CAP 11 Amido

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AMIDO

1 INTRODUÇÃO
O amido constitui a mais importante reserva de nutrição de todas as plantas
superiores. Entre os vegetais amiláceos mais usados na alimentação humana destacam-
se os cereais (arroz, milho e trigo), tubérculos e raízes (batata, mandioca, cará, etc.) e
leguminosas (feijão, lentilha, ervilha, etc.). Ocorre também em algas.
Em razão das inúmeras fontes de amido e sua importância nas indústrias
alimentícias, têxteis, de adesivos, de papel, de tintas, de mineração e outros usos, é
importante que ele seja obtido em ótimo rendimento e possua características
condizentes com as aplicações às quais se destina.
O termo “amylum”, de origem greco-latina, significa material farináceo obtido
através da moagem de tubérculos ou de outra fonte vegetal. No Brasil existem os termos
fécula e amido, para indicar se o material é proveniente de partes subterrâneas ou aéreas
das plantas, respectivamente. Assim, as féculas seriam obtidas da mandioca, batata,
cará, araruta, etc., enquanto que os amidos seriam obtidos de arroz, milho, sorgo, trigo,
etc.
A utilização do amido depende, em grande parte, de suas propriedades coloidais.
Quando uma dispersão de amido é aquecida, os grânulos absorvem água, incham e
produzem pastas viscosas que, ao se resfriarem, formam géis. Estas propriedades
dependem da origem do amido e determinam seu aproveitamento em um processamento
específico. O comportamento do amido pode, entretanto ser modificado através da
introdução de certos compostos na sua estrutura ou por meio de tratamentos físicos.
Estas modificações moldam o amido de acordo com a finalidade desejada e possibilitam
o seu emprego nos mais diversos setores industriais. O uso de amidos modificados no
Brasil é recente e restrito. Na maioria das vezes são preparados a partir de milho
(catiônico, pré-gelatinizado, ácido modificado), possivelmente pela falta de
conhecimentos básicos sobre as propriedades do amido. O conhecimento da estrutura e,
em decorrência, das propriedades, é imprescindível para ampliar seu uso industrial e
doméstico.
Ao amido e fécula extraído das plantas, sem alteração denomina-se “nativo” ou
natural. Amido e féculas modificados, tem suas propriedades naturais alteradas,
originando novas e melhores aplicações.
De acordo com Res. 38/76 D.O.U. os amidos modificados por meios físicos e/ou
enzimáticos são considerados amidos genuínos ou naturais e classificados como
ingredientes, já os amidos modificados por meios químicos classificam-se como
aditivos.

2 ESTRUTURA
O amido é composto da mistura de dois polissacarídeos: amilose e amilopectina,
organizados a partir do hilum, vindo a formar o grânulo de amido, cujo diâmetro e
forma apresentam variações inter e intra-espécies medindo e 1 a 2 micras até cerca de
200 micras. Podem possuir formas ovais, esféricas, definidas, excêntricas, chegando às
irregulares. AMANTE, E. R. (1986). (Quadro1).
Além destes polissacarídeos, o grânulo de amido contém compostos
nitrogenados, lipídeos e minerais que, apesar de estarem em baixa concentração, podem
ter uma influência marcante nas propriedades do amido. Por exemplo, o amido de batata
contém 0,04 – 0,10% de fósforo, presente como fosfato esterificado, cujas
características aniônicas afetam o comportamento coloidal do amido. Estes grupos
fosfatos estão presentes quase que exclusivamente na amilopectina. Muitos amidos,
particularmente aqueles provenientes de cereais, contêm cerca de 0,6% de lipídeos que
podem complexar com amilose alterando as propriedades reológicas do amido. Outros

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componentes como proteínas, nucleotídeos e várias substâncias inorgânicas são,


geralmente, considerados como impurezas, uma vez que não estão covalentemente
ligados aos polissacarídeos que compõem o grânulo de amido.
As proporções de amilose e amilopectina influem na viscosidade e no poder de
gelificação do amido.

Quadro 1 - Conteúdo de amilose de amidos de diversas fontes

Fontes de Amido Teor de Amilose (%)


Arroz ceroso * 0
Milho ceroso* 0
Milho 25
Arroz 16
Batata doce 18
Mandioca 18
Batata 18
Trigo 24
Ervilha 30
Milho com alto teor de amilose 80
* Amido contendo só amilopectina
Fonte: BOBBIO,F.º e BOBBIO,P.A., 1995.

2.1 Amilose
É um polissacarídeo linear, formado por unidades de D-glicose (D-
glucopiranoses), unidas entre si por ligações glicosídicas α 1-4, em número que variam
de 200 a 10.000.

HOCH 2 HOCH 2 HOCH 2 HOCH 2


!! O H H ! !! !! O H
H
!! !
O H H O H H
!
!! H ! ! 4H ! ! H! ! ! H !!
!! OH H 1!! ! OH H !_ _! OH H !_ _!! OH H
! !
___ O _! ! O ! ! ! ! O !! !! !___ OH
! !! ! ! ! !
! ! ! ! ! ! H OH
H OH H OH H OH

Final não redutor Unidades de α-D-glucopiranose Final redutor

Figura 2 – Representação da cadeia de amilose.

Na forma cristalina, as ligações glicosídicas na configuração α, conferem à


amilose uma estrutura helicoidal (interior hidrofóbico), que podem se acomodar átomos
de iodo, formando um composto de inclusão de cor azul intensa (Figura 5). Esta reação
é usada na determinação quantitativa de amilose (a absorção de iodo pela amilopectina é
praticamente nula). A cor azul do complexo ocorre quando existem pelo menos 40

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unidades de glicose na cadeia. Cadeias menores dão complexos de cor vermelha,


amarela ou marrom

Figura 5 – Complexo amilose-iodo

Em soluções aquosas diluídas, as moléculas de amilose existem como segmentos


distendidos, com os turnos da hélice muito afastados uns dos outros, para permitir a
existência de pontes de hidrogênio entre ciclos subsequentes da hélice. Ao adicionar
ácidos graxos ou álcoois de alto peso molecular à esta solução diluída, ocorre a
formação de complexos insolúveis, onde a parte hidrofóbica do composto orgânico está
inserida no interior da hélice. A formação destes complexos provoca um enrijecimento
e compactação da hélice, alterando o comportamento da amilose em solução, tornando-a
menos solúvel, e facilmente cristalizável.
Além das reações mencionadas, a amilose em solução tem tendência a formar
agregados cristalinos insolúveis, através de pontes de hidrogênio entre moléculas
adjacentes (intermolecular). Esta instabilidade da amilose é de extrema importância
tecnológica e depende do peso molecular do polímero, pH, temperatura e composição
do meio.
Moléculas de amilose com 150-200 unidades são bastante instáveis, enquanto
que altas temperaturas e pH alcalinos evitam a formação de complexos insolúveis.
Ao adicionar certos lipídeos, evita-se a complexação intermolecular insolúvel,
pois são envolvidos pelas hélices da amilose, formando complexos rígidos com amilose,
impedindo o rearranjo e super posicionamento necessário para uma associação
intermolecular; influenciando na digestibilidade do amido.

2.2 Amilopectina
Constitui a fração altamente ramificada do amido. É um polímero formado por
várias cadeias curtas constituídas de 20 a 25 unidades de α-D-glucopiranose unidas em
1,4, conforme Figura 6. Essas cadeias curtas estão unidas ou ramificadas entre si por
ligações α 1-6, constituindo essas ligações 4 a 5% do total das ligações glicosídicas na
amilopectina.
A estrutura da amilopectina, embora não perfeitamente estabelecida, confere à
ela uma forma esférica, que pode ser representada esquematicamente da seguinte
maneira, Figura 6:
Esta representação da amilopectina é distinguida por três tipos de cadeia:
a) A: é a cadeia ligada ao resto da molécula pelo grupo redutor (C1), ou seja, sem
grupos OH no carbono 6 comprometidos; b) B: são cadeias com um ou mais grupo
OH no carbono 6 comprometidos com o grupo redutor de outras cadeias; c) C: é a
cadeia que contém o grupo final redutor, livre.
As cadeias externas da maioria das amilopectinas têm, em média, 12 unidades de
glicose. Como, em média, a cadeia total tem 20 unidades de glicose e cada cadeia é
ramificada apenas uma vez, o tamanho médio da cadeia no interior é de 8 unidades de

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glicose. Estes resultados indicam também que a quantidade de cadeias A é igual a de


cadeias B.

HOCH2

H !! O
H Ligação α-1,6 entre duas
!!! !1
OH H !!!
unidades de glicose
___ O _!
! ! !_ O
! ! !
H OH
HOCH2 6CH2
H !!! OH H ! OH
!! H ! ! ! ! !
!!! OH H !! 1 4 H! !_ _
_ O _! OH H
! !!! !___ O _! ! ! ! O
! ! !
H OH H OH

Ligação α-1,4 entre duas


unidades de glicose

Figura 6 – Representação da cadeia da amilopectina.

A título de ilustração, o Quadro -2 abaixo compara as propriedades da


amilopectina e amilose.

Quadro 2 - Comparação entre as propriedades de amilose e amilopectina


AMILOSE AMILOPECTINA

Reação com iodo Azul intenso Vermelho violeta


Afinidade por iodo 19 – 20 % 1%
5 6
Peso molecular 10 – 10 10 – 10 8
7

Extensão da cadeia (número médio de unidades


de glicose por grupos redutores) 2.000 ou mais 19 – 28
Extensão da cadeia externa (número de glicose
médio) - 12 – 17
Extensão da cadeia interna (número de glicose
médio) - 5–8
Análise de Raio X Cristalino Amorfo
Solubilidade em água Variável Solúvel
Estabilidade em solução aquosa Retrograda Estável
Viscosidade intrínseca (1) 1,8 – 2,2 1,8 – 2,0
Oxidação por Periodato (IO 4 --- ) 3 Ác. Fórmico (n+2)
1)
A maior viscosidade da amilose em relação à amilopectina é devido à forma de
bastão (reta) da amilose, em comparação com a forma “globular” da amilopectina.
Fonte: CIACCO,C.F.; CRUZ,R.

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3 ESTRUTURA DO GRÂNULO DE AMIDO

O grânulo de amido é constituído de moléculas de amilose e amilopectina


associadas entre si por pontes de hidrogênio, formando áreas cristalinas radialmente
orientadas. Entre estas áreas cristalinas existem regiões amorfas, nas quais as moléculas
não têm uma orientação particular. As áreas cristalinas mantém a estrutura do grânulo e
controlam o comportamento do amido na água. É por este motivo que o grânulo de
amido exibe uma capacidade limitada de absorção de água, embora seja constituído de
polímeros solúveis ou parcialmente solúveis neste líquido.
O arranjo cristalino no grânulo de amido tem sido objeto de inúmeros estudos.
Entretanto, as características das áreas cristalinas, a nível molecular, ainda não foram
totalmente determinadas.

4 - CARACTERÍSTICAS TECNOLÓGICAS DO AMIDO

As características tecnológicas do amido que determinam sua aplicação


industrial são: dilatância; gelatinização; retrogradação; claridade da pasta e
suscetibilidade enzimática.

4.1 - Dilatância

O grânulo de amido no seu estado natural não é solúvel em água fria, e forma
suspensões com determinadas características reológicas.
Suspensões concentradas de amido comportam-se como fluidos dilatantes, ou
seja, exibe um aumento na resistência do fluxo com aumento na força de cisalhamento;
sendo difíceis de bombear e com fluxo irregular.
O fluxo de dispersões concentradas de amido (34%) é variável em função da
pressão aplicada. Aumentos excessivos de pressão causam interrupção do fluxo,
podendo chegar a total paralização do fluxo.

4.1.1 - Importância tecnológica da dilatância

O comportamento reológico das dispersões de amido é bastante importante na


indústria de extração. A concentração e lavagem do amido são feitas com auxílio de
centrífugas contínuas e/ou hidrociclones. Devido ao fenômeno da dilatância, a
concentração de amido deixando os equipamentos mencionados, deve ser
cuidadosamente controlada. Para melhor eficiência no processo, a concentração de
amido é a mais alta possível, sem contudo apresentar propriedades dilatantes.
Outros fatores como a temperatura e concentração de íons podem ter influência
na concentração limite para ocorrência da dilatância. Como a dilatância depende da
porcentagem de volume da fase sólida e não da quantidade de matéria seca, os fatores
que alteram o volume das partículas determinam a concentração limite para a dilatância.
A absorção de água pelo grânulo do amido natural e, consequentemente o seu
volume, depende da temperatura do meio. Para temperaturas abaixo da temperatura de
gelatinização, o grânulo de amido tem um coeficiente negativo de expansão, ou seja, o
volume do grânulo à temperatura do meio são inversamente proporcionais. Assim, a
maior eficiência nas etapas de purificação e concentração do amido é alcançada, quando

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a dispersão tem temperaturas mais altas. Na prática, a temperatura deve ser em torno de
30ºC.

4.2 - Gelatinização

Gelatinização é, em geral, o termo aplicado à seqüência de transformações que


ocorrem quando uma dispersão de amido é aquecida.
O grânulo de amido natural tem uma capacidade limitada de absorver água fria.
Esta capacidade é controlada pela estrutura cristalina do grânulo que, por sua vez,
depende do grau de associação e arranjo molecular dos componentes do amido.
O aquecimento de uma suspensão aquosa de amido provoca a quebra de pontes
de hidrogênio, que mantém o arranjo molecular dentro do grânulo de amido. Os grupos
hidroxilas das unidades de glicose que participavam das áreas cristalinas são hidratados
e o grânulo de amido incha. Fundamentalmente, a gelatinização do amido em vários
meios é atribuída à afinidade química dos componentes do amido, particularmente os
grupos hidroxilas, pelo solvente. A quebra das pontes de hidrogênio e o conseqüente
entumescimento pode, assim, ser conseguida por agentes químicos, como o NaOH,
NH4OH, etc.
Quando uma suspensão de amido é aquecida, os grânulos não mudam de
aparência até que uma temperatura crítica seja alcançada, e o processo de inchamento é
reversível e as propriedades óticas como a birrefringência dos grânulos, permanecem
inalteradas. Nesta temperatura, o grânulo começa a entumecer e simultaneamente perde
suas características de birrefringência e o inchamento irreversível, indicando alterações
na estrutura cristalina. Devido às características individuais, nem todos os grânulos
começam a inchar na mesma temperatura. Este processo geralmente ocorre em uma
faixa de temperatura de 5 a 10ºC.
Após a faixa de gelatinização, as pontes de hidrogênio continuam a ser
rompidas, o grânulo a inchar e a amilose começa a ser lixiviada do grânulo, difundindo
para o meio aquoso. Como conseqüência direta do entumescimento, ocorre um
aumento na solubilidade do amido, claridade e viscosidade da pasta. O entumescimento
dos grânulos continua até que estes sejam rompidos, e a estrutura granular deixe de
existir. A 120ºC todos os grãos estarão dissolvidos. Com o rompimento dos grânulos,
a viscosidade decresce abruptamente.
O comportamento do amido em água, quando aquecida, pode ser avaliado
através de vários métodos. Entre os mais usados destacam-se:

a) - Perda de birrefringência

Consiste em observar ao microscópio, com luz polarizada, as transformações no


grânulo enquanto estes são aquecidos em água. É o mais preciso para a determinação
da faixa de gelatinização. A perda de birrefringência é devida à destruição das áreas
cristalinas no grânulo.

b) - Poder de inchamento e solubilidade

O Poder de inchamento é dado pela relação entre o peso do sedimento, o qual é


obtido após aquecimento de uma dispersão de amido, e o peso do amido seco.
Para se obter informações fundamentais sobre o inchamento do grânulo, é

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necessário que a gelatinização do amido seja conduzida em excesso de água, permitindo


que os grânulos possam inchar livremente e sem desintegração mecânica.
As diferenças observadas entre os amidos de batata, milho e mandioca são
decorrentes do tipo de estrutura cristalina existentes nos vários amidos. Esta estrutura,
por sua vez, depende do tipo e grau de associação intermolecular existente entre os
componentes do amido. A nível molecular, muitos fatores podem influir no grau de
associação, forma, composição e distribuição das zonas cristalinas. Entre estes fatores
destacam-se a proporção de amilose e amilopectina, peso molecular, grau de
ramificação, conformação e extensão das cadeias externas da amilopectina.
O aumento de solúveis com a temperatura está ilustrado na Figura 8.
O aumento da solubilidade com a gelatinização é a base para a confecção de
alimentos amiláceos pré-preparados. Após a cocção, algumas farinhas de cereais são
secas, e vendidas como farinhas pré-gelatinizadas. Estas farinhas, devido à
gelatinização prévia, são parcialmente solúveis em água fria facilitando o preparo de
certos alimentos, como por exemplo, pudins, purê de batata pré-preparado, polenta,
cuscuz, etc.

Figura 8 – Solubilidade de vários amidos em função de temperatura.

c) - Viscosidade da pasta

O amilógrafo Brabender é o equipamento mais conhecido e usado para estudos


sobre o comportamento reológico de uma pasta de amido, pois registra continuamente
as variações de viscosidade de uma dispersão de amido aquecida gradualmente
(1,5ºC/min), em Unidades Brabender (U.B.).
A interpretação do amilograma requer um conhecimento dos eventos que
ocorrem durante a gelatinização. Quando uma dispersão de amido é aquecida, os
grânulos incham e virtualmente absorvem toda água disponível. Como resultado, os
grânulos inchados tornam-se mais susceptíveis à desintegração mecânica. Nestas
condições, as forças que mantém a estrutura do grânulo também são enfraquecidas,
contribuindo para a fragilidade do grânulo.

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No início da gelatinização, os componentes solúveis do grânulo difundem para o


meio líquido. Entretanto, quando os grânulos incham suficientemente ocupam todo
volume, é possível que estes solúveis voltem para o seu interior. Neste sistema, os
grânulos e fragmentos destes aderem uns aos outros, formando uma matriz mantida por
pontes de hidrogênio. Assim, a viscosidade registrada é causada pelos grânulos
inchados, pelos solúveis e pela interação ou coesão entre os grânulos.
A Figura 9 ilustra uma amilograma típico. A viscosidade no início aumenta
rapidamente até um máximo e, então, decresce. A temperatura onde a viscosidade
começa a crescer (A) é denominada temperatura de pasta, e não deve ser confundida
com a temperatura de gelatinização (temperatura onde tem início a perda de
birrefrigência, geralmente distingue-se temperatura inicial). A gelatinização de pasta,
contrariamente à temperatura de gelatinização, só ocorre após um inchamento inicial e,
usualmente neste estágio, os grânulos já perderam toda a birrefringência. Quando a
concentração de amido aumenta, pequenas variações no tamanho do grânulo são mais
facilmente detectadas. Assim, a temperatura de pasta é inversamente proporcional à
concentração.
Entre os pontos A e B existe uma situação dinâmica na qual, enquanto alguns
grânulos estão inchando, outros estão se desintegrando, devido à agitação. A
viscosidade máxima (B), por outro lado, caracteriza um equilíbrio entre o aumento de
viscosidade devido ao inchamento, e o decréscimo de viscosidade, causada pela
fragmentação. Após o ponto B, a desintegração prevalece e a viscosidade decresce. A
variação da viscosidade da pasta quando esta é continuamente agitada à temperatura
constante de 95°C por 20 min. (C - D), indica a resistência dos grânulos inchados à
agitação mecânica. O aumento da viscosidade com o resfriamento (D – E) é devido à
associação entre os componentes da dispersão.

Figura 9 – Amilograma obtido com amido de Mandioca a 4,5% (p/v).

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OLKKU e RHA (1978), observando as transformações de uma dispersão de


amido no viscoamilógrafo Brabender, resumiram a gelatinização na seguinte seqüência:
1) hidratação e inchamento dos grânulos em várias vezes do seu tamanho original;
2) perda da birrefringência dos grânulos;
3) aumento da claridade da pasta;
4) rápido aumento de consistência da pasta até atingir um máximo (viscosidade);
5) dissolução e difusão das moléculas lineares provenientes dos grânulos partidos;
6) formação de gel após resfriamento.

4.2.1 - Importância tecnológica da gelatinização

As propriedades de pasta do amido são de particular interesse na maioria das


aplicações industriais. Na indústria alimentícia, a temperatura de gelatinização, poder
de inchamento, viscosidade e estabilidade da pasta são de grande importância e
determinam a utilização de um amido.
Em determinados produtos, como por exemplo, em embutidos de carne, o amido
é usado como estabilizante de emulsão. Como esta propriedade do amido ocorre com a
gelatinização, é necessário usar um amido que tenha temperatura de gelatinização
menor que a temperatura de cocção do embutido. Na prática, o amido de mandioca é
preferido, pois a faixa de temperatura de gelatinização deste é de 58 - 70ºC sendo,
portanto, compatível com a temperatura atingida no interior do embutido durante a
cocção. (72ºC).
A eficiência da hidrólise enzimática também depende da temperatura de
gelatinização do amido. Como a suscetibilidade do grânulo aumenta consideravelmente
com a gelatinização, procura-se hidrolisar o amido a uma temperatura acima da
temperatura de gelatinização. Entretanto, o aumento de temperatura pode desnaturar a
enzima, inibindo sua ação no grânulo. Assim, existe um compromisso entre a
temperatura de gelatinização do amido e a resistência térmica da enzima.
A Figura 10 ilustra amilogramas obtidos com amido de batata, mandioca, milho
e milho ceroso. Os grânulos de amido que incham mais , produzem maior viscosidade,
como os de mandioca, batata, milho ceroso, são frágeis e suscetíveis à ruptura com o
aquecimento prolongado e/ou agitação mecânica. Já o amido de milho, por outro lado,
gelatiniza-se mais lentamente e incha menos, produzindo pastas com viscosidade menor
e mais estáveis que mandioca, batata ou milho ceroso. Portanto o amido de milho é
preferido como espessante em alimentos enlatados, pois a viscosidade das pastas deste
amido pode ser mantida durante a esterilização.

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Figura– 10 – Amilograma de amido de batata, mandioca, milho e milho ceroso.

4. 3 - Retrogradação

É o termo dado às transformações que ocorrem durante o resfriamento e


armazenamento de pastas de amido gelatinizado. Soluções com baixa
concentração de amido (≈2%p/v), tornam-se progressivamente turvas, devido à
agregação e conseqüente insolubilização de moléculas de amido e ao serem
deixadas em repouso, tendem a precipitar. Esses precipitados cristalinos são
formados devido à tendência para formação de ligações intermoleculares da
fração linear, o que não acontece com a amilopectina, na qual essa associação é
dificultada pelas ramificações, permanecendo na solução. Pastas com altas
concentrações formam géis que se tornam mais rígidos e opacos com o tempo.
A retrogradação é, basicamente, um processo de cristalização das
moléculas de amido. Esta cristalização ocorre pela forte tendência de formação
de pontes de hidrogênio entre moléculas adjacentes. A associação das moléculas
do amido propicia o desenvolvimento de uma “rede” tridimensional, mantida
coesa pelas áreas cristalinas. Esta rede é formada por grânulos de amido
parcialmente inchados e componentes do amido em solução. A formação desta
rede durante o resfriamento resulta na formação de géis. Freqüentemente, a
evolução da retrogradação é acompanhada de exudação de umidade do gel
(sinérese), que é a libertação de moléculas de água anteriormente ligadas às
cadeias de amilose.
Na prática, as primeiras indicações da ocorrência da retrogradação são o
aumento de firmeza e opacidade, resistência à hidrólise ácida ou enzimática,
baixa solubilidade em água ou perda da habilidade de formar complexos azuis
com iodo. De uma maneira geral, todas estas transformações podem ser usadas
para avaliação da extensão ou velocidade da retrogradação.
A velocidade de retrogradação de pastas de amido depende de fatores
inerentes ao grânulo ou seus componentes. Entre estes fatores salientam-se: a)
tipo de amido, b) peso molecular, e c) linearidade. A Figura 11 ilustra a
tendência à retrogradação de vários amidos.
O amido de cereais (nativos) tem a maior tendência à retrogradação que
amidos de raízes e tubérculos. É interessante observar que o comportamento do
amido de cereais pode ser devido a sua menor dispersibilidade em relação aos
amidos de raízes e tubérculos.
De uma maneira geral, as moléculas têm maior tendência à retrogradação.
Entretanto, esta tendência depende do peso molecular da molécula. Para a
amilose, a tendência máxima ocorre para pesos moleculares intermediários.
Moléculas muito grandes têm dificuldade em assumir orientação propícia para a
retrogradação. Por outro lado, moléculas muito pequenas, devido ao rápido
movimento Browniano, têm dificuldade em se associar.
Além destes fatores, a retrogradação depende da umidade, temperatura e
pH. Geralmente, a velocidade de retrogradação é máxima para géis com cerca de
30-40% de umidade, conservados ao redor de -4ºC e cujo pH foi ajustado para

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AMIDO

5.0 após a gelatinização. Altas temperaturas ou temperaturas abaixo de -4ºC


inibem a retrogradação.

Figura 11 – Tendência à retrogradação de vários amidos a uma concentração de 2


(p/v)

4.3.1 - Importância tecnológica da retrogradação

A retrogradação é responsável pelo encolhimento, sinérese e


endurecimento de géis de amido conservados por determinado período,
principalmente à temperatura de refrigeração. estes efeitos são mais
evidenciados quando o gel é congelado e descongelado por várias vezes. Em
alimentos como pães, molhos, pudins, etc., a ocorrência da retrogradação é
indesejável e deve ser evitada. O aumento de firmeza em pães durante o
armazenamento é atribuído quase que exclusivamente à retrogradação do amido.
Em pastas ou géis é comum o aparecimento, devido à retrogradação, de uma
película superficial que compromete a qualidade deste produto. Em molhos, a
insolubilização do amido pela retrogradação causa uma separação de fases
indesejável neste tipo de alimento.. A insolubilização do amido durante a
secagem de farinhas pré-gelatinizadas ou de arroz malequizado, também são
exemplos dos efeitos prejudiciais da retrogradação. Nestes alimentos, a secagem
a baixas temperatura, principalmente em determinada faixa de umidade, propicia
uma retrogradação mais intensa, diminuindo a solubilidade das farinhas pré-
gelatinizadas e aumentando o tempo de cocção do arroz malequizado.

Profa. Dra. Nísia Andrade Villela Dessimoni Pinto


AMIDO

Embora os efeitos da retrogradação sejam indesejáveis para a maioria dos


produtos alimentícios, existem alguns casos onde a ocorrência deste fenômeno é
benéfica.
A retrogradação na superfície de batatas antes da fritura diminui a
absorção de óleo e confere uma textura agradável ao produto. Neste
processamento, a gelatinização e posterior retrogradação ocorrem durante o
branqueamento e resfriamento antes da fritura, respectivamente. Em aplicações
industriais onde é necessária a formação de um filme insolúvel, como por
exemplo em papéis de parede, a retrogradação é desejável.
A tendência à retrogradação pode ser minimizada através de modificações
químicas. A introdução de grupos iônicos, como fosfatos, ou hidrofóbicos como
acetil ou propionil, nas unidades de glicose impedem a associação de moléculas
de amido inibindo a retrogradação. Embora estes amidos modificados, assim
como os de batata, milho e sorgo ceroso, entre outros, apresentem baixa
retrogradação, suas pastas são por demais coesivas para utilização em alimentos.
A introdução de ligações cruzadas nestes amidos minimiza esta característica e
viabiliza sua utilização em alimentos.
Assim é possível, através de modificações químicas, moldar o amido de
modo a se obter propriedades tecnológicas desejáveis.

4.4 - Claridade da pasta

A transparência é outra característica importante de pastas de amido e de


grande interesse para a aceitabilidade de um determinado produto pelo
consumidor. Por exemplo, o amido usado como espessante de recheios de tortas
ou usado como cobertura em confeitaria, deve ser transparente. Em outros
alimentos, como nas sobremesas pré-preparadas, a opacidade é uma característica
desejável. Independente destes fatores estéticos, a claridade de pastas de amido
está relacionada com a tendência à retrogradação do amido e, portanto, tem
influência em outras características tecnológicas da pasta. De maneira geral,
amidos com alta tendência à retrogradação produzem pastas mais opacas que
aqueles com baixa tendência à retrogradação.

Profa. Dra. Nísia Andrade Villela Dessimoni Pinto

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