Art20190701 03

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Processo: 5282250.43.2018.8.09.

0073

ESTADO DE GOIÁS
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE INHUMAS
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E CRIMINAL

Processo n°: 5282250.43


Requerente: __________
Requerida: Telefônica Brasil S/A

SENTENÇA

Trata-se de Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais proposta por ________
________ em face de TELEFÔNICA BRASIL S/A.

Extrai-se dos autos que o autor alega que em 24/11/2017, recebeu uma mensagem via
aplicativo WhatsApp, às 15h29min, no grupo “Hum Associados”, do integrante Dr. ________,
através do seu número cadastrado ([62]________), o qual indagou aos colegas sobre quem
utilizava o aplicativo do Banco do Brasil.

Afirma que, imediatamente, o integrante ________ respondeu a mensagem dizendo que


utilizava o aplicativo e logo depois o informou que não o utilizava.

Relata que na sequência das respostas, o integrante do grupo Dr. ________


conversou com o Dr. ________ e consigo no âmbito privado do aplicativo “WhatsApp”, tendo
solicitado a ________ uma transferência bancaria para uma conta do Banco do Brasil e ao
demandante, que respondeu não utilizar tal banco, solicitou uma transferência para uma conta da
Caixa Econômica Federal.

Narra que a transferência bancária solicitada por __________ era destinada a contas de
terceiros, sob a justificativa que o seu limite de transferências do dia havia excedido e, mediante
solicitação do interlocutor, realizou 03 (três) transferências, nos valores de R$ 1.000,00 (mil reais),
R$ 950,00 (novecentos e cinquenta reais) e a última no valor de R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta
reais), perfazendo o total de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).

Verbera que seu colega ________, por sua vez, realizou apenas uma transferência

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás


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bancária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) e logo suspeitou se tratar de um golpe, diante de outros
pedidos de transferências, razão pela qual não atendeu as solicitações.

Aduz, ainda, que ________, desconfiado, tentou ligar para o interlocutor a fim de verificar
a autenticidade dos pedidos, mas suas ligações eram recusadas e caiam diretamente na caixa
postal, razão pela qual ligou para a esposa de ________, Sra. _______________ (__________),
que lhe informou que o pedido de transferência não partiu de seu esposo, porque este se
encontrava em sua fazenda, noutra cidade.

Na oportunidade, __________ também informou que outras pessoas receberam o mesmo


pedido e a contataram, concluindo-se, então, se tratar realmente de um golpe através da clonagem
do Whatsapp de __________ por terceiros, que assumiram sua identidade no aplicativo, visando
aplicar golpes em seus contatos telefônicos, mediante solicitação de transferências bancárias,
fazendo do requerente uma vítima de tal façanha.

Alega que a linha telefônica de __________ era vinculada à operadora Vivo S/A, ora
promovida, a qual é, portanto, responsável pela segurança do terminal telefônico, sendo que a
mencionada fraude somente poderia ter êxito com o apoio de funcionários da operadora, conforme
noticiado em matérias jornalísticas colacionadas à exordial.

Diante disso, pleiteia a condenação da reclamada ao pagamento de indenização pelos


danos materiais e morais sofridos, em valor a ser arbitrado por este juízo.

Em sua peça de resistência, a demandada argui em sede de preliminar a inépcia da


inicial, por não ter o autor quantificado os valores pleiteados a título de indenizações, bem como de
ilegitimidade passiva, sob a justificativa de ser o aplicativo “Whatsapp” o verdadeiro responsável
pela fraude noticiada na exordial. Também suscita a inaplicabilidade do Código de Defesa do
Consumidor ao caso em tela, por não ser o autor cliente da operadora e não ser a empresa que
desenvolveu, distribuiu ou comercializou o aplicativo de mensagens alhures.

No mérito, argumenta, em síntese, a ausência de responsabilidade, ante a culpa


exclusiva de terceiro, qual seja, o aplicativo WhatsApp e a inexistência de ato ilícito ou dano moral
indenizável.

Sustenta, ademais, a ausência dos requisitos do dever de indenizar os danos materiais,


referente às transferências realizadas pelo promovente.

Ao final, pugna pela extinção do feito ou improcedência dos pedidos iniciais.

Realizada audiência una, foram colhidos o depoimento pessoal do demandante e


inquirida uma testemunha do requerente, a saber, o Sr. ________.

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Em sede de instrução, a testemunha mencionada informou que no dia e horário em que


se deu a clonagem (ou desabilitação do chip sem seu consentimento), seu aparelho ficou
indisponível e somente horas depois soube de tudo que se passou, conforme vídeo da sessão
publicado no evento 16 destes autos.

Suficientemente relatado. DECIDO.

Inicialmente, no que tange à preliminar de inépcia da inicial, verifico que o causídico do


demandante lançou em seus pedidos o requerimento de condenação da reclamada ao pagamento
de reparação por danos materiais e morais, ao arbítrio deste magistrado, contudo, indicou como
valor da causa o montante de R$ 28.620,00 (vinte e oito mil seiscentos e vinte reais).

Compulsando a narrativa constante da peça matriz, bem como a documentação a ela


acostada, vislumbra-se que o autor “perdeu” o valor de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) a
título de transferências realizadas em favor do estelionatário.

Logo, por consequência lógica, tem-se que o valor pretendido a título de reparação por
dano material perfaz a quantia de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), sendo o valor
remanescente atribuído à causa (R$26.120,00 – vinte e seis mil cento e vinte reais) o suposto
montante pleiteado pelo dano moral sofrido.

Nesse sentido, esclareço que o §3º do artigo 292, do Código de Processo Civil permite
a correção de ofício e por arbitramento do valor da causa. Da mesma forma, o art. 322, §2º do
mesmo compêndio estabelece que “a interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação
e observará o princípio da boa-fé”.

Destarte, rejeito a preliminar arguida, pois a inicial não é inepta.

Consoante a alegada ilegitimidade passiva da parte ré, verifico que suas


argumentações e justificativas se confundem com o mérito do debate e com este, portanto, será
analisada.

Pois bem.

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Nos termos do artigo 186, do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito”.

No mesmo sentido, o artigo 927, do Código Civil, prescreve que “aquele que por ato
ilícito causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo”.

Considerando tais dispositivos, verifica-se que para haver a responsabilização do agente,


deve restar configurado o ato ilícito perpetrado por este, bem como haver o nexo de causalidade
entre o dano proveniente do ato e a conduta.

Também entendo aplicável a legislação consumerista por equiparação, tendo em vista


que mesmo não sendo o autor usuário da operadora promovida, sofreu este o dano decorrente da
clonagem da linha telefônica de terceiro, outrora cliente da ré.

No caso em apreço, verifica-se que o cerne da questão posta à cognição judicial é a


clonagem de chip vinculado à operadora Vivo (requerida) e aplicativo WhatsApp de terceira pessoa,
que acarretou danos ao promovente.

Ora, examinando a situação trazida com a devida acuidade, especialmente os


elementos apurados e veiculados nas matérias jornalísticas jungidas à exordial, percebe-se que
tanto o Sr. __________, quanto o requerente foram vítimas de um golpe, aplicado através da
clonagem de chip para habilitação da linha em aparelho de terceiro estelionatário, visando o engodo
de contatos, mediante solicitação de transferências bancárias, sob a promessa de rápida devolução
do importe.

Por acreditarem se tratar de um pedido feito por alguém de seu convívio e confiança, as
vítimas realizam o pagamento solicitado e somente depois descobrem que a linha telefônica estava
em posse de meliantes.

In casu, restou demonstrado que o chip do Sr. __________ foi desabilitado de seu
aparelho
e habilitado no aparelho de um estelionatário, o qual instalou o aplicativo de mensagens descrito e
continuou a ação criminosa, lesando os contatos da linha telefônica clonada/hackeada, dentre eles,
o reclamante.

Nesse diapasão, em que pese a demandada não ter relação ou ingerência com o

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aplicativo WhatsApp, verifica-se que o uso da plataforma pelo fraudador só foi possível mediante
intervenção de funcionário da operadora, que viabilizou a troca do chip e o acesso aos dados do
cliente (__________), sem tomar as cautelas necessárias ou eventualmente em conluio com o
estelionatário.

Tal condição, aliás, poderia ser facilmente comprovada pela própria requerida, pois
certamente possui acesso às movimentações realizadas na linha telefônica na data e horário
descritos, especialmente se tratando da desabilitação do chip em determinado aparelho e
habilitação em outro, bem como qual de seus prepostos realizou a operação.

As alegações constantes da inicial são verossímeis e é evidente a impossibilidade


material de produção de prova pelo autor, referente à solicitação ou autorização da troca do chip
do Sr. __________.

Por outro turno, não se desincumbiu a reclamada do ônus de comprovar que tal troca
existiu e foi legítima, devendo, portanto, ser responsabilizada pela conduta perpetrada.

Oportunamente, esclareço que a responsabilidade da requerida decorre de culpa in


vigilando e in eligendo, tendo em vista que seria indispensável que exercesse fiscalização eficaz
sobre os atos de seus funcionários, de modo a evitar a fraude noticiada.

Saliento que a culpa aquiliana não se limita a alcançar quem, por ato próprio, venha a
ferir bem alheio, mas abrange também o dever de vigilância sobre objetos e coisas por parte do
proprietário, bem como sobre empregados, prepostos ou pessoas dependentes.

A culpa in vigilando caracteriza-se pela negligência do agente culposo na fiscalização


de pessoas sob sua responsabilidade, as quais terminam por ensejar dano a outrem.

A culpa in eligendo, por sua vez, é oriunda da má escolha do agente de seus empregados,
representantes, prepostos ou terceiros contratados, os quais, por inaptidão, inabilidade, negligência
ou imprudência, acabam ocasionando prejuízos a terceiros.

Assim sendo, se a requerida não adotou todas as cautelas necessárias para evitar a
fraude, assumiu o risco de produzir o resultado lesivo que é plenamente imputado à atividade que
desempenha.

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É cediço que a teoria do risco da atividade baseia a responsabilidade objetiva prevista no


CDC, que se harmoniza com o sistema de produção e consumo em massa e visa proteger a parte
mais frágil da relação jurídica.

E apenas por apreço ao debate, esclareço que não há na presente hipótese eventual
culpa concorrente do autor (vítima), como fez acreditar a defesa da ré em sede de audiência una,
porque o requerente foi induzido a acreditar que conversava com seu colega de trabalho, advogado,
uma vez que o estelionatário foi cuidadoso, inclusive, com o modo de escrever as mensagens, sem
erros de ortografia.

Portanto, merece o autor ser reparado pelo dano material sofrido, no importe em que foi
lesado, ou seja, em R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).

Ademais, encontra-se presente a obrigação de indenizar, haja vista que o promovente


sofreu uma quebra de expectativa e de confiança, pela fraude viabilizada pela operadora de
telefonia, ocasionando-lhe diversos transtornos, aborrecimentos e decepções, que fogem dos
dissabores normais do dia a dia, restando-me estipular o valor a ser pago a título de indenização.

Para a fixação da verba indenizatória, há de serem observados os critérios atinentes às


condições sociais, políticas e econômicas da vítima e do ofensor, bem como a natureza e extensão
do sofrimento impingido.

Inexistem critérios objetivos para o cálculo da compensação pecuniária no dano moral,


por não possuir uma dimensão econômica perfeitamente delineada, daí a razão de ser arbitrada
com a finalidade de anestesiar ou compensar a sensação de dor da vítima com uma sensação
agradável do recebimento do numerário.

Considera-se como eficaz aquela indenização que, preenchendo os requisitos acima


relatados, também não corresponda a um enriquecimento sem causa da vítima, mas produza no
perpetrador do dano um impacto apto a dissuadi-lo da prática de futuras condutas correlatas.

É, no entanto, pacífico que cabe esta hercúlea tarefa ao magistrado, valendo-se sempre
do bom senso e das regras da experiência, para apreender dos autos todo o sofrimento suportado.

De todo o modo, o juiz não é obrigado a deferir a integralidade do valor pleiteado pela
parte, cuja estipulação deve atender as peculiaridades de cada caso concreto.

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É certo que o valor não deve ser tão alto a ponto de enriquecer a parte, nem tão baixo
que se torne inexpressivo ante a capacidade econômica do ofensor.

Assim, tenho que o valor de R$8.000,00 (oito mil reais) afigura-se apto a compensar o
dano sofrido, bem como a desestimular futuras práticas assemelhadas por parte do ente
demandado.

Ante ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL para


condenar a requerida TELEFÔNICA BRASIL S/A ao pagamento ao autor da verba indenizatória
por danos materiais no valor de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), atualizado
monetariamente pelo INPC desde o desembolso/evento danoso e acrescido de juros de 1% (um
por cento) ao mês, a partir desta sentença.

Condeno a reclamada, ainda, ao pagamento ao autor de indenização por danos morais


no valor de R$8.000,00 (oito mil reais), devendo tal quantia ser corrigida monetariamente pelo INPC,
desde esta sentença e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento
danoso.

Na forma do artigo 55 da Lei nº 9.099/95, sem custas e honorários.

Transitada em julgado, certifique-se. Após, arquivem-se, cumpridas as formalidades


legais.

Inhumas/GO, (data da assinatura digital).

Pedro Silva Corrêa


Juiz de Direito

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