Desenvolvimento Regional
Desenvolvimento Regional
Desenvolvimento Regional
DESENVOLVIMENTO REGIONAL
EM EXPERIÊNCIAS DE
SANTA CATARINA, PARANÁ E
MATO GROSSO DO SUL
APOIO: Este livro teve o apoio financeiro para publicação da
(Organizadores)
ESTUDOS SOBRE
DESENVOLVIMENTO REGIONAL
EM EXPERIÊNCIAS DE
SANTA CATARINA, PARANÁ E
MATO GROSSO DO SUL
1ª edição
LiberArs
São Paulo - 2016
Estudos sobre desenvolvimento regional em experiências de Santa Catarina,
Paraná e Mato Grosso do Sul.
© 2016, Editora LiberArs Ltda.
ISBN 978-85-9459-027-5
Editores
Fransmar Costa Lima
Lauro Fabiano de Souza Carvalho
Revisão Ortográfica
Os organizadores
Editora LiberArs
Revisão técnica
Cesar Lima
Editoração e capa
Simone Alauk
ISBN 978-85-9459-027-5
CDD 338.9
CDU 338
Todos os direitos reservados. A reprodução, ainda que parcial, por qualquer meio,
das páginas que compõem este livro, para uso não individual, mesmo para fins didáticos,
sem autorização escrita do editor, é ilícita e constitui uma contrafação danosa à cultura.
Foi feito o depósito legal.
PRIMEIRA PARTE
DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE
DESENVOLVIMENTO NO TERRITÓRIO DO CONTESTADO
SEGUNDA PARTE
DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE
DESENVOLVIMENTO EM OUTROS ESTADOS DO BRASI
11
PRIMEIRA PARTE
13
TERRITÓRIO DO CONTESTADO:
ASPECTOS HISTÓRICOS DO PROCESSO DE
MARGINALIZAÇÃO
1. INTRODUÇÃO
15
conformou e o conformam em suas dimensões sociais, políticas, econômicas e
culturais contemporâneas.
Neste contexto, a precisão conceitual em torno do termo marginalização
assume importância decisiva, o que nos remete a uma consulta aos dicionários
da língua portuguesa, que remetem o termo marginalização ao verbo margina-
lizar: 1. “Impedir que participe de; por a margem de uma sociedade, de um
grupo, da vida pública.” Assim, a definição de marginalização sugere uma ação
marcada pela violência perpetrada por indivíduos, que impedem que outros
indivíduos participem de determinado âmbito de relações individuais, ou
sociais. Sugere por extensão, ação violenta de grupos, ou de instituições que
cerceiam a participação de outros grupos, de setores da sociedade da vida
social de uma comunidade, de um território, ou mesmo de um país.
16
como o resultado necessário de um passado que se atualiza no presente, nem
mesmo como transição para outro tempo futuro, mas como um tempo que se
mantém imanente na absolutidade de seu presente vital. Ainda nesta perspec-
tiva, para Benjamin argumenta:
O passado não se entrega a nós; ele só nos envia sinais cifrados, que dão conta,
misteriosamente, de seus anseios de redenção. Cada geração recebe uma es-
cassa força messiânica para perceber esses anseios do passado. É a partir de
nossa luta no presente que podemos entrever a verdade das lutas que ocorre-
ram antes. A recuperação do passado se dá na forma de recordações que cinti-
lam num momento atual de perigo (KONDER, 1999, p. 105).
17
lhes foi retirado e negado o acesso à terra, as condições dignas de vida e de
exercício de sua liberdade de pensamento e ação e, por extensão a possibili-
dade de rememorar suas lutas, suas derrotas, suas vitórias, seu modo de ver e
se situar no mundo.
18
nifestam no processo histórico de marginalização contemporânea do Territó-
rio do Contestado.
Neste contexto, talvez se possa afirmar e, mesmo rememorar que a mar-
ginalização do Território do Contestado continua a manifestar-se na sutileza
de práticas autoritárias que promovem o silêncio em torno da Guerra do Con-
testado. A despeito dos avanços, dos estudos, das pesquisas e publicações em
torno do conflito, majoritariamente em âmbito acadêmico é fato de que a soci-
edade brasileira desconhece significativamente a existência do conflito, sua
intensidade, profundidade e, sobretudo as sequelas na conformação antropo-
lógica, política, econômica e cultural do Território do Contestado.
Ou por outra perspectiva, talvez seja possível reconhecer na estratégia
autoritária de promoção do silêncio em torno do conflito, o fato de apresentá-
lo como informação secundária em livros didáticos e manuais de história. Mais
recentemente, esta estratégia de silenciar o conflito e as contradições que lhe
são inerentes se apresenta na forma de apresentá-lo com produto turístico a
ser ofertados para os ávidos consumidores apressados em vivenciar novas e
instantâneas experiências numa infinidade de selfies descontraidamente de-
sinteressados de qualquer compreensão em relação a implicâncias éticas,
políticas e estéticas do processo de marginalização vivenciado cotidianamente
pelo Território do Contestado.
Assim torna-se urgente reconhecer que é inerente as práticas autoritá-
rias constitutivas da sociedade brasileira, promover senão patrocinar o silên-
cio, o esquecimento em torno das contradições, da violência de suas práticas
políticas, econômicas e sociais. Talvez, se possa afirmar que tais práticas auto-
ritárias circunscrevem a natureza humana, ou mesmo a condição humana,
apresentando-se em suas especificidades nos mais variados povos e culturas.
Mas, invariavelmente é preciso ter presente que fazer silenciar um fato, um
acontecimento, um ser humano, ou todo um território significa negar-lhes a
palavra. Negar a palavra é negar a possibilidade da narrativa, do testemunho
do que aqui ocorreu, do direito a rememoração dos fatos e acontecimentos
que envolveram as gerações que nos antecederam e, que conformaram as
bases históricas de marginalização do Território do Contestado na atualidade.
A imposição do silêncio ao Território do Contestado em relação a expressão
de suas fraturas, de suas contradições e conflitos conformou-se como estraté-
gia de mantê-lo a margem, marginalizado impedindo o reconhecimento de si
mesmo a partir de suas origens e, por extensão, de que este reconhecimento
se circunscrevesse como variável constitutiva da conformação da sociedade
brasileira.
Mas, é preciso também reconhecer que o silêncio é uma das formas que
assume a linguagem humana. No silêncio de um indivíduo, de uma comunida-
de, ou de um Território reside uma narrativa de resistência. A imposição do
silêncio, do esquecimento, ou mesmo a negação da palavra pode retardar a
manifestação do discurso e da ação por gerações, mas não impede que a nar-
19
rativa se inscreva nas entrelinhas do discurso e na ação autoritária no tempo
presente.
Na perspectiva aristotélica o que caracteriza o ser humano é sua condi-
ção política. Assim, o homem é um animal político por ser um animal falante,
por possuir uma linguagem que lhe permite compartilhar a multiplicidade de
possibilidades que o mundo lhe apresenta cotidianamente. A política é sua
condição de ser no mundo, de agir conjuntamente com outros seres humanos
na conformação de um mundo que acolha dignamente a condição humana.
A ação política resulta dos laços de confiança entre homens, comunida-
des e territórios. Sob tais pressupostos, atentemos para o fato de que a ação
autoritária de imposição do silêncio, por meio da intensidade da narrativa
oficial em suas mais diversas formas (citadas em momento anterior deste
discurso), significa negar a palavra. A negação da palavra incide na impossibi-
lidade da ação política comum na constituição de laços de confiança comunitá-
rios e territoriais, fundamentais e necessários a afirmação de uma visão de
mundo que transcenda a marginalização.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
20
timento com o desenvolvimento do território e, que por reverso
beneficiam interesses isolados.
5. A dificuldade de superarmos a desconfiança característica de
nossa conformação societária marcada pelo autoritarismo extra-
tivista de nossa condição.
REFERÊNCIAS
21
CICATRIZES DO CONTESTADO:
A ESTATIZAÇÃO DA SOUTHERN BRAZIL
LUMBER AND COLONIZATION COMPANY E O
ADVENTO DO CAMPO DE INSTRUÇÃO
MARECHAL HERMES1
INTRODUÇÃO
1 O presente texto, na sua primeira versão, foi publicado na revista Desenvolvimento Regional em
debate, v. 6, n. 3 (2016).
2 Mestranda do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado
em Canoinhas/SC.
3 Professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado
(UnC), Santa Catarina, Brasil. Doutor em História pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
4 No ano de 2012 ocorreu o lançamento do documentário "O Contestado: restos mortais", do cineasta
Sylvio Back. Em 2015 foi lançado outro documentário, intitulado "Terra Cabocla", da cineasta Márcia
Paraíso. Esta obra se propõem a encontrar os descendentes dos rebeldes do Contestado nos dias atuais.
A obra, além de esteticamente encantadora, consiste em importante documento sobre a vida no
Contestado nos dias atuais. Entre a produção literária, merece destaque a obra "Caboclos Rebeldes: uma
aventura pela Guerra do Contestado", de Ricardo Campos. O autor produziu uma obra direcionada ao
público infanto-juvenil a partir das pesquisas mais recentes sobre a temática, contribuindo assim para a
superação de um dos principais problemas enfrentados pelos pesquisadores atualmente: viabilizar que o
conhecimento acadêmico seja disponibilizado ao público em geral que, mesmo na região do conflito,
ainda desconhece sua própria história.
23
Especificamente em relação à produção acadêmica, revigorada a partir
do início dos anos 2000, constata-se que nos últimos anos vem ocorrendo a
consolidação dessa área de pesquisa, principalmente em decorrência das ses-
sões do Simpósio Nacional sobre o Centenário do Movimento do Contestado,
evento que vem reunindo pesquisadores de diferentes universidades e de
distintas áreas do conhecimento5. Os estudos sobre o Contestado, além de
abundantes, – realizados a partir de uma instrumentalização teórica ampla e
sofisticada, que considera intensa busca e utilização de fontes inéditas –, esta-
beleceram novas abordagens e interpretações acerca daquele movimento
social, as quais vêm superando preconceitos e estereótipos que, a título de
exemplo, definiam os rebeldes revoltosos como "fanáticos" ou "jagunços" 6.
O avanço das pesquisas desvelou a complexidade do movimento, com su-
as especificidades, a heterogeneidade e a regionalização de suas causas. Cabe
lembrar que os estudos mais recentes não se restringem ao período do confli-
to, transcendendo o recorte cronológico tradicional. Esses incipientes estudos
vêm proporcionando a instauração de outro profícuo campo de pesquisa, qual
seja, o exame das consequências da Guerra do Contestado para aquela região,
cuja população ainda convive com os ecos do passado.
O período que precedeu o conflito foi caracterizado pela ampliação do
controle da terra, seja pela atuação do capital estrangeiro, representado tanto
pela ferrovia de propriedade da Brazil Railway Company, quanto pela madei-
reira operada por sua subsidiária, a Southern Brazil Lumber and Colonization
Company, seja pela atuação dos coronéis ou grandes comerciantes. Naquele
contexto, dada a privatização da terra e, por conseguinte, a proibição de aden-
trar as matas para realizar a coleta da erva mate, a situação dos pequenos
posseiros e sitiantes tornara-se insustentável. É plausível afirmar que, ao me-
nos no território do planalto norte de Santa Catarina, esse fator influenciou
decisivamente a adesão daquela população marginalizada ao movimento ser-
tanejo do Contestado.
Dentre as causas para o início do movimento sertanejo, adquire relevân-
cia as consequências suscitadas pela atuação de companhias estrangeiras, dos
setores ferroviário e madeireiro. Ambas, municiadas com a típica voracidade
do capital, avançaram sobre a região, exaurindo os recursos naturais, exter-
minando vidas e aniquilando as esperanças – de milhares de pessoas pobres
24
do interior do planalto meridional brasileiro – de que era possível viver em
um mundo repleto de justiça e equidade.
Após o término dos combates, as companhias estrangeiras permanece-
ram naquela região. A Lumber Company operou em Três Barras até o ano de
1940, quando foi estatizada por Vargas, durante o Estado Novo. Posteriormen-
te, no local em que aquela empresa atuou, ocorreu a formação de um campo
de manobras do exército brasileiro, resultando em outro processo de expro-
priação de pequenos proprietários rurais, famílias que ainda hoje lutam para
reaver as terras que lhes foram subtraídas injustamente.
O presente artigo pretende examinar a articulação política da companhia
e as consequências de sua atuação por mais de cinco décadas, até sua transfe-
rência para o Ministério da Guerra e posterior transformação num campo de
manobras do exército brasileiro.
Dessa forma, a análise não se restringe tão somente ao período de insta-
lação e operação da companhia, examinando, também, os impactos resultantes
da presença da Lumber Company, inclusive, os eventos sucedidos após sua
desativação.
METODOLOGIA
A LUMBER COMPANY
25
chegada as cidades de Itararé em São Paulo e de Santa Maria, no Rio Grande
do Sul, respectivamente.
O contrato para a construção da ferrovia estabelecia que a empresa res-
ponsável pela empreitada – a Brazil Railway Company – teria o direito de ex-
plorar as terras adjacentes à linha tronco, numa extensão de até quinze qui-
lômetros do leito da linha férrea. Essas terras eram cobertas por milhões de
pinheiros ou araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriúvas. Objeti-
vando extrair e comercializar essa madeira de alto valor econômico e, mais
tarde, vender parte daquelas terras a imigrantes europeus, a Brazil Railway
Company constituiu uma subsidiária, a Southern Brazil Lumber and Colonizati-
on Company. Em 1910, a Lumber instalou em Três Barras, então território
paranaense contestado por Santa Catarina, uma moderna serraria. A empresa
instituiu um processo industrial altamente mecanizado, com elevada organi-
zação técnica, tornando-se a maior madeireira da América do Sul (CARVALHO,
2010).
A construção desta grande linha férrea alterou o modo de vida das popu-
lações residentes nas regiões por ela atravessadas, elevando o valor econômi-
co das terras, agravando problemas sociais e influenciando diretamente a
deflagração do movimento sertanejo do Contestado, entre os anos de 1912 a
1916, na região fronteiriça entre os estados do Paraná e de Santa Catarina.
A Brazil Railway Company atuou durante quase trinta anos sob controle
do capital estrangeiro, até sua estatização através da publicação do Decreto-
Lei n.º 2.346, de 22 de julho de 1940, assinado por Getúlio Vargas, em plena
vigência do Estado Novo.
A estatização ocorreu em favor dos “interesses nacionais”. Essa foi a justi-
ficativa apontada pelo decreto presidencial. A expressão tem um forte viés
econômico e financeiro. O fato da Brazil Railway Company e suas filiais contro-
larem setores de fundamental importância para o Brasil, tais sejam, ferroviá-
rio, portuário, energético e de colonização, contribuiu para a estatização. En-
tretanto, os problemas decorrentes da má gestão nas companhias do grupo
Farquhar influenciavam, sobremaneira, a economia nacional. Os atrasos no
cumprimento de obrigações com credores de capitais – alavancados em bolsas
europeias – geraram descontentamento e abalaram a confiança dos investido-
res estrangeiros na economia nacional. Isso constrangia a administração pú-
blica do país7. Com base nessa justificativa, o primeiro artigo do decreto in-
corporou ao patrimônio da União os bens e direitos tanto da Brazil Railway
Company – existentes em território nacional – quanto de suas dependentes,
caso da Southern Brazil Lumber and Colonization Company, além de outras
onze companhias8.
7A título de exemplo, a Brazil Railway Company encontrava-se sob regime de concordata, a qual não
fora homologada pela Justiça brasileira, desde 18 de julho de 1917.
8Decreto-Lei n.º 2.346, de 22 de julho de 1940.
26
Conforme será examinado posteriormente, em determinado momento,
após a estatização, o Ministério da Guerra assumiu definitivamente o controle
da Lumber Incorporada, o que significou mudanças no modus operandi adota-
do pela companhia. Alguns antigos costumes foram banidos. Fumar durante o
trabalho, por exemplo, foi proibido, inclusive para os chefes de seção. Os rela-
cionamentos, anteriormente imbuídos pelo lúdico, sofreram a imposição de
certa disciplina militar. A intransigência dos oficiais em suas relações com o
pessoal da Lumber gerou conflitos e contribuiu para o agravamento dos pro-
blemas que assolaram a empresa ao longo da década de 1940. O ex-operário
da Lumber, Leopoldo Padilha, rememorou um episódio que exemplifica esse
processo. Segundo ele, “o pessoal fumava, brincava e o Coronel não queria. Um
dia ele pegou o cachimbo de um feitor e jogou no fogo, na frente de todo mun-
do”9. Para Leopoldo, após a estatização da companhia e o controle exercido
pelo exército, “mudou muita coisa”, pois na “época dos americanos”, o “pessoal
trabalhava direitinho” e após a chegada dos militares “a coisa foi fracassan-
do”10.
Ao longo da década de 1940, após os militares assumirem o domínio da
Lumber, obrigações legais inerentes aos contratos de trabalho deixaram de ser
cumpridas.
No período compreendido entre os dias 15 e 20 de outubro de 1948, o
promotor público, Rubem Moritz da Costa, remeteu para avaliação do juiz da
comarca de Canoinhas, Euclides Cerqueira Cintra, um conjunto de requeri-
mentos impetrados por trabalhadores acidentados e não indenizados 11.
Os operários e a operária vitimados por acidentes de trabalho foram pre-
teridos pela administração da Lumber Incorporada. Em um dos casos, embora
transcorridos seis meses desde o acidente, o operário não tivera acesso ao
atendimento médico e aos direitos assegurados pela legislação trabalhista, até
a denúncia ao juiz da comarca. Nas audiências, a companhia declarou que não
contestava os acidentes, mas sim os direitos dos (a) acidentados (a). É preciso
considerar que o exército, apesar da atribuição institucional, não reconhecia a
imputação de responsabilidade para com os trabalhadores da antiga Lumber e,
por conseguinte, as indenizações decorrentes de acidentes de trabalho.
Os casos localizados tiveram decisões favoráveis aos trabalhadores, asse-
gurados os tratamentos médicos e os pagamentos das indenizações.
O inquérito do operário polonês Estefano Schlapak é emblemático. Este-
fano “de início trabalhou nas matas da companhia, sujeito ao tempo, não pa-
rando o serviço mesmo em caso de chuva”. Em consequência da arduidade
9Entrevista com o ex-operário da Lumber, Leopoldo Padilha, de 96 anos. Realizada em Três Barras, no
dia 03 de setembro de 2005.
10Idem.
11Ação Trabalhista: Santilha Rodrigues Faria versus Southern Brazil Lumber and Colonization
Company Incorporada. Três Barras, 24 de abril de 1948; Ação Trabalhista: Sizenando Naizer versus
SBLCC Incorporada. Três Barras, 07 de julho de 1948; Ação Trabalhista: Estefano Schlapak versus
SBLCC Incorporada. Três Barras, 20 de outubro de 1948. Arquivo Histórico Municipal de Canoinhas.
27
desse serviço, adoeceu. Antes de abandonar o trabalho, em função das dores
abdominais insuportáveis, Estefano trabalhava no serviço de maquinista do
guincho. Nessa ocasião, Estefano já havia dedicado 25 anos de trabalho à em-
presa, na qual começou aos 15 anos de idade e pela qual foi abandonado sem
atendimento ou indenização.
Considerando a intempestividade entre as datas de ocorrência dos aci-
dentes citados e as datas de avaliação pela Justiça, conclui-se que não houve o
cumprimento das determinações da legislação trabalhista, situação que evi-
dencia o abandono dos trabalhadores acidentados à mercê da própria sorte,
sem sequer o adjutório do tratamento médico condizente. O fato da Lumber
Incorporada declarar não reconhecer os direitos dos acidentados e não pres-
tar os atendimentos básicos imputados pela legislação, foi algo representativo
do modo como o pessoal da Lumber seria tratado pela nova gestão. Os traba-
lhadores precisariam continuar a resistir.
O edital
28
Conquanto tenha sido efetivada a alienação do acervo, depreende-se que
houve irregularidades, seja no edital de concorrência pública, seja na posteri-
or partilha dos bens da Lumber. A proposta vencedora foi a única que consig-
nou preço superior ao mínimo estipulado no edital, correspondente a cin-
quenta milhões de cruzeiros, embora o excedente tenha sido de apenas
Cr$100.000,00 (cem mil cruzeiros). Apesar do edital de concorrência pública
não admitir a divisão dos bens da Lumber, após a negociação, uma parcela do
acervo foi celeremente escriturada em nome de terceiros.
Naquele contexto, também é preciso considerar o interesse do Ministério
da Guerra em instalar um Campo de Manobras na 5ª Região Militar, o que se
coadunou com a obtenção dos bens da antiga Lumber, após a estatização. Ou-
tro fator preponderante consistiu na atuação do governo do estado de Santa
Catarina, chefiado por Irineu Bornhausen, que colaborou decisivamente para
o processo de instalação do campo militar em Três Barras, inclusive assumin-
do o compromisso de cessão de terras – evidentemente após as desapropria-
ções – num total de dez mil hectares, na região de Papanduva, limítrofe ao
perímetro da Lumber.
No mês de março de 1951, um representante da 5ª Região Militar, cuja
sede do comando localizava-se em Curitiba, procurou o governo do estado de
Santa Catarina visando obter apoio para identificar uma área de terras entre
três e quatro mil alqueires. Tal área deveria estar localizada nas proximidades
da Lumber, em Três Barras, entre os rios Canoinhas, São João e Rio das Antas.
Em correspondência ao comandante da 5ª Região Militar, à época o General
Tristão de Alencar Pires, o governador catarinense, o udenista Irineu Bor-
nhausen, manifestou enlevo pela ideia, segundo ele, “visando o progresso que
advirá para Três Barras com o estabelecimento, ali, de uma Unidade do Exér-
cito Nacional”15. O governador enviou instruções ao prefeito municipal de
Canoinhas, orientando-o para que, juntamente com o representante da Com-
panhia de Madeiras Del Alto Paraná, empresa compradora do acervo da Lum-
ber, compusesse uma comissão com o objetivo de localizar uma área de terras
que atendesse aos interesses dos militares.
Transcorrido pouco mais de um mês, em nova correspondência do go-
verno catarinense destinada ao comando da 5ª Região Militar, o chefe do exe-
cutivo estadual ratificou sua intenção em colaborar com os interesses dos
militares, acerca da instalação do campo de manobras no município de Canoi-
nhas. O entusiasmo de Irineu Bornhausen com a negociata levou-o a declarar
que estava “(...) disposto a tomar todas as providências no sentido de desa-
propriar as terras necessárias à instalação, no município de Canoinhas, do
campo de Instruções e Manobras da 5ª Região Militar, na área escolhida pela
29
Comissão designada por esse comando”16. Dessa forma, o então governador do
estado de Santa Catarina, delegou a responsabilidade pela escolha de uma
área de terras a uma comissão constituída por representantes do Ministério
da Guerra e pelo controlador das empresas que haviam adquirido os bens que
integravam o acervo da antiga Lumber. Nesse contexto, estranha o fato dessa
atribuição para escolher e desapropriar terras ter sido transferida a uma co-
missão que apresentava, entre seus membros, representantes de empresas
privadas.
Na mesma correspondência, o governador Irineu Bornhausen, com o ob-
jetivo de “reduzir os custos com as indenizações” decorrentes das desapropri-
ações, apresentou uma proposta para permuta das novas áreas de terras, que
seriam desapropriadas pelo estado catarinense, com áreas de terras outrora
pertencentes à antiga Lumber, transferidas ao Ministério da Guerra após a
estatização daquela companhia. O General Tristão, atônito, afirmou não ter
compreendido a proposta, afinal, segundo ele, o patrimônio total da Lumber,
elencadas as terras, instalações e reservas florestais, estaria avaliado em cin-
quenta milhões de cruzeiros, enquanto as áreas de terrenos que o exército
receberia, caso aquiescesse com a permuta, “embora mais extensas, são, po-
rém, de valor incomparavelmente bem mais reduzido do que aquelas terras da
Lumber”17. A tentativa do governador catarinense em ludibriar o Ministério da
Guerra, através de uma ardilosa proposta de permuta fundiária, foi pronta-
mente rechaçada pelo comando militar. Contudo, esse revés nos planos para
utilização do acervo da Lumber em prol de interesses privados, não significou
o abandono do projeto.
No dia 29 de maio de 1951, foi realizada uma reunião da Comissão Regi-
onal de Escolha de Imóveis para o Ministério da Guerra, na sede da Lumber
Company, em Três Barras, município de Canoinhas 18. Entre os presentes, en-
contravam-se os militares componentes da Comissão19, os delegados da Supe-
rintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional 20 e os repre-
sentantes da Companhia de Madeiras Del Alto Paraná21.
O empresário Alberto Dalcanale declarou abrir mão, em favor do Ministé-
rio da Guerra, de área sob controle da Cia. de Madeiras do Alto Paraná, situada
16Ofício N.º 161 – Florianópolis/SC, 20 de abril de 1951. Do Governador do Estado de Santa Catarina
ao Comandante da 5ª Região Militar. Correspondências e Minutas do Palácio do Governo de Santa
Catarina para o Ministério da Guerra. APESC.
17Ofício N.º 93 – SER/5ª R. M. Curitiba/PR, 27 de Abril de 1951. Do Comandante da 5ª Região Militar
ao Governador do Estado de Santa Catarina. APESC.
18Ata da Reunião realizada pela Comissão Regional de Escolha de Imóveis para o Ministério da
Guerra. Três Barras, município de Canoinhas, 29 de maio de 1951. APESC.
19General Sady Martins Vianna, Tenentes Coronéis Carlos Queiros Falcão e Murat Guimarães,
Capitães Basílio Marques dos Santos Sobrinho e Dr. José Alvarenga Moreira, sob a presidência do
primeiro.
20Hortencio Alcantara Filho e Ary d’Leary Paes Leme.
21Alberto Dalcanale e Wilen B. Martins.
30
na região compreendida entre os rios Canoinhas, Jangada, Papanduva, bem
como de glebas situadas nas regiões de Valões, São João da Barra e Toldo de
Cima, “exceção feita da área de reflorestamento da gleba de Valões”. Dalcanale
concordou com a transferência integral das instalações e maquinarias existen-
tes na sede da Lumber, em Três Barras, ao Ministério da Guerra22. Evidente-
mente, as cessões dos bens não foram motivadas por um patriotismo exacer-
bado por parte de Dalcanale. A transferência das áreas supracitadas (com
exceção feita àquelas povoadas por pinheiros) consistiu em um estratagema
que objetivou desatar os bens de menor valor e transferir os trabalhadores da
antiga Lumber para uma instância pública – no caso, o Ministério da Guerra –
desincumbindo as empresas de Dalcanale das obrigações referentes aos salá-
rios, encargos trabalhistas e de contingências resultantes de indenizações aos
operários da companhia incorporada.
Após a efetivação da transferência, prosseguiram as negociações para a
doação, pelo governo catarinense, de terrenos que complementariam a área
necessária para instalação de um campo militar. O governador de Santa Cata-
rina, Irineu Bornhausen, propôs uma solução, aceita pelo então ministro da
guerra, general Henrique Teixeira Lott, que consistiu na utilização dos recur-
sos consignados na emenda n.º 157, no montante de Cr$ 40.000.000,00 (qua-
renta milhões de cruzeiros), para fins de complementação da dotação orça-
mentária do Ministério da Guerra, visando prover recursos para pagamento
das indenizações decorrentes das desapropriações de terras necessárias à
composição do campo militar em Três Barras23. Portanto, a atuação de Bor-
nhausen foi decisiva para a instalação do campo militar, inclusive dispondo-se
a desapropriar novas áreas de terra necessárias à composição do campo, o
que, de fato, consistiu num compromisso formal, contudo destituído de ônus
para o governo catarinense. Através de manobra astuta, embora obscura, tan-
to os encargos trabalhistas quanto o ônus e o desgaste político, inerentes ao
processo de desapropriação de terras na região de Três Barras, foram transfe-
ridos ao Ministério da Guerra. Os empecilhos à maximização dos lucros das
empresas controladas por Dalcanale haviam sido removidos, incrementando a
expectativa de auferir vantagens – lícitas ou não – àqueles que apoiaram ou
contribuíram decisivamente para o desfecho do negócio.
Após a reunião realizada em Três Barras, e, por conseguinte, do desenla-
ce dos trâmites jurídicos, a partir do dia 11 de setembro de 1952, a área onde
22Ofício n.º 913. Florianópolis/SC, 31 de julho de 1957. Do Governador do Estado de Santa Catarina –
Jorge Lacerda – ao Comandante da 5ª Região Militar – general Aurélio Lyra Tavares. Além do
Superintendente das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União, a reunião de transferência teve a
presença de um representante do Ministério da Guerra, membros da Comissão de Levantamento e
Avaliação, representante do governo catarinense e dos compradores dos bens da Lumber, “tudo de
conformidade com os entendimentos havidos entre o Ministério da Guerra, a Superintendência, os
adquirentes do acervo da Lumber e o Estado de Santa Catarina”.
23Idem.
31
outrora funcionara a Southern Brazil Lumber and Colonization Company foi
transferida ao controle do exército brasileiro.
Nos anos subsequentes, a área da antiga Lumber permaneceu sob contro-
le do exército, porém a configuração do campo militar continuava indefinida
em função da necessidade de ampliação da área total, o que seria viabilizado
somente após os processos de desapropriações de terras dos camponeses
situados em áreas adjacentes à sede da antiga serraria, local que também
abrigaria o comando do futuro campo militar.
32
montante de Cr$8.500.000,00 (oito milhões e quinhentos mil cruzeiros), ime-
diatamente após a concretização da negociação, realizou a venda dos imóveis
localizados na Barra Funda, recebendo a importância de Cr$ 10.000.000,00
(dez milhões de cruzeiros). Sem dúvida um excelente negócio. Além disso, as
centenas de milhares de pinheiros possuíam valor estimado entre Cr$ 100 e
Cr$ 200 (cem e duzentos cruzeiros) a unidade, ou seja, após seu corte e venda,
também poderiam auferir lucro de dezenas de milhões de cruzeiros 27.
À empresa Groppe S.A., coube a parcela industrial do acervo, além de fai-
xas de terras marginais à Rede Viação Paraná Santa Catarina. Esses consisti-
ram nos itens do acervo que posteriormente foram transferidos ao Ministério
da Guerra.
A terceira empresa que compunha o consórcio, a Cia. De Madeiras Del Al-
to Paraná S.A., obteve os pinheirais da Serra do Espigão, uma propriedade na
localidade de Felipe Schmidt, município de Canoinhas, e uma área de dez mil
metros quadrados, em São Francisco do Sul.
O referido relatório estimava que o valor real dos bens e direitos da Lum-
ber atingiria o montante de Cr$ 100.000.000,00 (cem milhões de cruzeiros).
No entanto, o preço básico fora definido em apenas Cr$ 50.000.000,00 (cin-
quenta milhões de cruzeiros). Segundo o relatório, o preço dos pinheiros e das
propriedades fora subavaliado, em valores aquém das cotações do mercado,
na mesma época e nos mesmos locais.
Ao tomar conhecimento do interesse do Ministério da Guerra em compor
um campo militar na região de Três Barras, o proprietário das três empresas
consorciadas que adquiriram os bens da Lumber, Alberto Dalcanale, prontifi-
cou-se em ceder a propriedade de seiscentos e cinquenta alqueires, além da
parte industrial, maquinários, ferrovia, edifícios e algumas propriedades em
São Francisco do Sul. Certamente, um notório empresário do setor fundiário,
madeireiro e colonizador, não obtinha fortuna realizando doações motivadas
por seu patriotismo. Juntamente com a parcela do acervo, de interesse do
exército, Dalcanale transferiu os duzentos e sessenta e quatro trabalhadores
da Lumber e os correspondentes encargos trabalhistas. O jornal Barriga Verde,
em março de 1953, denunciou aquilo que definiu como “uma das mais negras
manobras para saquear a Fazenda Nacional”. Segundo o jornal, os dirigentes
das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União e os compradores do
acervo da Lumber Company, entre eles Irineu Bornhausen, então governador
do estado de Santa Catarina, pressionaram o Ministério da Guerra para que
assumisse os encargos trabalhistas, objetivando isentar os compradores do
acervo28.
No dia 04 de fevereiro de 1954, a filha de Alberto Dalcanale, Ivete Terezi-
nha29, e o filho do governador Irineu Bornhausen, Paulo Konder Bornhausen,
contraíram matrimônio. Enquanto as famílias Dalcanale e Konder Bornhausen
33
celebravam sua união por intermédio do casamento de Paulo e Ivete, os du-
zentos e sessenta e quatro trabalhadores da Lumber e suas famílias, num total
de aproximadamente mil e duzentas pessoas, padeciam com o segundo perío-
do de atrasos no recebimento dos salários. Surgiam os “flagelados de Três
Barras”.
AS DESAPROPRIAÇÕES
34
O decreto n.º 50.570, de 18 de dezembro de 1956, autorizou a desapro-
priação de 7.614 (sete mil, seiscentos e catorze) hectares, atingindo oitenta e
nove lotes de pequenos agricultores, num total de sessenta e oito famílias.
O decreto de desapropriação apresentava diversas falhas técnicas. A títu-
lo de exemplo, não delimitava a localização da área desapropriada, apenas
referenciava terrenos situados no Estado de Santa Catarina. Além disso, não
descrevia os limites de cada propriedade, conforme a discriminação nas pró-
prias escrituras e, por fim, também não definia um dispositivo que permitisse
verificar os critérios de avaliação e validar os cálculos das verbas indenizató-
rias. Na etapa de arrolamento dos bens, a comissão do exército não conside-
rou pastos e ervais na composição das verbas indenizatórias, apenas as ben-
feitorias. Portanto, recursos imprescindíveis à subsistência daqueles campo-
neses, abruptamente lhes foram retirados, sem que houvesse a indenização
justa. Ademais, os valores das indenizações, consignados no decreto, apresen-
tavam acentuada defasagem, pois se referiam ao período em que o levanta-
mento da área de desapropriação fora efetuado. Ao considerar os índices de
inflação acumulada de 22,6% (vinte e dois inteiros e seis décimos por cento) e
12,7% (doze inteiros e sete décimos por cento) nos anos de 1956 e 1957, res-
pectivamente, depreende-se que os valores estabelecidos para as indeniza-
ções sofreram rápida perda de poder aquisitivo. No início da década de 1960,
os valores constantes no decreto sequer representavam 3% (três por cento)
do valor de mercado das terras (SCHIOCHET, 1988, p. 86).
Nesse mesmo período, os militares recrudesceram o tratamento dado aos
camponeses, que continuavam a morar nas terras desapropriadas. Proibiu-se
a retirada da madeira e da erva mate, recursos importantes para a subsistên-
cia dos pequenos agricultores, tendo sido formada, inclusive, uma comissão
para averiguar as eventuais transgressões a essa determinação. Além disso,
deu-se início às operações e manobras militares, que obrigavam os agriculto-
res desapropriados a se afastarem periodicamente de suas casas, uma eviden-
te estratégia para forçá-los a se retirarem definitivamente.
Em 1963, o poder judiciário concedeu títulos de posse provisória das ter-
ras desapropriadas ao exército, medida que lhe possibilitou assumir o domí-
nio das terras, embora ainda não tivesse efetuado o pagamento das indeniza-
ções, cujos valores seriam reavaliados em processo de revisão.
Não obstante o processo de revisão das indenizações, a atuação do exér-
cito, durante a remoção das famílias desapropriadas, marcou indelevelmente
aquelas pessoas. Diga-se de passagem que isto representa um vetor profícuo à
ampliação da pesquisa.
Na década de 1980, desapropriados e herdeiros se organizaram no Mo-
vimento dos Desapropriados de Papanduva. Sua atuação foi marcada, desde o
início, pela interposição de diversas ações judiciais, manifestações mediante
greves de fome e da organização de acampamento, na localidade de Poço
Grande, ao lado do Campo de Instrução Marechal Hermes. O acampamento foi
35
denominado de João Maria. O movimento também ocupou a sede do INCRA
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), em Florianópolis, du-
rante um ano, entre 1986 e 1987. Em 1987, também foi realizada a 2ª Romaria
da Terra/SC, que reuniu cerca de 20 mil pessoas (FAVARIN, 2009, p. 114). No
ano de 2007, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) reali-
zou uma ocupação e promoveu um debate acerca das terras do campo militar
serem improdutivas ou subutilizadas (em função do reduzido número de ma-
nobras realizadas). Além disso, houve denúncias de arrendamentos realizados
pelo exército, de áreas do campo, para o cultivo de grãos de soja por fazendei-
ros da região31.
O processo de desapropriação gerou enorme tensão social, pois os colo-
nos desapropriados sentiram-se lesados, haja vista que, segundo eles, o go-
verno federal estabeleceu preço irrisório pelas terras desapropriadas, destitu-
ído de isonomia, pois com terras que apresentavam de igual qualidade similar
foram sendo avaliadas com oscilações de até 100% (cem por cento) no valor
do hectare.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
31Correio do Norte. Ano 65. Edição n.º 3033. Canoinhas, 13 de Abril de 2012.
36
Acerca de sua influência indireta, já em seus derradeiros momentos, ou
seja, as desapropriações de terras realizadas para complementar a área neces-
sária à composição do campo de instrução militar, cuja sede coincidiu com o
local de instalação da companhia, nos dias atuais, muitos descendentes dos
antigos proprietários ainda mantém contendas judiciais, com o objetivo de
reaver as terras ou, ao menos, obter a reparação justa pelas verbas indeniza-
tórias defasadas pagas aos seus antepassados. Muitos acresceram suas dívidas
ao captar empréstimos para quitação dos honorários advocatícios e, ao rece-
berem suas indenizações, perceberam que a inflação havia corroído os valo-
res, impossibilitando a aquisição de outras áreas, semelhantes àquelas das
quais foram removidos.
Por conseguinte, em retrospectiva, tanto os duzentos e sessenta e quatro
trabalhadores da Lumber (e suas famílias), vinculadas ao quadro do Ministério
da Guerra – que padeceram com o descumprimento das obrigações salariais
de forma recorrente –, quanto os desapropriados do campo militar e seus
herdeiros, materializam alguns dos capítulos mais injustos da atuação das
classes dominantes, com o agravante da conivência do Estado em detrimento
dos interesses dos mais pobres.
Há que se considerar que muitos processos contundentes de exclusão
dos mais pobres, permanecem vigentes em toda a região do Contestado. Con-
quanto, em perspectiva, percebe-se um longo processo de exploração e exclu-
são, uma leitura diametralmente oposta permite vislumbrar que a resistência,
a organização e a luta dos excluídos, em prol do reconhecimento e cumpri-
mento de seus direitos, constitui uma tradição sólida, a qual atingiu seu auge
no movimento sertanejo do Contestado (1912-1916), nas décadas subsequen-
tes reinventada de modo dinâmico e ininterrupto.
São desafios que ainda precisam ser enfrentados, para amainar os impac-
tos de processos históricos de exploração e marginalização social do povo do
Contestado, com vistas aos avanços necessários no processo de desenvolvi-
mento das regiões atingidas.
REFERÊNCIAS
37
MACHADO, P. P. Lideranças do Contestado: a formação das chefias caboclas (1912-
1916). Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2004.
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militar na Guerra do Contestado. Dissertação (Mestrado em História). Centro de Fi-
losofia e Ciências Humanas. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Flori-
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SCHIOCHET, V. Esta Terra é minha terra: Movimento dos desapropriados de Papandu-
va. Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC, Florianópolis, 1988.
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TOMPOROSKI, A. A. “O pessoal da Lumber!” Um estudo acerca dos trabalhadores da
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de Santa Catarina, 1910 – 1929. Florianópolis. Dissertação (Mestrado em História).
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____. O polvo e seus tentáculos: a Southern Brazil Lumber and Colonization Company e as
transformações impingidas ao planalto contestado (1910-1940). Tese (Doutorado em
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VALENTINI, D. J. Atividades da Brazil Railway Company no sul do Brasil: a instala-
ção da Lumber e a Guerra na região do Contestado (1906-1916). Porto Alegre.
Tese (Doutorado em História). PUC/RS. Porto Alegre, 2009.
WELTER, T. O profeta São João Maria continua encantado no meio do povo. Um
estudo sobre os discursos contemporâneos a respeito de João Maria em Santa Cata-
rina. Tese (Doutorado em Antropologia Social). UFSC, Florianópolis, 2007.
38
SERTÃO É TERRA ONDE PERU DÁ COICE,
CANDEEIRO DÁ CHOQUE E O CISCO FAZ A
CURVA: BREVE ANÁLISE SOBRE O “SERTÃO”
NA HISTORIOGRAFIA CLÁSSICA BRASILEIRA E
DO CONTESTADO
INTRODUÇÃO
39
sujeitos que não constavam nesses documentos: operários, camponeses, es-
cravos, indígenas, enfim, os vencidos; fato denunciador da análise positivista
materializar-se em uma visão míope da história, parcial e incompleta, ao passo
que deixava a margem uma série de elementos que seu método simplesmente
negligenciava.
Em processo contínuo, a historiografia se pulverizou atingindo variados
elementos da atividade humana. Nesse contexto, o espaço foi reivindicado
pela História, a qual passou a empreender intensa reflexão intelectual sobre o
conceito de região e suas categorias. Reflexão ainda em curso, evidenciada
pelo expressivo número de programas de mestrado e doutorado existentes no
Brasil que apadrinharam a problemática do regional em suas áreas de concen-
tração. Nessa acepção, o “sertão” ganhou certo destaque, se fazendo problema
de historiadores em diversas partes do país, em busca constante de sua deli-
mitação para além daquele simples designativo atribuído a uma das quatro
sub-regiões geográficas do Nordeste brasileiro.
Posto isso, o intento deste ensaio será demonstrar uma linearidade na
ideia de “sertão” desenvolvida nos primórdios da historiografia brasileira e
seu respectivo uso pelos “historiadores de farda” 3. Para tanto, se fará uso da
metodologia de análise de discurso tendo como objeto obras de alguns impor-
tantes intelectuais que iniciaram uma tentativa de narração do Brasil enquan-
to nação, sendo eles: Francisco Adolfo de Varnhagen, Capistrano de Abreu e
Sergio Buarque de Holanda. Neste desígnio, se realizará algumas ponderações
das valiosas contribuições da Literatura, em especial efetivadas por Guima-
rães Rosa e Euclides da Cunha, haja vista que estes escritores são basilares ao
se pensar o “sertão”. Nada obstante, a espinha dorsal do texto ombrear-se-á na
análise das obras “Contestado” de Alcibíades Miranda, e “Campanha do Contes-
tado: episódios e impressões” de Demerval Peixoto. Os referidos autores parti-
ciparam como combatentes do exercito durante a Guerra Sertaneja do Contes-
tado4, deixando em seus textos um consideravel conjunto de discursos que
evidenciam visoes sobre o “sertao”, coeficiente que justifica sua escolha neste
trabalho.
Ao final, discorrer-se-a sobre algumas reflexoes quanto aos recentes es-
tudos acerca do espaço, da regiao e sua correlaçao com o pubere conceito de
desenvolvimento, tentando assim direcionar para possíveis encaminhamentos
que a Historia oferece aqueles que pretendem utilizar-se dela para empreen-
der pesquisas de carater regional, ou mesmo de Historia Regional.
3 O termo “historiador de farda” é empregado pelo historiador Rogério Rosa Rodrigues (2012, p. 249)
para nomear oficiais que se dedicaram à pesquisa histórica sobre o Contestado, não sendo aceitos nessa
categoria oficiais que apenas produziram obras de memórias ou relatórios técnicos sobre o Contestado.
Cabe aqui ressaltar que Alcebíades Miranda não é contemplado pela análise de Rodrigues, fato que,
desta forma, não me dá autoridade para assim nomeá-lo.
4 Utilizo aqui a nomenclatura Guerra Sertaneja do Contestado por concordar com a observação feita
pelo historiador Paulo Pinheiro Machado (2004, p. 36), onde mesmo aponta ser esta mais adequada e,
por sua vez, já utilizada pelo sociólogo Maurício Vinhas de Queiroz (1977), indiretamente fazendo
referência a outras guerras e movimentos sertanejos brasileiros.
40
A ETIMOLOGIA DO “SERTÃO”
41
ceitos”5, área teórica multidisciplinar das ciências humanas que se propõe a
investigar as mudanças nos significados de certos termos e palavras no tempo,
com intuito de demonstrar como que uma categoria pode associar-se a distin-
tos significados, o que permite captar a propagação dos discursos no imaginá-
rio social.
Portanto, uma das linhas possíveis de investigação conceitual se insere
na análise historiográfica, na captura das continuidades e rupturas presentes
nos discursos históricos, possibilitando ao historiador empreender um enten-
dimento sobre os espaços. Pois, como alude Agnes Heller (1993, p. 197), “a
historiografia reconstrói as idades passadas-presentes numa dimensão espa-
ço-temporal”.
5 No que tange a história conceitual ou história dos conceitos, no caso específico do estudo histórico,
destaco a figura do historiador alemão Reinhart Koselleck. Intelectual que contribuiu significativamente
para a superação da tradicional história das ideias, expondo que o estudo dos conceitos deve estar
sempre relacionado a uma dada realidade social. Sugiro assim, como leitura introdutória e
aprofundamento da reflexão de Koselleck, o artigo de Julio Bentivoglio (2010): A história conceitual de
Reinhart Koselleck; texto que sintetiza muito bem as contribuições deste importante historiador.
6 Atribuo aqui o termo “historiografia brasileira clássica” por entender que a abordagem, neste trabalho
realizada, não abrange todo o cabedal da historiografia brasileira, uma vez que para isso haveria a
necessidade de incluir vários outros importantes historiadores nesse tratamento, como Gilberto Freyre e
Caio Prado Junior. Sendo assim, a denominação clássica, por mim utilizada, não se configura em um
termo recorrente, mas sim uma maneira particular para delimitar três das principais obras escritas no
início da construção de uma narrativa da história nacional.
7 Obra publicada ordinalmente em dois volumes; o primeiro em 1854 e o segundo em 1857; sob o título
de História Geral do Brazil. Texto em que Varnhagen (monarquista declarado), procurou realizar um
trabalho de construção de Brasil independente, identificado com sua história e orgulhoso de suas
riquezas geográficas e naturais.
42
é um elemento do interior, de difícil penetração, desabitado, o qual precisa ser
civilizado, ocupado efetivamente. Entretanto, no discurso deste estudioso, o
ponto mais importante, que aqui interessa, é que o “sertão” não é desenvolvi-
do.
Euclides viu o sertão como reflexo do litoral: a barbárie estaria por toda parte.
Criticou as jornadas jacobinas no Rio de Janeiro, em março de 1897, quando
multidões reagiram à notícia da derrota da terceira expedição contra Canudos
43
com a destruição de jornais monárquicos e o assassinato de um jornalista
(VENTURA, 1998, p. 68).
8 Marc Léopold Benjamim Bloch (1886-1944), historiador medievalista francês, pertenceu à primeira
geração da Escola dos Analles, deu os primeiros encaminhamentos do olhar geográfico para a História,
assim como propôs uma a interdisciplinaridade nos objetos das ciências. Sugiro o texto de Guilherme
Ribeiro (2009): A Geografia testemunha a História – paisagem, região e interdisciplinaridade em Marc
Bloch, para elucidar melhor esta questão.
44
Entendo a lógica de um povo sujeito da sua própria história, logo aquilo
que para Capistrano era o desabitado, desconhecido, isolado, marginal, o peri-
goso; passa também ser possível de riquezas, um espaço que necessita ser
civilizado. Logo, passa também a ser passível de confronto, de beligerância. A
análise empreendida por Capistrano dá a factível condição de a historiografia
entender as regiões como espaços de disputa, de conflito; justamente em um
momento que as antigas províncias passavam a ter status de Estados autôno-
mos e soberanos.
Apesar de o “sertão” ter bandidos, marginais, ele precisa, no pensamento
da época, ser percorrido e civilizado, ser desenvolvido. O “sertão”, na concep-
ção de Capistrano de Abreu, necessita ser povoado por colonizadores. Até
mesmo os bandeirantes, quando se fixavam em determinados locais, passa-
vam de devastadores a colonizadores, vivendo com aquilo que o “sertão” lhes
fornecia (REIS, 1998, p. 76).
Por fim, inclui-se neste debate Sergio Buarque de Holanda. Um historia-
dor que consegue inserir o “sertão” em uma categoria polivalente, uma vez
que seus textos podem ser lidos de inúmeras maneiras. Um intelectual de
obras muito dispersas, as quais foram aglutinadas9, mas que mesmo assim foi
muito significativo para a historiografia brasileira, principalmente no que
tange o “sertão”. Sua contribuição foi seguida por inúmeros profissionais da
História, que, mais de quarenta anos depois, ainda seguem um caminho defi-
nido por Holanda.
Para este autor, o “sertão” é decorrente da pobreza da população. Ele
surge em decurso da existência de uma população extremamente pobre, assim
como a pobreza também pode surgir da presença do “sertão”. Não obstante,
para Holanda o remédio da penúria é o “sertão”, ou seja, quando parte da soci-
edade, marginalizada do capital, não consegue participar do sistema, é para o
“sertão” que estas pessoas correm. É a pobreza o motor da busca e da constru-
ção do “sertão”.
Para Sergio Buarque de Holanda (1945), especificamente em seu texto
“Monções”, o “sertão” é ocupado pela canoa, pelas vias fluviais. São as mon-
ções10 que se alastram pelo interior povoando as margens dos rios, ocupando
os espaços como linhas de transporte. Holanda considera que para a época
(segunda década do século XVIII e a primeira metade do século XIX), os rios
eram as estradas dos colonizadores, vias fluviais que aos poucos constroem
uma rede de ocupação do espaço que passam a fazer duplo sentido, ou seja,
9 Posso aqui destacar três principais obras que compõem a grande contribuição de Sergio Buarque de
Holanda para a historiografia brasileira, são elas: Raízes do Brasil (1936), Monções (1945) e Visão do
Paraíso (1959).
10 Cabe esclarecer que as “monções”, aqui referenciadas, não têm relação com termo da Geografia
usado para categorizar determinados ventos sazonais. Foram expedições fluviais que mantiveram
comunicações entre São Paulo e Mato Grosso nos séculos XVIII e XIX.
45
trazem e levam mercadorias e serviços. A interiorização do “sertão” se dá com
as vias fluviais.
Todavia, um importante ponto de sua narrativa, refere-se ao fato do “ser-
tão” ser o elemento de adaptação do homem. Holanda faz um trabalho etno-
gráfico, gastando todas suas veias de aproximação antropológica para mostrar
essa capacidade de adaptação do homem. É dessa adaptação, sugerida no iní-
cio do século XX por Euclides da Cunha, que, agora, na década de 1950, melhor
trabalhada por Holanda, que se vê na historiografia brasileira a figura do ser-
tanejo, de pele sofrida, que anda sempre em companhia de sua arma, passan-
do o dia inteiro montado num cavalo e que usa roupas rústicas. Aqui está ma-
terializada uma figura que é a do mameluco, do bandeirante. É esse tipo de
sujeito que é adaptado àquelas condições do “sertão”, um local difícil, hostil,
mas que é passível de amoldamento para a sobrevivência de determinadas
pessoas. Como aponta Reis (2006, p. 118):
Para Holanda, não é fácil viver no “sertão”, ele é duro, é hostil, porém foi
possível dominá-lo, e isso é mérito do português, na figura do bandeirante,
que soube se adaptar as condições adversas, soube entender que era melhor
para sua vida andar de sandálias do que com as pesadas botas que trazia da
Europa, soube descobrir que, em alguns casos, os alimentos utilizados pelos
indígenas eram muito melhores do que a comida portuguesa que estava acos-
tumado a fazer. É a adaptação do homem que propicia o domínio e, conse-
quentemente, o alastramento pelo “sertão”.
Desta forma, o “sertão” passa a ser conduzido, passa a ser tomado por
uma perspectiva de abertura. O sujeito que se mete pelo interior é um aventu-
reiro, um destemido, corajoso, mas, acima de tudo organizado, pois este espa-
ço desbravado passa a ser organizado metodicamente. Fato materializado em
viagens em que se estabeleciam pontos de paradas, as quais aos poucos se
tornavam pontos de apoio, depois pontos de abastecimentos, até tornarem-se
vilas. Uma viagem que antes era aventureira, agora se transformara em uma
viagem de estada, um percurso recorrente.
Contudo, o ponto fundamental do pensamento de Sergio Buarque de Ho-
landa consiste em povoar o “sertão” de aspectos sobrenaturais. Ele consegue
ver ali uma série de aspectos que não são apenas político, econômico, físico, ou
material, e sim sobrenatural. Ou seja, existe uma série de elementos que são
decorrentes das lendas, das crenças. O sertanejo precisa extravasar esse des-
46
conhecido, acreditando em determinadas coisas que permitem vencer as difi-
culdades, povoando o “sertão” do sobrenatural: um “sertão” mítico.
Guimarães Rosa é outro autor da Literatura que tem uma forma diferente
de abordar o “sertão”: virando-o do avesso; dando distinto caminho para o
termo, que é um percurso trilhado por outros posteriormente. O “sertão” pas-
sa a ser um elemento muito mais simbólico – ele é físico, mas também é sim-
bólico – podendo estar em todo lugar e, ao mesmo tempo, não estar. As suas
frases traduzem que “sertão” é “sertão”, ele é pulverizado em vários sentidos.
O que Guimarães Rosa faz e, de certa maneira, a historiografia também
efetiva, é aplicar no espaço e no tempo dilemas que são humanos, como o
poder, por exemplo, onde as disputas do bem e do mal se fazem presentes,
permeando o imaginário humano do sobrenatural. É esse o percurso que a
literatura consolidou e que, de certa forma, a História vem trilhando. O “ser-
tão” é físico e é imaginário, essa é a capacidade que Literatura tem ao consoli-
dar uma narrativa ideológica dos espaços, onde o “sertão” se mostra represen-
tado como um local de disputa. Assim, na historiografia, passa a ser muito
mais recorrente, principalmente nas décadas de 1970 e 1980, muito por inte-
grar as reflexões do espaço. Quando a História começa a pensar sobre as sin-
gularidades e as representações do espaço, ela encontra o “sertão”, o fazendo
cotidiano.
Durante longo tempo a historiografia dedicou-se a estudar as grandes
disputas políticas no litoral, já que seria lá que elas em sua maioria ocorreri-
am. A historiografia empreendeu uma visão em que o espaço político poderia
existir para além do litoral, refletindo sobre as singularidades dos espaços,
descobrindo assim os “sertões”. Após a década de 1970 a História passou a
reivindicá-los, impingindo a ideia de que os historiadores precisavam pensar o
conceito de região em condições diferenciadas, não ficando mais condicionado
aos palácios, a casas grandes, mas também ao espaço do aldeão, do camponês.
Destarte, a História encontrou o caboclo, o sertanejo, enfim, o “sertão do Con-
testado”.
47
“Apontamentos para a história: o Contestado”11 (1920) e “Guerra em sertões
brasileiros: do fanatismo à solução do secular litígio entre o Paraná e Santa
Catarina” (1931) ambas de José Octaviano Pinto Soares, “O Contestado entre
Paraná e Santa Catarina” (1918) de Ezequiel Antunes, “A jornada de Taquaru-
çu: feito guerreiro” (1936) de Antônio Alves Cerqueira e “Reminiscência do
Contestado: subsídio para a história” (1918) de José Vieira da Rosa.
Salienta-se, porém, que para uma abrangência total necessitar-se-ia de
uma abordagem muito mais extensa, a fim de dar conta de sua amplitude.
Sendo assim, um recorte se fez necessário, contudo, um recorte metodologi-
camente pensado, onde a escolha realizada se justifica pelo fato destes dois
trabalhos supracitados terem, cada um, uma peculiaridade.
Entre todas as obras passíveis de problematização do “sertão”, a escolha
por Alcebíades Miranda e Demerval Peixoto se fez por dois motivos. O primei-
ro, devido o texto de Peixoto ter sido, no ano de 1995, reeditado em três vo-
lumes, os quais se fazem presentes em muitas escolas da rede pública do Pa-
raná e Santa Catarina, o que o torna um dos materiais de maior acesso aos
estudantes de nível fundamental e médio sobre a temática do Contestado. O
segundo motivo, diz respeito a Miranda, especificamente por este não figurar
muito nas discussões historiográficas recentes. Márcia Janete Espig (2008),
historiadora que faz uma excelente discussão historiográfica do Contestado,
em sua tese de doutorado não apresenta Miranda em seu debate, apenas o cita
nas referências bibliográficas. Rogério Rosa Rodrigues (2012), que publicou
elucidativo capítulo sobre as narrativas históricas dos historiadores de farda
na obra “Nem fanáticos nem jagunços: reflexões sobre o Contestado (1912-
2012)”, também não o cita. Contudo, é importante esclarecer que Alcebíades
Miranda apesar de ter concluído seu trabalho ainda em 1939, uma publicação
somente veio acontecer em 1987, o que pode ter impactado para sua não cos-
tumeira presença nos debates historiográficos 12.
Miranda era capitão do 10º Batalhão do 4º Regimento de Infantaria, se-
diado na cidade de Curitiba, quando participou das operações do exército no
Contestado. Segundo o próprio, teria decidido registrar diariamente o que
com ele se passasse quando completou trinta e cinco anos de idade. Fato este,
a indicar sua consciência sobre a importância que teria para a temporalidade,
tanto que fez questão de mencionar em seu texto o desejo de que seu trabalho
prestasse algum serviço à história da sua pátria (MIRANDA, 2012, p. 12).
Não se sabe o que verdadeiramente motivou-o e redigir a obra, entretan-
to, Alcebíades coloca, de maneira pincelada, algumas sugestões ao longo da
11 Espig (2008, p. 36) esclarece que o livro de Pinto Soares tem uma errata em que o título da obra foi
corrigido para Subsídios para a história – o Contestado, fato este que deve ser apreendido com cuidado
ao passo de se não se fazerem confusões quanto a busca de Soares nas bibliografias, uma vez que
determinados pesquisados o citam com uma nomenclatura e, outros, com outra.
12 Importante considerar que não realizei nenhum tipo de pesquisa sobre a esporádica abordagem de
Alcebíades Miranda na historiografia, apenas aqui apresento uma constatação sem qualquer
aprofundamento mais detalhado.
48
redação. Já de início, estabelece forte crítica aos escritos dos oficiais que o
antecederam, numa tentativa de apresentar-se muito mais fiel aos documen-
tos e comprometido com a verdade histórica.
13 Miranda (2012, p. 22) aponta que o “sertão” era tão pouco conhecido que um mapa de possível
autoria de Caetano Valões, bandeirante fundador da então vila de Valões, hoje município de Irineópolis,
trazia a menção que o rio Timbó era afluente de rio Pelotas.
49
Para Alcebíades Miranda, o “sertão” é o efeito do abandono político. A
criminalidade e ignorância são resultados da incúria dos governantes, os quais
tão somente preocuparam-se com a região litorânea do Brasil, deixando o
interior do país a margem das iniciativas.
Nesse sentido, o do abandono político, se estabelece na narrativa uma
constante necessidade de comparação entre Canudos e o Contestado, materia-
lizados como fenômenos de morbidez social. Locais onde as situações crimi-
nógenas são parecidas, com absoluta falta de assistência, mas que necessitam
diferenciação e analogia, especialmente quanto ao ambiente e aos sujeitos que
os habitam.
50
tra essa representação social que os historiadores de farda lutaram. Isso ajuda
a compreender a presença marcante de Os sertões em suas narrativas.
51
A obra de Peixoto foi, à época, muito bem recebida pela crítica, compro-
vando que a rede de sociabilidade dos oficiais escritores não estava limitada
apenas a classe militar. A imprensa nacional teceu elogios ao trabalho, desta-
cando-o como brilhante, de alta cultura literária, digna dos mais calorosos
louvores (RODRIGUES, 2012, p. 249-250). Nada obstante Peixoto,
[...] não levou adiante a vida como intelectual, restringindo-se, além dos três
volumes sobre a Guerra do Contestado (1916-1920), a redigir o livro [...] Me-
mórias de um velho soldado (1960) e a tradução de outro sobre infantaria,
chamado O que é preciso saber sobre infantaria, de M. Abadie (1928) (RODRI-
GUES, 2008, p. 142).
É certo afirmar que não mais se sustenta a ideia, por tempo propagada,
de que o Contestado não teve um destaque na mídia, um vulto de importância
como teve Canudos, por falta de um Euclides da Cunha15. As obras publicadas,
já após a assinatura do acordo de limites, foram numerosas, seguindo um
crescente que atingiu certamente um ápice após a publicação, em 2004, do
trabalho de Paulo Pinheiro Machado: “Lideranças do Contestado”; obra que
trouxe uma série de aprofundamentos ao tema. Somado a isso, é considerável
assinalar que, agora, com a passagem do centenário da guerra (2012-2016),
está em curso um aumento ainda maior no número de trabalhos sobre o Con-
testado, uma vez que datas comemorativas, de cem ou cinquenta anos de de-
terminados fatos históricos, acabam motivando um avolumar nos expedientes.
Se, Peixoto foi merecedor de elogios, o “sertão” em sua narrativa de certo
modo também teve a mesma sorte. Para ele os aspectos naturais da região
eram verdadeiros tesouros, especialmente o pinho e o mate, riquezas que
poderiam fazer daquele espaço uma nova Canaã, à medida que a República o
fazia ressurgir do abandono (PEIXOTO, 1920, p. 10).
Assim como em Miranda (2012), “A campanha do Contestado: episódios e
impressões” (1920) inicia com a busca da contextualização geográfica, porém,
não em termos naturais, mas sim abordando seus núcleos habitados. Segundo
Luís Roberto Soares, o qual redigiu a introdução da edição de 1995 da respec-
tiva obra, a narrativa de Demerval Peixoto é de inspiração positivista, advinda
da Escola Militar do Rio de Janeiro, escola que formava as vanguardas das
elites dirigentes da época. Escola preocupada com a construção de um Estado
Nacional forte, enaltecendo as qualidades pátrias e com um forte ideal civiliza-
tório.
Sendo assim, as primeiras páginas objetivam dar ao leitor uma visão ge-
ral dos centros “urbanos” da região. Várias vilas e municípios são descritos
evidenciando seu atraso e pobreza. Somente duas municipalidades escapam
15 Opinião apresentada por Paulo Pinheiro Machado em palestra intitulada Contestado na sala de aula
– reflexões e possibilidades para o Desenvolvimento Regional. Palestra esta proferida durante o I
Seminário sobre Educação e Desenvolvimento Regional: os planos de educação e os desafios, realizado
na cidade de Canoinhas entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.
52
de sua crítica: Ponta Grossa e Curitiba. Entretanto, é de se salientar que estes
centros não foram palco dos conflitos e são certamente mencionados pelo
autor no intuito de estabelecer comparação entre os tão próximos e díspares
vilarejos.
Os rios também se destacam na redação, suas nascentes e cursos são de-
talhados com cuidado, deixando claro que, para este intelectual militar, o “ser-
tão” não é um espaço árido, de pouca flora ou carente de chuvas, é um “sertão”
muito mais constituído de práticas, conceituado pela atividade humana, na
concepção “certeauriana”: um espaço praticado (CERTEAU, 1994).
O “sertão” para Peixoto apresenta-se muito mais como um ambiente de
causa e efeito do humanal do que do geográfico. Há uma perceptível preocu-
pação com os sujeitos que empreendem relações naquele ambiente, sejam elas
de caráter social, cultural, econômica ou militar. Nesse sentido, e no que con-
cerne esta problematização, o sertanejo talvez seja um dos elementos mais
constantes em toda a narrativa, um elemento que vivera em total abandono,
espoliado pelos prepotentes, os quais por vezes podem se tornar vítimas des-
tes rancorosos e vingativos sertanejos (PEIXOTO, 1920, p. 11).
Em momentos euclidianos, Peixoto tece elogios condenatórios aos serta-
nejos (RODRIGUES, 2008, p. 146). A dicotomia de seu discurso é recorrente,
ao passo que deseja justificar a ação militar, mas também não ser duro para
com os seus irmãos de pátria:
16 Nota dos Organizadores: por se tratar de escrito de épocas passadas, algumas citações deste e outros
textos contêm erros de ortografia, considerando as normas atuais.
53
sobrenatural, aos espaços sociais, exprimindo, especialmente em Peixoto, uma
ideia de que ele pode apresentar-se em toda parte. Pode ser a expressão do
desconforme, daquilo que é diferente, desigual do modelo esteticamente con-
cebido como o padrão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
54
mento17 do “sertão”, é resultado do abandono político. Miranda inclusive su-
gere a falta de escolas como promotor de tal. Apesar de estes oficiais escrito-
res produzirem uma narrativa fortemente preconceituosa, positivista e elitis-
ta, ainda assim apontaram as falhas da esfera política como agente conseguin-
te da segregação social. Agora, passados mais de cem anos da Guerra do Con-
testado, muitos dos discursos ainda são os mesmos, o próprio termo “sertão”
perpetua, utilizado para referir-se a determinadas regiões de Santa Catarina
(AMADO, 1995, p. 1).
Neste território do planalto catarinense persiste o abandono. Dados do
ranking de IDH do Brasil de 2010, publicado no Atlas de desenvolvimento
Humano do Brasil de 2013, apontam para a discrepância entre regiões em de
Santa Catariana. Se Joinville, ao norte do estado, ocupa a posição de número
21, São Miguel do Oeste a 37, Tubarão a de número 67 e Florianópolis a posi-
ção 3. No Contestado, Três Barras está na 1720ª, Timbó Grande na 2924ª e
Lebon Regis na 3136ª posição (MUCHALOVSKI, 2015, p. 10). Dados que pode-
riam muito bem ser contemporâneos a Euclides da Cunha, quando este já
afirmava ser o litoral o espaço da riqueza e o interior o seu avesso.
Hoje, no centenário da Guerra Sertaneja do Contestado, o “sertão” parece
continuar. Se outrora o esquecimento e a falta de investimentos já eram per-
cebidos pelos seus críticos mais tendenciosos e elitistas, atualmente o que
mudara? Pensar sobre o processo histórico, os discursos, os conceitos, pode,
quem sabe, materializar-se num mecanismo para o entendimento do “sertão
do Contestado”, no intuito de ser amparo para a criação de medidas que pro-
movam o “desenvolvimento”, não necessariamente econômico, mas social.
Onde a parcela historicamente menos favorecida da população seja protago-
nista dos investimentos públicos, e não apenas referência nos discursos que,
dia após dia, ano após ano e eleição após eleição, prometem mudança no qua-
dro estabelecido, mas que, demonstram ser incapazes de efetivarem mudan-
ças substanciais. Os estudos estão sendo feitos, as alternativas estão sendo
levantadas, o material intelectual já é consideravelmente relevante, cabendo
aos que, detêm o poder da mudança, pô-las em prática.
REFERÊNCIAS
17 Obviamente que considero aqui a ideia de desenvolvimento de cada autor, não sendo este conceito
analisado em profundidade no discurso, servindo apenas de apontamento. Pois, o próprio conceito de
desenvolvimento é muito jovem, debatido com maior intensidade após o fim da Segunda Guerra Mun-
dial.
55
história escrita: teoria e história da historiografia. São Paulo: Contexto, 2006. p. 27-
64.
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56
A POBREZA NO PLANALTO NORTE
CATARINENSE: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E
IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO
REGIONAL1
INTRODUÇÃO
1 O presente texto, na sua primeira versão, foi publicado na revista Desenvolvimento Regional em
debate, v. 6, n. 3 (2016).
2 Doutora em Serviço Social, com atuação no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da
Universidade do Contestado (UnC). E-mail: [email protected]
3 Psicóloga, Mestre em Desenvolvimento Regional no Mestrado em Desenvolvimento Regional da
UnC.
57
distribuição de renda ou os padrões de vida e seus dos indivíduos da socieda-
de brasileira.
Os cenários da pobreza no Brasil são expostos pelos meios de comunica-
ção, os quais divulgam este problema decorrente da sociedade produtiva e
social, organizada em classes sociais. A condição de miséria e pobreza é vivida
por mais de 16,27 milhões de pessoas no Brasil, isto é o equivalente a 8,5% da
população (IBGE, 2013).
O IBGE revelou que no ano de 2013, dos 16,27 milhões de brasileiros que
viviam em condição de extrema pobreza, 4,8% não possuíam nenhuma renda
e, os demais 11,4 milhões possuíam rendimento per capita de R$ 1,00 a R$
70,00. A linha da pobreza no Brasil é delineada nesse parâmetro (renda per
capita de até R$ 70,00). Nesse caso a identificação das pessoas vivendo em
condições proporcionadas por essa renda é reconhecida pela condição de
pobreza extrema.
Os fatores que envolvem a miséria e a pobreza envolvem a responsabili-
dade social do Estado, o desemprego; a baixa escolaridade; restritas oportuni-
dades de capacitação profissional, trabalho e renda; exclusão social de seg-
mentos dos resultados da produção social. Nesse contexto o próprio sujeito
representa sua baixa estima, desvalorização pessoal, falta de confiança do
sujeito e da própria sociedade sobre ele.
Sob as abordagens teóricas pode-se entender que a pobreza está intima-
mente relacionada com o nível de renda de um grupo social, parâmetro que
expõe os cenários de uma sociedade. Entende-se que a linha de pobreza está
relacionada com o desenvolvimento de determinada sociedade, logo, pode
existir relação entre a existência da pobreza e o desenvolvimento de uma re-
gião.
Desta forma, pode-se entender que a existência de situações de pobreza
pode provocar um círculo de ruptura e isolamento pelo qual o pobre passa a
ser visto pela sociedade como alguém vulnerável, humilhado, destituído de
dignidade, de igualdade de oportunidades, autonomia e fundamentalmente
promotor de uma ausência constante de participação social.
O que representa para a sociedade não ter emprego, ter um trabalho mal
remunerado, possuir uma casa sem capacidades para satisfazer as necessida-
des básicas, não trazem apenas carência de recursos e impossibilidade de
adquirir bens de consumo; mas trazem também ao próprio indivíduo sensa-
ção de inutilidade, incapacidade de se realizar. Sensação esta, que impede os
indivíduos de usufruírem do mundo. É a partir desta percepção que se enten-
de a necessidade de estudar a pobreza e a exclusão social.
A exclusão social é uma problemática recorrente nas discussões em par-
ticular quando o recorte é a fome, em particular quando se evidenciam os
paradoxos nas nações ricas economicamente como é o caso brasileiro, os
quais fundamentam a formulação das políticas públicas em especial as de
enfrentamento a pobreza.
58
É neste contexto que se inserem as políticas públicas de assistência social
que dentre seus programas e ações promovidas, destaca-se os recursos estra-
tégicos de minimizar e erradicar a fome, a pobreza e a desigualdade social.
Esse recurso estratégico das políticas públicas e da assistência social, os pro-
gramas de transferência de renda (desenvolvidos a partir de política pública)
apresentam-se como estratégia do Estado para enfrentar a pobreza. Neste
estudo o Programa Bolsa Família brasileiro.
O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que be-
neficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza no Brasil desde
o ano de 2003. O Planalto Norte Catarinense apresenta um total de 34.612
famílias inscritas no Bolsa Família (PBF) atingindo um percentual de 9,69% da
população total da região (IBGE, 2013).
A lógica deste programa é que o acesso a uma renda mínima associada à
oferta de serviços básicos existentes nos municípios deveria possibilitar auto-
nomia às famílias pobres. Frente a esta discussão, pode-se entender a pobreza
como um conceito socialmente construído e definido por sua história, muitas
vezes associado a padrões estabelecidos pela mesma sociedade, em dados
momentos de seu desenvolvimento.
Ainda, na mesma perspectiva de construção social, a temática da pobreza
sob a concepção subjetiva, leva à identificação do reflexo social na produção
de pobreza, pela qual o sujeito passa a ser reconhecido no seu espaço como
pessoa com história e necessidades além das financeiras. Muitas vezes ao se
estudar o ambiente onde os sujeitos em condição de pobreza estão inseridos
observa-se comportamentos sociais de exclusão, de segregação social e de
pouco reconhecimento social por parte das próprias pessoas pertencentes a
este contexto.
Para tanto, o estudo teve como problemática: quais são as representa-
ções sociais dos sujeitos que vivem em condição de pobreza e sua interferên-
cia ao desenvolvimento no Planalto Norte Catarinense?
Na perspectiva de responder a esse problema, o objetivo geral do estudo
portanto, foi o de evidenciar as representações sociais dos sujeitos beneficiá-
rios no Bolsa Família no Planalto Norte Catarinense sobre sua condição de
pobreza e como tanto pobreza como o auto reconhecimento do sujeito pobre
implicam no desenvolvimento da região.
O texto deste é descrito na seguinte ordem: em um primeiro momento é
apresentado o referencial teórico estruturado com os principais temas que
abrangem este estudo, no segundo momento os procedimentos metodológicos
para a sua construção são descritos, para proporcionar entendimento dos
resultados e discussão que são apresentados em um terceiro momento e por
fim, este estudo conclui-se com a apresentação das considerações finais.
POBREZA
59
A pobreza pode ser entendida sob diversos aspectos, como privação em
termos de materiais, na forma de fome ou na baixa qualidade de moradia,
tratando-se de termos econômicos, pode ser entendida sob forma de inade-
quação de renda e em termos sociais, é definida como isolamento da comuni-
dade ou sentimento de baixa autoestima (VINHAS, 2006).
Esta problemática tem alcançado patamares cada vez mais elevados em
todo o mundo; no Brasil nas últimas décadas vem se observando cada vez
mais desigualdade na distribuição de renda e significativos níveis de pobreza
(SILVA, BANDEIRA e LOPES, 2011). Logo, explicar este fenômeno exige um
esforço para o seu entendimento no campo das determinações sociais.
Para melhor entendimento sobre o fenômeno pobreza faz-se necessária a
identificação de abordagens que o descrevem. A literatura especifica identifica
quatro abordagens fundamentais para sua compreensão no âmbito social,
sendo as elas: as culturalistas; as estruturalistas; as liberais-neoliberais; e, as
abordagens que concebem a pobreza como fenômeno multidimensional (SIL-
VA, 2004).
As abordagens culturalistas da pobreza concebem-na como decorrência
de fatores internos, comportamentais e valorativos defendidos pelos pobres,
nos quais o fator cultural é entendido como único determinante da pobreza no
mundo. Oscar Lewis (1983) um dos principais defensores desta teoria é citado
por Paugam (2003, p.51).
Este tipo de concepção tem sido adotado no Brasil como base para a ela-
boração de políticas públicas de enfrentamento da pobreza desde os anos de
1970. Já as abordagens estruturalistas, cuja discussão predominava nos anos
de 1950, se posicionam inversamente as abordagens culturalistas, uma vez
que concentra nas explicações sobre a pobreza em fatores externos e estrutu-
rais, entendendo o comportamento dos pobres como consequência e não co-
mo causa da pobreza (JESUS e COSTA, 2007).
60
A tese estrutural, consequentemente opera uma mudança de perspectiva: se
os mais desfavorecidos são afastados temporária ou definitivamente do mer-
cado de trabalho e das instituições oficiais, isso não ocorre porque se desinte-
ressam pelos valores da sociedade em geral, mas porque na ausência de renda
estável, de poder e de instrução, reconhecem que suas chances de promoção
social são comprometidas e que estão condenados a viver por mais ou menos
tempo em um contexto cultural no limite da exclusão social (PAUGAM, 2003,
p.52).
Esta vertente tem suas bases no marxista que concebe e explica a socie-
dade capitalista pelos processos de exploração do trabalho pelo capital. Jesus
e Costa (2007) complementam esta concepção descrevendo que a corrente
estruturalista a qual propõe que se considerem as questões estruturais que
definem o ambiente dos pobres e que os comportamentos descritos por Lewis
(1981) sejam definidos como consequência da pobreza e não como causa
como propôs a teoria culturalista.
Já a abordagem liberal-neoliberal dos anos de 1970 converge com a cul-
turalista. Aquela identifica as causas da pobreza e não concorda com inter-
venções sobre a pobreza realizadas pelo Estado. Para essa abordagem a inter-
venção do Estado sobre a pobreza poderia desestimular o indivíduo buscar no
trabalho a condição de interação social. Para os liberais ortodoxos, não deve-
ria ocorrer nenhuma intervenção do Estado sobre a pobreza. Aqueles qualifi-
cam o pobre como o indivíduo incapaz de competir no mercado. Mas um gru-
po de liberais aceitou a necessidade da intervenção do Estado desde que fosse
pontual e em circunstâncias bem definidas (SILVA, 2000).
Por fim, a abordagem da pobreza enquanto fenômeno multidimensional
provoca a discussão na qual se defende a pobreza de forma complexa, levando
em conta juízos de valor em termos relativos ou absolutos.
Crespo e Gurovitz (2002, p.3) descrevem que “a pobreza pode ser estu-
dada apenas do ponto de vista econômico ou incorporada a aspectos não
econômicos à análise, sendo contextualizada de forma dependente ou não da
estrutura sócio política da sociedade”. Esta abordagem tem como proposta
central contestar as concepções de pobreza por visões homogêneas e dicotô-
micas. A abordagem multidimensional define a pobreza a partir de três esfe-
ras que se inter-relacionam: a pobreza como juízo de valor, a pobreza relativa
e a pobreza absoluta (SILVA, 2007).
Crespo e Gurovitz (2002, p.03) dizem que a pobreza como juízo de valor:
61
fragilidade, embora seja bastante óbvio que mesmo uma conceituação objeti-
va da pobreza não se furta à presença de algum juízo de valor.
62
Considerando essas diferentes abordagens sobre pobreza no decorrer do
século XX três novas concepções foram desenvolvidas: a concepção de sobre-
vivência, de necessidades básicas e de privação relativa.
Durante os séculos XIX e XX até a década de 1950 o enfoque de sobrevi-
vência predominou. Teve origem no trabalho de nutricionistas inglesas que
apontavam que a renda do mais pobre não era suficiente para a manutenção
do rendimento físico de um indivíduo. Este enfoque tinha como objetivo pre-
servar a ênfase no individualismo compatível com o ideário da teoria liberal
(apresentada acima neste estudo). A partir deste ponto de vista e com a utili-
zação de medidas estatísticas formulou-se o primeiro modelo de proteção
social para o Estado de bem estar fundamentado em políticas nacionais de
assistência (SILVA, 2007).
A partir de 1970, novas exigências como serviços de água potável, sane-
amento básico, saúde, educação e cultura passaram a serem consideradas
necessidades mínimas para a sobrevivência e por esta razão a pobreza rece-
beu a conotação relacionada com as necessidades básicas (PEREIRA-PEREIRA,
2000).
Rocha (2006, p. 19) expõe que a adoção da “abordagem de necessidades
básicas insatisfeitas significa ir além daquelas de alimentação para incorporar
uma gama mais ampla de necessidades humanas, tais como educação, sanea-
mento, habitação” em contingencia dos direitos sociais previstos pela Consti-
tuição Federal Brasileira de 1988.
Por esta razão a noção de pobreza abrange outros aspectos da vida coti-
diana dos sujeitos, considerando que estes não só se alimentam como também
se relacionam e trabalham.
Somente nos anos de 1980 é que a pobreza foi vista por outro enfoque
mais abrangente e rigoroso, com maior direcionamento para se definir as
interferências sobre a pobreza, que passou a ser entendida como privação
relativa. Este conceito introduziu ao estudo da pobreza variáveis mais amplas,
que a conduziram para o entendimento de que os sujeitos podem sofrer priva-
ções em diversas esferas da vida, não implicando somente na privação materi-
al. Estas privações sofridas pelas pessoas determinavam o seu posicionamento
em todas as esferas sociais (CRESPO e GUROVITZ, 2002).
Outra forma de se entender a pobreza e que ampara a estruturação deste
estudo a citada por Silva (2007). Esta autora considera a pobreza enquanto
expressão objetiva ou subjetiva. A primeira expressão se refere às manifesta-
ções concretas do fenômeno na vida dos pobres, por outro lado a dimensão
subjetiva da pobreza diz respeito ao como o fenômeno é percebido pela socie-
dade em geral, inclusive pelos próprios sujeitos da pobreza.
Conforme Silva (2007) a pobreza é perceptível em diversos lugares e si-
tuações. Captar sua dimensão é complexo e subjetivo, uma vez que ela apre-
senta uma multidimensionalidade, podendo ser explicada de forma absoluta,
relativa e subjetiva.
63
Um dos parâmetros mais conhecidos para a determinação da pobreza e
que indica a pobreza extrema é o parâmetro estabelecido pelo Banco Mundial
o qual estabelece que pobres extremos são os que viviam com menos de 1
dólar por dia. Este parâmetro é criticado por atender uma perspectiva limita-
da da problemática, ou seja, mensura renda e consumo na perspectiva econô-
mica, uma vez que a pobreza vem se mostrando cada vez mais multifacetada.
Em complemento aos critérios e situações da pobreza e da pobreza ex-
trema no Brasil, apontados no início deste estudo o IBGE identificou também
que a predominância da população nestas condições localizava-se no meio
rural e que os estados do nordeste concentram a maior parte dos sujeitos
extremamente pobres (9,61 milhões), a região sudeste possui 2,72 milhões de
sujeitos nestas condições, seguido pelo norte com um contingente de 2,65
milhões, no sul são 715,96 mil sujeitos em condições de extrema pobreza (IB-
GE, 2013).
A criação de um indicador que sintetizasse a pobreza em suas mais di-
versas dimensões surgiu no ano de 1990 pelo Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD) e denominou-se Índice de Pobreza Humana
(IPH) no ano de 1997. Este índice tem sido utilizado desde então em estudos
sobre o desenvolvimento humano (IPEA, 2007).
A definição e respectiva caracterização de desenvolvimento humano têm
por objetivo aferir o avanço da qualidade de vida de uma população conside-
rando suas características econômicas, culturais, sociais e políticas. Esta abor-
dagem procura focar diretamente para as pessoas, suas oportunidades e capa-
cidades.
A definição do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi criado pela
Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a qualidade de vida e o
desenvolvimento econômico da população. Este índice varia de zero (quando
não apresenta nenhum desenvolvimento) até 1 (hum) (quando é considerado
que há desenvolvimento humano total). Por este parâmetro, é elaborado rela-
tório sobre o desenvolvimento humano de 187 países, pelo Programa das
Nações Unidas (PNUD). No ano de 2013 o Brasil manteve-se nesse ranking
mundial no 85° lugar apresentando o IDH de 0,73 (PNUD, 2013). O Brasil nas
últimas décadas veio demonstrando tendência de aprofundamento da desi-
gualdade pela distribuição de renda gerando elevados níveis de pobreza.
Neste estudo da pobreza se trata ela a partir de uma perspectiva social,
pela qual o sujeito pobre se relaciona com os atores sociais. Portanto, é neces-
sário estudar o pensamento social do que é pobreza e de que forma ela está
representada na sociedade a partir da visão do próprio sujeito pobre é descri-
ta neste estudo sob orientação das representações sociais.
A desigualdade social em especial carrega consigo a pobreza como condi-
ção social e historicamente produzida, porém, o seu enfrentamento faz parte
das estratégias da superação da desigualdade, que vem por meio da transfe-
64
rência de renda, que no Brasil é prevista por programas sociais, tais como o
Bolsa Família.
O Programa Bolsa Família4 é um programa de transferência de renda di-
reta para as famílias, vinculado a um auxílio financeiro para famílias que se
encontram em condições de pobreza extrema.
Este programa foi criação a partir da medida provisória número 132 de
20 de outubro de 2003, posteriormente convertida na lei número 10.836 de
09 de janeiro de 2004. É gerenciado pelo Ministério de Desenvolvimento Soci-
al e Combate à Fome (MDS). É o mais relevante programa no desenvolvimento
histórico entre os programas de transferência de renda no Brasil.
A seleção das famílias para receberem o benefício do PBF ocorre pela
sua inclusão no cadastro único para programa Socais (CadÚnico) que é pre-
enchido nos municípios, utilizando-se de uma ferramenta eletrônica. A partir
dos dados cadastrados, o MDS seleciona sistematicamente as famílias que
serão incluídas no PBF.
No estado de Santa Catarina eram 134.132 famílias beneficiadas pelo
PBF, destas 4.501 famílias (3,35%) fazem parte do recorte amostral deste
estudo por pertencem aos municípios estudados (Mafra, São bento do Sul,
Irineópolis e Três barras) (MDS, 2014).
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
4O Programa Bolsa Família pauta-se em três dimensões essenciais a superação da fome e da pobreza,
sendo elas a promoção do alivio imediato da pobreza a partir da transferência de renda às famílias
classificadas pobres ou extremamente pobres; o exercício dos direitos sociais básicos nas áreas de saúde
e educação através das condicionalidades e a coordenação de programas complementares que tem por
objetivo possibilitar as famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Família consigam superar a situação
de vulnerabilidade e pobreza (MDS, 2013).
5 A psicologia social aborda as representações sociais no âmbito do seu campo, do seu objeto de estudo,
da relação indivíduo-sociedade e de um interesse pela cognição, embora não situado no paradigma
clássico da psicologia. Esta abordagem se reflete sobre como os indivíduos, os grupos, os sujeitos
sociais, constroem seu conhecimento a partir da sua inscrição social, cultural, de forma a se compreen-
der como a sociedade se dá a conhecer e constrói esse conhecimento com os indivíduos.
6 Romeno naturalizado francês Serge Moscovici é dono de uma obra considerável, tão importante para
a psicologia (seu campo de formação e atuação) como para a história e as ciências sociais. Seus traba-
lhos e sua teoria das representações sociais (TRS) têm influenciado ao longo das últimas quatro décadas
pesquisadores tanto na Europa como nas Américas, incluindo o Brasil. Entre sua vasta obra – doze
livros individuais e quatorze que ele organizou ou escreveu em conjunto com outros autores –, apenas
dois foram traduzidos para o português.
65
duos, grupos e sociedade constroem seus conhecimentos a partir de uma ins-
crição social e cultural.
Alves-Mazzotti (2008, p.21) conceitua representações sociais, dizendo
que
7 A teoria das Representações Sociais parte da premissa de que existem formas diferentes de conhecer e
de se comunicar, e estas diferenças são guiadas por guiadas por objetivos sociais diferentes, gerando à
este sujeito social a compreensão de seu universo a partir do que lhe é definido pela sociedade que
pertence (ARRUDA, 2004).
66
provocam a produção de comportamentos e relações como meio de modificar
o outro, de forma lógica, própria, em uma linguagem particular não se trans-
formando nem em opiniões sobre objetos ou imagens, mais sim teorias ou
ciências coletivas que se destinam a interpretação da realidade atual.
Desta forma o estudo das representações sociais provoca uma releitura
do saber popular, do conhecimento do cotidiano e do conhecimento pré-
teórico de que falam Berger e Luckmann (1978), de forma que o conhecimen-
to sobre a realidade torne-se socialmente construído. Esta construção se dá a
partir do saber do sujeito interligado com a sua inscrição social. A isso Mosco-
vicci (1961) dá o nome de processo social (ARRUDA, 2002).
Moscovicci (1961, p.26) descreve que processo social
67
ais dos indivíduos que vivem em condição de pobreza no Planalto Norte Cata-
rinense.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
68
O estudo desenvolvido foi orientado pelos procedimentos metodológicos
da abordagem qualitativa e explicativa. A pesquisa de campo foi desenvolvida
pela aplicação de uma entrevista semidirigida para mulheres, conforme amos-
tragem descrita acima.
O roteiro da entrevista era composto por sete (7) perguntas e o local da
coleta de dados foi a residência dos sujeitos, quando de visita realizada pela
pesquisadora durante os meses de agosto a outubro de 2014. A entrevista
teve duração média de 30 minutos e foi realizada em local da casa escolhido
pelo pesquisado. Este cuidado foi tomado em virtude de a gravação das res-
postas não fosse afetada. Para a análise dos dados deste estudo utilizou-se
como procedimento metodológico a análise do discurso do sujeito coletivo
(LEFÈVRE, LEFÈVRE e TEIXEIRA, 2000). A entrevista semidirigida foi gravada
após autorização das participantes da pesquisa de campo e os discursos cole-
tados foram transcritos na íntegra para seguidamente ser realizada a análise
pela técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
69
quisa de campo. Desta forma se apresenta uma única análise do DSC para os
participantes deste estudo.
O quadro abaixo apresenta o primeiro questionamento realizado aos su-
jeitos que consiste em buscar o entendimento do que é pobreza para as entre-
vistadas.
Sujeito 7 (Mafra): “pobreza é ver meus filhos sentindo a mesma dificuldade que eu senti quando era
criança, é ter que repetir para eles o que eu ouvia da minha mãe (“isso não é coisa para pessoas po-
bres”) hoje repito para minhas filhas, para mim pobreza é a falta de tudo, é a necessidade de ter que
depender das outras pessoas (dinheiro, roupa, comida)”
Sujeito 11 (Irineópolis): “é a falta de dinheiro, sem dinheiro falta todo o resto, não se tem comida,
roupa nova, coisas para oferecer para seus filhos, acho que tudo se resume em falta de tudo... até de
esperança [...] o meu mundo é muito diferente o seu”
Sujeito 3 (Três Barras): “pobreza é ser visto de forma diferente pelas pessoas, sentir vergonha por não
conseguir ser melhor do que o dia de ontem e saber que os próximos amanhãs serão todos iguais, sem
dinheiro, tem trabalho, sem vida digna me sinto preso a esta condição ”.
Ideia Central
Pobreza é a falta de tudo, dinheiro, esperança, é ter que depender de outras pessoas é sentir vergonha
de ser visto diferente pela sociedade.
Discurso Síntese:
A pobreza é não se ter dinheiro, não conseguir oferecer melhores coisas para seus filhos, é depender
da ajuda de outras pessoas sempre. É sentir que se é tratado de forma diferente pela sociedade, muitas
vezes deixado de lado, quando as oportunidades vão ficando cada vez mais difíceis de serem encon-
tradas, isso só faz com que sejamos mais pobres. Até parece que ser pobre é bom, e que não queremos
melhorar, as pessoas com mais dinheiro devem pensar que não queremos crescer como elas, até
queremos mais não temos a mesma oportunidades, o nosso mundo é diferente não se tem a mesma
liberdade de quem tem dinheiro.
70
Já o autor Sen (2000), compreende a pobreza de forma mais completa,
descrevendo-a como uma ausência de funcionamento (habilidade de realiza-
ções) e de capacidades (liberdade para realizar), propondo principalmente
que a pobreza não deve ser vista como uma questão apenas econômica e indi-
vidual, mas sim como um conceito social, de forma que a pobreza possa ser
analisada a partir de estados e ações humanas.
Desta forma pode-se identificar no discurso deste grupo a ausência de li-
berdade de escolha, fator que os mantém na condição de pobreza, pois estes
podem até escolher não serem sujeitos pobres ou não estarem em condição de
pobreza, principalmente devida as condições que estão expostas os priva da
liberdade de simplesmente mudar de vida, ao buscarem oportunidades (fator
presente no discurso individual de muitos participantes), falta-lhes espaço e
aceitação na sociedade.
Santos (2007) descreve que a pobreza quando definida como privação de
capacidades acaba por refletir na liberdade das pessoas e Sen (2001) classifica
três razões distintas para liberdade; (1) a que por si só gera bem-estar, (2) a
que permite a realização de funcionamentos relevantes para o bem-estar e (3)
a que possibilita ao indivíduo a realizar a condição de agente social. Desta
forma a privação de liberdade pode contribuir para o empobrecimento dos
sujeitos.
Outro questionamento levantado por este estudo buscou por um enten-
dimento referente ao porque existem pessoas em situação de pobreza. Abaixo
é possível identificar os relatos apresentados.
Sujeito 12 (S Bento do Sul): “falta de oportunidades desde criança, não estudei, fui morar com uma
pessoa muito nova, para sair de casa, hoje tenho 5 filhos destes 2 pequenos, estou sozinha, não
consigo trabalhar. Mais resumo tudo em falta de estudo e isso leva a falta de oportunidade, sem
estudo não tem trabalho. Pense, tenho 39 anos estudei até a 5ª série e tenho 5 filhos, você acha que
alguém vai me dar trabalho?”
Sujeito 21 (Mafra): “não tem emprego, já andei a cidade toda atrás de um mais ninguém precisa, na
verdade eu sei e sinto que ninguém quer contratar pessoas mais velhas com pouco estudo, não sei
falar bonito, não tenho roupas boas, isso conta muito. Hoje eu trabalho por dia, mais sabe como é
né, hoje tem e manhã não tem. Mas é como vou levando a vida e dando de comer e vestir para meus
filhos. Hoje sinto a importância do estudo”.
Sujeito 2 (Irineópolis): “não sei dizer com certeza, mas eu estou assim porque não estudei. Só
consigo trabalho por dia, quando alguém dá, do tipo, limpar uma casa ou outra, mais não fico muito
tempo, logo as pessoas não querem mais. Sou pobre porque não consigo ver formas de deixar de ser
pobre”
Sujeito 18 (Três Barras): “falta de trabalho, não estudei. Hoje o estudo conta muito, sem ele não se
consegue fazer serviço nenhum. Não terminei a oitava série, sei ler e sei escrever mais é pouco e já
tenho 40 anos. Hoje está cheio de gente mais nova, com muito mais estudo. Tenho feito alguns
71
cursinhos profissionalizantes para ver se ajuda, mais a professora já falou, se eu não voltar estudar
não vou conseguir”
Ideia Central
A falta de estudo leva a falta de oportunidade de trabalho, fator que impede a superação da condi-
ção de pobreza.
Discurso Síntese:
Existem pessoas em condição de pobreza porque não estudaram, a falta do estudo atrapalha para
conseguir trabalho, sem trabalho não tem dinheiro, a falta de estudo provoca a falta de condições de
trabalho digno, sem trabalho digno não tem experiência sem experiência e com idade avançada aí
situação fica pior.
Tabela 2 - Discurso individual de sujeitos sobre a responsabilidade pela sua condição de pobreza
SIC “sou pobre porque não estudei, nunca gostei da escola desde pequeno e meus pais não me manda-
vam ir, isso fez com que eu desistisse muito cedo (estudei até a 5ª série), pois achava que ir para a
escola era perca de tempo, naquela época eu gostava mesmo de brincar, depois o tempo foi passando,
passei a trabalhar nas casas para ter um dinheirinho, e quando comecei buscar serviço de verdade, vi
72
que devia ter estudado mais, e que ia ser difícil ter um trabalho bom” (Sujeito 22 município de Mafra)
SIC ”sou muito responsável sim, tanto que hoje obrigo meus filhos irem para escola, pois sei qual vai
ser o futuro deles se não estudarem [...]” (Sujeito 28 Três Barras)
SIC “ quando vi que devia ter estudado mais para conseguir trabalho, voltei a estudar, estas escolas
especiais, mais não consegui acompanhar. Hoje não consigo trabalhar registrada, pois não tenho a
oitava série e não adianta, não consigo aprender as coisas, já estou muito velha”. (Sujeito 11 São Bento
do Sul)
SIC “ sem estudo não tem trabalho, sem trabalho não tem dinheiro, sem dinheiro sou pobre” (Sujeito 3
Irineópolis)
Foram 90,43% (N104) dos sujeitos que entendiam possível saírem da si-
tuação de pobreza atual, mas 9,57% (N11) entendia haver limitações para
ultrapassarem essa condição. A tabela 3 apresenta o discurso individual de
sujeitos ao complementarem o questionamento da entrevista.
SIC “existe possibilidade sim, mais depende muita coisa, voltei a estudar, também estou participando de
alguns cursos profissionalizantes oferecidos pela prefeitura, queria ter certeza que é só isso, para que eu
73
possa trabalhar registrada e daí possa ser feliz, sem me preocupar se amanhã vou ter dinheiro para
comprar comida ou roupa para meus filhos, vou andar na rua de cabeça erguida, me sentindo igual a
todo mundo” (Sujeito 12 município de Mafra)
SIC “já estou fazendo meus filhos irem para escola, não deixo perder um dia, se meus pais tivessem
feito isso comigo talvez eu estivesse melhor de vida, mais agora não dá para olhar para traz, tenho que
olhar para frente e não deixar que meus filhos tenho a mesma vida que eu” (Sujeito 8 Três Barras)
SIC “ estou certa que dá para melhorar, até porque já melhorei muito, eu já fui muito pobre, sem ter luz
e água em casa, roubava água de noite nos vizinhos para poder tomar durante o dia, hoje eu estou
estudando, faço uma matéria por vez porque não tenho mais cabeça para acompanhar, mais logo termi-
no, daí vou buscar emprego igual a todo mundo”. (Sujeito 19 São Bento do Sul)
SIC “eu não vejo forma de deixar de ser pobre, nunca fui diferente, meus pais tinham menos do que eu,
acho que enquanto a sociedade não olhar melhor para nós vamos ser sempre os necessitados, eu não
tenho esperança de ver as coisas mudar, acho que morro antes” (Sujeito 11 Irineópolis)
8 O papel constitutivo está associado às liberdades substantivas que inclui a capacidade de evitar a
fome, a subnutrição, doenças que podem ser prevenidas, morte prematura, bem como as liberdades
associadas à instrução, à participação política, à liberdade de expressão, etc. As liberdades substantivas
devem ser consideradas importantes independentemente do interesse individual em exercê-las ou não:
mesmo que uma pessoa não tenha vontade de exercer sua liberdade de expressão, por exemplo, seria
uma privação se ela não pudesse ter a escolha por manifestar-se ou não. Essas liberdades são parte
integrante do enriquecimento da vida humana. (SANTOS, 2007, p.38).
9 Já as liberdades instrumentais são importantes na medida em que contribuem para promoção de outros
tipos de liberdades (liberdade política, facilidades econômicas, oportunidades sociais, garantia de trans-
parência e segurança protetora), que se inter-relacionam entre si, permitindo uma liberdade global do
sujeito (SANTOS, 2007).
74
Na entrevista se indagou aos sujeitos sobre o que poderia contribuir para
que saíssem desta situação.
Quadro 4 - Discurso do Sujeito Coletivo sobre o questionamento do que poderia contribuir para o
entrevistados sair da condição de pobreza
Sujeito 21 (Mafra): “mais oportunidade de trabalho digno, não é por que sou pobre que não posso ter
um trabalho bom, em um lugar limpo, parece que as pessoas esperam que os pobres façam o trabalho
ruim e o rico o trabalho bom, agora estou trabalhando em lugar ruim porque ainda estou estudando,
ainda sou pobre, mais quero ir trabalhar em um lugar bom ”.
Sujeito 2 (Irineópolis): “duas coisas, mais trabalho e melhorar a renda do benefício, pois é muito
baixa e não dá para fazer muita coisa, tenho 5 filhos dar de comer e vestir todo mundo, não é barato ”
Sujeito 18 (Três Barras): “mais oportunidade para trabalhar, na medida que as pessoas vejam que com
o trabalho dá para deixar de ser pobre e começarem a trabalhar e não ficar dependendo só de ajuda as
coisas melhoram. Vejo muita gente que mora perto da minha casa que fica esperando a ajuda cair do
céu, veja, tenho 4 filhas, meu marido foi embora... o que eu posso fazer, buscar trabalho para dar
coisas para elas e ensinar elas serem diferentes ou ficar em casa esperando ajuda igual a muita gente e
ensinar minhas filhas fazer a mesma coisa amanhã. ”
Ideia Central
Com mais oportunidade de trabalho, ficaria mais fácil sair desta condição.
75
Considerando que todos os integrantes do estudo, inseridos ou não no
mercado de trabalho, eram beneficiários do Programa Bolsa Família, a ques-
tão recaiu sobre o conhecimento dos entrevistados sobre os programas para o
enfrentamento da pobreza oferecidos por seu município. Pode-se observar
que 80,87% (N93) disseram conhecer a existência de programas de enfrenta-
mento a pobreza oferecidos em seu município e 19,13% (N22) assumiram não
conhecer programas oferecidos com esta finalidade, mesmo estando inseridos
e estarem sendo beneficiados pelo PBF.
Quadro 5 - Discurso do Sujeito Coletivo frente ao questionamento sobre a especificação das me-
lhorias vivenciadas a partir da inclusão no PBF
76
Qual melhoria foi percebida em sua condição de vida após a sua inclusão no PBF?
Expressões Chaves
Sujeito 16 (S Bento do Sul): “pude comprar mais coisas, não são muitas, mas já dá para oferecer
o mínimo para meus filhos, de vez em quando trabalho de faxineira e já entra um pouco mais de
dinheiro (R$ 50,00 dia), com isso atendo as necessidades da minha família”
Sujeito 29 (Mafra): “consegui melhorar algumas coisas em minha casa, comprei TV, uma cozi-
nha nova, fico muito feliz quando estou em casa e vejo que as coisas estão melhorando, bem
devagar, mais a 5 anos atrás eu morava de favor no quartinho de uma amiga, tinha uma pia e dois
colchões, hoje tenho até TV, sou muito feliz ”.
Sujeito 2 (Irineópolis): “consigo comprar as coisas, pouquinhas, mais não falta mais comida, o
restante as outras pessoas ajudam, com roupas que não usam mais, ou moveis que iam jogar fora,
é assim que eu vou conseguir as coisas. O bolsa família me ajuda com a comida necessária para a
sobrevivência, tomara que eu nunca perca. ”
Sujeito 18 (Três Barras): “como melhorei, não preciso mais dizer não para tudo para meus filhos,
me sinto mais importante quando vou no mercado e consigo comprar e pagar minhas compras,
sinto que não devo nada para ninguém, me sinto mais digna.”.
Ideia Central
O PBF ajuda muito, consegui comprar coisas para a casa, oferecer necessidades mínimas para
meus filhos, me sinto mais importante e capaz de me manter sozinha, sem ficar pedindo tudo.
77
caracteriza pela restrição da participação das pessoas em determinados gru-
pos sociais ou econômicos. Identifica-se que as pessoas beneficiadas podem
passar participar mais ativamente na sociedade em que vivem, quando em
discursos individuais entrevistados se manifestam dizendo que “hoje não
tenho vergonha de andar na rua, sempre te recebo aproveito para comprara
as coisas que estão faltando, e faço isso me sentindo importante, igual as ou-
tras pessoas” (SIC).
A partir do discurso dos sujeitos pesquisados para este estudo, quando
perguntados sobre o que é pobreza, do porquê existem pessoas nesta condi-
ção, quais fatores contribuíram para que a condição destas pessoas fosse esta,
de que forma o Estado contribui para a superação desta condição e, que me-
lhorias foram identificadas nas suas vidas a partir do momento em que foram
incluídos em programas sociais de erradicação à pobreza, objetivou-se o en-
tendimento de uma possível relação entre a pobreza dos sujeitos pesquisados
para o estudo e as condições de desenvolvimento da região na qual vivem.
O estudo foi desenvolvido no território do Planalto Norte Catarinense
que é constituído por 13 municípios. A seleção dos municípios envolvidos no
estudo considerou dois municípios com maior IDHM (São Bento do Sul e Ma-
fra) e dois municípios com o menor IDHM (Irineópolis e Três Barras).
A partir desta definição realizou-se uma pesquisa buscando caracterizar
a pobreza na região estudada. O Planalto Norte Catarinense é tido nas mensu-
rações estaduais como um território de concentração de pobreza. O quadro
abaixo apresenta os números encontrados relacionado com os quatro municí-
pios estudados.
São Bento do
Sul Mafra Três Barras Irineópolis
IDHM 0,76 0,73 0,70 0,69
População Municipal – 74.801 52.912 18.129 10.448
habitantes
Cad Único10 4.293 6.991 3.177 1.377
Pobreza Extrema 527 1.021 647 479
Programa Bolsa Família 1.126 1.643 1.047 685
Benefício Social de Pobre- 169 306 649 42
za Extrema (BSPE)
BPC – Idosos 251 157 30 25
BPB – Pessoas com Defici- 335 398 88 137
ência
78
Ao se observar os dados do quadro acima se constata que o município de
São Bento do Sul possui 1,5% da sua população como beneficiária do PBF, o
município de Mafra possui 3,10% da sua população na condição de beneficiá-
ria do PBF, o município de Três Barras possui 5,77% de sua população na
condição de beneficiária do PBF e o município de Irineópolis possui 6,55% de
sua população na condição de beneficiários do Programa Bolsa Família.
Estes dados permitem a relação do estudo com afirmativa de Amartya
Sen (2000) quando este escreve que a visão do que é ser pobre é influenciada
pela determinação do espaço em que esta pobreza é apreciada. É possível
verificar pelo quadro que os municípios de Irineópolis e Três Barras possuem
o menor IDHM do grupo estudado e consequentemente apresentam um maior
percentual de pessoas beneficiárias pelo Programa Bolsa Família.
Este fator nos remete ao pensamento de que quanto menor foi o IDHM
maior é a confirmação da existência da pobreza e da exclusão. Pois para se
analisar o nível de desenvolvimento é preciso considerar a relação de altos
índices de pobreza, as condições e as possibilidades de melhoria da sociedade.
79
mento nas dimensões sociais, econômicas, educacionais, culturais e também
políticas. Trata-se de acionar transformações societárias em que os atores
possam reconhecer-se, conjugarem-se, corresponsabilizarem-se e coparticipa-
rem do redirecionamento ético-político da classe trabalhadora.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
80
Apontando muitas vezes que existem muitas pessoas na mesma condição
que eles, ou até mesmo pior, pois quando não estavam inseridos em nenhum
programa de benefício social a pobreza se fazia bem mais evidente. Estes en-
trevistados assumem poder ajudar as outras pessoas em condição mais com-
prometida que a sua, pois hoje já estão menos pobres.
O sentimento de não ser mais pobre, ou estar em uma condição de po-
breza menor atualmente, justifica-se quando se analisa que as beneficiadas
com um programa e estarem participando de uma circulação comunitária e
social as faz entenderem-se como alguém que já venceu alguns obstáculos,
sentirem-se mais livres para fazer escolhas no contexto social. A compreensão
de pobreza e a autodefinição de pobreza nesta situação acaba por ser supera-
da pelo fato de que agora possuem um pouco mais de condição de atender
suas necessidades mínimas.
Verificou-se em fragmentos do discurso dos sujeitos participantes do es-
tudo que a sua condição acaba indiretamente refletindo no crescimento de sua
cidade (principalmente a partir de uma leitura de renda versus poder de com-
pra) e também a partir da percepção de condição de estudo versus oportuni-
dade de trabalho.
Desta forma conclui-se que os elementos identificados neste estudo re-
forçam a visão de que o desenvolvimento da região também está relacionado
com a sensação de liberdade de escolhas e de envolvimento social de seus
sujeitos, permitindo que as entrevistadas passem a e sentir-se ativos no pro-
cesso de crescimento pessoal e crescimento de sua região. A ausência de en-
tendimento sobre o seu crescimento pessoal impede a leitura de crescimento
de região.
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83
O TURISMO NO TERRITÓRIO DO
CONTESTADO: POTENCIALIDADES
PAUTADAS EM ASPECTOS HISTÓRICOS E
POLÍTICAS PÚBLICAS
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
85
fomentar o desenvolvimento sustentável e, assim, amenizar os impactos de-
correntes deste processo histórico.
Dentre as possíveis estratégias de desenvolvimento, advém o turismo
pautado na herança imaterial do Contestado. Com este propósito, cabe exami-
nar, a priori, o papel do Estado no estabelecimento de políticas públicas que
permitam viabilizar, de fato, o turismo.
Dada a relevância, incumbe ao poder público intervir e regulamentar a
atuação da iniciativa privada. Assim, torna-se imprescindível analisar a evolu-
ção das relações entre o poder público e o turismo, além das competências
que lhe são inerentes, a fim de promover a efetiva implementação da atividade
turística.
4 O termo “coronel” vem da extinta guarda nacional imperial, que lutou nas guerras do Prata, do
Uruguai e do Paraguai, entre os anos de 1851 a 1870, convertendo-se em termo meramente decorativo
após as mencionadas guerras e abolido na Primeira República. No Império, cada município possuía um
regimento da guarda nacional, o posto de “coronel” era concedido ou vendido ao chefe político deste
município, que normalmente era o mais rico comerciante, industrial ou fazendeiro (MACHADO, 2004,
p. 93).
86
mesmo poderia gerar, mas, também, do contingente de agregados que residi-
am no entorno da propriedade, representados pelos peões, homens de confi-
ança e pelos fazendeiros de menor expressão, posseiros e lavradores dos ar-
redores, que ofereciam apoio e lealdade ao coronel. Essa capacidade de dispor
de significado contingente de homens, proporcionava ao coronel a possibili-
dade de exercer funções de polícia, acentuando ainda mais seu domínio.
Todavia, com o advento da República, ocorreu o fortalecimento do poder
político local, exercido pelos mandatários legitimamente eleitos, implicando
na gradativa decadência da influência política dos coronéis.
Neste território, um recurso altamente relevante para a população pobre,
em grande medida constituída por caboclos, consistia na extração da erva-
mate, que proporcionava, ao menos, a subsistência daquelas pessoas.
Entretanto, a partir da vigência da lei nº 601, de 18 de setembro de 1850,
sancionada por Dom Pedro II, conhecida como a “Lei de Terras”, houve uma
transformação gradual na relação entre os coronéis e a população cabocla. A
Lei de Terras, na tentativa de organizar a propriedade privada no Brasil, aca-
bou por privilegiar os grandes fazendeiros e proprietários de latifúndios, pois,
com a legitimação da propriedade, as maiores e melhores áreas que haviam
sido obtidas através da posse, permaneceram sob controle dos grandes fazen-
deiros. Estes, com o decorrer do tempo, passaram a proibir o acesso dos cabo-
clos aos ervais nativos de suas propriedades, restringindo-os de recursos an-
teriormente disponíveis. Esta conjuntura acentuou o processo de exclusão da
população pobre.
Não obstante a atuação dos coronéis, o advento e a inserção do capital es-
trangeiro, a partir da primeira década do século XX, contribuiu decisivamente
para concentração da propriedade privada, e, por conseguinte, para o agra-
vamento da tensão social.
O governo brasileiro, com o objetivo de construir uma ferrovia que inter-
ligasse os estados do sul do Brasil, assinou um contrato com a Brazil Railway
Company, companhia responsável pela construção da rede ferroviária, tendo
como pontos de partida e de chegada as cidades de Itararé em São Paulo e de
Santa Maria, no Rio Grande do Sul. No ano 1910, foi concluída a construção do
trecho que atravessava o território catarinense, num total de trezentos e oi-
tenta quilômetros, entre a cidade de União da Vitória, no Paraná, e Marcelino
Ramos, no Rio Grande do Sul, às margens do rio Uruguai.
Entrementes, o contrato para construção da ferrovia estabelecia que a
companhia responsável pela empreitada – a Brazil Railway Company – teria o
direito de explorar as terras adjacentes à linha tronco, numa extensão de até
quinze quilômetros do leito da linha férrea. Essas terras eram cobertas por
milhões de pinheiros ou araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriú-
vas. Objetivando extrair e comercializar essa madeira de alto valor econômico
e, mais tarde, vender parte daquelas terras a imigrantes europeus, a Brazil
Railway Company constituiu uma subsidiária, a Southern Brazil Lumber and
87
Colonization Company. Em 1910, a Lumber instalou, em Três Barras, então
território paranaense contestado por Santa Catarina, uma moderna serraria. A
empresa instituiu um processo industrial altamente mecanizado, tornando-se
a maior madeireira em atividade na América do Sul (CARVALHO, 2010).
Com o avanço de suas atividades, a Southern Brazil Lumber and Coloniza-
tion Company instaurou um incisivo processo de expansão fundiária, em mui-
tos casos utilizando-se de seu corpo de segurança (contingente de homens
armados) para obter as terras almejadas. Além disso, o processo fabril, inicia-
do nas densas matas, através do arraste das árvores tombadas por guinchos,
dentre as quais pinheiros araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriú-
vas, destruía toda a vegetação existente no percurso, ou seja, árvores menores,
espécies economicamente menos interessantes e também grandes quantida-
des de árvores de erva-mate, cuja extração, como já relatado, consistia em
recurso preponderante para a sobrevivência da população pobre que habitava
a região.
Depreende-se, portanto, que naquele contexto histórico, caracterizado
pelo controle da terra exercido pelos grandes proprietários de latifúndios, ou
seja, os coronéis, e, concomitantemente, pelo capital estrangeiro, representa-
do pela Brazil Railway Company e sua subsidiária, a Southern Brazil Lumber
and Colonization Company, a situação da população cabocla, formada por pe-
quenos posseiros e sitiantes, tornara-se insustentável, dada a privatização da
terra e a proibição de explorar a erva-mate. Assim, esse processo de exclusão
e marginalização contribuiu decisivamente para a adesão dos caboclos aos
redutos e influenciou peremptoriamente a deflagração do movimento sertane-
jo do Contestado (1912-1916), comumente denominado Guerra do Contesta-
do.
Embora a disputa entre os estados do Paraná e de Santa Catarina – a
Questão de Limites – tenha assumido, durante muito tempo, a condição de
causa principal para a eclosão da Guerra do Contestado, o avanço das pesqui-
sas explicitou uma diversidade de motivações e de objetivos, conforme a regi-
ão da zona contestada e dos setores sociais que aderiram ao movimento. Ma-
chado assim sintetiza:
88
Ao analisar as motivações dos integrantes do movimento sertanejo do
Contestado, podemos atribuir ao mesmo um caráter de conflito social, no qual
os alvos dos rebeldes revoltosos demonstraram a racionalidade intrínseca do
movimento: o capital estrangeiro; o domínio político e fundiário dos coronéis;
a exclusão da população nacional em detrimento do assentamento de estran-
geiros; a injustiças praticadas por aqueles que ocupavam cargos nos governos
das esferas estadual e federal.
5 Atualmente, os estabelecimentos com menos de 50 hectares constituem 82,7% da área ocupada por
propriedades rurais, contudo, essas propriedades ocupam somente 28,6% da área total. Por outro lado,
aqueles estabelecimentos agropecuários com mais de 500 hectares representam apenas 1,2% da área
ocupada por propriedades rurais, mas ocupam 32,2% da área territorial, praticamente um terço da área
total (SOUZA, 2009).
89
rio. A disseminação dos reflorestamentos, privilegiando esta monocultura,
reduz as áreas que poderiam ser utilizadas para diversificação produtiva.
Cabe destacar, também, que sobreveio a intensificação da exploração
comercial da erva-mate, pelas médias e grandes ervateiras que dominam o
setor, restringindo o acesso a elemento historicamente fundamental para
subsistência dos setores socialmente mais fragilizados. Esse domínio desesti-
mula a busca, por exemplo, pela agregação de valor à erva-mate, matéria-
prima de altíssima qualidade produzida na região.
De todo o exposto anteriormente, é razoável delimitar três fatores vigen-
tes no Território do Contestado que geram entraves à implementação de es-
tratégias de desenvolvimento territorial sustentável: o trauma associado ao
conflito social e ao genocídio praticado contra os caboclos, impondo, à popula-
ção que reside naquele território, sentimentos de vergonha e consequente
silenciamento; a expansão fundiária, outrora já vivenciada, que promove a
concentração da propriedade da terra, sob controle de grandes proprietários
rurais e de empresas multinacionais; a perpetuação do modelo econômico
baseado primordialmente no extrativismo.
Em meados da segunda década do século XXI, o contexto atual caracteri-
za-se, no Território do Contestado, pela concentração exacerbada da riqueza
por grupos minoritários, que assim o fazem há gerações; a precarização das
condições de vida dos trabalhadores urbanos e rurais; os empecilhos à organi-
zação e atuação política da população empobrecida do Território do Contesta-
do; a degradação do patrimônio material e imaterial, particularmente aquele
associado à memória das populações tradicionais e de seus remanescentes,
bem como dos segmentos empobrecidos da região; o processo de concentra-
ção da propriedade da terra por companhias madeireiras e do setor de celulo-
se, algumas estrangeiras, que monopolizam o acesso à terra – tal qual ocorreu
no passado – e disseminam espécies vegetais exóticas, desestimulando a con-
tinuidade das atividades na pequena propriedade, ignorando os limites dos
recursos ambientais e socializando detritos danosos ao meio ambiente, resul-
tantes de sua produção industrial; a continuidade do processo centenário de
exclusão e marginalização das populações tradicionais – indígenas, grupos
afrodescendentes (caso dos quilombolas), sertanejos, caboclos, além dos des-
cendentes daqueles que estiveram nos redutos da Guerra do Contestado – que
agora incide sobre seus remanescentes, grupos estes que permanecem impe-
didos de acessar a fração justa da riqueza produzida no território, em grande
medida, pelos próprios braços.
Ademais, ressaltam-se as dificuldades para superação do modelo econô-
mico vigente, amparado em produtos primários, os quais não necessitam de
beneficiamento, reduzindo o valor agregado e desestimulando o crescimento
econômico. Uma consequência diretamente observável, decorrente da conti-
nuidade desse modelo, virtualmente esgotado, consiste na proliferação dos
problemas sociais que afligem o Território do Contestado, o qual, embora
90
integre um dos estados mais desenvolvidos da federação, destaca-se pelos
índices decepcionantes de desigualdade social.
Conquanto o crescimento econômico e a expansão dos programas sociais
permitirem amenizar desigualdades históricas da sociedade brasileira, os
municípios que integram o Território do Contestado apresentam, hodierna-
mente, alguns dos mais baixos índices de desenvolvimento humano do estado
de Santa Catarina (IBGE, 2010), de acordo com sua classificação no IDHM
(Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios), compondo um bolsão
de pobreza e exclusão, precipuamente nas áreas onde a luta sertaneja foi mais
intensa.
É preciso salientar que, países ou territórios, caracterizados pela vigência
de uma matriz produtiva baseada no extrativismo, apresentam carências no
setor exportador, impossibilitando a obtenção de excedentes em divisas, vi-
sando a execução de investimentos em infraestrutura e nos setores básicos da
sociedade. No território do Contestado, manifestam-se essas carências. Suas
exportações resultam de produtos primários da agricultura e das atividades
das indústrias extrativistas, mormente a silvicultura direcionada à produção
de celulose. Todavia, nesses setores – vinculados à produção de commodities
– os preços são controlados pelos países dominantes ou por grandes corpora-
ções. Por conseguinte, dada a exploração maciça dos recursos naturais, eleva-
se a concentração fundiária e se produz acentuado impacto ambiental, especi-
almente a degradação do solo e dos mananciais, gerando, em contrapartida,
retorno econômico desproporcional à sociedade do entorno.
Destas questões, suscita a problemática que este projeto visa examinar: É
possível contribuir para a construção de um processo de desenvolvimento
territorial em bases alternativas, mediante proposta que considere a identida-
de territorial e os recursos materiais e imateriais do território, contrapondo-
se às práticas que ainda se manifestam entre as políticas públicas e empreen-
dimentos econômicos, que impedem a superação de um modelo que promove
a dilapidação dos recursos ambientais, além da concentração da riqueza e
perpetuação da miséria e exclusão social?.
Conforme será analisado neste artigo, especificamente no Território do
Contestado, uma estratégia altamente promissora consiste na revitalização do
turismo.
91
pode permanecer alheio ou indiferente à atividade turística, deve-se definir as
condições e delimitar o espaço de implementação.
Incumbe ao setor público promover a expansão e a captação de correntes
turísticas; a adequação e regulamentação normativa do funcionamento das
empresas; o estímulo e facilidade ao desenvolvimento da oferta turística, me-
diante determinadas planificações, bem como mediante a disponibilização de
canais creditícios apropriados, e o estabelecimento de estímulos fiscais. Tam-
bém corresponde ao setor público ditar normas visando regular a exploração
dos valores e atrativos existentes. Neste contexto, cabe destacar a relevância
do tratamento adequado da ordenação urbanística, a defesa da paisagem e a
criação de infraestrutura, tanto de acesso e comunicação, como de serviços
urbanos. SEDETUR/RS. Turismo estratégia gaúcha. (1998, p. 18).
O poder público, atuando dentro de sua esfera, pode manter uma postura
de subsídio e de complementação às ações desenvolvidas pelo setor privado,
no que concerne a atividade turística. Justifica-se sua presença em decorrência
dos seguintes fatores:
92
Segundo Sessa (1968), após a Segunda Guerra Mundial, independente-
mente do sistema político adotado pelas nações, verificou-se uma intervenção
cada vez mais acentuada dos governos nos vários setores de atividades das
nações. O turismo, com todos os efeitos que suscita no campo cultural, social,
político, de balanço de pagamento, não poderia ser exceção. Assim, o poder
público poderá adotar duas atitudes perante a realidade turística:
1ª atitude contrária: Um país ou uma região pode encontrar-se num con-
texto desfavorável, de tal modo que o desenvolvimento da atividade turística
torna-se inviável naquela conjuntura. Isto é, o país ou a região pode não pre-
encher os pré-requisitos da viabilidade turística. Nesse caso, suscitam dificul-
dades em incorporar o turismo como uma atividade a mais na administração
municipal, estadual ou nacional. Poderá acontecer, também, que a nação pre-
encha todos os pré-requisitos da viabilidade turística, porém o poder público
não considera o desenvolvimento dessa atividade em detrimento de outras
mais importantes. A atitude contrária do poder público também pode estar
relacionada aos seus efeitos predatórios. De fato, o turismo tem ocasionado a
devastação de paisagens, usos e costumes. Os exemplos que podem confirmar
tal afirmativa são inúmeros.
Além disso, tem-se verificado que algumas sociedades mais fechadas re-
sistem em aderir a este fenômeno de massa, contudo, outros segmentos tem
se posicionado negativamente em relação ao turismo. Ultimamente, observa-
se que países que já estiveram no topo do ranking internacional estão redu-
zindo o seu desenvolvimento turístico, dados os aspectos predatórios que o
mesmo envolve. É preciso salientar que a decisão desses países deve servir de
alerta às nações que estão projetando na atividade turística possibilidades de
contribuição para suas estratégias de desenvolvimento. Tais países ao consta-
tarem sua viabilidade turística, ao verificarem que preenchem os pré-
requisitos exigidos, se lançam à conquista dos mercados, no intuito de equili-
brar as suas contas através do ingresso de divisas. Nesse contexto a palavra
“divisas” assume importância e urgência para países, povos e comunidades.
Se, por um lado, países que assim se comportaram foram recompensados
através do incremento significativo de divisas, as consequências, em termos
ecológicos e culturais, foram incalculáveis. Apresenta-se algo complexo a um
morador nativo sentir-se estrangeiro em seu próprio país, constatar seus usos
e costumes sacrificados na ânsia da arrecadação de divisas. Diante das consi-
derações anteriores, dois aspectos podem ser analisados: a) Um país que pro-
jeta possibilidades através da intensificação da atividade turística. O seu de-
senvolvimento através do turismo deve estar devidamente preparado para o
impacto que ele proporciona; b) Os recursos turísticos que atraem os turistas
aos centros receptores são, com o passar do tempo, deteriorados. Nesse caso,
tanto o turista quanto o nativo são prejudicados, pois, o turista perde o incen-
tivo, senão o interesse, em se deslocar a polos turísticos descaracterizados; o
nativo, por sua vez, perde o visitante que consistia em sua fonte de renda.
93
Sobre tais pressupostos, é preciso definir uma política de turismo que em
fase inicial eduque ou instrumentalize o seu povo para a prática do turismo. Se
isso for levado a termo, talvez poder-se-á transitar de uma atitude contrária a
outra favorável ao desenvolvimento do turismo, em que todas as partes en-
volvidas sejam beneficiadas.
2ª atitude favorável: O poder público incorpora a atividade turística em
sua estratégia de desenvolvimento. Cada país ou região atribui ao turismo
uma determinada importância, que repercutirá em sua política econômica. É a
partir destas perspectivas que o turismo poderá se organizar e se estruturar.
Segundo Tocqueville (2004), não é verdade dizer que os homens que vi-
vem na era democrática sejam naturalmente indiferentes às ciências, às letras
e às artes, cumpre somente reconhecer que eles a cultivam à sua maneira, e
introduzem nesse âmbito as qualidades e os defeitos que lhe são próprios.
Afirma, também, que na América, a paixão pelo bem estar material nem
sempre é exclusiva, porém é generalizada; nem todos a experimentam da
mesma maneira, contudo todos a sentem. A preocupação em satisfazer as
menores necessidades do corpo e de prover as pequenas comodidades da
vida, assume importância universal aos espíritos.
Nos povos democráticos, os indivíduos são muito fracos, mas o estado
que os representa e os mantém em seus domínios, é muito forte. Em nenhum
outro lugar os cidadãos parecem menores do que numa nação democrática.
Em nenhum outro lugar a própria nação se parece maior e seu espírito reper-
cute com facilidade em um vasto quadro. Nas sociedades democráticas, a ima-
ginação dos homens se reduz quando eles pensam em si mesmos; ela se es-
tende indefinidamente quando pensam no estado. Decorre desse fato que os
mesmos homens que vivem pequenamente em casas apertadas, com frequên-
cia, visam ao gigantesco quando se trata de monumentos públicos (TOCQUE-
VILLE, 2004).
Os americanos estabeleceram o local em que desejavam constituir sua
capital: o ressinto de uma cidade imensa, que, ainda hoje, não é mais povoada
do que Pontoise, mas que, segundo eles, deve conter um milhão de habitantes;
já arrancaram as árvores num raio de dez léguas com medo de que viessem a
incomodar os futuros cidadãos dessa metrópole imaginária. Ergueram no
centro da cidade um palácio magnífico, para servir de sede ao congresso e lhe
deram o pomposo nome de Capitólio.
A questão do turismo é uma das temáticas de maior interesse nos últimos
tempos. Fala-se muito em turista e constituem-se entes públicos em governos
municipais, estaduais, nacionais para se ocuparem dessa atividade. Porém, o
que se verifica é que, apesar dos entes públicos serem constituídos, a ativida-
de do turismo não se apresenta em toda sua intensidade nas políticas econô-
micas do governo. Esses entes ou organismos públicos, relegados a uma con-
dição secundária no interior da política econômica, estão fadados a inoperân-
cia e a ineficácia, sobretudo no caso específico do turismo, atividade que exige
94
ação. O poder público adotará uma atitude proativa face ao turismo a partir do
momento em que atribuir a essa atividade prioridade em sua política econô-
mica.
Adotar uma política propositiva em relação ao turismo significa acompa-
nhar a situação conjuntural, executando medidas ágeis e adequadas. A capaci-
dade de resposta do setor público às exigências impostas pelo turismo, em um
dado momento, deve ser quase imediata, pois as decisões devem gerar ações
efetivas.
95
incapazes de resolvê-lo. Caso haja a necessidade de intervenção do poder
público, esta deve se extinguir a partir do momento que determinado grupo
ou individuo possam alcançar soluções adequadas, independente da ação do
Estado. Portanto, a intervenção é de caráter transitório. Isso porque não cabe
ao Estado assumir a condição de empresário, a não ser nos casos específicos
em que a iniciativa privada não encontre estímulos para agir, ou, por questões
de interesse nacional. Assim, o princípio da subsidiariedade demonstra os
limites da intervenção do estado no desempenho das atividades humanas,
fornecendo limitações à condução desse intervencionismo.
No que concerne à atividade turística, segue-se o mesmo raciocínio. De-
ve-se, contudo, ressaltar que o princípio da subsidiariedade pode explicar os
limites do intervencionismo em países que apresentam economias liberais, ou
capitalistas. Porém, este não é o caso dos países socialistas, onde o estado
assume todas as iniciativas, cabendo a ele planejar, executar e administrar os
diversos programas, entre os quais, o turismo. Caracterizado e definido o in-
tervencionismo do poder público na atividade turística, cabe analisar a ques-
tão das competências.
COMPETÊNCIAS
96
tivo estadual, isso significa que esta atividade possui um status equivalente ao
mais alto nível hierárquico na esfera da administração pública.
É importante ressaltar que a determinação do grau hierárquico do orga-
nismo incumbido da atividade turística, é diretamente proporcional à sua
importância dentro do contexto das demais atividades. Assim, para equacio-
nar a pulverização das atividades turísticas nos diferentes segmentos, inde-
pendentemente das atribuições e responsabilidades, é necessário cooperação
entre as diversas instâncias. As atividades se inter-relacionam e para que o
estado, através de seu governo, possa obter harmonia e conduzir suas ações
com eficiência e eficácia, faz-se necessário desenvolver uma mentalidade, bem
como fomentar o espírito de cooperação entre os organismos de um país,
estado ou município.
Em decorrência deste espírito de cooperação, resultam ações integradas,
fundamentais para se atingir a maximização dos esforços e dos recursos fi-
nanceiros. Na teoria, essas ideias encontram um campo fértil para a discussão,
contudo, na prática, torna-se difícil viabilizar o espírito de cooperação e as
ações integradas, haja vista que existem muitos interesses e ambições pesso-
ais que se colocam acima dos interesses dos próprios organismos. Essa distor-
ção tem causado entraves e estrangulamentos ao pleno e eficiente curso das
atividades de um país. No que se refere ao turismo, existe um certo agravante,
pois geralmente se apresenta subordinado a outro organismo. Assim enqua-
drado administrativamente, o setor turístico geralmente não recebe a devida
atenção. Além disso, a esses organismos frequentemente são designados pro-
fissionais que não possuem a devida qualificação técnica. . Nesse cenário, a
condução política da administração do tempo livre sofre uma dupla crise,
devido aos seguintes aspectos: a) A centralização teórica do poder num orga-
nismo sem, contudo, exercê-lo, porque esse poder repetidas vezes é comparti-
lhado com os outros organismos pressupostamente mais poderosos; b) O
suposto incremento na eficiência, que resultaria da descentralização do poder
em delegacias regionais, encarregadas de aplicar as políticas e ações voltadas
ao turismo, é inviabilizada pela ausência de respaldo legal e de recursos finan-
ceiros e humanos, além do escasso apoio dos comitês de coordenação inter-
departamentais, devido a sua pouca operacionalidade (BOULLIÓN, 2009).
A intervenção do poder público em matéria do turismo pode advir de di-
versas motivações:
(i) Políticas: Para um determinado país, a valorização dos seus recursos
naturais, históricos, culturais e artísticos, pode se constituir em prestígio. Na
verdade, o turismo é um dos meios mais eficazes para tornar conhecidos to-
dos esses valores. Outra causa que justifica a intervenção do poder público, diz
respeito à atuação desordenada das empresas de turismo, inclusive podendo
afetar as relações internacionais entre os países. Daí a necessidade de fiscali-
zar a atuação dessas empresas, através de legislação específica emanada dos
poderes públicos, visando assegurar aos turistas as garantias almejadas.
97
(ii) Econômicas: Relativas à renda nacional, às oportunidades de empre-
go e aos seus efeitos multiplicadores. O turismo tem se constituído em ele-
mento propulsor do desenvolvimento e do crescimento econômico de alguns
países e regiões, contribuindo com elevados percentuais na receita nacional
bruta. É inegável sua contribuição, e na redistribuição de todos esses benefí-
cios, o poder público não poderia se omitir.
(iii) Sociais: A prática do turismo atinge os mais variados segmentos da
sociedade. O poder público, que deve zelar pelo bem estar de todos esses ci-
dadãos, não pode permanecer alheio a todos os anseios e às necessidades
decorrentes desta atividade.
(iv) Meios de ação: A intervenção do poder público na área do turismo
ocorre de variadas formas. Todo o conjunto de leis, decretos, resoluções, visa
proporcionar o ordenamento da atividade turística. É precisamente essa base
legal que torna possível o ordenamento turístico.
A atuação do poder público deve direcionar a ação da livre iniciativa, no
sentido de resguardar o bem público ou os interesses majoritários da socieda-
de. O objetivo do lucro, que caracteriza a iniciativa privada, ofusca, por vezes,
a sua função pública. O poder público também possui a capacidade de deses-
timular a iniciativa privada, mediante instrumentos legais que negligenciem a
essência da atividade. O turismo, como uma atividade dinâmica, precisa cons-
tantemente ser analisado e ordenado. Desse fato decorre constante reformu-
lação de todo o aparato legal. Alguns países, onde a atividade turística encon-
tra-se mais desenvolvida, apresentam verdadeiros tratados sobre o direito
aplicado ao turismo.
Ao analisar o fenômeno turístico, enfocam-se os aspectos econômicos,
sociais, ecológicos e jurídicos. Sem adentrar nas minúcias que uma análise
abrangente requereria, o turismo é uma atividade condicionada aos instru-
mentos legais emanados dos poderes públicos. Justifica-se a partir do pressu-
posto que o direito de locomoção está ligado a liberdade da pessoa humana.
Ao examinar a legislação dos mais diferentes países, encontra-se em toda a
prerrogativa de salvaguardar o direito de locomoção dos seus cidadãos. O
turismo é uma forma de exercitar essa liberdade.
98
parado na herança imaterial do Contestado; (ii) o turismo decorrente dos
ativos naturais inseridos no território.
O potencial endógeno do Território do Contestado, em velar pela história
de um movimento social consiste em recurso que admite sua utilização para
finalidades turísticas. Neste contexto, o turismo histórico pode abranger a
herança imaterial decorrente da religiosidade; dos episódios épicos da Guerra
do Contestado trespassados por conflitos bélicos, incluindo-se, neste caso, a
visitação aos locais históricos em que ocorreram os combates e, inclusive, a
representação artística das batalhas mediante personagens figurados entre
soldados e revoltosos; passeios de trem mediante revitalização de trechos da
linha férrea construída pelo capital estrangeiro no início do século XIX e que
constituiu fator preponderante a para eclosão da Guerra do Contestado; visi-
tação aos museus que salvaguardam os registros históricos da Guerra do Con-
testado; práticas e costumes seculares inerentes à cultura e à culinária. Cada
aspecto pode ampliar uma gama variada de opções, por exemplo, no que tange
à religiosidade, há muitos locais em que se atribui milagres ao monge São João
Maria, até hoje considerados verdadeiros santuários, que merecem a visitação,
seja pela fé religiosa, seja pela beleza inegável da natureza.
Ao contrário dos aspectos singulares propiciados pelo turismo histórico
com amparo na herança imaterial, que fornecem atributos exclusivos e o dife-
renciam de outros polos turísticos existentes fora do território, o turismo
decorrente dos ativos naturais inseridos no Território do Contestado poderá
abranger, principalmente, o turismo rural, cujas principais atrações são a na-
tureza e a culinária
Cabe destacar que ambas as opções exigem investimentos adequados pa-
ra viabilização. No que tange ao turismo histórico pautado na herança imate-
rial, o investimento primário consiste na educação, mediante disseminação da
história do Contestado dentre os habitantes do território. Esse é um processo
sinérgico, aonde o conhecimento assume papel preponderante e pode resultar
no incremento do interesse pelo turismo histórico.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
99
tos históricos que moldaram o Contestado. Diante de tal realidade, o instru-
mento fundamental para alterar este estado de coisas é a educação, mediante
a disseminação do conhecimento amparado em pesquisas recentes, que de-
monstram a nobreza de valores assumidos pelos revoltosos que aderiram às
trincheiras durante a Guerra do Contestado.
A educação e a disseminação do conhecimento poderão, paulatinamente,
contribuir para a obliteração deste sentimento pejorativo e, por sua vez, o
turismo também possui enorme potencial para auxiliar a suprimir as errôneas
concepções arraigadas na consciência coletiva da população residente no Ter-
ritório do Contestado.
Além deste nobre atributo, o turismo também representa uma atividade
que pode propiciar alternativas de desenvolvimento sustentável do território.
Cabe ressaltar que a articulação entre turismo e desenvolvimento produz
resultados positivos, tais como aporte de recursos para investimentos, mu-
dança dos padrões de comportamento, estímulo ao processo de cosmopoliti-
zação, etc. Contudo, o sucesso desta empreitada e a obtenção de suas conse-
quências benéficas, dependem primordialmente de planejamento e, em última
instância, da política que será aplicada ao setor.
Ademais, as características específicas da atividade turística – o fato de se
amparar em relações pessoais, exigir o consumo no espaço local, possibilitar
sua vinculação a outros setores da economia, etc., a tornam especialmente
apta para induzir processos de desenvolvimento em determinados territórios,
particularmente aqueles historicamente alijados, que apresentam contingen-
tes populacionais ainda excluídos do acesso aos benefícios da sociedade mo-
derna.
A elaboração do planejamento demanda o envolvimento do Estado, o
qual, através de políticas públicas, viabilizadas por meio de instrumentos pre-
cisos, deve almejar objetivos voltados ao desenvolvimento e, ao mesmo tem-
po, evitar consequências perniciosas que poderão eventualmente sobrevir.
Dentre as ações efetivas, destaca-se a importância do incentivo à constituição
de empresas oriundas do próprio território, dentre as quais, aquelas compro-
metidas com a atividade turística.
A intervenção do setor público na atividade turística pode ser necessária,
porém não deve se restringir a uma simples função reguladora ou fiscalizado-
ra da atividade. Apesar da progressiva implantação da filosofia liberal, verifi-
cada nos últimos anos, em que o setor privado assume a condição de protago-
nista, cabe ao setor público estabelecer as condições adequadas para que as
pequenas empresas turísticas possam desenvolver com eficácia suas ativida-
des econômicas.
O desenvolvimento turístico ocorre em consequência de uma política de
planejamento meticulosa, baseada na atividade econômica e no desenvolvi-
mento humano e social de comunidades e povos. Deve estruturar-se sobre
ideais e princípios de bem estar e de felicidade das pessoas. Os problemas
100
sociais de uma comunidade não poderão ser solucionados na ausência de uma
economia forte e, o turismo, pode contribuir para alcançar este objetivo.
O turismo desenvolvido através da integração entre a sociedade civil e o
interesse público, ultrapassa conceitos de gestão pública e pode assegurar
maior flexibilidade e distribuição equitativa de lucros, que eventualmente
possa gerar em determinada localidade.
As questões da regionalização, sob a concepção de que regional não se
restringe a limites físicos ou geográficos, tampouco ao caráter político admi-
nistrativo, corresponde, acima de tudo, às afinidades e consequente constru-
ção de identidades culturais.
O poder público pode e deve cumprir seu papel no desenvolvimento do
turismo, conscientizando as populações das ações executadas e as sensibili-
zando em todos os aspectos relevantes, pois a atividade turística só pode ser
desenvolvida de maneira sustentável – econômica e ambientalmente – caso
resulte em benefícios para a localidade.
No âmbito do Território do Contestado, há potencialidades que podem
ser exploradas em prol da atividade turística. O principal fator se relaciona à
herança imaterial do Contestado, que se traduz em aspectos históricos, religi-
osos e culturais, capaz de propiciar atrações turísticas de interesse regional
ou, inclusive, nacional. Além da singularidade inerente à herança imaterial do
Contestado, os ativos naturais do território também possuem potencial para
se transformarem em atrações de interesse turístico, desde que ocorram in-
vestimentos adequados em sua estruturação e promoção.
REFERÊNCIAS
101
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TOMPOROSKI, A. A. “O pessoal da Lumber!” Um estudo acerca dos trabalhadores da
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tado (1912-1916). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.
102
SIGNOS DISTINTIVOS TERRITORIAIS:
INDICAÇÃO GEOGRÁFICA, MARCAS
COLETIVAS E SUA RELAÇÃO COM O
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
Karine Rohrbacher1
Cilmara Corrêa de Lima Fante2
Valdir Roque Dallabrida3
RESUMO
INTRODUÇÃO
103
esperada pelo consumidor. O instituto da Indicação Geográfica (IG) e Marcas
Coletivas (MC), além de proteger os produtos e serviços, conferem informa-
ções referentes à origem e qualidades dos mesmos. O resultado esperado é
que tal processo contribua na agregação de valor ao produto ou serviço prote-
gido, gerando um ganho para a coletividade envolvida, com isso, contribuindo
no desenvolvimento territorial do local em que se inserem.
O presente artigo pretende analisar os temas signos distintivos territori-
ais, com destaque para a Indicação Geográfica e Marcas Coletivas, focando-se
em questões de ordem legal, estabelecendo relações com o desenvolvimento
territorial, evidenciando os aspectos relevantes para a proteção e obtenção
dos direitos inerentes a esses institutos.
A pesquisa é explicativa, pois se preocupa em identificar os fatores que
contribuem para a ocorrência de certos fenômenos, como por exemplo, qual a
importância dos signos distintivos, como as IG e MC, no desenvolvimento ter-
ritorial. Utiliza-se de estudos bibliográficos.
Como resultado, buscou-se situar o tema signos distintivos territoriais e
os institutos da Indicação Geográfica e Marcas Coletivas no direito internacio-
nal e brasileiro. Oportunizou identificar os diferenciais entre estes institutos,
além de fazer prospecções sobre a contribuição dos signos distintivos no de-
senvolvimento territorial.
Assim, o presente texto, além desta introdução, é composto por outras
quatro partes. Assim, inicialmente, (i) dá-se destaque aos conceitos de territó-
rio, signos distintivos e desenvolvimento territorial, (ii) resume-se os princi-
pais aspectos conceituais e legais sobre Indicação Geográfica e Marcas Coleti-
vas, (iii) destacam-se os diferenciais entre esses dois institutos, além de, fi-
nalmente, (iv) serem feitas considerações finais.
104
que não se restringem aos atributos naturais, mas levam em conta também
raízes históricas, políticas e identidades (ABRAMOVAY, 2010).
Saquet (2015) associa-se a outros autores que consideram o território
uma construção social, histórica, relacional, sempre vinculada a processos de
apropriação do espaço, que atingem pessoas ou grupos sociais. Portanto, para
o autor,
105
reconhecimento de um produto ou serviço na forma de signo distintivo terri-
torial, tem maior potencial para contribuir no desenvolvimento territorial.
Sobre desenvolvimento, assumimos aqui a concepção expressa em Dalla-
brida (2015, p. 235):
habitam determinado território, que, ao mesmo tempo as identificam e servem como potencialidades no
processo de planejamento do futuro desejado, o projeto político de desenvolvimento territorial.
106
Brasil se dividem em duas espécies: Indicação de Procedência (IP) e Denomi-
nação de Origem (DO). Essa divisão permite distinguir os produtos ou serviços
que recebem uma indicação ligada somente a sua procedência, que designa o
lugar onde acontece a fabricação ou prestação de um serviço, daqueles produ-
tos ou serviços que também apresentam características específicas, incluindo
fatores naturais e humanos.
O artigo 177 da Lei 9.279/96 (BRASIL, 1996), bem como o artigo 2º, §1º
da Instrução Normativa nº 25/2013 (BRASIL, 2013) estabelecem o que consti-
tui a IP ou DO. A IP remete a um produto ou serviço, indicando o local onde
são produzidos ou prestados, independentemente de outros fatores, ou seja,
não precisando necessariamente que as condições geográficas interfiram. Ou
seja, a IP denota uma localidade que se tornou conhecida pela produção de um
determinado produto ou serviço, que associado à sua procedência acaba lhe
agregando valor. Já a DO indica ser o nome geográfico do país ou região que
designe um produto ou um serviço, cujas qualidades específicas estejam rela-
cionadas ao meio geográfico, incluindo os fatores naturais e humanos.
A DO possui um diferencial em relação à IP, por trazer maior complexi-
dade, uma vez que um produto ou serviço necessita apresentar certos requisi-
tos para possuir tal classificação, envolvendo os fatores geográficos, naturais e
humanos. Ou seja, é necessário que o meio geográfico em que acontece a pro-
dução ou prestação de serviços seja responsável pelas características específi-
cas, não sendo obrigatório que exista notoriedade do local. Já a IP se relaciona
com o aspecto de notoriedade, o qual contribui para a reputação e reconheci-
mento de um local devido às qualidades dos produtos fabricados, que serão
reconhecidos pelos consumidores.
Pimentel (2013), simplifica, explicando que a IP compreende a IG que te-
nha se tornado conhecida como centro da fama de um determinado produto e
a DO designa o próprio produto. Igualmente, a proteção estender-se-á à repre-
sentação gráfica ou figurativa da IG, bem como, à representação geográfica de
país, cidade, região ou localidade de seu território, cujo nome seja IG. Em ou-
tras palavras, na DO não basta que o produto tenha se tornado conhecido
pelas pessoas como de determinado local; é imprescindível que suas caracte-
rísticas sejam únicas devido às condições geográficas e/ou, inclusive, devido
ao savoir faire (saber fazer tradicionalmente dominado pelas pessoas do local
envolvidas).
A proteção jurídica, prevista para o instituto da IG, em primeiro lugar, vi-
sa impedir terceiros, que não cumprem os requisitos legais, de fabricar, im-
portar, exportar, vender, expor ou oferecer à venda ou ter em estoque produto
que se apresente como IG. Em segundo lugar, impede terceiros de usar, em
produto, recipiente, invólucro, cinta, rótulo, fatura, circular, cartaz ou em ou-
tro meio de divulgação ou propaganda, termos retificativos, tais como tipo,
espécie, gênero, sistema, semelhante, sucedâneo, idêntico, ou equivalente, não
ressalvando a verdadeira procedência do produto. E, em terceiro lugar, impe-
107
de terceiros de usar marca, nome comercial, título de estabelecimento, insíg-
nia, expressão ou sinal de propaganda ou qualquer outra forma que indique
procedência que não a verdadeira, ou vender ou expor à venda produto com
esses sinais. Importante destacar que o registro das IG é de natureza declara-
tória, uma vez que implica no reconhecimento de condições pré-existentes,
seja da reputação ou da influência do meio geográfico no produto (PIMENTEL,
2013).
O reconhecimento de um produto com IG se trata de uma estratégia de
qualificação, valorizando a diversidade e a singularidade de produtos enraiza-
dos em territórios específicos, podendo constituir-se em processo catalisador
de novas dinâmicas de desenvolvimento territorial, podendo ser entendido
como um processo de inovação institucional (NIEDERLE, 2014). Ou seja, a
proteção concedida a um produto ou serviço através de seu reconhecimento
como IG confere vantagens ao produtor, ao consumidor e à economia da regi-
ão, pela valorização dada ao produto, reputação do local de origem e aumento
da renda destinada ao produtor, além de atestar os níveis de qualidade de
produtos relacionados ao meio, de uma determinada área geográfica, com
impactos no desenvolvimento territorial.
A Lei 9.276/96 em seus artigos 122 e seguintes traz a previsão legal rela-
cionada às marcas, onde preceitua que pode ser registrado como marca um
sinal distintivo visualmente perceptível, não compreendido nas proibições
legais (BRASIL, 1996). As marcas representam uma categoria múltipla de
signos distintivos compreendidos nos direitos de propriedade intelectual,
subdividindo em marcas de produtos ou serviços, marcas de certificação e
marcas coletivas. Neste estudo faz-se menção às Marcas Coletivas (MC).
O sinal distintivo denominado como marca possibilita a identificação de
um produto pelos consumidores, de modo a distingui-lo de outros semelhan-
tes. A utilização das marcas tende a ser algo vantajoso para as estratégias
empresarias, uma vez que além de diferenciar produtos ou serviços de outros
existentes no mercado, transmite confiabilidade aos consumidores. Conforme
o artigo 131 da Lei 9279/96 (BRASIL, 1996), a proteção abrange o uso da
marca em papéis, impressos, propaganda e documentos relativos à atividade
do titular, sendo que, as marcas presentes no mercado possuem formas varia-
das, impostas aos produtos como etiquetas, adesivos, rótulos, embalagens,
entre outros.
Ressalta-se que a proteção concedida às marcas é restrita ao território
nacional em que é requerida, de acordo com o princípio da territorialidade,
bem como, o pedido de marca deverá ser solicitado juntamente com a indica-
ção de quais produtos ou serviços deverá assinalar (BARBOSA; DUPIM; PE-
RALTA, 2016).
108
Com relação à proteção de marcas, regulamentada pela Lei 9.279/96, há
a previsão das MC que podem ser consideradas subespécie da categoria mar-
ca. No artigo 123, III, da Lei 9.279/96 encontra-se expresso ser Marca Coletiva
“[...] aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos de mem-
bros de uma determinada entidade” (BRASIL, 1996).
Uma MC geralmente pertence a uma associação ou cooperativa cujos
membros podem utilizar a mesma para comercializar os seus produtos. A
associação, geralmente, estabelece uma série de critérios, direitos e obriga-
ções para o uso da marca coletiva (por exemplo, padrões de qualidade) e auto-
riza cada empresa associada a utilizar a marca desde que respeite tais crité-
rios. As MC podem ser um meio eficaz para a comercialização conjunta dos
produtos de um grupo de empresas para as quais seria mais difícil levar os
consumidores a reconhecer as suas próprias marcas e/ou levarem os princi-
pais distribuidores a aceitar a comercialização dos seus produtos (BRASIL,
2013).
A MC necessita que o pedido de registro contenha o regulamento de utili-
zação, que dispõe sobre as condições e proibições de uso da marca. Tal regu-
lamento deve ser apresentado no prazo de 60 dias após o depósito, quando
este não acompanhar o pedido, nos termos do artigo 147 da Lei 9.279/96
(BRASIL, 1996). Sobre o tema, é importante transcrever os apontamentos de
Cerdan et al. (2010, p. 78):
109
desenvolvimento tecnológico e econômico, contribuindo para o crescimento
de pequenas e médias empresas, devido, por exemplo, ao aumento da cliente-
la, através dos laços de confiança formados entre o empresário, seus produtos
e o consumidor.
110
Características Indicações Geográficas Marcas Coletivas
Legislação em Lei 9279/96 e Instrução
Lei 9279/96 e Instrução Normativa 25/2013.
vigor Normativa 25/2013.
Identificar a procedência de produtos e serviços Identificar produtos e servi-
Função cuja reputação, qualidade ou outra característica ços da entidade coletiva
se deva ao seu local de origem. titular da marca.
Produtores e prestadores de serviços locais
Entidade coletiva representa-
Titularidade estabelecidos no local e que satisfaçam as condi-
tiva de coletividade.
ções de cada espécie de IG.
Apresentar regulamento de uso, delimitação da
Condições para Apresentar regulamento de
área geográfica e comprovações relacionadas à
registro utilização.
espécie de IG solicitada.
Restrito aos produtores ou prestadores de servi-
ços estabelecidos no local e atendimento aos Membros ou associados à
Direito de uso requisitos de qualidade, no caso de Denominação entidade titular da marca.
de Origem.
Indefinida enquanto existir condições previstas
Vigência da Dez anos, renováveis indefi-
para cada espécie de IG, independente de reno-
proteção nidamente.
vação.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
111
torno financeiro; (ii) na empregabilidade, gerando empregos diretos e indire-
tos e diminuindo o êxodo rural; (iii) na cultura e qualidade, contribuindo na
preservação do saber fazer e melhoria da qualidade de vida; (iv) na governan-
ça do território (ou governança territorial)8, fortalecendo a cooperação regio-
nal, bem como, as instituições locais, além do aumento da capacidade de coor-
denação entre os atores do território (sociais, econômicos e/ou institucio-
nais).
Essa argumentação é reforçada por Pimentel (2013), quando afirma que
os dois institutos são promissores no fortalecimento da cooperação e promo-
ção do território, reunindo esforços, dividindo responsabilidades, otimizando
investimentos e compartilhando diferentes experiências na busca de um obje-
tivo comum. Desse modo, segundo argumenta o autor, os signos distintivos
colaboram no desenvolvimento territorial, por difundir o conhecimento tradi-
cional de determinadas regiões, melhorar a reputação do meio rural, trazendo
benefícios para a região, econômicos, culturais, bem como, ambientais, na
medida em que preservam a biodiversidade, os recursos genéticos locais e o
meio ambiente.
Ou seja, indubitavelmente, em graus diferenciados, a proteção, distinção
e maior divulgação regional e internacional de produtos e serviços com espe-
cificidade territorial, por meio dos institutos da IG ou MC, Tem potencial signi-
ficativo de promover impactos positivos na economia, na empregabilidade, na
cultura, na qualidade de vida e na governança dos âmbitos espaciais atingidos.
Em próximos estudos, pretende-se aprofundar o tema, utilizando informações
estatísticas que representem os aspectos indicados por Dupim e Hasenclever
(2016).
Por fim, é importante ressaltar que o reconhecimento ou registro de
qualquer desses signos distintivos, por si só, não é capaz de consolidar os
benefícios acima apontados, nem mesmo outros que também podem ser al-
cançados. Para tanto, faz-se necessária a participação direta de todos os atores
envolvidos, nas ações envolvidas na IG e MC, de forma integrada com o pro-
cesso de planejamento e gestão do desenvolvimento territorial.
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112
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113
QUESTÕES AMBIENTAIS ATUAIS:
COMPREENDÊ-LAS, É PRECISO. UMA VISÃO
HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DOS PROBLEMAS
AMBIENTAIS ATUAIS1
INTRODUÇÃO
1 Esta pesquisa é parte integrante do Estágio Pós-Doutoral da primeira autora, no âmbito do Programa
de Mestrado em Desenvolvimento Regional, na Universidade do Contestado, com financiamento da
CAPES.
2 Advogada. Doutora em Direito Econômico e Socioambiental (PUCPR). Professora em estágio pós-
doutoral na Universidade do Contestado (UnC) – Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regio-
nal. Santa Catarina. Brasil. E-mail: [email protected]
3 Graduado em Estudos Sociais. Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina,
Professor na Universidade do Contestado (UnC) – Programa de Mestrado em Desenvolvimento
Regional (Santa Catarina. Brasil.) e professor efetivo da Escola Estadual de Educação Básica Professor
Olavo Cecco Rigon em Concórdia (Santa Catarina, Brasil). E-mail: [email protected]
4 Filósofo. Doutor em Desenvolvimento Regional, com atuação no Programa de Mestrado em
Desenvolvimento Regional da UnC. Santa Catarina. Brasil. E-mail: [email protected]
115
em tempos atuais como natureza, não sendo este, no entanto, o sentido atribu-
ído pelos antigos. De acordo com o autor, é possível pensar que a physis grega
designava a própria realidade ou manifestação do real, porém numa dimensão
muito mais abrangente, já que contempla aspectos metafísicos como a gênese,
a essência, a substância e a forma das coisas, incluindo componentes psíquicos
e espirituais (1999, p. 167-176). A participação desses elementos de natureza
metafísica, no entanto, é fragilizada com o advento da modernidade.
Como parte das transformações proporcionadas pelo pensamento mo-
derno a respeito da natureza destaca-se a fragmentação das ciências, retiran-
do qualquer caráter subjetivo que pudesse a elas estar vinculado. Nesse senti-
do, Prigonine e Stengers (1991, p. 1) concluem que o ser humano assume a
posição de um estranho ao mundo que descreve. A partir da modernidade, fica
latente a ideia nuclear de que as ciências devem servir à construção de um
conhecimento hegemônico voltado à dominação e modificação da natureza.
Deste modo, a metamorfose da ciência consiste na perda de interesse pelos
fenômenos imutáveis ou estáveis, para dar lugar ao debate diante das evolu-
ções, crises e instabilidades (PRIGONINE e STENGERS, 1991, p. 4), focando-se
na finalidade explícita de modificar a natureza conforme os interesses das
sociedades.
Como componente do pensamento ecológico atual, há que se considerar
que há uma influência de alguns ciclos históricos que podem ser resumidos,
grosso modo, como: a) o ideário de superação do atraso pela tentativa de inte-
grar-se na economia pela exploração primária dos recursos naturais; b) Após
séculos de exploração, a influência que rege as questões ambientais volta-se à
identificação e superação dos problemas ambientais, cuja solução advém de
uma proposta inserida por um agente externo: primeiramente, as políticas
preservacionistas e, após a verificação de sua inviabilidade, as políticas de
desenvolvimento sustentável; c) Visualizada a sua insuficiência, vê-se a cria-
ção de novas e velhas soluções, sendo a mais atual a economia verde e sua
ideologia de mercantilização da natureza (MAMED, 2016).
OBJETIVO DO ESTUDO
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
116
tágio Pós-Doutoral, que embasarão a pesquisa principal, a ser apresentada ao
término do período.
ANÁLISES E RESULTADOS
PRINCIPAIS CONCLUSÕES
117
tos pontuais que não contemplam a origem dos problemas enfrentados. Deste
modo, pensar a questão ambiental através de um resgate do pensamento eco-
lógico ao longo do tempo é um esforço que poderá contribuir para o necessá-
rio aprofundamento da temática e para a busca de soluções realmente eficazes
para a gestão dos recursos naturais.
REFERÊNCIAS
KOIKE, K. Aspectos da physis grega. In: Revista perspectiva filosófica. V. VI, n. 12, jul-
dez, 1999.
MAMED, D. O. Pagamentos por Serviços Ambientais e mercantilização da natureza na
sociedade moderna capitalista. Paraná, 2016. Tese (Doutorado em Direito) – Pon-
tifícia Universidade Católica. Curitiba, 2016.
PRIGONINE, I.; STENGERS, I. Nova Aliança: Metamorfose da ciência. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1991.
118
PROGRAMA ENSINO MÉDIO INOVADOR:
EXPECTATIVAS DOS ESTUDANTES E
ARTICULAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO
REGIONAL1
INTRODUÇÃO
1 Estrato da Dissertação intitulada: Um olhar sobre a implantação do Programa Ensino Médio Inovador
(ProEMI) em duas escolas públicas da 25ª Gerência de Educação: uma análise
2 Pedagoga. Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade do Contestado. E-mail:
[email protected]
3 Doutor em Educação e professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da
Universidade do Contestado. E-mail: [email protected]
4 Doutora em Serviço Social e professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da
Universidade do Contestado. E-mail: [email protected]
119
Tratou-se de um estudo bibliográfico, de campo, exploratório, documen-
tal, quali e quantitativo. Utilizou-se a escala de Likert. Relata-se o resultado da
pesquisa realizada com 317 alunos de 1ª, 2ª e 3ª séries do Ensino Médio Ino-
vador da EEB Almirante Barroso e; EEB Santa Cruz de em Canoinhas-SC.
ANÁLISE E RESULTADOS
120
samos avançar um pouco mais. Por enquanto seria precipitado concluir que a
educação vem enfrentando, a contento, o desacordo citadino. Porque não bas-
ta ensinar na cidade; é preciso ensinar a cidade.
REFERÊNCIAS
121
IDEB: IMPORTANTE MECANISMO PARA
PERCEBER A EDUCAÇÃO EM DIFERENTES
CONTEXTOS
INTRODUÇÃO
As avaliações nacionais são cada vez mais comuns na maioria dos países da
América Latina. Embora seus resultados ainda pouco influenciem as políticas
educacionais adotadas, é possível observar que as avaliações têm uma inten-
ção nobre: acompanhar como anda o direito de aprender dos alunos.
123
OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
ANÁLISE E RESULTADOS
124
vestimento púbico financeiro e de formação para atingir amplamente todos os
municípios, pois as dificuldades de conseguir crescimento nos índices educa-
cionais não é realidade somente dos municípios pesquisados, e sim, situação
comum da educação básica nacional.
Fonte: INEP/MEC
* Número de participantes na Prova Brasil insuficiente para que os resultados sejam divulgados.
** Sem média na Prova Brasil 2015: Não participou ou não atendeu os requisitos necessários para
ter o desempenho calculado.
REFERÊNCIAS
125
SEGUNDA PARTE
127
PERCEPÇÃO DA SOCIEDADE SOBRE A
IMPORTÂNCIA DO TURISMO NO
DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA ANÁLISE
DO MUNICÍPIO DE PIRAQUARA/PR
INTRODUÇÃO
129
Julga-se relevante esse estudo, dado que, o desenvolvimento turístico de
uma região se torna desafio para os gestores públicos e privados, e cada vez
mais, a sustentabilidade de um destino turístico depende de uma gestão com-
partilhada entre o setor privado, o Estado e a comunidade local. Importante
frisar que, o tema desse estudo tem “o turismo como objeto de estudo [que] é
constituído por um centro no qual as diferentes disciplinas se entrelaçam”,
promovendo assim, um encadeamento de conhecimentos interdisciplinares
(DENCKER, 1998).
Atinente a isso, destaca-se que, os princípios indutores do desenvolvi-
mento do turismo são intrínsecos ao desenvolvimento econômico, e nesse
sentido, a diferenciação básica entre os conceitos de desenvolvimento e cres-
cimento econômico são caracterizados respectivamente pelos aspectos da
qualidade e da quantidade. Portanto, o desenvolvimento das cidades e regiões
é estabelecido, entre outras coisas, pelas transformações que ocorrem no re-
gime econômico em vigor ao longo do tempo, meneado principalmente pela
economia do país, e, principalmente em tempos de globalização, pela mundial.
Ademais, o turismo pode contribuir na geração de emprego, renda, de-
senvolvimento local e preservação da paisagem e mananciais, o que acarreta
numa rede de causas e efeitos entre a ecologia, a economia, e particularmente,
o turismo, envolvendo principalmente a indústria turística, defensores do
meio ambiente e comunidade (OMT, 2003). Diante disso, as tradicionais des-
crições do turismo (características dos visitantes, motivações de sua visita,
etc.) têm sido complementadas – e se tornando mais interessantes para a ad-
ministração pública e para a sociedade – em função da importância da realiza-
ção de estudos com caráter econômico.
Não obstante, devido à preocupação com a qualidade de vida presente
nas sociedades pós-industriais o turismo juntamente com o lazer, a cultura, as
artes, o esporte pode ser, conforme Barros (2005), a única alternativa para o
desenvolvimento local, sendo seriamente considerado por governos, estudio-
sos e comunidades.
Assim, crê-se que os gestores devam almejar em analisar o turismo sob a
ótica do Desenvolvimento Local, ou seja, verificar que tipos de turismo devem
ser desenvolvidos para que estes proporcionem desenvolvimento no sentido
amplo da palavra, no que concernem as diversas dimensões do desenvolvi-
mento sustentável, quais sejam, a econômica, a social, institucional e a ambi-
ental.
Em razão disso, esse artigo se mostra atual e importante, cuja temática
assentada no desenvolvimento local e turismo sustentável vêm despertando
interesse de estudiosos do turismo, bem como, de outros profissionais afetos a
sua multidisciplinaridade.
Estruturou-se esse artigo em quatro seções além dessa introdução, sendo
que na primeira se abordam as motivações para o turismo e na segunda seção
pontua-se a questão do turismo como atividade econômica. A terceira seção
130
abrange a administração pública, a questão ambiental e a sustentabilidade da
atividade turística, enquanto na quarta parte se faz uma análise do desenvol-
vimento do turismo no município de Piraquara, seguindo-se as considerações
finais.
131
ao seu entorno habitual por um período consecutivo inferior a um ano com
finalidade de lazer, negócios ou outras” (OMT, 2001, p. 3).
A ECONOMIA DO TURISMO
3 VBP é a expressão monetária que soma todos os serviços turísticos produzidos no país. Nesse valor
tem a chamada “dupla contagem”, pois soma os produtos finais com os insumos usados em sua
produção. É diferente, portanto, do Valor Agregado Bruto (VAB), que é o valor da produção sem
duplicações, que se obtém descontando do VBP, o valor dos insumos utilizados no processo produtivo.
132
consumo dos visitantes” (IBGE, 2008, p. 9). Assim, é possível avaliar o impacto
direto e indireto gerado pelo turismo na economia de um país ou região, utili-
zando-se métodos que permitem quantificar os gastos efetuados pelos turis-
tas. Uma das técnicas é o efeito multiplicador do gasto turístico que se baseia
no número de vezes que esse gasto circula na economia local.
A matriz do efeito multiplicador elaborada por Inskeep (1991, p. 388)
apud Garrido (2001, p. 34), a partir de informações provenientes da OMT,
aponta três modalidades de gastos turísticos: gastos diretos, isto é, serviços ou
produtos comprados diretamente pelo turista, gastos efetuados pelas empre-
sas turísticas e, os beneficiados finais, ou seja, os diversos prestadores de ser-
viços que representam as atividades econômicas que indiretamente estão
incorporadas na atividade turística (FIGURA 1).
133
PLANEJAMENTO PÚBLICO, MEIO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE
4 Turismo Sustentável é definido pelo Acordo de Mohonk (New Paltz/EUA), como sendo aquele que
busca minimizar os impactos ambientais e socioculturais, ao mesmo tempo que promove benefícios
econômicos para as comunidades locais e destinos - regiões e países (ECOBRASIL, 2016).
134
econômica e turística em seu território deve colocar o turismo como parte do
debate no planejamento municipal.
É necessário, por conseguinte, entender o turismo segundo uma nova vi-
são estratégica de desenvolvimento que visa maximizar as potencialidades
locais que sejam capazes de aproveitar esse fenômeno e transformá-lo em
uma alavanca de crescimento econômico para toda a sociedade.
Cabe aqui, então, pontuar uma questão intensamente discutida tanto no
meio científico como pelo mercado: pode o turismo ser manejado e desenvol-
vido localmente de forma sustentável? Com efeito, evidencia-se que a ativida-
de turística segundo Rodrigues (2002, p. 49) “[...] permite e facilita o uso fugaz
e intenso do território como parte integrante do ideal da modernidade que
considera o desenvolvimento como uma meta a ser atingida, medida e media-
da pela produção de mercadorias.”
Deste modo, é perceptível que o turismo na sua essência é incompatível
com a ideia de desenvolvimento sustentável 5, pois, a prática turística busca
sempre o consumo dos lugares belos e com natureza abundante [...], transfor-
mando-os para serem “comercializáveis”, nos padrões de “conforto e qualida-
de de vida do mundo moderno”, ou seja, o turismo como atividade acaba sa-
cralizando a natureza e submetendo-a ao mundo da mercadoria (RODRIGUES,
2002, p. 49, aspas no original).
Nesse pensamento Rabahy (1990) apud Barros (2005, p. 31), afirma que
“a busca e o contato direto com a natureza tem sido características da deman-
da turística contemporânea, porém os recursos naturais são limitados e a
atividade turística se localiza preferentemente em áreas onde estes recursos
são mais disponíveis.”
Pode-se afirmar, portanto, que o turismo, é um “consumidor da nature-
za”, haja vista, que essa é condição sine qua non para que exista a atividade
turística. Todavia, embora isso seja fato, o turismo possui em seu bojo, carac-
terísticas e ferramentas que podem efetivamente contribuir para o desenvol-
vimento local, podendo deixar de ser apenas, um instrumento mercantilista
voltado para a satisfação do turista, como usualmente se sucede.
Quando uma região fomenta o desenvolvimento do turismo em seu terri-
tório, a consequência imediata é o realce de seus atrativos turísticos. O reflexo
natural deste estímulo se traduz em aumento do fluxo turístico, que com fre-
quência, suscita o surgimento do que literatura econômica chama de externa-
lidades6. Diga-se a propósito, que é inevitável que uma localidade seja desco-
135
berta pelo turista, pois, este é ávido por descobrir novos lugares como comen-
ta Bahl (2004, p. 32) porque, “o ser humano – turista em potencial – busca
facilidades para a realização de seus deslocamentos, gerando um processo de
escolhas e seleção de localidades a visitar, motivado pela propaganda ordena-
da e muitas vezes verbal.”
Para atender uma demanda crescente de turistas, faz-se mister, que o tu-
rismo seja planejado de modo que, suas externalidades negativas sejam redu-
zidas a um patamar aceitável, para que não causem maiores danos aos ecos-
sistemas. Assim, para que o turismo se apresente como a melhor alternativa
vindoura, deve-se buscar seu planejamento e gerenciamento de forma inte-
grada no que tange aos seus sistemas econômicos, sociais e ambientais (Figu-
ra 2).
Em outras palavras, Ruschmann (2001), frisa que a atividade turística
proporciona efeitos favoráveis nas localidades receptoras se houver uma pla-
nificação adequada dos governos, das empresas e das comunidades envolvi-
das. Esta planificação deve estar diretamente vinculada com a visão da susten-
tabilidade dos projetos e ações turísticas, fundamentais para o sucesso e a
minimização dos impactos negativos. Salienta ainda, que oferecer oportunida-
de e acesso a um maior fluxo de pessoas, contrapõe-se a tarefa de proteger e
evitar a descaracterização dos locais privilegiados pela natureza e do patri-
mônio cultural das comunidades.
Diante desse contexto, um dos pontos importantes quando se pensa em
desenvolvimento local é, ponderar a participação da sociedade local no plane-
136
jamento da ocupação do espaço, principalmente no tocante ao fomento da
atividade turística, que Ruschmann (2001, p. 163), reputa como:
7 Assim como ocorre em outras atividades industriais e profissionais, a existência de uma maior
segmentação da demanda acarretou numa maior especialização da oferta. Alguns segmentos turísticos
são: religioso, vinícola, negócios, esportivo, gastronômico, cultural, melhor idade, rural, entre outros.
137
Já o objetivo final do planejamento, de acordo com Bernardi (2007), deve
ser melhorar a qualidade de vida das pessoas que moram naquele ambiente
urbano, mantendo equilíbrio ambiental e preservando seus recursos para as
futuras gerações.
Não obstante, outros instrumentos mais específicos e contemporâneos
que já vêm sendo adotados por muitos municípios são os Conselhos Munici-
pais de Meio Ambiente e os Conselhos Municipais de Turismo, onde a popula-
ção local, juntamente com os setores privado e público, debate e decide os
rumos das políticas locais (SALVATI, 2004).
Concluindo essa parte, turismo se for implantado dentro dos princípios
da sustentabilidade definidos pela SETU (2005, p. 39), ou seja, “sem degrada-
ção e destruição dos recursos naturais e artificiais; planejado e gerido de mo-
do a melhorar a qualidade de vida da comunidade local e que envolve repre-
sentantes da iniciativa pública e privada”, tornar-se-á uma fonte potencial de
entrada de divisas podendo gerar novas oportunidades de emprego e estimu-
lar a demanda por produtos e indústrias locais.
138
O turismo no município de Piraquara é essencialmente voltado para a
exuberância de suas riquezas naturais. Parte de seu território é considerado
Área de Proteção Ambiental (APA)8 onde estão localizados mananciais de
abastecimento público de interesse de municípios vizinhos.
Assim, o desenvolvimento de atividades economicamente produtivas no
município se torna restrito pelo fato de seu território abrigar várias áreas de
proteção ambiental, fator que reflete diretamente na arrecadação tributária.
Portanto, pode-se dizer que uma das opções viáveis para o desenvolvimento
sustentável de Piraquara passa pelo turismo ser praticado de forma sustentá-
vel associado à conservação do ecossistema, contribuindo assim para garantir
o suprimento de água para as atividades humanas.
O município (figura 4), conta hoje com cerca de 100 mil habitantes é o
maior fornecedor de água dos municípios próximos, e, no entanto, sofre com o
crescimento populacional oriundo principalmente, de famílias que se instalam
aqui pelo baixo custo de vida, e que trabalham em Curitiba e outras cidades no
entorno (COMATUR, 2008; ROTEIRO 2008; TESSEROLLI, 2008).
8 Unidade de conservação de uso sustentável, estabelecida pela Lei Federal n.º 6902/81, constituída por
terras públicas ou privadas (IBAMA, 2016).
139
No que tange a crescimento populacional, entre 1991 e 1996, segundo
Hardt e Hardt (2007, p. 5303) “[...] Piraquara registrou a maior taxa de cres-
cimento anual da [...] [RMC], 10,9% a.a. [...] com o estabelecimento de ocupa-
ções irregulares e geração de bolsões de pobreza [...]. Um dos motivos foi o
aumento das ocupações irregulares em áreas de preservação ambiental, como
é o caso da região do Guarituba. Essa região concentra a área de maior pobre-
za no município, abrigando atualmente mais de 42.000 pessoas, contingente
significativamente superior ao total da população urbana em 2000, bem como,
o bairro é mais populoso que a maioria dos municípios paranaenses (HARDT;
HARDT, 2007; TESSEROLLI, 2008).
Salienta-se que, uma parceria entre os governos federal, estadual e muni-
cipal realizou na região do Guarituba, um dos maiores processos de regulari-
zação fundiária do Brasil com realocação de famílias de áreas impróprias para
habitação, construção de habitações populares, saneamento básico, drenagem,
pavimentação, entre outros (TESSEROLLI, 2008). Além desse bairro hoje estar
com outro aspecto em termos socioambientais, a prefeitura está presente no
local através de uma unidade administrativa9 para atender a população da
região.
Outro aspecto relevante desse aumento populacional no município foi a
valorização mobiliária da capital Curitiba que ao crescer e se modernizar mo-
tivou um contingente populacional a ‘orbitar’ no seu entorno próximo bus-
cando áreas de baixo valor comercial, o que na maioria das vezes significava
áreas de interesse ou risco ambiental, poupadas pelo mercado imobiliário
formal ou com proibição de atividades, especialmente o uso habitacional, por
parte do poder público. Dessa forma, formaram-se grandes e precários bol-
sões urbanos, sem qualquer infraestrutura de serviços como coleta de lixo ou
esgoto, degradando o meio ambiente e contaminando o solo (SZUCHMAN;
OBA; HARDT, 2006, [n.p.]).
O contexto da dimensão de volume dos mananciais no território de Pira-
quara é muito significativo, pois, 93% do seu território são considerados áreas
de manancial, formadas por cinco bacias que produzem água para a RMC e,
principalmente, para Curitiba, cuja população é de mais de 1,7 milhão de pes-
soas. Na RMC são consumidos 7.200 litros de água por segundo e Piraquara
sozinha fornece 3.200 litros por segundo, ou seja, praticamente a metade da
água consumida (Clavisso apud LOPES, 2007). Dessa forma, o município busca
alternativas que promovam o desenvolvimento sustentável, e, entre essas, o
turismo vem sendo seriamente considerado e desenvolvido.
Um outro fator que pesa negativamente no desenvolvimento econômico
do município é a proximidade de Curitiba que de certa forma prejudica o co-
mércio local, aliado a características de cidade-dormitório (TESSEROLLI,
2008).
140
No que concerne ao orçamento público municipal, quando se compara a
estimativa de receitas de Piraquara com alguns municípios da RMC que pos-
suem uma população equivalente, percebe-se que a restrição legal para o de-
senvolvimento imposta pelos mananciais onera significativamente Piraquara.
O município de Araucária por exemplo, possui orçamento cerca de dez vezes
maior, sendo um município fortemente industrializado e produtor de efluen-
tes líquidos potencialmente poluidores dos corpos hídricos; o município de
Pinhais que foi desmembrado de Piraquara na década de 1980 tem orçamento
cerca de três vezes maior, e possui em seu território empresas potencialmente
poluidoras (Clavisso, apud LOPES, 2007).
Apesar desse aspecto orçamentário, o município tem conseguido realizar
importantes investimentos e o fluxo de turismo no município vem aumentan-
do progressivamente. “Quase todo fim de semana, o município recebe ônibus
com turistas - a maioria procedente de Curitiba - que vem para conhecer nos-
sas belezas naturais e as trilhas ecológicas existentes.” (ZAITER, 2008 apud
ALVES, 2008). Esse fluxo crescente de turistas e visitantes, talvez seja motiva-
do pela fuga do stress e do caos urbano que impera no cotidiano das grandes
cidades, pressionando cada vez mais as pessoas a buscarem paraísos ecológi-
cos como Piraquara.
Nesse pensamento, Ruschmann (2001) afirma que a degeneração da qua-
lidade de vida nos grandes conglomerados urbanos e seu impacto psicológico
aliado a busca pelo verde, incentivam as viagens de férias e de fins de semana.
A paisagem captada pelo turista quando visita o município de Piraquara,
que fica na sua lembrança, de acordo com Zaiter (2008) apud Alves (2008),
“são as montanhas e a presença da água que é abundante; a região possui
atualmente três trilhas ecológicas catalogadas que recebem fluxo constante de
visitantes”. Portanto percebe-se que a imagem que marca a região é definida.
Nesse sentido, Boullón (2002, p. 80) cita que:
141
caça e pesca, e os rituais de danças e cura de doentes. Os 40 hectares de terra
da aldeia ficam às margens da barragem do Piraquara I (ALVES, 2008).
De fato, a conjuntura da riqueza principalmente do patrimônio natural e
histórico-cultural de Piraquara impressiona e se constitui no grande atrativo
turístico (Figura 5).
142
diversidade biológica. No período de 2007 a 2012 houve crescimento expres-
sivo de visitantes, com uma variação de 29,7% (PARANÁ, 2014).
Os turistas e visitantes utilizam como ponto de referência o Centro de In-
formações Turísticas (CIT), inaugurado em 2006. A percepção do autor desse
artigo11 é que o município vivencia um clima de otimismo e a administração
pública e os empresários locais ligados ao turismo vêm realizando alguns
esforços que começam a surtir efeito. O município desde os anos 2010 está
também na rota do enoturismo – baseado na apreciação dos vinhos, da cultura
e tradições dos locais onde a bebida é produzida – haja vista, que “[...] um au-
dacioso e inovador projeto... [...] A Cave Colinas de Pedra é um empreendimen-
to com características únicas, que abriga em um mesmo local a exuberância da
mata atlântica, parte da história da centenária estrada de ferro Curiti-
ba/Paranaguá, além de boa gastronomia e degustação de vinho espumante.”
(PIRAQUARA, 2015, [n.p]).
Em termos de eventos, a Festa do Carneiro no Rolete tornou-se uma das
mais conhecidas em toda a região e a Festa Trentina relembra a história da
imigração. A cidade também fortaleceu o polo gastronômico nas proximidades
da antiga estação de trem no centro (PIRAQUARA, 2016).
143
no restaurante franco-italiano “Obra Prima”. Além disso, Piraquara está na
rota do primeiro trem de turismo de luxo do Brasil (figura 6), o que traz re-
cursos e gera empregos em localidades onde o trem para, pois incrementa a
economia do turismo trazendo ganhos ao comércio local.
Nos últimos oito anos a administração pública municipal vem adotando
uma postura de priorizar obras e políticas públicas que visem o desenvolvi-
mento econômico local e o bem-estar social. Isso reflete indiretamente na
atividade turística do município, haja vista, que antes de ser bom para o turis-
ta, a cidade deve ser proporcionar uma vida saudável para seus cidadãos.
Importante salientar que a cidade já conta desde 2006 com um Conselho Mu-
nicipal de Meio Ambiente, Agricultura e Turismo (COMATUR), sendo a ques-
tão ambiental o grande diferencial do município.
Nesse sentido, entre as várias obras realizadas nos últimos anos, cabe
destacar a construção do Teatro Municipal e do Parque das Águas com espaço
para lazer e esportes, pista de caminhada, lâmina d’água, palco para apresen-
tações e paisagismo. Além disso, o principal acesso da capital para o municí-
pio, a rodovia PR-415 está sendo duplicado o que certamente ajudará no de-
senvolvimento da cidade, dado que com maior facilidade de acesso, haverá um
aumento do fluxo de visitantes proveniente da Grande Curitiba, fomentando a
economia e o turismo.
A fim de se analisar como o Turismo é visto pela administração pública,
fez-se uma apreciação da Lei Orgânica Municipal (LOM) e do Plano Diretor
Municipal (PDM) que juntos constituem o arcabouço legal do município de
Piraquara.
A lei orgânica do município de Piraquara 13 no capítulo V, prevê medidas e
leis capazes de instrumentalizar sobre o meio ambiente (PIRAQUARA, 1990).
Considerando-se que o turismo, como qualquer outra atividade, pode ameaçar
a ordem pública, inclusive, podendo se tornar uma atividade abusiva e preju-
dicial à comunidade, a LOM pode prever medidas que regulem essa atividade.
No entanto, destaca-se que até o presente momento, a LOM não prevê nenhum
dispositivo que fiscalize e assegure o desenvolvimento e as possíveis implica-
ções do turismo.
No que tange ao Plano Diretor Municipal, Piraquara o elaborou em parce-
ria com a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), documento que foi
amplamente discutido com a comunidade em 12 reuniões e, posteriormente,
aprovado pela Câmara de Vereadores (AEN, 2004). O Plano Diretor entrou em
vigor em outubro de 2006 e norteará a gestão do município pelos próximos 30
anos.
Nesse contexto, Alves (2008) destaca que, segundo a Constituição Fede-
ral e o Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é o instrumento básico de política
144
urbana. Ademais, o PDM é fundamental para que haja um balanço legal apon-
tando os limites na relação dinâmica entre o desenvolvimento turístico sus-
tentável, o meio ambiente e o crescimento econômico necessário.
Fazendo-se uma análise dos principais trechos do PDM que abordam o
Turismo, destaca-se o seguinte:
A finalidade do PDM que está expressa no art. 6 é o incentivo ao
turismo rural e ecológico no Município, também definida no art.
47, inciso IV;
No art. 8, inciso VIII, está descrito que o objetivo é dinamizar o
turismo ecológico-rural a partir do aproveitamento da estrutura
existente no que concerne ao patrimônio histórico, cultural e de
recursos naturais tendo por metas como:
a) reforçar os elementos identificadores e diferenciadores do Mu-
nicípio que tenham ou possam vir a ter potencial turístico;
b) implantar equipamentos de infraestrutura turística;
c) estimular a construção da cidadania e o compromisso do cidadão
com a sua cidade;
d) adotar práticas de comunicação social que evidenciem os atrati-
vos turísticos do Município.
O Turismo é considerado como área estratégica para o desenvol-
vimento econômico e social do município, conforme expresso no
art. 29, que é específico sobre o turismo como fator desenvolvi-
mento econômico;
O art. 24 estabelece diretrizes de desenvolvimento econômico
via integração entre o Poder Público, a sociedade civil e o setor
privado;
O art. 67 prevê implantação de áreas de lazer e de apoio ao tu-
rismo nos vazios urbanos.
Posto isso, observou-se que o município cumpriu com alguns compro-
missos firmados no Plano Diretor, notadamente, através de medidas compen-
satórias promovidas pela Sanepar, decorrentes de um termo de compromisso
para promover algumas obras de caráter indenizatórias em função da inunda-
ção de área no município para a construção da Barragem Piraquara II inaugu-
rada em 29 de setembro de 200814. Do total investido na obra da barragem, R$
5 milhões foram destinados para aplicação em 12 ações compensatórias para
o município, as quais se destacam (AEN, 2006, grifos nosso):
a) Plano Diretor do município o qual visa planejar o crescimento
sustentável;
b) Três trilhas no Parque Marumbi com objetivo de incrementar
o turismo ecológico foram executadas obras de recuperação e
14 A obra contou com investimentos na ordem de R$ 74 milhões, tem capacidade para reservar 21
milhões de metros cúbicos de água. A barragem tem 17 metros de altura, 670 metros de comprimento, e
exigiu, para a construção do aterro, 364 mil metros cúbicos de terra compactada (SANEPAR, 2008a).
145
manejo das trilhas dos mananciais da serra. Foram projetadas
dentro de conceitos modernos para utilização e manutenção sus-
tentável das trilhas ecológicas e possuem três categorias de es-
forço físico - fácil (trilha Chaminé/dois mil metros); médio (Salto
da Caixa/1.200 metros); moderado a difícil (Morro do Ca-
nal/1.600 metros);
c) Salão de Eventos da Colônia Santa Maria, local tradicional-
mente conhecido por abrigar a Festa do Carneiro, realizada anu-
almente em junho que foi totalmente remodelado;
d) Casa de Guarda e o Centro de Visitantes do Instituto Ambi-
ental do Paraná (IAP) localizados na Unidade de Conservação
do Instituto Ambiental na Floresta Metropolitana, visitado por
professores e estudantes da região.
e) Instalação do Centro de Informações Turísticas na antiga Es-
tação Ferroviária de Piraquara para divulgação do turismo;
f) Placas indicativas turísticas: No total, 50 totens orientativos e
placas de sinalização do Caminho Trentino foram instalados em
toda a bacia do Rio Piraquara, onde orientam e divulgam os di-
versos produtos e seus produtores da região.
g) Cooperativa Trento Transforma: construção de uma “Vila
Agroecológica” que funciona dentro de padrões ambientalmente
corretos, ou seja, vai permitir que os produtores desenvolvam
diversas atividades permitidas pela legislação numa área de pro-
teção ambiental. O trabalho recebe apoio e assistência técnica do
Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
(Emater) e da Prefeitura de Piraquara, e é fiscalizado pelo IAP. O
complexo é equipado com abatedouro de pequeno porte para
caprinos, ovinos, suínos e peixes; uma unidade de produção
agroartesanal, outra para produção de mel; vinícola de pequeno
porte; unidade de laticínios e processamento de produtos de ori-
gem animal. Estima-se que 200 produtores rurais da região da
Bacia do Piraquara são beneficiados diretamente, e indiretamen-
te os cerca de 100 mil habitantes do município.
h) Reforma da Igreja Colônia Santa Maria - Polo Turístico Cul-
tural e Histórico desenvolvido na Colônia Santa Maria do
Novo Tirol: igreja instalada no século XIX tem imagens trazidas
da região do Trento, da Itália.
i) Dois portais instalados na PR-415, portais que identificam o
município como “A Capital da Água”.
Findando essa parte, fica patente que quando existe bom senso, as parce-
rias são producentes. Nota-se, no entanto, que os investimentos devem tam-
bém se ater a parte de talento humano tão necessária para uma gestão qualifi-
cada que faça jus aos recursos públicos empregados.
146
RESULTADOS E DISCUSSÕES DA PERCEPÇÃO DA SOCIEDADE EM
RELAÇÃO AO TURISMO
147
ra de utilidade pública e geral e serviços turísticos. Sem essa combinação e
sem a interação de seus agentes, os elementos que formam o produto turístico
passam a não ter o mesmo valor para o Turismo.
Conclui-se afirmando, que a percepção que a sociedade do município de
Piraquara tem acerca da importância do turismo é alta, porém, a atividade
turística ainda é incipiente em termos de receita proveniente da sua cadeia
produtiva.
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<http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/934-2.pdf>. Acesso
em: 05 out. 2016.
151
VALORIZAÇÃO DA TERRA NA REGIÃO OESTE
DO PARANÁ: AINDA VALE A PENA INVESTIR
EM TERRAS NA REGIÃO?
Guilherme Asai1
Moacir Piffer2
INTRODUÇÃO
153
processo ligado as atividades agropecuárias, ou seja, o preço das terras é in-
fluenciado pela atividade ligada a ela, mais do que a teoria econômica.
Ferro e Castro (2013) concluem que as o preço da terra está diretamente
relacionado à renda que se pode obter dela, onde o preço da soja indica a ren-
da obtida da terra para todas as regiões pesquisadas pelos autores. Relacio-
nando as áreas consolidadas com as áreas de fronteira, Ferro e Castro (2013)
indicam que existe uma maior possibilidade de especulação devido ao maior
potencial de crescimento, entretanto as áreas consolidadas ainda apresenta
valorização positiva dependendo da quantidade ofertada em cada região.
Dentro desse contexto, as áreas onde a agricultura é uma atividade con-
solidada devem ter uma taxa de valorização inferior às áreas de fronteira,
contudo, será que os investimentos em terras nessas áreas ainda podem ser
rentáveis?
Este trabalho tem o objetivo de apontar a oscilação no valor das terras na
Região Oeste do Paraná (ROP) observando se houve valorização nos preços e
indicar se o investimento em terras na região ainda é rentável em uma área
agrícola já consolidada. Adicionalmente, pretende-se avaliar o risco desse
investimento, apontando o risco-retorno das terras na região e em qual (is)
município (s) da ROP apresenta maior rentabilidade com menor risco.
O presente trabalho está dividido em cinco partes, incluindo esta de in-
trodução. A segunda parte irá apresentar de forma breve a ROP, a terceira irá
descrever os dados e a metodologia empregada no trabalho, a quarta parte
tratará dos resultados obtidos e a última será dedicada as considerações fi-
nais.
154
Por se tratar da última fronteira do Paraná a ser ocupada, Alves et al.
(2007) apontam que a atividade agrícola na ROP expandiu-se rapidamente na
década de 1980, com o surgimento e crescimento de agroindústrias e coopera-
tivas. Para Lima, Eberhardt e Barros (2011), de 1999 a 2005, municípios do
ROP tinham suas economias voltadas para o setor primário.
Tanto Rippel et al. (2006), quanto Alves et al. (2007) apontam que a po-
pulação da região é urbanizada nos polos de Toledo, Cascavel e Foz do Iguaçu,
mas as modificações do perfil da população nas últimas décadas não se faz
possível a caracterização como região agrícola.
Desta forma, a ROP apresenta uma distribuição de população tanto na
faixa rural, quanto na urbana e apresenta uma concentração de terras para os
médios proprietários, com ênfase no plantio de lavouras temporárias como
grãos, tendo estas terras agricultáveis como objeto desde estudo.
2 METODOLOGIA
1
𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 ( )
𝑛
𝐶𝐴𝐺𝑅 = (𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝐷𝑎𝑡𝑎 𝑓𝑖𝑛𝑎𝑙 ) −1
𝐷𝑎𝑡𝑎 𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙
(1)
155
preços das terras indicará o quão arriscado seria o investimento em terras em
determinando município. O uso da volatilidade representa a variação no preço
do ativo ao longo do tempo, cuja maior volatilidade indica maio risco.
Logo, a volatilidade é mensurada de acordo com a Equação (2):
1
𝜎=√ ∑𝑛𝑖=1(ui − ū)2
𝑛−1
(2)3
3 𝑆𝑖
Em que: 𝑢𝑖 = ln ( ); i intervalo de tempo (i = 0, 1, 2, ... ,n); S é o preço do ativo; n + 1 = número de
𝑆𝑖−1
observações.
156
Gráfico 1. Valorização (CAGR) do preço das terras dos municípios da Região Oeste do Paraná.
11,29%
Lindoeste 11,21%
10,61%
Diamante do Sul 10,15%
10,04%
Anahy 9,91%
9,65%
Santa Lúcia 9,49%
9,34%
Capitão Leônidas Marques 9,12%
9,05%
São José das Palmeiras 9,05%
9,04%
Três Barras do Paraná 8,83%
8,39%
Missal 8,34%
8,13%
Catanduvas 8,10%
7,57%
Corbélia 7,49%
7,29%
Mercedes 7,16%
7,02%
Santa Terezinha de Itaipu 7,00%
6,94%
Serranópolis do Iguaçu 6,91%
6,88%
Ouro Verde do Oeste 6,78%
6,77%
Cascavel 6,74%
6,70%
Ramilândia 6,68%
6,67%
Itaipulândia 6,61%
6,55%
Nova Santa Rosa 6,46%
6,33%
Cafelândia 6,32%
6,31%
Terra Roxa 6,17%
5,95%
Assis Chateaubriand 5,94%
5,88%
Pato Bragado 5,79%
5,75%
Matelândia 5,54%
5,52%
Jesuítas 5,43%
5,29%
Marechal Cândido Rondon 5,16%
0,00% 2,00% 4,00% 6,00% 8,00% 10,00% 12,00%
157
O Gráfico 2 ilustra os padrões médios de preço na região.
Gráfico 2. Nível médio de preço das terras dos municípios da Região Oeste do Paraná.
33.466
9.519
1998 2015
Valores médios
158
Tabela 1- Risco e retorno para cada microrregião da ROP
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
159
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160
ECONOMIA CRIATIVA E MERCADO DE
TRABALHO: UMA ABORDAGEM
INTRODUTÓRIA TENDO O MATO GROSSO DO
SUL COMO REFERÊNCIA1
Fabrício A. Deffacci2
Leoncio E. dos Santos Junior3
Weronica D. Adamowski4
Rafael Moreno5
INTRODUÇÃO
1Pesquisa prévia, realizada com apoio da Fundação de apoio ao Desenvolvimento do Ensino, ciência e
tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul.
2 Doutor em Ciências Sociais, docente do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e
Sistemas Produtivos da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
3 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
4Mestranda do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
5 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
161
um ato criativo gerador de um produto, bem ou serviço, cuja dimensão simbó-
lica é determinante do seu valor, resultando em produção de riqueza cultural,
econômica e social (MIC, 2011). Mas como definir as áreas? Segundo A Confe-
rência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento - UNCTAD
(2010) podem ser assim caracterizados os diversos setores da Economia Cria-
tiva (Figura 1).
162
a ser considerado exemplifica o índice relativo ao nível salarial, de acordo com
o qual o Estado também fica abaixo da média. A construção da pesquisa se deu
por meio de dados primários (bibliográficos). Posteriormente foram usados
dados secundários com o suporte da metodologia quantitativa. Na conclusão
são feitas as discussões dos resultados obtidos, averiguando no Estado de
Mato Grosso do Sul em comparativo aos demais Estados, um crescimento
inferior, todavia possibilitando identificar nestes resultados novas perspecti-
vas para a Economia Criativa, com sugestões e indicativos para o seu cresci-
mento.
ANÁLISE E RESULTADOS
2013 2,6
2012 2,55
2011 2,49
2010 2,46
2009 2,38
2008 2,37
2007 2,21
2006 2,26
2005 2,2
2004 2,09
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3
163
nal também manteve um crescimento continuo, os resultados serão maiores.
No entanto, pela quantidade de profissões que abrangem a Economia Criativa,
verificamos um potencial que futuramente poderá ser explorado.
MS 1
0,9
DF 1,7
1,4
RS 1,9
1,6
SC 2
1,5
RJ 2,3
1,8
SP 2,5
2
164
Gráfico 3- Remuneração média mensal no setor criativo
3.437,00
MS
2.504,00
5.127,00
SE
3.464,00
5.240,00
Título do Eixo
AM
4.234,00
5.851,00
SP
4.956,00
6.925,00
DF
5.307,00
8.682,00
RJ
6.348,00
0,00 1.000,002.000,003.000,004.000,005.000,006.000,007.000,008.000,009.000,0010.000,00
Remuneração
2013 2004
REFERÊNCIAS
165
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Report 2010: creative economy– a feasible development option. Geneva: United Na-
tion, 2010. Disponível em: http://unctad.org/pt/docs/ditctab20103_pt.pdf. Acesso
em: 10/09/2016.
166
QUEREMOS INVESTIR EM ARMAZENAGEM DE
GRÃOS? ESTUDO COM PRODUTORES RURAIS
DE PONTA PORÃ/MS1
INTRODUÇÃO
167
OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
ANÁLISE E RESULTADOS
168
se que os produtores que possuem armazenagem própria cultivam áreas
iguais ou superiores a 600 hectares. A maior parte dos produtores que planta
acima de 1000 hectares possui armazenagem própria. No entanto, as duas
maiores áreas não possuem esses sistemas.
O estudo concluiu que os 51 produtores rurais entrevistados tem uma
percepção similar, quanto se diz respeito ao sistema de armazenagem, a nível
de propriedade rural
Com relação à estrutura de armazenagem/transporte obteve-se uma mé-
dia 4,76, em uma escala entre 0 a 10, ou seja, os produtores indicaram que
estrutura de armazenagem e transporte atual não é suficiente para atender a
demanda, um gargalo no sistema produtivo da cultura de soja e ocasiona mai-
ores custos, e consequentemente uma menor lucratividade para o produtor.
Quando se trata do investimento em sistema de armazenagem, em nível
de unidade produtiva, a média obtida foi 9,01 em uma escala de 0 a 10, indi-
cando que os produtores percebem a vantagem em investimentos em siste-
mas de armazenagens em suas propriedades. Quando indagados sobre a ideia
em investir, os produtores pretendem ampliar as estruturas de armazenagem
e aqueles com maior área plantada que ainda estão filiados à cooperativa indi-
caram vontade em efetuar investimento nesses sistemas.
Concluiu-se, a partir disso que existe propensão dos produtores a inves-
tir em sistema de armazenamento na unidade produtora, mas isso está relaci-
onado com a quantidade de hectares utilizados para o plantio da soja.
REFERÊNCIAS
169
A SUCESSÃO RURAL COMO FONTE DE
REPRODUÇÃO SOCIAL: ESTUDO NO
ASSENTAMENTO DORCELINA FOLADOR
INTRODUÇÃO
171
As discussões acerca da agricultura familiar tomaram dimensão no esta-
do sobretudo a partir da política recente de distribuição de terras, com a ins-
talação da reforma agrária e o consequente estabelecimento de assentamen-
tos rurais. Essa nova modalidade de ordenamento do território passou a ser
considerada como um caminho capaz de induzir as interfaces social, ambien-
tal e econômica do desenvolvimento.
A partir dessas possibilidades contemporâneas surgem novas e desafia-
doras problemáticas a serem pesquisadas e discutidas. Em se tratando das
problemáticas existentes no âmbito da agricultura familiar merece destaque o
êxodo rural entre os jovens, questão que, segundo Abramovay (1998), deve
ser necessariamente considerada pelas regiões que pretendam o fortaleci-
mento desse modelo.
Para Weisheimer (2005) o êxodo rural entre os jovens se origina na invi-
sibilidade a eles imposta. Em movimento cíclico, da invisibilidade emerge a
migração que fortalece a invisibilidade, e deste modo o problema se sustenta.
Kummer e Colognese (2013), constataram que as pesquisas enfocadas na
juventude rural se debruçam exclusivamente sobre as dinâmicas de saída
(êxodo, migração) e permanência (sucessão, reprodução social) dos jovens no
meio rural. Entretanto, enquanto a dinâmica de saída é vastamente explorada
por pesquisadores, a de permanência se constitui como pontual lacuna na
produção científica.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
172
das ao jovem urbano; inserção precoce do jovem rural no trabalho / trabalho
pesado.
Sobre as motivações existentes para que os jovens migrem em direção ao
meio urbano os pesquisados apontaram a falta de trabalho como o principal
aspecto que desencadeia a migração, seguido da busca por melhores condi-
ções de estudo.
Como fatores que motivaram a permanência dos entrevistados no meio
rural foram apontados de forma equilibrada a “tranquilidade/afinidades com
o campo” e a “família”. A população jovem pesquisada direcionou significativa
importância à família, fato que pode indicar um diferencial presente na estru-
tura social familiar dos jovens que almejam reproduzir o modo de vida rural.
Do total dos pesquisados 55% afirmaram ter projeto de vida possível de ser
realizado no assentamento rural. Pode-se considerar que os jovens que per-
manecem no assentamento gostam do campo, sobretudo pela tranquilidade
desse modo de vida, próximos à família, orientados por uma rotina de ritmo
próprio.
REFERÊNCIAS
173
ANÁLISE DO DESAMPARO DIGITAL NOS
ASSENTAMENTOS RURAIS E SEU DESSERVIÇO
AO DESENVOLVIMENTO REGIONAL1
INTRODUÇÃO
175
SENAR), entretanto estas, em geral se apresentam pontuais e descontínuas. A
percepção de falha nesse processo esperta nova propositura, que objetiva
estabelecer o empoderamento do conhecimento (informação) como ferra-
menta de libertação, de estímulo a criatividade e a reflexão.
Dentro deste entendimento, o desenvolvimento de novas tecnologias
transforma o risco de um fracionamento digital em oportunidade, ao transfe-
rirem os benefícios da computação, da internet e das tecnologias relacionadas,
para todos os segmentos da população, até mesmo para aqueles que estejam
em desvantagem devido à educação, gênero, idade, etnia ou que vivem em
regiões remotas (como em aldeias e assentamentos rurais), ou seja, em áreas
geograficamente distantes dos centros urbanos (TAKARASHI, 2000).
Uma vez que a desigualdade social e a exclusão digital coexistam, e a se-
gunda amplia este desequilíbrio, exigem-se novas percepções e posturas, que
permitam então amenizar este quadro. A assimilação destas dicotomias digi-
tais e suas consequências induzem a diversos questionamentos: O uso das
Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDICs) contribuiria
para o aprimoramento da capacidade criativa e reflexiva dos assentados?
Como o empoderamento consubstanciado através das TDICs poderia refletir
positivamente no cotidiano dos assentados? Quais as consequências da exclu-
são digital para o desenvolvimento social e econômico nos assentamentos
rurais?
RESULTADOS ESPERADOS
176
dial, onde nesta “subordinação virtual” é quase inaceitável conjugar o verbo
“desconectar”. Aliás, as TDICs, têm-se infiltrado no cotidiano das pessoas e das
organizações. Tornando possível, por intermédio delas, realizar compras e
efetuar vendas, registrar e discutir opiniões, realizar negócios, fazer pesquisas
e buscar informações, entre outras atividades, sendo inúmeras as possibilida-
des.
Dessa forma, evidencia-se aqui que apesar da existência de programas de
inclusão digital por meio da iniciativa federal, os resultados ainda não são
perceptíveis no assentamento Itamarati I, especificamente, e é nesse sentido
que esta pesquisa se faz de suma importância, ao visar observar desde como
essa inclusão digital acontece e se acontece, caracterizando quais são as ex-
pectativas desta população rural frente às TDIC’s, além de identificar quais
seriam as consequências deste desamparo digital, e de que maneira as novas
tecnologias poderiam vir a contribuir para o desenvolvimento social destas
comunidades, compreendendo se haveria o interesse destas em participarem
dessa interação e inclusão tecnológica.
Os construtos da pesquisa serão formados com base nesses aspectos e
seriam direcionados para os assentados, visando analisar sob a percepção
deles acerca da realidade que vivenciam, descrevendo as consequências deste
desamparo digital e como a inclusão tecnológica pode favorecer o desenvol-
vimento regional, minimizando assim seus desserviços e as barreiras físicas
que os distanciam dos grandes centros.
Ademais, pretende-se ao final incitar novas discussões acerca deste as-
sunto, possibilitando o envolvimento dos agentes e dos atores locais, seja na
indicação de novas oportunidades de inclusão e/ou no aprimoramento daque-
las existentes, a luz dos resultados da pesquisa.
REFERÊNCIAS
177
ARANDUASSU DIGITAL: UNA PROPUESTA DE
INCLUSIÓN DIGITAL EN ÁREAS REMOTAS
INTRODUCCIÓN
179
desarrollar políticas adaptadas a los nuevos entornos en los países desarrolla-
dos, sin olvidar de extenderlas a todas las naciones más desfavorecidas para
que reduzcan las brechas digitales y sociales entre los pueblos.
No dejamos de insistir que pese a todas las posibilidades tecnológicas,
debemos tener en cuenta que dicha tecnología no está disponible para todo el
alumnado y profesorado. La brecha digital existe, pero no debemos olvidar
que en nuestro mundo existen muchas más brechas, algunas muy profundas.
OBJETIVOS Y MÉTODOS
180
biblioteca Gutemberg, entre otros, en un soporte offline sin necesidad de recu-
rrir a Internet.
REFERENCIAS
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181
ANÁLISE DOS RESULTADOS E METAS DO IDEB1
DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE PONTA
PORÃ/MS2
INTRODUÇÃO
183
desenvolvimento quando conceituado numa dimensão multifuncional e inter-
disciplinar na esfera social, política, econômica, humana e sustentável (SAN-
TOS et al., 2012). Assim sendo, pode expandir ou limitar o conhecimento
quando avaliado de forma interdisciplinar ou monodisciplinar, resultando no
progresso ou deterioramento de toda uma sociedade.
ANÁLISE E RESULTADOS
6
4
2
0
2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021
Resultados 3,3 4 4,5 5 5,2 5,7
Metas 3,3 3,7 4,1 4,4 4,7 5 5,3 5,5
7 “O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) é uma autarquia
federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é promover estudos, pesquisas e
avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e
implementação de políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e
equidade, bem como produzir informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e
público em geral”.(INEP)
184
Fonte: Dados organizados pelos autores com base no Instituto Nacional de Pesquisas Educacio-
nais Anísio Teixeira (Inep)/ Ministério da Educação (MEC).
Resultados Metas
6
4
2
0
2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021
Resultados 3,1 3,4 3,6 3,6 3,8 4,2
Metas 3,1 3,3 3,6 4 4,3 4,6 4,9 5,1
Fonte: Dados organizados pelos autores com base no Instituto Nacional de Pesquisas Educacio-
nais Anísio Teixeira (Inep)/Ministério da Educação(MEC).
O gráfico acima mostra que nos anos finais, as metas foram projetadas
em 2007 com a média 3.1, e o resultado só foi superior a meta em 2007 e
2009. Já em 2011foi igual, mas em 2013 e 2015 os resultados foram pouco
inferiores à meta estabelecida. Com isso, constatou-se o declínio na qualidade
de ensino em relação ao que foi percebido nos anos iniciais.
Observa-se a decadência no nível do ensino fundamental dos anos finais
para os anos iniciais. Entretanto, segundo o INEP a média de países desenvol-
vidos é 6.0 esclarecendo que o Ensino Fundamental não atingiu a média, con-
cluindo que ainda se possui uma fraca educação na região. A partir desta rea-
lidade, para impulsionar o desenvolvimento local no município de Ponta Porã
no que tange a educação, os governantes e a comunidade escolar deverão
propor mudanças fundamentais nas políticas públicas de educação, realizando
uma análise aprofundada das questões locais, a fim de proporcionar o pro-
185
gresso da região, uma vez que, a educação e o desenvolvimento são agentes
integradores e propulsores da emancipação democrática.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de de-
zembro de 1996. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm Acesso em:
14 de setembro de 2016.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 1996.
INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
http://portal.inep.gov.br/conheca-o-inep Acesso em: 15 de setembro de 2016.
SANTOS, E. L.; BRAGA, V.; SANTOS, R. S.; BRAGA, A. M. S. Desenvolvimento: um
conceito multidimensional. Desenvolvimento Regional em debate. Ano 2, n. 1, p.
44-61, jul. 2012.
186
DINÂMICA ECONÔMICA E ESPACIAL DAS
EXPORTAÇÕES DE PRODUTOS DE BASE
FLORESTAL EM SANTA CATARINA.
UMA ANÁLISE PARA O PERÍODO DE 2005 – 2014.
Ivo Raulino1
1. Introdução
1
Economista e Doutor em Geografia Econômica pela USP. Pesquisador vinculado
ao Instituto Ignácio Rangel. E-mail: [email protected].
187
reciclagem de papel, produção gráfica e editorial, além de atividades de co-
mércio, distribuição e transporte.
O segmento de madeira reconstituída é composto por uma gama variada
de produtos, muito embora os mais conhecidos sejam o MDF (Medium Density
Fibreboard), o aglomerado, o OSB (Oriented Strand Board ) e as chapas de
fibras, destinados às fábricas de móveis, à construção civil, à fabricação de
outros produtos e à exportação. Já a indústria do processamento mecânico
corresponde às serrarias, às produtoras de lâminas para a indústria de com-
pensados, as de lâminas decorativas e as produtoras de Produtos de Maior
Valor Agregado ( PMVA). Dentre os principais PMVA produzidos no país, ain-
da que com foco no mercado externo, podem ser citados os blocks, blanks,
molduras, fence, pisos, janelas e outros, enquanto os voltados ao setor move-
leiro são principalmente os pré- cortados, componentes estruturais, EGP (
Edge Glued Panel) e outros.
A cadeia produtiva de base florestal catarinense, em 2015, representada
por 14.821 empresas, empregava 91.500 trabalhadores.
188
destaque na produção de compensado, assim como Três Barras, Otacílio Costa
e Correia Pinto se destacam no segmento de celulose e papel.
Dentro do segmento da indústria madeireira, as atividades de serrarias
com o desdobro de madeira em tora, bem como a produção de artefatos de
madeira ( exceto móveis ) são as que possuíam em 2015 o maior número e
empresas ativas.
Já com relação ao número de empregos nas atividades industriais de base
florestal, SC responde por 14% dos postos de trabalho do setor florestal ma-
deireiro nacional. O setor é um importante empregador de mão de obra direta
e formal do Estado, contribuindo na geração de empregos que estão distribuí-
dos, na sua maioria, nas diferentes regiões e municípios catarinenses.
189
Figura Nº 03: Nº de empregos formais diretos em SC nos dez municípios mais expressivos.
Tabela Nº 01: Santa Catarina. Exportações de produtos de base florestal – 2005– 2014.
Em US$ mil FOB.
190
- Portas, janelas, assoalhos 199.671 233.166 122.283 126.410 146.018 152.969
e obras de marcenaria e
carpintaria
- Outras madeiras e obras 50.749 38.698 17.158 17.195 27.894 46.381
de madeira
Papel e celulose 176.386 202.166 150.153 226.517 201.431 235.805
- Pasta de celulose e papel 29.772 3.498 1.662 9.778 10.676 10.965
sanitário
- Embalagens e pasta 25.437 42.976 37.355 50.032 55.086 51.819
“quate”
- Papel e cartão kraft, 116.627 148.109 111.120 163.551 130.601 167.310
kraftliner
- Outras pastas e papéis 4.549 7.293 16 ----- ----- 5.711
Móveis de madeira 415.314 342.486 240.680 187.895 173.951 190.878
- Móveis madeira p/ 20.115 14.950 5.698 3.031 2.231 2.104
escritório
- Móveis de madeira p/ 15.241 24.659 13.718 9.270 7.665 8.705
cozinha
- Móveis de madeira p/ 171.965 130.063 106.964 94.698 90.063 107.103
quartos
- Outros móveis de madeira 170.711 140.098 90.921 62.735 58.946 58.633
- Componentes p/ móveis 36.824 31.562 22.381 16.263 14.718 14.333
de madeira
- Outros ----- 1.018 999 1.705 329 -----
Total Produtos Florestais 1.159.158 1.173.366 754.250 810.464 862.249 1.001.471
Fonte : Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.
191
Inicialmente cabe aqui uma importante observação. Ao discutir-se a di-
nâmica espacial das exportações, considerar-se-á a participação dos municí-
pios neste processo. Para tanto, selecionou-se os quinze municípios mais ex-
pressivos em termos de exportações de produtos de base florestal.
Com efeito, do ponto de vista da dinâmica espacial, o período 2005 –
2014 apresentou mudanças significativas nas exportações.
Inicialmente constata-se que os mesmos praticamente mantiveram sua
participação percentual ao longo do período em consideração, passando de
67,7% em 2005 para 71,7% em 2014, revelando significativo grau de concen-
tração espacial.
No entanto, analisando-se cada município em particular, percebe-se, de
imediato, algumas mudanças significativas.
Com efeito, a mudança mais expressiva ocorreu com o município de São
Bento do Sul, que apresentou queda nas suas exportações da ordem de 60%,
passando de US$ 216.211 mil em 2005 para US$ 87.893 mil em 2014, confor-
me dados da tabela nº 02.
Ainda com relação à queda nas exportações, vale destacar os municípios
de Canoinhas, com redução nas exportações da ordem de 57,0% e Rio Negri-
nho, que reduziu suas exportações em 31,5%.
Por outro lado, dentre os municípios que apresentaram crescimento em
suas exportações estão Campos Novos (265%), Três Barras (148%), Vargem
Bonita (89%), Curitibanos (49%), e Salete (40%).
Essa mudança na dinâmica espacial encontra explicações basicamente no
tipo de produto de base florestal exportado por cada município.
Tabela Nº 02: Exportações do complexo Agro florestal de SC por municípios – 2005 -2014. Em
US$ Mil FOB.
Municípios Anos
2005 2007 2009 2011 2013 2014
São Bento do Sul 216.211 145.583 111.787 88.467 75.527 87.893
Caçador 113.664 105.370 74.362 95.461 125.387 129.282
Rio Negrinho 84.920 92.432 31.655 33.477 49.034 58.291
Otacílio Costa 79.856 105.821 64.268 96.078 86.841 87.064
Lages 55.304 50.727 38.386 41.654 53.955 50.018
Canoinhas 50.743 50.108 34.862 23.828 20.433 21.903
Santa Cecília 40.625 36.804 36.848 34.374 45.046 44.053
Mafra 27.238 30.607 23.805 20.518 19.854 20.412
Três Barras 24.274 27.532 25.742 28.265 29.306 60.283
Salete 16.000 15.937 10.733 11.846 16.846 22.326
Pouso Redondo 17.218 18.454 6.518 4.212 6.868 5.009
Campos Novos 10.569 22.196 21.251 39.777 34.206 33.948
Timbó Grande ----- ----- ----- 14.504 20.607 21.424
Curitibanos 37.589 31.187 19.001 26.335 25.251 55.993
Vargem Bonita 11.052 14.248 12.914 19.749 21.389 20.873
A – Total (1+2+..15) 785.263 747.006 512.132 578.545 630.550 718.772
B – Total de SC 1.159.158 1.173.366 754.250 810.464 862.249 1.001.871
Participação % A/B 67,7% 63,7% 67,9% 71,4% 73,1% 71,7%
Fonte : Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.
192
No Planalto Norte de SC concentra-se cerca de 80% da produção de mó-
veis de madeira, em torno dos municípios de São Bento do Sul, Rio Negrinho,
Mafra e Campo Alegre.
Os municípios de São Bento do Sul e Rio Negrinho foram os que apresen-
taram as maiores quedas nas suas exportações. Em 2005, os dois municípios
respondiam por 63,6% de todas as exportações de móveis de madeira em
Santa Catarina, passando para algo em torno de 44,5% do total exportado pelo
Estado em 2014. Uma redução na participação sobre o total da ordem de vinte
pontos percentuais. No caso de São Bento do Sul, as alterações foram dramáti-
cas. Para que se tenha uma melhor compreensão do problema, em 2005, a
Industria Artefama, maior empresa exportadora de móveis do município, ex-
portou U$ 31.202 mil o que representava 14,5% do total de móveis exporta-
dos pelo município. Em 2015, a empresa praticamente não exporta mais, en-
contrando-se em recuperação judicial a partir do ano de 2012. O caso da Arte-
fama nos dá uma dimensão das consequências econômicas e sociais sobre
determinados setores da economia voltados basicamente ao setor externo,
quando são afetados por mudanças na política macroeconômica do Governo
Federal.
Por outro lado merece destaque o município de Caçador, que apresentou
crescimento nas exportações de móveis de madeira da ordem de 51%, pas-
sando de US$ 22.848 mil em 2005 para US$ 34.451 mil em 2014.
Considerando-se o total das exportações do complexo agroflorestal de
Caçador, percebe-se que o município apresentou ligeiro crescimento entre o
período 2005 – 2014 da ordem de 13,5%. Entre os anos de 2005 e 2009 apre-
sentou redução nas exportações totais, iniciando um movimento de recupera-
ção a partir do ano de 2010, chegando em 2014 com um volume de exporta-
ções da ordem de US$ 129.282 mil. Esse dinamismo exportador do município
deve-se ao fato de que o mesmo apresenta uma diversificação nas suas expor-
tações de produtos de base florestal, fruto de uma diversificação industrial
baseada no uso da madeira como matéria – prima.
Ao contrário de São Bento do Sul, Mafra, Rio Negrinho e Campo Alegre,
cujas exportações concentram-se basicamente nos móveis de madeira, Caça-
dor possui uma diversificação maior, que inclui móveis de madeira, portas e
janelas e molduras de madeira, além de papel e celulose.
Com relação às molduras, o município é o maior exportador nacional do
produto, com volume de US$ 21.703 mil em 2014.
Nas exportações de móveis de madeira, há em Caçador duas empresas,
que são a Temasa Ind. de Móveis Ltda e a Ind. de Móveis Rotta Ltda, que res-
pondem por 90% das exportações. Estas duas empresas têm sido responsá-
veis pela ascensão de Caçador como um novo centro produtor de móveis em
série. Já com relação às exportações de portas e janelas, o município expor-
tou, em 2014, US$ 55.685 mil , o que corresponde a 45% do total exportado
pelo Estado de Santa Catarina. Há em Caçador três grandes empresas expor-
193
tando portas e janelas: a Frameport, a Adami Madeiras e a Sincol S/A. Vale
destacar que a Frameport exporta praticamente 100% de sua produção para
mercados na Europa, EUA e Ásia.
Também merecem destaque a ascensão dos municípios de Curitibanos e
Timbó Grande. O primeiro manteve seu ritmo nas exportações até 2013, ex-
portando neste ano algo em torno de vinte e cinco milhões de dólares de pro-
dutos como madeira serrada e cabos de madeira para ferramentas. Encon-
tram-se no município como principais exportadores a Malinski Madeiras Ltda,
a Madescur Ind. Com. Madeiras Ltda, a Madeiras Brocardo Ltda, a Madeiras
Marisol Ltda e a Latina Sul Madeiras Ltda. No entanto, a partir de 2014 o mu-
nicípio deu um salto nas suas exportações. Isso deve-se ao fato de que o muni-
cípio é sede da Berneck S/A, uma gigante do complexo agroflorestal, que pro-
duz MDF para o mercado interno e externo, e que começou a exportar a partir
de Santa Catarina. Inicialmente, em 2013, a empresa exportou algo em torno
de cinco milhões de dólares. Mas, em 2014 a empresa exportou cerca de trinta
milhões de dólares e em 2015 chegou a exportar quarenta e dois milhões de
dólares em MDF.
Já quanto ao desempenho de Timbó Grande, o município passou a expor-
tar a partir de 2010, de forma tímida, mas já em 2014 apresentou exportações
na casa de vinte milhões de dólares. Essa ascensão do município deve-se ao
fato de ser sede de uma filial da empresa Lavrasul S/A Compensados e Lami-
nados, que começou a exportar a partir de Timbó Grande em 2010. Isso justi-
fica em parte o declínio nas exportações de Canoinhas a partir de 2010. A sede
da Lavrasul S/A fica em Canoinhas e tudo leva a crer que a empresa decidiu
ampliar as suas exportações a partir de sua filial em Timbó Grande.
Também é importante destacar a participação de Santa Cecília nas expor-
tações de produtos de base florestal. Neste sentido, percebe-se de que o muni-
cípio conseguiu manter o seu nível de exportações no período em considera-
ção, apresentando basicamente dois produtos em sua pauta de exportações:
madeira compensada e móveis de madeira., O município é sede da Guararapes
Indústria de Compensados, que exportou em 2014 U$ 34.219 mil, o que cor-
responde a 77,6% de todas as exportações do município naquele ano. A em-
presa tem como destino no exterior basicamente o mercado americano, para o
qual fornece madeira compensada para o setor da construção civil.
Concluindo a análise da dinâmica espacial, cabe mencionar o desempe-
nho dos municípios de Campos novos, Vargem Bonita e Três Barras, ambas
sedes de grandes empresas de celulose e papel. Em Três Barras temos a Rige-
sa, que no período 2005-2014 ampliou em 162% as suas exportações. Em
Campos novos temos a Iguaçu Celulose e Papel, que no mesmo período tam-
bém ampliou as suas exportações, passando de modestos nove milhões de
dólares para mais de trinta milhões de dólares em 2014.
194
Em Vargem Bonita está a sede da Irani Papel e Celulose, que no período
em consideração apresentou crescimento da ordem de 86% nas suas exporta-
ções.
Foram estas três grandes empresas, cuja produção é fortemente vertica-
lizada, as responsáveis pelo aumento das exportações de celulose e papel em
Santa Catarina, já que a outra grande empresa, que é a Klabin, manteve prati-
camente seu nível de exportações no período em consideração. A Klabin em
Santa Catarina exporta a partir de três municípios, onde mantém unidades
produtivas : Correia Pinto, Lages e Otacílio Costa. O desempenho exportador
das principais empresas de papel e celulose em Santa Catarina está na tabela
nº 03 abaixo.
Tabela Nº 03: Exportações de papel e celulose das principais empresas de SC. Em Mil US$ FOB.
Empresas Anos
2005 2007 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Klabin 103.539 134.009 95.241 102.771 128.592 107.617 118.285 132.153
Irani 21.499 33.283 26.693 23.329 21.225 19.901 21.819 39.728
Iguaçú 9.206 19.857 19.739 26.787 38.617 33.461 31.646 30.750
Rigesa 15.182 18.016 16.869 20.935 21.600 12.663 14.504 39.912
Primo 10.325 8.167 3.684 7.807 8.420 6.227 5.133 2.181
Tedesco
Totais 159.751 213.332 162.226 181.629 218.454 179.869 191.387 244.724
Fonte: Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.
195
Pressionado pelo avanço da globalização, a partir de janeiro de 1999, o
Governo brasileiro passa a adotar o regime de câmbio flutuante, o que faz com
que até 2002 houvesse uma forte desvalorização na taxa de câmbio. No entan-
to, a partir de 2004, já no governo Lula, começa a ocorrer uma constante e
gradual valorização nominal da taxa de câmbio, fenômeno que vai até 2011,
quando o dólar chegou ao patamar de R$ 1,88 ( gráfico 01).
5
3,91
4 3,53
2,89
2,65 2,65
R$/US$
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
ANOS
196
No entanto, a partir de 2006 inicia-se no país um processo de apreciação
cambial, que irá afetar as exportações nacionais. Em Santa Catarina as expor-
tações de base florestal também foram afetadas, com impacto mais significati-
vo sobre as exportações de móveis de madeira e, com menor intensidade as
exportações de Madeira e obras de madeira.
A taxa de câmbio é um importante elemento da política comercial de um
país, na medida em que é através dela que as empresas nacionais irão se de-
frontar com seus concorrentes nos mais diferentes mercados externos. É tam-
bém um importante elemento de medida do grau de competitividade externa
das empresas nacionais no exterior. No entanto, não é o único elemento de-
terminante da competitividade externa.
De forma ampla, é preciso dizer de que a competitividade está ligada à
capacidade de competir, o que numa abordagem geral pode ser resultante de
vários fatores que permitem que os agentes tenham maiores chances de “ga-
nhar” o jogo econômico, mesmo que por um determinado período de tempo.
A grande diversidade de conceitos e abordagens sobre a competitividade
tem origem nas diferentes correntes teóricas que estão centrando esforços em
compreender o crescente aumento da competição capitalista.
A noção de competitividade depende da perspectiva em que a corrente
teórica vislumbra a competição. Neste sentido, as abordagens ligadas ao “ma-
instream”, que entendem a racionalidade econômica como a maximização de
uma função maximização como lucros, vendas ou crescimento, costumam
entender a competitividade como um resultado, uma relação “ex post”. As
empresas que apresentarem um melhor desempenho revelado são as que se
apresentam mais competitivas.
Por outro lado, as correntes ligadas ao enfoque neo-schumpeteriano, cos-
tumam entender a competitividade como algo dinâmico. As decisões tomadas
hoje, em ambiente de incerteza, poderão refletir em uma maior capacidade de
competir.
197
sempenho no mercado seria uma provável conseqüência [sic] da competitivi-
dade e não sua expressão ( p. 262 – 264 ).
198
Por outro lado, Ferraz et al. (1997) propõe que a análise da competitivi-
dade deve ser centrada em três fatores principais. Estes fatores englobam
diversos aspectos que vão desde os internos às empresas até aqueles que se
referem à inter-relação do país com o mundo. Os fatores propostos são: a)
empresariais; b) estruturais; c) sistêmicos.
Nos fatores empresariais estão incluídos a idade e a produtividade do ca-
pital fixo, as técnicas de gestão e produção, as estratégias de “marketing” e
logística, pesquisa e desenvolvimento e treinamento de pessoal. São os fatores
empresariais que consideram as ações das empresas, enquanto, participantes
ativos do processo econômico. As decisões de uma empresa hoje a capacita
para poder auferir melhor desempenho no futuro, porém, sobre ambiente de
incerteza. Ou seja, somente posteriormente é que se saberá se as medidas
foram acertadas.
Os fatores estruturais são aqueles sobre os quais a capacidade de inter-
venção da empresa é limitada pela mediação do processo de concorrência,
estando por isso apenas parcialmente sobre sua área de influência. Desta for-
ma, o tamanho do mercado, o grau de integração da cadeia produtiva e o pro-
cesso de terceirização devem ser analisados como componentes dos fatores
estruturais. Porém, os fatores estruturais não são baseados apenas no padrão
de concorrência. Vê- se que já existem algumas externalidades com as quais as
empresas devem lidar. No entanto, estas externalidades podem sofrer alguma
influência por parte das empresas. Por exemplo, as exigências dos consumido-
res é algo totalmente externo às empresas, mas campanhas publicitárias po-
dem afetar positivamente esta externalidade.
Os fatores sistêmicos envolvem, por sua vez, os seguintes aspectos que
são totalmente externos às empresas: a) macroeconômicos; b) político institu-
cionais; c) legais -regulatórios; d) infraestruturais; e) sociais; e f) internacio-
nais. O aspecto macroeconômico apresenta quesitos como taxa de câmbio,
carga tributária, taxa de juros, política salarial, dentre outros. Já o aspecto
político-institucional está ligado à estrutura política e como esta determina as
políticas governamentais, tais como política tributária, políticas de incentivos
regionais e/ou setoriais e outros. Os parâmetros legais regulatórios são refle-
xos da estrutura jurídica do Estado, quer seja com leis de proteção à proprie-
dade industrial, quer seja com leis de preservação ambiental ou até mesmo de
defesa da concorrência. A infra-estrutura, por outro lado, pode afetar a com-
petitividade pelos custos extras que podem representar. Desta forma, insumos
como energia, transportes, telecomunicações e outros são chaves para a análi-
se deste parâmetro dos fatores sistêmicos.
Dentro dos fatores sociais encontram-se, principalmente, aqueles relati-
vos à mão- de- obra, quais sejam: sua abundância/escassez, nível de educação,
estrutura sindical e seguridade social. Por fim, os aspectos internacionais po-
dem afetar tanto o mercado consumidor da empresa, quanto suas fontes de
199
recursos. Assim, o comportamento do comércio mundial e os fluxos internaci-
onais de capital são fatores que podem afetar a competitividade.
Em pesquisa realizada na indústria de base florestal da região de Lages,
Hoff et al. (2006), buscando verificar a competitividade do setor, selecionou
um universo de 60 empresas, todas filiadas ao Sindimadeira, das quais 20
foram efetivamente visitadas para a aplicação de um questionário, em setores
como serrarias, laminadoras, fábricas de painéis de madeira, fábricas de mó-
veis, artefatos de madeira, além das fábricas de celulose e papel. Estas por
sinal foram excluídas da pesquisa, por razões não especificadas pelos autores.
Embora os autores não tragam dados empíricos sobre o desempenho das
empresas sobre o setor objeto da pesquisa, os mesmos concluem que muitos
dos padrões competitivos estabelecidos pelo referencial teórico adotado pe-
los autores não estão sendo seguidos, o que faz deste um setor pouco competi-
tivo nos mercados nacional e internacional. Para os autores, o que mantém o
setor ainda produzindo é, principalmente, o baixo custo de produção, propor-
cionado pela produtividade da matéria prima e pelo baixo investimento nas
plantas industriais (p. 131) (sic), embora os autores do estudo não tenham
apresentado nenhum indicador empírico do desempenho das firmas, como
por exemplo, as exportações, que são um importante indicador para avaliar-se
o desempenho externo das empresas de qualquer setor. Quais foram as em-
presas pesquisadas não sabemos, já que os autores decidiram optar pelo uso
de metodologia que omite o nome das empresas.
As conclusões dos autores não se aplicam de forma generalizada às de-
mais empresas no estado de Santa Catarina. Com efeito, observando-se os
dados da tabela nº 01, com relação às exportações de Madeira e obras de ma-
deira, é provável que exportações de produtos mais simples como madeira
serrada, laminada ou perfilada, seja de fato realizada por empresas cuja van-
tagem competitiva seja de fato proveniente de baixo custo de produção, pro-
veniente de produtividade da matéria prima. No entanto, ainda dentro deste
grupo de exportações, quando observamos as exportações de portas e janelas
e painéis de madeira reconstituída (MDF e Aglomerados), a competitividade
de empresas como a Frameport, a Sincol, a Adami, a Rhoden, a Guararapes, a
Lavrasul e a Berneck, em boa medida é resultado do forte processo de vertica-
lização da produção, desde a matéria prima, até aos bens finais, gerando aqui-
lo que (CHANDLER, 1990), chama de economias de escala e com posteriores
economias de variedade ou escopo, além de outros atributos apontados pelo
referencial teórico acima adotado. São todas grandes empresas, com partici-
pação expressiva nas exportações, e que mesmo num contexto de forte valori-
zação cambial não apresentaram queda em suas exportações, o que evidencia
forte capacidade competitiva em mercados externos, em razão de atributos
construídos internamente por estas empresas.
Por lado, quando consideramos o setor produtor de móveis de madeira,
constata-se que a taxa de câmbio parece ter sido um problema sério para uma
200
boa parte das empresas catarinenses exportadoras de móveis, como é o caso
da indústria moveleira de São Bento do Sul. A propósito das exportações de
São Bento do Sul, importante análise sobre as empresas deste município foi
realizada por (COMERLATTO, 2007), que já em 2007 apontava também a taxa
de câmbio como um entrave à continuidade das exportações de móveis pelas
empresas de São Bento do Sul. No entanto, o autor vai além e detecta outro
fator importante. Em sua pesquisa realizada junto a dez empresas exportado-
ras de móveis, constatou-se que todas elas exportavam 100% de sua produ-
ção, principalmente para o mercado americano. E o que é pior : as empresas
exportavam com marca dos compradores e não com marca própria, ou seja, as
exportadoras de móveis produziam o que na literatura se chama de private
label , ou seja, quando as empresas produzem bens de consumo para outras
empresas comercializarem como sendo produção sua. Além disso, o autor
detectou também o fato de que as empresas de São Bento do Sul encontram-se
numa cadeia produtiva global comandada pelo que (GEREFFI, 1994) chama de
Buyer- Driven , ou seja, a produção e exportação destas empresas é comandada
por grandes redes de compradores no exterior, principalmente nos EUA, que
encomendam estes móveis que são produzidos em São Bento do Sul mas ex-
portados com a marca do comprador nos EUA, fazendo com a maior parte do
valor gerado ao longo da cadeia produtiva seja apropriado pelos compradores
nos EUA e não pela indústria moveleira em São Bento do Sul. Neste contexto,
as grandes redes de compradores no exterior exigem principalmente preços
competitivos, pressionando em muito as margens de lucros das empresas
produtoras. Segundo (COMERLATTO, 2007), a inserção da indústria de móveis
de São Bento do Sul na cadeia mercantil global de móveis se dá de forma am-
plamente dependente e subordinada aos interesses dos compradores estran-
geiros. Este fato, aliado a já mencionada forte valorização da taxa de câmbio,
foram os fatores determinantes na debaclê da indústria moveleira de São
Bento do Sul. Há que se frisar também de que grande parte destas empresas
de São Bento do Sul não optou pelo mercado interno, mesmo num período de
crescimento da economia brasileira, quando se observou o crescimento da
renda per capta nacional, o que poderia se constituir numa válvula de escape
para períodos de crise nas exportações. Percebe-se que foi um erro de estra-
tégia empresarial.
Estratégia diferente parece ter sido adotada por outras empresas no es-
tado de SC, como é o caso da Móveis Rotta de Caçador e da móveis Rennar de
Fraiburgo, que inicialmente voltaram-se para o mercado interno, passando a
buscar o mercado externo somente num segundo momento, quando já haviam
se consolidadas como grandes empresas produtoras nacionais. Além disso, a
forma de inserção das duas empresas no mercado externo não se deu de for-
ma subordinada a nenhuma rede de compradores. Em 1998, a duas empresas
resolveram constituir uma empresa responsável pela comercialização dos
seus móveis, no exterior, principalmente nos EUA, onde no estado da Carolina
201
do Norte, criaram a Brazil Furniture Global (BFG). Esta empresa trata de co-
mercializar nos EUA a produção das duas empresas, que procuram se inserir
cada vez mais no mercado americano, mas cada qual produzindo e vendendo
as suas marcas próprias, apropriando-se, portanto, dos ganhos decorrentes
desta inserção na cadeia global de produção e comercialização de móveis.
Cabe mencionar que a Móveis Rotta, ao lada da Móveis Temasa, ambas de
Caçador, são empresas fortemente verticalizadas, produzindo inclusive a pró-
pria matéria prima, através de reflorestamentos próprios de pinus, o que pro-
porciona a estas empresas significativos ganhos de escala de produção, além
das economias de variedade.
Finalmente, uma análise do desempenho do setor de celulose e papel em
Santa Catarina, permite afirmar de que o setor não sofreu os impactos da forte
valorização cambial. A exceção parece ter sido a Primo Tedesco, de Caçador,
cujas exportações reduziram-se significativamente. A Klabin S/A, maior em-
presa do setor em Santa Catarina e maior exportadora, manteve seu nível de
exportações, apresentando inclusive leve crescimento da ordem de 2,85% ao
ano. Também com relação à Irani papel e celulose, também se constata que a
empresa manteve sua participação nas exportações. Já com relação à Rigesa
S/A e à Iguaçu Papel e Celulose, observa-se notável aumento na participação
das exportações do setor em Santa Catarina. A Rigesa apresentou crescimento
de 162,8% em suas exportações, o que lhe confere uma taxa média anual de
crescimento da ordem de 16,3%. Expressivo também foi o desempenho da
Iguaçu, no período em consideração aumentou suas exportações em 234%, o
que lhe confere uma taxa média anual da ordem de 23,4% em suas exporta-
ções de papel. São todas empresas fortemente verticalizadas em seu processo
de produção, inclusive sendo detentoras de enormes áreas de reflorestamen-
tos, que produzem a principal matéria prima para o setor, o que lhes confere
vantagens competitivas via ganhos de escala. Analisando as exportações de
celulose e papel nacionais para o período de 2001-2011, (COELHO et al.,
2013), aponta que em função do crescimento da demanda mundial por parte
da Europa e da China, os preços vem aumentando, tornando o mercado exter-
no ainda mais atrativo, embora o nível de competição do setor de papel seja
muito mais acirrado e as empresas mundiais, tais como a International Paper,
a Union Comp., a Weyyerhauser e a Mcmillan Bloend, apresentam elevadas
escalas de produção, canais de distribuição preferenciais e custos de capital
reduzido. No entanto, a indústria de celulose e papel nacional apresentou um
acréscimo na participação do comércio internacional com aumento das expor-
tações, consubstanciado pela existência de importantes vantagens comparati-
vas e variações discretas no preço médio.
4. Considerações Finais
202
As mudanças nas exportações de produtos de base florestal por parte dos
municípios considerados, mostrou-se sensível às modificações na taxa de
câmbio, para alguns, ao passo que para outros não chegou a constituir-se num
problema, na medida em que as empresas, responsáveis pelas exportações
destes bens de consumo, apresentavam outros atributos competitivos para
opor-se a um eventual processo de valorização da taxa de câmbio.
Para municípios como São Bento do Sul e Rio Negrinho, cuja atividade
econômica predominante é a indústria moveleira, a valorização da taxa de
câmbio foi determinante para o declínio das atividades exportadoras, embora
se constate de que foi também a forma como as empresas moveleiras optaram
por exportar seus produtos, basicamente através de agentes exportadores e
na forma de private label, outro fator explicativo importante para a queda
drástica nas exportações das empresas destes municípios.
Por outro lado, constatou-se que, embora a taxa de câmbio seja a mesma
para todos os agentes econômicos, vários municípios conseguiram ampliar
sua participação nas exportações, em função de que as empresas, baseadas
nestes municípios, construíram historicamente outros atributos que lhes
permitiram ampliar sua capacidade competitiva externa, como é o caso das
empresas de Caçador, principalmente.
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