processo que lhe está sendo movido neste Tribunal
de Segurança Nacional. .

60 61
~~.~~~ . . . _.~~.~- ....~~~--~~-
..

CARTA DE OLGA BENARIO PRESTES, TRADUÇÃO


ESPOSA DE LUIZ CARLOS PRESTES, DE 31.1.37, (~
À SUA SOGRA LEOcAolA PRESTES.

Berlin, 31.1.1937.

Chere mere, Berlim, 31.1.1937.


(
-Je viens seulement de recevoir tes leUres du ler. et du 9 janvier. Tu peux "Querida mãe: (
t'imaginer la. joie qu'elles m'ont causée.
(
Teut d'abord, je veux t'informer que tu es devenue grand'mêre. Le 27 Acabo de receber suas cartas de 1C? e 9 de janeiro. Você pode imaginar a
novembre, rai mis au monde la petite Anita Leocádia. C/est une petite filie bien alegria que me deram. (
portante, et, dês sanaissance elle pesait déjà 3.800 gr. Elle ales cheveux noirs et Antes de mais nada, quero informá-Ia de que você é avó. No dia 27 de no-
(
de grands yeux bleus. L'enfant se developpe bien et 50n sourire me rend moins vembro, dei a luz à pequena Anita Leocádia. É uma menina saudável e nasceu
( li;
triste ma situation.- Je fais tout ce que je peux paur qu'elle ne manque de rien. Je pesando 3.800 gramas. Ela tem os cabelos negros e grandes olhos azuis.. Ela se
la nourris au sein et le· ferai aussi longtemps qu'íI me sera possible de le faire. desenvolve bem e seu sorriso torna menos triste minha situação. Faço o possrvel ( ,.
Actuellement, je suis em "détention de protection" (Schutzhaft) et plus para que nada lhe falte. Eu a amamento e tenciono fazê-lo enquanto me seja poss(- , I
précisement à I'infirmerie d/une prison de femme.s_..Lors de I'acouchement, iI y a vel. ,.
(

eu des complications et j'ai été assez gravement malade. Mais aujord'hui, j'ai Atualmente, estou em "detenção de proteção" (Schutzhaftl e, mais preci- -~

surmonté tout cela. samente, na enfermaria de uma prisão feminina. Por ocasião do parto, houve com· ( ~
, i
Tu me demandes cambien de fois par mois tu peux m'écrire. D'aprês le plicações e estive gravemente doente. Mas agora superei tudo isso. ~,
I
reglement de la prison, j'ai le droit de recevoir un"e lettre tous les 10 jours. Je suis Você me pergunta quantas vezes por mês pode me escrever. Segündo o
contente de pouvoir te tenir au courant du developpement de ma petite. Je te regulamento da prisão, tenho o direito de receber uma carta a cada 10 dias. Fico ( I
prie de m'écrire à ton tour tout ce que tu sais sur la situation de Carlos. Depuis le feliz de poder mantê-Ia ao corrente do desenvolvimento de minha filha. Peço·lhe (
23 septembre, c'est à diredepuis le jour ou rai été expulsée du Brésil, je suis sans que, por sua vez, me escreva tudo o que saiba sobre a situação do Carlos. Desde
nouvelles de lui. Lorsque j'étais là-bas, naus pouvions· nous écrire de temps en 23 de setembro, isto é, desde o dia em que fui expulsa do Brasil, estou se-m notr- (."~
temps. Aprês la naissance de la petite, je lui ai adressé une lettre, mais jusqu 'ici, cias dele. Quando eu estava lá, podíamos nos corresponder de tempos em tempos. li
je n'ai pas eu de réponse. Je voudrais que tu m'envois dans ,'une de tes prochaines Depois do nascimento da menina, eu· mandei uma carta para ele, mas até agora não (
lettras une photographie de Carlos, car je n'en ai pas ici. tive resposta. Eu gostaria que você me enviasse, em Uma de suas próximas cartas,
Chêre mere, j'attendrai avec impatience ta réponse. Avec mes meilleurs uma fotografia de Carlos, pois não tenho nenhuma aqui.
(
voeux p'!ur ta santé ... Querida mãe, esperarei com impaciência a sua resposta. Com meuS melho·
Lf
res votos de boa saúde ...
Je t'embrasse ta filie alGA. (i
Beijos da sua filha alga.
( \1

('I,
62
63

,
l,.
l.,
I•.
I

l~'i:
o Suplicante, entretanto, sentia-se na obrigação de informar-lhe, a ele Sr.
David Levinson,queem hipótese alguma lhe seria poss(vel patrocinar, pessoal_e di-
retamente, a causa de Harry Berger ou Arthur Ernest Ewert, em face de dispositi· :1'.
vos claros e terminantes da nossa legislação. Para tal fim, deu-lhe a conhecer" antes :1
de tudo, o conteúdo do art. 133 da Constituição de 16 de julho de 1934, que é es.
te: "Excetuados quantos exerçam legitimamente profissões liberais na data da
Constituição, e os casos de reciprocidade internacional admitidos em lei, somente
li,
REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO, A RAUL MACHADO, lU
poderão exercê-Ia os ,brasileiros natos e os naturalizados que tenham prestado ser-
DE 11.2.37.
viço militar ao Brasil; não sendo permitida, exceto aos brasileiros natos, a revalida- :~!
ção de diplomas profissionais expedidos por institutos estrangeiros de ensino". f,'"
Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional Por esse texto, a advocacia, no Brasil, s6 é permitida aos brasileiros natos, !i~!
!~
ou naturalizados, com serviço militar prestado em tempo oportuno,res'salvados·os
.r/I. ç a.._~...z.
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_~ casos de reciprocida'de internacional, expressamente consignados em lei.
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.. ~z::.. c::4 tI'...... ---.L,,·-c. .... ..a.c.. o ~_
Ora, não sendo ele, Sr. David Levinson, nem brasileiro nato, nem brasileito
naturalizado, e não existindo, igualmente, convenção ou tratado firmado entre o
Brasil e a União Americana sobre o exerc(cio da advocacia, nos seus respectivos
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territórios, pelos nacionais destes dois pa(ses, imposs(vel lhe será advogar, entre ,~;
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nós, perante qualquer Tribunal, a causa de Harry Berger .
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~..:... .. cf...,_z G. ~ i. p""'" t!--c. ... ..<"'~_c.4:.4._p...,._. I"
c-...- ... ~ .c. " ..... ~~ ~ ~ .... ~
do art .. 22 do decreto n'.'22.478, de 20 de fevereiro de 1933, que rege o exerclcio li,'
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-,- 08 ... I: cl"c..-.!_ .... -. ,p .... ar.. ... ~ ..... 4~~K. da advocacia no território nacional, e que diz: "Em qualquer jUl'ZO, contencioso
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Ou administrativo, civil ou criminal, salvo quanto a habeas-corpus, o exerc(cio das
funções de advogado, provisionado ou solicitador, somente será permitido aos ins-
I,t
I~
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HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, advogado ex-offlcio de Har-
critos no quadro da Ordem e no gozo de todos os direitos decorrentes, de acordo l'
com este instrumento". ~,
ry Berger ou Arthur Ernest Ewert, vem expor e requerer a V .Exa:
Não estando ele, Sr. David Levinson, inscrito nos quadros da Ordem, na "I
Compareceu ontem, às 17 hor~s, no escritório do Suplicante, o Sr. David E'
Levinson, que, dizendo-se advogado norte-americano, lhe declarou estar incumbi· Secção deste Distrito Federal, não poderia, em face deste texto legal, ser admitido
" ~;
do por D. Minna Ewert, - que alega ser irmão de Harry Berger ou Arthur Ernest pelo Tribunal de Segurança Nacional como advogado de Harry Berger ou Arthur
Ernest Ewert. I~
Ewert -, promover, no Brasil, tudo quanto possa interessar à defesa do aludido l'
li
Harry Berger. Mostrou, por fim, o Suplicante ao Sr. David Levinson a impossibilidade da j

Para comprovar o mandato de que se diz investido, o Sr. David Levinson sua subseqüente inscrição nos quadros da Ordem, não s6 por força do texto cons·
apresentou ao Suplicante o documento original, que a esta acompanha, firmando titucional supra transcrito, como, também, em virtude· do que preceitua o art_ 13
com a assinatura "Minna Ewert", e ora devidamente. traduzido. do mencionado decreto n922.478, de 20 de fevereiro de 1933: "Para inscrição no
Tomando conhecimento da missão ostensiva que o Sr. David Levinson re- quadro dos advogados da Ordem é necessário, além dos requisitos legais de capaci·
clama para si, e que invoca como única razão justificadora da sua presença no pa(s, dade civil: ir1
o Suplicante declarou-lhe, desde logo, que não tinha nem interesse, nem obrigação I, ser bacharelou doutor, em Direito, por faculdade reconhecida pelas leis
de apurar quer a sua identidade pessoal, quer a qualidade de advogado, quer, final· da República ou sob ficalização permanente do Governo Federal ao tempo da for·
mente, a legalidade e autenticidade do mandato de. que se dizia investido. Tal as- matura ou ulteriormente (ficando entendido nessa conformidade o disposto no art.
sunto era, por sua própria natureza, da alçada exclusiva das autoridades federais l'.'do decreto n. 21.592, de 1 de julho de 1932); ou por faculdade de paIs estran·
geiro, legalmente reconhecida, e confirmado o grau do Brasil, salvo o disposto em Ir
do pa(s, tanto executivas quanto judiciais. 1;1
tratados internacionais relativos ao reconhecimento recrproco de trtulos;
r[,
64
65
tas tão freqüentemente quanto o intresse da defesa o exija.
11, ......... _...................................... ,
a) os estrangeiros serão admitidos nas mesmas condições estabelecidas para
Ele poderá, assim~ evitar os efeitos funestos e aumentar os bons resultados,
os brasileiros em seus respectivos países de origem, ressalvados os direitos dos que, que produz o isolamento sobre aqueles que, - inocentes ou culpados -, não ad- ('
na data deste decreto, já exercem a advocacia no Brasil;".
quiriram, ainda, o triste hábito da prisão. "Então, diz o Sr. Trarieux, ele poderá (n .

exercer o seu ministério de doçura, de bondade, de benevolência, prodigalizando


Ponderou, assim, o Suplicante ao Sr. David Levinson, que sendo ele norte-
americano, cabia-lhe apresentar diploma de Faculdade de Direito dos Estados
animações que tornarão a expectativa menos sombria, e evitarão todo ato de de~ (
Unidos, que, sendo oficialmente reconhecida pelo Governo brasileiro, tenha os tí-
sespero" .
Sente·se aqui o grande papel màral de consolo e de regeneração social, que
~
tulos, que expedir, reve!l.'tidos do privilégio de reciprocidade, em virtude de tratado
internacional.
é confiado ao advogado:·o indi_ciado, deprimido pelo regime de sua detenção, escu- t
Ora, esta é, perante nós, a situação da Universidade da Pennsylvania, pela tará de boa vontade os conselhos discretos daquele em quem ele terá posto a sua
confiança, o único do qual, em todo o caso, ele está certo de não ter que sé des-
~ !~
quai o Sr. David Le\linson se diz formado. Tal Universidade, além de não ser reco·
nhecida ofiCialmente pelo Governo Brasileiro, na forma da art. 13,1, não foi incluí- confiar, e ao qual ele tudo pode dizer, sem temor". C'
f

da, em convenção ou tratado firmado entre o Brasil e a União Americana, coma Ora, nas causas de natureza poHtica dificilmente pode o acusado depositar (~
instituto que possa expedir tftulos dotados da privilégio de assegu rar, no Brasil, aos inteira e total confiança no patrono que não escolheu, e que lhe foi designado ex~ '~

officio. Basta que este não comungue nos mesmos ideais do seu cliente, para que C'
Seus portadores o direito de se inscreverem na Ordem dos Advogados Brasileiros.
Replicou, então, o Sr. David Levinson ao Suplicante, que já estava ao cor-
se veja logo meio suspeito por ele. C!
rente de todas estas circunstâncias, pelo que não pretende mais patrocinar, ele pró- Pois bem, esta é, presentemente, a situação do Suplicante em face Harry
(
prio, a defesa de Harry Berger ou Arthur Ernest Ewert, tanto mais quanto não ma- Berger ou Arthur Ernest Ewert começa, - e com razão -, por desconfiar-do patro- ~

no que não escolheu, mas que aceitou, por força das circunstâncias.
( ,

neja· a língua portuguesa, e nem conhece, no todo ou em parte, a legislação crimi-


nal bra:;ileira. Seus obje:tivos, - acrescentou -, são bem mais modestos. Deseja Estrangeiro, conhecia entre nós apenas meia dúzia de elementos comunis- (~
apenas entrevistar-se com Harry Berger ou Arthur Ernest Ewert, para informá-lo tas, com os quais entrara em contato desde que aqui aportara. Preso pelas nossas
da incumbência que recebera da sua irmã Minna Ewert, e concertar, assim, com ele autoridades policiais, _viu-se completamente separado desses elementos, passando, ("
3
assim, a ser mantido, há mais de ano, totalmente só, e numa clausura absoluta. Na-
não só sobre a escolha de um patrono brasileiro, como também sobre os elementos
da lhe permitem: nem leituras, nem escrita, nem entendimentos com qualquer
C. ~
a empregar para que a defesa final, a ser apresentada, em favor dele Harry Berger,
C:~
se revista das características de liberdade e eficiência poss(veis nas atuais conjuntu-
ras, {l,O Suplicante: asseverou outrossim, o Sr. David Levinson que, essa sua confe-
rência com Harry Berger ou Arthur Ernest Ewert poderá ser em alemão, ou inglês,
outra criatura humana, a não serem os guardas. Não cessa, por isto, de demonstrar
a suspeita que alimenta a respeito dos propósitos de defesa com que o mesmo Su-
plicante justifica as suas visitas.
(
,
(
,
e versará ÚI',nCA E EXCLUSIVAMENTE sobre a matéria de defesa, devendo V. Faltaria, assim, o Suplicante aos deveres de lealdade e franqueza que tem
Exa. a .tudo presidir, para aplicar incontinenti as sanções que julgar convenientes para com a Justiça Especial se dissesse, agora, a V. Exa. que se sente habilitado 8 \,
caso ele, Sr. David Levinson, infrinja os compromissos que solenemente assumir produzir, em favor de seu cliente, uma defesa ampla e eficiente. (
Dentro desses limites, Exmo. Sr. Dr. Juiz, é de meu dever, como defensor ~
Foi nesta conjuntura que aqui se apresentou, vindo dos Estados Unidos, o (
ex-officiode Harry8erger, requerer a V. Exa.que se digne de tomar as_providências
Sr. David Levinson, que, dizendo-se mandatário de amigos e parentes de Harry
. indispensáveis para que se realize semelhante entrevista. (I
8erger, ou Arthur Ernest Ewert, declara·se disposto a tudo fazer, - soba fiscaliza·
f\lão ignora_V. Exa.que a missão do advogadoex-officioé, já de si, delicada li;1
ção imediata e direta das autoridades competentes do país -, para facilitar ao (
e séria. Mais grave se torna ela ainda quando a c~usa, confiada ao seu patrocínio, é
mencionado acusado a obtenção de todos os meios necessários ao oferecimento de
de natl!reza pai (tica.
uma defesa à altura das dificuldades da causa. \.11.
Na verdade. Entre os deveres inerentes à missão do patrono está o da sua
assistência assCdua às necessidades morais e materiais do seu cliente. Saillard (LE Afastada a hipótese de patroc(nio direto e pessoal dessa causa pelo Sr.
RÔLE DE L'AVOCAT EN MATII~RE CRIMINELLE, págs. 97198) focaliza esse David Levinson, por motivo da proibição legal anteriormente aqui exposta, por-
~
dever, dizéndo:Tem, antes de tudo, o advogado, a obrigação de ir ver o seu cliente; que impedir que Harry 8erger ou Arthur Ernest Ewert receba este auxilio de que
ele preencherá o voto da iei, visitando-o desde o começo, e reiterando as suas visi- está tão necessitado? ( ,
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66 67
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Em nome de que princ(pios vedar semelhante ajuda a um acusado que se
Por que abrir, agora, uma exceção para Harry Berger, ou Arthur Ernest
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acha totalmente 56, em terra estranha, cujos habitantes, na sua maioria, lhe são
irredutivelmente adversos? Sem parentes, sem amigos, sem companheiros presen- Ewert? Porque há suspeita, fundada ou não, de ser o Sr. David Levinson comunis- I,"
tes aqui no pa(s, parece ao Suplicante que as leis de humanidade não autorizam ta, ou mandatário da Terceira Internacional?
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impedir ao Sr. David Levinson de se entender com Harry Berger ou Arthur Ernest Admitamos que assim seja. Que importa isto? Ser-lhe-á poss(vel, com esse 'i'
Ewert para lhe facilitar os meios de escolher um patrono capaz de lhe inspirar con- entendimento com Harry Berger, ou Arthur Ernast Ewert, que pleteia se realize na
fiança. presença e sob a fiscalização de V. ~xa. impedir. que a Justiça Especial e.xerça o 'l!i

~
Qual o risco que poderá correr a sociedade brasileira com o fato de permi- seu árduo' mister? Temer-se-á, por acaso, que dessa entrevista possa surgir alguma
tir V. Exa.-e com as cautelas acima indicadas""1o entendimento pleiteado pelo 8r, nova conspiração comunista contra as nossas instituições? Sem falar na injúria que
David Levinson? esta suposição representaria contra a perspicácia de V. Exa. e a sagacidade das au-
Por outro -lado, acredita o Suplica~te que o Sr. David Levinson ,estará em toridades policiais do pa(s, seria dar, no entender do Suplicante, importância de~ ~
condições de, rememorando fatos ou circunstâncias da vida passada de Harry Ber- masiada à eficiência revo'lucionária do Sr. David Levinson. I)
ger, ou Arthur Erne'st Ewert, que lhe terão sido revelados pelos seus mandantes, Finalmente, se os comunistas não se interessarem pela sorte de seus compa- li
~1
inspirar confiança ao acusado, levando-o assim, a escolher a melhor orientação a
seguir, na sua defesa. Com os conhecimentos que o Sr. David Levinson já terá ad-
nheiros, presos e processados pelas autoridades e Tribunais dos Estados', que lhes
são adversos, quem, no ambiente de exaltação e de ódio em que o mundo contem-
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quirido do meio forense brasileiro, no decurso destes dias, poderá ser um seguro porâneo vive mergulhado, c,:!idará, com energia e'destemor, da defesa desses'revo-
orientador de Harry Berger, ou Athur Ernest Ewert. lucionários impenitentes?
Pór mais que reflita, Exmo. Sr., Juiz,. não chega o Suplicante a perceber Por tudo isto, Exmo. Sr. Juiz, o Suplicante', no exercício das suas funções
quais as conseqüências funestas que poderão advir para a ordem po!(tica, social, de advogado ex-officio,vem requerer a V. Exa.,que se digne de providenciar, com
ou jurídica do pa(s de um entendimento, na presença de V. Exa. entre o Sr. David as cautelas qüe a prudência lhe ditar, para que seja facul~ado ao $r. David Levinson,
\1

~~
Levinson e Harry Berger, ou Arthur Ernest Ewert. Mas, se V. Exa.isto permitir te- o direito de se entrevistar com Harry Berger, ou Arthur Emest Ewert, a fim de
rá, apenas, no ver do Suplicante, atendido às imposições incoerc(veis da lei, univer- com este se entender ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE sobre assunto de sua defesa.
salmente admitida, de defesa livre e independente. Nestes termos,

Páder-se-á alegar que o Sr. David Levinson não tem, em face da nossa legis-
lação, nenhum tftulo hábil que o autorize a nomear defensor para' Harry Berger ou
'I

I
P. Deferimento.
Arthur Ernest Ewert.
A questão, - ao que parece ao Suplicante -, não pode ser encarada debai-
xo deste aspecto, pois, o Sr. David Levinson não se arroga, para si, o direito de
constituir advogado que se incumba do patroc(nio da causa de Harry Berger, ou Distrito Federal, 11 de fevereiro de 1937 I
Arthur Ernest Ewert. O que ele quer é entrevistar-se com este acusado, - subme- I
tendo-se a todas as garantias e seguranças que a Justiça Especial julgar indispensá-
veis -, a fim de dar-lhe a certeza de que não foi desamparado pel9s amigos e pa-
rentes, que, ao contrário, tudo têm feito, dentro das suas possibilidades, para lhe Heráclito Fontoura Sobral Pinto
.facilitar os meios de tornar menos penosa a sua situaçã'o. Advogado ex-officio
Procedimento desta natureza permite-se, aqui e em todos os demais pa(ses
civiliz.ados, aos amigos, aos parentes e aos correligionários de todos os detentos
polfticos, nacionais e 'estrangeiros.

68
69
r'.1
apesar de meus esforços junto ao Tribunal de Segurança Nacional para modificá~la. (~!
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Nem eu, nem você nos permitiríamos dispensar a um cão lazarento das nos-
sas casas, o tratamento que vem sendo dado a Harry Berger. Metido no socavão do
lance inferior de uma das escadas da Polícia EspeCial, aí passa ele os dias e as noi-
tes, na mais absoluta segregação de todo e qualquer convívio humano, a ouvir, de
momento a momento, as passadas dos soldados' em trânsito sobre a sua cabeça. A
r:r't
roupa que traz, - calça e paletó sobre a pele -" ele não a muda desde meses. Nela (I'
Ji
CARTA DE SOBRAL PINTO A AGAMENNON MAGALHÃES,
MINISTRO DA JUSTiÇA.
-já não existe uma s6 'superf(cie disponível onde se possam fixar novas sujeiias. P.
vista só deste vestuário, - se é que tais andrajos podem Ser assim qualificados- (1
provoca náuseas.
Enquanto fatos desta maldade se passam nas prisões de Estado, ã sombra da
inércia do Tribunal de Segurança Nacional, a cuios orgãos expus o que se passa,
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sem nada omitir, -e em toda a sua dramática nudez, verbalmente; (!, por escrito, ( ~
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Rio, 13 de fevereiro de 1937. com- a discrição que me pareceu prudente, para resguardar o bom nome da justiça, I'
as autoridades federais iluç:lem a opinião pública nacional, anunciando, oficlosa-
( ·1
Agamennon. mente, pela imprensa', que Harry Berger se ãcha bem instalado, e çonvenientem~n­ (
I'1
1
te defendido por profissionais brasileiros, aos quais ni;1da é negado, não necessitan- ( ~
Justiça não se agradece, aceita-se; não se mendiga, reclama-se. Mas,- nas ter-
r(veis conjunturas que estamos atravessando, esta virtude - cardeal no governo
das nações - anda, entretanto, tão retra(da, que é de meu dever salientar, no meu
nome pessoal, a elevação do seu gesto mandando restituir a liberdade o meu clien~
do, assim, do auxílio de cidadãos norte-americanos, que dizem ter aqui vindo
especialmente para desempenhar missões já entregues a advogados nacionais,
Mas, nisto tudo o que mais me assombra, meu caro Agamennon, é o nenhum
valor da palavra oficial. Realmente, o Primeiro Magistrado do meu País, falando de
(
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~

te Dr. Sebastião Hora.


Agora, outro assunto. Trata-se da permanência do Sr. David Levinson entre
nós. Fui informado, oficiosamente, pelo Romano de que o governo federal comu-
público a todos nós, em' hora solene, asseverou categoricamente: "Posse_ a_firmar·
vos que, até agora, todos os detidos são tratados com benignidade, atitude essa
contrastante com os processos de violência que eles apregoam e sistematicamente
( Ir
nicou a este norte-americano, - que isto mesmo me confirmou, pessoalmente - praticam. Esse procedimento magnânimo não traduz frr.qllez6. Pelo contrário, é
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de que ele deverá regressa,r aos Estados Unidos pelo primeiro vapor que por aqui próprio dos fortes que nunca se amesquinham na luta e sabem manter, com igual (
paSsar. Ora, na petição que acompanha a carta que lha remeto oficialmente, nesta inteireza,o destemor e o sentimento de justiça humana". I'
(
data, na qualidade de advogado BX'officio de Harry Berger, mostro, de um lado, a
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indeclinável necessidade, para a ampla liberdade e eficiência da defesa deste acusa· Como defensor ex-officio de Harry Berger sou forçado a replicar: não é

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do, de permitirem as nossas autoridades o entendimento entre ele e o Sr. Dr. verdade. Venha comigo, sem aviso prévio, à Polícia' Especial, e eu o habilitarei a
David Levinson; e, de outro, o nenhum risco para a nossa tranqüilidade pública ou informar- ao Sr. Presidente da República que nas prisões de Estado existem detidos
privada, deste entendimento, a par da total ausência de motivo razoável capaz de que estão no dever de pensar que, para a administração brasileira, eles perderam a
justificar a denegação desta entrevista. condição de criaturas humanas.
Tais são as razões, que, no meu entender, levam a administíação federal a
Por que impedir,então,a sua realização, a meu ver oportun(ssima?
Por que há suspeita de que o Sr. David Levinson é comunista, podendo,
assim, estar incumbido, pela Terceira Internacional, de importante missão junto de
considerar o Sr. David Levinson como hóspede indesejável entre nós. Ele aqui
ficando, pode acontecer, de um instante para outro, que se tome imposs(vel evitar
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~[
Harry Beruer? a sua entrevista COm Harry Berger. Nesta conjuntura, como continuar reiativamen-
Não aceito, pelas razões expostas na minha petição já referida, semelhante te a este o tratamento revoltante que se lhe vem aplicando- até agora? E o Sr.
David Levinson, que, ao fim do processo, deverá regressar ao seu país, dirá, então,
versão. A verdadeira causa da estranha atitude das nossas autoridades eu a vou dar-
lhe, Agamennon; ei-Ia: pretende~se continuar na obra desumana da manter Harry aos SeuS concidadãos aquilo que aqui presenciou! Diante desse depoimento, l I
Berger na situação deprimente e aviltadora em que ele se encontra presentemente, 'adeus ... civilização brasileira I

71
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Aqui termina, Agamennon, o meu dever, e começa o seu. Se você está em
condições, ou não, de cumprl-Io, não é da minha conta; é da alçada exclusiva da
sua consciência de homem, de jurista, de ministro, e- de cristão.
Autorizando-o a fazer desta o uso que lhe convier, abraça-o com estima, o
·sempre ãs suas ordens,
Sobral Pinto
REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO
A RAUL MACHADO, DE 02.03.37.

Exmo. Sr. Or. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional.

HERÁCLITO FONTOURASOBRALPINTO, advogado ex-officio de Harry


Berger, não se- conformando com o despacho de V. Exa.,que ordenou continuasse
esse acusado na prisão onde se acha, vem, com a devida vênia, expor e requerer ao
esprrito sereno e equilibrado de V. Exa.:
Um dos mais constantes cuidados da çivilização cristã tem sido o_estabele-
cimento, no selo dos povos que acatam os seus postulados, d 'um regime carcerário
que dê aos detentos, independentemente da sua condição social e da sua categoria
profissional, a noção exata de que não perderam, com a reclusão, as suas prerroga-
tivas de criatura racional. Crimino_so ou inocente, rico ou pobre, correligionário ou
adversário poll'tico, o encarcerado precisa de receber, nas prisões mantidas pelos
Estados que se dizem cristãos, a impressão de que oS poderes públicos continuam
a divisar nele aquela característica constante e irremovível, que o crime poderá ter
feito adormecer, mas não desaparecer totalmente: a sua espiritualidade, esta cente-
lha do divino incrustada na ganga frágil do organismo humano. Só com a submissão
a esta lei da racionalidade da nossa natureza poderá o Estado engrandecer e nobj·
fitar a sua árdua e penosa missão de punir e castigar.
Urge, assim, cjue os juízes e tribunais façam dispensar aos detentos, que
vivem nas prisões e cárceres, sujeitos à sua ação e fiscalização, um tratamento que
os impeça de se considerarem simples animais hidrófobos ou empestados.
Por isto, todos os que dedicam o melhor dos seUS esforços ã organização
dos regimes penitenciários nas sociedades modernas, não cessam, - como D".
Concepclón Arenal (ESTUDIOS PENITENCIAR lOS - vol. 2'1, pág. 283) - de
advertir: "O regime material a que fica sujeito o detento pode resumir-se assim:
Ar - Alimento - Vestuário - Cama e alfaias - Trabalho - Exerereio -
Descanso - Sono.

72 73
c-
Ar - A cela deve ter capacidade suficiente e a ventilação necessária, para jeiras. A vista só deste vestuário, - se é que tais andrajos podem ser assim qualifi- (
que o ar seja tão puro quanto é indispensável à saúde do que o tem de respirar cados -, provoca nau se as incoercíveis. (
toda a noite e a maior parte do dia ... Tal é, Sr. Juiz, a prisão que destinaram para Harry Berger. Tal é, eminente
Os efeitos do extremo calor devem de ser atenuados por meio de .um bom (
Magistrado, o tratamento que lhe vem sendo dispensado.
sistema de ventilação, e, no que se refere ao frio rigoroso, o aquecimento poderá Semelhante desumanidade precisa de cessar, e de cessar imediatamente, (
se conseguir por meio de vapor, aproveitando o das máquinas motoras das indús- sob pena de deslustre para o prestrgio deste Tribunal de Segurança, que, para bem
trias estabelecidas". cumprir a sua árdua tarefa necessita de pautar a sua ação pelas normas inflex(veis C
Passando, então, a consagrada escritora a examinar a questão do vestuário, da serenidade e da justiça. (
diz que ele "como o alimento, tem de ser o necessário, porém de modo que pos- Tanto mais obrigatoriamente inadiável se torna a intervenção urgent(ssima
sam" os detentos, com ele, contraírem ... hábitos de limpeza. Assim, por exemplo, de V. Exa., Sr. Juh, quanto somos um povo que não tolera a crueldade, nem mes-
r
dar-se-ão meias, lenços. Para os tecidos do traje, há-de se buscar a maior duração e mo para com os irracionais, como o demonstra o decreto nl? 24.645, de 10 de (
abrigo" (lbid., pág. 289). julho de 1934, cujo artigo 1<? dispõe: "Todos os animais existentes no país são
Tratando, por fim, de resumir tudo o que lhe parece imprescind(vel ao tra- (
tutelados do Estado".
tamento dos detentos, conclui a mesma publicista: "Todas as regras que se dêem Para tornar eficiente tal tutela, esse mesmo decreto estatui: "Aquele que, (
sejam muito práticas, para que possam ser inflexíveis. O necessário psicológico, em lugar público ou privado, aplicar ou fizer aplicar maus tratos aos animais, in- (
para o alimento; o necessário para a limpeza, nas alfaias, e o necessário para o des- correrá em multa de 20$000 a 500$000 e na pena de prisão celular de 2 a 15
canso, na cama. Isto a justiça o exige, em harmonia com os meios de correção: dias, quer o delinqüente seja ou não o respectivo proprietário, sem prejuízo da (
torna-se ,duro o que é tratado com crueldade; não é meio de corrigir um homem o ação civil que possa caber" (art. 2<?). (
torná· lo duro" (lbid., pág. 291). E, para que ninguém possa invocar o benefício da ignorância nessa matéria,
Pois bem, Sr. Juiz, os responsáveis atuais pela guarda de Harry Berger pare- o art. 3C! do decreto supra mencionado define: "Consideram-se maus tratos: .... (
ce que atentaram em todas estas ponderações, mas para aplicar-lhe , precisamente, ; \I - Manter animais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a (
e com conhecimento de causa, o regime oposto ao que deflue destes postulados, respiração, o movimen.to ou o descanso, aLi os privem de ar ou luz".
hoje universalmente aceitos e proclamados. Baseado nesta legislação um dos juízes dê,Curitiba, Estado do Paraná, Dr. (
Metido no socavão do lance inferior de uma das escadas da Polícia Especial, Antônio Leopoldo dos Santos, condenou João Mansur Karan à pena de 17 dias de (
a( passa Harry Berger os dias e- as noites, sem ar convenientemente renovado, sem prisão celular, e ã multa de 520$000, por ter morto a pancadas um" cavalo de sua
(
luz direta do sol, e sem o menor espaço para se locomover. ~Jem cama, nem cadei- propriedade (doc. junto).
ra, nem banco. Apenas um colchão sobre o lagedo. De alfaias nenhuma not(cia. Ora, num pafs que se rege por uma tal legislação, que os Magistrados tim- (
Absolutamente segregado de todo e qualquer convívio humano, a ouvir, de mo- bram em aplicar, para, deste modo, resguardarem os próprios animais irracionais
(
mento a momento, as passadas dos soldados em trânsito pela escada, - sobre a sua dos maus tratos até de seus donos, não é poss(vel que Harry Berger permaneça,
cabeça - não pode usufruir nem os benefícios do repouso, nem os do silêncio. como até agora, meses e meses a fio, com a anuência do Tribunal de Segurança (
Nenhuma visita, nem de amigos, nem de parentes. Proibição de toda e qualquer Nacional, dentro de um socavão de escada, privado de ar, de luz e de espaço,
leitura, quer de jornais, quer de livros. AUsência total de correspondência: se a nin- envolto, além do mais, em andrajos, que, pela sua imundrcie, os próprios mendigos
guém escreve, ninguém,-também, lhe escreve. E como poderia ele, ainda, escrever, recusariam a vestir. (
se lhe sonegam tudo: papel, lápis e caneta. Assim, entram 0$ dias e as noites, Estes fatos, que o Suplicante está trazendo, por escrito, ao conhecimento (
vencem-se semanas sobre semanas, sobrepõem~se os meses uns aos outros, e Harry de V. Exa., assumem, neste momento, aspecto de particular gravidade, porque são
Berger, num isolamento alucinante, se vê invariavelmente entregue ao seu só pen- de molde a prejudicar o valor e a credibilidade da própria palavra oficial. (
samento, na imobilidade trágica de sua agonia sem fim, e do seu abandono até Com efeito, o Exmo. Sr. Presidente da República, dirigindo-se ao Congres- (
hoje sem remédio, apesar dos clamores estridentes do seu defensor impotente. so Nacional, em maio de 1936, dizia: "Como se conduziram as autoridades na difí-
I,
cil emergência - a moderação que não exclui a energia, a prudência que não dimi-
A roupa que traz, - calça e paletó sobre a pele -, ele não a muda desde meSes. Ne- nui o zelo - está no espírito de todos e na memória da popUlação. Apesar de (
la já não existe mais uma só superfície disponível onde se possam fixar novas su- insólita brutalidade dos atentados praticados contra a unidade nacional, da felonia
(
74 75
,
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,
(
A filosofia que adotam e difundem é a do monismo, segundo o qual o con-
e perversa indiferença que revelaram os amotinados, não houve qualquer excesso
junto de todas as coisas deve ser reduzido ao só princípio da matéria. Dentro deste
por parte do Poder Público que não utilizou sequer, ~m toda a sua amplitude, as
franquias concedidas pelo Poder Legislativo, procurando, apenas, deter e punir os
e
sistema, puramente materialista, a sociedade é regida por leis tão fatais incoercí·
responsáveis, declarados e reconhecidos. veis como as do mundo f(sico, que nos envolve e rodeia. A ciência social~ assim, é,
na sua natureza, idêntica às ciências físico-químicas.
O Poder Executivo, deixando mesmo de atender à justa indignação das
classes conservadoras, manteve·se sempre sereno, não impondo castigos nem pro- O que compete, pois, aos sociólogos é descobrir: - à maneira dos físicos e
curando servir·se do momento para aniquilar os vencidos" (Publicação n9 3 do dos químicos - as leis necessárias que regem, independentemente da vontade
Departamento Nacional de Propaganda, pág. 13). individual do homem, os fatos sociais. Esta é a doutrinação constante de .Engels
Tempos após, S. Exa., voltando a tratar do assunto asseverava no discurso (ANTIOÜHRING - vol. 39, págs. 23/24, ed. franco da Alfred Costes): "A concep·
que, ao regressar de Petrópolis, proferiu em Benfica: "Como procedeu o governo, ção materialista da história parte deste. princípio que há produção,e coma produção
para salvaguardar as instituições, está no conhecimento e na memória de todos:- a troca de seus pl:'odutos, contituem a base de toda a ordem social; que, em cada
com rigor Sem desumanidade, firme, sem excessos" (Publicação n9 4 do Departa- uma das sociedades aparecidas na história, a repartição dos produtos, e com ela a
mento Nacional de Propaganda - pág. 6). formação e a hie'rarquia social das classes ou ordens que a compõem, se regula de
E para que nenhuma dúvida pudesse pairar no espírito de todos os cida- acordo com a natureza e o modo da produção, e de acordo com o modo de troca
dãos, sobre a serenidade dos órgãos do Poder Executivo, o primeiro Magistrado da das coisas produzidas. Assim, as causas últimas de todas as transformações sociais
Nação, com o peso de sua incontestada e incontestável autoridade, acrescentou e revoluções pOlíticas devem ser procuradas, não na cabeça dos homens, segundo a
(Ibid., pág. 10): "Posso afirmar-vos que, até agora, todos os detidos são tratados medida crescente em que eles penetram a verdade e a justiça eterna~, mas nas mu-
com benignidade, atitude esta contrastando com os processos de violência que eles danças do modo de produção e de troca; elas devem ser procuradas não na filoso·
apregoam e sistematicamente praticam. Esse procedimento magnânimo não traduz fia, mas na economia da época estudada. Quando surge a idéia, de que as institui~
fraqueza. Pelo contrário, é próprio dos fortes que nunca se amesqui~ham na luta ções sociais existentes são irrácionais e injustas, que o racional se tornou tolice e o
e sabem manter, com igual inteireza, o deste mor e o sentimento de justiça huma- benef(cio, flagelo, isto é unicamente um ind(cio de que Se produziu, à revelia de
na". todos; nos métodos da produção e nas formas dé troca, tran,sformações com as
Ora, Sr. Juiz,.o Tribunal de Segurança Nacional, mais do que qualquer quais não se harmoniza mais a ordem social adaptadas às condições econômicas
outra instituição do país, deve de honrar a palavra do Exmo. Sr. Presidente da Re. anteriores. Quer _isto dizer, ao mesmo tempo, que oS meios de suprimir o mal-estar
pública, que, em circuntâncias tão solenes, - como já foi acentuado -, assegurou, descoberto devem necessariamente também se encontrar, - mais ou menos desen~
reiteradamente, a toda a Nação, que nenhum preso polrtico seria tratado com volvidos - nas condições modificadas da produção. Estes meios não devem ser
desumanidade. inventados pelo cérebro, mas descob~rtos, através do cérebro, nos fatos materiais
Entretanto, isto não vem acontecendo com Harry Berger. Posto à dispasi. existentes da produção".
ção do Tribunal de Segurança Nacional, o tratamento que lhe estão dando, apesar A ordem social, ássim, é mero reflexo da realidade 'econômica. E a desco-
do esforço em contrário do Suplicante, atenta contra todas as normas da civiliza- berta desta, e das leis necessárias que a regem, o homem a faz, através da sua inteli-
ção ocidental, pois, conforme foi já focalizado, infringe até dispositivos claros e gência, da mesma maneira e pelos mesmos processos com que descobre a realidade
terminantes da -legislação existente no pars em favor dos próprios animais irracio- fl'sico-química, e as leis Que a dominam.
nais.
Desta maneira, a análise do fenômeno .social deixa de ser um problema de
Não se argumente, como já se fez com o Suplicante, que bem pior seria o ordem normativa, para se transformar, conseqüentemente, numa questão de ordem
tratamento que Harry Berger faria dispensar aos burgueses brasileiros se vitoriosa especulativa. Em virtude desta transformação, os critérios de avaliação dos meios
tivesse sido a revolução de novembro de 1935, da qual era um dos chefes confes-
sos. e instrumentos de governo da sociedade não serão julgados à luz do qualitativo,
mas, inversamente, sob a imposição do quantitativQ. Dentro deste sistema, esses
Tal argumento, com ser auspicioso é, contudo, inequivocamente falso e im- meios e instrumentos governamentais não serão mais definidos de acordo com as
procedente.
n-ormas da distinção entre o bem e o mal, mas,ao contrário, consoante os impera·
Os comunistas quando lançam mão da violência contra os vencidos nada
tivos da distinção entre a verdade e o erro.
mais fazem do- que aplicar, com lógica, as leis do sistema que preconizam.

77
76
(
Por isto, do mesmo modo, como, no domínio da astronomia, ninguém
ousaria dizer que a lei da atração universal é boa limitando-se apenas aafirmarque Em face, pois, do sistema social que os comunistas preco"nizam para reger a (
é verdadeira, assim também, no domrnio da sociedade, ninguém poderá dizer que vida das sociedades humanas, a violência por eles empregada encontra uma justifi·
cação lógica, e uma explicação política. (
a lei da socializaçio da propriedade é boa ou má, devendo tão somente declará-Ia
verdadeira ou. errada. Tal, porém, já não ocorre com os governantes brasileiros, que partem do (
No dia em que o desenvolvimento cientrfico do pensamento humano con- postulado de que o homem é, antes de tudo, um ser moral, cuja consciência 'psico-
(
seguir emprestar â ciência social este cunho de certeza e segurança de que já des- lógica é absolutamente irredutrvel aos princípios da matéria organizada, regendo·se
frutam as ciências fr~ico-químicas, "o governo das pessoas" será "substiturdo pela por uma norma espeCificamente djversa das leis da natureza Hsica. Na verdade, (
adminsitração das coisas e pela direção das operaçães de produção" (Engels - como ensina Düguit(L'~TAT - LE DROIT OBJECTIF ET LA LOU POSITIVE,
(
Ibid., pág. 471. vaI. 19, págs. 16, 17, 181: "Esta regra social tal como a concebemos, não é uma lei
no sentido das leis do· mundo físico ou biológico, isto é, uma lei que exprime a (
Embora já existam, no mundo moderno, nos países de industrialização al-
tamente atingida, - sustentam os comunistas todas as condições para o estabeleci- simples relação de ~ucessão entre dois fenômenos. As leis do mundo físico ou bio- (
mento desta universal "adminsistração das coisas" e desta geral "direção das lógico são leis ~e causa; a regra social é uma lei de fim '" Falou-se de uma biologia
operações de produção", continua, entretanto, a neles vigorar "0 governo das social. Falou-se mesmo de uma est~tica ou de uma dinâmica sociais. Estes_sistemas C
pessoas", porque a burguesia, empenhada em prosseguir na sua obra de espoliação surgiram na sua hora, e prestaram serviços;" mostraram o nada da teoria dos direi~ (
do proletariado, - que é o único produtor da riqueza - impede a realização desta tos individuais; estabeleceram que a socie~ade não é um fato querido e artificial,
mas um 'fato espontâneo e natural. Eles erraram querendo identificar os fatos so- (
transformação social,· servindo-se, quais outros tantos instrumentos de compres-
são, precisamente do direito, da moral, e da religião, que nada mais representam, ciais e os fenômenos físlcos ou biológicos. Daí o "seu descrédito no atual momen- (
hoje em dia; senão meras criações artificiais do pensamento dos homens da classe to. Por mais que se faça não se poderá impedir que o fator essencial dos fatos
(
opresspra. O Estado, nesta fase da evolução histórica da humanidade, é o órgão sociais seja o próprio homem, ser consciente de seUs atos, é que pode afirmar que
expressivo desta "obra de opressão sistematizada. tem deles a consciência .. Não se poderá nunca demonstrar que as forças da nature- (
za e da vida sejam forças conscientes; elas o são talvez; ninguém nada sabe a tal
Nestas condições, cumpre derrubar este Estado burguês que está a entorpe- (
respeito; ninguém o saberá jamais; é possível que elas o sejam; tudo é posslvel;
cer a ascensão da humanidade para uma frase mais elevada de b~m-estar coletivo.
Ora, esta empreitada científica de destruição do Estado burguês só se tor~
mas ninguém pode afirmá-lo. A cada ato humano a consciência individual se afir- (
ma. Esta força é livre? Ninguém o sabe. Mas, é certo que ela é uma força coriscien-
nará poss(vel através da viólência, cuja missão é assim definida por Engels (I bid., (
te. É certo, assim, que o homem tem consciência de se determinar por um fim.
vai. 29, pág. 721: ..... a violência desempenha ainda um outro papel na história,
Talvez, na realidade, o ato humano é determinado por causas. Entretanto, o ho- (
um papel revolucionário; ... ela é, segundo a palavra de Marx, a parteira da velha
mem age como se ele fosse determinado por um fim. Escolheu ele livremente este (
sociedade grávida de uma sociedade nova, o intrumentocom o aux.rlio do qual o
fim? Talvez. Em todo o caso ele o escolheu conscientemente. Os fenômenos do
movimento social quebra e substitui formas polfticas geladas e mortas... ".
mundo natural nos aparecem determinados por causas, necessárias ou contingen- (
Incumbe, assim, à violência, na conceituação da filosofia comunista, por tes, pouco importa. Os atos humanos nos aparecem determinados por fins escolhi-
em equação a ordem social com a ordem econômica. ~
dos livremente talvez, mas certamente escolhidos conscientemente. Eis porque a
Urge, entretanto, não deturpar a natureza-mesma desta violência. Esta não (
lei social é uma lei de fim; todo o fim é leg(timo, quando ele é conforme ã lei
é um ato humano bom ou mau. Erraria quem assim a classificasse, porque, no di- social, e todo o ato feito para atingir este fim tem um valor social, isto é, jurfdico. (,
zer de Engels (lbid. vai. 39, págs. 44/451, "as forças sociais de ação agem absoluta· A regra de direito é, então,·a regra da legitimidade dos fins, e por ar ela é inteira-
mente como as forças da natureza: cega, violenta, e destruidoramente desde que (
mente diferente da lei física ou biológica que é a lei das relações de causa para
não as reconhecemos e com elas não contamos ... E isto é particularmente verda- efeito. A regra de direito pode então denominar-se uma regra de conduta, pois que (
deiro das possantes forças produtivas de hoje. Enquanto nos obstinamos em recusar ela se aplica a vontades conscientes, pois que ela determina o valor relativo dos (
a compreender delas a natureza e o caráter, - e o modo de produção capitalista e atos conscientes do homem".
os seus defensores se opõem a que as compreendamos - estas formas agem apesar Segundo os imperativos desta concepção, o direito, a moral e a religião são, (
de nós, contra nós, e nos dominam ... ". na sua origem e nos seus fundamentos, manifestações ps(quicas tão reais em si
quanto as da matéria, e precisam de ser levadas em conta pela inteligência humana,
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- que tudo ordena- e dispõe - a fim de que as suas manifestações, na ação social, é por a sua I(ngua de fora para o moleque. O moleque pode ter ou não ter, de ma-
seja dada a primazia legítima sobre as manifestações do mundo Hsico. neira absoluta, nenhum respeito para com o presidente da Corte de Justiça; isto
Nos limites' desta concepção, os governantes só têm a faculdade de praticar é matéria que, gostosa mente, podemos considerar como autêntico mistério psi-
aquilo que é considerado lícito pelo direito, pela moral, e pela religião que domi- cológico. Mas, se o moleque tem, absolutamente, algum respeito ao preside.nte" da
nam e regem a consciência social e pol(tica do meio social em que vivem. Corte de Justiça, este respeito é certamente outorgado ao presidente da Corte de
Ora, 'o Brasil por ser um país de civilização cristã organizou um sistema Justiça unicamente porque ele nâ'o põe a sua !fngua de fora .
jurídico que repele, por iníquo ~e injusto, o emprego da violência física e moral Assim, se o "'fribunal de Segurança Nacional quer punir, com eficiência,
como meio de governo, sobretudo quando é utilizado contra os detentos políticos. aqueles que em novembro de 1935 usaram da violência contra os leg(timos órgãos
,,
Pretender justificar, assim, com o exemplo dos governos comunistas, a da soberania nacional, necessita de afastar, firme e categoricamente, da sua ação \:
desumanidade implacável com que está sendo tratado Harry 8erger, é, - além d. punitiva todo e qualquer gesto de violência. Só â custa deste preço é que as suas
contradizer todas as afirmações teóricas da noss_a sistemática jurfqica - t dar razão sentenças se -valoriz~rão no seio da consciência cristã do povo brasileiro. Só assim, I:
aos doutrinadore? marxistas quando asseveram que o direito burguês é mera inven- elas poderão ser acatadas como obra de justiça serena.
ção artificial do pensamento explorador das ~Iasses possuidoras, empenhadas em Eis porque; M.M. Juiz, o Suplicante volta à presença de V. Exa. para re·
t
espoliar os proletários dos proveitos do produto industrial que eies não cessam de clamar, em nome da Justiça, contra o regime carcerário, desumano, que vem sendo
criar com a sua só força de trabalho. Recorrendo, na repressão legal aos inimigos aplicado a Harry Berger. Não é um favor que está a pleitear para o seu cliente. É
do regime, à prática da violência, que o seu direito teoricamente condena, os go- um diréito, indomável e' incoercrvel, que está a invocar, em nome da própria
vernantes burgueses nada mais fazem do que confirmar a argumentação da doutri- condição de criatura racional, de que nenhum tribunal pode demitir a- pessoa
na comunista, quando diz que esse direito é simples ficção do pensamento interes- de Harry 8erger.
seiro das classes: dirigentes, sem a menor base na realidade social do atual momento I mpõe-se, assim, que, Sem mais a delonga de um minuto, V. Exa. ordene,
histórico. com a sua autoridade de magistrado, que Harry Berger seja transferido, imediata-
Aliás, ninguém melhor do que Chesterton (ALL THINGS CONSIDERED,
págs. 222/223) escalpelou este sofisma grosseiro, só compreens"vel no seio das
mente, para uma cela condigna, onde, a par de cama, roupa, vestuário, e objetos
próprios para escrever, - de que está carecendo para a sua defesa -, se lhe per-
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nações bárbaras ~-, de que a violência dos vencidos deve ser punida pelos vencedo- mita fazer 'as-Ieit~ras que bem lhe aprouver, tudo, porém, dentro das normas de ,
res com medidas igualmente violentas. Eis, a tal respeito, a maravilhosa lição do vigilância prudente, que a administraçã'o carcerária costuma, em face dos detentos
saudoso e admirável moralista: "Qualquer que seja a verdade, é, entretanto, abso- oolfticos, por em prática, para evitar confabulações perigosas dos encarcerados
lutamente errado empregar o argumento de que nós europeus devemos fazer aos com os seus partidários políticos ainda em liberdade.
selvagens e aos asiáticos aquilo que os selvagens e asiáticos nos fazem, a nós. Eu Formulando o presente requerimento tem o Suplicante cumprido apenas
tenho visto, realmente, alguns polemistas usarem esta metáfora: Devemos comba- o Seu dever, oferecendo, entretanto, com isto, a V. Exa. adequada oportunidade
tê-Ias com as suas próprias armas". para que, sob os ditames imperiosos da sua consciência de homem e de Magis-
Muito bem; deixemos estes polemistas aplicarem a sua metáfora, e aplicá-Ia trado, possa V. Exa. cumprir o seu, com igual solicitude. 'I
literalmente. Vamos combater o sudanês com suas próprias armas. Suas proprias Requerendo a juntada da presente aos respectivos autos, ~

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armas são grandes facas muitos grosseiras, e espingardas, no momento, arcaicas.
Suas próprias armas são, também, a tortura e a escravidão. Se nós os combater-
mos com a tortura e a escravidão, estaremos combatendo pessimamente, precisa-
mente como se nós C?s combatêssemos com facas grosseiras e espingardas velhas.
O que constitui toda a força de nossa civilização cristã, é que ela nos leva a comba-
P. D.eferimento.

Distrito Federal, 2 de março de 1937.


!
ter com as próprias armas dela, e não com as armas dos outros povos. Não é de a) Her~clito Fontoura Sobral Pinto
" nenhum modo verdadeiro que a superioridade justifica o ditado: "Para velhaco, Advogado ex-oflicio

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velhaco e meio". N'ão_ é absolutamente verdadeiro que se um moleque põe a sua
Ifngua de fora para o presidente da Corte de Justiça, o pre.idente da Corte de Jus·
tiça imediatamente conclua que a sua única possibilidade de mar)ter a sua-posição
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CARTA DE LEOCADIA PRESTES A LUIZ CARLOS PRESTES. (;~
NOTfCIA DE A NOITE, ANEXADA AO REQUERIMENTO DE 2.3.37.
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Condemiiado \lola morte do cavaBo !I
CUnlTYBA.23 ($rTvfco !"sp~elal d'A do o magistrado recehldo, de todo ~
Paris, 6/3/1937.
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NOrrE) _ JI):to !\Iansuf K:H:tD. nesltl. paiz, felicit.lçócs pt'ltl lua .ttitudi!. (
capitul, matou um ('3\":1110 de 1stnlo A pena Impo.\h a Maml'llf Karan , a
cS[)Jncal-o . O nnima}
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prestava-lhe menor eumprido. et' hoje,- em t'!lIA.be .. ·
Incstima\"t'ls !icnÍtos, iluxiJitlndo--o na lcc1mentol ptnitenciariol d,a Brull.
mAnutenção de 6ua (AS::!,. Certo dJ'l. -
Meu Querido Filho, ('"
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porém, conta M::msur Kar~nJ O I('U ,...4.._IJI.~"""'--· ~- ....- - _ .... ~


r. -

Desejo de todo o coração que continues bem de saúde e ânimo forte. Até
amigo irNcionnl dcsobcdcccu-o.- Ti- (
nha que pagar por aryuelle crjm~. E. hoje nada recebi de tua parte, embora, muitas tenham sido e.cartas enviadas para
"L'
empunhando- um chicotr. dcspc,.Jou • a prisão onde te encontras desde março de 36. Ignoro se as recebeste. Hoje rasolvi
um" scrie tremenda clt golpes no cor- \ lt" escrever-te de novo, esperando, desta vez, um melhor resultado, quero dizer, que
(
pf) dó anim:ll. 'que. ,entincfa profun- ( I;' ,
damente a rtidcu do Ca5ti~o. caiu te cheguem às mãos estas linhas, portadoras do nosso amor e da. n01ll1 saudades,
por lerda. l>'~ra moter (,5lrehuch:mdo. r'
O aconlrcimcnll) impf('55ion o u & qU..:ln" n mas, principalmente para te dar urna gratíssima nat(eia que acabamos de receber. ~
to~ o viram, E lIma denuncia (oi l~· t A 27 de novembro nasceu em Berlim, em um hospital de uma prisão de mulheras,
"õlon , policia. EntreJ:uc Q cn~o f'm S (!
müo5 ria. justiça. ,loão M,m~ur J{a .. h tua filhinha a quam nossa querida Diga deu o noma de Anita Leocádlo, em honra
róln, depois de um llrOC('.~50 movi· p. à heroína brasileira Anita Garibaldi e em atenção a tua mãe. Que criatura admirável (I
mrn!ndo e origin..:ll, que culminou num .' é .tua esposa e como é digna d. ti. Congratulamo-nos, efu.ivamante contigo pelo !
julgamento jnedito. foi eondcmnadn a
17 dhu de- prisão cellular e 6. mulla h auspicioso acontecimento. DepoiS dos transes por que passamos e da terrível incer-
de 620MOO. O jui1. Antonio Leopoldo p
dos-,Santa, foi o Aulor da scnl\"nC'i\, e
teza que pesava sobre a sorte da her61ca Diga e do precioso penhor que trazia em (,
flue ~dn';.jU ;) m:~~d~:' do ~(I\,~lIn seu seio, podes bem imaginar a indescrit(vel emoçio que nos dominou e ao mesmo
(
.J~~~Ê5~:jl~e5~:c;:!li~~~~-~:rriÀsu~~r;h;~~: \' ~.: tempo a enorme alegria que encheu noSSOs corações ao termos conhecimento do
1 deu 0'
meios forense, do Paraná. ten· d "feliz sucesso. A nossa heróica Diga, somente a sua calma e paciGncia com que sou- l,
:~ .~~~:~;~:::"::$~:~~t:;": be suportar os terríveis sofrimentos morais porque passou devemos tão feliz acon- ( .'

tecimento. Junto vai a carta que dela'recebi, respondendo as que lhe havia escrito .. I
em janeiro último, e assim ficará a par sobre alguns detalhes sobre o nascimento (,

d. tua filhlnhe. Além dessa carta de 31 d. janeiro, nenhuma outra recebi, porém, (,
tenho escrito três vezes por mês, como determina o regulamento da prisão onde se
Nota: notícIa de A NoIte, de 29 de Janeiro de 1937, com que Sobral Pinto instruiu o seu pedi-
do pera Harry 8erger, baseado na Lei de Proteção aos Animais,
encontrão Por intermédio d~ amigos, Já lhe enviei uni pequeno auxílio pecuniário,
aga'sálhos, etc. Por esse lado podes ficar tranqüilo, q~e não nos descuidaremos des-
l,
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{ ___ .
ses dois entes queridos e tudo envidaremos para que nada lhes falte. Estamos ter M
minando um pequeno e.nxoval, todo feito por nóS ( eu e Lygia ) que muito breve
enviaremos para a muito querida Anita. Já enviei à Olga as fotografias pedidas.
Agora falemos um pouco sobre tua situação, que, espero, deverá em breve sofrer
algumas alterações. Não compreendo que continuemos sem poder corresponder M

nos, porque nenhuma justificativa poderão apresentar para continuar a impedir a


troca de cartas di! família, e termos assim n~tícias uns dos outros. Espero com anM
CARTA DE LYGlA A SEU IRMÃO LUIZ CARLOS PRESTES,
siedade, que me escrevas, pois desejaria tanto ver tua letra. PeçoMte também que SEM DATA. .
não deixes de me informar quais as tuas necessidades mais· urgentes, e o que devo
mandar primeiro. Sobre n6s, tenho a dizerMte que vamos bem de saúde e de esp(ri~ ;!
~.,

to, fortes e animadas para vencer todos os empecilhos que encontrarmos em nosso
caminho. Podes ficar tranqüilo. Eu mesma me admiro como pude resistir e supor-
tar a mudança completa por que passou a minha maneira de viver. Estou certa que
essa força a encontramos no multo amor que nos inspiras e no admirável exemplo Meu" querido irmão,
que para nós representa -tua vida toda de renúncias e sacrifício. Bem, meu querido
filho, vou terminar que esta já vai longa- demais, porém antes,quero lembrarMte que ~ão tenho espaço senão para escrever~te umas linhas. Elas são portadoras
se puderes escrever a Diga, que se aflige sem not(cias tuas, podes me enviar a carta de muitos votos de boa saúde e um grande e apertado abraço pelo feliz nascimento
que eu a transmitirei a ela. Tuas irmãs te abraçam e beijamMte com imenso carinho. da nossa querida Anita Leocádia. Não te posso dizer, querido Cauzinho, toda a
Com um apertado e saudos(ssimo abraço envio os meus mais ardentes votos pela alegria e orgulho que nos enchem os corações, meU e das manas, pela digna irmã
tua preciosa saúde. Tua extremosa mãe e a linda sobrinha que nos deste. Podes estar tranqüilo que não nos descuidaremos
delas. Recebe, querido irmão, com os meus melhores votos pela tua saúde muitos
( a. ) Leocádia Prestes. beijos e abraços saudÇ)sos da tua caçulinha,

( a. ) Lygia.

II
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OHclO DE RAUL MACHADO AO CHEFE DE POLfCIA
C~
DO DISTRITO FEDERAL,DE 9.3.37.
REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO, DE
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11.03.37.

Exmo, Sr. Dr. Raul Machado


(1
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Exmo. Sr. Capitão Chefe de Polícia do Distrito Federal. Juiz do Tribunal deSegurança Nacional. (
(
Tendo o Dr. Heráclito Fontoura Sobral Pinto, advogado do acusado
HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, advogadoex·officiode Luiz (
HARRY BERGER, ou ARTHUR ERNEST EWERT, requerido a este Juízo a i!,
Carlos: Prestes, vem, no processo crime que está sendo movido cOntra este perante
transferência de prisão do aludido acusado, por isto que este se acha recolhido na (
o Tribunal de Segurança Nacional, expor e requerer:
Polícia Especial em um socavão de escada, destituído, pela mingua de seu espaço, (
e por outras circunstâncias a que alude no requerimento de quaisquer condições Vindo de Paris, chegou ontem ao escritório do Suplicante a correspondên·
higiênicas, tenho a honra de solicitar de V. Exa., os necessários e urgentes infor- eia, que vai junta por cópia, constitu(da de duas cartas escritas por D. Leocádía (
mes sobre quais os pres(dios para que possa, ser transferido o aludido acusado, e Prestes, mãe do acusado supra nomeado, uma a seu filho, e outra ao próprio
(
que, oferecendo as necessárias condições de higiene, apresentem também as garan- Suplicante, e de uma terceira missiva dirigida, da Alemanha onde se acha, por D.
tias de vigilância e de segura permanência em custódia do acusado. DIga Benário Prestes à sua sogr~, O. Leocádia Prestes. (
Aproveito a oportunidade para apresentar a V. Exa., 05 meus protestos Essa correspondência foi enviada ao Suplicante não só para que o mesmo (
de elevada estima é distinta consideração. providencias~e, junto das autoridades competentes, sobre o estabelecimento de um
entendimento epistolar normal entre o acusado Luiz Carlos Prestes e os membros
(
da sua fam(lia, mas também, para que se incumbisse o próprio Suplicante de entre- (
Raul Machado gar ao seu cliente a carta a ele dirigida por sua mãe D. leocádia Prestes, e, ou·
JUIZ DO TRIBUNAL DE SEGURANÇA NACIONAL. trossim, a carta a esta escrita por sua nora, D. Diga 8enário Prestes. r
Nada há nessas cartas que impeça de fazê-Ias chegar ao seu destinatário. Ao ( ,

\',1.:'r:
contrário, os mais elementares princ(pios de solidariedade humana impõem a sua ( I
entrega a Luiz Carlos Prestes. Portadoras de mensagens' de amor e afeição famili-
\ :
ar, tais cartas serão para o acusado uma gota de lenitivo a esta solidão alucinante
a que se acha recolhido, presentemente.
Infelizmente, entretanto, não pode o Suplicante, sem autorização especial (l l '1'

de V. Exa., desobrigar-se, como era de seu desejo, de semelhante incumbência hu- '1
manitária. É que rigorosos são, a este respeito, os' preceitos da ética profissional,
como poderá V. Exa. verificar em Payen et Duveau (LES RÉGLES DE LA PRO·
~,~
~.!i
FESSION D'AVOCAT • pág. 212), que dizem: "O advogado não deve de se fazer
o intermediário do seu cliente, preso, com o mundo exterior. l _.~I
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87 "~I',
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.L __ , I
Cometeria falta grave o advogado que abusasse das facilidades outorgadas questão discutida" lACTES OU CDNGRES PENITENTIAIRE INTERNATID-
a seu ministério, transmitindo, por exemplo, às fammas cartas escritas pelos pre· NAL DE SAINT-PÉTERSBOURG. vol. 19 , pág5. 364/365).
50S, subtraindo-as, assim, à fiscalizacão do Ju(zo, ou levando ao preso jornais e ou· Ante os postulados do Direito Penal, a situação jur(dica do preso preven-
tras objetos, ou entregando·lhe somas de dinheiro enviadas por um terceiro". tivamente é sub~ncia Imente diferente da situação do preso por condenação judi-
Dando, pois, a conhecer a V. Exa. por cópias que fez extrair com absoluta ciária transitada em julgado. "Enquanto que o primeiro caso a detenção é um sim-
fidelidade, o inteiro teor dessa correspondência, o Suplicante visa mostrar a V. ples meio de tornar possível a execução da futura sentença, no segundo ela se re-
Exa. que deve assegurar-lhe o direito de encaminhar, pessoalmente, ao seu destina- veste, entre outras, da .característica çje expiação do crime praticado.
tário, as cartas-em questão. O eminente jwista há pouco citado focaliza a distinção entre estas duas
É preciso, entretanto, que não se limite a este gesto o procedimento de situações jurídicas, para daí deduzir conseqüências da mais alta importância. Eis,
V. Exa., relativamente à correspondência do acusado Luiz earlós Prestes. É inadiá- a tal respeito, as suas justas ponderações: "Tendo em vista o fim que deve atingir
vel, em face da narrativa que D. Leocádia Prestes fez ao Suplicante na carta a ele a prisão preventiva, e_ considerando a diferença essencial que existe entre a situação
dirigida, que V. Exa. estenda um pouco mais a sua ação benfazeja de Juiz sereno e jurídica de um condenado e a de um encarcerado preventivamente. que goza, le-
imparcial. " galmente, de todos os seus direitos de cidadão, deveremos recon~cer que na
Motivos, cada qual mais imperioso, já se apresentaram, certamente, ao es- prisão preventiva todas -as restrições baseadas sobre o fim da pena, como meio de
pírito culto de V. Exa., para verificar que-está com a razão o SupliCante quando expiação, emenda e inti'midação, devem ser afastadas.
entra a pleitear, como agora o faz, que seja autorizado o estabelecimento de uma Todos os relatórios são acórdes-sobre este princrpio geral.
correspondência regular entre o acusado Luiz Carlos Prestes e os membros da Dele eis as consequências:
sua famflia.
Não ignora V. Exa. que este acusado encontra-se recolhido a uma prisão ...................................................................................................
de Estado em virtude de prisão preventiva decretada pelo Tribunal de Segurança
Nacional. o preso pode~á, então, se ocupar dó que for do seu agrado; sob a condição,
Ora, renovando os preciSOS termos de uma tese apresentada ao Congresso todavia, de que as suas ocupações não sejam contrárias à ordem da prisão, nem de-
Penitenciário Internacional de São Petersburgo, o Suplicante se permite indagar: la ameacem a segurança. Entre as suas ocupa~ões, a necessidade de ler terá o pri-
em que o regime ao qual o detido está sujeito antes da sentença judiciária defi· meiro lugar para'o homem instruído, e a escolha da Isitura não dependerá, certa~
nitiva .se deve distinguir do regime ao qual ele será submetido após a cOndena- mente, senão do próprio preso.
ção?
A resposta ministrada, nesse Congresso, por Werevkine, um dos principais ....................................................................................................
relatores dessa tese, esclarece de maneira decisiva o assunto: "Os cinco relatórios
apresentados sobre a questão pelos Srs. Steitens,'barão de Marscháll, Armengol y o preso terá o direito de se entrevistar com as pessoas de sua famrHa, e ter-
Cornet, Foinitsky e Alexandrow, coincidem na idéia de que a detenção preventiva ceiras pessoas. As restrições a este direito não poderão ser admitidas senão quando
é necessária no interesse social e da justiça, a fim de evitar a fuga do acusado e im- houver perigo de fuga ou de conluio. Não há nenhuma objeção a se fazer â opinião
pedir a colheita dos indícios e provas da ação criminosa. E todos são ainda acordes- do Sr. Marschall, de que incumbe a autoridade encarregada da instrução decidir da
em que a privação da liberdade, que constitui a prisão preventiva, está longe de ser admíssibi lidade e da duração de cada visita, e ordenar a presença, no curso da vi-
uma pena, pois, para nos servir da expressão do Sr. Dr. Foinitsky, ela não tem a sua sita, de um membro do corpo de guarda, se ela o julgar necessário, pois só esta
fonte no direito que pertence ao Estado em face do indivíduo, ela não se incor- autoridade é que está a par de todas aS minúcias do caso" (lbid. págs. 368/369).
pora no seu "jus puniendi". A prisão preventiva decorre tão só da necessidade que Tais são, Sr. Juiz, os ensinamentos da moderna ciência jurídica, de que V.
tem a sociedade de Se certificar que a pena será cumprida, não passando, assim, de Exa. é um dos mais insignes cultores no noSso meio.
um meio de processo emp(egado para evitar que o culpado impeça o curso regular Entretanto, para gravame da consciência jurídica nacional, tais ensinamen-

" da ação e a manifestação da verdade.


Esta consideração e a diferença essencial que existe entre. a situação jur(di-
tos vêm sendo desrespeitados sistematicamente pela administração que, por ar-
brtrio incontido e arrogante vem privando caprichosamente o acusado Luiz Carlos
Prestes de se corresponder até com a sua própria mãe.
ca de um acusado e de um condenado devem de ser de um alcance decisivo para a
\.
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"
\.
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,-
(
É mister, M.M. Juiz, que se ponha termo definitivo a este regime desuma~
(
no. E é a V. Exa., como Juiz Preparador, que incumbe tomar as providências para
isto necessárias. (
Confiando na alta mentalidade justiceira de V. Exa., já tantas vezes com .. (
provada no curso deste processo, o Suplicante, cônscio das responsabilidades da
sua árdua missão de advogado ex~officio de Luiz Carlos Prestes, vem requerer a (
V. Exa. que, com a urgllincia- que o caso requer, se digne de ordenar sejam toma-
(
das as medidas indispensáveis para que, d'ora em diante, possa eSSe acusado, não CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCADIA PRESTES.
s6 fazer as leituras que forem do seu agrado, como também corresponder-se regu- 1
larmente com as pessoas de sua fam(lia.
Rio, 12 de março de 1937. (
P. Deferimento. (
Exma. Sra.
(
Distrito Federal, 11 de março de 1937. D. Leocádia Prestes.
(
Saudações respeitosas. (
Heráclito Fontoura Sobral Pinto.
Advogado ex·officio . Chegou-me às mãos, nas últimas horas da tarde de anteontem, a carta que (,
me dirigiu, capeando à que V. Exa. escreveu a seu filho, e a que sua nora lhe havia C
dirigido da Alemanha, onde se acha presentemente.
(
Cumprindo, mais uma vez, o meu árduo- dever de advogado ex-officio de
seu filho, apresentei ao Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacio:" (
nal, - mal ele chegou ao seu gabinete na manhã de ontem -, a petição de que
(
envio a V. Exa. cópia integral e fiel.
(
Esse Juiz, que se vem mostrando humano e tolerante, deferiu incontinenti
o meu requerimentQ, prometendo-me providenciar com a maior urgência para que (
fossem- dados a seu filho os meios e elementos de estabelecer com as pessoas de
(
sua famflia uma correspondência regularmente cont(nua.
Penso, assim, Exma. Sra. que me será dado o prazer de colocar no correio
(
aéreo, amanhã, juntamente com esta a resposta de Luiz Carlos Prestes él carta que (
V. Exa_ lhe dirigiu, e que eu, ontem mesmo, a ele entreguei pessoalmente, na sua (
prisão, que é no Quartel da PolCcia Especial desta capital.
Exclufdos os sofrimentos morais inerentes a uma prisão tão prolongada e l.
rigorosfssima no seu regime de isolamento absoluto, e que V. Exa. bem pode aqui- (
latar quão- penosa deve de ser, o estado de ânimo e de sa.úde ffsica de seu filho são (
bons. Encontra-se num quarto amplo e arejado, havendo ordens de lhe ser forne~
cida alimentação sadia, agradável e abundante. Sob este aspecto não formula quei~ '\
xas, nem reclamações. Revolta-se, isto sim, contra o isolamento absoluto, e a proi- '\
bição total de leitura, e da franquia de escrever, coisas estas, aliás, de que V. Exa,.
já teve conhecimento através da petição que "O RADICAL" publicou. \~ ~. '
(
90 91
(

\ .

C
1-_.
Se não providenciei, desde a minha nomeação como advogado ex-officio, a Deus, ninguém no paes ignora, nem mesmo os atuais governantes, que norteei
para o estabelecimento de uma correspondência normal entre Luiz Carlos Prestes sempre a minha vida profissional pelos princrpios da franqueza, da lealdade e dQ
e os membros da sua família, fói por ignorar completamente qual o endereço de desassombro. O que tenho para dizer e fazer faço-o à vista de todo.s, sujeitando-me
V. Exa. e de suas filhas. . a todas as conseqüências possíveis que decorram da minha atitude. Não toleraria,
A não. serem estes pequenos serviços, muito pouca coisa poderei fazer por assim, que as autoridades brasileiras entrassem a fazer a censura da minha corres-
Luiz Carlos Prestes, dada a declaração formal e categórica que formulou, e na qual pondência profissional. Se um tal abuso viesse ou vier a ser praticada saberei fazer
já tem insistido !!m outros enContros que .tivemos, de que n~o çonsentirá( de ma- valer, perante os nossos· tribunais,. os direitos da minha profissão. E, caso me
neira alguma, que eu intervenha, como advogado ex-officio. em defesa de seuS visse repeliçio pelos juízes do meu pa(s, pode V. Exa. ficar certa de que declinaria,
direitos. imediatamente, qa função de advogado ex-officio, em que me vi investido, pois
Não sei em que possa ser útil a V. Exa., e aos de sua família. Apesar disto não tolero o menor cerceamento da minha atividade proti"ssional. Ou me deixam
ponho-me inteiramente ~ sua disposi~o, animado do mesmo espírito com ql,JE! me exercê-Ia com liberdade, ou, então, eu a não exerço.
submeti às imposições do meu dever profissional, espírito este que procurei retrã- Com os protestÇ)s do meu apreço e consideração,
tar, com fidelidade,·na. carta que, em 12 de janeiro do corrente ano dirigi ao Presi-
dente do Conselho da Ordem dos Advogados na Seção deste Distrito Federal, e
S.P.
onde, disse: "Lamento apenas não dispor dos dotes de inteligência necessários ao
desempenho de tão árdua, p·enosa, e dif(cil missão, que o Conselho da Ordem Rua REPÚBLICA DO PERU, 70 Rua PEREIRA DA SILVA, 224
achou, na sua soberania, que devia de lançar sobre os meus frágeis ombros. 2Ç andar - Salas 1,2,3. LARANJEIRAS
O que me falta em capacidade, sobra-me porém, em boa vontade, para me
submeter ~s··imposições do Conselho da Ordem; e em.compreensão humana, para,
fiel aos impulsos 90 meu coração cristão, situar, no meio da anarquia contempo-
ntnea, a atitude destes dois semelhantes, crfados como eu e todos nós à imagem
de Deus.
Quaisquer que sejam· as minhas divergências do comunismo materialista,"'"
e elas são profundas -, não me esquecerei nesta delicada investidura que o Conse-
lho da Ordem· me impôs, que ·simbolfzo, em face da coletividade brasileira exaltada
e alarmada, A DEFESA.
Espero .que Deus me ampare nestà hora grave da minha vida profissional,
dando forças ao meu esprrito conturbado para mostrar aos Jurzes do Tribunal de
Segurança Nacional que Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest Ewert ou Harrv Ber-
ger são membros, também, desta vasta e tão atribulada famflia humana.
Alimento a fundada esperança de que encontràrei nesse reservatório imen-
so que é a caridade cristã, recursos dignos e apropriados para, sem renegar os
princ(pios básicos da civilização brasileira, d.emonstrar que os acusados, ora indi-
cados ao meu modesto patroc(nio, a par de erros funest(ssimos, alimentam~se
também de verdades generosas, para a difusSo das quais são capazes de grandes e
respeitáveis renúncias.li.

Assim, se V. Exa. necessitar de meus fracos préstimos, escreva-me sem


temor de· se tornar importuna, quer para o· meu escritório, quer para minha resi-
dt§ncia. A minha correspondência não foi até agora sujeita a nenhuma censura.
Acredito, portanto, que daqui por diante a mesma coisa acontecerá. Aliás, graças

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REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO, DE


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Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional
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- I """~I . (
-'--HERÁCLlTO FONTOURA SOBRAL PINTO, advogado ex·officio de Luiz
Carlos Prestes, vem expor e requerer a V. Exa: (
Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional.
Na última visita que o Suplicante fez ao seu cliente supranomeado, o Co- (
mando da Palreia Especial, cumprindo ordens de seus superiores hierárquicos, não
permitiu que essa visita se realizasse sem a presença, no mesmo compartimento, de I.
uma praça que acompanhasse todo o desenrolar da conversa. HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, advogado eX'officio de Har· ( !
Não se concebe, M. M. Juiz, maior gravame, do que este, à dignidade da no- ry Berger, vem expor e requerer a V. Exa:
bre e honrosa profissão de advogado. Formais e categóricas são as tradições da ad- Invocando elementares princrpios de humanidade e de justiça serena, o Suo
(
vocacia no que se refere ao livre entendimento entre o cliente, detido nas prisões plicante obteve de V. Exa.,mediante lon9a e fundamentada petição, ordem formal C
de Estado, e o seu patrono. Payen e Duveau (LES REGLES DE LA PROFESSION e positiva ao Sr. Capitão Chefe de Polrcia desta capital para que fizesse retirar de
D'AVOCAT. pág. 211), repetindo, aliás, lições imemoriais de outros ilustres tra· dentro do socavão do lance inferior de uma das escadas da PoHcia Especial, 'onde
\
tadistas, advertem: "Na .prisão, o advoga'do, portador da licença de entendimento, se encontrava, o acusado Harry Berger, fazendo-o conduzir, em seguida, para a Ca- C
é .introduzido num parlat6rio especial. Ele ali é colocado em presença de seu clien- sa de Detenção, desta cidade, onde se lhe daria quarto, cama, alfaias, roupa, de (
te, E PERMANECE SÓ COM ELE, mas um instrumento de apelo é geralmente que vinha sendo privado há quase um ano, e, bem assim, papel, tinta e caneta, de
ministrado ao advogado. Um "Judas", além disto, é aberto na porta". que nunca dispôs, desde que foi preso, e de que está, agora, mais do que nunca ne- (
. !:. evidente, assim, que' V. Exa, precisa tomar providência urgente que asse- cessitado para poder tomar notas necessárias à sua defesa.
gure ao Suplicante a sua livre comunicação com Luiz Carlos Prestes. Apesar de haver já transcorrido quase um mês, esta ordem de V. Exa,não
\.
Não pode o Suplicante admitir que seja criado qualquer embaraço ao exer- foi cumprida, como, aliás, o Suplicante tem reiteradamente comunicado verbal~ (
c(cio dos seus deveres profissionais. Ou se lhe garante efetivo entendimento livre mente a V. Exa" todas as vezes que tem comparecido a este Tribunal da Segurança \
Com os seus clientes, ou o Suplicante se verá forçado a recorrer aos meios que o Nacional.
sistema jur(dico brasileiro lhe faculta, para tornar real uma liberdade de defesa que, Não é poss(vel que V. Exa"que tem conhecimento exato da inqüldade que \
inicialmente, foi garantida ao Suplicante, mas que, neste momento, iá não mais vem sendo praticada contra este preso polftico, pois foi a primeira autoridade que', \
existe, neste pars, se defrontou com Harry Berger, depois da sua transferência para a Pol(·
Nestes termos, eia Especial, permita que a sua ordem, que não chega a ser de natureza jur(dica;
(
P. Deferimento. porque é. simplesmente, uma homenagem à densidade da natureza hurnana -, seja \
Distrito Federal, 5 de abril de 1937.
Heráclito Fontoura Sobral Pinto desrespeitada tão flagrantemente por agentes do Poder Executivo Federal.
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95 C
94
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l,
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,
Se Harry Berger se viu denunciado perante este Tribunal de- Segurança Na-
cional foi porque infringiu, segundo alega a denúncia, as leis penais do paes.
Mas, M. M. Juiz, a lei brasileira, conforme dispõe o art. 212 da Consolidação
das Leis Penais, aprovada e adotada pelo Decreto n922.213, de 14 de dezembro
de 1932, não tolera que ;rexecução de uma ordem judicial seja demorada pelo seu
executor.
Para que, assim possam os agentes. do Poder Público nacional invocar a lei OHelO DE RAUL MACHADO A EUZÊBIO DE QUEIROZ FILHO,
para infligir qualquer pena a Harry Berger, é indispensável que eles dêem o exem- COMANDANTE DA POLCCIA ESPECIAL, DE 9.4.37.
plo de obediência e submissão às leis a que restringem e limitam o seu arbítrio.
No caso, ora afeto ao patrocínio ex-officio do Suplicante, este acatamento
à ordem de V. Exa.se impõe COm tanto maior relevância quanto essa ordem vIsa
tão s6 restituir um preso pol(tico à sua dignidade de criatura racional.
Em,9de abril de 1937
Cresce, portanto, de gravidade a decisão que V. Exa.precisa tomar, imedia~
tamente, para que não se possa dizer, de futuro, e com toda a razão, o que, em fa~
ce da justiça alemã, odienta e perseguidora, declarou certa vez Dimitrov (LETTRES-
NOTES ET DOCUMENTES, pág. 30): "Sim, é bem assim, e é lógico. Eu me
limo. Sr. Comandante da Pol(eia Especial
acho entre as mãos do inimigo de çlasse, que se esforça; também, por empregar a
justiça corno uma arma para ex.terminar o cpmunismo; isto é, praticamente, para
dizimar os seu~sustentáculos convictos, conseqüentes, e inabaláveis".
O prestfgio, presente e futuro, do Tribunal de Segurança Nacional está,
agora, nas mãos de V. Exa. Da sua decisão, enérgica, serena, humana, e jUsta é que
vai resultar, no seio da' consciência cristã do pafs, a certeza de que a Justiça Espe~
eial não perdeu, nesta hora de incertezas angustiosas, o senso austero da sua sereni~
dade e da sua imparcialidade.
Solicito~vos as necessárias providências, no sentido de ser permitido. como
Nestes termos,
vinha sendo feito, no interesse da defesa, o isolado entendimento do advogado Dr.
Heráclito Fontoura Sobral Pinto com o seu constituinte Luiz Carlos Prestes.
P. Deferimento.
Outrossim, rogo~vos fornecerdes ao acusado Harry Berger os materiais de
escrita indispensáveis para a sua defesa.
Valho~me, do ensejo para apresentar~vos os protestos de minha considera~

Distrito Federal, 6 de abril de 1937. ção.

Heráclito Fontoura Sobra~ Pinto


Advogado ex·officio. a.l Raul Mamado.

Juiz do Tribunal de Segurança Nacional.

97
96

JI
(~~

Tal quantia acha-se, presentemente, depositada na Tesouraria da Polícia


ri. I
desta capital, e poderia ser utilizada para a aquisição de todos os objetos indispen- (
sáveis ao melhor conforto de Luiz Carlos Prestes. (
Infelizmente. todavia, não vejo possibilidades de fazer aplicar essa quantia,
ou outra qualquer que V. Exa. me remeta, para a melhoria da situação material de
r,
seu filho. Esbarro sempre nos tropeços e embaraços que o Sr. Capitão Chefe de (
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOcADIA PRESTES. Pal(eia consegue, com êxito, criar à· minha -ação humanitária. Tudo aquilo que
consigo ver deferido pelo Juiz Raul Machado, e que não dependa de execução peso c
soai minha, como, por exemplo, a expedição de correspondência, as autoridades c
policiais anulam, quanto aos efeitos por mim pleiteados, opondo a inércia da sua
Rio, 10de abril de 1937. inatividade.
C
De nada aqiantam as minhas reclamações ao Dr. Raul Machado, porque es- (
Exma. Sra. te Magistrado se limita a fazer renovar, através de ofícios a ordem de realização
(
D. Leocádia Prestes. das providências por mim solicitadas, mas que não são postas em prática pelos ór-
gãos da Polrcia Civil. ,
{

Tal é a situação ~om que nos defrontamos. Sinto-me totalmente isolado. A


própria imprensa, como será fácil a V. Exa.apurar, não nos dá" apoio. Ao redor de
c
mim se estabeleceu uma atmosfera de supresa e de assombro, por causa da minha (
atitude, que a quase unanimidade dos meus concidadãos não chega a compreen- (
Cumprimentos respeitosos. der. Estou certo de que -se não fora a minha notória fé religiosa, a par da minha
Atendendo o seu pedido, entreguei a seu filho, e meu cliente ex-officio, situação de colaborador direto da Ação Católica nesta Arquidiocese, qualquer (
Luiz Carlos Prestes, a correspo~dência a ele destinada, e que me foi encaminhada, coisa de bastante grave já me teria acontecido. Os aborrecimentos se sucedem num (
para tal fim, por V. Exa. crescendo ininterrupto, sem que, entretanto, nada de eficaz me seja dado obter em
Como formara o propósito de escrever hoje a-V. Exa.,fui, anteontem, visJ- (
favor de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger.
tar seu filho, para saber se"tinha ele alg~ma coisa para mandar dizer a V. Exa. Pe- (,
diu-me que informasse a V. Exa,ter-Ihe escrito, em maio do ano passado, uma car- Relativamente, então, a este último, não pode V, Exa, imaginar as minhas
ta, que entregou à administração policial, que se comprometera a pô-Ia no Correio, (
agonias. Contra ele se erguem, no país, ondas intransponíveis de ódio e de vingan-
imediatamente. Em virtude, porém, das cartas que V. Exa.lhe dirigiu, verificou ça_ As torturas que lhe vêm sendo aplicadas, apesar de meus clamores, deixam (
que tal carta de maio não foi encaminhada_ pelas 811toridades policiais. frios e impass(veis quase todos aqueles que delas têm conhecimento através das (
Agora, como resultado da minha intervenção, mandou a V. Exa.nova carta, minhas petições ao Dr. Raul Machado, e das minhas cartas àquelas pessoas ou or-
pelos mesmos canais anteriores, visto não ter a pol(ciadesta capital permitido que gãos, que me parecem aptos a me auxiliarem neste trabalho, cristão e humano, de I"
essa missiva me tosse entregue, para a necessária expedição pelo Correio aéreo. restituir Harry Berger à situação de criatura racional.
·Desejo, minha senhora, que se digne de informar-me se recebeu, ou não, I
esta segunda carta de seu filho, porque, na hip6tese de haver a poll'cia dado a ela Enquanto eu assim me movimento, Harry Berger, com expressões de raiva \
destino idêntico que deu à primeira, irei bater às portas da Corte Suprema do nos- intraduzível em palavras, me acolhe as visitas como tentativas de um mistificador
(
so país, para requerer seja assegurado o direito -de se corresponder Luiz Carlos vulgar e torpe, a serviço da polícia, para surpreender-lhe noS lábios alguma declara-
Prestes com os membros da sua família, ção comprometedora. Telegramas, que me são remetidos de Londres, cartas da ir- (\~

Quanto aos- recursos monetários de que me fala V. Exa, na sua carta, não se mã dele que lhe são endereçadas por meu intermédio, e longas epístolas de advoga-
dos londrinos, como a que me dirigiu P. R. Kimber, Solicitar, ele os lê indiferen- <.
torna necessária a sua remessa. Como não ignora V. Exa.,seu filho ao ser preso viu,
também, apreendida regular importância que tinha em seu poder. temente, para concluir dizendo que ele não tem a seu lado um advogado, mas um \ '

astuto policial! (
"
98 99 I,
(

\.
\, ,
Preciso, minha senhora, apelar para tudo o que há em mim de cristão, para
abafar, nestas horas dE;! intensa amargura, a explosão de indign~ção que tumultua
no meu peito tão injustamente golpeado.
Para vencer os meus ímpetos de revolta, procuro imaginar que, com certe-
za, a mi·nha atitude não seria diferente desta se eu me visse em situação idêntica na
Rússia de Stalin. Segregado de tudo e de todos, envolto num ambiente de hostili-
dades sem limites, sentindo o ódio dos guardas acumulando-se de minuto em minu-
to, metido num socavão de escada, sem poder falar com" ninguém, ou fazer quais- EXPOSiÇÃO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO, DE 14.4.37
quer leituras, sem roupa, sem cama e sem a menor higiene, como me pareceria es-
tranho aquele homem que me aparecesse no presídio onde me encontrasse para di-
zer-me que viera me defender num processo de cuja realidade eu poderia até duvi-
d<::r, pois que nunca me foi dado ver nem os Juízes que me iam julgar, nem o pro- Exmo. Sr. Dr. Raul Machado, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional
cesfoO do qual se dizié! que elilergia·a minha responsabilidade criminal!
Quando me ponho a imaginar estas coisas, sinto que o meu coração se de-
sarma, ao mesmo tempo que a consciê·ncia me ampara com os estímulos incoercí-
HERÁCLlTD FONTOURA SOBRAL PINTO, advogado ex·officiode Ha,-
veis da sua aprovação.
Que me importa, Exma. Sra., o julgamento dos homens? renho me esfor- ry Berger, intimado por V. Exa. a oferecer as alegações finais de defesa em favor
çado na medida das minhas energias, por amparar aqueles·que foram confiados
t
deste acusado, no proces~o-crime que lhe está sendo movido perante este TriblJr)é!!
ao meu pátrocínio desinteressado. Tenho, por acaso, o direito de desistir do pros- de Segurança Nacional, vem expor as razões por que deixa de atender a esta intl·
seguimento ·desta tarefa peno·sa, porque vencedores e vencidos ~esta insurreição, mação:
correligionários e adversários, intransigentes nas suas convicções ou nos seus inte- Defesa alguma pode ser eficaz sem que o cliente, confiando na lealdade 0
ress&s, não podem penetrar e compreender a minha atitude de serenidade, que uns no desinteresse do seu patrono, lhe ministre as informações de que está ele prec:isa-
e outros classificam com o epíteto injurioso de deserção? do, para levar·a bom termo a sua, por vezes, penosa tarefa. Nesta confiança incon·
Tenho a certeza de que V. Exa.não p.ensai"á assim. As suas cartas tão equili- dicional é que repousa o instituto do segredo profissional, que é, a um tempo, a
bradas nas suas expressões, exceto quando me acumulam de qualificativos que ul- base fundamental do exercício consciente da defesa esclarecida, e a condiçá'o in-
trapassam de muito a real insignificância dos meus dotes, são uma I?rova patente dispensável de um patrocínio eficiente e digno.
de que está em condições de bem apreender o que há de elevado, de sincero, e de Esta é, aliás, a lição invariável dos que se dão ao trabalho de expor as. re-
leal na minha atuação. gras comuns da profissão de advogado, como se pode. ver, por exemplo, em
Os homens, solicitados sem cessar por sua mall'cia, sentem-se incapazes, Appleton (TRAITÉ DE LA PROFESSION D'AVOCAT, págs. 363/364):" O se-
muitas vezes, de compreender os gestos e as palavras dos seus semelha.ntes. Quan- gredo profissional constitui, para o advogado tanto um dever quanto um direito.
tas vezes eu não já incidi neste funesto erro. Porque não tolerar, então, que os ou- É um dever para com os seus clientes;ele não poderia preencher o seu f.)8pel relativa-
tros façam a mesma coisa para comigo? mente a estes, aconselhá-los com utilidade, se os clientes não estivessem seguros da
Refletindo nestas coisas, minha senhora, é que me esforço por ser toleran- sua inteira discrição. É mister que eles possam falar-lhe com toda a con'fiança, ~
te. E Deus, que lê nos corações, há de por certo ter para comigo, quando tiver de contar com o segredo das suas confidênci~s".
me julgar, por ocasião do meu ingresso na Eternidade, em que acredito com todas
A confiança do diente é tud.o, portanto, no exerc(cio, por parte do advo-
as forças do meu espírito, um pouco mais de compaixão e de bondade.
gado, da sua nqbre função da defesa. Sem ela nada será possível ao patrono fazer
. Esta esperança, e tão so~ente ela, é que constitui a minha força, e a minha
.em benetrcio do acusado entregue aos cuidados .atentos da sua solicitude.
recompensa. Continuando, como sempre, ao seu inteiro dispor, assino-me, respei-
Pois bem, o Suplicante se encontra precisamente em face d'urna situação
tosamente,
Sobral Pinto desta. Por maiores que fossem os seus esforços, e mais constante a sua assistência,
não lhe foi possfvel grangear a confiança de Harry Berger.

iOO 101
I
(;~

~1
Penosas se tornaram, pelo contrário, nos últimos tempos, as visitas do Su-
plicante ao seu cliente, que o acolhia sempre com gestos de inequ(voca suspeicão, conhecer a procedência desta suspeição fundada, que invadiu o coração raivoso
mal disfarçada entre expressões de fina, mas contundente ironia. deste preso pol(tico tão duramente martirizado?
Se os entendimentos anteriores ã apresentação da defesa prévia se realiza- Tudo na sua inteligência é, hoje em dia, dúvida e dúvida just(ssima. Es-
(
ram o'um ambiente de manifesta simpatia, foi porque Harry Berger deles recolheu trangeiro, não conhece ninguém em terras brasileiras, a não ser meia dúzia de cor-
a esperança de que não tardaria em se ver restituldo à condição de homem, me- religionários pol(ticos, que para aqui o chamou. Isolado no socavão de escada em (
diante a sua transferência para um pres(dio onde lhe seria reconhecida, ao menos, que o sepultaram vivo, já perdeu até a noção cronológica dos meses, das semanas (il
a sua qualidade de criatura racional. e dos dias. E a sua debilidade f(sica, - que já atingiu, por causa deste regime desu·
Nutrindo. o Suplicante, por essa ocasião, a ingênua ilusão de que as a':ltori- mano, os últimos extremos de resistência de um organismo outrora de raro· vigor C' ,

dades da República não tinham o menor interesse em conservar este ser humano concorre, certamente.~ para esta sens(vel incapacidade de se situar no tempo. Cer- C}
na situação em que se colocam, ordinariamente, os cães hidrófobos, enquanto não cado, por outro lado, de agentes policiais que lhe são infensos, sem poder ver um .', ,
parente, um amigo, ou um jornal, que lhe sirvam de pontos de referência ou de ve~ (
chega o seu sacrificador, garantiu a Harry Berger que não demoraria muito a sua
remoção para uma cela ordinária, onde se lhe daria cama, roupa e direito à limpe- rificação, como apurar se, realmente, o Suplicante é o seu defensor, ou, ao contrá~ (1
rio, um astuto policial, incumbido de surpreender-Ih!,!, nos lábios, alguma declara- ,~
Zé). Afirmou-lhe mesmo o Suplicante que todos os. seus esforços imediatos seriam (11
consagrados a esta nobre tarefa. ção comprometedora?
~,l!
"
Não duvidou V. Exa"M,M. Juiz, da qualidade de advogado alegada pelo Sr.
Passaram-se, todavip, as horas, e, com elas, os dias, as semanas,. e os meses, íj
sem que Harrv Berger, apesar dos clamores constantes e ·repetidos, do seu defen- David Levinson, apesar da exibição de tCtulos, e de recortes de jornais americanos? ( -,~!
sor desatençJido, tosse retirado do socavão. da escada, em que o meteram, sem Não proclamaram, outrossim, as nossas autoridades policiais que ele era perigoso " j!
(" 11
cama, sem mesa, sem cadeira, sem banco, sem roupa e sem higiene_ O jaquetão agente da Terceira Internacional, não obstante ter apresentado um atestado da
e a calça imundos, que traz sobre a pele, de.sde mais de um ano, continuaram a
ser o seu único vestuário.
Embaixada Americana no nosso pa(s?
Bastou, assim que esse americano tivesse tido o arrojo de se apresentar
neste Tribunal de Segurança Nacional como advogado de Harry Berger, para que,
Ci( fI
Nesse cárcere permanece ele imobilizado, já lá se vão doze meses, privado
da lúz direta do dia, proibido de quafquer leitura, e totalmente alheiado do que se
imediatamente, as autoridades federais passassem a suspeitar dós intuitos com que q
passa fora deSsa solitária, que é, na sua solidão tétrica, e na sua estreiteza alucinan-
te, o mundo todo que a administração brasileira reservou para este homem desam.
procurara justificar a sua vinda até esta capital. Elas, entretanto, dispunham de
todos os meios de informação que o· progresso da indústria põe à disposição dos
governos, e a atitude do Sr. David Levinson, por outro lado, foi, enquanto perma-· (
(I ,
parado. . :1
Em vão se dirigiu o Suplicante ao Sr. Ministro da Justiça em cartas ofi-
neceu entre nós, ostensiva e franca. ( ,
Porque, em tais condições,]incriminar Harry Berger pelo fato de duvidar da
ciais e particulares; em vão apelou para o Conselho da Ordem dos Advogados do \
qualidade de advogado que o Suplicante invoca, se este acusado não conseguit,l
Brasil; em vão obteve que V. Exa.deferisse um requerimento de remoção imediata: lançar os seus olhos nl!m sobre o edif(cio do Tribunal de Segurança Nacional, nem
a situação de Harry Berger continuou inalterada, não tendo piorado, porque para
(,
piorar o qu~ atualmentl! existe nem mesmo a morte: Esta seria, em todo o caso, a
sobre as pessoas. que o vão julgar, 8, nem mesmo, sobre o próprio processo onde
se diz que estão recolhidas as acusações contra ele levantadas? Achará V. Exa.,por
(I
. I
libertação. !.

Era natural, assim, que dia por dia começasse a se formar na imaginação,
acaso, que isto é de assombrar? Pois bem, há coisas mais fantásticas: Harry Berger C1
agoniada, de Harry Berger, a convicção de que o Suplicante não passava de torpe
mistificador, que comparecia, de vez em quando, na sua presença para antE;!gozar,
não pôde, até esta data, ne'!l sequer ler em qualquer jornal a not(cia da existência
do Tribunal de Segurança Nacional, nestes seis meses da sua duração.
E, deste modo, vai V. Exa. à presença de Harry Berger para qualificá·lo, e
dl !I
perversa e maliciosamente, o despertar, na sua alma flagel.ada, daqueles fugazes
raios de esperança inpênua de uma breve melhoria de regime carcerário. entregar-lhe a denúncia; comparece o Suplicante ao seu pres(dio, para dar-lhe .',
'- ,II
'

102
Como, em face deste quadro dramático,. de uma inaudita palidez de cores
quando comparado com as tintas bem mais carregadas da realidade, deixar de re-
uma cópia da sua defesa prévia; vê'se ele, agora, chamado pelo Comando da Polí·
cia Especial para encher a "Folha de Interrogatório", que V. Exa.lhe remeteu para
tal fim, mas em nada se modificou o longo e desumano martírio da sua prisão
rigoros(ssima I
\I
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I
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t~
"t

103 l
~.

~.,
.~---_._~---

Não está, pois, Harry Berger no dever de não acreditar nem na realidade do dos, nada de sólido e de firme puderam as autoridades policiais apurar, com exatl·
Tribunal de Segurança Nacional, nem na deste processo. que lhe dizem estar a Jus· dão, a respeito da atividade comunista de Harry Berger. Tudo são inferências,
tiça brasileira a lhe mover? É que em parte alguma do mundo civilizado viu coisa deduções, suposições, mais ou menos prováveis.- relativamente à sua missão junto
que se pareça com o que está a lhe acontecer: ser denunciado e intimado desta de· às massas trabalhadoras brasileiras.
núncia; apresentar defesa prévia e saber que se abriu o período da instrução crimi· A decisão, assim, do Tribunal de Segurança Nacional vai se basear ÚNICA
nal;-ver·se submeter ao interrogatório final sem que, durante todos estes atos da E EXCLUSIVAMENTE, sobre os elementos colhidos no inquérito policial, feito e
mais alta importância e significação para os seus destinos, lhe tenha sido permiti· processado dentro do mais impenetrável sigilo, e fora, totalmente, das vistas dos
do sair da sua solitária, ir à presença dos seus Ju(zes, lançar os olhos sobre os volu- interessados, que não. foram admitidos a examinar um só documento, nem, tão
mes do seu processo, ouvir o depoimento de uma só testemunha, e defrontar·se pouco, a opor qualquer desmentido, às versões que, a respeito deles, foram imagi-
com qualquer outra pesso-a que não fossem os seus carcereiros I nadas, fantasiadas, ou criadas com maior ou menor fidelidade à sombra de elemen-
Não é, nestas condições, mais do que razoável que Harry Berger se deixe tos indiciários coligidos no curso da instrução policial.
tomar de assombro, espanto e indignação!? O que se pretende, pois, obter deste Tribünal de Segurança Nacional não é
Não se alegue que existe nos autos farta e abundante prova documental, uma sentença. Esta, na sistemática do nosso Direito, é o resultado de um debate
que compromete, grave e seriamente, ao acusado como um dosprincipaisresponsá- franco e leal, no decurso do qual acusação e defesa são postas no mesmo pé de
veis pela insurreição de novembro de 1935, irrompida nesta capital e em vários igualdade e respeito.
pontos do território nacional. Infelizmente, porém, não foi isto o que aconteceu, no transcurso do sumá-
A quase totalidade desta documentação não tem a mais leve característica rio, relativamente à pessoa de Harry Berger.
de quaiquer a.utenticiddde: são folhas datilografadas ou "mimeografadas", desa- Segregado de tudo e de todos. colocado na estreiteza de um vão inferior de
companhadas de qualquer assinatura, pela q~al se possa apurar, com realidade, que escada, onde vem sendo privado do uso de coisas e de objetos mais indispensáveis
são da autoria, ou de propriedade de Harry Berger. à conservação da sua própria vida animal, viu Harry Berger desrespeitada pela Polf~
Aumentando a natural imprestabilidade destes elementos para fixar are;;, cia desta capital até uma ordem do seu Ju iz sumariante, determi nando a sua remo-
ponsabilidade criminal de q-uem quer que-seja, o auto de apreensão, onde eles são ção para uma prisão qúe lhe ia permitir, ao menos, pensar que passara a ser de no-
relacionados,_ não se encontra assinado por Harry Berger, como poderá V. Exa. vo considerado pela administração brasileira como membro da vasta fam(lia huma-
apurar no volume 49, às fls. 11 e 12. . na.
A~sim, neste lT!ontão de papéis, privados da mais leve autenticidade, e que
Faltaria; portanto, o· Suplicante éSOS seus mais elementares deveres de de-
enchem a totalidade dos volumes 40 e 60, apenas um ou outro documento se po-
fensor, de homem, e de católico se, passando por cima de todas estas iniqüidades,
de ver escrito à mão. viesse, nesta hora grave e sombria, alinhar argumentos teóricos capazes de explicar
Preocupadas as autoridades policiais em firmar, de maneira positiva, a res- as razões, falsas umas e verdadeiras outras, que trouxeram até ao nosso território
ponsabilidade pessoal de Harry Berger na insurreição de novembro de 1935, deter- este intrépido pioneiro da revolução social. Ter um tal procedimento seria sancio- .
minaram que fosse feito o exame gráfico da letra destes raros documentos, para, nar, com o seu gesto complacente, um tratamento que as leis cristãs condenam, e
à sombra desta per(cia, dar como do punho de Harry Berger semelhantes esctitos. a dignidade da personalidade humana não tolera.
Este exame encontra~se à fI. 4.165, utilizando-se os Srs. Peritos, como material de
Numa conjuntura desta, em que tudo - no ambiente social, nos conse-
confronto, da "assinatura existente na individual datiloscópica do nome indicado",
lhos de governo, nas deliberações da administração, e nas decisões dos Tribu-
isto é, Arthur Ernest Ewert.
nais -, é exaltação apaixonada, o dever da defesa é falar alto, rude e franco.
Para os que já se habituaram a presenciar os fracassos retumbantes da per(·
cia grafológica, mesmo quando ela dispõe de farto, exaustivo e abundantíssimo Oferecer Alegações Finais em favor de Harry Berger, neste ambiente de tu-
material de comparação, não pode merecer a menor importância um exame de le- multo, e de postergação dos princípios processuais mais elementares, sempre que
tra que pode dispor, como meio de confronto, apenas de uma assinatura autênti· se trata de um interesse justo e nobre deste acusado, seria trair os seus direitos imo
cal prescritíveis de membro da espécie humana.
Resulta de tudo isto que apesar do estado de gU!;lrra, do segredo absoluto O Suplicante não perdeu, nesta hora delicada, o senso das suas responsabi-
em que se processou o inquérito, subtraído ao exame e á fiscalização dos interessa- lidades. Alheio aos subalternos interesses da poh'tica sem ideal, que corrói as me-

105
104
I
(~
Ihores energias da Nação, não .se deixa impressionar com'o grito dos heatí possi- (~
dentes, que não cessam de exclamar:" O comunismo, eis o inimigo " . (~
. É que, elevando o seu olhar, firme e sereno, sobre o panorama social dos
tempos modernos, sente a vontade de repetir bem alto aquela apóstrofe célebre e
(1
audaciosa de Michel Bakounine (CONFESSION -1857, ed. franc., págs. 72/73), (~
dirigindo-se, submisso, ao seu imperador, o Tzar Nicolau I:" O comunismo veio e (-Q
vem tanto do alto quanto de baixo; embaixo, nas massas do povo, ele cresce e vi-
ve como uma necessidade vaga, mas enérgica, como um instinto de aSGensão; nas
CARTA DE SOBRAL PINTO A MINNA EWERT,
IRMÃ DE HARRV BERGER.
(4
classes elevadas,como depravação, ego(smo, instinto de uma desgraça ameaçadora (i
(~
e merecida, temor vago e impotente produzido pela decrepitude e pelo remorso de Rio de Janeiro, 27 de abril de 1937.
uma consciência sobrecarregada; e este temor, e estas vociferações contra o
comunismo contribuíram, talvez, de maneira murto mais forte para difundi-lo do Sra. D. Minna Ewert. ( i

que a propaganda dos próprios comunistas._ Parece-me que este comunismo vago, Sauçlações respeitosas. ( I
invisfvel, impalpável, ubiquitário, que, sob uma forma ou sob outra, está vivo em·
todos os seres sem exceção, apresenta mil vezes mais perigos que o comunismo Infelizmente, em nada tenho podido ajudar o seU irmão, como me pediu
(i
definido e sistematizado, unicamente pregado em algumas sociedades comunistas na sua carta de 24 do mês passado. Todos os meus esforços, que não têm sido pe-
organizadas, declaradas ou secretas". (
quenos, foram até agora inúteis. i
O T.zar acolhia, há oitenta anos precisamente, tal apóstrofe com esta sim- Evidentemente, duas únicas coisas poderiam satisfazer à Sra.: obter a ab- ('
ples declaração: "I: verdade". solvição de seu irmão Arthur Ernest Ewert e conseguir, enquanto isto não se dá, a

," I~
Os que o sucederam, no trono imperial, esqueceram-se, desi::ltentos, desta sua colocação num presídio dotado de condições higiênicas, e no qual ele possa
advertência impressionante,. E sessenta anos mais tarde o mundo civilizado assistia, ter um tratamento condigno.
horrorizado e impotente, o comunismo se fixar, ousado e odiento, no seio do :!
maior império dos tempos modernos. Foi este o resultado d~s tribunais espe-
Não vejo, minha Sra.,_quaisquer possibilidades de alcançar a primeira da- ( ,.
.
,

quelas duas aspiraçõe-s tão justas que a Sra. alimenta: a absolvição de seu irmão. "
ciais, da postergação sistemática do Direito, e do emprego, freqüentemente reno- Existe, no processo, uma série enorme de circunstâncias que dão direito aos I d
vado, da violência consciente, que desrespeita não só todas as liberdades públicas, Ju(zes do Tribunal de Segurança Nacional julgarem que o seu irmão era um , ri
\, G
mas até a própria dignidade da natureza humana. dos mais graduados chefes da insurreição ocorrida nos fins de novembro de 1935 , ~
nesta capital, e em outros pontos do território nacional. Aliás seu irmão fez, no l ~
próprio processo, declarações que, conjugadas com as de outros membros do
Distrito Federal, 14 de abril de 1937. Partido Comunista Brasileiro, tornam certa a sua participação no preparo dessa t ~
insurreição. ( ~
a) Heráclito Fontoura Sobral Pinto Relativamente â segunda pretensã'o da Sra., embora até este momento ( ,j
Advogado ex-offício , ~
continue o seu irmão numa prisão imprópria,' onde se vê privado de tudo, não
perdi ainda as esperanças de alcançar uma melhoria de tratamento. É que me l J
I
sobram alguns recursos dos quais- pretendo lançar mão nos momentos aportu-
nos.
l j
l. 11
Não sei se a Sra. foi convenientemente informada pelo Sr. David
Levinson, que aqui esteve de fins de janeiro até meados de fevereiro po corrente \
ano, apresentando às nossas autoridades uma procuração, concebida nOS seguin-
l
tes termos: "I MINNA. EWERT of 300 Elgin Avenue London 1JIJ.9. herebv
\,
authorize Vou or anV person designated bV Vou to act on behalf of mv brother

107 ,
106
"l,
l_
l
ARTHUR ERNEST EWERT in connection with ali proceedings in which he is Assim, para ele, quer o telegrama que me foi enviado de Londres, e assi-
concerned and to use my name and authority in any way I could use if I were nado "Enhearten" , quer a sua carta, são meros expedientes da polícia daqui que
os emprega para fazê-lo ter contiança em mim, que não sou advogado encarre·
present in Brasil.
DATED this Eighteenth day of January, 1937. gado da sua defesa, mas funcionário da po1l'da, incumbido de obter dele informa-
çé5es a respeito da atividade do comunismo no Brasil.
(a) Minna Ewert".
Não sei, minha Sra.,até onde tudo isto possa tráduzjr uma convicção sin-
Presumo que a Sra. tenha tido entendimentos com o Sr. David Levinsori, cera de seu irmão. Por mais que- r~flita não posso atinar se realmente ele está pen-
porque a letra do envelope que continha a sua carta de 24 do mês passado pare- sando assim, ou, s~~ ao contrário, é- um meio de que ele está lançando mão para
ceu-me ser deste corajoso colega, a quem ministrei cópias de meus trabalhos apre- afastar de junto de si uma pessoa que, embora totalmente dedicada à defesa dos
sentados em defesa do seu ir-mão, e de quem, entretanto, não mais tive a menor seuS direitos, não comunga nos mesmos ideais.
É poss(vel que tendo passado por incrI'veis sofrimentos, e vendo-se cercado
not{cia _desde que daqui se retirou.
somente de policiais, que o tratam como um ente desprezível, ele se tenha deixado
Acredito que o Sr. David Levinson te-Ia·á posto a par dos esforços gigan- tomar_ de ódio por tudo aquilo que lhe traga ao espírito a lembrança desta ordem
tescoS que empreendi para tornàr possível uma visita dele ao seu irmão. social que reduz os seres humanos à condição de criatura irracional, como está
Devo" outrossim, informar-lhe, minha Sra. de que o seu irmão não confia sucedendo com el~.
na minha lealdade, e no meu desinteresse. Completamente segregado de tudo, Quaisquer que sejam as vicissitUdes que o procedimento do seu irmão me
sem ter a mais leve comunicação com o mundo exterior, ele não cessa de me ocasio,ne, quero dar"i:l Sra. uma' certeza: nada disso tem arrefecido o meu'ânimo,
crivar de ironias sempre que procuro com ele me avistar, pois diz não poder com- ou feito com que eu, não dê ao caso dele toda a solicitude da minha energia e da
preender que' um advogado se interesse por quem quer que seja sem a menor minha capacidade. Continuarei a empregar todos os recursos ao meu ~Icance para
remuneração, como vem acontece-ndo comigo. Inutilmente lhe tenho explicado minorar-lhe os sofrimentos, e ajudá-lo nesta grave edelicada conjuntura. É que,
que, no -Brasil, é questão de honra para um advogado reservar uma parte da sua minha Sra., estou agindo não para angariar a gratidão dele, ou merecer os ,louvores
atividade para trabalhar pelos pobres ou pelos desamparados. Ele continua a duvi· dos'seus partidários. Estas coisas não me interessam. O que me esti.mula é tão
dar da minha sinceridade. só a preocupação de cumprir serena e firmemente o meu dever. Cristão, antes
Não me utilizei dos recursos-postos à minha disposição pelo Solicitar P.R. de tudo, me esforco por cultuar e cultivar, sem desfalecimentos, a justiça sobe-o
Kimber, conforme carta que me dirigiu, porque não tenho necessidade, para os rana. Em nome dos seus imperativos é que me'venho conduzindo em todo este
atos do processo, de fazer a menor despesa. Os advogados ex·officio, indicados caso, animado da superior ambição de ver os direitos de seu irmão devidamente
pela Ordem. como é a minha hipótese, têm o direito de pleitear que sejam gra- reconhecidos pela administração do meu país.
tuitos todos os atos processuais. Julgando ter-lhe fornecido, com a minha habitual franqueza, os esclareci-
mentos de que estava necessitada, continuo, como sempre, ao seu inteiro dispor.
Tal dinheiro, entretanto, seria de grande necessidade para dotar o seu ir- Se enxergar nos meus préstimos qualquer poss(vel utilidade quer- para a Sra.,
mão de roupa, de objetos de seu uso pessoal, e de uma melhor alimentação. Mas, quer para o seu irmão,'estou inteiramente às suas ordens.
dada a intransigência. da administração federal em continuar a privar Arthur Ewert Receba, com as minhas homenagens, o testemunho do meu apreço.
de qualquer auxílio exterior, qualquer importância que eu mandasse buscar fica-
ria inaplicada nas minhas mãos, como está acontecendo com os 30:000$000 Sobral Pinto
apreendidos pela polícia desta capital em poder do seu irmão, e que se acham
atualmente recolhidos à Tesouraria daquela repartição.
Todas estas coisas eu as levo ao conhecimento de seu irmão, que em nada
acredita, tal é a sua desconfiança. A própria carta da Sra. ele não a quis levar a
sério, dizendo que está separado da Sra. há mais de seis anos. E como eu lhe
perguntasse se não conhecia a sua letra, replicouMme que, dada a longa separação,
não se recordava b-em dos exatos caracteres da sua letra.

109
108
;.
Não desconhece, outrossim, o pesar com que V. Exa., na presença do re- ~
presentante autorizado da DEFESA. ordenou fossem abafados os clamores que (~
(:~
Luiz Carlos Prestes dirigia ao seu defensor ex-officio que comparecera ao Quartel
da Pal(eia Especial exatamente para os recolher.
Nada disto interessa, Sr. Comandante. N§o estão aqui em jogo as nossas (
pessoas, ou os nossos sentimentos privados. Lamentáveis acontecimentos como o
de ontem têm significação muito mais alta. O que eles indicam, transpondo as
(~
REQUERIMENTO DE SOBRAL PINTO A RAUL MACHADO, nossas pequenas individualidades, é que-o próprio governo não chega a perceber
DE 5,5.37. que está a destruir com as suas próprias mãos a estrutura jur(dica ·sobre que
assenta a sua autoridade~·
Modesto obreiro do reinado do Direito no ·seio da sociedade brasileira, o
Suplicante, que simboliza, nesta hora grave as prerrogativas da DEFESA, austera
e digna, vem manifestar a V. Exa., com a devida vênia, a'sua desaprovação a tudo.
Exmo. Sr. Dr. Raul Machado Juiz do Tribunal de Segurança Nacional
quanta se vem fazendo para impedir o livre entendimento entre o acusado Luiz
Cados PreStes e o seU defensor ex-officio, não obstante as ordens formais em con.
HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, vem trazer ao conhecimento trário do M.M. Juiz Dr. Raul Machado.
de V. Exa. a lamentável cena que, como defensorex·officio_de Luiz Carles Prestes, C.omunicando a V. Exa., com a sua costumeira lealda~e, que nesta data se
teve de assi~ir, humilhada e impotente, no Gabinete da Comandante da Pol(cia dirige ao mencionado Juiz nos termes da petição que vai junta por cópia, re· (
Especial. quer e Suplicante que se digne V. Exã. de encaminhar a presente aes seus
ilustres superieres hierárquicos, para que se sirvam de erdenar sejam revogadas
(
No desempenho da sua árdua missão, o Suplicante se dirigiu ontem dO (I.,
Quartel da Polreia Especial para fazer entrega a este seU cliente de documentos as ordens que vêm impedindo o. livre entendimento. entre o acusado Luiz Carlos
que interessam vivatnente quer ~ sua condição de processado perante este Tribunal
Prestes e e seu defensor ex·officio. :1
(
de Segurança Nacional, quer aos seus sentimentos filiais. I..
Nestes termos, (
Mal se viu na presença do Suplicante" Luiz Carlos Prestes, declarou-lhe de- P. Deferimento.
ver ponderar-lhe, com lealdade, que a petição entregue a V. Exa. pelo mesmo Su- (
plicante para justificar a não apresentação de Alegações Finais não traduzia nas Distrito Federal, 5 de maio Cle 1937.
suas páginas primeira, segunda e terceira, os reais motivos por que este se recu- (li'
sara a se defender. Queria salientar esta circunstlincia, para que lhe fosse permiti- a) Heráclito Fontoura Sobral Pinto ('('
do, de futuro, dizer, sem contradição de sua parte, ao povo brasileiro, quais as Advogado ex-officio ~-
causas reais do seu silêncio, neste momento. 'li
( .
Por outro lado, acrescentou que esperava que o Suplicante compreendesse, '''!
com elevação e superioridade, este seu procedimento, e não entrasse a julgar que (
ele, Luiz Carlos Prestes, punha em dúvida a lealdade e a correção com que o
(
mesmo Suplicante se esforçara por penetrar os verdadeiros sentimentos do seu
cliente e vexatórias, que chegam até ao extremo' de não lhe permitirem nem ao (
menos o livre entendimento, para efeitos de defesa, com o advogado que lhe foi
dado pelo próprio Tribunal de Segurança Nacional, depois de escrupulosa indica-
ção do Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil? "
"- -I'
I,
Não ignora o Suplicante que V. Exa. está cumprindo ordens severas e ri- \
gorosas.
\.
111 \,~,l:
110
\...
l..
(
minuciosa declaração, que pedia fosse lida com especial atenção.
Ao fazer entrega deste escrito ao Suplicante foi Luiz Carlos Prestes adverti-
do pelo Comandante de Palreia Especial, - que seguia a palestra de ambos, na
companhia do Chefe do dia -, que tal escrito só poderia ir ter às mãos do Supli-
cante depois de previamente censurado pelo Sr. Chefe de Pol(cia.
Não se conformou, Luiz Carlos Prestes, como era natural, com esta d.ecisão.
Tomando das mãos do Suplicante a r~ferida declaração, passou, então, a ler os tre-
PROTESTO DE SOBRAL PINTO AO COMANDANTE DA POLfCIA chos dela que reputava principais, alegando que ao menos o uso da palavra não
ESPECIAL, DE 5.5.37. lhe seria cassado.
Teve, assim, o Suplicante a oportunidade de ouvir Luiz Carlos Prestes
afirmar, em resumo, que não se defendera, porque:
19 -desprezando dispositivo claro da Constituição, fora instituído pelo
Poder Público nacional, um tribunal de exceção para julgá-lo;
29 - a atitude de. V. Exa.r.quando o foi qualificar, fizera·o firmar na con-
Exmo. Sr. Comandante da Polfcia Especial
vicção de que inútil seria qualquer defesa. Com efeito, como perguntasse a V. Exa.
HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, vem como advogado ex- se a Constituição de 16 de julho de 1934 ainda estavi,i em vigor, V. Exa.lhe retru-
otficio de Luiz Carlos Prestes, renovar agora por escrito, perante V. Exa. o seu cara imed.iatamente: "Está, apesar de terem·querido destruir ... ".
protesto sereno contra o desrespeito que foi cometido ontem, neste Quartel de Po- Esta resposta, dada a um acusado quando o processo mal se iniciava, e a
Hcia Especial, contra os direitos da defesa soberana e Independente deste acusado. voz da defesa ainda não se fizera ouvir, para rebater.a palavra injuriosa da acusa-
Cultor intransigente do Direito, servidor incondicional da Justiça, respeita-o ção, dera-lhe a impressão de que V. Exa.já firmara o seu ju(zo definitivo;
dor consciente da Autoridade, o" Suplicante não pode, não quer, e não deve san- 39 - os dispositivos daLeique instituiu o Tri~unal de Segurança Nacional,
cionar com o seu silêncio atos como os de ontem, que, praticados na presença do uma vez lidos por ele acusado, acabaram por mostrar a inutilidade de qualquer es-
mesmo Suplicante, implicam Qravame, de rara e excepcional intensidade, a todos forço. Realmente, a supressão ,de toda e qualquer publicidade; o direito de afastar
estes institutos que servem de fundamento à própria estabilidade social~ dos· atos da instrução criminal um ou todos os acusados; exigüidade manifesta do
Pouco importa que Luiz Carlos Prestes houvesse utilizado de expressões al- prazo concedido para a apresentação da defesa prévia a réus, que, como ele Luiz
tamente injuriosas às autoridades do país. V. Exa., como detentor de uma parcela Carlos Prestes, foram mantidos dentro de incomunicabilidade a mais rigoro.sa; a
do Poder Público, deve compreender quão justificável é a exaltação deste preso proibição prática a ele Luiz Carlos Prestes de interrogar as testemunhas de acusa-
pol(tico que está confiado à guarda dI" V. Exa. ção e de arrolar testemunhas de defesa; o sigilo rigoroso, através da censura à im-
Se não foi possfvel a V. Exa. ouvir, com superior tranqüilidade, as injúrias prensa, em torno dos debates travados no seio do processo; tudo isto era de mol-
que estavam sendo assacadas por Luiz Carlos Prestes a todos os agentes do Poper de a convencê-lo de que não existia nenhuma franquia para a defesa, sendo-lhe,
Público brasileiro, como poderá exigir que este preso político conserve a sua sereni- assim, impossível mostrar que o dinheiro utilizado nas suas campanhas pai {ticas .
dade quando se vê reduzido pelo vencedor às condições mais humilhantes. Natu- não veio do tesouro de nações estrangeiras, e que não havia, nos seus propósitos,
ralmente, partindo do pressuposto das convicções marxistas dele Lui? Carlos Pres- nada que pudesse ser considerado como contrário aos verdadeiros interesses do
tes, o Suplicante alinhara razões teóricas capazes de justificarem a sua insubmissão povo brasileiro.
às ordens do Tribunal de Segurança Nacional. Tanto mais justificável era, para ele, No ambiente de constrangimento em que era procedida tal leitura, no cur-
o procedimento do Suplicante quanto não puderam amuos se entender livremen- so da qual repontavam, aqui e ali, expressões causticantes contra as autoridades do
te" em virtude de estar sempre presente às suas entrevistas um agente do Poder PÚ- País, foi, se a memória não lhe traiu, o que o Suplicante pôde reter.
blico, que lhes acompanhava. com atenção cuidada, tôdo o desenrolar da conversa- Decorridos, assim, uns dez minutos·, no máximo, dessa leitura, o Coman-
ção. dante da Polfcia Especial declarou a Lui~ Carlos Prestes que não podia permitir
Para fixar todos estes pontos e focalizar as razões v.erdadeiras que o leva- que ele prosseguisse, e exigia-lhe que fizesse entrega daquele escrito, para efeito de
ram a não se defender, redigira, para o só conhecimento do Suplicante, longa e remessa ao Gabinete do Chefe de Polfcia.

113
112
;.
Retrucando, disse Luiz Carlos Prestes, - nisto secundado pelo Suplican~ sendo movido, o Suplicante jogaria para longe de si o exercício das funções de ~

~
te -, qUE:: aquilo era um documento seu, e, uma vez que ele o não podia ler nem Procurlidor Criminal da República, que não pediu. que não pleiteou, mas a que
mesmo ao seu advogado ex-officin assistia-lhe o direito de o destruir. Passando, deu o melhor da sua inteligência, da sua cultura, dÇ) seu esforço, da sua indepen-
imediatamente da palavra à ação, entrou a rasgar as tiras de papel que tinha nas dência, e da sua dignidade.
mãos. O Comandante da PolI'eia Especial ouviu, atento, estas palavras ditas em
Sem a perda de um segundo, o Chefe do dia, - logo auxitiado por várias tom cortês, calmo, e sereno.
I,
,~
praças da Pol(cia Especial que se achavam de guarda, no corr~dor que dá acesso Em resposta declarou, entretanto, que era de seu dever ponderar que esta-
ao Gabinete do Comando -, lançou-se sobre Luiz Carlos Prestes, para subjugá-lo, va cumprindo ordens, não podendo, todavia, tolerar que Luiz Carlos Prestes inju-
e arrancar-lhe das mãos crispadas todos aqueles pedaços de tiras dilaceradas. riasse, como vinha fa~endo com aquela leitura, não só todas as autoridades do
Um minuto, se tanto, durou a luta desigual. Reduzido à impotência, Luiz País, mas, de modo particular, a corporação a que ele comandava. De modo algum
Carlos Prestes viu-se lhe tirarem das mãos aquelas tiras que escrevera para o seu permitiria a quem quer que fosse, e muito menos a um preso, usar rela~ivamente
advogado, sendo conduzido, totalmente subjugado, para o isolamento do quarto, aos membros da Pol(cia Especial as palavras que ele, Luiz Carlos Prestes, emprega-
que lhe serve de prisão. ra na própria presença do Suplicante.
Enquanto aqueles pedaços de papAI eram colocados sobre a mesa do Co- Nesta altura, o Suplicante recordou, com a franqueza que Ih~ é habitual,
mandante da Polícia Especial, que ordenava, no mesmo momento, fossem eles cui- ao Comandante da PolI'cia Especial, o tratamento desumano que verri sendo aplica-
dadosamente colados, e, em seguida, assim reconstituídos, encaminhados ao Gabi- ,j!
do a este acusado. Relembrou-Ihe o episódio ridículo da peregrinação, até agora
nete do Chefe de Polícia, o Suplicante, com a tranqüilidade serena de quem está a inútil, do mesmo Suplicante pelos Tribunais e repartições da' República, que têm
(
cumprir dever indeclinável, fazia sentir ao Comandante da Polícia Especial a gravi-
dade de semelhante cena; Naquele instante, cônscio das suas responsabilidades,
jurisdição sobre Luiz Carlos Prestes, para poder entregar-lhe camisas, cuecas, pija- C
. mas, sabonetes, e outros objetos que tais, que a solicitude materna' de D. Leocá-
cumpria-lhe declarar que tudo aquilo estava errado, profundamente errado, funes- (
dia Prestes enviara para acudir às necessidades físicas mais imediatas do seu filho.
tamente errado. Era uma sementeira de ódio que se espalharia, mais cedo ou mais Aí fica, M.M. Juiz, a exposição fidelíssima, mas resumida, do lamentável e (
tarde, por todo o país. triste acontecimento que o Suplicante, agoniado, teve de assistir de braços cruza- (
Tanto mais sombrio era semelhante ep'lsódio quanto ele só se tornara pos- dos. Cumprindo o seu dever penoso dirigiu ao Sr. Comandante da Policia Espe-
sível em virtude do desrespeito sistemátiCo às ordens anteriores de V. Exa. Fosse cialo protesto que vai junto, por cópia, para conhecimento de V. Exa. (
livre o entendimento entre o acusado e seu defensor ~x-cfficio, como V. Exa.já Superior às disputas dos partidos, alheio aos interesses subalternos do Po~
determinara, e tal cena não teria tido a oportunidade de surgir ante o olhar estarre- ~
der, e todo entregue ao só cumprimento austero da sua profissão de advogado,
cido da DEFESA, que o Suplicante simbolizava naquela' hora. o Suplicante põe nas mãos de V. Exa.o destino da DEFESA livre e independente. (
Porque semelhantes atitudes? O Suplicante exerceu, outl !)ra, e num mo- O que cabia ao Suplicante fazer está feito. A Justiça, anciada e inquieta, (
mento bem mais conturbado que o atual, as delicadas funções de Procurador Cri- espera agora qqe V. Exa.saiba cumprir também aquilo que, como Juiz,.a consciên-
minal da República. Promoveu processos políticos da mais alta repercussão. Fez (
cia lhe ditar que é de seu dever fazer nesta dura emergência.
sentar, também, no banco dos réus, pol(ticos de projeção nacional. Conhece, por-
Requerendo a junção da presente aos respectivos autos, (
tanto, melhor do que ninguém, até onde podem ir as necessidades da repressão. li
Por maiores que elas sejam, entretanto, não são de molde a justificar o que vira e (-I',
presenci~ra. Por isto, como Procurador Criminal da República, timbrou em tornar "
P. Deferimento. C
livre e independente a defesa dos acusados. , 'I
A todos, grandes e pequenos, ricos e pobres, poderosos e desprotegidOS, C,
Distrito Federal, 5 de maio de 1937.
fez assegurar, em toda a sua plenitude, o direito da defesa ampla, livre, e soberana.
Se o Governo a que servia, com dedicação mas com independência, ousasse
a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto ("
praticar contrq um acusado sujeito à jurisdição judicial o menor desrespeito aos
direitos da defesa e quisesse conservá-lo em incomunicabilidade rigorosa idêntica Advogado ex-officio
. à em que vem sendo mantido Luiz Carlos Prestes em face do processo que lhe está
(
114 115 {vr:'

l
l ..
(

V. Exa., presumo que a atitude de Luiz Carlos Prestes foi determinada, - no que
diz respeito d sua proibição de oferecer defesa -, pela falta de confiança no mo-
desto advogado que o Conselho da Ordem indicara para seu patrono ex-officio.
Esperando poder ser mais minucioso no próximo correio aéreo, afirmo-lhe,
Exma. Sra., continuar sempre .pronto a atender a tudo quanto for de seu agrado
solicitar-me, e que esteja dentro das minhas possibilidades_
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÃDIA PRESTES Com estima e alto apreço,

Rio de Janeiro, 8 de maio de 1937. Sobral Pinto

Exma. Sra.
D. Leocddia Prestes.

Em nieu poder as suas cartas de 7, 10, 24, 28, e 30 de abril p_ findo.


Parece-me desnecessário dizer-lhe que tomei todas as providências que me
solicitou. Tal como eu esperava, entretanto, nada obtive, nem mesmo a reunião
aos autos, antes da sessão do julgamento, da carta que V. Exa. me enviou para
que conseguisse fazê-Ia ler por ocasi1l0 da referida se ..1Io.
As roupas que enviou continuam, Exma. Sra., no meu escritório. Não con-
segui, ainda, licença para entregá-Ias.
Como V. Exa .. já terá sido informada, certamente, na madrugada de hoje
foi conhecido o resultado do julgamento de. seu filho: condenação a 16 anos e8
meses de prisão. Não conheço, ainda, os termos do acórdão. É que não quis cam-
parecer ao Tribunal senão depois de terminados OS trabalhos, e tâ'o só com o ob·
jetivo de ser informado acerca das penas impostas. Medidas vexatórias e desaten-
ciosas decretadas pelo Sr. Barros Barreto a respeito do ingresso dos advogados no
edif(cio do Tribunal, por ocasião da sessão do julgamento, ·Ievaram-me a não coM-
parecer a este ato a fim de me não submeter àquelas medidas.
Os jornais desta manhã nlo publicam, infelizmente, o teor da decisão,
sendo-me, assim, imposs(vel dar a V. Exa. conhecimento de semelhante peça.
Todavia, prometo que remeterei a V. Exa. pelo avião de quinta-feira próxima, a
(ntegra da sentença que tanto deve de agoniar o seu coração materno.
Já obtive de seu filho a necessária autorIzação para interpor o recurso ca-
brvel para o Supremo Tribunal Militar. Diante do que se vem passando nos últimos
entendimentos meus com o seu filho, e que contrasta de maneira tão radical-e ab-
sol uta com o que ocorrera nas nossas primeiras entrevistas, anteriores âs cartas de
,
I~

116
fi';'
(~

.~
por toda a parte, a morte vai estendendo, implacavelmente inexorável, o império (
I"
~~
da sua obra malfazeja.
Não me admira, pois, que os SeuS clamores dirigidos aos Juízes do Tribunal
de Segurança Nacional" não tenham sido sequer a~mitidos como dignos de entrar
no ventre do processo. A sua carta de 24 de abril, endereçada a mim e aos Srs. (~
Juízes do Tribunal de Segurança Nacional, foi por mim encaminhada ao aludido (~.

CARTA DE SOBRAL PINTO À LEOCÁDIA PRESTES. Tribunal, no dia 29 do mês- p.findo, nos termos da petição cuja cópia ora envio
a V. Exa.
(\1
Pois bem, o Presidente Barros Barreto proferiu nessa petição o seguinte f
Rio de Janeiro, 12 do maio de 1937; (
despacho: "Nada há que deferir, pois, já tendo expedido as instruções devidas, es-
capa à competência deste Tribunal determinar providências relativas ao regime
(I'

Exma. Sra.
disciplinar do presídio". (r
Julguei, por isto inútil apresentar ao mesmo Tribunal a sua carta de 30 de
D. Leocádia Prestes. (I
abril. Não. permitindo o Regimento do Tribunal que a Defesa se fizesse ouvir na
Obtive ontem, finalmente, autorização do Sr. Chefe. de Polícia para entre- sessão de julgamento, ~u iria sujeitar a novo indeferimento o pedido, que V. Exa. (
gar a Seu filho os objetos que me remeteu para tal fim. Hoje, se Deus quiser, irei me fazia, de efetuar a leitura dessa carta por ocasião da aludida sessão.
Para onde iremos, Exma. Sra.? Só Deus pode. descortinar o futuro e os (
até à Polícia Especial, para, na presença do Comandante dessa Força, passar às
mãos de Luiz Carlos Prestes as roupas e objetos de uso de que ele estava realmente destinos da raça humana. Apenas pressinto, através destes exemplos de maldade (
necessitado. consciente, que teremos de atravessar horas bem amargas, iguais a estas que
Parece incrível que a supressão das liberdades tenha atingido, no Brasil, a V. Exa. já está sofrendo, e continuará a sofrer ao ler o acórdão do Tribunal de Se- <,l'
tais extremos que um advogado precise fazer as peregrinações a que tive de me en- gurança Nacional, que remeto, com a presente. O "JORNAL DO COMÉRCIO" (
tregar para conseguir dar a um preso poll'tico algumas roupas que a sua velha mãe, _ publica, hoje, na (ntegra esta peça judiciária. Para que V. Exa. tome de tudo co- ( "~
também exilada, lhe mandara de longes terras. nhecimento, eu me permito enviar-lhe essa decisão tal qual este órgão carioca
Quando lanço a minha vista inquieta sobre o vasto panorama do mundo a estampou. (
moderno, sinto que o coração me a"perta por ver a sementeira de ódio e de destrui· Aproveitando a oportunidade mando-lhe, também, Exma. Sra., uma carta
ção que o esp(rito de injustiça sistematizada vai estendendo sobre toda a vasta su- do Dr. Eugênio Carvalho do Nascimento, advogado indicado pelo Conselho Militar <.
perfície da terra. para defender seú filho no processo de deserção, que lhe está sendo movido. ('
A própria melhoria da condição material dos trabalhadores não foi alcan· Poderá V. Exa. enviar diretamente ao Dr. Nascimento, para os endereços (
çada, no seio da sociedade atual, pela só força da razão atuando sobre a vontade que ele indica, os elementos que solicita. Ou, se achar preferível remetê-los a mim,
dos governantes. Esta melhoria nâ'o é o produto do esf~rço dos homens de boa que me incumbirei de fazê-los chegar, imediatamente, às mãos deste meu colega. ('
vontade. Não, ela foi obtida através de lutas fratricidas, que ensoparam de precio- Uma palavra, ainda. Vou interpor para o Supremo Tribunal Militar' ore· ( .
síssimo sangue humano terras que deveriam Ser rega das apenas pelas águas vindas curso de apelação contra a decisão do Tribunal de Segurança Nacional. Entre ou-
tras alegações, sustentarei que o" acórdão está errado quando ordenou a acumula- (
do Céu, e pelo suor dignificador do rosto do homem de trabalho.
Tudo, Exma. Sra., nos dias de hoje, é luta e luta inclemente. Ninguém çá"o das penas impostas a Luiz Carlos Prestes. (
mais se entende, pois vivemos numa verdadeira torre de Babel. Nem mesmo a uni- Futuramente, pretendo enviar a V. Exa. cópia integral de todos os traba-
dade de doutrina, e a identidade da Fé são capazes de aproximar os corações, e lhos que, como advogado ex-officio tive a oportunidade de apresentar em favor de \
desarmar o braço homicida. Na Rússia, os marxistas, que manejam o poder, fu- seu filho quer ãs autoridades judiciais, quer às administrativas do nosso paes.
<-
zilam os velhos companheiros de lutas que ousam divergir da orientação da pol(- Continuando, como sempre, ao Seu inteiro dispor, assino-me, re.speitosa-
mente. \.
tica oficial. Na Espanha, os católicos que colaboram com o governo matam os ir- Sobral Pinto
mãos de Fé que se uniram aos rebeldes que guerreiam esse governo" E, assim,
\.
111>
119 ~
(

~
r-
Receio, nestas condições, que as minhas cartas tenham sido, ar, vertidas
~

com infidelidade ou para o inglês ou para o alemão. Para evitar semelhante~ in-
~ convenientes seria bom que a Sra. se pusesse em contato com pessoa da colônia
brasileira ou da colônia portuguesa a( de Londres, servindo·se dos préstimos de
uma delas para as traduções. _
Com as minhas homenagens; sempre ao seu dispor.

CARTA DE SOBRAL PINTO A MINNA EWERT. Sobral Pinto

Rio de Janeiro, 20 de maio de 1937.

Exma.Sra.
D, Minna Ewert.

Respondo à sua carta de 14 do corrente, que recebi ontem.


Envio-lhe,. por via aérea e por via mar(tima, a presente, acompanhada da
cópia da carta de 27 de abril.
Peço-lhe, outrossim, que me informe se recebeu a carta que lhe dirigi, por
via aérea, no dia 12 do corrente, acompanhada do inteiro teor do acórdão do Tri-
bunal de Segurança Nacional onde foi proferida a condenação de seu irmão éi pena
de prisão de 13 anos e 4 meses.
Não tenho estado, ultimamente, com Arthur Ewert, ou Harry Berger,
porque ele -passou a acolher as minhas visitas com gestos de profundo desprezo, e
olhares inundados de ódio e de injúria. Acho que é de meu dever poupar-lhe
mais este vexame, pois, não confiando na lealdade da minha assistência, ele me
toma como um espião.
Para amparar-lhe os direitos, no que se refere éi melhoria do seu tratamento
na prisão, não necessito de estar em contato com ele. Na minha qualidade de ad-
vogado posso me apresentar perante os tribunais do pars e os órgãos da adminis-
tração pública para pleitear tudo quanto tenho pleiteada para tirá·lo da situação
humilhante de desconforto e de privações f(sicas em que se encontra presentemen·
te. Assim, vou fazendo tudo o que posso em benef(cio do seu irmão, sem me ver
na "necessidade de concorrer, com as minhas visitas que lhe são sempre desagradá-
veis, para aumentar os seus inauditos sofrimentos morais.
Acharia conveniente" que a ·Sra. trotixe"sse, para apresentar ao seu irmão,
uma carta autografada pela Sra. dele, única pessoa por quem ele se interessa viva
e incessantemente.
A sua carta de 14 do corrente está mal traduzida. Nela há um per(odo que,
em português, não há sentido. Vou transcrever tal perrodo: "Pode ser que um
cura visitá-lo e r.emete a ele minhas saudades?".

120 121
r-
\J~
Todo mundo, porém, cruzou os braços diante deste espetáculo tétrico,
que ainda agora perdura. E, assim, enquanto as autoridades judiciárias e adminis- (,.
trativas ficam mudas e quedas, Harry Berger sofre, intrépido e corajoso, o seu
(~
'r'"
mardrio sem fim. Sepultado vivo na escuridão de um socavão de escada, sem luz, IÇJ
sem ar. sem movimentos, caminha lentamente para a morte inevitável. Sem cama, (,
sem cadeira, sem banco, sem roupa, este acusado vem sendo mantido, há mais de ('.:4
ano, na mais absoluta solidão. Não fala com ninguém, nem lhe deixam ler nada. E
(i
PELO APELANTE, ARTHUR ERNEST EWERTou HARRY BERGER as poucas vezes em que pôde se defrontar com o seu advogado ex·officio; presente
:i:
(em 24.5.37) a estes entendimentos estava sempre um agente do Poder Público, incumbido de ('i
fiscalizar e censurar a conversa entre patrono f;! cliente.
E como se. todas estas torturas não parecessem ainda suficientes, resolve- (
~,I

ram fornecer a este preso infeliz apenas o café da manhã e a refeição a que damos (

o nome de "almoço".
Organizou a poll'cia, durante doze longos meses, o seu inquérito; ofereceu
o Ministério Público, logo a seguir, a sua denúncia; abriu-se, imediatamente
~:.,
il'
Acudindo ao apelo do Conselho da Ordem para defender Harry Berger pe· após, o prazo da instrução criminal; veio, finalmente, a sentença de condenação. ;,
(
rante o Tribunal de Segurança Nacional, advertimos, inicialmente, que o que se Durante·todo este tempo, isto é, dezoito meses, Harry Berger não viu uma peça do
instaurava ".ão era só o julgamento de um homem, mas também o da causa que processo, não examinou um só documento, não se defrontou com uma só teste- (
ele simbolizava. Com a consciência de quem vem acompanhando, com espírito de munha, e não teve nem mesmo a oportunidade de conhecer quatro· dos seus cinco
verdade e justiça, o desenvolvimento desta causa no seio das nações cultas, mostra·
C
Ju(zesl
mos, - escudados na autoridade dos competentes -, que era indispensável que as Horrorizados coni esta desumanidade sistematizada, dirigimos; em 29 de (
reivindicações justas e irrecusáveis, que deram origem ao movimento proletário abril p. findo, ao Dr. Juiz Preparador do processo mais uma petição solicitando (
contemporâneo, fossem levadas em conta pelos Srs. Juízes do Tribunal Especial imedi.atas providências capazes de porem cobro a estas torturas inexplicáveis e
quando tivessem de examinar a atuação de Harry Berger nos lutuosds aconteci- inúteis. Foi tudo em vão, como demonstra o original dessa petição, - com o seu (
mentos ocorridos no país em novembro de 1935. Assim agindo, não incidiriamos despacho de indeferimento -, que instrUI, agora, as presentes Razões. ( '"
Srs. Ju (zes no grave e funesto erro de considerar como mera ambição pessoal de Para que semelhante procedimento? Os pioneiros do comunismo interna- ( \1
um estrangeiro impertinente aquilo que, na realidade, tem muito de desinteresse cional não se deixam abater por estes exemplos de martírio cruciante. Fatos desta
pessoal e de superior dedicação aos direitos, sempre tão menosprezados, das clas- natureza só servem para gerar ódios cada vez mais irredutíveis. Longe de fazer re- (,
ses trabalhadoras. cuar os adeptos do comunismo, uma repressão abusiva e ilegal como est~ de que ~:
Não fomos ouvidos. E, ao chegar agora ao termo deste processo, o dever
nos obriga a altear, ainda mais, a nossa voz impotente, para dizer que nos engana-
·vem sendo vítima Harry Berger, desperta neles o sentimento. incoerc(ve.1 da vingan-
ça, que se lhes apresenta ao espírito como imperativo de um dever de justiça a ;' ~
mos totalmente quando supunhamos que iríamos presenciar um julgamento. O cumprir inexoravelmente. C",j
que temos assistido, para deslustre da nossa civilização, tem sido tão só o esmaga- Porque, outrossim, enveredar o noSSO Poder Público por este caminho que
mento brutal, desuman~, e revoltante de uma criatura humana. lhe amesquinha, ante os homens de coração bem formado, a autoridade moral? ( il I,
j
Não houve nada neste processo que se pareça, ainda que longinquamente, Será porque Harry Berger é estrangeiro? Mas, por ser alguém estrangeirç (\
com o que, no seio das nações civilizadas, se chama o direito de defesa. Nestes
quatro longos meses de lutas estéreis, fomos apenas o espectador manietado de
perdeu o direito de ser considerado criatúra racional? Não inscrevemos nós na
Constituição de 16 de julho de 1934 (art. 113,1 ), o postulado de que todos são
li
( ,
crueldades indescritl'veis, que mareiam, para sempre, o renome da nossa Justiça.
iguais perante a lei não havendo privilégios, nem distinções, por motivo de nasci-
Estão nos autos os nossos clamores. Nos autos estão,também, as provas da mento, sexo, raca, profissões próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças l
inércia dos que tinham a obrigação de tomar as mais enérgicas providências. religiosas ou idéias po!(ticas? \
122 123 \

\ _.

"
Funesta e sombria é esta nova civilização, sobretudo pela negação de Jesus
Ao proclamarmos este princ(pio não sofremos o influxo de um postulado Cristo, que se viu totalmente repelido das bases fundamentais do noVo edif(cio so-
romano. Sujeitamo-nos, ao contrário, às lições da experiência racional. Pois, no
cial comunista?
dizer de Ihering ( L'ESPRIT DE DROIT ROMAIN - trad. de O. de Meulenaere, Tenhamos, então, a coragem de confessar que grande parte das atrocidades
vai. 19, pág. 6 ), " a vida dos povos não é uma coexistência de seres isolados: co- que hoje se praticam, no seio das nações modernas, decorre da apostasia prática de
mo a dos indiv(duos no Estado, ela constitui uma comunidade; ela se traduz num
Jesus Cristo pelos próprios povos q\Je sé dizem cristãos.
sistema de contingência e de ação rec(proca, pac(fica e belicosa, de abandono e de 1:1
apreensão, de empréstimo e de préstimo; numa palavra, ela constitui uma gigantes- Na verdade, quem diz cristianismo diz, necessariamente , solidariedade II
ca troca, que abraça todas as faces da existência humana. A lei do mundo Hsico é humana tanto na ordem espiritual quanto na ordem material. Pela lei cristã, o lil
também a do mundo intelectual; a vida se compõe da admissão das coisas ext~rio­ fraco se torna forte, e.~ forte desce até à fraqueza do desprotegido. Ninguém fica '~

res e de sua apropriação (ntima; recepção e assimilação são duas funções funda- ao desamparo. Todos têm o com que prover as suas necessidades espirituais e ma-
teriais. A liberdade prótege a todos os membros da comunidade, e os menos favo·
1I
mentais de que a presença e o equil(brio são condições de existência e de vitalida- I,
de de todo organismo vivo. Por obstáculo à admissão das coisas exteriores, é ma- recidos pela fortuna dispõem de tudo quanto precisam não só para si, mas também it
tar. A expansão de dentro para fora não começa senão com o cadáver". para a manutenção e educação da sua prole.
Alargando, um pouco mais adiante, a sua visão panorâmica, o grande pen- Pois bem, este não é o panorama da vida social, nos tempos que correm. I:·
sador germânico acresoenta ( Ibid., págs. 6/7 ): "Todo povo existe também para os Voz insuspeita, Jean Rivain ( UN PROGRAMME DE RESTAURATlON SOCIA~
outros, e todos os outros povos têm o di~eito de estar em relação com eles. A lei LE, págs. 152/153 ) teve a coragem de proclamar: "A liberdade sem garantias do
II
da divisão do trabalho regula também a vida das nações. Todo solo não produz tu- trabalho e da propriedade, o livre jogo da especul.ação, consagram o direito dos
\
do, todo povo não pode tudo. É pelo auxnio e expansão rec(proca que se encon- mais fortes. O proletário é um desapossado, o proletariadO é um res(duo social, e a
í
tra equilibrada nos povos a imperfeição de cada um deles em particular. A perfei- sociedade trata de fabricar este resl'duo . Que vemos? A riqueza mobiliária cres-
ção não aparece senão no conjunto, na comunidade". cendo incessantemente, acumula-se entre as mãos de um pequeno número de capi-
Após percorrer vários dom(nios da atividade do homem, para fixar esta lei talistas. Em face desta oligarquia financeira e parasitária, um povo sem ligações
fatal e inexorável da interdependência das nações, Ihering conclui ( Ibid., págs. com o solo, e sem nenhuma profissão organizada, sem tradições e sem patrimônio, II,.
7/8 ): "0 comércio, ou numa ordem de idéias mais geral, a troca dos. bens mate- desenraizado, desclassificado, desapossado. Entre estes dois campos adversos, Um
riais e intelectuais, não é somente uma questão de interesse que depende da livre exército de pequenos proprietários que sobrevi eu à antiga ordem francesa, ma~ li
vontade dos povos, é um direito e um dever. Recusar cumprir este dever, é insur- que tende a diminuir; esta classe tampão fornece agentes, intermediários ao capita-
gir-se contra a ordem da natureza, é desobedecer at?s mandamentos da história. lismo, e alvos ao povo para os seus jogos de massacre".
Uma nação que se isola, não somente comete um crime contra si mesma, pois que Qual a conseqüência deste regime iníquo -e pecaminoso? O consagrado
ela se priva dos meios de aperfeiçoar a sua educação, mas ela se torna culpada de sociólogo francês teve o mérito de enxergar, com objetividade, aquilo que está ao
uma injustiça para com os outras povos. O isolamento é o crime capital dos povos, alcance de qualquer homem sereno 'e imparcial. Por isto, pôde dizer ( Ibid., pág.
pois a lei suprema da história é a comunidade. Um povo que repele a idéia do 153): " Destes fatos, que partem os laços de solidariedade na divisão do trabalho,
contato com uma civilização estrangeira, isto é, da educação pela história, tem, nasce a luta de classes. Os interesses dos co·produtores,em vez de concorrerem pa-
por este fato, perdidou direito de existir. O mundo tem direito à sua queda". ra o mesma fim, se opõem: e o capitalista tratado como explorador é o primeiro
Quer queiramos, quer não, a influência dos estrangeiros há de se exercer adversário. A Internacional dos trabalhadores é um fato de solidariedade que a es-
sobre a formação dos nossos costumes, das nossas idéias, e das nossas instituições. teS une na luta para a solução da questão operária. Privados em sua pátria de seus
Da mesma maneira, os povos, que n.... s são vizinhos, sofrem sem remédio o influxo direitos econômicos mais essenciais, ,eles esperam reconquistá-los, por meio do so·
da nossa atividade no seio da comunhão universal. cialismo internacional. Entre a solidariedade pol(tica, de que esqueceram oS bene-
Se esta é a lei, que rege a vida das nações, porque tratar como animal hi- freios, e a solidariedade econômica de um proletariado desapossado, esta" lhes
drófobo a um alemão, como Harry 8erger, que empolgado por uma ordem social parece facilmente a mais premente. A culpa cabe ao regime que quebrou OS laços
nova, que os russos criaram no Oriente da Europa, se transportou para o nosso ter- da unidade francesa; mas é um contra-senso condenar como anti patriotas pelo fa-
ritório, para, com a sua experiência de revolucionário internacional, auxiliar os to de defenderem a sociedade que lhes abre () caminho.
comunistas brasileiros na implantação aqui dessa mesma ordem social?
125
124
Para restituir as suas razões ao patriotismo, é preciso restabelecer um regi. tinto da justiça e desejar ser livre; para fazê-Ia triunfar cumpre apenas querer o seu
me econômico social, que coordene os esforços em vez de os opor, que una os ar. próprio bem, o seu próprio interesse, ou somente abandonar·se ao espírito de mu·
('
tífices de uma mesma produção em lugar de fazê· los se baterem, e que dê aos mais dança, de turbulência, e de revolta que trabalha incessantemente os povos, sobre~
(i,
pobres a parte de patrimônio que ·Ihes cabe". tudo quando eles não se sentem nem felizes, nem bem governados, nem for~emen·
Urge, assim, que o Poder Público brasileiro, pondo de lado, '" circunstância te contidos. Esta propaganda espontânea da Revolução Francesa se anuncia nesta ( :;
de ser estrangeiro Harry Berger, nele veja pelo menos a sua qualidade de ente ra. época em que se esboçam os primeiros desígnios da Política Revolucionária; uma
cional, merecedor, portanto, do tratamento próprio das criaturas humanas. e outra vão caminhar de par, sustentando-se e excitando·se mutuamente", (
Postergando todos os -seus direitos, torturando a sua pessoa, suprimindo as Atentando nestes aspectos da. revolução social, que perturba, hoje em dia, (l
prerrogativas da sua personalidade, as autoridades brasileiras não diminuem Harry a vida dos povos mais adiantados, é que se poderá restabelecer o equillbrio e a har· ( ,
Berger. Elas é que se diminuem, se amesquinham, e se barbarizam. mania da sociedade, por que não se_ tardará em verificar que o edifício social ne·
Não se iludam os nossos dirigentes. Harry Berger passará a ser, dentro em cessita de sofrer profl,mdas e radicais transformações. (
pouco, para o comunismo internacional, uma bandeira de combate. Não tardará No dia em .que os nossos dirigentes se orientarem no rumo de uma política
muito em que, no domínio das letras universais, surja um novo S,tefan Priacel de larga visão social, estarel1)os libertos de aberrações como as deste_ processo, on·
( AU NOM DE LA LOII ... , pág. 13 ) para dizer dele o que este publicista afir- de se pôs de lado tudo o que era cautela jurídica, precaução legal, e exigências de C. C1
mou do torturado comunista alemão:- "Thaelmann tornou-se o símbolo de uma
Alemanha que sofre e combate para que possam renascer um dia, nesse grande
justiça.
Tão fora da realidade social se colou o Tribunal de Segurança Nacional
(1
país, todas as liberdades conquistadas por séculos de luta: o direito de falar, de es. que não pôde perceber o absurdo imenso que praticou considerando como "delic· C
craver, de· pensar, o direito de reunião; liberdades aniquiladas pelo hitlerismo, di. tos autônomos" os que atribuiu a Harry Berger no seu acqrdão de 7 do corrente.
(
reitos· suprimidos. Eis, a tal respeito, o que reza o julgado:"O Tribunal, na aplicação das penalidades
•. ';1
Romain Rolland, definindo a personalidade de Ernest Thaelmann exprime impostas aos acusados Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger, ( ,
exatamente a emoção de_milhões de homens de bem, que, d'um extremo ao outro considerou "condições elementares" do delito capitulado no art, 10 da Lei nO (
38, os atos criminosos, de que cogita o art. 4Q da mesma Lei, desde que esses atos , L
do mundo, pois pensam na sua vida anleaçada e trabalham-para a sua libertação. .- Irl
Eu vos convido mu_i especialmente, diz Romain Rolland, a dirigir o nosso hajam sido cometidos pelos 'acusados até à deliberação do movimento sedicios~ de ( l
-novembro de 1935, considerando-se, porém, "delitos autônomos", por estarem as· .. ';
piedoso pensam;nto, a nossa saudação altiva e reconhecida ao mais ilustre destes l ,~,
combatentes encadeados, àquele sobre quem se abate, neste momento, toda. o apa. sim configurados na lei, quando a prática daqueles atos tiver ocorrido após a sufo· ,i·1
( -~!I
relho da justiça hitleriana, feita de violência e de mentira ... Nesta hora de união cação do referido movimento. Não julga o Tribunal trata~·se, no caso, de "crimes
mundial contra a guerra e o fascismo, Thaelmann é mais do que o valente chefe da continuados", de vez que, como é assente em jurisprudência e doutrina, a figura
jurídica do "delito continuado" só se verifica em direito quando, além da unidade
('i
classe operária da Alemanha, da vanguarda do nosso exército; ele é o símbolo vi. . li
vo da nossa causa, ele é a bandeira de todo o exército. Mais está ele ameaçado, da resolução criminosa, ocorre a infração, pelo mesmo agente, e por mais de uma ( I'0,
mais nos é ele sagrado •.. ". vez, do "mesmo artigo de lei penal". ( li
Não é exato que não podendo certos fatos serem considerados como integra· , ~
Nem poderá ser de outro modo. Há na revolução comunista um elemento
( 1"
que é universal, e que se aplica, assim, a todos os povos que já atingiram a um cer. dos na figura do "crime continuado", devam eles ser tidos, necessariamente, como " m'
to grau de desenvolvimento industriaL É que ela se propõe a resolver o problema outros tantos" crimes autônomos". (, IJ['!'
da produção e o da distribuição da riqueza produzida. Onde quer que esteja, pois,
o homem industrialmente aperfeiçoado aí estarão estes problemas fundamentais.
Labora o ac6rdãá, ora recorrido, em evidente equ ívoco quando sustenta
que os crimes são ou "autônomos" , ou "continuados", Esta afirmação supõe que q (
il!

!ij
Pode·se dizer, portanto, da revolução comunista aquilo que Sorel ( L'EU. estas duas categorias científicas abrangem, nos s,eus limitados quadros, todas as 'li
classes de crimes. - j~
ROPE ET LA RÉVOLUTION FRANÇAISE, vol. 29, pág. 109 )disse da grande
convulsão que abalou a Europa no fim do século XVIII:" A revolução de França Ora, modernamente, nenhum criminalista de certa notoriedade deixa de in· \'j1
tinha isto de particularmente temível: ela era compreensível para todos e imitável dicar uma terceira categoria de crime da mais alta importância para os efeitos de l
'- li
il
11
em cem lugares, a um tempo. Para compreendê·la não há mister senão de sentir os uma repressão penal justa e eqüitativa. Esta terceira categoria, ninguém há que ig- \.'1
'encargos do regime feudal; para a ela se associar não é necessário senão ter o ins. nore, é constituída pelo "crime permanente", A este respeito, doutrina Manzini
,
126
127 , i,
-

"~i
\
I,
(TRATTATO DI DIRITTO PENALE, vol. 10, pág. 565) : "O crime permanente aoS olhos de todos: o propósito que nunca a abandona de trabalhar, no seio da so~
não se confunde com o crime continuado. A noção deste é fornecida pelo art. 81, ciedade moderna, pela implantação de um governo proletário revolucionário. Mar~
preâmbulo, do Código Penal, -e a respectiva teoria será exposta no vaI. 20. Por xista até o cerne da sua alma rebelde, Harry Berger se considera mero instrumento
agora basta notar que, enquanto o crime permanente pressupõe uma atividade ou da " revolução proletariana, a revolução-órgão "( Ralea . L'IDÉE DE RÉVOLU·
uma inatividade separável que protrai no tempo o fato originário, o crime conti· TION DANS LES DOCTRINES SOCIALlSTES, 1'6g. 319 l. que "monopolizou li
nuado pressupõe várias violações da mesma disposição de lei, sucessivas ou con' para ela todas as simpatias dos trabalhadores, e tornou impossível qualquer outra
temporâneas , e, por conseqüência, uma' atividade ou inatividade separável, unifi~ forma de revolução. Ela teve um êxito incontestado durante quase toda a segunda ~:
cada, por ficção jur(dica, pelo elemento psicológico do mesmo desfgnio crimino- metade do século XI..X. Em torno dela se formou a internacional, e quase todas as í.j
!,I
so", organizações operárias" ( Ibid. ).
O que cabia, portanto, ao Tribunal de Segurança Nacional, no seu acórdão, ti:
A ação, assim-,·de Harry Berger, a que alude o acórdão recorrido, é uma_só, ,I
era estender um pouco mais a sua análise sobre as atitudes de Harry Berger, para embora .se tenha desenvolvido através de uma série inumerável de fatos distintos. 11
verificar se, não se enquadrando nas linhas definidoras do "crime continuado", Empolgado pelo seu ideal, unificava, através das suas contínuas solicitações, todos II
deveriam, entretanto, ser definidas como constituindo um só "crime permanên~ estes fatos, diversos e diferentes na ordem da sucessão do terr. po, mas. idênticos no ti
te". fim, que visavam alcançar. 1:1
i~J
Com efeito, "crimes permanentes, segundo a nossa noção, que foi integral~ a erro do acórdão recorrido está em querer encarar como iguais e idênti-
:'i
mente acolhida pelo vigente Código Penal, são todos aqueles relativamente aos caS a revolução burguesa e a revolução proletariana. n
!;.
quais, com eliminação da atividade positiva ou negativa que 05 constitui, n.ão so~ Nada mais diferente, entretanto, do que estes dois fenomênos sociais.
brevive nenhum efeito positivo direto, enquanto presupõem ali admitem, por isto 1\·
Procurando caracterizá·los com precisão, Staline ( LES QUESTIONS DU j~
mesmo, a existência de um estado subjetivo e objetivo identicamente contrário ao [,I
LENINISME, págs. 17/18, ed.franc. do Sureau d'Éditions ) expõe:" O problema ,"
Direito Penal em cada momento seu, iniciado por um fato (ação ou omissão), fundamental da revolução burguesa se reduz em se apoderar do poqer e em adap·
que por si só pode ser insuficiente ou suficiente para concretizar a noção de um tá~la à economia burguesa existente, enquanto que o-problema fundamental da re·
crime, mas que em todo o caso deve ser tal que permita o protaimento voluntá~ volução proletariana consiste, após a tomada do poder, em-edificar uma nova eco- ií
rio ininterrupto d'aquela oposição jur(dica, que é prevista pela lei na hipótese tlpi· nomia socialista. I·'I'
ca, e a possibilidade, por parte do sujeito, de fazê·la cessar por sua vontade de mo- :jl
A revolução burguesa termina ordinariamente com a tomada do poder, en·
do juridicamente eficaz". (Ibid., p6gs. 567/568). quanto que a tomada do poder não é senão o começo da revolução proletariana, ~i[;
Vê·se, portanto, que a característica por excelência do cdme permanente é que utiliza este poder como alavanca para a transformação da velha economia e
a existência de um estado contrário ao Direito Penal,que se prolonga por um lon~ para a organização da nova.
go período de tempo, mas sempre idêntico, na sua natureza, através da atuação ile~ A revolução burguesa se contenta em substituir no poder um grupo explo- l:!~'
~II.
gal de uma só vontade criminosa. rador por outro grupo explorador; eis porque, ela não tem necessidade de quebrar
Disto decorre, relativamente à consumação dos crimes desta espécie, uma o antigo mecanismo estadual, enquanto que a revolução proletarlana arrebata o
conseqüência da mais alta importância. Manzini não se esquece de focalizá~la, di~ poder de todos os grupos exploradores e o transmite ao chefe de todos os traba~
zendo: "Dada a noção do crime permanente, bem se compreende como a consu~ Ihadores explorados, à classe dos proletários, e, em seguimento, ela é obrigada a
~.
rn
mação dele se verifica, mas não se esgota, no momento em que se concretizam os quebrar a velha máquina do Estado para substituí-Ia por uma nova ". :n
elementos constitutivos do crime, e se realizam as condições de punibilidade do fa~ Tudo quanto sobre o território brasileiro Harry Berger executou, enquanto I,!~

~
to, do mesmo modo que ela. se protrai até a cessação da atividade (positiva ou gozou da sua liberdade, foi mera transposição para o domínio da ação prática da~
negativa) do delinqüente, isto é, até quando tenha cessado o estado considerado quilo que constitui o pensamento teórico da concepçãó pol(tica que esposou.
criminoso pela lei; pois que na permanência de tal estado, o crime ou a contraven~ Todos os fatos, por conseqüênda, que lhe são atribuídos, são simples ema-
ção se mantém sempre em via de consumação" ( Ibid., pág. 570 ). nações da sua vontade permanentemente ant(~jurídica. Continuamente revoltado
Se o acórdão, depois de se submeter aos imperativos destes postulados da contra a ordem social vigente, Harry Berger, animado sempre de um só propósito, ~
ciência criminal contemporânea, se entregasse à tarefa tão fácil de olhar para o in~
terior da vontade de Harry Berger, não tardaria em descobrir isto que está patente
acha que deve identificar a sua vida com os postulados da revolução·órgão, úni- '~..,
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cos susceptíveis, no seu entender, de destruir a atual democracia burguesa, e de fa-
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128 129
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zer surgir, em substituição a ela, a democracia proletariana. ~-~


Uma atividade ~ue se orienta por diretrizes permanentemente tão contrá- '~
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rias aos dispositivos da nossa lei penal, na parte em que-pune toda e qualquer ma- ,\
nifestação atentatória da nossa atual ordem pai (tica e social, tem de ser considera- \ ,I
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da como constituindo um 56 "crime permanente", só podendo, por conseqüência, { i
ser objeto de uma só pena. [.'i'
Fiel ao seu superior destino de defensor, intransigenteda ordem jurídica do \ ~
PELO APELANTE, LUIZ CARLOS PREStES, 24.5,37
país, nos domínios da sua especial atividade, este Supremo Tribunal Militar saberá ( i,
elevar-se acima das paixões exaltadas das nossas facções políticas, para, ouvindo só
os reclamos da consciência jurídica do país, justamente alarmada com a freqüente
(I
. !
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repetição de tantos abusos de poder, tratar com um pouco mais de humanidade a , :i
este estrangeiro já tão atrozmente martirizado, e que ora se limita a pedir, pela voz C jl)
rigorosa do seu defensor até agora impotente, um pouco mais de ~
( ~
{~.~i
JUSTiÇA, "Amai a ju-stiça, vós os que julgais a terrà" (Liv. de-Sabed. - 1,1), ordena o
Eterno aos que, no governo das nações, receberam em quinhão, a tarefa ~rdua de (
declarar inocentes ou culpados aqueles que sevêem apontados. pelos seus semelhan-
tes como elementos de desagregação social, instrumentos que se fizeram do ódio, \
Distrito Federal, 24 de maio de 1937,
da cobiça, da inveja, e da concupiscência. (
o
"
::

a,) Heráclito Fontoura Sobral'Pinto, Este amor da justiça se manifesta, no juiz, pela serenidade da sua postura, e (

Advogado ex-officio.
pela imparcialidade das suas decisões. Colocando·se em equidistância dos dois.ex-
tre'mos da causa, isto é,· do acusador e do acusãdó,'dispõe-se o magistfado·a·ouvir,
d "U
I'
sucessivamente, as queixas de um e as explicações de outro, assegurando a ambos, I,

em toda a sua plenitude, o direito de buscar e de exibir as provas que se tornarem i li


I
capazes de confirmar, objetivamente, as suas respectivas asseverações, Confrontar.-
do, em seguida, todos os elementos de convicção assim recolhidos; e pesando-os, . (
depois, um por um, na balança do seu saber, feito só de experiências e de verda- ( r
des, proferirá calmo, austero, reto, e independente o seu julgamento definitivo. i'
( :
( tf
Os que amam a justiça, e se esforçcun por vê-Ia implantada soberanamente
no seio da sociedade humana, assim procedem sem descontinuidade. A obra que
realizam se multiplica em benefícios de paz social, porque é o resultado de uma (i
vontade reta, e de uma inteligência esclarecida, empenhadas no trabalho, fecundo
de defender os laços morais da solidariedade humana, em todos os domínios da C
sua atividade. No julgamento que se processa dentro destas garantias, nada de (
apaixonado e subalterno se intromete, revestindo-se a sentença, que dele resulta,
de um cunho tal de seriedade reta que as próprias partes não ousam atribu(-Ia a
I,
inspirações alheias aos imperativos da só justiça. I,
Foi assim que se procedeu para com Luiz Carlos Prestes? Respondam, na.
sua eloqüência muda, os próprios autos deste processo.'
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130 131 1,_

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Tais métodos não são novos, nem nos é lícito reivindicar deles a primazia
Preso em março de 1936, este acusado se viy logo reduzido à mais rigorosa
para as nossas atuais autoridades policiais. Há quase cem anos, a polícia prussiana
incomunicabilidade, - mantida dia e noite através de sentinela à vista. Desde en- os empregara contra os comunis.tas de Colônia, provocando de Engels ( Correspon-
tão, não lançou mais a vista sobre qualquer jornal, não leu mais um só livro, não ~"
dance· trad. franco de J. Molitor, vol. 111, pág. 137 ) esta observação ferina:" a t
empunhou mais um só instrumento de escrita, ri.ão falou mais a nenhuma pessoa,
poll'cia ... quebra secretarias, presta falsos juramentos, faz depoimentos f~lsos, e l,",
i.l.

nem pôde sequer corresponder-se com a sua própria Mãe! Sem cessar, porém, du-
rante meses e meses, dois olhos atentos e alertas o perseguem implacavelmente
reivindica, além di·sto, uma situação privilegiada em face dos comunistas, postos I"..,
fora da sociedade! Isto, e o modo pelo qual a pól{cia, sob forma a mais matreira,
dentro das quàtro paredes do seu cubículo solitário. Sem a menor interrupção, por usurpa todas as funções do ministério público, repele Saedt para o segundo plano,
outro lado, dois ouvidos, continuamente à espreita recolhem com açodamento, exibe, como provas;· escritos não autenticados, simples boatos, relatórios, zun-
para transmiti-Ia ao Sr. Capitão·Chefe de Polícia, toda e qualquer palavra que o zuns, que eta se esforça em fazer passar por coisas juridicamente demonstradas, é
prisioneiro, - sujeito a esta vigilância alucinadora -, dirija aos seus guardas para
positivamente demais ".
pedir-lhes que lhe permitam satisfazer até as suas necessidades mais imediatas! Era natural,· assim, que esta primeira audiência do processo criminal, rea1i~
Paralelamente a esta segregação total de Luiz Carlos Prestes, empenhava-se
zada no interior indevassável de uma repartição· polic.ial, longe das vistas do públi- ~:
a Polícia em organizar, dentro do mais absolyto sigilo, que os rigores do Estado de r,
co fiscalizador, e sem que fosse atenuada de um só grão a atmosfera de opressão ir-
Guerra facilitavam, este vasto inq.uérito cqnstituído de relatórios, depoimentos, vis-
torias e buscas e apreensões, que se sucedem numa barafunda louca e anárquica,
respirável em que o mergulharam, não deixassem no espírito revoltado de Luiz ~!
que dá bem a exata medida da mentalidade pouco justiceira dos que orientaram
Carlos Prestes a mais longínqua ilusão sobre a condenação que já lhe fora reserva- ~;
da. Cresceu ainda de vulto esta sua persuasão quando obteve a informação de que li!
estas diligências: Formigam ror tôda parte os impressos, as folhas mimeografadas,
as cópias datilografadas, os folhetos, os manifestos, e os panfletos: tudo, porém,
o advogado, que lhe iam dar, disporia apenas de três dias para ler a denúncia, exa- ~,
minar todo aquele va~to processo, constituído por 50 volume.s, colher as provas
sem a menor autenticidade, nem a mais longínqua prova de identificação com a
que lhe fossem·favoráveis, e apresentar, no fim de tudo, ... a sua defesa prévia!· ri
atividade de Luiz Carlos Prestes, sobre nada foi ouvido ou· perguntado. Coisa al-
guma lhe deixaram ver. Nenhuma informação lhe ministraram sobre o que lhe atri- Não há bom senso, que se não revolte· contra uma tão evidente denegação I
buíam. A sua incomunicabilidade se estendia, assi.m, também até às peças de acu- de justiça! Pois, então, leva a Polícia, - que dispõe de todos os elementos de in- 1
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sação que contra ele preparavam. vestigação -, doze. meses para organizar 6 seu inquérito, colher os seus elementos
Nesta absoluta ignorância de tudo quanto constava do inquérito permane- de acusação, e ao principal acusado neste inquérito, que é conservado preso, sob
ceu Luiz Carlos Prestes até janeir9 do corrente, ano, quando recebeu das mãos do o regime da mais rigorosa incomunicabilidade, se concede apenas o prazo de
Juiz Dr. Raul Machado, que o fora qualificar no Quartel da Polícia Especial, a de- três dias não só para organizar a sua defesa, mas também para apresentar aos seus
núncia do Sr . Procurador do Tribunal de Segurança Nacional. juízes as provas em que ela se apóia! Seria ridículo se não fora antes dei tudo
Impossível foi, nessa ocasião, a Luiz Carlos Prestes extirpar da sua imagina- monstruoso! As autoridades policiais, que manej~m..a vontade vasto. e poderoso
ção, - apesar de exacerbada pelo tratamento desumano que lhe vinham dispen- aparelho administrativo, que se movimentam livremente por todo o território na-
sando -, um confronto significativo que a ela acudiu imediatamente: o do seu in- cional, que manipulam a seu talante verbas vultosas! ninguém exigiu que fizessem
terrogatório, no dia em que fora preso, com o do em que se iniciava o processo ju- com rapidez os seus trabalhos de investigação. Gastaram nesta tarefa o tempo que
dicial contra ele promovido. Naquele, a sala, onde ele se verificará, era uma depen- lhes aprouve, apesar dos apropriados e inesgotáveis meios de perquisição de que
dência da Polícia, que o prendera. Num dos lados do Delegado, que..Jhe dirigia per~ podiam rançar mão, dentro da lei e fora dela! j:

guntas, estava um senhor, que se dizia Procurador Criminal. No outro lado, estava Com Luiz Carlos Prestes, entretanto,. tudo se faz diferentemente. Não obs- II
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um funcionário, que passava para o papel, na qualidade de escrevente, as respostas tante se achar preso numa situação de absoluta incomunicabilidade, não conhecer f
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obtidas. Pois bem, neste segundo interrogatório, e que diziam ser o ato inicial de .se
nada das acusações contra ele levantadas, ·não poder entender, livre ou restrita-
um processo judicial, a sala, onde ele ocorria, era também uma dependência da Po- mente, com parentes, amigos, ou partidários, e não d·i~por· sequer de um lápis, de
Iicia, que o vinha martirizando, sendo igualmente os mesmo tanto o Procurador uma caneta, ou de um pedaço de papel, para as mais ligeiras notas, o prazo que
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quanto o escrevente! Nesta .segunda cena, - que em tudo o mais se mostrava idên- lhe concedem para imprimir rumo à sua defesa, "t~oGar idéias com o advogado W
tica à primeira·- apenas se operara· uma mudança: o Delegado desaparecera, para que lhe dão ex·officio, e que ele nem sequer conhece, .é o de ... três diãs!
que em lugar dele pudesse surgir o Or. Juiz Preparador.
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133
132
A sua atitude, portanto, recusando-se a participar deste simulaci'o de defe- mas das sol icitações feitas pelo requerente já foram deferidas por este Ju ízo, que
sa, que lhe ofereceram, precisa de ser encarado, sobretudo, como o grito justamen- a isso se limitou dentro da sua estrita órbita judiciária. Outras dizem respeito à
te vingador de uma consciência humana, que se vê esmagada nas suas prerrogativas administração do presídio, não havendo, pois que deferi-Ias o Juiz".
mais sagradas - não pelas sanções morais da justiça austera e reta, ser'enamente Que fazer, nesta conjuntura, se i) próprio Dr. Juiz Preparador achava que
restauradora da ordem social violada -, mas pelos golpes brutais da força abusiva- não estava "dentro da sua_ estrita órbita judiciária" o fazer com que meros agentes
mente organizada em Estado, que perdeu o verdadeiro sentido da sua superior policiais se submetessem às suas decisões? Se uma autoridade judiciária declara
missão de garantidor soberano de todas as liberdades públicas. que os seus de!õpachos podem ser impunemente desacatados pelos agentes subalter-
Nada espelha de maneira mais impressionante a deserção do Estado brasi- nos do Poder Executivo,' que providências poderia tomar, em face deste abuso, o
leiro a esta sua finalidade espiritual de representante temporal de um país cristão, impotente advogado de Luiz Carlos Prestes?
do que os sucessivos e impunes atentados dos agentes do ~xecutivo ao exerc(cio Mas, Srs. Ministros, não pararam aí os desacatos ostensivos e brutais aos
do direito de defesa pelo patrono ex-officio de Luiz Carlos Prestes. direitos da defesa. No. regime de força em que nos mergulharam, só um argumento
A documentação já existente nos autos, e a que ora se oferece, com as pre- vale:- a violência; só uma vontade sabe impor-se: a dos agentes do Poder Executivo.
sentes razões, mostram, de maneira a desafiar qualquer réplica honesta, que os Ora, neste processo ·de cunho e natureza nitidamente policiais, a Defesa parecia
guardas de Luiz Carlos Prestes timbraram em impedir que ele se entendesse livre- querer faz~r prevalecer outro argumento: o da razão, e outra vontade: a do direito.
mente com o seu patrono. Começaram por só autorizar palestras entre acusado e Urgia; pois, chamá-Ia à nossa triste realidade.
advogado desde 'que dois ou mais agentes da PoHcia Especial acompanhassem to- Não tardou muito que se oferecesse às autoridades policiais desta Capital a
do o desenrolar da conversação., Consentiam, todavia, que o defen.sor ex-officio oportunidade de vencer, em luta inglória, os atrevimentos da Defesa ingenuamente
entregasse ao· seu cliente as cartas que a Mãe deste lhe enviava de França, e as có- confiante nas suas imunidades. Dirigindo-se ao Quartel da Pol(cia Especial para en-
pias das petições que ele apresentava ao Juiz.Preparador para se desobrigar de al- tregar ao respectivo Comandante, um requerimento onde pedia se lhe permitisse
gum dever humanitário imediatamente ligado ao processo. passar às mãos de Luiz Carlos Prestes peças de roupa que a Mãe dele lhe mandara
de Paris, - visto não ter conseguido esta autorização do Dr. Juiz Preparador, con-
t evidente, entretanto, que a Defesa não poderia se, conformar cOm este siderado para tal fim única autoridade competente pela própria Polícia -,(doc.
desrespeito às suas prer'rogativas fundamentais. Para fazê-Ias restaurar, dirigiu, em junto sob nQ 2) resolveu o defensor deste acusado também com ele se defrontar,
5 de abril último, ao Dr. Juiz Preparador a petição de fls. 874 (49 vai - série A), aproveitando, assim, a sua 'ida àquele Quartel. Mal se viu na presença do seu advo-
onde denunciava a postergação do direito de defesa, pedindo. em seguida, providên- gado, Luiz Carlos Prestes entregou-lhe longo documento escrito,- que pôde redi-
cias urgentes e apropriad?s. gir após medidas obtidas pela Defesa -, e cuja devolução, entretanto, logo solici-
Deferida essa petição, as autoridade policiais ao r.eceberem a comunicação tou, ao ser advertido pelo Comandante da Polícia EspeCial que tal escrito deveria
do Juiz Dr. Raul Machado, dando-lhes conta da necessidade de assegurarem livre e ser submetido à censura do Sr. Capitão-Chefe de Polícia. Passou, então o acusado
a lê-lo em voz alta, sendo, porém, impedido de prosseguir na sua leitura, após uns
isolado entendimento entre Luiz Carlos Prestes e o seu defensor ex-officio, ofere-
dez minutos do seu início, por ordem do mesmo Comandante, que entrou a exi-
ceram a seguinte resposta: "além da presença de uma praça da Polrcia Especial pa- gir-lhe que passasse às mãos dele o referido documento. Seguiu-se, como era natu-
ra acompanhar todo o desenrolar da conversa entre patrono e cliente, foi exigida ral, a recusa peremptória de Luiz Carlos Prestes, nisto apoiado pelo seu defensor.
a exibição de tod(!s as cópias que o Suplicante tinha em mãos,e relativas a petições Inutilmente rasgou este indiciado o seu escrito, pois os seus guardas, - na vista
e cartas ligadas aos interesses da defesa e da situação carcerária do referido acusa- mesmo do patrono -, lançaram-se sobre o prisioneiro, e; após, pequena luta, onde
do, para que fossem submetidas á prévia leitura do chefe do dia naquele quartel da não tardaram em subjugá-lo, arrebataram-lhe aquil.o que escrevera para o seu advo-
Polreia Especial" (doc. junto sob n91 I. gado! lavrando ali mesmo o seu protesto, renovado' mais tarde por escrito, em
Tais são os precisos termos da petição que a Defesa, em 28 do mês findo, petição dirigida ao CO!llandante da Pai ícia Especial, a Defesa deu de tudo conhe-
apresentava ao Juiz, Dr. Raul Machado, para in.formá-Io de que novos e mais vexa- cimento ao Dr. Juiz Preparador (doc. junto sob n9 3).
tórios impecilhos tinham sido criados à comunicação entre Luiz Carlós Prestes e o Esta autoridade se limitou, como das vezes anteriores, a despachar, textual:
seu patrono. mente:"Quanto ao relato feito no presente, do fato a que alude, não estão dentro
Que providências resultaram deste novo apelo do advogado ora recorrente? da estrita órbita judiciária as providências' que no caso éouberem. Dirija-se a defe-
Atentem os Srs. Ministros .para o despacho do então Dr . .juiz Preparador: "Algu_ sa, querendo, à autoridade competente".

134 135
Para que prosseguir mais? Há enumerações que estão no conhecimento de Para o acórdão recorrida só -existem duas espécies de crime: os autônomos
todos. Há demonstrações que aborrecem tão evidente e palpável é aquilo que se e os continüados Fora desta classificação nada mais existe, que mereça a atenção
quer demonstrar_ Assim, o com que nos defrontamos não foi uma ação judiciária, \1
dos magistrados.
alheia às paixões ambientes foi um inquérito policial, que se procurou revestir, na Nestas condições, provado que os atos atribuídos a Luiz Carlos Prestes não !
sua fase final, das aparências de um processo judicial. Neste não se quis ouvir a voz podem ser considerados como constituindo partes integrantes de um só "-crime
dos acusados_ A preocupação, pelo contrário, foi abafá-Ia , para impedir que, sob continuada", cumpre encará~los como outros tantos "crimes autônomos", que
os escombros dos lutuosos acontecimentos de novembro de 1Q35, aparecesse o precisam de ser punidos consoante a regra do art. 58 do Código Penal Militar, que
mundo de anarquia mental e de des~gregação administrativa que enche de inquie- diz: "Quando o criminoso for convencido de mais de um crime, impor-se-Ihe-ão as
tação os que, nesta época de destruição de todos os valores morais, se interessam penas estabelecidas para cada um deles ..."
sobretudo pelos destinos do reinado da justiça_ Os clamores, pois, da Defesa alheia Contra este procedimento do acórdão, - motivado certamente pela só
ao tumulto das facções em luta, não encontraram eco. Apenas o Conselho da Or- preocupação de impor uma pena de longuíssima duração que a sanção do
dem dos Advogados da Seção do Distrito Federal esboçou um gesto elegante. art. 19 da _lei n938, de 4 de abril de 1935, não autorizava -, ergue-se, em protes-
Diante dos apelos do defensor de Luiz Carlos Prestes ( docs_ juntos sob n9 4 e 5), to veemente, tudo o que há de mais esclarecido nos domínios da ciência penal
oficiou ao Sr. Presidente do Tribunal de Segurança Naci0':1al ( doc. junto sob n9 contemporânea.
6 ), encarecendo a necessidade urgentíssima de ser- assegurada a garantia da "co· As premissas do acórdão são infundadas. Não só a classificação por _ele
municação entre o advogado e o cliente, sem interposição de pessoas, nem assis- adaptada não corresponde à que hoje em dia é seguida por todos os que se dedi-
tência de terceiros". cam ao estudo da ciência criminal, como também os atas atribuídos-a Luiz Carlos
Prestes não podem ser desligados da unidade de ação, que, desde 1930, ele vem
Logo 'lhe veio, porém, ao Conselho da Ordem o desengano. A autoridade mantendo em face da realidade social bra·sileira. Estas duas circunstâncias, eviden-
judiciária, a. que recorrera, advertiu sem pestanejar: "Já havendo recomendada tes na sua objetividade, impedem que a conclusão do acórdão de condenação me-
providências no sentido de ser assegurada aos respectivas advogados, na interesse reça o apoio dos que, como Ju{zes de superior instância, terão de sobre ele se pro-
da defesa, toda comunicabilidade com os presas recolhidos aos diversos estabeleci- nunciar.- \1
mentos à disposição da Tribunal de Segurança Nacional - não pode esta presidên- Ninguém ignora que todos"os penalistas· proclamam que existem "crimes
cia tomar outras medidas, cabendo às autoridades competentes, de conformidade perm,mentes", que não se confundem com as que o acórdão denomina de "autô-
com as leis e regulamentos vigentes, as providências solicitadas ... " ( doc. junto lI!
nomos" e de- "continuãdos".
sob n9 7 ). Com efeito, Poletti IRivista Italiana di Diritto Penal.· vaI. IV, p'g. 190)
. esclarece:"A noção jurídica do crime permanente, que à primeira vista poderia pare-
Quando tão autorizados representantes da justiça cruzam, deste modo, os
cer evidenHssima, está, ao contrário, entre as mais incertas e confusas quer na dou- (I
braços ante o inequívoco espezinhamento desta, o ânimo mesmo dos maiores li-
trina, quer na jurisprudência. Tal incerteza é devida, provavelmente.ao fato de li
dadores sente arrefecer os seus ímpetos de luta. Tal não se deu, porém, com o
Conselho da Ordem. Varonil, foi bater, ainda que em vão, às portas do Sr. ~.1inis­
que, por muito tempo, a figura do crime permanente estava compreendida na do I!
tro da Justiça, para relembrar-lhe que, "grande advogado e emérito professor': seria crime continuado e com esta confundida: de fato, a distinção entre as duas figu· II
ras de crime se afirmou nitidamente só no século decorrido, sendo fixada, final- I
o primeiro em reconhecer" a legitimidade das medidas postuladas e reconhecidas
mente, a distinção entre a i'ileração de atos e a il1teração de fatos criminosos, ca-
pelo Tribunal", entrando, por isto, a providenciar "para a sua efetivação" (doc.
bendo a mérito principal disto primeiramente a Giuliani, e depois a Ortolan".
junto sob n9 8 ).
Aí têm os Srs. Ministros a moderna classificação, que considera "crime
Não é poss{vel que o Supremo Tribunal Militar sancione, com a sua autori- continuado" o que é constituído por atos criminosos de idêntica natureza, unifi·
dade, todas estas iniqüidades, que ora estão sendo focalizadas. Seria o afundamen- cados por uma só intenção delituosa; e que reputa, par outro lado, "crime perma·
to total das nossas tradições de povo que sabe cultuar, com reverência respeitosa, nente" b que é formada por fatos criminosos de diversas naturezas, unificados li
os verdadeiros sentimentos de justiça. Uma sentença que, para ser proferida, esma- também por uma só intenção de atingir determinado fim ilegal. l,
"
ga,_tranqüila e indiferente, o direito da defesa livre e independente, não pode pre- Ocorre sempre, portanto, a verificação qe "crime permanente" quando
valecer, principalmente quando, afastando-se dos princípios, firmemente assenta- existe, no dizer preciso do ilustre cientista já invocado: "19) uma vontade disposta
dos, da ciência penal, ousa erigir em "crimes autônomos" atos que são, pela natu- a criar e a manter viva a violação da lei penal por Um certo período de tempo;
reza mesma da sua finalidade, meras participações de um só e mesmo "crime per- 20) uma atitude· criminosa apta a realizar e a manter vivas, por certo tempo, as ex- ~

manente". tremas da própria violação jur(dica" Ilbid., pág. 198). '1"

136 137
III
li)
~ I1
Tudo isto mais aclarar-se-á desde que se atente nesta ponderação do aludi-
capitalista (exército burguês, polrcia, hierarquia burocrática, tribunais, parlamen-
do penalista (Ibid., págs. 200·201): "Como muitos autores observam justamente
tos, etc.) substituído pelos novos órgãos do poder proletariano ... ".
(por exemplo: Ortol_ao, Hélie, Glasser, Masucci, Campus, Manzi, etc. 1 , pode-se
dizer que o crime, por todo o tempo em que dura a permanência, estã,-como diz Examine-se, agora, a atividade de Luiz Carlos Prestes à luz destas orienta-
o Relatório ministerial, em via de consumação, porque, por todo este tempo, per- ções ideológicas, e logo se verificará o cunho inconfundivelmente programático de
manecem vivas as extremas que constituem o crime, segundo a definição da lei. que ela se revestia. O que ele fez, enquanto se conservou em liberdade, foi simples
Isto é, há no crime permanente não um momento, mas um período de consuma-. execução de um plano pré-estabelecido, que visava dar ao prolettlriado na~ional,
ção, em que podemos distinguir um momento inicial e um momento final". com as adaptações e restrições que as. condições sociais brasileiras exigiriam, a fun-
Apliquem-se à ação de Luiz Carlos Prestes sobre a realidade social brasileira ção de classe dominadora. O seu plano era, como é ainda, um só: conquistar para
estes princípios jurídicos elementares, e logo ela se reflitirá como o resultado coe- a classe proletária o poder pai ítico da nação. Para isto o tempo era um fator deci-
rente, ao largo de seis longos anos, de um só propósito, e de uma só vontade perti- sivo, e a multiplicidade de fatos ilegais, definidós em lei como crimes, outra condi-
naz. ção indispensável de êxitq. Sem a persistência, assim, de sua vontade.consciente-
mente disposta a infringir, durante anos seguidos, dispositivos categóricos da nos~
O que este acus~do, quis sempre, nestes últimos tempos, e ainda agora
sa lei penal, não poderia Luiz Carlos Prestes realizar nunca aquilo que é, hoje em
quer é realizar no Brasil a revolução social. Esta, na sua intenção de marxista con-
victo, é o órgão necessário-e fatal da implantação da democracia proletária no nos~ dia, todo 0_ sentido da sua vida de revolucionário: a implantação da ditadura do
so meio. Nela concentrou ele todos os seus ideais, e para ela convergem todos os proletariado no seio da sua nacionalidade. Ideal funesto, - tem o seu defensor
seus pensamentos, todos os seus atos, e todas as suas energias. ex-officio o dever de proclamar bem alto nesta hora de extrema gravidade -, mas
que, pela continuidade de suas manifestações, tem a indisfarçável força de unificar
Tudo isto é, nele, mero reflexo desta diretriz da Internacional Comunista
todos os fatos criminosos, .imputados ao referido -acusado, e que devem ser
{Programme de I'internationale Communiste, pág. 30 - Bureau d'Editions - Pa-
tidos, por isto, como simples execução parcelada, no tempo, de uma só intenção,
ris}: "Entre a sociedade capitalista e a sociedade comunista sé estende um período
que esse ideal simboliza e corporifica.
de transformação revolucionária, a que corresponde um período de transição pol(-
tica durante o qual o Estado não pode_deixar de ser uma ditadura revolucionária do Tais fatos não constituiriam, pois, "crimes autônomos", como decidiu o
proletariado. A transição da ditadura mundíal do imperialismo para a ditadura acórdão ora recorrido, mas, pelo contrário, fases distintas de um só "crime perma~
mundial do proletariado abraça um longo período de lutas, de revezes e.de·vitórias nente", cuja pena, sendo a do art. 19 da lei n938, de 4 de abri! de 1935, não po-
do proletariado, um período de crise contínua do sistema capitalista e de cresci- deria nunca ser aplicada no máximo a Luiz Carlos Prestes, pois, é de bradar aos
mento das revoluções socialistas, isto é, de guerras civis do proletariado contra a céus que se não tenha reconhecido a este acusado sequer o seu exemplar compor-
burguesia, período de guerras nacionais, e de sublevações coloniais, que, não sendo tamento anterior. A sua fé de" ofício, de raro brilho, e que está junta aos autos,
em si mesmo movimentos socialistas do proletariado revolucionário, tornam-se exigia dos seus juízes_a consideração, ao menos, de alguns minutos de leitura. Pri-
objetivamente, porque abalam a dominação imperialista -, partes integrantes da mei:-o da sua turma, e de irrepreensível conduta militar enquanto permaneceu nas
revolução proletariana mundial ... ". fileiras do Exército Nacional, Luiz Carlos Prestes mereceu de seus chefes imediatos
e de seus mais graduados superiores, elogios de excepcional relevo. r-.Jão podia,
Empenhada em realizar esta transformação radical do edifício social e eco-
pois, o acórdão ora reco'rrido, permanecer silencioso, e sem a menor explicação,
nômico da humanidade, adverte, ainda, a Internacional Comun,ista (lbid., pág.31):
sobre tão excepcional circunstância, cujo reconhecimento tanto beneficiaria a
liA conquista do poder pelo proletariado é a condição preliminar do crescimento
este acusado.
das forças socialistas da economia, e do surto cultural do proletariado, que, trans-
Foi, Srs. Ministros, à custa deste menosprezo inconcebível que se conseguiu
formando-se, a si mesmo, conscientemente, torna-se o dirigente da sociedade em
condenar Luiz Carlos Prestes à pena tão elevada. Não parecera ainda bastànte a
todos os domínios da vida, arrasta neste processo de refundição as outras classes, (r
supressão da garantia, que a nenhum réu se nega, de organizar·e recolher as suas 1!,1
e cria, com- isto, um terreno favorável ao desaparecimento das classes".
Cumpre, entretanto, aos marxistas não esquecer nunca, - previne a
provas; não fora, outrossim, suficiente a usurpação real e efetiva do direito da de-
fesa livre e indapendente. E que, apesar de tudo, ficava restando ao acusado um
('If.~
Internacional ( Ibid., pág. 32 ) - que esta "conquista do poder pelo proletariado, 1'-11
elemento que o favorecia e amparava: a sua fé de ofício. Cumpria, pois, vencer
é a abolição violenta do poder da burguesia, a destruição do aparelho do Estado
mais este incômodo obstáculo! Como consegui-lo, porém? Era muito simples:
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138 139
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bastaria deixar no olvido aquele tão honroso testemunho da vida militar de Luiz
Carlos Prestes I
Por tudo isto, Srs. Ministros, a sentença, que em tamanhos pecados inci- 'I
diu, pode ter sido hábil ou corajosa, mas, agr~vou, sem cautela.e sem piedade, pa- I,i l
ra perpétu0 deslustre seu, os sentimentos cristãos da alma justiceira de toda uma I
Nação. '~!
!~!
Distrito Federal, 24 de maio de 1937.
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÁDIA PRESTES,
l:':~i'
I!

a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto


Rio, 28 de maio de 1937.
Advogado ex-officio.
Exma. Sra.
fi
11
D. Leocádia Prestes. '1

Ja entreguei, pessoalmente, a seu filho, as roupas e objetos que estavam em


meu poder, e a que fiz alusão nas cartas de 8 e 12 do corrente, cujos recebimentos
I:
:~I

V. Exa. me acusou na sua missiv<l de 19 último. I

O Comandante da Polícia. Especial, auxiliado por três subordinados seus,


submeteu terno, piiamas, cuecas, lenços, gravatas, tudo, enfim, a uma Qusca e revis- IIi
ta ~ão minuciosas que gastou nesta tarefa mais de meia hora. Os lenços, eram des- lI !

fraldados contra a luz, e o cós das cuecas dobrados de milímetro em "milímetro


para que pudessem_esses policiais ter a certeza de que nenhum bJlhet.e, ou serrJnha
l
de aço, estivessem sendo remetidos por V. Exa. a Luiz Carlos Prestes. O sabonete
foi partido ao meio, e os paus de chocolate miudamente quebrados, pois o Sr. Ca-
'I
I!,
. pitão-Chefe de Polícia ordenara, no seu despacho, - que autorizava a entrega das I~
li!l!
coisas constantes da relação por mim fornecida -. que houvesse o máximo rigor :ii,

na revista a ser efetuada. Por isto, as gravatas foram viradas do avesso, e o forro do
terno de casimira quase que foi descosido, ato este, entretanto, que não chegou a :li.
ser praticado, ã vista das minhas ponderações, logo secundadas pelo Secretário da Ilij
Corporaç§'o, de que isto implicaria na inutilização daquele vestuário.
:ii'~!,
AI' tem V. 'Exa., através deste epis?>dio rid{culo, a mentalidade dos dirigen- :11

li!
tes da administração que orientam os negócios públicos do Brasil. A incompetên-
:i;'
cia tendo ascendido a postos que exigem, para o seu bom desempenho, dotes de
superior descortínio, entra, à m{ngua destes mesmos dotes, a praticar medidas de :ifi
!,'~
precaução, que nada resguardando, por sua inutilidade, só serve'm para colocar mal i'~
as próprias autoridades, que as põem em prática. t!
I,l'
Para conhecimento de V. Exa., envio, com esta, cópias da petição que diri· li',",'I"
gi ao Dr. Raul Machado, nas vésperas do julgamento, e do protesto que apresentei (~
aO Comandante da Polícia Especial. relativamente à cena deprimente de que fui il
um dos atores passivos. Nessa data de 4 do corrente, o cerceamento da defesa de "1
140
141
seu filho, que já era intenso,atingiu às culminâncias da brutalidade agressiva e vio- Ora, dada a posição em que nos colocamos, perante o problema social, de
lenta. Por essas cópias ficará V. Exa. devidamente informada do que-venho sofren- adversários intransigentemente defensores de soluções contraditórias, constituirá
do no nosso país, porque, fiel discípulo de Jesus Cristo, procuro, por entre as para ele uma humilhação estar sendo amparado por mim, principalmente porque
falhas da minha vontade claudicante, cumprir os mandamentos da Igreja Eterna. tudo quanto eu venho fazendo encontra base e fundamento sobretudo na caridade
O Dr. ~aul Machado, indeferindo o meu requerimento referente à junção cristã.
aos autos dessa petição que lhe apresentava, acrescentou no seu despacho: "Quan- Está certo de que eu não deixarei de perceber que não lhe fica bem, a ele
to ao relato feito na presente, do fato a que alude, não estão dentro da estrita Luiz Carlos Prestes, estar a receber esmola de Um adversário.
órbita judiciária as providências que no caso couberam. Dirija-se à defesa, queren- Ao me dizer tais coisas, que preferiria me comunicar por escrito, - acres-
do, à autoridade competente". ·centou -, se as autoridades policiais lhe tivessem permitido escrever-me, não nu·
Recorri, como era natural ao Conselho da Ordem, que oficiou, sem demo- tria a mais longínqua ·dúvida de que eu compreenderia quanto de penoso havia
ra, ao Presidente do Tribunal de Segurança Nacional, encarecendo a necessidade para ele neste gesto de dispensar as minha visitas, que, na sua solidão, eram o ('I'
urgentíssima de ser assegurada a garantia da "comunicação entre o advogado e o único oásis de intelectualidade e de solidariedade humana que ainda lhe restava.
t
C'•
cliente, sem interposição de pessoas, nem assistência de terceiros". Fazia, ainda, questão de acentuar 4ue lLesta resolução nada podia haver de
Pois bem, eis o que respon-deu o Sr. Barros o&rreto: "Já havendo recOmen- caráter pessoal, po!s era evidente que nos dispensávamos mútua e recíproca simpa- ~
dado providências no sentido de ser assegurada aos respectivos advogados, no inte- tia. Neste seu gesto havia, isto sim, o propósito de poupar-me novos e penoso.s (
resse da defesa, toda comunicabilidade com os presos recolhidos aos diversos esta- aborrecimentos, da natureza daquele a que alude a petição cuja cópia ofa vai ~

belecimentos à disposição do Tribunal de Segurança Nacional - não pode esta pre-


(
junta. I~

sidência tomar outras medidas, cabendo às autorldades competentes, de confor- Tais, Exma. Sra. foram, se,a memória me é fiel, os termos das palavras pro- Cli'
midade com as leis e regulamentos vigentes, as providências solicitadas .. .". feridas por seu filho em tom calmo, cortês, e delicado, que mal escondia a emoção
sincera, e o embaraço real que dele se apoderaram nessa ocasião, e que eu a cada
C
É COm o maior constrangimento que ponho V. Exa. a par _deste episódio,
por todos os títulos lamentável, pois receio que nele V. Exa. encontre motivos
instante ia sentindo através da dificuldade de expressões com que_ trt!duzia o seu ~ r~

para novas e sombrias apreensões relativãmente aos sofrimentos de seu filho. O pensamento. (
Repliquei-lhe, imediatamente, com a maior firmeza e segurança, mais ou ~
coração materno tem fibras bem mais sensíveis, e muito mais profundas ...
Mas, o pedido que Luiz Carlos Prestes me fez, em conseqüência deste cer- menos na forma que se segue:
(
Não era exàto que, como advogado, eu devesse suspender as minhas visitas, (~
ceamento de defesa, me obriga a expor a V. Exa. tudo o que se está passando, pois
porque os carcereiros dele impediam a nossa livre comunicação. t,
condicionei a minha futura atitude, relativamente a este pedido, à decisão que V. (
Exa. quisesse tomar. Para habilitá-Ia a resolver o assunto parece-me necessário O advogado atua dentro de Um Ljuadro legal que reserva para as autoridades I
expor-lhe também as origens dele. Vamos, pois, ao que nos interessa. executivas ou judiciárias as soluções por ele pleiteadas em nome da lei. Justas ou (,
Na última vez que estive com o-seu filho, ele me disse, em resumo: injustas Úlis soluções, cabe-lhe o dever de a elas se submeter. Incumbe-lhe, apenas, (
Estava imensamente grato a tudo quanto eu vinha fazendo em seu beneH- dirigir-se à autoridade superior, para a qual possa recorrer, para, escudado na força y
cio, e, sobretudo. em benefício de V. Exa. i só dos seus raciocínios, obter a reforma da anterior decisão. Se esta, entretanto, Gm
Cons~ntira em aceitar os meus gestos, que, de certo modo, vinham suavi-
zando a sua prisão rigorosa, porque eu estava agindo como advogado indicado pelo I
for confirmada, - embora com infração da lei -, deve o advogado fazer aquilo
que tal decis~o lhe permite, mas não como quem está recebendo favor, mas como
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Conselho da Ordem dos Advogados neste Distrito Federal. quem está exercendo um direito seu, decepado em parte.
Entretanto, era evidente que, como advogado, eu não poderia anuir nos \ Quanto à invocação, por mim feita, constantemente, aos preceitos da cari- ( o.
desrespeitos tão ostensivos e contínuos às prerrogativas da minha profissão. dade cristã, ela não visava os meus adversários comunistas, - para os quais ela não II
pode constituir preceito de consciência -, e sim os elementos reacionários da bur-
(
Se, apesar de tudo quanto vinha ocorrendo, eu insistia em procurá-lo, era
porque, cama católico, eu me sentia ligado, em consciência, ao desempenho dos guesia, que não cessam de apontar à execração pública os nossos semelhantes, que,
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pequenos misteres a que estava a me entregar, repetidamente, sobretudo para cor- por motivos que não me cabia recordar naquele instante, tinham esposado a con-
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responder,-com certeza, a confiança m~ternal de v, Exa. cepção marxista. ~
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142 143 l ~
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Por outro lado, a noção verdadeira da caridade cristã, tal como Jesus Cristo de Jesus Cristo, que será eternamente imaculada, mas a pessoa deste seu pobre e
a define, e a Igreja propaga, pelos seus representantes autorizados, nada tem de hu· mesquinho discípulo, que, nessa hora sombria, o estaria renegando com a mesma
milhante ou de vexatória. Na realidade, caridade não é sinônimo de esmola no sen- covardia com que o, então, presumido Pedro procedeu naquele episódio da
tido burguês da palav'ra; é coisa muito mais sublime. O conceito que ela exprime é Paixão, tão consolador para a frágil natureza humana. li
o da igualdade absoluta de todas as almas. Assim, em face de Deus Onipotente, a Cumpria, -outrossim, não perder de vista que tais entendimentos na presen-
alma de Staline, a Oe Pio XI, e a do mais anônimo operário têm em si o mesmo ça de autoridades policiais não eram humilhantes só para ele Luiz Carlos Prestes. A r\1
valor, nada havendo na natureza delas que seja capaz de distingui·las na ordem -do humilhação antes de atingi-lo feria ~ seu desinteressado ~dvogado ex-officio.
merecimento. O que torna uma mais valiosa do que a outra é a qualidade dos atos Como quer que fosse, porém~ o que me animava, nos meus gestos e nas
de que cada uma se faz a autora consciente. Se esta abraça a verdade, com sinceri- minhas, atitudes, era "0 propósito sincero e puro de socorrer, na medida da~ minhas
dade, e multiplica-se em atos de benemerência para com as criaturas humanas; não energias, a alma irmã de uma criatura sofredora. De nenhum modo, eu me permiti-
por vanglória, vaidade, ou desejo de alcançar louvores e elogios alheios, mas porque ria concorrer para o vexame e a humilhação de um semelhante meu, ainda que esse '"r'
nessas criaturas vê irmãos seus em Jesus Cristo, o seu merecimento será, evidente- fosse o maior inimigo qaquilo que é para mim todo o sentido da minha vida: a "
mente, bastante maior do qu~ o daquela outra alma, que difunde imprudente ou minha até hoje inabalável Fé religiosa.
conscientemente o erro, ou que trata os outros seres humanos ou com maldade, Estaria, pois; disposto a me submeter à vontade dele, Luiz Carlos Prestes,
ou, então, com generosidade que busca apenas os aplausos da opinião pública, a, desde que V. Exa. anuisse, também, aos desejos .dele. É que neste episódio não
por isto, inteiramente divorciada da pessoa divina de Jesus Cristo. estão envolvidos apenas o advogado católico e o revolucionário comunista. Há en- I
E não é só. A verdadeira caridade nos proíbe de que nos julguemos melho·
res, ou mais. prilegiados do que os nossos semelhantes. Criatura frágil e falível, o
tre ambos, de permeio, um coração materno, que sofre, e que chora lágrimas de
agonia indefinl'vel. Tudo quanto eu já fizera, estou fazendo; e me proponho a fa- H
I~
homem, por maior que seja a sua inteligência, a sua cultura, ou as suas virtudes, 'zer até o' fim, vem servindo para consolar, um pouco,.este seu peito de anciã já
não está isento do erro, do pecado, e da infâmia. Ninguém, neste mundo de pro- tão experimentado pela dor e pela desdita. Parecia·me justo que essa alma de mãe !\;
vações, poderá afirmar: "Desta água não beberei". aflita tivesse, também, a oportunidade de se pronunciar, neste debate que tantl?
É, ainda, a caridade cristã qu'e nos impede de nos orgulharmos da nossa in- interessa ao seu coração agoniado.
teligência, e, mesmo, da nossa Fé. Não é inteligente quem quer, cama não é ca- Venha, agora, de V. Exa: a palavra definitiva, que será por mim acatada 'r
tólico quem se dispõe a sê-lo. Como há de ser são de mente aquele que recebeu com a mesma lealdade, o mesmo desassombro, e a mesma firrneza com que procu-
ao nasce.r uma razão débil? Como poderá ter 8" Fé católica aquele jovem que, ro respeitar sempre os ditames da minha consciência religiosa. Alheio aos interes- li
nascendo no seio de uma tribo africana, nunca ouviu pronunciar o nome, para ses subalternos do mundo, quero apenas trabalhar, na medida das minhas energias, li
para honrar o nome de Jesus Cristo, meu Mestre e meu Senhor. ,I
mim tão sublime na sua divindade, de Nosso Senhor Jesus Cristo? :!~
Eu não via, por conseguinte, em que as minhas visitas pudessem humilha-lo Antes de terminar esta carta tão longa, para a qual procurei traduzir, em
a ele Luiz Carlos Prestes, pois, não lhe estavam, cOm isto, a fazer um favor, mas a palavras singelas, o mundo de emoções que tumultuam no meu coração tão con-
cumprir apenas o meu dever, tão sagrado para mim, como o que ele pensou aten- turbado, nesta hora de extrema gravidade para a nossa nacionalidade, cabe-me par~
der ao desencadear o movimento de novembro de 1935. Tanto mais isto não cons- ticipar-Ihe que já interpus devidamente arrazoado, o recurso de apelação para o
titui nenhuma humilhação, qua-nto, quaisquer que venham a ser as Situações de Supremo Tribunal Militar. Na próxima semana, se Deus me permitir, enviar-Ihe-ei "
ii:

luta implacável que as nossas respectivas concepções de vida, - tão fundamental- cópia destas Razõe~.
mente contraditórias -, possam nos lançar de futuro, a caridade cristã me vedará Agradecendo, mais uma vez, as expressões generosas que se dignou dirigir-
categoricamente fazer a mais leve referência a estes modestíssimos serviços que lhe me na sua carta de 19 do corrente, peço a V. Exa. que aceite, com as suas filhas, as
estou prestando. Se as contingências da vida nos vierem a colocar-nos um em face homenagens do meu sincero respeito.
do outro como adversários na vida pública, eu praticarei a mais infame das ações
contra a caridade cristã se ousar aludir, ainda que indiretamente, a isto que tenho Sobral Pinto
agora feito como advogado ex-officio de elementos comunistas. :n,
É claro que, homem sujeito a todas as falhas, não estarei livre de amanhã
,,1,
li
praticar uma infâmia destas, que, se vier a ser cometida, deslustrará não a caridade
I1

'145 11
144 'li
,!
(-
carta que me dirigira, na qualidade de seu advogado, e que hoje repousa, abusiva e
criminosamente, numa das gavetas qa secretaria do Sr. Capitão-Chefe de Pai (cia.
Inúteis foram até este instante os meus esforços no sentido de alterar esta
situação, que diminui e amesquinha, antes dê tudo, a autoridade moral da nOSSa
Administração.
O Tribunal de Segurança Nacional cruzou os braços. Depois de ter ordena- I~
(
do a transferência de Harry Berger para um presídio onde lhe fosse restituída a sua 11;
CARTA DE SOBRAL PINTO A JOSÉ CARLOS MACEDO SOARES,
qualidade de criatura.,racional, e após ter·me assegurado a livre comunicação-com ('
NOVO MINISTRO DA JUSTIÇA, DE 3.6.37. . li!
os meus clientes ex-officio, não se animou a fazer cumprir as suas decisões, apesar
(
das reclamações do CO'nselho da Ordem da Seção deste Distrito Federal, para o
qual eu dirigi apelos reiterados. (

Exmo. Sr. José Carlos de Macedo Soares.


O ilustre an.tecessor de V. Exa. fechou, por sua vez, os ouvidos aos meus
insistentes clamores.' Não obstante' ter exposto a S. Exa. tudo o que se passava,
('"
)i
providência alguma se dignou tomar. \
No dia eni que V. Exa. se investe nas altas funções de Ministro da Justiça Fiado na Fé religiosa que ilumina o coração católico de V. Exa., venho na ("
dupla qualidade de advogado e de católico, reclamar apenas Justiça. Não é possível il'
cumpro, como advogado ex-officio de Harry Berger e Luiz Carlos Prestes, o dever (
penoso de comunicar a V. Exa. que a administração brasileira vem mantendo, até que V. Exa. consinta em sancionar, com uma atitude de inércia, as monstruosida-
agora, estes' dois- presos políticos fora do amparo dos salutares princípios dessa des que vêm sendo praticadas à sombra do Estado de Guerra. A obra que até agora (
se realizou não foi de punição_ O que eu tenho presenciado só me é lícito classifi·
mesma Justiça, cuja g~arda acaba de ser confiada às experimentadas mãos de V.
Exa. car como perseguição.
( "
Não sou político, e as lutas que se processam em torno do poder não me (h
Harry Berger está reduzido à humilhante condição de animal hidrófobo. i interessam. Indiferente às competições administrativas, só uma coisa me preocupa: Jr l

A prisão que lhe deram é o socavão de uma escada no Quartel da PolI'eia Especial. (
Privado de ar renovado, de luz, e de movimento! nada lê nem jornais, nem livros, o reinado da Justiça.
Tudo tenho feito, dentro das minhas energias e da minha limitada capaci- ("i
nem revistas. Não o privaram só de·toda e qualquer convivência humana. Foram
além. Não lhe dão nem sequer cama e roupas. E a alimentação que lhe ministram é dade, para obter que as autoridades brasileiras tratem a Harry Berger e Luiz Carlos (l
Prestes como membros da espécie humana. Pouco me importa o comunismo deles. ,
o que, na linguagem presidiária, chamam "meia·ração" ..
Almas resgatadas por Nosso Senhor Jesus Cristo, de Quem somos, V. Exa. e eu, (
Luiz Carlos Prestes se dispõe de um bom quarto, que lhe serve de presídio, -r
e alimentação regular, sofre a tortura alucinante da sentinela à vista, dia e noite, humildes disdpulos, têm direito a serem tratados com humanidade e com Justiça. (
vendo·se atingido, tal como Harry Berger, pelo mesmo isolamento rigoroso, apenas Não me impressiona outrossim, Exmo. Sr., a objeção agora tão freqüente- ( I,
suavizado, recentemente, pela troca de correspondência com algumas pessoas de mente recordada de que, em novembro de 1935, Harry Berger e Luiz Carlos Pres-
I}
sua familia, após a minha intervenção junto ao Tribunal de Segurança Nacional, no tes fizeram brotar, na nossa vida social e militar, um rubro filete de sangue. C'
sentido de obter para ele semelhante franquia. Este filete de sangue tem origens mu ito mais remotas. Desde Caim que ele I
percorre a terra, ensopando de ódio e de tristeza a história das nações. Não foram (;i
Como se todas estas iniqüidades já não bastassem para marear os. propósi- ( li
tos, aparentemente justiceiros, da repressão intentada contra os comunistas, a os comunistas que inauguraram, no Brasil, as lutas sangrentas, e o assassínio de
-ti
Administração Pública Federal timbrou em espoliar os dois acusados supra-indica- companheiros dentro dos quartéis, por motivos pai (ticos.
<. '
dos dos seus direitos de defesa livre e independente_ Nunca me foi facultado en- E quando, esquecidos do nosso próprio passádo, quiséssemos atribuir a fi"
tender-me a sós com estes meus clientes ex-officio. As nossas conversações foram Harry Berger e a Luiz Carlos Prestes a inauguração, nq nosso meio, destes métodos
('i
sempre seguidas, fiscalizadas, e censuradas por agentes do Poder Público, que che-
garam ao extremo de subjugarem-, na minha presença, a pessoa de Luiz Carlos Pres-
de violência sangrenta, não assiste às autoridades brasileiras o direito de negar-lhes
justiça, como se vêm fazendo.
C;,1
tes, para que pudessem alcançar a vitória inglória de lhe arrancarem das mãos-uma Ponha tenho, Exmo. Sr., a esta obra de iniqüidade que, ainda neste instan- li;
te, se está praticando contra ds meus clientes ex-officio. Proceda desta man~ira, (,il
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146
147 C li
\.,I!i,
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para que possam todos os brásileiros afirmar, verdadeiros e sem lisonja, que a Jus-
tiça encontrou afinal o seu Ministro.
Com as minhas homenagens, sempre ao dispor de V. Exil.,

Sobral Pinto

CARTA DE SOBRAL PINTO A MINNA EWERT,


R ia, 11 de junho de 1937,
Rio, 3 de junho, 1937.

Exma. Sra.
D. Minna Ewert.
Nada tem que me agradecer pela carta que lhe dirigi em 20 de maio p. fin-
do. Venho cumprindo, apenas, o meu dever. E pode ficar certa, minha Sra., de que
enquanto Deus me der forças' tudo farei, dentro dos meus recursos intelectuais, pa-
ra amparar e socorrer o seu irmão.
Não sei se conseguirei obter da administração brasileira a necessária autori-
zação para que a sua cunhada venha para a companhia de seu irmão, no presídio
a que este tiver de ser recolhido. É verdade que o art. 14 da Lei n9 244, de 11 de
setembro de 1936, que regula a matéria relativa às prisões poll'ticas diz textual-
mente: "Ficam criadas cinco colônias agrícolas e penais, que o Poder Executivo
localizará-convenientemente.
Parágrafo único. As pessoas internadas nas colônias agrícolas e penais
PODERÃO SER ACOMPANHADAS PELA FAM(LlA".
Antes de tudo, cumpre-me indagar se o seu irmão uniu-se à sua cunhada
pelos laços jurídicos estabelecidos pela lei alemã, ou se a união dele decorreu tão
só da vontade firme de ambos, sem intervenção das autoridades competentes para
celebrarem casamentos.
Uma simples união voluntária, desacompanhada das formalidades legais
referentes ao casamento, não é de molde a me autorizar sustentar, em face da
nossa justiça penal, que a sua cunhada pertence, realmente, à família de seu irmão.
Peço-lhe, assim, que me esclareça a respeito da circunstancia acima focali-
zada; e, na hipótese de ter seu irmão realmente contraído núpcias legais, queira en-
viar-me a respectiva certidão, devidamente autenticada pelo Cônsul brasile_iro com-
petente do pafs onde o casamento se realizou.
Como quer que seja, esta hipótese s6 poderá ser examinada quando o seu
irmão tiver de ser transferido para uma das colônias agrícolas a que alude o art.
14 acima indicado.

148 149
(~
(;:
É de meu dever, entretanto, ponderar que não será fácil, mesmO no caso ficará" habilitada a verificar que as autoridades brasileiras resolveram, afinal, a-
de ser o seu irmão casado perante a lei com a sua cunhada, conseguir a volta tender aos meus clamores. ('--
pesta ao Brasil. Pode ficar, portanto, mais tranqüila. Daqui por diante os sofrimentos li
A razão é esta: ela foi expulsa do nosso País, mediante a instauração de (
físicos, decorrentes da má instalação de seu irmão vão cessar completan:aente;
um processo administrativo, estabelecido na nossa legislação. Para que lhe seja, e as torturas morais, resultantes do seu isolamento, vão ser muito atenuadas. O (
assim, permitido tornar a entrar no Brasil é indispensável pleitear, junto ao Presi- Dr. Macedo Soares é católico praticante, e dotado de real espírito de justiça. !

dente da República, a revogação do seu decreto anterior de expulsão. Assegurou-me, assim, que não consentirá que os presos pol(ticos sofram cercea-
Bem compreenderá a Sra. que não será tarefa fácil o conseguir um ato mentos não autorizados pela legislação penal do País, e que não encontrem jus- (
desta natureza. tificativas racionais em face da segurança do regime. (I,
Tenho para mim- como muito mais viável esta solução, que ora lhe apre- Pretendo procurar logo à tarde o Sr. Ministro da Justiça para saber de
sento, baseado no art, 21 da lei n9 136, de 14 de dezembro de 1935, que deter- S. Exa. quais as me.didas que deliberou tomar em face da situação em que en- (
mina, "FICA SUJEITO À EXPULSÃO IMEDIATA O ESTRANGEIRO, mesmo controu, no quartel da Polícia Especial, o seu irmão.
proprietário de imóveis, que praticar qualquer dos crimes definidos nesta ou na
(
Na próxima carta, comunicar-Ihe-ei tudo quanto tiver ocorrido entre a
Lei n9 38 ... ". ('fi
data de hoje e a em que lhe for escrever. '-·L·

Na conformidade deste dispositivo, desde que seja confi.rmada, pelo Su-


Acreditando ter-lhe ministrado todas as -informações que mais devem in- (>i
premo· Tribunal Militar, a condenação do seu irmão, estarei em situação de pleite-
teressar o seu coração fraterno, ponho-l!Ie, Como sempre, ao seu inteiro dispor.
ar, até mesmo perante o Poder Judiciário, que o seu irmão seja expulso do País. ir,
Com estima e apreço,
Surge, aqui, um problema, e que_ vem a ser o seguinte: as autoridades bra-
(
sileiras só poderão expulsá-lo para a Alemanha, que é a pátria de origem de
Arthur Ernest Ewert, (
Entretanto, o advogado inglês P. R. Kimber, que· me escreveu em março
do corrente ano, em nome da Sra., me declarou, na carta que tenho em meu Sobral Pinto ( li]
poder, que os governos da França, ou dos Estados Unidos da Américado Norte (
estariam dispostos a acolher, nos seus respectivos territórios, a pessoa de seu ir-
mão, a quem dariam asilo.
Para que, pois, eu fique em condições de solicitar às autoridades brasileiras
(
( .
a imediata expulsão de seu irmão do território nacional, urge que um desses dois
governos dê instruções ao seu Embaixador aqui no sentido de comunicar ele ao
( .
1~
nosso Ministro das Relações Exteriores de que estará disposto a visar o passaporte (
que for expedido em favor de Arthur Ernest Ewert para permitir o seu ingresso (
ou na França ou nos Estados Unidos da América do Norte.
Se a Sra., e os seus amigos de Londres, -a que alude na sua carta de 1 do l
corrente; não derem tais providências, a expulsão de seu irmão terá efeitos con- (
traproducentes, pois determinará a sua ida imediata para a Alemanha. i
Cabe-me, finalmente, dar-lhe, uma boa notícia: temos, no Brasil, um novo
l .
~
Ministro da Justiça. É homem bem mais generoso do que os seus antecessores. ,
I'

Dirigi, por isto, a S. Exa. uma carta onde expus, com a minha habitual franqueza,
os sofrimentos de seu irmão, e a necessidade, imediata, de-ser melhorada a sua si- C. ~
~
tuação. O Ministro mandou-me chamar, e, de viva voz, narrei todo o longo calvá- C.
rio de Harry Berger. O novo titular prometeu-me_tomar urgentes providências.
E no "Correio da Manhã" de hoje saiu a notícia que vai junta, pela qual a Sra. \f
\.;1
150 151 (i;
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franquias como estas: leitura de um jornal como o -"Jornal do Comércio", e de
livros de caráter científico e histórico; entendimento livre com o seu advogado;
correspondência regular com as pessoas de sua fam{\ja;' passeios diários ao ar
livre.
Informou·me, ainda, o Sr. lristão de Athayde que Harry Berger.permane·
ceria, por mais alguns dias, na Polícia Especial, mas no quarto em que se encontra
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÃDIAPRESTES atualmente o seu filho, sendo-lhe, também, concedidas idênticas franquias.
Para melhor esclarecimento de V. Exa. relativamente a tais assuntos~
Rio de Janeiro, 12 de junho de 1937. junto ã presente um tópico do "Correio da Manhã" de hoje.
Em face destes 'resultados, penso, Exma. Sra., que não foram de todo inú-
teis os meus modestos esforços. Diz·me a consciência que tudo quanto estava ao
meu alcance fazer ~m benefício dos meus. clientesex·officioeu fiz, destemeroso e
Exma. Sra.
verdadeiro. Obstáculo nenhum foi capaz.de deter a minha atuação profissional. E,
D. Leocádia Prestes. agora, quando anuncio a V. Exa. todos estes resultados, eu sinto quão maravi-
Desde a semana passada que seu filho está de posse da madeixa dos cabelos lhosa e incoercível é a força da Fé religiosa nas virtudes infinitas de N. S. Jesus
da sua netinha, Anita Leocádia, que V. Exa. me remeteu com a carta de 29 do Cristo. Foi nos Seus exemplos de renúncia que eu, por entre as misérias dos meus
mês passado. pecadosl fui buscar o modelo das minhas atitudes, pálidas na minha imitação, mas
Comunico, igualmente, a V. Exa., que já está em meu poder a sua carta de brilhantes nas origens de que elas promanam.
5 do' corrente, em resposta à que dirigi a V. Exa. naquela mesma data de 29 de Pode estar certa, Exma. Sra., de que a vitória que alcançamos, eu e V.
maio findo. Exa., ~ que tanto almejávamos, inspirando-nos apenas nos salutares princípios
Pretendo dirigir-me, logo à tarde, ao Quartel da Polícia Especial, para en- da Justiça, si3rá, para mim, um alento para novas energias, para novos esforços,
tender-me com Luiz Carlos Prestes. para novo~ clamores, a fim de que possamos o.bter êxitos mais'brilhantes daqui por
É com o coração em festa que participo a V. Exa. a profunda alteração diante.
que já sofreu o regime carcerário de" seu filho, e de seu companheiro Harry Berger. Desobrigando-me do compromisso que assumi na última carta que dirigi
A investidura do Sr. José Carlos de Macedo Soares na pasta da Justiça teve a vir. a V. Exa., mando, com esta, cópia das minhas Razões de Apelação
tude de alterar, para melhor, a orientação das autoridades brasileiras, no que se Chegou, neste instante, a minha vez de merecer um favor' de V. Exa., e que
refere à repressão dos fatos ocorridos no país em novembro de 1935. vem a ser: peço que me inform.e o qué o Sr. David Levinson declarou a alguns jor-
No desempenho da minha função de advogado ex-officío de Luiz Carlos nais de Paris. Se não for muito penoso para V. Exa., ousaria solicitar que me r.eme·
Prestes e Harry Berger escrevi, em 3 do corrente, ao Sr. Macedo Soares a carta, tesse o texto integrai dessas notícias. É que os jornais daqui têm feito alusões a
cuja cópia ora remeto a V. Exa. Quatro ou cinco dias após a entrega desta mis- estas comunicações do ,Sr. David Levinson, fazendo resumos que dão a entender
siva o Sr. Ministro da. Justiça fez·me chamar, por intermédio de um amigo comum, que o Sr. David Levinson, dizendo-se homem de excepcional corag"em, foi conside·
a fim de melhor se esclarecer sobre a matéria por mim focalizada na carta em ques- rado pelo Governo Brasileiro como advogado capaz de criar às autoridades brasi·
tão. leiras sérias dificuldades. Da( pode-se deduzir que os advogados brasileiros, nesta
Dessa conferência, que tivemos, resultou a visita pessoal do Sr. Macedo hora sombria que tivemos de atravessar, não se animaram a cumprir a sl.!a missão
Soares ao aludido Quartel, e que foi noticiada no uDiárío de NotIcias", de hoje, de nobreza destemerosâ.
nos termos do tópico, que passo, também, às mãos de V. Exa. Como não me animo a fazer' ju (zos temerários, nem a praticar injustiças,
Ontem, à noite l o mesmo amigo comum supra mencionado , e que outro gostaria de conhecer, com fidelidade e exatidão, as declarações do Sr. David
não é senão o Sr. Tristão de Athayde (Alceu de Amoroso Lima), me participou, Levinson, para, na hipótese de constituirem elas ofe'nsa â verdade, dirigir-me, em
da parte do Sr. Ministro da Justiça, que Luiz Carlos Prestes será transferido, ama- termos adequados, a este meu colega de Filadélfia.
nhã ou segunda-feira, para a Casa de Correção, dessa Capital, onde lhe serão dadas Continuando, como sempre, à inteira disposição de V. Exa., aguardo as
novas determinações de V. Exa. Respeitosamente,' Sobral Pinto
152
153
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sileiros, resguardar, com entranhado patriotismo, é que me tenho detido nesta em~ C
preitada, que se me vem apresentando, dia mais dia, como iminente. CF
Mas, Eminência, o. cumprimento do dever impõe obrigações a que em cons-
ciência não nos podemos furtar. E, nestas noites frias de junho e de julho, quando ('"
me vejo, e aos filhos, no aconchego reconfortante dos nossos leitos, protegidos (,:,
contra a temperatura baixa pelos cobertores que nos envolvem, o meu pensamento,
agoniado e opresso, voa para junto de Harry Berger que eu sei, de ciência própria, (
CARTA DE SOBRAL PINTO AO CARDEAL DOM SEBASTIÃO que está sobre o lagedo, sem roupa fi sem coberta. (
LEME, DE 3.7.37. Bem pode imaginar V. Eminência, a tristeza que me invadiu quando ouvi
do Sr. Ministro da Justiça a declaração de que não tinha forças para fazer retirar, (
imediatamente, Harry Berger das mãos implacáveis dos seus algozes. Talvez... (
d'aqui a uns vinte dias fosse possrvel aS. Exa. providenciar esta transferência.
Não, Eminência, não e não. Eu não me conformo com esta demora. Seria (
Eminência. t
uma deserção, sobretudo quando o Sr. Ministro da Justiça me declarou que a
transferência de Luiz Carlos Prestes iria ser efetuada amanhã, à noite. Tremo de ('
Apesar de saber quanto seria grato ao seu coração de Pastor intervir jun- pavor,Emiriência, ao pensar que Harry Berger, já quase morto, como o Sr.- Minis-
to às autoridades J)rasileiras para que fizessem cessar, incontinenti, as maldades e tro da Justiça teve ocasião de verificar pessoalmente, vai ficar entregue à sanha dos (
as torturas indesáitíveis que vêm sendo aplicadas, deliberada e sistematicamente, seus algozes, sem a fiscalização do seu companheiro. (
contra o comunista Harry Berger, confiado ao meu patroc{nio ex-officio, não quis Exatamente para impedir semelhante ameaça para os restos de vida de
nunca, até agora, recorrer ao'auxmo eficaz de V. Eminência. t. que confiava no vi- Harry Berger foi que dirigi, em 17 do mês p. findo, ao Sr. José Carlos de Macedo (
gor das minhas reclamações, e na força, incoercível, da minha argumentação cerra· Soares a carta de que envio, neste instante, a V. Eminência, cópia integral. (
da. Nada justifica, Eminência, esta permanência de Harry Berger no Quartel da
a entendimento que ontem tive com o Sr. Ministro da Justiça, convenceu· Polrcia Especial. Na Casa de Correção já estão prontas as instalãções para ambos os ('
me, entretanto, de que não me restará outro caminho senão ir bater às portas do presos confiados ao meu patrocrnio ex-offieio. (
Judiciário, a fim de que seja cessada, uma vez por todas, esta obra de crueldade. É Nesta grave conjuntura, venhó apelar, como último recurso, para V. Emi-
que a boa vontade e o espírito de justiça do Sr. José Carlos de Macedo Soares es- nência. Representante de Jesus Cristo, nesta Arquidioeese, V. Eminência, melhor (
tão esbarrando na dureza irredutível do Sr. Capitão-Chefe de Polícia, que, auxilia- do que ninguém, poderá, no exercício do seu munus pastoral, chamar à razão os (
do pelas autoridades militares, se dispõe a levar avante a sua sinistra empreitada de nossos governantes, fazendo-lhes ver que ódio nada constrói, e que a maldade traz
não deixar que Harry Berger saia das suas garras senão morto. sempre, no seu bojo, o gérmen da morte e da destruição. Use, Eminência, - eu su- li
Não quero e não devo, Eminência, criar a menor dificuldade aos poderes plico como advogado cristão -, de todo o seu prestrgio junto ao Exmo. Sr. Presi- ( ~
públicos do meu país no que diz respeito à sua superior missão de vigiar e resguar- dente da República, para, como Pastor de almas, m9strar ao primeiro magistl'ado
dar a ordem pública. Não me assiste, assim, o direito de desvendar aos olhos da do nosso país, que, à sombra de sua autoridade, os agentes do Poder Público nes- l ~
Nação, num debate judiciário público, as monstruosidades diabólicas que o Poder ta Capital estão matando, aos poucos, num suplício alucinante, a uma desprotegi- (~j
Público brasileiro, nas horas sombrias do Estado de Guerra, praticou impunemente da criatura humana. l
contra uma criatura humana que se viu reduzida a uma tal condição de indignida- Aí fica, Eminência, o meu último e derradeiro apelo.
de ede humilhação que encheria de revolta a qualquer coração bem formado que Por Deus, não me repila.
(
pr~~enciasse a sua aplicação até mesmo a um cão hidrófobo. No dia, Eminência, em Autorizando V. Eminência a fazer desta o uso que lhe parecer necessário,
que eu for bater âs portas do Juçticiário para narrar, com a minha autoridade mo- beija-lhe, filial e respeitoso, as mãos sagradas, o sempre seu. "( ,
ral,as infâmias levadas a efeito contra Harry Berger, posso asseverar a V. Eminência I,I
que será o primeiro golpe fundo contra a moralidade da nossa administração.
Sobral Pinto \
Olhando para o futuro do Brasil, que me cabe, como a todos e a cada um dos bra· Rio, 3/ Julho/ 937.
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Estes fatos, que o Suplicante está trazendo, por escrito, ao conhecimento ['
de V. Exa., assumem, neste momento, aspecto de particular gravidade, porque li
são de molde a prejudicar o valor e a credibilidade da própria palavra oficial.
Com efeito, o Exmo. Sr. Presidente da República, dirigindo-se ao Con- II
gresso Nacional, em maio de 1936, dizia: "Como Se conduziram as autoridades
na dif(cil emergência - a moderação que não exclue a energia, a prudência que
não diminue o zelo - está no esp(rjto de todos e na memória da população. Ape-
CARTA DE SOBRAL PINTO AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, sar da insólita brutali.dade dos atentados praticados contra a unidade nacional, da
GETÚLIO DORNELLES VARGAS, DE 8.7.37. felonia e perversa indiferença que revelaram os amotinados, não houve qualquer-
excesso por parte do Poder Público que não utilizou sequer, em toda a sua pleni-
tude, as franquias ~ncedidas pelo Poder Legislativo, procurando, apenas, deter e
punir os responsáveis, declarados e reconhecidos.
Exmo. Sr. Presidente da República. O Poder Executivo, deixando mesmo de atender ã justa indignação das
classes conservadoras, manteve-se sempre sereno, não impondo castigos nem
procurando servir-se do momento para aniquilar os vencidos" (Publicação número
Advogado ex-officio de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger por nomeação 3 do Departamento Nacional de Propaganda, pág. 13).
do Juiz Dr. Raul Machado e indicação anterior do Conselho da Ordem dos Advo- Tempos após, S. Exa., voltando a tratar do assunto, asseverava no discurso
gados da Seção deste Distrito Federal, venho, como último recurso administrativo, que, ao regressar de Petrópolis, proferiu, em Benfica: "Como procedeu o Governo,
antes de bater às portas do Judiciário, pleitear perante o Primeiro Magistrado de para salvaguardar as instituições, está no conhecimento e na memória de todos:-
meu país que as sanções até agora exercidas contra os meus clientes ex-officio per- com rigor sem desumanidade, firme, sem excessos" (Publicação número 4 do De·
cam o seu aspecto de perseguição odienta, para se revestirem do caráter de uma partamento Nacional de Propaganda, pág. 6).
obra de justiça serena.
E para que nenhuma dúvida pudesse pairar no espírito de todos os cida-
Antes de vir à presença de·V. Exa. envidei todos os esforços ao alcance da
dãos, sobre a serenidade dos órgãos do Poder Executivo, o Primeiro Magistrado da
minha modesta capacidade profissional, a fim de convencer às autoridades policiais Nação, com o peso de sua incontestada e incontestável autoridade, acrescentou:
desta Capital, que tin.ham sob a sua guarda Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, de I
'11
(lbid., pág. 10): "Posso afirmar-vos que, até agora, todos os detidos são tratados
que deviam fazer cessar, imedi.atamente, as torturas morais que vinham aplicando com benignidade·, atitude esta contrastante com os processos de violência que eles
contra estes dois presos polftícos, e os suplfcios físicos indescritíveis, que estavam apregoam e sistematicamente praticam. Esse procedimento magnânimo não traduz II
1"
a infligir a Harry Berger, que se vira reduzido à humilhante condição de animal hi- fraqueza. Pelo contrário, é próprio dos fortes que nunca se amesquinham na luta i
drófobo. e sabem manter, com igual inteireza, o deste mor e o sentimento de justiça huma-
Como, em fins de janei;o do corrente ano, o Juiz Dr. Raul Machado me in- na", II
I
deferisse a petição em que solicitava a remoção de Harry Berger para outro local Ora, Sr. Juiz, o Tribunal de Segurança Nacional, mais do que qualquer ou-
apropriado à sua rigorosa reclusão, voltei a insistir no mesmo pedido, junto a esse tra instituição do país, deve honrar a palavra do Exmo. Sr. Presidente da Repúbli-
Juiz, alegando, além dos princfpios de justiça que invocava, mais os seguintes mo· ca, que, em circunstâncias tão solenes, - como já foi acentuado -, assegurou, rei-
teradamente, ~ toda a Nação, que nenhum preso político seria tratado com desu·
Ili,
tivos:li • •num país que se rege por uma tal legislação, que os Magistrados tim-
"
I:
manidade".
bram em aplicar, para, deste modo, resguardarem os próprios animais' irracionais
do.s maus tratos até de seus donos, não é poss(vel que Harry Berger permaneça, co~
Tomando conhecimento deste novo pedido meu, o Juiz Dr. Raul Machado I!
I
acabou, afinal, por deferi-lo, dando ordens, logo a seguir, ao Sr. Capitão-Chefe de
mo até agora, meses e meses a fio, com a· anuência do Tribunal de Segurança Na- Polícia, para que fizesse transferir para a Casa de Detenção o meu cliente ex-of- I
cional, dentro de um socavão de escada, privado de ar, de luz e de espaço, envolto, ficio Harry Berger. I;
além do mais, em andrajos, que pela sua imundfcie, os próprios mendigos recusa- Pois bem, Excelência, até esta data, o Sr. Capitão-Chefe de Polícia timbrou
riam a vestir. em desacatar, ostensiva e arrogantemente, esta ordem do Juiz Dr. Raul Machado,

156 157
(
,
que, apesar das minhas constantes e repetidas reclamações, não se animou a afron- o atual Sr. Ministro da Justiça teve ocasião de verificar, pessoalmente, tu- (
tar a resistência ilegal do executor do.Estado de Guerra nesta capital. do quanto estou a informar, agora, a V. Exa .. Disposto a ser, na realidade, verda- 'i
("
Inutilmente me dirigi ao Conselho da Ordem e ao Sr. Ministro da Justiça deiro Ministro da Justiça, S. Exa. mandou preparar na Casa de Correção desta Ca-
de então. Tudo permaneceu na mesma. E, deste modo, o Sr. Capitão-Chefe de Po- pital instalações, seguras e higiênicas, para servirem de prisão.a Luiz Carlos Prestes (
I(cia, esquecido de que tirava é repressão do comunismo toda a sua justificação e Harry Berger , que se sentiriam, deste modo, restitUl'dos à sua condição de cria- (
legal, era o primeiro a dar ao pafs o exemplo do desrespeito ã lei e do desacato à turas racionais.
própria Justiça Especial, pois, como V. Exa. não ignora, o art_ 212 da Gonsolida- Estas instalações, ExcelênCia, estão prontas desde 26 do mês passado, co·
ção das Leis Penais, aprovada eadotada pelo decreto número 22.213, de 14 de mo tive a oportunidade de verificar em pessoa. (
dezembro de 1932, não tolera que a execução de uma ordem judicial seja retar· Entretanto, apesar da boa vontade do Sr. Ministro da Justiça, a transfe-
('
dada por aquele que recebe a incumbência de fazê-Ia cumprir. rência de Luiz Carlos Prestes e de Harry Berger não se efetuou. .
Não desanimando na tarefa de chamar à razão as nossas autoridades po- Na esperança de que V. Exa. não consentirá que a palavra autorizada do [
lici~is, dirigi-me ao ·atual. Sr. Ministro da Justiça no dia da sua posse, para, em
Chefe da Nação continue, como até agora, a ser desprestigiada e desvalorizada
(
traços pálidos, descrever os maus tratos físicos e morais de que vêm sendo as pela ação ilegal e abusiva dos agentes subalternos do Poder Público, aqui fica o
vítimas inermes, nas mãos dos seus carcereiros implacáveis, Harry Berger e Luiz meu apelo em favor de Luiz Carlos Prestes e de Harry Berger, que têm direito (
a serem tratados como membros da famma humana.
Carlos Prestes. Em carta que escrevi a S. Exa., mostrei que Harry Berger está (.
metido, desde abril do ano passado, no socavão de uma escada, sem luz, sem ar Como homem, como cristão, como brasileiro, e como advogado venho a-
firmar na presença do Exmo. Sr. Presidente da República do meu país que Luiz (
renovado, e sem a menor possibilidade de se locomover. Aí permanece dia e noi-
te, privado de cama, de cadeira, de banco, de mesa, de roupas e de higiene. Nada Carlos Prestes e Harry Berger não se viram, até este instante, a braços com l:lma (
lhe dão, nem mesmo a alimentação indispensável. Por isto, Excelência, de robusto obra de justiça. As sanções brutais e desumanas que lhes têm· sido· aplicadas nada
têm que se pareça com uma obra desta natureza. O que fizeram e estão fazendo (
que era, Harry Berger, - reduzido a pele e osso -, se transformou numa sombra
de homem. contra eles foi e está sendo empreitada sinistra de aniquilamento físico e moral. (
Ponha, Excelência, paradeiro definitivo a esta empreitada de ódio. Por
Não satisfeitos com estes supl(cios físicos, aplicados, fria e conscientemen- amor às nossas tradições de povo cristão, faça V. Exa. que seja respeitada ao me- (
te, a ·Harry Berger, os agentes de pai (cia do Governo de V. Exa., infligem torturas nos a determinação da própria Justiça Especial, que, por intermédio do Juiz Dr. (
morais alucinantes aos meus clientes ex-officio mantendo-os dentro da mais ab- Raul Machado, já proferiu, neste episódio lamentável, a sua decisão definitiva.
soluta e rigorosa incomunicabilidade, hoje suavizada apenas relativamente a Luiz (
Autorizando V. Exa. a fazer desta o uso que melhor convier ao seu Gover-
Carlos Prestes pela correspondência que a este é permitido ter com·a sua mãe e a no, rendo a V. Exa. as homenagens do meu respeito e da minha consideração. (
Sua mulher, que se acham, atualmente, em Paris e em Berlim, respectivamente. Sobral Pinto
Exclu(do o meu entendimento pessoal, - e sempre na presença de um agente do (
Advogado ex-afficia
Poder Público -, Luiz Carlos Prestes e Harry Berger são conservados, permanen- (
temente, fora de todo e qualquer convívio humano, e dentro de um tal isolamento Rio de Janeiro, 08 de julho de 1937.
que não sei como ainda não enlouqueceram; Nada lêem: nem jornais, nem revistas,
nem livros. De nada sabem, porque há proibição absoluta de os informar sobre \
qualquer coisa do mundo exterior. Não vêem, nessa prisão rigorosa, senão os seus
I
habituais carcereiros. "
ASSIm, Exmo. Sr. Presidente da República, enquanto que V. Exa. empe- (
nhava solenemente, até em atos oficiais, a palavra austera do Primeiro Magistrado (
da Nação de que o Poder Público não impusera castigos, nem procurara aniquilar
os vencidos, os executores do Estado de Guerra, opondo fqrmal desmentido âs l"
asseverações de V. Exa, reduziam os meus clientes ex-officia à situação que acabô (
"
de descrever.

158 159
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~

Pelo correio aéreo de quinta-feira porei V. -Exa. inteiramente a par de todas


as providências que houver firmado com o Dr. Lassance para beneficiar o seu filho.
D'aqui por diante espero firmemente em Deus que tudo irá melhorando, de
modo que V. Exa., além dos sofrimentos produzidos pela separação e pela"prisão
em si de seu filho, não terá mais motivos para inquietações quanto ao tratamento
carcerário de Luiz Carlos Prestes. Continuando, como sempre, às suas ordens,
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOcADIA PRESTES.
Rio, 10 de julho de 1937. Sobral Pinto

Exma. Sra.
D. Leocádia Prestes

Meus parabéns. Desde anteontem que o seu filho se encontra na Casa de


Correção, recolhido no local que o Sr. Ministro da Justiça- mandou_ preparar para
ele e para f!arry Berger. Com ,ele estive horas após a sua transferência. Mostrava-se
satisfeito com o fato, ... se é que é possível a seu filho ter alguma satJsfação no
meio de tantos reveses. Em todo o caso disse-me que considerava a sua remoção
para a Casa de Correção mais do que um grande alívio físico e moral, porque nela.
havia uma grande vitória.
Para' dar C) V. Exa. uma impressão de co mó essa transferência se efetuou,
envio a publicação feita a respeito pelo "Diário de Notícias""de ontem. Com pe-
quenas adulterações, próprias de todo e qualquer noticiário jornalfstico, foi isto
narrado no recorte junto o que se passou, mais ou menos.
Na SUa nova prisão Luiz Carlos Prestes sente-se restituído à sua dignidade
humana. A administração do presídio mostra-se à altura dos seus deveres penosos.
Trata-o com o respeito e a consideração que um preso político deve de merecer
sempre das autoridades administrativas. Para dar a V. Exa. uma idéia da mudança
radical do regime carcerário basta-me comunicar a V. Exa. que, desde o seu ingres-
so na Casa de Correção, que o seu filho está lendo quase todos os jornais que se
editam nesta Capital.
Logo à tarde irei novamente ã Casa de Correção, não só para fazer a mi-
nha habitual visita semanal a seu filho, como também para combinar com o Dire-
tor do presídio, Dr. Carlos Lassance~ uma série de providências capazes de suavi·
zarem os rigores da prisão do meu cliente ex-officio. Na ligeira palestra que manti-
vemos anteontem, o Dr. Lassance e eu, combinamos tratar da questão dos livros
a ler. e do fornecimento de dinheiro e objetos indispensáveis ao uso diário .de
seu filho, por ocasião da minha ida hoje à Casa de Correção.

160
161
,( '
tia que a Polícia desta Capital apreendeu em poder dele, por ocasião da sua prisão. (,
V
Julgo que pelo próximo correio aéreo estarei em condições de informar a V. Exa.
(~
sobre o despacho que tal requerimento mereceu do Ex·mo. Sr. José Carlos de Ma- (·'r)
cedo Soares. . i
Tenho a dizer, igualmente, a V. Exa.que encaminhei ao Sr. Ministro Rela- C':
tor da apelação crime n94.899, que contém o recurso que interpus para o Supre-
rT).o Tribunal Militar da sentença qu~ condenou seu filho, a petição em que pedi a (
junção aos autos das"cartas que V. Exa.dirigiu aos Ju(zes do Tribunal de Seguran- (
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÃDIA PRESTES.
ça Nacional, e aos Ministros do referido Supremo Tribunal Militar. Para conheci-
mento de V. Exa.,envio, com esta, uma cópia da mencionada petição. (
Rio. 17 de julho de 1937. Como vê V. Exa.,tudo venho fazendo, nos momentos oportunos, para sua· (
vizar a situação penosa de seu filho. Se mais não·tenho feito é porque ou não dis-
ponho de elementos capazes de me ajúdarem, ou as deficiências da minha modesta C
Exma. Sra. capacidade não me perinitem apreender ,por entre a comple.xidade da sua átuação, i
O. Leocádia Prestes. o verdadeiro sentido do pensamento e dos .propósitos exatos de ~uiz Carlos Pres·
("
Por que me pedir desculpas pela demora com que V. Exa. respondeu as teso O'aí os equívocos de que fala V. Exa., na carta a que respondo, sobre a
minhas cartas de 12 e 19 de junho p. findo? Quando insisto junto de V. Exa.para natureza real dos acontecimentos·de 27 de novembro de 1935, ne,sta Capital. (
que acuse o recebimento da minha correspondência é porque ela leva sempre a V. Como V. Exa. naõ ignora, Luiz Carlos Prestes proibiu, terminante e catego·
(
Exa. alguma noHeia que interessa ao seu coração materno. Não devo, assim, permi· ri~amente, que eu apresentasse, em seu/avor, qualquer defesa. E na carta que a V.

tir que, de. minha parte, venha a .se interromper a continuidade das informações Exa. dirigiu o Or. Eugênio Carvalho do Nascimento dizia ele em 10 de maio do cor· (
rente ano: "Como sabe, Prestes não vem se defendendo e nem pretende defender-
que V. Exa.,como D. Minna Ewert, precisam de receber a respeito de tudo quanto (
acontece, entre nós, relativamente à vida carcerária de Luiz Carlos Prestes edeHar. se do crime político, pelo qual foi condenado no Tribunal de Segurança". Fiquei
ry Berger, bem como ao· processo crime em que foram envolvidos. entregue, assim, às minhas próprias forças, obrigado ou a cruzar os braços, silen· \
Aquiete-se, pois, V. Exa. O atraso com que V. Exa.me respondeu não me cioso, ou, então, a explicar ao País, e sob a só responsabilidade da minha perso-
( 'i]
nalidade, os motivos que levavam o meu cliente ex-officio a não se defender da
trouxe quaisquer prejuízos ou contrariedades, não merecendo. por isto, nenhuma
lamentação de sua parte. A carta de V. Exa.,datada de 10 do corrente, veio no mo- acusação que lhe estava sendo movida. Nesta alternativa, a comodidade me indica- «
mento opoytuno, porque já preparara todos os documentos e recortes de jornais. va o primeiro caminho, que eu poderia trilhar e retrilhar com seguran.ça tanto ,
{

que tinham acompanhado as minhas cartas de 12 e 19 de junho p. tindo. para fa- ma.ior quanto as regras profissionais não o desautorizam, nem condenam.
(
zê.los seguir pelo correio aéreo de hoje. Repugnava, porém, ao meu espírito justiceiro tomar o rumo desta inércia,
Cabe· me, outrossim, comunicar a V. Exa.que, juntamente com os cabelos quando eu via o seu· filho entregue à sanha dê seus implacáveis perseguidores, nos (
da sua neta Anita Leocádia, entreguei a seu filho a carta que a sua nora, Olga Pres- quais eu percebia uma inspiração subalterna· de esmagamento do adversário venci-

:!
tes, a ele dirigiu em 15 de maio do corrente ano. do, e não o anseio superior de uma obra de justiça a ser levada a efeito com ener·
A situação carcerária de seu filho melhorou de maneira considerável, como gia, mas, também, com dignidade e com serenidade.
V. Exa,já foi informada pelas notícias que lhe mandamos seu filho e eu, em cartas Certo, penoso e árduo seria o segundo caminho. Seguindo-o eu ter!a de tra·
que escrevemos, pelo avião de 10 deste mês. Neste sentido tive até a oportunidade
de dirigir ao "0 IMPARCIAL", desta Capital. a carta de qUe dá notícia o recor·te
balhar intensa·mente. A cada passo iria tropeçar em aborrecimentos pessoais e pro-
fissionais de todo o gênero;
;I
\. -'

junto, que destaquei desse órgão de publicidade, na sua edição de 13 do corrente. Deliberei, entretanto, afrontar todos os riscos, para só dar ouvidos aos dita- (..
Animado com este sopro·de justiça, que ora areja o ambiente político do mes da minha consciência de advogado católico. Entregue ao meu patrocínio
,
País, dirigi ao Sr. Ministro da Justiça a petição de que ora envio a V. Exa.a respec- ex--officio estava u~ semelhante meu, que fora espoliada· dos seus direitos mais \.

tiva cópia, para requerer que fosse entregue ao Diretor c;Ja Casa de Correção, à dis· elementares. Cumpria acudi-lo com os· recursos da minba minguada capacidade
profissional. Foi o que fiz, indiferente às censuras de uns, e surdo às mofas de ou·
\
posição de seu filho, que a aplicaria aos fins permitidos pela lei carcerária. a quan- 1I

162
163 '1
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(
\
tros, que chegaram a me classificar de intrometido pelo fato de estar a reivindicar lação, deixei-me conduzir tão só por explanações teóricas feitas, oficialmente, no
para Luiz Carlo,s Prestes, e contra a sua expressa vontade, garantias que ele não VII Congresso da Internacional Comunista. Como V. Exafnão ignora, no folheto
estava a reclamar. intitulado "Deux Discours", Maurice Thorez figura, à fI. 42, dizendo: "Nós, co~
Não me arrependi, não me arrependo, e espero em Deus que não me arre- munistas, lutamos pelo poder dos soviets, pela ditadura do proletariado. Sabemos
penderei da atitude que assumi, até agora, e que continuarei a manter até o fi'm da que é o único meio de acabar para sempre com a crise, a miséria, o fascismo, e a
jornada, relativamente à minha intervenção COmO advogado neste processo instau- guerra. Mas, sabemos também que, para o momento, uma minoria somente da
rado contra aqueles que, justa ou injusta'!1ente, foram declarados cabeças ou co- classe operária, e, sobretudo, uma minoria somente do povo de França, partilha
réus do movimento de 27 de novembro de 1935. Ê que agi norteado pelo nobre da nossa convicção, e. se bate com a firme vontade de estabelecer o poder dos so-
ideal cristão de ajudar, na medida das minhas poucas forças, os meus semelhantes viets. Eis porque o poder dos soviets não pode constituir o fim imediato da nossa
que estavam sofrendo, e que ou apelaram para mim, como aconteceu com o Barre- luta atual. Mas, sendo a minoria, podemos e devemos dirigir a maioria do pa(s que
to Leite Filho, o Roberto Sisson, e outros, ou que foram entregues ao meu está resolvida a evita.r, por qualquer preço, o estabelecimento de uma ditadura fas-
patroc(nio ex-officio. como Luiz Carlos Prestes, Harry Berger, e outros. cista, podemos e devemos convencer às massas, na luta e na base da sua própria ex-
Atravessei, Exma. Srê:., horas amargas e penosas. Deus que lê nos corações periêncía, da necessidade de chegar ~ república dos soviets".
sabe o que sofri, e.o que estou sofrendo. De tudo me dou, porém, por bem pago, Assim, Exma. Sra. a luta pela democracia e pela libertação nacional de que
porque nada mais fiz do que cumprir, com firmeza, os deveres que a consciência me fala na sua carta de 10 de julho era apenas uma fase da revolução social no
me apontava. E, para coroar o meu contentamento interior, sei que V. ·Exa.e os Brasil. Alcançada a vitória, no momento de novembro de 1935, na base de uma
seus exp~rii'nentaram, com a.minha atuação, a consolação de poderem se entender frente única, Como fator polftico, Luiz Carlos Prestes não ficaria satisfeito coni a
com Luiz Carlos Prestes, que viram, afinal, restitufdo à sua dignidade de pessoa aplicação dos postulados preconizados pela sua campanhademo"crática de liberta-
humana, por isto que o sabem hoje bem tratado. ção nacional,.de que se fizera, entre nós, a pregoeira leg(tima a Aliança Nacional
Hão de me perdoar, por isto, os equfvocos de que me fiz o autor incons- Libertadora. Empunhando nas mãos o poder pof(tico, Luiz Carlos Prestes esforçar~
ciente nas minhas Razões de apelação sobre o "caráter da luta" que Luiz Carlos se-ia para atingir a segunda' fase da revolução social. e, uma vez transposto este se-
Prestes vem chefiando entre nós. gundo marco, marcharia resolutamente até alcançar a meta final, isto é, a ditadura
Até recentemente seu filho e eu nunca abordamos este assunto. Sempre do proletariado. Não sou eu quem o diz, mas· Van Min, na sua fala ao já menciona-
achei, desde o nosso primeiro encontro, que não me assistia o direito de provocar do VII Congresso Mundial da Internacional Comunista. Ar ( Le Front Unique dans
manifestações de Luiz Carlos Prestes sobre a {ndole e o caráter das suas iniciativas, les pays coloniaux, pág. 39) diz o vigoroso comunista: "Nas condições de um pars
no nosso meio, em" prol da revolução social. Por força da proibição que me fizera tal qual o Brasil, onde uma aliança de libertação nacional já está criada, conti-
de defendê-lo no processo instaurado perante o Tribunal de Segurança Nacional, nuando-se a aplicar de maneira justa e ousada a tática da frente popular anti-impe-
minha atuação teria de se restringir às reivindicações que todo o homem deve fa- rialista, facilita-se ao Partido Comunista a sua lúta e a vitória da revolução quanto
zer como membro da espécie humana. E, na qualidade de advogado, achando-me à fase da frente nacional, prepara-se o terreno para o desenvolvimento ulterior da
diante de uma condenação que,a meu ver, desrespeita dispositivos claros da nossa revolução na fase seguinte, mais elevada, isto é, facilita-se a luta do Partido Comu-
legislação penal. incumbia-me mostrar, à luz de documentos comunistas de auten- nista que via dar ao povo brasileiro uma perspectiva da instauração do poder sovié-
ticidade indiscutida, e da nossa o.rganização jur(dica, que todos os atos atribufdos tico".
a Luiz Cartas Prestes, na sentença de condenação, são meros reflexos da sua ideolo· Foram estas, Exma. Sra., as orientações que eu segui para mostrar que to-
jia revolucíonária. Não há como distingui-los, classificando a uns como executa- dos os atos de Luiz Carlos Prestes estavam unificados pelo seu ideal de pregoeiro,
dos, constituindo, por isto, o crime do art. 1? da lei n? 38, de 4 de Abril de convicto, da revolução social de tipo comunista no nosso amado Brasil.
1935; e a outros como mera preparação de nova revolução, e, como tais, passfveis
d'as sanções do art. 49 da mesma lei. Como jurista, que sou, e me honro de ser, cabia-me mostrar ao Supremo
Acha V. Exa, - que é nisto também secundada por seu filho -, que detur- rribunal Militar que não há que separar, na atividade de Luiz Carlos Prestes, os
pei a natureza 'da luta poll'tica levada a efeito pelo meu cliente eXaofficio. atos anteriores a 27 de Novembro de 1935 dos atos que são posteriores a essa da-
É possfvel que assista razão a V. Exa, e a seu filho. Não tendo jamais com ta. Tódos são meras expressões de um objetivo final a atingir. Se crime há nesses
este conversado sobre esta matéria, antes de apresentar as referidas Razões de ape- atos, tal crime é um só. e não vários como afirmou o acórdão de que apelei.

164 165
(
Tudo isto, Exma. Sra., eu disse sobre a só responsabilidade do meu nome, (
timbrando em não empenhar nessas afirmações a responsabilidade de seu filho, a
quem procurei, desde o começo, resguardar de todas maneiras, para que não viesse r'"
de futuro a ser prejudicado pela atuação impertinente do seu advogado ex-off(cio. (
Quero ser, no seio da sociedade brasileira, e na esfera modesta e limitada da minha
atuação, um elemento_ de aproximação dos corações, e nunca um fator de maiores r'
divisões do que aquelas que já noS infelicitam. c-~
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOcADIA PRESTES.
Ao escrever a V. Exa.a respeito da campanha de descrédito !lO Brasil, de
Rio, 24 de julho'de 1937. (
que se fizeram autores. pelo menos alguns elementos comunistas, não quiz dizer
que aqui não se maltratavam os presos poll'ticos, envolvidos nos acontecimentos (
de novembro de 1935. V. Exa. s'abe que fui dos mais severos críticos da política (
governamental' quanto a este capítulo. Quis, apenas, dar a V. Exa. as razões pelas ~xma. Sra.
(
quais o Exmo. Sr. José earlos de Macedo Soares-ainda 'não tinha conseguido levar D. Leocádia Prestes.
a efeito a transferência de Luiz Carlos Prestes e de Harry Berger para uma prisão (
mais digna e mais humana. Aquiete-se V.Exa. As reticências da minha carta de 10 do corrente não f
(
Sabemos todos que é impossível fazer, no interior ou no estrangeiro, uma têm a significação que V.Exa. lhes emprestou. Com elas eu quis apenas atenuar o
campanha, em prol dos presos pai íticos, que não descambe para o descrédito do efeito da palavra "satisfeito", por mim empregada ao falar da sensação do seu filho (
povo no seio do qual este mau tratamento é praticado. Nem há que esperar, nes- quando se viu transferido de presídio. Pareceu·me usar de uma expressão desta pa-
(,
sas manifestações de protesto, qualquer espírito sincero de justiça. É que aqueles ra traduzir o sentim~nto interior de um homem que se acha preso não era muito
( :11
mesmo que são oS mais exaltados em E!xigir dos governos autoritários tratamento justo, pois, bastava a só circunstância de se ver Luiz Carlos Prestes separado de sua
humano para os seus partidários, quando se vêem no poder incidem nas mesmas mulher e de sua filha, que nem sequer pôde ainda conhecer, para que não se sinta
(
faltas, que tanto censuram nos outros. nunca ele "satisfeito". As reticências, assim, de que me servi deveriam levar V. Exa.
Nada disto me causa estranheza, nem é de molde a arrefecer o meu esfor- a compreender que a satisfação que o seu filho experimentava era tão somente a (
ço em prol dos perseguidos. Cristão, acredito, firme e serenamente, no dogmã da que decorria da mudança de prisão.
queda. Por isto, onde quer que est.á o homem aí estará, necessariamente, a fraque- E assiste inteira razão a Luiz Carlos Prestes quando se mostra satisfeito ~ :~
za, a tibieza, a contradição e a cegueira. com a sua situação na Casa de Correção. t: que aI' tem ele a liberdade de se correspon- (,

Continuando, com'o sempre, à inteira disposição de V. Exa.,aguardo, res- der livremente com a sua fam(lja; de receber livros, jornais, roupa,- alimentos, e de í, ,
peitoso e solicito, as suas novas ordens. dinheiro; de fazer passeios num pequeno pátio, bem batido pelosol. e para o qual \;~
se abre o seu cubrculo; e de se entender a sós, com o seu advogado ex-officio. ( ,I
Para que V. Exa. tenha exata noção de como tudo se alterou para melhor,
Sobral Pinto
relativamente ao tratamento de seu filho, envio a V. Exa. cópia da minha corres· (,,1'
(,
1 1

pondência com o Sr. Ministro da Justiça, com o Presidente da Ordem dos Advo.
gados, com o Diretor da Cada de Correção, e mesmo com o Comandante da Pai í-
cia Especial. Por estes documentos verificará V. Exa. que nada está faltando, atual-
(;;
mente ao conforto de Luiz Carlos Prestes no presídio a que está recolhido.
. Ouanto à maneira pela qual foi feita a tranferência de seu filho do Quartel ( ,"
da Polrcia Especial para a Casa de Correção, a narrativa feita pelo "Diário de Notr-
cias" não é, de certo modo, fiel, e para isto eu chamei a atenção de V. Exa.,com
dizer que nela havia adulterações. Tendo ontp-m mostrado a Luiz Carlos Prestes a
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carta que V. Exa. me dirigiu em 17 do corrente, pediu·me que descrevesse a V.

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c Nestas condições, ser-me~á I{cito pleitear, junto á administração da Casa.
( Exa., com minúcias, o que se passou, na realidade, e que foi o que se segue: na tar-
de do dia 8 do corrente, o Comandante Queiroz foi ao quarto de seu filho para que o seu filho possa receber a visita dos parentes que aqui tem, e que são, ao que
( dizer-lhe que se preparasse para, naquela noite, ser removido, para a Casa de Corre- eu saiba, os primos cujos nomes se seguem: Dr. Armando Prestes de Menezes,
( ção. Não acreditou ele nesta comunicação, pois, já por duas vezes anteriores ela fo- Sr. Antônio Jacinto Prestes de Menezes e D. Maria Eugênia Guimarães, irmã de
? ra feita sem que os os atos seguissem às palavras. Às 24 horas, mais ou menos, des- ambos, e atualmente casada com o Sr. Hugo Pereira Guimarães, filho do 'Almi-
se dia 8, foi o seu filho acordado pelo Comandante Queiroz, em pessoa, que justi· rante Protógenes Pereira Guimarães, atual Governador do Estado do Rio.
?
ficou aquele seu despertar com a necessidade de transportá-lo, a ele Luiz Carlos Estes primos de Luiz Carlqs Prestes são filhos do Dr. Eugênio Ferreira
, Prestes, para o novo pres(dio; Vestindo-se, seu filho saiu do quarto em companhia de Menezes e de D. _. Gertrudes Antonieta Prestes, - Nenena para os íntimos.
do Comandante Queiroz, que não o deixou carregar a. sua mala, que, por ordem do Esta, - que já faleceu como também o seu marido -, era irmã do_ marido de
mesmo Comandante Queiroz, foi conduzido por uma das praças da Polícia Espe- V. Exa., Dr. Antônio Prestes.
cial. Ao chegarem ao portão que se abre para a rua, ali viu Luiz Carlos Prestes um Vim a saber da existência, aqui, destes sobrinhos de V. Exa., porque o Sr.
carro-forte da Palreia, próprio para o transporte de presos, e, atrás dele, uma "li- Antônio Jacinto Prestes de Menezes, que reside em Niterói, à Praia de Icarai, 499,
mousine". Enquanto a mala era colocada dentro do carro-forte,- Luiz Carlos telefone 1.929, me procurou, há dias, no escritório, para me dizer que ele e o
Prestes entrava na "limousine", na companhia do Comandante Queiroz e de mais irmão dele estavam à minha disposição para me auxiliar no que fosse necessário
três praças da Polícia Especial, todas devidamente armadas. Nessà ocasião, outra para suavizar a prisão de Luiz Carlos Prestes. Deu-me, por ocasião desta visita, o
praça da Pol(eia Especial, munida de um fuzil-metralhadora, foi colocada no carro- Sr. Antonio Jacinto algumas fotografias de famnia, onde se vêemV. Exa., o Dr.
forte. Nenhuma algema foi aplicada, nessa ocasião, aos pulsos de seu filho, que Antônio Prestes, e três filhos de V. Exa., ainda em tenra idade. Levei, anteontem,
não teve, também, ocasião de ver qualquer força armada acompanhar nem o carro- todas estas fotografias a seu filho, que com elas ficou, pois, segundO me disse,
forte, que ia' na frente, nem a "limousine", que àquele 'seguia. Dado o adiantado estava para escrever à Exma. D. Ermelínda de Almeida Felizardo para lhe solicitar
da hora, a cidade estava quase deserta, decorrendo a viage'm sem o menor inciden- se dignasse a ele remeter um retrato de V. Exa. e do Dr. Antônio Prestes.
te. Chegando na Casa de Correção, Luiz Carlos Prestes foi-levado, imediatamente, O seu filho, no que diz respeito às visitas, declarou-me que se tem direito
para o pequeno apartamento, que ali prepararam para ele e para Harry Berger sem 'a se entender com estes parentes, gostaria de recebê· los. Recusaria, entretanto, a
que tivesse, igualmente oportunidade de -ver o menor aparato de força. ver estes primos se esta franquia for concedida em caráter de favor. Adversário
Aí tem V. Exa., com absoluta fidelidade, a descrição da maneira pela qual intransigente dos governantes que dirigem, neste instante, os negócios públicos
_foi feita a transferência de presídio, e, como vê, nada houve de deprimente, nem do Pa(s, não quer, não deve, e não pode merecer deles nenhuma concessão, que
de humilhante para o seu filho. não se revista de um caráter pura e estritamente legal. Só pretende obter fran-
Pela exposição que acabo de fazer, tem agora V. Exa. a certeza de que to- quias que a lei, explícita e formalmente, lhe confira como um direito.
das as reivindicações que formulou na carta que V. Exa. escreveu em 14 de maio
Finalmente, quanto à livre disposição da importância atualmente deposi-
último aO Supremo Tribunal Militar foram atendidas, com exceção das três se-
tada na Tesouraria da Polícia, na carta que escrevei em 17 do corrente, já pus
guintes: transferência de Luiz Carlos Prestes para uma Casa de Saúde, disposição
V. Exa. a par do que estou fazendo.
livre da quantia que se encontra depositada na Tesouraria da Polícia, e recebimen-
Tais são, Exma. Sra. os informes que me incumbe ministrar a V. Exa.
to de visitas de parentes e amigos'.
para a sua necessária tranqüilidade. Pode ficar sossegada. Tudo quanto estiver
Relativamente â transferência para uma Casa de Saúde, seu filho incumbiu- ao meu alcance eu farei para acudir âs necessidades de seu filho. Esta é a minha
me de escrever a V. Exa. de que não vê nisto a menor necessidade. Quanto és visi- norma invariável para com todos os meus clientes. A advocacia é o meu sacerdócio
tas, o regulamento do prédio dispõe que os presos poderão ser visitados tão so~ cristão. Procuro estabelecer entre ela e os preceitos teóricos da moral evangélica
mente pelos pais, pela mulher, e pelos filhos, irmãos e parentes próximos. Tais uma equação perfeita, até onde isto me é permitido pelas fraquezas da minha von-
visitas serão aos sábados, das duas ás- quatro-horas da tarde,.e não deverão durar tade de cristão imperfeito, e pelas deficiências do mOeu entendimento de criatura
mais de 1/4 de hora. Durante a visita o preso será vigiado por um guarda, que fal ível. Boa vontade, em todo o caso, não me falta. É esta que me tem levado a
assistirá á conversação, e não consentirá que se lhe entreguem objetos de qualquer emprestar, nestes últimos dias, a seu filho, alguns livros capazes de o distraírem,
qualidade que seja. com eficiência, na sua prisão penosa.

168 169

j
(~

Uma palavra, para terminar. Não recebi, até agora, as roupas de lã, aliás
desnecessárias, neste momento, pois o tempo aqui tem estado mais para quente /'
do que para frio. Logo que as receba, leva'las-ei, sem demora, sem que corra o ris-
co de aborrecimentos iguais aos que tive com a entrega dos objetos que V. Exa.
para aqui remeteu com a·sua carta de 7 de abril.
Com as minhas homenagens, sempre ao seu dispor.

Sobral Pinto
CARTA DE SOBRAL PINTO A CARLOS LASSANCE,
DIRETOR DA CASA DE CORREÇÃO.
Rio,12deagostode 1937. (
í"
(
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Lassance,
( d,

Com uma carta, escrita de Paris em 4 do corrente, recebi de D. Leocádia (


Prestes, um cheque no valor de 1 :200$000 emitido contra o Bank of London ri'
(
&. South America.
Na segunda-feira última fui a este estabelecimento bancário onde me foi
CI.,
I(
paga a import§ncia em questão. {' \'

De conformidade com o que determinava D. Leocádia Prestes nessa ; I!'


carta de 4 do corrente, descontei todas 'as quantias despendidas por mim em fa- ,
·. Iil
vor de seu filho Luiz Carlos Prestes, e que são as seguintes: 150$000 aos escre- ,(
ventes do Cartório do Tribunal de Segurança Nacional pelas cópias.,que, a meu
pedido, tiraram de num.erasas peças dos autos; 26$000 à minha datilógrafa por C
outras cópias que incumbi de tirar de peças que interessavam a Luiz Carlos Pres- (
tes; e 25$000 de duas certidões que me foram fornecidas pelo Escrivão do Tri·
bunal de Segurança Nacional, Sr. Anôr Margarido. A esta import§ncia de « , . li'
201 $000 cumpre acrescentar mais as seguintes, que fiz em favor de Harry Ber- ~'
ger, e consoante determinação expressa de .Luiz Carlos Prestes: 99$200 cor- ' i~
( , <'
respondentes à aquisição de roupas; 29$000 relativos ao fornecimento de frutas; I
e 20$600 referentes à compra de fumo. Temos, deste modo, um total de (
349$800 gastos por mim. Ficam restando, assim, para Luiz Carlos Prestes, ( 'i
850$200. I
Acontece, porém, que tenno ~m meu poder, e' pertencente a este meu I -!l"
cliente ex-officiã a quóntia de 100$000, que ele me entregou para que eu (I~
• ft
passasse às mãos de D. Júlia Santos, dona da casa da rua Honório, 279, no iVleyer,
onde Luiz Carlos Prestes se havia refugiado, em fins de 1935 oU começo de ,J
1936, quando a Polícia passou a procurá·lo para prendê·lo. · ~
lcll
Foi-me, entretanto, de todo impossível encontrar D. Júlia Santos, apesar
de todos os meus esforços para avi.stá-Ia. Só me resta, assim, o dever de restituir ",
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a Luiz Carlos Prestes essa quantia de 100$000, que, juntada li anterior, perfaz
o total de 950$200, que ora passo às suas mãos, para o efeito de ser levado para
o poder do meu cliente ex-officiQ.
Continuando, como sempre,. ao seu inteiro dispor, envio-lhe o meu cor-
dial abraço.

, I Sobral Pinto
REQUERIMENTO AO RELATOR DA APELAÇÃO CRIME f>t'? 4.899
DE 28.7.37.

Exmo. Sr. Ministro Relator da Apelação-Crime n94.899.

HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, advogado ex·officio de Har-


ry Berget, vem expor e requerer a V. Exa:
No estudo que está fazendo dos autos desta Apelação-Crime n9 4.899 já de-
I';
parou V. Exa., certamente, com inúmeras petições do Suplicante reclamando, com tj
veemência, um tratamento humano para Harry Berger, que se encontrava recolhi-
do no socavão de uma escada, sem cama, sem roupa, sem banco e onde não lhe
~i
era dado sequer gozar nem de luz, natural ou artificial, nem de ar renovado. li
Bate,u o Suplicante a todas as portas. Dirigiu-se ao Juiz Sumariante. ~pelou ~
para' o Presidente do Tribunal de Segurança Nacional. Invocou o auxílio do Conse-
lho da Ordem dos Advogados. Escreveu aO Sr. Ministro da Justiça, antecessor do
atual. Recorreu para o Exmo. Sr. Presidente da República. Tudo foi em vão.
No instante, porém, em que se investiu o Sr. José Carlos Macedo Soares
na pasta da Justiça, o Suplicante se dirigiu a S. Exa. solicitando uma providência
enérgica e imediata capaz de fazer cessar a~ humilhações c os vexames indescri-
trve;s, que vinham sendo sistematicamente infligidos ao meu cliente ex-officio.
Chamando a si, nobremente, um encargo que era sobretudo das autorida-
des judiciárias, - uma vez que trata-se de réu condenado por sentença cujos efei-
tos não são s~spensos pelo recurso interposto -, o Sr. Ministro da Justiça fez trans-
~.,­
~til
ferir Harry Berger para um quarto bom e arejado, onde dispõe de cama, de cober-
tas, de cadeira, e de mesa.
A isto, e tão soment~ a isto se limitaram, até agora, as meqidas r:',oncedidas
ao meu cliente ex-officio. Continuam, entretanto, todas as demais restrições, pois
não lhe permitem qualquer leitura, seja de livros, revistas, ou jornais. Não lhe mi-
nistraram, outrossim, até agora, nem ao mesmo a roupa de uso comum.
Reduzido, por outro lado, a uma desnutrição orgânica alarmante, como já
foi verificada pelo Dr. Miguel Salles, no exame médico a que o submeteu, Harry
I~!
2i

172 173
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\1.
!tl

~
~
.u
Berger necessita de alimentação adequada, único meio, - segundo o Dr. Miguel
Salles declarou pessoalmente ao próprio Suplicante -, de levantar as energias, já
grave e seriamente comprometidas, deste .torturado preso poh'tico.
Não é possível, Sr. Ministro, que'V. Exa.possa cruzar os braços diante des~
ta obra de inqüidade contra um preso que tem, agora, o seu Recurso~Crime nas
r;nãos de V. Exa. Urge uma providência firme e oportuna da parte do Relator desta
Apelação·Crime n94.899.
Tendo bem nítida a noção dos meus deveres e confiando plenamente na CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÃDIA PRESTES.
serenidade justiceira de V. Exa.,o Suplicante vem requerer que se digne de oficiar, Rio de Janeiro, 14 de agosto de 1937. ,
imediatamente, ao Sr. Ministro da Justiça determinando que se sirva de expedir as ("I
\
ordens necessárias ao Sr. Comandante da Polícia Especial, onde se encontra, atual~
('.
mente, Harry Berger, que a este facilite:
1? - a leitura de livros e de um matutino, que, tendo sido indicados e esco~ (li]
Exma. Sra,
Ihidos pelo preso, não tragam risco nenhum para a disciplina do quartel;
21? - o uso da alimentação que for prescrita, nas condições já referidas,
D. Leocádia Prestes.
?
(I
pelo Dr. Miguel Salles, médico.legista da Polícia Civil desta capital; Todas as determinações da carta que V. Exa. me dirigiu em 4 -do corrente,
I~
39 - ' 0 recebimento' de roupas indispensáveis como paletó, calça, camisa, foram por mim executadas, sem demora da minha parte. Como o correio só me
cueca, lenços e meias;
C'i
entregou a carta de V. Exa., com o cheque, no valor de 1 :200$000, contra o Bank
49 - o fornecimento do fumo que for do seu agrado. of London &South America, depois das 13 horas, só me foi possível efetuar o re-
('"
V
Tudo isto devia ser fornecido pela administração policial desta Capital, que, cebimento desta importânCia na segunda~feira, dia 6. ( o,,

ao prender Harry Berger, procedeu a uma rigorosa busca na sua residência, de on· Se não pude entregar a D. Júlia Santos a importância de duzentos mil réis
( "
(200$000), a que faz alus«o na referida carta de 4 de agosto, a culpa não foi mio
de retirou tudo: "roupa, móveis, utens(lios, livros e dinheiro. Natural e normal se·
ria/pois, que as autoridades policiais fossem restituindo, agora, a Harry Berger tu~
nha.
Para exato conhecimento de V. Exa., a respeito da aplicação do dinheiro
ê 1\
do aquilo que pudesse ser de sua utiÜdade imediata no presídio. ( 11'.
Dada, porém, a urgência das providências ora solicitadas, o Suplicante se que me enviou, e destinado a seu filho, envio a V. Exa., cópia da carta que, an~
teontem, mandei ao Dr. Carlos Lassance, di-retor da Casa de Correção. Do mesmo :- I~
prontifica a fornecer todos estes elementos indispensáv~is ao bom tratamento de ~ ,
modo, junto à presente cópia do cartão que o Dr. Eugênio Carvalho do Nasci- 1\
Harry Berger, visto achar-se em correspondência com D. Minna Ewert, irmã do seu
cliente ex~officio, e que se dispõe a enviar, até por via telegráfica, de Londres onde mento me dirigiú em resposta à carta que eu lhe havia escrito, e de que mandei !(J
se acha, o numerário necessário para esta.obra de simples humanidade.
cópia à sua filha Lygia. (' \,
\~
Fiz, ontem, uma visita rápida a Luiz Carlos Prestes. Tenho~me visto asso- ,,.
,

Formulando veemente e ardoroso apelo à consciência de homem e de magis~


berbado de trabalho. Atacado, por outro lado, de uma tremenda nevralgia facial,
trado, que são os melhores títulos de V. Exa.,o Suplicante espera que V.Exa. não
se retirará, hoje, deste recinto onde s6 se administra justiça, sem ter antes cumpri~ que me inutiliza~ âs vezes, horas seguidas, por força das dores cruciantes que me ~ Ij. .
do, com firmeza e serenidade, o seu dever incoercível. assaltam, não tenho podido olhar, com a solicitude e a urgência necessárias, o caso
(,- ,~
11
Nestes termos, de sua nora Olga, e de sua neta Anita Leocádia. Precisamos, entretanto, e para .' t1
P. Deferimento. atender ao que me pediu o filho de V_Exa., examinar com particular atenção este
-r:(
,-'" -j'~..'
aspecto da vida íntima de Luiz Carlos Prestes. Estimaria, assim, que V_ Exa. me ( "j
pusesse a par de tudo quanto aí tem feito, e das exigênCias das autoridades alemãs
Distrito Federal, 28 de julho de 1937. no que se refere â libertação de sua nora Olga, e à entrega da sua neta Anita Leo~ \.. k':
cádia. Deste modo, poderei tentar, aqui, junto das autorida~es administrativas ou
a) Heráclito Fontoura Sobral Pinto judiciárias, um procedimento que habilite V. Exa. a atuar junto das aut.oridades l'l:,
Advogado ex-offício alemãs. Se os meus serviços puderem ser úteis a V. Exa. ou ao seu filho, estou l . '1';'
174 C ;1
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175 ( "I
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inteiramente às ordens. Se preferirem, porém, recorrer a qualquer outro colega,
não se acanhem, nem receiem que eu me melindre. Nestes assuntos profissionais
só uma coisa me preocupa: o interesse dos meus clientes, voluntário~ oU ex~of~
ficio. Como já fiz sentir, mais de uma vez, a V.Exa., a advocacia é, para um cató-
lico, mero apostolado.- Por entre as minhas falhas e os meus pecados procuro, na
medida das minhas forças, permanecer fiel a este imperativo da religião de Jesus
Cristo. Assim, se V. Exa., ou Luiz Carlos Prestes encontrarem dificuldades para CARTA DE SOBRAL PINTO ti. JOSÉ CARLOS DE MACEDO SOA·
se entenderem com outro colega que melhor con'esponda às suas expectativas. RES, MINISTRO DA JUSTIÇA, DE 19.8.37.
n«o há porque deixar de agir em matéria de tamanha magnitude para a vida
afetiva de ambos. Os meus pequenos conhecimentos, a minha modesta capaci~
dade profissional, e o meu habitual destemor continuam, como até aqui, à disposi-
ção de V. Exa. e de seu filho. Exmo. Sr. Ministro da Justiça.
Deixo de enviár a· V. Exa. o endereço, na Europa, dÇl Sr. Orlando Leite
Ribeiro, por uma razão muito simples:· é que e:ste diplomata se encçmtra, pre-
sentemente, nesta Capital, onde reside· à rua Duvivier, 43, telefone 27~8114. O Honrando. o apelo angustioso que D. Leocádia Prestes me dirige do seu pe-
posto onde está servindo é o próprio Ministério das Relações Exteriores. noso exílio, passo às mãos de V. Exa. a carta que.ela, aflita e esperançada, escreveu
Se V. Exa. quiser algum serviço dele, e não desejar a ele se dirigir, dire- ao Sr. Ministro da Justiça do Brasil.
tamente, pode se utilizar de mim para veículo dos seus desejos. Católico e patriota, eu me honro com o desempenho desta missão de que
Finalmente, cabe-me transmitir a V. Exa. uma .sugestão de seu filho. me vi investido pela veneranda Mãe de Luiz Çarlos Prestes. Tudo farei, na medida
Talvez fosse mais conveniente escrever V. ·Exa. a ele por meu intermédio. As ,das minhas energias' morais e da minha capacidade profissional, para evitar que o
cartas demorariam menos a chegar ao seu destino. Julgo que poderei combinar Governo bárbaro e odiento de Hitler pratique a monstruosa iniqüidade de tirar das
com o. Dr. Carlos Lassanc'e um processo menos demorado para as cens.uras das mãos de sua mãe uma tenra criança de 10 meses.
cartas, e, assim, teria Luiz Carlos Prestes notícias sempre recentíssimas. de V. Ao longo do tempo, n.o seio da consciência livre de todas as nações civifiza~
Exa., e de todas as pessoas que tão de perto interessam ao afeto dele. das, reboa até hoje, e reboará, por certo, até à consumação dos séculos, a voz da
Com as minhas homenagens, receba, Exma. Sra., o testemunho do meu história, contando às novas gerações que surgem pata a vida, este episódio narrado,
mais alto apreço. com a simplicidade tétrica, por Edmond et Jules de Goncourt (HISTOIRE DE
MARIE ANTOINETTE • pág. 354 ): "Todas as dores da Rainha iam ser coroadas
por uma dor suprema. Neste coração, onde tudo é chaga, a República encontrou
Sobral Pinto
espaço para ur:na ferida nova, e mais profunda de que todas.
No dia 3 de julho, às 10 horas da noite, os Municipais entram na prisão da
Rainha. A Rainha, a Princesa Elizabeth, a Princesa Real levantaram~se ao barulho
dos postigos. O Delfim se despertou. Os Municipais vêm comunicar à Rainha a de·
cisão da Comissão de Salvação Pública sancionada pela Convençâo:
"A Comissão de Salvação Pública decide que o filho de Capeto seja separa·
do de sua Mãe".
A Rainha correu para o leito de seu filho, que grita e se refugia nos seus
braços. Ela o cobre, ela o defende com todo o seu corpo: ela se ergue contra as
mãos que avançam, e os Municipais vêem que esta Mãe não quer entregar o seu fi-
Ihol Eles a ameaçam com o emprego da força, e de fazer subir a guarda .•. "Ma-
tai~me, então, antesl" diz a Rainha.

177
176
(i!
Uma hora, uma hora I durou este debate entre as lágrimas e as ameaças, en- (
Se não encontraram as nossas autoridades no procedimento de Diga Sená-
tre a cólera e a defesa, entre estes homens que assaltavam a esta Mãe, e esta Mãe rio Prestes nada capaz de fazê~la sentar no banco dos réus dos nossos Tribunais, (
que os desafiava de lhe arrancarem o filhol Por fim, os Municipais, cansados da
sua torpeza, ameaçam a Rainha de lhe matar o filho: a esta palavra, o leito fica li-
porque afastá-Ia, definitivamente, do brasileiro a quem ligara a sua vida, e a quem, ,'" J~
dentro em 'breve, iria tornar pai, dando à luz a uma menina que dele concebera?
vre. A Princesa Elizabeth e a Princesa Real vestem a criança: à Rainha não resta- Não foi o, então, 10 Delegado Auxiliar da Polícia desta Capital, Dr. Demócrito f-
vam mais as forças suficientes para isto! Depois, inundado com as lágrimas e os de Almeida, quem informou ao Sr. Capitão-Chefe de PolI·cia, em ofício dê 12 , i!'
(-- "I"
beijos de sua Mãe, de sua tia, e de sua irmâ, a pobre criança, desfeita em lágrimas, de junho de 1936, que Olga Benário Prestes "foi detida na residência de Luiz Car-
~
segue os Municipais: ele vai de sua Mãe para Simãol". los Prestes~ de quetrJ. se declara esposa"? ( '"
É esta cena, cuja lembrança ainda hoje nos enche de horror e de indigna- Como admitir, assim, justificativa para o ato do Governo Brasileiro, que ~ j
ção, que, dentro em pouco, se vai renovar, covarde e trágica, no interior de uma entregou, consciente"e deliberadamente Olga Benário Prestes à vingança do racis- ( .
prisão polftica da Alemanha. mo odiento e per~eguidor de Hitler? Cruzar as autoridades brasileiras os braços ('I
Não ignoro, Excelência, que o ódio polftico,- que não se desarma diante ante a iniqüidade que ora se projeta levar avante contra um coração materno, num ( ,.,
de nenhuma iniqüidade -, procurará, na exaltação dos seus desvarios, dizer que dos pres(díos pol"fticos da Alemanha, é procedimento que se não compreende, e
Maria Antonieta era Rainha e que Olga Prestes é uma mulher do povo. que a consciência cristã profliga. (
Aos que a polftica tornou, assim, cegos e coléricos responderei que a ma- Certo de que V. Exa. a quem já tanto deve a Justiça, levará em considera. ( .
ternidade não conhece distinções sacia i-s. Em face dela, nobres e plebeus, ricos e ção o pedido formulado por D. Leocádia Prestes, na carta que a esta acompanha,
assino-me,- respeitoso, (fi
pobres, livres e escravos sofrem o peso mcoercfvel das mesmas leis da natureza. O
coração materno pulsa com igual ritmo tanto nos altos cumes da sociedade como (
na mais bidixa esfera das camadas sociais. Sobral Pinto
Por isto, o coração de uma Rainha, não merece, na voz da História, maior
-:
proteção do que o de uma plebéia. A realeza e o trono aqui se nivelam com a hu- (
mildade e a sujeição. ("
"Se me dirijo, agora, a V. Exa. na qualidade de advogado ex-officio de Luiz
( ~

,
Carlos Prestes, é porque não posso aliJar da minha convicção a certeza de que cabe
ao Governo brasileiro a maior responsabilidade neste crime contra os direitos da . "I',
maternidade, que ora se prepara, fria e cruelmente, no recinto dramático de uma I
Rio, 19/ agosto/1937 . . I
prisão da outrora gloriosa Germânia. (
V. Exa. poderá encontrar, em qualquer momento, nos arquivos deste Minis- ( j
tério, a cópia do ofício que em 14 de maio de 1936 o Delegado Eurico Bellens
f ~•
Porto dirigia ao Sr. Capitão -Chefe de Polícia desta Capital no qual dizia: "Ao en-
cerrar o inquérito a que procedo sobre os acontecimentos desenrolados nesta capi-
tal em novembro do ano próximo passado, cumpre-me levar ao conhecimento de
(t"
V. Exa. que nos autos respectivos NÃO ENCONTRO ELEMENTOS BASTANTES :";,
';:1
QUE PERMITAM INCLUIR COMO INDICIADAS com atuação definida as estran- \ , J_~

geiras Elisa Ewert ou Machla Lenczyeki, Carmen Alfaya de Chioldi e Maria Berg- I
~er Prestes que também usava os nomes de Yvonne, Olga e Maria Villar. " -)"1
Trata-se evidentemente de elem~ntos indesejáveis, cuja permanência no ter-
rítório nacional não é aconselhada. Por estas razões, data venia. lembro a Vossa
Excelência a conveniência de contra elas serem instaurados os competentes proces-
sos de expulsão, na forma da legislação em vigor."
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que tanta mágoa me causou. Consolo-me, porém, com as declarações do filho de
V. Exa. feitas de público, de que "estando cercado, na Pol íeia Especial, só de
vermes, apareceu-lhe, afinal, Um homem". Este homem fui eu. Mais adiante, na
sua defesa oral, acrescentou: "O Sr. Sobral Pinto exerce a advocacia como um sa.
cerdócio". Que mais pOderei eu ambicionar nesta causa, da parte deste meu cliente
ex-officio? Da parte dos juízes, e da administração quero muito mais, ainda, pois,
até agora, nâ'o me atenderam no que venho pleiteando:Justiça.
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÃDIA PRESTES.
Não podendo prosseguir por falta
I de tempo, envio a V. Exa. os protestos
Rio, 18 de setembro de 1937. de meu mais alto apreço.
Sobral Pinto

Exma. Sra.
D. Leocádia Prestes.- r,
f
;i
Não é por- descaso que não tenho escrito a V. Exa. - é por absoluta falta ti
material- de tempo. Para conseguir aumentar os meus rendimentos de trabalho, ve-
nho sacrifi~ando, diariamel)te, nestas. últimas semanas,.du~s horas do tempo qúe
reservo, ordinariamente, para o sono E para agoniar, ainda mais, a minha vida já
tão sobrecarregada, fiquei hoje sem datilógrafa.
i Perdemos, DOr. Lassance e eu o dia todo de ontem no esforço, até agora
. ~

vão, de levar um tabelião ao presldio onde está o filho de V. Exa., a fim de lavrar
uma escritura pública de reconhecimento, por parte de Luiz Carlos Prestes, de sua
filha Anita Leocádia. Só encontramos má vontade e medo. Todos temem sofrer a
campanha, que já está sendo feita contra mim, de serem proclamados delegados do
~
Comintern, a soldo de Stálin Certamente V. Exa. já se acha informada de mais I
esta perfídia inventada contra o modesto advogado, que, fiel disdpulo de Jesus rt
I
Cristo, tem sabido, até este instante, colocar os deveres da sua consciência religiosa r
acima das suas conveniências pessoais.

~
Na impossibilidade de enviar a V. Exa. pelo avião de amanhã, a escritura
supramencionada, e que espero fazer pelo avião de quinta-feira, mando hoje os ,:1
. documentos oficiais que atestam nada ter ficado apurado aqui contra Diga Benário \

~
Prestes. Fiz traduzir tais documentos, e legalizá-los no Consulado Alemão.
Transmito, outrossim, a V. Exa. outra notícia triste: nada consegui no l
!I
Supremo Tribunal Militar, que confirmou a sentença de 1~ Instância. Vou rrn-
preender novo esforço, interpondo o recurso de embargos. Seremos, desta vez,
I
mais felizes?
~
Alguns partidários do filho de V. Exa. não se mostram satisfeitos com a ~,
PI
minha atuação no processo. Querem me dar um ou mais assessores, que seriam m

~
constitu(dos por Luiz Carlos Prestes. Na próxima carta, e-quando dispuser nova·
mente de minha datilógrafa, exporei minuciosamente a V. Exa. mais este ep.isódio,

180 I
181
I
,~

~

~

~
Supremo Tribunal Militar, um grupo de amigos de Prestes, e dos quais eu sou o
emissário autorizado, achou conveniente a constituição, imediata, por parte do
chefe, de três advogados. Um seria o $r., cujo afastamento do posto de defesa se
nos apresenta. impossfvel; outro seria um advogado de mentalidade nacionaHiber-
tadora, capaz de apreender o verdadeiro pensamento de Prestes no atual momento
político brasileiro; e o terceiro um advogado de grande projeção e prestl'gio políti-
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCADIA PRESTES. co, em condições, portanto, de se encarregar da criação de um ambiente político \".
necessário a um julgamento mais simpático da causa, por parte dos ju{zes. Nada (
disto será feito, porém, sem o assentimento expressivo do Sr.
Respondi, imedratamente, com a minha habitual franqueza e serenidade:- (
Ria, 25 de setembro de 1937.
i
Já declarei, mais de l;Iina vez, àqueles a quem devo satisfação pelo desempenho do (
Exma.Sra. patroc(nio da causa de Luiz Carlos Prestes, que não pedi, nem pleiteei o mandato
D. Leocádia Prestes. de que me vi investido. Uma vez, porém, que ele me foi outorgado, não vacilei Um ( "
~,'~
instante sequer para aceitá-lo. Recebendo a comunicação da sua outorga respondi (
Atendendo aO pedido do filho de V. EXij. remeto, com esta a cópia da car- incontinenti que iria desempenhá-lo COm o meu ardor costumeiro, pondo. no exer- "I
deio dele o zelo, a lealdade e o destemor com que, habitualmente, me desobrigo
(
ta que ele me entregou em 11 do corrente. Pretendo, logo que possa dispor de
algumas horas de folga, dar resposta a esta carta, mantendo, porém, em tudo e por dos meus deveres profissionais. Longe de estar, cOm isto, a fazer"um favor, o que /~
tudo, o tom·cordial, sincero, verdadeiro, e justo que pus sempre nas minhas rela- eu passaria a desempenhar seria apenas uma tarefa de estrito e indeclinável dever
ções com o filho de V. Exa. Quando tiver encaminhado essa resposta mandarei a profissional. Colocava a questão neste pé, para que ninguém se visse na contingên-
c"','1I
( 'i
V. Exa. cópia integral dela. cia de se manifestar grato às minhas atitudes de defensor ex-officio, caso elas
Nesta data envio, diretamente, à Gestapo uma certidão com a respectiva pudessem traz~r, no decurso do processo, algum lenitivo quer para o meu cliente (f ,i:
versão alemã.. da escritura de reconhecimento da menor Anita Leocádia, cujo ex-officio, quer para as pessoas a ele diretamente ligadas pelo afeto, ou pela co- \1."
·munidade de ideais filosóficos ou polfticos. Se a maneira pela qual vinha agindo ti-
(I
traslado seguiu com a carta que dirigi, em 22 do corrente, a V _ Exa. li,;
Julgo que, com estas providências, não· me mostrei infiel aos compromis- nha causado algumas surpresas, era porque na minha pessoa se casavam as qualida-
sos que assumi para com V.. Exa., no sentido de regularizar à sombra dos recursos des do advogado e do católico, circunstância esta que fazia refletir no exerdcio da
que o direito nos faculta, a situação, ainda tão penosa, da nora e da neta de V. profissão o dever de consciência religiosa que o católico tem sempre presente nos I"~

Exa. Estou, por outro lado, a colher novos materiais jurídicos para ajudar a V. atos da sua vida cotidiana. Assim, de um lado eu procurava ser fiel aos deveres da
minha profissão, e de outro, eu me esforçava em não criar dificuldades à consciên-
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Exa. e ao meu cliente ex~officio nesta pugna que, alheia à espera subalterna das ,( l!
competições po\(ticas, interessa tão só os sentimentos afetivos de todos os mem- cia filosófica e polftica do r.,eu cliente ex-officio. ·11
bros da famnia de V. Exa., tão rudemente experimentados por sucessivos e inin- Na hora em que eu sentisse que, involuntariamente, estava sendo um trope- ( .~1
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terruptos reveses. Nada farei, entretanto, sem consultar previamente ao filho de ço para os ideais de Luiz Carlos Prestes, declinaria, com serenidade, do meu man-
V. Exa. Daqui por diante adaptarei, invariavelmente, esta norma, mesmo quando dato, a fim de facilitar ao meu cliente ex-officio seguir o rumo que melhor aten- <. ;.:
tiver de agir sob a só responsabilidade do meu nome. Quero estar a cavaleiro das desse às suas aspirações pai (ticas. C 1"';
crfticas dos amigos do filho de V. Exa., e de que tratei em cartas anteriores, mas A advocacia foi institu(da para ajudar os homens a harmonizarem os seus ,,
\
apenas para dar disto conhecimento a V. Exa., reservando-me para relatar minu- justos interesses no seio da~ coletividades em que eles atuam. No exercfcio dela o
ciosamente o assunto nesta carta de hoje. profissional, em hip6tese alguma, pode fazer prevalecer os seus melindres, as suas
Logo após o julgamento, pelo Supremo Tribunal Militar, do recurso de vaidades e os seus interesses pessoais em detrimento dos direitos do cliente, ou dos \, 'i
apelação interposto, pelos acusados, contra a sentença do Tribunal de Segurança superiores interesses gerais da sociedade. Quando um conflito deste surge no pa- I~

Nacional, fui procurado por um partidário do filho de V. Exa., que me disse, mais trocfnio de uma causa s6 uma solução é posslvel para o advogado que queira se
manter fiel à sua missão: retirar-se da liça, desinteressadamente, para que o seu
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ou menos, o seguinte: - Em face das declarações de Luiz Carlos Prestes perante o \ , :if;
cliente readquira a Sua indispensável liberdade de movimentos.
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Desde que, portanto, a minha atúação, como defensor ex-officio de Luiz -Lucas, Capo X, V. 36) seus inimigos de classe. À mingua de outras virtudes, esfor-
Carlos Prestes, não estava à altura das necessidades da causa, eu me prontificava, ço-me em imitar aquele Samaritano qUé, passando por cima dos ódios de raça,
depois de ouvidos V. Exa. e Luiz Carlos Prestes, a restituir ao Conseiho da Ordem socorreu o israelita que, na estrada que vai de Jerusalém a Jericó, caiu em poder
o mandato'que me fora outorgado por ele, explicapdo, sem ressentimento, e sem dos ladrões. Se outros advogados puderem encontrar que melhor corresponda às
revolta, aos meus mandantes, a causa do meu gesto. aspirações de V. Exa. e de seu filho, não se embarecem; estou pronto a prestar a
O que se me ap~esent~va, desde logo, como impossível, era a minha trans- ambos mais este serviço da minha demissão.
formação de advogado ex-officio em advogado constitUl'do por Luiz Carlos Preso Com as minhas homenagens,. sempre às ordens de V. Exa.,
teso A luta em que eu me acho empenhado é áspera e bravia. Nela os tropeços
surgem a cada momento, graves, perigosos, e quase invencíveis. Para enfrentá· los Sobral Pinto
necessito mais do que a simples força da minha só autoridade moral. Preciso de
estar escudado, também, no prestígio de um mandato impessoal. Hei mister, nesta
dif(cil conjuntura, de ser a própria encarnação do instituto da DEFESA.
Ora, se eu, d'ora em diante, passasse a figurar como represehtante OIreto
de Luiz Carlos Prestes, a minha força moral estaria muito diminu(da para pleitear
aquilo que venho pleiteando. Por conseqüência, as vantagens que os amigos de
Luiz Carlos Prestes pensavam obter com a mudança da natureza do meu mandato,
longe de aumentarem iriam ficar vultosamente diminuidas.
Mas, desde que eu só poder.ia continuar a patrocinar â· defesa de Luiz
Carlos Prestes como-advogado ex-officio, era evidente que não haveria meios, nem
modos de tornar poss(vel a constituição, por parte deste meu cliente, de mais dois
outros advogados, porque este último ato impUcaria na cassação automática do
meu mandato.
Ante tal exposição, o partidário do filho de V. Exa. pediu· me que nada
dissesse a ni'nguém do que acabava de se passar, pois precisava de comunicar aos
~
~~
seus companheiros a impraticabilidade de ser levado avante o propósito da consti· I~
tuição de mais advogados para Luiz Carlos Prestes, uma vez que, em hipótese !
alguma, eles concordariam com o meu afastamento do patroc(nio da causa do I
I
filho de V. Exa. . I

Dali há dois dias, entretanto, outro partidário de Luiz Carlos Prestes me I


procurou para insistir na conveniencia de serem nomeados mais dois advogados, I
não para aumentar a eficiência da defesa da causa de Luiz Carlos Prestes, MAS II
PARA DAR·LHE MAIOR POMPA.
Renovéi, então, a este novo emissário a exposição anterior, dele ouvindo,
nessa ocasião, a declaração de que, dada a minha intransigência, ficava sem efeito a
I
11·
\
sua proposta, em torno da qual se deveria fazer pefinitivo e perpétuo silêncio. ~
I
Informei, contudo, a este segundo emissário que ia dar conhecimento do
que se passara ao filho de V. Exa. - coisa que já fiz -, e, em seguida, a V. Exa.,
coisa que estou fazendo.
Quero ser, Exma. Sra., neste transe tão cheio de apreensões para o coraçao
materno de V. Exa., e de tantos e tamanhos reveses para o filho de V. Exa., a mão
amiga de um modesto e impotente "próximo daquele que caiu em poder dos" (S.

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184 185
,. il'
~

r
Do mesmo modo dele recebi a informação de que entregou hoje ao Diretor (
da Casa de Correção uma carta para V. Exa. Tal carta deve seguir pelo avião de
(-
quinta-feira próxima.
O'ora em diante as cartas para o filho de V. Exa.. devem ser endereçadas a (
ele para a Casa de Correção. Foi o próprio Diretor quem me solicitou que comuni·
r J
casse isto a V. Exa.
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOcADIA PRESTES. Com as minhas homenage~s, sempre à disposição de V. Exa., (
(
Sobral Pi nto
(
Rio. 4 de dezembro de 1937.
(
-Exma. Sra. (
D. Leocádia Prestes"
(
Confirmaram-se, em parte, as minhas expectativas. Fui chamado à Polícia (
apenas para cuidar de interesses do filho de V. Exa. Como vê, Exma. Sra., eu é que
(
estava com a razão, quando afirmava aos meu amigos, inquietos, que ainda não
tínhamos' atingido o grau de deliqüescência que eles sustentavam fosse o da atual (
opressão. (
O governo alemão solicitou ao do Brasil que indagasse do filho_ de V.
Exa. onde, em que pats, e em que data Luiz Carlos Prestes se teria casado com (
Olga 8enário Prestes. Das respostas do filho de V. Exa. é que irá depender a situa~ (
ção da menina Anita Leocádia. Comparecendo ontem um delegado de Polícia à
Casa de Correção para efetuar o interrogatório do filho de V. Exa., este se recusou
a prestar decla~ações sem antes ouvir a minha opinião, fazendo, outrossim, ques- (
tão de que eu estive~se presente ao ato do seu interrogatório.
Nesta conformidade, a autoridade policial sol icitou a minha presença na
Delegacia de Ordem Pol (tica e Social, a fim de que a acompanhasse até à presen-
1/
ça do filho de V. Exa., que se recusou a darquaisqueresclarecimentos antes do ,<
governo alemão declarar, oficialmente, qual a relação que possa existir entre os
esclarecimentos solicitados e a situação da menina Anita Leocádia. Acrescentou
Luiz Carlos Prestes que receiava que o governo alemão quissesse obter as informa~ {
ções indicadas para, com apoio nelas, prejudicar, ainda mais, a situação de Diga
Benário Prestes.
,
"

Aproveitei a oportunidade para, com o assentimento expresso do atual "


Diretor da Casa de Correção. indagar do filho de V. Exa. se ele tinha recebido caro (, '

tas de V. Exa. Respondeu-me que pelo atual Diretor lhe foram entregues as cartas
(
de 13 e de 17 do mês pr6ximo findo, faltando receber, entretanto, as cinco cartas
anteriores. i

l
186 187 (~l_

(,
\,
\,
vado, sem roupas e sem cama. Tão rigoroso era o isolamento destes dois homens
que nem mesmo a correspondência epistolar com as suas respectivas famnias lhes
era fraqueada.
Depois de uma luta gigantesca, consegui dominar a maldade do Capitão Fe·
linta Müller, num dos setores em que ela era mais intransigente: o da correspondên-
cia dos meus clientes ex-officio, supra mencionados e com as suas respectivas famí-
lias. Com pertinácia humana e cristã.foi-me possível obter do Juiz Raul Machado
CARTA DE SOBRAL PINTO A FRANCISCO CAMPOS, MINISTRO providência oportuna, rio sentido de, - por meu intermédio, e sob a fiscalização
DA JUSTiÇA. não só do Comandante da Polfcia Especial como também daquele Juiz -, se corres·
.~.
ponderem Prestes com asua Mãe, irmã, e esposa, e Berger com a sua irmã e esposa.
R ia, 4 de janeiro de 1938.
Mais áspero foi o embate relativamente à restituição de Berger à sua condi-
ção de criatura humana. Apesar de haver obtido do Juiz Raul Machado ordem ao
Capitão Felinto Müller para a transferência, imediata, deste meu cliente ex-officio
Campos,
para a Casa de Detenção, essa transferência não se realizou porque o Capitão Felin-
I,
:'1,1.

to Müller desacatou a ordem do Juiz, e este não se animou a:fazê-Ia cumprir, mui: m
Você sabe o desprezo que me merece o amor à irresponsabilidade, e o hor- to embora repetidas fossem as minhas reclamações. ;!i~'
li'i
ror que tenho ao regime da indecisão. Gosto das definições claras. e das atitudes va- Com a entrada do Macedo Soares para o Ministério da Justiça, porém, tudo
ir
ronis. se modificou. Tendo-lhe exposto por escrito, e verbalmente, tudo quanto se passa-
Como advogado ex-officio do Prestes e do Btnger, tenho me dirigido, ofi- e
va, consegui tirar os meus clientes ex-afficia Prestes Berger das mãos vingativas
~B
i~
cialmente, a. você, na qualidade de Ministro da .Justiça, para lhe solicitar providên- do Capitão Felinto Müller. Assim, esses dois condenados pai (ticos foram transferi- i~
cias urgentes e necessárias no sentido de assegurar q meu entendimento, no exercí- ~
dos para a Casa de Correção, .onde o Poder Público permitiu a estes dois homens ,'j
:~
cio do mandato que me foi confiado pela Ordem, com esses dois clientes, bem co- apenas ó seguinte: a comunicação livre com o seu advogado ex-officio; a leitura de
mo um outro, Azar Galvão de Souza, que também se encontra na Casa de Corre- livros e jornais; e a correspondência epistolar semanal com algumas das pessoas de ,I,fi
ção, - estabelecimento diretamente subordinado e dependente da sua autoridade. suas fam(ljas, residentes na Europa. Era muito menos do que' se permite aos presos i!:i
IJ~
Você, inexplicavelmente, entregou a solução deste caso ao Negrão de Lima, condenados por crime comum.
1·'
li'
que, em atitude ainda mais inexplicável, nada resolve, é, quando interpelado por i\
Nunca o Capitão Felinto Müller se conformou com estes atos ligeiramente I:'ij
mim, emprega os processos em uso nas rodas e nos meio~ pai (ticos: muitos abraços, humanitários do Macedo Soares. Concentrou os maiores esforços no sentido de re-
muitos elogios pessoais, ... mas nada de uma palavra positiva, clara, e decisiva tomar a posse destes dois condenados políticos. Seria necessário escrever um livro \
i,i'1
quanto ao que interessa.
Você há de convir, meu caro Campos, que um profissional da minha lealda·
para expor-lhe, meu caro Campos, tudo quanto se forgicou de mentiras, de falsida- ,é"
des, de imputações aleivosas contra o Diretor da Casa de Correção, e contra mim,
de, franqueza e desassombro deve de ser tratado de modo bem diferente. para que se criasse um ambiente prop(cio à volta dos meus clientes ex"Officio para
Venho, por isto, apelar para você, reservando-me o direito de, logo mais, o domfnio esmagador do Capitão Felinto Müller, Basta·me recordar·lhe que se che· 'li
'~
.ri
ou amanhã, vir buscar pessoalmente com você a solução deste caso. gou ao cúmulo de inventar a calúnia de que eu me fizera elemento de ligação entre
Para habilitá·lo a tomar uma decisão justa e humana, quer por diante dos Prestes e os comunistas que ainda permaneciam em liberdade. tl
seus olhos alguns episódios desta minha luta áspera com a Polfcia desta Capital, Com o advento disto que a( está, o Capitão Felinto Müller conseguiU ex-
que nunca cessou de se esforçar por esmagar brutalmente os meus clientes ex-of- pulsar da Casa de Correção o Dr. Carlos Lassance, - que não consentira em se
ficio Prestes e Berger. transformar em joquete nas mãos dele -, e fazê-lo substituir pelo Tenente Canepa,
Você não ignora que durante um ano Prestes e Bergér, em virtude de or- que é pessoa a ele totalmente submissa. Num encontro que tive com esse homem dele
dens diretas do Capitão Felinto .Müller, estiveram segregados de todo e qualquer ouvi a declaração expressa e formal de que era um simples carcereiro, executor Ii-
conv(vio humano, e proibidos de ler o que quer que fosse, sendo de notar que o . teral de ordens rigorosas que lhe fossem dadas pelo Chefe de Palfciaou pelo Dr.
último vinha sendo mantido dentro de um socavão de escada, sem luz, sem ar reno- !~
Israel Souto. Acrescentou, nessa. ocasião, que, para ele, Prestes e Berger eram con- .\Ti
r

188 189
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ir
i
(
de nados iguais aos demais que se encontravam naquele presCdio, estando sujeitos, (

por isto às- mesmas sanções e punições dos presos comuns. (


Não quero ser importuno, pelo que deixo de lhe rel~tar todo o teor da pa-
lestra, quiçá discussão, que mantive com o Tenente Canepa. Limitar-me-ei a dizer-
(i~
. 111
,_.-,!
lhe, meu caro Campos, que afirmei, então, a este carcereiro, que como advogado \ ,I
ex~fficio, ficaria muito satisf~ito se os meus clientes conseguissem, para si, trata- (i
mento igual ao que era dispensado aos presos comuns. .-'1
Dentro- em dias, vai-se abrir o prazo, no Supremo Tribunal Militar I para a CARTA DE SOBRAL PINTO A FRANCISCO CAMPOS,
apresentação dos embargos ao acórdão que condenou Luiz Carlos Prestes e Harry
MINISTRO DA JUSTIÇA_
(
Berger às penas de 16 anos e 8 meses, e de 13 anos e 4 meses respectivamente. Ne-
cessito de me comunicar livremente com eles, para cuidar da sua defesa nesta últi- Rio, 10 de janeiro de 1938, i\
ma fase do processo deles. A mesma necessidade experimento relativamente a [" ):'
Azar Galvão de Souza, cuja apelação vai ser julgada dentro de semanas. -
A fim de tomar o rumo que o dev~r profissional me impuser, venho bater
Campos, e.'I'
às suas portas. E, logo à tarde, ou amanhã, conforme as h.ora~ de que puder dispor, Nos regimes livres, que sabem respeitar, como pedra fundamental da estru- (I
aqui voltarei para falar pessoalmente a você sobre este assunto, a fim de obter da tura social, a dignidade pessoal do cidadão, a oposição desempenha um papel de
sua lealdade uma decisão por es~rito sobre tão importante matéria. (
alto relevo na boa administração da coisa pública. O oposicionista, nesses países
Aytorizando você a fazer desta o uso que melhor convier à sua administra- que não se esforçam em escravizar os membros da comunhão pai ítica, é um ho- '~
ção , envio-lhe o meu abraço cordial. mem que, não querendo e não podendo aceitar do Governo qualquer vantagem {. "
,~
, )
pessoal, - pelos imperativos da sua consciênci~ doutrinária, e pelo respeito que '"
Sobral Pintá <, j

(1
deve a si próprio -, procura, entretanto, estimulado pelas exigências do bem pú-
blico, ora criticar os atos injustos e maléficos dos governantes, ora fazer aos diri-
gentes do seu país sugestões desinteressadas, mas, oportunas, que postas em prá-
tica, melhorem as condições da vida espiritual, material, política, e administrativa
dos seus concidadãos.
Neste regime de senzala, que o Getúlio, com sua colaboração, instituiu
ri'I
para o Brasil, sinto, meu caro Campos, que a Provid€ncia me reservou o papel que,
nas sociedades civilizadas, exercem os homens da oposição. Preciso ser, em face do
(1.1'
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idealismo filosófico de você, do militarismo presunçoso do Góes Monteiro, e do ( j:i
caudilhismo branco do Getúlio, o homem disposto a dizer a verdade, à custa de '."j "

qualquer risco, sem preocupações de agradar ou de desagradar àqueles aos quais (,!
ela enaltece, ou incomoda, prontificando-me, outrossim, a proporcionar ao Go-
verno absolutista que aí está a oportunidade de realizar alguns empreendimentos, d
que só servirão para preparar para o no~so Brasil um futuro menos sombrio, e i','
'.I "~I
quiçá, mais feliz e mais próspero. "
" l.11i
Varrida a tribuna política do cenário da vida pública brasileira e garroteada , 1'·11
a imprensa livre pelos caprichos governamentais, os dirigentes já não têm, entre
nós, quem lhes recrimine os abusos do Poder, ou lhes aponte, neste ou naquele
domínio particular da administração a adoção de certas medidas suscetíveis de
'li!.
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melhor atender ao interesse público. Proponho-me meu caro Campos, a suprir, na \""r!f
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medida das minhas possibilidades, e dos limites estreitos de témpo, de que posso Huston Pedresa, vem dedicando, nestes últimos tempos, todo o seu esforço em
lançar mão, esta dupla função patriótica. prol qa criação de uma sua filha de dois anos, e da manutenção de Mário Pedrosa,
Se assim pretendo proceder, é porque não me alisto no número daqueles seu marido, que, por alimentar idéias marxistas, puramente teóricas, se viu forçado
cujo lema oposicionista é simplesmente este: "quanto pior, melhor". Amo em de~ a se esconder das autoridades policiais, continuamente à sua procura, ficando, des~
masia a terra que foi o berço e é, agora, o túmulo dos meus antepassados. Tenho, te modo, impossibilitado de trabalhar.
por outro lado, um carinho demasiadamente entranhado no meu coração pela Não me acho habilitado a lhe dizer quais são as idéia! da D. Arlinda Hus~
Igreja que Nosso Senhor Jesus Cristo fez depositária das verdades eternas, que pre~ ton, e de D. Celina Velloso Borges, pois o meu informante não mantám relações
gou no decurso do seu apostolado terreno. Não me assiste, assim, o direito de, por de' intimidade éom estas senhoras. A impressão que ele tem, porém, é de que são
ódio à escravidão pai ítica que ora domina em terras do Brasil, e pelo desprezo que pessoas quiçá exaltad~s, mas sem quaisquer ligações sóliqas com revolucionários l

me merece a ambição medíocre do PodeJ, que envenena a alma do GetúHo, deixar


que a coisa pública se deprave e se desmoralize mais do que atualmente, para que
capazes de perturbarem ,a ordem pública, sendo destituídas de qualquer eficiência
quanto à organização, orientação, e deflagração de um movimento revolucionário
li
entre nós.
,
com_isto se rejubilem os adversários políticos seus e do Getúlio. ;
Assim, tudo quanto estiver ao meu alcance para levar o Poder Público Lance, pois, ·as suas vistas sobre este caso, que estou a focalizar perante a ,:i
nacional e melhorar as condições da vida pública e particular de todos os brasilei~ sua atenção. Mais experimentado do que você, nestes assuntos, não só pela minha
ros, eu não deixarei de fazer com minha costumeira franqueza e lealdade, sem qualiçtade de advogado militante, como também porque, durante quatro anos, nos 1
temer parecer importuná a você- e aos seus companheiros de Governo, e_ confor- períodos governamentais do Dr.8ernardese doDr. Washington Luiz, tive o encargo li-
mista aos que timbram em declarar· usurpador, - e a meu ver com justiça -, o· de orientar 'e dirigir toda a re'pressão legal contra os _conspiradores e revolucioná~ :U','
atual Gover~o que nos domina. rios daquelá época, afirmo~lhe que as prisões polfticas efetuadas pela Polícia não ij~
Qando execução a este meu programa, começo, meu caro Campos, por trazem, em cerca de 80% dos casos, a menor vantagem para a ordem pública, l,
chamar a sua atenção sobre a atual campanha de rep~essão da Polícia desta Capital criando, pelo contrário, em torno do Governo um ambiente de malquerença ger)e·
"

li
contra os elementos tidos como comunistas, membros da 4;;t Internacional, f(Jnd-a~
!!~
ralizada, outrossim, as autoridades militares e' poiiciais sentem~se animadas a prati~
da e dirigida por Trotsky. Segundo informações que me foram trazidas por üm car as maiores arbitrariedades, porque têm a consciência de. que são irresponsáveis di.

homem respeitável, estão presas, há mais de uma- semana, as seguintes pessoas: D. quer perante a opinião pública, que não chega nunca a tomar conhecimento dessas il~
'c
Mary Huston Pedresa, esposa de Mário pédrosa; a sogra deste último, D. Arlin~a arbitrariedades, ql,lér perante os supremos dirigentes do Paes, que nunca se mos~
li"
Huston; o genro desta, Dr. Nelson Velloso Borges, e sua mulher D. Celina Velloso tram dispostos·a'coibir os abusos dos seus subordinados, sObretudo porque são os
Borges. primeiros a se sentirem culpados pela formação desta mentalidade totalmente i{
O meu informante esclarece que a prisão de D. Mary Huston Pedresa, e de divorciada da prudência e da serenidade que preside sempre, nos Estados civiliza~ ;i~

D. Arlinda Huston se fez com requintes especiais de leviandade e maldade, pois os dos, a situação dos dirigentes que têm a consciência de fazer parte de um governo ;&
investigadores que efetuaram a detenção destas duas senhoras, ao levarem~nas para de poderes limitados. l.,,'i!
Esperando que você tome as providências que o presente caso reclama, per- i\i
a Polícia Central, deixaram em casa, inteiramente sós, 4 crianças, das quais a mais I!
li
moça tinha 2 anos e mais velha 15 anos de idade. Admitindo que estas dua.s senho~ mito~me assinar amigo e oposicionista, sempre disposto a servir a Jesus Cristo e ao
ras fossem inequivocamente comunistas, e partidárias decididas de Trotsky, não se Brasil. "
e
compreende que agentes da autoridade não vejam o que há de perigoso de som· !lii-
!I:
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brio deixarem 4 crianças ao desamparo numa casa inteiramente deserta! É por I'

um ato destes que o comunismo se infiltra muitas vezes em toda uma vasta região. ;!;,
Sobral Pinto i\
Vamos, agora, a outro ponto: o meu informa'1te, que é um ancião de rara
dignidade, assevera que o Dr. Nelson Velloso Borges ê homem trabalhador, dono lI!
I
de uma fábrica num dos subúrbios desta Capital, totalmente alheio das idéias e da
propaganda marxista. A vida toda dele se divide entre as exigências do seu traba~
lho industrial, os imperativos da sua saúde, permanentemente em perigo, e a solici~
tude dos que dependem da sua economia particular. Do mesmo modo, D. Mary ,I'
I.
11;
192 193
lil
(-
dos pelos reveses ou pelas desgraças. Tenho como dever indeclinável da minha (··.'1.
, :1
consciência cristã amparar, na medida das minhas possibilidades, e dentro dos ri
recursos das minhas energias físicas e morais, todos aqueles que, como o Sr.
encontram milhcSes de vozes sempre dispostas a acusá-lo, a fim de atrair sobre a
ri.'
· !
sua cabeça as iras de toda uma vasta população. Aprendi, Sr. Capitão, no regaço ( ..

de minha santa Mâ'e, a respeitar a desgraça dos vencidos, e a estender t dentro dos
limites da honestidsQe, a minha-mão caridosa a todos os que sofrem.
(
CARTA DE SOBRAL PINTO AO CAPITÃO LUIZ CARLOS PRESTES. . "
Os de quem. me desinteresso, Sr. Capitão, são os vencedores. Se algum (· 1.I
Rio, 15 de janeiro de 1938. dia a Providência Divina, nos desígnios insondáveis da sua sabedoria, vier a ( I~
transformar o Sr. dê" vencido em vencedor, e eu ainda estiver neste vale de
lágrimas, não lhe faltará a oportunidade d.e verificar o que estou a lhe dizer. (
Assim, se em alguma coisa o Sr., e a sua velha progenitora julgarem que "I
f ti
Sr. Capitão Luiz Carlos Prestes. eu lhes posso ser úti" continuarei, como até agora, ã inteira disposição de ambos.
O Sr. sabe que, indigno mas convicto discípulo· de Nosso Senhor Jesus (
Somente ontem à tarde me chegou ao escritório, entregue pelo Correio, a Cristo, venho me esforçando, sobretudo nestes últimos anos, a por em prátita
estes divinos ensinamentos dos Santos Evangelhos: "Bem-aventurados os que
( .1 ,!~
sua carta de 12 do corrente. Dela tivera, entretanto, notícia, horas antes, pelo
próprio Diretor da Casa de Correção, a quem fui procurar, para que me facilitasse padecem perseguição por amor da justiça; porque deles é· o reino do Céu"-. ( .J

~1~
a comunicação com o Sr. e outros clientes recolhidos a este prcsrdio É que o Dr .. Bem-aventurados pois, quando vos injuria~em, e vos perseguirem, e
Negrão de Lima, chefe de gabinete do Sr. Ministro da Justiça, me informara que caluniosamente disserem todo mal contra vós, por meu respeito.
já havia expedido oHcio àquele Diretor, comunicando o despacho proferido pelo Alegrai-vos e exultai, porque alto galardão é o vosso nos Céus; pois
·
Sr. Ministro da Justiça no último dos meus requerimentos, formulado por mim a também assim· foram perseguidos os profetas, que existiram antes de vós. ~ .~
(
.~
respeito do restabelecimento dos meüs entendimentos profissionais com todos os Vós sois o sal da terra. E, se o sal perder a sua virtude, com que outra
acusados confiados ao meu modesto, mas dedicado patrocínio. coisa se· há de salgar? Para nada mais fica servindo senão para se lançar fora, e
Desde meados de novembro do ano passado que os livros, mencionados na ser pi.sado pelos homens. (11
sua carta, chegaram ao meu escritório. Não fui, entretanto, informado nem por Vós sois a luz do mundo. Nâ'o pode esconder-se uma cidade, que está situa- ~.·I.'i!
~
carta de sua veneranda progenitora, que não me escreve desde 27 daquele mês, da sobre o monte;
nem por qualquer outro meio de comunicação, que'tais livros se destinavam ao Nem os que acendem uma luzerna e metem debaixo do alqueire, mas (~
-~
Sr. Achei, assim, que era de meu dever guardá-los até que pudesse saber qual a põem-na sobre o candeeiro, para alumiar a todos os que estão na casa.
pessoa que os havia remetido para mim. Tanto mais razoâvel me parecia este pro" Luza também assim a vossa luz diante dos homens; para que eles vejam as ( .
cedimento quanto, como é fácil ao Sr. compreender, recebo freqüentemente, quer
de outros pontos do território nacional, como de pa(ses estrangeiros, ora enviados
vossas boas obras, e glorifiquem a vosso Pai, que está nos Céus", (5. Matells -
capo V. vv. 10, 16).
(°·1
l·i~

l ~
por livrarias, ora por amigos, residentes ou de passagem em. outras nações, re- Como vê, Sr. Capitão, a minha atitude, para com o Sr. e todos os que se "j•
vistas, livros, e jornais que pensam, na sua generosidade, que possam interessar ã acham entregues ao meu patrocínio, é o mero reflexo da minha consciência re" l ~
minha insaciável curiosidade. ligiosa. Nada têm que me agradecer, portanto. I fi

Peço-lhe, por isto, mil desculpas de não ter providenciado, imediatamente, Do seu patrono ex~fficio sempre grato e obrigado. '1
I"~
~~
para que chegassem às suas mãos os 4 volumes, que relaciona na sua carta, e que ~

faço, agora, acompanharem a presente. Sobral Pinto \


!IH
Quanto aos incômodos que pensa que me estão a causar o Sr. e a sua Mãe
urge que deix~ de falar nisto: é sempre com o maior prazer que vejo chegar as
t,i',.!
oportunidades de servir aos meus semelhantes, sobretudo quando eles ·são atingi- irt.
! I!

',- "i'
194 195 \ ~
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I.
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. ".
,

CARTA DE SOBRAL PINTO AO TENENTE CANEPA, CARTA DE SOBRAL PINTO PARA FRANCISCO NEGRÃO DE
NOVO DIRETOR DA CASA DE CORREÇAo. LIMA, CHEFE DO GABINETE DO MINISTRO DA JUSTiÇA. ij
I>
Rio, 15 de janeiro de 1938. Rio, 19 de feVereiro de 1938.
11
H
I
Sr. Tenente Canepa. Negrão,

Saudações. Envio-lhe, como combinamos, os nomes de alguns presos pai íticas, com as !
I.

~:!
Envio-lhe, para serem entregues ao meu cliente ex--officio Luiz Carlos Pres- indicáções que me foram ministradas por amigos ou parentes deles, a fim de que
tes os livros por ele reclamados na sua carta de 12 do corrente a mim dirigida, e, ,!ocê dê início ao serviço de apuração, por meios meramente administrativos, da
bem assim; uma carta que a ele escrevi. Os livros são os seguintes: Wells - "Abrégé justiça ou injustiça das prisões contra as quais forem apresentadas a você as
de I'Histoire du Monde"; Charles Adam . "Descartes, sa vie et- 50n oeuvre"; competentes reclamações.
Georges Hardy . "Le partage de la terre aux XI X~ et XX~ siécles"; "Le Mois" .
N981, du 20 Octobre 1937.
Ao tempo em que eu era Procurador Criminal da República,chamei amim,
de acordo com o Presidente da República e o Ministro da_Justiça de então, o en-
II
liI,
Cabe-me, ainda, explicar-lhe que mando fechada a carta que enderecei ao cargo de examinar, eu mesmo, através de interrogatórios, efetuados nas próprias q
meu cliente ex-officio suprariomeado, porque, em todos os países civilizados, o prisões, e das diligências que me parecessem oportunas ou necessárias, o bom ou IIIi
princípio que rege o entendimento entre patrono e acusado é este que Payen e o mau fundamento das detenções levadas a efeito tanto pela Polícia quanto pe-
Duveau fixam (LES REGLES DE LA PROFESSION D'AVOCAT, pág. 211): las autoridades militares. O meu parecer, apresentado direta e pessoalmente, ao II
"A correspondência também permanece secreta. A Administração não abre as Presidente da República, era por este acatado invariavelmente, pelas características
cartas que o preso recebe de seu advogado. É mister, compreende-se, que. a assi- de serenidade e impar~ialidade de que se revestiam não só as diligências por' mim
natura e o título deste figurem no envelope".
Sendo de meu dever defender as prerrogativas da minha profissão, não
efetuadas, como também as conclusões a que eu chegava.
Desde que a minha fiscalização, prestigiada incondicionalmente pelo Pre-
!
posso, não devo, e não quero concorrer, com o meu assentimento, para que os sidente da República e pelo Ministro da Justiça, passou a ser exercida, pessoal- !
meus entendimentos, MERA E EXCLUSIVAMENTE PROFISSIONAIS, fiquem mente, sobre todas as prisões efetuadas nesta Capital, "os revolucionáriOS perigo~ 1
sujeitos à censura de quem quer que seja. sos", - como então se dizia -, desapareceram como que por encanto. I
Com estima e apreço, sempre ao seu dispor, Faça você a mesma coisa, e verá, meu caro Negrão, como o número dos ~U
"comunistas", - expressão que veio substituir "os revolucionários perigosos" de J.
~r
Sobral Pinto outrora -, diminuirão de maneira impressionante. ,I

~
Quero preveni-lo, entretanto, de uma coisa: se você se dispuser, realmente,
a exercer sobre a Polícia desta Capital a fiscalização-que a moralidade adminis-
trativa e os_ deveres de justiça impõem ao Ministro da Justiça, por si ou pelos 1
seus auxiliares de mais imediata confiança, prepare-se para afrontar as investidas ~
li
odjent~s daqueles que se habituaram ao regime do arbítrio o mais absoluto. I n- [.

196 197

J
trigas, mentiras, calúnias serão empregadas c6ntra você, a fim de que o desânimo
o vença, ou, então, se tOrne insustentável a sua situação de chefe de gabinete
do Ministro da Justiça.
Tenho, a este respeito, larga e dolorosa experiência. Vi-me a princrpio
hostilizado desabridamente. Todos os processos em que é fertil a perfídia humana
foram utilizados contra mim.
Mas, aqui vai agora, o reverso desta exper!ência: quando perceberam que
CARTA DE SOBRAL PINTO A FRANCISCO NEGRÃO DE LIMA. 'j!
eu me sabia afirmar, e conhecia a arte da contra-ofensiva desassombrada, todos
se arrojaram a meus pés, temerosos de que eu lhes fizesse pagar caro os des~ervi­ .1'1
Rio, 14 de março de 1938. (
ços que estavam a prestar ao Governo da República, e â tranqüilidade pública.
Não sei, meu caro Negrão, se, nesta desmoralização generalizada em que (
carmos, e nesta ausência sistemática das mais elementares noções de responsabili-
dade, que reina no seio da administração do· país, ainda será possível a você fazer
Negrão, I!'
alguma coisa que não represente esta marcha, contínua e fatal, para o. caos e a (
anarquia, que todos estamos a divisar no horizonte da nossa vida política, social
e administrativa. Dia por dia, os problemas vão se complicando num crescendo Gostei de ver o tom do seu ca,rtão. Aquele "Dr. Heráclito Sobral Pinto", F. (
Negrão de Lima, Chefe do Gabinete do Ministro da Justiça, cumprimenta", é de (I,
assustador, sem que os responsáveis pelos destinos do país consigam deter a de-
sagregação ,de todos os valores morais e sociais intimamente ligados à solução um sabor austero que condiz muito bem com os propósitos severos, do Estado i1"
(
de tais problemas. Novo, de que você é, entre nós, um dos mais sólidos baluartes.
(
.,,
Em todo o caso, como sou constantemente procurado por pessoas que , Infelizmente, meu Caro Negrão, as fichas 'que acompanharam esse' cartão
i'
pensam que eu pqsso fazer alguma coisa em benefício de presos políticos, - me convenceram, mais do que nun.ca, de que não existem atualmente' meios, nem
suposição esta que não é de todo infundada -, acho que é de meu dever man- modos de vencer o arbítrio policial, que campeia soberano contra as liberdades C'\/
dar-lhe as notas juntas, para que você tome as providências que, na sua consciên- públicas. Ao escrever-lhe a carta de 19 do mês p. findo, visei obter de você a cria- (
cia de governante, pensar que o bem público esteja a reclamar. ção de um órgão que tivesse autoridade suficiente para atuar sobre os agentes
(
Cordialmente, o sempre seu. subalternos da Pol(cia, impedindo-os de conservar presos, meses e meses a fio, inú-
meros cidadãos brasíleirós contra os quais tais agentes de Polícia não conseguiram
( .
tt:

Sobral Pinto
a
coligir prova nenhuma de sua atividade subversiv~ contra ordem política e social
'I
I::
( q.
da Nação.
( .
Meu objetivo, Negrão, não era o de óbter de você o simples encaminha-
menta à Delegacia Especial de Segurança Pol(ticó e Social das notas sobre a prisão .'1
\. 11
desta ou daquela pessoa, a fim de que esse órgão da nossa Pol(cia Civil desse a você
as informações vagas.e imprecisas, qüe constam das fictias ql,Je você acaba de me (.
" i!
mandar. Para consegufr tão minguado resultado não valeria a pena ir bater a tão al-
I... [..1;
ta porta. Qualquer investigador meu conhecido, a quem me dirigisse, me daria as
informações que você me transmitiu. i.,1,1
O porqU~V"!,lmente me interesso, meu caro Negrão, é por uma obra de I 'i
"'1~
justiça. Esta é a fli..ilidade que eu quero alcançar. Este regulamento de feitoria que
o Getúlio decretou para o Bràsil, em 10 de', n.óvembro do ano passado, diz no s~u \1"
art. 170; "Durante o estado de emergência i)"u o Estado de Guerra, dos atos prati- ( ".
'íj~
cados em virtude deies não poderão conhecer os juízes'e tribunais". Reduzido isto
a troco miúdo, este texto significa que a Polícia .pode prender quem bem lhe ·,c

198
199
I ;1:
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aprouver sem que a autoridade judiciária possa pôr termo aos abusos e arbitrarie- mente aceitar qualquer posto na nossa administração pública, animado do só intui-
dades dos agentes do Poder Executivo. to de dar demonstração inequ(voca de que nada quero ou pleiteio para mim.
Horrorizado com esta perspectiva foi que me d-irigi a você para solicitar-lhe O meu único programa, dentro ou fora da administração pública, vem sen-
que se erigisse você em instância revisora dos atos policiais, quando eles se ,reves- do um só: a defesa intransigente do direito e d~ justica, que, na exigüic;iade dos
tem das aparências de mera perseguição, como está a acontecer com os casos de meus recursos intelectuais, reputo valores eternos, inaces~~;(veis às arremetidas ca-
Cirio Estrella Dias e D. Mary Huston Pedrosa. ducas dos homens que depositam toda a sua confiança nos ímp'etos da força e da
Basta lançar a vista, com algum- espírito crítico, sobre as informações violência.
que a Delegacia Especial acaba de prestar relativamente a estas duas pessoas, para Dentro deste ponto de vista, - que assume, diante dos meus olhos, o as-
que se veja, desde logo, e sem possibilidade de contestação, que nada, absoluta· pecto de imperativo intransponível de um dever religioso, que a minha consciência
mente nada, conseguiu a Poh'cia desta Capital apurar- contra elas, e que seja de católica me aconselha a respeitar-, permito-me insistir junto de você, a todo o
molde a justificar a prisão que arT!bas estão a sofrer atualmente. meu poder, para que consinta em examinar, com propósitos de crítico. sereno mas
Estamos, meu caro Negrão, em 1938. Pois bem, ao ser interpelada por vo- autoritário, todos os atos da Polfcia desta Capital. Revista-se, meu caro Negrão,
cê, a Delegacia Especial informa que esse homem, a quem não conheço, fez parte para esta empreitada superior do mesmo esp(r'ito de justiça com que de 1924 a
I

do Bloco Operário Camponês, que já deixou de existir não sei há_ quanto tempo,' 1928 eu, como Pro_curador Criminal da República, agi desassombradamente nos ,i,
tendo dirigido uma greve de metalúrgicos ... em- 1935. Vemos, assim, que Cirio governos do' Dr. Bernardes e do Dr. Washington Luis. I
Estrella Dias é preso em 1938, ... porque em 1935 dirigiu uma greve de metal6r- Tenha pena de centenas e centenas de pessoas que a estas horas, segregadas
gicos! A mesma co!sa pode-se dizer da outra pessoa, D. Mary Huston Pedrosa, que do convívio dos seus parentes e amigos, estão a passar as maiores privações nas' pri-
foi presa! em janeiro deste ano, - diz a Polícia -, em virtude de praticar delitos . sões de Estado, sem que tenham sequer a capacidade de se tornarem perigosas à
atentatórios ao regime social vigente, como provam os documentos arrecadados estabilidade do regime. Volte, pois, a examinar, novamente o caso de Círio Estrella
em seu poder. Dias e D. Mary Huston Pedrosa, e estenda, além do mais, a sua ação benfazeja so-
Mas, que delitos foram esses? Que espécie de documentos foram arrecada- bre estes dqis casos que ora ponho diante das suas vistas.
dos em poder dela? Nàda informa a Delegacia Especial a este respeito, "... e isto Abraços cordiais do sempre seu, ii
pela razão mui~o simples de que tais delitos não passam de mera fantasia dos agen-
tes subalternos da Polícia atual.
Sobral Pinto
Se as coisas continuarem neste pé, não será de estranhar que, amanhã, eu
me- veja recolhido a um dos xadrezes da Casa de Detenção como um dos comunis-
tas mais perigosos do país, por ser o representante autorizado, entre nós, do fami-
gerado Comintern. Para obter semelhante resultado bastará que se considere como
prova séria e robusta as-afirmações odientas e insensatas de um jornal como "A
li
li
PÁTRIA".
Você não sabe, meu caro Negrão, o que é a Poh'cia política, quando aque· ;:
les que a dirigem sabem que não têm que prestar contas de "cada um de seus atos a
uma autoridade superior, que seja serena, sagaz, firme e experimentada. Atrás de
serviços realmente inestimáveis, em defesa da ordem pol ítica e social, pratica a Pa-
Iícia poll'tica abusos, violências, e arbitrariedades de tal gravidade que assumem as- )
pectos de verdadeiros suplícios chineses. Para se atingir a semelhante degradação
nada mais será preciso do que a certeza, por parte dos agentes subalternos, de que
ninguém os punirá ou repreenderá pejos crimes perpetrados.
Estou a lhe falar como cidadão desinteressada, que vive a pugnar, dentro
das suas modestas possibilidades, pela dignificação da vida pública do seu pa(s.
Você sabe que não sou político. Você não ignora que tenho recusa,do sistematica-

200 201
I
_J
Para conhecimento· de V. Exa.,envio. cópia das duas cartas que escrevi em 4
de dezembro do ano passado, e que não chegaram às mãos de V. Exa. Mantenho,
neste momento, o mesmo esp(rito firmemente cristão de batalhar o bom combate
da justiça e do direito. Superior às ins(dias, procuro não me afastar dos ensina-
mentos do meu único mestre e senhor: Jesus Cristo. Seguindo as lições_do glorioso
Pontifice, atualmente reinante, permito-me repetir a V. Exa.as maravilhosas e co-
rajosas palavras do Cardeal Faulhab~r, Arcebispo deMunique,pronunciadasna sua
CARTA DE SOBRAL PINTO A LEOCÁDIA PRESTES Catedral em 12 de f~vereiro último: "Na mensagem do CardealVerdier, também, ,I
o Santo Padre disse aos comunistas: "As vossas doutrinas não são as nossas doutri-
Rio, 7 de maio de 1938. (
nas. Os nossos mártires- (alusão à Espanha) morreram para defender as nossas dou-
trinas". Mas, em seguida, o Santo Padre continuou: "Queremos ajudar os operários (
e defender os seus direitos. Quere~os preparar para amanhã a pacificação de todos
os homens na justiça e no amor". O Santo Padre oferece a mão aos operários. Com
Exma. Sra.
o comunismo, nem conciliação nem colaboração são possíveis. Mas, com os operá-
D. Leocádia Prestes.
-rios comunistas transviados uma conciliação é possível. É preciso distinguir entre
Somente anteontem me veio às mãos a carta que V. Exa.me escreveu-em (
o erro e o transviado, entre a coisa e a pessoa. Ama-se o doente, mas não se ama
27 de abril último Empenhado em atender, imediatamente ao seu pedido, dirigi· a doença. Estende-se a mão ao transviado, mas não se aceita o seu erro". (
me, ontem, à Casa de Correção, a fim de ver se me seda possível falar pessoalmen- Um pouco mais adiante, este gigante da Ação. Católica na Alemanha mo- (
te ao filho de V. Exa.,ao qual entregaria cópia da carta que V. Exa.me dirigira. derna, totalmente escravizada ao paganismo, continua a sua lição memorável: tiO
Após ter esperado mais de uma hora, o Tenente Canepa mandou-me di· reino de Deus sobre a terra, no cume do qual se encontra o Pctpa, e os reinos deste (
zer, por um contínuo, que, estanqo muito ocupado, não me poderia receber. Man- . mundo falam línguas diferentes, e têm princípios de governo diferentes. Os reinos
dei entregar-lhe, então, pelo m_esmo portador, cópia da carta que eu acabara de re·
(
do mundo dizem: ~ preciso infligir ao inimigo, neste caso ao bolchevismo, feridas
ceber de V. Exa. as mais profundas possíveis; é preciso extirpá-lo pelo ferro e o fogÇJ. O reino de (
Vou me dirigir, novamente,_ ao Sr. Ministro da Justiça, a fim de expor aS. Deus, que não é deste mundo, diz: é preciso curar as feridas com o amor do bom
Exa. o que se passou, pedindo,outrossim, a esse titular que tome as providências Samaritano, é preciso procurar os homens individuais com o amor do Bom Pas-
necessárias à cessação desta incomunicabilidade em que se encontra o filho de V. tor" ( LA DOCUMENTATION CATHOLlQUE, vol. 39, cols.397/398 l. (
Exa.relativamente à pessoa do seu advogado ex-officio. I nspirando-me nestes ensinamentos salutares é que irei bater, de novo, às (
Já chegara aos meus ouvidos que algo de anormal se passara com o filho portas do Supremo Tribunal Militar, quando tiver de opor embargos ao acórdão
de V. Exa. A versão que me foi fornecida é,porém, um pouco diferente: narraram· (
que condenou a 16 anos e 8 meses de reclusão o filho de V. Exa. Acredito que o
me que fora chamado um médico para examinar Harrv Berger. Esse médico, cuja meu cliente ex.-officio não esteja mais disposto a me fornecer os dados e elementos (
identIdade não souberam me indicar, teria destratado Harry Berger por ocasião do indispensáveis a esta derradeira defesa. Os últimos acontecimentos ocorridos no
exame. O filho de V. Exa.,que está num cub(culo próximo, teria protestado con-
tra o procedimento do médico indelicado. Este, irritado, levou o fato ao conheci·
País, e as dificuldades de todo o gênero que estão sendo criadas ao meu entendi- <-
mento livre com ele, talvez, haja,m levado ao seu espírito a convicção da inanida· (.
menta do Tenente Canepa, que ordenou fossem aplicadas ao filho de V. Ex-a.as de de qualquer esforço do seu modesto advogado, que, apesar de tudo, não, per-
segumtes sanções: enclausuramento no cubículo, com privação do banho de sol. deu a sua -fé na força incoercível dos grandes princípios morais, que regem o mun- (I'
por 30 dias consecutivos e piivação de toda e qualquer leitura. do. Sou dos que não acreditam na regeneração do homem e da vida social pela
Como sinal de protesto, o filho de V. Exa. teria, iniciado uma greve de fo- atuação da força e dos decretos governamentais. O saneamento dos povos e das
me. nações só se faz com -a valorização da natureza moral da criatura humana.
Eis, Exma. Sra., o que me foi contado por pessoa que se dizia bem infor- Aliás, o caso da sua netinha é bem uma demonstração do que vale a força
mada, a qual, entretanto, não me falou em agressão física, e muito menos em moral. Não fora a eficácia desta e V. Exa. não teria, neste ocaso doloroso da sua
agressão pelo próprio Diretor. existência, a imensa consolação de poder debruçar-se, maternalmente meiga, so-

202 203

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bre esta criaturazinha que é sangue de seu sangue. Uma palavra ainda: se qut5er
utilizar-se de meu nome para remeter dinheiro para o filho de V. Exa.; poderá
fazê·lo.
Queira receber, Exma. Sra. as homenagens respeitosas de

Sobral Pi nto
CARTA DE SOBRAL PINTO AO CARDEAL DOM SEBASTIAo
LEME,
EM 9.6.38.

Eminência.

Devo a V. Eminência, como meu Pastor, uma explicação sobre os aconte-


cimentos da Casa de Correção, ocorridos em 19 do corrente, e dos quais resultou
a minha 'prisão, abusiva e ilegal, pela prática dos crimes de desacato e ferimentos
leves, que falsamente me atribuiram.
Membro da Ação Católica_desta Arquidiocese, e, além do mais, Utn dos
seus dirigentes, por extrema generosidade de V. Eminência, eu me esforço, dentro
da fraqueza da minha vontade, em me aproximar daquele modelo de que fala Pio
X (Actes de S.S. Pie X . ed. das "Questions Actuelles", vol. 29 , pá9. 951 "Todos ;;1,1
os' que são chamados a dirigir, ou que se consagram a promover o movimento ca-
tólico, devem ser católicos à toda prova, convencidos da sua F é, solidamente ins- :ií!
tru{dos das coisas da religião, sinceramente submetidos ã Igreja, e, em particular, i:,
a esta suprema Cadeira Apostólica e ao Vigário de- Jesus Cristo sobre a terra; eles i~
devem ser homens d'um~ piedade verdadeira, de virtudes másculas, de costum'es
puros, e de uma vida de tal modo sem mácula que eles sirvam a todos de exemplo
L
iR
eficaz" .
Ora, se eu tivesse, realmente, praticado os crimes que me imputam, eu esta- [1
ria, sem a menor dúvida, faltando aos meus deveres de membro da Ação Católica, Ili
porquanto, no dizer de Tertuliano (Apologeticum . XXXVI, 21: "Querer mal, fa· I'
zer mal a quem quer que seja, dizer mal, pensar mal de quem quer que seja, nos
-' é também proibido". 11
Os fatos não se passaram como o fez crer a versão oficial. Mas, impedido, \''i.!
naturalmente, pela censura governamental, de explicar aos meus concidadãos a [·X

violência de que fui vítima,- inédita nos anais' da advocacia brasileira -, venho I,'",i'
cumprir o dever, para mim religioso, de fornecer a V. Eminência a versão real do
que se passou.
J

204 205
No documento que dirigi ao Presidente da Conselho da Ordem dos Igreja, para usar as expressões do Canon da santa Missa. Não me animaria, em hora
Advogados, na Seção deste Distrito Federal, que ora remeto por cópia a V. Emi- tão austera, a induzir em erro aquele que, aos meus olhos iluminados pela Fé,
nência, encontrará o meu querido Pastor a narrativa, resumida mas fiel, de tudo prolonga, na gloriosa cidade de São Sebastião, a missão regeneradora das almas,
quanto ocorreu comigo no interior da Casa de Correção. Nessa exposição serena e que Nosso Senhor Jesus Cristo confiou aos seus santos Apóstolos. Pois bem, Emi-
objetiva retratei com minúcias alguns episódios, e descrevi em traços largos outras nência, é neste instante de verdadeira unção religiosa que venho afirmar haver
cenas, inspirandq-me, nessa tarefa do só propósito de fazer prevalecer a verdade feito no documento, cuja cópia estou remetendo a V. Eminência, tão só a des-
dos fatos. Só num ponto, Eminência, deixei de ser totalmente exato. Foi naquele crição da verdade.
em que relato a minha última resposta ao Diretor da Casa de Correção, e que V. Se os fatos tão .. deprim~ntes, que busquei relatar COm ânimo sereno, se
Eminência poderá ler na página 3, linhas 47,48 e 49. A frase que a( reproduzo, refletissem apenas sobre a minha apagada individualidade, é bem possível, Emi.
deve de ser acrescentadas estas palavras que, no ardor da discussão, eu também nência, que eu tivesse me imposto, como tantas e tantas outras vezes, um silên-
proferi: "Mentiroso é você". cio tumular, procurando neles enxergar a merecida punição de Deus ao meu
Ao prestar as minhas declarações nesse flagr$lnte de uma falsidade re~ol­ orgulho e ã minha vaidade. Mas, o que eles põem em jogo, em vez disto, é o
tante que estava sendo, lavrado contra mim, eu julguei prudente, para efeitos da prestigio, a dignidade "e a liberdade lícita d~ atuaç§'o de. uma profissão, que, nesta
minha defesa futura, em Juízo, omitir este revide, que, apesar de perfeitamente hora crepuscular da nacionalidade, está servindo de único amparo ã pessoa do ci-
justificável em face das leis da moral, poderia fornecer ao Ministério Público, que dadão brasileiro. Urgia, em tais condições, agir COm rapidez, firmeza, e desassom-
tiver de funcionar no processo, argumentos contra a minha inocência em face da bro, num supremo esforço de afirmação,para que os governantes arbitrários da
lei. Estamos numa época de proscrição total da altivez, da dignidade, da probi- atualidade" soubessem que encontrariam disposto a todas as renúncias, inclusive
dade, e do b!lm senso mais elementar. A Justiça, triste e humilhada, se vê escorra- até a sua própria vida, o modesto e insignificante advogado que eles tinham esco-
çada por governantes e governados, os quais entraram a depositar todas as suas lhido, no seu mandonismo ilimitado, como homem sobre o qual iriam experimen-
esperanças de um futuro melhor no só emprego irracional da força material tar até onde poderia chegar a força da sua arrogância ilegal e abusiva.
agressiva. A Magistratura deixou de ser o exercício da arte divina de julgar, para Não posso, assim, ser homem de desordem" mas de ordem; de revolução,
se ver transformada em simples meio de vida fácil e socialmente honroso. A"justi- mas de autoridade; de indisciplina, mas de obediência. Não seria capaz, portanto,
ça, encarnada no Poder Judiciário, já não é mais a garantia da dignidade e respei- de penetrar num pres(dio para desacatar o seu Diretor, dando um funesto exemplo
tabilidade da pessoa humana, no seio da sociedade, mas, pelo contrário, se viu aos· meus concidadãos de insubordinação contra as leis justas do meu Pat's. Muito
rebaixada ã humilhante condição de mero instrumento de governo dos que mane- menos, EmJnência, iria praticar a inútil loucura de expor a minha vida sem ne-
jam a extensa e possante máquina do Estado. Bem vê V. Eminência que, reduzido nhuma finalidade superior, e só pelo prazer de poder dizer, mais tarde, caso conse.
por abuso de poder, à situação injusta de criminoso, pareceu~me que' não havia guisse sobreviver desta agressão, que era um homem de coragem. A Casa de Corre-
mal em que, no meu longo relato, eu omitisse uma simples frase que proferi, numa ção tem presentemente reforçado o seu destacamento policial-militar, provido,-
justa atitude de revide, mas que, se fosse por mim confessada, poderia me trazer, é bom que se saiba -, das mais modernas armas automáticas, e dispõe, além disto,
no futuro; os maiores aborrecimentos. Aliás, mesmo sem esta razão, já de si valio- excepcionalmente, de um vasto corpo de investigadores, escolhidos a dedo entre
sa, era-me Ircito, em face da moral cristã, negar tudo o que me pudesse prejudicar, homens de má catadura que se habituaram a não ter o menor respeito para com a
como ensina Salsmans, S. J. (Droit et Morale . Déontologie Juridique, págs. 201/ vida do seu semelhante; achando·se tina Im ente, sob a direção de um Diretor, que,
202): "O acusado, por mais culpado que seja, pode negar decididamente· o que se sendo homem de rara estatura e fortaleza física, é cultor, assíduo, de vários es-
lhe imputa. Esta negação não é uma mentira. É mister o mesmo dizer das outras portes. Como admitir, em tais condições, que eu, em presença de toda esta vasta
uexplicações", inventadas pelo culpado, ou sugeridas pelo seu advogado, para força material, fosse me aventurar a apelar para a violência física, como instru-
provar que ele "não pode ser o autor do crime"; para estabelecer um Alibi, etc. - mento de decisão, quando, pelas razões' supra-expostas, ela só serviria para me
Nos hOssos dias, com efeito, é universalmente aceito que um acusado não deva esmagar?
confessar a sua falta perante a justiça, nem dizer literalmente a verdade", Pelo que aí está, Eminência, não escapará, por certo, <l perspicácia· de V.
A não ser, neste ponto, tudo o mai~, Eminência, é a expressão rigorosa da Eminência que se, neste deplorável incidente, eu consegui sair engrandecido e
verdade. Estou falando, num impulso de afeto e submissao, ao meu Pastor, que é, respeitado, - sem um arranhão sequer na minha epiderme, sem que nem ao menos
nesta Arquidiocese. o símbolo da paz, da proteçgo, da unidade e do governo da um botão da minha. roupa fosse arrancado, e a gravata. do meu colarinho desloca-

206 207
da mesmo de um milímetro -, foi porque, tendo a meu lado a verdade e a jUs-
tiça, só empreguei, comO instrumento de vitória, a inquebrantável força moral da
minha austeridade, e a respeitabilidade inegável da minha pessoa, que nada teme
i a não ser a justiça definitiva de Deus Nosso Senhor.
Animando-me a pedir a V. Eminência uma pequenina prece diária, por
" ocasião da Santa Missa, em intenção da minha imunidade profissional, enquanto
me mostrar fiel aos santos preceitos evangélicos, aqui fico, meu querido Pastor, CARTA DE SOBRAL PINTO À FRANCISCO CAMPOS
sempre e sempre, à sua inteira disposição. MINISTRO DA JUSTlÇA_
Sobral Pinto Rio, 17 de junho de 1938.

Rio,9 de junho de 1938.

Campos.

Fui ontem informado pelo Cardim que um funcionário da censura policial


estivera na redação do "Jornal do Comércio" para comunicar à direção deste
matutino, - e a propósito da "varia" de Domingo que transcrevera o ofício do
Conselho da Ordem a mim dirigido sobre o incidente com o Diretor da Casa de
Correção -, que d'ora ehl diante ficava expressa e formalmente proibida qualquer
notícia que envolvesse louvor à minha pessoa, ou pudesse significar uma homena-
gem à minha vida pública ou particular.
Invoco seu testemunho autorizado de que nunca fui político, nem parw
ticipei jamais, de 1930 para cá, de quaisquer manifestações de caráter partidáw
rio. Advogado e publicista, - medíocre e pequenino, é certo -, tenho apenas
:1
buscado, na medida das minhas energias frsicas e morais, me mostrar fiel aos im-
'. perativos da minha vocação. Sobrecarregado de encargos familiares, paupérrimo,
como você sabe, vivendo até numa casa hipotecada, que a generosidade do Dr.
Afonso Penna Júnior me permitiu adquirir, nas condições supra-referidas, venho I,

afrontando, de um lado, a pobreza árdua e du(a, e, de outro, a prepotência de au- i:1


toridades desumanas, e totalmente alheias aos superiores deveres das suas funções. I';';j
Para cumprir o meu dever austero, a tudo tenho renunciado. A minha vida é um
i'~
labutar constante, pois que, agora, nem mesmo tenho à minha disposição as
!!-!.
poucas horas em que posso ficar-na minha própria casa. Dou a todos os meus con-
cidadãos o exemplo de uma vida laboriosa, que se desdobra, dia e noite, em vi- )~
,q
gílias em prol da estabilidade do Direito e da respeitabilidade da Justiça. A minha j~
banca, normalmente avara de causas remuneradas, está, agora mais do que nunca,
transformada numa vasta policlínica jurídica para a qual acorrem, implorando am- li
,,'
paro, centenas e centenas de compatriotas nossos, que me pedem patrocinar, gra- 'i!'
tuitamente, 05 direitos dos seus amigos e parentes: L~
i'~cl

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-' 209
208 lil
Como prêmio de todo este esforço gigantesco,que venho dispendendo pela
imperativo, sobretudo, da minha consciência religiosa, o governo de que você faz ~enta de essencial para a garantia do cidadão brasileiro. Autorizando-o a fazer
parte envida todas as suas energias para me apontar ao País como um inimigo da desta o uso que julgar oportuno e necessário, abraça-o, COm o carinho de sempre,
o todo seu,
Pátria, e como um individuo indigno de, receber o aplauso de quem quer que seja.
Ontem era a calúnia torpe do meu comunismo, não se enverg<?nhando certas auto· Sobra! Pinto
ridades de me atribuirem a função abjeta de agente de ligaçã0 entre os comu-
nistas presos e os que ainda se encontravam em liberdade. Esmagada, logo no nas-
cedouro, esta imbecil mentira, prepararam as autoridades arbitrárias novo plano de
envolvimento desmoralizante da minha modesta mas_destemerosa individualidade.
Urgia enredar-me num cipoal de mentiras deslavadas, que, apresentando-me aos
olhos de todos como um desrespeitador das I~is vigentes, justlficasse o ato prepo-
tente do Poder púbU.co de cerceamento integral da minha liberdade. Foi assim,
meu caro Campos, que surgiu este episódio deprimente da Casa de Correção, que
as autoridades policiais, com a colaboração do Tenente Canepa, acreditaram, na
sua ingenuidade idiota, que seria o túmulo do _meu apostolado desinteressado e
corajoso em favor da implantação, entre nós, do reinado superior do Direito e da
Justiça. A Providência, contudo, nos seus desígnios insondáveis, transformou em
e
eievação honra aquilo que a Polícia supunha que seria a minha de-sonra defini-
tiva.
O ódio, porém, não se desarma tão facilmente. Por isto, prepara ele,
agora, a sua terceira investida contra a niinha reputação. Qual o seu plano, e quais
os meios de que pensa lançar mão? É evidente que, não possuindo. o dom de ad-
vinhar, estou na mais completa ignorância tanto. deste plano quanto dos meios
de sua execução. Isto, todavia, pouco me importa. Estou preparado para tudo.
Desde que, diante de Deus, eu sinta limpa a minha consch3:ncia, tudo o mais me é
indiferente. Advogado por vocação, e n.ão por interesse, não esmorecerei na minha
luta, nem desertarei do juramento da minha colação cle grau. Bem sei que, criatura
frágil, estou sujeito, como São Pedro, ao perjuro na hora solene. Mas, humilde
discípulo de Nosso Senhor Jesus Crist.o, imploro, a cada instante, a este meu Mes-
tre o Senhor que me dê forças e energias para me mostrar sempre digno nos mo-
mentos decisivos da minha vida profissional. Se por mim mesmo eu nada valho,
contudo, pelos merecimentos infinitC'ls de Jesus Cristo, eu sei que serei invencível,
como os primeiros cristãos ante o poderio material dos Césares romanos. Homem
de Fé viva e ardente, tenho sempre presente ao meu espírito esta promessa do
Filho de Deus: "Bem-aventuradoSlos que padeçem perseguição por amor da jl,lstiça,
porque deles é o reino dos Céus" (São Mateus, Capo V, v. 10).
Sendo você, nesta hora atribulada Ministro da Justiça do Brasil, venho
preveni·lo do que se está passando, a fim de que você tome as providências que
se impõem, não na defesa da minha pessoa, que não está em jogo, mas em defe~a
da profissão nobre e altiva, que sinto encarnar neste momento, no que eia repre-

210
211

~.
,,
,,
dado a todas as tentativas dirigidas contra a minha profissão, e contra a minha
própria pessoa.
O que falta ver destruído nesta infeliz·e grande Pátria? A honradez, o
desinteresse, a dignidade, e a fidelidade ao dever passaram a ser, para os gover.
nantes atuais, crimes contra a Nação, passíveis de cadeia ou de desprestígio so.
cial. Os heróis, os beneméritos, os salvadores da nacionalidade são os Tenentes
CARTA DE SOBRAL PINTO A FRANCISCO Bezerra, os Juízes B.arros· Barreto, os Governadores Benedito. Estes, sim, é que
NEGRÃO DE LIMA. estão em equação cqm os nossos infelizes tempos, e esta nossa degradante época.
De minha parte, e sobretLido no desempenho do mandato que me foi
Rio, 5 de agosto de 1938.
Outorgado por indicação do Conselho da Ordem dos Advogados, hei de reagir,
como tenho reagido até agora, contra este conformismo geral, que tudo nivela.
Até hoje não recuei Um passo, nem mesmo diante da prisão ·abusiva, ilegal, e
Negrão. estúpida. Espero em Deus que _d'Ele merecerei a graça inestimável de· poder con.
tinuar com a mesma dura intransigênci.a a defender os princípios jurídicos e mo-
Fiquei .estarrecido ao ler o ofício que você enviou ao Canepa a propósito rais ·por cuja preponderância no seio da nossa sociedade tenho, nestes -últimos
dos meus entendimentos com Luiz Carlos Prestes, Harry Berger e Azar Galvão anos, trabalhado sem cessar tanto na minha vida p~blica quanto na minha vida
de Souza, meus clientes, atualmente recolhidos à Casa de Correção. Conf.esso-Ihe, privada . .-
com a minha habitual franqueza, que não O supunha capaz de querer diminuir-me, Eu não posso, assim, me conformar Com os termos do seu ofício ao
como o fez, neste ofício de rara infelicidade na sua redação. O tal Estado Novo Diretor da Casa de Correção. Se é verdade que tenho o dever de .ir falar com os
que vocês inventaram só produz destes resultados: a inversão de todos 05 valores. meus clientes a que faz alusão o seu ofício, não é menos certo que este enten-
É preciso ter perdido a noção da nossa realidade moral para se admitir a hipótese dimen'to precisa de obedecer a normas de altivez e dignidade que o mencionado
de que um advogado da minha estirpe possa ser posto "sob a fiscalização" de um ofício afasta de maneira positiva e inequ{voca. Procuro, - às vezes sabe Deus
selvagem como é o atual diretor da Correção, homem sem nenhuma das qualidades com que esforço -, não revidar a certas impertinências claras e patentes, mas con.
intelectuais e morais necessárias para o exercício de funções tão" delicadas. Causa tra as quais não encontro, nem nas leis nem nas convenções sociais, pontos de
pasmo que, após a desautoração pública deste amansador de cavalos quer pelo apoio na ordem jurídica, e na ordem moral. Prefiro conter-me a ofender direitos
Ministério Público quer pela Magistratura desta Capital! representados pelo Premo- . e prerrogativas dos meus semelhantes. Quando, porém, o direito e a moral me
tor e pela Juiz da H Vara Criminal da Justiça do Distrito Federal, você se permi- apóiam vou até às últimas conseqüências, indiferente a tudo e a todos, pois só
ta tentar humilhar·me, atribuindo a esse Canepa a para ele excelsa e honrosíssima uma preocupação me absorve: a de cumprir COm firmeza, sem vacilação, o meu
incumbência de fiscalizar a maneira pela qual eu exerço os meus deveres profissio- dever austero. Eis porque, Negrão, eu me dirijo, nesta mesma data ao Ministro
nais. Não, não e não. Urge que você saiba que não estou a mendigar favores. Es· da Justiça, e ao meu amigo particular, transitoriamente titular desta pasta.
tou a reclamar um direito, que pode ser negado, parque este é um país de escra· Do sempre seu,
vos, mas que reivindico, com toda a energia, porque ao menos tenho a consciên-
cia de que sou um homem livre. Não sei como não arrebento de dor, de tristeza,
e de vergonha. Foi preciso que fossem para o Ministério da Justiça um dos meus Sobral Pinto
maiores amigos, o Campos, e um Outro a quem sempre dispensei a maior consi-
deração e o· maior respeito, para que eu me visse arrastado na sargeta da rua por
funcionários subalternos deste meSmo Ministério, sem que conseguisse nem do
Campos, nem de você a reparação a que tenho direito. O que eu consigo são ofl'-
cios como este que humilham e amesquinham. Se o amesquinhamento e a humi-
lhação não me têm atingido é porque, sozinho, corajoso e enérgico tenho revi·

212
213
Entretanto, Srs. Ministros, em 10 de novembro de 1937, o Sr. Presidente
da República dos Estados Unidos do Brasil, que fazia proceSSar os Embargantes,
com a autoridade que lhe advinha da ordem constituional então reinante no País,
pelo fato de quererem eles modificar a Constituição de 16 de julho de 1934,
abolia, por ato unilateral da sua vontade, essa mesma Constituição de 16 de julho
de 1934, dissolvendo, com o auxílio da Força Armanda, os Poderes Legislativos
Federais e Est.aduais, e restringindo, de maneira alarmante para as liberdades pú.
PELOS EMBARGANTES LUIZ CARLOS PRESTES,
blicas, as atribuições do Poder Judiciário da União. Foi desta maneira que surgiu
ARTHUR ERNEST EWERT OU HARRV BERGER E
no País, da noite para o dia, e Sem possibilidades de qualquer reação, a Carta
AGILDO DA GAMA BARATA RIBEIRO.
Constitucional.de 10 de novembro de 1937.
E, assim, Srs. Ministros, o que foi considerado crime em 27 de novembro
de 1935, isto é, a tentativa de modificaçã~ da Constituição de 16 de julho de
Rio, 03 de outubro de 1938. 1934, passou a ser; em 10 de novembro de 1937, ato do excepcional mereci-
mento.
Falando ao seu rei, nUm sermão sobre a Justiça, proclamou o príncipe da Há mais ainda, Srs. Ministros: como, sustentar, com serenidade, que pode
oratória sacra da gloriosa França: um Tribunal Judiciário continuar a considerar crime, atos que visavam modificar
"É de se notar que se não se caminha com um passo igual na senda da Jus- uma lei que, neste instante, já nã·o mais existe, por isto que foi totalmente revo·
tiça, aquilo mesmo que se faz j~stamente torna-se odioso", advertindo; em seguida: gada? Os Embargantes o que pretendiam, no dizer inequívoco do acórdão embar,
É em vão que "um" magistrado se vangloria, algumas vezes, de ter bem jul- gado, era modificar a Constituição da República. Mas, qual Constituição? A de
gado; a desigualdade do seu procedimento faz com que a justiça não reconheça 16 de julho de 19347 Esta, porém, deixou de ter qualquer existência legal. Desa-
como seu aquilo mesmo que ele Taz segundo as leis: ela se envergonha de não lhe pareceu por completo. É, hoje em dia, mera reminiscência histórica, como a Cons·
servir senâo de pretexto; e até que ele se torne igual para todos, sem acepção de tituição de 24 de fevereiro de 1891, e como a Constituição Imperial óe 25 de mar-
pessoa, a justiça que ele recusa a, um convence de manifesta parcialidade aquela ço de 1824, e o Ato Adicional de 12 de agosto de 1834. Quem ousaria, sem levan-
que ele se glorifica-de fazer a outro" (BOSSUET - Oeuvres choisis - vaI. 59 ,ed. tar ondas de ridículo contra si, punir alguém, neste momento, porque- em 3 de
Hachette. pág. 455). outubro de 1930 tentou modificar a Constituição de 24 de-fevereiro de 1891?
Estes admiráveis conceitos ajustam-se, como um? luva, ao procedimento Que suprema irrisão não seria, também, o propósito daqueleque quisesse enxergar
dos Embargantes Luiz Carlos Prestes, Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger e crime nas atitudes de pessoas que, habitandO territ6rio brasileiro, se dispusessem
Agildo da Gama Barata Ribeiro. É que consta do ac6rdão da Primeira Instância, a modificar a Constituição Imperial de 25 de março de 1824 ou o Ato Adicional
confirmado pelo ac6i'dão embargado. que todos eles foram condenados "por de 12 de agosto de 1834? É que todas estas Constituições foram proclamadas, pe·
tentar diretamente e por fato mudar por meios violentos a Constituição da Repú- lo Poder Público que as revogou, construções caducas e anacrônicas, que não po-
blica"(Juiz Relator Dr. Raul MachaDO - RE LATÓRIO E ACÓRDÃO, pág.6). diam mais servir de normas de conduta para quem quer que habitasse o território
Isto, Srs. Ministros, era dito e afirmado em 7 de maio de 1937, numa épo- nacional. Como, em tais condições, ousar o Supremo Tribunal Militar punir al-
ca em que vigorava no País a Constituição de 16 de julho de 1934, votada e pro· guém em nome de Uma Constituição, como a d~ 16 de julho de 1934, que não
mulgada pela Assembléia Nacional Constituinte, eleita e escolhida pelo povo resguarda sequer o direito de um só cidadão brasileiro, por isto que já deixou de
brasilelro, mediante voto direto e secreto, especialmente para este fim. ser, desde novembro de 1937, lei normativa· do País?
Porque tentaram mudar, com o emprego da força armada, a Constituição Mais monstruoso, todavia, será o prop6sito de querer punir Luiz Carlos
da República que os legítimos representantes da Nação organizaram, no exercício Prestes, Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger, e Agildo da Gama Barata Hibeiro
do mandato que lhes foi outorgado, Luiz Carlos Prestes, Arthur Ernest Ewert ou porque tentaram modificar a Constituição da República que foi promulgada em
Harry Berger, e Agildo da Gama Barata Ribeiro estão curtindo, em dura e rigorosa 10 de novembro de 1937. Aqui o absurdo assumiria as proporções de uma insensa,
prisão, as conseqüências do seu gesto ousa.do. tez, porquanto estando sendo processados por atos que teriam praticado em

214
215

~.
novembro e 1935 não lhes seria possível, de modo algum, querer modificar uma e centenas de lições de mestres consagrados, tanto do Direito Soviético, quanto do
lei que não existia nem ao menos em projeto, ou esboço. Direito Ocidental. Limitar-nas-emas, todavia, a invocar apenas a lição de Horácio
Aí têm os Srs. Ministros o dilema que este processo, neste momento, faz de Castro (PRINC(PIOS DE DERECHO SOVIÉTICO· 1934· I? ed., pág. 264):
brotar em todas as consciências retas, que se empenham tão só em obter do
"Reputa-se perigosa toda ação ou omissão dirigida contra a estrutura do
Supremo Tribunal Militar urna obra de justiça que seja igual para todos.
Estado soviético ou que perturbe.a ordem jurídica criada pelo governo de operá-
" S,em sabemos que não faltarão justificações para este procedimento de
considerar execrável a tentativa de modificação da Constituição em novembro
rios e camponeses durante a época de transição para a organização social comu-
nista.
de 1935 e altamente benemérita a liquidação total da mesma Constituição em no·
A primeira noção penal que se destaca é o positivismo e a perigosidadeda
vembro de 1937. Há quase cem anos, Carlyle já vergastara, em termos eloqüentes,
'. ação, ao mesmo tempo que a destruição do princípio nullum crimen, nulla poena,
a tenacidade maliciosa da inteligência humana, dizendo:
sine legis poenali anteriori, já que adverte que não são somente crimes as infrações
"Há urna grande diferença entre as nossas duas espécies de guerras civis, punidas no Código, mas, também, qualquer ação ou omissão dirigida contra a es- i~1
entre a guerra moderna lingual ou parlamentar, que tem como arma a lógica, e a trutura do Estado sc;)Viético que perturbe a ordem jurídica do mesmo.
guerra antiga ou manual, regida pelo aço, e de nenhum modo vantajoso para a
primeira. No conflito manual, quando· enfrentais o inimigo, de sabre na mão, um O clássico princípio da catalogação das penas, nascido das entranhas de
golpe bem desferido é definitivo; pois, fisicamente falando, quando se faz saltar uma grande revolução, perece nas mãos de outro formidável movimento_social. Os
o cerebelo, o homem morre honestamente e não vos perturba mais. Mas, que di- esforç9s dos enciClopedistas criaram a tábua dos delitos, suprimindo o arbítrio dos
/ ferença quando se combate ~om argul'nentos. Aqui, nenhuma vitória definitiva juízes, preconizado pelos juristas dos reis nos últimos anos do século XVIII, e [li
![i'
pode ser considerada como final. Derrubai o inimigo com a invectiva parlamentar, foram a alma penal da Revolução Franc~sa. Hoje, pelas ironias da História, é outra
até a extinção de sentimento; cortai-o em dois, colocando uma metade do seu Revolução, herdeira daque.la, que implanta de novo o arbítrio judicial, fazendo 'I!
argumento sobre a primeira ponta do dilema, e a outra metade sobre a segunda;
arrancai-lhe, por um instante, o cerebelo ou a faculdade pensante: isto pouco im-
subsistir os tipos do artic:ulado COm meros exemplos.
~
O critério do arbítrio judicial nasce na união dos sovietes como lógico pos-
porta; ele se levanta e renasce no dia seguinte, e no dia seguinte recomeça o seu 11'
tulado de um conceito defensivo do Direito Penal, e estE;! critério se manifesta em '11
fogo" (HISTOIRE DE LA REVOLUTION FRANÇAISE . trad. fr. de Jules artigos, como o 13, que diz: "Não se aplicarão medidas de defesa social contra as I~
Rache· vaI. 29 pág.21). pessoas que hajam executado fatos previstos na Lei Penal quando o tribunal reco-
1'1
Por isto, estamos certos de que surgirão pessoas para dizer que a .modifica-
li!
nheça que foram executados em estado de legítima defesa contra ataques dirigidos I'
ção da Constituição de 16 de julho de 1934, tentada em novembro de 1935, vi- à organização soviética, contra a própria pessoa.do que se defende, ou contra um
sava implantar no País o regime comunista; ao' passo que·a liqüidação dessa mesma terceiro, se não excedem os limites da legítima defesa". Este preceito é de caráter 1(:
Constituição, em nóvembro de 1937, teve em- mira libertar o País dos perigos da
infiltração comunista.
francamente positivista, porém nada mais é do que um lógico desenvolvimento do
critério que preside o Direito Penal".
j~~
Não rios cabe discutir, aqui, intenções e propósitos. Este não é o lugar, Se o Supremo Tribunal Militar mantiver a condenação dos Embargantes,
,
porque não estamos a fazer obra de pol ítica, mas estamos tão só empenhados em que estão sendo acusados de terem tentado modificar a Constituição de 16 de i~:
executar uma tarefa de Justiça. O que é de nosso dever acentuar, nesta conjuntura, jUlho de 1934, terá, agora conscientemente, contribuído com uma enorme parcela li.l
é que, com semelhante justificação, pede-se aos Tribunais Judiciários do pa{s que para que os princípios soviéticos do Direito Penal se instalem, petulantes e agres- i
punam os acusados que perante eles comparecem, não de acordo com a sistemáti- sivos, no seio da civilização cristã que formou e moldou a nacionalidade brasileira. 'I~
ca jurídica do direito cristão, que só vê crimes n.os atos que infringem uma lei pe-
,['
nai preexistente, mas, pelo contrário, de acordo com a finalidade dos atos pra-
l Mas, Srs. Ministros, se na vossa alta sabedoria, recusardes a ouvir os nossos
clamores, erguidos tão só em nome d~ nossa insaciável sede de Justiça, e insistir-
1(1
ticados por estes mesmos acusados. I, lr-
des em manter esta condenação que se não justifica mais, em face dos princípios I
I
Ora, nada há de mais caracteristicamente comunista do que esta orientação jurídicos que constituem, apesar de tudo, o cerne vigoroso da nossa vida social,
de só se levar em conta, em matéria criminal, a finalidade que o agente tinha em procurai, ao menos, por esta decisão definitiva em equação com outras que já ~
mira atingir Com o seu ato. Poderíamos, a este respeito, reproduzir aqui centenas foram proferidas por este Supremo Tribu~al Militar em casos idênticos.
~
216 217
Não é possível, assim, que seja mantida a condenação imposta a Luiz Car- na vastidão enorme das execuções parciais rea1,izadas. Como, porém, apenas dois
los Prestes e Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger como autores do crime previsto ou três focos revolucionários passaram da conspiração para a execução, deixando
no art. 49 combinado com o art. 19 da Lein9 38, de 4 de abril de 1935. de atuar dezenas e dezenas de outros focos com que contavam os chefes revolu-
Nas nossas Razões de Apelação, que não mereceram sequer uma contradita cionários, os atos ocorridos no 39 Re.Qimento assumiram as proporções de uma
desenvolvida e argumentada no acórdão recorrido, demonstramos, de maneira de- importância, que, na realidade, não tinha, e nem podiam ter. A prova dos autos é
cisiva, que na hipótese de ser verdadeira a acusação levantada contra Luiz Carlos farta e abundante não só no que diz respeito à vastidão dos planos a serem execu-
Prestes e Arthur Emest Ewert ou Harry Berger de que, após 27 de novembro de tados, como também no que se refere à atuação de Agildo da Gama Barata Ribei-
1935, tinh~m tentado articular um novo movimento armado contra a Constitui- ro somente naquela madrugada, e isto mesmo comosimples comandante de um
ção do País, não se tratava de um novo crime, mas de meros atoS de continuidade foco de rebeldia. Emprestar-lhe, por conseqüência, o papel de cabeça do movi-
e permanência do crime anterior. Urgia, em tais condições, puni-los não por dois mento de novembro de 1.935 é, manifestamente, contrariar a prova dos autos.
crimes, isto é, o do -art.. 19 da lei número 38, de 4 de abril de 1935, e o do art. O fato de ter ele recebido, diretamente de Luiz Carlos Prestes l a incumbên-
49 combinado com o art. 19 da mesma lei cia de comandar o movimento no seio do 39 Regimento de Infantaria não tem a
Aliás, este· Supremo Tribunal Militar, em relação a acusados em outros força de erigi-Io em· cabeça da revolução geral. Incumbência idêntica foi dada a
processos já admitiu, em hipótese idêntica, não o crime contínuo ou permanente, Trifino Correa, o qual apesar disto, foi absolvido por este Supremo Tribunal Mi-
l

como é do direito e de justiça, mas, em todo o caso, o crime continuado. litar, sob a alegação, aliás verdadeira, de que ele não recebeu a ordem de Luiz
Por que, pois, não aplicar a .Luiz Carlos Prestes e Arthur Emest Ewert Carlos Prestes, visto ter si<;fo esta interceptada no caminho.
ou Harry Berger o mesmo critério; que já foi utilizado para minorar a p.ena impos· Se o Supremo Tribunal Militar, entretanto, assim agiu foi porque achou,
ta a outros criminosos da mesma categoria? Aliás, o acórdão embargado, que in- e muito bem, que uma ordem dessa natureza transformava aquele que a recebia
siste em negar,' contra a evidência, a continuidade ou permanência da intenção cri- em mero instrumento daquele que a dava.
minosa de LuizCarlos Prestes e Arthur Emest Ewert ou Harry Berger, quando se Mas, se aquele que a não recebia, e, po"r isto, a não executava, ficava livre
trata de punir estes dois acusados por um.só crime, não vacila, num ilogismo inex- de culpa e pena, aquele que a rece.bia e a executava teria de ser considerado apenas
plicável l em invocar a persistência de uma intenção rebelde, durante 13 anos, para como um executante de propósitos alheios.
recusar a Luiz Carlos Prestes a.aplicação da atenuante do exemplar comportamen- Oral esta última situacão não se harmoniza, de modo algum com a cçmdi-
to anterior. Ainda aqui não é feliz a decisão recorrida porque o Decreto 19.395 1 de ção de cabeça de movimento, a qual pressupõe uma atitude de iniciativa originária
8 de novembro de 1935, baixado pelo então Chefe do Governo Provisório da Re- que o simples executante não tem, nem apresenta.
pública, concedeu ampla e incondicional anistia a todos os civis e militares, que l Por todo o exposto, que está conforme a prova dos autos, espera-se que o
direta ou indiretamente, se envolveram nos movimentos. revolucionários ocorridos Supremo Tribunal Militar, melhor refletindo sobre os fatos da causa, se disporá a
no País, devendo ficar l conforme preceitua o § 29 do art. 19 deste Decreto, em
perpétuo silêncio l como se nunca tivessem existido, os processos e sentenças rela-
fazer, nos termos ora sustentados, obra de serena e imparcial ~
(
tivas a estes mesmos fatos. JUSTiÇA. ~
í
Com que direito, portanto l o Supremo Tribunal Militar apela para estes
fatos que uma lei do País manda que fiquem em perpétuo silêncio? Distrito Federal, 28 de novembro de 1938. •
~
Finalmente, e quanto a Agildo da G.ama Barata Ribeiro cumpre focalizar
que não há, nos autos senão a prova de que, pondo em execução ordens do seu
I a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto ~
~
chefe rebelde, comandou, na madrugada de 27 de novembro de 1935, o levante Advogado.
do 39 Regimento de' Infantaria. Não deliberou, excitou ou dirigiu o movimento
de. 27 de novembro de 1935. Comandou apenas, na hora da luta, uma pequena ~
força que se pôs sob o seu comando. Executou, assim, uma tarefa revolucionária
que era uma gota no oceano imenso da revolução em preparo. Tivesse esta explo-
~
L
dido em toda a extensão dos planos organizados pelos chefes revolucionários res- ~
(
ponsáveis, e os acontecimentos do 39 Regimento de Infantaria se teriam perdido
.-~
218 219
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~
L..
\

Por embargos de nulidade e infringentes de julgado; dizem

LUIZ CARLOS PRESTES, HARRY BERGER, ou ARTHUR ERNEST


EWERT, e AGI LOO DA GAMA BARATA RIBEIRO o seguinte:
19
P.P. - que o acórdão que negou provimento ao recurso de apelação não pode pre-
valecer, devendo, pelo contrário, ser reformado; REQUERIMENTO DE SOBRÀL PINTO AO MINISTRO PRESI DENTE
realmente, DO TRIBUNAL DE SEGURANÇA NACIONAL DE 30.4.42.
29
P.P. - que não é possível, relativamente aos dois primeiros Embargantes, manter
a condenação que lhes foi imposta, cpm fundamento no art. 49 da Lei n9
38, de 4 de abril de 1935, por isto que não praticaram, nem poderiam pra- Exmo. Sr. Ministro Presidente do Tribunal de Segurança Nacional.
ticar, o delito, configurado neste artigo, e que lhes foi imputado;
igualmente, LUIZ CAR LOS PRESTES, brasileiro, casado, ex-Capitão do Exército Na-
39 cional, atualmente recolhido à Penitenciária Central do Distrito Federal, vem, no
Processo n91, série A, expor e requerer a V. Exa. o que se segue:
P.P. _ que, ainda em relação aos dois primeiros Embargantes, que não poderá
subs.istir o grau máximo da pena do art. 19 da referida Lei, e que lhes foi Por acórdão de 7 de maio de 1937 deste Tribunal de Segurança Nacional,
I.
l'

aplicado, desde que milita. em favor do primeiro Embargante a circunstân- que transitou em julgado, proferido neste processo, foi o Suplicante condenado.à I
cia atenuante do seu exemplar comportamento anterior, e ocorre, quanto pena de 10 anos de rec:lusão, grau máximo do art. lC?, combinado cÇ)m o art. 49 da
ao segundo Embargante o fato de não existir prova nos autos de qualquer Lei n9 38, de 4 de abril de 1935, acumulada com a pena de 6 anos e 8 meses, tam-
circunstância agravante ou atenuante na prática do crime; bém, de reclusão, grau máximo do art. 4C? , combinado com os arts. 1Çl e 49C? da
mesma lei n938, de 4 de abril de 1935, reconhecida, na ausência de atenuantes, a
li'
outrossim,
circustância agravante do art. 50, da citada .lei nQ 38, em ambos os casos, devendo li
~,
49 ~I
se observar, nos termos da sentença, quanto ao cumprimento das penas, a regra do
P.P. _ que o acórdão exibe alteração na parte em que condenou o terceiro Em-
art. 58, preâmbulo, do Código Penal Militar, e que é a seguinte:
bargante, porque, de um lado, ele não foi cabeça do movimento insurrecio- "Quando o criminoso foi convencido de mais de um crime, impor-se-Ihe-ão
nal de 28 de novembro de 1935, e, de outro, ria concorrência de circuns- as penas estabelecidas para cada um deles; começando a cumprir a mais grave delas
tâncias atenuantes com uma só agravante, a pena deve de ser inferior àque- em relação à sua intensidade, ou a maior, se forem da mesma natureza", ill
la que foi mandada aplicar, pelo acórdão oi-a embargado. !~
Sendo da mesma natureza ambas estas penas impostas ao Suplicante, acha- ',li
Pelo exposto, espera-se que os presentes embargos serâo recebidos, e, após II
se ele presentemente, a cumprir, na Penitenciária Centtal do Distrito Federal, si-
devidamente sustentados, nos termos do art 308 do Código da Justiça Militar, tuada na rua Frei Caneca, nesta Capital, a pena de reclusão de 10 anos. f~l'
julgados provados, para o fim de ser diminuída a pena que foi imposta a cada um Muito mais tarde, e noutro processo, porém, o Juiz Coronel Augusto May- II;
dos Embargantes, como é de inteira nard ·Gomes, por sentença de 7 de novémbro de 1940, que, igualmente, transitou
JUSTiÇA. em julgado,inflingiu ao Suplicante nova. pena; esta, entretanto, de 30 anos de pri-
são celular, grau máximo do art. 17,Parágrafo único da Lein938, de 4 de abril de
Protesta-se por todo o gênero de provas admitidas em direito, e pela Lei. 1935, combinado com c a"rt. 249, § 1C?, da Consolidação das Leis Pen.ais, por dizer
que ocorriam, na espécie, as agravantes dos §§ 29, 51?, 7C?e 13?do art. 39 da refe-
Distrito Federal, 3 de outubro de 1938. rida Consolidação, e não existirem quaisquer atenuantes. I'li·
a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto Em meado·s do ano de 1937, e quando ainda não tinha transitado em julga-
Advogado ex • officic do a condenação imposta, em 7 de maio daqu.ele mesmo ano, por este Tribunal de

220 221

'I
·(1
Segurança Nacional, foi o Suplicante transferido, após reiteradas, veementes e fun- fiscalização direta de uma sentinela à vista; não se compreende, Sr. Ministro Presi-
dadas reivindicações de sua parte, para a, então, Casa de Correção, desta Capital. dente, que não se dê, sistematicamente, ao Suplicante a possibilidade sequer de se
Como a prisão do Suplicante, nessa época, decorresse da mencionada sen- entender com uma pessoa que possa levar às autoridades administrativas superiores
tença de 7 de maio de '1937, que não transitara"ainda, em julgado, não foi o mes- da República, ou aos Jul'zes executores da sua pena, a sua reclamação contra os re-
mo Suplicante sujeito a nenhum regime carcerário, mas, por foça de suas reclama- petidos e sucessivos atos de arb ítrio com que se vê ferido na prisão em que Cje en-
ções justas e irrespondl'veisr foi-lhe, ao menos, reconhecido um certo número de dI- contra.
reitos que são inseparáveis da própria natureza humana, tais como a correspondên- Para obter dos Jul'zes, incumbidos da execução da sua pena, que façam

~
cia com a sua Mãe, o entendimento livre e permanente com o seu advogado, e a cessar este estado de coisas, que a nossa legislação não permite, é que oSuplicante

~
leitura de livros e jornais de sua preferência. se dirige, agora,' a V. 'Exa. Com efeito, conseguindo, recentemente, e após 10 me-
Sobrevindo, todavia, o golpe de 10 de novembro de 1937, todas estas fran- ses do último entendimento, falar ao seu advogado, o Suplicante lhe reiterou, ver-
quias foram suprimidas imediatamente, restaurando-se, mais tarde, mas apenas balmente, aquilo que, dia!= antes, lhe mandara dizer numa carta que a censur~ do
com o caráter de favor, as que permitiam ao Suplicante escrever à sua velha Mãe, presídio consentiu, âfinal, em fazer chegar às mãos do seu patrono, e que é o se-

=
atualmente no México, e ler livros e um jornaf. Por isto, de vez em quando, a ad- guinte:
ministração da, então, Casa de Correção se outorgava a si própria o direito sooera- "Como V. Exa. deve saber, depois de mais de seis anos de prisão, continua
no e irrecorrível de, interromper aquela correspondência ou de vedar e~ta leitura, sem qualquer modificação sensível minha situação de incomunicabilidade e rigoro-
desde que, no entender da referida administração. o Suplicante se tornasse merece- so isolamento. Nestas condições, penso agora, ao terminarem as férias forenses, di- f'I
rigir-me aos Juízes de nossa terra para pedir-lhes simplesmente que me façam Jus-
dor de alguma "punição" (I),
tiça" . ti
Foi I}esta situação de total e absoluto isolamento que o veio encontrar a
decisão do Supremo Tribunal Militar de 7 de julho de 1939 pela qual transitou em O que o Suplicante, assim, vem pleitear junto de V. Exa. é simplesmente
i
julgado o acórdão de 7 de maio d'e 1937, deste Tribunal de Segurança Nacional. Justiça. E o meio de que se serve é este que lhe está assegurado no art. 43 da Leiln9 (
Incomunicável estava, incomunicável continuou. Isolado estava, isolado continuou. 38, de 4 de abril de 1935, no domínio do qual foi imposta a pena de reclusão de
Escrevendo à sua Mãe por favor estava,. escrevendo por.favor a sua Mãe continuou. 10 anos, constante da sentença de 7 de maio de 1937, e que é a que o mesmo Suo.
Impedidode falar com o seu advogado estava, impedido de falar com o seu advoga- plicante está a cumprir, presentemente. Eis que o que determina este art.43 supra-
do continuou. Proibido de trabalhar tlstava, proibido de trabalhar continuou. Pri- invocado:
vado de quaisquer distrações estava, privado de quaisquer distrações continuou. E, "No interesse da ordem pública, ou a requerimento do condenado, poderá
assim, entregue, dia e noite, ao seu próprio pensamento, vive o Suplicante cercado o Juiz executor da sentença ordenar seja a pena cumprida fora· do lugar do delito.
por quatro paredes frias, mudas, e imóveis. Conceber-se-á prisão mais dura, maif, Poderá, igualmente, em qualquer tempo, determinar a mudança do lugar de cum-
penosa e mais desumana? Dir-se-ia, Sr. Ministro Presidente, que ninguém se preo- primento da pena.
§ lI? O lugar de cumprimento de pena, salvo requerimento do interessado,
cupa com os destinos da saúde mental do Suplicante, circunstância esta que não é
não poderá ser situado a mais de mil quilômetros dp lugar do delito, asseguradas
de se admitir porque foi um isolamento desta espécie que levou Harry Berger a se
sempre boas condições de salubridade e de higiene.
mergulhar para sempre, e sem remédio, nas trevas sombrias e trágicás de sua de-
§ 2~ Das decisões sobre O MODO e lugar DE CUMPRIMENTO DA PENA
mência definitiva.
ca.be recurso para a Instância Superior, com o processo dos recursos criminais.".
Este estado de coisas precisa acabar. O Suplicante é membro da família hu-
Vê-se, pois que pela Lein938, de 4 de abril de 1935, - que é a que rege o
mana, e o que pretende obter da magistratura do seu País é tão simplesmente que
cumprimento da pena s0b cuja ação o Suplicante se acha -, cabe ao Juiz da con-
ela faça cumprir, com serenidade e imparcialidad.e, os direitos inerentes aos mem-
denação ESTABELECER O MODO do cumprimento da pena aplicada, e, bem as-
bros desta Família, e que se acham consagrados, aliás, nas leis positivas do nosso
sim, determinar o lugar em que se deve realizar o referido cumprimento da pena.
País.
Não se compreende, Sr. Ministro Presidente, que o Suplicante seja mantido Ora, o Juiz que impôs ao Suplicante a primeira pena de 10 anos de reclu-
durante o cumprimento de sua pena neste regime da mais absoluta e rigorosa inco- são, em cujo cumprimento ele se encontra presentem.ente, foi o Tribunal de Segu-
municabilidade, que dura há mais de seis anos; não se compreende, Sr. Ministro rança Nacional t criado pela lem9244, de 11 de setembro de 1936. Para assim agir,
Presidente, que ponham ü Suplicante, praticamente, comá está acontecendo, sob a este Tribunal de Segurança Nacíonal invocou o art. 13 da referid","-"e\ que diz:

222 223

'~
prerrogativas de criatura racional, e de membro integrante da vasta família humana.
"O Tribunal aplicará as penas cominadas pelas leis ns. 38 de 4 de abril, e O que o Suplicante vem, assim, reivindicar perante os Juízes da sua terra são
136, de 14 de dezembro de 1935, podendo determinar que sejam cumpridas em aqueles direitos que nenhum Poder tem autoridade para tirar da criatura humana,
colônias agrícolas e penais". porque eles estão intimamente tímidos à própria natureza dela e independem de
Em face destes dispositivos, que são aplicáveis ao caso do Suplicante, vem quaisquer condições de raça, de religião, e de concepções políticas.
ele pedir que este Tribunal de Segurança Nacional, como Juiz de execução da· pena Por isto, o Suplicante deliberou pleitear, mesmo do presídio onde o reco-
que lhe foi imposta pelo acórdão de 7 de maio de 1937, determine O MODO DE lheram, e por todos os meios I(citas ao seu alcance, que lhe sejam reconhecidos es-
CUMPRI MENTO DESTA PENA, na forma da legislação reguladora da matéria. ses direitos inerentes à sua qualidade" de homem, e que, além do mais, lhe são asse-
Aliás, o Supremo Tribunal Militar, por acórdão de 19 de abril de 1940 gurados pela legislação aplicável à sua pessoa, na qualidade de condenado.
(fls. 26/27 do 9? volume deste Processo n91, série AI, tomando conhecimento de Antes de tudo, 9 Suplicante quer ficar isento do regime de arbítrio a que
uma reclamação do Suplicante, decidiu caber a este Tribunal de Segurança Nacio- se acha sujeito presentemente. Para ele, na Penitenciária Central do Distrito Fede-
nal, como Corte de 1~ I nstância, proferir julgas sobre a maneira de executar as pe- ral, não há regras fixas, não há regulamento permanente, não há tratamento cons-
tante. Nunca lhe de~am a conhecer as condições, regras, e preceitos que deve se se"
nas impostas ao Suplicante.
No desempenho destas suas atribuições de Juiz executor da pena que está guir, normalmente dentro da prisão. Jamais lhe reconheceram qualquer franquia co-
o Suplicante a cumprir atualmente, é mister que este Tribunal de Segurança Nacio- mo um direito seu inalienável. Não conversa com ninguém. Não recebe visitas,
nal não perca de vista que a pena que o mesmo Suplicante está cumprindo é a de nem sequer as de seu advogado. Não pode distrair-se com qualquer trabalho. O seu
10 anos de reclusão, porque o acórdão de 7 de maio de 1937 mandou que fosse destino, duro e cruel, é viver no isolamento, guardado dia e noite por funcionário
observada a regra do art. 5? , preâmbulo, do Código Penal Militar, a qual estabele- do presídio, que durante as suas horas de ronda tem ordens severas de se manter
em face do Suplicante dentro do-mais absoluto silêncio.
ce que:
"Quando o criminoso ·fái convencido de mais de um crime,impor-se-Ihe-ão Inteiramente diferente, e incomparavelmente muito mais suave é o regime
as penas estabelecidas para cada um deles, começando a cumprir a mais grave delas a que estão sujeitos, na mesma Penitenciária, os réus de crimes comuns_ Eles traba-
em relação à sua intensidade, ou a maior se forem da mesma natureza". Iha'rn durante o dia_ Eles se divenem, com a prática de jogos e a audição de rádio_
Neste acórdão de 7 de maio de 1937, este Tribunal de Segurança Nacional Eles recebem, todas as semanas, em dias e horas fixados pela administração, os
atribuiu ao Suplicante a prática de dois crimes: o do art_ 1? da Lein9 38, de 4 de seus parentes e amigos. Lêem jornaiS e livros de sua escolha. Vivem, outrossim, em
abril de 1935, e do art. 49da mesma Lei. Pelo primeiro crime impôs uma pena de comum uma grande parte do dia. E tudo isto lhes é outorgado não por mero favor
reclusão de 10 anos; pelo segundo impôs outra pena, também de reclusão, de 6 da administração, mas como conseqüência direta de regulamentos baixados pelo
anos e oito meses. Por ser, pois, mais grave a pena de 10 anos de reclusão, é por ela Poder Público, e que obrigam, também, os membros da administração do presídio.
que deverá começar o cumprimento das duas penas impostas. Entretanto, Sr. Ministro Presidente, quando alei n938, de 4 de abril de
Conseqüentemente, o Suplicante está, neste momento, a cumprir a pena de 1935, estabeleceu para os condenados por infração ao art. l?dela, a pena de re-
reclusão de 10 anos, pela prática do crime previsto no art. 19da Lein938, de 4 de clusão, o que esta lei visou foi colocar, precisamente, os condenados políticos nu-
ma situação de privilégio em face dos condenados de crimes comuns. O Suplicante
abril de 1935.
Pois bem, pelo art. 47 da Consolidação das Leis Penais, que estava em vi- não divaga, nem inventa. Reproduz lição elementar da doutrina penal. Realmente,
gor na data em que o Suplicante foi condenado, Galdino Siqueira (DIREITO PENAL BRASILEIRO, Parte Geral, ed. 1921, n9
"a pena de reclusão será cumprida em fortalezas, praças de guerra, ou esta- 424, págs. 590/591), ensina:
"No art. 47 declara o Código que "a pena de reclusão será cumprida em
belecimentos militares".
O que havia, portanto, a fazer com o Suplicante, nessa época da sua conde- fortalezas, praças de guerra ou estabelecimentos militares". Esta pena é aplicável
nação definitiva, era enviá-lo para uma fortalezá, praça de guerra, ou, então, esta- somente às espécies de crimes pal/ticas; ... "Não se prescreve regime especial, pe·
belecimento militar. Isto não foi feito, entretanto, ,como o exigiam a lei, o direito, lo que deve vigorar o imperante nos lugar~s onde a pena deve ser cumprida. Assim,
como o efeito especial dessa pena, diz João Vieira, parece ser que o condenado
e a justiça.
Mas~ não é o cumprimento deste art. 47 que o Suplicante vem pleitear, não está sujeito a trabalho algum, não só porque tal obrigação não se infere de
neste momento, dos Juízes de execução desta sua pena de 10 anos de reclusão. O nenhuma pásição do Código Penal, como porque os lugares Ç>nde é cumprida
que lhe interessa, agora, é coisa muito importante, porque diz respeito com as suas
225

224
por sua mesma natureza sujeitos aos regulamentos militares impediriam a organi-
zação de trabalho penitenciário nas condições do art. 53 , isto é, mais ou menos
adaPta~o ao estado dos reclusos."
t evidente, Sr. Ministro Presidente, que esta situação ilegal não pode per-
durar por mais tempo. Urge por-lhe termo definitivo. Eis por que, valendo.sedo que
Tão digna de respeito é, assim para o legislador, a pessoa do condenado po-
preceitua o § 2? do art. 43 da Lei n9 38, de 4 de abril de 1935, o Suplicante vem
lítico, que ele a manda colocar em estabelecimentos militares, para que fique su-
requerer, por intermédio desta, ao Tribunal de Segurança Nacional que fixe, na
jeita apenas ao regulamento comum de tais estabelecimentos, e não ousando, por-
qualidade de executor da pena imposta, o modo de cumprimento da mencionada
pena.
·tanto, impor-lhe, como obrigação, nem mesmo a prática dó trabalho. Buscando
defender a sua própria estabilidade, o Estado não quer, todavia, nem desonrar o
criminoso político, e nem submetê-lo a um regime carcerário rigoroso, ao contrá- O Suplicante eritra, assim, e em seguida, a reivindicar, neste momento, es.
rio do que faz em relação aos condenados por crimes comuns. É o que adverte. tes direitos fundamentàis:
com precisão e clareza, a ciência penal, nesta outra lição de Galdino Siqueira 1? - manter, em caráter permanente, correspondência epistolar semanal
(lbid., pág. 591). com a sua Mãe, atualmente no México.

"Sujeitando todos os crimes pai íticos a mesma pena, com o nome de pri- Sob nenhum pretexto, esta correspondência poderá ser interrompida. O
são de Estado, \lemos o código húngaro, arts. 20. n93 e 35. A diversidade de trata-o Suplicante, no intuito de não fornecer motivos para a suspensão desta correspon_
menta penal entre o delinqüente, comum e o delinqüente político advém DA 01- dência, nunca a utilizou senão para dar expansão aos seus sentimentos puramente
VERSIDI-\DE DO MÓVEL da ação delituosa, bem como da categoria dos agentes. filiais. Quando, portanto, quiser a administração carcerária vedaro seguimento de
qualquer carta deverá apresentá·la ao Sr. Ministro da Justiça, e, se necessário ao
E ~esde que o motivo do crime, como rndice em regra da personalidade, Juiz da execução da pena, que é este Tribunal de Segurança Nacional;
deve determinar a qualidade de pena, e regime correspondente, bem avisado anda-
2? - receber, semanalmente, ao menos a visita do seu advogado. As fun.
:-ia o legislador criando a·s penas paralelas, a exemplo dos códs. italiano, húngaro,
ções deste não cessaram com a condenação definitiva do Suplicante. Conforme
holandês e outros, isto é, penas que podendo ser iguais em duração distinguem-se, ensinaram os mestres que têm tratado do assunto,
quanto à sua natureza e regime, uma sem caráter desonroso, SOB REGI ME BRAN-
"a missão da defesa não é somente advogar perante o júri e discutir a ques-
DO (custódia honesta, detenção ou seqüestração) para os delinqüentes que agiram
tão de,culpabilidade; após a leitura da sentença, questões graves e decisivas podem,
sob motivo social ou sem peniersidade, como os delinqüentes polrticos, ou passio~
ainda, apresentar·se no interesse do acusado, quer sobre o alcance legal desta seno
nais, ou culposos, outra com caráter desonroso, SOB REGIME RIGOROSO, para
tença, quer sobre os meios de nulidade que importa fazer apurar, QUER, TAM.
os delinqüentes que cederam a motivos ignóbeis, egoísticos, distinção que devia
sej·relacionada com as circunstâncias materiais da ex.ecução do crime, e destarte
B~M, SOBRE A APlICAÇAo DA PENA" (Cresson _ USAGES ET REGLES DE
LA PROFESSION D'AVOCAT, vol. 1?, pág.366).
fazendo, pela -diversidade de pena, a distinção que a opinião pública faz entre os No mesmo sentido é esta outra lição:
delinqüttntes".
"O advogado deve, em n·ome da Justiça e do seu cliente, assistir a este últi-
Com o Suplicante, entretanto, e por exceção singularíssima, se vem fazen- mo durante todo o tempo dos debates, e não o deve deixar senão depois da fixa-
do precisamente o contrário disto que se acha determinado_ expressa e formalmen- ção definitiva da Sua sorte. Em matéria criminal, a sentença do juri não o libertaria
te, pela legislação penal do País. Realmente, comparando-se o regime carcerário da sua obrigação; poderão, ainda, existif observações que devam ser apresentadas
A RESPEITO DA APLICAÇÃO DA PENA" (Saillard _ LE RÔLE DE L'AVOCAT
dos réus de crimes comuns da Penitenciária Central do Distrito Federal com o regi- EN MATII~RE CRIMINELLE. pág. 142).
me carcerário que na mesma Penitenciária. está sendo aplicado ao Suplicante, veri-
fica-se, sem som.bra de dúvida, que os réus de crimes comuns tém um regime Ora, esta é eXdtamente a situação do Suplicante. Conde.nado a duas penas
brando e o Suplicante, pelo contrário, tem um regime que já ultrapassou todos os de reclusão, uma de 10 anos de duração e outra de 6 anos e 8 meses, e, Posterior- (
rigores, porque é, em tudo, antes de tudo, e sobretudo, particularmente mente, a uma prisão celular de 30 anos, não· conseguiu sair do regime puramente
alu(;inante. Só a fibra de um habituado a afrontar todos os riscos, só a têmpera de policial, que é aplicado, nas Delegacias do Palrcia, àqueles que são acusados de te. (11
um lutador que não se dobra diante de todas as ameaças, só o caráter de um com- rem praticado algum crime, e que são conservados, por isto, dentro da mais abso- ~
batente destemeroso, é que seriam capazes de dois ou três meses, em 1937 -, a lUta e rigorosa incomunicabilidade. A única diferença que existe entre estes aCUsa. 1:
(
um regime tão duro, tão implacável e tão cruel. dos e o Suplicante é esta: a incomunicabilidade deles dura apenas alguns dias, ou, '"
.11:

no máximo, algumas semanas, ao passo que a do Suplicante dura já-6 longos anos. (
:.. 1
226
~Iili
227 \~
\á,
'--
,

Nesta matéria de visitas, o Suplicante se encontra numa situação realmente


" singular. A sua Mãe, esposa, filha e irm§'s não se acham presentemente no Brasil.lm- São estas, Sr. Ministro Presidente, as reivindicações que o Suplicante vem
possível será, assim, ao Suplicante, receber as suas visitas. Os outros parentes, e pleitear perante os Juízes incumbidos de fiscalizarem o cumprimento da pena qúe
mesmo alguns amigos dedicados e solícitos que desejassem visitá-lo, ver-se-iam Io- lhe foi imposta. Após seis anos de torturas morais indescriHveis, espera o Suplican-
ga envoltos numa atmosfera de perigosa suspeição. Graves aborrecimentos lhes po- te que ao menos estas franquias lhe serão asseguradas, em toda a plenitude, como
deriam advir se teimassem em ver e visitar o Suplicante. o estão a eXigir os mais elementares princípios de justiça.
Assim, uma só pessoa existe no País que está isenta, pela própria natureza Requerendo a junção da presente aos autos do respectivo processo, a fim
das suas funções, de toda e qualquer supeição: é a pessoa do advogado do Supli- de que sejam tomadas pelo Tribunal de Segurança Nacional as medidas aqui plei-
teadas,
cante, o qual, como V. Exa. não ignora, foi constituído defensor do mesmo Supli-
cante por indicação do Conselho da Ordem dos Advogados nesta Seção do Distri-
to Federal, e conseqüente nomeação do Juiz deste Tribunal, Dr. Raul Campelo
Machado, P. e E. Deferimento.
Por esta circunstância, o advogado do Suplicante acha que têm inteiro ca-
bimento aqui estas graves e austeras palavras de Saillard:
Distrito Federal, 30 de abril de 1942.
"A primeira obrigação do advogado é ir ver o seu cliente; ele preencherá,
assim, o voto da lei, fazendo isto desde o começo, e reiterando as suas visitas tão
freqüentemente quanto o interesse da defesa o exija.
(a.) Heráclito Fontoura Sobral Pinto,
Ele poderá, portanto, EVITAR OS EFEITOS FUNESTOS E AUMENTAR
OS BONS RESULTADOS QUE O ISOLAMENTO PRODUZ sobre aqueles que,-
inocentes ou culpados -, não adquiriram, ainda, o triste hábito da prisão. "Aí,
diz o Sr. Trarieux, ele poderá exercer o seu ministério de doçura, bondade, bene·
volência e prodigalizar encorajamentos que tornarão menos sombria e áspera, e
previnirão qualquer ato de desespero".
,Ih'
Sente·se, aqui, o grande papel moral de consolação e de regeneração social,
que é confiado ao advogado: o inculpado, deprimido pelo regime de sua dete;lção, II!I
escutará boamente os conselhos discretos daq!Jele em quem ele terá posto a
sua confiança. O ÚNICO DO QUAL, EM TODO O CASO, ELE ESTÁ CERTO DE
I'
11'
QUE NÃO TERÁ NUNCA QUE DESCONFIAR, E AO QUAL ELE PODE TUDO I
DIZER SEM TEMOR. Não está ele seguro de que nada sairá da sua boca, que não I"~
possa ser útil aos seus próprios interesses? A célula se presta maravilhosamente pa-
ra esta influência direta do homem sobre o homem." (lbid" pág, 98),
Segregado de tudo e de todos, poderá ao menos o Suplicante ouvir, todas
as semanas, a palavra leal, solícita-, e austera do seu advogado: li!
3'? - executar quaisquer trabalhos condizentes com a sua condição de con- i''I"·
~I
ill
denado político, em recinto distinto do do seu cubículo, se possível;
;:1
4~ - tomar banhos de sol, e fazer alguns exercícios f(sicos em lugares li'

apropriados, de modo a resguardar e garantir o bom funcionamento de todos os i:!:


seus membros e órgãos;
5'? - ler livros e jornais de SU!3 preferência, à semelhança, aliás, do que é
li
permitido,-pela administração carcerária, a todos os condenados de crimes comuns.
!II
228
r
~

229
tJ Código estabelece, portanto, distinção entre os atos que integram a figu-
ra do inquérito policial militar: aqueles que se manifestam através de vestígios
~
~(
materiais ou de pessoas vinculadas ao fato criminoso são susceptíveis de ser tidos
como provas, mas aqueles que não pertencem a essa categoria, tais como testemu-
nhas, confissões, acariações e reconhecimento i~e pessoas não podem ser tidos
como prova, dpvendo ser considerados apenas como elementos destinâdos a habili-
tar o Ministério Público a instaurar a respectiva ação penal.
RAZOES DE APELAÇÃO DE EURICO NATAL
A lei processual determina, portanto, de forma categórica, que, com exe-
ção das perícias e dos exames, levados a efeito no inquérito policial, toáos os
outros elementos nele ··recolhidos devem ser considerados pelo Juiz do. processo
(

~.
como inexistentes após o oferecimento da denúncla.
Essa distinção entre os elementos colhidos no inquérito iustifica~se plena-
mente, Basta ler o àrt. 314 do Código de Processo Penal Militar para que se apure,
desde logo, a legitimidade da distinção,
o grande e quase genial historiador brasileiro CAPISTRANO DE ABREU, Realmente, determina este artigo:
observador exato e pesquisador penetrante dos costumes, hábitos e normas da vida liA perícia pode ter por objeto os· vestígios materiais deixados pelo crime
da gente brasileira, tais como os registram a história, não cessava de proclamar, por ou as pessoas e coisas, que, por sua ligação com o crime, podem servir-Ihedepro-
força de seus estudos e de suas observações, que o Brasil só progrediria com firme- va."
za e só se tornaria um País civilizado no dia em que fosse promulgada a seguinte As perícias e os exames recaem, como acima se declara, sobre coisas que
lei: "Art. 19-5upram·se todas as leis existentes. Art. 2Q-Revogam-se todas as dis- existem realmente e sobre pessoas de identidade absoiutamente conhecida. Aque·
posições em contrário:' las e estas não podem ser inventadas nem forjadas, elas sãõ porque são, sendo a
Esta afirmação de CAPISTRANO DE ABREU era o resultado da verifica· verificação delas e as suas relações com· o crime, que a justiça precisa de punir,
ção, que vinha fazendo, desde muito, a respeito da não aplicação constante e inin- estabelecidas com total certeza, mesmo na fase do inquérito.
terrupta de numerosas leis votada: pelo Poder Legislativo do País. Coisa idêntica, entretanto, já não acontece cem os demais elementos reco-
lhidos no inquérito, porque a violência das-autoridades policiais pode perfeitamen-·
Os chamados processos de subversão, atualmente da competência da Justiça
te fabricá-los, sem nenhuma correspondência com a realidade dos fatos. T estemu- '·U']
Militar, comprovam, de maneira Impressionante, a exata· e indiscut(vel observação
nhas e indiciados podem, sob a pressão de torturas as mais diversas, dizer que (
de CAPISTRANO DE ABREU. ]i"
viram o que não viram e fizeram o que não flzeram, A coação física e moall exer· (
Com efeito, um passeio tranqüilo e despreocupado através dos artigos do
cida sobre pessoas, ainda que enérgicas e varonis, é de molde a arrancar dos indi· i!
Código de Processo Penal Militar revela a existência de alguns preceitos legais, que (
ciados confissões falsas e de testemunhas depoimentos fantásticos. Porque isto é
não são sistematicamente cumpridos pelos órgãos competentes da Justiça Militar. I~
perfeitamente possível, é que o legislador deu aos elementos desta natureza apenas (,
Assim, por exemplo, o art. 99 do referido Código de Processo Penal Militar o caráter de simples informação para instauração da respectiva ação penal. ·'1

preceitua: Este parágrafo único acima transcrito é completado pelo art. 314 do aludi- c' 'i
"O inquérito policial militar é a apuração sumária de fato, que, nos termos do Código de Processo Penal Militar que diz:
legais, configure crime militar, e de sua autoria. Tem o caráter de instrução provi- "A perícia pode ter por objeto os vestígios materiais deixados pelo crime ou ('I
sória, cuja finalidade precípua é a de ministrar elementos necessários ã propositura as pessoas e coisas, que, por sua ligação com o crime, passar serlfir-Ihe de próva".
da ação penal. Do inquérito policial militar, assim, só se salvará, na hora do julgamento,
Parágrafo único. São, porém, efetivamente instrutórios da ação. penal os a prova material que, através de exames e de perícias, tiver sido nele recolhida.
exames, pen'cias e avaliações: realizados regularmente no curso do inquérito, por Tudo o mais, tais como depoimentos de testemunhas, confissões, acariações, não
pel'itos idôneos e com obediência às formalidades previstas neste Código". poderão servir de elementos para a condenação de qualquei indiciado. Tais·ele- C
1
mentos só serão válidos, no momento do julgamento, se tiverem sidos ratificados
230 l_'I'!I
231 <"I
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em juizo. É isto o que ordena a lei, cujo texto acaba de ser reproduzido nestas PQis bem, Srs. Ministros, estes textos legais foram postos de lado, como
Razões de Apelação. se não existissem, pela Sentença que condenou EUR ICO NATAL à pena de dois
A conclusão supra-indicada é confirmada, em termos expressos, pelo art. anos de reclusão, como incurso no art. 43 do Decreto-Lei n9 898, de 29 de
297 do já citado Código de Processo Penal Militar, que ordena, categoricamente: setem bro de 1969.
"O juiz formará. convicção pela livre apreciação do conjunto das provas Contra o ora Apelante EURICO NATAL não foi colhida em ju(zo prova
colhidas em juíza. Na consideração de cada prova, o juiz deverá confrontá·la com nenhuma, quer testemunhal quer material. A Sentença o reconhece em termos ex-
as demais, verificando se entre elas há compatibilidade e concordância". pl(citos, como, a seguir se demonstrará.
A segunda parte do artigo acima reproduzido está, evidentemente, subor- Quanto à prova testemunhal, eis os seus termos:
dinada ao preceito imposto na primeira parte, a saber, aquela que declara que só "As testemunhas arroladas pela Procuradoria às folhas 1414, 1417,1419,
têm valor para o julgamento as provas colhidas em jUl'zo. 1421, 1493, 1495, apenas testemunharam, respectivamente, os depoimentos de
Não pairam nas normas até aqui transcritas as providências do Código de ANTONIO GONÇALVES EGLER, JANETE OLIVEIRA CARVALHO, EURICO
Processo Penal Militar no sentido de permitir a condenação de alguém só mediante NATAL, DALTON GODINHO PIRES e as duas últimas, de UBAJARA SILVEI-
as provas colhidas em ,juízo. Realmente, o artigo 309 desse Código estabelece: RA ROR IS. Estas testemunhas se limitaram a reconhecer os acusados e a declarar
"A CONFISSÃO É RETRATÁ VEL e divisível, sem prejuízo do livre con- que os depoimentos foram prestados sem qualquer eiva de violência ou coação."
vencimento do juiz, FUNDADO NO EXAME DAS PROVAS EM CONJUNTO". As testemunhas, assim, não puderam informar coisa alguma sobre as supos-
Deste modo, a confissão, feita no inquérito policial, mas que é retratada tas atividades criminosas de EURICO NA TAL. O que dizem é que o mesmo pres-
em juízo, na hora própria, não pode servir de prova para condenar a quem quer tou as suas declarações livremente e sem a menor coação.
que seja. Estas testemunhas não estão mentindo, porque o que lhes foi dado assistir
Quando o texto .acima transcrito auto~iza que o juiz, por livre convenci- foi o ato final de uma violência.e de uma coação que vinha durando meses, no cur-
mento se utilize da confissão que foi retratada, estabelece, entretanto, uma condi- . so dos quais o ora Apelante sofreu toda a espécie de torturas, dum isolamento to·
ção legal, que é a do "EXAME DAS PROVAS EM CONJUNTO". tal, mantido em rigorosa e pertinaz incomunicabilidade, com ofehsa clara, perma-
Da aproximação do membro de frase "EXAME DAS PROVAS EM CON- nente" e manifesta à lei.
JUNTO". constante do art. 309, do outro membro de frase "CONJUNTO DAS Realmente, o Decreto-Lei n9 898, de 29de setembro de 1969, dispõe, no
PROVAS COLHIDAS EM JUIZO", integrante do art. 297, ambos do Código de §19 do art. 59:
Processo Penal Militar, apura-se que a expressão usada pelo art. 309 e referente à "0 Encarregado do Inquérito poderá manter incomunicável o indiciado até
confissão, só é admissível para as provas colhidas em juízo ou para as provas mate- dez dias desde que a medida se torne necessária às averiguações policiais milita-
ríais' colhidas n"o inquérito, nos termos do parágrafo único do art. 99, combinado res".
com os termos do art. 314, ambos do Código de Processo Penal Militar. Por seu turno, a Lei n9 4.215, de 27 de abril de 1963, determina, no ítem
Não é lícito ao juiz comparar ou aproximar uma confissão, obtida no in· III do art. 89:
quérito policial militar, com outra confissão, recebida no mesmo inquérito policial "São direitos do advogado: ii
militar, para, através desta comparação ou aproximação, proclamar que, sendo elas comunicar-se, pessoal e reservadamente, com os seu clientes, ainda quando [i·'
compatíveis, constituem prova contra os dois acusados. E não é lícito porque estes se achem presos ou detidos em estabelecimento civil ou militar, mesmo inco- t
ambas as confissões foram feitas no inquérito policial militar, o que lhes tira toda municáveis". li:
e qualquer credibilidade. A prisão incomunicável em que EURICO NA TAL foi mantido, duante me- I
A confissão, feita no inquérito policial militar, só é aceitável como prova ti
ses, sem que ninguém, inclusive a sua própria família, soubesse em que prisão ele
quando ela pode ser comparada ou aproximada de uma prova material que pesa fora colocado, e os motivos que a determinaram, foi, portanto, flagrantemente ile-
sobre o autor da confissão. Se esta prova material, nos termos do parágrafo único gal, em face dos termos da lei acima reproduzidos, na sua integridade. )'1
do art. 99, combinado. com os termos do art. 314 do mesmo Código, não existe É claro que, após ter sido seviciado, coagido e ameaçado, recebeu a reco-
relativamente ao autor de uma confissão feita no inquérito policial militar, tal con- mendação de afirmar, calma e tranqüilamente, tudo aquilo que lhe fora sugerido II
fissão não autoriza, nos termos da lei, condenar o autor dela, se, em ju ízo, ele a
;;
no período das torturas, sob pena de, não o fa~endo, voltar novamente para câ- ,.1\
retistou. mara das torturas. Sem a menor possibilidade de resistir nem de recorrer à prote- ",i

232 233
ç,ão de sua família e do advogado de sua escolha, a solução era capitular ante a prov.as materiais que as confirme, a Sentença prossegue nestes termos: ~
vontade abusiva de seus algozes. Repetiram, por isto, a lição mentirosa anterior· "Mister, entretanto, se faz entender que uma simples declaração seja insufi- ~
~
mente recebida. Desta forma, uma confissão feita no inquérito policial, sem que ciente, mas, vários co-réus fazendo as mesmas acusações ou se referindo a um fa-
nesse inquérito haja qualquer prova material que a confirme, foi considerada pelos to, esta prova já vem tomando corpo, embora, de inquérito o podem conduzir os
ju(zes militares como prova da culpabilidade do ora Apelante EURICO NA TAL, julgadores a uma convicção de que esta ou aquela acusação tem cabimento. É o
que acontece nestes autos". 'i~
quando a lei, que regula.o assunto, preceitua, em termos precisos e inconfundíveis, (
que uma tal confissão tem de ser tida como inexistente, uma vez que foi retratada É de pasmar o ilogismo e a ilegalidade da Sentença, desde que o que é ile-
na hora própria, perante os juízes que, no momento do julgamento, deliberaram gal uma vez, tem de ser ilegal dez ou cem vezes. Quando a lei determina que as
elevá.la à categoria de prova, apesar da manifesta proibição da lei. confissões feitas no inquérito não têm o valor de prova é porque, no inquérito,
Estranha e surpreendente é a coerência e a lógica da Sentença, como o de- as confissões não são feitas dentro das condições e das garantias impostas pelo
monstra o seguinte trecho desse documento: ei-Io: art. 307 do Código de Processo Penal Militar, condições e garantias que são
"Fala-se, no autos, sobre um julgamento que havia ocorrido, de um s.u bver - as seguintes: (
sivo de nome GERALDO DAMASCENO e, acusam-se alguns réus de terem sido os "Para que tEmha valor de prova, a confissão deve:
a) - ser feita perante autoridade competente; . (
autores. Ora, sobre o fato nada foi apurado. Nada resultou provado sobre o fato."
Aqui, como o trecho supratranscrito o demonstra, a Sentença resolveu, e o b) - ser livre, espontânea e expressa;
fez acertadamente,não levar em consideração as confissões dos indiciados, porque c) - versar sobre o fato principal;
d) - ser v-erossímil; (
não foi recolhida nos autos, mesmo na fase do inquérito, prova nenhuma da mor-
te, por execução, do companheiro de subversão. Tal procedimento da Sentença foi e) - ter compatibilidade e concordância com as demais provas do praces- (
so".
correto, sensato e lagal, por isto que a prova da morte, e morte por execução, não (
Ora, a confissão atribu(da a EURICO NATAL não foi feita perante a auto-
foi apresentada nos autos.
Entretanto, nos outras pontos da confissão, naqueles em que há referên- ridade competente, a saber, o encarregado do inquérito; não foi livre, espontânea e í
cias a aliciamento de n'ovos membros para o Partido Comunista do Brasil, conver- expressa, mas, pelo contrário, foi coagida, obrigada e imposta; e, finalmente, não é
(
sas nas esquinas das ruas, reuniões nas casas de -uns e dos outros dos membros des- compatfvel nem concordante com as demais provas do processo, uma vez que não
te Partido, a Sentença, num ilogismo flagrante contrário à lei, deixou de aplicar o foi recolhida nos autos prova de espécie alguma que confirme as declarações do (
mesmo critério, considerando a confissão, em tais pontos, como prova suficiente inquérito ~ ele atribul'das.
(,
para condenar o ora Apelante EURICO NATAL_ Numa incoerência, que a lei condena, a Sentença chama prova aquilo que, 0'
Este i1ogismo merece maior censura, porque ·a Sentença desrespeitou a lei, a seguir, ela declara: (l
sabendo que o fazia, consoante certifica o trecho que se segue: "Alguns acusados prestaram depoimentos convergentes para estabelecer (
liA lei entende que a simples confissão de inquérito e as declarações de co- responsabilidade de outros e esses depoimentos foram depois confirmados em su- I'
réus não são suficientes como prova". mário, não pelos réus, é verdade, mas por testemunhas que, no inquérito, presen- C
A conclusão 16gica, serena e imparcial desta afirmação certa e legal da Sen- ciaram suas declarações e, em Ju ízo, vêm e declaram que o fizeram de livre e es- (
pontânea vontade, sem qualquer coação." '-l!
tença, seria a da absolvição daqueles indiciados que figuram no processo sem que
nos autos respectivos surja prova material, seja de que natureza for, que confirme As testemunhas convocadas, agora, pela Sentença para -dar credibilidade (I;
as declarações prestadas no inquérito, naquela fase em que eles permaneceram in- às confissões dos indiciados, não estiveram ao lado e na presença dos mesmos in· C
comunicáveis durante meses, sem que as suas próprias fammas soubessem o desti- diciados durante todo o peiíodo em que eles permaneceram detidos e incomunicá- ( il ,

no deles. ~ óbvio que esta incomunicabilidade e esta detenção desconhecida estão veis em prisões do exército,. sofrendo toda a espécie de torturas para que anuíssem
a atestar que os indiciados sofriam, nesse período, toda a espécie de coação, com em dizer aquilo que as autoridades militares queriam que eles dissessem. Estas tes- \,
i'il
a finalidade de forçá-los a dizer e a proclamar aquilo, que na verdade, eles não temunhas s6 estiveram presentes ao ato final, que era o resultado de toda a coa-
ção que durava meses. Este aspecto já foi focalizado anteriormente nestas mesmas I,
tinhàm feito nem praticado. (
Ê de salientar, agora, que, depois de reconhecer que a lei não dá o menor Razões de Apelação. Assim, o que a Sentença considera prova é uma série de con- 1
valor às confissões feitas no inquérito policial, que estejam desacompanhadas de fissões feitas com infração e desrespeito total ao que .figura preceituado no art.
lil
234 235 \1
~
~

,-
A confissão desacompanhada de qualquer prova materiElI é nula, não podendo
307 do Código de Processo Penal Militar, já anteriormente citado. 100 confissões
ser admitida como prova por qualquer juiz militar.
nulas, quando reunidas, não se transformam numa confissão verdadeira, isto é, não
Mais singular, ainda, é a afirmação de que a lei não é tão liberal como se
podem ser elevadas à categoria de prova. A validade de uma confissão não é uma
apreg"oa. Onde, na lei e na doutrina, os textos, as razões e as declarações que au-
questão de número, mas uma questão de qualidade. Aquilo que não- presta nem va·
le nada porque não se reveste das condições exigidas pela lei, pode se repetir dez, torizam a fazer afirmação tão grave. A lei é o que é. Contra ela não podem"preva-
cem ou mil vezes que continua a não prestar e a não valer nada. lecer argumentos nem quaisquer considerações de ordem pai (tica. A nossa lei
não é nem rigorosa nem frouxa. Ela é a lei e tem de ser obedecida.
É de uma ingenuidade, incompreens(vel em homens experimentados, como
Finalmente, o mais espantoso é que a Sentença reconhece que não fo"i co-
aqueles que proferiram a Sentença que condenou EURICO NA TAL que conside-
lhida no processo prova nenhuma a respeito das supostas atividades ilegais de
rem eles verdadeiras as confissões, feitas no inquérito, por serem l/convergentes pô-
EURICO NA TAL, porque ninguém assistiu aos aliciamentos que lhe são atribuf-
ra estabelecer responsabilidade de outros".
dos, ninguém ouviu as suas conversas com os supostos correligionários comunistas,
Esta convergência é o que há de mais explicável: os indiciados estiveram
ninguém presenciou a sua leitura de jornais comunistas clandestinos. Como tudo
meses a fio nas mãos dos interrogadores. Obtida a declaração de um, mediante o
isto é muito difídl de ser apurado pelas autoridades repressoras do comunismo,
emprego da tortura, torna-se fácil, através dos mesmos métodos de coação, obter
conclui-se que a e!as"é I(cito torturar os trabalhadores humildes, a fim de arrancar
dos demais indiciados declarações idênticas.
deles. pela coação insuportável, a confissão falsa de todas estas atividades.
A convergência, a que alude a Sentença, obtida no decurso do inquérito Quando os jUl'zes, sentinelas da lei, tornam nulos os seus preceitos, sob o
que se arrasta por meses, com os indiciados incomunicáveis, longe ae ser prova de fundamento de que eles protegem supostos inimigos do regime, estão preparando,
culpabilid~de deles, revela, pelo contrário, o abuso das autoridades que presidiram sem que o percebam; para a Pátria, um futuro sombrio e funesto. Os fatos sociai"s
tal inquérito. não provocam, no seio da comunidade onde eles surgem, conseqüências rápidas ou
O ponto mais lamentável, porém, da Sentença é aquele em que declara imediatas. Eles vão solapando aos poucos as normas que presidem ao desenvolvi- 11
que, embora se arriscando a condenar inocentes, entende que as confissões mani- mento social de tais comunidades.
festamente ilegais, feitas· sem as condições e garantias impostas pelo art. 307 do O desrespeito consciente e sistemático das leis de um Pa(s pertencem a esta
Código de Processo Penal Militar, devem ser aceitas como prova, pela incapacida- categoria de fatos sociais. Os efeitos desagregadores que dele decorrem não apare-
de das autoridades repressoras de conseguir as provas exigidas pela lei. Torture-se, cem logo. Levam anos para revelar a sua obra de destruição. Ele acarreta, necessa·
coaja-se,·sevicie-se, desrespeite-se a dignidade da pessoa humana, mas arranquem-se riamente, o desprestfgio da Justiça e a confiança que nela depositam os cidadãos
confissõ~, ainda que falsas, para garantir o regime que a( está. Aqui vão estas "in- da Pátria, cujo despertar é quase sempre desastroso e doloroso.
",Ivei, palavras da Sentença: A Sentença reconhece que não existe nos autos prova alguma contra"o ora
lias métodos empregados para a propaganda do regime comunista e suas Apelante EURICO NA TAL; Nem no inquérito, nem no sumário entrou nestes
dis~id"ências já por si só tornam-se dific(limos de serem provados, porque feita atra- auto, prova alguma apontando o ora Apelante EURICO NA TAL como comunista i
vés de ~liciamentos, leituras, sobretudo de imprensa clandestina, conversas aopé.
do~ouvido, tudo no maior segredo, subrepticiamente, nos subterrâneos da subver-
são, cada vez mais vigorosa. Há nos autos referências a dinheiros vindos do exte-
e como comunista em atividade. A condenação dele, pela Sentença, decorreu tão
somente da sua confissão, feita no inquérito, e de outros indiciados, também fei-
ta no inquérito.
~I
rior, donde se conclui, auxflio externo para sustentação dos partidos fora-da-Iei. Pouco importa que a lei não admita sejam tidas como prova semelhantes ",t"
A não aceitar-se esse tipo de provas que, embora de co-réus, venham acompanha- confissões. O que é preciso é condenar, conforme a própria Sentença confessa
das de confissÇ)es, seria deixar à larga a atuação do insidioso inimigo da Pátria. t
verdade que se faz necessária uma interpretação rigorosa de um tal tipo de prova,
nestes termos:
"Ora, não admitir-se acusações desta natureza, seria deixar aos inimigos
'i'II'
:i

pois, injustiças podem ocorrer, sobretudo quanto a inimizades partidárias ou um


elemento mal avisado queira deixar as fileiras da subversão, que são citados pelos
do regime, uma situação muito cômoda para defender-se a continuar livremente ;~;
com o apanágio da Justiça, sua propaganda desagregadora e nefasta ao regime
membros ativistas. Conclui-se assim, que a lei não é tão liberal como se alega." I'
constitu(do. Não fora assim o único culpado' neste inquérito seria DALT9N GO- J
O que é singular em toda esta exposição da Sentença é que ela se atreve DINHO PIRES que teve apreendido em sua residência material subversivo _.. " 'i,
a denominar prova aquilo que, pela lei, não tem nem pode ter semelhante valor.
237
236

J
Não pode o ora Apelante EURICO NA TAL deixar de acentuar que' há, Se o Superior Tribunal Militar entender, apesar da argumentação cerra-
nestes autos, prova idônea de torturas cruéis aplicada aos indiciados na fase do in- da aqui desenvolvida, de condenar o ora Apelante EURICO NATAL, deverá,
quérito. A Dra. GRACIELA MEINBERG FADUL. segundo diz a própria Seno em tal caso, receber o presente recurso para, modificando a Sentença de li! Ins-
tença. tância, condená-lo a 6 meses de reclusão.
"Alegou que o depoimento prestado, no inquérit.o, não representa a verda- Em face de tudo quanto foi exposto, debatido e argumentado, com ba-
de, porque obtido à base de violência e coaçã:o moral, frsica e psic9Ióglca". se na lei reguladora do assunto, confia o ora Apelante EURICO NA TAL seja
Mais adiante, continua a Sentença: absolvido e, na pior das espécies, condenado a pena de reclusão de 6 meses.
"às folhas 1.611, uma informação do Hospital Central do EXÉRCITO dá Urge, porém, proclamar, com veemência, que a solução legal do seu caso é a
noticia de que a Dra. GRACIELA MEINBERG FADUL fora apresentada àquela absolvição, como estão a exigir os preceitos da serena e imparcial
entidade, com um prolapso hemorroidário e ali operada. Isto ocorreu no decurso JUSTiÇA
de sua prisão".
Esta indiciada foi absolvida, e o foi acertadamente, uma vez que a sua con-
fissão, falsa, decorreu das torturas tão cruéis que lhe inflingirarn até o ponto de Rio de Janeiro, 12 de janeiro de 1976.
ser necessária a sua internação no Hospital Central do Exército, onde fói operada.
A conclusão lógica, legal e justa da argumentação até aqui desenvolvida é
uma só, no que diz respeito ao ora Apelante EURICO NA TAL, a sua absolvição,
à semelhança do que ocorreu com a Dra. GRACIELA MEINBERG FADUL.
Heráclito Fontoura Sobral Pinto.
Mas, admitindo-se, para argumentar, que o ora Apelante devesse ser con-
denado, com_ fundamento nas confi.ssões , extorquidas pela violência, recolhidas
nestes autos, não poderá ele ser condenado a dois anos de reclusão, como incurso
no art. 14 do Decreto·Lei n9 898 de 29 de setembro de 1969. A Sentença deciara,
no que lhe diz respeito:
"Condenar EURICO NATAL, unanimemente, e por maioria de votos,
como incurso no art. 43, a dois anos de reclusão".
O art. 14 do referido Decreto-Lei, preceitua:
"Formar, filiar-se ou manter associação de qualquer título, comitê, entida-
de de classe ou agrupamento que, sob a orientação ou cqm o auxflio de governo
estrangeiro ou organização internacional, exerça atividades prejudiciais ou perigo-
sas à Segurança Nacional.
Pena: reclusão, de 2 a 5 anos, para os organizadores ou mantenedores, e de
6 meses a 2 anos, para os demais_"
Apura-se, pelo texto acima transcrito, que a pena de 2 anos de· reclusão é,
num caso, pena m(nima; e, noutro caso, pena máxima.
É pena mínima quando se trata de organizadores e mantenedores; e é de
pena máxima, para os demais.
No caso do ora Apelante EURICO NA TAL, a sua confissão, falsa, não o
coloca na posição de organizador e mantenedor do Partido Comunista. Consi-
derada como prova, embora ilegalmente, ela o colocaria na situação de apenas
filiado do Partido Comunista.
Neste hipótese, sendo ele primário, a pena a lhe ser imposta teria de ser
de 6 meses, e nunca de 2 anos.

238
239

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\
SUMARiO

7 Carta de Sobral Pinto a Ary Quintella, de 7.3.79.

11 Carta de Juscelino Kubitschek de Oliveira a Sobral Pinto, de


9.2.72.

13 Discurso do Deputado Federal Álvaro Valle, em 13.3.79, sobre à


concessão do PrDmio Juca Pato ao jurista Sobral Pinto.

17 Porque Defendo os Comunistas- introdução de Ary Quíntella.

35 Auto de Declarações prestadas pelo Capitão Luiz Carlos Prestes,


em 9.3.36.

37 Carta de Sobral Pinto à sua irmã Natalina, de 11.1.37, a respeito


de seu patrocínio de Luiz Carlos Prestes.

40 Carta de Sobral Pinto a Targino Ribeiro, Presidente do Conselho


da OAB, de 12.1.37, aceitando a defesa de- Luiz Carlos Prestes e
Harry Berger.

42 Carta de Sobral Pinto a Dom Sebastião Leme, Cardeal do Rio de


Janeiro, de 14.1.37.

43 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, Juiz do Tribunal


de Segurança Nacional, de 15.1.37, solicitando lhe seja permitido
entrar na célula de Luiz Carlos Prestes.

45 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 15.1.37,


solicitando seja dispensado tratamento condigno a Harry Berger.

47 Resposta de Euzébio de Queiroz Filho, Comandante da Polícia


Especial, ao Juiz Raul Machado, em 25.1.37, confirmando
denúncia de Sobral Pinto relativa ãs condições de encarceramento
de Harry Serger.

48 Defesa Prévia de Harry Serger, de 29.1.37.

58 Exposição de Sobral Pinto a Raul Machado, de 29.1.37, expli-


cando porque ainda não fizera a Defesa Prévia de Luiz Carlos
Prestes.

--. - --~._-
("
( ~
Ofício de Raul Machado a Euzébio de Queiroz ~ilho, Coman-

~j
62 Carta de Diga Benário Prestes, esposa de Luiz Carlos Prestes, de 97
31.1.37, à sua sogra, Leocádia Prestes. dante da Polícia Especial, de 9.4.37, referente ao relacionamento
de Sobral Pinto com Luiz Carlos Prestes, e outra matéria:
63 Tradução da carta de Diga Benário Prestes.
98 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 10.4.37, a respeito
. 64 Requerimento de Sobral Pinta a Raul Machado, de 11.2.37, a da correspondência dela com Luiz Carlos Prestes .
respeito da impossibilidade de David Levinson, advogado norte-
americano, ser patrono de Harry Berger no Brasil. Exposição de Sobral Pinto a Raul Machado, de 14.4.37, sobre as (
101
razõ.es de não haver ainda apresentado as Alegações Finais em (
70 Carta de Sobral Pinto a Agamennon Magalhães, Ministro da favor de Harry Berger.
(
Justiça, de 13.2.37. .

107 çarta de Sobral Pinto a Minna Ewert, irmã de Harry Berger, de (


73 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 2.3.37, 27.4.37, a respeito de David Levinson.
(
falando das péssimas condições de encarceramento de Harry
Berger e sólicitando seja aplicada ao prisioneiro a lei de Proteção 110 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 5.5.37, (
aos Animais. reiterando lhe seja permitido falar a sós com Luiz Carlos Prestes.
(
82 Notícia de A Noite, anexada ao requerimento de 2.3.37. 112 Protesto de Sobral Pinto ao Comandante da Polícia Especial, de (
5.5.37, referente a pressões exercidas por aquela autoridade (
83 Carta de leocádia Prestes a Luiz Carlos Prestes, de 6.3.37, co- contra Luiz Carlos Prestes.
municando o nascimento da filha dele. (
116 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 8.5.37, comunicando (
85 Carta de Lygia a seu irmão Luiz Carlos Prestes, falando de Anita a condenação de Luiz Carlos Prestes a 16 anos e 8 meses de
Leocádia, filha dele, sem data. prisão.
(
(
86 Ofício de Raul Machado ao Chefe da Polícia do Distrito Federal, 118 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 12.5.37. comuni-
de 9.3.37, referente às péssimas condições de encarceramento de cando a entrega dos objetos remetidos ao filho.
( .
Harry Berger.
(" \
120 Carta de Sobral Pinto a Minna Ewert, de 20.5.37, comunicando a
87 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 11.3.37, condenação de Harry Berger a 13 anos e 4 meses de prisão. (
solicitando seja entregue a Luiz Carlos Prestes correspondência a (,
ele dirigida. 122 Pelo Apelante Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger, em 24.5.37.
C "
.1 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 12.3.37, em que fala
de sua posição como advogado de Luiz Carlos Prestes e Harry
131 Pelo Apeiante Luiz Carlos Prestes, em 24.5.37. ,
\

Berger. 141 Carta de Sobral Pinto a leocádia Prestes, de 28.5.37, descrevendo


a revista de objetos pessoais que ele entregara a Luiz Carlos
94 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 5.4.37, Prestes.
solicitando lhe seja assegurada a livre comunicação com Luiz (,
Carlos Prestes. 146 Carta de Sobral Pintu a J.osé Carlos de Macedo Soares, novo
\
Ministro da Justiça, de 3.6.37, descrevendo as péssimas condições
95 Requerimento de Sobral Pinto a Raul Machado, de 6.4.37, de encarceramento de Harry Berger, "reduzido à humilhante \
r~iterando seu pedido de remoção de Harry Berger para outro condição de animal hidrófobo", e de. Luiz Carlos Prestes, que \.
cárcere. "sofre a tortura alucinante da sentinela à vista, dia e noite".
\,
\ .

,...=~- L'
149 Carta de Sobral Pinto a Minna Ewert, de 11.6.37, a respeito da 180 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 18.9.37, a respeito
possibilidade da cunhada dela - Sabo - retornar ao Brasil~ de do "reconhecimento, por parte de Luiz Carlos Prestes, de sua
onde fora expulsa. filha Anita Leocádia".

152 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 12.6.37, referente 11 182 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 25.9.37, comuni·
possível transferência de cárcere de Luiz Carlos Prestes e Harry cando a remessa à Gestapo de certidão de escritura de reconhe-
Berger. cimento de Anita.Leocádia.

154 Carta de Sobral Pinto ao cardeal Dom Sebastião Leme, de 3.7.37, 186 Carta de -Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 4.12.37, ainda a
solicitando a Sua Eminênç:ia "chamar à razão os nossos governan. espeito de Anita Leocádia.
tes" para que Harry Berger não morra na Polícia Especial.
188 qarta de Sobral Pinto a Francisco Campos, Ministro da Justiça, de
156 Carta de Sobral Pinto ao Presidente da República, Getúlio Dor- 4.1".38, solicitando providências para assegurar o seu entendi-
nelles Vargas, de 8.7.37, a respeito das "torturas morais" que mento com Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, na Casa de Cer-
Luiz Carlos Prestes e Harry Berger vinham sofrendo, bem como reção, e mencionando o procedimento de Filinto Müller, Chefe de
"os supll'cios ffsicos indescritíveis, que estavam a inflingir a Harry Polícia.
Berger" .
160 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 10.7.37, sobre a 191 Carta de Sobral Pinto a Francisco Campos, Minisvo da Justiça, de
transferência de prisão de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger. 10.1.38, mencionando "Neste regime de senzala que o Getúlio,
com a sua colaboração . .. "
162 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 17.7.37, sobre a
defesa de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger. 194 Carta de Sobral Pinto ao Capitão Luiz Carlos Prestes, de 15.1.38,
em que declara: "Os de quem me desinteresso, Sr. Capitão, são
167 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 24.7.37, a respeito os vencedores".
das condições de transferência de Luiz Carlos Prestes para a Casa
de Correção. Carta de Sobral Pinto a9 Tenente Canepa, novo Diretor da Casa
196
171 Carta de Sobral Pinto a Carlos Lassance, Diretor da Casa de
de Correção, de 15.1.38, remetendo livros para Luiz Carlos Pres-
Correção, de 12.8.37, prestando contas da quantia remetida por tes.
Leocád ia Prestes.
197 Carta de Sobral Pinto para Francisco Negrão de Lima, Chefe do
173 Requerimento ao Relator da Apelação Crime nÇ> 4.899. de Gabinete do Ministro da Justiça, de 19).38 remetendo "os no·
28.7.37, solicitando medidas urgentes a fim lide levantar as mes de alguns presos políticos . . , "3 fim de que você dê inicio ao
energias, já grave e seriamente comprometidas, desse torturado serviço de apuração ... da justiça ou injustiça das prisc5es . , . "
preso político - Harry Berger."

i75 199 Carta de Sobral Pinto a Francisco f'l<>9'''' <lo Lima, de 14.3.38,
Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 14.8.37, a respeito assim iniciada: "Gostei de ver o tom de seu cartão. Aquele "Dr.
da possível libertação de Diga Benário Prestes.
Heráclito Sobral Pinto, F. Negrão de Lima, Chefe do gabinete
177 do Ministro da Justiça, cumprimenta" é de 11m sabor austero'
Carta de Sobral Pinto a José Carlos de Macedo Soares, Ministro da
Justiça, de 19.8.37, em que afirma tudo fazer "para evitar que o . que condiz muito bem ... "
Governo bárbaro e odiento de Hitler pratique a monstruosa
iniqüidade de tirar das mãos de sua Mãe uma tenra criança de 10 Carta de Sobral Pinto a Leocádia Prestes, de 7.5.38, mencionando
meses" . 202 greve de fome iniciada por Luiz Carlos Prestes.

...-.,,'":=-.,.. ;_
.. _---,,-
\~
205 Carta de Sobral Pinto ao Cardeal Dom Sebastião Leme, de 9.6.38,
relatando a sua prisão, dentro da Casa de Correção.
~~
I

Carta de Sobral Pinto a Francisco Campos, Ministro da Justiça,


c-
209
de 17.6.38, a respeito dos acontecimento;; na Casa de Correção.
(
(
212 Carta de Sobral Pinto a Francisco Negrão de Lima, de 5.8.38, em
(
que diz: "O tal Estado Novo que vocês inventaram só produz
destes resultados: a inversão de todos os valores". (
(
214 Pelos Embargantes Luiz Carlos Prestes, Arthur Emest Ewert ou
Harry Berger e Agildo da Gama Barata Ribeiro, em 3.10.38. (
(
221 Requerimento de Sobral Pinto ao Ministro Presidente do Tribunal
de 30.4.42, fazendo certas reivindicações para Luiz Carlos Prestes. (
(
230 Razãeside Apelação de Eurico Natal, de 12.1.76.
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