Geometria Descritiva - Cálculo de Telhados
Geometria Descritiva - Cálculo de Telhados
Geometria Descritiva - Cálculo de Telhados
RESUMO
Este artigo apresenta dois problemas de cálculo da área de telhados. Para a solução, são utilizados co-
nhecimentos de geometria descritiva, matemática e computação gráfica. Os resultados obtidos com
os diferentes métodos são comparados e analisados. É feita uma estimativa do número de telhas. Os
conhecimentos de matemática utilizados são conteúdos do Ensino Médio. A modelagem em compu-
tação gráfica é feita de forma simples e pode ser disponibilizada aos alunos, que podem, assim, obter
automaticamente a área dos telhados e observar outra forma de solucionar o problema. A proposição
de problemas reais de engenharia na disciplina de graduação Geometria Descritiva vem sendo utilizada
com sucesso em sala de aula. Os resultados dos alunos nas avaliações mostram uma melhora no desem-
penho, além de um maior interesse pela disciplina.
Palavras-chave: Geometria descritiva; engenharia; telhados; computação gráfica.
ABSTRACT
DESCRIPTIVE GEOMETRY, MATHEMATICS AND GRAPHIC COMPUTER FOR
CALCULATING THE AREA OF ROOFS
This paper presents two problems for calculating the area of roofs. Descriptive Geometry, Mathemat-
ics and Graphic Computer are used for solution. The results obtained with the different methods are
compared and analyzed. An estimate of the number of tiles is made. The mathematics content used is
learned in high school. The CAD model is simple, and can be made available to students. Thus, students
can automatically obtain the area of roofs and observe another way to solve the problem. The proposi-
tion of real engineering problems in Descriptive Geometry undergraduate course has been used suc-
cessfully in the classroom. Student results on assessments show an improvement in performance, and
a greater interest in the course.
Keywords: Descriptive geometry; engineering; roof; computer graphics.
três livros aqui citados (HAWK, 1962; ROWE, no AutoCAD 2012 (KATORI, 2013), software bas-
1939; CHERRY, 1933), diversas aplicações da GD tante difundido para projetos em engenharia. Com-
para a engenharia. Cherry (1933) mostra o concei- param-se os valores de área obtidos através da GD,
to de interseção entre reta e plano, através de um da fórmula simplificada e do AutoCAD. Após isso,
cabo que atravessa um telhado; Rowe (1939) traz faz-se uma estimativa do número de telhas, através
um exemplo de obtenção da perspectiva axonomé- de fórmulas disponibilizadas pelos fabricantes.
trica de uma pirâmide pentagonal como uma apli- Já o segundo telhado tem quatro águas, e é si-
cação do método descritivo da mudança de plano milar ao apresentado em Hawk (1962). Nesse tipo
de projeção; e Hawk (1962) propõe problemas nos de telhado, a fórmula simplificada para o cálculo da
quais se pede a verdadeira grandeza (VG) de barras área não funciona, pois as águas não são retangula-
de torres de transmissão de energia. Também apre- res. Através da GD, no entanto, obtém-se a VG do
senta o caso de projeto de um ramal de comunica- telhado. Calcula-se a sua área utilizando-se a fórmu-
ção entre tubulações, tratando-se da distância entre la de Heron, da geometria plana, para triângulos. Os
retas reversas. O problema de obtenção da VG de valores de área são cotejados com os obtidos através
um telhado de quatro águas é mostrado em Hawk do AutoCAD em 3D para se comparar a precisão
(1962). das técnicas.
Esses livros procuram inventar problemas, de No presente caso, a implementação de pro-
modo a facilitar a compreensão e mostrar as possi- blemas práticos de engenharia em sala de aula foi
bilidades de aplicação da GD. Esse enfoque vai ao iniciada no primeiro semestre de 2013 (AYMO-
encontro da proposta de Aravena-Reyes (2014), NE, 2014), na disciplina Geometria Descritiva II-
que entende a problematização como uma tarefa A, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
inventiva, em que o enunciado deve “esgotar o pro- (UFRGS). Não são necessárias adaptações signi-
blema como ponto de partida para convertê-lo em ficativas no conteúdo, sendo que os livros citados
referência de transformação da realidade”. (CHERRY, 1933; HAWK, 1962; ROWE, 1939)
A maioria dos livros de Geometria Descriti- apresentam a abordagem tradicional e complemen-
va do Brasil (BORGES et al., 1998; MACHADO, tam os temas com as situações reais.
1969; PRINCIPE Jr., 1983) apresenta problemas
abstratos envolvendo ponto, reta e plano. Não se TELHADO DE DUAS ÁGUAS
encontrou casos que exemplifiquem uma contex- Os telhados são um caso facilmente com-
tualização das possíveis aplicações da GD em enge- preendido pelos alunos, pois telhados estão muito
nharia. presentes nas cidades, sendo os telhados de duas
Este trabalho apresenta a solução do problema águas bastante comuns em casas.
de dois telhados. O primeiro telhado tem duas águas Neste item, é apresentada a obtenção da área
(faces). Utilizando a GD, obtém-se a VG do telhado do telhado através da GD, de fórmula simplificada e
e calcula-se a sua área através da geometria plana. do AutoCAD 2012. Além disso, é feita a estimativa
Empregando uma fórmula simplificada, disponível do número de telhas para cobri-lo.
na Internet, faz-se o cálculo da área do telhado de
duas águas. Essa fórmula funciona apenas em faces Resolução através da GD
retangulares e leva em conta a sua inclinação (ângu-
lo da face do telhado em relação ao plano horizontal O telhado proposto tem duas águas retangula-
de projeção). A inclinação é um parâmetro de proje- res iguais, e sua épura está na Figura 1. Assim, o cál-
to importante, pois dela depende o bom escoamen- culo será feito para uma água e depois multiplicado
to da água. O problema é também modelado em 3D por dois.
Fonte: <http://www.acemc.com.br/informacoes-
tecnicas/calculo-de-consumo/>.
A área pode ser calculada manualmente através A área da face DCFE é dada pela soma de
das equações (3) e (4), mas, na Internet, há sites que 10,451 e 18,028, totalizando 28,479m². Já a área da
possibilitam o cálculo de forma automática. Neste face ADF está representada na Figura 8, e fica em
trabalho, utiliza-se o site “Math is fun” (MATHIS- 8,745m².
FUN, 2014). Para isso, basta colocar os valores a, b e
Figura 8: Área do triângulo ADF.
c nos campos apropriados. A Figura 7 mostra a área
da face D”1C”1E”1F”1 . Como ela é uma face trape-
zoidal (de quatro lados), é necessário dividi-la em
duas partes, o que é feito através da reta D”1E”1 (cf.
Figura 5). Na Figura 7, a primeira imagem represen-
ta o triângulo D”1C”1E”1 e a segunda é o triângulo
D”1E”1F”1 .
Figura 7: Área dos triângulos DCE e DEF.
A Figura 10 contém a área da face ADF, que é Os problemas reais empregando geometria
8,746m2, muito próximo ao valor obtido através da descritiva foram introduzidos em sala da aula na
GD, 8,745 m2. UFRGS, em 2013, para as turmas dos cursos de
A área total do telhado é obtida através da diversas engenharias (Civil, Mecânica, Elétrica,
Equação (6): Produção, Cartográfica, Minas, Metalúrgica, de
Materiais). A sua implementação necessita pou-
Área total = 2x (Área DCFE + Área ADF) = 2x cas adaptações no conteúdo. Os livros consultados
(6)
(28,484 + 8,746) = 74,46m2 (CHERRY, 1933; HAWK, 1962; ROWE, 1939)
apresentam a abordagem tradicional e comple-
Figura 10: Área da face ADF.
mentam os temas com as situações reais. Utiliza-se
na disciplina, como material de apoio, o software
HyperCAL3D (TEIXEIRA e SANTOS, 2013).
Esse software permite a modelagem de sólidos a par-
tir das coordenadas dos pontos e da lista de faces.
Pode-se observar um maior interesse pela disci-
plina e uma melhora no desempenho. Foi feita uma
Fonte: Elaboração do autor. análise dos resultados de 240 alunos por semestre,
em relação à nota média e ao número de reprova-
A área total do telhado calculada através da GD ções. A média geral aumentou de 6,4, em 2012, para
é 74,448m2 e pelo AutoCAD fica em 74,46m2. Essa 7,6, em 2013. A reprovação (média abaixo de 6,0),
diferença ocorre devido à precisão numérica utiliza- em 2012, foi 21%, e em 2013, caiu para 13%.
da, e é bem pequena: 0,012 m2 ou menos de 0,02%. Outros casos reais vêm sendo preparados para
Isso demonstra a precisão oferecida tanto pela GD a utilização em sala de aula.
quanto pelo AutoCAD.
Deve-se lembrar que a execução do telhado REFERÊNCIAS
também está sujeita à imprecisão e à quebra de ma-
ACEMC. Associação dos Ceramistas de Monte Carmelo.
terial. Para uma quebra de 5% das telhas, a área total Cálculo de Consumo. 2014. Disponível em: <http://
(sem considerar beirais e espigões) é 74,46 multi- www.acemc.com.br/informacoes-tecnicas/calculo-de-
plicado por 1,05, ou seja, 78,183m2. Observa-se, en- -consumo/>. Acesso em: 22 out. 2014.
tão, que os métodos apresentados trazem resultados
ARAVENA-REYES, J. A. A problematização como in-
próximos e confiáveis para o cálculo do número de venção: fundamentos para a educação em engenharia.
telhas. Revista de Ensino de Engenharia, v. 33, n. 2, p. 65-71,
2014.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
AUTODESK. Education Community Software for Stu-
Este artigo apresentou o cálculo da área de te- dents. 2014. Disponível em: <http://www.autodesk.
lhados utilizando conhecimentos de geometria des- com/education/student-software>. Acesso em: 22 out.
critiva, matemática e computação gráfica, conectan- 2014.
do as diversas áreas. AYMONE, J. L. F. Geometria descritiva aplicada à solu-
Os resultados demonstram a precisão e a faci- ção de problemas de arquitetura e engenharia. Revista
lidade de utilização da geometria descritiva, da fór- Educação Gráfica (Online), v. 18, p. 134-151, 2014.
mula de Heron e do software AutoCAD 2012 para o BORGES, G. C. M.; BARRETO, D. G. O.; MARTINS,
cálculo da área de telhados. A fórmula simplificada E. Z. Noções de geometria descritiva: teoria e exercí-
para o cálculo da área funciona apenas para telha- cios. 7. ed. Porto Alegre: Sagra-dc Luzzatto, 1998.
dos retangulares. O exercício de projeto envolve co- CHERRY, F. H. Descriptive geometry; an introduction
nhecimentos de geometria plana, que os alunos de to engineering graphics. New York: The Macmillan Co.,
engenharia já aprenderam no Ensino Médio, sendo, 1933. Disponível em: <http://hdl.handle.net/2027/
portanto, exequível. uc1.$b45965>. Acesso em: 22 out. 2014.
Revista de Ensino de Engenharia, v. 34, n. 2, p. 45-52, 2015 – ISSN 0101-5001
[52] GEOMETRIA DESCRITIVA, MATEMÁTICA E COMPUTAÇÃO GRÁFICA PARA O CÁLCULO DA ÁREA DE TELHADOS
HATHITRUST RESEARCH CENTER (United States MATHISFUN. Heron’s Formula. 2014. Disponível em:
of America). University of Michigan (Org.). HathiTrust <http://www.mathsisfun.com/geometry/herons-for-
Digital Library. 2014. Disponível em: <http://babel. mula.html>. Acesso em: 22 out. 2014.
hathitrust.org/cgi/ls?field1=ocr;q1=descriptive geome
PRINCIPE JUNIOR, A. R. Noções de geometria des-
try;a=srchls;lmt=ft;sz=100>. Acesso em: 22 out. 2014.
critiva – v.1. São Paulo: NBL Editora, 1983.
HAWK, M. C. Schaum’s outline of theory and pro-
ROWE, C. E. Engineering descriptive geometry; the
blems of descriptive geometry. New York: Schaum,
direct method for students, draftsmen, architects, and
1962. Disponível em: <http://hdl.handle.net/2027/
engineers. New York: D. van Nostrand Company, Inc.,
coo.31924001595093>. Acesso em: 22 out. 2014.
1939. Disponível em: <http://hdl.handle.net/2027/
KARINA TELHAS. Cálculos área de cobertura. 2014. mdp.39015000983802>. Acesso em: 22 out. 2014.
Disponível em: <http://www.karinatelhas.com.br/cal-
TEIXEIRA, F. G.; SANTOS, S. L. HyperCAL3D, Um
culos.php>. Acesso em: 22 out. 2014.
sistema inovador para auxílio ao processo de ensino de
KATORI, R. Autocad 2013 – modelando em 3D e re- geometria descritiva. In: GRAPHICA 2013 - INTER-
cursos adicionais. São Paulo: Senac São Paulo, 2013. NATIONAL CONFERENCE ON GRAPHICS EN-
GINEERING FOR ARTS AND DESIGN, 10, 2013,
MACHADO, A. Geometria descritiva: noções funda-
Florianópolis. Anais... Florianópolis: UFSC, 2013. p.
mentais para uso dos alunos do curso científico e dos
1-13. Disponível em: <http://graphica2013.ufsc.br/
candidatos às Escolas Superiores – teoria-exercícios. 18.
anais-2/>. Acesso em: 22 out. 2014.
ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1969.
DADOS DO AUTOR
José Luís Farinatti Aymone – Graduado em Engenharia Civil (1993, UFRGS); Mestre em
Engenharia Civil na área de Estruturas (1996, UFRGS); Doutor em Engenharia Civil na área
de Estruturas (2000, UFRGS). Professor Associado IV do Departamento de Design e Expres-
são Gráfica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), tendo ingressado em
1998. Na graduação, atua na disciplina Geometria Descritiva. Na Pós-Graduação, leciona na
disciplina Design Virtual do PGDESIGN (UFRGS). Em pesquisa, atua principalmente nos
temas: design virtual, projeto de artefatos, representação e modelagem, CAD (projeto auxi-
liado por computador), realidade virtual (VRML), visualização científica, interfaces gestuais e
otimização do encaixe de peças. Orienta nos níveis de mestrado e doutorado.