São Paulo Na Primeira República - Silvia Moreira
São Paulo Na Primeira República - Silvia Moreira
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ISBN: 85-11-02125,6
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Silvia Moreira
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editora brasiliense
1988
Copyright © Silvia Levi-Moreíra
Capa:
Sílvia Massaro
Revisão:
Maria de Lourdes Appas
José Waldir Santos Moraes
ISBN: 85-11-02125-6
ÍNDICE
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Conclusão '............... 58
Indicações para leitura. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 61
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8 Silvia Levi-Moreira
industriais. Os capitais aplicados na indústria pro- pressa se não tivesse havi uerra" (op. cit., p. 114).
1:/1
vinham basicamente de três fontes: do comércio im- ão nos interessa no momento discutir se a
portador, dos cafeicultores e dos imigrantes/ Grande Guerra foi ou não benéfica à indústria. À
Não interessa aqui discutir as relações comple- época do conflito mundial, São Paulo era uma cidade
mentares e! ou contraditórias entre café e indústria definida e demarcada pelo signo da industrialização.
na Primeira República. Esta questão já foi objeto de ~ configuração dos bairros õenunciaVã-r' consti-
muitos estudos.&"abe,..mo entanto, salientar que o r uição de grupos sociais diferenciados. No Brasil, os
crescimento do parque industrial se verificou ainda 54164 operários em 1889 passavam para 149018 em
na virada do século, atin,.gindo São Paulo a primazia 1907 e para 275514 em 1920. Grande parte des-
nesse processo em 1920' A liderança paulista não se se operariado era de estrangeiros. Mais de 1/3
I explica pelos "dons inatos" de seus capitalistas, mas (1156472) dos imigrantes que entraram no Brasil,
I.ill pela implantação de uma economia de mercado lu- entre 1890 e 1929, eram italianos. Esta situação se
I"
"I crativo (Warren Dean, A Industrialização de São refletia em São Paulo: 1/3 dos 694489 imigrantes
Paulo, São Paulo, DIFEL, 1971). Ê importante lem- eram italianos. Não é à-toa que, segundo Gina L.
brar também que, contrariamente ao que se pensava Ferrero, a característica mais importante da cidade
II
até bem pouco tempo, a indústria não se desenvolveu de São Paulo era a italianità (apud Maria T. S.
III a partir de um sistema artesanal. Desde o começo, o Petrone, "Imigração", in História Geral da Civili-
estabelecimento das indústrias se fez com grandes zação Brasileira, tomo III, 2? vol., Sociedade e Insti-
unidades fabris, configurando um modo de produção tuições (1889-1930), São Paulo, DIFEL, 1977, p.
tipicamente capitalista (Sérgio Silva, Expansão Ca- 105). A mão-de-obra ocupada na indústria paulista
feeira e Origens da Indústria no Brasil, São Paulo, acompanhava esse quadro. Mais de 50% eram es-
Alfa-Omega, 1976).. ~()~. 1ikd trangeiros. E isto desde 1893~
O parque manufatureiro paulista cresceu mais Apesar de os italianos terem preponderado entre
acentuadamente durante os anos de 1907 e 1913, ou os imigrantes, é preciso lembrar também a grande
seja, durante os bons anos do café. A Primeira Guer- entrada no país de outros grupos, entre eles os espa-
ra Mundial desafiou a continuidade'Hesse d~e~01- nhóis e portugueses, fortemente presentes nos ser-
~ eóm a reduçâoõa impmtrt.Ç-ª!Ld~hen;s-de viços portuários.D\ origem ~t:an~do proleta-
.clIplfal-passóu-se a u~ruti1ização da-rnaqni- riado constitui, sem~, um dado importante
n~~e:oora existentes nâS--":âbricas, o que para o entendimento de sua atuação na cidade de
~ar-I:en=Dêãíi=ã-- er-g-untar~se-:a-i-H-dustriali- São paulq)Mas, em nenhum momento, acreditamos
zação de São Paulo não se teria processado mais de-
____ L. _---'-'_ ser este um fator por si só explicativo de por quê a
12 Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 13
Mão-de-obra ocupada na indústria (1893) trabalho; reivindicações que atestam uma movimen-
Cidade de São Paulo tação heterogênea, porém pujante, da classe operária
para criar um espaço político próprio.
Nacionais Estrangeiros Total Percentagem A diminuição da ocorrência de movimentos pa-
A B B/A redistas em determinados anos da Primeira Repú-
Manufatureiros 774 2893 3667 79% blica pode ser tomada como indício de declínio do
Artistas 1481 , 8760 10241 86% movimento operário. Trata-se de uma ilusão. Os
Transportes 1998 8527 10525 81% anos de 1912 e 1913 revelaram intensa mobilização,
Total 4253 20180 24433 82,5%
enquanto nos três anos seguintes decresceu o número
de greves. No entanto, a Guerra Mundial exerceu a
Fonte: Recenseamento de 1893, citado por P. S. Pinheiro, "O Proleta- função de estimular a arregimentação operária e o
riado Industrial na Primeira República", in História Geral da Civilização
Brasileira, cit., p. 139. debate em torno da questão do militarismo. Em
1917, com a grande greve, tornava-se patente a vita-
lidade do movimento trabalhista.
classe operária se organizou de U!!lª__ determinada A existência de greves - sem dúvida o instru-
manw:~o õe~~~tr-ã:Trã6ãfhõ-~ recente~rtêm re- mento de luta mais utilizado pela classe operária -
discutido esta ques ao como um dos fundamentos da mostra que o conflito de classes ocorria desde a Pro-
vigência de certas correntes ideológicas no Brasil, clamação da RepúblicajIsto é, desde 1889 ocorrem
principalmente o anarquismo. movimeh tos grevistas, apesar de os artigos 205 e 206 do
'111
O que se nota é que desde a implantação do par- Código Penal (promulgado em 11.10.1890) proibi-los
,1/1 que industrial paulista presencia-se a 'luta da classe pura e simplesmente (Paula Beiguelman, Os Com-
I! operária reivindicando melhores condições de tra- panheiros de São Paulo, São Paulo, Símbolo, 1977Y.
balho, melhores salários e a regulamentação dos di- Ainda que esparsas quando da implantação do novo
I!
,I
reitos individuais, sociais e civis. regime, as greves se intensificaram na virada do sé-
I Tem-se dado muita atenção ao período de 1917 culo ..
111
a 1920, qu~ a crise e~mk.ª-_(~randQ acen- ~ntre 19Q.L.e.-.19.l.i.foram registrad~l ...•
greves
tu~ão eãüiiíeiil:õno 9!Sfo....d&-vi:daj-1e-voua na C-ª.llUã!_J?a.E!istae 38 em cidades menore~. No Es-
I. IIII! unia intensi11cãÇão do movim~ntQ_op.€1>á,Fi0;-c0mgre- tado.1k.S~.2....~_~~.n.tt:.e_J215 e 192~ _cak.ula-se em
lli ves eclõcltrrde-fl0-!'>M"S":""'Nõ'êrrtanto,
bem antes de 1917 1163JlÚme.r.Q-Qe-gre~(-Azi-s-SilUãQ, Sindicqto e Es-
II II já ocorrem greves, lutas contra o regime disciplinar tado: suas relações na formação do proletariado de
nas fábricas e por melhores condições de vida e de São Paulo, São Paulo, Ãtica, 1981, pp. 105 e 139).
14 Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 15
terclassistas (seja com as classes médias ou a própria rário. A_aJ!t~ relativiza o fator imigração como um
burguesia industrial, por exemplo), que visassem ~n~õsaa~tg~ncia-d~rrarqttis:nrOlfô Br~-
modiycar a correlação de forças na sociedade capita- ~Il. Antes, a tt~deoto-gnranarqui'stã"êrii"""Sao
lista.Jj P~~pe .eadieêes-histêriees-de .•pêrío-
Não se pretende aqui expor esmiuçadamente o ~s lí6erfáriospela extensão" do-s<lire!1Q
pensamento anarquista. Estando apontadas as suas individuais, sociais- e~civis-.aes'-0perárius~fõiõetermi-
linhas básicas, torna-se importante ver p.QL.9!1eo rlãõa pelas coifêli'Ç'Õe-s-sóei0-:p0líti€as-a-qu~éSfãvam
anarquismo, e nã~õ socialismo, foi predÕminante no submetidas as classes trabalhadoras nas primeiras
!p-~ário. A historiogrãfiatem- dado dife- década do Brasil Republicano (Silvia L. Magnani, O
rentes razões para explicar a força do anarquismo em Movimento AnarqZi ta em São Paulo, São Paulo,
'Brasiliense, 1982).
~t:....
São Paulo, entre as quais salienta-se a origem imi-
da classe oJl.e.rária.-Bsse-tip.o::ãe-an.álise rem
ins USIvelevado ã conclusõe~que relacionam. a "fra-
Para se comp :eender as razões que levaram à
difusão do anarquismo é preciso ver que o Estado
lir
~za,j do I!!.2.Y.i!n~nto 'Õpêrário às suas .origens es- Republicano, amparado pela Constituição, impediu
trangeIras, bem como às SYMposições ideológicas de o envolvimento político independente de grupos des-
i"gIforaro papel d_oEstadQ.. Dessa forma, a proposta constentes com as classes dirigentes. O texto consti-
anarquista -ólplanta exótica" - teria impedido tucional, ao negar o voto aos analfabetos e imigran-
uma ação política coletiva da classe trabalhadora. tes, excluía a grande maioria da classe trabalhadora
Recentemente, no entanto, algumas pesquisas do processo político-eleitoral. Pode-se dizer que o Es-
têm salientado a efervescência do movimento ope- tado da Primeira República, organizado sob influên-
rário através da recuperação minuciosa das dife- cia do liberalismo, acabava atuando em sinergismo
rentes lutas no período em questão. Lutas que dizem com as teses anarquistas. Isto é, tratava-se da não
resp~condi~.Q~~enor, da mu- participação da classe operária nos mecanismos polí-
l~r~e..dos...-1-iiÜgfantes.,,-1utas
contra a di~plina, lutas tico-institucionais existentes na Primeira República.
por-moradia, pelos transportes, contra..a, carestia, As reivindicações da classe operária foram sempre
etc, E isso antes das grandes greves do período de apresentadas diretamente aos empresários, cabendo
1917 a 1920. Silvia L. Magnani, ao estudar o movi- ao Estado o papel interventor de repressão dos con-
mento anarquista, parte' da análise do I Congresso frontos que ocorriam entre patrões e trabalhadores.
Brasileiro (1906), enfatizando não se tratar de um A exclusão da classe trabalhadora da esfera po-
acontecimento isolado e sim de um acontecimento lítico-partidária ajuda a entender por que o anar-
que ocorreu em fase de ascensão do movimento ope- quismo, e não o socialismo, predominou durante esse
20 Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 2.1
República que nunca chegaram a vigoraWNão se questão social. Procurava-se, dessa forma, oficia-
pretende aqui abordar as leis existentes nesse perío- lizar a questão social sob uma perspectiva de não
do. O que se quer é discutir o papel da legislação, no identificá-Ia apenas como um caso de polícia.
que se refere à história do movimento operário e sin- Por outro lado, é preciso ter em mente que a le- i
dical, fortemente influenciado pelas idéias anar- gislação trabalhista corporificou tanto a vitória
quistas. .,. , quanto a derrota das lutas operárias.fE verdade que ",I!-
O reconhecimento dos sindicatos urbanos em
< os anarquistas não reivindicavam leis trabalhistas,
1907 (a sindicalização rural data de 1903) altera radi- mas a luta dos sindicatos para controlar o mercado
calmente o caráter da luta pregada pelos anarquistas de trabalho, bem como a aceitação (pelos industriais)
através do enfrentamento direto entre os indivíduos. dos sindicatos como os únicos interlocutores entre
:,'0 sindicato (ente coletivo), ao ser aceito como inter- operários e patrões, acabou atrelando os trabalha-
. locutor nas negociações com os industriais (entes in- dores, cada vez mais, à esfera do Estado. Para os
dividuais), modificou tanto a prática operária anar- industriais, aceitar que o mercado de trabalho fosse
quista quanto a prática liberal dos empresários. A controlado pelos sindicatos implicava que também
luta não mais se travava entre dois indivíduos, do- estes fossem, por sua vez, controlados. Isto levou a
tados da mesma "liberdade" e "igualdade". Esta si- um processo de burocratização do movimento ope-
tuação possibilitou que outros interlocutores fossem rário, através do qual os trabalhadores foram per-
requisitados, isto é: o Estado foi chamado para den- dendo o poder de decisão para as mãos dos especia-
tro do processo em que se davam as questões traba- listas em questões do trabalho. Assim, a luta dos tra-
-r lhistas. Este fenômeno ocorreu particularmente após balhadores para controlar o mercado de trabalho
as greves de(Í9U) quando se ampliou a legislação acabou se transformando no calcanhar-de-aquiles do
sobre o merc~o de trabalho. No entanto, a interpo- movimento operário, na medida em que foram con-
sição do Estado já era perceptível desde 1911, quan- trolados os próprios trabalhadore,§,J É o que Kazumi
do foi criado o Departamento Estadual do Trabalho Munakata assinala como o "paradoxo" da luta ope-
em São Paulo. Se em\1918, com a criação na Câmara rária: "para conquistar o controle pelos trabalha-
dos Deputados da "Comissão de Legislação Social", dores das condições de trabalho, os trabalhadores
a questão social adquiria foros de jurisprudência, acabam endossando uma forma de organização que
emJ,9Wela é incorporada definitivamente à Consti- os controla" (A Legislação Trabalhista no Brasil, São
tuição, que consagrava o poder do Congresso Na- Paulo,
."..-
Brasiliense, 1984, 2!'-ed., p. 55).
cional de legislar sobre o trabalho. Assim, antes Nos anos imediatamente anteriores a 1930 os .j.1-
mesmo de)930, competia ao Estado legislar sobre a anarquistas vão perdendo grande parte de sua força,
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com outras correntes ganhando espaço dentro do
movimento operário. Este espaço é basicamente
preenchido pelos comunistas, congregados no Par-
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tido Comunista do Brasil (PCB) fundado em 1922,
Procurando aparar as divergências existentes no mo-
vimento operário, com a criação de um bloco unifi-
cado dos trabalhadores, o PCB vai desenvolver uma
linha de atuação bem distinta dos anarquistas. A
principal tese do PCB era a necessidade de centra- A SITUAÇÃO POLÍTICA,
lização sindical, cuja ausência se refletia na fraqueza
do movimento operário, Por volta de @27) os comu-
OS INDUSTRIAIS
nistas começam a controlar o movimento operário, E A QUESTÃO SOCIAL
retirando aos anarquistas sua primazia. Organizados
em partido, os trabalhadores passariam a enfrentar
não só os industriais, agora organizados em associa-
~!1~!
ções de classe (o CIESP é criado em 1928), mas um Durante a Primeira República a política parti-
Estado que aos poucos vai rediscutir a "questão so- dária em São Paulo estava sob o firme controle do
cial" colocando-a sob o prisma da intervenção racio- Partido Republicano Paulista (PRP). Partido único
nal e autoritária. Dessa forma, as propostas liberal e das classes dominantes até 1926 ---..:quando foi fun-
anarquista perdem terreno para uma solução insti- dado o Partido Democrático (PD) -, o PRP sempre
tucionalizada da questão social. Caberá ao Estado elegeu, não sem atritos, de vereadores a presidentes
do após-30 implementar uma política de incorpo- do Estado. E, apesar das diversas cisões ocorridas,
ração da classe trabalhadora numa ordem corporati- sua hegemonia perdurou durante toda a Primeira
vista. 'Mas este é um processo que não mais pertence República. Aos diretórios locais cabia o papel de re-
à Primeira República, já então chamada de "Velha". ferendum na escolha dos candidatos feita pela Co-
missão Diretora do PRP. Escolhido pela Convenção,
estava praticamente eleito o candidato. Dessa forma,
PRP e situacionismo caminharam sempre juntos até
o surgimento do Partido Democrático.
Com pouca necessidade de justificar a sua ação,
uma vez que controlava praticamente sozinho a má-
I ~ I
7 ~
,
26 . Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 27
quina do Estado, o PRP não chegou a elaborar um é uma questão que interessa mais à ordem pública do
projeto claro de poder. Nesse sentido, a sua prática que à ordem social" (apud José Enio Casalecchi, "As
política ficou conhecida - sendo sempre criticada plataformas políticas dos; candidatos à presidência
pelos adversários oriundos do mesmo campo político do Estado de São Paulo na Primeira República", in
-, como sem "fundamento", sem "ideal", "conti- Boletim de Economia e História, ano I, n? 1, Arara-
nuísta" . quara, mar. 1978, p. 90). Detenhamo-nos um pouco
A política, aos olhos dos perrepistas, resumia- mais na sua fala. Dizia o candidato:
se numa troca de favores e de cargos, efetivada atra-
vés da corrupção, da violência ou das fraudes eleito- "Homens vindos de outros climas, habituados por
rais. Essas colocações poderiam levar à conclusão de outras leis, materializados por sofrimentos por nós
que o PRP, guiado pelo clientelismo, constituiu-se desconhecidos, exacerbados por males que aqui não
medraram.. agitam-se e agitam em momento propí-
num partido cuja linha de atuação não conheceu de-
cio, como seja o da carestia de vida, intercorrente-
safios internos desde a fundação, em 1870, até o sur- mente produzida pela guerra européia ...
gimento do PD em 1926. Mas, ao contrário, o par- O problema a resolver aqui, não direi que seja
tido sempre conviveu com vozes discordantes, a co- diametralmente oposto, mas é incontestavelmente
meçar pelas críticas à política monopartidária. As diferente do europeu".
várias cisões no seio da agremiação (entre elas as de
1891, 1901, 1915, além da de 1926) refletem essa Para Washington Luís, se na Europa havia su-
discordância, Isso continua válido mesmo quando se perpopulação e falta de terras, no Brasil havia falta
aponta para o fato de que as vozes divergentes te- de braços e abundância de terras para serem culti-
nham, no mais das vezes, retomado ao partido. vadas.
Tudo em acordo com uma visão, preponderante à E ainda:
época, de política conciliatória: No entanto, é mais
importante destacar neste capítulo a linha que preva- "Aqui, leis liberais aboliram de direito as castas e os
leceu na prática política do PRP durante o período privilégios que a bem examinar de fato nunca. exis-
em questão, principalmente com relação aos con- tiram aqui; aqui, não se formam classes, o homem
flitos sociais. experimenta as profissões e escolhe as que mais lhe
A visão que os situacionistas tinham dos movi- convém ... o lavrador de hoje é o colono de ontem,
mentos trabalhistas pode ser captada através da frase t corno o capitalista de agora é o operário de ainda
famosa de Washington Luís, quando candidato à agora. A todos que chegam, nacionais ou estrangei-
presidência do Estado em 1920: "A agitação operária ..ros, trabalhadores agrícolas, industriais e comer-
~
.J J
28 . Silvia Levi-Moreira São Pq.1JI() na Primeira República
dantes, podemos dizer sem rubores: somos todos governantes. Em nome do "progresso" de-São Paulo,
novosem país novo. Trabalhai e economizai". impunha-se reprimir os indivíduos que provocassem a
desordem, já que a anarquia não era atributo da po-
Washington Luís chega a afirmar que as aspi- pulação paulista. Aqueles que a promoviam eram
rações operárias (tais como a jornada de 8 horas de elementos estranhos, influenciados por ideologias
trabalho, regulamentação do trabalho feminino e do estrangeiras, porquanto exóticas.'
menu r, dos acidentes do trabalho) eram uma reali- Dentro dessa ótica de "manutenção da ordem",
dade em São Paulo. Isto apesar das constantes de- o Estado deveria intervir energicamente para evitar
núncias nos jornais da época não só quanto à falta de qualquer interrupção no desenvolvimento das ativi-
regulamentações mas também quanto ao desrespeito dades produtivas. Como se verá adiante, os gover-
às já existentes. Reconhece a ocorrência diária de nantes realmente não' hesitaram em utilizar a força
greves - como conseqüência do alto custo de vida - para conter os movimentos de trabalhadores.
e propõe ao "Estado o dever de regulá-Ias nas suas Ao longo de toda a Primeira República não fal-
causas, nos seus efeitos". taram medidas enérgicas contra o movimento ope-
A longa referência ao pensamento de Wash- rário, amparadas inclusive pela legislação. Essa ação
ington Luís serve para ilustrar como deveriam ser so- repressiva, denunciada na imprensa da época, tra-
lucionados os conflitos sociais na ótica dos gover- duzia-se na depredação e fechamento de associações
nantes: com a intervenção do Estado através llC seu operárias, prisão, invasão de domicílios, espanca-
aparato policial. Campos Sales já afirmava em J896: mentos e deportação de líderes grevistas.
"U ma boa polícia é condição de um bom governo '. Uma arma importante contra a organização
Cabe à polícia a tarefa de "manter a ordem, garantir operária foi a expulsão de estrangeiros. As leis de ex-
a segurança individual, salvaguardar a propne.laue, pulsão existiam desde o início da República (com o
defender a moral pública e reprimir os vícios ... ". Em Código Penal de 1890 contra vadios e capoeiras es-
1908~Albuquerque Lins também confiava à polícia o trangeiros). Na Primeira República ficaram mais co-
papel vigilante sobre os "maus elementos" que dia- nliecidas as leis Adolfo Gordo, de 1907 e 1921. A
riamente se infiltravam no meio da "população esta- cada onda grevista reforçavam-se os instrumentos de
belecida e laboriosa". E ainda: "Quando se trata do coerção, visando impedir desafios à política dos gru-
bem público e do interesse geral, impera unia lei pos dominantes e, nesta estratégia, inseriam-se as
suprema, existe um ideal comum: Pelo engrandeci- leis de expulsão. Pela lei de 1907 vedava-se a expul-
mento de São Paulo". são de estrangeiro que fosse casado com brasileira,
Há uma lógica imanente no discurso político dos ou viúvo, o que tivesse filho brasileiro ou, no mínimo, I
~
.. ~
~
30 Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 31
dois anos de residência no Brasil (cinco anos na lei de rosa disciplina ao mesmo tempo que recebiam di-
1921). No entanto, as autoridades não respeitavam, versos benefícios. Por volta de 1917, quando era
muitas vezes, tais aspectos da legislação. então presidente do Centro Industrial do Brasil, Jor-
O mesmo ocorria com o habeas eorpus, freqüen- ge Street propôs, alegando falta de braços, S6 horas
temente ignorado. Por outro lado,um simples rela- semanais como jornada de trabalho e o trabalho in-
tório policial, baseado em acusações de testemunhas, ~ fantil a partir dos 11 anos. Embora admitisse uma
bastava para incriminar o acusado. Dessa forma con- legislação de amparo à mulher grávida, insistia em
firmava-se o que dizia Washington Luís:' "A questão que fossem curtas as licenças e se ensinasse o opera-
social interessa antes à ordem pública", isto é, a riado a controlar a natalidade.
questão social era antes um caso de policia. Apontando o sistema escolar deficiente, Jorge
Aliados à polícia, principalmente nos momentos Street sustentava que a fábrica constituía-se na me-
subseqüentes às greves, estavam os industriais. As lhor escola para as crianças brasileiras (mais "pre-
pesquisas demonstram que a regra de (conduta dos !I coces" que as européias), dado que as amparava do
industriais era a de coerção, embora' houvesse ex- abandono e vício das ruas. Segundo o industrial, o
I ceções, como Matarazzo e Jorge Street, (que impri- M trabalho dos menores de 12 a 1S anos correspondia,
miam às suas relações com a classe trabalhadora.certa na verdade, a um desejo dos próprios pais:
I dose de paternalismo. Respondendo com /ock-outs,
expulsando os agitadores ou enviando à polícia listas I, "Os operários da fábrica empenham-se, fortemente,
negras dos operários despedidos - postura assumida ~.\
~ para obterem estas colocações para seus filhos e pa-
por O. Pupo Nogueira, secretário-geral do Centro rentes, e sempre que eu lhes falo em diminuir-lhes as
dos Industriais de Fiação e Tecelagem de São Paulo, horas de trabalho, eles, invariavelmente, me respon-
na década de 20 -, as classes patronais compor- t; dem que não só essas crianças os ajudam no ganha-
taram-se, via de regra,de forma repressiva e intran- pão quotidiano, como também julgam melhor para
sigente frente aos conflitos trabalhistas. eles trabalharem na fábrica do que ficarem em casa,
É importante examinar um pouco mais detalha- ao abandono, e sem fiscalização. Será possível que
damente as posições tomadas por alguns industriais. todos estes pais, irmãos e parentes sejam tão desna-
Vamos começar com o caso de Jorge Street. Diri- . turados que procedam deste modo só por ganância e
li,' para ganhar com o trabalho dos seus pequenos,
gindo fábricas têxteis no Rio de Janeiro e em São como já há quem tenha dito? Pensar assim seria
Paulo, Jorge Street construiu na unidade paulista :,:
gràve injúria feita a esses operários, na grande maio-
uma vila operária padrão. Conhecida por "Vila Ma- li ria dos quais os sentimentos naturais de afeição são
ria Zélia", nela os operários obedeciam a uma rigo- perfeitamente normais e vivos" ("Código do Traba-
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partidários (da Liga Nacionalista de São Paulo e do tavam submetidos os operários; a ineficiente e incom-
Partido Democrático) e dois vêm de homens públicos pleta lei de acidentes de trabalho e do seguro ao ope-
(Rui Barbosa e Sampaio Dória). Comecemos com rário. Rui Barbosa propunha uma série de medidas
estes últimos. visando a harmonização das duas classes: operária e
empresarial.
Ao esbarrar na inconstitucionalidade da intro-
Rui Barbosa missão do Estado nas relações entre Capital e Tra-
balho, e de uma legislação que regulasse os direitos
Rui Barbosa (1849-1923), abolicionista na Mo- trabalhistas, Rui Barbosa defendeu a Revisão Cons-
narquia e senador na República, manifesta-se sobre titucional. Dialogando com políticos rio-grandenses,
a questão social apenas em 1919, numa conferência ele afirmava que, se o Estado não tinha competência
realizada no Rio de Janeiro (20.3.1919) quando can- para intervir na questão social, era então preciso al-
didato à Presidência da República. terar a Constituição para que se desse a ela essa com-
Posicionando-se como um "democrata social" e petência. Se a lei era inadequada, ela deveria ser al-
seguindo as idéias do cardeal Mercier, Rui Barbosa terada. A revisão constitucional, segundo Rui Bar-
defendia a "felicidade da classe obreira, não nas ruí- bosa, era o único caminho para a "conciliação na-
nas das outras classes, mas na reparação dos agravos cional", contrariando os que diziam ser esta revisão
que ela, até agora, tem curtido" ("A Questão Social um "programa de desagregação". Para o revisio-
e Política no Brasil", in Escritos e Discursos Seletos, nista, operários e patrões dependiam uns dos outros
Rio de Janeiro, Cia. Aguilar Edit., 1966, p. 431). Em e formavam um corpo coeso e indissolúvel. Tinham
1919, para Rui Barbosa a questão social era o mais ambos interesse na revisão e na força da lei nas re-
importante dos problemas a resolver. Mas não .era, lações entre Capital e Trabalho. Ele alertava para o
segundo ele, o socialismo que solucionaria os con- fato de que os "operários não melhorariam se, em
flitos sociais, apesar de este conter, como em todas as vez de obedecer aos capitalistas, obedecessem aos
teorias, tanto um fundo verdadeiro quanto errôneo. funcionários do Estado socializado". Desta forma,
Em seu texto, Rui Barbosa chamava a atenção "nem todos os males do sistema econômico estavam
para diversos aspectos que mereciam um exame cui- com os detentores do capital" .
dadoso: as más condições habitacionais dos operá- Rui Barbosa esclarecia ainda:
rios; abusos do trabalho noturno, de menores e mu-
lheres (principalmente gestantes); turnos excessiva- " ... quando me preocupo com a iminência de como-
mente longos; as más condições de higiene a que es- ções e subversões, nãoé porque as almeje, busque ou
40 Silvia Levi-Moreira São Paulo na Primeira República 41
estime (cansado estou de implorar que as evitemos), são, Sampaio Dória publicou, em 1922, um texto
mas porque as temo, as pressinto, as diviso, e quero bastante amplo (388 páginas) intitulado A Questão
convencer os que as promovem de que nos devemos Social (São Paulo, Off. Graph. Monteiro Mob. & C.).
unir todos contra os seus tremendos perigos" (art. Nele, Sampaio Dória aborda exaustivamente as dife-
cit., p. 453).
rentes perspectivas existentes à época para resolver
os conflitos trabalhistas (inclusive as propostas co-
Por constatar a'gravidade dos problemas traba- munistas e católicas), demonstrando grande conheci-
lhistas e preocupado com a "implantação da de- mento do assunto. Baseando-se nas idéias de Charles
sordem", Rui Barbosa propunha a revisão constitu- Gide, chegava a uma única conclusão: a questão
cional e defendia a interferência estatal para resolver social seria resolvida pelo Cooperativismo, que le-
a questão social. varia ao surgimento do produtor independente. Após
rechaçar as teorias marxistas e anarquistas, mas re-
conhecendo que a questão social existia, ele pro-
Antônio de Sampaio Dória punha que o Estado tomasse medidas que favore-
cessem o produtorindependente. Vale apena citá-Ias:
Antônio de Sampaio Dória é outro exemplo de
homem público, ligado aos grupos dominantes, que "I?) o acionato obreiro;*
apresentou proposta alternativa para o tratamento 2?) os bancos populares de crédito industrial e
da questão social. Formado pela Faculdade de Di- agrícola;
reito em 1908, ele foi bastante atuante na área edu- 3?) as cooperativas de produção e consumo;
cacional, chegando a ser diretor geral da Instrução 4?) a educação maternal, primária e profissional".
Pública do Estado de São Paulo em 1920, sob a pre-
sidência de Washington Luís. Foi também membro o Estado deveria agir mediante os seguintes
atuante do Conselho Deliberativo da Liga Naciona- princípios:
lista de São Paulo (que discutiremos a seguir). Após
1930, sua presença não foi menos marcante. Um dos
"I?) Fixação do salário mínimo em número de ho-
principais autores do Código Eleitoral elaborado em ras, menor que o dia médio de trabalho, de
1932, Sampaio Dória foi ministro da Justiça em
1945, tendo ainda se candidatado a senador em 1947,
pela União Democrática Nacional (UDN). (*) Participação dos operários como acionistas das empresas e,
No que diz respeito diretamente à nossa discus- inclusive, em sua administração.
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modo que não haja miséria no lar do operário nância dos senhorios;
diligente e econômico. d) favores à construção de casas higiênicas ... ;
2?) Limite máximo do dia de trabalho pela capaci- e) a distribuição dos impostos ... ;
dade de resistência individual, a critério do tra- f) animação ao trabalho agrário, com atrair
balhador. braços para a lavoura, distribuindo semen-
3?) Proibição do trabalho aos menores, e limitação tes adaptadas, expurgadas e selecionadas,
dos adolescentes, para lhes assegurar o desen- organizando postos de experimentação,
volvimento físico, e a educação. abrindo estradas ... ;
4?) Repouso hebdomadário de 24 horas mínimas, g) em suma, tudo o que melhore as condições
abrangendo, sempre que possível, o domingo. gerais da vida, sempre que as iniciativas e
S?) Preparação técnica, que, aumentando a renda as posses individuais sejam deficientes.
do trabalho, dê ao operário a consciência e o 12?) O poder público deve socializar, com ou sem
poder de se bastar a si próprio. privilégio, os serviços que, a cargo de particu-
6?) Proibição de empresas que não atendam às lares, não ofereçam segurança necessária,
condições higiênicas nos prédios e nos instru- como correios, ou serviços que, confiados a
mentos. particulares, não tenham a extensão e eficiên-
7?) Igualdade de pagamento, sem distinção de cia requeridas pelo progresso nacional, como
sexo ou idade, aos mesmos trabalhos. a educação pública" (Antônio de Sampaio Dó-
8?) Interdição do trabalho nas oficinas às mulhe- ria, op. cit., pp. 370-372).
res um mês antes e um mês depois do parto,
sem que percam os seus salários.
I 9?) Supressão do trabalho noturno, que não for Como a teoria do laisser-faire, laisser-passer ti-
absolutamente necessário, e, no inevitável, ve- nha os seus defensores, Sampaio Dória preconizava a
dar o emprego das mulheres e das crianças. intervenção do Estado para amparar o trabalho fren-
1O?) Responsabilidade do capital pelos acidentes do te ao capital que o explorava. Segundo Dória, nada
trabalho, mediante seguro ou caução obriga- justificava a indiferença do Estado quando se tratava
tórios. de garantir a justiça entre os homens. Citando Rui
Ll P) Interferência direta do Estado no custo de vida, Barbosa, afirmava que dificilmente se poderia acei-
como: tar a neutralidade: "Não há imparcialidade entre o
a) combate aos trusts ... ; crime e a Justiça" .
b) as medidas que aproximem produtores e
Sampaio Dória admitia a organização operária,
consumidores, suprimindo intermediários
inúteis; via sindicatos, e a greve como direito da classe tra-
c) o amparo legal aos inquilinos contra a ga- balhadora, embora defendesse o voto como a melhor
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arma reivindicatória. Mas, a sua solução "ampla e Liga Nacionalista de São Paulo
duradoura" residia na formação de produtores inde-
pendentes com a eliminação dos assalariados e dos
patrões. Não propugnava pela extinção da grande A Liga Nacionalista de São Paulo (LNSP) foi
indústria, do grande comércio ou da propriedade uma entidade que surgiu vinculada às escolas supe-
agrícola. O que importava era a maximização da riores no final de 1916, na capital paulista, fruto da
produção de riquezas, com "o menor dispêndio de campanha de Olavo Bilac em prol do "reerguimento
forças" . do caráter nacional".
Por outro lado, reconhecia que o capitalista era Afirmando ser uma associação extrapartidária,
avaro e ganancioso, pretendendo obter a máxima a LNSP tinha como objetivos principais lutar pelo
I renda, pagando o mínimo, mas argüía que as greves voto secreto e obrigatório, pela efetiva aplicação da
se resumiam na solicitação de salário e na dimi- lei da obrigatoriedade do serviço militar e pela di-
nuição das horas de trabalho. Além do mais, se- fusão da instrução e desenvolvimento da educação
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Vários dos integrantes da LNSP tiveram parti-
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cipação política não só enquanto a entidade existiu, rária, funcionavam de 2~S às 6~S feiras das 19hOO
Ilill mas também após o seu fechamento, seja através do às 20h30, e nelas só podiam ser matriculados os indi-
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Partido Democrático (e, posteriormente, da UDN), víduos que não pudessem efetivamente freqüentar
ou em movimentos como o de 1932. Lembre-se, por aulas durante o dia.
exemplo, o nome de Antônio de Sampaio Dória ou de É, no entanto, em torno da luta pela obrigato-
Armando de Salles Oliveira, interventor no Estado riedade e segredo do voto que a LNSP centralizou
de São Paulo em 1933~ toda a sua atuação. A prática da democracia somen-
Por outro lado, a presença de Jorge Street no te estaria assegurada quando se pusesse fim às frau-
Conselho Deliberativo da Liga tem de ser explicada. des e violências que caracterizavam as eleições. Jul-
Qual o interesse de um representante do setor indus- gava-se necessária uma reformulação institucional
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48 Silvia Levi-Moreiro
campo da luta política, a Liga admitia somente o anarquismo: O não reconhecimento da luta política
\ voto, "única arma ordeira" através da qual se daria o
solucionamento do problema operário.
formal. Os anarquistas rejeitavam qualquer forma
de ação a nível parlamentar, terreno de luta política
Pode-se afirmar que a LNSP procurava sempre privilegiado pela LNSP. Era exatamente a instância
diluir o conflito social apelando para os chamados jurídico-política que a Liga reconhecia como único
"interesses nacionais". A retórica nacionalista da campo legítimo para o enfrentamento das diferentes
I Liga evitava qualquer identificação com uma deter- correntes de opinião.
minada corrente ideológica, na tentativa de obter o . No voto secreto a Liga depositava suas espe-
I' consenso de todos os setores da sociedade para a sua ranças de conter, de certa forma, a insatisfação so-
IIII atuação. Mas esse consenso nem sempre foi obtido. cial urbana, agravada com a elevação do custo de
As classes dominantes e as classes dominadas não en- vida. A Liga pretendia, com o voto secreto, prevenir
11,· caravam da mesma maneira a questão nacional. Eis I W qualquer alteração drástica da estrutura social. Não
como se colocava o jornal O Combate por ocasião da há dúvida que era a mobilização autônoma das clas-
greve de 1917: ses operárias o que aterrorizava os grupos domi-
nantes. Para a Liga, a solução da questão social pas-
"Da mesma forma que o sr. Altino Arantes pode se sava principalmente pelo problema da representati-
'11: fazer jesuíta à hora que quiser, o sr. Leuenroth tem o vidade do poder.
direito de combater todas as crenças religiosas e de A LNSP empenhou-se em reformular a lei elei-
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pregar o ateísmo. Como a Liga Nacionalista quer sal- II toral. E isso com dois objetivos: ter alternativas para
var a Pátria com o voto, o sr. Sanchez pode clamar o ascenso do movimento operário e romper o mono-
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contra o sufrágio universal. Nem por isso Augusto pólio político-partidário do PRP, visto pela Liga
Compte foi para a cadeia" (O Combate, 21.9.1917). como um fator de instabilidade social. No entanto, a
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Ir , I Paulo e para o Brasil, sendo vista como única via Constituição, tornando uma realidade o go-
i 11; I para que os integrantes da Liga se impusessem poli- verno do povo e opondo-se a qualquer revisão
ticamente. Fosse isso contra o PRP, fosse como alter- constitucional que implique restrição às garan-
nativa às propostas anarquistas do movimento ope- tias e liberdades individuais.
rário. I 2?) Pugnar pela reforma da lei eleitoral no sentido
. A LNSP foi fechada em 1924 acusada de envol- de garantir a verdade do voto, reclamando,
para isso, o voto secreto e medidas assegurado-
vimento na revolta njilitar ocorrida em São Paulo,
ras do alistamento, do escrutínio da apuração e
embora sua atitude tenha sido de neutralidade du- do reconhecimento.
rante todo o conflito. A associação não mais seria 3?) Vindicar para a lavoura, para o comércio e
reaberta. Diversos de seus membros acabariam por para a indústria a influência a que tem direito,
integrar o Partido Democrático, fundado em 1926. por sua importância na direção dos negócios.
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Na parte final do manifesto-programa (22.3. o PD participou do pleito federal de fevereiro
1926) do PD eram explicitados os pontos básicos do de 1927, tendo eleito alguns de seus candidatos para
partido: a Câmara dos Deputados. Tanto nas eleições de
11 1927 quanto nas de 1928, o PD não conseguiu eleger
"I?) Defender os princípios liberais consagrados na nenhum candidato ao Senado Federal. Em 1928, o
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55
A questão que se coloca é: Afinal, a que vinha o do PRP, O PD contrapunha o "estado de Direito"
Partido? O que teria levado os dissidentes do PRP a (M; L. Prado, op. cit., p. 170). Dentro da lei e da
organizar-se em um partido em 1926? No dizer de ordem, a "questão social" seria solucionada.
Maria Lígia Prado, o "PD surgiu com um projeto Além de ajudar a solapar as bases do PRP o PD,
específico para fazer frente ao movimento social que a partir da década de 20, ajudou a difundir a ban-
avançava 'perigosamente' ", bem diferente do projeto deira da democracia, com a luta pelo voto secreto e
implantado pelo governo, apoiado pelo PRP. Se- pela participação eleitoral da população. Isto não in-
gundo a autora, I~ valida, no entanto, a caracterização do PD como um
partido que engendrou um projeto alternativo de do-
" ... 0 PD como partido político foi o primeiro a pro-
minação social. Segundo Maria Lígia Prado, "o pro-
por um projeto alternativo de dominação social. Ele jeto político-social pensado pelo PD constituiu-se na
respondia às questões de seu tempo em que a temá- fórmula mais adequada encontrada pela classe domi-
tica da 'questão social' e da 'revolução'atingiu forte- nante para apagar e neutralizar os antagonismos so-
mente certos grupos da classe dominante. Sua res- ciais e as oposições de classe" (op. cit., p. 176).
posta criticava o simplismo da dominação até então
vigente contida na proposição questão social! ques-
tão de polícia e, ao mesmo tempo, se colocava como
alternativa a saídas mais radicais como a do BOC.
Além disso, a luta ideológica que já se travava com o
socialismo levantava como bandeira a possibilidade
concreta da harmonia social e do congraçamento, o
do surgimento, através do cooperativismo, do produ-
tor livre e independente" (op. cit., p. 165).
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