Anchieta
Anchieta
Anchieta
VITÓRIA
2013
JOSILENE CAVALCANTE CORRÊA
VITÓRIA
2013
Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
1. .
Pescadores. 4. Identidade. 5. Indústrias – Localização - Anchieta (ES).
6. Território. I. Zanotelli, Cláudio Luiz, 1959-. II. Universidade Federal
do Espírito Santo. Centro de Ciências Humanas e Naturais. III. Título.
CDU: 91
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Prof. Cláudio Luiz Zanotelli por aceitar me orientar e pela
boa dose de paciência.
Aos professores Luis Carlos Tosta dos Reis, Eneida Maria Souza Mendonça,
Maria Inês Faé, Celeste Ciccarone e Antonio Carlos Queiroz Ó Filho, os quais
deixaram contribuições que certamente foram além do campo intelectual.
Aos colegas Ana Luiza Santos Alves, Douglas Rafael Salaroli, Beatriz Mauro
Zandonadi, Elaine Cristina Rossi, Flávio Hertel Magris, Lívia Barraque Barbosa,
Luciana Schaeffer, Maria da Penha dos Santos, Miquelina Aparecida Deína,
Pedro Henrique Gomide Lucci, Reginaldo Alex Calçavara, Rodrigo Huebra
Martins, pela oportunidade de compartilhar as alegrias e agruras dos desafios
da pós-graduação.
Tradução da autora
RESUMO
The research investigates the social-ecological conflicts that cover the Ubu e
Parati Fishermen Community, since the lately happening dynamic territorials
raised by the process of industrial and oil pole increasing in the city of Anchieta,
in the southern costline of Espírito Santo state. Going through the thematic
stories retold by the Community individuals, we aimed the comprehension on
the reasons why the fishing territories have been decreasing and its consequent
reduction of surviving management conditions for its traditional work, besides
this, the threatening the fishermen territorial identity and cultural practices are
also affected by the enterprises advancement. Likewise, the lowering life
quality at the fishermen space of living and their resistance invite us to debate
about environmental justice and the “ v t” that was planned to this
place. In general, it is realized that there is a complex web of public and private
individuals who manage to use the multiterritoriality (HAEBAERT, 2004a;
2004b) playing down their original territorialities and t fs ’s local
managing power, for dominating the craved territory.
Foto 08 – Rua Mário Pereira das Neves, principal rua de Ubu, paralela
à costa....................................................................................................... 125
Foto 11 – F x g b s “P ss s
t ” u G t P t ................... 127
Foto 14 – s t v “b t g ” st u õ s s
casas dos pescadores de Ubu e Parati..................................................... 132
Imagem 09– Rede territorial dos pescadores de Ubu e Parati até o início
dos anos de 1970........................................................................................ 177
INTRODUÇAO............................................................................................. 01
1 OS CAMINHOS PERCORRIDOS............................................................ 14
4 “ E EN L I ENTI ”................................................... 55
5 CONCLUSÕES........................................................................................ 211
6 REFERÊNCIAS........................................................................................ 215
7 ANEXOS................................................................................................... 233
1
INTRODUÇÃO
1
Lançado em 2006, o ES 2025 corresponde a um projeto de desenvolvimento econômico articulado entre a
entidade empresarial denominada Espírito Santo em Ação e o poder público estadual. Elaborado no final do
primeiro mandato do Governador Paulo Hartung este Plano consolida a participação da iniciativa privada na
formulação de políticas públicas por meio de uma forte parceria com o Poder Executivo Estadual. (RAINHA, p.
119, 2012)
2
O ES-2025 deixa clara a expectativa para que o município reforce e amplie a cadeia
estadual produtiva siderúrgica e de petróleo e gás, compondo o escopo concernente
à t z “ s v v t ” 2, inserção regional e expansão urbana, sob o
argumento da busca da redução das desigualdades e erradicação da pobreza,
apesar das inúmeras controvérsias acerca dos impactos resultantes desse perfil de
política pública inspirado em modelos mundialmente adotados de reprodução do
capital (SANTOS, 2000b; OLIVEIRA, 2003 [1972]; PORTO-GONÇALVES, 2006).
Tais projetos são reforçados por estudos indicativos de investimentos previstos no
Espírito Santo, realizados pelo Instituto Jones dos Santos Neves desde 2000 (IJSN,
2010)3, estando o município de Anchieta, no topo da lista de investimentos.
2
N t xt t “ s v v t ” stá ss ss ustrialização, urbanização,
mercantilização da natureza e culturas, cuja intenção primordial é o crescimento econômico. Por outro lado, esta
pesquisa mostra – se crítica a esta concepção predominantemente econômica, usando como referência PORTO-
GONÇAVES (2006), o qual reafirma a necessidade de se propor um modelo de desenvolvimento associado ao
desafio ambiental, o que implica no combate a apropriação destrutiva dos recursos naturais, a padronização
cultural, privatização dos territórios e políticas anti-democráticas. Este tema será melhor tratado no capítulo 2.
3
O Instituto Jones dos Santos Neves é uma autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Economia e
P j t uj f é “produzir conhecimento e subsidiar políticas públicas através da elaboração e
implementação de estudos, pesquisas, planos, projetos, programas de ação e organização de bases de dados
estatísticos e geo-referenciados, nas esferas estadual, regional e municipal, voltados ao desenvolvimento
socioeconômico do Espírito Santo, disponibilizando essas f õ s Est às ” (IJ N 01 )
4
Registrada em 12 de junho de 2006, a Associação de Pescadores de Ubu e Parati – APUP foi criada para dar
maior ênfase e direcionamento às demandas das referidas comunidades. Até então, estes pescadores estavam
vinculados à Colônia de Pesca Z 4, localizada no Centro de Anchieta. Esta Associação dispõe de um link no site
denominado Rede Comuna Verde. Este site é resultado de um projeto de pesquisa desenvolvido no âmbito da
instituição de ensino superior EMESCAM Vitória-ES, e financiado pela FAPES a partir de 2008, intitulado
“I t s sócioambientais na saúde dos trabalhadores causados pela indústria de pelotização Samarco e
aqueles que serão provocados pela extração de hidrocarbonetos no município de Anchieta-E ” Est j t
esteve sob a coordenação dos professores doutores Maria Helena Rauta Ramos e Luiz Henrique Borges.
4
Outro fato marcante ocorrido em 2009, foi a construção do gasoduto que atravessou
área de pesca artesanal na praia de Tiquiçaba6 em Ubu. Esse gasoduto foi
5
Histórico das dragagens realizadas no Porto de Ubu: 1976, 1985, 1992, 2001, 2007, 2009, 2013 (SAMARCO,
2013).
6
A praia de Tiquiçaba teve seu nome alterado desde que a Petrobras aí realizou os levantamentos geotécnicos
para instalação de terminal portuário de Ubu, passando a ser denominada de Praia do Além, nos mapas dos
estudos. Para os pescadores, a enseada ab g “t ês” s s T qu b L g zu
5
A ampla ação da empresa Vale também tem gerado inúmeros conflitos em vários
pontos do mundo (DOSSIÊ..., 2010). Com empreendimentos em todos os
continentes, a empresa vem colecionando protestos e insatisfação por parte de
diversos grupos sociais atingidos, das mais variadas formas, pela atuação dessa
instituição. O rebatimento das ações arbitrárias da empresa pode ser visto no
surgimento, em 2009, de uma rede de articulação internacional denominada
Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale, cujo ponto central consiste na
reunião de comunidades afetadas, realizando denúncias e dando visibilidade aos
impactos.
9
Porto-Gonçalves (2006) ss t us t “ v g á ” t t t “ v
t ” u v z qu f -se àqueles que habitam e/ou usufruem do lugar há
gerações, estabelecendo laços sócioculturais peculiares ao meio que o circundam. Por outro lado, o
us x ss “ v t ” t s té s st s u -moderno-colonial, e
qu ss f “t ” u s “ f ” u “ t s ” s t s
“ s”, ou seja, com forte base no pós-colonialismo.
10
As entrevistas de caráter exploratório ocorreram no período de maio e junho de 2012 e foram de fundamental
importância para uma aproximação inicial com o lugar, assim como na definição do recorte empírico para esta
dissertação.
7
Observam-se também os efeitos das modificações das relações dos grupos com os
lugares por terem suas fortes redes territoriais de trabalho e de pertencimento
alteradas e continuamente ameaçadas. Tais mudanças puderam também ser
compreendidas a partir do modo como ocorre o enlace entre o caráter material do
território ao fator emotivo e simbólico descrito por Tuan (1974).
11
Refiro – me à empresa Samarco que está aí localizada há 36 anos e que vem concretizando uma política de
intensificação de suas atividades na última década, concretizando as tendências quanto às políticas de
planejamento territorial preconizadas no Plano Diretor Municipal de Anchieta (Lei Complementar nº 13 de 2006),
o qual amplia consideravelmente à área destinada à expansão do perímetro urbano municipal, que passou de
29.975.95 m2 para 144.250.846.41 m2 (BARBOSA, 2010, pág. 152-153).
12
Refiro – me às empresas Vale e Petrobras, as quais passaram a atuar diretamente no município mais
recentemente, a partir dos anos de 2000, ressaltando – se o fato de que a Samarco foi comprada pela empresa
Vale em maio de 2000.
13
s tg vs ub uj títu é “ t g t t
Vitória – ES – B s ”
10
Dessa forma, novos circuitos de poder têm se estabelecido e também novas formas
“ st t z ” v u ít s s
territorialidade do grupo que até então se apropriava do lugar. Com a reorganização
do território múltiplo que aí se observa houve o estímulo em tentar compreender a
correlação de forças entre os diferentes atores sociais na disputa em torno do direito
de uso e ou permanência no lugar, uma vez que as ações têm alcançado níveis
máximos de incompatibilidade de usos do mesmo, sem contar com a transferência
do ônus ambiental aos pescadores, afetando inclusive os espaços onde habitam.
No entanto, ressalta-se que essa etapa dos trabalhos de campo foi feita com muita
tranquilidade, diferentemente da etapa de sistematização dos variados dados
coletados. A dificuldade deu-se no momento da sua organização e incorporação ao
texto, o que acabou exigindo outras leituras em paralelo, para que boa parte do
material tivesse coesão com a problemática posta. A consequência desse
desequilíbrio fez com que o tempo previsto para a finalização fosse ultrapassado.
1 OS CAMINHOS PERCORRIDOS
O processo de pesquisa aqui desenvolvido esteve longe de ser uma trajetória rígida
de procedimentos e definição metodológica prévia à sua realização. Deixo claro o
fato de que, como pesquisadora pouco (ou quase nada), tinha de conhecimento ou
vivência junto ao grupo estudado. Na verdade, minha formação foi estruturada
fundamentalmente na realidade Amazônica, pois foi em Belém o início de minha
trajetória acadêmica. A migração para o Espírito Santo deve-se ao fato de eu ter um
capixaba como cônjuge.
Só no final do ano de 2004 é que mudei-me do Rio de Janeiro para o Espírito Santo,
instalando-me na própria capital, pois aí dispunha de um pequeno terreno de família,
onde construí uma primeira residência. A partir desta vinda ao estado deu – se início
u ss “ ” u í t s s x t tv s
mudança para lá permaneciam. As visitas a esse município ficaram mais frequentes
com o intuito de obter informações gerais sobre o lugar e para lá direcionar suas
atividades de trabalho e estudo.
16
t “ s– v v t ” é x t P t – Gonçalves (2006, p. 81); “des – envolver é tirar o
envolvimento (a autonomia) que cada cultura e cada povo mantém com o seu espaço, com o seu território; é
subverter o modo como cada povo mantém suas próprias relações de homens (e mulheres) entre si e destes
tu z ”
17
Realizar esta pesquisa me levou, por outro lado, a reflexão acerca do papel do
pesquisador e profissional que tem testemunhado e participado, ou não,
decisivamente em inúmeros processos de planejamento, estudo e elaboração de
diagnósticos e projetos que legitimam ações transformadoras nos territórios, tal
t s (1996 6) t qu : “ ss s ê s omuns e
também a nossa consciência de intelectuais e especialistas se move no território
ss t ”
17
O Plano Diretor do Município de Anchieta foi instituído pela Lei Complementar nº 13 de 28 de novembro de
2006 e veio atender as especificações estabelecidas pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257, de 10 de julho de
2001), no que refere – se a indicação de elaboração de Plano Diretor para municípios em vias de sediar grandes
projetos industriais e seus consequentes grandes impactos, independentemente do município de Anchieta ter
menos de 20.000 habitantes, mas atualmente, Anchieta já ultrapassou a margem dos 20.000 habitantes (IBGE,
2010).
18
Estas agendas que se multiplicaram pelo país foram inspiradas pelo principal documento formulado durante a
Conferencia das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano - Rio 92, intitulado de
programa estratégico universal para alcançar o desenvolvimento sustentável no Século XXI. Constituía num
esforço de identificar e reduzir os impactos sóciooambientais previsíveis, diante do acelerado processo de
urbanização que acomete inúmeras cidades pelo mundo sem, no entanto, discutir o modelo político - econômico
de produção e desenvolvimento, que predomina em inúmeros países.
18
Com isto, objetivou-se compreender como foi construído o elo afetivo entre essas
pessoas e o lugar, suas prerrogativas, e a consequente precarização da qualidade
de vida quando este laço territorial é rompido. Neste momento da pesquisa, decidiu-
se realizar trabalho de campo para obtermos as coordenadas geográficas, com o
uso de GPS19 e imagens que contemplassem os referenciais paisagísticos destes
pescadores, principalmente aqueles que servem de apoio às atividades da pesca.
Este trabalho de campo ocorreu no período entre dezembro de 2012 e fevereiro de
2013 e será melhor detalhado no sub-item 1.3.
19
GPS ou Global Position System é o aparelho utilizado na identificação de pontos de localização na superfície
da Terra.
21
Nesta entrevista, objetivou-se tomar seu ponto de vista acerca da elaboração dos
estudos sobre o polo, na qualidade de arquiteto-urbanista de uma das consultorias
citadas. A partir desta entrevista obtivemos significativas indicações bibliográficas
para o prosseguimento da pesquisa. As análises provenientes dos dados aí obtidos
com esta entrevista estão incorporadas na dissertação, principalmente no sub-
capítulo 3.2.
Dentre essas fontes, destacamos o site da Rede Comuna Verde, o qual integra
várias outras importantes associações de caráter comunitário e ambiental que juntas
têm travado lutas contra ações abusivas dos empreendedores e contestando a
negligência do poder público. Neste site, obtiveram-se informações prévias acerca
dos grupos e áreas afetadas do município, dando um direcionamento inicial na
seleção dos entrevistados. Assim, entrevistou-se, de maneira preliminar, membros
20
A indicação da entrevista foi dada pelo Orientador desta pesquisa.
22
O resultado desse contato inicial permitiu não apenas nos aproximar do grupo
estudado, mas também nos aproximar dos desafios por eles apresentados,
ocasionando a reflexão acerca do papel da academia e nas possíveis contribuições
que o resultado do trabalho poderia dispor para a Comunidade.
Após esses diálogos iniciais, foi possível direcionar a abordagem da pesquisa para a
compreensão das transformações no lugar por meio dos indivíduos que nela viveram
ou vivem, mostrando outras concepções a serem comparadas às retóricas presentes
nos documentos oficiais do Governo e das empresas, sendo a História Oral, o
recurso considerado pertinente à abordagem pretendida. Neste momento, havia a
pretensão de se estudar as duas Comunidades (Chapada da A e Monteiro, e
pescadores de Ubu e Parati).
A partir de então, percebeu-se que além de obter as versões dos pescadores sobre
o uso e ocupação do lugar, tornou-se importante conhecer elementos identitários
sobre seu modo de vida e de seus antepassados, justificando assim suas narrativas
de afirmação sobre o direito de permanência do uso desses espaços,
fundamentando então a opção pelo uso da História Oral para o prosseguimento da
pesquisa, a qual será mais detalhada a diante.
PARTICIPANTES
Apenas entrevista 03
Entrevista e questionário 14
TOTAL 17
Fonte: Questionários e entrevistas realizados para a esta dissertação (2012/2013).
21
(...) uma metodologia, na qual o pesquisador se coloca no campo como uma antena de rádio, captando de
forma sensível os elementos que interessam para sua proposta, interagindo com o grupo, vivendo com ele e
influenciando e sendo influenciado. Uma relação humana, na qual a empatia é importante, mas o confronto,
quando exigido, também o é, já que se torna o pressuposto para relações baseadas na autenticidade pessoal e
não na representação de papéis. (FERNANDES, 2004 apud TURRA NETO, 2004, p.42, acesso em: 27 mai.
2013).
25
PARTICIPANTES
Moradores de Ubu 08
Moradores de Parati 06
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
ENTREVISTADOS
Homens 09
Mulheres 05
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
A partir das histórias colhidas obtiveram-se relatos sobre quando e como ocorreu a
inserção dos empreendimentos e os impactos diretos por eles ocasionados nas
áreas de trabalho desses pescadores. Ao mesmo tempo levantaram-se alguns
dados quantitativos relevantes para a análise das transformações do modo de vida
22
Inclui-se dentre os entrevistados o Presidente da Associação de Moradores de Ubu e Parati, sendo este o
mesmo que auxiliou no contato com os pescadores a serem entrevistados.
26
das gerações passadas para a atual, assim como alguns pârametros para avaliação
das condições de moradia dos pescadores. Naturalmente, o diálogo por si só
acabou direcionando para as estratégias de luta diante da disputa pela permanência
do direito de uso dessas áreas, assim como, pelo direito ao ressarcimento dos
prejuízos ocorridos.
30/05/2012
11/06/2012
14/12/2012
21/12/2012
28/12/2012
18/01/2013
19/01/2013
18/02/2013
25/02/2013
06/03/2013
27/05/2013
27/06/2013
01/07/2013
06/07/2013
12/07/2013
Fonte: Trabalho de campo realizado no período entre maio de 2012 e julho de 2013.
Meihy (2002) e Alberti (2004) ressaltam que por meio da História Oral, obtém–se
uma pluralidade de documentos ricos para análise, enquanto Geertz (1978) atenta
para o seu valor diante da interpretação das culturas e diferentes modos de vida. A
utilidade dessa metodologia para a Ciência Geográfica tem se tornado frequente,
uma vez que a própria execução da metodologia nos permite uma aproximação do
grupo estudado, acessando conhecimentos e percepções extras, ampliando o
acesso para além das informações produzidas e coletadas objetivamente numa
entrevista tradicional (TURRA NETO, 2011, p. 342).
Cohen (1993) e Alberti (2004) informam em seus estudos sobre quando se fez, da
História Oral, um novo paradigma voltado ao estudo dos marginalizados. Nos anos
de 1960 há um retorno à subjetividade como tema de pesquisa nas Ciências Sociais
aliado a um momento de efervescência de movimentos sociais de caráter diversos,
estimulando a criação de um banco de dados de utilidade pública e acadêmica
enquanto alternativa de produção de conhecimento além daquele considerado
oficial.
Portanto, esse método tem reafirmado seu valor ao dar credibilidade à dimensão
social dos eventos, da vida e do desempenho de boa parte de seus protagonistas,
os quais em muitas ocasiões tiveram suas versões consideradas como suporte
documental secundário.
Passamos então a delimitar alguns conceitos propostos por Meihy (2002, p. 13) para
orientação metodológica:
30
História Oral é uma prática de apreensão de narrativas que podem ser feitas
pelo uso de meios eletrônicos e destinada a recolher testemunhos,
promover análises de processos sociais do presente e facilitar o
conhecimento do meio imediato. A formulação de documentos mediante
registros eletrônicos é um dos objetivos da história oral que, contudo,
podem e devem também ser analisados a fim de favorecer estudos de
identidade e memória cultural.
Atualmente, este instrumento de pesquisa tem dado lugar à busca do contato com
uma pluralidade de experiências sociais, indispensáveis à proposta central desta
pesquisa, que é mostrar a forma de como se dá a intersecção de territórios em áreas
de pesca e quais têm sido seus efeitos, considerando as diferentes territorialidades
aí presentes. Portanto, expor a visão desse grupo de pescadores é, no mínimo, um
31
ss f ss t H sb t (1999 178) “t tó s
percebido em suas múltiplas perspectivas, desde aquela de uma paisagem como
esp t “v v ” qu “s b z ” u u té u t
geográfico mais amplo e em tese mais abstrato, como o de Estado-N ” N ss
pesquisa, a pretensão da busca pela definição da identidade do grupo transpassa
pelo território e dá sustento à sua condição étnica ao abordarmos seus valores,
símbolos e práticas diversas.
Sabe-se que a análise da percepção da paisagem, por si só, não é suficiente para a
compreensão dos valores atribuídos ao lugar, mas aqui foi tomada como ponto de
partida para se estudar o modo de ver o mundo dos sujeitos e os possíveis impactos
dela sobre a comunidade, em particular para se verificar o comprometimento do
acesso ao referencial paisagístico, por parte dos pescadores.
Turra Neto, (2011, pag. 343), a partir de suas experiências de uso do método de
história oral, alerta para o fato de que os discursos apreendidos serão aqueles que
ganham condições de emergência no percurso da pesquisa. São parciais, possíveis
e resultam de um processo contingente e contextualizado de investigação, o qual é
influenciado pelo caminho metodológico percorrido pelo pesquisador.
Como a história é sempre social (MEIHY, 2002), considera-se que o que foi narrado
apresenta vínculo com a construção coletiva, portanto deve remeter à atenção
quanto aquilo que reflete a individualidade ou a influência da coletividade; o que
atribui significativo valor a cada interpretação relatada. Ou seja, deve-se ter claro
que a subjetividade também apresenta seus limites, principalmente na escala
individual.
Sugestões e indícios também foram usados para orientação, uma vez que não há
um conjunto de regras fixas para a aplicação do método de História Oral, portanto
ajustes foram realizados a cada obstáculo ou nova condição colocada. O resultado
dessa experiência será evidenciado nos textos que se seguirão, especialmente no
34
Há outros atores que intervém de maneira direta na área sob disputa além da
Vale, Samarco e Petrobras?
A questão territorial é central para a problemática, uma vez que trata-se do direito de
uso de um trecho de área costeira do litoral sul do Espírito Santo, por parte de um
grupo de pescadores anchietenses que historicamente dele usufruem.
O conceito de território passa a ser o elemento teórico propulsor desta reflexão, uma
vez que ele norteará a hipótese acerca do processo de multiterritorialidade que
constituia Comunidade e, dentro desta, as reflexões sobre a experiência da luta
contra a territorialização precária23.
Por outro lado, abordar a multiterritorialidade nos remete a percepção dos múltiplos
territórios aí presentes, assim como suas diferenças, contrastes e dinâmicas
diversas. Nesta trajetória, percebe-se que as grandes alterações realizadas em
territórios interseccionados têm ocasionado impactos recíprocos, promovendo
situações conflituosas entre os diversos agentes que participam dessas
territorialidades.
23
H sb t ( 004) õ t “t t z á ” vés “ st t z ” s
melhor traduziria o processo de estar inserido numa nova territorialidade em situação desfavorável sob vários
aspectos.
37
Na prática, o que nos chama a atenção é o fato de constatarmos que quando estes
conflitos são travados entre agentes de grande poder econômico e de baixo poder
econômico, os primeiros acessam massivamente outras estratégias de caráter
político, jurídico e científico, fazendo com que a legitimação do domínio territorial, por
parte de grupos econômicos poderosos, torne-se fato constante. Este fato pode ser
observado nos inúmeros casos de notória injustiça ambiental registrados por autores
a exemplo de Porto-Gonçalves (2006), Acserald et al. (2009) e Böhm (2013)24.
24
Palestra ministrada no dia 24 de maio de 2013 pela visitante Profa. Dra. Maria Laura Böhm, Pós-doutoranda
st tut ê s s U v s Gött g st t tu “E s s
ut s G v s õ s t s Hu s” f ganizada pelo Programa de Pós-graduação em
Direito da UFES.
38
Por outro lado, o mesmo autor reconhece que o meio simbólico, viabilizado pela
educação e política, também pode gerar uma concepção de lugar que vai além da
experiência direta da maioria das pessoas, tal como se observa na incorporação do
conceito de Estado-Nação, o qual evoca um sentido muito eficaz da identidade, da
soberania e da coletividade (ANDERSON, 2006 [1983]), mesmo prescindindo de
relações concretas diretas com os demais sujeitos que dele participam. Um exemplo
ust t v s s õ s f t t “ t x b ” qu t tát
út à ss su st s “ s t v s” s ít sg v t s
estado, legitimando então os projetos das elites político-econômicas.
P s “ ” x x tó é
ferro atribui ao território o sentido predominantemente de instrumento e recurso para
obtenção de lucros, distinguindo-se, em intensidade, pelas Comunidades mais
tradicionais, cujos territórios abarcam simultaneamente a base de recursos para
sobreviver, o referencial simbólico - afetivo, o referencial identitário, além de
possibilitar usos múltiplos e coletivos.
Portanto, uma reflexão mais profunda sobre o recurso econômico põe em evidência
ss s õ s qu t “ té ss ” à s t sf s ss s
humanas, ganhando vida pelas técnicas vigentes em cada momento da história.
Reafirma-se assim, o caráter do território enquanto recurso, todavia sob ângulos
distintos da forma de produção, predominando o caráter funcional e mercantil para
os empreendedores industriais e o seu valor enquanto lugar de sobrevivências do
cotidiano para os sujeitos cujos modos de vida não se inserem de modo contínuo ao
chamado mundo globalizado.
Numa visão mais abrangente, Milton Santos também nos fala acerca do conceito
multiescalar que envolve o território (SANTOS, 1994), quando diz que o território é
compreendido entre o mundo e a sociedade local. O autor explicita o fato do território
“t s ” s t ss s s s bt u ss
racionalizador e um conteúdo ideológico de origem distante e que chegam a cada
lugar com os objetos e normas para serví – las, ocasionando profundas mudanças
estruturais e ampliando as desigualdades entre os lugares por meio da fragilização
das condições de resistência das territorialidades originárias.
25
Hibridez, em Canclini (1997, apud HAESBAERT, 2004a) corresponde a uma trama cultural majoritariamente
urbana, repleta de oferta simbólica heterogênea e renovada constantemente a partir das interações do local com
redes nacionais e transnacionais de comunicação. Incorporar este conceito significa tentar compreender as
causas e os efeitos das quebra e da mescla dos novos sistemas culturais que são construídos.
41
Para muitas sociedades originárias, predomina uma total coesão e coerência entre a
base material do território enquanto abrigo e recurso ao mesmo tempo que sua
apropriação é mediada por referências simbólicas que trabalham a favor da
perpetuação de sua cultura. Nestas circunstâncias, a perda territorial configuraria na
perda direta de sua identidade (HAESBAERT (2004b) apud
BONNEMAISON&CAMBREZY, 1996), reafirmando a importância da identidade dos
indivíduos e grupos em relação a uma parcela do espaço, chamando nossa atenção,
enquanto pesquisadores, para a compreensão da política em torno das identidades
culturais coletivas.
A relação entre identidade e território é ambígua, pois, mesmo quando uma pessoa
sai de seu território, ela o carrega consigo, ou ainda, mesmo quando ainda está
nele, ele pode submeter-se a uma dinâmica territorial completamente nova, tendo a
sua territorialidade desestruturada.
Há ainda grupos identitários que distinguem-se das comunidades, os quais têm suas
identidades mediadas pelo mercado. O território, portanto, é o do mercado e não do
grupo, é o caso dos grupos de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e
Trangêneros, o GLBT.
Haesbaert (1999) esclarece o fato de que nem toda identidade social fundamenta-se
necessariamente numa fração do espaço geográfico. Entendendo melhor a noção
de identidade, o mesmo autor explica (1999, p. 173):
26
Entende-se cultura a partir de Freire ( 009 54) qu su qu “u ju t v s t z
modos de viver enquanto culturas próprias, singulares, isto é, fonte de onde nasce o diferente, de onde minam os
folclores; uma prática cultural apoiada em determinismos tradicionais, em elementos (da moradia, da
alimentação, do jeito de se vestir , do modo de se comportar, das relações, do modo de produzir, dos saberes e
f z s t ) g s ss qu s íz s f t uz t s”
43
Dessa forma, um recorte espacial pode muito bem ser o elemento, o símbolo dessa
identidade, aquilo que vai conectar os referenciais simbólicos e as práticas
concretas.
28
Latour (1994 [1991]) desvenda o conceito de modernidade, numa crítica ao predomínio do ponto de vista
ocidental-europeu, desviando nossa atenção acerca das contradições presentes no seio dessa pretensa rede
temporal, que camufla as diferenças e os fluxos que envolvem, aproximam e diferenciam os sujeitos.
45
impunha ao território uma rigidez têmporo – espacial que coloca a todos numa
mesma trajetória com destino à modernidade.
suficiente para a superação das restrições estabelecidas pelo espaço e pelo tempo,
e cada vez mais instrumentalizados pelo capital por meio da tecnologia e da ciência.
Não resta dúvida sobre o potencial de intervenção do capital que, por meio das
redes, destrói aquilo que é visto como barreira ao fluxo produtivo e comercial,
entretanto, deve haver um cuidado quanto às consequências das ações
interventoras dos empreendimentos econômicos, pois seria muito limitada a visão de
que nada restará daquilo que constituía anteriormente a territorialidade originária. Ou
seja, o autor Haesbaert (2009, p. 130), faz perceber que por traz dos trabalhos que
v “ st u s t tó s” b -se um conceito de território com
sérias implicações políticas, desviando nosso olhar daquilo que não fora destruído,
ou ainda, daquilo que ressurge sob novos parâmetros.
O autor nos remete ao entendimento de que, uma leitura mais detalhada desses
vários processos territoriais nos faria perceber que estes ocorrem simultaneamente,
tornando indispensável a sua abordagem de maneira paralela e integrada. Há um
rebatimento imediato para cada aspecto acima apresentado, ocasionando uma
t t z u “ v t t t ss áv ” (H E B E T
2009, p.127).
financeiro. Por outro lado, limitar-se a ela impediria de ver a dimensão sócioespacial
e as potencialidades e resistências nela contidas.
Toda essa dinâmica territorial reafirmada deixa claro que a simples ameaça a perda
territorial implica na reconstrução imediata de sua territorialidade, mesmo que o
grupo permaneça no lugar. Dessa forma, entende-se que a desterritorialização
movida pela expansão industrial corresponde a dinâmica reterritorializadora pela
qual a comunidade passa, movimentos estes que nos obrigam a acompanhá-los de
perto para perceber os momentos dos encontros e das rupturas.
Uma reflexão sobre estes dois paradigmas instiga a investigar situações em que
ambas condições podem ser observadas numa mesma localidade, levando – nos a
desvendar a condição territorial assumindo a presença desse cruzamento de
territórios e, consequentemente, das tramas que daí surgem.
51
Por conseguinte,
A propriedade da terra como fundamento do território é deslocada pela
noção de soberania que é a ação de domínio sobre o espaço de
pertencimento. Real ou imaginado. Sem as amarras da propriedade, o
territorial surge com mais nitidez enquanto espaço de relações políticas
entre as distintas representações que legitimam as ações de domínio sobre
ele, por isto é que em cada território se encontram diversos sentidos de
domínio, histórico e complexos - na maioria das vezes produzidos para
além das fronteiras locais – diminuindo o caráter aberto, submetido a
formas jurisdicionais. A jurisdição tem fronteiras difusas que não são físicas,
isto é, são desterritorializadas, política e socialmente falando, razão pela
qual o sentido de domínio se translada com os atores que deixam suas
marcas nas localidades. Aparecem assim as jurisdições guerrilheiras,
paramilitares, municipais, indígenas, afrocolombianas, ecológicas, judiciais,
eclesiásticas etc., num mesmo lugar, configurando nele uma arena própria
para a luta territorial. (ZAMBRANO, 2001, p. 17, apud HAESBAERT, 2004b,
p. 9).
u ó ut f u v t “ x ê s
t g ” qu s st ultiterritorialidade no sentido estrito.
c) s út s “g t s ” ( EY 008) ompressão
espaçotempo e seu potencial.
e) b “t s s s” à multiterritorialidade, para
Milton Santos (1978:211) o lugar seria o acúmulo de ações realizadas em
tempos desiguais.
Enfim, nesta pesquisa, tem-se clareza das implicações políticas que o conceito de
multiterritorialidade nos disponibiliza, principalmente diante das práticas de injustiça
ambiental que têm atingido os pescadores de Ubu e Parati. A escolha do conceito
parte do princípio que há um rico conteúdo simbólico–cultural carregado de
sentimento topofílico resistindo às ações (des)reterritorializadoras dinamizadas por
55
2.4 OS DESENVOLVIMENTISMOS
Tem-se percebido uma ação combinada entre Estado e empresas, a qual se revela
ser sinônimo de estratégias usadas no avanço do domínio de empresas sobre novos
territórios, oficializando o direito de propriedade privada sobre o lugar de interesse
coletivo, no caso em estudo dos pescadores de Ubu e Parati.
Neste momento, o empreendedor se vale da associação do capital acumulado e das
condições de controle da propriedade fundiária (ZANOTELLI et al., 2013),
mobilizando todo um aparato burocrático e técnico necessário à definição dos eixos
de expansão, reserva de espaço e posterior concretização do negócio desejado.
Enfim, a injustiça que identificamos neste caso estudado não corresponde a um fato
isolado, mas compõe uma concreta e longa história de invasões de povos europeus
sobre territórios alheios. Nesta esteira, não podemos deixar de criticar o fato de que
a expansão do capitalismo avançou em consonância com uma aura de missão
civilizatória que servia de justificativa para a história do etnocídio e genocídio contra
v s t x s “ t v s” “ t s s” u “s v g s” (P T -GONÇALVES,
2006, p. 12) e que até hoje, serve de justificativa para expelir comunidades
originárias que ocupam territórios, cujo princípio é o valor de uso.
Desde os anos de 1960, apesar dos inúmeros questionamentos acerca dos efeitos
do desenvolvimento nos países onde, aparentemente, havia sido bem sucedido,
permanece a ambiguidade em relação à ideia do desenvolvimento, cuja
característica central é se colocar como alternativa ao subdesenvolvimento, sem
questionar as interrelações ocultadas neste dualismo.
Observou-s qu v u qu st t s b s “ f t s odos de
s s gu s” ( t 64) s s u v z s t
sobre os países sub-desenvolvidos. O universo discursivo que predominava (e que
ainda tem muita força) era aquele que posicionava os países em pares dicotômicos,
causando um grande constrangimento àqueles que eram classificados enquanto
retrógrados ou não alinhados à trajetória da modernidade (MASSEY, 2009).
Estes mesmos atores, no dizer de Porto-Gonçalves (op.cit, p. 67), são aqueles que
numa aparente contradição, evocam o debate sobre as demandas por recursos não-
renováveis. Todavia, o debate fica circunscrito às questões técnico – científicas e
econômicas, desviando a atenção pública das incontáveis perdas e extinção de
elementos da flora e fauna, indispensáveis ao sustento de inúmeros povos
tradicionais que mantinham uma relação de maior proximidade com o meio ambiente
que o circunscrevia.
59
Dessa maneira, com o advento do ambientalismo nos anos 60, cresce também a
consciência de que há um risco iminente de consequências ambientais desastrosas,
com alcance que varia do local ao global. O otimismo tecnológico que o século XIX
nos deixou não garante a capacidade ilimitada de recuperação de um determinado
sistema. Da mesma forma, o otimismo econômico do século XXI, não garantiu a
superação da pobreza e das abissais desigualdades sociais no mundo
contemporâneo (OLIVEIRA, 2003 [1972]; DAVIS, 2006).
O controle da mobilidade, dos fluxos passou a ser estratégico nas ações políticas de
expansão territorial, interferindo estrategicamente nas políticas de planejamento e
gestão territorial. Como exemplo, observou-se a elaboração da Agenda Estratégica
60
Neste movimento, atores internos aos territórios também passam a fomentar ações
estruturantes para viabilizar o encontro entre eles e os nós externos das cadeias
produtivas que se formam. Essa ação, geralmente silenciosa, só é percebida quando
é anunciada a chegada de grandes objetos técnicos, quando na verdade, a
supressão de direitos fundamentais da Comunidade local já foi, há muito tempo,
suprimida.
30
A referida Agenda dá ênfase à elaboração e implementação da carteira de projetos estratégicos preconizados
no Plano ES-2025 e voltados à Região Sul. Nessa ocasião o município de Anchieta era abrangido pela região
denominada Microrregião de Gestão Administrativa Metrópole Expandida Sul. Conforme lei 9.768 de 28/12/2012,
a região passou a ser denominada Microrregião de Planejamento Litoral-Sul e passou a incluir os municípios de
Presidente Kenedy e Rio Novo do Sul.
61
31
Refiro – me às duas visitas técnicas ocorridas em outubro e novembro de 2012realizadas a projetos sociais
envolvendo atividades de piscicultura e maricultura financiadas pela empresa Petrobras. A realização das visitas
62
Vemos então, que as notórias condições de mobilidade, quer seja física ou virtual,
têm disponibilizado ferramentas para que as comunidades mais pobres usufruam
dessa multiterritorialidade, começando pelo simples acesso e interpretação da
Constituição e leis dela derivadas, proporcionando brechas de reflexão e ação para
jogar com a multiterritorialidade concreta, a favor dos direitos civis e ambientais dos
povos tradicionais.
Esse modo de olhar permite ver o quão as vidas estão repletas de influências de
outros espaços e escalas, tornando-as singulares, devido uma específica
combinação de influências diversas, portanto, o território aqui sob análise, será visto
num sentido multi-escalar e multi-dimensional, para assim nos aproximarmos de sua
multiplicidade, procurando seu entendimento e buscando pensar em práticas de
reversão da injustiça sócioambiental.
objetiva convencer aos pescadores locais a aceitar os projetos pré – prontos de compensação e ações
mitigatórias devido aos impactos previstos, cumprindo assim, uma das etapas dos processo licitatório junto a
órgãos públicos ambientais.
63
Uma vez que este trabalho propõe reafirmar o direito de proteção ambiental justa e
equânime para as comunidades, assim como o acesso aos direitos civis e à sua
implementação independente de sua condição social, econômica ou de nível
educacional, pretende-se aqui mostrar o viés anti-democrático da ação
multiterritorial, mas também mostrar seu potencial na defesa do reconhecimento, do
respeito e dos valores dos diferentes grupos étnicos, e em especial, aqueles que
integram-se à natureza de modo mais democrático e menos degradante.
64
32
Informações obtidas na palestra Transformações do uso do solo e conflito no litoral de Anchieta, proferida no
VII seminário de Pesquisa e Iniciação científica do Núcleo de estudos de Arquitetura e Urbanismo – NAU da
Universidade Federal do Espírito Santo, sob coordenação da Profª. Drª. Eneida Maria Souza Mendonça.
65
A inserção dos jesuítas fazia parte dessa estratégia de domínio territorial. Por meio
da catequese eles introduziam os princípios do cristianismo no modo de pensar e
viver dos indígenas se mesclam os e concomitantemente, promoviam aproximação e
diálogo. Ente os indígenas, se mesclam os indivíduos de diferentes tribos, havendo
uma grande confusão de identidades, além de modificações de costumes e
tradições indígenas e também, nas tradições de origem portuguesa, validando
portanto a experiência multiterritorial.
66
O convívio do Padre José de Anchieta com os índios foi próximo e longo, o que pode
ser observado nas obras artísticas literárias e teatrais por ele deixadas. Interessante
observar que nos autos são descritas inúmeras passagens, nas quais há um total
t â b és í s f t st b s “ ív s v z ”
integrados, interpretando atos característicos de suas culturas e também da cultura
dos colonizadores, notáveis representações do espaço socialmente produzido, como
podemos observar no trecho, logo abaixo, dentre suas numerosas obras
(GONÇALVES, 1996, p. 5-6). De certa forma, podemos dizer que eventuais posturas
“ st s ” s t s gu s su s b s t t buí
flexibilização dos territórios indígenas.
33
“ UT UNÇÃ ”
LOCAL: Reritiba, hoje Anchieta, no Espírito Santo.
DATA: 15 de agosto de 1590.
CENÁRIOS: 1. No porto de Reritiba.
2. No adro da Igreja da Assunção.
3. Dentro da mesma igreja.
PERSONAGENS: Coro de Meninos.
Anjo da Aldeia (An.).
Diabo com companheiros (D1, DD).
6 selvagens que dançam.
2 índios civilizados que dançam.
TEMA: No porto um coro de meninos saúda a imagem da Assunção de
Maria, antes de começar a procissão até a igreja.
- No adro da igreja, o Anjo convida Nossa Senhora a tomar posse da aldeia
e protegê-la. O Diabo principal, à frente de vários companheiros, tenta
impedir a entrada da Virgem; mas o Anjo o expulsa sem mais, com os
companheiros.
- Seis selvagens dançam uma dança portuguesa, e dois índios
civilizados, para alegria dos primeiros, dançam uma à maneira da terra.
- Três representantes de tribos, tamoio, tupiniquim e tupinambá, vêm
louvar a Virgem.
- A imagem é introduzida na Igreja, e durante o desfile para o beijo de
despedida. Se canta em honra de Maria uma canção.
ATOS: I Saudação no porto.
II Diálogo do Anjo e Diabo.
III Duas danças.
IV Louvores dos três representantes de tribos.
V Beijo da imagem e canto de Despedida.
LÍNGUA: Tupi. (...)
33
Trecho do Teatro de Anchieta página 28 – Edições Loyola. (Pe. Viotti, apup GONÇALVES, 1996, P. 5-6).
34
Em língua tupi, Reritiba ou Reigtyba significa lugar de muitas ostras, as quais alimentavam os ascendentes
indígenas, como pode ser observado nos sambaquis de depósitos de ostras ainda encontrados em morros de
Anchieta.
68
Vale lembrar que os territórios para implantar essas Aldeias não eram
escolhidos aleatoriamente pelos colonizadores. Para tal, eram preferidos
lugares considerados estratégicos, do ponto de vista da defesa e da
viabilidade. Principalmente aqueles onde os colonizadores já encontravam a
existência de certa infra-estrutura, como: caminhos, água potável, recursos
alimentares, saberes dos nativos e situação geográfica estratégica para
possibilitar a defesa do território (MATTOS, 2008, p.8).
Destaca-se ainda o fato de que há registros nas cartas de Padre Anchieta acerca de
doações de terras de sesmarias a indígenas, assim como a atribuição de direitos aos
índios cristãos, consentidos pelo Rei Dom Sebastião. (MATTOS, 2009, p.11). As
atividades praticadas pelos indígenas abrangiam a aprendizagem da catequese,
atuavam na defesa contra piratas ou invasores estrangeiros, prestavam ajuda de
caráter público e de solidariedade política, além de trabalhar em obras de
construção, dessa forma, o indígena apresentava significativa presença no mercado
de trabalho local. Como exemplo, é citada a Igreja Nossa Senhora da Assunção e,
ao lado, a Residência dos Padres, obras edificadas por índios catequisados.
69
Tal incorporação dos índios às atividades urbanas diversas da aldeia não significava
que predominava um ambiente pacífico, tanto que em 1742, uma desavença entre
um índio e um missionário da Companhia de Jesus, acabou virando um conflito
político que se estendeu até o Ouvidor – Corregedor da Capitania do Espírito Santo.
As consequências puderam ser vistas no início da fragilização diplomática entre
índios, jesuítas e a própria coroa portuguesa, assim como a fundação do
aldeamento Orobó-Py-uma (atual município de Piúma), região que passou a abrigar
sí s fug t v s “N Iriritiba, muitas vezes eles reagiram questionando a
falta de liberdade, a arbitrariedade dos tratamentos que recebiam, e as questões
territoriais, sendo que est s ss t stó ” (NE E 1995 18)
Nesta ocasião, sabia-se que aos índios foram doadas terras inalienáveis, cujo
tamanho variava de 6 à 12 léguas (GONÇALVES, 1996). Entretanto, Mattos (2009)
analisa esta questão sob ponto de vista bem diferente.
ocasião, a quem pudesse retribuir com favores políticos ou gerar mais dízimos,
sendo essas ações reafirmadas pelo corpo jurídico da época.
Em 1771 criavam-se escola pagas pelos próprios habitantes, pois a condição urbana
da vila carecia de um sistema educacional, o qual anteriormente era de
responsabilidade dos jesuítas (GONÇALVES, 1996).
Interessante observar que no século XIX, a postura do europeu era coerente com o
que Quijano (2000) denomina de sistema-mundo, onde a apropriação da natureza e
dos saberes era o objetivo que norteava suas expedições além-mar. Ou seja, estes
visitantes constituíam verdadeiros braços das monarquias centralizadas europeias
na América Latina. O uso do saber dos nativos nas práticas expedicionárias ainda
persiste nos dias atuais, como se observa na contratação de habitantes de Ubu e
72
Quadro 03: Dados do censo demográfico dos séculos XVIII e início do século XIX
ANO HABITANTES ECONOMIA (predominante)
1724 3.119 Lavoura
1784 3.017 Lavoura
1824 1.707 Extração de madeira
Fonte: Elaborado por Josilene Corrêa (maio de 2013) a partir de informações disponíveis em
Gonçalves (1996).
Com o avançar do século XIX, os negros também mostravam sua insatisfação por
meio de rebeliões e apoio a causas libertárias, culminado em morte de capitães –
mores e senhores de fazenda. Em 1850 a promulgação da Lei Euzébio de Queiroz
proíbe o tráfego negreiro e lança as prerrogativas do processo gradual da abolição,
do qual se tem registros de 1872 em Anchieta (GONÇALVES, 1996). Contudo, com
a legalização e mercantilização da propriedade das terras estabelecida em 1850
com a Lei de Terras, anulam-se algumas prerrogativas dos índios e seus
descendentes e se impede a possiblidade de acesso às terras aos ex-escravos.
Enquanto isso, as ideias favoráveis à proclamação da República circulavam nos
jornais locais da época.
Gonçalves (1996) cita o fato de que em 1886, eram feitos os primeiros estudos para
a construção de um porto, a ser localizado na Ponta dos Castelhanos, fato este que
nunca se concretizou. Apesar disso, em 1890, a realização de estudos ainda mais
precisos reafirmou a viabilidade da construção não apenas do porto, mas também a
construção de uma ponte metálica sobre o rio Benevente, uma cidade na região
portuária, além dos estudos para construção da estrada de ferro Benevente-Minas
73
que se ligaria à estrada de Ferro Leopoldina, como vê-se no trecho noticiado pelo
“ á f “ tó 06 utub 1890 -Ano I - nº 100.
“ I GE E IN UGU ÇÃ
Da estrada de Ferro de Benevente à Minas, que vai ser construída pela
Companhia Geral de Estradas de Ferro do Brasil - às nove horas da manhã
de quarta-feira de 24 de setembro, largou do ancoradouro o PAQUETE DO
RIO PARANÁ, pertencente ao Loide Brasileiro, conduzindo a Diretoria da
Companhia Geral de Caminhos de Ferro de Benevente à Minas , o Sr.
Ministro da Agricultura, alguns convidados e representantes da Imprensa da
Capital. (...). A concessão feita (...) para a construção da Estrada de Ferro
Benevente à Minas abrange também a edificação de uma nova cidade do
mesmo nome que ocupará uma área de 6 km quadradros de terrenos
quase todos já comprados pela Companhia, todos de granito em
decomposição e numa média de 10 metros acima do mar. A nova cidade
será edificada a partir do lugar denominado ponta dos Castelhanos,
terminando na cidade Velha e terá uma magnífico Porto, servido por uma
ponte metálica, via dupla com 200 metros de extensão facilitando assim a
entrada dos navios, tendo todos os aparelhos necessários para a carga e
descarga dos mesmos. (...) A estrada assim construída terá seu ponto
terminal na Estação de Santa Luzia de Carangola ao Rio de Janeiro. (...) O
rendimento mínimo da estrada será avaliada por dados oficiais, será a do
transporte de 2 milhões de arrobas de café. Dentro de um ano deverá estar
inaugurado o tráfego até o quilômetro 29, na estação de Iconha,; dentro de
15 meses até o quilômetro 48, no Rio Novo; dentro de 18 meses até o
quilômetro 74 em Itapemirim, dentro de dois anos até Santa Luzia de
g ” ( u G NÇ L E 1996)
O insucesso dos investimentos previstos pode ser, em parte, atribuídos aos esforços
do governo estadual em direcionar o escoamento da produção agrícola exportável
para a capital, centralizando assim os investimentos econômicos (MENDONÇA;
GOLTARA, 2012).
Imagem 3 - Colégio para moça D. Maria Mattos é o prédio maior em primeiro plano. .
Fonte: <http://4.bp.blogspot.com/_YnFl7fhF444/SoX4gW-DlOI/AAAAAAAAAKg/gXEUoI6hjPY/s1600-
h/postal.jpg>.
Esse setor vai perdurar até os anos de 1960, quando os setores do turismo e
industrial passaram a receber maiores incentivos.
De uma maneira geral, podemos afirmar que do século XVI à primeira metade do
século XX, há muitas transformações nas dinâmicas territoriais do município,
entretanto, elas são consideradas lentas quando comparadas àquelas que se
sucederão no avançar da segunda metade do século XX.
Quando vêm turistas com jet ski pra cá é um tormento. Eles ficam
passando por cima das nossas redes e isso afasta os peixes todos.
Atrapalha o nosso trabalho! (Pescador D, 58 anos)
No cont xt f “ ít v t t s t vá B s
principalmente a partir dos anos 50, contribuiu para acelerar o ritmo de
t sf u us s ut s s b s s”
(MENDONÇA, GOLTARA, 2012). Desse modo, o turismo é apontado como uma
alternativa de crescimento econômico para o município de Anchieta.
35
A entidade vem proporcionando ações nas áreas de educação, saúde e assistência social no meio rural desde
a sua fundação pelo padre Humberto Pietrogrande, em 1968, no município de Anchieta e atualmente está
presente em 58 municípios capixabas e 22 estados brasileiros por meio de 300 escolas. Destacou-se pelo uso
da pedagogia de alternância, oriunda da França, que combina o trabalho no campo alternado com a frequência
escolar. Fonte: <http://www.al.es.gov.br/portal/frmShowContent.aspx?i=23657> Acesso em julho de 2013.
79
A especulação imobiliária também integra esse processo, uma vez que cria-se um
mercado de terras para aqueles que desejavam obter um segundo imóvel com
função turística, há registros da presença de loteamentos na região de Castelhanos
e de Ubu, no início dos anos de 1970, tema este que será melhor visto no próximo
capítulo.
Portuguez (1998, p. 38) aborda o interesse do turismo direcionado à área litorânea:
Nessa época já se aponta o início de uma política formal mais voltada ao setor
turístico com ênfase no papel do município, o que vai culminar com uma lei de
municipalização do setor, conforme vemos abaixo.
Decreto nº 130, de 30/03/94, que con base em la Ley nº 8.490, del 19/11/92,
creó el Comité Ejecutivo para el Programa Nacional de Municipalización del
Turismo del entonces Ministerio de la Industria, del Comercio y del Turismo.
(PORTUGUEZ, 2010, p. 374)
Foi feita então uma articulação do empresário, dono do hotel, com a Prefeitura
Municipal com o intuito de remover os pescadores que ali habitavam. Para a
empresa hoteleira, era imprescindível que os pescadores se mudassem, pois o
caráter do empreendimento exigia a privatização do espaço e o consequente
“b t ” s s t s s us j “ g z ” s g
81
E ss st Es í t t s s ss â u “
s v v t ” x t é 1970, o momento de
implantação de grandes plantas industriais. Tendo a Região Metropolitana da
Grande Vitória como destino prioritário e, além desta, o município de Aracruz, com a
produção de celulose e o município de Anchieta, com a Samarco produzindo as
pelotas de ferro. No litoral norte, Portuguez (2010) destaca a implantação de
empreendimentos atrelados ao setor de hidrocarbonetos, economia esta que
também afetou intensamente as comunidades pesqueiras de Regência e Povoação
e nos anos de 1990, atinge os povoados pesqueiros de Degredo, Pontal do Ipiranga
e Barra Seca.
36
Corresponde a uma etapa posterior ao recebimento de polpa de concentrado oriundo da usina de
Germano (MG). O minério em pó misturado a água passa pelo processo de decantação
proporcionando a separação do minério da água. A água com poluentes e elementos químicos é
decantada em bacias e, por meio de efluente, é descartada na lagoa de Mãe-Bá, dando então vazão
ao mar por meio de comportas.
37
O termo dividendo, obviamente, deriva do verbo dividir. Ele dá nome à divisão dos lucros de uma
empresa entre seus acionistas, após os descontos de imposto de renda e contribuição social. Quando
uma companhia vai bem e obtém lucro, ela é obrigada, por lei, a entregar pelo menos 25% desse
lucro aos acionistas. Normalmente isso acontece uma vez por ano, após o fechamento do balanço
(Fonte: IPEA, 2006)
87
Na época era regime militar. A gente não sabia de nada não. Quando
a gente viu já tavam metendo máquina pra tudo quanto é lado e a
gente olhando um pra cara do outro sem saber o que fazer. (Sr. S,
Pescador, 53 anos).
Em 1993, há o início das exportações para o mercado chinês por parte da Samarco
e, ao contrário de se limitar às expressivas cifras que os noticiários divulgam, propõe
intensificar as contradições inerentes ao seu vultoso crescimento na virada do século
XX para o século XXI: a pressão sobre os recursos naturais e o acirramento das
desigualdades sociais. Dentre as inúmeras consequências destacam-se também a
padronização do ritmo de trabalho intensivo e extensivo, o aumento da concentração
de renda e a danificação ao meio ambiente (JABOUR, 2008).
Em 1998 a empresa destacou-se por receber a certificação ISO 14001 para todas as
etapas de seu processo. A ISO 14001 refere-se a um sistema de gestão ambiental
que regula as etapas do processo de padronização e certificação de empresas em
nível internacional, favorecendo as práticas de comércio internacional diante das
s t s x gê s tv s “sust t b b t ” Ao contrário do valor
positivo que a mídia insiste em atribuir a tais certificações, contrapõe-se um forte
questionamento sobre os critérios requeridos na obtenção das mesmas (PORTO-
GONÇALVES, 2006). O autor também atenta para o fato de que e quem define
como são estabelecidos os instrumentos regulatórios dos impactos sócioambientais,
pois muitos têm sido forjados, internacionalmente, sendo as mesmas grandes
corporações transnacionais que afetam, em grande escala, o meio ambiente.
f tv t st s suj t s s b gué f z “b us ” u hor,
“us st tég ” utt t s t s í s qu
v s “ g t táv s” s u s s quê s
podem ser vistas na apreensão coletiva de pautas definidas pelas grandes
corporações, em detrimento das pautas vividas em nosso cotidiano.
38
Lei Complementar nº 87 de 13 de setembro se 1996 apresentada pelo Deputado Antônio Kandir e
aprovada pelo Congresso Nacional durante a sua gestão como Ministro do Planejamento do Governo
Fernando Henrique Cardoso, substituiu o Decreto-Lei nº 406/68, estendendo a exoneração do ICMS
para a exportação de produtos primários e semi-elaborados, numa ação estratégica de busca de
reequilíbrio das contas externas do país L K f “ st tu z ” E
nº42/2003concedendo imunidade do ICMS para toda e qualquer operação de exportação, garantindo
aos exportadores o aproveitamento total do respectivo crédito (SOARES, 2007).
89
Em 2000 a empresa Vale e BHP Billinton compram, cada uma, 50% da Samarco,
passando a ser as suas novas proprietárias. Novas expectativas de expansão logo
se confirmam com a criação de dois escritórios sendo um em Amsterdã (Holanda) e
o outro em Hong Kong (China). Novos sujeitos passam a compor a rede de
abrangência de negócio e poder da empresa.
39
A Lei NORMAM-08/DPC, capítulo 3, seção II, de 2003, impõe restrições severas à atividade da
pesca num raio de 500 metros, ao redor de áreas portuárias e plataformas de petróleo, portanto, ao
ser construída uma dessas estruturas, a restrição ao seu uso passa a ser contínua, estando o
pescador sujeito a
multas aplicadas pela Capitania dos Portos (MARINHA DO BRASIL. DIRETORIA DE PORTOS E
COSTAS, 2003).
90
Note que apesar dos pescadores estarem incluídos na dinâmica das relações de
poder, estes estariam posicionados dentro de um paradigma territorial distinto de
todos os outros sujeitos que aí atuam, os quais se caracterizam conforme
apresentado no quadro 6:
93
PARADIGMA PARADIGMA
TERRITORIAL 1 TERRITORIAL 2
Sujeitos Pescadores Empreendedores do segmento
do turismo, Estado, Samarco,
mercado consumidor de pellets.
Objetivos Práticas simbólico- Recurso enquanto valor de
identitárias, fonte de troca, controle físico para
recursos, valor de uso obtenção de produção e lucro.
e abrigo físico.
Ações Construção de redes Disciplinarização e controle
de afetividade e restritivo e excludente.
segurança.
Modos de uso e Coexistência de Princípio da exclusividade e
ocupação múltiplas identidades. unifuncionalidade.
Acessibilidade Restrita, com Alto potencial de compressão
multiterritorial pouquíssimo caráter espaço-tempo para viabilizar
potencial. seus negócios.
Temporalidade Tempo próprio, único, Tempo da modernidade
construído ao longo de abrangente que incorpora
gerações. forçosamente outros tempos.
Modalidade do Territorializações mais Territorializações efetivamente
território flexíves, admitindo múltiplas, que usam a vasta
conjunção com outros conexão flexível que tem no
territórios, sem território zonal e nos territórios
pretensão de se fechar em rede, para se apoderarem
totalmente. do território, penetrando em
territórios mais flexíveis e
determinando seus usos.
Fonte: Elaboração por Josilene Corrêa a partir de proposição de Haesbaert (2004a).
Apesar do Estado assumir o papel de destaque no título desse capítulo, ele não
assume sozinho o papel de executor da politica de desenvolvimento urbano-
industrial para o município estudado a partir do Plano de Desenvolvimento Espírito
Santo 2025, o ES-2025. Pelo contrário, busca-se partir desse ator público,
estabelecer os laços com os demais sujeitos que interferem na dinâmica territorial do
lugar, apontando seus objetivos, funções, estratégias e escalas de ação.
Na última década, podemos dizer que a RMGV tem se consolidado enquanto região
metropolitana, centralizando uma vasta rede urbana, ao mesmo tempo em que se
expressa em uma crescente e complexa teia de inter-relações econômicas e sociais
(ZANOTELLI, 2010), associada aos conhecidos problemas das grandes
aglomerações: a sobrecarga da infra-estrutura e dos serviços de atendimento ao
público, restrição da mobilidade, especulação imobiliária, segregação e degradação
sócioambiental, dentre outros.
Para este trabalho, tomou-se por base a nomenclatura adotada, depois de outros
pesquisadores, por Zanotelli et al. (2013, p. 01), intitulada Região Metropolitana
Expandida da Grande Vitória, abrangendo os município de Aracruz e Anchieta, pelo
fato de ambas terem, respectivamente, importantes indústrias de celulose e
s ug é t “[ ] u t g u t ê t s
industriais e de migração habitat-trabalho com os município da região metropolitana
f [ ]”( )
96
t t s t t s st s u “ g st s” t s
frequentemente acionados, forjando uma homogeneidade momentânea, desviando a
atenção das duras desigualdades ocasionadas por investimentos geograficamente
just s s t “ át s” s s us g s v st s
Até o final do século XX, Rainha (2012, p. 19) afirma que a participação do
empresariado em processos públicos decisórios ocorreu da seguinte forma:
x b ” f s u u u v s 105 ss s b s
individualmente ou em pequenos grupos, as quais foram consideradas atores
relevantes para contribuir com suas expectativas sociais em relação ao futuro do
Est “ squ s qu t t v ”
su t s u u t t s“ s s s” t
tf s t s v gê s “v sõ s futu ” ss s
pontos de divergência que também teriam servido de base de informações para a
construção de cenários variados.
ss ú s v st t s “ sf s” úb s v b z
desenvolvimento estadual por meio do ES-2025, à Anchieta é atribuída a condição
101
Os municípios tiveram que incluir essa exigência nas suas leis orgânicas, e
passariam a ter vantagens por ocasião da liberação de recurso estadual e da
105
A Agenda XXI também foi elaborada na mesma época do PDM e veio atender as
prerrogativas do Ministério do Meio Ambiente em Associar Desenvolvimento
Sustentável, o que pressupõe integrar crescimento econômico, proteção ambiental e
justiça ambiental, condição esta que se tem mostrado incompatível diante das
inúmeras contestações aqui citadas.
106
A empresa Samarco apesar de não ser um sujeito local recente, também compõe o
eixo de expansão projetado para o município, principalmente a partir de meados dos
anos 2000, quando esta passa a estar sob o controle acionário, em partes iguais de
capital da Vale S. A. (multinacional brasileira) e BHP Billiton (multinacional
australiana), e constitui - se essencialmente em exportadora de pelotas de ferro para
o mercado siderúrgico mundial, em particular o mercado Chinês (SAMARCO, 2012),
o seu principal consumidor. Atualmente, a empresa é a 2ª maior exportadora
nacional de pelotas de minério de ferro, sendo superada apenas pela Vale, sua
partícipe (SAMARCO/CEPEMAR, 2009).
107
40
Licenciamento Ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão competente licencia a localização,
instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades de pessoas naturais ou jurídicas de direito
público ou privado que utilizem recursos ambientais e sejam consideradas efetivas ou potencialmente poluidoras
ou, ainda, daquelas que, sob qualquer forma ou intensidade, possam causar degradação ambiental,
considerando as disposições gerais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. Fonte:
Disponível em: <http://www.meioambiente.es.gov.br/default.asp#fluxograma>. Acesso em jun. 2013.
108
Dessa forma, o que não fica evidente no plano as recorrentes reclamações acerca
do aumento da poluição atmosférica, apontadas no próprio Relatório, mas logo são
banalizadas pelas medidas compensatórias previstas na própria legislação
ambiental.
110
É importante observar que havia uma disputa política acerca de onde seria o porto e
a Usina CSU, pois também se cogitava a possibilidade de todo o projeto do polo se
localizar no nordeste brasileiro.
Nesta avaliação, um fator limitante foi a bacia hidrográfica do Rio Benevente, que foi
diagnosticada insuficiente para suprir as necessidades previstas com o aumento de
população do município nos próximos anos (ESPIRITO SANTO EM
3
AÇÃO/CEPEMAR, 2008). O gasto pelo empreendimento de 1.800 m de água por
hora, previsto na primeira etapa, aumentaria ainda mais essa insuficiência. Ou seja,
logo haveria falta d´água para abastecer o consumo de água potável pela
população. E isso seria ainda mais grave na fase de sua expansão.
41
O Termo de Referência contempla as diretrizes gerais da Resolução CONAMA nº 001/86
contemplando os dispositivos legais sobre as peculiaridades do empreendimento e da área onde se
pretende instalar um projeto, norteando os trabalhos relativos ao EIA/RIMA do empreendimento que se
pretende licenciar. Neste caso, o Termo de Referência do Polo serviu prioritariamente para o Governo e
empresariado realizar os estudos necessários à viabilização de Plano Diretor de Ocupação do Polo,
sendo estes estudos técnicos rateados entre empresas SERENG Engenharia e Consultoria S.A.,
FUTURA Consultoria e CEPEMAR Consultoria e Meio Ambiente, de acordo com as temáticas
consideradas pertinentes a cada uma, sendo a última, a mesma responsável pela elaboração do Termo
de Referência e Relatório de Impacto Ambiental, ambos apresentados ao IEMA.
112
A pretensão era que o novo porto tivesse calado de 28a 30 metros, o que o colocaria
como o primeiro terminal de águas profundas do país. Hoje, o porto com maior
profundidade é o do Maranhão, também operado pela Vale, que possui 23 metros de
calado.
O porto seria construído próximo ao que já existe e é operado pela Samarco, que
tem calado de 18 metros (Cf. mapa 4). Nessa mesma época a previsão era de que a
estrutura portuária ficasse pronta até o final de 2011, quando deveria entrar em
funcionamento a nova siderúrgica, o que de fato não ocorreu.
114
A Petrobras decidiu implantar em Anchieta sua base portuária (Cf. mapa 4) para
atender as plataformas que já operam e, as que pretendem, nos próximos anos,
fazer operar na bacia do ES, sendo que atualmente boa parte desse atendimento é
realizado pela base de Macaé e Companhia Portuária de Vila velha. Esta base de
apoio foi planejada desde 2006, caracterizando-se por ter sido o estopim das
efetivas manifestações dos Pescadores Artesanais de Ubu e Parati.
O projeto prevê um porto na Praia denominada de Além pela própria empresa, mas
que corresponde a mesma praia utilizada pelos pescadores há gerações, para a
realização de suas atividades de pesca (Cf. mapa 4).
Destacamos ainda alguns números que fazem dessa empresa um segmento que
tem facilidade na flexibilização dos territórios quando se é necessário (Quadro8).
É uma empresa com grande representatividade também no que tange aos impostos
gerados para os governos federal, estadual e municipal, além das participações
especiais e royalties - gerados pela exploração do petróleo, para os municípios e
estado – a empresa encontra-se pelo menos desde 1995 (Exame, 2012) na primeira
posição no ranking das maiores empresas do país, e é a primeira do mundo em
tecnologia de exploração de petróleo em águas profundas (PETROBRAS, 2013).
Com isso, a esta empresa também estão atrelados graves conflitos sócioambientais,
116
Fonte: Organizado por Josilene Corrêa e arte de Henrique Viana (junho de 2013).
119
Fonte: Organizado por Josilene Corrêa e arte de Henrique Viana (junho de 2013).
120
Você tinha que ver como era aqui! A gente chegava a mirar42 as redes
três, quatro ou mais vezes num dia. Podia largar a rede lá em qualquer
43
lance que vinha xaréu, xixarro, sarda, robalo e utras
qualidades...agora, dependendo da época, a gente não consegue nem
tirar o sustento pros filhos comerem! (Pescador P, 63 anos)
42
Coletar o pescado que era capturado nas redes de pesca.
43
Lance: denominação dada ao ponto de referência para a delimitação das áreas de pesca
entre os pescadores artesanais. Por exemplo, em um lance, ou seja, naquele ponto, pode
haver 1, 2, 6 ou até mais pescadores que instalam suas redes, dependendo das condições
oferecidas pelo ambiente natural e alcance do lance. Em média, cada rede seria um pescador
ou uma família, o qual amarraria sua rede na rede do companheiro, e assim, sucessivamente,
formando um cordão único de redes de pesca.
124
É uma biboca que separa Ubu e Parati. Aquilo ali era um caminho que
tinha umas pedras que segundo a história, foi onde o (o corpo do)
Padre Anchieta caiu. Mas aquilo era só um caminho, era mato e só
tinha um caminho. Não tinha luz, era a lua que clareava pra gente. Em
Parati me falaram que Ubu foi primeiro (...). Depois começou a existir o
Parati. Alguém foi pra lá e fez uma casinha lá no meio do mato. Ai outro
alguém foi e outro alguém foi. Mas, tudo quase na mesma época.
(Pescador N, 62 anos).
Foto 8 - Rua Mario Pereira das Neves, principal rua de Ubu paralela à costa.
Note as casas apenas no lado esquerdo da rua.
Como pode-se observar, a Rua Mario Pereira das Neves (Foto 8), a rua à beira
mar de Ubu, apresenta casas apenas em uma lado da calçada, defronte à
praia. Diferentemente de Ubu, a rua principal de Parati, denominada Manoel
Miranda Garcia, apresenta casas em ambos os lados da rua, indicando um
maior estreitamento desta quando comparada a rua principal de Ubu (Foto 10).
Foto 10 - Entrada da região de Parati, com acesso pela R. Mario Pereira das
Neves que inicia em Ubu.
Foto 11 - F x g b s “P ss s Anchieta”
na Rua Manoel Miranda Garcia, entrada de Parati.
Isso aqui tava todo destruído. Foi ai que eu pedi pela associação para
restaurar isso tudo aqui. Tava quase tudo caindo isso aqui. Aí eles fizeram
isso aqui. Já fizeram em nome da Associação. Mandaram a carta,
reconhecendo a gente e dizendo que tinham aceito o pedido da
Associação, e que logo ia ser restaurada a biboca. Aqui tinha uma água
quando a maré tava seca, era uma água doce, um poço, a gente passava
aqui em baixo por causa da água. Agora da onde era eu não sei. Mas
agora não tem mais, depois que as máquinas entraram aqui, o pocinho
sumiu. (Pescador S, 53).
44
De acordo com Albino, Girardi e Nascimento (2001), esta área da costa litorânea espírito-
santense é abrangida pela Formação Barreiras, sendo composta por falésias e terraços de
abrasão marinha, com tendência a retrogradação. Neste trecho correspondente ao acesso e
entrada da região de Parati, observa-se uma elevação na altitude do relevo em relação à
região de Ubu associada à presença de um imediato trecho de costão rochoso. Como há
ausência de cordão litorâneo que separa o costão rochoso e a encosta, a ação das ondas
torna-se mais destrutiva agravada pela retirada da vegetação para a abertura do caminho que
dava acesso ao Parati.
128
tu t s s s su s f í s v “ g á ” s
Ubu e Parati, compartilham o lugar com vários outros sujeitos: turistas,
empresas e pessoas de distintas regiões e com distintos perfis
sócioeconômicos que ocupam o lugar de forma eventual ou continuamente.
45
Dados obtidos a partir dos Documentos da APUP (2008).
130
ANOS Domicílios
1970 90 (valor aproximado)
2010 850
Fonte: Elaborado pela autora com base na análise de fotografia aérea de 1970 e no último
censo do IBGE (2010).
PARTICIPANTES
Domicílio permanentemente ocupados 460
Domicílios não ocupados (uso ocasional) 390
Total de domicílios 850
Fonte: Elaborada pela autora com base no último censo (IBGE, 2010) .
t t u s u s j s s í s “ t s
o u s” s sub-ocupados em relação à média estadual.
46
Os pescadores descrevem a batinga como um barro fácil de modelar e com a resistência necessária
para o preenchimento da estrutura das paredes, na construção das casas.
133
PARTICIPANTES
Sempre morou 12
Migrou para a região 02
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
PARTICIPANTES
Região de Ubu e Parati 12
Interior de Anchieta 01
Outras regiões 01
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
Um dado recorrente nas entrevistas foi o fato de muitos dos pescadores que
habitavam à beira mar venderem suas casas, mudando-se para onde eles
v “ t t s aqui de ” á st qu s
área de expansão da ocupação de Ubu e Parati (Cf. mapa 5).
Foto 15 - Casa disponível para aluguel Foto 16- Imóvel de antigo pescador à
permanente ou temporário em Ubu. venda em Ubu.
Fonte: Josilene Corrêa (junho de 2013) Fonte: Josilene Correa (junho de 2013)
Os conteúdos das fotos acima (Cf. fotos 17 e 18) nos dão algumas pistas
acerca das diferentes condições sócioeconômicas dos pescadores, pois
percebeu-se que aqueles que possuem melhores instrumentos de trabalho, a
exemplo de barcos maiores, possuem habitações maiores e melhor
estruturadas que aqueles que não possuem barco ou possuem um barco
menor.
PARTICIPANTES
Possuem imóvel próprio 11
Não possuem imóvel próprio 03
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
Mapa 6 – Áreas afetadas pelo polo industrial de Anchieta. A elipse engloba os territórios do habitar e do trabalhar, ambos afetados pelos
grandes empreendimentos.
Fonte: Elaborado por Josilene Corrêa e Fabrício Holanda (junho de 2013).
141
RECLAMAÇÃOES PARTICIPANTES
Poluição do ar e da água 10
Mudança da correnteza 02
Não há reclamação 02
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
Note que em relação ao nível de PTS, a região onde localiza-se Ubu e Parati
s t u qu “ á”. Mesmo na comunidade de Mãe-bá ela é
t bé “ á” qu t Gu su ss f s t -se entre
“ gu ” “I qu ”
senão eles vão admitir que deram prejuízo pra gente. (Pescador T,
54 anos)
recebe até os dias atuais os seus resíduos, bem como o mar que recebe
estes e o material colhido pelas dragagens do Porto de Ubu.
PARTICIPANTES
Depende totalmente 10
Depende parcialmente 04
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
PARTICIPANTES
Possuem familiares que trabalham ou trabalharam em 12
empresas prestadoras de serviços terceirizados à Samarco
Possuem familiares que trabalham na pesca 07
Possuem familiares que trabalham no comércio 03
Possuem familiares que trabalham no funcionalismo público 02
Possui familiar que trabalha na Samarco 01
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
146
PARTICIPANTES
Incentiva os filhos a serem pescadores 05
Não incentiva os filhos a serem pescadores 09
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
animais, tais como galinha, peru, pato, cabrito, vaca e cavalo. Nessas
histórias, há uma recorrência acerca da prioridade do auto-sustento, quanto
ao objetivo da produção. Entre a rotina das tarefas cotidianas, misturavam-
se as alegrias do lazer. Veja.
PARTICIPANTES
Aprendeu com os pais ou avós 10
Aprendeu com outros membros da 02
comunidade
Aprendeu com o cônjuge 02
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
“s b f z ” qu v v b s s s é b st t
curioso. Estas eram produzidas com matérias primas que não são mais
usadas atualmente, a exemplo das espécies de plantas denominadas
popularmente de tucum e gravatá.
Após o processo de putrefação da planta, suas fibras eram limpas para dar
início a uma outra etapa da confecção da rede, a qual consistia no preparo
dos fios a serem unidos até alcançarem um nível de resistência
considerável e comprimento suficiente. Este procedimento era feito em
u áqu t s “ fus s” ss f
associando o trabalho artesanal ao trabalho manual, os fios eram
151
Havia ainda pescadores da região que migravam para outras regiões, para
exercer a atividade da pesca industrial, evidenciando o princícipio da
fluidez territorial, ressaltada por Haesbaert (2004a) sempre presente na
vida das sociedades.
153
Além das longas jornadas de trabalho e longos períodos fora 47, ouviram-se
também relatos acerca das difíceis condições de trabalho às quais os
trabalhadores que atuavam na pesca empresarial eram submetidos, tendo
muitas vezes sua saúde comprometida. Algumas pescadoras relataram
ainda que quando os maridos se ausentavam por semanas, elas sentiam-
se seguras por saberem que elas próprias podiam ir em busca do alimento
47
Tais períodos variavam, em média, de 4 dias a 4 semanas.
154
para seus filhos, uma vez que o lugar lhes dispunha de boas condições
para a cata do sururu e também do peixe da lagoa de Ubu.
INSTRUMENTO DESCRIÇÃO
Caíco Barco de propulsão manual, também conhecido como barco a
remo com 3 m de comprimento, com capacidade para 500 kg
brutos.
Bateira Barco a motor, o qual varia entre 6 a 10 metros de
comprimento e com capacidade que varia de 4 a 20 toneladas
brutas.
Rede de espera Rede a ser instalada em um lugar fixo para capturar peixes ao
longo de um dia, sendo retirada apenas no dia seguinte.
Rede de fundo Rede usada para capturar peixes no mesmo dia.
Linha Usada na captura individual do pescado.
Pote Cano de aproximadamente 40 cm de altura e 15 cm de raio
usado na captura do polvo.
Tarrafa Usada na captura de lagosta e siri.
Puçá Rede de pesca de malha melhor usada na captura de
camarão e siri.
Gaiola ou covo Usada para capturar peixes menores que servirão de iscas
para a pesca de espécies maiores.
Cavadeira Cano longo de metal ou madeira usado para arrancar o sururu
da pedra onde ele se reproduz. É geralmente usado com um
balde de plástico comum para armazenamento do marisco
coletado.
Espinhel Grande quantidade de anzóis unidos em vários pontos
apropriados.
Garatéia A garatéia é um instrumento de ferro ou madeira usada na
fixação das redes em terra firme, no mar ou em rochas.
Cordas As cordas servem para manter estendido o cordão do lance,
substituindo portanto uma rede de pesca, caso esta precise
ser retirada.
Fonte: Organizado por Josilene Corrêa (julho de 2013).
156
PARTICIPANTES
Possui barco de remo 09
Possui 1 barco de remo e 1 a 02
motor
Não possui barco próprio 03
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
PARTICIPANTES
Possuem rede de espera, rede de fundo e linha 08
Possuem balde e cavadeira 05
Possui rede de espera, rede de fundo, linha e 01
espinhel
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
G v F f gu IB ( 010) gu t u qu “
s ” u t é s s s f v s s s
redes foram então recolhidas por meio de compra, pois os pescadores na
maioria das redes só usavam o nylon, uma vez que este material apresenta
mais durabilidade que o fio de seda.
159
PARTICIPANTES
1º grau incompleto 08
1º grau completo 03
2º grau incompleto 01
2º grau completo 02
TOTAL 14
Fonte: Questionários aplicados a 14 pescadores e pescadoras de Ubu e Parati (2013).
T v s u õ s “t s” s s tê s u “s b -f z ”
artesanal, o que não se aprende nas escolas formais e cujos valores
apresentam relevância para sobrevivência das pessoas do lugar.
qu t “ ” s Qu z qu
pescador tem que ter cara, ou tem que ser feio?
48
Período de quatro meses em que não se pode pescar para permitir a reprodução das espécies.
163
s s quê s s v st s t tu s t “ s
s ” s s v s t s t t s
imposições. Por outro lado, as frequentemente multas a ele aplicadas
f z qu ut s s s t “j g f s ”
receio de serem multados pelo IBAMA ou pela Capitania dos Portos,
conforme as falas de pescadores durante a Palestra sobre Licença de
Pesca para Embarcações, realizada no dia 27 de junho de 2013 na
Câmara Municipal de Anchieta49. Nesta palestra encontravam-se inúmeros
representantes de organizações vinculadas ao setor pesqueiro, os quais
expuseram suas dificuldades em cumprir as exigências estabelecidas para
obtenção da Licença de Pesca, especialmente aqueles que enquadram-se
na categoria de pesca artesanal, mas têm que definir previamente as
espécies que pretendem capturar para a obtenção da Licença.
49
A referida palestra foi organizada pela Prefeitura Municipal de Anchieta, por meio da Secretaria
Municipal de Agricultura, Pesca e Abastecimento, Colônia de Pescadores Z-4 de Anchieta, IFES e
INCAPER, cujos debates giraram em torno das regras concernentes a obtenção de licença de pesca,
além da divulgação de informações acerca do Plano Safra da Pesca e Aquicultura
(2012/2013/2014) o referido Plano consiste na disponibilização de 4,1 bilhões em linhas de crédito
e investimentos por meio de Ações do Ministério da Pesca e Aquicultura voltadas a ampliação da
cadeia produtiva da indústria do pescado para atendimento da demanda nacional e mundial. Sob
os recorrentes rótulos do desenvolvimento sustentável, geração de emprego e inclusão social, o
Governo Federal reforça o valor da segmentação da pesca dentro da lógica de mercado
competitivo e lucrativo, incentivando ações empreendedoras por parte dos pescadores.
164
ss ut s gõ s t â s s í sf “ st s”
nas calçadas e nos bancos de areias da praia, ficando suscetíveis às
intempéries do tempo e as ações depredatórias de turistas que prejudicam
os pescadores de Ubu e Parati, diferentemente dos incômodos insetos e
abutres que importunam os pescadores de Povoação, no litoral de
Linhares (Portuguez, 2010). Como diz um pescador:
Jogaram meu barco nas pedras... Fiquei quase dois meses sem
meu barco esperando a menina (filha) me ajudar a consertar (...).
Eu gastei quase uns R$ 2.500,00 para consertar ele todo,
comprando uns equipamentos pra eu mesmo consertar. Sabe o
que é isso? As pessoas vem pra cá e não entendem as coisas,
não entendem que se isso tava aqui é porque alguém deixou isso
aqui! É porque isso é importante para alguém. E esse alguém fui
eu criatura de Deus! (Perscador S, 53 anos).
166
O projeto de construção do atracadouro ainda faz parte dos planos atuais dos
pescadores de Ubu e Parati, tendo eles reenviado a solicitação de pedido de
licença ao IEMA, associado ao pedido de autorização para construção de uma
fábrica de gelo, realidade essa já conquistada pelos pescadores de Regência
(Portuguez, 2010).
50
O financiamento da construção do Mercado de Peixe foi viabilizado pelo Edital 2007 do
projeto social Petrobras Ciranda Capixaba, o qual financia iniciativas comunitárias de regiões
de área de influência das Unidades de Operações de Exploração e Produção da empresa.
169
Na opinião dos pescadores de Ubu e Parati o projeto Tamar acaba dando uma
importância exagerada à uma espécie como se as demais não tivessem o
direito a proteção, expondo isso na última reunião junto à Samarco, na
discussão acerca dos impactos decorrentes das dragagens. No Estudo
Ambiental (SAMARCO/APLYSIA, 2013) constava que um dos critérios usados
170
Até a década de 1980, os pesadores de Ubu e Parati relatam que não tinham
como foco a captura das tartarugas, mas quando estas vinham nas suas redes,
sv v u “ s qu ” s s s g qu t t ug
sempre foi capturada para a prática da subsistência, o que não seria razão
suficiente para um super projeto de preservação intensa e restritiva aos
pescadores. Contudo, ouvindo uma conversa informal entre uma bióloga e um
colega, esta contou que prestava serviço a uma empresa terceirizada que
participava do monitoramento da orla sul-capixaba. Os resultados obtidos nos
trabalhos de monitoramento indicavam que os pescadores encontravam-se no
topo da lista dos predadores das tartarugas, sendo a captura nas redes de
pesca a principal causa de suas mortes. Buscou-se referências para se ter
acesso a este relatório, mas nada foi encontrado a princípio.
Quanto aos prejuízos sociais, estes são ainda mais complexos, pois remetem
estudos ainda mais abrangentes, que revelem as relações de interdependência
entre a espécie e o viver do grupo. A tradicional separação entre homem e
171
Por outro lado, o que não pode ficar oculto é a evidente prática de injustiça
ambiental que se coloca. Como podem os pescadores serem acusados e
punidos pela matança ou captura de espécies de animais proibidas por lei
enquanto a Petrobras e a Vale-Samarco ficam impunes diante dos já relatados
e registrados impactos ao meio ambiente e à Comunidade do lugar? Sem
contar que pescadores que trabalham na empresa Samarco, prestando serviço
em suas plataformas, afirmam que visualizaram vários animais marinhos
mortos nos tubos da draga. Onde escontram-se estas estatísticas de
mortandade?
51
A limpeza das redes é uma etapa fundamental no trabalho da pesca. As redes precisam ser lavadas a
cada 3 a 4 dias e é feita mediante a sua colocação na areia da praia para que o atrito entre ela e a água
do mar retire os sedimento que ficam fixados nela. Posteriormente a rede deve permanecer ao sol para
secar. Caso a rede passe do tempo necessário da lavagem, torna-se mais difícil a sua limpeza. Com as
atividades da dragagem do Porto de Ubu, os pescadores afirmam que o “mar é revirado” e os
sedimentos que surgem nas redes se fixam mais que normalmente.
172
elaborado em 2009, mas só foi assinado pelo atual prefeito no dia 19 de janeiro
de 2013.
A luta pela renda básica foi fruto de uma articulação com um dos vereadores
para aprovação de um projeto de lei, na Câmara do Município de Anchieta,
obtendo recurso de um fundo especial a ser gerenciado por um grupo gestor,
incluindo representantes dos pescadores artesanais, pelo qual pretende-se
assegurar uma renda básica aos pescadores e pescadoras afetados pelos
grandes projetos em suas áreas pesqueiras.
Por outro lado, os mais jovens que possuem menos vínculo com a pesca, têm
bus g “ sf s” s s sf st s s b
configuração do mercado de trabalho cada vez mais ligado às atividades
industriais e urbanas.
52
A Secretaria de Inclusão Digital (SID) do Ministério das Comunicações, criada em 2011 (Decreto nº 7.462, de 19
de abril de 2011), tem como principal atribuição a formulação, execução e articulação de políticas públicas relativas
à inclusão digital no âmbito do Governo Federal (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, 2011).
175
a) O Campo de Futebol
Imagem 9 – Rede territorial dos pescadores de Ubu e Parati até o início dos
s 1970 s “ ós” t t s ug s su t t
mediação espacial nas relações sociais, os quais foram descritos como fator de
fragilização da identidade territorial desses pescadores, os quais detinham
naquele lugar as condições para a manutenção da sua sobrevivência biológica,
cultural e sua independência econômica.
53
Lembremos o fato de que a empresa Samarco foi comprada pela empresa Vale no ano de 2000, mas
como ela tem uma história própria antes de ser englobada pela Vale, ela é, em alguns momentos,
tratada separadamente neste trabalho.
180
(continua)
-1º qu t s s s f ss gu “ v ”
companheiro;
-2º que houvesse um revezamento diário dos lances de pesca, uma vez que,
dependendo da localização do lance, sabia – se da variação da qualidade das
condições biofísicas e dos diferentes resultados produtivos.
-3º ao final do mês, ao longo do verão, havia um sorteio para a redistribuição
dos lances, de maneira que não houvesse privilégio para aqueles que
eventualmente se beneficiassem de melhores condições biofísicas da área do
lance.
Leia-se a descrição do pescador sobre o sistema de lance repartido.
Até 90, cada pescador tinha a sua rede então vamos supor assim: se
eu coloquei minha rede aqui às 06:00h da manhã de hoje, amanhã às
54
Neste trabalho, considera-se a geração atual o grupo de pescadores que tem compartilhado o
território com as referidas grandes empresas, dentre outros segmentos econômicos, sentindo-se
prejudicados pelos mesmos, seja pela perda de território de trabalho, seja pela perda da qualidade do
meio ambiente em seu entorno. Estes oscilam entre a faixa etária dos 30 aos 80 anos.
183
Nota-se o fato de que o sistema de lance repartido não era atribuído a todas as
áreas pesqueiras de Ubu e Parati, mas apenas nas áreas mais disputadas,
conforme vê-se no mapa 8.
Além da produção obtida por meio da pesca no lance repartido, havia também
a possibilidade de se produzir por meio da pesca com linha, puçá e em áreas
d s “ v s” st st s s v s g s g st
territorial coletiva. Era possível também utilizar os pontos de pesca fora
qu s g b s s “ s t s” N t t s s s
relembram que isso era opcional devido à fartura do pescado até o início dos
anos de 1970.
Mapa 8 – Lances de pesca dos pescadores de Ubu e Parati: lances repartidos e lances livres.
Fonte: Elaborado por Josilene Corrêa e Ramon Cândido (junho de 2013).
185
Sinto saudade daquela época em que a gente vivia em paz, tranquilo, não
tinha barulho, não tinha poluição, a gente se organizava e dava tudo certo,
cada um no seu lance. Quando tinha algum problema era só chamar o Seu
Magno que ele resolvia tudo. (Pescador P, 63 anos)
s s“ s t ou de pesca” s t v t g st s
próximos à praia, o que confere aos pescadores maior facilidade de acesso. Já os
demais pescadores, fixam suas redes a partir do primeiro lance formando um cordão
de redes, sem uma sequência necessariamente rígida.
Numa conversa informal com uma pescadora de 75 anos, nota-se uma evidente
insatisfação pela supressão do sistema de lance repartido, quando desabafa
z qu “ tg t tinha dono, mas hoje o mar tem dono (...) até
isso, porque os lances ali são de Fulano, Cicrano e Beltrano, é só deles. Ali ninguém
x qu z qu já tá !” f t s s t -se
desprivilegiada com as mudanças nas regras de uso do espaço marítimo.
55
GPS corresponde a um aparelho de recepção de sinais de satélite, os quais servem para a
identificação das coordenadas geográficas, a serem inseridas, posteriormente, em programas de
computador, disponibilizando a identificação das localidades pretendidas.
187
A intenção inicial era fazer todos os registros fotográficos dos lances a partir do
sentido mar-terra. Entretanto, não foi possível fazer o registro destes dois
lances, com vista a partir do mar.
Este trecho de praia constitui importante área do trabalho da pesca para todos
s s s t s s g s us v ut z “ st ”
u “gu ”b s s su s s
Meu pai com 86 anos dizia que isso aqui era Tiquiçaba, meu
avô que eu também conheci dizia que isso aqui era Tiquiçaba,
outras pessoas que já morreram com noventa e tantos anos
também sempre falaram que isso aqui era Tiquiçaba, esse
finado Magno dizia que era Tiquiçaba, aí não tem como dizer
outra coisa. (Pescador S, 53 anos)
maior ou menos grande, por exemplo, ela não gosta de muita chuva não, ela
f t s ! g st qu tu ! E j ”
Foto 40 – Ex f ug “ ”é ss t é
pelos moradores da região.
P N st u s s t “ s” s v s
pescadores, era o local de onde obtinha-se o marisco sururu, na verdade, os
rochedos que compõem o costão de Anchieta à Guarapari abrangiam o seu
ecossistema.
O sururu morreu tudo. Foi pena você ter vindo na maré alta,
porque na maré baixa você vê tudo, não tem mais sururu não,
só tem aqueles esquentações na pedra, mas os que a gente
come mesmo, morreu tudo. Foi ali que eu fiz as fotos, pegando
isso tudo até o Hotel Pontal. E eles (as empresas) ainda
f ( t ) “v ês f z ss s f t s u ?” í
eu disse, se tiver Hotel Pontal na lua, então eu tive lá (na lua)!
(Pescador S, 53 anos)
Esta destruição dos nichos de sururu, até hoje não foi avaliada nem pela
empresa Samarco e nem pela empresa Petrobras que também é apontada
como responsável pela destruição do ecossistema do sururu. Até hoje, ambas
se recusam a assumir o crime sócioambiental.
Este fato veio à tona várias vezes durante as entrevistas realizadas com os
pescadores sempre envoltos por um sentimento de pesar, conforme percebe-
se na fala da pescadora:
Eu não queria nunca que essas empresas tivessem vindo pra cá. Se a
minha mãe tivesse viva ela ia ter um sofrimento muito grande porque
ela adorava ir para as pedras tirar sururu. [...] Ela levava a gente com
g t v b t s “buz s”
vinha e fazia comida pra gente. Tinha até um italiano que vinha aqui e
195
s z “ qu é u t b qu gué ss
f ” (P s L 57 s)
Com esta destruição das áreas onde se reproduzia o sururu, outro circuito
territorial foi quebrado, pois as mulheres que atuavam na coleta desse marisco
passaram a migrar para Iriri (Cf. mapa 1), praia localizada próxima a fronteira
su t qu ssu “ s su u u” s
continuar exercendo seu trabalho, o que implica em custos com transporte e
no aumento do esforço físico, ao transportar sacos de aproximadamente 30
quilos do marisco. Outra alternativa por elas encontrada foi a inserção na
economia informal 56, trabalhando como diaristas, costureiras, tomando conta
de imóveis de veranistas ou serviços temporários no setor terciário, conforme
conversas informais obtidas durante a atividades de observação participante.
Ressalta-se o fato de que foram as mulheres, dentre os pescadores
entrevistados, aquelas que dependem parcialmente da pesca (Tabela 10).
56
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (2006), a economia informal abrange uma
diversidade de trabalhadores que enfrentam desvantagens, de intensidades variáveis no
contexto nacional, urbano ou rural. A economia informal absorve trabalhadores que, de outra
forma, não teriam trabalho e nem rendimento, ou seja, há uma necessidade absoluta de
obtenção imediata de renda. Eles podem trabalhar por conta própria ou serem assalariados. As
mulheres encontram-se no grupo caracterizado por abranger as primeiras vítimas dos déficits
t b g gu IT ( 006 10) “ x s f ut s
vezes ser imputada a políticas macro-econômicas e sociais inadequadas, ineficazes, mal-
planejadas ou mal implementadas, em muitos casos formuladas sem consulta tr t ”
196
Mapa 10 – Impactos da 7ª dragagem do Porto de Ubu sobre as áreas de Pesca da Comunidade de Ubu e Parati (Anchieta)
Fonte: SAMARCO/APLYSIA (julho de 2013)
197
A referida lagoa era utilizada para a lavagem das roupas na época em que não
havia água encanada, conforme ouviu-se da pescadora F de 56 anos, a qual
f u qu “qu g t v t u á v
as roupas, então, enquanto as mães faziam as tarefas, a gente brincava nos
s E s f ss u ”
Eu me lembro de uma vez quando nós fomos furar a lagoa. A gente era
tudo criança e eu me lembro que ia todo mundo, a mamãe levava a
gente. Depois que os homens conseguiam furar a lagoa aparecia muito
peixe, aí, os peixes ficavam presos nos matos, então ficava um monte
de gente pegando aqueles peixes (Pescador N, 45 anos).
Qu ut z v “fu g ” g b é
chuvarada porque a Capitania não podia saber senão eles não
autorizavam. Quando eles vinham ver a gente dizia que a chuva tinha
estourado a lagoa (Pescadora N, 61 anos).
Pra fazer a drenagem a Comunidade se reunia e cavavam uma vala do mar até
a lagoa (Imagens 10 e 11).
202
Fonte: Trabalhos de campo realizados para esta dissertação (2012/2013) e arte de Mariana
Mauro (maio de 2013).
Fonte: Trabalhos de campo realizados para esta dissertação (2012/2013) e arte de Mariana
Mauro (maio de 2013).
203
Há ainda relatos que afirmam que no final na década de 60, houve a pretensão
de se construir um empreendimento imobiliário á beira da lagoa, havendo
inclusive o início das obras de estruturação da base do prédio, mas o projeto
não teve prosseguimento.
s “ b s” s s s t submersos
qu é stá t s “b x s” st u s s su fí
mar. De acordo com os pescadores, esses rochedos correspondem a berçários
responsáveis pela reprodução do robalo, anxova, sarda, xixarro, xaréu, lagosta,
mero, badejo, garoupa São Tomé, covadinha, dentre outras espécies por eles
apontadas.
O lance a ser mostrado a seguir corresponde a Baixa Grande de Ubu (Foto 51).
Como já foi visto, as multas constituem um sério problema não apenas para os
pescadores da região de Ubu e Parati, mas também para todos os pescadores
que atuam na costa brasileira e que têm partilhado dessa multiterritorialidade
marcada pelos conflitos com grandes empreendimentos de diversos
segmentos. Isso pode ser verificado na participação em eventos, cuja temática
envolvia os direitos dos pescadores artesanais, como no II Seminário Nacional
de Espaços Costeiros, ocorrido em Salvador em junho de 2013 e palestra
intitulada Licença de Pesca para embarcações, ocorrida na Câmara da
Prefeitura Municipal de Anchieta também no mês de junho do ano corrente.
Mapa 11 - Síntese das paisagens dos lances de pesca da Praia de Tiquiçaba, Lagoa Azul e Ouriços.
Fonte: Elaborado por Josilene Corrêa e Fabrício Nascimento (maio de 2013).
211
5 CONCLUSÕES
Nesta realidade, constata-se que tais mudanças não são fruto de decisões
geradas no seio dessa Comunidade, mas sim de grupos de empreendedores
capitalistas indiferentes à territorialidade que ali existia, cujas metas
concentravam-se sobre lucrativos projetos de base industrial pesada.
213
6 REFERÊNCIAS
http://www.meioambiente.es.gov.br/download/RIMA_UTE_sudeste1.pdf>
Acesso em 02 ago. 2013.
trabalho e meio ambiente. v.3, n.1, Artigo 2, jan./ abril 2008. Disponível em <
http://www.revistas.sp.senac.br/index.php/ITF/article/view/89/114> Acesso em
22 de junho de 2013.
=2644:Macrorregioes_Planejamento.png&catid=307&Itemid=253> Acesso em
11 de abril de 2013.
LEMOS. Haroldo Mattos de. Normas ISO 14000. Rio de Janeiro. 2012.
Disponível em
http://www.abnt.org.br/imagens/ApresentacoesRio20/17_06/17_06_Haroldo%2
0Mattos%20de%20Lemos.pdf Acesso em 27 de abril de 2013.
RIBEIRO, Ana Clara Torres. O fato metropolitano – enigma e poder. In: etc,
espaço, tempo e crítica. Revista Eletrônia de Ciências Humanas e Sociais e
outras coisas. 01° de Setembro de 2007, n° 2 (5), vol. 1. Acesso em Jan. 2013.
Acesso em <http://www.uff.br/etc>
<http://www.meioambiente.es.gov.br/download/tr_004_08_samarco_usina_rev_
02.pdf>. Acesso em: maio. 2013.
I EI E T E u “I g s tu z s ” I :
A inconstância da alma selvagem. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, pp. 319-
344.
232
ANEXO I
Homem ( ) Mulher ( )
Nome: ________________________________________________________
Comunidade: ( ) Ubu ( ) Parati ( ) Outra? _____________
Município: _________________________Telefone: _____________________
Idade :___________________Estado Civil:____________________________
(cont.)
(Cont. )
ANEXO II
Eu, __________________________________________________________________,
portador/a do documento ______________________________, residente na
Rua___________________________________________________________________
__________Comunidade de ______________________________________________,
declaro para os devidos fins que cedo os direitos da minha entrevista para que seja
transcrita, analisada e utilizada, no todo ou em partes, no âmbito da pesquisa acima
citada. Da mesma forma, informo que a Universidade ficará com a guarda do material
após o término da pesquisa.
__________________________________ ________________________________
Entrevistado Pesquisadora Josilene Corrêa