Dissertação de Mestrado LIGIO MAIA
Dissertação de Mestrado LIGIO MAIA
Dissertação de Mestrado LIGIO MAIA
CENTRO DE HUMANIDADES
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-graduação em
História Social da UFC, como
requisito parcial à obtenção do título
de Mestre, sob orientação do Prof.
Dr. Eurípedes Antônio Funes.
________________________________________
Prof. Dr. Eurípedes Antônio Funes – Orientador, UFC
_________________________________________
Prof. Dr. John Manuel Monteiro – UNICAMP
________________________________________
Profa. Dra. Isabelle Braz Peixoto da Silva - UFC
iii
AGRADECIMENTOS
Todo trabalho científico é uma construção coletiva, na medida que é o
resultado parcial de discussões entre pares, mas que não se sabe ao certo, onde,
quando e com quem teve início, por isso seria impossível escrever esta
dissertação, sem levar em conta todos aqueles que direta ou indiretamente
cruzaram meu percurso, mesmo correndo o evidente risco de deixar alguém
importante de fora. Aos professores da UFC, devo um agradecimento especial a
Profa. Dra. Adelaide Gonçalves pela franqueza intelectual e rica companhia,
desde a Iniciação Científica. Aos Profs. Drs. Régis Lopes e Frederico de Castro
Neves as minhas considerações à seriedade e rigor teórico, com que
encaminharam suas disciplinas, durante o curso de mestrado.
A todos os funcionários nos diversos centros de pesquisa que tive acesso
e no departamento de História da UFC, em especial, a Dona Regina, que fez com
que o fardo da burocracia fosse menos pesado.
Aos “conhecidos” na Unicamp, minhas considerações a Jefferson Cano,
pela ajuda indispensável mesmo antes de minha chegada, e a excelência do
corpo docente através dos Profs. Drs. Robert Slenes, Michael Hall e Sidney
Chalhoub, do Cecult - Centro de Pesquisa em História Social da Cultura, em
especial, a Profa. Dra. Silva Hunold Lara, por sua sempre disponibilidade e rigor
científico durante nossas discussões sobre o objeto deste trabalho. Na disciplina
de História Indígena e do Indigenismo, a Profa. Dra. Nádia Farage, que com sua
competência e desenvoltura nos proporcionou uma fecunda discussão das
principais visões a cerca da “nova história indígena”, o que desviou
completamente minha pesquisa, e mesmo, meu entendimento dos povos
indígenas – atores fundamentais da Colônia e do Brasil atual. Aos colegas da
disciplina, minha gratidão à cumplicidade no rico ambiente acadêmico: Vilson
Cabral, Tatiana Takatuzi, Gláucia Montoro, Noêmia Moura, Juan Carlos Peña e,
em especial, ao pernambucano Edson Silva – minha referência nordestina “típica”
na Grande São Paulo. A este último devo também sua arguta leitura de minhas
primeiras páginas e envio ininterrupto de textos, teses e referências bibliográficas.
v
RESUMO
Este trabalho analisa como se deu a construção das alteridades
envolvendo índios e jesuítas - e em menor grau, outros agentes coloniais -, nos
contatos interétnicos nas Serras de Ibiapaba, durante o século XVII, na Capitania
do Seara Grande. Para tanto, balizamos nossas discussões em duas linhas
teóricas fundamentais: o significado ampliado da Missio jesuítica e seus
desdobramentos nas práticas sociais, principalmente, através de sua catequese; e
ainda, no processo peculiar de leitura, concebido e construído pelos povos
nativos, a partir de seus entendimentos a cerca dessa nova contingência histórica
advinda com os contatos. De forma, que nesse encontro de lógicas culturais
distintas foi-se processando uma mútua tradução de como cada lado (ou lados
diversos) percebia e compreendia o Outro – missionário e/ou indígena, a partir de
seus referenciais, limitações e experiências vividas.
RÉSUMÉ
Ce travail porte sur l’analyse du processus de la construction des altérites
entre les indiens et les jésuites – dans un degré inferieur, entre autres agents, au
couns des contacts interethiques dans la Serras de Ibiapaba, pendant le XVII e
siècle, dans la Capitania do Seara Grande. Pour cela, nous avons oriente nos
discussions dans deux axés théoriques fondamentaux: le sens amplifié de la
Missio jésuitique et ses déboublement dans les pratiques sociales, principalement
à travers as catéchèse et encore, dans le processus propre de la lecture, conçu et
construit par les peuples natifs à partir de leur compréhension de cette nouvelle
contingence historique obtenue par les contacts entre eux de manière que, dans
cette rencontre de logiques culturelles différentes, une traduction mutuelle de la
manière par laquelle chaque coté (ou des cotés diverses) percevait et comprenait
l’autre – missionaire et/ou indigène, à partir de leurs référentiels, limitations et
expériences vécues a été deve loppée.
SUMÁRIO
Considerações finais.....................................................................................187
Fontes e Bibliografia......................................................................................191
x
CAPÍTULO I
________________________________________________________________
MILÍCIA DE JESUS CRISTO NAS SERRAS DE
GOAPAVA
1
Valdelice Girão comentando a ocupação na capitania cearense teria afirmado que os rios
Jaguaribe e Acaraú “foram os dois primeiros pontos essenciais da colonização; e, ao mesmo
tempo, serviram de estradas onde se desenvolveu a marcha de ocupação da Capitania; e depois
escoadouro das manadas de corte para os mercados consumidores”. GIRÃO, Valdelice Carneiro.
Da Conquista e Implantação dos Primeiros Núcleos Urbanos na Capitania do ‘Siará Grande’. In:
SOUZA, Simone (coord). História do Ceará. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 1994, p.32.
2
Segundo o autor, as duas correntes principais de povoamento advindas da expansão da pecuária
teriam sido: da Bahia, ocupando o curso dos rios São Francisco e Itapicuru, também conhecido
como “sertão de dentro”; e de Pernambuco, abrangendo as regiões próximas do litoral até chegar
ao Ceará, o “sertão de fora”, onde em algum momento confluíram. Cf. ABREU, J. Capistrano de.
Capítulos de História Colonial. Rio de Janeiro, Sociedade Capistrano de Abreu, Livraria Briguet.
Prefácio e notas de José Honório Rodrigues, 5ª ed., 1969, p. 159.
xiii
3
Cf. SOBRINHO, Thomaz Pompeu. “Considerações Gerais”. In: Três Documentos do Ceará
Colonial. Fortaleza: Instituto do Ceará, 1967, pp. 9-58.
xiv
4
“Relação Sumária das Cousas do Maranhão” (07/03/1624). In: Anais da Biblioteca Nacional –
ABN, V. 94, anexo, 1974.
5
Cf. “Representação de Bento Maciel Parente a El-Rei sobre as coisas tendentes a defesa e
observação e bom governo da Província do Maranhão” [04/08/1636]. In: Revista do Instituto do
Ceará – RIC, t. 24, p. 234, 1910.
xv
6
Carlos Studart Filho explica que “existiam ligações constantes, e mais ou menos fáceis,
conhecidas já dos franceses no século XVI”. Cf. RIC, t. 51, p. 17, 1937.
7
Discorrendo sobre a “Ibiapaba Francesa” e defendendo a idéia de origem da “civilização”
cearense no planalto ibiapabano, o Pe. Sadoc de Araújo afirma que a “história do Ceará, por isso
mesmo, ainda não foi escrita, uma vez que não teve origem no litoral como narram comumente os
manuais, nem foi lusa a primeira civilização que entrou em contato com a cultura autóctone e
nativa dos primitivos indígenas que habitaram o nosso atual território”. ARAÚJO, Pe. Sadoc de.
Estudos Ibiapabanos. Sobral: Imprensa Universitária, Universidade Vale do Acaraú, 1979, pp. 45 e
46.
8
Velho e Novo Mundo são usados neste trabalho a partir da proposta formulada por O’Gorman: “O
significado de ambas as designações é transparente, porque se, em sua acepção tradicional,
“mundo” quer significar a porção do orbe terrestre providencialmente designado para a habitação
do homem, a América mostrou ser, literalmente, um mundo novo no sentido de uma ampliação não
previsível (...), da inserção nela de uma parcela da realidade universal”. O’GORMAN, Edmundo. A
invenção da América. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992, p. 198.
xvi
9
Para nossa pesquisa, além da farta documentação jesuítica e das autoridades régias, fizemos um
percurso em fontes escritas sob a forma de crônicas e/ou relatos produzidos no “calor da hora”.
Principalmente, dos Jesuítas, Fernão Cardim [1625] e João Felipe Bettendorff [1699]; e dos
Capuchinhos franceses, Claude d’Abbeville [1614] e Yves d’Évreux [1614].
10
Os motivos do desmembramento com o Estado do Brasil teriam sido a vastidão das capitanias
do Norte, com difícil administração da sua sede, na Bahia, além, das dificuldades de navegação
onde alguns cronistas afirmam ser mais fácil sair do Maranhão para Lisboa do que para Salvador
(CÂMARA apud ARARIPE, 1958:76). Trabalho recente, no entanto, conclui que a constituição do
Estado do Maranhão foi uma negociação política de influentes famílias vinda de Pernambuco para
ocuparem o recém “descoberto” território. Cf. “Cenários e Imagens da Fronteira Maranhense”. In:
CARDOSO, Alírio. Insubordinados mas sempre devotos: poder local, acordos e conflitos no Estado
do Maranhão (1607-1652). São Paulo: dissertação de Mestrado, UNICAMP, 2002, pp. 29-103.
11
Viegas discorrendo sobre La conquête progressive du territoire, e os grupos locais no Maranhão
teria afirmado: “La politique d’implantation est, dans um premier temps, laissée à l’initiative des
cólons (...). Il s’agit, em somme, d’une sorte de far-west de l’Amérique portugaise”. VIEGAS, João.
La Mission d’Ibiapaba. Lê père Antonio Vieira & le droit des indiens. Préface d’Eduardo Lourenço.
Paris: Chandeigne/UNESCO, 1998, p. 99.
xvii
12
Para uma análise dos resultados práticos na economia do Ceará sob dependência da Capitania
geral de Pernambuco, vide: GIRÃO, Valdelice Carneiro. Dependência da Capitania do Ceará ao
Governo de Pernambuco, 1656-1799. Fortaleza: Caderno do Núcleo de Estudos e Pesquisas
Sociais – NEPS, Departamento de Ciências Sociais e Filosofia da UFC, nº 4, 1986.
xviii
Moreno, o mesmo que na obra Iracema, uma Lenda do Ceará [1865], de José de
Alencar, um dos símbolos da literatura romântica indianista do século XIX,
aparece como personagem europeu, branco e colonizador que enamorando da
índia tabajara Iracema, a virgem dos lábios de mel, simbolizava no enredo
alencarino a possibilidade de harmonia entre o mundo “branco” e o mundo
“indígena”. Na opinião de Hoornaert, o texto de Alencar estaria superado em
termos estilísticos, mas não em seu sentido subjacente, ou seja, como proposta
para pensar a identidade nacional; ademais, mesmo concordando com o
historiador belga, Alfredo Bosi também entende o romance como uma tentativa de
“simbiose luso-tupi”, acrescentando que esse processo ocorria gravitando no
colonizador, pois “o destino do nativo era tratado como sacrifício espontâneo e
sublime” (BOSI, 1992: 176-193)13.
O capitão do Ceará, Martim Soares Moreno, auxiliou Jerônimo de
Albuquerque, o “capitão-mor da conquista”, quando este navegava as costas
cearenses com uma esquadra de quatro navios e mais de cem homens e, após
chegarem ao “buraco das Tartarugas” (atual Jeriquaquara, na região norte do
Ceará), construíram um presídio para simbolizar a posse portuguesa e
requereram-se mais homens para passar ao Maranhão14.
Alguns decênios antes, o então soldado, Soares Moreno, com apenas 17
anos tinha feito parte da comitiva de Pero Coelho, em 1603, que, saindo de
Pernambuco chegou até as Serras de Ibiapaba, de modo que também foi co-
partícipe do conflito bélico que o açoriano travou com os Principais Mel-Redondo e
Diabo Grande, e, mais que qualquer outro, percebeu o crasso engano dessa
estratégia na “conquista do Maranhão”. Anos depois, sobre a comitiva, afirmou
que,
“depois de seis meses de guerra onde eu recebi muitas feridas com os
demais companheiros, e vendo que nos não podíamos sustentar, nos
13
Cf. HOORNAERT, Eduardo. Descobrir o Ceará com os Olhos e o Coração de José de Alencar.
Palestra apresentada no Centro Cultural Dragão do Mar de Arte e Cultura, Ceará, em 17/04/2002.
(no prelo); Cf. Um mito sacrificial: o indianismo de Alencar. In: BOSI, Alfredo. Dialética da
Colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, pp. 176-193.
14
“Relação Sumária das Cousas do Maranhão” (07/03/1624). Op. Cit.
xix
15
MORENO, Martim Soares. “Relação do Ceará” [1618]. In: Três Documentos do Ceará Colonial.
Op. Cit., p. 181.
16
Vide Introdução e notas de Raimundo Girão. In: MORENO, Martim Soares. Op. Cit, p. 162.
17
Id. Ibidem, pp. 164 e 165.
xx
Devemos destacar, ainda, que Soares Moreno mais do que apenas fazer
uso da amizade com Jacaúna, na verdade, conhecia profundamente a
organização social dos Tupi, numa clara disposição de entender o outro em sua
própria alteridade e, mesmo, revestindo-se dela para ser aceito entre os guerreiros
do morubixaba e granjear prestígio, como apontado por ele mesmo em seu relato:
“Ali no dito ano degolei mais de duzentos franceses e
flamengos piratas e lhe tomei 3 embarcações donde uma delas veio a
Sua Majestade a esta cidade toda a proa e popa douradas e para fazer
estes assaltos me despia nu e me rapava a barba tingindo de negro
com um arco e frechas ajudando-me dos índios falando-lhes de
continuo a língua e perguntando-lhe o que já sabia bem fazer”21 (grifos
nossos).
18
Id. Ibidem, p. 163.
19
Id. Ibidem, p. 183.
20
MORENO, Martim Soares. Op. Cit., p. 183.
21
Id. Ibidem, p. 182.
xxi
22
“Carta que, de Barbados, escrevia Mathias Beck em 8 de Outubro de 1654”. RIC, t. 70, 1956, pp.
28-36; para além das chamadas “guerras de resistência” nativa, vide: FAUSTO, Carlos. Da
Inimizade: forma e simbolismo da guerra indígena. In: NOVAES, Adauto (org.). A Outra margem do
ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1999, pp. 251-282.
23
Cf. CÂMARA, José Aurélio. Aspectos do domínio holandês no Ceará. RIC, t. 70, pp. 5-36, 1956.
xxiii
26
“Carta para o Governador do Maranhão sobre se lhe avizar dê toda ajuda e favor para a factura
do Hospício que se manda fazer no Siará a requerimento dos Padres da Companhia” [08/01/1697].
In: ABN, vol. 66, p. 163.
27
“Carta para o Governador Geral do Maranhão sobre o descobrimento da estrada do Maranhão
para o Brazil” [25/01/1969]. In: ABN, Vol. 66, pp. 158 e 159.
xxv
28
LEITE, Serafim, S.I. História da Companhia de Jesus no Brasil. (10 Vol). Lisboa / Rio de Janeiro:
Livraria Portugália / Instituto Nacional do Livro, 1938-1950.
29
Segundo Leite tratar-se-iam dos padres Antão Gonçalves e João de Vilar e do Irmão Geraldo
Ribeiro.
30
Província era a unidade administrativa básica da Companhia desde a primeira década de sua
fundação, sendo um modelo copiado dos Dominicanos, Franciscanos e outras ordens (O’MALLEY,
2004: 86). No Brasil, aparentemente, estas tentavam seguir a lógica espacial da administração
secular colonial. Assim, na Colônia, além da Província do Brasil, a Missão do Maranhão foi elevada
à condição de Vice-Província, em 1727, após longo debate envolvendo jesuítas do Brasil e de
Portugal junto ao Generalato em Roma. Cf. LEITE, Serafim, S. I. Op. Cit., IV, p. 220.
31
Hospício seria uma “Casa ou Residência grande, cabeça de toda a Missão, diferente das casas
de Aldeias. A ela se acolheriam os missionários das Aldeias para repousar, de vez em quando; e
dela, os missionários, que a habitassem de assento, iriam fazer missões às Aldeias e ao sertão.
Seria também uma enfermaria geral dos missionários onde se recolhessem os doentes ou
alquebrantados pela idade”. Cf. LEITE, Serafim, S. I. Op. Cit., III, p. 73.
xxvi
32
O hospício deveria ser construído apenas onde o trabalho catequético estivesse bem avançado.
Um ano antes, Pe. Guedes argumentava que com o hospício, Ibiapaba seria ponto de apoio para
missões no Piauí, mencionando, ainda, a promessa dos índios em ajudar a catequizar “seus
parentes” nas Serras de Araripe (sul do Ceará) com quatro a cinco mil almas. Cf. “Carta do Padre
João Guedes, da Companhia de Jesus, representando a vossa o bem espiritual que receberão os
moradores da Serra de Ibiapaba em se fundar Hospício” [1720]. Documentos Históricos - DH, vol.
99, pp. 122-125.
33
Cf. Petição de Bernardo de Aguiar a El-Rei [1717 ou 1718]. In: RAU, Virginia. Os Manuscritos do
Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. Vol. II. Lisboa: Livraria Portugália, 1958, pp.
379-382.
34
Sobre esta questão, vide: Id. Ibidem, pp. 210-211; 235-237; 240-247; 248-254; 276-281; 282-
287; 292-293; 298-301; 305-306; 384-393; 394-404.
xxvii
perigo para as suas almas. Que esta mudança não agradava aos
índios, provava-o a petição que a el-Rei viera fazer, a este reino, o seu
governador, também índio, D. Jacob de Sousa e Castro, mandando
para o mesmo efeito o seu padre missionário [João Guedes]. E se a
experiência mostrava que seria melhor não passar a ordem para
desanexar aqueles índios da capitania do Ceará, seria muito pior
anexar agora o mesmo Ceará ao governo do Maranhão”35.
35
“Parecer do duque de Cadaval sobre as consultas do Conselho Ultramarino” [04/09/1721].
Id.Ibidem, pp. 305, 306.
36
Em 1706, uma parte dos guerreiros nativos fora deslocada para Paraíba “para apaziguar os
tumultos” de “Tapuias” rebelados, no mesmo período que se tinha um levante no litoral cearense
por conta das injustiças dos moradores “lusitanos” e “lusobrasileiros” em algumas aldeias. O
“superior da aldeia”, no ofício de capitão, treinou os índios para a batalha, o que resultou na morte
de mais de 400 nativos e dezenas de cativos. Cf. “Carta de Andreoni ao P. Michelangelo
Tamburino, Preposto Geral” [12/11/1706]. In: POMPA, Cristina. Religião como tradução:
missionários, Tupi e “Tapuia” no Brasil colonial. Bauru, SP: EDUSC, 2003, pp. 291, 292.
xxviii
37
Cf. “Carta ao bispo do Maranhão sobre a Repartição dos índios” [19/11/1681]. ABN, vol. 66, p.
62; “Carta para o bispo do Maranhão sobre dúvida da sua jurisdição sobre os padres da
Companhia” [02/09/1684]. ABN, Vol. 66, pp. 66.
38
“Carta para o Capitão-mor do Ceará João de Mello de Gusmão” [24/04/1665]. ABN, vol. 66, pp.
228, 229.
39
Segundo Charles Boxer, a constituição dos bispos era fundamental para a implementação da
hierarquia da Igreja, como representantes diretos do papado. No entanto, em regiões inóspitas,
como na Colônia, fora concedida às ordens religiosas regulares uma “autoridade alargada” na
conversão e administração paroquial, ressalvando, contudo, práticas de consagração episcopal.
Cf. BOXER, Charles. A Igreja e a expansão Ibérica (1440-1770). Rio de Janeiro: Edições 70, pp.
85-92.
40
Para os regalistas, “as finalidades da cidade terrena (da política, do império) são autônomas em
relação às da cidade divina, o poder real vem directamente de Deus, pelo que os reis não
reconhecem superior na Terra e o papa não os pode depor”. Cf. HESPANHA, António Manuel
(coord). História de Portugal: o Antigo Regime (1620-1807), vol. IV. Lisboa: Estampa, 1993, p. 134.
xxix
41
“Carta do Governador de Pernambuco, D. Henrique Luiz Pereira, sobre normas relativas aos
indígenas e resumo sobre a dita legislação” [20/10/1735]. In: THÉBERGE, Pedro. Esboço Histórico
sobre a Província do Ceará. Edições fac-sim. Fortaleza: Fundação Waldemar Alcântara, 2001, pp.
155-161.
42
Dentre os vários documentos ausentes, além do Regimento, está a lei de 1680 que abolia a
escravidão indígena no Estado do Maranhão. De acordo com Beatriz Perrone-Moisé as “grandes
leis de liberdade” teriam sido as de 1609, de 1680 e a de 1755. Nelas a distinção entre índios
aliados e inimigos fora anulado. Sobre um balanço histórico da legislação indigenista, vide:
xxx
45
Como a obra missionária estava apenas começando na colônia portuguesa, Nóbrega foi
nomeado Superior da Missão no Brasil. Em março ou abril de 1553, o Provincial de Portugal, Pe.
Simão Rodrigues concedeu-lhe patente de Vice-Provincial, resolução aprovada por Santo Inácio.
Somente, em julho do mesmo ano, foi assinada e aprovada sua patente de Provincial da Província
do Brasil, primeira criada no Novo Mundo. Vide: LEITE, Serafim, S.I. “Introdução Geral”. Cartas dos
Primeiros Jesuítas do Brasil. São Paulo. Comissão do quarto Centenário da Cidade de São Paulo.
Vol. I, 1954, p. 9.
46
Duas cartas do Ir. Pero Correia ao Provincial de Portugal, Pe. Simão Rodrigues são singulares
neste aspecto. A primeira datada de junho de 1551 rezava o seguinte: “Mas ellos [os índios] tieten
tan poca noticia de Dios, que me parece que se há de temer com ellos mucho trabajo, y uma de las
causas y más principal es poque no tienen rey, antes en cada Aldeã y casa ay su Principal” (doc.
nº 25, §2); outra, de março de 1553, dizia: “y que digamos que es gente que antes deixava morir
que quebrantar su lei y deixar de adorar sus ídolos, ellos no tienen lei ni ídolos a que adoren, ni
tienen más que algumas abusiones y niñeirias, que aún oi en dia se hallan dentro del reino de
Portugal [...], mas esto son casos que facilmente se le pueden quitar poniéndoles en necessidade,
como dixe” (doc. nº 60, §19). Id. Ibidem.
xxxiv
47
Sobre este debate que perpassava a “humanidade” indígena, inclusive, justificando as ações e
métodos missionários de conversão, que envolveu os mais renomados teólogos do século XVI,
entre eles: os jesuítas, Manuel da Nóbrega, Luiz Molina, José de Acosta e os dominicanos,
Bartolomeu de las Casas, Francisco de Vitória e outros, vide: A Escravidão Voluntária dos Índios.
In: EISENBERG, José. As Missões Jesuíticas e o Pensamento Político Moderno: Encontros
Culturais, Aventuras Teóricas. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2000, pp. 125-166; Desenvolvimento
xxxv
Sistemático da Ética Colonial pela Escolástica Espanhola no Século de Ouro. In: HÖFFNER,
Joseph. Colonialismo e Evangelho: Ética do Colonialismo Espanhol no Século do Ouro. São Paulo:
Ed. da Universidade de São Paulo, Rio de Janeiro: Ed. Presença, 1973, pp. 225-242.
48
O emprego do termo “bárbaro” originou-se na Grécia antiga, para classificar outros povos e
demarcar sua inferioridade. Para Raminelli, o termo saltou os escritos de Aristóteles e Tomás de
Aquino, ganhando terreno fértil na colônia portuguesa, sendo bárbaros “os índios de corpos nus”,
canibais na faina de devorar carne humana, vivendo sem fé, sem lei e sem rei. Cf. RAMINELLI,
Ronald. Op. Cit., pp. 54-77. O barbarismo ganhou nova faceta quando relacionado ao tema do
“sacrifício” dos jesuítas no trabalho missionário. Cf. De caraíba a Amanaiara: trajetórias e
construções, último tópico deste trabalho.
49
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. In: GIORDANO, Cláudio
(coord). Escritos Instrumentais sobre os Índios. São Paulo: EDUC/Loyola/Giordano, 1992, p.172.
50
O Pe. Manuel da Nóbrega rejeitava a tese da Política aristotélica, segundo a qual, o ser inferior
teria que se subjugar ao ser superior para sua própria proteção. A “humanidade” indígena
baseava-se na argumentação escolástica das faculdades inatas: vontade, memória e inteligência.
Cf. “Diálogo sobre a Conversão do Gentio” do P. Manuel da Nóbrega [Baía, 1556-1557] e “Plano
Civilizador” [Baía, 08/05/1558]. Sobre uma análise desta reformulação proposta e sua influência
para o “pensamento político moderno”, vide: EISENBERG, José. Op. Cit., pp. 222-246.
xxxvi
51
Hespanha defende que Portugal possuía um “estatuto colonial múltiplo”, quer dizer, inexistia um
projeto homogêneo e centralizador sob suas conquistas até pelo menos o século XVIII, sendo este
forjado a partir da realidade interna de suas colônias. Cf. HESPANHA, António M. A constituição do
Império português. Revisão de alguns enviesamentos correntes. In: FRAGOSO, João (et alli). O
Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos VXI-XVIII). Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2001, pp. 163-188.
xxxvii
A leitura do padre jesuíta foi clara. Tratava-se de uma “guerra” que devia
ser travada pelos missionários contra o maior de seus inimigos, o Demônio. Pois,
em geral, era Ele o causador das intempéries naturais, da tão declarada indomia
indígena e, conseqüentemente, da “indecifrabilidade aos hábitos cotidianos dos
ameríndios” (SOUSA, 1993: 29). E na luta pela “conquista espiritual”, era preciso
identificar os sinais da ação demoníaca que estavam à solta nas Serras,
52
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op. Cit, p. 150.
xxxviii
53
FIGUEIRA, Luiz, S.I. “Relação do Maranhão [1608]”. Op. Cit., p. 76.
xxxix
54
Cf. “Padre Juan de Polanco, Carta de Roma, 13 de agosto de 1553”. In: VIEIRA, Antônio, 1608-
1697. Cartas do Brasil. Organização e introdução de João Adolfo Hansen. São Paulo: Hedra, 2003,
p. 31.
xl
55
Cf. NOBRE, Geraldo S. História Eclesiástica do Ceará (1ª parte). Fortaleza: Secretaria de Cultura
e Desporto, 1980, pp. 47 e 48.
56
SOBRINHO, Thomas Pompeu. “Considerações Gerais”. Op. Cit., p. 12.
57
Girão em capítulo intitulado “A Economia do Ceará no Primeiro Século”, fala das ações
catequéticas jesuíticas do século XVII, como empreendimentos importantes na constituição de uma
economia nascente e de expansão do Império português, uma vez, que seus trabalhos
missionários desdobravam-se na penetração e reconhecimento territoriais e a fixação dos nativos
nos aldeamentos. Cf. GIRÃO, Raimundo. História Econômica do Ceará. 2ªedição, Fortaleza:
UFC/Casa José de Alencar, 2000, pp. 63-97.
xli
58
STUDART, Barão de. Francisco Pinto e Luiz Figueira: o mais antigo documento existente sobre
a história do Ceará. In: Commemorando o Tricentenário da vinda dos primeiros portuguezes ao
Ceará, 1603-1903. Fortaleza: Tip. Minerva, 1903, pp. 47-92.
59
LEITE, Serafim, S.I. Luiz Figueira: a sua vida heróica e a sua obra literária. Lisboa: Divisão de
Publicações e Biblioteca/Agência Geral das Colônias, 1940, p. 38.
xlii
60
Cf. Introdução e notas de Raimundo Girão sobre a “Relação do Ceará” [1618]. Op. Cit., p. 180.
61
Cf. LEITE, Serafim, S.I. Luiz Figueira: a sua vida heróica e a sua obra literária. Op. Cit., p. 157.
xliii
62
Os jesuítas que aceitaram convite do Pe. Vieira, além do Pe. Pedrosa, foram: Francisco Veloso
em 1652, Salvador do Vale e Antônio Pereira em 1655, Gonçalo de Veras e João Maria Gorzoni
em 1659, João Felipe Bettendorff e Gaspar Misch em 1660. Cf. HOORNAERT, Eduardo (org).
História da Igreja no Brasil: ensaios de interpretação a partir do povo. (Primeira Época). 3ª ed., São
Paulo: Edições Paulinas/Vozes, 1983, 82.
63
Os jesuítas que aturaram no Maranhão e Pará como fruto do pioneirismo da entrada de
reconhecimento de 1607, ainda no século XVII foram os seguintes: Francisco Veloso (1619-1679)
que fez a primeira entrada no rio Negro em 1657, além, de entradas nos rios Tocantins e Pindaré;
Salvador do Vale (1628-1676) que junto com o grupo de 1655 exerceu intensa atividade no Pará,
Marajó, Pacajá, Amazonas até aos Pauxis (atual cidade de Óbidos); o jesuíta maranhense, Pe.
Antônio Pereira, que expulso do Maranhão por conta do motim de 1661, retorna em 1664 para
trabalhar junto às aldeias dos Guajajara no rio Pindaré e no rio Tapajós, morto em seguida em
1687, pelos índios no que hoje seria a região do Amapá; o italiano, Pe. João Maria Gorzoni (1657-
1711) que durante cinqüenta anos trabalhou nas aldeias dos rios Pindaré, Solimões, Negro,
Madeira, Tapajós e Xingu; e ainda, o Pe. Gaspar Misch (1626-1697), luxemburguense, que durante
trinta e sete anos exerceu atividades no Pará e Amazonas. Cf. O Ciclo Maranhense, Id. Ibidem.,
pp. 75-92.
xlv
64
LEITE, Serafim, S.I. “Introdução Geral”. In: Cartas dos Primeiros Jesuítas do Brasil, Op. Cit., pp.
5 e 6.
65
O’Malley, contudo, defende que a Companhia de Jesus não pode ser vista como criação direta
da Contra-Reforma (ou Reforma Católica) – tese recorrente nos trabalhos sobre os jesuítas. Pois,
os padres possuíam agenda própria, distinta de Trento, apesar de terem percebido tempos depois
que esta era uma obrigação pastoral mais ampliada. Cf. O’MALLEY, John W. Os primeiros
jesuítas. Tradução Domingos Armando Donida. São Leopoldo, RS: Editora UNISINOS; Bauru, SP:
EDUSC, 2004, pp. 15-44.
xlvi
66
A expressão “vigário de Cristo” foi usada pela primeira vez pelo Papa Inocêncio III (1198-1216) e
depois, em definitivo, por Inocêncio IV (1243-1254). Segundo Sousa e Melo, esta mudança trouxe
um significado ampliado do papel do chefe da Igreja Católica, que passou de “vigário de S. Pedro”
e, portanto ao de um simples sacerdote, para tornar-se vigário direto de Cristo, ligado
simbolicamente à universalização do poder divino. Cf. SOUSA E MELO, Márcia Eliane Alves de.
Pela Propagação da Fé e Conservação das Conquistas Portuguesas: as Juntas das Missões –
Século XVII-XVIII. Porto: Tese de doutoramento, Universidade do Porto, 2002, p. 26. Todavia,
achamos que esta mudança conceitual no período das navegações ultramarinas ganhou novo
reforço, uma vez, que poderia ser reflexo de uma perspectiva expansionista do Catolicismo. Vale
acrescentar que nas Constituições da Companhia, o Sumo Pontífice é considerado “vigário de
Cristo”.
67
Além do Novo e Velho Mundo, os inacianos atingiram também Ásia e África.
68
Esta Carta foi depois confirmada por outra do Papa Júlio III intitulada Exposcit debitum, de 21 de
julho de 1550. Vide, Fórmulas do Instituto da Companhia de Jesus. In: Constituições da
Companhia de Jesus e Normas Complementares. Anotadas pela Congregação Geral XXXIV. São
Paulo: Edições Loyola, 1997 [1558], p. 25.
xlvii
69
Para uma breve discussão do contexto da Igreja Romana, desde sua criação até o século XVI, e
o papel da Companhia de Jesus nas suas reformulações, vide: A Igreja Católica no limiar do século
XVI. In: ASSUNÇÃO, Paulo. A terra dos Brasis: a natureza da América portuguesa vista pelos
primeiros jesuítas (1549-1596). São Paulo: Annablume, 2000, pp. 41-55.
70
Na América sob a influência hispânica, a congênere do Padroado seria conhecida como
Patronato, no entanto, as atribuições eram as mesmas para os monarcas ibéricos: construir ou
permitir a construção de catedrais, mosteiros, conventos, hospícios e etc.; apresentar a Santa Sé,
uma lista para preenchimentos de bispado, arcebispado, abadia e outras funções eclesiásticas
menores; administrar jurisdições e receitas eclesiásticas; transferir, promover ou afastar prelados
de quaisquer ordens; arbitrar conflitos envolvendo o poder eclesiástico e civil e entre os próprios
clérigos; e por fim, aceitar ou rejeitar documentos papais após passar pelo crivo da chancelaria da
Coroa. Cf. BOXER, Charles Ralph. Op. Cit., pp. 85-115.
xlviii
71
“Para o Governador do Maranhão que não tendo os Padres da Companhia os Missionários que
são obrigados lhes não assigne a certidão que costuma” (06/09/1684). In: ABN, Vol. 66, p. 66.
72
Cf. “Carta para o Provincial da Companhia de Jesus” [02/09/1684]. Id. Ibidem, p. 64.
73
Sobre a anacrônica dissociação entre política, economia e teologia nos
74
Os Franciscanos dividiam-se em três ramos distintos: os da Província de Santo Antônio, os da
Piedade e os da Conceição da Beira e Minho. Trabalharam com os índios em diversos
aldeamentos (Anaratuba, Bocas, Caviana, Acapary, Paru e de Menino Jesus); os Mercedários,
ordem de Nossa Senhora das Mercês, era uma congregação espanhola no Vice-Reino do Peru e
que teria chegado ao Pará, por convite de Pedro Teixeira, em 1639, ao voltar de Quito percorrendo
todo o curso do Amazonas. Trabalharam junto aos poucos núcleos “brancos”, abrindo escolas para
os filhos de colonos; os Carmelitas, que não raras vezes entraram em conflito com os jesuítas,
tiveram forte influência missionária junto aos nativos, situado nos rios Negro e Solimões. Vide:
MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Os principais grupos missionários que atuaram na Amazônia
brasileira entre 1607 e 1759. HOORNAERT, Eduardo (coord). História da Igreja na Amazônia.
Petrópolis: Vozes, 1992, pp. 63-120.
75
Os jesuítas não eram a priori contra a escravidão nativa, como um mecanismo legal de controle.
Mas, discordavam da ilegalidade de suas práticas para fins de exploração desmedida e que
interferisse no cumprimento de suas doutrinas. Estas posições, entretanto, foram mudando
internamente no próprio seio da Companhia de Jesus. Cf. VAINFAS, Ronaldo. Ideologia e
Escravidão: os letrados e a sociedade escravista no Brasil Colonial. Petrópolis: Vozes, 1986.
76
O Pe. Vieira usando de sua influência em Lisboa teria sido o responsável direto pela provisão de
1680 que, dentre outras coisas, mandava as autoridades coloniais ajudarem, inclusive,
financeiramente, na expansão dos aldeamentos jesuíticos nos sertões, dirigido pelos padres. Cf.
LEITE, Serafim, S. I. História da Companhia de Jesus no Brasil. p. Cit., IV, pp. 67 e segs.
lii
77
“... na cópia e envio de cartas com diversos destinos, foi construído e definido o projeto jesuítico
missionário numa troca de informações que se realizava no eixo Roma, Lisboa, Índia, Brasil”.
LONDOÑO, Fernando Torres. Escrevendo Cartas. Jesuítas, Escrita e Missão no Século XVI.
Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 22, nº 43, p. 30, 2002.
78
Para uma leitura destes documentos da Companhia, vide: Constituições da Companhia de Jesus
e Normas Complementares. Op. Cit. ; e, LOYOLA, Inácio de. Exercícios Espirituais. Apresentação,
tradução e notas do Centro de Espiritualidade Inaciana de Itaici. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola,
2002 [1548].
liii
A obediência jesuítica não era apenas ordeira e de pleno funcionamento da hierarquia, mais que isso, era uma
disposição inaciana, um vínculo agregador de ação conjunta80. De forma que existia uma certa racionalização81 na prática
da obediência que se estendia às práticas de conversão, uma vez que os jesuítas, na “vinha de Cristo”, ou seja, os que
estavam mais próximos dos gentios, nos trabalhos de campo, deviam observar e introjetar - como ensinado nos Exercícios
Espirituais82 -, o sentido uno da obediência que ganhava materialidade no corpo social da Companhia, mas que tinha como
fundamento metafísico, Deus – a “Causa Primeira de todos os tempos” (HANSEN, 2003: 27). Esta metafísica dos inacianos,
de maneira alguma, entrava em choque com as decisões realistas, afinal, esse “projeto se instaura permanentemente: é um
processo, um conjunto de políticas cuja formulação e implantação seriam impossíveis para um pensamento voltado apenas
para si e para o alto” (NEVES, 1978: 30).
Discorrendo sobre os Exercícios, José Eisenberg afirma que, ao lado do conceito constitucional de obediência,
o primeiro Geral da Companhia formulou também o conceito jesuítico de “Prudência”. Para esse “método de raciocínio
prático”, contudo, dois esteios de pensamento deviam nortear os missionários, enquanto pregadores em terras longínquas:
a adaptação das normas e a tolerância das violações que não fossem extremamente ofensivas (EISENBERG, 2000: 45).
Mas notem, que a prudência não tinha nada que ver com uma simples precaução por parte dos missionários, era sim, a
capacidade de colocar em prática um julgamento são sobre seu próprio ministério (O”MALLEY, 2004: 131)83.
79
Constituições da Companhia de Jesus. Op. Cit., p. 174.
80
Id. Ibidem, §659, p. 206.
81
Como Baêta Neves, usamos este termo não no sentido cartesiano de um chamado cientificismo
“positivista”, mas no aspecto de realismo que ele sugere. Cf. NEVES, Luiz Felipe Baêta. O
Combate dos Soldados de Cristo na terra dos papagaios. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1978, p. 30.
82
Adrien Demoustier afirma que uma das originalidades de Santo Inácio, ao escrever os Exercícios
teria sido a estrutura pedagógica indireta, ou seja, dividido em quatro semanas, o livro levaria o
exercitante a compreender que sua liberdade resultaria na compreensão de sua união com Deus e
consigo mesmo, como indivíduo e como membro da Companhia. Cf. DEMOUSTIER, Adrien, S. I.
L’originalité des “Exercices spirituals”. In: GIARD, Luce (dir.). Les Jésuites à l’âge Baroque (1540-
1640). Grenoble: Editions Jérôme Millon, 1996, pp. 23-35.
83
Em 1550, o Pe. Polanco, secretário pessoal de Santo Inácio, tinha listado sessenta qualidades
desejadas a um membro da Companhia, a “terceira era flexibilidade, a qual insistia que os
candidatos possuíssem tanto nos julgamentos especulativos como nos práticos, porque ‘cabeças
duras’ não estavam adaptados à vida jesuítica”. O’MALLEY, John W. Op. Cit., p. 132.
liv
84
Neste relato, Pe. Ascenso Gago menciona os Tabajara (do tronco Tupi), que eram “entre todas
as do Brasil, a de melhor juízo”. E os “Tapuias” Guanacé, Reriíu e Aconguaçu, sendo estes dois
últimos não assistidos sistematicamente devido à distância. O jesuíta, ainda menciona três outras
aldeias de “língua geral”, distante quinze dias de onde estavam e não contatados. Cf. LEITE,
Serafim, S.I. Op. Cit., III, pp. 38-56.
lv
85
Id., Ibidem, p. 42.
86
Id., Ibidem.
87
Baseado em Jean de Léry, calvinista francês, que escreveu Histoire d’un voyage fait en la terre
du Brésil [1586], Métraux, afirma que os meninos, comumente, usavam roletes de madeira,
conchas e pequenos ossos. Os adultos, contudo, usavam “pedras raras de diferentes tipos”. Cf.
MÉTRAUX, Alfred. A religião dos Tupinambás e suas relações com as demais tribos tupi-guarani.
Prefácio, tradução e notas de Estêvão Pinto; apresentação de Egon Schaden – 2ª ed. São Paulo:
Ed. Nacional: Ed. da Universidade de São Paulo, 1979, p. 99.
lvi
88
LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., III, pp. 38-56.
89
Eisenberg afirma que este aspecto da Ordem é “freqüentemente negligenciado por historiadores
do pensamento político do início da era moderna” e “sobre os rumos do movimento tomista
conhecido como seconda scholastica”. Cf. Noster modus procedendi. In: EISENBERG, José. Op.
Cit., pp. 27-58.
90
A Visita teria sido escrita entre 1658 e 1661. E apesar de tentativas para alterá-la, nunca houve
uma aprovação oficial do Geral da Companhia e, “Bettendorff, por ordem do mesmo Geral,
mandou copiar a “Visita” de Vieira, e que se guardasse um exemplar em todas as aldeias e
Missões, convindo-se de ante-mão em que, tendo mudado depois de Vieira as circunstância da
missão, alguns determinações se observassem a moderação que tais mudanças requeriam”.
LEITE, Serafim, S. I. Op. Cit., IV, pp. 105, 106.
91
Em carta escrita ao bispo do Japão, D. André Fernandes, Vieira formula a teoria do “Quinto
Império”, que em linha gerais, seria uma defesa visionária e profética, da ressurreição de D. João
IV para destruir os turcos e reduzir todos os povos a religião verdadeira, sob a tutela do Papa e do
Imperador. Esta carta, junto com sua defesa perante o Tribunal do Santo Ofício e sua História do
Futuro marcava sua defesa da restauração portuguesa, como Império dominante e mundial sob a
tônica sebastianista. Cf. PÉCORA, Alcir. Op. Cit., pp. 51 e 52.
lvii
após experiências no rio Itapecuru, com os índios Ibajara; pelo Tocantins, com
ínfimos resultados na conversão; na “jornada do ouro”, acompanhando expedições
que buscavam metais preciosos no interior; na missão de Nheengaíba, na Ilha de
Marajó, onde afirmou ter convertido cem mil almas (HOORNAERT, 1992: 130); e
certamente, somadas as suas experiências nas Serras de Ibiapaba, em 1660.
Serafim Leite publicou a Visita, dividindo-a em cinqüenta parágrafos. Num
deles, precisamente no §18 – Baile dos Índios, poderia está a base para a tomada
de decisão do Pe. Ascenso Gago:
“Para que os índios fiquem capazes de assistir os ofícios
divinos, e de fazer conceito da doutrina, como convém, se lhes
consentirão os seus bailes nas vésperas dos domingos e dias santos,
até 10 horas ou onze da noite somente, e para que acabem os tais
bailes, se tocará o sino, e se recolherão às suas casas”92.
92
Para uma leitura de todo o documento, vide: LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., IV, pp. 106-124.
93
De acordo com Serafim Leite, esta data deveria ser registrada, como fundação da atual cidade
de Viçosa, no Ceará.
lviii
De modo, que concordamos com Sousa (2003: 62), ao afirmar que essa
festa foi “um misto de diversão e devoção” em que “os missionários transigiam”.
Um estudo sobre a formação desses padres, já instrumentalizados, inclusive com
aprovação papal - com as ferramentas da obediência e prudência jesuíticas,
mostra a capacidade inaciana de elaboração de uma certa condescendência das
práticas sociais ameríndias a partir dos contextos da realidade colonial. Contudo
não se tratou de transgressão a ortodoxia teológica da Igreja e a seus preceitos
litúrgicos comemorativos, antes, porém, a um “modo de proceder” peculiar no
trabalho de missionação. Ou seja, olhos voltados aos Céus, mas também olhos
voltados a Terra.
Essa aparente brecha doutrinária era uma estratégia de aproximação e
domínio, afinal, os padres sabiam, de antemão, de sua autonomia para julgar a
adaptação das normas e a tolerância das violações que não fossem
extremamente ofensivas. E mais, sabiam, pelas Constituições, que sua salvação
dependia por efeito conseqüente, da salvação de suas “ovelhas” – no caso, os
nativos, pois o fim da Companhia “não é somente ocupar-se, com a graça divina,
da salvação e perfeição das almas próprias, mas com esta mesma graça,
95
esforçar-se intensamente por ajudar a salvação e perfeição das do próximo” .
Estavam, assim, pelo menos nesse exemplo, colocando em prática o que já
haviam aprendido em sua formação religiosa.
Retomando o relato da ânua de 1695, o padre passa a enfocar,
entusiasticamente, as pazes conseguidas entre as várias aldeias “Tapuia” que
estavam nas Serras e na costa litorânea, no “Ceará”96. Em Ibiapaba, a paz
94
“Carta annua do que se tem obrado na Missão da Serra de Ibiapaba para o Pe. Francisco de
Matos da Companhia de Jesus, Provincial da Província do Brasil, assinada por Ascenso Gago e
Manuel Pedroso” [1701]. In: LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., III, p. 64.
95
Constituições da Companhia de Jesus, Op. Cit., §3, p. 40.
96
Como as fronteiras ainda não estavam plenamente estabelecidas, como já comentamos, o que
subentendemos nos relatos é que o “Ceará” referia-se ao litoral (talvez, Camocim, hoje localizado
no litoral norte do estado do Ceará) em diferenciação ao “Ceará Grande” ou “Seara Grande” que
se referia a toda capitania no século XVII.
lix
97
LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., III, p. 48.
lx
98
Id., Ibidem, p. 49.
99
Analisando diversas crônicas coloniais e “etnográficas” sobre os Tupi, H. Clastres esclarece a
distinção entre pajé e pagy uaçu. O primeiro é também conhecido como xamã encarregado de
curar o mal ou infligi-lo dentro da ambigüidade de seus dons; sendo o último, um caraíba que vivia
recluso, afastado por completo das aldeias – diferindo dos xamãs. Para aprofundar as diferenças
conceituais entre pajé, pagy uaçu, profeta e morubixaba (chefe tribal), vide: Pajés e Caraíbas. In:
CLASTRES, Hélène. Terra sem Mal. Tradução Renato Janine Ribeiro. São Paulo: Ed. brasiliense,
1978, pp. 34-53.
lxi
100
Mesmo constatando tal antropomorfia em seus estudos, H. Clastres (1978: 48) sustenta sua
tese sobre os maracás, como simples instrumentos de percussão, e em nota adverte, “Se fosse
permitido considerar os desenhos dos cronistas como ‘informações’ tão dignas de crédito como
seus escritos, um desenho de Staden [mercenário alemão que escreveu “Viagem ao Brasil”, em
1557], seria muito sugestivo: o maracá que representa é dotado somente de uma “boca”,
enganosamente semelhante a uma lua crescente”. Sobre uma crítica documental da crônica de
Hans Staden e outros cronistas dos Quinhentos, vide: ASSUNÇÃO, Matthias Rohring. &
FLEISCHMANN, Ulrich. & ZIEBELL-WENDT, Zinka. Os Tupinambá: realidade e ficção nos relatos
quinhentistas. Revista Brasileira de História, São Paulo: ANPUH-Marco Zero, vol. 11, nº 21, set
90/fev 91, pp. 125-145.
101
Cf. SILVA, Isabelle Braz Peixoto da. A Santidade de Jaguaripe: Catolicismo popular ou religião
indígena. Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, 1995, v. 26, nº ½, pp. 65-70.
lxii
reafirmação étnica.
102
Já no início do século XVII, Cardim recorre aos referenciais europeus para descrever o maracá:
”... ao som de uma cascavel feito ao modo dos que usão os meninos em Espanha, com muitas
pedrinhas dentro ou umas certas sementes de que também fazem muito boas contas“. CARDIM,
Fernão, S.I. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1978
[1625], p. 155.
103
FIGUEIRA, Luiz, S.I. “Relação do Maranhão [1608]”. Op. Cit. p. 87.
104
LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., III, p. 42.
lxiii
105
Serafim Leite (1940: 39, 40), afirma que este documento foi escrito pelo próprio Visitador, Pe.
Manuel de Lima. Nele, os exemplos da entrada de reconhecimento realizado pelos padres,
Francisco Pinto e Luiz Figueira, às Serras de Ibiapaba, em 1607, é tomada como exemplo e
análise para futuros empreendimentos ao interior. Se a assertiva de Leite tiver procedência, houve
uma radical mudança na formulação proposta pelo Pe. Lima, que de acordo com Pompa,
considerava perigosa uma aproximação com os nativos nos aldeamentos. Cf. POMPA, Cristina.
Op. Cit., p. 48.
lxiv
ec. Parece que não he bem tirar-lhes os nossos seus costumes que se
não encontrão com a lei de Deus, como chorar, cantar e beberem com
moderação. E se alguns se desmandarem, dar-lhes a sua penitência. E
não quebrar-lhes os nastos de vinho, nem impidir-lhes não vão estar na
praia ec.”106 (grifos nossos).
106
“Algumas advertências para a província do Brasil”[1609]. In: POMPA, Cristina. Op. Cit., p. 75.
107
Id., Ibidem, pp. 77-79.
108
Id., Ibidem, p. 78.
lxv
A causa, de acordo com o missionário, é simples e merecia apenas um pouco mais de discernimento, pois,
109
Id., Ibidem, p. 79.
110
Talvez, o texto bíblico do apóstolo Paulo que se refira o missionário seja o remetido aos
Hebreus (5:13, 14): “Quem se alimenta ainda de leite, visto ser criança, é inexperiente quanto à
doutrina moral; o alimento sólido, pelo contrário, é próprio para os adultos, que pelo hábito,
possuem as faculdades adestradas para discernirem entre o bem e o mal”.
111
“Algumas advertências para a província do Brasil” [1609]. In: POMPA, Cristina. Op. Cit., p. 79.
112
Além da Congregação Geral, instância máxima da Companhia, havia outra de menor alcance
conhecida por Congregação Provincial, onde se reuniam para discutir assuntos relacionados
apenas à Província, inclusive na própria escolha dos dois Professos de quatro votos que
participariam junto com o Provincial numa possível reunião da Congregação Geral. Cf. LEITE,
Serafim, S.I. Op.Cit., II, p. 498, 499.
lxvi
113
Um conjunto específico de Províncias formava uma Assistência. A Assistência de Portugal no
Brasil colonial compreendia: Província de Portugal, Província do Brasil, Província do Japão,
Província da Índia – desmembrada depois em duas: Goa e Malabar, e as Vice-Províncias da China
e do Maranhão e Grão-Pará, além das Missões em Angola, Moçambique e Etiópia. Cf. LEITE,
Serafim, S.I. Op. Cit., I, p. 12.
114
Procurador era o jesuíta encarregado pelo Pe. Geral de representar uma determinada Província
em algum lugar específico.
lxvii
219), “toda essa má vontade dos Padres Consalvi, Bettendorff e Gandolfi” foi
reflexo “de certo movimento que se esboçou então contra o governo dos nacionais
(Portugueses e Brasileiros)”. Ou seja, toda protelação construída junto a Roma
nesse período, deu-se por disputas de jurisdição e, mesmo, por influências
pessoais sobre a organização burocrática e missionária dos jesuítas no Brasil.
Todavia não é possível aprofundar tal querela pela simples indisponibilidade de
documentos, de qualquer forma, optamos por mencioná-la por considerar que tais
divergências no próprio seio da Companhia no Brasil, ainda estão à espera de
uma reflexão histórica contundente.
Apesar de termos discorrido até o momento, sobre a ação catequética em
Ibiapaba, de diversos missionários, não se pode negar que o maior exemplo do
uso realístico da “obediência” e “prudência” jesuíticas no Maranhão, delineada nos
documentos internos da Ordem, fora implementado pelo Pe. Antônio Vieira, pois,
para ele, inexoravelmente, índios subordinados ao Império português e este
subordinado ao amplo projeto de cristianização como elemento integrador e
mantenedor da Obra divina formariam o “corpo místico do Império” (HANSEN,
2003: 29, 64), que em hipótese alguma, podia ser quebrantado, sob perigo de
abjurar os planos de Deus, cujos homens e, principalmente, os missionários para
seu êxito completo, haviam que trabalhar ardorosamente, pari passu com o poder
secular.
Em documento sem data, talvez, um esboço do que viria a ser a Visita,
Pe. Vieira imprime, no papel, o modo de proceder dos missionários que estavam
trabalhando no Maranhão e Grão-Pará. Logo após discorrer sobre a missionação
“no temporal” e “no espiritual”, o jesuíta segue desenvolvendo seus argumentos no
“modo como se hão de fazer as entradas no sertão pelos nossos portugueses”:
“Chegada que for a tropa à parte aonde a dirigem, terão suas
inteligências por meios de suas embaixadas, com que manifestem ao
gentio o intento de sua ida, que é só para converter à nossa fé; e para
os atrair, os convidem com resgates, prometendo-lhes bom trato e
companhia; e quando eles não queiram reduzir-se voluntariamente,
sendo em parte que nos podem ofender as nossas povoações, os
poderão obrigar por armas; mas de tal maneira sempre que, reduzidos
à nossa sujeição, não alcancem eles que há em nós vingança, mas
lxviii
115
“Modo como se há de Governar o Gentio que há nas Aldeias do Maranhão e Grão-Pará” [s/d].
In: VIEIRA, Antônio, S.I. Escritos instrumentais sobre os índios. Op. Cit., pp. 72-83.
116
Além do medo servil, São Tomás de Aquino menciona, em seus escritos, o medo filial, ou seja,
“o temor inspirado pela sujeição à autoridade divina”. Este era próprio dos que acreditavam em
Deus e na Sua Igreja constituída. Cf. EISENBERG, José. Op., Cit., p. 107.
117
Eisenberg, analisando o estilo socrático do Diálogo, conclui que para Nóbrega todos os pagãos
podiam ser convertidos pela pregação, no entanto, os “pagãos civilizados” precisavam apenas ser
persuadido com uma argumentação racional, enquanto que os “pagãos brasileiros” necessitavam
de outra estratégia missionária, justificando assim, a prática do medo servil. Id. Ibidem, pp. 105,
106.
lxix
118
Cf. “Carta Ânua do que se tem obrado na missão da Serra de Ibiapaba desde o ano de 93 até o
presente de noventa e 5 para o Padre Alexandre de Gusmão da Companhia de JESUS Provincial
da Província do Brasil” [10/10/1695]. In. LEITE, Serafim, S.I. Op. Cit., III, pp. 38-56.
119
Sobre os embates do terço de Matias Cardoso na região do Açu e Jaguaribe, vide: A
Guerra do Açu. In: PUNTONI, Pedro. Op. Cit., pp. 123-180.
lxx
120
Para um comentário sobre a carta de Vieira ao Provincial e, ainda, uma discussão sobre as
“fronteiras da Cristandade” no Maranhão, vide: CARDOSO, Alírio Carvalho & CHAMBOULEYRON,
Rafael. Fronteiras da Cristandade: relatos jesuíticos no Maranhão e Grão-Pará (século XVII). In:
PRIORI, Mary Del & GOMES, Flávio dos Santos (orgs). Os senhores dos rios. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2003, pp. 33-60.
121
Para uma seminal discussão sobre as concepções redutora e simplista sobre os inacianos na
Colônia, vide: Continuidade, totalidade, periodização, cortes. Sobre a historiografia da religião do
Brasil-Colônia. In: NEVES, Luiz Felipe Baêta. Vieira e a imaginação social jesuítica: Maranhão e
Grão-Pará no século XVII. Rio de Janeiro: Topbooks, 1997, pp. 37-78.
122
Vale lembrar que a metáfora do mundo como teatro fora um dos temas recorrente entre os
escritores da época Barroca, dentre eles, o próprio Pe. Vieira. Cf. Semen est verbum Dei. In:
SANTOS, Beatriz Catão Cruz. O pináculo do temp(l)o: o Sermão do padre Antônio Vieira e o
Maranhão do século XVII. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1997, pp. 73-92.
lxxi
CAPÍTULO II
____________________________________________
DESORDEM E HERESIA NA REPÚBLICA DE
BACO
LEITE, Serafim, S.I. História da Companhia de Jesus no Brasil. Lisboa / Rio de Janeiro: Livraria
123
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. In: GIORDANO, Cláudio
124
(coord). Escritos Instrumentais sobre os Índios. São Paulo: EDUC/Loyola/Giordano, 1992, p.148.
125
O bispo Sardinha até permitia um intérprete na confissão por conta da
demanda e pouco conhecimento dos dialetos indígenas, mas que deveria ser
“homem prudente e honesto”. Já em 1552, havia notícias também de mulheres
usadas pelos jesuítas como intérpretes na prática confessional. Cf. O’MALLEY,
John W. Os primeiros jesuítas. Tradução Domingos Armando Donida. São
Leopoldo, RS: Editora UNISINOS; Bauru, SP: EDUSC, 2004, p. 238.
lxxiv
também aparece como marca identificadora, como um cristão até certo ponto sob
condição, numa clara aproximação do alter e do ego que, em última instância,
segregava, diferenciava. Aproximação sim, mas para demarcar diferenças.
Neste sentido, o batismo para os padres marcava não somente o
rompimento com antigos costumes ancestrais e nascimento de uma simbologia
espiritual, mas, dentro da ideologia da catequese, o nascimento também religioso
(de caráter doutrinal e litúrgico) e social do indivíduo. E no contexto do ministério,
significava ainda, “sinal de conversão – o signo de sucesso da missão” (NEVES,
1978: 74). Com esse sacramento, em especial, efetivamente, expandia-se a
Cristandade e dissipava-se o paganismo.
Entre os Tupinambá, a escolha dos nomes não era tarefa fácil e, por
vezes, exigia mesmo, a organização de um conselho para indicar uma
denominação que melhor exprimisse “a personalidade psicológica e mística de
seu portador” (MÉTRAUX, 1979: 97). Por isso a constante mudança ou acréscimo
de novos nomes aos usados desde criança - que assinalavam seu prestígio
social126, e a estreita ligação com o Mundo dos espíritos e com a natureza – de
elementos do Mundo animal, vegetal, mineral -, mas também associados a
alimentos ou objetos manufaturados.
Em Ibiapaba, os relatos jesuíticos dão conta de índios conhecidos como
Cobra Azul, Lagartixa Espalmada, Milho Verde, Mel Redondo, Acaju (fruto do
cajueiro), Mandiaré (espécie de mandioca), Carapecu (acarás ou peixe de
escama), Antonio Carajbpocu127, Diabo Ligeiro e Diabo Grande.
Este último era o Principal da maior aldeia contatada pelos missionários,
no primeiro momento, em 1607. Sua designação (em tupi, Jurupariaçu) refere-se a
126
O ritual antropofágico tupi marcava esta mudança: “De todas as honras e gostos da vida”,
mencionou Cardim (1978 [1625]: 159), “nenhum é tamanho para este gentio como matar e tomar
nomes nas cabeças de seus contrários”. Para Fausto (apud NOVAES, 1999: 267, 268), “ o
matador emerge como um novo homem, mais forte e mais criativo, mas ao mesmo tempo mais
perigoso, pois passa a conter em si uma nova subjetividade: aquela de sua vítima”.
127
Um dos índios mortos com Francisco Pinto no ataque dos Tarairiú. Na análise
de Sobrinho, a etimologia da palavra Carajbpocu ou Caraíba pocu (ou mucu),
referia-se a um catecúmeno de elevado prestígio junto aos padres. Cf.
SOBRINHO, Thomas Pompeu. “Notas e comentários”. In: Três Documentos do
Ceará Colonial. Fortaleza: Instituto do Ceará, 1967, p. 145. Tese confirmada, uma
vez, que o dito índio teve um enterro cristão ao lado da sepultura do Pe. Pinto.
lxxvi
vassalos de El-Rei meu Senhor unindo-se Vossa Mercê com sua gente
aos Porgueses [...] pelo qual já mereceu, que o dito Senhor o honrasse
com carta assinada pela sua real mão, me acho obrigado a agradecer-
lhe de novo este particular serviço”129.
129
“Carta que se escreveu [rasurado] Jacob de Sousa e Castro, Governador dos Índios da sua
Nação Tabojara” [1715]. In: Documentos Históricos – DH, Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro,
1938, vol. 40, p. 10.
130
A partir do século XVI, D. João III reuniu o grão-mestrado das três ordens militares – Cristo, Aviz
e Santiago -, numa poderosa instituição religiosa e militar cujo objetivo era distribuir comendas e
hábitos como “instrumentos de clientelismo para a coroa e de promoção social para os premiados”.
Cf. ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios aldeados no Rio de Janeiro colonial – novos
súditos cristãos do Império português. Campinas: Tese de doutorado, Universidade de Campinas,
2000, p. 150.
lxxviii
Por isso, o trajeto não fora feito de qualquer maneira, como uma
expedição qualquer liderada por militares e/ou aventureiros em busca de
enriquecimento fácil de “peças e pedras”133, mas concebido como uma
peregrinação religiosa em sentido lato:
“..., logo pella menhã rezávamos o itinerário e ladainhas de
Nossa S’ora e depois entre dia as dos Santos e co nossos bordões na
mão e nosso cabasso de agoa nos hiamos caminhando tendo nossa
oração pello caminho como podíamos o tempo q’ nos parecia”134.
Se a expedição pioneira dos padres fora uma empresa de
reconhecimento, como o autor afirma, entretanto, diferenciava-se da de Pero
Coelho (1603), pelas ações e pelos atores envolvidos: sessenta índios, sem
guarnição militar, com liderança de dois missionários sob o auspício da Cruz.
Pouco mais de cinqüenta anos mais tarde, Pe. Vieira, discorrendo sobre a
terra talha, enquadrou os índios e mais importante, sua potencialidade, para se
tornarem cristãos, numa analogia com os “negros penhascos”. Nesse trecho, logo
abaixo, é possível percebermos a mistura de espanto frente à natureza, mas que
seu espírito missioneiro, finda por desenvolver uma visão utilitarista para sua
exploração, de missões ainda futuras:
“Ibiapaba, que na língua dos naturais quer dizer terra talha,
não é uma só serra, como vulgarmente se chama, senão muitas serras
juntas, que se levantam ao sertão, das praias do Camucí, e mais
parecidas as ondas do mar alterado, que a montes, se vão sucedendo,
e como encapelando umas após das outras em distrito de mais de
quarenta légoas: são tôdas formadas de um só rochedo duríssimo e em
partes escalvado e medonho, em outras cobertas de verduras e terra
lavradia, como se a natureza retratasse nestes negros penhascos a
condição de seus habitadores, que sendo sempre duras, e como de
pedras, às vezes dão esperanças, e se deixam cultivar”135.
133
Para Holanda, tais expedições não encontrando ouro ou pedras preciosas na
“geografia fantástica” das lendas inventadas pelos índios, tinham na “caça ao
gentio” a possibilidade do lucro fácil e garantido. Cf. Peças e pedras. In:
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Visão do Paraíso: os motivos edênicos no
descobrimento e colonização do Brasil. 6ªed. São Paulo: Brasiliense, 1996, pp. 35-
66.
134 FIGUEIRA, Luiz, S.I. “Relação do Maranhão [1608]”. Op. Cit., p. 78.
135
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660], Op. Cit, p. 148.
lxxxi
136
BRUIT, Héctor. O visível e o invisível na conquista hispânica da América. In: VAINFAS, Ronaldo
(org). América em tempo de conquista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992.
137
Levantamos algumas hipóteses sobre essa mudança de padroeiro em Ibiapaba, no último tópico
do capítulo final.
lxxxii
138
FIGUEIRA, Luiz, S.I. “Relação do Maranhão [1608]”. Op. Cit., p. 80.
lxxxiii
Uma das causas do êxito dos missionários entre os Tupi, no Maranhão, foi
a promessa de sempre manter os espíritos afastados das aldeias, contudo houve
uma leitura precipitada por parte dos padres que enquadraram toda diversidade
considerável de seres espirituais da cosmologia indígena, num único reduto de
símbolo cristão que representava a maldade personificada no demônio
(MÉTRAUX, 1979: 56-62).
A construção de uma paisagem cristã, em terras gentílicas, fora sempre
acompanhada por uma espécie de contabilidade da salvação. As fontes que
conseguimos elencar não trazem, em princípio, quaisquer diferenças marcantes
nos números apresentados, quer de índios aldeados quer de índios que podiam
ser aldeados, no momento que os missionários considerassem oportuno, numa
clara sistematização de dados e informações coletados, que a mera substituição
de um sacerdote ou Superior no território missionado – resultado, talvez, de uma
ordem superior para ocupar outros cargos na hierarquia da Companhia ou
assistência espiritual noutra parte da imensa Província Jesuítica e, ainda, da
repentina expulsão acionada por guerra ou levante nativos -, não poriam em risco
anos de trabalho missionário.
Essa preocupação com a descontinuidade catequética era também uma
preocupação na ordenação do cotidiano nas missões, que quase sempre recaia
sobre o controle pessoal dos índios. O “remédio das almas”, disse Pe. Vieira,
devia ser aplicado, individualmente, sempre que necessário, num reforço
doutrinário para catecúmenos displicentes – “se há alguns mais rudes”.
“Isto se poderá fazer mais comodamente, quando as Aldeias
se desobrigarem pela quaresma, pondo à margem das listas, defronte
do nome do que há mister ser ensinado este sinal + [uma cruzinha]
139
Cf. “Espíritos”. In: MÉTRAUX, Alfred. A religião dos Tupinambás e suas relações com as demais
tribos tupi-guarani. Prefácio, tradução e notas de Estêvão Pinto; apresentação de Egon Schaden –
2ª ed. São Paulo: Ed. Nacional: Ed. da Universidade de São Paulo, 1979, pp. 56-62.
lxxxiv
para que o mesmo padre, ou outro que lhe suceda, conheça os que
necessitam de ser catequizados”140.
140
“Visita”. In: LEITE, Serafim, S.I. Op.Cit., IV, pp. 106-124, §16.
141
MORAES, Pe. José de, S.I. História da Companhia de Jesus na Extinta Província do Maranhão
e Pará. Rio de Janeiro: Typographia do Commercio, 1860 [1759], p. 26.
lxxxv
142
O mais conhecido representante dos Tupi teriam sido os Tupinambá que habitavam grande
parte do litoral na Colônia. Tal qual o primeiro, este termo também ganhou uma certa elasticidade
conceitual abrangendo os Tamoio, no litoral de Angra dos Reis; os Tamiminó, do Espírito Santo e
na margem esquerda do baixo Paraíba e sul do Macuco; os Tupiniquim, localizados entre Vitória e
Camamu, emigrando para as cabeceiras do Tietê; os Caeté, que viviam entre o São Francisco e
Itamaracá; os Tabajara (ou Tobajara), que imperavam no território entre a Capitania de Itamaracá
e o rio Paraíba, de onde emigraram para as Serras de Ibiapaba e o Maranhão; os Petiguara (ou
Potiguara), na região do rio Jaguaribe; e os Guajajara, do Vale do Pindaré. Cf. MÉTRAUX, Alfred,
lxxxvi
certos traços sociais, este, contudo, fora construído como uma categoria política
no interior das práticas coloniais. Logo, o termo “Tapuia” não pode ser
“compreendido como um etnônimo”, pois, como bem apontado por Puntoni (1998:
5), “seu significado básico está associado a uma noção de barbárie duplamente
construída. São bárbaros aqueles assim considerados pelos ‘outros’ que podem
ser integrados mais imediatamente à cristandade: os Tupi”. De modo que os
“Tapuia” representados pelos cronistas coloniais aparecem em termos negativos
e, como antítese das sociedades tupi (MONTEIRO, 1994: 20).
O Pe. Fernão Cardim, missionário jesuíta que ocupou importantes cargos
na hierarquia da Companhia de Jesus (Reitor, Procurador, Provincial) e que teria
ordenado a partida de Recife dos jesuítas Francisco Pinto e Luiz Figueira para as
Serras de Ibiapaba, em 1607, referindo-se aos Tapuyas, tornou ainda mais clara
essa antítese: “Todas estas setenta e seis nações de Tapuyas, que têm as mais
dellas differentes línguas, são gente brava, silvestre e indomita, são contrarias
quase todas do gentio que vive na costa do mar, vizinhos dos Porguezes”, e para
convertê-los conclui o sacerdote, “Somente fica um remédio, se Deus Nosso
Senhor não descobrir outro, e é havendo ás mãos alguns filhos seus aprenderem
a língua dos do mar”144.
Assim, as várias categorias sociais construídas no bojo da sociedade
colonial para identificação das diferentes sociedades indígenas também
conheceram “marcadores étnicos genéricos”. No entanto, para além do binônio
Tupi/Tapuia, comumente, observado e apontado nas pesquisas etno-históricas no
feixe acomodação/resistência, Monteiro nos alerta, com razão, que a “tendência
de definir grupos étnicos em categorias fixas serviu não apenas como instrumento
Op. Cit.; CASTRO, Eduardo Viveiros de. O mármore e a murta; sobre a inconstância da alma
selvagem. Revista de Antropologia. São Paulo, USP, 1992, v. 35, pp. 21-74. Vale lembrar, que os
Tabajara eram Tupinambá de fato, não sofrendo tal elasticidade conceitual.
143
Alguns autores defendem a tese de uma unidade lingüística e/ou cosmológica entre os Tupi e
os Guarani, usando a expressão “Tupi-guarani” em suas análises, como, por exemplo, Estêvão
Pinto (1935),Viveiros de Castro (1992), Métraux (1979), Nimuendaju (2002). Entre alguns
historiadores, entretanto, esta unidade seria analiticamente problemática. Cf. Pompa (2003).
144
Para conhecer nominalmente esses Tapuia e a concepção classificadora de Cardim, vide: Do
princípio e origem dos índios do Brasil e de seus costumes, adoração e cerimonias. In: CARDIM,
Fernão, S.I. Tratados da Terra e Gente do Brasil. Introd. e notas de Baptista Caetano, Capistrano
de Abreu e Rodolfo Garcia. 2ª ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939, pp. 142-181.
lxxxvii
145
Cf. MONTEIRO, John M. Entre o Etnocídio e a Etnogênese: identidades indígenas coloniais.
Campinas: Unicamp, 2000, p. 6 (Mimeo). Esta última afirmação de Monteiro parece ter ocorrido em
Ibiapaba, sobretudo, na relação dos Principais com jesuítas e autoridades coloniais, como teremos
oportunidade de demonstrar em tópico específico.
146
“Carta Ânua do que se tem obrado na missão da Serra de Ibiapaba desde o ano de 93 até o
presente de noventa e 5 para o Padre Alexandre de Gusmão da Companhia de JESUS Provincial
da Província do Brasil” [10/10/1695]. In: LEITE, Serafim, S.I., Op. Cit., III, p. 43.
147
Serafim Leite (1938-1950, III: 61), diz em nota, que se tratavam dos Carateu ou Crateus. Esta
nomenclatura, contudo, não se encontra nem no “Mapa Etno-histórico” de Nimuendaju (2002) e
nem na listagem de “Os indígenas do Nordeste”, organizada por Estêvão Pinto (1935).
148
Estevão Pinto (1935) não faz qualquer referência aos Quitaiaíu e Acongá; Nimuendaju (2002:
55, 58), entretanto, os cita, mas sem apontar sua filiação lingüística.
149
O domínio da família dos Garcia d’Ávila durante três séculos senhoreou parte do sertão – desde
a Bahia até a divisa do Piauí com o Maranhão -, ocupando uma área pouco maior de 400 léguas
(2.640 Km). A autonomia dos senhores da Casa da Torre se explica em parte, pela existência do
morgadio, “surgida em Portugal no século XIV com o objetivo de fortificar a propriedade nobiliária,
mediante o estabelecimento de sua indivisibilidade e vinculação da herança ao direito de
primogenitura”. Cf. BANDEIRA, Moniz. O feudo: a Casa da Torre de Garcia d’Ávila: da conquista
dos sertões à independência do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, p. 25.
150
Na Capitania do Ceará, a Casa da Torre não conseguiu estender seus domínios até a região do
Cariri (ao sul do estado), como requerido, devido à reivindicação judiciosa em Portugal de um
senhor de nome Arioso que se intitulava “primeiro descobridor do Cariri”. Cf. Id. Ibidem, p. 248.
151
Nimuendaju (2002: 41, 42, 48), cita os Anacê, que pela distribuição geográfica de seu mapa,
bem poderia referir-se aos Guanacê. Cita ainda, os Reriíu e Aconguaçú sem, contudo, conhecer
sua filiação lingüística. Estevão Pinto (1935) não os cita.
lxxxviii
152
Diferente das missões jesuíticas orientais – que usavam a escrita como
mediação idiomática -, no Brasil, os missionários tinham que se fixar na oralidade
do tupi falado, cabendo aos padres “reduzir” os inúmeros dialetos nativos ao
alfabeto romano e as regras gramaticais latinas. Sobre este aspecto importante do
trabalho jesuítico, que mais que traduzir palavras, traduzia-se também tradições e
relações sociais, vide: A Língua mais usada na Costa do Brasil: Gramáticas,
Vocabulários e Catecismos em Línguas nativas na América Portuguesa. In:
MONTEIRO, John M. Tupis, Tapuias e Historiadores – Estudos de História
Indígena e dos Indigenismo. Campinas: Tese de Livre Docência, Universidade de
Campinas, 2001, pp. 36-52.
153
A Congregação Geral reunia – sem uma periodicidade certa -, todos os Provinciais da
Companhia espalhados no mundo. Sendo a instância máxima da Ordem, seu objetivo é deliberar
sobre assuntos considerados urgentes e também de escolha do Padre Geral. A primeira data de
1558, para escolha do sucessor de Inácio e confirmação das Constituições e a última
(Congregação Geral XXXIV) de 1993, para complementar ou suprimir a versão das Constituições.
xci
154
Entre índios aldeado e não aldeado, Ibiapaba possuiria mais de dez mil habitantes compondo
doze companhias militares a serviço do Império português (LEITE, 1938-50, III: 65). Este aspecto
belicoso dos nativos enquanto vassalos do rei foi característico do século XVIII.
xcii
Pernambuco
Guajuru 250
Guaraíras 300
Jaguaripe[Jaguaribe] 1000
Lagoa do Podi no Açu 1000
Serras de Ibiapaba 4000
Urutaguí 150
Total 6700
Baía
Aldeia de Cana Brava 800
Aldeia de Ilhéus 900
Aldeia de Juru 400
Aldeia de Saco 700
Aldeia do Espírito Santo 300
Aldeia e Natuba 600
Camamu 300
Patatiba 300
S. João do Porto Seguro 500
Serinhaém 50
Total 4850
Total 1100
Rio de Janeiro
Cabo Frio 1000
Itinga 300
São Barnabé 400
São Lourenço 100
Total 1800
São Paulo
Emboug, Capela e Campos da
Paraíba 1000
155
“Informação para a Junta das Missões de Lisboa, 1702”. In: LEITE, Serafim, S. I., Op. Cit., IV,
pp. 569-573.
156
Por Provisão (22/10/1735) foram confiadas aos jesuítas no Ceará sete aldeias indígenas que
acabaram por serem reduzidas a quatro, constando no Catálogo da Companhia em 1741:
Parangaba, com “índios da Aldeia Nova e Anacés de Aguanambi” sob orago de Bom Jesus (1.200
índios); Caucaia ou “Nossa Senhora dos Prazeres de Caucaia” (600 índios); Paupina, com índios
transferidos de Paranamirim sob invocação de Nossa Senhora da Conceição (800 índios); “Aldeia
dos Paiacus” composta por índios fugitivos do Apodi no Rio Grande, sob orago também de Nossa
Senhora da Conceição (200 índios). Cf. LEITE, Serafim, S. I. Op. Cit., III, pp. 85-96.
xciv
157
“Sermão da Sexagésima”. In: VIEIRA, Antônio, S.I. Sermões (vol. I). Introdução e supervisão
técnica de Luiz Felipe Baêta Neves. Erechim: EDELBRA, 1998, p. 30.
158
Id. Ibidem.
xcv
159
Vieira quando em visita as Serras de Ibiapaba, em 1660, acordou com os Principais que as
vinte povoações em que estavam dispersos ficaria em apenas uma, com igreja e sob a supervisão
dos missionários. Cf. LEITE, Serafim, S. I., Op. Cit., III, p. 25.
160
“A um padre provincial do Brasil, 10 de junho de 1658”. In: VIEIRA, Antônio, 1608-1697. Cartas
do Brasil. Organização e introdução de João Adolfo Hansen. São Paulo: Hedra, 2003, p. 191.
xcvi
161
“Carta ânua ao geral da Companhia de Jesus” [30/09/1626]. In: VIEIRA,
Antônio, S.I, 1608-1697. Cartas do Brasil. Op. Cit., pp. 77-117.
162
Sua última carta, escrita sete dias antes de sua morte, data de 10/07/1697,
endereçada ao secretário do Duque de Cadaval. Não fosse sua conhecida
influência na Colônia, na Corte e outros países, sua longevidade (1608-1697)
abrangendo quase todo século XVII e seus escritos - 710 cartas conhecidas e
duzentos sermões, que ele mesmo reescreveu para posterior publicação -, Vieira,
já mereceria atenção dos historiadores deste século da história do Brasil.
HANSEN, João Adolfo. Introdução. Id. Ibidem, pp. 7-74.
xcvii
163
“Carta ânua ao geral da Companhia de Jesus” [30/09/1626]. Op. Cit., p. 86.
xcviii
Potiguara, cujo fim era a inserção dos índios no Mundo colonial, sob essa
perspectiva de correlação de forças aliadas (POMPA, 2003: 207-210).
Matias Beck, a mando da Assembléia dos Nobres e Poderosos Senhores,
de Pernambuco, senhoreou a capitania do Ceará por pouco mais de cinco anos. O
registro da dominação holandesa, nesse período, encontra-se em seu Diário que,
infelizmente, está incompleto, pois abrange apenas três meses entre sua viagem e
os primeiros dois meses no Ceará, entretanto é possível compreendermos que
tipo de relação estava esboçada com os povos indígenas no litoral. Antes mesmo
de pisar em terras cearenses, Beck, chamando os subordinados, exortou que,
“neste intento dei ao comandante Maes todas as ordens necessárias
para que fossem transportados à terra na devida forma, e mandei
recomendar a todos, sob pena corporal, que não fizessem aos índios,
assim homens como mulheres, nem as suas plantações ou roças, o
menor dano ou gravame ou desgosto, e assegurar-lhes que aqueles
que violassem semelhante ordem e cometessem qualquer dano ou
violência, seriam exemplarmente castigados”164 (grifos nossos).
164
BECK, Matias. “Diário de Matias Beck” [1649]. In: Três Documentos do Ceará
Colonial. Op. Cit., p. 230.
165
Cf. Os “Tapuia” dos holandeses. In: POMPA, Cristina. Religião como tradução:
missionários, Tupi e “Tapuia” no Brasil colonial. Bauru, SP: EDUSC, 2003, PP.
240-256.
xcix
166
BECK, Matias. Op. Cit., p. 229.
167
Além dos índios de Pernambuco refugiados em Ibiapaba, a política de entrada
ao interior promovido, sobretudo, por bandeiras paulistas após a Restauração,
empurrou para os sertões do rio Salgado e Vale do Cariri, no Ceará, aldeias
indígenas no rio Piancó e alto Piranhas. Cf. POMPA, Cristina. Op. Cit., p. 245.
c
vencedoras, uma vez que diversos povos indígenas colaboraram, de fato, com os
inimigos e hereges do Catolicismo Romano e do Rei português.
Para Evaldo Cabral de Mello (1998:15, 16), a presença e conquista
neerlandesa, no nordeste, não devem ser entendidas como tentativa, aliás,
fracassada, de substituição de instituições e valores lusos por outras mais liberais
e desenvolvidas, tema recorrente na historiografia nativista; ou “ainda nos
fenômenos de choque e acomodação de cultura entre protestantes do norte da
Europa e católicos da península ibérica”; mas sim, no proveito imediato que a
guerra podia trazer sobre a sociedade colonial, que se desenvolvia no Brasil. Ora,
se a peleja entre católicos e protestantes da Europa não pode ser considerada
parâmetro no entendimento dos significados da guerra luso-holandesa, o mesmo
não se pode afirmar do transtorno que foi para os jesuítas a presença dos índios
“convertidos” ao Calvinismo, nas Serras de Ibiapaba, na época de Vieira.
Certamente, o jovem Viera, em 1626, não era o mesmo do período em
que missionou no Maranhão, assim, como também não era o já cego e
convalescente ancião no final do Setecentos, pressupondo-se, por isso, haver
vários “Vieiras” como também vários “Maranhões”, “Parás” e “Brasis”, tão bem
salientado por João Adolfo Hansen (2003: 11). Contudo o jovem noviço que
apontou a derrocada portuguesa, na Bahia, como castigo divino pelas injustiças
cometidas aos índios, repetiu, décadas depois, o mesmo argumento ao referir-se a
Pernambuco:
“Entregou Deus Pernambuco aos holandeses por aqueles
pecados que passam aos reinos de umas nações a outras, que são as
injustiças. E como grande parte das injustiças do Brasil caíam desde
seu princípio sobre os índios naturais da terra, ordenou a justiça divina
que dos mesmos índios junto com os holandeses se formasse o açoite
daquela tão florente República (...); sendo os índios, como inimigos
domésticos, os guias que franqueavam a campanha aos holandeses e
os executores das crueldades que eles política e hereticamente lhes
cometiam”168(grifos nossos).
Castigo divino e heresia dos novos inimigos dos jesuítas, na Colônia, eis
os pontos norteadores do argumento de Vieira. Mas podemos perceber que não
168
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op.
Cit., p. 139.
ci
169
Id. Ibidem, pp. 131, 132.
170
Id. Ibidem, p. 139.
cii
171
No “sermão dos sermões”, Vieira mesmo sem referir-se aos reformados, afirma
que a diferença entre pregador verdadeiro e falso é que este último prega “as
palavras de Deus” e não “a palavra” Dele, promovendo o uso incorreto das
Escrituras, então conclui: “tomados em verdadeiro sentido, são palavras de Deus,
tomados em sentido alheio [fora da Igreja Romana], são armas do diabo”. Cf.
VIEIRA, Antônio, S.I. Sermão da Sexagésima [1655]. Op. Cit., pp. 27-54.
172
VIEIRA Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op. Cit.,
p. 139.
civ
173
Id. Ibidem, pp. 134, 135.
174
Id. Ibidem, pp. 138, 139.
cv
175
Id. Ibidem, p. 132.
176
Tal analogia se processou por conta das práticas nativas do homem contrair em matrimônio a
viúva de seu irmão falecido, “como se a tivessem recebido de Moisés”, disse Vieira. Id. Ibidem, p.
165.
cvi
177
Cf. SOUTO MAIOR, Pedro. A Missão de Antônio Paraupaba ante o Governo Hollandez. RIC,
1912, t. 26, pp. 72-82.
cvii
180
Cf. Carta-resposta de Pedro Poty a seus parentes [31/10/1645]. In: SOUTO MAIOR, Pedro.
“Dois índios notáveis e parentes próximos”. Op. Cit., pp. 61-68.
181
Carta circular de Felipe Camarão a índios inimigos [28/03/1646]. In: Id. Ibidem.
182
Cf. Os holandeses e seus aliados. In: POMPA, Cristina. Op. Cit. pp. 207-218; A Re-socialização
nas Aldeias: as múltiplas etnias tornam-se índios aldeados e súditos cristãos do Império português.
In: ALMEIDA, Regina Celestino de. Op. Cit. pp. 118-186.
cix
183
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op. Cit. pp. 151, 152.
cx
Paraupaba. Com a paz alcançada por Antônio Ribeiro, apontou Vieira: “duas
povoações que eram compostas de gentios e hereges ficaram de todas cristãs”184.
Com a volta de Antônio Ribeiro à Ibiapaba, os missionários receberam
notícias do Visitador, que por conta da instabilidade dos índios, mandava que
abandonassem urgentemente a missão e levassem, para o Maranhão, todos os
índios que quisessem seguí-los. Novamente, aflora-se a desconfiança nos padres,
só que desta vez, o autor da Relação - num dos raros momentos de sua escrita -
dá voz direta aos nativos:
“Não tinha acabado de dizer o padre, quando já estava lida a
resposta no semblante de todos, os quais rebentara, dizendo: Eis aqui
como era verdade o que até agora todos cuidávamos, e como os
padres não tiveram nunca outro intento, senão de nos arrancar de
nossas terras para nos fazerem escravos de seus parentes, os
brancos” (grifos nossos).
184
Id. Ibidem, pp. 153, 156.
185
Id. Ibidem, p. 162.
cxi
lhe pesava mais, que ser cristão e ter recebido o batismo”186. Ora, o batismo como
sacramento aplicado e marcador por excelência, da Cristandade, não exigia dos
índios uma absorção interior e plena dos ensinamentos pregados, geralmente,
sendo suficientes algumas repetições de catecismos, ladainhas e práticas
litúrgicas exteriores; em suma, porque para a Companhia de Jesus, o número de
índios batizados aparecia aos olhos das autoridades coloniais, como resultado
concreto do trabalho catequético, podendo, por isso mesmo, maquiar a verdadeira
face das dificuldades na conversão e, ainda, barganhar da Coroa subsídios para a
Obra - em forma de côngruas, transporte marítimo gratuito para deslocamentos,
ajudas especiais para construção de Colégios, igrejas, hospícios e até isenções
fiscais, etc.. E essa farsa explica, pelo menos em parte, a sempre inconstância187
dos já batizados na prática cotidiana das missões.
Diferente do batismo, a confissão exigia de seus praticantes, certa
compreensão da abstração doutrinária nela subjacente. A primeira geração de
jesuítas, no bojo das discussões do Concílio de Trento, já a entendia menos como
auxílio para o Perdão divino a cada pecado grave cometido, e mais como meio
eficaz para um novo modo de vida, promovendo “um conhecimento mais
aprofundado de si mesmo e para retornar mais firmemente a Deus e fugir para
longe daquilo que era errado e prejudicial” (O’MALLEY, 2004: 216, 217). É claro
que essa visão jesuítica ruiu por terra quando estes se depararam com os povos
indígenas no Novo Mundo, tendo este sacramento ganhado nova funcionalidade
no âmago das missões, ou seja, como um dos mais importantes mecanismos de
vigilância sobre as práticas sociais indígenas. Talvez, alguns padres jesuítas
nunca tenham perdido de vista esse aspecto ideal da prática confessional, mas
não há dúvidas que com os índios houve certo desvio teológico primário para
conhecer seus pensamentos e, a partir deles, traçar estratégias de ação
missionária.
186
Id. Ibidem, pp. 134, 167.
187
É claro que tal inconstância indígena não era resultado apenas de uma má
avaliação dos missionários, implicando questões mais profundas a cerca da
cosmologia tupinambá. Sobre isto ver instigante artigo de Castro. Cf. CASTRO,
Eduardo Viveiros de. Op. Cit., pp. 21-74.
cxii
188
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op. Cit. pp. 167, 168.
189
Id. Ibidem, p. 166.
cxiii
190
Solapada pela ação do fogo, apenas um homem teria escapado do desastre:
Irin-magé, que se conservou no Céu junto a Monan. A terra então foi resfriada com
as águas do dilúvio formando os rios, montanhas, depressões e o mar – salgado
pelas cinzas. Monan então deu uma mulher a Irin-magé e este casal repovoou o
globo após o cataclisma. Cf. MÉTRAUX, Alfred. Op. Cit. , p. 31.
191
O tradutor de Métraux, afirma que este pediu para substituir a expressão “deus-civilizador” por
“herói-civilizador” sem, contudo, explicar melhor tal mudança conceitual. Cf. Id. Ibidem, p. 20, nota
“m”.
cxiv
192
VIEIRA, Antônio, S.I. “Relação da Missão da Serra de Ibiapaba” [1660]. Op. Cit.
cxv
mas sabem que tem alma e que esta não morre e depois da morte vão
a uns campos onde há muitas figueiras ao longo de um rio, e todos
juntos não fazem outra coisa senão bailar” (grifos nossos).
193
Id. Ibidem.
cxvi
194
Id. Ibidem, p. 167.
cxvii
menos, nos obstáculos diversamente apontado pelos padres. Seja como for,
Vieira não quis arriscar todo trabalho, então realizado, nessa retomada das
missões, em Ibiapaba, pois durante os quase dois meses de permanência nas
Serras, tomou drásticas resoluções que mexeram com os envolvidos:
“A primeira que se resolveu, e executou logo, foi que todos os
índios de Pernambuco saíssem e fossem para o Maranhão (...); e os da
serra, sem o exemplo e doutrina dos pernambucanos, que eram os
seus maiores dogmatistas, ficarão mais desimpedidos e capazes de
receber a verdadeira doutrina, e de os padres lhes introduzirem a forma
da vida cristã, o que, endurecidos com a contrária, se lhes não
imprimia”196 (grifos nossos).
196
Id. Ibidem, p. 189.
197
Os índios estavam espalhados em vinte povoações para melhor defender-se de um possível
ataque dos portugueses. É provável que esta tática de defesa tenha sido levada pelos índios de
Pernambuco demonstrando sua influência até sobre o espaço físico ocupado.
198
Na documentação jesuítica não é comum encontrarmos notícias de castigos
físicos. Isto se explica, em grande parte, pelo maior apologeta da Companhia no
Brasil, Serafim Leite, propositalmente substituir termos traduzidos (do espanhol e
latim) ou omitir partes das fontes que pudessem explicitar em demasia esta
prática. Não podemos esquecer que este jesuíta teve acesso direto a documentos
inéditos e, ainda, fechados em Arquivos da Ordem na Europa para escrever sua
História da Companhia de Jesus no Brasil [1938-1950] e que por muito tempo foi a
única voz “legítima” sobre os jesuítas no Brasil. Cf. HANSEN, João Adolfo. História
da Companhia de Jesus no Brasil. In: MOTA, Lourenço Dantas (org). Introdução
ao Brasil. Um banquete no trópico. São Paulo: Editora SENAC-SP, 2001, pp. 45-
73; em Ibiapaba conhecemos apenas mais um exemplo desta função. Em 1607 o
“braço dos padres” também foi um irmão do maior Principal, “diabo ligeiro”, sendo
“alcaide dos outros” com uma vara em mãos, percorria a aldeia de madrugada
exortando todos que fossem filhos de Deus e Nossa Senhora e não acreditassem
cxix
mais nas “coisas de seus antepassados”. Cf. FIGUEIRA, Luiz, S.I. “Relação do
Maranhão” [1608]. Op. Cit., pp. 76-113.
cxx