Teoria Geral Dos Direitos Humanos

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DIREITOS HUMANOS Prof. Luciano Meneguetti – Rev. 02 - ago.

2019

TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS

1. ASPECTOS INTRODUTÓRIOS: a importância dos Direitos Humanos

Atualmente é muito comum a veiculação e utilização (muitas vezes de


maneira equivocada e fora de contexto) da expressão “direitos humanos” nos
mais variados meios de comunicação (internet, redes sociais, televisão, rádio,
revistas, jornais etc.). Ao longo da história humana possivelmente nunca tanto
se falou em direitos humanos como ocorre nos dias de hoje. E por quê? Qual a
razão disso?
Uma primeira explicação, ainda que sucinta, é a notoriedade e importância
que assumiram esses direitos na contemporaneidade. Frutos de conquistas
históricas, os direitos humanos foram pouco a pouco sendo idealmente
reconhecidos e então consagrados (positivados) nas Constituições dos países
(onde são conhecidos como direitos fundamentais) ao redor do globo e também
nos tratados internacionais (locus em que são conhecidos propriamente como
direitos humanos).
Utilizando-se aqui uma frase bastante coloquial, pode-se então afirmar
que “os direitos humanos não nasceram (e não nascem) em árvores”, mas são
resultado de um processo de evolução social marcado por sangrentas guerras,
lutas, reivindicações e conflitos de várias espécies. Em cada momento específico
da história humana houveram demandas do mesmo modo específicas pelo
reconhecimento e pela positivação dos direitos humanos nos textos jurídicos
nacionais e internacionais. Ao longo da história muito já se lutou por uma vida
humana pautada na liberdade, igualdade, fraternidade (lema da Revolução
Francesa) e na dignidade.
Hoje, contudo, o que se verifica é uma ampla gama de direitos consagrados
e protegidos pelos textos constitucionais e convencionais1 que não mais
precisam ser reconhecidos e positivados, mas protegidos e efetivados. Conforme
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1 Os textos convencionais referem-se aos tratados ou convenções de direitos humanos que têm
sido adotados pelos países ao longo dos tempos.
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afirmou Norberto Bobbio, “o problema fundamental em relação aos direitos do


homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los”.2
O “processo civilizatório em busca da efetividade na valoração adequada
da liberdade, da igualdade e da fraternidade conta, historicamente, com
inúmeras linhas de partida, mas ainda está bem aquém de uma linha de chegada
(...) Os direitos humanos são direitos que, longe de apenas constarem em uma
constituição simbólica [e nos tratados internacionais], devem ser conquistados
e assegurados diuturnamente pela sociedade internacional e, internamente,
pelos Estados que a integram”.3
Respondendo às questões levantadas no primeiro parágrafo deste texto, os
direitos humanos estão na pauta do dia (tanto no âmbito interno dos Estados
como no plano internacional) não só em razão da notoriedade e importância que
assumiram, mas principalmente pelo fato de terem sido reconhecidos e
positivados ao longo dos tempos, mas não estarem sendo efetivamente
protegidos.
O fato é que a temática assumiu tamanha relevância no contexto mundial,
regional e local que se tornou impossível dissociar a proteção dos direitos
humanos do cotidiano da vida em sociedade. Além disso, o estudo desses direitos
no ambiente acadêmico atende hoje a uma tendência não apenas nacional, mas
mundial, em dar-se o devido tratamento ao tema no âmbito dos bancos
escolares, uma tendência presente nas maiores e mais importantes
universidades do Brasil e do exterior.
A relevância e importância conferidas aos direitos humanos na atualidade
é refletida na crescente cobrança do tema nos exames da Ordem dos Advogados
do Brasil, nos principais concursos públicos do país, tais como Magistratura
(estadual e federal), Ministério Público (estadual e federal), Delegado (estadual e
federal), Defensoria Pública etc., bem como em provas oficiais estabelecidas pelo
governo brasileiro (v.g., ENEM E ENADE).
Os concursos públicos para o ingresso nas diversas carreiras jurídicas
2
Página

existentes no país têm espelhado o reflexo de uma conscientização e valorização

2 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2004, p. 16.
3 LISBOA, Roberto Senise. Prefácio à 2ª Edição. MALHEIRO, Emerson. Curso de Direitos

Humanos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015.


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na promoção e proteção dos direitos humanos. Explica Valerio Mazzuoli que a


“exigência cada vez maior do tema nos concursos públicos se deve ao fato de o
mundo estar passando por um momento de renovação, em que os direitos das
pessoas passaram a ser a meta primeira da atuação do Estado. Assim, é natural
que os concursos, que vão colocar novos servidores no mercado de trabalho no
Brasil, exija desses candidatos conhecimentos sólidos de Direitos Humanos,
mesmo porque um servidor público melhor preparado em Direitos Humanos será
mais apto para melhor atender um cidadão do que outro servidor que não têm
conhecimento específico nessa matéria”.4
Neste cenário, o que se constata é que tanto temas relativos à teoria geral
dos direitos humanos, bem como temas específicos pertinentes à temática têm
estado presentes de um modo cada vez mais constante nos editais dos diversos
concursos públicos do país, que têm contemplado e exigido nos respectivos
processos seletivos, um conhecimento cada vez mais aprofundado de
diversificadas temáticas que estão inseridas no contexto dos direitos humanos.
De outro lado, deve-se ainda ressaltar que a imensa produção científica
envolvendo os direitos humanos tem sido alavancada de maneira surpreendente
nos últimos anos. É enorme a quantidade de eventos (Congressos, Simpósios,
Encontros, Seminários, Palestras etc.) que tem se preocupado em discutir os
direitos humanos, seus diversos eixos temáticos e toda a problemática que
suscita. É vasta a quantidade de obras que têm se preocupado com o tema
(livros, revistas, artigos e outros periódicos) e que têm sido colocadas à
disposição das pessoas em livrarias especializadas e, sobretudo, por meio da
internet. As organizações internacionais e também aquelas de natureza não
governamental (ONGs) também constituem importantes agentes de fomento à
pesquisa sobre a temática, contando com uma grande quantidade de
publicações que são oferecidas ao público, em geral, gratuitamente.
Todos esses fatores estão a demonstrar a importância que assumiu os
direitos humanos e seus diversos eixos temáticos no cenário mundial e
notadamente no ambiente jurídico brasileiro nos últimos tempos, de modo que
3

não mais é possível conceber-se um curso de Direito que não proporcione aos
Página

4 Disponível em: <https://goo.gl/gp9CeP>. Acesso em 13 de fev. 2017.


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seus acadêmicos a introdução e o aprofundamento das questões que envolvem


a temática.

2. ACEPÇÕES DAS PALAVRAS: DIREITO E HUMANO

A expressão “direitos humanos” é composta por duas palavras


impregnadas de significados distintos: direito e humano.
Etimologicamente a palavra “direito” vem do latim directus, em linha reta.
Trata-se de uma palavra polissêmica, isto é, que comporta vários significados.
Nos Dicionários Aurélio e Michaelis, a palavra direito está associada, dentre
outras coisas, àquilo que é certo, justo, reto, aprumado, acertado, legítimo,
correto, íntegro, honrado; a um complexo de leis vigentes em um país; à uma
prerrogativa legal, conferida a alguém, para exigir de outrem algum
procedimento etc.
Portanto, ao se buscar apresentar uma definição do que seja o direito,
primeiramente deve-se ter em mente que o vocábulo compreende enfoques e
significados diversos, v.g., o termo em questão pode ser utilizado para significar
o justo, ou um conjunto de normas jurídicas, ou uma prerrogativa que tem a
pessoa de fazer valer determinada posição jurídica etc. Desse modo, o direito
pode ser visto sob diversas perspectivas: direito como ciência, direito como
justiça, direito como ordenamento jurídico, direito como norma, direito como
prerrogativa, direito como arte etc.5
Nesse sentido, Rizzatto Nunes explica que “observando o Direito à luz da
realidade dos estudos jurídicos contemporâneos, pode-se vislumbrar que o
termo ‘direito’ comporta pelo menos as seguintes concepções: a de ciência,
correspondente ao conjunto de regras próprias utilizadas pela Ciência do Direito;
a de norma jurídica, como a Constituição e as demais leis e decretos, portarias
etc.; a de poder ou prerrogativa, quando se diz que alguém tem a faculdade, o
poder de exercer um direito; a de fato social, quando se verifica a existência de
4
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5GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Introdução ao Estudo do Direito: teoria geral do direito. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: Método, 2015, e-book.
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regras vivas existentes no meio social; e a de justiça, que surge quando se


percebe que certa situação é direito porque é justa”.6 (grifo nosso)
Importa aqui apresentar o conceito de direito em seu aspecto objetivo,
entendido como a realidade, presente na vida social, que regula as relações entre
as pessoas. Nesse enfoque, o direito pode ser definido como “o conjunto de
normas imperativas que regulam a vida em sociedade, dotadas de coercibilidade
quanto à sua observância”.7 Por outras palavras, direito “é um conjunto de
normas que objetiva regulamentar o comportamento social”.8
Não se deve confundir o direito objetivo com o direito positivo. Conforme
Rizzatto Nunes, o direito positivo é “o conjunto das normas jurídicas escritas e
não escritas (o costume jurídico), vigentes em determinado território e, também,
na órbita internacional na relação entre os Estados, sendo o direito positivo aí
aquele estabelecido nos tratados e costumes internacionais”.9
Esse direito positivo pode ser separado em dois elementos: de um lado, o
direito objetivo e, de outro, o direito e o dever subjetivos. Enquanto o direito
objetivo é o conjunto, em si, das normas jurídicas escritas e não escritas,
independentemente do momento do seu exercício e aplicação concreta, o direito
subjetivo é “a prerrogativa colocada pelo direito objetivo, à disposição do sujeito
do direito”, sendo que “essa prerrogativa há de ser entendida como a
possibilidade de uso e exercício efetivo do direito, posto à disposição do sujeito”.10
Compreendido os significados do direito em sua feição objetiva e subjetiva,
uma questão ainda se põe. O que significa ter um direito? O que se quer dizer
com a frase muito comum no meio social: “eu tenho direito”?
Oscar Vilhena Vieira explica que “ter um direito é ser beneficiário de
deveres de outras pessoas ou do Estado”.11 Portanto, quando se afirma ter um
5
Página

6 NUNES, Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2016,
pp. 73-74.
7 GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Introdução ao Estudo do Direito, op. cit.
8 DIMOULIS, Dimitri. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. 6. ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 41.


9 NUNES, Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito, op. cit., 168.
10 NUNES, Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito, op. cit., 168.
11 VIEIRA, Oscar Vilhena. A Gramática dos Direitos Humanos. In: Boletim Científico. ESMPU,

Brasília, a. I – nº 4, p. 13-33 – jul./set. 2002, p. 13.


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direito, simultaneamente também está se afirmando que alguém, do outro lado,


tem um dever, seja esse alguém uma pessoa, grupo de pessoas ou o Estado.
A outra palavra que compõe a expressão direitos humanos e que precisa
ser analisada é humano.
Etimologicamente a palavra “humano” vem do latim humanus, do homem
ou a ele relativo. Em uma definição biológica, o dicionário Michaelis define o
homem como um “mamífero da ordem dos primatas, do gênero Homo, da espécie
Homo sapiens, de posição ereta e mãos preênseis, com atividade cerebral
inteligente, e programado para produzir linguagem articulada”.
O estudo do homem de maneira mais aprofundada é objeto da
Antropologia, que visa justamente “fundar ou constituir um saber científico que
toma o homem como objeto”.12
Para a temática relativa aos direitos humanos, importa investigar qual é o
sentido da palavra “humano” que integra a referida expressão. E aqui torna-se
forçoso o reconhecimento de que ser humano é todo indivíduo pertencente à
espécie humana, dotado de razão, de capacidade de raciocínio.13
Nesse sentido dispõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos
(DUDH), de 1948:

Artigo 1º. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade


e direitos. São dotados de razão e consciência14 e devem agir em
relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Portanto, embora possa parecer óbvio, é preciso aqui frisar que direitos
humanos são aqueles direitos de todos os seres humanos, simplesmente em
razão disso: por ser um humano racional, sentimental e corporal. Nesse sentido,
direitos humanos são os direitos do branco, do negro, do pardo, da criança, do
adolescente, do adulto, do idoso, do homem, da mulher, do homossexual, do
6
Página

12 ASSIS, Olney Queiroz Assis; KÜMPEL, Vitor Frederico. Manual de Antropologia Jurídica. São
Paulo: Saraiva, 2011, e-book.
13 “Capacidade para resolver (alguma coisa) através do raciocínio; aptidão para raciocinar, para

compreender, para julgar; a inteligência de modo abrangente: todo indivíduo é dotado ou faz uso
da razão” (Dicionário Aurélio).
14 “Percepção dos fenômenos próprios da existência; capacidade para discernir; discernimento,

bom senso; noção do que se passa em nós; conhecimento; sentimento do dever; moralidade”
(Dicionário Aurélio).
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nacional, do estrangeiro, do índio, do quilombola, do católico, do evangélico, do


ateu etc. Todos os seres humanos são titulares dos direitos humanos:

DIREITOS HUMANOS: PARA TER, BASTA SER!

O estudo dos direitos humanos depende dessa prévia compreensão de que


todos os seres humanos são titulares dos direitos humanos, não podendo haver
qualquer forma de discriminação ou preconceito em razão da raça, da cor, do
credo religioso, da opção sexual, da orientação política, filosófica ou ideológica
etc., conforme estabelece o art. 2º da DUDH:

Artigo 2º. 1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e
as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de
qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião
política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,
nascimento, ou qualquer outra condição. 2. Não será também feita
nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou
internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se
trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer
sujeito a qualquer outra limitação de soberania.

3. CONCEITOS DOUTRINÁRIOS

Pela leitura do tópico anterior já é possível ter uma noção acerca do que
são os direitos humanos, enquanto direitos de todas as pessoas, simplesmente
pelo fato de serem humanas (definição tautológica).15
No entanto, a delimitação conceitual dos direitos humanos é objeto de
grande controvérsia e cercada de equívocos doutrinários. Direitos humanos é
expressão ambígua e de significação heterogênea. Na doutrina há uma vasta
quantidade de definições relativas a esses direitos e que não poderiam ser todas
7
Página

aqui mencionadas e discutidas. No entanto, sem aqui menosprezar o estudo

15Uma definição tautológica dos direitos humanos é aquela que não traz nenhum elemento novo
que permita caracterizar tais direitos (PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos,
Estado de Derecho y Constitucion. 6. ed. Madrid: Tecnos, 1999, p. 25).
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relativo à ontologia dos direitos humanos e à evolução história desses direitos16,


algumas definições mínimas, assim como certas considerações sobre esse ponto
temático são importantes e por isso são feitas a seguir.
Primeiramente é importante entender que a expressão direitos humanos
está “intrinsecamente ligada ao Direito Internacional Público. Assim, quando se
fala em ‘direitos humanos’, o que tecnicamente se está a dizer é que existem
direitos que são garantidos por normas de índole internacional, isto é, por
declarações e tratados celebrados entre Estados com o propósito específico de
proteger os direitos (civis e políticos; econômicos, sociais e culturais etc.) das
pessoas sujeitas à sua jurisdição”.17
Essa compreensão inicial é necessária para que se possa distinguir (pelo
menos em relação ao local onde estão positivados) os direitos humanos, que se
encontram nos textos das declarações e dos tratados internacionais, dos direitos
fundamentais, que são consagrados nos textos constitucionais dos Estados,
assim como ocorre com a Constituição brasileira (v.g., art. 5º). No entanto,
materialmente falando (quanto ao conteúdo desses direitos), ambos visam a
proteção e a promoção da dignidade humana, bem como resguardar um conjunto
mínimo de direitos básicos, necessários para o pleno desenvolvimento da vida
dos indivíduos.
Pérez Luño aponta para a existência de três espécies de definições:18
1) Tautológicas – os direitos humanos são, v.g., aqueles correspondentes
ao homem pelo fato de serem homens;
2) Formais – os direitos humanos são, v.g., aqueles que pertencem ou
devem pertencer a todos os homens, que não podem ser deles privados;
3) Teleológicas ou finalísticas – os direitos humanos são, v.g., aqueles
imprescindíveis para o desenvolvimento da pessoa humana, para o
8

progresso social, ou para o desenvolvimento da civilização.


Página

16 Para um estudo aprofundado sobre a evolução história dos direitos humanos vide:
COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 8. ed. São Paulo:
Saraiva, 2013; HUNT, Lynn. A Invenção dos Direitos Humanos: uma história. São Paulo:
Companhia das Letras, 2009.
17 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Método, 2016,

p. 23.
18 PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitucion, op. cit.,

p. 25.
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Pérez Luño, compatibilizando a evolução histórica dos direitos humanos


com a necessidade de definição quanto ao seu conteúdo os entende como:

“...um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento


histórico, concretizam as exigências de dignidade, liberdade e igualdade
humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos
ordenamentos jurídicos em nível nacional e internacional”. 19

Nestor Sampaio Penteado Filho define os direitos humanos como

“...um conjunto de prerrogativas e garantias inerentes ao homem, cuja


finalidade básica é o respeito à sua dignidade, tutelando-o contra os
excessos do Estado, estabelecendo um mínimo de condições de vida. São
direitos indissociáveis da condição humana”.20

Para André de Carvalho Ramos, os direitos humanos consistem em

“...um conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida


humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. Os direitos
humanos são os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna.21

4. ESTRUTURA DOS DIREITOS HUMANOS

André de Carvalho Ramos explica que, em geral, “todo direito exprime a


faculdade de exigir de terceiro, que pode ser o Estado ou mesmo um particular,
determinada obrigação”.22 Em razão disso, os direitos humanos têm uma
estrutura variada que, segundo o autor são: direito-pretensão, direito-liberdade,
direito-poder e direito-imunidade, sendo que todos acarretam obrigações do
Estado ou de particulares revestidas, respectivamente, na forma de: (i) dever de
9

prestar, (ii) ausência de direito, (iii) sujeição e (iv) incompetência.


Página

19 PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitucion, op. cit.,
p. 48.
20 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Direitos Humanos. Vol. 3 (Coleção OAB nacional. Primeira

fase) 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, e-book.


21 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p.

29.
22 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 29 e ss.
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O direito-pretensão consiste na busca de algo, gerando a contrapartida de


outrem do dever de prestar. Assim, se determinada pessoa tem direito a algo,
então outrem (Estado ou particular) tem o dever de realizar uma conduta que
não viole esse direito, v.g., o direito à educação fundamental gera o dever do
Estado de prestá-la gratuitamente (CRFB, art. 208, I).
O direito-liberdade consiste em uma faculdade de agir que gera a ausência
de direito de qualquer outro ente ou pessoa. Desse modo, se uma pessoa tem a
liberdade de crença (CRFB, art. 5º, VI), o Estado ou terceiros não têm nenhum
direito (ausência de direito) de exigir que essa pessoa tenha determinada religião.
O direito-poder implica uma relação de poder de uma pessoa de exigir
determinada sujeição do Estado ou de outra pessoa. Assim, se uma pessoa tem
o poder de, ao ser presa, requerer a assistência da família e de advogado (CRFB,
art. 5º, LXIII), isto sujeita a autoridade pública a providenciar tais contatos.
Por fim, o direito-imunidade consiste na autorização dada por uma norma a
uma determinada pessoa, impedindo que outra interfira de qualquer modo.
Desse modo, se uma pessoa é imune à prisão, a não ser nas hipóteses
constitucional e legalmente permitidas (CRFB, art. 5º, LXI), isso impede que os
agentes públicos (v.g., policiais) possam alterar a posição da pessoa em relação
à prisão.

MEMORIZAR

DIREITO PALAVRA CHAVE

Direito-pretensão Dever de prestar

Direito-liberdade Ausência de direito

Direito-poder Sujeição

Direito-imunidade Não interferência


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5. DIGNIDADE HUMANA COMO NÚCLEO DOS DIREITOS HUMANOS

É preciso iniciar este tópico com duas afirmações categóricas: (i) a


dignidade humana constitui o núcleo dos direitos humanos, (ii) toda pessoa é
dotada de uma dignidade inerente.23 Isto significa dizer que todos os direitos
humanos convergem para uma finalidade comum e essencial, que é a proteção
da dignidade inerente à toda pessoa humana.
Praticamente todos os instrumentos internacionais de direitos humanos
(declarações ou tratados), independentemente dos direitos humanos que estão a
consagrar e proteger, são enfáticos ao afirmar e reafirmar a dignidade humana
como a essência dos direitos humanos e inerente à todas as pessoas.
Abaixo, parte do texto da Carta das Nações Unidas, também conhecida
como Carta de São Francisco, de 1945, tratado internacional que criou a
Organização das Nações Unidas (ONU):

NÓS, OS POVOS DAS NAÇÕES UNIDAS, RESOLVIDOS a preservar as


gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço
da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a
reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na
dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos
homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e
a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações
decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional
possam ser mantidos, e

No mesmo sentido, a DUDH afirmou a dignidade humana em seu primeiro


artigo, sendo seguida posteriormente por uma série de tratados de direitos
humanos, tais como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, o Pacto
Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais, ambos de 1966, a
11

Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica),
Página

de 1969:

23 Para um estudo mais aprofundado sobre a dignidade humana vide: SARMENTO, Daniel.
Dignidade Humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Belo Horizonte: Fórum, 2016; SARLET,
Ingo Wolfgang. Dignidade (da Pessoa) Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal
de 1988. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015, e-book; NUNES, Rizzatto. O Princípio
Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
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Declaração Universal dos Direitos Humanos


Artigo 1º. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir
em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Praticamente todos os textos constitucionais dos diversos países no


mundo também caminham nesse sentido, como o faz a Constituição da
República Federativa do Brasil (CRFB), de 1988:

Artigo 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união


indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se
em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III – a dignidade da pessoa humana;

Em relação à CRFB, de 1988, Daniel Sarmento, ao explicar quem é


considerada pessoa para o texto constitucional, para fins de preservação da sua
dignidade, afirma que “o ordenamento jurídico-constitucional brasileiro se
lastreia em uma premissa antropológica, que se deixa entrever em diversas
passagens da Constituição e que é vital para a definição dos contornos do
princípio da dignidade da pessoa humana. Trata-se da ideia de pessoa concreta,
que é racional, mas também sentimental e corporal; que é um fim em si mesmo,
mas não uma ‘ilha’ separada da sociedade; que deve ter a sua autonomia
respeitada, mas também precisa da garantia das suas necessidades materiais
básicas e do reconhecimento e respeito de sua identidade”.24

Se é pessoa, se é um ser humano, tem uma dignidade inerente.25

Conforme explica Rizzatto Nunes, “o ser humano é digno porque é [...] a


12

dignidade nasce com a pessoa. É-lhe inata. Inerente à sua essência”.26


Página

24 SARMENTO, Daniel. Dignidade Humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Belo Horizonte:


Fórum, 2016, p. 70.
25 Inerente: que se encontra ligado de modo íntimo e necessário; inseparável; relativo ao que é

próprio de alguém ou ao que está na essência dessa pessoa (Dicionário Aurélio).


26 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, op. cit., p. 63.
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Assim como ocorre com a expressão direitos humanos, as definições acerca


da dignidade humana são as mais variadas na doutrina, de modo que não seria
possível abordá-las exaustivamente aqui. Mas diante da necessidade de um
conceito capaz de oferecer uma clara compreensão do que está a se estudar, cita-
se aqui uma das definições mais adotadas e mencionadas em obras jurídicas
que tratam direta ou indiretamente da temática, proposta por Ingo Wolfgang
Sarlet, para quem a dignidade humana é

“...a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o


faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres
fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de
cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições
existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover
sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e
da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido
respeito aos demais seres que integram a rede da vida”.27

Esquematizando o conceito28
13
Página

27 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade (da Pessoa) Humana e Direitos Fundamentais na


Constituição Federal de 1988, op. cit.
28 Vide gráfico maior no final do texto.
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A compreensão da dignidade humana requer um olhar para a filosofia de


Kant, para quem o ser humano é um fim em si mesmo, não podendo ser visto ou
tratado como uma coisa, isto é, como um objeto à serviço do Estado, da sociedade
em geral ou mesmo de terceiros.29
Nesse sentido, Daniel Sarmento afirma que toda pessoa deve ser “vista
como fim em si, e não como mero instrumento a serviço do Estado, da
comunidade ou de terceiros; como merecedora do mesmo respeito e consideração
que todas as demais, e não como parte de um estamento na hierarquia social;
como agente autônomo, e não como o ovelha a ser conduzida por qualquer
pastor; como ser racional, mas que também tem corpo e sentimentos e, por isso,
experimenta necessidades materiais e psíquicas; como ser social, imerso em
relações intersubjetivas fundamentais para a sua identidade, e não como
indivíduo atomizado e desenraizado”.30
O que se extrai dessas lições é que o ser humano, dotado de uma dignidade
inerente, não pode ser tratado como um mero objeto, instrumentalizado para
servir de meio para o atingimento de qualquer propósito que seja.

Toda vez que o ser humano for coisificado, isto é, tratado como um
objeto, haverá uma violação da dignidade humana.

6. DIVERSIDADE TERMINOLÓGICA

Os direitos essenciais do indivíduo, que têm por finalidade assegurar-lhe


uma vida digna, contam com ampla diversidade de termos e designações que
estão presentes tanto na doutrina como nos textos internacionais e nacionais.
Em verdade, existem na doutrina até mesmo confusões terminológicas e o uso
14

indiscriminado (até banalizado) de várias expressões para fazer referência aos


Página

direitos humanos31, dentre as quais destacam-se:

29 WEYNE, Bruno Cunha. O Princípio da Dignidade Humana: reflexões a partir da filosofia da


Kant. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 83-84; MORAES, Guilherme Peña de. Curso de Direito
Constitucional. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 552.
30 SARMENTO, Daniel. Dignidade Humana: conteúdo, trajetórias e metodologia, op. cit., p. 92.
31 “A nossa Constituição acompanha o uso variado de termos envolvendo ‘direitos humanos’.

Inicialmente, o art. 4º, II, menciona ‘direitos humanos’. Em seguida, o Título II intitula-se
‘direitos e garantias fundamentais’. Nesse título, o art. 5º, XLI, usa a expressão ‘direitos e
liberdades fundamentais’ e o inciso LXXI adota a locução ‘direitos e liberdades constitucionais’.
Por sua vez, o art. 5º, § 1 º, menciona ‘direitos e garantias fundamentais’. Já o art. 17 adota a
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a) Liberdades públicas;
b) Liberdades fundamentais;
c) Direitos da pessoa;
d) Direitos da pessoa humana;
e) Direitos individuais ou garantias individuais;
f) Direitos públicos subjetivos;
g) Direitos naturais;
h) Direitos fundamentais da pessoa humana;
i) Direitos fundamentais do homem;
j) Direitos e liberdades fundamentais do homem;
k) Direitos do homem;
l) Direitos essenciais do homem;
m) Direitos e garantias fundamentais;
n) Direitos humanos; e
o) Direitos fundamentais.
É possível afirmar que essa imprecisão terminológica é fruto do
reconhecimento e da evolução dos direitos essenciais da pessoa humana ao
longo dos tempos, levando-se em consideração o local onde gradativamente
foram sendo positivados (nas declarações e nos tratados internacionais, bem
como nas Constituições) e também sua delimitação e conteúdo.
No século XXI não há dúvida de que as duas expressões mais utilizadas
são: direitos humanos e direitos fundamentais.
Conforme já se ressaltou anteriormente, materialmente falando, tanto os
direitos humanos como os direitos fundamentais estão voltados para a proteção
da dignidade humana e dos direitos essenciais para que essa dignidade seja
efetiva. A dissonância, portanto, verifica-se apenas em relação ao plano em que
15

esses direitos são consagrados.


Página

dicção ‘direitos fundamentais da pessoa humana’. O art. 34, ao disciplinar a intervenção federal,
insere uma nova terminologia: ‘direitos da pessoa humana’ (art. 34, VII, b). Quando trata das
cláusulas pétreas, a Constituição ainda faz menção à expressão ‘direitos e garantias individuais’
(art. 60, § 4º). No art. 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, há o uso,
novamente, da expressão ‘direitos humanos’”. (RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos
Humanos, op. cit., p. 51)
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Tecnicamente, os direitos humanos figuram no âmbito internacional, isto


é, em normas de índole internacional, que são fruto do acordo de vontades dos
Estados, estando presentes, portanto, nas declarações e nos tratados
internacionais que veiculam normas protetivas desses direitos e liberdades, que
visam sujeitar o Estado ao cumprimento de obrigações voltadas à promoção,
respeito e proteção desses direitos para todas as pessoas sujeitas à sua
jurisdição.
Por sua vez, os direitos fundamentais figuram no plano interno, isto é, em
normas de índole doméstica, sendo fruto da vontade unilateral do Estado, mais
especificamente do legislador constituinte, razão pela qual encontram-se
consagrados nos textos constitucionais, isto é, nas Constituições de cada Estado
soberano.

Direitos humanos – no plano internacional (declarações e tratados)


Direitos fundamentais – no plano interno (Constituições)

7. CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS

A doutrina aponta para uma série de características dos direitos humanos,


que são adjetivações conferidas a esses direitos. Estas características próprias
de que são dotados os direitos humanos, permitem distingui-los de outros tipos
de direitos, especialmente os da ordem jurídica doméstica dos Estados.
O rol dessas características apresentado abaixo é meramente
exemplificativo, isto é, em numerus apertus, comportando, portanto, ampliação
por meio da inclusão de outras características:
1) Centralidade – os direitos humanos representam hoje a nova
centralidade do Direito Constitucional e também do Direito Internacional.
Isto significa que todas as normas do ordenamento jurídico (seja ele
nacional ou internacional) devem ser compatíveis com a promoção da
16

dignidade humana, razão pela qual devem passar por uma filtragem pro
Página

homine;32

32RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 91. A filtragem pro homine
consiste no processo de verificação de compatibilidade da norma, seja ela interna ou
internacional, com a promoção da dignidade humana.
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Em razão dessa centralidade torna-se importante apontar aqui algumas


questões relativas à interpretação dos direitos humanos, à luz de alguns
princípios internacionais consagrados no âmbito da temática:

a) Princípio da interpretação conforme os direitos humanos33 – em um caso


concreto, deve ser averiguado se determinada norma a ser aplicada está
conforme aos direitos humanos; quando uma norma impugnada admite
várias interpretações possíveis, o intérprete deve escolher, uma que a
compatibilize com os direitos humanos (lógica semelhante à interpretação
conforme à Constituição);
b) Princípio da prevalência ou primazia da norma mais favorável – consiste na
escolha, no caso de conflito de normas (quer nacionais ou internacionais)
daquela que seja mais benéfica ao indivíduo; não importa a origem da
norma (se internacional ou nacional), mas sim o resultado: o benefício ao
indivíduo (aproxima-se do princípio pro homine, mas possui menor
abrangência);34
c) Princípio pro homine ou pro persona35 – “impõe, seja no confronto entre
normas, seja na fixação da extensão interpretativa da norma, a observância
da norma mais favorável à dignidade da pessoa, objeto dos direitos
humanos. Impõe a aplicação da norma que amplie o exercício do direito
ou que produza maiores garantias ao direito humano que tutela”; por
17

outras palavras, aplica-se a norma que assegura de maneira mais eficaz e


mais ampla o exercício de um direito humano.
Página

33 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 102.


34 Há na doutrina autores que tratam o princípio pro homine e o princípio da primazia da norma
mais favorável como sinônimos. Nesse sentido, Valerio Mazzuoli afirma que “no que tange aos
tratados de direitos humanos, cabe destacar a necessidade de interpretação que leve em conta
sempre a norma mais favorável ao ser humano. Ou seja, os tratados de direitos humanos devem
ser interpretados tendo sempre como paradigma o princípio pro homine, por meio do qual deve
o intérprete (e o aplicador do direito) optar pela norma que, no caso concreto, mais projeta o ser
humano sujeito de direitos. Tal é assim pelo fato de o ser o indivíduo (vítima da violação de
direitos humanos) sempre a parte mais vulnerável na relação com o Estado, o que demanda, só
por isso, uma interpretação mais favorável aos seus interesses. [...] Em suma, o princípio pro
homine (ou da “primazia da norma mais favorável”) é princípio de interpretação obrigatório para
todos os tratados de direitos humanos, sem o que o resultado da aplicação de uma norma
internacional de proteção (em detrimento de outra, internacional ou interna) pode restar
indesejável, por ser menos protetora” (MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos,
op. cit., p. 238).
35 TORQUES, Ricardo. Interpretação “pro homine” dos Direitos Humanos. Disponível em:

<https://goo.gl/HhWXRh>. Acesso em 15 ago. 2017; SAGÜÉS, Néstor; MARCOS, Edgar Carpio.


La interpretación de los derechos humanos en las jurisdicciones nacional e internacional. In:
MANCHEGO, José Palomino; CARBONELL, José Carlos Remotti (Coord.). Derechos Humanos y
Constitución en Iberoamérica. Lima, Grijley, 2002, p. 28 e ss.
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2) Universalidade – significa que são titulares dos direitos humanos todas


as pessoas, bastando a condição de ser pessoa humana para que se
possa invocar a proteção desses direitos (daqui decorre a inerência
desses direitos), tanto no plano do direito internacional como no âmbito
do direito interno de cada Estado; os direitos humanos alcançam a
todos, indistintamente e independentemente de raça, sexo, credo
religioso, afinidade política, nacionalidade, status social, econômico,
cultural etc. (DUDH, art. 1º);
No entanto, duas colocações precisam ser feitas: (i) ser universal não
significa ser absoluto, pois há direitos humanos que podem (e são) por vezes
limitados/relativizados (relatividade em sentido estrito ou limitabilidade) por
outro ou por outros direitos humanos; (ii) os direitos humanos não são
universais em sua aplicação.
No contexto da universalidade torna-se importante fazer algumas
considerações sobre o relativismo cultural (corrente de pensamento que se opõe
à universalidade), o multiculturalismo e o interculturalismo.
A concepção universal dos direitos humanos, balizada pela DUDH sofreu
e sofre fortes resistências dos adeptos do movimento do relativismo cultural, os
quais afirmam que “a noção de direito está estritamente relacionada ao sistema
político, econômico, cultural, social e moral vigente em determinada sociedade.
Sob esse prisma, cada cultura possui seu próprio discurso acerca dos direitos
fundamentais, que está relacionado às específicas circunstâncias culturais e
históricas de cada sociedade. Nesse sentido, acreditam os relativistas, o
pluralismo cultural impede a formação de uma moral universal, tornando-se
necessário que se respeitem as diferenças culturais apresentadas por cada
sociedade, bem como seu peculiar sistema moral”.36
Nota-se que o relativismo cultural acaba por constituir uma das
características dos direitos humanos que é a relatividade (em sentido amplo).
18
Página

36PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 16. ed. São Paulo:
Saraiva, 2016, p. 234.
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Relativismo cultural – a tônica do relativismo é a exigência do respeito


à diferença, à diversidade e às identidades culturais (...) não há
possibilidade de se estabelecer um padrão universal de direitos,
devendo-se, sim, respeitar a diversidade cultural que impõe
posicionamentos divergentes diante de questões elementares à vida do
ser humano, como as liberdades individuais e também coletivas.
Exemplos: prática da clitorectomia e da mutilação feminina por muitas
sociedades da cultura não ocidental, apedrejamento de mulheres
apanhadas em adultério nessas sociedades etc.

Por sua vez, o multiculturalismo, multiculturalidade ou pluralismo cultural


é a convivência pacífica de várias culturas em um mesmo ambiente. Trata-se de
um fenômeno social diretamente relacionado com a globalização e as sociedades
pós-modernas. Para Boaventura de Souza Santos é preciso superar o debate
entre universalistas e relativistas por meio do multiculturalismo. Nas palavras
do autor os direitos humanos devem ser novamente conceituados
(reconceptualizados) como multiculturais. O multiculturalismo é condição prévia
de uma relação equilibrada e mutuamente potencializadora entre a competência
global e a legitimidade local, que constituem os dois atributos de uma política
contra hegemônica de direitos humanos do tempo presente.37
A interculturalidade ou interculturalismo refere-se à interação entre
diferentes culturas de forma recíproca, de modo a favorecer um estável convívio
e integração entre elas, baseados numa relação de respeito pela diversidade e no
enriquecimento mútuo. Fala-se aqui no diálogo intercultural, e a construção de
uma concepção multicultural dos direitos humanos decorreria desse diálogo.
3) Inerência – é a qualidade de pertencimento desses direitos a todos os
membros da espécie humana, sem qualquer distinção; o ser humano
tem dignidade única e direitos inerentes à condição humana; ser
19

humano significa ter direitos inerentes à essa condição;38


Página

37 SANTOS, Boaventura de Souza. Descolonizar el Saber, Reinventar el Poder. Montevideo:


Ediciones Trilce-Extensión Universitaria/Universidad de la República, 2010, p. 67.
38 O Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, logo no primeiro parágrafo,

reconhece que “a dignidade inerente a todos os membros da família humana e seus direitos
iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”.
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Sobre esta característica, Carlos Weis explica que “o reconhecimento da


inerência é premissa racional para a construção da noção de direitos humanos,
porque a existência do ser humano livre, anterior à criação do Estado, permite a
limitação da ação deste ou seu direcionamento para a criação de condições
favoráveis à vida em sociedade”.39
Além disso, para este autor, a inerência também desempenha a função “de
propiciar a constante alteração do sistema normativo dos direitos humanos,
sempre que se renovar ou ampliar o entendimento do que seja a ‘dignidade
inerente a todos os membros da família humana’ [...] Outra consequência
fundamental é o caráter não-taxativo dos direitos humanos até agora
reconhecidos, eis que, sendo inerentes aos seres humanos, em grupo ou
individualmente, se apresentam em constante mutação, acompanhando e
interferindo na evolução social, regional e local”.40
4) Historicidade – os direitos humanos são uma construção histórica, que
vão sendo construídos com o decorrer do tempo, num fluxo contínuo e
evolutivo (“não nascem em árvores”). Portanto, não são fruto de apenas
um acontecimento específico e isolado na história, mas produto de um
processo temporal e complexo no qual vão se formando suas nuanças;41
Esses direitos nascem de lutas, reivindicações e demandas por direitos
específicos, em cada momento também específico da história humana, daí a
razão pela qual a doutrina divide didaticamente o estudo dos direitos humanos
em gerações ou dimensões. Por serem históricos, os direitos humanos são
sempre mutáveis, adaptáveis e aperfeiçoáveis, não sendo estacionários, uma vez
que estão em constante movimento evolutivo.42
5) Transnacionalidade – consiste no reconhecimento dos direitos
20

humanos onde quer o indivíduo esteja43, pois esses direitos


Página

transcendem as fronteiras físicas dos Estados.

39 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 176.
40 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 177.
41 GARCIA, Bruna Pinotti; LAZARI, Rafael de. Manual de Direitos Humanos. Volume Único.

Salvador: JusPODIVM, 2014, p. 41.


42 GARCIA, Bruna Pinotti; LAZARI, Rafael de. Manual de Direitos Humanos, op. cit., p. 41.
43 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 187-188. Dalmo de Abreu Dallari

explica que “Os direitos fundamentais da pessoa humana são reconhecidos e protegidos em
todos os Estados, embora existam algumas variações quanto à enumeração desses direitos, bem
como quanto à forma de protegê-los. Esses direitos não dependem da nacionalidade ou
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Essa característica é ainda mais importante na ausência de uma


nacionalidade (apátridas) ou na existência de fluxos de refugiados, situações em
que determinado Estado deverá garantir esses direitos à estas pessoas (apátridas
e refugiados), mesmo diante do fato de não serem elas nacionais desse Estado.
Os direitos humanos não mais dependem do reconhecimento por parte de
um Estado ou da existência do vínculo da nacionalidade, existindo o dever
internacional de proteção aos indivíduos, confirmando-se o caráter universal e
transnacional desses direitos.
6) Indivisibilidade – consiste no reconhecimento de que todos os direitos
humanos possuem a mesma proteção jurídica, pois todos são essenciais
para uma vida digna. Desse modo, não é possível reconhecer apenas
alguns dos direitos reconhecidos, isto é, não basta garantir um direito
e abrir mão de outro; não basta escolher uma das dimensões dos
direitos humanos e esquecer das demais;
Sobre essa característica Carlos Weis explica que “ao se afirmar que os
direitos humanos são indivisíveis se está a dizer que não existe meio-termo: só
há vida verdadeiramente digna se todos os direitos previstos no direito
internacional dos direitos humanos estiverem sendo respeitados, sejam civis e
políticos, sejam econômicos, sociais e culturais. Trata-se de uma característica
do conjunto das normas, e não de cada direito individualmente considerado”.44
7) Interdependência – trata-se de uma característica que está intimamente
ligada à anterior (indivisibilidade) e significa que todos os direitos
contribuem para a realização da dignidade humana (ideia de interação,
interatividade). Portanto, a interdependência “diz respeito aos direitos
humanos considerados em espécie, ao se entender que certo direito não
alcança a eficácia plena sem a realização simultânea de alguns ou de
todos os outros direitos humanos”;45
21
Página

cidadania, sendo assegurados a qualquer pessoa” (DALLARI, Dalmo de Abreu. O Que São Direitos
da Pessoa. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1984, p. 22).
44 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 184. Sob essa ótica, a

indivisibilidade demanda, v.g., a proteção simultânea da vida, da integridade física e da liberdade


de expressão, dentre outros (direitos civis e políticos) e também da saúde, da educação, do
trabalho, da previdência social (direitos sociais, econômicos e culturais).
45 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 184.
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Assim como ocorre com a característica da indivisibilidade, a


interdependência remete às chamadas gerações ou dimensões de direitos
humanos. “E essa característica não distingue direitos civis e políticos ou
econômicos, sociais e culturais, pois a realização de um direito específico pode
depender (como geralmente ocorre) do respeito e promoção de diversos outros,
independentemente de sua classificação”.46
8) Unidade – esta característica está intimamente ligada às duas
anteriores (indivisibilidade e interdependência), uma vez que os direitos
humanos compõem um único conjunto de direitos, formando uma
unidade de direitos indivisível e interdependente (ou inter-relacionada),
havendo uma relação recíproca em que um contribui para a realização
do outro;
9) Inexauribilidade – conhecida também como abertura, não exaustividade
ou não exauribilidade dos direitos humanos, significa que esses direitos
são inexauríveis, no sentido de sempre ser possível a sua expansão pelo
acréscimo de novos direitos. Por outras palavras, os direitos humanos
não se esgotam naqueles que já foram reconhecidos e consagrados nos
instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos e na
ordem jurídica interna (Constituições), sendo sempre possível a
ampliação do rol dos direitos já existentes (que não excluem outros)
diante de novas demandas que visem o atendimento da dignidade
humana (vide nesse sentido, v.g., o art. 5º, § 2º, da CRFB);47
10) Irrenunciabilidade (ou indisponibilidade) – diferentemente do que
ocorre com os direitos subjetivos em geral, que podem ser
“renunciados” por seus titulares, os direitos humanos têm como
caraterística básica a irrenunciabilidade, no sentido de que ninguém
pode renunciar, isto é, abrir mão da própria natureza humana para
permitir a violação de direitos que lhe são inerentes e essenciais para
22

uma vida digna. Esta característica fundamenta-se na impossibilidade


Página

de o ser humano despir-se de sua dignidade;

46WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 184-185.


47“§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte”.
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Sobre essa característica, Valerio Mazzuoli explica que a


irrenunciabilidade se traduz na ideia de que a autorização do titular de um
direito humano não justifica ou convalida qualquer violação do seu conteúdo.48
Trata-se aqui de uma das características mais polêmicas dos direitos
humanos e que tem despertado o maior número de questões e debates no âmbito
da doutrina e da jurisprudência.
Na perspectiva do campo fático esta característica é alvo de intensas
críticas e de inconformismo, notadamente pelos próprios titulares dos direitos
humanos, não sendo poucas as circunstâncias em que se verifica que o titular
de um direito humano deixa de gozar parte ou mesmo a integralidade de
determinado direito, v.g., em programas televisivos (Big Brother, A Fazenda), em
23

atividades laborais (arremesso de anões, peep-show49), nas situações


Página

relacionadas à disposição da própria vida (eutanásia, suicídio assistido).

48 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 32.


49 Atividade laboral na qual uma mulher, completamente sem roupas, dança, em uma cabine
fechada, mediante remuneração, para um espectador individual que assiste ao show. A questão
envolvendo o peep-show ocorreu na Alemanha, num caso em que “discutia-se a possibilidade de
se conceder licença de funcionamento para um estabelecimento onde se praticava o chamado
peep-show [...]. A licença de funcionamento não fora concedida administrativamente sob o
argumento de que aquela atividade seria degradante para a mulher e, portanto, violava a
dignidade da pessoa humana. Em razão disso, os interessados ingressaram com ação judicial
questionando o ato administrativo. Eles argumentavam que a mulher estaria realizando aquele
trabalho por livre e espontânea vontade. Ou seja, era uma mulher adulta, com plena capacidade
de discernimento, que estava realizando aquela atividade porque queria, sem pressão
psicológica, financeira ou física. Logo, não havia que se falar em violação à dignidade. Seria um
trabalho como qualquer outro. Sustentaram ainda que várias boates onde se praticava o strip-
tease obtiveram a devida licença de funcionamento, razão pela qual o peep-show também deveria
ser permitido. Portanto, se uma mulher (ou um homem) deseja realizar atividades como o do
peep-show, o Estado não deveria impedir. É um trabalho como outro qualquer, a não ser que a
pessoa esteja ali contra a sua vontade. Defendeu-se, ainda, que não há um valor constitucional
ligado aos ‘bons costumes’ ou à moralidade sexual. A Constituição não obriga que se siga um
comportamento sexual ‘convencional’ ou ‘familiar’. Há, pelo contrário, proteção à diversidade e
ao pluralismo, inclusive de cunho sexual. Qualquer limitação a direitos fundamentais com base
em justificativas fundadas na moralidade sexual é, em princípio, suspeita, a não ser quando se
busca também proteger o público infantil. No caso do peep-show (ao contrário de outdoors,
programas de televisão, revistas etc. que podem ser vistos por crianças), o trabalho é realizado
em ambiente fechado e tipicamente adulto. Logo, não seria justificável a limitação ao direito
fundamental (ao trabalho) nessa situação específica. O caso chegou até a Corte Constitucional
alemã, que deveria decidir se merecia prevalecer a autonomia da vontade da mulher, que estava
ali voluntariamente, por escolha própria, ou a dignidade da pessoa humana, já que aquela
atividade colocava a dançarina na condição de mero objeto de prazer sexual. A decisão foi no
sentido de que o peep-show violaria a dignidade da pessoa humana e, portanto, deveria ser
proibido. Na argumentação, o TCF decidiu que ‘a simples exibição do corpo feminino não viola a
dignidade humana; assim, pelo menos em relação à dignidade da pessoa humana, não existe
qualquer objeção contra as performances de strip-tease de um modo geral’. Já os peep-shows –
argumentaram os Ministros do Tribunal – ‘são bastante diferentes das performances de strip-
tease. No strip-tease, existe uma performance artística. Já em um peep-show a mulher é colocada
em uma posição degradante. Ela é tratada como um objeto… para estímulo do interesse sexual
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Na doutrina há uma tendência em se admitir a mitigação dos efeitos da


irrenunciabilidade por meio da distinção teórica entre a renúncia e o não-exercício
de um determinado direito, segundo a qual pode o titular deixar de exercitar um
direito humano ou fundamental, mas jamais renunciá-lo, ou seja, dele se
despojar em definitivo.50 Outra proposta identifica a existência de alguns direitos
humanos, cuja natureza autorizaria a sua renúncia, identificáveis por exclusão,
em comparação com os direitos diretamente ligados à vida (pois sem a vida a
dignidade não tem razão de ser), à integridade física e mental e à liberdade
de tomar decisões (autonomia da vontade).51
11) Inalienabilidade – os “direitos humanos são inalienáveis, na medida
em que não permitem a sua desinvestidura por parte do titular, não
podendo ser transferidos ou cedidos (onerosa ou gratuitamente) a
outrem, ainda que com o consentimento do agente”.52 Desse modo,
afirma-se que os direitos humanos são intransferíveis e inegociáveis,
dada a impossibilidade de atribuir a eles uma dimensão pecuniária
(valor econômico) para fins de comércio (principalmente venda).
Explica Gilmar Mendes e Paulo Gonet Branco que “inalienável é um direito
ou uma coisa em relação a que estão excluídos quaisquer atos de disposição,
quer jurídica - renúncia, compra e venda, doação -, quer material - destruição
material do bem. Isso significa que um direito inalienável não admite que o seu
titular o torne impossível de ser exercitado para si mesmo, física ou
juridicamente. Nesse sentido, o direito à integridade física é inalienável, o
indivíduo não pode vender uma parte do seu corpo ou uma função vital, nem
24

tampouco se mutilar voluntariamente”.53


Página

dos expectadores’. Explicou ainda o TCF que a violação da dignidade não seria afastada ou
justificada pelo fato de a mulher que atua em um peep-show estar ali voluntariamente. Afinal,
‘a dignidade da pessoa humana é um objetivo e valor inalienável, cujo respeito não pode ficar ao
arbítrio do indivíduo’” (MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. 6. ed. São
Paulo: Atlas, 2016, p. 507).
50 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed. São Paulo: Malheiros,

2014, p. 183; GUERRA, Sidney. Direitos Humanos: Curso elementar. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2015, p. 230; MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito
Constitucional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 144.
51 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional,

op. cit., p. 144.


52 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 32-33.
53 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional,

op. cit., p. 143.


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É preciso destacar que ser inalienável não significa que não se possa
desempenhar atividades econômicas utilizando-se de um direito humano, v.g.,
negociação da atividade resultante do exercício do direito humano à livre
manifestação do pensamento, do qual resultam várias formas de criação
humana (produção científica, literária ou artística), tais como uma pintura, uma
música, um livro etc. O que se negocia aqui não é o direito humano, mas a
atividade resultante do exercício desse direito.
12) Imprescritibilidade – os direitos humanos são imprescritíveis porque
são sempre exigíveis (vindicáveis), não se esgotando ou se perdendo
com o decurso do tempo. Isto significa que, existindo ser humano,
haverá esses direitos inerentes a ele.
No entanto, deve-se aqui destacar o seguinte: (i) pode haver a prescrição
do direito decorrente do exercício dos direitos humanos. Exemplificativamente,
se uma pessoa sofre alguma espécie de dano (v.g., material, moral, estético),
como decorrência da violação de um direito humano que está sendo exercido por
determinada pessoa (v.g., o direito à intimidade), abre-se então o prazo
prescricional para que ela possa reclamar, junto ao Judiciário, uma reparação
pecuniária (ou de outra natureza) pela lesão sofrida.
13) Vedação do retrocesso – consiste na proibição de o Estado retroceder
em matéria de proteção dos direitos humanos. Por outras palavras, “os
direitos humanos devem sempre (e cada vez mais) agregar algo de novo
e melhor ao ser humano, não podendo o Estado proteger menos do que
já protegia anteriormente”.54
Portanto, os direitos humanos caracterizam-se pela proibição do
retrocesso, que é um princípio internacional também conhecido como proibição
do regresso, não retorno, efeito cliquet ou não retorno da concretização, vedando-
se a eliminação da concretização já alcançada na proteção de algum direito
humano, admitindo-se somente de aprimoramentos e acréscimos.
André de Carvalho Ramos aponta que outra expressão utilizada pela
doutrina, para referir-se à proibição do retrocesso “é o entrenchment ou
25

entrincheiramento, que consiste na preservação do mínimo já concretizado dos


Página

54 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 33.


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direitos fundamentais, impedindo o retrocesso, que poderia ser realizado pela


supressão normativa ou ainda pelo amesquinhamento ou diminuição de suas
prestações à coletividade”.55
Nesse contexto, importa ressaltar por fim que, do mesmo modo que o
Estado (no âmbito interno) não pode retroceder na proteção dos direitos
humanos já alcançada, o Direito Internacional também deve atuar nesse mesmo
sentido, não retrocedendo ou impondo restrições aos direitos protegidos. É por
essa razão que atualmente se encontram presentes em diversos tratados
internacionais de direitos humanos as chamadas cláusulas de diálogo, que
visam justamente estabelecer um diálogo com o direito interno dos Estados (e
também com outros tratados sobre o tema), de modo a sempre buscar uma
melhor proteção dos direitos humanos por meio da aplicação da norma que mais
proteja esses direitos, seja ela doméstica ou internacional. Exemplo: art. 29, b,
da Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

Artigo 29. Normas de interpretação


Nenhuma disposição desta Convenção pode ser interpretada no
sentido de: (...) b) limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou
liberdade que possam ser reconhecidos de acordo com as leis de
qualquer dos Estados Partes ou de acordo com outra convenção em
que seja parte um dos referidos Estados;

8. GERAÇÕES OU DIMENSÕES DOS DIREITOS HUMANOS

Em decorrência da característica da historicidade dos direitos humanos,


segundo a qual esses direitos são frutos de uma construção que vem ocorrendo
ao longo da história, a doutrina convencionou dividi-los em gerações, dimensões
ou categorias, com base nos momentos históricos que inspiraram o seu
reconhecimento e positivação nos textos constitucionais e internacionais, dando
origem à teoria das gerações ou dimensões dos direitos humanos.
26
Página

55 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 99.


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Em razão do caráter indivisível, interdependente e complementar (relação


de complementaridade em que um complementa o outro) desses direitos, que se
somam e dialogam para melhor proteção da dignidade humana, apontando,
portanto, para a necessidade de fruição simultânea de todos eles pelos seus
titulares, esta divisão só se justifica para fins didáticos, em uma tentativa da
doutrina “de tornar mais palatável a noção da historicidade dos direitos
humanos, isto é, explicar de forma sintética que o surgimento daqueles obedeceu
às injunções histórico-políticas, cujas características marcaram os direitos
nascidos naquele momento”.56
Foi o jurista francês, de origem Checa, chamado Karel Vasak, quem
apresentou pela primeira vez a classificação dos direitos humanos em gerações,
em Conferência ministrada no Instituto Internacional de Direitos Humanos de
Estrasburgo (França), no ano de 1979. Naquela oportunidade, cada geração foi
associada por Vasak, a um dos componentes do lema da Revolução Francesa:
“liberté, egalité et fraternité” (liberdade, igualdade e fraternidade). Assim, de
acordo com sua proposta, os direitos de liberdade seriam os da 1ª geração; os
direitos de igualdade, os da 2ª geração; e os direitos de fraternidade, os de 3ª
geração, que esquematicamente podem ser assim colocados:
27
Página

56 WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos, op. cit., p. 51.


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De acordo com essa concepção, firmou-se classicamente na doutrina a


classificação dos direitos humanos em três gerações/dimensões que traduzem,
sem dúvida, um processo cumulativo e qualitativo de reconhecimento e
positivação desses direitos, e que podem ser sintetizados da seguinte maneira:
1) Os direitos de primeira geração/dimensão são as liberdades públicas,
os direitos políticos básicos, que representam os direitos civis e políticos
do povo, traduzidos no valor liberdade;
Esses direitos foram os primeiros a constarem nos instrumentos jurídicos
(constitucionais e internacionais), institucionalizados historicamente a partir da
Magna Carta de 1215 do rei João Sem Terra e presentes a partir de então em
muitos outros documentos históricos que se sucederam. Sistematicamente
aparecem a partir da constitucionalização ocidental (séculos XVIII e XIX) e têm
como titular o indivíduo, sendo oponíveis ao próprio Estado57, razão pela qual são
também conhecidos como direitos de resistência, direitos de defesa ou direitos
de oposição perante o Estado.
André de Carvalho Ramos explica que “o papel do Estado na defesa dos
direitos de primeira geração é tanto o tradicional papel passivo (abstenção em
violar os direitos humanos, ou seja, as prestações negativas) quanto ativo, pois
há de se exigir ações do Estado para garantia da segurança pública,
administração da justiça, entre outras”.58 Por isso se fala nesse momento
específico da história na figura do Estado absenteísta, que deve se abster de
violar os direitos humanos do indivíduo (prestações negativas).

São exemplos: o direito à vida, o direito às liberdades (de pensamento,


de expressão, de informação, de locomoção, de reunião, de associação,
de consciência e crença, de culto etc.), o direito à igualdade (formal ou
“da boca para fora”), o direito à propriedade, o direito à propriedade
intelectual, o direito à segurança, o direito à privacidade, o direito ao
sigilo das comunicações, os direitos da personalidade (nome, honra,
imagem), o direito à nacionalidade, o direito à participação política, o
28

direito de acesso à justiça etc.


Página

57 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Direitos Humanos, op. cit.


58 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 58.
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2) Os direitos de segunda geração/dimensão são aqueles voltados para a


garantia de uma igualdade material entre os indivíduos (igualdade lato
sensu) e compõem-se dos chamados direitos sociais, econômicos e
culturais do povo, que traduzem justamente o valor igualdade;
Decorrentes da Revolução Industrial (fim do século XIX e início do século
XX), em razão de movimentos sociais que eclodiram nesse período (v.g., Comuna
de Paris e Cartista – Inglaterra), como consequência das péssimas condições de
trabalho e da constatação de que a inserção formal da liberdade e da igualdade
em declarações de direitos não era capaz de garantir a sua efetiva concretização,
esses direitos buscam estabelecer melhorias no âmbito social do trabalhador59 e
ganham relevo com a Constituição do México, de 1917 (que regulou o direito ao
trabalho e à previdência social), com a Constituição alemã de Weimar, de 1919
(que, em sua Parte II, estabeleceu os deveres do Estado na proteção dos direitos
sociais) e, no plano do Direito Internacional, com o Tratado de Versailles, que
oficialmente pôs fim à Primeira Guerra e criou a Organização Internacional do
Trabalho (OIT).
Esses direitos, que são também titularizados pelo indivíduo e oponíveis ao
Estado, foram inseridos inicialmente no contexto dos direitos programáticos ou
de aplicabilidade mediata (que somente seriam aplicáveis por meio da
intervenção do legislador ordinário), à vista de não disporem, para sua efetivação
imediata, das garantias tradicionais usualmente aplicadas aos direitos de
liberdade. Durante muito tempo prevaleceu a noção de que somente os direitos
de liberdade (primeira geração) eram de aplicabilidade imediata. Posteriormente
várias Constituições, inclusive a brasileira, formularam o preceito da
aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais (CRFB, art. 5º, § 1º).
Os direitos de segunda geração/dimensão são marcados pelo nascimento
do Welfare State ou Estado do Bem-estar Social, em que o Estado passa a ser
mais intervencionista, comprometendo-se a promover uma maior igualdade
social e a garantir condições básicas para uma vida digna, representando,
portanto, uma modificação do papel do Estado, exigindo-lhe um vigoroso papel
29

ativo.
Página

59 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Direitos Humanos, op. cit.


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Nesse sentido, André de Carvalho Ramos explica que os direitos sociais,


tais como o direito à saúde, educação, previdência social, habitação, dentre
outros, demandam “um papel ativo do Estado para assegurar uma condição
material mínima de sobrevivência”.60

São exemplos: o direito à igualdade (no exercício dos direitos


econômicos, sociais e culturais); o direito à educação; o direito à saúde;
o direito a um padrão de vida que assegure a saúde e o bem-estar
individual e da família; o direito ao trabalho digno (proteção contra o
desemprego, liberdade e escolha, condições justas e favoráveis,
limitação das jornadas de trabalho, saúde e segurança no trabalho,
férias remuneradas etc.); o direito à assistência e à previdência sociais;
o direito ao repouso e ao lazer; o direito à moradia, ao vestuário e à
alimentação; o direito à cultura; o direito à segurança pública etc.

Estas suas primeiras gerações de direitos humanos “concentram-se em


direitos pertencentes ao indivíduo, à pessoa humana propriamente dita, não
possuindo um foco na coletividade”61, um quadro que vai mudar com a terceira
geração/dimensão de direitos.
3) Os direitos de terceira geração/dimensão são aqueles “derivados de
grandes alterações sociais na comunidade internacional, causadas pela
globalização da economia, avanços tecnológicos e científicos, como as
viagens espaciais, a robótica, a internet etc. Tais direitos direcionam-se
para a preservação da qualidade de vida, tutelando o meio ambiente,
permitindo o progresso sem detrimento da paz e autodeterminação dos
povos, direito à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade,
constituindo-se em interesses difusos e coletivos, que transcendem o
indivíduo ou grupos de indivíduos, representando os direitos de
fraternidade ou solidariedade, uma vez considerado o homem como
integrante da sociedade, traduzidos no valor fraternidade”.62
30
Página

60 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 58.


61 GARCIA, Bruna Pinotti; LAZARI, Rafael de. Manual de Direitos Humanos, op. cit., p. 95.
62 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Direitos Humanos, op. cit.
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André de Carvalho Ramos destaca que esses direitos “são oriundos da


constatação da vinculação do homem ao planeta Terra, com recursos finitos,
divisão absolutamente desigual de riquezas em verdadeiros círculos viciosos de
miséria e ameaças cada vez mais concretas à sobrevivência da espécie
humana”.63

São exemplos: o direito à preservação da qualidade de vida; o direito ao


meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado; o direito ao
progresso e ao desenvolvimento; o direito à paz; o direito à
autodeterminação dos povos; o direito à comunicação; o direito ao
patrimônio comum da humanidade; os direitos do consumidor; o
direito a serviços públicos eficientes; o direito à incolumidade da
Administração Pública etc.

Além destas três gerações propostas por Karel Vasak, a doutrina


posteriormente passou a falar em uma quarta geração e, mais recentemente, até
mesmo em uma quinta geração, embora não seja pacífica nesse sentido.
4) Os direitos de quarta geração/dimensão constituem uma construção
doutrinária mais recente que data do final do século XX. Seriam
aqueles direitos de preservação do ser humano (clonagem, sucessão de
filhos gerados por inseminação artificial, manipulação do patrimônio
genético etc.), os direitos e garantias de proteção contra a globalização
desenfreada (direito à democracia, pluralismo etc.), direitos que se
referem à eutanásia, à bioética, às biociências, à biotecnologia, à
bioengenharia, aos alimentos transgênicos, à informática etc.
De acordo com Norberto Bobbio, referida geração de direitos decorreria dos
avanços no campo da engenharia genética, capazes de colocar em risco a própria
existência humana por meio da manipulação irresponsável do patrimônio
genético humano.64 Para Paulo Bonavides, os direitos de quarta geração,
resultantes da globalização dos direitos humanos (universalização no campo
31

institucional), correspondem ao direito à democracia (no caso, a democracia


Página

direta), direito ao pluralismo e o direito à informação.

63 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit., p. 58.


64 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, op. cit., p. 9-11.
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Há uma corrente atual que sustenta serem de quarta geração/dimensão


os direitos das minorias, ou o direito de ser diferente (Luís Roberto Barroso65 e
Uadi Lammêgo Bulos66).
Como marco histórico dessa geração pode-se citar a Declaração Universal
sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos, da UNESCO, que reconhece em
seu art. 1º que o genoma humano é patrimônio da humanidade; no art. 2º, que
ninguém pode ser discriminado em virtude de suas características genéticas; e,
em seu art. 4º, que o genoma não pode ser objeto de negociação financeira. No
âmbito interno brasileiro, a proteção dos direitos de quarta geração/dimensão
encontrou guarida na Lei n. 11.105, de 24 de março de 2005, a chamada Lei de
Biossegurança, que proibiu a clonagem humana.
5) Os direitos de quinta geração/dimensão, para Paulo Bonavides, seriam
aqueles direitos transportados diretamente da 3ª geração para os dias
de hoje, significando mais especificadamente o direito à paz permanente
entre os povos; enfim, direito à pacificidade permanente.67
Para Janusz Symonides, o conteúdo que assegura o direito à paz como
uma quinta geração/dimensão é definido por vários dos “direitos humanos já
existentes, cuja implementação tem impacto direto sobre a manutenção da paz
e prevenção dos conflitos e da violência. Isso se aplica à liberdade de
pensamento, consciência e religião, inclusive ao direito de fazer objeções de
consciência ao serviço militar, à liberdade de opinião e de expressão, à liberdade
de associação e reunião pacíficas, e ao direito de todo indivíduo de participar do
governo do seu próprio país. Entre os deveres dos Estados expressos nos
instrumentos de direitos humanos, merece particular destaque a proibição, por
lei, de qualquer propaganda favorável à guerra e da apologia ao ódio nacional,
racial ou religioso que constitui incitamento à discriminação, hostilidade ou
violência”.68
32
Página

65 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Direitos Humanos, op. cit.


66 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p.
87.
67 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p.

594-601.
68 SYMONIDES, Janusz. Direitos Humanos: novas dimensões e desafios. Brasília: UNESCO

Brasil, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2003, p. 31.


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Existem autores da área do direito eletrônico, como Patrícia Peck e Luís


Carlos C. Olivo, que o entendem como integrante da quinta geração/dimensão
dos direitos humanos. Aqui estaria compreendido o direito de acesso e
convivência em um ambiente salutar no ciberespaço.69
Por fim, cabe aqui destacar que a expressão geração tem sido criticada
pela doutrina, que parece dar certa preferência à expressão dimensão (ainda que
essa também não seja isenta de crítica).
A crítica mais contundente é que a palavra geração transmite a ideia de
sucessão de uma geração por outra. Conforme explica George Marmelstein, “o
uso do termo geração pode dar a falsa impressão da substituição gradativa de
uma geração por outra, o que é um erro, já que, por exemplo, os direitos de
liberdade não desaparecem ou não deveriam desaparecer quando surgem os
direitos sociais e assim por diante”.70
Em verdade, os direitos de uma geração não substituem ou suplantam os
de outra, mas se complementam e fortalecem para a promoção da dignidade
humana (características da unidade e complementaridade). Além disso, importa
ressaltar a não existência de uma hierarquia entre os direitos previstos em cada
geração e nem mesmo a prioridade da implementação dos direitos previstos em
cada uma delas (características da indivisibilidade e interdependência).
Nesse sentido, Flávia Piovesan, fazendo menção ao que ela chama de
fantasia das gerações de direitos, afirma que a “noção simplista das chamadas
‘gerações de direitos’, histórica e juridicamente infundada, tem prestado um
desserviço ao pensamento mais lúcido a inspirar a evolução do direito
internacional dos direitos humanos. Distintamente do que a infeliz invocação da
imagem analógica da ‘sucessão generacional’ pareceria supor, os direitos
humanos não se ‘sucedem’ ou ‘substituem’ uns aos outros, mas antes se
expandem, se acumulam e fortalecem, interagindo os direitos individuais e
sociais (...) O que testemunhamos é o fenômeno não de uma sucessão, mas antes
da expansão, cumulação e fortalecimento dos direitos humanos consagrados, a
33

revelar a natureza complementar de todos os direitos humanos”.71


Página

69 GARCIA, Bruna Pinotti; LAZARI, Rafael de. Manual de Direitos Humanos, op. cit., p. 97.
70 MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais, op. cit., p. 59.
71 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, op. cit., p. 65.
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WEYNE, Bruno Cunha. O Princípio da Dignidade Humana: reflexões a partir da


filosofia da Kant. São Paulo: Saraiva, 2013.

ESTE MATERIAL CONSTITUI UM COMPLEMENTO DAS AULAS


MINISTRADAS EM SALA, NÃO AS SUBSTITUINDO EM QUALQUER
HIPÓTESE.
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DIGNIDADE HUMANA

QUALIDADE DE CADA SER HUMANO

intrínseca distintiva

FAZ DE CADA UM MERECEDOR DE

respeito consideração

QUEM DEVE TER RESPEITO E CONSIDERAÇÃO?

Estado Sociedade

UM CONJUNTO DE DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS


QUE ASSEGURAM A PESSOA
não sofrer tratamento
condições existenciais mínimas
desumano e degradante

PROMOVER A PARTICIPAÇÃO ATIVA E CORRESPONSÁVEL


no destino da própria
vida em sociedade
existência
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