Anemia
Anemia
Anemia
Definição
Anemia é um termo que se aplica, ao mesmo tempo, a uma síndrome clínica e a um quadro laboratorial caracterizado por (1) diminuição do
hematócrito (é a percentagem de volume ocupada pelos glóbulos vermelhos ou hemácias no volume total de sangue), da (2) concentração de
hemoglobina no sangue, ou da (3) concentração de hemácias/eritrócitos por unidade de volume. Em indivíduos normais, os níveis de hemoglobina
variam com a fase do desenvolvimento individual, a estimulação hormonal, a tensão de oxigênio no ambiente, a idade e o sexo. Considera-se
portador de anemia o indivíduo cuja (2) concentração de hemoglobina (tem melhor acurácia) é inferior a:
● 13 g/dL no homem adulto;
● 12 g/dL na mulher adulta;
● 11 g/dL na mulher grávida;
● 11 g/dL em crianças entre seis meses e seis anos de idade;
● 12 g/dL em crianças entre seis e 14 anos de idade.
Esses valores aplicam-se para o nível do mar, alterando-se significativamente em grandes altitudes, mas não sofrem variações com a raça, a região
geográfica ou a idade avançada.
O hematócrito é a fração volumétrica ocupada pelos eritrócitos no sangue, obtido através do processo de centrifugação. Os valores normais do
hematócrito são: 36-44% nas mulheres e 39-50% nos homens. De uma forma geral, o hematócrito está em torno de três vezes o valor da
hemoglobina. A contagem de hemácias normal varia entre 3,8-5 milhões/mm³ nas mulheres e 4,3-5,6 milhões/mm³ nos homens.
Esses sintomas são decorrentes da ADAPTAÇÃO FISIOLÓGICA À ANEMIA, são 2 os principais mecanismos q amenizam a hipóxia tecidual
decorrente da anemia:
(1) aumento do débito cardíaco – o maior fluxo orgânico mantém a oxigenação tecidual, mesmo com menos conteúdo de O2 por ml de sangue;
(2) aumento do 2,3 DPG (glicose difosfato) na hemácia – este metabólito reduz a afinidade da hemoglobina pelo O2, facilitando, assim, a
extração do oxigênio pelos tecidos.
Exame físico
Tbm ajuda bastante:
(1) Ao encontrar glossite (inflamação da língua, q acarreta a mudança da coloração da língua, seu inchaço e perda das papilas gustativas,
fazendo com q a língua um aspecto da língua) e queilite angular [popularmente chamada de “boqueira” é uma inflamação de uma ou ambas
comissuras (ângulos) da boca, q provoca nas extremidades da boca ressecamento, rachaduras e lesões avermelhadas, pode ser tbm acompanhada de
dor coceira], o médico deve pensar em anemias carenciais;
Exames complementares
A investigação laboratorial complementar é fundamental p/ a confirmação do diagnóstico etiológico das anemias.
d) Bioquímica sérica
A dosagem das escórias nitrogenadas (ureia e creatinina) pode confirmar o diagnóstico de insuficiência renal crôni-
ca. A anemia geralmente está presente quando a creatinina está acima de 2,5 mg/dl. O hepatograma (é um conjunto de exames de rotina para checar a
função hepática) pode ajudar no diagnóstico de uma hepatopatia crônica. As anemias hemolíticas cursam com hiperbilirrubinemia indireta, aumento
do LDH e redução da haptoglobina. A destruição celular na anemia megaloblástica ocorre dentro da medula óssea (eritropoiese ineficaz), levando a
um quadro bioquímico semelhante ao das anemias hemolíticas. O ferro sérico está reduzido na anemia ferropriva e na anemia de doença crônica.
- dosagem sérica de ureia e creatinina
- dosagem sérica de TGO e TGP, fosfatase alcalina, gama GT, bilirrubinas direta/indireta/total e LDH;
- dosagem de ferro (pela dosagem sérica de ferritina), saturação de transferrina < 15%, ferritina sérica < 10 ng/ml confirmam o diagnóstico
de anemia ferropriva.
- dosagens da vitamina B12 e ácido fólico → grande valia na avaliação etiológica da anemia megaloblástica.
Como na verdade a resposta medular é representada pelo número absoluto de reticulócitos (normal = 40.000-100.000/mm³), o percentual deve ser
corrigido pelo grau de anemia.
Veja como é feita a correção:
Hemoglobina: Hematócrito:
% não corrigido x Hb/15 (para homens); % não corrigido x Ht/45 (para homens);
% não corrigido x Hb/13,5 (para mulheres); % não corrigido x Ht/40 (para mulheres)
(2) Em casos de anemia moderada ou grave, em geral os níveis de eritropoieina se elevam muito, reduzindo o tempo de maturação
reticulocitária na medula óssea. Por exemplo, quando o Ht está abaixo de 25%, esse tempo cai para a metade. Significa que metade dos reticulócitos
circulantes representa células pré-formadas, que acabaram de ser deslocadas da
medula para o sangue. Como esses reticulócitos não refletem a produção medular
eritroide (cél. precocemente liberadas antes de estarem prontas), precisamos corrigir
para este fator. É só dividir tudo por dois (metade). Assim, definimos o Índice de
Produção Reticulocitária (IPR):
IPR = % reticulócitos corrigido / tempo na circulação em dias
(normalmente usa 2)
https://edisciplinas.usp.br/course/view.php?id=40185
file:///C:/Users/Henrique%20SSD/Desktop/Dog%20B/Diagn%C3%B3stico%20diferencial%20das%20anemias.pdf
http://www.me.ufrj.br/images/pdfs/protocolos/obstetricia/anemias.pdf
ANEMIA FERROPRIVA (1ª)
(ANEMIA COM DEFICIÊNCIA DE FERRO)
Ainda hoje a forma adulta dessa anemia carencial é típica de mulheres na menacme, especialmente as hipermenorreicas, aparecendo como
resultado da perda crônica e excessiva de ferro pelo sangue menstrual. Por trás do quadro anêmico existe quase sempre uma doença de base
determinando perda sanguínea crônica de pequena monta. Devemos buscar este diagnóstico específico – embora muitas vezes a doença subjacente
seja de pouca morbidade (como um leiomioma uterino ou mesmo uma hemorroida). Eventualmente, no entanto, nos deparamos com o diagnóstico de
condições graves e inicialmente silenciosas, como o adenocarcinoma de cólon…
Fisiopatologia
A quantidade corporal total de ferro está em torno de 50 mg/kg no homem e 35 mg/kg na mulher. A maior parte (cerca de 70-75%) é encontrada
nas hemácias, ligada ao heme da hemoglobina. Uma parcela menor (25%) pode ser encontrada nas proteínas ferritina e hemossiderina, tbm fibras
musculares, que formam os “compartimentos armazenadores de ferro”, especialmente nas células da mucosa intestinal, e nos macrófagos do baço
e medula óssea. O restante (cerca de 2%) fica circulando no plasma, ligado à transferrina sérica. O ferro férrico +3 ingerido é carreado até o intestino,
onde é reduzido a ferroso +2 e absorvido no duodeno.
Todas as três (ferritina, hemossiderina e transferrina) são proteínas capazes de ligar o ferro, podendo ser encontradas tanto no plasma quanto no
meio intracelular. A ferritina, é a ligação de ferro + proteína apoferritina, q é produzida pelo fígado, tbm é a principal responsável pelo
armazenamento de ferro. A concentração sérica de ferritina é diretamente proporcional às reservas de ferro no organismo, isto é, quanto maior
o acúmulo de ferro, maior será o valor da ferritina sérica. Os níveis normais de ferritina no plasma variam de 20 a 200 ng/ml, sendo a média no
homem de 125 ng/ml e, na mulher, de 55 ng/ml. De uma forma geral, cada ng/ml de ferritina sérica corresponde a 10 mg de ferro armazenado.
A hemossiderina é um derivado da ferritina após proteólise por enzimas lisossomais. Funciona também como uma proteína “armazenadora de
ferro”, porém de liberação muito mais lenta.
A transferrina (ou siderofilina) é uma proteína sintetizada pelo fígado responsável pelo transporte do ferro no plasma, agindo como um link entre
os principais depósitos teciduais do metal e o setor eritroide da MEDULA ÓSSEA.
Em pessoas normais, e mesmo na anemia ferropriva, o percentual de ferro absorvido pela mucosa duodenojejunal não ultrapassa 50% do ferro
ingerido (na prática, varia entre 10-30%). Esse percentual sofre grande influência: (1) tipo de alimento q contém ferro; (2) outros alimentos q podem
inibir ou estimular a absorção de ferro; (3) necessidade de ferro do organismo.
Das células da mucosa intestinal, o ferro ganha a corrente sanguínea e se distribui para diversos tecidos do corpo, em especial a MEDULA
ÓSSEA e o fígado. Mas ele não circula entre esses compartimentos em sua forma livre (que é tóxica) – praticamente todo ferro plasmático circula
ligado a uma glicoproteína especial: a transferrina (ou siderofilina), que é sintetizada no fígado e tem a capacidade de capturar e transportar duas
moléculas de ferro. Apesar de apenas 2% do ferro corporal total estar ligado à transferrina, ela é um elemento crucial no chamado “ciclo do ferro”. É
através dela que o ferro chega aos precursores eritroides da medula óssea, que possuem grande quantidade de receptores de transferrina em sua
membrana.
Os eritroblasto (precursores dos eritroides), nesse processo, ocorre internalização do complexo transferrina-ferro-receptor. O ferro se dissocia do
complexo, e a transferrina é exocitada da célula para ser novamente aproveitada, retornando ao sangue. Nesse momento, o ferro incorporado pelas
células medulares tem dois destinos básicos: (1) ser armazenado pela ferritina dentro das próprias células da medula e; (2) ser captado pelas
mitocôndrias dessas células e introduzido numa protoporfirina, para formar o heme e tomar parte na composição de uma molécula de hemoglobina.
O ferro, então, passa a fazer parte da estrutura da hemoglobina, circulando junto com as hemácias por cerca de 120 dias (4 meses).
Quando as hemácias se tornam senis, são fagocitadas por macrófagos nos sinusoides do BAÇO. Esses fagócitos rompem a membrana das
hemácias, e as moléculas de hemoglobina são dissociadas em globina e heme. O heme recebe a ação da heme-oxigenase, liberando ferro e
biliverdina. O ferro reciclado dentro dos macrófagos esplênicos tem dois destinos básicos: (1) ser estocado pela ferritina e hemossiderina dos
próprios macrófagos; e (2) ser liberado no plasma, se ligando à transferrina e sendo novamente captado pelos eritroblastos da medula óssea. Aqui,
mais uma vez, a hepcidina (hormônio produzido pelo fígado) interfere no metabolismo do ferro, pois pode inibir a liberação de ferro dos macrófagos
para a transferrina plasmática, a exemplo do que ocorre nos enterócitos. Assim, o BAÇO também é, à semelhança da MUCOSA INTESTINAL e da
MEDULA ÓSSEA, um importante compartimento “armazenador” de ferro. (CICLO FECHADO)
_______________________________________________________________________________________________________________________
O organismo humano não é capaz de eliminar ativamente o ferro já estocado em seu interior! Toda vez que este metal é introduzido em nosso
sistema, não consegue ser fisiologicamente eliminado. Existem, entretanto, três doenças que aumentam patologicamente a absorção intestinal de
ferro: as talassemias, a anemia sideroblástica e a hemocromatose primária (hereditária). Nessas desordens, a reposição inadvertida de sulfato ferroso
pode levar à intoxicação pelo ferro…
Outro conceito importante sobre o metabolismo do ferro é o seguinte: como não existe nenhuma via para eliminação “ativa” desse metal, um
quadro de ferropenia é atingido quase sempre através de perda sanguínea… Em geral, os pacientes que desenvolvem carência de ferro são “aqueles
que menstruam” (mulheres) ou que apresentam perda sanguínea repetida, crônica, suficiente para esgotar completamente os estoques de ferro dos
macrófagos (geralmente após três meses de perda de ferro).
O sangramento CRÔNICO é a principal causa de anemia ferropriva!!!
É por este motivo que as maiores causas de anemia ferropriva estão associadas a sangramentos crônicos ou aumento da necessidade de ferro (em
inflamações, q dificultam a saída do ferro dos seu depósitos) e ainda a pobre ingestão alimentar.
Etiologia
Adultos
- mulheres que menstruam ou qualquer indivíduo que apresenta perda sanguínea crônica → é necessário que haja um balanço negativo do ferro
corporal, até que seja consumido todo o estoque armazenado desse metal.
- defeitos de absorção de ferro → após cirurgias como a gastrectomia subtotal com anastomose a Bilroth II, quando o trânsito digestivo
“bypassa” o duodeno, importante sítio de absorção do ferro + má absorção de ferro pelo efeito da hipo ou acloridria, pois perde-se a acidez gástrica
necessária para a conversão do íon férrico no íon ferroso. As enteropatias que acometem conjuntamente o jejuno proximal e o duodeno, em especial a
doença celíaca.
- Durante a gestação, a mulher tem uma perda média elevada de ferro, chegando a 4 mg/dia. A perda excessiva provém dos seguintes fatores:
aumento da massa de hemácias típico da gestação, perda para o feto, perda sanguínea no parto. => Por esse fato, a reposição de sulfato ferroso tem
sido rotina durante a gestação (profilaxia primária).
- A hipermenorreia sem dúvida é uma das causas mais comuns de anemia ferropênica; deve ser avaliada pelo ginecologista, para busca de um
leiomioma ou pólipo uterino, ou então um distúrbio hormonal-funcional. A doação de sangue frequente é uma outra causa de anemia ferropriva.
Cada doação corresponde a uma perda de 250 mg de ferro. Entre vermes causadores de anemia ferropriva, destacamos os ancilostomídeos: Necatur
americanus e Ancylostoma duodenale.Esses helmintos habitam o duodeno, aderidos por meio de ventosas à mucosa duodenal, alimentando-se de
sangue. → PERDA SANGUÍNEA
- Homens ou pacientes idosos na maioria das vezes apresentam perda sanguínea crônica pelo trato gastrointestinal. A causa mais comum é a
hemorroida, seguida pela doença péptica ulcerosa e finalmente pelo câncer de cólon.
Crianças
- A anemia ferropriva é, de longe, a causa mais comum de anemia em crianças.
- A criança que nasceu a termo, com peso normal, apresenta reservas corporais de ferro (estimadas em 70 mg/kg) suficientes para garantir as
necessidades do metal até os seis meses de idade. Por isso, a anemia é menos comum nessa faixa etária. O aleitamento materno exclusivo é
recomendado até essa idade, pois, apesar de conter pequena quantidade de ferro (0,26-0,73 mg/ml), a sua absorção é excelente (50%). O ferro
presente no leite de vaca (in natura ou industrializado) é muito pouco absorvido (apenas 10%).
- Em prematuros e crianças com baixo peso ao nascer (PIG), tudo muda: estas crianças nascem com menos estoque de ferro e têm uma
velocidade de crescimento maior da massa hemoglobínica no primeiro ano de vida, necessitando, portanto, de maior aporte diário de ferro (2
mg/kg/dia, comparado a 1 mg/kg/dia na criança à termo de peso normal). Daí a maior chance de desenvolver anemia ferropriva, caso não recebam
suplementos de ferro.
- Entre 6-24 meses (até dois anos completos) é o período mais propenso à anemia ferropriva. Três são os motivos: (1) o momento pico de
crescimento da criança, necessitando de mais ferro; (2) esgotamento dos estoques do nascimento; (3) desmame sem suplemento de ferro e
sem fórmulas ou alimentos enriquecidos. => AUMENTO DA NECESSIDADE POR CAUSA DO CRESCIMENTO
- Déficit alimentar
- Perda sanguínea crônica → O uso do leite de vaca está associado à perda de sangue oculto nas fezes em 30% dos casos (enteroproctocolite
por alergia ao leite).
- Infestação por ancilostomídeos, tricocefalíase (comuns entre 2-5 anos de idade) e outras afecções gastrointestinais ou urinárias são fatores a ser
considerados.
Manifestações clínicas
Os sinais e sintomas do estado ferropênico podem ser divididos em: (1) relacionados à anemia; e (2) relacionados à ferropenia em si.
1- Sinais e sintomas da anemia
São eles: astenia (fadiga, indisposição física), insônia, palpitações, cefaleia etc. Em pacientes previamente coronariopatas, cardiopatas, pneumopatas
ou cerebrovasculopatas, a anemia pode desencadear, respectivamente, angina pectoris, insuficiência cardíaca, dispneia e rebaixamento da consciência!
O exame clínico revela palidez cutaneomucosa e sopro sistólico de “hiperfluxo”. Hemorragias retinianas podem ser detectadas em presença de anemia
grave.
2- Sinais e sintomas da ferropenia
São indicativos de uma anemia carencial (ferropriva e megaloblástica)
- glossite (ardência e língua despapilada) - por vezes acompanhada de queilite angular (lesão nos ângulos da boca)
Já achados do estado ferropênico avançado
- Unhas quebradiças - coiloníquia (unhas em colher)
As escleras podem assumir uma coloração azulada. Em alguns casos (15%), pode ser observada esplenomegalia de pequena monta (mecanismo
desconhecido).
Perversão do apetite (representada pela pica (desejar e mastigar substâncias que não têm valor nutricional, como gelo, argila,
terra ou papel) ou parorexia, isto é, desejo de comer alimentos de baixo valor nutricional, como amido, gelo (pagofagia) e terra, constitui-se em
um sintoma clássico e bastante específico, que reverte prontamente ao iniciarmos a reposição de sulfato ferroso.
Crianças...
Anorexia e irritabilidade são os sintomas mais comuns. Pode haver prejuízo ao desenvolvimento psicomotor e alterações
comportamentais. Algumas deficiências podem se tornar irreversíveis.
2. Ferro sérico*
Deve sempre ser interpretado junto com os valores de ferritina e TIBC. Encontra-se baixo na anemia ferropriva (geralmente < 30
mg/dl),
mas eleva-se imediatamente após a reposição oral e parenteral, permanecendo, neste último caso, elevado por semanas. Nas talassemias e na anemia
sideroblástica, o ferro sérico geralmen te está normal ou elevado!!
3. Ferritina sérica*
A dosagem da ferritina no soro é o teste indicado para documentar a deficiência de ferro. é o primeiro parâmetro a se alterar na
anemia ferropriva. Níveis abaixo de 15 ng/ml são típicos da anemia ferropriva, enquanto valores acima de 60 ng/ml praticamente afastam este
diagnóstico. Na anemia de doença crônica, a ferritina sérica costuma estar entre 50-500 ng/ml. = 20-60 ng/ml (raramente, entre 60-100 ng/ml). Nas
talassemias e na anemia sideroblástica, ela fica acima de 200 ng/ml. Quando queremos diagnosticar a etiologia correta de uma anemia em indivíduos
utilizando ferro oral, devemos suspendê-lo e aguardar cerca de uma semana para obtermos um valor de ferritina mais confiável.
5. Hematoscopia
Nas fases iniciais da deficiência de ferro, observa-se apenas anisocitose. Se a anemia piora,
podemos encontrar microcitose e hipocromia. A poiquilocitose (neste caso marcada por
hemácias em forma de charuto e micrócitos bizarros – Figura 4) é um achado que acompanha a
anemia grave. A anemia ferropriva é aquela que mais se relaciona ao achado de
anisopoiquilocitose!
O mielograma é o exame de maior acurácia para o diagnóstico da anemia ferropriva, porém só deve ser realizado em casos duvidosos.
Os estoques de ferro das células reticuloendoteliais podem ser avaliados através de uma amostra de medula óssea, obtida por meio de
aspirado ou biópsia e corado com Azul da Prússia. Por convenção, esses estoques são graduados numa escala de 1 a 4+. A presença de qualquer
ferro corável afasta a possibilidade de anemia ferropriva declarada. Concluímos então que a análise do ferro medular pode permitir a
diferenciação entre anemia ferropriva e anemia de doença crônica (aumento do depósito de ferro) quando os níveis de ferritina forem inconclusivos!
3- Anemia Ferropriva
Os achados laboratoriais observados nesta fase incluem uma ferritina persistentemente baixa (< 15 ng/ml), uma queda ainda mais
acentuada do ferro sérico (< 30 μg/dl) e da saturação da transferrina (< 15%) além de francas alterações na morfologia das hemácias. Essas
modificações incluem primeiramente microcitose, com níveis de hemoglobina em torno de 8-10 g/dl, e, finalmente, hipocromia e poiquilocitose,
quando a anemia se agrava.
O esfregaço do sangue periférico mostra intensa anisocitose (quantificada pelo RDW, que se encontra caracteristicamente alto, em
torno de 16%), com predomínio de células microcíticas e hipocrômicas, com alguns pecilócitos (poiquilócitos) em forma de charuto. Quando os
níveis de hemoglobina caem abaixo de 8 g/dl. O problema agora não é mais hipoproliferação, e sim um distúrbio de maturação (eritropoese ineficaz)
pela grave deficiência na síntese do heme... Ocorre, então, acentuação da anisocitose, aumento do percentual de pecilócitos no sangue periférico e
agravamento da microcitose e da hipocromia.
Em suma: quando leve/moderada, a anemia ferropriva é classificada apenas como HIPOPROLIFERATIVA (índice de produção reticulocitária baixo;
relação mieloide/eritroide normal ou alta). No entanto, quando grave, a anemia ferropriva assume o padrão de ERITROPOIESE INEFICAZ, isto é, o
índice de produção reticulocitária continua baixo, mas a relação M/E se torna reduzida, por hiperplasia do setor eritroide. Segundo a chamada
“classificação fisiológica da anemia” (que divide as anemias em hipo ou hiperproliferativas), a eritropoiese ineficaz é um subtipo especial de anemia
hipoproliferativa! O que acontece é que o excesso de hemácias disformes recém-formadas acaba sendo destruído antes mesmo de deixar a medula óssea...
Tratamento
A dose recomendada para a correção da anemia ferropriva é de 60 mg de ferro elementar (o que equivale a 300 mg de sulfato ferroso) três a
quatro vezes ao dia. Observe a relação: quantidade de sulfato ferroso (mg) = 5x quantidade de ferro elementar (mg), ou ainda, o ferro elementar
constitui 20% da massa do sulfato ferroso. Em crianças, a dose deve ser 5 mg/kg/dia (3-6 mg/kg/dia) de ferro elementar, dividido em três
tomadas.
Absorção quando o estômago está vazio, 1-2h antes das refeições, de preferência associado a vit. C ou a suco de laranja. Dessa forma, cerca de
15% do ferro elementar é absorvido pelo duodenojejuno. Os efeitos colaterais gastrointestinais do ferro oral são bem conhecidos e incluem náuseas,
vômitos, desconforto epigástrico e diarreia. Eles incidem em cerca de 15-20% dos pacientes e geralmente são contornados quando as cápsulas passam
a ser ministradas junto às refeições. Ou seja, o sulfato ferroso só deve ser dado junto com a comida em caso de intolerância gástrica...
→ Tratamento eficaz e tempo de TTA?
A hemoglobina e o hematócrito começam a subir em duas semanas, geralmente voltando ao normal em dois meses após o início da
terapia. A reposição de ferro deve durar 3-6 meses após a normalização do hematócrito (total de 6-12 meses), no intuito de reabastecer os estoques
corporais desse elemento. O controle pode ser feito com a ferritina sérica, que deve chegar a valores acima de 50 ng/ml... Em crianças,
recomenda-se uma duração de 3-4 meses para a terapia de reposição, ou dois meses após a normalização da hemoglobina.
→Indicação de ferro parenteral?
As indicações de ferro parenteral incluem: (1) síndromes de má absorção duodenojejunais, como a doença celíaca; (2) intolerância às
preparações orais; (3) anemia ferropriva refratária à terapia oral, apesar da adesão terapêutica; (4) necessidade de reposição imediata dos estoques de
ferro, quando utilizamos, por exemplo, a eritropoietina recombinante humana em pacientes com insuficiência renal crônica em tratamento dialítico.
● ferro-dextran → A preparação mais antiga de ferro parenteral. Ela contém 50 mg de ferro elementar por ml de solução. Via
preferencialmente endovenosa, mas o uso intramuscular [pode manchar a pele no local da aplicação, o que pode persistir por anos (por isso, é
indicada a técnica em “Z” de pregueamento da pele)] tbm é possível. O principal efeito colateral do ferro-dextran é a anafilaxia (reação
alérgica grave). Tal problema é menos provável com os novos preparados férricos...
● gluconato férrico de sódio e o ferro-sucrose → são os mais atuais para uso parenteral (endovenoso). Tais preparados são comprovadamente
mais seguros que o ferro-dextran.
A dose total requerida é diretamente proporcional ao déficit de ferro na hemoglobina, somado a quantidade necessária para repor os
estoques de ferro (1.000 mg no homem e 600 mg na mulher).
Déficit de ferro da hemoglobina:
(15 - Hb) x peso (kg) x 2,3
Déficit de ferro da hemoglobina + déficit de estoque (dose TOTAL do ferro parenteral):
(15 - Hb) x peso (kg) x 2,3 + 1.000 (no homem)
(15 - Hb) x peso (kg) x 2,3 + 600 (na mulher)
________________________________________________________________________________________________________________________
TALASSEMIA
As talassemias são desordens hereditárias que têm como característica básica uma deficiência na síntese das cadeias de globina. Elas possuem um
espectro clínico amplo de apresentação, variando desde indivíduos inteiramente assintomáticos até crianças com anemia grave, deformidades
ósseas e destruição acelerada de células vermelhas… anemia profunda, esplenomegalia e deformidades ósseas.
As talassemias são classificadas de acordo com o tipo de cadeia globínica deficiente. Os tipos mais conhecidos são as (1)
betatalassemias (deficiência na produção de cadeias beta) e as (2) alfatalassemias (deficiência na produção de cadeias alfa).
(1) BETALASSEMIA
Introdução
A betatalassemia é a forma mais comum de talassemia no Brasil, sendo a terceira hemoglobinopatia registrada (menos prevalente que a anemia
falciforme e a hemoglobinopatia SC). A prevalência do gene betatalassêmico no Rio de Janeiro encontra-se em torno de 0,15%, sendo esse
percentual bem mais elevado nas áreas de colonização italiana de nosso país (São Paulo e Região Sul). Tbm é relatada em indivíduos negros. No
mundo, grande parte dos casos se concentra nos países do Mediterrâneo, como a Grécia e a ilha de Chipre, onde prevalência do gene betatalassêmico é
de 5-15%.
Mecanismo genéticos
O gene da cadeia beta, ou β, de globina está presente no cromossoma 11, juntamente com os genes das outras cadeias globínicas não alfa, isto é, a
cadeia delta ou δ (forma adulta) e a cadeia gama ou γ (forma fetal).
As diversas mutações só podem determinar dois tipos de gene betatalassêmico:
(1) um gene totalmente incapaz de produzir cadeia beta (gene β0); e
(2) um gene que produz uma pequena quantidade de cadeia beta (gene β+), mas inferior ao normal. Ainda dentro do gene β+, existem subtipos que
produzem mais ou menos cadeia beta (ex.: o gene β+ mediterrâneo produz menos cadeia beta do que o gene β+ africano, do negro). O gene normal da
cadeia beta é representado como gene β.
Assim, os genótipos possíveis de encontrar são:
β/β (pessoa normal), β0/β0 e β+/β+ (homozigotos), β0/β+ (duplo heterozigoto), β0/β e β+/β (heterozigotos).
“CLASSIFICAÇÃO”
1. Em um extremo, os homozigotos para o gene β0 (genótipo β0/β0) não produzem absolutamente nenhuma cadeia beta, e os duplos heterozigotos
(genótipo β0/β+) produzem pouquíssima cadeia beta. → betatalassemia major (anemia de Cooley), => um quadro de extrema gravidade e
letalidade, dependente de hipertransfusão para a sobrevivência (este é considerado o fenótipo mais grave da doença).
2. No extremo oposto, os heterozigotos para o gene β0 ou β+ (genótipo β0/β ou β+/β) → betatalassemia minor ou “traço talassêmico” => Um
gene (ex.: o gene paterno) produz cadeia beta normalmente, enquanto o outro (ex.: o gene materno) não produz ou produz menos esta cadeia...
Estes indivíduos são totalmente assintomáticos, embora tenham típicas alterações nos índices hematimétricos do hemograma.
3. Os homozigotos para o gene β+ (genótipo β+/β+) → betatalassemia intermedia, um quadro moderadamente grave de talassemia, mas não
dependente da hipertransfusão.
Fisiopatologia
O que acontece quando a cadeia beta está em quantidade reduzida ou ausente nas células eritroides? Duas consequências sobrevêm:
(1) diminui a síntese de hemoglobina, promovendo microcitose, hipocromia e anemia;
(2) sobram cadeias alfa no citoplasma do eritroblasto.
As cadeias alfa livres são completamente insolúveis e precipitam no citoplasma da célula. O seu efeito tóxico culmina na destruição dos
eritroblastos na própria medula óssea, um processo chamado eritropoiese ineficaz. Na betatalassemia major, somente 15-30% dos eritroblastos
escapam da destruição medular!! Os poucos que sobrevivem originam hemácias “defeituosas”: além de microcíticas e hipocrômicas, estas hemácias
contêm corpúsculos de inclusão (remanescentes de cadeia alfa), que as tornam suscetíveis aos macrófagos do baço, explicando a hemólise
extravascular crônica.
Em resumo: a anemia é consequência ao mesmo tempo da redução da síntese de hemoglobina (HIPOproliferativas), da eritropoiese ineficaz [acaba
estimulando (por um mecanismo desconhecido) a absorção intestinal de ferro, levando à hemossiderose (ou hemocromatose, acúmulo de Fe nos
tecidos), mesmo na ausência da reposição inadvertida de sulfato ferroso] e da hemólise crônica extravascular.
- Radiografia de Crânio => aspectos clássicos da expansão medular: adelgaçamento da cortical, alargamento da cavidade medular e a imagem do
“hair-on-end”, ou “cabelos na extremidade”.
- Radiografia de mão => notamos também adelgaçamento cortical, com expansão dos espaços entre as trabéculas ósseas.
Com a instituição da TERAPIA COM HIPERTRANSFUSÃO REGULAR, objetivando-se uma Hg entre 11-13 g/dl, as complicações acima
citadas podem ser evitadas, permitindo um crescimento adequado e uma qualidade de vida mais razoável, pelo menos até os 15-17 anos de idade. Há
uma importante redução da hepatoesplenomegalia.
As transfusões repetidas durante longos anos levam à sobrecarga de ferro no organismo, provocando hemocromatose transfusional. Lembre-se
de que o paciente já havia acumulado ferro por aumento da absorção intestinal (hemocromatose eritropoiética). O QUADRO CLÍNICO é marcado
por agravamento da hepatoesplenomegalia, coloração “bronzeada” da pele, hipogonadismo, diabetes mellitus e insuficiência cardíaca congestiva
refratária. O paciente acaba por falecer por arritmias cardíacas ou falência cardíaca ainda numa idade jovem. → com início precoce da terapia
sobrevida média pode chegar aos 31 anos.
Laboratorial
- anemia grave, microcítica e hipocrômica, com VCM entre 48-72 fL e CHCM entre 23-32 g/dl.
- hiperbilirrubinemia indireta, aumento do LDH, redução da haptoglobina, reticulocitose. (hemólise extravascular)
- índice de reticulócitos é de apenas 5-15%,
- esfregaço do sangue periférico é bastante rico → Há uma intensa anisopoiquilocitose, com predomínio de hemácias microcíticas e
hipocrômicas e de hemácias em alvo (leptócitos). A eritroblastose é marcante, decorrente da hiperplasia eritroide exagerada. Os eritroblastos na
periferia (“hemácias nucleadas”), correspondem a mais de 10% da contagem leucocitária, ou mais de 200/mm³.
2- Betatalassemia Intermedia
É um quadro mais brando que o descrito para a anemia de Cooley, pois estes pacientes possuem uma produção intermediária de cadeia beta pelos
seus eritroblastos. Frequentemente, o diagnóstico é feito na adolescência ou fase adulta. São indivíduos cronicamente anêmicos, com Hg na faixa
entre 6-9g/dl (Ht entre 18-27%), deformidades ósseas características, icterícia intermitente, episódios de litíase biliar recorrente e esplenomegalia
moderada. O crescimento, desenvolvimento e fertilidade estão preservados.
A absorção de ferro intestinal também está aumentada (3-10 vezes em relação ao normal). Os sinais e sintomas da hemossiderose só aparecem
após os 30 anos, a não ser quando é prescrito sulfato ferroso inadvertidamente ao paciente, quando o médico julga tratar-se de uma anemia
ferropriva...
Laboratorial
- achados dos índices hematimétricos e na hematoscopia do sangue periférico são idênticos aos da betatalassemia major.
- O que as diferencia é o grau de anemia.
3- Betatalassemia Minor
Entidade benigna. O clínico não deve confundir a talassemia minor (e nem a intermedia) com anemia ferropriva!!
Esses pacientes são heterozigotos para o gene β+ (β+/β) ou para o gene β0 (β0/β). A talassemia minor também é referida como “traço
talassêmico”.
O paciente é assintomático, sendo o seu problema descoberto acidentalmente no seu hemograma. Alguns possuem uma anemia discreta (Hg >
10 g/dl), outros não apresentam anemia. Os grandes marcadores desta entidade são a microcitose (VCM entre 60-75 fL) e a hipocromia (HCM
entre 18-21pg). O sangue periférico contém hemácias em alvo e pontilhado basofílico.
Diagnóstico
- ELETROFORESE DE HEMOGLOBINA (padrão-ouro p/ o diagnóstico de betalassemia)
Esse exame quantifica proporcionalmente os tipos de hemoglobina presentes no homogeneizado de hemácias do paciente. Como vimos em ca-
pítulos passados, o normal de um adulto é 97% de HbA1, 2% de HbA2 e 1% de HbF. Betalassemia como há menos cadeias beta (ou simplesmente
não há), as hemoglobinas formadas por outras cadeias não alfa sobressaem, como a HbA2 e a HbF. Valores de HbA2 entre 3,5 a 8% são
característicos.
O percentual de HbF depende do grau de deficiência da cadeia beta: na forma major, esse percentual pode ultrapassar 90%, enquanto que
na forma minor, pode ser normal ou levemente elevado.
Tratamento
2- Betatalassemia Intermedia
- A reposição de ácido fólico 1 mg/dia está indicada.
- As hemotransfusões estão indicadas para os sintomáticos e para aqueles com sinais de insuficiência cardíaca.
- A terapia quelante de ferro está indicada quando a ferritina sérica é superior a 1.000 ng/ml. → pode-se usar Deferiprona (Ferriprox) ou a própria
Deferoxamina, por VO.
3- Betatalassemia Minor
NÃO exige tratamento, somente orientação e aconselhamento genético. Se for possível, devem-se estudar as mutações do casal, para saber se o
tipo de gene é β0 ou β+ e, portanto, as chances do filho ter talassemia major ou intermedia.
(2) ALFATALASSEMIA
Introdução
O gene da alfatalassemia tem uma elevada concentração em localidades no sudeste da Ásia e na China, bem como em populações originárias da
costa oeste da África (negros). A doença também é encontrada esporadicamente na Índia, Oriente Médio, Itália, Grécia e nordeste da Europa.
Mecanismos genéticos
Existem quatro genes da cadeia alfa de globina, dispostos no cromossomo 16, dois alelos em cada braço cromossomial. Enquanto que as betatalas-
semias ocorrem por mutações pontuais qualitativas nos genes beta, as alfatalassemias são decorrentes de deleção de um ou mais genes alfa.
Os genótipo normal dos quatro genes alfa é representado da seguinte forma: αα/αα. Este código é aproveitado para representar os genótipos
alfatalassêmicos:
- αα/α_ (1 deleção) Carreador assintomático;
- αα/_ _ (2 deleções) Alfatalassemia minor (heterozigoto α0); → casal … tem 25% de ter um filho com hidropsia fetal,
- α_/α_ (2 deleções) Alfatalassemia minor (homozigoto α+); --. casal … nunca terá um filho com esta doença
- α_/_ _ (3 deleções) Doença da HbH;
- _ _/_ _ (4 deleções) Hidropsia fetal.
O alelo α0 (representado por _ _) é a deleção de ambos os genes alfa de um braço cromossomial. O alelo α+ (representado por α_) é a deleção de
apenas um gene alfa de um braço cromossomial. Como veremos adiante, os sintomas da doença só se manifestam com 3 deleções (doença da HbH)
ou 4 deleções (hidropsia fetal).
Nos EUA, os negros americanos têm uma prevalência de 15% do gene da alfatalassemia, porém a doença manifesta é raríssima. Isto vem do
seguinte fato: o genótipo daqueles que têm alfatalassemia minor é do tipo (α_/α_), ou seja, homozigotos α+.
Fisiopatologia e clínica
1- Hidropsia Fetal
A ausência completa de cadeias alfa (genótipo _ _/_ _) é incompatível com a vida extrauterina. O resultado é um natimorto ou um
nascimento de um bebê com hidropsia fetal, rapidamente fatal. A única cadeia que substitui a cadeia alfa é a ξ (da hemoglobina embrionária), ativa
somente até a vida fetal. Nesse momento, torna-se essencial a síntese de cadeias alfa, para produzir HbF (α2γ2). Sem nenhuma cadeia alfa, as cadeias
gama se juntam, formando tetrâmeros γ4, denominados Hb Barts. Essa hemoglobina é muito ávida por O2, não sendo possível a entrega do precioso
gás para os tecidos do feto. A anemia e hipóxia grave provocam falência cardíaca e edema fetal (hidropsia).
2- Doença da Hemoglobina H
A ausência de três genes (genótipo α_/_ _) permite o nascimento da criança sem maiores problemas, mas já com anemia. O quadro clí-
nico se desenvolve tal como uma talassemia intermedia, com hemólise extravascular e moderada eritropoiese ineficaz. Os pacientes chegam à
fase adulta sem necessidade de hemotransfusões. Apresentam esplenomegalia e uma anemia moderada microcítica hipocrômica.
Forma-se um tetrâmero de cadeias beta (β4), denominado HbH. Esta última pode se precipitar nas hemácias, aparecendo no esfregaço do
sangue periférico, corado pelo azul brilhante de cresil, como um pontilhado eritrocítico.
3- Alfatalassemia minor
São pacientes assintomáticos, mas com microcitose e hipocromia no hemograma. O valor médio do VCM é de 72 fL e do CHM, de
31 g/dl. O diagnóstico é suspeitado com exames de check-up. A principal preocupação é de saber o genótipo e a possibilidade de ter filhos com
hidropsia fetal ou doença da HbH.
Diagnóstico
- ELETROFORESE DE HEMOGLOBINA → pode confirmar o diagnóstico em casos de hidropsia fetal (forma mais grave) (diagnóstico precoce na
10a sem. de gest., através de biópsia do vilo coriônico com realização de teste genético no material coletado), ao mostrar a Hb Barts e ausência
completa de HbA. A doença da HbH também é diagnosticada por esse exame: o percentual de HbH detectado varia entre 5-40%. A HbA2 e a HbF
estão proporcionalmente normais ou reduzidas (ao contrário das betatalassemias).
A alfatalassemia minor é mais difícil de diagnosticar. Indivíduos com microcitose entre 70-80 fL, sem anemia, com laboratório do ferro
normal e eletroforese de hemoglobina normal provavelmente possuem alfatalassemia minor. O diagnóstico deve ser confirmado por estudo genético.
Este último tem importância no aconselhamento genético de casais portadores.
Tratamento
O tratamento só está indicado na doença da HbH, sendo semelhante àquele preconizado para a betatalassemia intermedia, observando-se
as indicações de hemotransfusão, quelação de ferro e esplenectomia. A reposição de ácido fólico 1 mg VO/dia está sempre indicada.
ANEMIA SIDEROBLÁSTICA
Introdução
A Anemia Sideroblástica (AS) representa
um grupo de desordens heterogêneas que
possuem como característica comum, além
de anemia, a presença de depósitos de
ferro nas mitocôndrias dos eritroblastos.
A mitocôndria “carregada” de ferro assume
localização perinuclear nessas células
vermelhas jovens, que recebem por isso o
nome de sideroblastos em anel.
Patogênese
Tem como base um distúrbio da síntese do heme, desde que não seja a carência de ferro. Lembre-se de que o heme é formado pela
incorporação do ferro (no seu estado de íon ferroso, ou Fe+2) à protoporfirina IX. Todo esse processo, desde a síntese da protoporfirina até a
incorporação do ferro, ocorre no interior da mitocôndria dos eritroblastos. Deficiências enzimáticas ou defeitos mitocondriais podem prejudicar a
síntese do heme. Duas consequências surgem nesse momento: (1) prejuízo à síntese de hemoglobina, levando à hipocromia e anemia; (2) acúmulo
de ferro na mitocôndria.
Fisiopatologia
O heme inibe a captação de ferro pelo eritroblasto (um tipo de feedback negativo) – como pouco heme é formado, o ferro continua se
acumulando cada vez mais na célula, culminando com a formação dos sideroblastos em anel.
O ferro mitocondrial acumulado é potencialmente lesivo ao eritroblasto, eventualmente levando à sua destruição na própria medula – um
mecanismo chamado eritropoiese ineficaz. Isso explica o encontro de uma leve hiperplasia eritroide na medula óssea, sem elevação da contagem de
reticulócitos periférica. A anemia megaloblástica e as talassemias são outros exemplos de anemia relacionada à eritropoiese ineficaz.
A redução da síntese do heme, em conjunto com a eritropoiese ineficaz, estimula (por mecanismos desconhecidos) a absorção intestinal
de ferro. Após vários anos, o paciente evolui com um estado de sobrecarga de ferro – chamado de hemossiderose ou hemocromatose. Para
diferenciar da hemocromatose primária e da secundária a múltiplas transfusões, este tipo de sobrecarga corporal de ferro é denominada
Hemocromatose Eritropoiética. A mesma q ocorre na talassemia. Por isso, grande parte da morbidade das anemias sideroblásticas (especialmente
as hereditárias) vem da sobrecarga de ferro nos órgãos e tecidos, manifestando-se como hepatoesplenomegalia, lesão hepática e cardíaca.
Etiologia
Não há um distúrbio único para todas as anemias sideroblásticas… Alguns exemplos:
a) No tipo hereditário (ligado ao cromossomo X)
Há uma mutação na primeira enzima da síntese protoporfirínica – a ALA sintase. Essa enzima tem como principal cofator a vitamina B6
(sob a forma de piridoxal 5-fosfato). O mutante da ALA sintase só “funciona” quando altas doses (suprafisiológicas) de vitamina B6 são oferecidas
ao paciente.
b) No tipo adquirido idiopático
Não se conhece bem onde está o distúrbio na síntese do heme. Contudo, há fortes indícios de que mutações no DNA mitocondrial
prejudicam a ação de uma enzima que converte o íon férrico (Fe+3) em íon ferroso (Fe+2). O íon férrico (Fe+3) não consegue ser incorporado à pro-
toporfirina IX.
c) No tipo adquirido reversível
Determinadas drogas ou distúrbios de oligoelementos podem atingir diretamente ou indiretamente a síntese do heme. O etanol é o
principal exemplo… Essa substância pode: (1) interferir na interação entre a piridoxina (vitamina B6) e a ALA sintase; (2) inibir diversas enzimas da
síntese protoporfirínica; e (3) promover disfunção mitocondrial. Outras drogas implicadas são: isoniazida, pirazinamida e cloranfenicol. A
deficiência de cobre (causas nutrição parenteral total, gastrectomia e reposição desnecessária de sais de zinco) provoca anemia sideroblástica,
provavelmente pelo fato da enzima mitocondrial que converte Fe+3 em Fe+2 (citocromo oxidase) conter cobre em sua composição. => O excesso de
zinco induz à formação de uma proteína intestinal (metalotioneína) capaz de quelar todo o cobre da dieta.
Quadro clínico e Diagnóstico
Algumas características comuns a todos os tipos...
- sideroblastos em anel da medula óssea, caracterizam-se por microcitose e hipocromia, o que reflete a produção inadequada de hemoglobina (existe
pouco heme).
- frequentemente observamos na prática são duas populações de eritrócitos: uma hipocrômica e microcítica e outra normocítica e, eventualmente,
macrocítica. A isso denominamos dismorfismo eritrocitário. Esse dimorfismo (ou bimorfismo) pode ser identificado por um RDW aumentado,
pela curva de anisocitose “bífida”, ou na própria hematoscopia do sangue periférico.
A anemia sideroblástica se caracteriza por apresentar, no ESFREGAÇO DE SANGUE PERIFÉRICO, tanto hemácias microcíticas
quanto macrocíticas – ocorre que, na forma herdada de doença, predominam os micrócitos (típica redução do VGM), enquanto que, na forma
adquirida, geralmente predominam os macrócitos (aumento do VGM). Os macrócitos são decorrentes da eritopoiese acelerada dos eritroblastos não
afetados pela doença, por estímulo da eritropoietina.
Como há um estímulo à absorção intestinal de ferro, ele se acumula no organismo (hemocromatose eritropoiética). Como consequência,
teremos ferro sérico alto (> 150 μg/dl), ferritina sérica normal alta ou alta (> 100-200 ng/ml), TIBC normal e saturação de transferrina alta
(30-80%).
→ Suspeitar quando?
Quando houver a coexistência paradoxal de hipocromia com ferro sérico alto, saturação da transferrina elevada e ferritina elevada. As
talassemias (major e intermedia) também podem determinar esse padrão. Uma eletroforese de hemoglobina pode excluir esta última entidade.
→ Corpúsculo de Pappenheimer?
ESFREGAÇO de sangue periférico identifica precipitados de ferro conhecidos como corpúsculos de Pappenheimer (figura 1B). Note:
os sideroblastos em anel aparecem no ASPIRADO DE MEDULA; enquanto os corpúsculos de Pappenheimer, no sangue periférico.
→ Como confirmar o DIAGNÓSTICO?
Só há uma forma:ASPIRADO DE MEDULA ÓSSEA (mielograma), pelo encontro de mais de 15% de eritroblastos do tipo
Sideroblastos em Anel. Este achado é sempre confirmatório...
1- Anemia Sideroblástica Hereditária
Apesar de ser menos comum do que as formas adquiridas, pela sua potencial reversibilidade com o tratamento, na forma hereditária
(altas doses de piridoxina) e adquirida reversível, e pela sua semelhança laboratorial com a anemia ferropriva (microcitose e hipocromia). Perceba
que uma “confusão” diagnóstica poderá ser fatal: a reposição de sulfato ferroso para um paciente com anemia sideroblástica, além de não
corrigir a anemia, pode acelerar o processo de hemocromatose (ou hemossiderose), culminando em doença grave, com risco de óbito por
arritmia ou disfunção miocárdica.
Esta anemia é mais comum em homens (herança ligada ao X), tal como a hemofilia e o daltonismo. O grau de anemia é variável,
podendo ser leve, moderada ou grave (Hg < 7 g/dl). Os casos mais graves podem evoluir com as lesões orgânicas da hemossiderose (cardiomiopatia,
cirrose hepática, hiperpigmentação, diabetes mellitus secundário).
2- Anemia Sideroblástica Adquirida Idiopática
Há grandes indícios de que a anemia sideroblástica adquirida idiopática seja uma desordem mielodisplásica. Após uma mutação de um
clone progenitor hematopoiético (que pode ser a própria célula-tronco) ou eritroide, este ganha uma “vantagem proliferativa” sobre as outras células
da hematopoiese normal. Portanto, um grupo de células derivadas do mesmo clone começa a se sobressair na medula óssea. O que caracteriza uma
síndrome mielodisplásica é o fato de este clone ser “defeituoso” – neste caso com um distúrbio na síntese do heme.
adultos de meia-idade ou idosos (raramente jovens e crianças), sem preferência de sexo. A anemia é leve a moderada, lentamente
progressiva até um grau de estabilidade. Também existe hemocromatose eritropoiética, justificando o achado de hepatoesplenomegalia em 1/3 a
1/2 dos casos.
O hemograma mostra anemia normocítica ou levemente macrocítica. Pode ser normocrômica ou hipocrômica. Os micrócitos são
derivados dos sideroblastos em anel, enquanto que os macrócitos (sobrepõem +) são provenientes de progenitores normais, mas que possuem um
tempo de maturação reduzido num ambiente de hiperplasia eritroide medular (níveis aumentados de eritropoietina).
Podemos dividir os pacientes com AS adquirida idiopática em dois subgrupos:
(1) “Anemia sideroblática pura” => em que às demais alterações displásicas medulares são inexistentes;
(2) “Forma verdadeiramente mielodisplásica” => também chamada de “anemia refratária com sideroblastos em anel”, nas quais a displasia
medular é encontrada em sua forma típica.
3- Anemia Sideroblástica Adquirida Reversível
Alcoolismo: a anemia associada ao alcoolismo geralmente tem inúmeras causas. A presença de sideroblastos em anel geralmente não se
constitui em causa isolada, entretanto pode ocorrer em 25-30% dos alcoólatras, sobretudo na presença de desnutrição. Anemia é geralmente
macrocítica.
Tratamento
A princípio, existem duas preocupações: (1) correção da anemia; e (2) correção ou prevenção da hemocromatose (hemossiderose).
No 1o caso → anemia sideroblástica hereditária (especialmente aquela ligada ao X) é corrigida em 40-60% dos casos pela
reposição de doses suprafisiológicas de piridoxina (vitamina B6). A dose proposta é de 100-200 mg/dia por três meses. Após 2-3 semanas de
tratamento, já é observada reticulocitose no sangue periférico. A anemia sideroblástica adquirida idiopática NÃO costuma responder a nenhum
tratamento.
Em relação à hemocromatose eritropoiética, o paciente deve ser acompanhado pela sua ferritina sérica. Caso esse parâmetro esteja
superior a 500 ng/ml, está indicada a terapia para reduzir o acúmulo corporal de ferro. Quando a anemia é leve (Hg > 9 g/dl), o método escolhido
pode ser a flebotomia repetida (são sangrias). Nos casos mais graves, refratários, ou com anemia moderada ou grave, indicamos o quelante
(agentes quelantes são administrados para "seqüestrar" os íons metálicos) de ferro desferoxamina (por via parenteral). A dose recomendada é de 40
mg/kg/dia (SC em infusão contínua).
Etiologia
Manifestações clínicas
Laboratório
Tratamento
Etiologia
Manifestações clínicas
Laboratório
Tratamento
SÍNDROMES MIELODISPLÁSICA
(AS MIELODISPLASIAS)
Fraqueza, tonturas, falta de ar (dispneia), sopros cardíacos, aumento a diferença entre a pressão máxima e a mínima, palidez cutânea e mucosa,
taquicardia.
→ petéquias, equimoses, epistaxes(é definida como o sangramento proveniente da mucosa nasal) (hemorragia); febre, dor torácica, tosse
(pneumonia) =>
→ icterícia, esplenomegalia, hepatomegalia =>