Antropologia e Sociabilidade
Antropologia e Sociabilidade
Antropologia e Sociabilidade
Resumo
O objetivo deste artigo é interpretar as formas de sociabilidades e de trocas que ocorrem
no ambiente da feira de Redenção-CE, como também desmistificar algumas categorias
sobre os mercados informais. Discuto aqui um pouco do conceito de Cidade, analisando
como e de que forma o urbanismo interfere sobre os fatores sociais, assim como a
enquadro como um campo repleto de possibilidades em que os atores sociais encontram
diversas maneiras de interações e escolhas. A feira é um tipo de comercio que mesmo
com o passar do tempo e as mudanças no espaço urbano, persistem e vão se remodelando
nesse espaço, fazendo parte do cotidiano (VEDANA, 2013). Sua estética é remodelada
diariamente, seus atores (re)constroem imagens, seja essa imagem física, espacial ou até
mesmo seus simples gestos. A feira compõe a cidade, suas bancas estão repletas de
sentidos compartilhados por esses atores (VEDANA, 2013) e nesse meio existem diversas
trocas, como as ajudas recíprocas, trocas de mercadorias, conversas e também o
cruzamento de trajetórias distintas de vida. Faço uma relação entre a cidade e a feira,
levando em consideração a fragmentação e um possível individualismo presente no
espaço urbano. Partindo do método de pesquisa etnográfica clássico em antropologia
descrevo o espaço onde ocorrem estas relações, as formas de comunicação, os códigos de
interação, assim como as relações de reciprocidades que ocorrem neste ambiente.
Introdução
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Este trabalho é parte de minha monografia intitulada etnografia das trocas e sociabilidades entre
feirantes e frequentadores da feira de Redenção-CE para obtenção do titulo de bacharel em
humanidades pela universidade da integração internacional da lusofonia afro-brasileira.
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Bacharel em humanidades, universidade da integração internacional da lusofonia afro-brasileira
(UNILAB). Graduando em sociologia pela mesma universidade.
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maciço e capital do Estado, frequentei a feira diariamente observando também os
vendedores locais. Usei o método clássico em antropologia, lançando mão da observação
participante no meio urbano a partir da proposta de Eckert e Rocha (2008).
Cidade e sociabilidade
Dessa forma, vemos que a paisagem da cidade, assim como de outras coisas, nos narra
historias. Ser participante da cidade significa participar da vida pública, ser ator e construtor
da mesma. A cidade é a natureza transformada pelo homem (ROLNIK, 2004). Com o
desenrolar dos tempos e mudanças espaciais e sociais, a estética da cidade vai se alterando.
Suas casas, seus edifícios, os comércios, o modo como às pessoas se vestem dizem muito a
respeito da cidade. Como formula Rolnik, “... a cidade é também um registro, uma escrita,
materialista de sua própria história” (ROLNIK, 2004, p.09).
Viver na cidade é antes de tudo viver de forma coletiva, suas estruturas físicas e espaciais
representam a vida social urbana (ROLNIK, 2004).
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Pensar a sociabilidade é, sobretudo, buscar entender o que nos une como seres
humanos, em casa, na rua, no trabalho, na escola. Em qualquer lugar que estamos, temos
que nos comunicar uns com os outros. Por meio de negociações e conflitos negociamos
nossas regras e determinamos nossos espaços sociais na sociedade, a sociabilidade
possibilita a interação entre os homens. Mas afinal o que é sociabilidade?
A questão então é perceber as interações que ocorrem nesse meio. O espaço não
é construído apenas por tijolos e cimento ou por barreiras físicas, ele é antes de tudo feito
por pessoas, lugares, sentimentos, uma serie de símbolos construídos e reconstruídos
diariamente. Com aponta Velho:
A vida urbana coloca as pessoas fisicamente mais próximas, forçando assim uma
convivência. Falando de forma simples, a sociação é a forma de evitar situações
desagradáveis, situações essas que impossibilitariam nossa vida em sociedade. Existe
uma organização, quanto à esse ponto Simmel ressalta, “[t]oda organização interna da
interação urbana se baseia numa hierarquia extremamente complexa de simpatias,
indiferenças e aversões, do tipo mais efêmero ao mais duradouro” (SIMMEL, 1983,
p.128), nossa vida é um jogo, no ponto de vista de Simmel (1983) a sociedade não existe
enquanto coisa, são nossas relações que determinam o que é a sociedade. Essa sem as
regras sociais que harmonizariam as relações, não seria possível.
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Estética da informalidade em Redenção
Durante esses dias, o movimento começa por volta das sete horas da manhã, é
comum chegarmos à feira os oitos horas e ainda vermos feirantes montando as estruturas
de suas bancas. Quando chega às onze horas, alguns feirantes já começam desmontar suas
bancas e guardarem seus produtos.
Nesse dia o horário também se altera, o movimento dos feirantes começa no dia
anterior, sábado. No sábado à noite, por volta das 19 horas, podemos perceber uma
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grande movimentação dos feirantes nesse espaço e nesse momento eles já se preparam
para a feira. Alguns, principalmente da cidade de Redenção já começam a montar suas
bancas.
Figura 1 Movimento da feira aos Domingos na Rua Juvernal de Carvalho. Foto do autor.
A feira narra e representa a cidade a partir de suas imagens (VEDANA, 2013). Ela
faz parte do cotidiano da cidade, preenche as ruas. Assim como a cidade tem seus bancos,
suas praças, suas casas e edifícios, que juntos contam a historia da cidade, a feira conta
não apenas uma historia comercial, narra também sobre as identidades, trajetórias de vida,
sentimentos. Como apontou Vedana, “... o que temos então é o mercado como uma
expressão de vida na cidade...” (VEDANA, 2008, p.90).
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ordem e o que seria desordem. Teremos que levar em consideração a relatividade desses
conceitos, afinal o que está em ordem para mim pode está desordenado para meu vizinho,
o que aparentemente penso como caótico para alguns pode expressar outra forma de
organização, esta que pode nos passar despercebida. A desordem, segundo Mary Douglas,
pode apresentar perigo, mais ao mesmo tempo pode ser poder. A autora contribui:
Na feira, essa possível desordem significa o poder de fugir dos “padrões” impostos
pela formalidade. Essa possível desordem serve para que o poder estatal não tente
padronizar a feira, criar uma “ordem”. A desordem na feira funciona como um
mecanismo de proteção, cria-se uma imagem de desordem para proteger a ordem interior
da feira, pois caímos no conto de classificar desordem sempre partindo do conceito de
ordem, esse por sua vez que é relativo.
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são exercidos em nome da estrutura social; eles protegem a sociedade contra o perigo que
lhe dirigem os malfeitores” (DOUGLAS, 1996, p.123). Bem, a estrutura social aqui
é a feira, o malfeitor é o poder estatal que tenta impor o “padrão” ao mercado e os feirantes
usam dos poderes internos para se proteger do sistema que tenta os menosprezarem
enquanto cidadãos comerciantes e trabalhadores.
Os jogos
Uma cliente fala com dona Josefa, esta tem que comprar um presente
para uma criança, percebo que a compra tratava-se de um presente para
um aniversario. Entretanto, devido suas condições financeiras e outras
compras feitas durante o dia, podia pagar apenas quinze reais no objeto
em questão, peça de roupa essa que custava vinte reais. Josefa nesse
momento olhava para a mulher com um olhar a meia altura, percebi que
ela ficou sensibilizada, logo após vendeu o produto (CADERNO DE
CAMPO, FEIRA DE REDENÇÃO, 08-10-2014).
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Na feira apesar dos possíveis individualismos existentes, percebo que entre os
feirantes existe o hábito de compartilhar os clientes. Presenciei vários episódios em que
o cliente esta a procura de um determinado objeto, quando o feirante não tem esse objeto,
conduzi-o o comprador a outro feirante vizinho. Este é outo exemplo das diferenças que
existe entre comprar na feira e comprar é um supermercado. Você já foi a um
supermercado e na falta do produto o vendedor indicar outro supermercado? Essa
possibilidade – ao que notei- é comum na feira.
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Considerações finais
Viver na cidade é antes de tudo viver de forma coletiva (ROLNIK, 2004), nesta
os indivíduos disputam mais que o espaço, eles confrontam sentimentos e ideias
cotidianamente. Na feira a disputa por espaço ocorre de forma diferente, existe um
“respeito espacial”, um código que não está escrito em nenhum lugar, não existe
comprovantes de propriedades, até mesmo porque ali é espaço publico, mas existe um
código simbólico que diz: “esse é meu espaço” “aquele é o seu”. Um “mundo” repleto de
códigos a ser desvendados.
Esta pesquisa não se encerra aqui. Ao passar sempre na feira e rever as pessoas
que convivi por algum tempo, resgatamos lembranças do nosso cotidiano, trocamos
mensagens e trajetórias. O que fiz aqui foi apenas perceber que a feira, assim como a
cidade de Redenção não está fixa, imóvel, ela estar constantemente em transformação.
Estes não são apenas espaços físicos, são antes de tudo dinâmicos e repletos de
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emoções, seres humanos que diariamente se reinventam e, consequentemente, também
reinventam a cidade.
Referências
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a Dádiva: forma e razão da troca nas sociedades arcaicas.
In: MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2003, p.183-
314.
SIMMEL, George. Sociologia. Morais Filho, Evaristo de. (org.). São Paulo: Ática, 1983.
VEDANA, Viviane. Fazer a Feira: estudo etnográfico das "artes de fazer" de feirantes
e fregueses da Feira-Livre da Epatur no contexto da paisagem urbana de Porto Alegre.
Dissertação de Mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Antropologia
Social da UFRGS. 2004. Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/3731
ultimo acesso em 02-02-15.
VEDANA, Viviane. No mercado tem tudo que a boca come: estudo antropológico da
duração das práticas cotidianas de mercado de rua no mundo urbano contemporâneo. Tese
(Doutorado em Antropologia Social)–Instituto de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. Disponível em
http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/3731 ultimo acesso em: 05-02-15.
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