A Bacia Das Almas

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OS DESCENDENTES DE CAIM

AS DEZ GERAÇÕES: Os descendentes de Caim

Caim sabia muito bem que sua culpa de sangue


seria visitada sobre ele na sétima geração, pois
assim Deus havia decretado contra ele. Ele
esforçou-se, portanto, para imortalizar seu
nome através de monumentos, e tornou-se
construtor de cidades. A primeira chamou-se
Enoque, batizada com o nome do seu filho,
porque a partir do nascimento de Enoque Caim
passou a experimentar alguma medida de
descanso e paz. Além dessa Caim fundou outras
seis cidades. Essa edificação de cidades era um
ato de perversidade, porque ele as cercava com
uma muralha, forçando sua família a permane-
cer do lado de
AS DEZ GERAÇÕES: Os descendentes de Caim
Caim sabia muito bem que sua culpa de sangue
seria visitada sobre ele na sétima geração, pois
assim Deus havia decretado contra ele. Ele
esforçou-se, portanto, para imortalizar seu nome
através de monumentos, e tornou-se construtor
de cidades. A primeira chamou-se Enoque,
batizada com o nome do seu filho, porque a partir
do nascimento de Enoque Caim passou a experi-
mentar alguma medida de descanso e paz. Além
dessa Caim fundou outras seis cidades. Essa edifi-
cação de cidades era um ato de perversidade,
porque ele as cercava com uma muralha,
forçando sua família a permanecer do lado de
dentro. Suas outras iniciativas foram todas igual-
mente perversas: a punição que Deus lhe
ordenara não efetuara nenhum aperfeiçoa-
mento moral.
Eles dedicavam todo seu amor e atenção
às esposas estéreis.
Caim pecava a fim de assegurar o seu próprio
prazer, porém seus vizinhos sofriam prejuízo
como resultado. Ele aumentava os bens de sua
casa através de rapina e violência e incitava seus
conhecidos a buscarem prazeres e pilhagens
através de roubo, tornando-se um grande líder de
homens de conduta perversa. Ele introduziu
ainda uma mudança na simplicidade de vida na
qual os homens vinham vivendo, sendo o
inventor dos pesos e das medidas. Dado que os
homens viviam de modo inocente e generoso
enquanto nada sabiam dessas artes, Caim trans-
formou o mundo em maliciosa velhacaria.
Como Caim foram todos os seus descendentes,
perversos e sem piedade, pelo que Deus resolveu
destruí-los.
O fim de Caim lhe sobreveio na sétima geração
dos homens, e lhe foi infligida pela mão de seu
tataraneto Lameque. Lameque era cego, e quando
saía para caçar era conduzindo pelo seu filho
mais novo, que informava o pai quando havia
caça à vista, a qual Lameque então abatia com seu
arco e flecha. Certa vez ele e o filho saíram numa
caçada, e o rapaz discerniu à distância alguma
coisa que tinha chifres; ele tomou-a por um
animal de alguma espécie, e disse ao cego
Lameque que fizesse sua flecha voar. A mira foi
boa, e a presa caiu. Quando chegaram perto da
vítima o rapaz exclamou:
– Pai, o senhor matou algo que se parece um ser
humano em todos os sentidos, exceto que tem um
chifre na cabeça.
Lameque soube de imediato o que acontecera –
tinha matado seu ancestral Caim, que Deus
marcara na testa com um chifre. Em seu
desespero ele bateu as mãos uma contra a outra,
matando inadvertidamente seu filho entre elas.
Infortúnio seguiu-se a infortúnio. A terra abriu a
sua boca e engoliu as quatro gerações nascidas de
Caim – Enoque, Irade, Meujael e Metusael.
Lameque, cego como era, não podia voltar para
casa; teve de permanecer ao lado dos cadáveres
de Caim e de seu filho. Ao entardecer suas
esposas, procurando-o, encontraram-no ali.
Quando ouviram o que ele tinha feito quiseram
separar-se dele, ainda mais por saberem que
qualquer descendente de Caim estava condenado
à aniquilação. Porém Lameque argumentou:
– Se Caim, que cometeu assassinato de forma pre-
meditada, foi punido apenas na sétima geração,
eu, que não tive a intenção de matar ser humano
algum, posso esperar que a retribuição seja
adiada por setenta e sete gerações.
Lameque foi com suas esposas até Adão, que
ouviu ambas as partes e decidiu o caso em favor
de Lameque.
Caim introduziu uma mudança na simpli-
cidade de vida na qual os homens
vinham vivendo.
A corrupção daquela época, e em especial a
depravação da linhagem de Caim, fica evidente no
fato de que Lameque, bem como todos os homens
na geração do dilúvio, casavam-se com duas
mulheres, uma com o propósito de criar filhos, a
outra a fim de entregarem-se às indulgências da
carne – pelo que essa segunda era tornada infértil
por meios artificiais. Como os homens daquela
época tinham inclinação ao prazer ao invés de
desejo de cumprirem seu dever para com a raça
humana, eles dedicavam todo seu amor e atenção
às esposas estéreis, enquanto as outras esposas
passavam seus dias como viúvas, sem alegria e
em depressão.
As duas esposas de Lameque, Ada e Zilá, deram à
luz dois filhos cada um; Adá dois meninos, Jabal e
Jubal, e Zilá um menino, Tubal-Caim e uma
menina, Naamá. Jabal foi o primeiro entre os
homens a edificar templos aos ídolos, e Jubal
inventou a música cantada e tocada dali em
diante. O nome de Tubal-Caim foi bem dado,
porque ele completou a obra de seu ancestral
Caim; Caim cometeu assassinato, e Tubal-Caim, o
primeiro a saber afiar o ferro e o cobre, forneceu
os instrumentos usados em guerras e combates.
Naamá, “a adorável”, ganhou seu nome devido
aos sons doces que produzia de seus címbalos
quando chamava os adoradores a prestarem
tributo aos ídolos.
* * *

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

Paulo Brabo @SAOBRABO


Escrevo livros, faço desenhos e desenho letras.
A Bacia das Almas é repositório final de ideias
condenadas à reformulação eterna.
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Série Lendas dos judeus

1. As primeiras coisas criadas


2. PAULO BRABO, 24 DE DEZEMBRO
DE 2005
3. AS PRIMEIRAS COISAS
CRIADAS

4. Estocado em GOIABAS
ROUBADAS
5. A CRIAÇÃO: As primeiras coisas criadas
6. No princípio, dois mil anos antes do céu e da
terra, sete coisas foram criadas: a Torá,
escrita com fogo negro sobre fogo branco e
repousando sobre o colo de Deus; o Trono
Divino, erguido no céu e que mais tarde
estaria sobre as cabeças dos Hayyot; o
Paraíso à direita de Deus, o Inferno à sua
esquerda; o Santuário Celestial diretamente à
frente de Deus, tendo em seu altar uma jóia
gravada com o Nome do Messias, e a Voz que
clama: “Voltai, filhos dos homens”.
7. Quando decidiu a respeito da criação do
mundo, Deus tomou conselho com a Torá. A
recomendação dela foi:
8. – Oh, Senhor, um rei sem um exército e sem
cortesãos e atendentes não merece o nome
de rei, pois ninguém há perto para prestar-
lhe a homenagem devida.
9. A resposta agradou a Deus sobremaneira.
Dessa forma ele ensinou todas as coisas
terrenas, através do seu divino exemplo, a
nada empreender antes de primeiro
consultar os seus conselheiros.
10. O conselho da Torá foi dado com algumas
reservas. Ela duvidava do valor de um mundo
terreno por causa do pecado do homem, que
iria por certo negligenciar os seus preceitos.
Porém Deus dissipou as suas dúvidas,
dizendo a ela que o arrependimento havia
sido criado muito antes, e que os pecadores
teriam oportunidade de corrigir sua conduta.
Além disso, o serviço do templo seria
investido de poder de remissão, e o Paraíso e
o inferno destinavam-se a fazerem sua
obrigação como recompensa e punição. Final-
mente, o Messias era designado a trazer
salvação, que poria um fim a toda a
pecaminosidade.
11. Porém nem mesmo este mundo
teria permanecido, se Deus tivesse
executado o seu plano original de
governá-lo sob o princípio da justiça
estrita.
Tampouco foi este mundo habitado pelo
homem a primeira das coisas terrenas
criadas por Deus. Ele fez diversos mundos
antes deste, mas destruiu a todos, porque não
se satisfez com nenhum antes de criar o
nosso. Porém nem mesmo este mundo mais
recente teria permanecido, se Deus tivesse
executado o seu plano original de governá-lo
sob o princípio da justiça estrita. Foi apenas
quando viu que a justiça por si mesma traria
a ruína do mundo que ele associou à justiça a
misericórdia, e fez com que ambas governas-
sem conjuntamente. Desta forma, desde o
princípio de todas as coisas prevaleceu a
bondade divina, sem a qual nada teria conti-
nuado a existir. Se não fosse por isso, as
miríades de espíritos malignos já teriam
colocado um fim às gerações dos homens.
Porém a bondade de Deus ordenou que a
cada mês de Nisã, por ocasião do equinócio
da primavera, os serafins aproximem-se do
mundo dos espíritos, e os intimidem de modo
a que eles temam fazer mal ao homem.
13. Além disso, se Deus em sua bondade não
tivesse concedido proteção aos fracos, os
animais mansos já teriam sido há muito
tempo eliminados pelos animais selvagens.
No mês de Tamuz, por ocasião do solstício do
verão, quando a força do beemote está no seu
auge, ele urra tão alto que todos os animais o
ouvem, e por um ano inteiro permanecem
assustados e temerosos, e seus atos tornam-
se menos ferozes do que seriam por
natureza. Novamente, no mês de Tisri, por
ocasião do equinócio do outono, o grande
pássaro ziz bate suas asas e dá o seu grito,
para que todas as aves de rapina, águias e
abutres, recuem de medo, e passem a temer
lançaram-se sobre os outros e aniquilá-los
em sua cobiça. Além disso, não fosse a miseri-
córdia de Deus, o vasto número de peixes
grandes teria rapidamente colocado um fim
nos pequenos. Porém por ocasião do solstício
do inverno, no mês de Tebet, o mar torna-se
agitado, pois o leviatã espirra água, e os
grandes peixes ficam inquietos; eles refream
seu apetite, e os pequenos escapam da sua
rapacidade.
14. Finalmente, a bondade de Deus se
manifesta na preservação de seu povo, Israel.
Ele não poderia ter sobrevivido à inimizade
dos gentios, se Deus não tivesse designado
para ele protetores, os arcanjos Miguel e
Gabriel. Quando acontece de Israel desobede-
cer a Deus, e é acusado de mau comporta-
mento pelos anjos de outras nações, ele é
defendido pelos seus guardiões designados,
com resultado tão positivo que os outros
anjos passam a temê-los. Uma vez que os
anjos das outras nações estão aterrorizados,
as próprias nações não ousam levar avante
seus perversos intentos contra Israel.
15. Para que a bondade de Deus reinasse na
terra como no céu, aos Anjos da Destruição
foi designado um posto na extremidade mais
distante dos céus, do qual não devem nunca
se mover, enquanto os Anjos da Misericórdia
circundam o trono de Deus, às suas ordens.

16.
17. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

18. O alfabeto

19. PAULO BRABO, 03 DE JANEIRO DE


2006
20. O ALFABETO

21. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
22. A CRIAÇÃO: O alfabeto
23. Quando Deus estava para criar o mundo
pela sua palavra, as vinte e duas letras do
alfabeto desceram da terrível e augusta coroa
de Deus onde haviam sido gravadas com uma
pena de fogo flamejante, posicionaram-se em
pé ao redor de Deus, e uma após a outra falou
e pediu:
24. – Crie o mundo através de mim!
25. A primeira a vir à frente foi a letra Tav.
Ela disse:
26. – Ó, Senhor do mundo! Seja da sua
vontade criar o mundo através de mim, visto
que é através de mim que o senhor dará a
Torá a Israel pela mão de Moisés, como está
escrito: “Moisés ordenou-nos a Torá.”
27. O Santo, bendito seja ele, respondeu
e disse:
28. – Não.
29. – Por que não? – perguntou Tav.
30. E Deus respondeu:
31. – Porque nos dias que virão deverei
colocar você como sinal de morte sobre as
frontes dos homens.
32. Assim que Tav ouviu essas palavras da
boca do Santo, bendito seja ele, retirou-se da
sua presença desapontada.
33. A letra Shin deu um passo a frente
e pediu:
34. – Ó, Senhor do mundo, crie o mundo
através de mim, visto que o seu próprio
nome, Shaddai, começa comigo.
35. Infelizmente Shin é também a primeira
letra de Shav, mentira, e de Sheker, falsidade,
e foi por isso desclassificada. Resh não teve
melhor sorte: foi observado que ela era a
letra inicial de Ra’, perverso, e de Rasha’,
maligno, e diante disso a distinção de que ela
desfruta por ser a primeira letra no Nome de
Deus, Rahum, o misericordioso, em nada
contava.
Kof foi rejeitada porque Kelalah, maldição,
pesa mais do que o fato de ser a primeira
letra em Kadosh, o Santo. Em vão Tzade
chamou a atenção para a palavra Zaddik, o
Justo: havia Zarot, os infortúnios de Israel,
testemunhando contra ela. A letra Pe tinha
Podeh, redentor, em seu favor, mas Pesha,
transgressão, refletia desonra sobre ela. Ayin
foi declarada inadequada, porque embora
comece ‘Anawah, humildade, faz a mesma
coisa por ‘Erwah, imoralidade.
36. Samek disse;
37. – Ó, Senhor, seja da sua vontade começar
a criação através de mim, pois o senhor é
chamado como eu de Samek, o Sustentador
de todas as coisas que tendem a cair.
38. Mas Deus disse:
39. – Você é necessária no lugar em que está,
e deve continuar a sustentar todas as coisas
que tendem a cair.
40. Nun é a primeira letra de Ner, “a lâmpada
do Senhor”, que é “o espírito dos homens”,
mas também de Ner, “a lâmpada dos ímpios”,
que será apagada por Deus. Mem começa a
palavra Melek, rei, um dos títulos de Deus,
mas como é também a primeira letra de
Mehumah, confusão, não teve chance de
realizar o seu desejo. A reivindicação de
Lamed trazia sua própria refutação. Ela apre-
sentou o argumento de que era a primeira
letra em Luhot, as tábuas celestiais dos Dez
Mandamentos, esquecendo que as tábuas
eram feitas em pedaços por Moisés. Kaf
estava certa da vitória: tanto Kisseh, o trono
de Deus, quanto Kabod, sua honra, e Keter,
sua coroa, começam com ela. Deus teve de
lembrá-la de que iria bater uma contra a
outra as suas mãos, Kaf, em desespero pelos
infortúnios de Israel. À primeira vista Yod
parecia ser a letra apropriada para o
princípio da criação, devido à sua associação
com Yah, Deus, porém Yezer ha-Ra’, a inclina-
ção para o mal, também acontecia de
começar com ela. Tet identificava-se com
Tob, o bem, porém o verdadeiro bem não é
deste mundo; pertence ao mundo que está
por vir. Het é a primeira letra de Hanun, o
Gracioso; porém essa vantagem é vencida por
seu lugar na palavra para pecado, Hattat. Zain
sugere Zakor, lembrança, mas é ela mesma a
palavra para arma, aquela que fere. Wav e He
compõem o Inefável Nome de Deus, e são
portanto exaltados demais para prestarem
serviço no mundo terreno. Se Dalet represen-
tasse apenas Dabar, a Palavra Divina, teria
sido usada, mas representa também Din,
justiça, e sob o governo da lei sem o amor o
mundo teria caído em ruína. Finalmente, a
despeito de lembrar Gadol, grande, Gimel não
foi escolhida, porque Gemul, retribuição,
começa com ela.
41. Depois que as revindicações de todas
essas havia sido negadas, a letra Bet
aproximou-se do santo, bendito seja ele, e
pediu diante dele:
42. – Ó, Senhor do Mundo! Seja sua vontade
criar o mundo através de mim, levando-se em
conta que os moradores do mundo dão
louvor ao senhor através de mim, como é
dito: “Bendito seja o Senhor para sempre.
Amém e amém”.
43. O Santo, bendito seja ele, atendeu imedi-
atamente ao pedido de Bet.
44. – Bendito o que vem em nome do Senhor
– disse ele.
45. E criou o seu mundo através de Bet,
como é dito: “Bereshit [No princípio] Deus
criou os céus e a terra”.
46. A única letra que absteve-se de fazer
qualquer pedido foi a modesta Alef, e Deus
mais tarde recompensou sua humildade con-
cedendo a ela o primeiro lugar nos Dez
Mandamentos.

47.
48. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.
49.
50. O primeiro dia
51. PAULO BRABO, 26 DE JANEIRO DE
2006
52. O PRIMEIRO DIA

53. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
54. A CRIAÇÃO: O primeiro dia
55. No primeiro dia da criação Deus
produziu dez coisas: os céus e a terra, Tohu e
Bohu, a luz e as trevas, o vento e a água, a
duração do dia e a duração da noite.
56. Embora o céu e a terra consistam de
elementos inteiramente diferentes, eles
foram criados como uma unidade, “como um
panela e sua tampa”. Os céus foram formados
da luz dos trajes de Deus, e a terra da neve de
debaixo do trono divino. Tohu é uma faixa
verde que engloba o mundo inteiro, e produz
a escuridão, e Bohu consiste nas pedras do
abismo, que produzem a água. A luz criada no
princípio não é a mesma luz do sol, da lua e
das estrelas, que apareceram somente no
quarto dia. A luz do primeiro dia era de tal
natureza que teria permitido que o homem
enxergasse num só relance o mundo inteiro
de uma ponta a outra. Antecipando a perver-
sidade das gerações pecaminosas do dilúvio e
da Torre de Babel, que eram indignas de
desfrutar da bençao dessa luz, Deus a
ocultou, mas no mundo que está por vir ela
aparecerá aos piedosos em sua glória
original.
57. Leva-se quinhentos anos para se
caminhar da terra ao céu, e de uma
extremidade do céu à outra, e é neces-
sário o mesmo tempo para se viajar do
oeste ao leste, ou do sul ao norte.
58. Diversos céus foram criados, na
verdade sete, cada um com um propósito
particular. O primeiro, visível para o
homem, não tem função exceto a de encobrir
a luz durante a noite, e por isso desaparece a
cada manhã. Os planetas estão presos ao
segundo céu; no terceiro o maná é fabricado
para os piedosos no porvir; o quarto contem
a Jerusalém celestial juntamente com o
Templo, no qual Miguel ministra como sumo
sacerdote e oferece as almas dos piedosos
como sacrifício. No quinto céu residem as
hostes de anjos, e cantam louvor a Deus,
embora apenas durante a noite, pois durante
o dia a tarefa de dar glória a Deus nas alturas
é de Israel, na terra. O sexto céu é um lugar
sinistro; ali originam-se a maior parte das
provações e visitações ordenadas para a
terra e seus habitantes. Empilhados naquele
lugar estão neve e granizo; há sótãos cheios
de orvalho nocivo, armazéns abarrotados de
tempestades e porões que comportam
reservas de fumaça. Portas de fogo separam
essas câmaras celestiais, que estão sob a
supervisão do arcanjo Metraton. Seu
conteúdo pernicioso maculou os céus até o
tempo de Davi. O piedoso rei orou que Deus
expurgasse de sua exaltada morada qualquer
coisa que estivesse prenhe de maldade; não
era próprio que tais coisas existissem tão
próximas ao Misericordioso. Apenas então
elas foram transferidas para a terra.
59. O sétimo céu, por outro lado, nada
contém que não seja bom e belo: o direito, a
justiça e a misericórdia, os armazéns da vida,
da paz e da benção, as almas dos piedosos, as
almas e espíritos das gerações não-nascidas,
o orvalho com o qual Deus reviverá os
mortos no dia da ressurreição e, acima de
tudo, o Trono Divino, cercado por serafins,
pelos ofanins, pelos santos Hayyot e pelos
anjos ministrantes.
60. Correspondendo aos sete céus, Deus
criou sete terras, cada uma separada da
seguinte por cinco camadas. Acima da terra
mais inferior, Erez, jazem em sucessão o
abismo, Tohu, Bohu, o mar e as águas. Chega-
se então à sexta terra, Adamah, cena da mag-
nificência de Deus. Do mesmo modo, Adamah
é separada da quinta terra, Arka, que contém
o Gehenna e Shaa’re Mawet e Sha’are
Zalmawet e Beer Shahat e Tit ha-Yawen e o
Abadon e o Seol e onde as almas dos
perversos são guardadas pelos Anjos da Des-
truição. Semelhantemente, a Arka segue-se
Harabah, “a seca”, lugar de riachos e
ribeirões, apesar de seu nome; a terra
seguinte, Yabbashah, “o continente”, contém
os rios e nascentes.
61. Tebel, a segunda terra, é a primeira
habitada por criaturas vivas, trezentas e
sessenta e cinco espécies, todas essencial-
mente diferentes das da nossa terra. Algumas
têm cabeças humanas presas a um corpo de
leão, serpente ou boi; outras têm corpos
humanos encimados pela cabeça de algum
desses animais. Além disso, Tebel é habitada
por seres humanos com duas cabeças e
quatro mãos e pés – na verdade, têm todos os
orgãos duplicados exceto o tronco. Acontece
de vez em quando que as partes dessas
pessoas duplas disputam umas com as
outras, especialmente quando comem e
bebem, ocasião em que cada uma exige para
si a porção maior. Essa espécie de humani-
dade é notável por sua grande piedade, outra
diferença entre ela e os habitantes da terra.
62. A nossa própria terra chama-se Heled e,
como as outras, está separada de Tebel por
um abismo, por Tohu, por Bohu, pelo mar e
pelas águas.
A azáfama vai-ou Tohu Tohu va-Bohou ou Bohou
ou (hebraico: ּ֙‫ )ו ָֹ֔בהו ֹ֙תהו‬é um conceito que aparece
no segundo verso da Torá e a Bíblia. Ela é
composta de duas palavras hebraicas lufa-lufa e
relação. A primeira palavra significa agitação
desabitada, deserto inabitável. A segunda palavra,
corpulento significa vazio. As duas palavras
unidas descrever o estado do mundo no
momento da criação do corpulento 1. O segundo
termo é encontrado apenas três vezes na Bíblia e
é, portanto, difícil de definir 2 e está sempre
ligada a agitação.
Parashat Bereshit: Quem eram Tohu e Bohu?
Vamos começar pelo começo. A primeira palavra
na Torá é b'reishit (‫)בראשית‬. o
Tradução Inglês convencional, "No princípio", não
é muito preciso. O prefixo b 'significa "dentro" ou
"às." Isso não é controversa. No entanto reishit
significa "início". É o caso em construção. "Dentro
o princípio "seria Barosh ou barishonah, o que
não é o que a Torá diz. (Esta análise não é
novo. Rashi apontou isso há 900 anos.)
"No início do" o quê? A próxima palavra é bara
(‫)ברא‬. Isso geralmente significa "que ele criou,"
em
o uso pretérito, mas tempo verbal foi bastante
flexível em hebraico antigo. Rashi diz
b'reishit bara é como Bereshit b'ro ("criação de")
‫בראשית ברא כמו בראשית ברוא‬
e ele suporta esta interpretação com vários
outros versos em Tanach em que o mesmo
gramatical
estrutura é usada. Assim, temos a tradução ", No
início da criação do céu e do Elohim
terra ", ou, na tradução JPS," Quando Deus
começou a criar os céus e a terra. "O que temos
não é aqui uma descrição da origem física do
universo. É simplesmente a linha de uma história
de abertura,
"As Aventuras de Elohim." Na verdade, Onkelos,
em sua tradução da Torá do século 2-em
Aramaico, b'reishit processado como b'qadmin, o
que significa, "Era uma vez".
Este é o início de uma história de aventura sobre
os deuses da Mesopotâmia. Os hebreus foram
um ramo distante ocidental da civilização
mesopotâmica. Estamos disse mais tarde em
Gênesis que Abraão era
nascido em Ur, uma grande cidade, na margem do
rio Eufrates que foi o mais importante da
Mesopotâmia
centro religioso em torno de 2000 aC. A palavra
`ivri (" hebreu ") parece significar" aqueles que
cruzaram
over "(o rio Jordão), em outras palavras," aqueles
que vieram do Oriente. "
Nosso texto continua da seguinte forma:
No início da criação do céu e da terra de Elohim, a
terra era Tohu e Bohu.
As palavras tohu e bohu não são hebraico. O
sufixo -u os marca como estrangeira. Em
hebraico, -u é um
verbo terminando, mas estes são substantivos.
Eles são mais prováveis palavras sumérias. Em
língua suméria,
substantivos geralmente terminam em -u, em
especial nomes próprios, como os nomes das
pessoas e os nomes dos
deuses.
Os sumérios eram um povo não-semita que
chegaram, aparentemente por via marítima, no
que é hoje
sul do Iraque em torno de 5000 aC. Eles
estabeleceram uma civilização notável para as
grandes cidades com impressionante
edifícios, agricultura em grande escala, com
sistemas de irrigação e drenagem elaborados,
altamente desenvolvida fina
artes, um sistema jurídico altamente
desenvolvido, e uma prática religiosa sofisticada
e complexa. Elas
desenvolveu um dos primeiros sistemas de
escrita do mundo e deixou uma extensa literatura
escrita.
A maioria dos povos do Oriente Médio, então e
agora, foram semitas. Suas línguas
(Aramaico, acadiano, etc.) são da mesma família
de línguas como hebraico. Suméria, em contraste,
parece
não estar relacionado com qualquer outra língua
conhecida. Os semitas eram tribos seminómades
com economias
com base em animais. A situação entre os semitas
e sumérios por volta de 2500 aC foi
um pouco semelhante ao das tribos germânicas
contra os romanos nos últimos anos do Roman
Império. Suméria foi conquistada pelos semitas
no ano 2340 aC. Houve um ressurgimento da
Independência sumeriana, centrado em Ur, por
volta de 2000. Por fim, os sumérios foram
reconquistadas em volta
1750 por uma tribo semita chamado os
babilônios (também chamado de Akkadians) e
absorvidos no
Império Babilônico. Sumeriana gradualmente
morreu como uma língua falada, mas continuou
como o idioma
de contratos de negócios, medicina e religião,
assim como fez Latina na Europa. Mitologia
suméria era
adoptado pelos conquistadores, tanto quanto os
europeus do norte adotou o cristianismo, a
religião do
Romanos.
Os sumérios também tinha uma história da
criação, chamado emuná Elish. Ele é só existiam
em translations--
um por assírios e babilônios por outro. A versão
assíria é fragmentário, mas o
Versão babilônica está quase concluída. A versão
babilônica está no idioma acadiano excepto
que a maioria dos personagens têm sumeriana,
ou Sumerianized, nomes, por exemplo, Anu,
Shazu, Asharu,
Kingu, Addu, Dumuduku, Enbilulu. O fim do
processo de criação é muito semelhante à criação
como descrito na Torá, com a criação do céu e da
terra, corpos celestes, e assim por diante,
terminando
com a criação de pessoas, mas emuná Elish
também inclui uma descrição detalhada do que
aconteceu
antes que o céu e a terra foram feitas. Aqui está a
abertura do texto (I: 1-12):
Quando lá em cima o céu não tinha sido nomeado,
Lá embaixo, a terra não tinha sido chamado pelo
nome;
Apsu primordial, seu criador,
Mummu, [e] Ti'amat, ela, que deu à luz a todos
eles,
Misturavam suas águas juntos,
E não terras de pastagem havia sido formada,
nem mesmo uma cana pântano era para ser visto;
Quando os deuses não tinha sido trazido à
existência,
Eles não tinham sido chamados pelo nome, seus
destinos ainda não tinha sido fixado,
[Naquela época] eram os deuses criados dentro
deles.
Lachmu e Lachamu veio a existir; eles foram
chamados por nomes.
Mesmo antes de terem crescido [e] se tornar alto,
Anshar e Kishar foram criados; eles superaram-
los [em estatura].
Há um grande elenco de personagens, todos eles
deuses, muitos deles personificações de naturais
fenômenos. Apsu é a água doce, encontrados hoje
em rios e aquíferos subterrâneos. Ti'amat é o sal
água. Mummu é a névoa que se forma sobre as
águas. Sul do Iraque é coberta com água salobra
pântanos, onde o oceano encontra a água do rio.
A variação sazonal mais marcante neste ambiente
é
a inundação anual de água doce do derretimento
da neve chega do Eufrates, que no final do ano
regride e é substituído por água salgada do Golfo
Pérsico.
No início só temos Ti'amat e apsu se misturaram,
com o servo de Apsu e
conselheiro Mummu pairando acima. Ti'amat e
apsu têm vários filhos, que, em seguida, ter filhos
e
netos de sua própria. Depois de Ti'amat e apsu
bisnetos crescer até a idade adulta eles
começam a ficar juntos para festas estridentes
altos, que perturbam muito Ti'amat que só quer
descansar em
paz e sossego. Apsu tenta levá-los a manter o
nível de ruído baixo de modo que ele e Ti'amat
pode obter
seu sono, mas sem sucesso. Mummu aconselha
apsu para matar todos os bisnetos, e em
Desesperado, ele decide realizá-la, apesar do
protesto de Ti'amat que tal curso de ação é muito
drástica. Um dos netos, um deus chamado Ea,
conhecido por sua grande sabedoria, aprende de
Mummu e
O plano de Apsu. Ele usa um encantamento
mágico para paralisar apsu e, em seguida, para
salvar a nova geração de
deuses, Ea mata Apsu e declara-se rei dos deuses.
Ti'amat está devastada. Ela chora apsu por
muitos anos, e seu profundo pesar (e
continuando
insônia?) a leva gradualmente em uma raiva
profunda. Ela assume a forma de um dragão
temível e continua
o tumulto em busca de Ea. Ea engaja-la na
batalha, mas logo foge em terror. Tudo parece
perdido para o
gerações mais jovens, mas, em seguida, um dos
filhos de Ea, um jovem deus cintas chamado
Marduk, leva para o campo
e luta com Ti'amat. Depois de uma luta feroz que
ele consegue captar Ti'amat em uma rede gigante.
Ele, então,
mata-la, atirando uma flecha em sua boca aberta
que perfura seu coração.
Marduk leva a substância de Ti'amat e de Apsu e
cria a partir deles o céu e a seca
terra. Ele divide o cadáver de Ti'amat em dois;
torna-se um meio para o mar, enquanto a outra
metade se torna
o firmamento. (Compare com Salmo 148: Louvai-
o, alto do céu e da água que está acima da
céu, deixe-os elogiar o nome Adonai, porque Ele
mandou, e logo foram criados.) Marduk
coloca uma cobertura sobre o cadáver de apsu
para fazer a terra firme (o que explica por que se
você cavar fundo
o suficiente, você vai encontrar água doce). Ele
faz moradas no céu para os outros deuses (a
quem nós
ver até hoje como as estrelas). Ele conclui sua
criação, fazendo os seres humanos, para que eles
para construir
templos e, em seguida, para realizar rituais nos
templos que proporcionam conforto aos deuses.
Diferentes cidades
assumir a responsabilidade por diferentes
deuses, que por sua vez, asseguram o bem-estar
dos cidadãos do seu
cidades correspondentes. No final da criação de
Marduk, os deuses jogou um grande banquete,
onde eles
relaxado com música e cerveja, e eles ", elogiou o
trabalho que [Marduk] tinha feito."
As versões babilônicos e assírios desta história
são essencialmente idênticas, com uma exceção:
Enquanto Marduk é o herói da versão babilônica,
o herói da versão assíria é um deus chamado
Enlil. Acontece que o deus Marduk foi atendido
por a cidade de Akkad, a cidade capital do
Império Babilônico, enquanto Enlil era o deus da
Assíria, a capital do Império Assírio. Unknown,
parece que o ponto principal da história é
explicar por que é que a cidade especial, que
acontece
para ser politicamente dominante deveria estar
no comando do império.
Em nossa versão da história, Ti'amat é chamado
de "Tohu" e Apsu é chamado de "Bohu." Nosso
texto
continua como se segue:
No início da criação do céu e da terra de Elohim,
A Terra consistiu de Tohu e Bohu, e através da
água salgada era escuridão e sobre o
água doce um sopro divino pairava.
Já no início da criação, existe água salgada
(t'hom) e de água doce (mayim). O sal
água é chamado de "Tohu", enquanto a água doce
é nomeado "Bohu", e acima Bohu paira o deus
nevoeiro, não
referido pelo nome, mas presumivelmente
conselheiro confiáveis do Bohu Mummu - note
que ele só paira acima do
de água doce, e não a água salgada. A Torá refere-
se aos deuses pai e mãe por seus nomes próprios,
enquanto emuná Elish se refere a eles usando
títulos. Em sumério a palavra apsu literalmente
significa "a sua
pai ", ou seja, o pai dos deuses. Ti'amat é a versão
acadiana de uma raiz semítica comum que
foi provavelmente pronunciado algo como
Tihamah (em hebraico, t'hom) que significa
"oceano", que possivelmente
derivada originalmente do nome sumério Tohu.
Em nossa versão nós colocamos nosso deus tribal
particular, o protetor dos Hebreus, no papel do
herói que cria o mundo como nós o conhecemos
fora da substância da mãe Tohu e o pai Bohu.
A história da criação foi, provavelmente, tão
familiar para os povos do Oriente Médio que a
mera menção de
Tohu e Bohu e o sopro divino que paira acima
teria sido suficiente para chamar a atenção para a
plena
história - as descrições das genealogias divinas e
batalha poderia ser omitida.

O nome da Torá usa para o herói da nossa


história é Elohim. A palavra hebraica elohim
literalmente
significa "deuses", no plural. (O singular seria
eloah.) O sufixo -im marca elohim claramente
como
plural, mas quando se refere ao nosso Deus, ele é
usado com verbos conjugados no singular.
Quando eu comecei
Leitura de Torah em hebraico eu estava muito
perplexo com o fato de que a primeira frase do
texto sagrado de
nossa religião "monoteísta" refere-se a Deus
como "Deuses". No entanto, esta utilização pode
ser compreendido pelos
comparando com a seção final de emuná Elish. No
banquete em honra de Marduk, os 50 deuses de
Geração de um Marduk por um doar seus nomes
sobre ele, como declarações de subserviência.
Com
cada nome, Marduk assume as competências e
responsabilidades do deus correspondente. Por
exemplo,
Addu, o deus das nuvens de trovão, dá o seu
nome para que Marduk agora estará a cargo de
fornecendo chuva. Nibiru, que controla os cursos
das estrelas, dá o seu nome e que agora também
torna-se responsabilidade de Marduk.
Posteriormente, os deuses se referir a Marduk
como "Fifty":
Com o nome de "Fifty"
Os grandes deuses de cinqüenta nomes liguei
para ele e, assim, fez sua maneira preeminente.
Finalmente, Ea, o pai de Marduk, dá o seu nome
em seu filho, dizendo:
... Seu nome será Ea!
A totalidade de todos os meus ritos cerimoniais,
ele deve controlar; e todos os meus juízos, ele
deve dirigir.
É neste espírito que a Torá usa "Deuses" como
um título honorário para o deus preeminente que
tomou
as responsabilidades de todos os deuses.
Elohim é, portanto, um título honorário para o
nosso Deus, cujo nome próprio, aliás, é Yahu (com
a
Sumeriana sufixo -u). Em nossas escrituras, Yahu
é encontrado principalmente em nomes
compostos de pessoas;
Considere os seguintes exemplos, entre muitos:
Eliyahu (Elias) "Meu deus é Yahu"
Yirm'yahu (Jeremias) "Yahu é exaltado"
Y'sha`yahu (Isaías) "Yahu vem para o resgate"
Rei Uziyahu "Minha força é Yahu"
Rei Y'chizqiyahu "Yahu é poderosa"
e assim por diante.
A interpretação convencional dos versos da Torá
abertura como uma proclamação teológica
do monoteísmo é claramente errada. Yahu é um
descendente dos deuses Tohu e Bohu, que, claro,
existia muito antes que Ele nasceu. Yahu mata
Sua bisavó Tohu e, assim, cria a
mundo físico. No entanto, o ponto da história não
é explicar a física da criação, mas sim para
proclamar: "Nosso Deus é mais corajoso e mais
forte do que o seu deus." Isso prepara o terreno
para a subsequente
capítulos da Torá que contam em detalhes a
nossa história nacional criação. Isaías, no
haftarah para este Torah
leitura, de forma concisa resume toda esta
história em apenas dois versos (42: 5-6):
Assim diz o deus HaSheim, criador do céu, a quem
a estendeu, e aquele que
fez a terra e seus povos, dando almas para as
nações da terra, espírito aos que andam
sobre ele:
I, HaSheim, proclamou que você seja justo e fez-
lhe expandir e deu-lhe um nacional
convênio de ser uma luz para as nações.
(Isaías, aliás, usa o nome apropriado de Deus em
sua forma mais sagrado - Yahu com um h
adicional no
fim. É desrespeitoso para alguém que não seja o
Sumo Sacerdote pronunciar esse nome, assim que
eu fiz
a substituição tradicional HaSheim, "O Nome".)
Isaías começa lembrando-nos que o nosso Deus é
o
Deus que criou o céu e a terra. Ele então diz a
ideologia central da Torah:
(1) A nação de Israel foi escolhido para uma
missão particular.
(2) Essa missão consiste em se comportar de
acordo com um determinado padrão de
comportamento.
(3) Ao fazer isso fizermos a nossa parte no
grande projeto de fazer do mundo um lugar
melhor - por
dando um bom exemplo para outras nações a
seguir.
O tipo de análise que apresentei aqui, com base
em evidências arqueológicas e linguística
estudos, nos dá um vislumbre do nosso folclore
nacional antes de ser redigido, preenchendo os
detalhes omitidos por
os redatores. O ato de colocar em escrever um
texto sagrado que foi previamente transmitida
apenas oralmente é
um evento extremamente significativo na história
de uma nação. Até então, as histórias são fluidas,
mudando
gradualmente de geração em geração. Escrever
uma história para baixo é como construir uma
barragem em um rio: It
dá especial destaque à parte do rio, pouco antes
da barragem. Isso já aconteceu duas vezes em
nossa
história, pela primeira vez quando a Torá foi
redigido e, em seguida, em torno de 200 dC,
quando o rabino Judá decidiu ter
Mishná registadas por escrito. Estes dois grandes
protuberâncias no rio pode fazer judaísmo
aparecer estática
e imutável, mas na verdade um princípio
fundamental da hidrodinâmica (a "equação da
continuidade")
nos assegura que a água continua a fluir na
mesma taxa. É tentador para se concentrar
apenas sobre a Torá e
Mishná, porque é muito conveniente ter textos
claros na frente de nós, mas a civilização judaico
prosseguiu o seu fluxo constante, antes e depois
desses dois textos escritos.
David Goodson
Outubro
63. Hostes de anjos cantam louvor a
Deus, embora apenas durante a noite,
pois durante o dia a tarefa de dar glória
a Deus nas alturas é de Israel, na terra.
64. Dessa forma uma terra ergue-se acima da
outra, da primeira à sétima, e acima da
sétima estão dispostos os céus, do primeiro
ao sétimo, sendo que o último deles está
preso ao braço de Deus. Os sete céus formam
uma unidade, os sete tipos de terra formam
uma unidade, e os céus e a terra juntos
formam também uma unidade.
65. Quando Deus fez o presente céu e a
presente terra, “o novo céu e a nova terra”
também foram gerados, bem como as cento e
noventa e seis mil palavras que Deus criou
para sua própria Glória.
66. Leva-se quinhentos anos para se
caminhar da terra ao céu, e de uma extremi-
dade do céu à outra, e também de um céu ao
seguinte, e é necessário o mesmo tempo para
se viajar do oeste ao leste, ou do sul ao norte.
Apenas um terço deste vasto mundo é
habitado, sendo que os outros dois terços são
divididos igualmente entre água e terras
desertas.
67. Além das porções habitadas a leste está o
Paraíso com suas sete divisões, cada uma
designada aos piedosos de determinada
categoria. O oceano está situado a oeste, e é
salpicado de ilhas que são habitadas por
muitos povos diferentes. Além dele, por sua
vez, está a estepe sem fim cheia de serpentes
e escorpiões e destituída de qualquer espécie
de vegetação, quer sejam gramíneas ou
árvores. Ao norte estão os suprimentos de
fogo-do-inferno, de neve, granizo, fumaça,
gelo, escuridão e tempestades, e naquela vizi-
nhança toda sorte de diabos, demônios e
espíritos malignos. Sua habitação é uma
grande extensão de terra que levaria qui-
nhentos anos para atravessar. Além dela jaz o
inferno. Ao sul localiza-se a câmara contendo
reservas de fogo, a caverna da fumaça e a
forja dos ventos e furacões. Acontece então
que o vento que sopra do sul traz calor e
mormaço sobre a terra. Não fosse pelo anjo
Ben Nez, o Alado, que retém o vento sul com
suas plumas, o mundo seria consumido. Além
disso, a fúria de suas rajadas é temperada
pelo vento norte, que aparece sempre como
moderador, qualquer que seja o outro vento
que estiver soprando.
68. A leste, oeste e sul, céu e a terra tocam
um ao outro, mas o norte Deus deixou por
terminar, para que a qualquer homem que
afirmasse ser deus fosse oferecida a tarefa de
suprir a deficiência, de modo a ser
condenado como impostor.
69. A terra começou a ser construída pelo
centro, com a pedra fundamental do Templo,
a Eben Shetiyah, pois a Terra Santa é o ponto
central da superfície da terra, Jerusalém é o
ponto central da Palestina e o Templo está
situado no centro da Cidade Santa. No
santuário em si o Hekal é o centro, e a Arca
santa ocupa o centro do Hekal, erigido sobre
a pedra fundamental, que é dessa forma o
centro da terra. Dali lançou-se o primeiro
raio de luz, cortando a Terra Santa, e a partir
dali iluminando toda a terra. A criação do
mundo, no entanto, não poderia ter tomado
lugar até que Deus banisse o senhor da
escuridão. “Retire-se”, Deus disse a ele, “pois
desejo criar o mundo através da luz”. Apenas
depois que a luz havia sido formada surgiram
as trevas, a luz governando o céu, as trevas a
terra. O poder de Deus manifestou-se não
apenas na criação do mundo de coisas, mas
igualmente nas limitações que ele impôs
sobre cada uma. Os céus e a terra
estenderam-se em comprimento e largura
como se aspirassem à infinitude, e foi preciso
a palavra de Deus para colocar um limite no
alcance deles.
70. Photo by Robodot
71.
72. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

73. O segundo dia

PAULO BRABO, 23 DE FEVEREIRO DE


2006
O SEGUNDO DIA

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

A CRIAÇÃO: O segundo dia


No segundo dia Deus criou quatro coisas: o firma-
mento, o inferno, o fogo e os anjos. O firmamento
não é o mesmo que o céu do primeiro dia. Trata-
se do cristal que se estende sobre as cabeças dos
Hayyot, do qual o céu deriva a sua luz, da mesma
forma que a terra deriva do sol a sua luz. Esse fir-
mamento protege a terra de ser inundada pelas
águas do céu; ele forma a divisão entre as águas
de cima e as águas de baixo. Foi cristalizado na
forma sólida pelo fogo celeste, que ultrapassou os
seus limites e condensou a superfície do firma-
mento. Desta forma o fogo fez a divisão entre o
celestial e o terrestre por ocasião da criação, da
mesma forma que fez por ocasião da revelação no
Sinai. O firmamento não tem mais de três dedos
de espessura, e apesar disso faz separação entre
dois corpos tão pesados quanto as águas inferio-
res, que são as fundações do mundo inferior, e as
águas superiores, que são as fundações dos sete
céus, do Trono Divino e da residência dos anjos.
A separação das águas entre águas superiores e
inferiores foi o único ato dessa natureza realizado
por Deus em conexão com a obra da criação.
Todos os outros foram atos unificadores. Este
causou, portanto, algumas dificuldades. Quando
Deus ordenou: “Que as águas se ajuntem num só
lugar, de modo que apareça a terra seca”, certas
porções recusaram-se a obedecer, e abraçaram-
se umas às outras ainda mais firmemente. Em sua
indignação contra as águas, Deus determinou que
toda a criação se dissolvesse novamente no caos.
Ele chamou o Anjo da Face e ordenou que des-
truisse o mundo. O anjo arregalou os olhos e
fogos abrasadores e espessas nuvens projetaram-
se deles, enquanto ele gritava:
– Aquele que divide em duas metades o Mar
Vermelho! – e as águas revoltosas não se
moveram.
Todas as coisas estavam ainda sob perigo de des-
truição. Então aquele que canta os louvores de
Deus começou:
Tende piedade do teu mundo, não o
destruas; pois se o destruirdes, quem
cumprirá a tua vontade?
– Ó Senhor do mundo, nos dias que virão tuas
criaturas cantarão sem interrupção louvores a ti;
bendizer-te-ão irrestritamente, e glorificar-te-ão
sem medida. Tu tomarás Abraão à parte de toda a
humanidade para ser teu; um de seus filhos tu
chamarás de “meu primogênito; e seus descen-
dentes tomarão sobre si o jugo do teu reino. Em
santidade e pureza tu lhes conferirás a Torá, com
as seguinte palavras: “Eu sou o Senhor seu Deus”;
a que eles responderão: “Tudo que Deus tem
falado faremos”. E agora suplico-te, tende
piedade do teu mundo, não o destruas; pois se o
destruirdes, quem cumprirá a tua vontade?
Deus assim apazigou-se. Retirou a ordem que
determinava a destruição do mundo, mas as
águas ele colocou sob as montanhas, para perma-
necerem ali para sempre.
A objeção das águas inferiores contra a divisão e
a separação não foi o único motivo para a sua
rebelião. As águas haviam sido as primeiras a dar
louvor ao Senhor, e quando foi decretada a sua
separação em superiores e inferiores, as águas
superiores regozijaram-se, dizendo:
– Bem-aventuradas somos nós, que temos o privi-
légio de habitar junto ao nosso Criador e junto ao
seu Trono Santo.
Assim celebrando elas lançaram-se para o alto, e
proferiram canção de louvor ao Criador do
mundo. Tristeza recaiu sobre as águas inferiores.
Elas lamentaram:
– Ai de nós, que não fomos achadas dignas de
habitar na presença de Deus, e de louvá-lo junta-
mente com nossas companheiras.
Elas tentaram portanto alçar-se para o céu, até
que Deus as repeliu, pressionando-as contra a
terra. Apesar disso elas não deixaram de receber
recompensa pela sua lealdade: quando desejam
dar louvores a Deus, as águas superiores
precisam pedir antes permissão às águas
inferiores.
O segundo dia foi um dia desfavorável não apenas
no sentido de que introduziu uma separação no
que antes havia sido apenas unidade: foi também
o dia que contemplou a criação do inferno. Deus
não pôde portanto dizer desse dia como disse dos
outros, “e viu que era bom”. Uma divisão pode ser
necessária, mas não pode ser chamada de boa, e o
inferno certamente não merece o atributo
de bom.
O

O inferno tem sete divisões, uma abaixo da outra.


Essas são chamadas Sheol, Abaddon, Beer Shahat,
Tit ha-Yawne, Sha’are Mawet, Sha’are Zalmawet e
Gehenna. São necessários trezentos anos para se
percorrer a altura, a largura ou a profundidade de
cada divisão, e seriam necessários seis mil e
trezentos anos para se atravessar uma extensão
de terra correspondente à extensão das sete
divisões.
Há em cada caverna sete mil fendas, e
em cada fenda sete mil escorpiões.
Cada uma das sete divisões tem por sua vez sete
subdivisões, e em cada compartimento há sete
rios de fogo e sete de granizo. A largura de cada
um é de mil varas, sua profundidade mil, seu
comprimento trezentos, e eles fluem um para
dentro do outro, sendo supervisionados por
noventa mil anjos de destruição. Há, além disso,
em cada compartimento sete mil cavernas, em
cada caverna sete mil fendas, e em cada fenda
sete mil escorpiões. Cada escorpião tem trezentos
anéis, e em cada anel sete mil bolsas de veneno,
dos quais fluem sete rios de veneno mortal. O
homem que o toca explode imediatamente: cada
membro é separado do corpo, suas entranhas se
esfacelam e ele cai de rosto no chão.
Há também cinco tipos diferentes de fogo no
inferno. Um deles devora e absorve, outro devora
e não absorve, enquanto o terceiro absorve e não
devora; há ainda outro fogo que nem devora nem
absorve, e finalmente um fogo que devora o fogo.
Há brasas do tamanho de montanhas, brasas do
tamanho de colinas e brasas do tamanho do Mar
Morto, e brasas que se assemelham a enormes
pedras, e há rios de asfalto e enxofre que fluem e
borbulham como brasas vivas.
A terceira criação do segundo dia foram as hostes
de anjos – tanto os anjos ministradores quanto os
anjos de louvor. A razão pela qual eles não foram
trazidos à existência no primeiro dia foi para que
os homens não cressem que os anjos auxiliaram
Deus na criação do céu e da terra. Os anjos que
são moldados de fogo têm formas de fogo, mas
apenas enquanto permanecem no céu. Quando
descem à terra, a fim de fazerem a vontade de
Deus aqui embaixo, são ou transformados em
vento ou assumem a aparência de homens. Há
dez escalões hierárquicos, ou graus, entre
os anjos.
Os de nível hierárquico mais exaltado são os que
cercam o Trono Divino por todos os lados: à
direita, à esquerda, na frente e atrás, sob a
liderança dos arcanjos Miguel, Gabriel, Uriel e
Rafael.
Deus os silencia: “Quietos, até que eu
tenha ouvido as canções e doces
melodias de Israel”.
Todos os seres celestiais louvam a Deus com as
palavras: “Santo, santo, santo é o Senhor dos
exércitos”, mas nisso os homens têm precedência
sobre eles. Os anjos não podem começar sua
canção de louvor até que os seres terrenos
tenham trazido sua exaltação a Deus. Israel em
particular tem a preferência dos anjos. Quando
circundam o Trono Divino na forma de
montanhas de fogo e colinas flamejantes, e
ensaiam levantar as vozes em adoração ao
Criador, Deus os silencia com as palavras:
– Quietos, até que eu tenha ouvido as canções,
louvores, orações e doces melodias de Israel.
Assim sendo, os anjos ministrantes e todas as
outras hostes celestiais aguardam até que os
últimos ecos das doxologias de Israel, erguendo-
se da terra, tenham se extinguido, e só então
proclamam em alta voz: “Santo, santo, santo é o
Senhor dos exércitos”.
Quando se aproxima a hora da glorificação de
Deus por parte dos anjos, o augusto arauto
divino, o anjo Shamiel, desce até as janelas do céu
mais inferior para escutar as canções, orações e
louvores que ascendem das sinagogas e casas de
saber, e quanto terminam, ele anuncia o seu fim
aos anjos de todo o céu. Os anjos ministrantes,
aqueles que têm contato com o mundo sublunar,
dirigem-se agora a suas câmaras para seu banho
de purificação.

Eles mergulham num riacho de fogo e chama por


sete vezes, e por trezentas e sessenta e cinco
vezes examinam-se cuidadosamente, para
certificar-se que nenhuma mancha permanece
aderida a seus corpos. Só então sentem-se dis-
pensados para galgar sua escada de fogo e juntar-
se aos anjos do sétimo céu, e cercar o trono de
Deus juntamente com Hashmal e todos os santos
Hayyot. Adornados de milhões de coroas chame-
jantes, trajando vestes de fogo, todos os anjos em
uníssono, com as mesmas palavras e a mesma
melodia, entoam canções de louvor a Deus.

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

74. O terceiro dia


75. PAULO BRABO, 16 DE ABRIL DE
2006
76. O TERCEIRO DIA

77. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
78. A CRIAÇÃO: O terceiro dia
79. Até esta altura a terra era plana e total-
mente coberta de água. Mal haviam se ouvido
as palavras de Deus: “Ajuntem-se as águas”, e
surgiram as montanhas e colinas, e a água
acumulou-se em bacias profundas. Mas a
água era rebelde e recusava-se a ocupar os
lugares mais baixos, e ameaçou inundar a
terra, até que Deus forçou-a de volta ao mar e
circundou o mar de areia. Agora, sempre que
a água sente-se tentada a transgredir ela
contempla a areia e recolhe-se. As águas
estavam apenas imitando seu chefe Rahabe, o
Anjo do Mar, que rebelou-se contra a criação
do mundo. Deus havia ordenado a Rahabe
que assumisse também a água. Ele recusou-
se, dizendo: “Já tenho o que basta”. A punição
pela sua desobediência foi a morte. Seu
cadáver jaz nas profundezas do oceano, e a
água dispersa o mau cheiro que emana dele.
80. Agora, sempre que a água sente-se
tentada a transgredir ela contempla a
areia e recolhe-se.
81. A principal criação do terceiro dia foi o
reino das plantas, tanto as plantas terrestres
quanto as do Paraíso. Primeiro foram feitos
os cedros do Líbano e as outras grandes
árvores. Em seu orgulho por terem sido
colocadas em primeiro lugar, elas
projetaram-se alto ar acima, considerando-se
as mais privilegiadas das plantas. Então
Deus disse:
82. – Eu abomino a arrogância e o orgulho,
porque apenas eu sou exaltado, e ninguém
mais.
83. Ele então criou no mesmo dia o ferro,
substância pela qual as árvores caíam. As
árvores começaram a chorar, e quando Deus
perguntou a razão das suas lágrimas elas
disseram:
84. – Choramos porque criaste o ferro a fim
de nos derrubar com ele. O tempo todo nos
havíamos crido as mais elevadas da terra, e
agora o ferro, nosso destruidor, foi chamado
à existência.
85. Deus respondeu:
86. – Vocês mesmas proverão um cabo ao
machado. Sem a sua assistência o ferro não
será capaz de fazer coisa alguma contra
vocês.
87.
A ordem de gerar semente segundo a sua
espécie foi dada apenas às árvores. Mas as
diversas espécies de erva rasteira pensaram
consigo mesmas que se Deus não tivesse
desejado divisões segundo as espéciesnão
teria instruído as árvores a darem fruto
segundo a sua espécie, cuja semente
estivesse nele – especialmente já que as
árvores estavam inclinadas por sua própria
iniciativa a se dividirem em espécies. Por
essa razão as ervas rasteiras também se
reproduziram segundo as suas espécies. Isso
ocasionou uma exclamação do Príncipe do
Mundo: “Dure para sempre a glória do
Senhor; regozije-se o Senhor nas suas obras”.
88. A obra mais importante realizada no
terceiro dia foi a criação do Paraíso. Dois
portões de carbúnculo formam a entrada do
Paraíso, e seis miríades de anjos ministrantes
o guardam. Cada um desses anjos brilha com
o esplendor do céu. Quando o justo aparece
diante dos portões, as roupas com que foi
enterrado são tiradas dele, e os anjos o
vestem com sete vestimentas de nuvens de
glória, colocam sobre sua cabeça duas coroas,
uma de pedras preciosas e pérolas, a outra de
ouro de Parvaim, depositam oito murtas na
sua mão, e proferem louvores diante dele e
dizem: “Siga seu caminho, e coma o seu pão
com alegria”. Em seguida eles o conduzem a
um lugar repleto de rios, cercado por oito-
centas espécies de rosas e murtas. Cada
[justo] tem um dossel segundo seus méritos,
e sob ele fluem quatro rios, um de leite, o
outro de bálsamo, o terceiro de vinho e o
quarto de mel. Cada dossel é coberto de uma
vinha de ouro, e dela pendem trinta pérolas,
cada uma brilhante como Vênus. Sob cada
dossel há uma mesa de pedras preciosas e
pérolas, e sessenta anjos postam-se junto de
cada homem justo, dizendo a ele: “Vá e coma
com alegria o mel, porque você ocupou-se
com a Torá, que é mais doce do que o mel, e
beba o vinho reservado na uva desde os seis
dias da criação, pois você se ocupou da Torá,
que é comparável ao vinho”.
89. Deus assenta-se no meio deles e
expõe-lhes a Torá.
90. O menos belo dos justos é bonito como
José e o Rabi Johanan, como os grãos de uma
romã de prata sobre a qual descem os raios
do sol. Não há luz, pois “a luz dos justos
brilha intensamente”. Eles experimentam
quatro transformações por dia, passando por
quatro estágios. No primeiro o justo é trans-
formado em criança. Ele entra na divisão das
crianças, e desfruta das alegrias da infância.
Ele é então transformado num jovem, e entra
na divisão dos jovens, com os quais ele
desfruta dos deleites da juventude. Ele em
seguida transforma-se em adulto, no auge do
vigor, e adentra a divisão dos homens, e
experimenta os prazeres da idade adulta.
Finalmente ele é transformado em velho. Ele
entra na divisão dos velhos, e desfruta dos
prazeres da velhice.
91. Há oitenta miríades de árvores em cada
canto do Paraíso, sendo a mais inferior delas
mais excelente do que todas as árvores de
especiaria. Em cada canto há sessenta
miríades de anjos cantando com vozes melo-
diosas, e a árvore da vida ergue-se no meio e
dá sombra a todo o Paraíso. Ela tem quinze
mil sabores, cada um distinto do outro, e os
perfumes variam da mesma forma. Sobre ela
pendem sete nuvens de glória, e ventos
sopram sobre ela dos quatro lados, de modo
que seu aroma é bafejado de uma ponta do
mundo à outra. Sob ela assentam-se os
eruditos e explicam a Torá. Sobre cada um
deles estendem-se dois dosséis, um de
estrelas, o outro de sol e lua, e uma cortina de
nuvens de glória separa um dossel do outro.
92. Além do Paraíso começa o Éden,
contendo trezentos e dez mundos e sete com-
partimentos para sete diferentes classes de
piedosos. No primeiro estão os “mártires
vítimas do governo” como Rabi Akiba e seus
companheiros; no segundo estão os que
foram afogados; no terceiro Rabi Johanan
ben Zakkai e seus discípulos; no quarto
aqueles que foram arrebatados na nuvem de
glória; no quinto os penitentes, que ocupam
um lugar que mesmo um homem perfeita-
mente piedoso não pode obter; no sexto
estão os jovens que não experimentaram o
pecado em suas vidas; no sétimo estão os
pobres que estudaram a Bíblia e a Mishnah, e
conduziram uma vida de decência auto-
respeitosa. E Deus assenta-se no meio deles e
expõe-lhes a Torá.
93. Quanto às sete divisões do Paraíso, cada
uma tem doze miríades de milhas de largura
e doze miríades de milhas de extensão. Na
primeira divisão habitam os prosélitos que
abraçaram o judaísmo por sua próprio
arbítrio, não por pressão. As paredes são de
vidro e os lambris de cedro. O profeta
Obadias, ele mesmo um prosélito, é o super-
visor dessa primeira divisão. A segunda
divisão é construída de prata, e seus lambris
são de cedro. Aqui vivem os que se arrepen-
deram, e Manassés, o filho penitente de
Ezequias, preside sobre eles. A terceira
divisão é construída de ouro e prata. Aqui
habitam Abraão, Isaque e Jacó, todos os israe-
litas que saíram do Egito e toda a geração que
viveu no deserto. Também Davi está ali, junto
com todos os seus filhos exceto Absalão,
sendo que um deles, Quileabe, ainda vivo. E
todos os reis de Judá estão ali, com exceção
de Manassés, filho de Ezequias, que preside
sobre a segunda divisão, a dos penitentes.
Moisés e Arão presidem sobre a terceira
divisão. Aqui há preciosos vasos de ouro e
prata e jóias e dosséis e camas e tronos e
lâmpadas, de ouro, de pedras preciosas e de
pérolas, o melhor de tudo que há no céu. A
quarta divisão é construída de belíssimos
rubis, e seus lambris são de madeira de oliva.
Aqui habitam os perfeitos e constantes na fé,
e os lambris são de oliveira porque suas vidas
foram para eles amargas como azeitonas.
94. Elias toma a cabeça do Messias,
coloca-a no colo e diz: “Aquiete-se,
porque o fim está próximo”.
95. A quinta divisão é construída de prata,
ouro e ouro refinado, e do ouro mais puro e
bdélio, e no meio dela passa o rio Gion. Seus
lambris são de prata e ouro, e exala dele um
perfume mais requintado do que o perfume
do Líbano. As colchas das camas de prata e de
ouro são feitas de púrpura e azul, tecidas por
Eva, e de escarlata e pelo de bode, tecido por
anjos. Aqui habita o Messias num palanquim
feito de cedro do Líbano, “senso seus pilares
de prata, o fundo de ouro, o assento de
púrpura”. Com ele está Elias. Ele toma a
cabeça do Messias, coloca-a no colo e diz:
“Aquiete-se, porque o fim está próximo”. Em
todas as segundas-feiras e quintas e sábados
e dias santos os patriarcas vem até ele, bem
como os doze filhos de Jacó, e Moisés, Arão,
Davi e Salomão, e todos os reis de Israel e de
Judá, e choram com ele e confortam-no, e
dizem a ele: “Aquiete-se e coloque sua
confiança no Criador, pois o fim está
próximo”. Também Corá e seu grupo, e Datã e
Abiram e Absalão vêm até ele toda quarta-
feira e perguntam: “Quanto falta até que o fim
venha cheio de maravilhas? Quando nos
trarás novamente à vida, e dos abismos da
terra nos alçarás?” O Messias lhes responde:
“Vão até seus pais e perguntem a eles”.
Quando ouvem isso eles ficam com vergonha
e não vão perguntar aos seus pais.
96. Na sexta divisão habitam os que
morreram realizando algum ato piedoso, e na
sétima divisão os que morreram de uma
enfermidade infligida como expiação pelos
pecados de Israel.

97.
98. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

99. O quarto dia

PAULO BRABO, 17 DE MAIO DE 2006


O QUARTO DIA

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

A CRIAÇÃO: O quarto dia


O quarto dia da criação produziu o sol, a lua e as
estrelas. Essas esferas celestes não foram na
verdade formadas neste dia; foram criadas no
primeiro dia, e meramente colocadas nos seus
lugares no céu no quarto dia.
No princípio o sol e a lua desfrutavam de poderes
e privilégios iguais. A lua falou com Deus e disse:
– Ó, Senhor, por que criaste o mundo com a letra
Bet?
Deus respondeu:
– Para que ficasse conhecido das minhas
criaturas que existem dois1 mundos.
A lua:
– Ó, Senhor, qual dos mundos é maior, este
mundo ou mundo que está por vir?
Deus:
– O mundo que está por vir é maior.
A lua:
– Ó, Senhor, tu criaste dois mundos, um maior e
um menor; criaste o céu e a terra, sendo que o
céu supera a terra; criaste o fogo e a água, sendo a
água mais forte do que o fogo, porque pode
apagá-lo. Agora criaste o sol é a lua, e é apropri-
ado que um seja maior do que o outro.
Então disse Deus à lua:

– Sei bem que sua intenção é que eu lhe faça


maior do que o sol. Como punição decreto que
você fique com apenas um sexto da sua luz.
A lua suplicou:
– Devo ser punida tão severamente por ter dito
uma única palavra?
Deus cedeu:
– No mundo futuro a sua luz lhe será restaurada,
de modo que sua luz será novamente como a luz
do sol.
A lua não estava ainda satisfeita.
– Ó, Senhor – ela disse, – e a luz do sol, quão
grande será naquele dia?
A ira do Senhor acendeu-se então mais uma vez.
– Quê? Você está conspirando contra o sol? Tão
certo quanto você vive, no mundo que está por
vir a luz dele será sete vezes mais forte do que a
luz que ele hoje irradia.
O sol percorre o seu curso como um noivo,
sentado sobre um trono com uma guirlanda ao
redor da cabeça. Noventa e seis anjos
acompanham-no em sua jornada diária, em
turnos de oito a cada hora: dois à sua esquerda,
dois à sua direita, dois à frente e dois atrás. Forte
como é, o sol poderia completar o seu curso do
sul ao norte num único instante, mas trezentos e
sessenta e cinco anjos restringem-no através de
inúmeros ganchos de ferro. Cada dia um dos
anjos solta o seu gancho, de modo que o sol é
obrigado a gastar trezentos e sessenta e cinco
dias no seu curso. O progresso do sol em seu
circuito é uma canção ininterrupta de louvor a
Deus. E é apenas essa canção que torna o seu
movimento possível. Por essa razão, quando quis
ordenar que o sol se detivesse no seu curso Josué
ordenou que ele se calasse. Tendo calado sua
canção de louvor, o sol ficou imóvel.

O sol tem duas faces: uma, de fogo, voltada para a


terra, e outra de granizo, voltada para o céu, cuja
função é aplacar o prodigioso calor que irradia da
oura face – de outro modo a terra pegaria fogo.
No inverno o sol volta sua face de fogo para cima,
e dessa forma o frio é produzido. Quando se põe
no oeste ao entardecer o sol mergulha no oceano
e toma um banho, sendo seu fogo extinguido, e
por essa razão ele não dispensa fogo nem calor
durante a noite. Porém logo que alcança o leste
na manhã seguinte ele mergulha numa corrente
de fogo, que acende-o e concede-lhe calor, os
quais o sol derrama sobre a terra. Da mesma
forma a lua e as estelas tomam banho numa
corrente de granizo antes de assumirem os seus
postos à noite.

Quando o sol e a lua estão prontos para dar início


ao seu ciclo de tarefas eles aparecem diante de
Deus e imploram que ele os dispense de cumprir
a sua obrigação, a fim de serem poupados de con-
templar a humanidade pecaminosa. É somente
mediante constrangimento que eles procedem
com seu curso diário. Retornando da presença de
Deus sol e lua encontram-se cegados pela
radiância do céu, e não conseguem encontrar o
caminho. Deus, por essa razão, lança flechas, por
cuja luz cintilante eles são guiados. É devido à
pecaminosidade do homem, a qual o sol é forçado
a contemplar em seus cursos diários, que ele
enfraquece à medida que se aproxima a hora do
seu declínio, pois os pecados têm um efeito
corruptor e delibitante, e ele se põe no horizonte
como uma esfera de sangue, porque o sangue é o
sinal de corrupção.
De manhã, ao lançar-se no seu curso, as asas do
sol tocam as folhas das árvores do paraíso, e sua
vibração é transmitida aos anjos e aos santos
Hayyot, às outras plantas e também às árvores e
plantas da terra, bem como a todos os seres da
terra e do céu. É sinal para que eles voltem seus
olhos para o céu. Logo que contemplam o Nome
Inefável, que está gravado no sol, eles erguem
suas vozes em canções de louvor a Deus. No
mesmo momento é ouvida uma voz celestial que
diz: “Ai dos filhos dos homens, que não atentam
em honrar a Deus como essas criaturas que
erguem agora suas vozes em adoração”. Essas
palavras, naturalmente, não são ouvidas pelos
homens, da mesma forma que eles não escutam o
rangido do sol contra a roda na qual estão presos
todos os corpos celestes, embora o som seja
extraordinariamente alto. Essa fricção entre o sol
e a roda produz as partículas cintilantes que
dançam nos raios de sol. Essas são portadoras de
cura aos doentes, as únicas criações doadores de
saúde do quarto dia, no todo um dia desafortu-
nado, especialmente para as crianças, sendo nele
afligidas por doenças.
Quando Deus puniu a ciumenta lua, diminuindo
sua luz e esplendor de modo que ela deixasse de
se equiparar ao sol como havia sido original-
mente, a lua caiu, e minúsculos fragmentos
soltaram-se do seu corpo. Esses são as estrelas.
1
A letra Bet, segunda letra do alfabeto hebraico,
corresponde ao algarismo dois.
Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas
judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

100. O quinto dia


101. PAULO BRABO, 05 DE JUNHO DE
2006
102. O QUINTO DIA

103. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
104. A CRIAÇÃO: O quinto dia
105. No quinto dia da criação Deus tomou
fogo e água, e desses elementos fez os peixes
do mar. Os animais da água são muito mais
numerosos do que os da terra. Para cada
espécie na terra, com exceção da fuinha, há
uma espécie correspondente na água e, além
disso, muitas outras encontradas apenas
na água.
106. O regente sobre as criaturas do mar é o
leviatã. Juntamente com os outros peixes, ele
foi feito no quinto dia. Originalmente ele foi
criado macho e fêmea como todos os outros
animais. Porém quando ficou evidente que
um par desses monstros poderia aniquilar
toda a terra com a sua força, Deus matou a
fêmea. Tão imenso é o leviatã que para saciar
sua sede ele requer toda a água que flue do
Jordão mar adentro. Sua comida consiste de
peixes que entram espontaneamente entre
suas mandíbulas. Quando ele está com fome
um hálito quente sopra de suas narinas, que
torna as águas do grande mar quentes ao
ponto da ebulição. Por mais formidável que
seja o behemoth, o outro monstro, ele sente-
se inseguro até que o leviatã tenha saciado a
sua sede. A única coisa que pode mantê-lo
sob controle é o esgana-gato, um pequeno
peixe que foi criado com esse propósito, e
diante do qual o monstro queda em
assombro. Porém o leviatã não é apenas
grande e forte; é além disso maravilhosa-
mente formado. Suas barbatanas irradiam
ofuscante luz, sendo o próprio sol obscure-
cido por ela, e também seus olhos projetam
tamanho esplendor que o mar é com freqüên-
cia repentinamente iluminado por ele. Não é
de admirar que essa fera maravilhosa seja o
brinquedo de Deus, com o qual ele passa
seu tempo.
107. Apenas uma coisa torna o leviatã
repulsivo: seu odioso cheiro, que é tão forte
que se penetrasse o próprio Paraíso torna-lo-
ia inabitável.

108.
O verdadeiro propósito do leviatã é servir de
iguaria aos justos no mundo do porvir. A
fêmea foi colocada em salmoura tão logo
morta, para ser preservada até o momento
em que sua carne será necessária. O macho
está destinado a prover uma visão extraordi-
nária a todos os espectadores antes de ser
consumido. Quando sua última hora chegar
Deus convocará os anjos para que entrem em
combate contra o monstro. Mas tão logo o
leviatã lance o seu olhar sobre eles os anjos
fugirão, desfalecidos de medo, do campo de
batalha. Eles retornarão à carga com espadas,
porém em vão, porque suas escamas podem
repelir o ferro como se fosse palha. Eles não
terão mais sucesso quando tentarem matá-lo
arremessando pedras e lanças; tais mísseis
ricochetearão sem causar a menor impressão
no corpo do monstro. Desanimados, os anjos
desistirão do combate, e Deus ordenará que o
leviatã e o behemoth entrem em duelo um
contra o outro. Como resultado ambos cairão
mortos, o behemoth esmagado por um golpe
das barbatanas do leviatã, o leviatá morto
por um açoite da cauda do behemoth. Da pele
do leviatã Deus construirá tendas para
abrigar as multidões dos piedosos enquanto
eles desfrutam dos pratos feitos da sua carne.
A quantidade designada a cada justo será
proporcional a seus merecimentos, e
ninguém invejará ou se ressentirá da porção
maior de outro. O que sobrar da pele do
leviatã será esticado como toldo sobre
Jerusalém, e a luz que se projetará dela
iluminará o mundo inteiro, e o que restar da
sua carne, depois que os justos tiverem
saciado seu apetite, será distribuído entre o
restante dos homens.

Behemoth é o nome de uma criatura descrita


na Bíblia, no Livro de Jó, 40:15-24. No idioma
hebraico é transcrito
como‫בהמות‬, Bəhēmôth, Behemot, B'hemot;
em Árabe ‫( بهيموث‬Bahīmūth) ou ‫بهموت‬
(Bahamūt).[1]
Livro de Jó, 40:15-24.
15 Considera agora um animal gigantesco que,
como a ti, também criei. Ele come erva como
um boi.
16 Sua força se manifesta em seu corpo, até
mesmo nos músculos de seu ventre.
17 Quando quer, endurece sua cauda como um
cedro, e seus músculos são entrelaçados como
cordas.
18 Seus ossos são como tubos de cobre; suas
costelas, como barras de ferro.
19 Ele foi o começo de Minha criação; somente
quem o criou pode dele aproximar sua espada
(para destruí-lo).
20 Nas montanhas encontra seu alimento e em
sua volta andam outros animais.
21 Ele repousa sob os lotos nos esconderijos
das plantas dos pântanos.
22 O recobre a sobra dos lotos; os salgueiros
o envolvem.
23 Se transborda o rio, ele nem sequer
estremece; sente-se confiante mesmo que
flua o Jordão por sua boca.
24 Poderia alguém o arrastar ou prender em
seu focinho um laço?
25 És capaz de pescar o Leviatan com um
anzol? Ou amarrar uma corda à sua língua?
26 Podes prender com um anel seu nariz? Ou
perfurar sua mandíbula com um gancho?
27 Ele te faria súplicas? Ou te falaria com
suaves palavras?
28 Faria um convênio contigo, para que o
admitisses como um perpétuo servo?
29 Brincarias com ele como se fora um
passarinho? Ou o manterias preso para
divertimento de tuas filhas?
30 Fariam dele um banquete os pescadores?
Repartiriam seus pedaços entre os
mercadores?
31 Podes rechear sua pele com farpas e sua
cabeça com arpões?
32 Põe sobre ele tua mão. Pensa na luta que
terias que enfrentar e desistirás."
41
1 "Vã é a esperança de vencê-lo; não
desfaleceria qualquer um, só em vê-lo?
2 Ninguém tem a ousadia de atrever-se a
enfrentá-lo. Quanto mais, ante Mim, quem
ousaria manter-se em pé (sem submeter-se)?
3 Quem Me deu algo que Me traga a obrigação
de ressarci-lo? Pois tudo que existe sob a
extensão dos céus a Mim pertence.
4 Guardaria Eu silêncio ante sua
arrogância, sua fala orgulhosa ou suas
palavras escolhidas?
5 Quem descobriu a superfície da
veste (do Leviatan)? Quem se arriscará entre
duas presas?
6 Quem pode escancarar as portas
de sua face? Pois terror inspiram seus dentes.
7 Suas presas são seu orgulho, unidas umas
às outras como se estivessem seladas.
8 Cada uma está tão próxima da outra que nem
sequer o ar passa entre elas.
9 Estão unidas uma à outra de tal forma que
não podem ser afastadas.
10 Seu resfolegar provoca raios de luz e seus
olhos são como as pálpebras da aurora.
11 De sua boca parecem sair tochas
chamejantes com centelhas faiscando à sua
frente.
12 De suas narinas sai vapor como de uma
panela fervente ou juncos sendo queimados.
13 Sua respiração acende carvões e uma
chama sai de sua boca.
14 Seu pescoço demonstra sua força, e temor
caminha à sua frente.
15 As escamas que o revestem são todas
unidas. Estão firmemente assentadas sobre
ele e não podem ser arrancadas.
16 Seu coração é duro como uma pedra; duro
como a pedra de um moinho.
17 Quando se ergue, até os mais corajosos se
atemorizam. Desesperados, unem-se
em um grupo.
18 Se alguém o atacasse com uma espada,
nenhum efeito causaria; tampouco a
lança, o ferrão ou a flecha.
19 Para ele, o ferro é como a palha e o bronze,
como madeira podre.
20 As flechas não provocam sua fuga. As
pedras da funda se estilhaçam.
21 As maçãs se quebram; ri-se do brandir da
lança.
22 Deita-se sobre os cacos mais pontudos e
parece estar sobre uma camada macia de
lama.
23 Faz ferver o fundo como uma chaleira. Faz
o mar se assemelhar a um caldeirão fervendo.
24 Brilha atrás dele o rastro que deixa;
pensar-se-ia que embranqueceu o mar.
25 Nada há sobre a terra que com ele se
pareça, por ter sido feito para a
nada temer.
26 Observa de baixo para cima as coisas
elevadas; é rei sobre todas as feras
orgulhosas."
Sua descrição é tradicionalmente associada à
de um monstro gigante, podendo ser retratado
como um leão monstruoso, apesar de
alguns criacionistas o identificarem como
um saurópode ou um touro gigante de três
chifres. Em uma outra análise vemos este
como um animal pré-histórico muito conhecido
como braquiossauro. Os relatos no livro de Jó,
capítulo 40 (Bíblia), apontam para este grande
herbívoro. Esta criatura tem um corpo
couraçado e é típica dos desertos (embora
"Behemot" também seja como
os hebreus chamavam os hipopótamos).
Contemplas agora o beemote, que eu fiz
contigo, que come a erva como o boi. Eis que a
sua força está nos seus lombos, e o seu poder
nos músculos do seu ventre. Quando quer,
move a sua cauda como cedro; os nervos das
suas coxas estão entretecidos. Os seus ossos
são como tubos de bronze; a sua ossada é
como barras de ferro. Ele é obra-prima dos
caminhos de Deus; o que o fez o proveu da sua
espada.
Em verdade os montes lhe produzem pastos,
onde todos os animais do campo folgam. Deita-
se debaixo das árvores sombrias, no
esconderijo das canas e da lama. As árvores
sombrias o cobrem, com sua sombra; os
salgueiros do ribeiro o cercam.
Eis que um rio transborda, e ele não se
apressa, confiando ainda que o Jordão se
levante até à sua boca. Podê-lo-iam porventura
caçar à vista de seus olhos, ou com laços lhe
furar o nariz?
Segundo a tradição judaica ortodoxa, sua
missão é esperar pelo dia em que Deus lhe
pedirá para matar o Leviatã, uma criatura
marinha tida por alguns como parecida com
uma baleia. As duas criaturas morrerão no
combate, mas o Behemoth será glorificado por
cumprir a sua missão.

Leviatã, Behemoth e Ziz em iluminura de uma


Bíblia de Ulm, 1238

O nome é o plural do hebraico ‫בהמה‬, bəhēmāh,


"animal", com sentido enfático ("animal
grande", "animal por excelência"). Na tradição
judaica ortodoxa, Beemote é o monstro da terra
por excelência, em oposição a Leviatã, o
monstro do mar, e Ziz, o monstro do ar. Diz
uma lenda judaica que Beemote e Leviatã se
enfrentarão no final dos tempos, matando-se
um ao outro; então, sua carne será servida em
banquete aos humanos que sobreviverem.
1. No mesmo dia em que os peixes foram
criados os pássaros, pois essas duas espécies
de animais são intimamente relacionadas
uma à outra. Os peixes são formados de água,
os pássaros de terreno pantanoso saturado
de água.
2. Da mesma forma que o leviatã é o rei dos
peixes, o ziz foi apontado para governar
sobre os pássaros. Seu nome vem da
variedade de sabores que sua carne tem; tem
gosto disso, zeh, e daquilo, zeh. O ziz é tão
monstruosamente grande quanto o próprio
leviatã. Seus tornozelos repousam sobre a
terra, e sua cabeça chega ao próprio céu.
3. Aconteceu certa vez que viajantes num navio
perceberam uma ave: ela estava em pé sobre
água, que meramente cobria-lhe os pés, e sua
cabeça chocava-se contra o céu. Os observa-
dores concluíram que a água não podia ser
nada profunda naquele ponto, e prepararam-
se para tomar banho ali. Uma voz do céu os
advertiu: “Não desçam aqui! Certa vez um
machado de carpinteiro escorregou de sua
mão neste local, e levou sete anos para
chegar ao fundo”. O pássaro que os viajantes
viram era nada mais nada menos do que o
ziz. Suas asas são tão vastas que abertas obs-
curecem o sol. Elas protegem a terra contra
as tempestades do sul; sem o seu auxílio a
terra não seria capaz de resistir aos ventos
que sopram daquela direção. Certa vez um
ovo de ziz caiu no chão e quebrou. Seu
líquido inundou sessenta cidades, e o
impacto esmagou trezentos cedros. Feliz-
mente acidentes como esse não ocorrem com
freqüência: normalmente o pássaro faz seus
ovos deslizarem gentilmente para dentro do
ninho. Esse infortúnio ocorreu devido ao fato
de que aquele ovo estava podre, e o pássaro
jogou-o fora descuidadamente.
4. O ziz tem outro nomem, Renanin, porque é o
cantor celestial. Devido à sua relação com as
regiões celestiais ele é também chamado de
Seqwi, o vidente, e é além disso chamado de
“filho do ninho”, porque ao nascer seus
filhotes desembaraçam-se de seus ovos sem
o auxílio da mãe; nascem, por assim dizer,
diretamente do ninho. Como o leviatã, o ziz é
uma das iguarias que será servida aos
piedosos no final dos tempos, para
compensar as restrições alimentares
impostas sobre eles, que proíbem-nos de
consumir aves imundas.

5.
6. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

7. O sexto dia

PAULO BRABO, 05 DE JULHO DE 2006


O SEXTO DIA

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

A CRIAÇÃO: O sexto dia


Da mesma forma que os peixes foram formados
da água e os pássaros de argila misturada com
água, os mamíferos foram formados da terra
sólida; da mesma forma que o leviatã é o repre-
sentante mais notável dos peixes e o ziz dos
pássaros, o behemoth é o mais notável represen-
tante dos mamíferos. A força do behemoth se
equipara à do leviatã, tendo sido ele também
impedido, como o leviatã, de crescer e
multiplicar-se, do contrário o mundo não poderia
continuar a existir. Depois de tê-lo criado macho
e fêmea, Deus privou-o imediatamente do desejo
de propagar sua espécie. Ele é tão monstruoso
que requer a vegetação de milhares de
montanhas para sua alimentação diária. Toda a
água que flui pelo leito do Jordão num ano inteiro
basta-lhe para precisamente um único gole. Foi
por essa razão necessário conceder-lhe um
corrente dedicada a seu uso exclusivo, corrente
que flui do Paraíso e chama-se Yubal. Também o
behemoth está destinado a ser servido aos bem-
aventurados como apetitosa iguaria, mas antes de
desfrutarem da sua carne ser-lhes-á permitido
assistir ao combate mortal entre o leviatã e o
behemoth, como recompensa por terem se
privado dos prazeres do circo e das disputas dos
gladiadores.
O leviatã, o ziz e o behemoth não são os únicos
monstros; há inúmeros outros, e fabulosos, como
o re’em, animal de proporções gigantescas do
qual um único casal, macho e fêmea, existem. Se
fossem mais numerosos o mundo mal teria como
manter-se diante eles. A cópula dos re’em ocorre
apenas a cada setenta anos, pois Deus ordenou
que o macho e a fêmea residissem em cantos
opostos da terra, um a leste, outro a oeste. A
cópula resulta na morte do macho, que é mordido
pela fêmea e morre com a mordida. A fêmea
emprenha e permanece nesse estado por não
menos que doze anos. Ao final desse longo
período ela dá a luz gêmeos, um macho e uma
fêmea. No ano que precede ao parto ela é incapaz
de se mover e morreria de fome, não fosse pela
saliva que brota copiosamente da sua boca, que
rega e faz frutificar a terra junto a ela, levando-a a
produzir o que basta para o seu sustento. Por um
ano inteiro tudo que o animal consegue fazer é
rolar de uma lado para o outro, até que seu
ventre finalmente se rompe e saem os gêmeos.
Sua aparição é portanto o sinal para a morte da
mãe re’em. Ela abre espaço para a nova geração,
que está por sua vez destinada a sofrer o mesmo
destino da geração anterior. Imediatamente após
o nascimento um dos gêmeos parte para leste e
outro para leste oeste, para reencontrarem-se
apenas após a passagem de setenta anos,
reproduzirem-se e morrerem. Um viajante que
viu certa vez um re’em descreveu-o com tendo
vinte quilômetros de altura, sendo o compri-
mento da sua cabeça de oito quilômetros. Seus
chifres têm uma circunferência de cem metros, e
sua altura é muito maior.
Uma das criaturas mais notáveis é o “homem da
montanha”, Adne Sadeh, ou, simplesmente, Adão.
Sua aparência é exatamente a de um ser humano,
porém ele permanece preso ao chão por um
cordão umbilical, do qual sua vida depende.
Quando o cordão é cortado, ele morre. Esse
animal mantém-se vivo com o que é produzido no
solo ao redor de si, dentro da distância que sua
corda permite que ele cubra. Nenhuma criatura
pode aventurar-se a adentrar o raio do seu
cordão, pois ele ataca e destrói qualquer coisa a
seu alcance. Para matar o Adne Sadeh não se
pode aproximar-se dele; seu cordão umbilical
deve ser rompido à distância com um dardo,
sendo que ele morre em seguida entre gemidos e
lamentos.
Certa vez aconteceu de um viajante encontrar-se
hospedado dentro da região em que esse animal é
encontrado. Ele ouviu, sem ser percebido, seu
anfitrião conversando com a esposa sobre o que
deveriam fazer para honrar seu hóspede, e resol-
vendo servir a ele “o nosso homem”, nas suas
palavras. Pensando que havia caído entre
canibais, o estranho correu o mais rápido que
pôde para longe de seu hóspede, que tentava em
vão impedi-lo. Ele mais tarde descobriu que não
havia existido nenhuma intenção de recreá-lo
com carne humana, mas apenas com a carne de
um estranho animal chamado “homem”.
Da mesma forma que o “homem da montanha”
permanece fixado ao chão pelo seu cordão
umbilical, o barnacle cresce de uma árvore pelo
seu bico. É difícil dizer se ele é um animal que
deve ser abatido antes de ser consumido propria-
mente, ou se é uma planta e pode ser comida sem
nenhum cerimonial.
Dentre os pássaros a fênix é o mais fabuloso.
Quando Eva deu a todos animais um pouco da
fruta da árvore do conhecimento, a fênix foi o
único pássaro que se recusou a comer, tendo sido
então recompensado com vida eterna. Depois de
viver mil anos o seu corpo se encolhe e as penas
caem, até ficar pequeno como um ovo. Esse é o
núcleo do novo pássaro.
A fênix é também chamada de “guardiã da esfera
terrestre”. Ela acompanha o percurso do sol em
seu circuito, estendendo as asas e capturando os
raios inflamados do sol. Não fosse a fênix a
interceptá-los, nem o homem nem outro ser
inanimado teria como sobreviver. Em sua asa
direita estão inscritas em caracteres imensos,
com cerca de quatrocentos estádios de altura, as
seguintes palavras: “não é a terra que me dá
origem, nem o céu, mas somente as asas do fogo”.
Seu alimento consiste em maná do céu e orvalho
da terra. Seu excremento é um verme, cujo excre-
mento é por sua vez a canela usada por reis e
príncipes. Enoque, que viu as fênices quando foi
trasladado, descreve-as como criaturas voadoras,
fabulosas e de aparência estranha, com pés e
caudas de leão e cabeças de crocodilo; seu
aspecto é de cor púrpura semelhante ao arco-íris;
seu tamanho, novecentas medidas. Suas asas são
como as dos anjos, sendo que cada uma tem doze;
as fênices assistem a carruagem do sol e
acompanham-no, levando calor e orvalho onde
são ordenados por Deus. De manhã, quando o sol
dá início a sua jornada diária, as fênices e os
chaldriki cantam, e todos os pássaros batem suas
asas, regozijando o Doador de luz, e cantam uma
canção ao comando do Senhor.
Dentre os répteis a salamandra e o shamir são os
mais fabulosos. A salamandra origina-se de uma
fogueira de madeira de murta mantida ardendo
continuamente por sete anos através de artes
mágicas. Não maior do que um camundongo, a
salamandra é ainda assim investida de proprieda-
des peculiares. A pessoa que se mancha com o
seu sangue torna-se invulnerável, e a teia tecida
por ela é um talismã contra o fogo. As pessoas
que viviam por ocasão do dilúvio se vangloriavam
de que, caso viesse um dilúvio de fogo, protege-
riam a si mesmas com o sangue da salamandra.
O rei Ezequias deve sua vida à salamandra. Seu
perverso pai, o rei Acabe, havia-o entregue aos
fogos de Moloque, e ele teria sido queimado vivo
não tivesse sua mãe pintado o filho com sangue
de salamandra, de modo que o fogo não lhe
causasse mal.
O shamir foi criado no crepúsculo do sexto dia da
criação juntamente com outras coisas extraordi-
nárias. Ele tem o tamanho de um grão de cevada,
e possui a notável propriedade de cortar o mais
duro dos diamantes. Por essa razão ele foi
utilizado para as pedras do peitoral vestido pelo
sumo sacerdote. Primeiro os nomes das doze
tribos foram traçados com tinta nas pedras a
serem engastadas no peitoral, e em seguida o
shamir passou por sobre as linhas, gravando-as.
Uma circunstância formidável foi que a fricção
não produziu qualquer partícula das pedras. O
shamir foi também usado para lavrar as pedras
com as quais o Templo foi construído, porque a
lei probia1 que ferramentas de metal fossem uti-
lizadas na obra do Templo.
O shamir não pode ser guardado num vaso de
ferro ou de qualquer outro metal, porque partiria
em dois o receptáculo. Ele é guardado embru-
lhado num pano de lã, que é por sua vez colocado
num cesto de chumbo cheio de grãos de cevada. O
shamir foi mantido no Paraíso até que Salomão
precisasse dele, tendo enviado sua águia para
trazer até ele o verme. Com a destruição do
templo o shamir desapareceu. Destino seme-
lhante recaiu sobre o tahash, que foi criado com o
propósito único de que sua pele fosse utilizada no
Tabernáculo. Assim que o Tabernáculo foi com-
pletado o tahash desapareceu. Ele possuía um
único chifre na testa, tinha cores alegres como um
peru e pertencia à classe dos animais puros.
Dentre os peixes há também criaturas fabulosas,
como os cabritos-do-mar e os golfinhos, para não
mencionar o leviatã. Um marinheiro viu certa vez
um cabrito-do-mar em cujos chifres estava
gravado: “Sou um pequeno animal marinho, mas
apesar disso atravessei 1500 quilômetros para
me oferecer como comida ao leviatã”. Os
golfinhos são metade homem, metade peixe, e
mantém até mesmo relações sexuais com seres
humanos; são por isso chamados “filhos do mar”,
pois num certo sentido representam a raça
humana na água.
* * *

1
E se me fizeres um altar de pedras, não o cons-
truirás de pedras lavradas; pois se sobre ele
levantares o teu buril, profaná-lo-ás. *Êxodo
20:25*

8. O sexto dia, continuação


9. PAULO BRABO, 07 DE SETEMBRO
DE 2006
10. O SEXTO DIA, CONTINU AÇÃO

11. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS · ILUSTRAÇÃO
12. A CRIAÇÃO: O sexto dia, continuação
13. O GATO E O RATO
14. Embora todas as espécies do mundo
animal tenham sido criadas durante os dois
últimos dias da criação, muitas característi-
cas de certos animais só surgiram mais tarde.
15. Gatos e camundongos, hoje inimigos,
eram originalmente amigos. Sua inimizade
atual teve uma origem específica. Certa
ocasião o camundongo apareceu diante de
Deus e disse:
16. – Eu e o gato somos parceiros, mas agora
não temos o que comer.
17. O Senhor respondeu:
18. – Você está conspirando contra o seu
companheiro só para poder devorá-lo. Como
punição ele é que vai devorar você.
19. Disse o camundongo:
20. – Ó, Senhor do mundo, o que eu fiz de
errado?
21. Deus replicou:
22. – Ah, verme impuro, você deveria ter
aprendido com o exemplo da lua, que perdeu
parte da sua luz por ter falado mal do sol, e o
que ela perdeu foi dado a seu oponente. As
más intenções que você nutre contra o seu
companheiro serão punidas da mesma
maneira. Ao invés de devorar o gato, ele é
que irá devorar você.
23. O camundongo:
24. – Ó, Senhor do mundo! Toda minha
espécie será exterminada?

25. Deus:
26. – Vou cuidar para que um remanescente
seu seja poupado.
27. Em sua indignação o camundongo
mordeu o gato, e o gato por sua vez atirou-se
sobre o camundongo, perfurando-o com os
dentes até matá-lo. Desde aquele momento o
camundongo tem tamanho pavor do gato que
não tenta nem mesmo se defender dos
ataques do inimigo, e vive escondido.
28. CÃES E GATOS
29. Do mesmo modo, cães e gatos desfruta-
vam de uma relação amigável, e só mais tarde
tornaram-se inimigos. Cão e gato eram
parceiros, e compartilhavam um com o outro
do que quer que tivessem. Aconteceu certa
vez que nenhum dos dois foi capaz de
encontrar coisa alguma para comer por três
dias. O cachorro então propôs que encerras-
sem a parceria. O gato iria até Adão, cuja casa
teria por certo o bastante para ele comer,
enquanto o cachorro tentaria a sorte em
outro lugar. Antes de se separarem os dois
juraram jamais recorrer ao mesmo mestre. O
gato foi habitar com Adão, e encontrou
camundongos em número suficiente para
satisfazer o seu apetite. Vendo o quanto era
útil para espantar e exterminar os camun-
dongos, Adão passou a tratar o gato com toda
gentileza.
30. O cachorro, por sua vez, passou maus
bocados. Na primeira noite depois da
separação ele dormiu na caverna do lobo, que
havia-lhe oferecido abrigo por uma noite.
Durante a noite o cão ouviu passos e foi
contar a seu hospedeiro, que disse que ele
fosse expulsar os intrusos. Eram animais
selvagens, e o cachorro por pouco não
perdeu a vida. Desconsolado, o cachorro
fugiu da casa do lobo e foi buscar refúgio com
o macaco. Este recusou-se a conceder a ele
abrigo por uma noite que fosse, e o fugitivo
foi forçado a apelar para a hospitalidade da
ovelha. Novamente o cão ouviu passos no
meio da noite. Obedecendo ao comando de
sua hospedeira ele saiu em perseguição dos
ladrões, que revelou-se no fim das contas
serem lobos. O latido do cachorro informou
os lobos da presença da ovelha, de modo que
ele causou inocentemente a morte dela.
31. O cão havia agora
perdido seu último amigo. Noite após noite
ele saía pedindo abrigo, sem jamais
encontrar um lar. Ele finalmente decidiu
retornar à casa de Adão, que também
concedeu-lhe abrigo por uma noite. Quando
os animais selvagens aproximaram-se da
casa, sob o manto da escuridão, o cão
começou a latir e Adão acordou, expulsando-
os em seguida com seu arco e flecha. Reco-
nhecendo a utilidade do cachorro, Adão
pediu que ele permanecesse para sempre.
Porém logo que viu o cachorro na casa de
Adão o gato começou a discutir com ele,
repreendendo-o por ter violado seu
juramento. Adão fez o melhor que pôde para
apaziguar o gato: disse que ele mesmo tinha
convidado o cão a fazer dali a sua casa, e
assegurou que o gato não perderia nenhum
privilégio com a presença do cachorro; ele
queria que os dois ficassem com ele. Mas foi
impossível aplacar o gato. O cão prometeu
não tocar nem o gato nem qualquer coisa
destinada a ele, mas o gato disse que não
podia viver na mesma casa com um ladrão
como o cachorro. As disputas entre cão e gato
tornaram-se a ordem do dia. Finalmente o
cão disse que não agüentava mais e deixou a
casa de Adão, dirigindo-se á de Sete. Ele foi
acolhido com carinho por Sete e, da casa de
Sete, continuou seus esforços de reconcilia-
ção com o gato. Em vão. Sim, a inimizade
entre o primeiro cão e o primeiro gato são
até hoje transmitidas a seus descendentes.
32. A BOCA DO CAMUNDONGO
33. Até mesmo as peculiaridades físicas de
determinados animais não faziam parte do
seu aspecto original, mas devem sua existên-
cia a algo que ocorreu depois dos dias da
criação. O camundongo tinha a princípio uma
boca muito diferente da atual. Na Arca de
Noé, na qual todos os animais viviam pacifi-
camente a fim de garantir a preservação de
cada espécie, o par de camundongos estava
sentado perto do gato. De repente esse
último lembrou que seu pai tinha o hábito de
devorar ratos; pensando que não havia mal
algum em seguir o seu exemplo, o gato saltou
sobre o camundongo, que procurava sem
sucesso por um buraco por onde escapar.
Então um milagre aconteceu: apareceu um
buraco onde não havia existido nenhum, e o
camundongo buscou abrigo ali. O gato
perseguiu o camundongo, e embora não
pudesse segui-lo buraco adentro, conseguia
enfiar a pata, tentando tirar o camundongo
de seu esconderijo. Depressa o camundongo
abriu a boca na esperança de que a pata
entrasse nela, e o gato fosse assim impedido
de apertar as garras contra sua carne. Mas
como a cavidade da boca não era grande o
bastante o gato conseguiu abrir com as
garras as bochechas do camundongo. Isso
não ajudou muito, pois apenas alargou a boca
do rato, e a presa acabou escapando. Depois
de sua escapada feliz o camundongo

aproximou-se de Noé e disse:


34. – Ó, homem piedoso, costure por gentilza
a minha bochecha onde abriu-a meu inimigo,
o gato.
35. Noé mandou que ele trouxesse um cabelo
do rabo do porco, e com este ele reparou o
dano. Daí originou-se a linha com marca de
costura na boca de todo camundongo, até os
nossos dias.
36. O CORVO
37. O corvo é outro animal que mudou sua
aparência durante sua estada na arca.
Quando Noé pensou em enviá-lo para
averigüar o estado das águas, o corvo
escondeu-se sob as asas da águia. Porém Noé
encontrou-o e disse:
38. – Vá ver se as águas baixaram.
39. O corvo implorou:
40. – Não tem outro pássaro que você possa
enviar nessa missão?
41. Noé:
42. – Meu poder estende-se apenas sobre
você e sobre a pomba.
43. Mas o corvo não estava satisfeito, e disse
a Noé com grande insolência:
44. – Você está me enviando apenas para que
eu encontre a morte, e deseja a minha morte
para que minha esposa esteja a seu serviço.
45. Por essa razão Noé amaldiçoou o corvo
da seguinte forma:
46. – Que sua boca, que falou mal de mim,
seja maldita, e seja sua cópula com sua
esposa realizada apenas através dela.
47. Todos os animais da arca disseram
“Amém”. É por essa razão que uma massa de
saliva escorre da boca do corvo macho para
dentro da boca da fêmea durante a cópula, e é
só assim que ela é fecundada.
48. No todo o corvo é um animal sem
atrativos. Ele permanece hostil com seus
filhotes até que seus corpos estejam cobertos
de penas negras, embora como regra geral os
corvos amem uns aos outros. Deus, por essa
razão, coloca os corvos jovens debaixo de sua
proteção especial. Do excremento dos
filhotes nascem vermes, que lhes servem de
alimentos nos três dias após o nascimento,
até que as penas brancas tornem-se negras e
seus pais reconheçam-nos como sua prole e
passem a cuidar deles.
49. A culpa pelo desajeitado saltitar do corvo
é dele mesmo. Observando o passo gracioso
da pomba ele ficou com inveja e tentou imitá-
lo. Como resultado ele quase quebrou todos
os ossos, sem nisso chegar perto de
conseguir qualquer semelhança com a
pomba, sem mencionar que angariou contra
si mesmo a zombaria de todos os outros
animais. Seu fracasso suscitou o escárnio
deles. Ele decidiu então retomar seu andar
original, mas descobriu que no intervalo o
havia desaprendido. Como não era capaz de
andar de um jeito ou de outro, seu passo
tornou-se um saltitar entre os dois. Nisso
vemos quão verdadeiro é que quem não está
satisfeito com sua modesta porção acaba
perdendo o pouco que tem na luta por coisas
melhores e mais vultosas.
50. O NOVILHO
51. O novilho é outro animal que sofreu
mudanças com o passar do tempo. Original-
mente sua cabeça era completamente coberta
de pelos, mas hoje em dia ele não tem pelos
no focinho, porque Josué beijou-o no focinho
durante o cerco de Jericó. Josué era um
homem extraordinariamente pesado.
Cavalos, jumentos e mulas não podiam com
ele, partindo-se todos sob seu peso. Do que
eles não conseguiram fazer o novilho
mostrou-se capaz. Em seu lombo Josué
cavalgou durante o cerco de Jericó, e em
gratidão concedeu-lhe um beijo no focinho.

52. A SERPENTE, A TOUPEIRA E


O SAPO
53. A serpente também é diferente do que
era no princípio. Antes da queda do homem
ela era o mais sagaz dos animais criados, e
em aparência lembrava de perto o homem.
Andava em pé, e tinha tamanho extraordiná-
rio. Depois da queda a serpente perdeu todas
as vantagens intelectuais que possuía em
relação aos outros animais, e degenerou
também fisicamente: foi privada de pés, de
modo a não poder perseguir outros animais e
matá-los. A toupeira e o sapo também
tiveram de ser feitos inofensivos de modo
similar; o primeiro não tem olhos, do
contrário seria invencível, e o sapo não tem
dentes, do contrário nenhum animal aquático
poderia sobreviver.
54. A RAPOSA
55. Enquanto a sagacidade da serpente
causou sua ruína, a sagacidade da raposa
manteve-a em posição vantajosa numa
situação difícil. Depois que Adão cometeu o
pecado da desobediência Deus entregou todo
o reino animal ao poder do Anjo da Morte, e
ordenou que ele jogasse um par de cada
espécie na água. Ele e o leviatã teriam juntos,
dessa forma, domínio sobre tudo que tem
vida. Quando o Anjo da Morte estava para
executar a ordem divina sobre a raposa, esta
começou a chorar amargamente. O Anjo da
Morte perguntou a razão para as lágrimas, e a
raposa respondeu que estava lamentando o
triste destino de seu amigo. Neste ponto ela
apontou para a imagem de uma raposa no
mar, que nada mais era que seu próprio
reflexo na água. O Anjo da Morte, persuadido
de que um representante da família da
raposa já havia sido atirado na água, deixou-a
ir. A raposa contou esse truque ao gato, que
usou-o também contra o Anjo da Morte.
Assim acontece que nem gatos nem raposas
estão representados no mar, embora todos os
outros animais estejam.
56. Quando passava os animais em revista o
leviatã notou a ausência da raposa, e foi
informado do modo astuto pelo qual ela
havia se esquivado de sua autoridade. Ele
enviou peixes grandes e poderosos na missão
de atraírem o ausente para dentro da água.
57. Andando na beira da água, a raposa
notou o grande número de peixes, e
exclamou:
58. – Feliz de quem pode quando quiser
satisfazer sua fome com peixes como esses.
59. O peixe disse-lhe que bastava que ele os
seguisse e seu apetite seria satisfeito com
facilidade. No mesmo momento informaram
a raposa da grande honra que a aguardava. O
leviatã, disseram eles, estava às portas da
morte, e ele os havia enviado a fim de desig-
narem a raposa como seu sucessor. Os peixes
estavam prontos para carregar a raposa nos
dorsos, de modo que ela não precisava temer
a água, e assim conduziriam-na até o trono,
que ficava sobre um enorme rochedo. A
raposa cedeu a essas persuasões, e desceu
até a água. No mesmo momento um senti-
mento de incomodação tomou posse dela. A
raposa começou a suspeitar que as mesas
haviam sido viradas, e que ela estava sendo
feita de caça, ao invés de fazer os outros de
caça como costumava acontecer. Ela insistiu
que os peixes lhe contassem a verdade, e eles
admitiram quem haviam sido mandados para
prendê-la para o leviatã,

que queria seu coração a


fim de se tornar tão sábio quanto a raposa,
cuja sabedoria ele tinha visto muitos
louvarem. A raposa disse em tom de
repreensão:
60. – Por que não me disseram a verdade de
uma vez? Eu poderia ter trazido meu coração
comigo para o rei Leviatã, que teria me
coberto de honras. Agora vocês sofrerão por
certo grave punição por não terem trazido
comigo meu coração. As raposas, vejam, não
carregam seus corações consigo, mas
mantém-nos num lugar seguro, e só quando
precisam dele retiram-no dali.
61. Os peixes nadaram depressa até a praia,
onde deixaram a raposa, para que ela
pudesse ir buscar seu coração. Mal havia
colocado os pés em terra firme a raposa
começou a saltitar e a bramir. Quando
mandaram-na ir em busca do seu coração e
segui-los, ela disse:
62. – Tolos, como eu poderia tê-los seguido
água adentro, se meu coração não estivesse
comigo? Ou existe então alguma criatura que
possa sair por aí sem seu coração?
63. Os peixes responderam:
64. – Venha, venha de uma vez, isso é brinca-
deira sua.
65. Retrucou a raposa:
66. – Tolos, se fui capaz de passar a perna no
Anjo da Morte, quanto mais em vocês?
67. Os peixes tiveram então de voltar, fracas-
sada sua missão, e o leviatã não teve escolha
a não ser confirmar o julgamento provocador
da raposa:
68. – De fato, a raposa é sábia de coração, e
vocês, tolos.

69.
70. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.
71. Todas as coisas louvam ao Senhor

PAULO BRABO, 14 DE OUTUBRO DE 2006


TODAS AS COISAS LOUVAM AO
SENHOR

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

A CRIAÇÃO: Todas as coisas louvam ao Senhor


“Tudo que Deus criou tem valor.” Até mesmo os
animais e insetos que parecem à primeira vista
inúteis e nocivos tem uma vocação a cumprir. A
lesma, que deixa atrás de si uma trilha pegajosa,
consumindo dessa forma a sua vitalidade, serve
de remédio para o furúnculo. A picada do marim-
bondo é curada aplicando-se à ferida uma mosca
doméstica esmagada. O mosquito, débil criatura,
que capta alimento mas jamais o secreta, é espe-
cífico contra o veneno da víbora, e esse réptil
venenoso cura por sua vez erupções, enquanto
que o lagarto é o antídoto ao escorpião.
Não apenas todas as criaturas servem o homem e
contribuem para o seu conforto, mas Deus
também “ensina-nos através dos animais da
terra, e concede-nos sabedoria através das aves
do céu”. Ele concedeu a diversos animais admirá-
veis qualidades morais como padrão para o
homem. Se a Torá não nos tivesse sido revelada
poderíamos ter aprendido o cuidado para com as
decências da vida com o gato, que cobre seu
excremento com terra; o respeito à propriedade
com as formigas, que jamais avançam sobre as
reservas umas das outras; e o cuidado para com
uma conduta decorosa com o galo, que quando
deseja unir-se à galinha promete comprar para
ela um manto longo o bastante para chegar até o
chão, e quando a galinha lembra-o da promessa
ele sacode sua crista e diz: “que a minha crista
seja tirada de mim se eu não comprá-lo assim que
tiver condições”.
O gafanhoto também tem uma lição a ensinar ao
homem. Ele canta durante todo o verão, até que
seu ventre se rompe e a morte o leva para si.
Embora não desconheça o destino que o espera,
ele permanece cantando. Da mesma forma o
homem deve cumprir seu dever para com Deus,
não importando as conseqüências. A cegonha
deve ser adotada como modelo em dois sentidos.
Ela guarda zelosamente a pureza de sua vida
familiar, e para com seus semelhantes é compas-
siva e misericordiosa. Mesmo o sapo tem o que
ensinar ao homem. Junto à água vive uma espécie
de animal que subsiste apenas de criaturas
aquáticas. Quando percebe que um desses está
com fome o sapo vai até ele espontaneamente e
oferece-se como comida, cumprindo dessa forma
a prescrição: “se teu inimigo tem fome, dê-lhe de
comer; se tiver sede, dê-lhe de beber”.
“Se teu inimigo tem fome, dê-lhe de
comer; se tiver sede, dê-lhe de beber”.
Toda a criação foi chamada à existência por Deus
para sua glória, e cada criatura tem seu próprio
hino de louvor através do qual exalta o criador. O
céu e a terra, o paraíso e o inferno, o deserto e os
prados, rios e mares – todos têm seu modo
próprio de prestar homenagem a Deus. O hino de
louvor da terra é: “dos confins da terra ouvimos
cantar: glória ao Justo!”. O mar exclama: “o
SENHOR nas alturas é mais poderoso do que o
bramido das grandes águas, do que os poderosos
vagalhões do mar”.
Também os corpos celestes e os elementos
proclamam o louvor de seu criador: o sol, a lua, as
estrelas, as nuvens e os ventos, o relâmpago e o
orvalho. O sol diz: “o sol e a lua param nas suas
moradas, ao resplandecer a luz das tuas flechas
sibilantes, ao fulgor do relâmpago da tua lança”; e
as estrelas cantam: “só tu és Senhor, tu fizeste o
céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra e
tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há
neles; tu os preservas a todos com vida, e o
exército dos céus te adora”.
Cada planta, além disso, tem uma canção de
louvor. A árvore frutífera canta: “então cantarão
de alegria todas as árvores do bosque, na
presença do Senhor, pois ele vem; pois vem julgar
a terra”; e as espigas do campo cantam: “os
campos cobrem-se de rebanhos, e os vales
vestem-se de espigas; exultam de alegria e
cantam”.
Notável entre os que cantam louvores são os
pássaros, e dentre eles o maior é o galo. Quando
Deus visita à meia-noite os piedosos no Paraíso,
as árvores dali irrompem em adoração, e suas
canções acordam o galo, que começa por sua vez
a dar louvor. Por sete vezes ele canta, e cada uma
das vezes recita um verso. O primeiro verso é:
“levantai, ó portas, as vossas cabeças; levantai-
vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da
Glória. Quem é o Rei da Glória? O Senhor, forte e
poderoso, o Senhor, poderoso nas batalhas”. O
segundo verso: “levantai, ó portas, as vossas
cabeças; levantai-vos, ó portais eternos, para que
entre o Rei da Glória. Quem é esse Rei da Glória?
O Senhor dos Exércitos, ele é o Rei da Glória”. O
terceiro: “levantai-vos, vós justos, e ocupai-vos da
Torá, para que seja grande a vossa recompensa
no mundo vindouro”. O quarto: “tenho aguardado
pela tua salvação, ó Senhor!” O quinto: “ó pregui-
çoso, até quando ficarás deitado? Quando te
levantarás do teu sono?” O sexto: “não ames o
sono, para que não empobreças; abre os olhos e
te fartarás do teu próprio pão”. E o sétimo verso
cantado pelo galo diz: “já é tempo de trabalhar
para o SENHOR, pois a tua lei está sendo violada”.
A canção do abutre é: “eu lhes assobiarei e os
ajuntarei, porque os tenho remido; multiplicar-
se-ão como antes se tinham multiplicado” – o
mesmo verso com o qual o pássaro anunciará, no
devido tempo, o advento do Messias. A única
diferença será que quando anunciar o Messias ele
cantará esse verso pousado no chão, sendo que
ele o canta sempre sentado em outro lugar.
Tampouco os outros animais louvam menos do
que os pássaros. Mesmo as feras predadoras
entoam adoração. O leão diz: “o Senhor sairá
como valente, despertará o seu zelo como homem
de guerra; clamará, lançará forte grito de guerra e
mostrará sua força contra os seus inimigos”. E a
raposa exorta à justiça com as seguintes palavras:
“ai daquele que edifica a sua casa com injustiça e
os seus aposentos, sem direito! Que se vale do
serviço do seu próximo, sem paga, e não lhe dá o
salário”.
Sim, os peixes mudos do mar sabem proclamar o
louvor de seu Senhor. “Ouve-se a voz do SENHOR
sobre as águas,” dizem eles, “troveja o Deus da
glória; o Senhor está sobre as muitas águas”,
enquanto o sapo exclama: “bendito seja o nome
da glória do seu reino, para todo o sempre”. Des-
prezíveis como são, mesmo os animais rastejan-
tes dão louvor a seu criador. O camundongo
exalta a Deus com as seguintes palavras: “porque
tu és justo em tudo quanto tem vindo sobre nós;
pois tu fielmente procedeste, e nós, perversa-
mente”. E o gato canta: “todo ser que respira
louve ao Senhor. Louvai ao Senhor!”

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

72. O homem e o mundo


73. PAULO BRABO, 25 DE OUTUBRO
DE 2006
74. O HOMEM E O MUNDO

75. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
76. ADÃO: O homem e o mundo
77. Com dez frases Deus criou o mundo,
embora uma única frase tivesse bastado.
Deus queria deixar claro quão severa será a
punição aplicada sobre os perversos, que
destróem o mundo criado através de até dez
frases, e quão agradável a recompensa
destinada aos justos, que preservam o mundo
através de até dez frases.
78. O mundo foi feito para o homem, embora
tenha sido a última de suas criaturas a
chegar. Isso foi proposital, porque o homem
deveria encontrar todas as coisas prontas
para si. Deus foi o anfitrião que preparou
pratos finos, pôs a mesa e em seguida
conduziu o convidado ao seu lugar. Ao
mesmo tempo, a aparição tardia do homem
sobre a terra deve ser vista como uma admo-
estação à humildade. Que o homem se guarde
do orgulho, para não ter de ouvir a provoca-
ção de que o pernilongo é mais velho do
que ele.
79.
A superioridade do homem sobre as outras
criaturas fica evidente no próprio modo da
sua criação, completamente diferente do
delas. Ele foi o único criado pela mão de
Deus: o restante surgiu da palavra de Deus. O
corpo do homem é um microcosmo, um
mundo completo em miniatura, e o mundo,
por sua vez, é um reflexo do homem. O cabelo
da cabeça corresponde às florestas da terra,
suas lágrimas ao mar, sua boca ao oceano. O
mundo, além disso, é semelhante à órbita do
olho do homem: o oceano que engloba a terra
é como o branco do olho, a terra seca é a íris,
Jerusalém a pupila e o Templo a imagem
refletida na pupila.
80. “Por causa de Israel, criarei
o mundo”.
81. Porém o homem é mais do que mera
imagem do mundo. Ele alia em si mesmo qua-
lidades do céu e da terra. De quatro ele faz
lembrar os anjos, de quatro faz lembrar os
animais. Sua capacidade de se expressar, seu
intelecto judicioso, sua postura ereta, o fulgor
do seu olhar – tudo isso faz dele um anjo. Por
outro lado ele come e bebe, expele dejetos do
corpo, reproduz-se e morre, como as feras do
campo. Foi por isso que Deus disse antes da
criação do homem:
82. – Os seres celestiais não se reproduzem,
mas são imortais; os seres da terra se repro-
duzem, mas morrem. Criarei o homem a fim
de unir os dois, de modo a que quando ele
pecar, quando comportar-se como animal, a
morte o acometerá; mas se abster-se de
pecar, viverá para sempre.
83. Deus convocou todos os seres do céu e da
terra para contribuírem na criação do
homem, e ele mesmo tomou parte nela. Por
essa razão todos esses amam o homem, e se
ele viesse a pecar mostrar-se-iam interessa-
dos na sua preservação.
84. O mundo inteiro, naturalmente, foi criado
para o homem piedoso, temente a Deus, que
Israel produz com a oportuna condução da lei
de Deus revelada a ela. Portanto Israel é que
foi levado em consideração quando o homem
foi feito. Todas as outras criaturas foram ins-
truídas a alterarem sua natureza se em algum
momento do curso da história Israel preci-
sasse de ajuda. Ao mar foi ordenado que se
dividisse diante de Moisés, e ao céu que desse
ouvidos às palavras do líder; o sol e a lua
foram instados a pararem sob o comando de
Josué, os corvos a alimentarem Elias, o fogo a
poupar os três jovens na fornalha, o leão a
não causar dano a Daniel, o peixe a cuspir
Jonas e o céu a abrir-se para Ezequiel.
85. Em sua humildade, Deus consultou os
anjos, antes da criação do mundo, a respeito
de sua intenção de criar o homem. Ele disse:
86. – Por causa de Israel, criarei o mundo.
Farei divisão entre luz e trevas, da mesma
forma que no futuro farei por Israel no Egito:
densas trevas cobrirão a terra, e os filhos de
Israel terão luz em suas habitações; farei
separação entre as águas abaixo do firma-
mento e as águas acima do firmamento, da
mesma forma que farei por Israel: dividirei as
águas para ele na travessia do Mar Vermelho;
no terceiro dia criarei as plantas, e farei da
mesma forma por Israel: produzirei para ele
o maná no deserto; criarei os grandes
luminares para dividirem o dia e a noite, e
farei o mesmo por Israel: irei diante dele
como uma coluna de nuvem durante o dia e
como uma coluna de fogo durante a noite;
criarei as aves do céu e os peixes do mar, e
farei o mesmo por Israel: trarei para ele
codornizes do mar; da mesma forma que
soprarei o fôlego da vida nas narinas do
homem, farei por Israel: darei a ele a Torá, a
árvore da vida.
87. Toda a criação foi condicional.
88. Os anjos maravilharam-se de que tanto
amor fosse dispensado ao povo de Israel, e
Deus disse a eles:
89. – No primeiro dia da criação farei o céu e
o estenderei; da mesma forma Israel erguerá
o Tabernáculo como habitação da minha
glória. No segundo dia estabelecerei uma
divisão entre as águas da terra e as águas do
céu; da mesma forma Israel pendurará no
Tabernáculo um véu para separar o lugar
Santo do Santo dos Santos. No terceiro dia
farei com que a terra produza ervas e
vegetação; da mesma forma Israel, em obedi-
ência aos meus mandamentos, comerá ervas
na primeira noite da Páscoa, e preparará
para mim os pães da proposição. No quarto
dia farei os luminares; da mesma forma
Israel fará para mim o candelabro de ouro.
No quinto dia criarei os pássaros; da mesma
forma ele moldará [sobre a Arca] os
querubins de asas estendidas. No sexto dia
criarei o homem; da mesma forma Israel
separará um homem dos filhos de Arão para
sumo-sacerdote a meu serviço.
90. Conseqüentemente, toda a criação foi
condicional. Deus disse às coisas que fez nos
seis primeiros dias:
91. – Se Israel aceitar a Torá, vocês permane-
cerão e se perpetuarão; de outro modo farei
com que tudo retorne ao caos.
92. O mundo inteiro viveu portanto em
suspense e temor até o dia da revelação do
Sinai, quando Israel recebeu e aceitou a Torá,
cumprindo assim a condição estabelecida por
Deus no momento em que criara o universo.

93.
94. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

95. Os anjos e a criação do homem


PAULO BRABO, 11 DE N OVEMBRO DE
2006
OS ANJOS E A CRIAÇÃO DO HOMEM

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

ADÃO: Os anjos e a criação do homem


Deus em sua sabedoria, tendo decidido criar o
homem, pediu o conselho de todos a seu redor
antes de levar a cabo seu propósito – exemplo
para que o homem, não importa quão grande e
notável seja, não despreze o conselho dos
humildes e fracos. Primeiro Deus chamou o céu e
a terra, depois todas as coisas criadas, e por
último os anjos.
Os anjos não estavam todos de acordo. O anjo do
Amor era a favor da criação do homem, porque
ele seria afetuoso e amoroso, mas o anjo da
Verdade se opunha, porque ele seria cheio de
mentiras. E, embora o anjo da Justiça fosse a
favor, porque ele praticaria a justiça, o anjo da
Paz se opunha, porque ele seria contencioso.
A fim de invalidar o seu protesto, Deus atirou o
anjo da Verdade do céu contra a terra, e quando
os outros bradaram em protesto contra trata-
mento tão injurioso, Deus disse: “A verdade
brotará da terra1”.
As objeções dos anjos teriam sido muito mais
veementes se eles tivessem conhecido a verdade
a respeito do homem. Deus havia lhes contado
apenas sobre os piedosos, ocultando deles que
haveria no gênero humano gente reprovável.
Ainda assim, embora conhecessem apenas
metade da verdade, os anjos puseram-se a
clamar:
– Que é o homem, que dele te lembres? E o filho
do homem, que o visites2?
Deus respondeu:
– As aves do céu e os peixes do mar, para que
foram criados? De que serve uma dispensa cheia
de delícias finas, se não há convidado para
desfrutar delas?
E os anjos só puderam exclamar:
– Ó Senhor, nosso Senhor, quão admirável é teu
nome em toda a terra! Faze como é agradável a
teus olhos.

Para um número não insiginificante de


anjos sua oposição trouxe conseqüências fatais.
Quando Deus convocou o grupo sob a liderança
do arcanjo Miguel e perguntou-lhes sua opinião
sobre o homem, eles responderam com desdém:
– Que é o homem, que dele te lembres? E o filho
do homem, que o visites?
Deus estendeu imediatamente o seu dedo
mínimo, e todos foram consumidos pelo fogo
exceto seu líder, Miguel. O mesmo destino
sobreveio ao grupo sob a liderança do arcanjo
Gabriel; apenas ele foi salvo da destruição.
O terceiro grupo consultado era comandado pelo
arcanjo Labiel. Ensinado pela terrível sina de seus
predecessores, ele advertiu sua tropa:
– Vocês viram que infortúnio recaiu sobre os
anjos que disseram “que é o homem, que dele te
lembres?” Cuidemos para não fazermos o mesmo,
para que não soframos a mesma dura punição.
Pois Deus não deixará de fazer no fim o que
planejou. É aconselhável portanto que cedamos a
seus desejos.
Assim advertidos, os anjos disseram:
– Senhor do mundo, é bom que pensaste em criar
o homem. Cria-o deveras de acordo com a tua
vontade. Quanto a nós, seremos assistentes e
ministros dele.
Por causa disso Deus mudou o nome de Labiel
para Rafael, o Resgatador, porque sua hoste de
anjos foi resgatada pelo sábio conselho. Ele foi
designado como anjo da Cura, que tem sob seu
cuidado todos os remédios celestiais, arquétipos
dos remédios utilizados na terra.
* * *

1
Salmo 85:11
2
Salmo 8:4

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

96. A criação de Adão


97. PAULO BRABO, 21 DE NOVEMBRO
DE 2006
98. A CRIAÇÃO DE ADÃO
99. Estocado em GOIABAS
ROUBADAS
100. ADÃO: A criação de Adão
101. Quando finalmente o assentimento dos
anjos foi dado à criação do homem, Deus
disse a Gabriel:
102. – Vá e me traga poeira dos quatro cantos
da terra. Criarei o homem a partir dela.
103. Gabriel foi cumprir a ordem do Senhor,
mas a terra o repeliu, recusando-se a deixar
que ele juntasse poeira dela. Gabriel
repreendeu:
104. – Por quê, Terra, você não cede à voz do
Senhor, que fundou-a sobre as águas sem
recorrer a escoras ou pilares?
105. A terra respondeu:

106. – Estou destinada a ser


amaldiçoada, e amaldiçoada por causa do
homem1. Se o próprio Deus não vier tirar a
poeira de mim, não será qualquer outro a
fazê-lo.
107. Quando ouviu isso Deus estendeu sua
mão, pegou poeira do chão e criou o primeiro
homem a partir dela. Propositalmente esse
pó foi tirado dos quatro cantos da terra, para
que se um homem do oriente morresse no
ocidente, ou um homem do ocidente
morresse no oriente, a terra não se recusasse
a receber o morto, dizendo para que voltasse
ao lugar de onde havia sido tirado. Quando
acontece de um homem morrer, e no local em
que é enterrado, ali retorna ele à terra da
qual foi gerado. A poeira era além disso de
várias cores: vermelha, negra, branca e verde
– vermelha para o sangue, negra para as
entranhas, branca para os ossos e veias e
verde para a pele pálida.
108. Neste momento a Torá interferiu,
dirigindo-se a Deus:
109. – Ó, Senhor do mundo! O mundo é teu, e
podes fazer dele o que parecer bom a teus
olhos. Porém o homem que estás agora
criando será parco em dias e pleno de
conflito e de pecado. Se não é teu propósito
ter longanimidade e paciência para com ele,
melhor seria não chamá-lo á existência.
110. Deus respondeu:
111. – É por acaso que sou chamado de
longânimo e misericordioso2?
112. A graça e a ternura de Deus revelaram-se
de forma particular no fato dele ter retirado
um punhado de poeira do lugar onde mais
tarde se ergueria um altar, dizendo:
113. – Farei o homem a partir deste lugar de
reconciliação, para que ele possa perdurar.
114. Photo by Iain R
Escultura: Ron Mueck
115. 1 Gênesis 3:17
116. 2 Êxodo 34:5,6

117.
118. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

119. A alma do homem

PAULO BRABO, 12 DE DEZEMBRO DE


2006
A ALMA DO HOMEM

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

ADÃO: A alma do homem


O cuidado com que Deus moldou cada detalhe do
corpo do homem nada é em comparação com sua
solicitude na criação da alma humana. A alma do
homem foi criada no primeiro dia, pois é o
espírito de Deus movendo-se sobre a face das
águas. Assim, ao invés de ser o último, o homem é
na verdade a primeira obra da criação.
O espírito, ou, para chamá-lo pelo seu nome
usual, a alma do homem, possui cinco poderes
diferentes. Através de um deles ela escapa do
corpo todas as noites, sobe até o céu e ali busca
nova vida para o homem.
A alma do homem foi criada no primeiro
dia, pois é o espírito de Deus movendo-
se sobre a face das águas.
Com a alma de Adão foram criadas as almas de
todas gerações de homens. Estão elas armazena-
das num prontuário no sétimo dos céus, de onde
são retiradas à medida em que são necessárias
para cada corpo humano.
A alma e o corpo do homem são
unidas da seguinte forma: quando uma mulher
concebe, o Anjo da Noite, Lailah, carrega o
esperma até a presença de Deus, e Deus decreta
que sorte de ser humano sairá dali – se será
homem ou mulher, forte ou fraco, rico ou pobre,
bonito ou feio, alto ou baixo, magro ou gordo, e
quais serão todas as suas outras qualidades.
Apenas a piedade e a impiedade são deixadas sob
a determinação do próprio homem. Deus estão
faz um sinal para o anjo responsável pelas almas
e diz:
– Traga-me aquela alma assim-e-assim, que está
escondida no Paraíso, cujo nome é assim-e-assim,
e cuja forma é assim-e-assim.
O anjo traz a alma designada, que faz uma reve-
rência quando entra na presença de Deus, e
prostra-se diante dele. Naquele momento Deus dá
a ordem:
– Entre nesse esperma.
A alma abre sua boca e implora:
– Ah, Senhor do mundo, estou muito satisfeita
com o mundo em que tenho vivido desde o dia
em que me chamaste à existência. Por que desejas
agora que eu entre nesse esperma impuro, eu que
sou santa e pura, e parte da tua glória?
Deus a consola:
– O mundo em que farei você entrar é melhor do
que o mundo em que você tem vivido; quando
criei você, foi apenas com esse propósito.
A alma é então forçada a entrar contra à vontade
no esperma, e o anjo carrega-a de volta para o
útero da mãe. Dois anjos são especificados para
cuidarem que a alma não saia dele, nem caia fora
dele, e uma luz é colocada acima dela, através da
qual a alma pode ver de uma extremidade à outra
do mundo.
De manhã um anjo a carrega ao Paraíso e mostra
a ela os justos, ali assentados em sua glória, com
coroas sobre suas cabeças. O anjo então diz
à alma:
– Sabe quem são esses?
Ela responde que não, e o anjo prossegue:
– Esses que você contempla foram formados,
como você, no útero da mãe deles. Quando
entraram no mundo esses guardaram a Torá de
Deus e seus mandamentos, e foram por isso
tornados participantes da bem-aventurança de
que você os vê agora desfrutar. Saiba que você irá
também um dia deixar o mundo lá embaixo, e que
se guardar a Torá de Deus será achada digna de
sentar-se com esses piedosos. Se não, estará
condenada ao outro lugar.
De noite o anjo leva a alma ao inferno, e mostra
os pecadores a quem os Anjos da Destruição
estão castigando com açoites de fogo. Os
pecadores estão todos bradando: “Ai de nós! Ai
de nós!”, mas nenhuma misericórdia é concedida
a eles. O anjo pergunta como antes:
– Sabe quem são esses?
Como antes a resposta é negativa, e o anjo
continua:
– Esses que são consumidos pelo fogo foram
criados como você. Quando colocados no mundo
eles não guardaram a Torá de Deus e seus man-
damentos, e vieram por isso para esta desgraça
que você os vê sofrer. Saiba que seu destino
também é deixar o mundo. Seja justa, portanto, e
não perversa, para que possa ganhar o mundo
futuro.
Do mesmo modo que foi formada contra
a vontade, você agora nascerá contra a
vontade.
Entre a manhã e a noite o anjo carrega a alma de
um lugar a outro, mostrando onde ela vai viver e
onde vai morrer, o lugar em que será enterrada, e
leva-a pelo mundo todo, apontando os justos e os
pecadores e todas as coisas. De noite ele a
recoloca no útero da mãe, onde ela permanece
por nove meses.
Quando chega a hora de emergir do útero para o
mundo, o mesmo anjo dirige-se à alma:
– Chegou a hora de você sair para o mundo.
A alma objeta:
– Por que você me quer fazer sair para o mundo?
O anjo responde:
– Saiba que, do mesmo modo que foi formada
contra a vontade, você agora nascerá contra a
vontade, e contra a vontade morrerá, e contra a
vontade prestará contas diante do Rei dos reis, o
Santo, bendito seja ele.
A alma está ainda relutante em deixar o seu lugar.
O anjo faz um carinho com os dedos nos lábios do
nenê, apaga a luz à sua cabeça e a traz para o
mundo contra a vontade. Imediatamente a
criança esquece tudo que sua alma viu e
aprendeu, e vem ao mundo chorando, por ter
perdido um lugar de refúgio e segurança e
descanso.
Quando chega a hora do homem deixar este
mundo o mesmo anjo aparece e pergunta:
– Você me reconhece?
O homem responde:
– Sim, mas por que você veio até mim hoje, e não
outro dia?
O anjo diz:
– Para tirá-lo deste mundo, pois a hora da partida
chegou.
O homem cai no choro, e sua voz alcança as extre-
midades do mundo, porém nenhuma criatura
ouve a sua voz, com exceção do galo. O homem
protesta:
– De dois mundos você me tirou, e para este
mundo você me trouxe.
Mas o anjo lembra:
– Eu não lhe disse que você foi formado contra a
vontade, nasceu contra a vontade e contra a
vontade morreria? Agora, contra a vontade, você
terá de prestar contas de si mesmo diante do
Santo, bendito seja ele.

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

120. O homem ideal


121. PAULO BRABO, 08 DE JANEIRO DE
2007
122. O HOMEM IDEAL

123. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
124. ADÃO: O homem ideal
125. Como todas as criaturas formadas nos
seis dias da criação, Adão saiu das mãos de
Deus plenamente desenvolvido. Ele não era
como uma criança, mas como um homem de
vinte anos de idade. As dimensões do seu
corpo eram gigantescas, atingindo da terra ao
céu ou, o que representa o mesmo, do oriente
ao ocidente. Entre as gerações seguintes dos
homens, houve poucos cujas medidas
compararam-se a Adão em seu tamanho
extraordinário e perfeições físicas. Sansão
possuía sua força, Saul seu pescoço, Absalão
seu cabelo, Asael sua ligeireza de pés, Uzias
sua testa, Josias suas narinas, Zedequias seus
olhos e Zerubabel sua voz. A história
demonstra que essas excelências não repre-
sentaram bençãos para muitos de seus pos-
suidores; levou à ruína quase todos

eles. A força extraordinária


de Sansão ocasionou sua morte; Saul
suicidou-se cortando o pescoço com sua
própria espada; embora corresse com
agilidade, Asael foi atravessado pela espada
de Abner; Absalão ficou preso pelo cabelo a
um carvalho, e assim suspenso encontrou a
morte; Uzias foi acometido de lepra na testa;
os dardos que mataram Josias entraram-lhe
pelas narias, e os olhos de Zedequias foram
cegados.
126. A maioria dos homens herdou tão pouca
da beleza quanto do tamanho portentoso de
seu primeiro pai. As mais belas mulheres,
comparadas a Sara, são como os grandes
macacos comparados a seres humanos. O
mesmo acontece na comparação de Sara com
Eva, mas Eva era também um mero macaco
quando comparada a Adão. A figura dele era
tão bela que bastava a sola do seu pé para
ofuscar o esplendor do sol.
127. Adão era tão bonito que bastava a
sola do seu pé para ofuscar o esplendor
do sol.
128. Suas qualidades espirituais andavam em
paridade com seu charme pessoal, pois Deus
formara sua alma com cuidado especial. A
alma do homem era a imagem de Deus, e
Deus enche o mundo, de modo que a alma
enche o corpo humano; da mesma forma que
Deus vê todas as coisas, e não é visto por
ninguém, a alma vê, mas não pode ser vista;
da mesma forma que Deus guia o mundo, a
alma guia o corpo; da mesma forma que Deus
em sua santidade é puro, também é pura a
alma; como Deus habita em segredo, também
a alma.
129. Quando estava para colocar a alma no
corpo argiloso de Adão, Deus disse:
130. – Por onde soprarei a alma dentro do
homem? Pela boca? Não, pois ele irá usá-la
para falar mal de seu semelhante. Pelos
olhos? Com eles ele piscará libidinosamente.
Pelos ouvidos? Esses darão atenção a calúnia
e blasfêmia. Soprarei a alma em suas narinas:
da mesma forma que elas discernem o que é
impuro e rejeitam-no, recebendo de bom
grado o que é perfumado, os piedosos
esquivar-se-ão do pecado, e apegar-se-ão às
palavras
da Torá.
131. As perfeições da alma de Adão
manifestaram-se tão logo ele a recebeu,
mesmo antes que ele ganhasse vida. No
intervalo de uma hora que separou o soprar
da alma no primeiro homem e o momento em
que ele ganhou vida, Deus revelou-lhe toda a
história da humanidade. Deus mostrou a
Adão cada geração e seus líderes; cada
geração e seus profetas; cada geração e seus
professores; cada geração e seus eruditos;
cada geração e seus homens de estado; cada
geração e seus juízes; cada geração e seus
integrantes piedosos; cada geração e seus
integrantes comuns, medianos; cada geração
e seus integrantes ímpios. A história de seus
anos, o número de seus dias, o cálculo de
suas horas e a medida de seus passos foram
todos revelados a ele.
132. No intervalo que separou o soprar
da alma no homem e o momento em
que ele ganhou vida, Deus revelou-lhe
toda a história da humanidade.
133. De sua própria vontade Adão abriu mão
de setenta anos dos que haviam sido designa-
dos a ele. Seu tempo designado de vida era
para ser de mil anos, um dos dias do Senhor.
Mas Adão viu que um único minuto de vida
havia sido alocado para a grande alma de
Davi, e presenteou-a com setenta dos seus
anos, reduzindo os anos que lhe cabiam de
mil para novecentos e trinta.
134. A sabedoria de Adão mostrou-se extre-
mamente vantajosa quando ele deu nome aos
animais. Pareceu então que Deus, ao rebater
os argumentos dos anjos que se opunham à
criação do homem, havia falado bem quando
insistira que o homem deveria possuir mais
sabedoria do que os anjos.
135.
Adão tinha menos de uma hora de idade
quando Deus reuniu todo o mundo animal
diante dele e dos anjos. Esses últimos foram
chamados para dar nome às diferentes
espécies, mas não se mostraram à altura da
tarefa. Adão, no entanto, falou sem hesitação:
136. – Ó Senhor do mundo! O nome apropri-
ado para este animal é touro, este cavalo, este
leão, este camelo.
137. Ele dessa forma chamou a todos, um de
cada vez, pelo seu nome, adequando o nome
à peculiaridade de cada animal. Deus então
perguntou-lhe como ele deveria se chamar, e
ele disse “Adão”, porque havia sido criado de
Adamah, o pó da terra. Deus então pediu a ele
o seu próprio nome, e Adão disse:
138. – Adonai, “Senhor”, porque és Senhor de
todas as criaturas – sendo que Adonai era o
nome que Deus havia dado a si mesmo, o
nome pelo qual os anjos o chamam, o nome
que permanecerá imutável para sempre.
139. Porém, não fosse o espírito santo, Adão
não teria sido capaz de encontrar nome
algum; ele era na verdade profeta, e sua
sabedoria era uma qualidade profética.

140.
Os nomes dos animais não foram a única
herança deixada por Adão para as gerações
que seguiram-se a ele, pois a humanidade
deve a ele todos os ofícios, especialmente a
arte de escrever, e foi ele o inventor de todos
os setenta idiomas. Ainda outra tarefa Adão
realizou pelos seus descendentes: Deus
mostrou a ele toda a terra, e Adão designou
quais lugares seriam mais tarde ocupados
pelos homens, bem como os lugares que per-
maneceriam desabitados.
141.
142. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

143. A queda de Satanás

PAULO BRABO, 17 DE JANEIRO DE 2007


A QUEDA DE SATANÁS

Estocado em GOIABAS
ROUBADAS · ILUSTRAÇÃO
ADÃO: A queda de Satanás
As extraordinárias qualidades com que Adão foi
abençoado, tanto físicas quanto espirituais, susci-
taram a inveja dos anjos. Esses tentaram
consumi-lo com fogo, e ele teria perecido, não
tivesse a mão protetora de Deus se estendido
sobre ele, e estabelecido a paz entre ele e os
exércitos celestiais.
Satanás, em particular, tinha ciúme do primeiro
homem, e seus maus pensamentos levaram por
fim à sua queda. Depois de ter dotado Adão de
alma, Deus convidara todos os anjos para virem e
prestarem-lhe reverência e homenagem. Satanás,
o mais insígne anjo do céu, dotado de doze asas
ao invés das seis de todos os outros, recusara-se a
obedecer à ordem de Deus, dizendo:
– Criaste a nós, os anjos, a partir do esplendor
da Shekiná, e agora ordenas que nos prostremos
diante da criatura que moldaste do pó da terra!
Deus respondeu:
– Todavia o pó da terra exibe mais sabedoria e
entendimento do que você.
Satanás exigiu uma prova de inteligência com
Adão, e Deus assentiu, dizendo:
– Criei animais selvagens, pássaros e répteis. Tra-
los-ei a todos diante de você e de Adão. Se você
for capaz de dar nomes a eles, mandarei que Adão
lhe preste homenagem, e você habitará junto à
Shekiná da minha glória. Caso contrário, no
entanto, se Adão chamá-los pelos nomes que
designei a eles, você se sujeitará a Adão, e ele terá
um lugar no meu jardim, e o cultivará.
“Preste adoração à imagem de Deus!”
Assim disse Deus e dirigiu-se ao Paraíso, seguido
por Satanás. Quando viu a Deus, Adão disse a sua
mulher:
– Venha, adoremos e prostemo-nos; ajoelho-mo-
nos diante do Senhor, nosso Criador.
Satanás tentou então atribuir nomes aos animais,
tendo fracassado nas duas primeiras tentativas, o
touro e a vaca. Deus conduziu dois outros animais
até diante dele, o camelo e o jumento, com o
mesmo resultado. Deus voltou-se então para
Adão, e questionou-lhe a respeito dos nomes dos
mesmos animais, construindo suas perguntas de
modo a que a primeira letra da primeira palavra
fosse a primeira letra do nome do animal posto
diante dele. Desta forma Adão foi capaz de
adivinhar os nomes corretamente, e Satanás viu-
se forçado a reconhecer a superioridade do
primeiro homem. Ele porém irrompeu em
clamores bárbaros que atingiram o céu,
recusando-se a prestar homenagem a Adão como
lhe havia sido ordenado.
O exército de anjos comandado por Satanás agiu
da mesma forma, a despeito dos protestos de
Miguel, que foi o primeiro a prostrar-se diante de
Adão a fim de dar exemplo aos outros anjos.
Miguel dirigiu-se a Satanás:
– Preste adoração à imagem de Deus! Se você se
recusar, o Senhor Deus lançar-se-á em cólera
contra você.
Satanás retrucou:
– Se ele se lançar em cólera contra mim, exaltarei
meu trono acima das estrelas de Deus, e serei
como o Altíssimo!
Imediatamente Deus lançou Satanás e seu
exército para fora do céu sobre a terra, e é
daquele momento que data a inimizade entre
Satanás e o homem.

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

144. A mulher
145. PAULO BRABO, 21 DE FEVEREIRO
DE 2007
146. A MULHER

147. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS

148.
149. ADÃO: A mulher
150. Quando abriu seus olhos pela primeira
vez e contemplou o mundo ao seu redor,
Adão irrompeu em louvor a Deus:
151. — Quão grandes são tuas obras, Senhor!
152. Porém sua admiração pelo mundo ao seu
redor não excedeu a admiração que todas as
coisas criadas dispensaram a Adão. Elas
tomaram-no por seu criador, e vieram
prestar-lhe adoração. Ele porém disse:
153. — Por que vocês vêem adorar a mim?
Não, eu e vocês juntos reconheceremos a
majestade e o poder daquele que nos criou a
todos. “O Senhor reina” — declarou ele, — “e
está revestido de majestade!”
154. Não apenas as criaturas da terra: até
mesmo os anjos chegaram a pensar que Adão
fosse senhor de todos, e eles estavam prestes
a saudá-lo com o “Santo, santo, santo é o
Senhor dos exércitos” quando Deus fez com
Adão caísse no sono; os anjos souberam
então que ele não passava de um ser humano.
155. O propósito do sono que recaiu sobre
Adão era dar a ele uma esposa, para que a
raça humana pudesse se desenvolver e todas
as criaturas reconhecessem a diferença entre
Deus e o homem. Quando ouviu o que Deus
estava decidido a fazer, a terra começou a
tremer e sacudir.
156. — Não tenho forças — ela disse – para
prover comida para multidão dos descenden-
tes de Adão.
157. Por essa razão o tempo foi dividido entre
Deus e a terra: Deus ficou com a noite, a terra
com o dia. O sono reconfortante sustenta e
fortalece o homem, proporciona-lhe vida e
descanso, enquanto a terra produz fruto com
a ajuda de Deus, que a rega. Ainda assim o
homem tem de trabalhar a terra a fim de
ganhar o seu sustento.
158. A decisão divina de conceder uma com-
panheira a Adão veio ao encontro dos anseios
do homem, que havia sido tomado por uma
sensação de isolamento quando os animais
vieram até ele em pares para receberem
seus nomes.
159. Apesar de todo cuidado empregado,
a mulher apresenta todas as falhas que
Deus procurou evitar.
160. A fim de banir sua solidão, a primeira
mulher dada como esposa a Adão foi Lilith.
Como ele, Lilith foi criada do pó da terra; ela
porém permaneceu com ele por um intervalo
muito curto, porque insistia em desfrutar de
igualdade completa com seu marido. Ela jus-
tificava seus direitos a partir de sua origem
comum. Com a ajuda do Nome Inefável, que
ela proferiu, Lilith fugiu de Adão e desapare-
ceu em pleno ar. Adão veio reclamar diante
de Deus que a mulher que ele lhe havia dado
o havia abandonado, e Deus enviou três anjos
para capturá-la. Esses foram encontrá-la no
Mar Vermelho, e tentaram fazê-la voltar com
a ameaça de que caso não fosse ela perderia
diariamente cem de seus filhos-
demônios.

Lilith, no entanto, preferiu essa punição a


viver com Adão. Ela se vinga ferindo
crianças-de-colo — os meninos durante sua
primeira noite de vida, sendo que as meninas
estão expostas a seus desígnios perversos até
os vinte anos de idade. O único modo de
afastar o mal é colocando nas crianças um
amuleto que traz os nomes de seus três anjos
captores, pois esse foi o acordo feito
entre eles.
161. A mulher destinada a ser a verdadeira
companheira do homem foi tomada do corpo
de Adão, pois “apenas quando semelhante é
unido a semelhante a união é indissolúvel”. A
criação da mulher a partir do homem foi
possível porque Adão tinha originalmente
duas faces, que foram separadas com o nasci-
mento de Eva.
162. Quando estava a ponto de criar Eva,
Deus disse:
163. – Não farei a mulher a partir da cabeça
do homem, para que ela não ande de cabeça
empinada em orgulho e arrogância; não a
farei a partir do olho, para que seus olhos não
sejam licenciosos; não a partir do ouvido,
para que ela não fique ouvindo conversa
alheia; não a partir do pescoço, para que ela
não seja insolente; não a partir da boca, para
que ela não seja tagarela; não a partir do
coração, para que ela não seja inclinada à
inveja; não a partir da mão, para que ela não
seja intrometida; não a partir do pé, para que
ela não seja vagabunda. Irei formá-la a partir
de uma parte casta do corpo.
164. A cada membro e orgão que formava,
Deus ia dizendo:
165. – Seja casto! Seja casto!
166. Entretanto, apesar de todo cuidado
empregado, a mulher apresenta todas as
falhas que Deus tentou evitar. As filhas de
Sião foram arrogantes e andaram com
pescoços empinados e olhos licenciosos; Sara
ouviu a conversa alheia em sua própria
tenda, quando o anjo falava com Abraão;
Miriam foi mexeriqueira, acusando Moisés;
Raquel teve inveja de sua irmã Léia; Eva
colocou suas mãos sobre o fruto proibido, e
Diná foi vagabunda.
167. A constituição física da mulher é muito
mais complicada do que a do homem, já que
deve servir para a concepção; semelhante-
mente, a inteligência da mulher amadurece
mais cedo do que a inteligência do homem.
Muitas das diferenças físicas e psíquicas
entre os dois sexos podem ser atribuídas ao
fato de que o homem foi formado da terra e a
mulher do osso. Mulheres precisam de
perfumes, homens não: a poeira do chão
permanece inalterada não importa por
quanto tempo seja guardada; a carne, no
entanto, requer sal para ser mantida em boas
condições. A voz da mulher é estridente, a
voz do homem não: quando alguma carne
macia é cozida, nenhum sol é ouvido, mas
basta colocar um osso na panela e ele racha
de imediato. O homem é fácil de aplacar, a
mulher não: umas poucas gotas d’água
bastam para amolecer um torrão de terra, já
um osso permanece duro, mesmo que mergu-
lhado em água por dias. O homem deve pedir
à mulher para ser sua esposa, e não a mulher
o homem para ser seu marido, porque foi o
homem que teve de arcar com a perda de sua
costela; ele dá a investida no intento de
cobrir o seu prejuízo.
168. As próprias de diferenças de modo de
vestir e conduta social tem suas razões na
origem do homem e da mulher. A mulher
cobre o cabelo em memória do fato de ter
sido Eva quem trouxe o pecado ao mundo;
ela tenta dessa forma esconder a sua
vergonha. Os mandamentos religiosos ende-
reçados apenas às mulheres remetem à
história de Eva. Adão era a oferta alçada do
mundo, e Eva a maculou; como forma de
expiação é ordenado às mulheres que
separem uma oferta alçada da massa de
farinha. E, por ter sido a mulher quem
apagou a luz da alma do homem, a ela é
ordenado que acenda a lâmpada do Shabat.
169. O mundo está fundamentado em
serviços de amizade.
170. Adão foi levado a cair num sono
profundo antes que a costela para Eva fosse
retirada do seu lado. Isso porque se ele
tivesse observado a sua criação ela não teria
despertado amor nele. Até hoje permanece
verdade que os homens não são capazes de
apreciar os charmes de mulheres que obser-
varam e conheceram desde a infância. De
fato, Deus havia criado uma mulher para
Adão antes de Eva, mas ele a rejeitou, porque
ela havia sido feita na frente dele. Conhe-
cendo todos os detalhes de sua formação ele
sentiu repulsa por ela.
171. Porém quando despertou de seu sono
profundo e viu Eva diante dele em toda sua
surpreendente beleza e graça, ele exclamou:
172. – Esta é aquela que levava meu coração a
palpitar por inúmeras noites!
173. Ele porém logo discerniu qual era a ver-
dadeira natureza da mulher. Ela, sabia ele,
lograria convencer o homem fosse através de
súplicas ou lágrimas, elogios ou carícias. Ele
por isso disse:
174. – Esse é o meu sino que nunca pára
de tocar!
175. O casamento do primeiro casal foi
celebrado com pompa jamais repetida no
curso de toda história. O próprio Deus, antes
de apresentá-la a Adão, vestiu e adornou a
Eva como noiva. Sim, ele interpelou os anjos,
dizendo:
176. – Venham, prestemos serviços de
amizade por Adão e sua companheira, pois o
mundo está fundamentado em serviços de
cordialidade, e esses me são mais agradáveis
aos olhos do que os sacrifícios que Israel irá
oferecer sobre o altar.
177. Assim sendo, os anjos cercaram o pálio
matrimonial e Deus proferiu as bençãos
sobre o casal, da mesma forma que o Hazan
faz sob o Huppah. Os anjos dançaram e
tocaram instrumentos musicais diante de
Adão e Eva em suas dez câmaras matrimoni-
ais feitas de ouro, pérolas e pedras preciosas,
que Deus havia preparado para eles.

178.
Adão deu a sua mulher o nome de Ishah e
passou a chamar a si mesmo de Ish, abando-
nando o nome Adão, que ele usara antes da
criação de Eva. Isso porque Deus acrescen-
tara seu próprio nome Yah aos nomes do
homem e da mulher – a letra Yoide a Ish e a
letra He a Ishah, – para indicar que enquanto
andassem nos caminhos de Deus e observas-
sem os seus mandamentos, seu nome lhes
seria um escudo contra todo mal. Porém se se
desviassem seu nome seria retirado, e ao
invés de Ish restaria Esh, o fogo, um fogo
brotando de cada um e consumindo o outro.
179. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

180. Adão e Eva no Paraíso


181. PAULO BRABO, 15 DE MARÇO DE
2007
182. ADÃO E EVA NO PARAÍSO

183. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
184. ADÃO: Adão e Eva no Paraíso
185. O Jardim do Éden foi a primeira
habitação do primeiro homem e da primeira
mulher, e as almas de todos homens passam
por ele depois da morte, antes de chegarem
ao seu destino final. Isso porque as almas dos
finados precisam passar por sete portais
antes de chegarem ao ‘Arabot celestial. Ali as
almas dos piedosos são transformadas em
anjos, e ali permanecem para sempre,
louvando a Deus e banqueteando-se com a
visão da glória da Shekiná. O primeiro portal
é a caverna de Macpelá, nas vizinhanças do
Paraíso, que está sob o cuidado e supervisão
de Adão. Se a alma que se apresenta diante
do portal é digna, ele grita: “Abram espaço!
Seja bem-vindo!” A alma prossegue então até
chegar ao portão do Paraíso, guardado pelo
querubim e pela espada flamejante. Se não é
achada digna, a alma é consumida pela
espada; do contrário recebe um passe de
admissão no Paraíso terrestre. Ali há um
pilar de fumaça e de luz que se estende do
Paraíso ao portão do céu; se alma conseguirá
escalá-lo e alcançar o céu através dele
dependerá do seu caráter. O terceiro portal,
Zebul, fica na entrada do céu. Se a alma é
digna, o guarda abre o portão e admite-a no
Templo celestial. Miguel apresenta-a a Deus e
a conduz então ao sétimo portal, ‘Arabot,
além do qual as almas dos piedosos, transfor-
madas em anjos, louvam ao Senhor e
alimentam-se da glória da Shekiná.
186. Apenas quem consegue abrir
caminho através da árvore do conheci-
mento pode aproximar-se da árvore
da vida.
187. No Paraíso erguem-se a árvore da vida e
a árvore do conhecimento, sendo que essa
segunda forma uma sebe ao redor da
primeira. Apenas quem consegue abrir
caminho através da árvore do conhecimento
pode aproximar-se da árvore da vida, que é
tão imensa que seriam necessários a um
homem quinhentos anos para atravessar
uma distância igual ao diâmetro do seu
tronco, sendo que não é menos vasto o
espaço sombreado por sua coroa de ramos.
De debaixo dela flui a água que irriga toda a
terra, abrindo-se em quatro correntes, o
Ganges, o Nilo, o Tigre e o Eufrates. Porém foi
apenas durante os dias da criação que o reino
vegetal recorreu às águas da terra para o seu
sustento. Mais tarde Deus fez com que as
plantas dependessem da chuva, isto é, das
águas superiores. As nuvens sobem da terra
ao céu, de onde a água é derramada nelas
para que sirvam de conduto. As plantas
começaram a sentir o efeito da água apenas
quando Adão foi criado. Embora tenham
vindo à existência no terceiro dia, Deus não
permitiu que elas brotassem e aparecessem
acima da superfícia da terra até que Adão
orou pedindo-lhe comida, pois Deus anseia
pelas orações dos piedosos.
188. O Paraíso sendo o que era, Adão não
tinha, naturalmente, que trabalhar na terra. É
verdade que Deus colocou o homem no
Jardim do Éden para tratar dele e mantê-lo,
mas isso significava apenas que ele deveria
estudar ali a Torá e guardar os mandamentos
de Deus. Havia seis mandamentos em
especial que todo ser humano deveria
obedecer: não adorar ídolos, não blasfemar
contra Deus, não cometer assassinato nem
incesto, nem assalto nem roubo – sendo que
todas as gerações têm o dever de instituir
medidas de lei e ordem. Havia um manda-
mento adicional, mas era uma proibição tem-
porária: Adão deveria comer apenas as ervas
verdes do campo. A proibição contra o uso de
animais para alimento só foi revogada na
época de Noé, depois do dilúvio. Adão, no
entanto, não foi privado de consumir de
pratos de carne. Embora não lhe fosse
permitido matar animais para satisfazer o
seu apetite, os anjos traziam-lhe carne e
vinho, servindo-o como criados. E da mesma
forma que ministravam-lheos anjos de
acordo com suas necessidades, faziam os
animais. Esses encontravam-se inteiramente
debaixo do seu domínio, e recebiam sua
comida das mãos de Adão e de Eva. Em todos
os sentidos o mundo animal tinha uma
relação diferente com Adão da sua relação
com os descendentes dele. Os animais não
apenas conheciam a língua do homem, mas
respeitavam a imagem de Deus, pelo que
temiam o primeiro casal – porém tudo
tornou-se o oposto disso depois da queda
do homem.
189. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

190.

191. A queda do homem


192. PAULO BRABO, 29 DE MARÇO DE
2007
193. A QUEDA DO HOMEM

194. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS
195.
196. ADÃO: A queda do homem
197. Entre os animais a serpente era notável.
De todos ela possuía as mais excelentes qua-
lidades, nalgumas das quais assemelhava-se
ao homem. Como o homem ela caminhava
sobre dois pés, e tinha o peso igual ao de um
camelo. Não fosse a queda do homem, que
trouxe infortúnio também sobre elas,
bastaria um par de serpentes para realizar
todo o trabalho que o homem tem de fazer;
além disso, elas teriam lhe fornecido prata,
ouro, jóias e pérolas. Na verdade, foi justa-
mente essa habilidade da serpente que
causou a ruína do homem e sua própria
ruína. Seus dons intelectuais superiores
levaram-na a ser infiel. Isso também explica a
inveja que tinha do homem, especialmente de
suas relações conjugais. A inveja da serpente
fez com que ela imaginasse diversos modos e
maneiras de ocasionar a morte de Adão. Ela
conhecia bem demais o caráter do homem
para tentar exercitar seus exercícios de
persuasão sobre ele, por isso abordou a
mulher, sabendo que as mulheres são facil-
mente enganadas.
198. “Da mesma forma que ele cria e
destrói mundos…”
199. Sua conversa com Eva foi habilmente
planejada, de modo à mulher não ter como
escapar da armadilha. A serpente começou:
200. – É verdade que Deus disse “vocês não
podem comer de toda árvore do jardim”?
201. – Podemos – respondeu Eva – comer o
fruto de todas as árvores do jardim, exceto
daquela que fica no meio do jardim. Essa não
devemos nem mesmo tocar, para que não
sejamos feridos de morte.
202. Ela disse assim porque em seu zelo de
guardá-la de transgredir o mandamento
divino Adão havia proibido Eva de tocar a
árcore, embora Deus tivesse mencionado
apenas o consumo do fruto. Permanece ver-
dadeiro o provérbio que diz: “melhor um
muro firme de dez palmos de altura do que
um de cem metros que não tem como ficar
em pé”. Foi o exagero de Adão que permitiu à
serpente persuadir a mulher a provar do
fruto proibido. A serpente empurrou Eva
contra a árvore e disse:
203. – Está vendo? Tocar a árvore não causou
a sua morte. Comer o fruto da árvore também
não vai lhe fazer mal algum. Não foi nada
menos que perversidade que induziu a
proibição, pois assim que comerem vocês
serão como Deus. Da mesma forma que ele
cria e destrói mundos, vocês terão também o
poder de criar e destruir. Da mesma forma
que ele mata e faz voltar à vida, vocês terão
também o poder de matar e reviver. Ele
mesmo comeu o primeiro fruto da árvore, e
criou em seguida o mundo. É por isso que ele
os proibiu de comer, para que vocês não
criem outros mundos. Todo mundo sabe que
artesãos do mesmo ofício odeiam uns aos
outros. Além disso, vocês não perceberam
que toda criatura tem autoridade sobre a
criatura criada antes dela mesma? O céu foi
feito no primeiro dia e é mantido no lugar
pelo firmamento, feito no segundo dia. O fir-
mamento, por sua vez, está submetido às
plantas, criadas no terceiro dia, pois elas
absorvem toda a água do firmamento. O sol e
os outros corpos celestes, criados no quarto
dia, exercem domínio sobre o mundo das
plantas, que podem amadurecer seus frutos e
florescer apenas através da influência deles.
A criação do quinto dia, o mundo animal,
exerce domínio sobre as esferas celestes; veja
o ziz, que pode escurecer o sol com suas asas.
Mas vocês são mestres de toda a criação,
porque foram os últimos a serem criados.
Comam depressa o fruto da árvore que está
no meio do jardim e tornem-se independen-
tes de Deus, para que não aconteça que ele
produza novas criaturas que exerçam
domínio sobre vocês.
204. “Ele mesmo comeu o primeiro fruto
da árvore”.
205. Para dar peso a essas palavras, a
serpente começou a sacudir violentamente a
árvore, fazendo cair seus frutos. Ela comeu
deles, e disse:
206. – Da mesma forma que eu não morro
comendo do fruto, vocês também não
morrerão.
207. Eva nada pôde fazer além de dizer a si
mesma: “Tudo que meu mestre me ordenou
(pois era assim que ela chamava Adão) não
passam de mentiras!”. E estava determinada
a seguir o conselho da serpente. Ela porém
não conseguiu forçar-se a desobedecer o
mandamento de Deus por completo. Eva
chegou a um meio-termo com sua consciên-
cia: comeu primeiro só a casca da fruta; em
seguida, vendo que a morte não lhe sobrevi-
nha, comeu o fruto em si.
208. Mal havia terminado, ela viu o Anjo da
Morte diante de si. Esperando que seu fim
chegasse imediatamente, Eva determinou
fazer Adão também comer do fruto proibido,
para que ele não se casasse com outra
mulher depois da sua morte. Foram necessá-
rios lágrimas e queixumes da parte dela para
convencer Adão a tomar o passo fatídico. Não
satisfeita, Eva deu o fruto a todos os seres
vivos, para que estivesse também sujeitos à
morte. Todos comeram e são todos mortais,
com exceção do pássaro malham, que
recusou o fruto com as seguintes palavras:
209. – Não basta vocês terem pecado contra
Deus e terem trazido a morte sobre outros?
Vocês vêem ainda até mim, tentando me
persuadir a desobedecer o mandamento de
Deus, para que eu coma e morra por causa
disso? Não vou fazer o que vocês estão
querendo.
210. “Além disso, vocês não perceberam
que toda criatura tem domínio sobre a
criatura criada antes dela mesma?”
211. Ouviu-se então uma voz celestial que
disse a Adão e Eva:
212. – A vocês a ordem foi dada, e vocês não a
obedeceram. Ao contrário, transgrediram-na
e tentaram persuadir o pássaro malham a
fazer o mesmo. Ele foi fiel e me temeu, muito
embora eu não tivesse dado a ele manda-
mento algum. Afirmo portanto que ele jamais
provará a morte, nem ele nem os seus des-
cendentes: viverão todos para sempre no
Paraíso.
213. Adão disse a Eva:
214. – Você me deu da árvore que eu a proibi
de comer? Você me deu dela sim, pois meus
olhos se abriram, e estou com um azedo nos
dentes1 da boca.
215. Eva respondeu:
216. – Se tenho um azedo nos dentes, que os
dentes de todos os seres vivos tenho o azedo
também.
217. O primeiro resultado foi que Adão e Eva
ficaram nus. Antes disso seus corpos haviam
estado cobertos por uma pele córnea, e
envoltos na nuvem da glória. Mal haviam
violado o mandamento dado eles, caíram
deles a nuvem de glória e a pele córnea, e
ficaram ali em sua nudez, envergonhados.
Adão tentou juntar folhas de árvores para
cobrirem seus corpos, mas ouviu uma árvore
após a outra dizer:
218. – Esse é o ladrão que enganou seu
Criador. Não! Não virá contra mim o pé da
insolência, nem me tocará a mão2 do
perverso!
219. Apenas a figueira deu-lhe permissão de
tirar suas folhas, porque o figo era ele mesmo
o fruto proibido. Adão teve a mesma experi-
ência do príncipe que seduziu uma das cama-
reiras do palácio. Quando o rei, seu pai, saiu
em seu encalço, ele buscou em vão refúgio
entre as outras camareiras, mas apenas a que
havia ocasionado a sua desgraça prestou-lhe
assistência.
220. Lendas dos Judeus é uma compilação de
lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente o
Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.

221.
222. 1
Conforme Jeremias 31:30
223. 2
Conforme Salmo 36:11
224. A punição

PAULO BRABO, 14 DE MAIO DE 2007


A PUNIÇÃO

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

ADÃO: A punição
Enquanto Adão permaneceu nu, buscando algum
meio de escapar do seu embaraço, Deus não
apareceu a ele, pois não devemos “nos esforçar
para ver um homem na hora da sua desgraça”. Ele
esperou que Adão e Eva se cobrissem com folhas
de figueira. Porém mesmo antes que Deus falasse
com ele, Adão sabia o que estava para acontecer.
Ele ouviu os anjos anunciarerm:
– Deus está dirigindo-se àqueles que habitam o
Paraíso.
Ele ouviu mais, aquilo que os anjos estavam
dizendo uns aos outros sobre a sua queda, e o que
estavam dizendo a Deus. Perplexos, os anjos
exclamavam:
– Quê? Ele ainda anda livremente pelo Paraíso?
Não morreu ainda?
Pelo que Deus se pronunciou:
– Eu disse a ele “no dia em que comer você certa-
mente morrerá”. Ora, vocês não sabem de que
tipo de dia eu estava falando; se de um dos meus
dias de mil anos ou de um dos dias de vocês.
Darei a ele um dos meus dias: ele terá novecentos
e trinta anos para viver, e setenta para deixar aos
seus descendentes.
Quando Adão e Eva ouviram Deus se aproxi-
mando, esconderam-se entre as árvores – o que
não teria sido possível antes da queda. Antes de
cometer o seu pecado, a altura de Adão ia da terra
ao céu, mas depois foi reduzida a cem côvados.
Outra conseqüência do seu pecado foi o medo que
Adão sentiu quando ouviu a voz de Deus; antes da
queda ela não o inquietava de modo algum. Por
isso quando Adão disse “Ouvi a sua voz no jardim
e tive medo”, Deus replicou: “Antes você não
tinha medo, agora tem?”
Deus conteve as repreensões a princípio. Em pé
no portão do Paraíso ele apenas perguntou:
– Adão, onde está você?
Deus queria dar a ele a oportunidade de
se arrepender.
Através disso Deus estava querendo ensinar ao
homem uma regra de boas maneiras, a de nunca
entrar na casa de outra pessoa sem anunciar-se
primeiro. Não há como negar que as palavras
“onde está você?” estavam prenhe de signficado;
elas destinavam-se a fazer com que Adão perce-
besse a vasta diferença entre seu estado anterior
e o atual: entre seu tamanho sobrenatural
anterior e as dimensões reduzidas de agora;
entre o senhorio do Senhor de antes e o senhorio
da serpente de agora. Ao mesmo tempo, Deus
queria dar a ele a oportunidade de se arrepender
do seu pecado, para o qual Adão teria recebido o
perdão divino. Porém, longe de arrepender-se,
Adão difamou a Deus, proferindo blasfêmias
contra ele. Quando Deus perguntou: “Você comeu
da árvore que eu mandei que não comesse?”
Adão não confessou o seu pecado, mas tentou
justificar-se com as seguintes palavras:
– Ah, Senhor do mundo! Enquanto eu estava
sozinho não caí em pecado, mas logo que me veio
essa mulher ela me tentou.
Deus replicou:
– Eu a dei a você para ajudá-lo, e você está se
mostrando ingrato ao acusá-la dessa forma,
dizendo “foi ela que me deu o fruto da árvore”.
Você não a deveria ter obedecido, pois a cabeça é
você, não ela.
Deus, que sabe todas as coisas, já havia previsto
exatamente isso, e não havia criado Eva até que
Adão lhe pedisse uma ajudadora, para que ele
tentasse colocar a culpa em Deus por ter criado a
mulher.
Adão tentava colocar em outra pessoa a culpa
pelo seu delito, e o mesmo fez Eva. A mulher,
como seu marido, também não confessou sua
transgressão e orou por perdão, o que teria sido
concedido a ela. Gracioso como é, Deus não teria
proferido condenação sobre Adão e Eva antes
deles se mostrarem obstinados. Não foi assim
com a serpente. Deus infligiu a maldição sobre a
serpente sem ouvir a sua defesa, porque a
serpente é perversa, e os iníquos são bons argu-
mentadores. Se Deus a tivesse questionado a
serpente teria perguntado:
– O senhor deu-lhes um mandamento e eu o
neguei. Por que eles obedeceram a mim e não ao
senhor?
Por isso Deus não entrou numa discussão com a
serpente, mas decretou diretamente as seguintes
dez punições: a boca da serpente foi fechada e ela
perdeu a capacidade de falar; suas mãos e pés
foram cortados fora; a terra lhe foi dada como
alimento; ela é forçada a sofrer dor intensa
durante a troca de pele; inimizade passou a
existir entre ela e o homem; se ela comer as
iguarias mais finas ou beber as bebidas mais
doces, essas se transformarão em pó na sua boca;
a gravidez da fêmea dura sete anos; as pessoas
tentarão matá-la logo que a virem; mesmo no
mundo futuro, quando todos os seres serão
benditos, ela não escapará a punição decretada
para ela; e desaparecerá da Terra Santa se Israel
seguir nos caminhos do Senhor.
Além disso, Deus disse à serpente:
– Criei você para reinar sobre todos os animais,
tanto os animais domésticos quanto as feras do
campo, mas isso não lhe satisfez. Você será por
essa razão mais maldita do que qualquer animal
doméstico ou fera do campo. Criei você para ter
uma postura ereta, mas isso não lhe satisfez. Você
deverá por essa razão andar sobre sua barriga.
Criei você para comer a mesma comida que o
homem, mas isso não lhe satisfez. Você deverá
por essa razão comer poeira todos os dias da sua
vida. Você procurou causar a morte de Adão a fim
tomar dele a sua esposa. Eu por isso estabeleço
inimizade entre você e a mulher.
Quão verdadeiro é que aquele que cobiça o que
não lhe é devido não apenas não obtém o que
deseja, mas perde também aquilo que tem!
Os anjos estavam presentes quando a condenação
foi proferida contra a serpente (pois Deus havia
convocado o Sinédrio dos setenta e um anjos ao
sentar-se para julgá-la), portanto a execução do
decreto contra ele foi confiada aos anjos. Eles
desceram do céu e cortaram as mãos e os pés da
serpente. Seu sofrimento foi tamanho que seus
berros de agonia foram ouvidos de uma extremi-
dade a outra do mundo.
O veredito contra Eva consistiu também de dez
maldições, sendo que o seu efeito é ainda percep-
tível até hoje na condição física, espiritual e social
da mulher. Não foi o próprio Deus que anunciou a
Eva a sua sina. A única mulher com quem Deus
jamais falou foi Sara. No caso de Eva ele valeu-se
dos serviços de um intérprete.
Finalmente, a punição de Adão também foi
dividida em dez partes: ele perdeu seu traje
celestial – Deus o despiu; com dificuldade ele
teria de ganhar o seu pão; a comida que ele comia
se transformaria de boa em ruim; seus filhos
vagariam pela terra; seu corpo secretaria suor;
ele teria uma inclinação para o mal; na morte seu
corpo seria presa de vermes; os animais teriam
poder sobre ele, no sentido de que poderiam
matá-lo; seus dias seriam poucos e cheios de
adversidade; e no fim ele teria de prestar contas
de toda a sua conduta sobre a terra.
Deus teria permitido que eles permane-
cessem no Paraíso.
Esses três pecadores não foram os únicos a
receberem punição. A terra não teve melhor
sorte, sendo culpada de vários delitos. Em
primeiro lugar, ela não havia obedecido por
completo à ordem que Deus dera no terceiro dia,
de produzir “árvores frutíferas”. O que Deus
desejara era uma árvore cuja madeira fosse
agradável ao paladar da mesma forma que o
fruto. A terra produziu árvores que davam frutos,
mas a árvore em si não era comestível. A terra,
além disso, não cumpriu o seu dever em relação
ao pecado de Adão. Deus havia designado o sol e
a terra para testemunharem contra Adão caso ele
transgredisse. O sol, em conformidade com isso,
escurecera no instante em que Adão tornara-se
culpado de desobediência; porém a terra, não
sabendo como apontar a queda de Adão,
desconsiderou-a por completo. A terra sofreria
também uma punição dividida em dez partes:
sendo antes independente, a terra teria agora de
esperar para ser regada pela chuva do alto; os
grãos que ela produz seriam suscetíveis a resse-
camento e mofo; ela teria de produzir toda
espécie de vermes odiáveis; a partir daquele
momento ela seria dividida em vales e
montanhas; teria de fazer crescer árvores infe-
cundas, que não dão fruto; espinhos e abrolhos
brotariam dela; muito seria semeado na terra,
mas pouco colhido; no futuro a terra terá de
revelar o sangue que abriga, não podendo mais
encobrir seus mortos; e, finalmente, ela
deveria envelhecer como uma roupa.
Quando Adão ouviu as palavras “você produzirá
espinhos e abrolhos” dirigidas [por Deus] à terra,
seu rosto começou a suar, e ele disse:
– Quê? Será que eu e meu gado comeremos do
mesmo coxo?
O Senhor teve misericórdia dele, e disse:
– Por causa do suor do seu rosto, você comerá
pão.
A terra não foi a única coisa criada a sofrer com o
pecado de Adão. O mesmo destino sobreveio à
lua. Quando a serpente seduziu Adão e Eva,
expondo a sua nudez, ambos choraram amarga-
mente, e com eles choraram o céu, o sol e as
estrelas, e todos os seres criados e coisas diante
do trono de Deus. Os próprios anjos e seres celes-
tiais lamentaram a transgressão de Adão. Apenas
a lua riu, pelo que Deus se enfureceu e diminuiu a
sua luminosidade. Ao invés de brilhar de forma
invariável como o sol, ao longo de todo o dia, a lua
envelhece rápido, e é obrigada a nascer e
renascer vez após outra.
A conduta insensível da lua ofendeu a Deus, não
apenas pelo contraste com a compaixão demons-
trada por todas as outras criaturas, mas porque
ele mesmo enchera-se de pena de Adão e sua
esposa. Ele fez para eles roupas da pele tirada da
serpente, e teria feito ainda mais; teria permitido
que eles permanecessem no Paraíso, se eles
apenas tivessem se mostrado arrependidos. Mas
Adão e Eva recusaram-se a se arrepender e
tiveram de partir, para que seu entendimento
semelhante ao divino não os levasse a pilhar a
árvore da vida e aprendessem a viver para
sempre. De certo modo, ao expulsá-los do
Paraíso, Deus não deixou que o atributo divino da
justiça prevalecesse por completo. Ele associou
misericórdia à justiça, e enquanto partiam
ele disse:
– Ah, que pena que Adão não foi capaz de guardar
o mandamento dado a ele nem por um pouco
de tempo!
Para guardar a entrada do Paraíso, Deus designou
os querubins, também chamados de espadas fla-
mejantes eternamente revolventes, porque os
anjos podem alternar-se entre um formato e
outro de acordo com a necessidade. Ao invés da
árvore da vida, Deus deu a Adão a Torá, que é
semelhantemente uma árvore da vida para os que
se apegam a ela, permitindo que ele habitasse no
oriente, nas proximidades do Paraíso.
Tendo a sentença sido pronunciada sobre Adão,
Eva e a serpente, o Senhor ordenou que os anjos
conduzissem o homem e a mulher para fora do
Paraíso. Esses começaram a chorar e suplicar
amargamente, e os anjos tiveram pena deles,
deixando de cumprir a ordem divina até que
pudessem pedir a Deus que mitigasse o seu
severo veredito. Porém o Senhor foi irredutível:
– Fui por acaso eu que cometi uma transgressão
ou pronunciei falso julgamento?
Também a oração de Adão, que lhe fosse dado de
comer o fruto da árvore da vida, foi negada –
porém com a promessa de que, se ele levasse uma
vida piedosa, ser-lhe-ia dado o fruto no dia da
ressurreição, e viveria para sempre.
Eles haviam desfrutado dos esplendores
do Paraíso por poucas horas.
Vendo que Deus estava irremediavelmente
decidido, Adão começou a chorar e implorar aos
anjos que lhe dessem pelo menos permissão para
levar consigo especiarias de doce aroma para fora
do Paraíso, para que lá fora ele também pudesse
oferecer ofertas a Deus, e suas orações fossem
aceitas diante do Senhor. Pelo que os anjos foram
até Deus e disseram:
– Rei da eternidade, ordena-nos que demos a
Adão temperos de doce aroma do Paraíso.
E Deus ouviu a oração deles. Adão colheu açafrão,
nardo, cálamo e canela, e além disso toda sorte de
sementes para o seu sustento. Carregando essas
coisas, Adão e Eva deixaram o paraíso e vieram à
terra. Eles haviam desfrutado dos esplendores do
Paraíso por um brevíssimo período, de umas
poucas horas. Foi na primeira hora do sexto dia
da criação que Deus teve a idéia de criar o
homem; na segunda hora ele pediu o conselho
dos anjos; na terceira ele juntou terra para o
corpo do homem; na quarta, formou Adão; na
quinta revestiu-o de pele; na sexta seu corpo sem
alma estava completo, de modo que ele podia
postar-se de pé; na sétima a alma foi soprada
nele; na oitava o homem foi conduzido ao
Paraíso; na nona foi dada a ele a ordem divina
que proibia-o de comer o fruto da árvore no meio
do jardim; na décima ele transgrediu essa ordem;
na décima primeira foi julgado, e na décima
segunda hora foi expulso do Paraíso para
expiação do seu pecado.

Esse dia fatídico foi o primeiro do mês de Tishri,


por isso Deus disse a Adão:
– Você será o protótipo dos seus filhos. Da mesma
forma que você foi julgado por mim neste dia e
absolvido, os filhos de Israel serão julgados por
mim neste dia de Ano Novo, e serão absolvidos.
Cada dia da criação produziu três coisas: o
primeiro, o céu, a terra e a luz; o segundo, o fir-
mamento, o gehenna e os anjos; o terceiro,
árvores, ervas e o Paraíso; o quarto, o sol, a lua e
as estrelas; o quinto, peixes, pássaros e o leviatã.
Como Deus planejava descansar no sexto dia, o
Sábado, trabalhou em dobro na sexta-feira, pro-
duzindo seis criaturas: Adão, Eva, gado, répteis,
feras do campo e demônios. Os demônios foram
criados logo antes do início do Sábado e são, por
essa razão, espíritos sem corpo – o Senhor não
teve tempo de criar-lhes corpos.
O Senhor não teve tempo de criar
corpos para os demônios.
No crepúsculo entre o sexto dia e o Sábado dez
criações foram produzidas: o arco-íris, mantido
invisível até o tempo de Noé; o maná; as fontes de
água, das quais Israel tiraria água para saciar sua
sede no deserto; a inscrição sobre as duas placas
de pedra dadas no Sina; a pena com a qual a
inscrição foi escrita; as duas placasem si; a boca
da mula de Balaão; o túmulo de Moisés; a caverna
na qual habitariam Moisés e Elias, e a vara de
caminhada de Arão, com suas flores e amêndoas
maduras.
Photo by Simon Pais

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

225. O sábado no céu


226. PAULO BRABO, 19 DE JUNHO DE
2007
227. O SÁBADO NO CÉU

228. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS

229.
230. ADÃO: O sábado no céu
231. Antes que o mundo fosse criado ninguém
havia para louvar a Deus e conhecê-lo. Por
essa razão ele criou os anjos e os santos
Hayyot, o céu e todo o seu exército e também
Adão. Todos esses deveriam louvar e glorifi-
car o seu Criador. Durante a semana da
criação, no entanto, não era apropriado
louvar o Senhor e proclamar o seu esplendor.
Apenas no Sábado, quando toda a criação
cessou, os seres da terra e do céu, todos
juntos, irromperam em cântico e adoração
enquanto Deus subia até seu trono e tomava
assento nele. Era no Trono da Alegria que ele
assentava-se, e fez passar todos os anjos
diante de si – o anjo da água, o anjo dos rios,
o anjo das montanhas, o anjo das colinas, o
anjo dos abismos, o anjo dos desertos, o anjo
do sol, o anjo da lua, o anjo das Plêiades, o
anjo de Orion, o anjo das ervas, o anjo do
Paraíso, o anjo do Gehenna, o anjo das
árvores, o anjo dos répteis, o anjo dos
animais selvagens, o anjo dos animais domés-
ticos, o anjo dos peixes, o anjo dos gafanho-
tos, o anjo dos pássaros, o anjo-chefe sobre
os anjos, o anjo de cada um dos céus, o anjo-
chefe de cada divisão dos exércitos celestiais,
o anjo-chefe dos Hayyot, o anjo-chefe dos
querubins, o anjo-chefe dos ofanim, e todos
os outros esplêndidos, terríveis e poderosos
anjos.
232. Esses todos compareceram diante de
Deus com grande alegria, banhados numa
torrente de alegria, e regozijaram-se e
dançaram e cantaram, e exaltaram o Senhor
com muitos louvores e muitos instrumentos.
233. Era no Trono da Alegria que ele
assentava-se.
234. Os anjos ministrantes começaram:
235. – Dure para sempre a glória do Senhor!
236. E o restante dos anjos retomaram a
canção com as seguintes palavras:
237. – Alegre-se o Senhor nas suas obras!
238. Arabot, o sétimo céu, estava cheio de
júbilo e glória, esplendor e força, poder e
força e orgulho e magnificência e grandiosi-
dade, louvor e celebração, cântico e alegria,
lealdade e integridade, honra e adoração.
239. O Senhor chamou então o Anjo do
Sábado para assentar-se num trono de glória,
e trouxe diante dele os anjos-chefes de todos
os céus e de todos os abismos, e convocou-os
a dançar e celebrar, dizendo:
240. – É Sábado diante do Senhor!
241. Os príncipes exaltados do céu
responderam:
242. – Diante do Senhor é Sábado!
243. Foi permitido até mesmo a Adão subir ao
mais alto céu, para participar dos festejos por
causa do Sábado.
244. Foi conferindo a alegria do Sábado sobre
todos os seres, sem excetuar Adão, que o
Senhor dedicou sua criação. Ao ver a
majestade do Sábado, sua honra e grandiosi-
dade, e a felicidade que conferia a todos, por
ser a fonte de toda alegria, Adão entoou uma
canção de louvir ao dia do Sábado. Deus
então disse a ele:
245. – Você canta uma canção em louvor ao
dia do Sábado, e a mim, o Deus do Sábado,
não canta canção alguma?
246. Diante do que o Sábado ergueu-se do seu
assento e prostrou-se diante de Deus,
dizendo:
247. – Bom é dar graças ao Senhor.
248. E toda criação acrescentou:
249. – E cantar louvores ao seu nome, ó,
Altíssimo.
250. Este foi o primeiro sábado, e esta foi sua
celebração no céu por parte de Deus e dos
anjos. Os anjos foram informados na mesma
ocasião que em em dias futuros Israel obser-
varia aquele dia como santo de modo similar.
251. – Separarei para mim mesmo um povo
dentre todos os povos – Deus disse a eles. –
Esse povo guardará o Sábado, e eu o santifi-
carei para que seja o meu povo, e eu serei o
seu Deus. De todos que tenho visto, escolhi
toda a semente de Israel, e o designei como
meu filho primogênito, e o santifiquei para
mim mesmo por toda a eternidade, a ele e ao
Sábado, para que guarde o Sábado e
abstenha-se nele de qualquer trabalho.
252. Para Adão o Sábado teve um significado
peculiar. Quando ele foi forçado a abandonar
o Paraíso no crepúsculo da véspera de
Sábado, os anjos disseram enquanto ele se
afastava:
253. – Adão não passou nem sequer uma noite
residindo na sua glória.
254. O Sábado então apareceu diante de Deus
para defender Adão, e disse:
255. – Ó Senhor do mundo, nos seis dias de
trabalho nenhuma criatura foi morta. Se o
senhor começar agora matando Adão, o que
será da santidade e da benção do Sábado?
256. Deste modo Adão foi resgatado dos fogos
do inferno, que seriam a punição adequada
para seus pecados. Ele em gratidão compôs
uma salmo em honra ao Sábado, que Davi
mais tarde incorporou no seu saltério.
257. Ainda outra oportunidade foi concedida a
Adão de aprender e apreciar o valor do
Sábado. A luz celestial, através da qual Adão
podia contemplar o mundo de ponta a ponta,
deveria por justiça ter desaparecido imedia-
tamente após o seu pecado. Porém, por consi-
deração ao Sábado, Deus permitiu que essa
luz continuasse a brilhar, e os anjos, ao entar-
decer do sexto dia, entoaram uma canção de
louvor e gratidão a Deus, pela luz radiante
que brilhava noite adentro. Apenas quando o
Sábado foi embora a luz celestial cessou, para
consternação de Adão, que temia que a
serpente pudesse atacá-lo no escuro. Deus
porém iluminou o seu entendimento, e ele
aprendeu a esfregar duas pedras uma contra
a outra e desta forma produzir luz para
suprir suas necessidades.
258. A luz celestial foi apenas uma das sete
dádivas preciosas das quais Adão desfrutou
antes da queda e que serão concedidas
novamente ao homem apenas na era messiâ-
nica. As outras são a resplandescência do seu
rosto, a vida eterna, a elevada estatura, os
frutos do solo, os frutos da árvore e as lumi-
nárias do céu, o sol e a lua – pois no mundo
que há de vir a luz da lua será como a luz do
sol, e a luz do sol será sete vezes mais
intensa.
259.
260. Photo by wiseacre

261. O arrependimento de Adão

PAULO BRABO, 30 DE JUNHO DE 2007


O ARREPENDIMENTO DE ADÃO

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

ADÃO: O arrependimento de Adão


Expulsos do Paraíso, Adão e Eva construíram
para si uma cabana, e por sete dias ficaram
sentados em grande aflição, lamentação e pesar.
Ao final dos sete dias, atormentados pela fome,
saíram e foram procurar comida. Por outros sete
dias Adão cruzou a região de um lado a outro,
procurando o tipo de delícias finas de que haviam
desfrutado no Paraíso. Foi em vão: ele nada
encontrou. Eva então disse a seu marido:
– Meu senhor, se lhe agrada, mate-me. Talvez
Deus leve-o então de volta para o Paraíso, pois o
Senhor Deus ficou irado com você por
minha causa.
Porém Adão rejeitou esse plano com aversão, e
saíram ambos novamente em busca de comida.
Nove dias se passaram, e nada ainda tinham
encontrado que se assemelhasse ao que tinham
tido no Paraíso. Viram apenas comida adequada
para gado e animais selvagens. Adão então
propôs:
– Façamos penitência. Talvez Deus nos perdoe e
tenha pena de nós, e nos dê alguma coisa para
sustentar a vida.
Sabendo que Eva não era forte o bastante para
suportar a mortificação da carne que ele
propunha infligir sobre si mesmo, Adão
prescreveu-lhe uma penitência diferente da sua.
Nenhuma palavra saia da sua boca, pois
somos indignos de suplicar a Deus.
– Levante-se – ele disse, – vá até o Tigre, pegue
uma pedra e fique em pé sobre ela na parte mais
profunda do rio, onde a água chega-lhe na altura
do pescoço. Que nenhuma palavra saia da sua
boca, pois somos indignos de suplicar a Deus:
nossos lábios estão impuros em razão do fruto
proibido da árvore. Permaneça na água por trinta
e sete dias.
Para si mesmo Adão determinou quarenta dias de
jejum, enquanto ele permanecia em pé no rio
Jordão, da mesma forma que Eva deveria ficar nas
águas do Tigre. Depois de ajustar a pedra no meio
do Jordão e subir nela com as águas chegando-lhe
ao pescoço, ele disse:
– Conclamo a você, água do Jordão: aflija-se
comigo, e reúna ao meu redor todas as criaturas
nadantes que vivem em você. Que elas me
cerquem e lamentem comigo e, ao invés de
golpearem de aflição os seus próprios peitos,
golpeiem a mim. Não foram eles que pecaram,
mas apenas eu!

Logo vieram todos, os residentes do Jordão, e


cercaram-no, e daquele momento em diante a
água do Jordão parou, cessando de fluir.
A penitência que Adão e Eva impuseram a si
mesmos despertou receios em Satanás. Ele temia
que Deus perdoasse o pecado deles, e por isso
planejou desviar Eva do seu propósito. Passados
dezoito dias ele apareceu a ela disfarçado de anjo;
fingindo condoer-se dela, começou a bradar,
dizendo:
– Saia desse rio e não chore mais! O Senhor Deus
ouviu a sua lamentação, e sua penitência foi
aceita por ele! Todos os anjos suplicaram ao
Senhor em seu favor, e ele enviou-me para tirá-la
da água e dar a vocês o sustento de que desfruta-
vam no Paraíso, cuja perda vocês têm estado
lamentando.
Enfraquecida como estava por suas penitências e
mortificações, Eva cedeu à insistência de Satanás,
e ele a conduziu até onde estava seu marido.
Adão reconheceu-o de imediato, e entre lágrimas
clamou:
– Ah Eva, Eva, onde está agora a sua penitência?
Como você pôde deixar-se seduzir novamente
pelo nosso adversário, ele que roubou de nós
nossa permanência no Paraíso e toda alegria
espiritual?
Pelo que Eva começou a chorar e clamar:
– Tenha vergonha, Satanás! Por que você nos
hostiliza sem razão? O que foi que fizemos para
que você nos persiga com tamanha malícia?
Com um suspiro profundo, Satanás contou-lhes
de que forma Adão, de quem tivera inveja, tinha
sido o verdadeiro motivo da sua queda. Tendo
perdido sua glória através do homem, tinha
determinado fazer com que ele fosse expulso do
Paraíso.
Ele entendeu que o que tinha deplorado
era o curso da natureza.
Depois de ouvir a confissão de Satanás, Adão
orou a Deus:
– Senhor meu Deus! Minha vida está em suas
mãos. Retira de mim esse adversário, que busca
levar minha alma à destruição, e concede-me a
glória a que ele não tem mais direito.
Satanás desapareceu imediatamente, mas Adão
prosseguiu em sua penitência, ficando em pé nas
águas do Jordão por quarenta dias.
Enquanto permanecia dentro do rio Adão
percebeu que os dias iam ficando mais curtos, e
teve medo de que o mundo pudesse estar escure-
cendo por causa do seu pecado, e desabaria em
breve. Para evitar a perdição ele passou oito dias
em oração e jejum. Porém depois do solstício do
inverno, quando viu os dias tornando-se mais
longos novamente, Adão passou oito dias feste-
jando, e no ano seguinte celebrou ambos os
períodos, o anterior e o posterior ao solstício. É
por isso que os pagãos celebram as calendas e a
saturnália em honra aos seus deuses, embora
Adão tenha consagrado ambos os dias em honra
a Deus.
Na primeira vez em que viu o sol se pôr Adão
também foi tomado de apreensão e temor.
Aconteceu na conclusão do Sábado, e Adão disse:
– Ai de mim! Por minha causa, pelo meu pecado, a
terra escureceu, e ficará novamente sem forma e
vazia. Assim será executada a punição de morte
que Deus proferiu contra mim!
Toda a noite ele passou em lágrimas, bem como
Eva, que chorava sentada de frente para ele.
Quando o dia começou a clarear ele entendeu que
o que tinha deplorado era o curso da natureza, e
trouxe uma oferta para Deus, um unicórnio cujo
chifre foi criado antes dos cascos, e sacrificou-o
no lugar onde mais tarde se ergueria o altar em
Jerusalém.
Photo by Stephen A. Edwards

262. O livro de Raziel


263. PAULO BRABO, 23 DE J ULHO DE
2007
264. O LIVRO DE RAZIEL

265. Estocado em GOIABAS


ROUBADAS

266.
267. ADÃO: O livro de Raziel
268. Depois de ser expulso do Paraíso Adão
orou a Deus com as seguintes palavras:
269. – Ó Deus, Senhor do mundo! O senhor
criou o mundo inteiro para honra e glória do
Poderoso, e fez da forma que lhe agradou.
Seu reino é por toda a eternidade, e seu
reinado por todas as gerações. Nada lhe está
oculto, e nada escondido dos seus olhos. O
senhor criou-me como obra das suas mãos, e
estabeleceu-me como governante sobre as
suas criaturas, para que eu exercesse
domínio sobre as suas obras. Porém a
ardilosa e execrável serpente seduziu-me
com desejo e com lascívias; seduziu, é
verdade, a esposa do meu coração. O senhor,
no entanto, não revelou-me o que sobrevirá a
meus filhos e às gerações depois de mim. Sei
muito bem que nenhum ser humano é capaz
de ser íntegro aos seus olhos. E que é minha
força para que eu me coloque na sua
presença com rosto impudente? Não tenho
boca com que falar nem olho com o qual ver,
pois verdadeiramente pequei e cometi trans-
gressão, e por causa dos meus pecados fui
expulso do Paraíso. Devo arar a terra da qual
fui tomado, e os demais habitantes da terra,
os animais selvagens, não mais, como antes,
demonstram assombro e temor diante de
mim. A partir do instante em que comi da
árvore do conhecimento do bem e do mal a
sabedoria me abandonou: sou um tolo que
nada sabe, um ignorante que nada compre-
ende. Agora, misericordioso e gracioso Deus,
peço que volte novamente a sua compaixão
ao cabeça das suas obras, ao espírito que
instilou nele e à alma que soprou nele. Venha
ao meu encontro com a sua graça, pois o
senhor é gracioso, tardio em irar-se e pleno
de amor. Que a minha oração alcance o trono
da sua glória, e a minha súplica o trono de
sua misericórdia; que o senhor se incline na
minha direção com amor. Que as palavras da
minha boca sejam aceitáveis, e o senhor não
dê as costas à minha petição. O senhor é
desde a eternidade e será até a eternidade;
era rei, e será rei. Tenha agora misericórdia
da obra das suas mãos; conceda-me conheci-
mento e compreensão, para que eu saiba o
que sobrevirá a mim, à minha posteridade e a
todas as gerações que virão depois de mim, e
o que me sobrevirá a cada dia e a cada mês.
Não negue a mim o auxílio dos seus servos e
dos seus anjos.
270. No terceiro dia depois que Adão ofereceu
essa oração, enquanto sentava às margens do
rio que flui do Paraíso, apareceu a ele, na
hora mais quente do dia, o anjo Raziel,
trazendo nas suas mãos um livro. O anjo
dirigiu-se a Adão com as seguintes palavras:
271. – Adão, porque está tão desanimado?
Porque tão aflito e ansioso? As suas palavras
foram ouvidas no momento em que, entre
apelos e súplicas, você as proferiu, e recebi a
incumbência de ensinar-lhe palavras puras e
compreensão profunda, de torná-lo sábio
através do conteúdo do livro sagrado que
trago nas mãos, e de dar-lhe a conhecer o que
irá lhe sobrevir até o dia da sua morte.
Quanto a todos os seus descendentes e todas
as gerações posteriores, se lerem este livro
em pureza, com um coração devoto e uma
mente humilde, e obedecerem aos seus
preceitos, tornar-se-ão como você: eles
também saberão de antemão o que aconte-
cerá, em qual mês e em qual dia ou qual
noite. Tudo estará manifesto para eles:
saberão e compreenderão se uma calamidade
está por vir, uma fome ou animais selvagens,
inundações ou seca; se haverá abundância de
grão ou escassez; se os perversos governarão
o mundo; se gafanhotos devastarão a terra;
se os frutos cairão das árvores ainda verdes;
se furúnculos afligirão os homens; se guerras
predominarão, ou doenças ou pragas entre
homens e gado; se o bem foi resolvido no céu,
ou o mal; se o sangue fluirá, e o rumor de
morte dos abatidos será ouvido na cidade. E
agora, Adão, venha e dê ouvidos a tudo que
lhe direi a respeito da natureza deste livro e
da sua santidade.
272. O anjo Raziel então leu do livro e, quando
ouviu as palavras do santo volume proferidas
pela boca do anjo, Adão caiu no chão, tomado
de pavor. Porém o anjo o encorajou:
273. – Levante-se, Adão – ele disse. –
Coragem, não tenha medo, aceite este livro
de mim e guarde-o, pois dele você extrairá
conhecimento e se tornará sábio, e irá
também ensinar o conteúdo dele a todos que
forem dignos de saberem o que ele contém.
274. No momento em Adão pegou o livro uma
chama de fogo brotou das proximidades do
rio, e o anjo subiu sobre ela em direção ao
céu. Adão então soube que o que havia falado
com ele era um anjo de Deus, e que o livro
vinha do próprio Rei Santo, e usou-o em
santidade e pureza. Esse é o livro do qual
podem ser aprendidas todas as coisas que
vale à pena saber, e todos os mistérios; que
ensina também como invocar os anjos e fazê-
los aparecerem diante dos homens, e respon-
derem todas as suas perguntas. Porém não
são todos que podem fazer uso do livro,
apenas aquele que é sábio e temente a Deus,
e recorre a ele em santidade. Esse estará
seguro contra todos os conselhos perversos,
sua vida será serena, e quando a morte tirá-lo
do mundo, encontrará repouso num lugar
onde não há nem demônios nem espíritos do
mal, e das mãos dos perversos será veloz-
mente resgatado.
275. * * *

276. Lendas dos Judeus é uma compilação de


lendas judaicas recolhidas das fontes
originais do midrash (particularmente
o Talmude) pelo talmudista lituano Louis
Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado
em 6 volumes (sendo dois volumes de notas)
entre 1909 e 1928.
277. A doença de Adão

PAULO BRABO, 03 DE AGOSTO DE 2007


A DOENÇA DE ADÃO

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ADÃO: A doença de Adão


Depois de viver novecentos e trinta anos Adão foi
tomado de uma enfermidade, e sentiu que seus
dias estavam chegando ao fim. Ele chamou todos
os seus descendentes e reuniu-os diante da porta
da casa de adoração na qual oferecia suas orações
a Deus, a fim de dar-lhes sua última benção. Sua
família ficou perplexa de encontrá-lo deitado em
seu leito de enfermidade, pois não sabiam o que
era dor e sofrimento. Sete anunciou sua disposi-
ção de ir até os portões do Paraíso e pedir a Deus
que deixasse um de seus anjos trazer para Adão
um de seus frutos. Adão, porém, explicou-lhes o
que eram doença e dor, e que Deus os havia
infligido sobre ele como punição pelo seu pecado.
Adão sofria brutalmente; a doença arrancava dele
lágrimas e gemidos de dor. Chorando aos soluços,
Eva disse:
– Adão, meu senhor, dê-me metade da sua enfer-
midade e eu a levarei sobre mim de bom grado.
Não foi então por minha causa que isso lhe
sobreveio? Por minha causa você sofre dor e
angústia.
Adão, porém, explicou-lhes o que eram
doença e dor.
Adão pediu a Eva que fosse com Sete aos portões
do Paraíso implorar que Deus tivesse misericór-
dia dele; que mandasse seu anjo pegar um pouco
do óleo que flui da árvore da sua misericórdia e
entregasse aos seus mensageiros. O ungüento lhe
traria descanso, e mandaria embora a dor que o
consumia. No seu caminho para o Paraíso, Sete foi
atacado por um animal selvagem. Eva gritou para
o agressor:
– Como ousa tocar a imagem de Deus?
A resposta veio imediatamente:
– A culpa é sua! Se não tivesse aberto a sua boca
para comer do fruto proibido, minha boca não
estaria agora aberta para destruir um ser
humano.
Porém Sete repreendeu:
– Morda a sua língua! Deixe em paz a imagem de
Deus até o dia do julgamento.
O animal abriu caminho para eles, dizendo:
– Vejam, deixo passar a imagem de Deus.
E esgueirou-se de volta para o seu esconderijo.
Chegados aos portões do Paraíso, Eva e Sete
começaram a chorar amargamente, e com muitas
lamentações imploraram a Deus que desse a eles
do óleo da árvore da sua misericórdia. Por horas
eles oraram assim. Finalmente apareceu o
arcanjo Miguel, e disse-lhes que vinha na
qualidade de mensageiro de Deus para informar
que o pedido deles não podia ser concedido. Adão
morreria dali a poucos dias, e como estava sujeito
à morte, assim estariam os seus descendentes.
Apenas por ocasião da ressurreição, e apenas
para os piedosos, o óleo da vida seria fornecido,
juntamente com toda a bem-aventurança e os
deleites do Paraíso.
A morte é o destino de toda a
nossa raça.
Retornando a Adão eles relataram o que havia
acontecido, e Adão disse a ela:
– Que grande desgraça você trouxe sobre nós ao
despertar tamanha ira! Veja, a morte é o destino
de toda a nossa raça! Chame os nossos filhos e os
filhos de nossos filhos, e conte a eles a forma
como pecamos.
E enquanto Adão jazia prostrado em seu leito de
dor, Eva contou-lhes a história da queda deles.

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

278. Eva narra a história da queda


EVA NARRA A HISTÓRIA DA QUEDA

Estocado em GOIABAS ROUBADAS

ADÃO: Eva narra a história da queda


Depois que fui criada Deus dividiu o Paraíso e
todos os animais que ele continham entre Adão e
eu. O leste e o norte foram designados a Adão,
juntamente com todos os animais do sexo
masculino. Eu era a senhora do oeste e do sul e de
todos os animais do sexo feminino. Satanás,
remoendo a desgraça de ter sido expulso do
exército celestial, resolveu provocar a nossa ruína
e assim vingar-se do seu fracasso. Ele conquistou
a serpente para o seu lado, observando que antes
da criação de Adão os animais podiam desfrutar
de tudo que crescia no Paraíso, mas agora
estavam restritos ao consumo de ervas rasteiras.
A expulsão de Adão do Paraíso traria, portanto,
benefícios para todos. A serpente hesitou, pois
temia a ira de Deus, mas Satanás acalmou seus
temores:
– Disponha-se apenas a ser meu vaso, e falarei
através da sua boca um discurso que se mostrará
capaz de seduzir o homem.
“O que você está fazendo no Paraíso?”
A serpente então ficou suspensa no muro que
cerca o Paraíso, a fim de poder conversar comigo
a partir de fora. Isso aconteceu precisamente
quando meus dois anjos da guarda haviam subido
ao céu para suplicar ao Senhor. Eu estava
portanto inteiramente sozinha, e quando Satanás
assumiu a forma de um anjo e inclinou-se junto
ao muro externo do Paraíso, entoando canções
seráficas de louvor, fui enganada, pensando que
fosse um anjo. Iniciou-se então uma conversa,
Satanás falando através da boca da serpente:
– Eva é você?
– Sim, eu mesma.
– O que você está fazendo no Paraíso?
– O Senhor colocou-nos aqui para cultivá-lo e
comer dos seus frutos.
– Que bom. Mas vocês não podem comer de todas
as árvores.
– Podemos sim, com exceção de uma, a árvore
que fica no meio do Paraíso. Foi só dela que Deus
nos proibiu de comer; do contrário, disse ele,
morreremos.
A serpente esforçou-se de todo modo para me
persuadir de que eu não tinha nada a temer – que
Deus sabia que no dia em que eu e Adão comesse-
mos do fruto da árvore, seríamos como ele
mesmo. Tinha sido inveja que havia levado a
Deus a não comermos dele.
Apesar dessa insistência, permaneci firme,
recusando-me a tocar a árvore. A serpente então
se dispôs a colher um fruto da árvore para mim.
Diante disso abri o portão do Paraíso, e ela
deslizou para dentro. Mal havia entrado ela
exclamou:
– Estou arrependida do que disse. Acho melhor
não dar a você o fruto da árvore proibida.
Esse foi um astucioso ardil para tentar-me ainda
mais. Ela disse que consentiria em dar-me o fruto
apenas se eu prometesse que faria meu marido
comer dele também. O juramento que me fez
fazer foi o seguinte:
– Pelo trono de Deus, pelos querubins e pela
árvore da vida, darei a meu marido deste fruto,
para que ele também coma.
A serpente subiu na árvore e injetou no
fruto o seu veneno.
Em seguida a serpente subiu na árvore e injetou
no fruto o seu veneno, o veneno da inclinação
para o mal, e inclinou até o chão o galho do qual
ele crescia. Peguei o fruto, mas soube de imediato
que tinha sido despojada da integridade com a
qual havia estado vestida. Comecei a chorar, por
causa disso e por causa do juramento que a
serpente havia arrancado de mim.
A serpente desapareceu da árvore enquanto eu
procurava folhas para cobrir a minha nudez, mas
todas as árvores ao meu alcance haviam deixado
cair suas folhas no momento em que comi do
fruto proibido. Apenas uma reteve suas folhas, a
figueira, a própria árvore cujo fruto havia sido
proibido para mim. Chamei Adão, e usando
palavras blasfemas consegui convencê-lo a comer
do fruto. Porém mal ele havia ultrapassado seus
lábios, Adão tornou-se consciente de sua verda-
deira condição e bradou contra mim:
– Mulher perversa, que foi que você fez comigo?
Você me privou da glória de Deus.
Naquele mesmo instante Adão e eu ouvimos o
arcanjo Miguel tocar sua trombeta, e os anjos
exclamando:
– Assim diz o Senhor, venham comigo ao Paraíso
e ouçam a sentença que proferirei sobre Adão.
Escondemo-nos, porque temíamos o julgamento
de Deus. Assentado em sua carruagem puxada
por querubins, e acompanhado por anjos que
proferiam seu louvor, o Senhor apareceu no
Paraíso. À sua chegada as árvores nuas
novamente produziram folhas. Seu trono erguia-
se junto à árvore da vida. Deus dirigiu-se a Adão:
– Adão, onde você está escondido? Acha que não
posso encontrá-lo? Pode uma casa esconder-se
do seu arquiteto?
Adão tentou colocar a culpa em mim, que havia
prometido mantê-lo inocente diante de Deus; eu,
por minha vez, acusei a serpente. Mas Deus distri-
buiu justiça sobre nós três. A Adão ele disse:
“Amargamente oprimido, você jamais
experimentará qualquer doçura.”
– Você não obedeceu os meus mandamentos mas
deu ouvidos à voz da sua mulher, por isso maldito
será o solo apesar de todo o seu esforço. Quando
você cultivá-lo ele se recusará a lhe entregar a
sua força. Ele lhe dará espinhos e cardos, e com o
suor do seu rosto você comerá o pão. Você
enfrentará muitas adversidades, perderá as
forças e ainda assim não achará descanso. Amar-
gamente oprimido, você jamais experimentará
qualquer doçura, sendo castigado pelo calor e
açoitado pelo frio. Você labutará muito, porém
sem acumular riqueza. Você engordará, porém
deixará de viver. Os animais sobre os quais você é
mestre se levantarão contra você, porque não
obedeceu a minha ordem.
Sobre mim Deus proferiu a seguinte sentença:
– Você sofrerá angústia e dolorosa tortura na
hora do parto. Em tristeza você dará a luz seus
filhos, e na hora do parto, quando estiver perto de
perder a vida, você confessará e exclamará:
“Senhor, senhor, salve-me nesta hora, e jamais
voltarei a ceder ao prazer carnal”. Porém ainda
assim o seu desejo permanecerá continuamente
voltado para o seu marido.
Na mesma ocasião toda sorte de enfermidades foi
decretada sobre nós. Deus disse a Adão:
– Por ter dado as costas à minha aliança, infligirei
setenta pragas sobre a sua carne. A dor da
primeira praga se apoderará dos seus olhos, a dor
da segunda praga a sua audição, e uma após a
outra as setenta pragas recairão sobre você.
À serpente Deus disse:
– Por ter se tornado vaso do Maligno, enganando
os inocentes, você será maldita, mais do que
qualquer animal de criação ou animal selvagem.
A comida que você desejar comer lhe será
subtraída, e você comerá poeira todos os dias da
sua vida. Você se arrastará sobre seu peito e
sobre sua barriga, e será privada de suas mãos e
pés. Você perderá suas orelhas, suas asas e todos
os outros membros que usou para seduzir a
mulher e o marido dela, levando-os a serem
expulsos do Paraíso. Colocarei inimizade entre
você e a descendência do homem: ela lhe ferirá a
cabeça e você lhe ferirá o calcanhar, até o dia do
julgamento.
* * *

Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas


judaicas recolhidas das fontes originais
do midrash (particularmente o Talmude) pelo tal-
mudista lituano Louis Ginzberg (1873-
1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo
dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.

279. A morte de Adão


280. A morte de Eva
281. O nascimento de Caim
282. Fratricídio
283. A punição de Caim
284. Os habitantes das sete terras
285. Os descendentes de Caim
286. Os descendentes de Adão e Lilith
287. Sete e seus descendentes
288. Enos
289. A queda dos anjos
290. Enoque, governante e mestre
291. A ascensão de Enoque
292. O traslado de Enoque
293. Matusalém
294. O nascimento de Noé
295. A punição dos anjos caídos
296. A geração do dilúvio
297. O livro santo
298. Os ocupantes da arca
299. O dilúvio
300. Noé sai da arca
301. A maldição da embriaguez
302. Os descendentes de Noé espalham-se pelo mundo
303. A depravação da humanidade
304. Ninrode
305. A torre de Babel
306. As gerações perversas
307. O nascimento de Abraão
308. O bebê proclama Deus
309. A primeira aparição pública de Abraão
310. O pregador da verdadeira fé
311. Na fornalha ardente
312. Abraão emigra para Harã
313. A estrela no oriente
314. O verdadeiro crente
315. O iconoclasta
316. Abraão em Canaã
317. Sua estadia no Egito
318. O primeiro faraó
319. A guerra dos reis

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A PUNIÇÃO DOS ANJOS CAÍDOS


NOÉ: A punição dos anjos caídos

Quando atingiu a maturidade Noé seguiu os passos de seu avô Matusalém,


enquanto todos os outros homens voltaram-se contra esse piedoso rei. Longe de
obedecerem os seus preceitos, perseguiram a inclinação maligna de seus corações
e perpetraram toda sorte de feitos abomináveis.

Em grande parte foram os anjos caídos e sua posteridade de gigantes que ocasio-
naram a depravação da humanidade. O sangue derramado pelos gigantes clamava
da terra até o céu, e os quatro arcanjos acusaram os anjos caídos e seus filhos
diante de Deus, pelo que ele deu-lhes uma série de ordens. Uriel foi enviado a Noé

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SETE E SEUS DESCENDENTES

AS DEZ GERAÇÕES: Os descendentes de Sete

As exortações das esposas de Lameque produziram efeito em Adão. Depois de


cento e trinta anos de separação ele voltou para Eva, e o amor que ele nutria por
ela era agora muitas vezes mais forte do que antes. Quando não estava corporea-
mente com ele, Eva estava presente nos seus pensamentos. O fruto de sua união foi
Sete, que estava destinado a ser ancestral do Messias.

Sete nasceu formado de tal modo que não foi necessário executar nele o rito da
circuncisão. Dessa forma Sete foi um dos treze homens que de algum modo
nasceram perfeitos ((Segundo uma tradição judaica, os treze homens que

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OS DESCENDENTES DE ADÃO E LILITH


AS DEZ GERAÇÕES: Os descendentes de Adão e Lilith

Quando as esposas de Lameque ouviram a decisão de Adão, que deveriam


continuar a viver com o marido, viraram-se para Adão e disseram:

– Médico, cure a si mesmo!

Elas referiam-se ao fato de que Adão vinha ele mesmo vivendo separado da esposa
desde a morte de Abel, pois havia dito: “porque eu deveria gerar filhos, se é para
expô-los à morte?”

Embora evitasse o intercurso com Eva, Adão era visitado em seus sonhos por
espíritos do sexo feminino, e dessa união com elas foram gerados demônios de
várias espécies, que foram dotados de capacidades peculiares.

Seu método consistia em escrever umas poucas palavras num


pedaço de papel, que ele fazia então seu aluno engoli
OS HABITANTES DAS SETE TERRAS

AS DEZ GERAÇÕES: Os habitantes das sete terras

Quando foi expulso do Paraíso, Adão chegou primeiro à mais inferior das sete
terras, Erez, que é escura, sem um raio de luz, e inteiramente vazia. Ele ficou
apavorado, especialmente diante das chamas da espada que se revolve incessante-
mente, e que está nesta terra.

Depois que Adão efetuou penitência Deus conduziu-o à segunda terra, Adamah,
onde há luz refletida do seu próprio céu e de suas estrelas e constelações seme-
lhantes a espectros. Aqui habitam os seres semelhantes a espectros frutos da união
de Adão com os espíritos. Vivem perpetuamente tristes; a emoção da alegria é

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A GERAÇÃO DO DILÚVIO

NOÉ: A geração do dilúvio

Enquanto os descendentes de Caim assemelhavam-se a seu ancestral em sua


depravação e pecaminosidade, os descendentes de Sete levavam uma vida piedosa
e ordeira, sendo que a diferença entre as duas linhagens refletia-se em seus locais
de residência. A família de Sete fixara-se nas montanhas próximas ao Paraíso,
enquanto a família de Caim residia no campo de Damasco, o lugar onde Abel foi
assassinado por Caim.

Infelizmente, na época de Matusalém, logo após a morte de Adão, a família de Sete


corrompeu-se à maneira dos cainitas. As duas linhagens uniram-se uma à outra a
fim de cometerem toda espécie

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NOÉ SAI DA ARCA

NOÉ: Noé sai da arca


ao fim do ano de punição, Noé não saiu da arca até receber de Deus ordem para
fazê-lo. Ele disse a si mesmo: “Ao comando de Deus entrei na arca; a seu comando
sairei dela”.

Porém quando Deus lhe disse que saísse da arca Noé se recusou, pois temia que
depois de viver sob terra seca por algum tempo e gerar filhos, Deus traria outro
dilúvio. Ele não saiu da arca até Deus jurar que jamais voltaria a visitar a terra com
um dilúvio.

“Isso eu lhe disse para que você pudesse implorar mise ricórdia para
a terra”.

Quando saiu da arca e pisou em céu aberto, Noé chorou amargamente diante da
devastação causada pelo dilúvio

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