Relatorio Final Do IPF Manguinhos
Relatorio Final Do IPF Manguinhos
Relatorio Final Do IPF Manguinhos
O presente relatório condensa três produtos do projeto “O Índice de Prosperidade das Favelas
(IPF) – Piloto Manguinhos: O relatório contendo a metodologia e a proposta de indicadores que
compõem o IPF (Produto 3); O Mapeamento de atores de Manguinhos (Produto 5), e; Agenda
programática mínima para Manguinhos (Produto 6).
Outubro, 2017
Sumário
Apresentação .................................................................................................................................... 4
4.- O Índice de Prosperidade de Favelas para Manguinhos: Uma agenda mínima para a Comunidade
........................................................................................................................................................ 52
2
4.1.- Arquitetura do sistema de indicadores ............................................................................... 53
4.3.- Bases para uma agenda programática mínima para Manguinhos ........................................ 66
Bibliografia ...................................................................................................................................... 73
3
O Índice de Prosperidade de Favelas (IPF)
Piloto Manguinhos
Apresentação
O presente relatório sintetiza os resultados principais de um projeto de pesquisa que visa a
construção de um Índice de Prosperidade para áreas socioeconomicamente vulneráveis em centros
urbanos de grande porte que no caso brasileiro são as favelas e as suas comunidades. Colocado o
objetivo central dessa forma, pode passar ao leitor a ideia de uma pesquisa que vem a contribuir com
elementos adicionais ou com novos indicadores em um campo que gerou bastante literatura e
acúmulo de conhecimento pelo menos nas últimas três décadas. Se esse fosse o intuito, seria também
uma atitude louvável. Porém, a complexidade da pesquisa foi de outra natureza e, em consequência,
as implicações dos seus resultados serão também distintas.
Por considerar que o maior fator de risco para o desenvolvimento e sustentabilidade não
apenas da nossa cidade, mas também da região metropolitana é a desigualdade, as favelas aparecem
como os territórios cujas populações são mais vulneráveis em termos socioeconômicos. Assim o alvo
do trabalho a ser desenvolvido se concentrou nesses territórios.
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Manguinhos é uma comunidade com demandas bem qualificadas a partir de articulações
históricas como o Conselho Comunitário de Manguinhos e diversos projetos públicos, projetos de
cunho acadêmico que produziu dados e diagnósticos sobre o local e presença de instituições como a
FIOCRUZ ou a UNISUAM que tem como área de influência a comunidade de Manguinhos. Por esse
conjunto de fatores, se vislumbrou a oportunidade de começar a colocar em prática todos os recursos
materiais e intelectuais já adquiridos pelos membros da incipiente rede de cooperação com o intuito
de, futuramente, ser replicado em outras comunidades da cidade.
A incorporação da UNISUAM como parceiro foi de grande relevância não somente para a
realização do encontro acima mencionado, mas também para servir de apoio nas diversas atividades
de pesquisa.
No entanto, a crise abrangente que o país e o nosso estado enfrentavam e enfrentam obrigou
a redimensionar os projetos e também as parcerias. Existiam também – decorrente da complexidade
institucional da rede que nascia – visões e perspectivas diferentes que, aconselhavam o bom senso,
diminuir o ritmo das ambições inicialmente colocadas. Foi decidido que era importante nesta primeira
fase concentrar esforços na construção da proposta do Índice de Prosperidade de Favelas (IPF) para,
posteriormente, e com um produto em mãos ver as oportunidades durante 2017, para retomar as
parcerias e os projetos futuros.
No entanto, o Instituto não poderia ter cumprido o mandato sem o apoio ativo do Instituto
Pro-Natura, o Instituto Coca-Cola e a UNISUAM. As três instituições não pouparam esforços desde as
suas próprias vocações para chegar a bom termo.
Tem-se que mencionar a generosidade de estudiosos das mais diversas áreas e gestores
públicos e privados que dedicaram tempo e esforços para contribuir com seu conhecimento nas
etapas da pesquisa.
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O Instituto AFortiori também precisa reconhecer e agradecer a parceria das instituições
atuantes em Manguinhos. O Conselho Comunitário de Manguinhos, CCS-AISP 22, a Casa do
Trabalhador e todas as representações e lideranças comunitárias que abriram um diálogo honesto e,
naturalmente, difícil com o projeto. De qualquer forma, encontraram-se canais de cooperação e todos
abraçaram o projeto permitindo implementar a metodologia que será descrita brevemente adiante.
Os resultados da pesquisa são, por direito próprio, da comunidade de Manguinhos e o Instituto
AFortiori sempre terá as portas abertas.
O surgimento das desigualdades entre grupos humanos que habitam os mesmos espaços
urbanos não é um fenômeno novo. Desde a formação dos primeiros centros urbanos no Brasil colonial
assimetrias estavam presentes e eram decorrentes da divisão de trabalho e da diferenciação
econômica. Portanto, a sedimentação dos desequilíbrios é um fenômeno secular de reforço
permanente de concentração econômica que não se canaliza em melhoria social para todos os
segmentos da população.
Se nos anos 90 os pesquisadores afirmavam que a pobreza no Brasil tinha cor (negro), gênero
(mulheres) e idade (jovens até 24 anos de idade); hoje pode-se acrescentar que a pobreza também
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tem endereço: os territórios denominados de favela nos grandes centros urbanos. A compressão das
assimetrias dimensionais alimenta e potencializa as assimetrias espaciais.
Esse resultado tem origem na percepção dos cidadãos de que as autoridades públicas,
diversos tipos de representação político-partidária ou outro tipo de atores não podem ser confiáveis,
produzindo uma democracia inercial com baixos níveis de capital social. A hipótese aqui é que esta
apatia institucionalizada afeta as capacidades de governança e autonomia em virtude dos laços sociais
invisíveis criados entre as lideranças genuínas e atores predadores. Neste sentido, o capital social de
natureza negativa, limita avanços substantivos nos processos participativos e na capacidade efetiva
decisória abrindo espaço para a tutela social e política. (Baquero, 2015, p. 145)
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metrópoles brasileiras. Mais do que elencar temas ou problemas setoriais que precisam ser
enfrentados, assim como as suas possíveis soluções; o objetivo é propor ao leitor uma leitura sobre o
fato de que um acúmulo de desigualdades crescentes sobre os mesmos grupos humanos com
características etnográficas comuns em espaços geográficos de alta densidade populacional nos
centros urbanos, consolidam outro tipo de problemas (supressão de direitos, atrofia do tecido social
e político e, finalmente, centralidade do setor público) que precisam ser pensados analiticamente de
forma integrada na hora de buscar soluções.
Este relatório, adota a premissa do parágrafo acima como eixo norteador, em dois aspectos
importantes:
Tome-se um exemplo para ilustrar que a releitura proposta tem implicações radicalmente
diferentes. A literatura especializada, frequentemente, toma como uma das causas mais
importantes para as altas taxas de desemprego, os sérios problemas de qualidade da
educação básica. Portanto, as soluções para mitigar o desemprego passam por ações
intersetoriais que incluem a melhora da qualidade da escola, investimentos na
infraestrutura escolar, melhores equipamentos, professores qualificados, etc. A
comparação de vários indicadores educacionais entre as favelas e o resto das cidades
podem mostrar a relevância do argumento. No entanto, a nossa resposta a este exemplo
é um rotundo “sim, mas não”: o que relaciona ambos setores – oferta educacional de
qualidade e o mercado de trabalho – não é apenas uma relação intersetorial apontada,
por exemplo, pela literatura sobre desenvolvimento humano; mas existe sim uma relação
simbiótica que somente é possível pela supressão de direitos, pela atrofia do capital social
e político e pela omnipresença do setor público. Não adianta melhorar a oferta
educacional esperando que reverbere na queda da taxa de desemprego, enquanto essas
três dimensões não sejam levadas à serio na análise e na proposta de soluções.
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Em síntese, não se trata de elencar um conjunto de indicadores setoriais que reflitam um
diagnóstico acurado e as suas soluções, mas de incorporar também a sequência das
soluções que na base devem apontar os problemas nesses três macro fatores.
Todas as reflexões realizadas até aqui foram critérios importantes no desenho da estratégia
de pesquisa. A presente seção incorpora a seguir uma reflexão sobre o conceito de prosperidade e
outros termos equivalente. Não se trata de se debruçar sobre características técnicas dos conceitos
com a pretensão de propor um conceito adequado que seja capaz de ser operacionalizado, mas de
apenas contextualizar analiticamente o trabalho central que foi realizado com a comunidade de
Manguinhos.
Na segunda seção, se realizará uma descrição detalhada e analítica do trabalho de campo com
a comunidade, os objetivos propostos, os efetivamente alcançados e o grau de aderência da
metodologia com os princípios norteadores apresentados nestas páginas iniciais.
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Na quarta seção apresenta-se a proposta de indicadores e as suas dimensões, assim como
algumas considerações técnicas a serem tomadas no seu cálculo. Finalmente, a quinta e última seção
ensaia uma agenda mínima programática para a comunidade de Manguinhos e a descrição sucinta
das tarefas futuras para avançar no cálculo efetivo do IPF.
O primeiro avanço significativo nos anos 30 foi a superação da visão restrita utilitarista que
propõe que a atividade econômica, principalmente mensurada pelo Produto Interno Bruto per capita,
constituía uma excelente variável proxy do bem-estar social. No entanto, apesar do crescimento do
PIB per capita, o desemprego, níveis de pobreza significativos, condições precárias de saúde da
população e desigualdade na distribuição de renda coexistiam com um maior dinamismo da atividade
econômica. (Jannuzzi, 2017)
Portanto, a adoção do PIB per capita como indicador que monitorava o progresso social,
mostrou-se inadequado e insuficiente. Uma das críticas mais importantes para os objetivos do
presente relatório, consistia em que o produto per capita ignorava deficiências na distribuição
equitativa da renda. A alta concentração de renda gerava níveis de pobreza significativos
independentemente do nível de renda per capita. Países com alto nível de atividade econômica e com
processos robustos de acumulação econômica e geração de investimentos, possuíam segmentos
importantes da sua população em condições de pobreza, problemas educacionais e de saúde. A
riqueza produzida não se traduzia em bem-estar social e o PIB per capita não captava essa brecha
impossibilitando o monitoramento de políticas públicas redistributivas que visavam a redução da
desigualdade na distribuição de renda.
É importante para os objetivos do nosso trabalho traçar ainda que de forma esquemática a
historiografia conceitual percorrida pelo estado de arte dos indicadores sociais. Essa evolução aqui
apresentada pretende discutir e entender um conflito que grande parte da literatura considera ainda
não resolvida e que a construção da proposta do IPF pretende superar, pelo menos parcialmente. Esse
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conflito ou dicotomia consiste no caráter descritivo dos indicadores versus o caráter prescritivo dos
mesmos. Essa dicotomia influencia também na questão de quem é a clientela preferencial dos
indicadores de ambos tipos de indicadores.
Em 1933, o comitê emitiu o gigantesco relatório, Recent Social Trends. Este relatório foi
louvado como uma conquista das ciências sociais por grande parte dos departamentos de sociologia
das universidades americanas, mas também considerado praticamente inútil por outros círculos. O
volumoso relatório, foi o primeiro documento oficial dedicado à medição das questões sociais,
abrangendo temas como demografia, saúde e educação. (Cobb & Rixford, 1998)
Embora tenha servido para o conhecimento enciclopédico das tendências sociais, forneceu
pouca utilidade sobre como entender ou resolver os enormes problemas provocados pela Grande
Depressão e o desenho de políticas para superar os seus efeitos devastadores. No entanto,
considerando o contexto da época, representou enorme vitória política devido a que se dava igual
relevância à produção de indicadores sociais.
This report, prepared at the request of President Johnson, represents an attempt by social
scientists to look at several important aspects of the quality of American Life, and digest
what is known about progress toward generally accepted social goals. It is not in itself a
social report, but a step toward the development of a social report and a comprehensive
set of social indicators. These could not only satisfy curiosity about how we are doing, they
could also improve public policy making by: 1) providing more visibility to social problems
and, 2) making possible better evaluation of public programs. The report deals with such
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areas as: health and illness; social mobility; the condition of the physical environment;
including pollution and housing; income and poverty; public order and safety; learning,
science, and art; and participation and alienation. An appendix discusses how we can do
better social reporting in the future by pointing out how current statistics are deficient for
this purpose, and indicating the specific ways in which social indicators can be used to
determine public policy. (Department of Health, Education, and Welfare, 1970)
A passagem extraída acima evidencia algumas questões que se devem ressaltar e que
mostram a trajetória do estado da arte na construção de indicadores sociais e índices sintéticos. Em
primeiro lugar, o abandono definitivo da ideia de que, com o PIB per capita, seria suficiente captar a
qualidade de vida da população. A transformação automática do produto da atividade econômica em
progresso social foi questionada definitivamente. Ainda que se adote a premissa de que a renda das
famílias é um indicador robusto de bem-estar, produto não é o mesmo que renda das famílias porque
não existe a possibilidade de que as famílias se apropriem integralmente do produto.
Em segundo lugar, estreitamente relacionado com o ponto anterior, dado que o PIB per capita
não sintetiza ou representa progresso social, outros indicadores podem e devem captar de forma mais
acurada o progresso social. Se isto é verdade, de forma logica, é necessário desagregar setorialmente
as várias faces das condições sociais da população. Como pode ser apreciado na citação, temas como
educação, saúde, mobilidade social, geração de renda e pobreza, meio ambiente, ordem pública e
segurança, entre outros já eram incorporados como temas – ou dimensões – que deveriam ser
incluídos na hora de obter um quadro compreensivo da realidade social de um determinado país.
Em terceiro lugar, note-se que o tema da participação política e alienação foram também
incorporados na agenda de pesquisa do relatório. Não era mais possível pensar que a densidade do
tecido social e político da população era um ingrediente dispensável na hora de demarcar os fatores
que definem as condições de progresso social.
Porém, existe um conflito entre ambas finalidades na hora de elaborar propostas de sistemas
de indicadores na área social. Os proponentes de indicadores descritivos afirmam que a motivação
dos decisores de política ou da população para elaborar intervenções é uma parte fundamental dos
processos de mudança social. Embora isso seja verdade, é insuficiente. Os que defendem indicadores
de natureza prescritiva afirmam que o fornecimento de evidências sobre quais políticas podem
realmente funcionar é talvez o passo mais crucial para gerar mudanças. (Cobb & Rixford, 1998)
O conflito acima mencionado esconde outro dilema que foi resolvido em parte, simplesmente
reconhecendo que descrição e/ou prescrição envolve um debate entre a objetividade/imparcialidade
e a subjetividade/parcialidade do responsável de elaborar indicadores sociais. Esse debate foi
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superado com o desenvolvimento conceitual das ciências sociais que permitiu hoje o reconhecimento
de que toda proposta tem uma natureza pseudo-objetiva. (Cobb & Rixford, 1998)
Depois que o relatório fora publicado em 1914, a Fundação foi muito procurada para financiar
estudos semelhantes em outras cidades. Uma vez que não existiam recursos financeiros suficientes,
a Fundação decidiu contribuir com a publicação da metodologia e a assessoria técnica para quem
precise. A solução encontrada, foi que, com a metodologia e assessoria técnica disponível, a execução
passou a ser coordenada e supervisionada por comitês de cidadãos, federações de igrejas, câmaras
de comércio ou associações civis. Nos anos seguintes, mais de dois mil pesquisas locais foram
realizadas em temas como educação, cultura e lazer, saúde pública, segurança e condições
socioeconômicas. Os indicadores que foram gerados pelos especialistas, mas coordenados e sujeitos
às organizações sociais foram amplamente divulgados nas comunidades com o intuito de que estas
passem a interpelar ao poder público. Nas palavras de Smith, “The surveys usually explained much less
than met the eye. In reality, they were less an instrument for testing hypotheses and designing reforms
than for arousing a community’s conscience and ‘quickening community forces’ for reform, as one staff
member of the foundation put it”. (Smith, 1991)
Praticamente um século depois, ainda temos a mesma metodologia no que diz respeito à
construção de indicadores comunitários: financiamento privado, execução por parte dos especialistas
e difusão dos resultados e mobilização por parte das organizações sociais para pressionar o poder
público a realizar as iniciativas. Por outro lado, a produção de indicadores de natureza prescritiva
continua nas mãos de quem produz programas e políticas (autarquias, ministérios, centros de
pesquisa estatais), que têm capacidades tecnicamente distintas e significativas devido a que os
registros administrativos e dados de oferta encontram-se nas mãos dessas instituições e são
imprescindíveis para determinar a eficiência e eficácia dentro de um enfoque causal.
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A pesquisa aqui realizada, questiona conceitualmente este conflito e aspirou operacionalizar
o questionamento na parte metodológica. O sucesso ou não desta iniciativa, somente poderá ser
confirmado nas próximas etapas.
Em segundo lugar, nunca foi possível superar totalmente o viés descritivo em prol da visão
prospectiva que era necessária para formatar políticas públicas, assim como realizar a permanente
avaliação das iniciativas. Atrás desta limitação, se encontra um impasse ideológico que se reflete na
escolha da alternativa metodológica indutiva da escola americana de sociologia. Avançar na visão
prospectiva significava adotar a ótica dedutiva para entender as relações de causalidade dos
fenômenos sociais com o intuito de fornecer conhecimento útil na formatação das políticas públicas.
Significava abrir o debate sobre que modelo de sociedade deveria nortear a produção de indicadores
e qual o tipo de políticas se deveria propor. Implicava finalmente, que o governo se comprometesse
com algum modelo de entender a questão social. Dar os passos descritos aqui era totalmente inviável
na realidade americana dos anos 80. (Smith, 1991)
Em terceiro lugar, diferente das duas anteriores, a razão para descontinuar a publicação foi a
partir de um fato positivo. As demandas por informação cresceram de forma tão significativa e a
capacidade de produção de informação cresceu de forma exponencial que a consequência foi a
proliferação de relatórios setoriais geradas a partir das diversas agências e secretarias. Ganhou-se no
detalhe técnico e especificidade, mas se perdeu em relevância política.
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“Entre as condições prévias que permitiram que esta trajetória se cumprisse
tem-se: um programa de política social articulado do bem-estar social, uma
orientação intervencionista do governo, agências estatísticas inovadoras e a
centralidade geográfica"
Da onda gerada nos países europeus para a internacionalização dos sistemas de indicadores
sociais foi um passo. Os próprios países membros de instituições multilaterais demandaram a
necessidade de realizar compatibilizações dos sistemas nacionais de informação com objetivo não
apenas de comparar, mas também de criar e calcular indicadores e índices no âmbito supranacional.
A OCDE é uma das primeiras organizações a produzir sistemas de indicadores para os países membros,
Living conditions in OECD countries: a compendium of social indicators. (OECD, 1986) representa uma
das primeiras realizações e predecessor do OECD Better Life Index que é calculado para 38 países
incluindo o Brasil. (OECD, 2017)
As iniciativas acima mencionadas, são apenas exemplos célebres entre outras dezenas de
outras que incluem as setoriais. A Organização Mundial da Saúde (OMS) enfatiza a saúde humana,
levando ao movimento saudável das cidades, que desenvolveu indicadores para avaliar melhorias na
saúde pública amplamente analisadas.
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1.2.- Desenvolvimento Humano e Progresso Social como referenciais teóricos e
empíricos da Prosperidade
O conceito de desenvolvimento humano nasceu definido como um processo de ampliação das
escolhas das pessoas para que elas tenham capacidades e oportunidades para serem aquilo que
desejam ser. (PNUD, 2017)
O desenvolvimento humano devido ao fato que envolve a expansão das escolhas, acaba
determinando quem somos e o que fazemos. Vários fatores influenciam essas escolhas: a ampla gama
de opções que temos de escolher; nossas capacidades; as restrições socioeconômicas e cognitivas; as
convenções sociais e as influências culturais que moldam nossos valores e escolhas; nosso próprio
empoderamento e os modelos de agência que exercemos individualmente e nos grupos na definição
de nossas opções e oportunidades; e os mecanismos que existem para resolver reivindicações
concorrentes de forma justa e favorável à realização do potencial humano. (United Nations
Development Programme, 2016)
Se renda e riqueza fossem medidas ainda que não correspondam ao fim do processo de
desenvolvimento, pelo menos refletissem fielmente o padrão de vida das pessoas (correlação
perfeita), não haveria na prática dificuldades para utilizar tais medidas. (Kang, 2011)
No entanto, tomemos o caso do Brasil, entre tantos outros onde a distribuição desigual da
renda e de outros recursos, ou a baixa qualidade de serviços públicos como educação básica e saúde
levam a distorções tais que cidadãos de países de renda média inferior à brasileira às vezes exibem
qualidade de vida superior à dos brasileiros. Outros exemplos de disparidades entre nível de renda
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per capita e padrão de vida são dados por Sen, como por exemplo o estado de Kerala na Índia, que
apresenta indicadores sociais muito superiores aos apresentados por diversas regiões mais ricas, o
que justifica o uso de outras medidas além de renda per capita para a avaliação do desenvolvimento
de um país. (Sen, 1999)
A dimensão renda do IDH considera a renda per capita da população, ou seja, a renda média
mensal dos indivíduos residentes em determinado lugar (município, UF, região metropolitana),
expressa em reais. A renda per capita capta a capacidade média de aquisição de bens e serviços por
parte dos habitantes de determinada área geográfica e assim garantir um padrão de vida capaz de
assegurar suas necessidades básicas. A grande limitação de utilizar apenas esse único indicador nesta
dimensão é não considerar a desigualdade de renda. Assim, um município, por exemplo, pode
apresentar uma elevada renda per capita, mas, ao mesmo tempo, pode ter uma grande parcela de
sua população vivendo na pobreza que somente é explicada pela desigualdade na distribuição de
renda.
A dimensão Educação está composta por dois indicadores: escolaridade da população adulta
e fluxo escolar da população jovem. O primeiro, a escolaridade da população adulta, é medido pelo
percentual da população de 18 anos ou mais de idade com o ensino fundamental completo. O
segundo, fluxo escolar da população jovem, é medido pela média aritmética de:
A medida da educação da população jovem não inclui toda a população em idade escolar e
frequentando a escola, captando apenas determinados momentos da passagem da população jovem
pelo sistema educacional. Além disso, no caso do indicador que envolve definição de série, “anos finais
do fundamental”, capta apenas o ensino regular. Também adota, por questões amostrais e
estatísticas, faixas etárias ampliadas daquela faixa etária ideal: 12 anos nos anos finais do
fundamental, 16 anos com ensino fundamental completo, e 19 anos com ensino médio completo.
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O indicador da educação da população adulta limita a avaliação desta população àqueles que
completaram o ensino fundamental, não incluindo aqueles que tiveram alguma passagem pelo
sistema educacional sem completar ciclos. Também pressupõe como suficiente o ensino fundamental
completo, quando já se considera como básico o ensino médio completo. Nesse sentido mesmo com
indicadores altos a medida é modesta.
A descrição anterior, pretende apenas informar ao leitor sobre o tipo de implicações que
podem trazer à análise este índice sintético. As vantagens do IDH, residem na enorme capacidade de
comparação do IDH, na facilidade de obter esses 4 indicadores em praticamente todos os países do
mundo e na capacidade de mobilizar governos com vistas a melhorar o índice. Propostas e iniciativas
não apenas do setor público nos três níveis da federação, mas também de representações da
sociedade civil têm sido pautadas e orientadas pelo IDH no Brasil nas últimas três décadas.
Com efeito, desde o cálculo do IDH no âmbito intra-nacional e municipal a finais da década
dos anos 90, a relevância do IDH cresceu em termos exponenciais na formatação de propostas e no
monitoramento de programas sociais nas áreas de geração de renda, educação e saúde. O IDH no
Brasil tem servido como base para uma ampla reflexão sobre a melhoria de programas sociais e debate
sobre a alocação de recursos públicos. Finalmente, em muitas regiões do país, o IDH foi importante
fator de mobilização social em torno de metas e cumprimento de objetivos da ação do estado.
Apesar das potencialidades acima mencionadas. O IDH propõe um recorte muito restrito do
desenvolvimento humano. Não se trata apenas de comparar com outros índices sintéticos, mas
principalmente com a própria proposta conceitual e filosófica dos autores e especialistas que
trabalharam no tema e no cálculo do IDH (United Nations Development Programme, 2016):
1. First, the HDI is not a comprehensive measure of human development. It just focuses on the
basic dimensions of human development and does not take into account a number of other
important dimensions of human development.
2. Second, it is composed of long-term human development outcomes. Thus, it does not reflect
the input efforts in terms of policies nor can it measure short-term human development
achievements.
3. Third, it shares all the limitations of composite measures. But it is important to keep it simple
with minimum variables to ensure its acceptability, understanding and predictability.
4. Fourth, the HDI is an average measure and thus masks a series of disparities and inequalities
within countries. Disaggregation of the HDI in terms of gender, regions, races and ethnic groups
can unmask the HDI and can be and has been used widely for policy formulation.
5. Fifth, income enters into the HDI not in its own right, but as a proxy for resources needed to
have a decent standard of living. The issue with regard to income is how it is transformed into
the health and education dimensions of the HDI. Thus, between income and the other two
dimensions of the HDI, the issue is that of transformation, and not of substitution.
O IDH tem, portanto, um alcance limitado. Não pode fornecer uma imagem completa do
desenvolvimento humano em qualquer contexto. Este índice deve ser complementado com outros
indicadores úteis para obter uma visão abrangente. O reconhecimento desta limitação central – que
pode ser amplamente discutida em termos da disponibilidade de indicadores ou da própria forma de
calcular cada um deles – é verificado quando os Relatórios do PNUD incorporam, a cada ano, um
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conjunto importante de outros indicadores que complementam a visão do Desenvolvimento Humano
na hora de mensurar as diversas dimensões da qualidade de vida da população.
Assim, é preciso refletir outras alternativas metodológicas que representem análises sobre o
desenvolvimento humano. Definitivamente, o IDH, apesar de a sua enorme relevância, não pode
retratar a imagem completa. A principal determinante que é preciso introduzir nas análises é a
desigualdade nas suas diversas formas de propagação – desigualdade de oportunidades e de
resultados. (Cossio & Amorim, 2003)
O Índice de Progresso Social (IPS) visa atender a esta necessidade premente, criando um
quadro de medição robusto e holístico para o desempenho social e ambiental dos países. Este índice
pode ser usado por líderes do governo, empresas e sociedade civil para comparar os avanços de tal
forma a acelerar o progresso. O IPS compõe um quadro abrangente para medir o progresso social que
é independente do PIB, mas é complementar. A ótica aqui proposta é um mundo em que o progresso
social se situa ao lado do PIB como referência central para os desempenhos nacionais. O índice,
pretende fornecer uma base sistemática e empírica para orientar uma estratégia de crescimento
inclusivo. (Social Progress Imperative, 2015)
Consoante com a definição de Progresso Social na citação anterior, o IPS propõe 4 eixos
norteadores para a construção do índice: (Social Progress Imperative, 2015)
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3. Holístico e relevante para todos os países: A ideia foi criar uma medida holística do
progresso social que incorpore os diversos aspectos do bem-estar de todas as sociedades.
Definir o que é uma sociedade saudável para qualquer país, incluindo países de maior
renda, é indispensável na elaboração de uma trajetória para sociedades menos prósperas
para chegar ao estágio dos países mais desenvolvidos.
4. Acionável (aproveitável): o Índice pretende ser uma ferramenta prática que ajudará os
líderes e profissionais do governo, empresas e sociedade civil a implementar políticas e
programas que direcionem o progresso social mais rápido.
Básicas Abrigo
Segurança pessoal
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Cada um dos componentes incorpora entre 3 e 5 indicadores de resultado, totalizando 52
indicadores. No entanto, a estrutura descrita, funciona internacionalmente. Ou seja, com o intuito de
alcançar comparabilidade, o Social Progress Imperative – instituição sediada nos Estados Unidos –
mantém essa estrutura para 133 países. Desta forma, existe o -Global e podem existir IPS’s locais
(aplicações especificas no âmbito subnacional).
Com efeito, existem acordos locais em vários países – Colômbia, Estados Unidos, Costa Rica,
Peru, Paraguai, entre outros. No Brasil, desde 2013, o Social Progress Imperative aplicou a
metodologia e seus princípios, mas com a flexibilidade necessária para contextualizar os territórios da
Amazônia (municípios desta região) e se adaptar as disponibilidades de informação que nutrem a
construção dos indicadores. Além do IPS-Amazônia, a nossa cidade também foi beneficiária através
de convênio entre a Prefeitura (Instituto Pereira Passos) e esta organização. Outras duas organizações
apoiaram o Convênio: Fundação Roberto Marinho e a Fundación Avina.
O IPS RIO tem como objetivo construir o índice para as 32 Regiões Administrativas (RA) do Rio
de Janeiro, levando em consideração métricas que permitam ao poder público e aos cidadãos avaliar
o desempenho social da cidade. Os indicadores são compostos por bases públicas de dados
secundários, garantindo assim a estabilidade da periodicidade das informações quantitativas. (Pulici,
Carvalho Moura, & Mosaner, 2016)
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Da observação da Tabela 1 acima, é possível perceber que os 36 indicadores, distribuídos nos
12 componentes, são na sua maioria semelhantes aos extraídos por outras instituições que produzem
este tipo de indicadores. Por exemplo, os indicadores complementares que existem nos Relatórios
Anuais de Desenvolvimento Humano do Brasil ou as diversas versões da plataforma de consulta do
Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil possuem os mesmos indicadores que propõe o IPS-RIO.
Este fato é decorrente das possibilidades já definidas que as bases de dados públicas ou os registros
administrativos setoriais de alguns ministérios ou autarquias oferecem.
Até aqui, descrevemos dois índices sintéticos de grande relevância internacional que tratam
da mesma temática e nas últimas décadas tem contribuído com significativas inovações
metodológicas, cumprindo um papel central no debate público não apenas sobre o que significa
melhoria na função de bem-estar da população de um determinado território, mas também tem
empoderado à população de tal forma a participar menos passivamente sobre o futuro e metas que
devem ser trilhados para disseminar de forma igualitária o bem-estar social, econômico e político.
Outro fator determinante para a escolha desses dois índices na descrição realizada até aqui,
diz respeito à ampla aplicação de ambos em contextos subnacionais no Brasil. Seja o IDH, seja o IPS
ambos constituem realidades presentes no milieu social brasileiro, no mundo acadêmico, na
formulação e monitoramento de políticas públicas e, em alguns casos, de programas e investimento
social do setor privado. O IDH e o IPS têm a virtude da elegância do tratamento empírico dos dados
quantitativos e a simplicidade da metodologia que permite uma transparência impar quando
comparados com outras metodologias – por exemplo as de causalidade entre fenômenos sociais.
Estamos cientes que existe uma gama enorme de outros índices que foram brevemente
mencionados nas primeiras páginas desta seção. Outros índices de natureza multidimensional como
o IDH e o IPS existem não apenas no Brasil, mas também em outras regiões do planeta. Com um alto
grau de sofisticação metodológica e quantitativa ou expressando contextos de alto desenvolvimento
socioeconômico como os países da OCDE, esses índices poderiam ser também escolhidos como
referenciais diretos do trabalho aqui empreendido. A questão é que tanto o IDH quanto o IPS
oferecem uma base comum substantiva de diálogo e de potenciais parâmetros que podem vir no
futuro a calibrar empiricamente o índice de prosperidade.
O IDH e o IPS seriam critérios “padrão ouro” para a comparação na medida em que grande
parte dos indicadores se nutrem das mesmas bases de dados. Também seriam excelentes descritores
porque ambos já alcançaram um grau de maturidade nos mesmos contextos geográficos e sociais
onde o índice de prosperidade pretende contribuir: no âmbito intra-município, captando as condições
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socioeconômicas de populações com alto grau de vulnerabilidade social e demandas por serviços
públicos de qualidade não satisfeitas e, finalmente, em palcos de alta assimetria dimensional que
configuram a temática da desigualdade como delicada e difícil de ser tolerada se pretendermos uma
sociedade mais prospera no futuro.
Porém, ambos não poderiam ser deixados de lado como referenciais diretos do trabalho
realizado aqui. Dialogar com ambos os índices permite também nutrir um debate público sobre os
(des)caminhos do desempenho social, econômico e político do nosso país.
23
metodológico diferente aos aplicados em outros índices. Assim, as características apresentadas a
seguir são produto tanto da própria historiografia mobilizada (mesmo que devamos reconhecer que
a escolha é arbitrária e totalmente transitória) e das necessidades oriundas do trabalho empírico e de
campo realizado ao longo dos últimos meses.
Note-se que não se trata de colocar o fruto da atividade econômica apenas como um médio
(IDH) ou de dissociar as variáveis econômicas das sociais como faz o IPS. Do que se trata é de enfatizar
que prosperidade é um instrumento que somente faz sentido se adotamos a premissa de que
prosperidade é um processo permanente de atingir metas que são permanentemente reavaliadas ao
longo das etapas superadas no que tange as condições socioeconômicas de uma dada população.
Confúcio
No entanto, o que interessa aqui é retomar a reflexão sobre fluxo entre o vetor econômico e
o bem-estar social. No Diagrama 2, é possível apreciar de forma muito didática a dinâmica desse fluxo.
24
Uma comunidade qualquer tem como desafio a procura por uma vida melhor. Em geral, esta procura
é efetivada a partir da plena conscientização – por parte da população – das condições específicas de
precariedade existentes. Para superar as condições de precariedade ambas dimensões (representadas
pelos círculos) precisam abrir fluxos de dupla via. Ou seja, para atingir a transformação e virar uma
comunidade próspera, os resultados econômicos precisam fluir para impulsionar os vetores sociais
que geram maiores níveis de bem-estar social e os resultados do bem-estar devem também incidir
nos vetores econômicos que geram crescimento.
Ridley dedica vários capítulos no seu livro, para mostrar que se indivíduos e comunidades
continuassem com a ideia de autossuficiência nem o progresso tecnológico, nem a satisfação das
necessidades básicas, nem a convivência em coletividades participativas e democráticas poderiam
alcançar os patamares em que se encontram hoje. Os capítulos do extenso livro de Ridley são muito
1
No caso do ILP uma parte significativa dos indicadores não são muito adequados para o nível intra-municipal
ou para outro tipo de recorte espacial urbano (bairros, Regiões Administrativas ou favelas), pois foram pensados
no âmbito nacional.
25
sugestivos na hora de descrever a trajetória indissolúvel da prosperidade e da interdependência
humana: The collective brain: Exchange and specialization (dedicado ao acúmulo de conhecimento e
capital humano); The manufacture virtue: barter, trust and rules (progresso econômico); ou, The
triumph of the cities (desenvolvimento urbano) são alguns exemplos onde o autor mostra que o fator
determinante foi e é a interdependência.
Mas a interdependência entre as pessoas, cidadãos ou comunidades é uma das fases. A outra
fase relevante é a interdependência temática. Existe sim uma conexão substantiva entre dimensões,
não é apenas formal ou burocrática. Isso é que deve ser sinalizado de forma inequívoca pelo diagrama
2. A perda do fluxo entre ambas as esferas (econômica e de bem-estar social) implica no surgimento
de barreiras à prosperidade da comunidade. Da mesma forma, análises estanques sobre educação,
segurança pública, mercado de trabalho, entre outros, impede perceber as correlações temáticas.
Iniciar esta subseção citando uma passagem da última publicação de Ridley (2015), sintetiza
as características mais relevantes para a implementação da metodologia que será descrita na próxima
subseção. A ideia de um processo conduzido de dentro para fora e o protagonismo do milhões e não
dos planos de alguns são elementos fundamentais para repensar e propor o que talvez seja o traço
mais distintivo do nosso trabalho: incentivar e sistematizar o trabalho coletivo de uma comunidade
na identificação dos objetivos, dos mecanismos e das interações entre os componentes que fazem
parte do sistema de indicadores.
Na maior parte das vezes, o trabalho técnico de identificar os problemas, estabelecer as metas
futuras para a resolução desses problemas, modelar as causas e seus resultados e, finalmente, propor
métricas e construir indicadores ocupa a centralidade deslocando as visões e as interações da
comunidade. A questão aqui é que as possibilidades técnicas na construção de indicadores e a
disponibilidade de outros indicadores já produzidos previamente por institutos de pesquisa acaba por
gerar um processo totalmente inverso ao levantado por Ridley: o processo é conduzido desde fora e
a iniciativa está nas mãos de poucos que por muito bem preparados e bem intencionados que sejam
assumem a centralidade do processo deslocando a comunidade que, em última instância, seria a
beneficiária da prosperidade – independente do conceito que seja mobilizado.
26
No entanto, recolocar a centralidade da comunidade no processo de tal forma que os
mecanismos de indução sejam de dentro para fora e também adquira relevância as ações de muitos
e não de poucos, requer pensar com muito cuidado a temática da governança. Por isso, na proposta
do Instituto Legatum a dimensão institucional é ressignificada e se identifica a participação e as
liberdades individuais como balizas de uma governança da comunidade saudável e sustentável.
Independente dos indicadores que se escolhem, a questão é que no núcleo da prosperidade encontra-
se a democracia, talvez não como fim, mas como pré-requisito necessário para deslanchar e sustentar
o processo.
Finalmente, ainda dentro desta discussão sobre o caráter democrático que deve pautar o
processo de prosperidade é importante trazer brevemente uma reflexão que conecta três elementos:
participação ampla dos menos favorecidos, expansão massiva dos benefícios da prosperidade e, como
consequência, redução das desigualdades internas e externas. Esta mensagem, também está implícita
tanto no Ridley quanto na documentação disponível do Instituto Legatum.
Mais do que isso, o Banco Mundial tem dedicado esforços para estudar, propor e financiar a
democratização dos benefícios da prosperidade. Na verdade, da mesma forma que a bibliografia
mobilizada até aqui, o Banco Mundial identifica que prosperidade implica incluir nos benefícios do
bem-estar aos menos favorecidos e de forma abrangente na cobertura. Sim essas duas finalidades
alcançadas, não é possível afirmar que uma sociedade é prospera. Por isso estabelece que os
benefícios e os padrões de qualidade de vida devem pelo menos beneficiar aos 40% mais pobres.
(World Bank, 2015)
O segundo elemento que não pode ser aceito sem restrições quando se trabalha com
comunidades, é que políticas públicas cuja principal virtude é incentivar a concorrência e erodindo
monopólios de tal forma a ampliar mercados aumentam a igualdade de oportunidades, tornando
possível a expansão da prosperidade e o crescimento econômico inclusivo. (World Bank/OECD, 2017)
a) Como deve ter notado o leitor atento, evitamos propor indicadores ou realizar análises
sobre os mesmos em quaisquer das propostas aqui descritas. Fazemos isso, porque como
27
será explicitado mais adiante, este trabalho precisava ser realizado de dentro para fora da
comunidade;
b) Conceitualmente, propomos que o conceito de Prosperidade é uma construção coletiva
das comunidades em contextos espaciais, materiais, políticos e culturais específicos. Por
isso, que aqui se aposta na plasticidade do conceito;
c) Plasticidade do conceito de prosperidade que não implica a impossibilidade de acumular
conhecimento ou identificar que em outras áreas vulneráveis urbanas não existam
elementos transversais que possam utilizar um subconjunto de indicadores a serem
calculados em outras áreas. Neste sentido, somos otimistas que o IPF pode sim ser
aplicado em outros contextos;
d) Porém, deve-se ter cuidado de não esquecer que independente do recorte espacial ou
temporal o que norteia a metodologia são as três características descritas aqui;
e) Se o ponto anterior é aceito, então uma das maiores contribuições é de caráter
metodológico e, portanto, a replicabilidade passa a ser um critério de sucesso ou fracasso.
Por isso surgiu a necessidade de realizar um piloto;
f) A desigualdade é um determinante que não pode ser deixado de lado. Portanto, apesar
de reconhecer princípios universalistas como o faz o IDH ou IPS, aqui a ênfase é na redução
de assimetrias e do reconhecimento que os desiguais precisam ser tratados
desigualmente com o objetivo de reduzir desigualdades qualquer que seja a tipologia;
g) Finalmente, a metodologia aplicada testou a ideia de que o conhecimento
institucionalizado (acadêmicos, pesquisadores, especialistas, gestores) deveria cumprir no
piloto um papel complementar e tomar as medidas necessárias para evitar o
deslocamento da comunidade. Não significa que na hora de pensar as soluções técnicas
não sejam importantes, mas o esforço foi o de manter o papel de assessoria.
28
Inhaúma, na Baía de Guanabara, incluindo a ilha do Pinheiro e a ilha do Bom Jardim. Hoje, com 16
grandes comunidades próximas, entre elas a Vila Turismo (de 1951), CHP2 (de 1951), Parque João
Goulart (junto ao rio Faria), Parque Carlos Chagas ou Varginha (1941) e Mandela de Pedra (1995), a
Comunidade Parque Oswaldo Cruz ou do Amorim (1901) e os Conjuntos Habitacionais Nelson
Mandela e Samora Machel, situados entre o rio Jacaré e o canal do Cunha.
O Complexo de Manguinhos é ocupado pela grande área da Fundação Oswaldo Cruz, pela
Refinaria de Manguinhos e pelo complexo de favelas e é servido pela avenida Brasil, Linha Amarela,
ramal da Supervia, avenida dos Democráticos e rua Leopoldo Bulhões.
29
2.2.2.- Macro-atividades de campo
O trabalho de campo foi dividido em duas frentes: a primeira de levantamento de atores e
mapeamento de desafios do território de Manguinhos; a segunda frente estabelecer canais de
comunicação e troca com diversas formas de representação da comunidade e com especialistas da
área socioeconômica, ambiental e de cultura, entre outros para coletar insumos que alimentem a
proposta de construção dos indicadores (objeto deste trabalho).2
No desenho metodológico a sequência dos encontros foi crucial para garantir os princípios
apresentados acima:
2
O desdobramento futuro do campo será a elaboração técnica de questionários para serem aplicados com os
moradores com o objetivo de validar esses instrumentos.
30
2. Série de reuniões individuais e coletivas com especialistas/gestores: Foram entrevistadas
13 pessoas em diversas áreas para mostrar os resultados da primeira oficina com a
comunidade e coletar sugestões e também incorporar temas na agenda de debate;
3. Segunda oficina com a comunidade: Mostrando os resultados da série de reuniões com
especialistas e gestores, assim como apresentar um avanço do trabalho de pesquisa.
Com efeito, adotar a premissa que as favelas possuem características próprias intrínsecas
quando comparadas com outros territórios implica realizar uma imersão na área escolhida com o
propósito de captar as particularidades do território.
31
O trabalho de campo – cujos momentos mais visíveis foram os Workshops – impunha um
trabalho denso de sensibilização e alinhamento de expectativas entre os atores convidados e a própria
equipe de pesquisa. Para isto, foi necessária uma abordagem em vários ambientes institucionais para
captar as características da rede de relacionamentos e as dinâmicas entre atores no território. Deve-
se acrescentar que também foram realizadas reuniões individuais com lideranças que potencialmente
poderiam ter um efeito multiplicador com outras lideranças e poderiam abrir outros espaços para a
equipe de pesquisa.
Como exposto acima, para se ter acesso ao território, fez-se necessário conhecer as lideranças
locais para apresentação do projeto e conseguir o envolvimento desses representantes de
Manguinhos no debate para construção do IPF. A entrada no território foi realizada através um
mobilizador comunitário com facilidade de acesso no território que conhecia algumas lideranças locais
e que participa de alguns movimentos sociais de Favelas. O nosso mobilizador tinha duas tarefas
bastante desafiadoras:
Em geral, todos atuam e estão fazendo a gestão de projetos contra a violência, para apoio aos
moradores de rua, moradores de rua com dependência química, projetos de cultura, crianças com até
8 anos de idade, mobilidade com crianças deficientes, ambulantes, jovens, entre outros. Foi nessa
32
reunião que a equipe de pesquisa conseguiu identificar, parcialmente, um conjunto de iniciativas
como as mencionadas. A sociedade civil, através das organizações e movimentos sociais, tem um
papel estratégico no processo de intervenção social para formulação e implementação de uma política
pública.
O primeiro encontro foi possível em virtude da união de nossa agenda de pesquisa com uma
agenda do próprio território, cujo eixo de atenção foi e é a violência no território e a crise de
segurança.
Outras reuniões foram realizadas em espaços onde as lideranças indicava, assim um segundo
encontro foi realizado na Biblioteca Parque de Manguinhos para planejamento participativo dos
próximos passos: agenda das oficinas e levantamento das temáticas.
Esta situação interferiu as semanas seguintes no ritmo previsto na execução das diversas
tarefas do projeto trazendo dificuldades à equipe do projeto para marcar as reuniões de preparação
das oficinas com os diversos representantes do território. Essas reuniões preparatórias tinham por
objetivo a adesão e participação da comunidade para discussão dos mais diversos temas que deveriam
ser incluídos no IPF para que o índice reflita de forma abrangente os gargalos e potencialidades do
desenvolvimento sustentável.
Frente a essa realidade optou-se por inserir o projeto em outros ambientes institucionais com
o propósito de cumprir a nossa agenda, mas também de realizar a imersão necessária nos diversos
problemas que atingem a comunidade de Manguinhos sempre com o intuito de obter uma agenda
integrada.
33
lideranças e se disponibilizaram a participar do processo de sensibilização e mobilização do projeto. A
equipe conseguiu agendar três reuniões no dia 13/06/17 durante a tarde, no CRJ Manguinhos, com
outras representações que não tinham sido indicados anteriormente, ampliando assim a rede de
contato.
Dada a agenda intensa das lideranças em torno da escalada de violência que impossibilitou
continuar a sensibilização do projeto em reuniões presenciais, decidiu-se utilizar intensamente as
ferramentas de comunicação da internet. Mantivemos contato através de um grupo do WhatsApp,
criado com todos os contatos que fizemos durante os encontros e conversas individuais. O grupo IPF
Manguinhos tornou-se a via de comunicação mais rápida para sabermos das agendas do território e
para acessar as pessoas informando e convidando para os próximos passos. Também solicitamos a
nossa inclusão em outros grupos de WhatsApp e Facebook de tal forma a não interromper o processo
de imersão no território e continuar com a sensibilização para participar nos Workshops com a
comunidade.
A estratégia de utilizar as ferramentas da internet não seria tão eficiente se não existisse a
complementação com o contato pessoal para apresentação do projeto, esclarecimento via e-mail e
telefone.
34
Abrir a mobilização para moradores e outros atores do território foi uma estratégia para
garantir adesão do território ao projeto do IPF. Quando a equipe apresentou a proposta para
moradores que não faziam parte das representações formais, houve um interesse genuíno e
entendimento da importância do projeto.
Para mobilização em territórios é central que o mobilizador seja morador do território, com
fácil acesso entre as pessoas locais e com disponibilidade para contatos e encontros em horários
diversos. Este ponto foi um aprendizado, pois o mobilizador participante da equipe do projeto não era
morador do território e não tinha disponibilidade integral, apesar de ter acesso ao território e as
pessoas, ocasionando um processo mais lento na mobilização.
Finalmente, um aprendizado muito importante é atender para a dinâmica política dos atores.
Manguinhos – como possivelmente outros territórios vulneráveis – possui uma gama importante e
diversa de interesses setoriais. Muitas vezes contraditórias e com pretensões hegemônicas sobre as
agendas. Talvez está seja a razão principal para termos encontrado: agendas
atomizadas/fragmentadas; vínculos estabelecidos de caráter tópico e de curto prazo; microssistemas
de governança fragmentados, e; dada a vulnerabilidade socioeconômica dos atores e do território
predomínio do poder público e de instituições capazes de mobilizar todo tipo de recursos.
35
A 1ª oficina de trabalho com
moradores de Manguinhos sobre
condições e perspectivas de vida no escopo
do projeto de formulação do Índice de
Prosperidade das Favelas (IPF) foi realizada
no dia 12 de julho de 2017 das 13:00 às
18:00 na UNISUAM – Av. Paris, nº 84, Sala
Integradora 208B, Bonsucesso. Com o
objetivo de constituir um grupo diverso de
12 a 18 pessoas, a expectativa foi superada
com a com a participação de 28 moradores
e representantes da comunidade.
O trabalho de campo com os especialistas ou, que estamos denominando aqui, conhecimento
institucionalizado seguiu os cânones tradicionais de metodologias qualitativas. Pesquisa preliminar
sobre o tema e as contribuições da pessoa que potencialmente será entrevistada e preparação do
roteiro contendo as seguintes partes:
Como mencionado páginas acima, esta etapa de entrevistas foi iniciada somente depois da
realização da 1ª Oficina com a comunidade. Desta forma pretendíamos garantir o papel subsidiário
dos entrevistados na medida em que a parte mais extensa da entrevista era o item (c). As 12
entrevistas foram realizadas entre o dia 1º e 22 de agosto de 2017.
36
A próxima seção contém uma descrição analítica dos resultados de todo o trabalho de campo,
incluindo o mapeamento realizado.
Por sua vez, as fontes secundárias utilizadas foram sítios eletrônicos, relatórios e bases de
dados de órgãos públicos como o IBGE, dados administrativos setoriais públicos.
Seguindo a metodologia geral do IPF, que visa privilegiar dinâmicas e identidades verificados
entre moradores das favelas em detrimento de definições oficiais ou de atores distantes do território,
o mapeamento foi desenvolvido com base em três premissas centrais:
37
Pacificadora (UPP) do Governo do Estado e pelo Programa UPP Social, sua contrapartida
de competência municipal, sob gerência do Instituto Pereira Passos (IPP).3
b) Tomou como base o conjunto de mapeamentos produzidos na 1ª Oficina Comunitária em
Manguinhos realizada no âmbito deste projeto, que definiu a localização e divisão entre
comunidades próximas e apresentou questões relativas às dinâmicas próprias do
território, tendo verificado e acrescentado os itens que serão apresentados.
c) Trabalhou com dimensões temeáticas formuladas e posteriormente discutidas com
moradores que participaram, respectivamente, da 1ª e 2ª Oficinas Comunitárias em
Manguinhos realizadas no âmbito deste projeto, e com o conjunto de “especialistas”
sobre os diversos temas que serão abordados neste documento e no IPF.
Vila Turismo
Parque João Goulart
CH Samora Machel
Samora Machel II
Vila União e Conjuntos dos Ex-
Combatentes e Tiradentes Condomínio Embratel/PAC
Instituto AFortiori.
3
Isto significa que não foram consideradas parte de Manguinhos as três comunidades pertencentes ao “Parque
Arará”, localizado do outro lado do Canal do Cunha e da Refinaria de Manguinhos: Vila Arará, Parque Herédia
de Sá e Parque Horácio Cardoso Franco.
38
Manguinhos é considerado um complexo de grande porte pela densidade populacional e
extensão de seu território, mas devido às suas características físicas de um antigo estuário – com a
junção de diversos rios e cobertura de manguezal – a ocupação não é contínua. Seus limites físicos
são a Linha Amarela, ao norte, as Avenidas dos Democráticos e Dom Hélder Câmara, a oeste, o Viaduto
de Benfica, Canal do Cunha ou Refinaria de Manguinhos, ao sul, e a Avenida Brasil ao leste. Ainda,
como ilustra o Mapa 1, o Complexo de Manguinhos é formado por 16 comunidades residenciais,
considerando como uma os Conjuntos Habitacionais dos Ex-Combatentes e Tiradentes, em cujo
entorno se formou a ocupação da Vila União. Estas comunidades, com algumas exceções, estão
entrecortadas por linhas férreas e de alta tensão e pelos Rios Faria, Timbó e Jacaré.
Ainda nas primeiras décadas do século XX, devido a sua localização central e acessível por
portos fluviais para a Baía de Guanabara e pelo ramal de trem da Leopoldina para Petrópolis e Três
Rios, o Estuário de Manguinhos passou a ser aterrado criando solos mais extensos, estáveis e
protegidos de impactos naturais, como inundações. Tais transformações físicas do território foram
feitas a partir de extensas propriedades privadas e da União no local e, em grande parte,
39
implementadas pela Empresa de Melhoramentos da Baixada Fluminense, que incorporou áreas de
manguezais e alagadiças através de uma série de obras estruturais. Os terrenos criados, afastando a
costa do território de Manguinhos, deram espaço à mais terrenos pertencentes ao Governo Federal,
utilizados, entre outros fins, para a instalação do Aeródromo de em 1934 para formação de pilotos e
testes de aviões e, eventualmente, da Refinaria de Manguinhos da Petrobrás, inaugurada em 1954
após um longo processo de instalação e regularização.
No entanto, a população não beneficiada pelo Governo Federal ou por outros atores-chave
na produção de moradia, como a Fundação Casa Popular, continuou a ocupar áreas que permaneciam
vazias próximas às margens dos rios, ou entre estes e vias que se abriram ao longo dos anos, como as
40
Avenidas dos Democráticos e Dom Helder Câmara,4 que delimitam comunidades referidas como Vila
Turismo, CHP-2 e Parque João Goulart, todas datadas do início da década de 1950. Nas décadas
seguintes, ocupações irregulares se expandiram também para o entorno dos conjuntos habitacionais
citados, separados da área da CHP-2 pelo Rio Jacaré, consolidando a chamada Vila União.
Neste contexto, até a década de 1970, o território de Manguinhos passou por um intenso
processo de urbanização, industrialização e adensamento populacional majoritariamente de baixa
renda e de forma irregular. Em 1980, já eram visíveis ocupações também ao norte da Vila Turismo,
referidas como Comunidade Agrícola de Higienópolis e Vila São Pedro, esta última hoje do outro lado
da Linha Amarela, que teve o trecho que corta Bonsucesso e Manguinhos construído logo antes de
sua inauguração em 1997. Durante este período, o adensamento e constantes desabamentos,
enchentes e incêndios nas ocupações irregulares em Manguinhos geraram uma pressão enorme por
espaços e moradias, que contrastava com grandes propriedades industriais e empresariais
subutilizadas ou já abandonadas. Diante deste cenário, o Governo do Estado e, depois, a Prefeitura
passaram a interceder e promover negociações com a empresa Embratel, para desapropriar seus
terrenos e construir moradias. Nesse momento, Manguinhos foi reconhecido como bairro por um
Decreto-Lei de 1988.
Devido às negociações truncadas entre o Poder Público e Embratel, que se iniciaram em 1983,
a população da região passou a invadir partes do terreno, eventualmente permitindo a construção
dos Conjuntos Habitacionais (CH) Nelson Mandela e Samora Machel, inaugurados no início da década
de 1990. Adotando um padrão construtivo de casas e vilas, os CH Nelson Mandela e Samora Machel
passaram por outras ondas de construção após suas inaugurações oficiais, gradativamente quebrando
com o padrão original e descaracterizando-os. No último ímpeto de ocupações, formaram-se outras
comunidades, chamadas Mandela de Pedra, iniciada em 1995 e chegando às margens do Canal do
Cunha, e Embratel/Samora Machel II, consolidada em 2001 no interior desta área entre a última e o
CH Samora Machel e Nelson Mandela, que fica às margens do Rio Jacaré.
Por isso, investimentos neste sentido só foram realizados de forma ampla nas décadas de
2000 e atual (2010), principalmente através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do
4
A Avenida Dom Hélder Câmara foi originalmente aberta após a fundação da Irmandade de Nossa Senhora da
Penha em 1728, como um meio de comunicação com o Centro da cidade sob o nome Estrada Real de Santa Cruz,
depois Av. Suburbana, até receber nome atual em 1999. Já a Avenida dos Democráticos, assim chamada a partir
de 1923, foi originalmente aberta a partir da Estrada Real de Santa Cruz como Estrada da Penha, ligando a
Estrada Real ao Largo da Penha.
41
Governo Federal e de contrapartidas estaduais e municipais. Neste movimento, o território físico de
Manguinhos foi alterado de forma significativa e diversos equipamentos e serviços foram instalados.
Simultânea a estas obras, a remoção completa da comunidade Mandela de Pedra foi realizada
gradualmente entre 2009 e 2014, com a resistência de um pequeno conjunto de casas nos últimos 2
anos do processo. Ao final, uma via asfaltada demarcou a área removida, separando-a da comunidade
Samora Machel II/Embratel e CH Nelson Mandela, que não foram afetados. Atualmente, a área
permanece vazia. Ainda, semelhantemente ao Conjunto Habitacional Embratel, o PAC construiu
outros dois condomínios seguindo o padrão construtivo de prédios de apartamentos no território: um
no antigo Depósito de Suprimentos do Exército – DSUP, que devido à propriedade militar não havia
sido invadido, mas foi desapropriada para as obras, e na antiga Cooperativa Central de Produtores de
Leite – CCPL, que fica um pouco mais distante e havia sido invadida por mais de 1.200 famílias de baixa
renda por volta de 2002. Os primeiros apartamentos dos Condomínios da DSUP e Nova CCPL foram
entregues, respectivamente, em 2009 e 2014.
42
Por sua vez, além de assumir parte das construções e manutenção de maior parte destes
equipamentos, o Governo do Estado também implantou duas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP)
em Manguinhos, ambas inauguradas em 2013.
43
povoadas, cruzando bairros como Piedade, Lins de Vasconcelos, Engenho de Dentro, Inhaúma, Maria
da Graça e São Cristóvão.
Caracteriza-se como uma região com sérios problemas ambientais, com poluição do ar, dos
rios e do solo, devido ao lançamento de dejetos in natura, tanto das fábricas como das moradias, nos
rios que cortam a região, além da proximidade com a Avenida Brasil e a Refinaria de Petróleos de
Manguinhos S.A. (Fernandes & Gama-Rosa Costa, 2012)
Segundo dados do Censo de 2010, processados pelo Instituto Pereira Passos para as
comunidades de Manguinhos, a tabela a seguir apresenta o quadro resumido de fornecimento dos
quatro serviços urbanos essenciais – água encanada, energia elétrica, esgotamento sanitário e coleta
de resíduos sólidos – segundo as respostas dos moradores.
44
3.1.3.- Mobilidade urbana
Garantir mobilidade urbana de qualidade, integrada e capilar (próxima à moradia, trabalho e
locais de frequência) é um desafio diretamente correlacionado com o adensamento populacional,
grau e qualidade de urbanização e articulação entre diferentes modais.
Uma questão de rede por natureza, a mobilidade urbana deve necessariamente considerar, a
partir de determinada origem, quais destinos estão acessíveis por quais modais, com que capacidades
e com que tempo de deslocamento. No caso de Manguinhos, que é grande, populoso e localizado em
área estratégica entre o Centro da cidade e a Baixada Fluminense, o acesso a diferentes meios de
transporte é considerado relativamente bom quando comparado a outras favelas da Zona Norte e
Zona Oeste.
Considerando ambas questões referidas, moradores relatam que um dos principais problemas
é a obstrução e fechamento de passagens, ausência de caminhos diretos e interligando pontos
estratégicos e o crime organizado que proíbe a passagem de moradores de certas áreas em outras
comunidades, além do impedimento geral do ir e vir gerado pela violência.
45
destinos, como no metrô e trem, a superlotação, falta de ar condicionado e restrição de linhas e
destinos disponíveis, entre outros.
UPP Manguinhos
CIDPOL
UPP Arará/Mandela
Instituto AFortiori.
46
Como premissa, explorar o tema da segurança pública e seu provimento pelo Poder Público
em territórios de favela é um desafio delicado. Neste mapeamento, consideraram-se fontes oficiais
pertinentes as informações, notícias e dados de órgãos públicos como a Polícia Militar do Estado do
Rio de Janeiro (PMERJ), a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (PC-RJ) e do Programa Unidades de
Polícia Pacificadora (UPP) e sua contrapartida municipal, a UPP Social e dados produzidos pelo
Instituto Pereira Passos (IPP) neste âmbito.
Em relação à efetividade dos investimentos da UPP para garantir a segurança pública local,
ataques violentos ao container da UPP Arará/Mandela localizado nos fundos do CH Nelson Mandela
em março de 2014 deixaram o Comandante da Unidade baleado e o container incendiado, causando
danos também a postes e moradias próximas. Entre 2016 e 2017, os moradores relatam que os
efetivos de policiais do programa vêm diminuindo, enquanto uma nova onda de recrudescimento da
violência eclodiu no território de Manguinhos e áreas próximas, como o Jacarezinho, com tiroteios
frequentes gerando dezenas de vítimas, feridos e constantes interrupções de serviços básicos.
Por fim, outras ações que requerem verificação, mas foram previstas pelo Poder Público,
envolvem os serviços da RioLuz, responsável pela iluminação pública das vias, tendo sido previsto pela
Secretaria Municipal de Conservação a modernização e 309 pontos de luz e instalação de 23 novos
pontos, a criação de uma rotina de manutenção da iluminação pública no local, com o chamado
programa Vamos Iluminar, de ambos os órgãos da Prefeitura citados. Além disso, não foram
identificados postos ou ações da Guarda Municipal no território.
47
Dos 28 participantes, 19 eram moradores de Manguinhos e que se distribuíam em 9
comunidades do complexo, sendo a Vila Turismo a que tinha o maior número de representantes na
oficina. Não estavam presentes moradores das comunidades referidas como Parque João Goulart e a
Nova CCPL, nem da área abaixo do Viaduto de Benfica, possivelmente identificadas como Favelas
Vitória de Manguinhos e Previdência.
Por outra parte, 50% responsáveis do domicílio, 29% cônjuge do responsável e 18% filhos do
responsável. Em relação à educação, 18% havia chegado à pós-graduação, 32% ao Ensino Superior,
21% ao Ensino Médio, 18% ao Ensino Fundamental e 11% não responderam.
Em relação aos aspectos de trabalho e renda, 29% disseram que não trabalharam nem um dia
na última semana, enquanto 71% trabalharam. Desses, 19% atestaram ter carteira de trabalho
assinada, mas 22% consideraram-se empregados sem CTPS assinada, 30% autônomos, 11%
trabalhadores domésticos, 7% temporários, além de 1 estagiário, 1 trabalhador cooperativado e os
11% que não responderam.
Através destes vínculos de trabalho, 68% declararam viver com uma renda domiciliar mensal
média de 0 a 3 salários mínimos enquanto 21% optaram por não responder. Além disso, poucos
recebem benefícios ou auxílios do Poder Público, com apenas uma aposentadoria por tempo de
serviço do marido falecido e uma diretamente recebida, além de duas Bolsas Família. Por fim, o dado
mais expressivo entre participantes, por incluir 9 que não moram em Manguinhos é que 89% conhece
alguém vítima de violência no território.
Para captar as diferentes percepções dos convidados, foram propostas duas atividades:
• São poucos equipamentos públicos como praças, quadras, campos, espaços para
crianças brincarem, que ofereçam atividades para adolescentes, porque há
concentração destes equipamentos, que são “muito aglomerados para uma
comunidade que é imensa”.
• Há uma distribuição espacial razoável de escolas e creche. Durante o mapeamento os
jovens perceberam que em cada comunidade tem pelo menos uma escola de Ensino
Fundamental e uma creche, mas a percepção é que são pequenas e não há vagas
suficientes. Isso não quer dizer, porém que a educação seja boa. Não há qualidade e
faltam professores. O acesso ao Ensino Superior no território também é pouco
incentivado, mesmo que tenham instituições próximas e públicas como Fiocruz, UERJ
e UFRJ, além de instituições privadas como a UNISUAM.
• Apontaram para o problema de as iniciativas não serem sistemáticas, nem
amplamente divulgadas. Oportunidades não chegam para todos os interessados,
somente para quem conhece e sabe onde procurar, sabe como ir atrás. É assim que
funciona o acesso à cursos profissionalizantes, graduação, especializações, etc. a
desativação recente da FAETEC e a Biblioteca Parque reduzem ainda mais o acesso ao
conhecimento e a cultura.
• A questão da mobilidade foi muito destacada, tanto o uso de transporte público,
quanto a circulação de pedestres na comunidade. Para a Zona Sul e a Zona Oeste, em
geral precisa de até 3 conduções e o Bilhete Único não facilita mais nada. O Metrô
mais próximo é Maria da Graça, fica muito longe para moradores de locais como o
Mandela I e II e não tem opções fáceis para se chegar até lá.
49
❖ Em termos de atividade econômica, o comércio é bastante dinâmico, gerando renda
e emprego. Parte significativa do comércio funciona à noite, atende a comunidade no
retorno do trabalho.
❖ Como dona de comércio, uma participante destacou a crescente dificuldade de
manter seu negócio devido à recusa de fornecedores em entregar no local com seus
caminhões, como costumavam fazer, por causa da violência. Agora, comerciantes tem
que sair da comunidade, aumentando seus custos para obter os produtos que
vendem.
❖ Outra participante descreveu as dificuldades como consumidora, explicando que
juntou dinheiro para comprar um eletrodoméstico nas Casas Bahia, mas descobriu
que eles proíbem a entrega em territórios “como Manguinhos, porque é muito
violento”.
❖ Sobre isso os equipamentos que o PAC construiu, ainda que concentrados, eram
muito importantes e agora estão fechados ou abandonados.
❖ É percebido que o empreendedorismo em Manguinhos e os coletivos são duas
potencialidades muito fortes do território, mas esbarram tanto na violência, quanto
na baixa escolaridade, incentivos e oportunidades.
❖ Sobre a qualidade do ensino sustentam que muitos professores ainda têm didáticas
inadequadas, reclamam, excluem alunos, não tem preparo para realizar o trabalho no
contexto que temos. Começa assim um ciclo negativo, pois muitos, especialmente os
meninos, abandonam a escola, ficam com baixa escolaridade, baixa empregabilidade,
perdem perspectivas e se envolvem na violência.
❖ Discutiram sobre as vulnerabilidades da família e mencionaram a deterioração dos
laços e inversão de papéis. Muitas crianças vulneráveis e desprotegidas, é urgente a
oferta de projetos de desenvolvimento infantil.
O segundo grupo de mulheres adultas focou mais nos equipamentos de saúde, educação e
trabalho:
50
qualidade, gerando a violência porque sobram adolescentes dispostos a entrar para o
tráfico ou pessoas que recorrem à violência para resolver seus problemas na vida.
❖ Os investimentos são descontinuados ou abandonados, são mal feitos ou precários e
são desiguais. As obras do PAC em Manguinhos, apesar de serem recentes já têm
problemas, como no Mandela I que tem enchente direto desde as obras. Ou a Clínica
da Família, que tem um atendimento heterogêneo pelo território.
❖ Gestores e participantes de projetos que estão aqui e não se conheciam, mas são do
mesmo território. Por isso é fundamental o fortalecimento das redes, o difícil é as
instituições darem conta sozinhas. Então os projetos são sempre para poucos, alguns
porque tem poucas vagas mesmo, outros que interessam menos ou que não tem
divulgação adequada.
51
4.- O Índice de Prosperidade de Favelas para Manguinhos: Uma agenda mínima
para a Comunidade
Finalmente, nesta última seção do presente relatório a tarefa central de tecer considerações
que permitam desenhar a proposta do IPF. Até aqui, este documento, fez uma proposta ao leitor de
contextualizar o estado da arte sobre indicadores sintéticos, mostrando os elementos centrais que
delineiam os avanços e inovações não apenas técnicas, mas principalmente conceituais para superar
os desafios que se colocam desde inícios do século anterior na mensuração quantitativa dos
fenômenos na área social (Introdução). O objetivo central, dessa primeira seção, consistiu em mostrar
que é possível aproveitar as virtudes de esforços anteriores neste campo dos índices sintéticos para o
IPF.
Somente com essa discussão previa seria possível situar ao leitor das características
metodológicas do IPF. Características estas que se centram na diferenciação do processo (de baixo
para cima e de dentro para fora); na forma de imersão no território para o qual se pretende contribuir
com os indicadores e dimensões, e; na substantivação do termo Prosperidade através da fixação de
três conceitos: sustentabilidade, interdependência e democracia.
52
fenômenos resilientes de longa data na cidade do Rio de Janeiro e, em particular, nas favelas da
cidade.
Não apenas novas temáticas ou novos desafios surgiram, mas também novas formas de
percepção de como concatenar os fenômenos apresentados pelos moradores. Assim, foi possível
aprender sobre as microdinâmicas políticas e de interação dos moradores, substanciar com um novo
olhar o papel do setor público ou dos desafios que se apresentam para quem tem certeza dos impactos
e consequências de intervenções sociais, culturais e econômicas.
A tarefa que resta por realizar é usar todo o trabalho de campo na construção da proposta do
IPF. Este desafio se desdobra em outros dois objetivos: construir a lógica das dimensões que deverão
constituir o IPF e, posteriormente, propor indicadores para cada dimensão.
Ambas as tarefas têm aspectos técnicos importantes, mas principalmente, no caso do IPF as
“vozes” da comunidade estão no centro deste esforço. Os aspectos técnicos precisam ser discutidos
levando em consideração essas vozes
53
indicadores que serão selecionados e o peso estatístico de cada indicador, encontra-se a de garantir
a relação entre todo o trabalho conceitual prévio e a operacionalização empírica do conceito.
No caso do IPF, o trabalho conceitual teve a articulação de 4 vetores de ação: o primeiro vetor
é a mobilização do estado da arte no que tange a indicadores sociais e o seu posterior desdobramento
em métodos de agregação desses indicadores (índices sintéticos); o segundo é a descrição e
subsequente análise sobre as diferenças entre conceitos como desenvolvimento humano, progresso
social e, finalmente, prosperidade; o terceiro vetor consistiu na escolha e ulterior processo de imersão
em um espaço geográfico com inequívocas características de vulnerabilidade socioeconômica, neste
caso Manguinhos na cidade do Rio de Janeiro; finalmente, o quarto e último vetor, a implementação
do trabalho de campo que teve por intuito a interação e participação de vários tipos de representações
do território incluindo os próprios moradores na estruturação do IPF.
Importante ressaltar que não existe uma coerência linear entre os vetores acima mencionados
de ordem substantiva. Ou seja, uma linearidade substantiva implicaria que o conhecimento
predominante em termos de índices sintéticos seja totalmente balizado por um conceito de
prosperidade que, por sua vez, não precisaria de imersão em qualquer território (pois a sua validade
empírica é para qualquer espacialização territorial com certas adaptações) nem uma consulta densa
às diferentes representações do território.
a) Ex-ante, o IPF para Manguinhos não será o mesmo para outras comunidades. Nem as
dimensões, os componentes, os pesos relativos e nem os indicadores podem ser definidos
para todas as áreas vulneráveis. A semelhança é uma questão empírica a ser verificada.
Como pesquisadores, temos a expectativa de que existem muitas problemáticas comuns
aos territórios, mas não os mesmos pesos e a mesma estrutura dos componentes. Essa é
a maior limitação de outros índices, eles “encaixam” a realidade específica em um único
esquema pré-definido de dimensões e indicadores. Ganha-se na comparabilidade, mas se
perde muito na utilidade para a comunidade se temos o objetivo de que índices sintéticos
servem para mobilizar e avaliar as iniciativas de política pública.
b) Portanto, a replicabilidade substantiva do IPF é limitada, mas a replicabilidade
metodológica ganha força.
54
explicitaram temas como produtividade, direitos de propriedade, investimentos privados, etc. o que
não significa que a discussão sobre a economia não tenha aparecido.
A Figura 2 incorpora uma visão dinâmica da estrutura incluindo a intensidade nas preferências
e um sequenciamento das dimensões e componentes que devem ser atendidos desde as óticas dos
representantes. Necessário sublinhar que não existe uma única voz orgânica e unânime da
comunidade. Existem várias percepções sobre a prosperidade, diversidade na intensidade das
preferências, urgências diferentes para a resolução de problemas e concatenamentos causais muito
heterogêneos entre as dimensões. Se às vozes da comunidade se agrega a visão do conhecimento
institucionalizado então a polissemia é ainda mais radicalizada. A Figura 2 pretende expressar todas
essas diversidades de forma dinâmica.
55
Figura 1: Dimensões e componentes do Índice de Prosperidade de
Favelas (IPF) – Manguinhos - 2017
O que foi explícito nas falas foi a necessidade de equipamentos (manutenção dos mesmos,
recuperação de espaços e equipamentos desativados, a reabertura da Biblioteca Parque ocupada para
evitar seu fechamento durante a realização do trabalho de campo, a criação de espaços públicos para
esta área como forma de ocupação para evitar criminalidade e vandalismo). Também se afirmou a
necessidade do fortalecimento e implementação de projetos nesta dimensão seja com parcerias, seja
com o apoio do governo estadual e/ ou municipal.
56
podemos ter a certeza que neste campo seriam realizados enormes progressos em Manguinhos.
Mesmo que pareça ser uma visão minimalista da dimensão, existência de projetos e equipamentos de
qualidade, as lideranças expressaram como serem relevantes. Naturalmente, que esses dois objetivos
gerariam outros efeitos de spillover para outros componentes de outras dimensões, mas a
quantificação desses efeitos somente pode ser realizada se temos a certeza de que equipamentos e
projetos nesta área existem em número suficiente.
Mais uma vez, não estamos negando a relação estreita entre Regularização fundiária e a
moradia, mas esta é uma relação conceitual e analítica totalmente legítima e válida que nas óticas da
comunidade funciona com implicações diferentes.
Contudo, muito pouco se sabe sobre as características destas instituições, seu tamanho, suas
áreas de atuação ou a sua capilaridade, portanto, é muito difícil organizar a ação coletiva. Os próprios
atores chave ficam frequentemente surpreendidos com a quantidade de atores que surgem nos
diversos fóruns. Outra questão importante diz respeito a superposição de agendas, fato que
fragmenta e torna ineficaz a representação. A necessidade de enxergar a governança e a sua qualidade
em vários aspectos não é somente consensual, mas foi uma das primeiras percepções da equipe de
pesquisa.
57
de fragmentação e superposição de iniciativas, de falta de recursos de todo tipo, de desgaste e
cansaço pela quantidade de agendas o que gera pouca credibilidade e ceticismo da eficácia da
cooperação.
Instituições e voluntariado são dois ativos que se articulados numa governança inclusiva e
participativa deve se refletir no aumento da capilaridade e do funcionamento adequado das redes.
Assim, o ideal neste campo é que governança e resiliência aumentam o protagonismo da comunidade,
diminuem a eficácia de agentes predatórios que se aproveitam das condições de vulnerabilidade.
Finalmente, a dimensão da Segurança pública surge com três componentes que caracterizam
muito fortemente o momento que Manguinhos e outras favelas do Rio de Janeiro atravessam hoje.
Entre todas as dimensões propostas para o IPF, pela natureza dos componentes, talvez esta seja a que
contém um caráter eminentemente finalístico. Os três componentes são aqueles que os moradores
querem para o seu território: fim da violência, diminuição das diversas formas de criminalidade, todo
dentro do mais amplo respeito dos direitos humanos. Aqui, a população de Manguinhos quer
resultados imediatos e está ciente que a violência e criminalidade tem consequências negativas nas
outras dimensões: afetam o funcionamento das escolas e, portanto, a qualidade da educação,
interfere nas atividades econômicas do território, na mobilidade, na empregabilidade, nas condições
de saúde das famílias, na interrupção do fornecimento de serviços, nos quadros de depressão e no
futuro da juventude.
Índices sintéticos em geral, priorizam os temas dando peso relativo a cada indicador dentro
de cada dimensão. Isto pode ser feito de variadas formas metodológicas (agregação aritmética,
geométrica, análise de componentes, análise fatorial, etc.), mas estas também são estáticas e
58
somente são modificadas a partir dos resultados de cada indicador e de processo de reformulação dos
índices que frequentemente são realizados após de atingir estágios que são captados pelos próprios
indicadores. A questão problemática, desde a nossa ótica, é que índices sintéticos pouco ajudam na
priorização de temas na tomada de decisões durante o processo de implementação. Mais uma vez,
porque para tomar decisões precisamos obter resultados (ex-post) para saber que rumos precisam
ser corrigidos ou se podemos priorizar outra dimensão.
Esse foi exercício que tentou-se realizar aqui como complemento à visão estática da estrutura
do IPF para Manguinhos. Devemos alertar que é um exercício ou, melhor dizer, um ensaio para
incorporar dinamismo ao índice. Para dar dinâmica três elementos devem ser incorporados na
estrutura:
a) O sentido de urgência dos atores frente aos problemas e desafios. Urgência que definiria
que ações tomamos primeiro e sem as quais o resto ficaria inviável.
b) A intensidade das preferências dos atores para solucionar as questões. Atores têm
preferencias por atacar um problema mais do que outros. No entanto, alguns expressam
diferentes intensidades: Por exemplo, a maioria considera que os problemas do comércio
deveriam ser solucionados, mas se mobilizam com maior intensidade no caso de escolas
fecharem por causa das operações policiais.
c) Da mesma forma que todos os indicadores sintéticos os resultados dos indicadores
também devem ser levados em consideração.
59
metodologia de painel é possível obter resultados interessantes a partir do trabalho de campo
realizado com os membros da comunidade e com os especialistas.
Se não fosse por este último fator dificilmente o IPF para Manguinhos seria útil para a base
programática do território.
60
Dentro de cada dimensão, também existe um ordenamento proposto: Articulação e
Instituições em primeiro lugar e depois fortalecimento de redes e voluntariado. No caso da Segurança
pública, primeiro o reestabelecimento dos direitos da população e em sequência o combate à
criminalidade e redução da violência. Note-se, que tanto no caso da Segurança pública, quanto da
Governança o tamanho dos componentes (intensidades das preferências) não incidiu na sequência
(urgência):
Pode-se afirmar que as opiniões vertidas dos membros da comunidade e dos especialistas são
muito consistentes com os resultados da Figura 2. Outros testes realizados mostraram que esta
metodologia não estabelece comparação apenas dentro de cada dimensão, mas também entre os
outros componentes de outras dimensões, permitindo assim a mudança de posicionamento das
dimensões.
Antes de passar a próxima subseção, onde se explicita os indicadores para cada componente,
é importante sublinhar que o exercício ensaiado se encontra em fase de testes. Implica que as
informações coletadas para o painel proveem de um momento específico no tempo, com atores
determinados. Mesmo que realizemos um novo exercício com os mesmos atores, temos a expectativa
de que operariam mudanças no painel devido a percepção diferente dos atores do contexto que hoje
mudou (por exemplo, a diminuição da violência). Precisamente, era esse o efeito desejado: o
dinamismo do IPF de Manguinhos.
Assim, a arquitetura do IPF para Manguinhos, foi pensada para atender dois grandes objetivos:
61
4.2.- Proposta de Indicadores por tema
Na série de Tabelas 4-9, apresentam-se os indicadores para cada uma das seis dimensões,
propostas e os componentes de cada uma delas. Importante realizar alguns comentários que
permitam contextualizar ao leitor. Em primeiro lugar, o total de indicadores para as seis dimensões e
23 componentes é de 81 indicadores. Sendo que decidiu-se complementar o sistema de indicadores
com mais 24 indicadores.
Assim, em cada Tabela se colocaram os indicadores que compõem o IPF para Manguinhos
(fundo azul claro) e os indicadores complementares (fundo branco). Outra informação relevante é que
em cada Tabela se explicita o tipo de fonte que deverá ser mobilizada para obter a informação,
primária ou secundária. No caso da informação primária, ela surge porque não existem dados
secundários disponíveis ou não cumprem os requisitos de estabilidade, periodicidade,
representatividade e abrangência no nível intra-municipal ou para áreas subnormais (favelas na
metodologia do IBGE).
Obter a informação a partir de dados secundários foi uma prioridade da pesquisa, já que o
custo é várias vezes inferior às fontes de dados primárias. Estas últimas requerem de:
Um outro tipo de ação é iniciar um processo de consulta com a comunidade e com alguns
especialistas com dois objetivos bastantes distintos: Com a comunidade, para captar preferências do
que é possível eliminar. No entanto, se deve ter muito cuidado de fazer um trabalho preliminar de
empoderamento para evitar decisões decorrentes da falta de informação.
No caso dos especialistas, o objetivo é resolver possíveis superposições técnicas para que
possam ser eliminadas e, portanto, reduzir o número de indicadores. Para este exercício é necessário
que sejam elaborados os instrumentos de coleta e complementar a análise com os instrumentos de
coleta das fontes secundárias. O trabalho aqui consistiria em fazer uma cuidadosa revisão das
perguntas que seriam incluídas nos questionários.
Em relação aos instrumentos de coleta, ressaltar aqui que pelo menos três questionários
precisam ser desenvolvidos para coletar a informação:
62
1) Questionário domiciliar que agregaria por dimensão as perguntas que os responsáveis do
domicílio passariam a responder;
2) Questionário para a Governança e resiliência que poderia ser aplicado às diversas
instituições, e;
3) Questionário para ser aplicado nas instituições públicas com o intuito de coletar
informação sobre os serviços que oferecem na comunidade.
As três dimensões acima mencionada são Urbanismo, Bem-estar e Trabalho Renda que
englobam 14 componentes. Esses componentes versam desde questões tais como infraestrutura e
meio ambiente, as três áreas do IDH (saúde, educação e renda), mercado de trabalho e
empreendorismo com uma visão completa do mundo de trabalho, assistência social e variáveis
setoriais sobre a indústria, comércio e serviços.
Os indicadores de cada tabela são autoexplicativas e não precisam mais comentários. Apenas
mencionar que existem alguns de natureza qualitativa, mas totalmente codificáveis em mapas
hierárquicos quantitativos (Ex. Tabela 4 “Missão, objetivos e ações/atividades).
63
Tabela 5: Indicadores do IPF Manguinhos – Segurança Pública
64
Tabela 7: Indicadores do IPF Manguinhos – Bem-estar
65
Tabela 9: Indicadores do IPF Manguinhos – Cultura, lazer e esporte
A mensagem final desta seção, tem relação com o caráter experimental e polêmico dos
indicadores selecionados. Polêmico na medida em que facilmente argumentável que poderiam ser
outras as escolhas, os recortes poderiam ter sido diferentes. O que podemos afirmar neste sentido, é
que o IPF foi pensado para abrir uma discussão sobre o tema, pode mudar sim, pode diminuir ou
aumentar dimensões, componentes e indicadores. Esta é a sua virtude.
Virtude, porque não foi balizado ou fundamentado com argumentos técnicos unicamente, as
vozes da comunidade de Manguinhos foram o eixo norteador e, como toda voz, pode e vai ser
contestada. O que se temos certeza – e não temos medo de ser redundantes – é que muitos ajustes
devem vir de todo o trabalho empírico futuro. É no exercício empírico que poderá se identificar e
consolidar o IPF para Manguinhos.
Pela mesma razão, a necessidade premente do trabalho empírico, é que não nos aventuramos
a propor um método de agregação estatística. Consideramos que essa tarefa é a última etapa do
trabalho empírico.
No entanto, analisando as 6 Tabelas de uma coisa estamos certos: o conjunto da obra oferece
uma compreensão integrada, uma visão holística dos problemas e travas para o desenvolvimento
sustentável de Manguinhos em termos territoriais.
Um conceito de prosperidade para áreas vulneráveis urbanas de grande porte foi engendrado.
Precisamos ser cautos: esta não é uma agenda pública de Manguinhos, não temos
legitimidade para tal, apenas é uma base, uma lista de temas levantados que podem subsidiar às
lideranças.
66
Porém esta base, devido ao fato de estar correlacionada à construção do IPF para
Manguinhos, ela pode imediatamente ser monitorada pelos indicadores quando os mesmos forem
calculados. Em síntese, temos certeza que os temas elencados como prioritários na próxima subseção,
podem ser objeto de acompanhamento pelo IPF e que a satisfação e superação das demandas e
desafios colocados na agenda terão impacto no IPF para Manguinhos.
A segunda atividade, levantou um debate por temas para captar os principais desafios que as
vozes da comunidade consideram que devem ser superados. Este material passou por alguns filtros
em termos de deixa-lo consistente com todo o trabalho realizado para elaborar a proposta do IPF para
Manguinhos com suas dimensões e componentes. Assim, os resultados mais importantes serão
apresentados a seguir.
As lideranças do território são ignoradas ou não atendidas pelos agentes e órgãos públicos,
por isso a importância da representação institucional e sua legitimidade reconhecida diante do poder
público.
67
à toda a precarização da vida dos moradores, como cidadãos, que são tratados “à base
de força e poder, pois de fato não vivemos numa democracia”.
5) Sobre a participação nas políticas públicas e decisões sobre o território, foi enfatizado
que estas relações sempre apresentam condições impositivas, em detrimento de
apoio e escuta ativa. Neste contexto, foram relatadas como as relações com agentes
públicos – médicos, policiais, assistentes, pessoas que ocupam posições de poder –
são frequentemente autoritárias e punitivas, na medida em que reclamações,
questionamentos ou discordâncias geram retaliações no atendimento que recebem.
6) O tema da segurança, formulado como violência e insegurança, devido à situação de
conflito conflagrado em Manguinhos, permeou toda a oficina. Neste sentido, a
violência é tratada tanto como a questão mais urgente e prioritária, quanto o
problema para o qual não vislumbram solução prática viável, além de também
representar o principal impeditivo do desenvolvimento de demais áreas da vida na
comunidade, como educação, saúde, trabalho e renda, empreendedorismo,
urbanismo e serviços básicos.
7) Como consequência da “insegurança constante” em Manguinhos, os moradores
relataram diversos problemas, desde a interrupção do funcionamento dos Correios,
que tem uma central e depósito dentro do território, a dificuldade de encontrar
empregos, entregas de bens e eletrônicos, até questões como problemas de saúde
mental (pânico, paranoia, medo constante, exaustão, baixa autoestima, depressão) e
física (mortes e lesões violentas).
8) Um tema central nesta área, é o acesso à justiça e falta de canais de resolução de
conflitos e defesa de direitos, tanto entre moradores, quanto frente às empresas
privadas, concessionárias e ao próprio Estado, como abusos de poder policial ou
mesmo violências sofridas dentro ou fora do território, pois muitos moradores de
favelas não fazem denúncias formais à polícia por descrença e/ou para não sofrer
preconceito ou retaliação deles. Falta de amparo e assistência neste campo geral.
68
11) O fechamento da Biblioteca Parque causou uma perda enorme na dinâmica cultural
no território, perdeu-se acesso ao cinema, computadores com internet, livros e
revistas, outros materiais e a sociabilidade. Gerava uma série de benefícios, atividades
culturais, um espaço de lazer seguro, de qualidade. Havia um cadastro de
frequentadores (base de dados rica mal gerida e subaproveitada pelo Estado em
geral). O objetivo principal de investimentos públicos na Cultura e Lazer, segundo o
grupo, deveria ser dar suporte financeiro e técnico às iniciativas de interesse ou
execução local, e garantir a sustentabilidade dos equipamentos com emprego de
recursos para sua contínua utilização.
12) Significação da cultura como espaço ainda livre, democrático e próprio da sociedade
civil para expressão social local com a retratação e discussão de temas pertinentes.
13) Outra questão que surgiu atrelada ao tema do esporte foi a demanda por espaços que
também servem para o lazer, a sociabilidade e a cultura como praças públicas,
quadras poliesportivas e lugares para desenvolver e melhorar a qualidade a vida e
perspectivas de crianças, adolescentes, idosos, e adultos também.
14) O setor da cultura pode ter interfaces com trabalho e empreendedorismo em relação
à empregabilidade, desenvolvimento de capacidades, aquisição de conhecimentos
úteis.
15) O investimento nos equipamentos deve ser contínuo e estruturante, no sentido de
criar estabilidade e qualificação para profissionais e alunos atendidos. Fortalecimento
de rede das escolas com espaços culturais, mobilização de agendas e grupos locais
que mantenham compromisso social com esses espaços educacionais. Existem sim
saques da população e de grupos criminosos à bens públicos, mas porque não são
construídos de forma integrada, são locais que não tem respaldo cultural por trás que
gere uma valorização por parte da comunidade em geral, com exceções como a
Biblioteca.
16) Preocupação com efeitos de reformas trabalhistas que gerem desincentivos para
o trabalho formal, uma vez que este é o que gera maior estabilidade para pessoas
vulneráveis. A maior parte da população de Manguinhos e outras favelas não tem
acesso ou qualificação suficiente para o trabalho formal, problemas com
educação de base, desenvolvimento de interesses e aptidões profissionais.
Desqualificação da educação para populações pobres, com profissionais
despreparados e desmotivados, que reproduzem padrões de exclusão.
17) Barreiras ao trabalho: preconceito pelo local de moradia, violência impeditiva do
ir e vir para o trabalho, educação de má qualidade e alto índice de evasão e falta
de incentivos e oportunidades profissionais ao longo da vida.
18) Trabalho e empreendedorismo atrelados à assistência social, onde foram
mencionadas a Clínica da Família (saúde) e a Casa do Trabalhador
(encaminhamento para empregos). Destacou-se que “não atendem a
69
comunidade toda, mas têm o potencial de funcionar. Seria necessário a ampliação
da atuação desses pontos, divulgação e sistematização do que oferecem. Podia
ter um centro eficiente que distribuísse e encaminhasse os cidadãos para todos
os setores públicos, acompanhamento familiar da comunidade”.
19) Empreendedorismo comunitário e economia solidária foram temas trazidos pelos
frequentadores e coordenadores de atividades na Casa do Trabalhador. “A cultura
do morador em não reconhecer as iniciativas e comércios locais, dificulta. Não
percebemos o potencial criativo e não dispomos de parceiros e projetos
estruturantes e permanentes que apoiem o desenvolvimento de atividades
econômicas locais”.
20) Comentando sobre a economia local e valorização dos negócios locais, uma
participante apontou que é difícil ainda porque o empreendedorismo em
Manguinhos começou a ter maior movimento a partir de 2008 com o influxo de
investimentos do PAC, da UPP, outras coisas. Em 2010, entraram com a UPP de
fato, e isso deu um empurrão empreendedor com alguns projetos que vieram
juntos. Deu exemplo pessoal, de que até projetos chegarem ao território não tinha
pensado que poderia gerar renda com coisas que produzia de artesanato.
70
26) Destacaram a demanda por uma Casa da Mulher como um espaço específico de
atendimento para tratar dos direitos da mulher, oportunidades de trabalho
formal e amparo para violências, dificuldades familiares e encaminhamentos. Para
valorizar o papel da mulher na comunidade e retornar com as atividades
fundamentais para o bem-estar e autoestima das moradoras de Manguinhos, “a
Casa da Mulher é importante porque funciona focada para assuntos específicos
deste grupo mais vulnerável”.
27) Sobre saúde, os moradores se mostraram preocupados com a falta de
informações, divulgação e conscientização sobre temas desta área, que julgam de
extrema importância. Entre os assuntos com poucas informações e graves
consequências, foi destacada a sexualidade
28) O tema da saúde também apareceu correlacionado com o saneamento e outros
serviços como a coleta de resíduos sólidos. Ambos, segundo os moradores, são
falhos, sendo o primeiro superestimado pelo Censo e de baixíssima qualidade,
sem tratamento correto e muitos esgotos clandestinos, enquanto o segundo, feito
oficialmente pela Comlurb, teria piorado após o encerramento do projeto Gari
Comunitário, que cumpria esta função antes.
29) Prevenção de problemas de saúde e impactos positivos nesta área também foram
mencionados como benefícios da oferta de esporte, lazer e cultura de qualidade
na comunidade.
71
34) Os moradores indicaram a Refinaria de Manguinhos como ponto de poluição e
degradação ambiental. Rios canalizados ou não estão muito degradados.
Agravante consiste em que esses rios cortam o território e, portanto, eles
constituem um foco de problemas de saúde e meio ambiente para a população.
Os 34 pontos até aqui descritos, são o resultado da interação com representantes e moradores
da comunidade de Manguinhos. Os mesmos não constituem uma Agenda Programática de
Desenvolvimento Sustentável (APDS-Manguinhos) completa, mas os insumos suficientes que
expressam a vontade e a visão sobre os problemas e travas que precisam ser removidas para trilhar o
caminho do desenvolvimento do território.
a) Desafio técnico: A partir dos 34 pontos é necessário estabelecer uma linha-base, definir
metas (curto, médio e longo prazo), desenhar as atividades necessárias e o cronograma
para a resolução das travas mencionadas. O IPF Manguinhos é a ferramenta central para
este desafio técnico, ainda que o desenvolvimento do IPF ainda precisa cumprir outras
etapas para o seu pleno funcionamento.
b) Desafio de inclusão: A inclusão de outros atores na comunidade de Manguinhos é uma
necessidade urgente para o empoderamento da comunidade em torno desta agenda. Essa
inclusão não é apenas para obter maior consenso e apoio político-institucional, a mesma
tem um papel estruturante na medida em que o consenso eficaz se alcança distribuindo
atribuições e funções a todos os participantes. Com certeza, esse processo de inclusão
alterará a agenda de forma substantiva no sentido em que outros temas serão
considerados e reformulados. Finalmente, o processo de inclusão precisa de uma
governança estruturada que permita a participação institucional, mas principalmente
territorial devido à extensão geográfica de Manguinhos.
c) Desafio de pactuação com atores externos ao território: Superados os dois desafios
anteriores, a pactuação com o poder público em todas as suas instâncias (federal, estadual
e municipal), com outras organizações relevantes e com o setor privado permitirá
transformar a agenda em plano de ações que inclui o financiamento. Naturalmente, que
a pactuação implica em negociação e, portanto, a agenda pode experimentar alterações.
Porém, o elemento central nesta pactuação é manter os canais de comunicação fluidos
com os atores no território ao longo de todo o processo.
Os desafios acima colocados, os temas que servem como insumo para a construção de agenda
programática de desenvolvimento sustentável de Manguinhos e a proposta do IPF para o território
compõem um conjunto de vetores que podem vir a ser trabalhados não apenas para Manguinhos,
mas também para outros territórios urbanos vulneráveis.
72
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