As Contradições Do Lulismo - André Singer e Isabel Loureiro
As Contradições Do Lulismo - André Singer e Isabel Loureiro
As Contradições Do Lulismo - André Singer e Isabel Loureiro
Boitempo Editorial,
2016.
O autor não ignora que a interferência na economia pode causar conflitos na dinâmica do conflito distributivo, mas
entende que o foco dessa regulação seria demasiadamente estreito para compreender a complexidade da crise
enfrentada, de repercussões internacionais, ou as implicações decorrentes das alterações na estrutura de classes
ocorrida nas décadas anteriores, desde o governo Collor, mas principalmente após o primeiro governo Lula – que
gerou 2,1 milhões de empregos por ano no país, dentre os quais 2 milhões remuneravam abaixo de 1,5 salários
mínimos.
“Na realidade, parece-nos que o sucesso dos governos de Lula da Silva deveu-se, sobretudo, à combinação do
momento econômico favorável com a consolidação de, para utilizarmos a expressão popularizada pelo cientista
político André Singer, um ‘reformismo fraco’, que alimentou essa relação social hegemônica” (pág. 56)
[ver mais em André Singer - Os sentidos do lulismo]
“De fato, sabemos que durante os governos de Lula da Silva, 2,1 milhões de empregos formais foram criados no
país todos os anos. No entanto, desses 2,1 milhões de empregos formais, 2 milhões remuneram até 1,5 salário
mínimo”. (pág. 56)
[ver mais em Pochmann - Nova Classe média?]
“Não devemos esquecer que nos últimos dez anos, 94% dos empregos criados no mercado formal de trabalho
brasileiro remuneravam até 1,5 salários mínimos” [ANTUNES, R.; BRAGA, Ruy. Os dias que abalaram o Brasil: as
rebeliões de junho de 2013. Revista de Políticas Públicas da UFMA. Edição Especial, julho de 2014]
“Conforme pesquisa realizada pela consultoria Plus Marketing na passeata do dia 20 de junho de 2013, na cidade
do Rio de Janeiro, a maioria dos manifestantes encontra-se no mercado de trabalho (70,4%), ganhando até um
salário mínimo (34,3%). Se somarmos estes aos que ganham entre dois e três salários mínimos (30,3%), temos que
mais de 64% do total de um milhão de pessoas que foram às ruas no Rio de Janeiro são parte desse proletariado
precarizado urbano. Se, no início, havia um predomínio da juventude estudantil, ela desde logo se mesclou aos
assalariados médios urbanos e já há vários dias atingiu profundamente as periferias, com um cenário de
manifestações e reinvindicações que tocam diretamente as classes populares”. [ANTUNES, R.; BRAGA, Ruy. Os dias
que abalaram o Brasil: as rebeliões de junho de 2013. Revista de Políticas Públicas da UFMA. Edição Especial, julho
de 2014]
“Além disso, as condições de trabalho tornaram-se mais precárias, com o aumento da taxa de rotatividade e de
flexibilização do emprego, sem citar o aumento do número de acidentes do trabalho no país”. (pág. 57)
“Na realidade, a soma do desmanche das formas de solidariedade fordista promovido pela empresa neoliberal com
o avanço do padrão de consumo pós-fordista estimulado pela globalização econômica impulsionou um avanço sem
precedentes da individualização do comportamento da classe trabalhadora do país”. (pág. 58)
“No entanto, esses dirigentes foram absorvidos pelo aparelho de Estado e pelos fundos de pensão, transformando-
se em verdadeiros administradores do investimento capitalista no país. Ou seja, eles deixaram de representar os
interesses históricos dos trabalhadores, alinhando-se aos interesses particulares de uma burocracia sindical que
rapidamente está se transformando em uma nova burguesia de Estado. Esse tipo de ‘transformismo’ social tendeu
a afastar as antigas lideranças sindicais absorvidas pelas funções administrativas das demandas provenientes do
SINGER, André; LOUREIRO, Isabel. As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo. Boitempo Editorial,
2016.
ativismo das bases formadas, sobretudo, pelo proletariado precarizado. Eis o campo de tensão entre o regime de
acumulação e o modo de regulação”. (pág. 58)
“O primeiro governo Lula da Silva preencheu aproximadamente metade dos cargos superiores de direção e
assessoramento – cerca de 1.305 vagas, no total – com sindicalistas que passaram a controlar um orçamento anual
superior a 200 bilhões de reais. Além disso, posições estratégicas dos fundos de pensão das empresas estatais foram
ocupadas por dirigentes sindicais”. (pág. 62)
Crise
“Malgrado os planos de demissão voluntária (PDVs) anunciados em 2012 por algumas importantes montadoras, de
maneira geral, o mercado de trabalho brasileiro permaneceu contratando até 2015, ainda que em ritmo mais lento
do que aquele verificado ao longo da década de 2000”. (pág. 60)
“De fato, os anos 1990 foram muito difíceis para o movimento sindical brasileiro, em especial quando pensamos na
conjuntura econômica marcada pelo desemprego em massa. As empresas promoveram um acelerado ciclo de
reestruturação produtiva que terceirizou, flexibilizou e precarizou o trabalho. Dois efeitos sobre o movimento
sindical foram mais salientes: o recuo das taxas de sindicalização e o desmanche do militantismo de base em favor
de um aumento do pragmatismo das cúpulas sindicais. Progressivamente, o movimento sindical abandonou o
esforço de organização de suas bases nos locais de trabalho em favor de um projeto político orientado pela eleição
de seus dirigentes para cargos políticos”. (pág. 60)
“No entanto, aos aumentos do salário mínimo acima da inflação seguiu-se um endurecimento nas condições de
consumo da força de trabalho: nos anos 2000, a taxa de rotatividade do trabalho do país aumentou certa de 10%
(de cerca de 33%, em 1999, para 36%, em 2009). Para aqueles que ganham entre 0,5 e 1,5 salário mínimo, a taxa
de rotatividade foi de 85% em 2009, ou seja, um aumento de 42% em comparação com 1999. Além disso, a taxa de
terceirização do trabalho aumentou em média 13% ao ano. De cerca de 3 milhões de trabalhadores prestando
serviços para outras empresas em 2002, saltamos para 12,7 milhões de trabalhadores terceirizados em 2013”. (pág.
61)
“Além disso, o protagonismo alcançado desde os anos 1990 pelos programas de participação nos lucros e resultados
(PLR) nas negociações coletivas dos setores mais organizados do sindicalismo fragilizou a participação dos
trabalhadores terceirizados, na medida em que os acordos de PLR tendem a excluir os terceirizados, os estagiários,
os temporários e os trabalhadores afastados por doença”. (pág. 61)
“Assim, as categorias mais estruturadas e com representação sindical alcançaram a oportunidade de realizar
acordos em que os ganhos reais oscilaram entre 1,5% e 3% acima da inflação. Tomando o conjunto das categorias
acompanhadas pelo SACC-Dieese entre 2008 e 2013, os aumentos reais médios permaneceram entre 0,9% e
1,98%”. (pág. 57)
“Assim, parece-nos mais ou menos claro que, conforme a experiência social da classe trabalhadora brasileira com
o atual modelo de desenvolvimento se aprofundava, ainda mais problemáticos se tornavam o controle da
inquietação das bases com os baixos salários, a deterioração das condições de trabalho e o aumento do
endividamento das famílias trabalhadoras pelo movimento sindical. Desde 2008, o sindicalismo brasileiro percebeu
que essa inquietação não seria contida pelas políticas públicas, vendo-se obrigado a promover greves e paralisações,
ainda que as lideranças sindicais lulistas não desejassem encabeçar movimentos paredistas capazes de atingir o
governo federal”. (pág. 70)
Em 2013, “de acordo com o Sistema de Acompanhamento de Greves do Departamento Intersindical de Estatística
e Estudos Socioeconômicos (SAG-Dieese), os trabalhadores brasileiros protagonizaram uma onda grevista inédita
na história do país, somando 2.050 greves. Isso significa um crescimento de 134% em relação ao ano anterior,
quando foram registradas 877 greves. Esse número superou o ano de 1990, configurando um novo recorde na série
histórica do SAG-Dieese. Em termos de horas paradas, tivemos 111.342 em 2013, representando um crescimento
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de 28% em relação ao ano anterior. Trata-se do maior número desde 1990, quando foram registradas 117.027 horas
paradas”. (pág. 70)
Terceirizados
“De fato, em média, os trabalhadores terceirizados no Brasil recebem 24,7% a menos por uma jornada semanal 7,5
horas mais longa, submetendo-se a uma taxa de rotatividade 53,5% superior aos trabalhadores diretamente
contratados”. (pág. 79)
Ideologia
“Acrescentemos a esse esboço de emancipação via formalização que normalmente repõe a precariedade do
passado informal a flagrante despolitização das relações de trabalho capitaneada pela descentralização, pela
privatização e pela terceirização dos serviços públicos nos bairros periféricos e percebemos a gravidade do colapso
dos movimentos sociais reivindicativos da periferia”. (80)
“À custa da ‘destruição dos músculos da sociedade civil brasileira’, como diria Francisco Oliveira, o crescimento do
‘onguismo’ liderado por ex-militantes especializados em estabelecer contratos terceirizados com a prefeitura de
São Paulo a fim de desenvolver projetos sociais nas periferias substituiu a reinvindicação por direitos universais pelo
ativismo em torno de políticas públicas focalizadas”. (81)
Relação entre construção (Minha Casa Minha Vida) x espaços subvalorizados x mobilidade x jornadas; (85)
Relação entre construção x supervalorização de áreas não regularizadas x remoções policiais e queimadas em São
Paulo; (85)
“O subproletariado semirrural acantonado nos grotões foi beneficiado pelo programa Bolsa Família (BF), passando
da extrema pobreza para a pobreza oficial. O precariado urbano deixou-se seduzir pelos aumentos do salário
mínimo acima da inflação e pela formalização do mercado de trabalho com a criação de empregos. O proletariado
sindicalmente organizado beneficiou-se do mercado de trabalho aquecido, alcançando negociações coletivas
vantajosas tanto em termos salariais quanto em benefícios trabalhistas”. (87)