Sumrio

Introduo e plano de curso p. 1

Perfil Biogrfico - Canhoto p. 2

1a Parte: O Choro e sua rvore genealgica p. 4

2a Parte: O Choro e seus gneros musicais p. 19

Exemplo musical 1 CHORO p. 19

O CHORO Histria p. 19

Exemplo musical 2 POLCA p. 20

A POLCA Histria p. 21

Exemplo musical 3 LUNDU p. 21

O LUNDU Histria p. 22

Exemplo musical 4 TANGO-HABANERA p. 22

Exemplo musical 5 TANGO BRASILEIRO p. 23

O TANGO BRASILEIRO Histria p. 24

Exemplo musical 6 MAXIXE p. 24

O MAXIXE Histria p. 25

Exemplo musical 7 SCHOTTISCH p. 26

O SCHOTTISCH Histria p. 27

Exemplo musical 8 VALSA BRASILEIRA p. 27

VALSA BRASILEIRA Histria p. 28

Exemplo musical 9 QUADRILHA p. 28

A QUADRILHA Histria p. 29

Exemplo musical 10 CHORO-SAMBA p. 30

O CHORO-SAMBA e O SAMBA-CHORO Histria p. 31

BIBLIOGRAFIA PARA O ESTUDO DO CHORO p. 32

0
 Introduo e plano de curso

Em sua quarta edio, o Festival Nacional de Choro de 2008 vem consolidar cada vez
mais a importncia e a fora de um dos mais importantes gneros populares urbanos do
Brasil. Como dito na apostila do Festival de 2007, a histria do choro rica e complexa,
e ainda est, em grande parte, por ser escrita, apesar do esforo de grandes
pesquisadores do passado.

por este motivo que a cada ano procuramos refundir e ampliar o curso de Histria do
Choro do Festival, apresentando novos enfoques e resultados de uma pesquisa que est
continuamente em andamento. Tal como nos anos anteriores, o curso tem como objetivo
principal apresentar um panorama geral da Histria do Choro, tendo como foco
principal os seus aspectos musicais. De fato, quando se analisa a bibliografia existente a
respeito de choro, verifica-se que normalmente aspectos sociais e histricos ganham
muito mais relevo do que os aspectos musicais, visto que na maioria das vezes estes
estudos so publicados por no msicos. Nos ltimos anos, no entanto, esta situao
vem se revertendo graas ao trabalho de pesquisadores que so eles mesmos msicos de
choro, o que permite que tenham outra viso sobre o assunto.

Por isso, pretendemos durante este curso realizar um trabalho calcado na anlise
musical dos diferentes gneros que compe o choro (polca, valsa, maxixe, schottisch,
quadrilha, lundu etc). claro que tambm sero abordados aspectos histricos e sociais,
mas tendo sempre a msica como referncia primordial. Temas como o papel dos
acervos de partituras dos primeiros chores, a importncia das levadas
(acompanhamentos rtmico-harmnicos), o improviso e o contraponto no choro, dentre
muitos outros, sero relacionados com as diferentes geraes e os diferentes perodos do
choro. Tudo isso com farto material discogrfico e iconogrfico a ser apresentado
durante o curso.

A apostila deste ano est dividida em trs partes. Na primeira parte voc encontrar uma
breve biografia do homenageado do ano: Waldiro Tramontano, o Canhoto do
Cavaquinho. Na segunda parte apresentamos um artigo da professora Anna Paes,
intitulado O Choro e sua rvore Genealgica que traz uma sntese histrica das diversas
geraes do choro. Finalmente, na terceira parte, apresentamos pequenos resumos sobre
os j mencionados gneros conformadores do choro, apenas como forma de roteiro
do que ser desenvolvido em aula. Esta seo foi revista e ampliada a partir do material
apresentado nos anos anteriores. Ao final da apostila h uma bibliografia que servir
como referncia para aqueles que desejarem se aprofundar em temas especficos.

Como nas edies anteriores, o curso de Histria do Choro se apresenta ainda como
uma rara oportunidade de troca de experincias, resultados de pesquisa e formulao de
projetos, por reunir msicos e pesquisadores de todo o pas. Esperamos que mais uma
vez o curso seja uma experincia frutfera e proveitosa para todos.

Anna Paes e Pedro Arago

1
 Canhoto Waldiro Frederico Tramontano

Um dos mais importantes instrumentistas de choro de todos os tempos, Canhoto nasceu

a 9 de agosto de 1908 na rua So Clemente, bairro de Botafogo, Rio de Janeiro.
Comeou a tocar o cavaquinho ainda bastante jovem, tomando parte, desde os seus 8
anos de idade, em numerosas reunies festivas integrando diversos conjuntos que iam
exibir-se rua General Polidoro. Segunda informao que consta em seu prprio
arquivo pessoal, Canhoto foi aluno de Galdino Barreto, um dos mais clebres
cavaquinhistas do incio do sculo XX, e que havia sido tambm mestre de Mrio
lvares da Conceio, o famoso Mrio Cavaquinho.
Ainda segundo apontamentos de seu arquivo pessoal em 1928, trabalhando na Sade
Pblica, veio a conhecer uma pessoa de nome Benjamim, amizade esta que lhe
propiciou inmeras oportunidades para freqentar bailes em companhia do mesmo, que
era excelente trombonista. Tocando certa vez em casa de Alfredinho Flautim, que fazia
parte do conjunto de Pixinguinha, fez camaradagem com o violonista Gorgulho,
integrante do grupo instrumental de Benedito Lacerda. Tomando contato com Benedito
Lacerda, Canhoto logo convidado por ele a integrar o famoso grupo Gente do Morro,
criado no incio da dcada de 1930. Alm de Canhoto e Benedito, faziam parte do
conjunto Russo do Pandeiro, Macrino, Bernardo e Doidinho. Este grupo foi o
responsvel por algumas das primeiras gravaes de sambas do Estcio, interpretados
por Francisco Alves.
Pouco tempo depois o grupo desfeito, para dar lugar ao famoso Conjunto Regional de
Benedito Lacerda. Em sua formao inicial o conjunto tinha o prprio Benedito,
Gorgulho (Jaci Pereira) e Ney Orestes aos violes, Canhoto, e Russo do Pandeiro. O
grupo sofreria algumas substituies at chegar a formao clssica, com Dino e

2
Meira aos violes, Canhoto ao cavaquinho e Popeye ao pandeiro. O Conjunto de
Benedito Lacerda que frequentemente assinava como Bomios da Cidade, quando
gravava em gravadoras das quais no era exclusivo acompanhou com alguns dos
mais importantes intrpretes da poca como Orlando Silva, Silvio Caldas, Carmen
Miranda, entre outros.
Em 1940 o conjunto realiza algumas das mais importantes gravaes de choro de todos
os tempos: com a participao de Pixinguinha ao sax-tenor seriam gravados clssicos
como Proezas de Slon, Naquele Tempo, Descendo a Serra, entre muitos outros, em
gravaes que constituem at hoje uma referncia obrigatria para todos aqueles que
estudam o gnero.
Em 1950, com a sada de Benedito Lacerda, Canhoto assume a liderana do conjunto,
que passa a se denominar Regional do Canhoto, e conta com a participao de Altamiro
Carrilho na flauta (algum tempo depois o conjunto ganharia o reforo de Orlando
Silveira ao acordeom). Contratado pela Rdio Mayrink Veiga o regional faz enorme
sucesso, gravando diversos discos pela Victor. Entre as msicas gravadas estavam
diversos choros de Altamiro Carrilho (Canarinho Teimoso, Enigmtico), Orlando
Silveira (Romntico), Guio do Morais (Pitoresco), e do prprio Canhoto (Gingando, em
parceria com Dino). Em 1957 Altamiro Carrilho sai do grupo sendo substitudo por
Carlos Poyares: o grupo continua atuando na rdio at o incio da dcada de 1960.
Na dcada de 1970, Canhoto ainda participaria, com Dino e Meira, de diversas
gravaes de msica popular: pode-se destacar, por exemplo, o primeiro disco de
Cartola, lanado pela gravadora Marcus Pereira em 1974, que contou com este trio de
msicos.

3
 1 Parte: O Choro e sua rvore Genealgica

At pouco tempo atrs, o choro, principal gnero de msica instrumental

brasileira, era estigmatizado como uma msica de gente velha, repetitiva, cristalizada no
tempo, que nunca se renovava. Houve um perodo em que o repertrio do choro parecia
se esgotar nos mesmos clssicos Noites Cariocas, Brasileirinho, Pedacinhos do Cu,
Lamentos, Naquele Tempo, Carinhoso, Tico-Tico no Fub, Brejeiro, Odeon, Flor
Amorosa, em arranjos para a tradicional formao regional: violes, cavaquinho e
pandeiro; e um ou dois instrumentos solistas. Mas qualquer pessoa que aceitar a
aventura de percorrer a trajetria desse gnero desde a sua origem aos dias de hoje
perceber o quo superficial foi essa viso.
to flagrante a ampliao do cenrio do choro que hoje em dia dificilmente
seria possvel se taxar o gnero como passadista. O choro vem atraindo um nmero cada
vez maior de jovens msicos que vem no gnero a escola ideal para sua formao;
programas de rdio com repertrio de choro vo ao ar com maior freqncia; cursos e
oficinas de choro so organizados em vrias cidades; as universidades, que durante
muito tempo estiveram alheias nossa msica popular, acolhem o choro em seus cursos
de msica; diversas teses acadmicas vm sendo feitas, no s no Brasil como no
exterior, tendo o choro como objeto de estudo; msicos de extraordinrio talento vm
surgindo e lanando no mercado CDs de choro de excelente qualidade, muitos deles
com repertrio autoral. Percebe-se claramente que o choro vive um momento de grande
fertilidade, mas a que fato podemos atribuir essa guinada?
Para responder a essa pergunta necessrio nos voltarmos para o fato histrico
que foi o encontro do maestro Radams Gnattali (RS, 1906-1988) com uma nova
gerao de msicos de choro que despontava no final da dcada de 70. O grupo de
msicos que constituiu a primeira formao da Camerata Carioca: o bandolinista Joel
Nascimento, a cavaquinista Luciana Rabello, os violonistas Raphael Rabello, Mauricio
Carrilho, Luiz Otvio Braga, e o pandeirista Celsinho Silva; alm dos violonistas Sergio
e Odair Assad, que formariam o clebre Duo Assad, so alguns dos jovens que tiveram
a sorte de conviver e usufruir dos ensinamentos desse grande mestre, que nessa fase da
vida, j acumulava 50 anos de carreira.

4
 Radams foi pea chave para abertura de uma nova perspectiva no universo do
choro, transpondo a barreira entre a msica popular e a msica erudita. Pianista
virtuoso, compositor prolfico de peas eruditas e populares, Radams atuou ao lado de
Pixinguinha como o principal arranjador de grande parte das gravaes do nosso
cancioneiro a partir da dcada de 30. Sua Sute Retratos (que homenageia quatro
mestres do choro: Pixinguinha, Anacleto de Medeiros, Ernesto Nazareth e Chiquinha
Gonzaga), uma pea de concerto para bandolim, regional de choro e orquestra de
cordas, dedicada Jacob do Bandolim e gravada originalmente por ele, foi um divisor
de guas na histria da msica popular brasileira. Pela primeira vez um compositor
brasileiro compunha uma pea que integrava a linguagem e a instrumentao do choro
msica de concerto. Na verso de Retratos dedicada a Joel Nascimento, para bandolim,
3 violes (sendo um de sete cordas), cavaquinho e pandeiro, o conjunto regional passou
a funcionar como um conjunto de cmara, com as funes de solista e acompanhante se
alternando entre os intrumentos, explorando novos timbres e formas de harmonizao.
A Camerata Carioca apresentou a Sute Retratos em 1979, no famoso espetculo
Tributo a Jacob do Bandolim, e deslanchou na dcada de 80, em outros trabalhos
inovadores como o espetculo dirigido por Hermnio Bello de Carvalho,Vivaldi e
Pixinguinha, revelando o ponto em comum entre o choro e a msica barroca atravs da
arte do contraponto. A partir do exemplo da Camerata, novos grupos surgiram com a
certeza de que pra se tocar choro no era necessrio repetir os mesmos clssicos do
repertrio do gnero, nem reproduzir os mesmos arranjos ou a mesma instrumentao
tradicional.
Mas talvez o maior ensinamento de Radams tenha sido a sua reverncia aos
grandes mestres, o exemplo da sua postura em acreditar que a renovao de um gnero
s possvel a partir de um profundo conhecimento das suas razes. Postura igualmente
defendida por Villa-Lobos na gerao anterior.
Seguindo esse princpio, dez anos aps a morte de Radams, um de seus
discpulos, Mauricio Carrilho, empreende uma pesquisa com apoio do Programa de
Bolsas da Fundao Rio-Arte: Inventrio do Repertrio do Choro (1870 1920), com
intuito de preencher uma enorme lacuna de conhecimento do repertrio das origens do
choro. Realizei essa pesquisa em parceria com Mauricio, e reunimos mais de 6.000
obras em partituras manuscritas e editadas, de cerca de 1.300 compositores nascidos no

5
sculo XIX. Com base nesse material, reunido e catalogado, vrias gravaes
contemporneas puderam ser feitas, lanadas a partir de 2002 pela primeira gravadora
especializada em choro, a Acari Records, criada por Mauricio Carrilho e Luciana
Rabello. Ao mesmo tempo em que eram lanados esses CDs, passvamos a ter acesso
ao precioso acervo de discos de 78 rpm de Humberto Franceschi, recentemente
digitalizado e incorporado ao Centro Petrobras de Referncia da Msica Brasileira,
contendo grande parte da produo fonogrfica realizada no Brasil nas primeiras
dcadas do sculo XX.
O retorno desse repertrio aos dias de hoje, na forma de gravaes originais ou
atravs da sua vivncia em releituras contemporneas, permitiu que msicos de longa
carreira profissional no cenrio do choro como o bandolinista Pedro Amorim; o
pandeirista Celsinho Silva; o clarinetista e saxofonista Proveta (Nailor Azevedo); os
flautistas Toninho Carrasqueira e Marcelo Bernardes; o pianista Cristovo Bastos;
Luciana Rabello, Mauricio Carrilho, entre outros que participaram das gravaes
ampliassem o seu entendimento sobre a diversidade de gneros que compem o
universo do choro.
Esse conhecimento passou a ser transmitido no Rio de Janeiro a partir do ano
2000, poca da fundao da Escola Porttil de Msica, e passou a servir como fonte de
inspirao para criao de novas composies entre alunos e professores, fato que vem
acontecendo at os dias de hoje.
Essa pesquisa tambm permitiu que comessemos a delinear a rvore
genealgica do choro a partir de uma perspectiva musical e no apenas histrica. Duas
figuras centrais contribuiram para o delineamento dessa rvore: a primeira delas foi
Alexandre Gonalves Pinto, violonista, cavaquinista e carteiro, nascido no Rio de
Janeiro da segunda metade do sculo XIX. Conhecido pelo apelido de Animal,
Gonalves Pinto foi o primeiro msico a nos oferecer como legado seu livro de
memrias, O Choro -reminiscncias dos chores antigos, editado em 1936, j no final
da sua vida, onde relaciona mais de 460 personalidades das primeiras geraes do choro
em pequenas biografias, relatando aspectos musicais e sociais em histrias
divertidssimas testemunhadas por ele, e vividas entre os chores na virada do sculo
XIX para o sculo XX. Esse livro, segundo muitos musiclogos, tornou-se a principal
referncia bibliogrfica sobre o choro. A segunda figura central foi o jornalista, crtico e

6
musiclogo carioca Ary Vasconcelos (1926-2003), um dos mais importantes estudiosos
da msica popular brasileira. Vasconcelos foi o primeiro pesquisador a fazer uma
anlise da histria do choro em geraes e a iniciar um inventrio do seu repertrio a
partir da sua coleo de discos de 78 rpm.
Seguindo os passos desses grandes mestres, comeo ento a mapear a rvore
genealgica do choro de forma panormica, com intuito de ressaltar as caractersticas
principais de cada gerao, destacando seus principais expoentes. Nesse ensaio esto
focalizadas apenas seis geraes, visto que a trajetria das que surgiram a partir da
dcada de 1980 ainda est em desenvolvimento. O critrio utilizado aqui para
classificao de expoentes dentro de uma determinada gerao considera no s a poca
de nascimento mas tambm a representatividade da sua produo musical num perodo
especfico da histria do choro.

A primeira gerao
O choro nasce no Rio de Janeiro, na segunda metade do sculo XIX, quando
msicos brasileiros comeam a se organizar em grupos instrumentais compostos por
flauta, cavaquinho e violo, e passam a interpretar as danas europias introduzindo
elementos rtmicos do batuque e do lundu, provenientes da cultura dos escravos
africanos. O choro nessa poca ainda no designava um gnero e sim o grupo
instrumental que tocava as danas europias de forma particular. At ento esses
gneros importados, entre eles a polca, a quadrilha, o schottisch, o pas-de-quatre, a
valsa, a mazurca, o tango e a habanera, quando tocados por orquestras nos bailes nobres
da cidade, mantinham suas caractersticas originais preservadas. A polca foi o gnero
que mais caiu no gosto popular, tornando-se a principal matriz do choro. Comeam a
surgir edies de partituras com diversas modalidades de polcas (polca-lundu, polca-
tango, polca-maxixe, polca-cateret, polca-chula), revelando o seu processo de
nacionalizao.
Neste perodo merecem destaque os seguintes compositores pioneiros: o flautista
Joaquim Callado (RJ, 1848-1880), msico de grande fama pelo seu virtuosismo, o
primeiro a formar um conjunto de choro; o maestro Henrique Alves de Mesquita (RJ,
1830-1906), muito prestigiado na corte do Rio de Janeiro, autor do primeiro tango
brasileiro, gnero que surgiu como resultado da fuso da polca j nacionalizada com as

7
danas espanholas (zarzuelas, tangos andaluzes e habaneras), em voga na dcada de '60;
a pianista Chiquinha Gonzaga (RJ, 1847-1935), primeira mulher a se profissionalizar
como musicista popular e maestrina, produzindo centenas de msicas nos seus 88 anos
de vida, entre elas vrios clssicos que marcaram a histria da msica popular e do
teatro brasileiro; e o pianista Ernesto Nazareth (RJ, 1863-1934), consolidador do tango
brasileiro, que enriqueceu o repertrio do choro compondo peas de grande sofisticao
harmnica, trazendo para o piano a rtmica das polcas e lundus tocados pelos grupos
instrumentais de choro.
primeira gerao pertencem ainda os flautistas Duque Estrada Meyer (RJ,
1848-1905), Viriato Figueira da Silva (RJ, 1851-1883), Juca Kallut (RJ, 1857-1922),
Pedro Galdino (RJ, 1860?1919), Pedro de Alcntara (RJ, 1866-1929), e o cavaquinista
Galdino Barreto (RJ, 1850-1933?), criador de uma escola de cavaquinho perpetuada por
seus discpulos Mrio lvares (RJ, 1861-1905) e Waldiro Frederico Tramontano, o
Canhoto (RJ, 1908-1987).

A segunda gerao
De 1889, ano da Proclamao da Repblica, at o final da dcada de 20 a fase
em que o choro se consolida como gnero. A abolio dos escravos e os progressos
tecnolgicos provocam mudanas na estrutura da sociedade brasileira. Surge uma classe
social intermediria no Rio de Janeiro, inexistente at ento, de funcionrios pblicos
(carteiros, funcionrios dos telgrafos, da Casa da Moeda, do Arsenal da Marinha, das
estradas de ferro, da Alfndega), que muito ir contribuir para o desenvolvimento do
choro, tocando de forma diletante, nos quintais, nas festas e bailes da cidade.
Esse o perodo em que a formao instrumental dos conjuntos de choro se
amplia, incorporando instrumentos como o clarinete, o oficleide, o trompete, o
trombone e o bombardino, e esse fato se deve em grande parte atuao de um dos
principais mestres do choro: Anacleto de Medeiros (RJ, 1866-1907). Anacleto levou o
choro ao recesso das bandas civis e militares, foi fundador e primeiro mestre da Banda
do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro em 1896, regendo-a em solenidades, festas
pblicas e diante dos primeiros aparelhos de gravao da Casa Edison para registro dos
primeiros discos brasileiros. No repertrio das bandas, o gnero de maior popularidade
nessa poca o maxixe. Surgido inicalmente como uma dana praticada nos bailes

8
populares da Cidade Nova, o maxixe se desenvolveu nas primeiras dcadas do sculo
XX, executado por bandas e orquestras nas sociedades carnavalescas e no teatro de
revista.
Despontaram nessa fase, no mbito das bandas ou ranchos carnavalescos, os
seguintes instrumentistas de sopro: Leandro Santanna (RJ, 1870?-1930?), Raul
Malaguti (RJ, 1880?-1940?), tio do pianista, compositor e arranjador Paulo Malaguti,
dos dias atuais; Jos Silva (Baianinho) (RJ, 1880?-1965?); Manoel Malaquias (RJ,
1870?-1940?); Zumba (Jos Gonalves Jr) (PE, 1889-1974), e Andr Vitor Correia (RJ,
1888-1948) todos clarinetistas, sendo que os dois ltimos tambm foram saxofonistas;
o trombonista lvaro Sandim (RJ, 1862-1922), autor do clssico Flor do Abacate; e os
trompetistas Luiz de Souza (RJ, 1865?-1920) e Casemiro G. Rocha (RJ, 1880-1912). O
primeiro, autor da valsa Cllia, e o segundo, autor da famosa polca Rato Rato.
Pertencem a essa gerao os seguintes mestres compositores: o trompetista
Albertino Pimentel (RJ, 1874-1929), sucessor de Anacleto como regente da Banda do
Corpo de Bombeiros; o oficleidista, trombonista e bombardinista Irineu de Almeida (RJ,
1873-1916), mestre na arte do contraponto e professor de Pixinguinha; o cavaquinista
virtuose Mrio lvares (RJ, 1861-1905), professor de Donga e Pixinguinha; os
violonistas Satyro Bilhar (CE, 1860-1927), Quincas Laranjeiras (PE, 1873-1935) e Joo
Pernambuco (PE, 1883-1947), mestres que contriburam para elevar o reconhecimento
do violo como instrumento solista; Arthur de Souza Nascimento, o Tute (RJ, 1886-
1951), primeiro violonista de 7 cordas da histria do choro, que tambm pertenceu
primeira formao da Banda do Corpo de Bombeiros tocando bombo e prato; o flautista
virtuose Patpio Silva (RJ, 1880-1907), primeiro solista a realizar um registro
fonogrfico no Brasil em 1902; Candinho Silva (RJ, 1879-1960), trombonista da
orquestra do Teatro Municipal, autor de centenas de choros recolhidos em partituras
manuscritas por Jacob do Bandolim. Tambm se insere nesta gerao o maestro Heitor
Villa-Lobos (RJ, 1887-1959), pois embora sua obra pertena ao mbito da msica de
concerto, ela tambm reflete a enorme influncia da linguagem do choro adquirida a
partir do convvio com os principais chores desse tempo em reunies musicais.
a partir da segunda gerao que o choro deixa de ser uma msica restrita ao
Rio de Janeiro, passando a se expandir por vrios estados brasileiros, como podemos
constatar: no Par, na obra de Clemente Ferreira Jnior (1864-1917) e Jos Agostinho

9
da Fonseca (1886-1945); no Maranho, na obra de Adelman Brasil Corra (1884-1947);
no Rio Grande do Norte, na obra de Tonheca Dantas (1870-1940); em Pernambuco, na
obra de Alfredo Gama (1867-1932); em Alagoas, na obra de Misael Domingues (1857-
1932); em So Paulo, na obra de Zequinha de Abreu (1880-1935), Eduardo Souto
(1882-1942) e Marcelo Tupinamb (1889-1953); e no Rio Grande do Sul, na obra de
Octvio Dutra (1884-1937).

A terceira gerao
A terceira gerao do choro marcada pelo incio da influncia norte-americana
na presena de jazz bands e orquestras de salo, a partir do incio da dcada de 20.
nessa fase que desponta o grande Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana Filho) (RJ,
1897-1973), um dos pilares da msica popular brasileira, cuja trajetria como
compositor, instrumentista, regente e orquestrador contribuiu para fixar as bases do
choro contemporneo.
No incio de sua carreira, Pixinguinha criou o conjunto lendrio Os Oito Batutas
com a finalidade de tocar no elegante Cinema Palais, onde tradicionalmente apenas
msicos eruditos se apresentavam. Com a formao instrumental de flauta, violes,
cavaquinho, bandola, pandeiro, ganz e reco-reco, e com repertrio composto de
maxixes, sambas e emboladas nordestinas, a atuao do conjunto fez um sucesso
estrondoso, chamando a ateno de pessoas influentes da sociedade carioca, como
Arnaldo Guinle, que em 1922 decidiu patrocinar uma viagem do conjunto a Paris. Os
Oito Batutas fazem a primeira excurso internacional de um conjunto de msica popular
brasileira. A platia francesa, que de msica popular s conhecia o jazz americano e o
tango argentino, foi surpreendida e contagiada pela fora da msica popular brasileira
autntica e pela flauta genial de Pixinguinha.
De volta ao Brasil, aps a participao nas comemoraes do Centenrio da
Independncia, o grupo seguiu para a Argentina, onde realizou 20 gravaes mecnicas.
Nessas gravaes, a percusso, que at ento s havia aparecido nas gravaes de
bandas, ouvida pela primeira vez numa pequena formao instrumental. Ouve-se
tambm a estria do saxofone de Pixinguinha.

10
 Aps a dissoluo dos Batutas surgem as primeiras orquestraes de
Pixinguinha para novos conjuntos instrumentais como a Orquestra Tpica Pixinguinha-
Donga, Orquestra J. Thomaz, Orquestra Victor Brasileira e a Diabos do Cu.
Embora ainda guardasse as caractersticas musicais do maxixe, o samba carioca
comea a despontar em 1917 a partir do primeiro registro fonogrfico com essa
denominao: Pelo Telefone, de Donga e Mauro de Almeida.
Outros nomes de destaque na terceira gerao do choro alm dos j citados so:
os pandeiristas Jac Palmieri (RJ, 1880?-1960?) e Joo da Baiana (Joo Machado
Guedes) (RJ, 1887-1974), este ltimo considerado o primeiro grande mestre no
instrumento; os flautistas Antnio Maria Passos (RJ, 1880? 1940?), Agenor Bens (RJ,
1890?-1950?), Raul Silva (SP, 1889-1938); os clarinetistas Louro (Lourival Incio de
Carvalho) (RJ, 1894-1956) e Maramb (Jos Mariano da Fonseca Barbosa) (PE, 1896-
1968), irmo do mestre Capiba; os saxofonistas Romeu Silva (RJ, 1893-1958) e Ratinho
(Severino Rangel de Carvalho) (PE, 1896-1972); os trompetistas Bonfiglio de Oliveira
(SP, 1894-1940) e Napoleo Tavares (MG, 1892-1965); o cavaquinista Nelson Alves
(RJ, 1895-1960); os violonistas Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) (RJ, 1890-
1974), Amrico Jacomino (SP, 1889-1928), Jos do Carmo (PE, 1895-1977), Alfredo
Medeiros (PE, 1892-1961), Romualdo Miranda (PE, 1898-1971), Levino da Conceio
(RS?, 1895-1955); os bandolinistas Adalberto de Azevedo (Betinho) (RJ, 1896-1969) e
Aristides Jlio de Oliveira, o Moleque Diabo (RJ?, 1895?-1938); os pianistas Sinh
(Jos Barbosa da Silva) (RJ, 1888-1930), Lus Nunes Sampaio (Careca) (RJ, 1886-
1953), Aristides Borges (RJ, 1884-1967), Freire Jnior (RJ, 1881-1956), Oswaldo
Cardoso de Meneses (RJ, 1893-1935), Tia Amlia (PE, 1894-1983); e o compositor
Erothides de Campos (SP, 1896-1945).

A quarta gerao
Em 1927, o progresso tecnolgico representado pela chegada de microfones,
auto-falantes, vitrolas e discos eltricos, abre uma nova fase na histria da msica
popular brasileira. At ento, os cantores precisavam berrar dentro dos tubos acsticos e
os msicos tinham que tocar com toda fora para que fosse impressa a cera da matriz do
disco. A mudana permitir o surgimento de gravaes de sons jamais ouvidos na

11
msica instrumental, no registro de solos de violo, bandolim e cavaquinho; e na msica
vocal, no registro de vozes menos empostadas e mais espontneas.
Surge nessa poca, no bairro do Estcio de S, a primeira escola de samba, a
Deixa Falar, fundada por Ismael Silva, Bide, Maral, Nilton Bastos, Brancura, entre
outros. nessa fase que o samba carioca se consolida como gnero, deixando de se
assemellhar ao maxixe, e passando a apresentar caractersticas rtmicas prprias. Abre-
se caminho para um rol de compositores magnficos que iro abrilhantar nossa msica
popular: Ary Barroso, Noel Rosa, Lamartine Babo, Wilson Batista, Geraldo Pereira,
Ataulfo Alves, Assis Valente, Cartola, Dorival Caymmi, Capiba, entre outros.
A fase de 1930 a 1945 considerada a poca de Ouro do Rdio, quando surge
um grande mercado de trabalho para instrumentistas, arranjadores, compositores e
cantores. A atividade do compositor popular ganha valor comercial e cresce o nmero
de sociedades defensoras dos direitos do autor, tendo sido a SBAT a primeira delas,
fundada em 1917 pela pioneira Chiquinha Gonzaga.
Os msicos de choro iro atuar em conjuntos regionais contratados para
acompanhar grandes estrelas da msica vocal (Mrio Reis, Slvio Caldas, Francisco
Alves, Moreira da Silva, Carmen Miranda, Aracy de Almeida, Orlando Silva, etc.) em
programas de rdios, como a Rdio Mayrink Veiga e a Rdio Nacional, valorizados por
terem grande versatilidade para tocar de ouvido, improvisar arranjos instantneos e
tapar os buracos da programao com um vasto repertrio de choros. Pixinguinha e
Radams Gnattali sero os principais responsveis pelos arranjos de orquestras no
acompanhamento de cantores, criando uma escola brasileira de orquestrao.
O conjunto regional de maior destaque nessa poca o do flautista Benedito
Lacerda (RJ, 1903-1958), que rene alguns dos melhores msicos de acompanhamento
da histria da msica popular brasileira: Dino 7 cordas (Horondino Jos da Silva) (RJ,
1918-2006) e Meira (PE, Jaime Toms Florence) (1909-1982) nos violes e Canhoto
(Waldiro Frederico Tramontano) (1908-1987) no cavaquinho. De 1946 a 1950, o
conjunto vive uma fase brilhante, com a entrada de Pixinguinha fazendo os famosos
contrapontos aos solos de Benedito no programa O Pessoal da Velha Guarda, dirigido
por Almirante na Rdio Tupi.
A partir de 1951, com as constantes ausncias de Benedito, Canhoto assume a
liderana do grupo, chamando o flautista Altamiro Carrilho (RJ, 1924) e mais tarde o

12
acordeonista Orlando Silveira (SP, 1922-1993). Assim nasce o lendrio Regional do
Canhoto, o mais clebre regional da histria da msica popular brasileira.
Outros grandes nomes que deslancharam suas carreiras nas rdios e orquestras
desse tempo foram: o genial bandolinista Luperce Miranda (PE, 1904-1977), o
clarinetista e saxofonista Lus Americano (SE, 1900-1960); os flautistas Dante Santoro
(RS, 1904-1969), Joo Dias Carrasqueira (SP, 1908-2000) e Copinha (Nicolino Cpia)
(SP, 1910-1984); os saxofonistas Sandoval Dias (BA, 1906) e Fon-Fon (Otaviano
Romero Monteiro) (AL, 1908-1951), este tambm diretor de orquestra; os bateristas
Valfrido Silva (RJ, 1904-1972) e Luciano Perrone (RJ, 1908-2001), precursores na
criao do estilo brasileiro de se tocar bateria, sendo o ltimo, mestre de nosso
contemporneo Oscar Bolo; os pianistas Non (Romualdo Peixoto) (RJ, 1901-1954),
tio dos cantores Ciro Monteiro e Cauby Peixoto, Custdio Mesquita (RJ, 1910-1945),
Ga (SP, Odmar do Amaral Gurgel) (1909-1992), Vadico (SP, Oswaldo de Almeida
Gogliano) (1910-1962); Carolina Cardoso de Meneses (RJ, 1916-1999), herdeira de
uma linhagem de vrias geraes de pianistas em sua famlia. Foi clebre o seu duo com
o violonista Garoto (Anbal Augusto Sardinha) (SP, 1915-1955), um dos principais
mestres do violo brasileiro, virtuose de vrios instrumentos de corda. Outros
violonistas que se destacaram nessa gerao foram Armandinho Neves (SP, 1902-
1976), organizador de um dos primeiros conjuntos regionais de So Paulo, Aymor
(Jos Alves da Silva) (SP, 1908-1979), Antnio Rago (SP, 1916); Dilermando Reis (SP,
1916-1977), Laurindo de Almeida (SP, 1917-1995), Rogrio Guimares (SP, 1900-
1980), Mozart Bicalho (MG, 1902-1986), Henrique Brito (RJ, 1908-1935), integrante
do Bando de Tangars, Valzinho (Norival Carlos Teixeira) (RJ, 1914-1980), cujas
composies foram celebrizadas pela cantora Zez Gonzaga; Claudionor Cruz (1914-
1995), que ao lado do compositor Pedro Caetano cultivou o gnero samba-choro,
compondo clssicos do repertrio do choro cantado; o violinista Faf Lemos (Rafael
Lemos Jnior) (RJ, 1921-2004) e o acordeonista Antengenes Silva (MG, 1907-2001),
autor da famosa valsa Saudades do Mato.

13
A quinta gerao
A partir da segunda metade da dcada de 1940 tem incio a fase em que se
destacam as estrias em disco de grandes cones do choro: Jacob do Bandolim (RJ,
1918-1969), com seu choro-sambado Treme-Treme, e o solista de cavaquinho Waldir
Azevedo (RJ, 1923-1980), com o choro Brasileirinho, ambos lanados em 1947.
O clarinetista e saxofonista Abel Ferreira (MG, 1915-1980) deslancha a sua
carreira em 1946, com a gravao de Chorando Baixinho; o trombonista Raul de Barros
(RJ, 1915), autor do clssico Na Glria, grava em 1948 seu primeiro disco com
composies de Donga: Pobre Vive de Teimoso e Malabarista. No ano seguinte o
flautista Altamiro Carrilho (RJ, 1924) grava dois choros de sua autoria, Flauteando na
Chacrinha e Travessuras do Srgio. Alguns anos mais tarde faria enorme sucesso com
o maxixe Rio Antigo, gravado por sua Bandinha. O acordeonista Luiz Gonzaga (PE,
1912-1989), que no incio da dcada de 1940 surgira como instrumentista de choro e
msica regional nordestina, se lana como cantor em 1946, gravando Baio, parceria
com o compositor Humberto Teixeira que ditaria o gnero da nova moda nacional dos
anos 1950. Seguindo os passos da moda, Waldir Azevedo lana em 1951 o baio
Delicado, um grande sucesso comercial, no s no Brasil como no exterior. Nessa fase
tambm estriam em discos o acordeonista Sivuca (PB, 1930-2006) e Chiquinho do
Acordeon (Romeu Seibel) (RS, 1928-1993), alm do cavaquinista Edinaldo Vieira
Lima, o ndio do Cavaquinho (AL, 1924-2003).
O lanamento da carreira desses grandes cones do choro, curiosamente, se d em
meio a um cenrio musical onde a influncia da msica norte-americana se faz sentir: na
msica vocal, nos gneros fox cano e samba-cano estilo dor-de-cotovelo; e na
msica instrumental, no sucesso de grandes orquestras inspiradas nas big bands, que
tocam em cassinos, teatros e sales de gafieira. Destacam-se orquestras como as dos
maestros Fon-Fon, Carioca, Cip e a clebre Orquestra Tabajara do clarinetista
Severino Arajo (PE, 1917), atuante at hoje, que lana sua primeira gravao em 1945
com Chorinho em Aldeia. Essas orquestras lanaram instrumentistas virtuoses, entre os
quais compositores que enriqueceram o repertrio do choro com suas composies
marcadas pelo estilo jazzstico. o caso do saxofonista K-Ximbinho (Sebastio de
Barros) (RN, 1917-1980), autor dos clssicos Sonoroso, Ternura e Sempre; o
trompetista Porfrio Costa (PB, 1913), autor de Peguei a Reta; o trombonista Jos

14
Leocdio, autor de Paraquedista, gravado tambm com letra pelo cantor Jorge Veiga;
Z Bodega (PE, 1923-2003), considerado um dos maiores saxofonistas brasileiros; o
prprio Severino Arajo, autor do clssico Espinha de Bacalhau; o trombonista Norato
(MG, 1923) e o clarinetista Paulo Moura (SP, 1933).
Desde o incio da dcada de 40, o maestro Csar Guerra-Peixe (RJ, 1914-1993),
compositor erudito e popular, musiclogo, violinista e arranjador, compe uma srie de
peas para orquestra de salo incluindo choros, sambas, marchas e sambas-canes.
Destacamos entre elas, os choros para quinteto de saxofones e orquestra, onde faz uso
de harmonizaes que seriam popularizadas somente vinte anos mais tarde.
Surgem novos conjuntos trazendo arranjos e formaes instrumentais inditas: o
Quinteto Radams Gnattali composto pelo prprio Radams ao piano, Chiquinho do
Acordeon, Luciano Perrone na bateria, Pedro Vidal Ramos no contrabaixo, Z Menezes
(CE, 1921) na guitarra eltrica; o Trio Surdina, formado por Faf Lemos, Chiquinho do
Acordeon e Garoto. Alguns msicos iro desenvolver suas carreiras fora do Brasil,
incorporando outras linguagens, mesmo tendo suas razes no choro: o caso dos
violonistas Bola Sete (Djalma de Andrade) (RJ, 1923-1987) e Laurindo de Almeida; e
do saxofonista e maestro Moacir Santos (PE, 1924-2006), que s recentemente teve
suas composies de choro reveladas.
Abrimos um parntese para ressaltar nessa fase, a trajetria notvel do
instrumentista, compositor e pesquisador Jacob do Bandolim. Prevendo as dificuldades
para viver como msico de choro e por no querer fazer concesses indstria
fonogrfica, Jacob segue a tradio dos chores da segunda gerao, tornando-se
funcionrio pblico. Talvez esse fato explique a constncia da sua carreira, imune aos
modismos, resgatando a obra de vrios mestres do passado e renovando o gnero com
suas prprias composies que hoje so, parte do repertrio fundamental do gnero.
Jacob foi responsvel por manter acesa a tradio das rodas de choro, fazendo
saraus memorveis na sua casa em Jacarepagu. Um dos saraus mais lembrados foi em
1959, quando convidou msicos pernambucanos, alm do genial violonista Canhoto da
Paraba (PB, 1928) para um encontro com Pixinguinha, Dilermando Reis, Radams
Gnattali, entre outros.
O esprito de preservao da memria musical brasileira norteou Jacob na
organizao de um extenso arquivo musical. Desde 1975 esse arquivo mantido pelo

15
Museu da Imagem e do Som-RJ, onde se encontram gravaes inditas de saraus,
ensaios, alm de partituras preciosas, como as que recebeu como herana de chores de
vrias geraes, em 35 cadernos manuscritos, organizados em ordem cronolgica de
1887 at meados da dcada de 60, contendo mais de 1.300 ttulos de choros.
A partir do final da dcada de 1950, a produo musical no ambiente do choro fica
ofuscada pelo movimento da bossa nova. Entretanto, alguns discos fundamentais sero
produzidos na dcada de 1960, entre eles: Choros Imortais vol. 1 e 2, por Altamiro
Carrilho e Regional do Canhoto; Vibraes, por Jacob do Bandolim e o lendrio
conjunto poca de Ouro, formado por alguns dos melhores acompanhadores de choro
de todos os tempos: Dino 7 Cordas, Csar Faria (pai de Paulinho da Viola) (RJ, 1919-
2007), Carlos Leite (violes), Jonas Silva (cavaquinho) (RJ, 1934-1997) e Gilberto
dvila (pandeiro); alm do primeiro disco do maestro Moacir Santos, intitulado
Coisas, trazendo uma linguagem musical moderna que influenciaria uma gerao de
msicos de choro na dcada seguinte.
Embora o choro no ocupasse mais um lugar de destaque no mercado fonogrfico
a partir da bossa nova, a sua influncia continuar se fazendo sentir na produo dos
principais compositores da msica popular brasileira desse tempo. Podemos observa-la
na obra de Tom Jobim, Chico Buarque, Edu Lobo, Francis Hime, Baden Powell (RJ,
1937-2000), este discpulo do mestre Meira, assim como foram Mauricio Carrilho (RJ,
1957) e Raphael Rabello (RJ, 1962-1995).

A sexta gerao
Chegamos aos anos 70, dcada em que vrios acontecimentos iro contribuir para
um movimento de revitalizao do choro. No mesmo ano da morte de Pixinguinha, em
1973, a participao do Conjunto poca de Ouro (com nova formao aps a morte de
Jacob com Do Rian (RJ, 1944) ao bandolim, Damsio (violo) e Jorginho do
Pandeiro (RJ, 1930), e os veteranos Dino 7 Cordas, Csar Faria e Jonas), no show
Sarau, de Paulinho da Viola, torna-se a grande atrao da temporada.
Em 1976, Paulinho da Viola evidencia seu bero musical, lanando o disco
Memrias Chorando, onde grava choros dos mestres Ary Barroso e Pixinguinha, alm
de choros de sua autoria em solos de cavaquinho e violo.

16
 Surge no mercado fonogrfico, dominado pelas gravadoras multinacionais, a
gravadora Marcus Pereira, preocupada em enaltecer a obra de artistas do choro,
lanando os discos A Msica de Donga; Brasil, Flauta, Bandolim e Violo, com
Evandro do Bandolim e Regional; Brasil Trombone, com o trombonista Raul de Barros
(RJ, 1915); Brasil, Sax e Clarineta com Abel Ferreira; Pixinguinha, de Novo com
Altamiro e Carlos Poyares (ES, 1928-2004), Artur Moreira Lima interpreta Ernesto
Nazareth vol. I e II, etc.
A tradio das rodas de choro se mantm em bares como o Sovaco de Cobra, na
Penha, ponto de encontro de chores estreantes e veteranos. Os grupos que se destacam
no Rio de Janeiro nesse perodo so Os Carioquinhas, que em 1977 lana seu nico LP,
o Galo Preto e o N em Pingo dgua. Os dois ltimos fazem suas estrias fonogrficas
respectivamente em 1978 e 1983, e esto em atividade at os dias de hoje.
A partir de 1977 a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro passa a
estimular a formao de novos conjuntos, lanando o projeto Concerto de Choro e
promovendo concursos anuais de conjuntos de choro. Em So Paulo a TV Bandeirantes
comea a promover o Festival Nacional de Choro, onde participam grupos de chores
de vrios estados, entre eles o Amigos do Choro do bandolinista Rossini Ferreira (PE,
1919-2001); o Lenha da Casa do flautista Plauto Cruz (RS, 1929); o Regional do
Evandro (PB, 1932-1994), do bandolinista Josevandro Pires de Carvalho; o Conjunto
Atlntico, onde se destacam o violonista Antonio dAuria (SP, 1912-1998) e o
bandolinista Isaas Bueno de Almeida (SP, 1937); e o regional de Esmeraldino Salles
(SP, 1926-1979), parceiro do acordeonista Orlando Silveira.
Surgem Clubes do Choro que se espalham pelo pas. Merece destaque o Clube do
Choro de Braslia que surgiu a partir do encontro de chores que se reuniam pra tocar na
casa da flautista Odette Ernest Dias (Paris, 1929), e tambm do jornalista Raimundo de
Brito: entre eles Waldir Azevedo, residente em Braslia desde 1971, o cavaquinista
Chico de Assis, conhecido como Six, os violonistas Hamilton Costa e Alencar 7 Cordas,
Bide da Flauta, Pernambuco do Pandeiro (Incio Pinheiro Sobrinho) (PE, 1924), o
citarista e compositor Avena de Castro (RJ, 1919-1981), o clarinetista Celso Cruz dos
Carioquinhas, o bandolinista e compositor carioca Cincinato, frequentador das
tradicionais rodas de choro do Retiro da Velha Guarda, na casa de Joo Dormund em
Jacarepagu, no Rio de Janeiro.

17
 Radams lana em 1975 o disco do seu novo sexteto, que conta com a
participao do pianista Larcio de Freitas (SP, 1941), alm dos integrantes do seu
quinteto. Na dcada de 80 a experincia da Camerata Carioca abre caminho para o
surgimento de grupos como o gua de Moringa, ainda em atividade, e a Orquestra de
Cordas Brasileira, inspirados na mesma linguagem de arranjo. Tambm tem destaque a
Orquestra de Cordas Dedilhadas de Pernambuco e a Oficina de Cordas celeiro de
excelentes instrumentistas como os violonistas Joo Lyra, Henrique Annes, Boz, os
bandolinistas Marco Csar, Ivanildo Maciel e Adalberto Cavalcanti, os violistas Nilton
Rangel e Adelmo Arcoverde cujos primeiros discos foram idealizados por Hermnio
Bello de Carvalho, ento diretor da Diviso de Msica Popular Brasileira da Funarte.
Outro lanamento precioso, idealizado por Hermnio em 1982, o encontro do
jovem violonista Raphael Rabello com o mestre Radams Gnattali num disco dedicado
obra de Garoto. Raphael 7 Cordas, como tornou-se conhecido, sendo discpulo direto
de Dino 7 Cordas, desponta sua carreira de solista, lanando quatro anos depois, parte
da obra de Radams para violo solo, no disco Raphael Rabello interpreta Radams
Gnattali. Raphael se projeta como um dos maiores violonistas brasileiros realizando
centenas de shows e gravaes como solista e acompanhante, e apesar do seu
falecimento prematuro, ainda referncia para o surgimento de novas geraes de
excelentes violonistas brasileiros e estrangeiros.
O crescente interesse de msicos estrangeiros pelo choro aponta para uma
perspectiva de internacionalizao do gnero no sculo XXI. Em pases como EUA,
Japo e Frana existem Clubes de Choro empenhados em divulgar o gnero, realizando
shows e workshops. Os lanamentos de CDs autorais de choros de msicos estrangeiros
como da flautista japonesa Naomi Kumamoto e do violonista australiano Doug de Vries
pela Acari Records, revelam que a rvore genealgica do choro j comea a se expandir
para alm das fronteiras do Brasil.
O enorme poder de congregao do choro continuar reunindo msicos de
origens, culturas e idades diferentes, que se orgulham de cultivar esse gnero musical.
Conscientes da ancestralidade do choro, a maior herana cultural da msica popular
brasileira, futuros msicos e pesquisadores vo seguir completando essa rvore,
desvendando a obra de mestres do passado e revelando a atuao dos msicos de hoje.
Anna Paes

18
 2 Parte O Choro e seus gneros musicais

1. CHORO

a) Ingnuo (Pixinguinha)

O CHORO

No Rio de Janeiro do sculo XIX, por volta de 1870, a palavra choro

designava o grupo instrumental composto por flauta, cavaquinho e violo, e o local
onde se executavam as abrasileiradas danas europias. O flautista e compositor
Joaquim Callado foi um dos primeiros msicos a constituir um conjunto com essa
formao chamado Choro Carioca. Os chores eram msicos amadores que se reuniam
para tocar em comemoraes festivas. Eram, na sua maioria, servidores pblicos, civis e
militares, do Arsenal da Marinha, da Estrada de Ferro, da Alfndega, e especialmente
dos Correios.
Na ltima dcada do sculo XIX o maestro Anacleto de Medeiros fundou a
Banda do Corpo de Bombeiros constituda por muitos msicos de choro. Este fato
revela que no final do sculo a formao instrumental dos conjuntos de choro j havia
incorporado novos instrumentos como o clarinete, o oficleide, o trompete, o trombone e
o bombardino. Vrios desses conjuntos participaram das primeiras gravaes feitas no
Brasil para Casa Edison a partir de 1902, como o Grupo do Malaquias (clarinete,
violo, cavaquinho), a prpria Banda do Corpo de Bombeiros, com formao reduzida,
Grupo Carioca de Candinho Silva, (trombone, cavaquinho, violo), Choro Carioca de
Irineu de Almeida, Bonfiglio de Oliveira e Pixinguinha (oficleide, trompete, flauta,
cavaquinho e violo).
Na virada do sculo, com o aumento da produo musical de compositores
populares brasileiros e a definio do estilo interpretativo, o choro passa a ser
considerado um gnero musical.

19
2. POLCA

a) Choro e Poesia (Pedro de Alcntara)

b) Apanhei-te Cavaquinho (Ernesto Nazareth)

20
A POLCA
Gnero originrio da Bomia, Tchecoslovquia, de onde a partir de 1837 (data
da primeira partitura impressa em Praga) iria se espalhar rapidamente pela Europa e por
todo o mundo. No Brasil, teria sido apresentada pela primeira vez em julho de 1845 no
Teatro So Pedro, no Rio de Janeiro. A partir da torna-se uma coqueluche nacional,
sendo incorporada ao repertrio de inmeros instrumentistas e compositores, como
Callado, Anacleto de Medeiros, Irineu de Almeida, entre muitos outros. A tal ponto se
tornou popular no Brasil que Alexandre Gonalves Pinto a definiu da seguinte forma:
A polca, assim como o samba, uma autntica tradio brasileira.
Ao contrrio do que afirmam inmeros dicionrios de msica, a polca no
precisa ser necessariamente em andamento vivo. Polcas como S para Moer de Viriato
Figueira e Polca em Sol de Mrio lvares, so exemplos de polcas em andamento lento.
No Brasil, a polca se fundiu com outros gneros como o maxixe e o lundu,
resultando da inmeras variaes de acompanhamento.

3. LUNDU

Isto Bom (Xisto Bahia)

21
 O LUNDU

Era originalmente uma dana de roda e umbigada angolana, trazida pelos

escravos na segunda metade do sculo XVIII, acompanhada por atabaques. Mais tarde o
lundu foi introduzido nos sales das cortes do Brasil e Portugal, assumindo a forma de
cano, acompanhado ao piano, muito semelhante modinha. No sculo XIX tornou-se
cantiga de duplo sentido, s para homens, quando acompanhado ao violo, como mostra
a gravao do lundu Isto Bom, de Xisto Bahia (1841-1894), um dos principais
cultores do gnero.
A integrao do lundu com as danas europias gerou novos gneros musicais
como a polca-lundu ou tango-lundu. Podemos afirmar que o lundu foi o principal canal
por onde a influncia africana chegou ao choro.

4. TANGO-HABANERA

a) Ali-Bab (Henrique Alves de Mesquita)

22
5. TANGO BRASILEIRO

a) Brejeiro (Ernesto Nazareth)

Variao: experimente tocar o mesmo trecho modificando o ritmo da segunda

linha para

b) Batuque (Henrique Alves de Mesquita)

23
 O TANGO BRASILEIRO
Gnero que surgiu no Rio de Janeiro em 1870 como resultado da fuso da polca
j nacionalizada com as danas espanholas (zarzuelas, tangos andaluzes e habaneras),
muito em voga na dcada de '60 na Amrica do Sul. O tango argentino, surgido cerca de
dez anos mais tarde, no se assemelha ao tango brasileiro apesar de guardar a mesma
influncia das danas espanholas, pois o processo de fuso ocorreu a partir da milonga
criolla. O tango Olhos Matadores do maestro Henrique Alves de Mesquita (1830-
1906), editado em 1871, considerado o primeiro tango brasileiro, apesar da partitura
no ter sido localizada pelos principais pesquisadores da sua obra. O tango Ali Bab,
entretanto, apresentado no ano seguinte, com grande sucesso na pea teatral homnima,
chegou at nossos dias, podendo ser escutado na coleo Princpios do Choro (Acari
Records, 2002). Ali Bab ainda guarda forte influncia da habanera, em movimento
lento e compasso binrio com ritmo de colcheia pontuada-semicolcheia seguida de duas
colcheias no acompanhamento.
O tango brasileiro continuou seu desenvolvimento, sendo cultivado por vrios
compositores nas ltimas dcadas do sculo XIX e incio do XX, mas foi na na obra de
Ernesto Nazareth (1863-1934) que o gnero atingiu sua culminncia. Nazareth
acrescentou ao tango a rtmica da forma de execuo dos pequenos conjuntos
instrumentais de choro, compostos por flauta, cavaquinho e violo. No
acompanhamento do tango Brejeiro, primeiro tango do compositor, lanado em 1893, o
primeiro tempo do compasso binrio em colcheia pontuada-semicolcheia repetido no
segundo tempo, substituindo as duas colcheias, caracterstica da rtmica da habanera.
Outro exemplo de tango na obra de Nazareth, talvez seja sua msica mais conhecida: o
tango Odeon.

6. MAXIXE

a) Ou Vai ou Racha (Annimo)

24
 Variao: experimente tocar o mesmo trecho modificando o ritmo da segunda
linha para

b) Le-L (Ida Leal do Canto)

O MAXIXE

Surgiu no Rio de Janeiro, em torno de 1880, como uma forma de danar a polca,
o tango, a habanera e o lundu nos bailes populares da Cidade Nova. Inicialmente era
considerado uma dana indecente e proibida nos sales da alta sociedade. Na virada do
sculo, a partir da sua entrada nos sales das sociedades carnavalescas e no repertrio
dos compositores de teatro de revista, o maxixe passa a ser considerado um gnero,
atingindo todas as classes sociais.
Pela semelhana rtmica em compasso binrio e sincopado, o maxixe muito
confundido com o tango brasileiro. O fator que melhor distingue o maxixe do tango
brasileiro a presena dos baixos sincopados, provenientes do acompanhamento dos
violes na execuo das baixarias (contracanto na parte grave do instrumento) ou dos
instrumentos de sopro de registro grave. Como apontou o maestro Guerra-Peixe: o
costume de empregar a baixaria era to apreciado que em certas ocasies a melodia
principal ficava colocada no registro grave, cabendo aos instrumentos restantes, dos
registros mdio e agudo, uma significao secundria por alguns momentos na estrutura
do trecho musical.

25
 Na histria do choro alguns exemplos de maxixes que se celebrizaram so: O
Gacho ou Corta-Jaca (Chiquinha Gonzaga), Dorinha, Meu Amor (Jos Francisco de
Freitas), Jura (Sinh), Rio Antigo (Altamiro Carrilho).

7. SCHOTTISCH

a) No Me Olhes Assim (Anacleto de Medeiros)

b) Bouquet (Mrio lvares)

26
 O SCHOTTISCH

Segundo a definio clssica de muitos dicionrios e livros especializados, a

schottisch cujo nome quer dizer escocesa, seria uma dana de origem alem,
originalmente de compasso binrio semelhante a polca sendo porm mais lenta. Foi
levada para Inglaterra e para Frana na primeira metade do sculo XIX e introduzida no
Brasil em 1851 pelo professor de dana Jos Maria Toussaint, ganhando grande
popularidade e variantes em diferentes regies do Brasil. No nordeste deu origem ao
xote, gnero aparentado ao baio. No universo do choro, mais conhecido por ser um
gnero masculino (o schottisch) de compasso quaternrio.
Bastante popular entre os chores at meados do sculo XX, foi cultivado por
grandes compositores como Anacleto de Medeiros (autor dos clssicos Santinha e Iara),
Mrio lvares, Pixinguinha, entre muitos outros. A partir da dcada de 50 comea a
haver um declnio na produo de schottischs: Pixinguinha e Jacob do Bandolim, por
exemplo, compuseram poucos schottischs, levando-se em conta o tamanho das suas
obras. A partir da dcada de 90 h um ressurgimento da produo de schottisch na obra
de compositores de choro, principalmente no que se refere aos msicos da Acari
Records, como Maurcio Carrilho e Pedro Amorim.

8. VALSA BRASILEIRA

a) Flor do Mal (Santos Coelho)

27
 A VALSA BRASILEIRA

Primeira dana de salo de par enlaado, em compasso ternrio, a valsa chegou

ao Brasil na segunda dcada do sculo XIX, trazida da ustria pelo compositor
Sigismund Neukomm que veio residir no Rio de Janeiro em 1816.
A valsa brasileira se expandiu por todas as classes sociais e figurou em diversos
nveis artsticos da nossa msica folclrica, popular e erudita. Essa variedade de
estilos que a valsa assumiu torna-se evidente na nomenclatura usada nas edies
nacionais, indicando o carter expressivo das peas: valsa brilhante, valsa espanhola,
valsa de concerto, valsa de salo, valsa seresteira, valsa sentimental, valsa de bravura,
valsa sertaneja.
As primeiras edies de valsas no Brasil, da primeira metade do sculo XIX,
ainda guardam muita semelhana com o modelo europeu. Na segunda metade do sculo
XIX, por volta de 1870, o abrasileiramento da valsa pode ser percebido na produo de
compositores especialistas no gnero, como os pianistas Aurlio Cavalcanti, Carlos T.
de Carvalho, Jos Garcia Christo, Viva Guerreiro, Ernesto Nazareth, entre outros.
No ambiente do choro temos exemplos de diversos estilos de valsas que se
celebrizaram tais como: Subindo ao Cu (Aristides Borges), Primeiro Amor (Patpio
Silva), Terna Saudade (Anacleto de Medeiros), Abismo de Rosas (Amrico Jacomino),
Saudades do Mato (Jorge Galati), Confidncias (Ernesto Nazareth), Vo da Mosca
(Jacob do Bandolim), Rosa (Pixinguinha).

9. QUADRILHA

a) Estamos Trabalhando (Annimo)

28
b) Soirre Brsilienne (Henrique Alves de Mesquita)

A QUADRILHA

Segundo Jos Ramos Tinhoro, a quadrilha uma dana coletiva de salo

baseada em formas de alegres danas populares, surgida na Europa de incios do sculo
XIX como continuao modificada da contradana (...) Foi chamada de quadrilha por
suas figuras lembrarem a formao militar da squadra, cujo diminutivo se vulgarizaria
acompanhando o espanhol cuadrilla. A dana e a msica da quadrilha fizeram sua
entrada no Brasil no tempo da Regncia (1830-1841) atravs do modelo francs de
contradana a dois ou quatro pares (quadrilha dupla), de som alegre e movimentado.
A quadrilha formada por cinco partes que obedecem, na maioria dos casos ao
seguinte esquema: a primeira e a terceira partes em seis por oito e as trs outras
(segunda, quarta e quinta) geralmente em dois por quatro.
A quadrilha se incorporou ao universo do choro no incio do sculo: inmeros
chores compuseram quadrilhas, como Callado, Henrique Alves de Mesquita,
Saturnino, entre muitos outros. Sempre foi uma msica associada dana, e por isso seu
andamento era vivo, conforme comprovam as poucas gravaes de quadrilha que nos
chegaram do incio do sculo. Segundo Alexandre Gonalves Pinto:
A quadrilha era uma dana figurada com cadncia de seis por oito e dois por quatro
no compasso. (...) Esse estilo de dana traz saudades das marcaes: Travess!
Balanc! Tour! Anavancatre! Marcantes anavan! Caminhos da roa! Volta
gente que est chovendo! Na quadrilha era que o danarino mostrava as suas
habilidade e o seu devotamento a Terpesychore. Por exemplo_ no Travess!

29
 muita gente boiava quando um cavalheiro pulava do seu lugar e ia figurar ao lado de
uma dama que se achava distante. (...) Para ser marcante era preciso conhecer todas
as evolues da quadrilha e estar muito atento ao desenrolar da msica

A quadrilha caiu em completo desuso entre os chores a partir da terceira dcada

do sculo XX, tendo sido o nico gnero ligado ao choro cuja tradio oral desapareceu
completamente: A partir da dcada de 1990, graas ao violonista Maurcio Carrilho, a
quadrilha foi recriada, assumindo um carter mais camerstico, com um andamento
mais lento, que possibilita salientar as belas melodias e o carter lrico das antigas
quadrilhas.

O CHORO-SAMBA

a) Noites Cariocas (Jacob do Bandolim)

30
O CHORO-SAMBA e O SAMBA-CHORO

O samba sempre esteve relacionado historicamente com o choro a maioria

dos msicos que acompanharam cantores de samba era formada pela escola do choro:
Pixinguinha, Benedito Lacerda, Dino, Meira, Canhoto, entre muitos outros. A influncia
do choro pode ser sentida tambm nas composies de muitos sambistas, como Nelson
Cavaquinho cujo modo de tocar violo, repleto de baixarias, nos remete aos
contrapontos do choro ou D. Ivone Lara, afilhada do choro Candinho do Trombone,
autora de composies com sofisticao harmnica e meldica tpica dos grandes
choros.
Desta relao entre samba e choro nasceram dois outros gneros que poderamos
chamar de samba-choro e choro-samba. O samba-choro uma composio com
caractersticas rtmicas e meldicas de um choro, mas feita originalmente com letra: o
caso de algumas composies de Boror (Da cor do pecado, Curare), Pedro Caetano e
Claudionor Cruz (Nova Iluso, Engomadinho) entre outros. Note-se que existem choros
que receberam posteriormente letra. Estes no constituem samba-choro, pois no foram
compostos originalmente para receber letra, como o caso de Doce de Cco e Ingnuo
(letrados por Hermnio Bello de Carvalho e Paulo Csar Pinheiro, respectivamente). So
simplesmente choros.
O choro-samba um choro com caractersticas rtmicas e meldicas tpicas do
samba: o caso das msicas Receita de Samba, e Bole-Bole, e Noites Cariocas de Jacob
do Bandolim. Observe no exemplo como o acompanhamento reproduz a levada tpica
de um tamborim de samba.

31
BIBLIOGRAFIA BSICA PARA O ESTUDO DO CHORO

ALENCAR, Edigar de. O fabuloso e harmonioso Pixinguinha. Rio de Janeiro,

Ctedra e Braslia, INL, 1979.
ALMEIDA, Renato. Histria da Msica Brasileira. 2 ed. Rio de Janeiro, RJ.
Briguiet, 1942. 529 p.
ALMIRANTE (Henrique Foris Domingues). No tempo de Noel Rosa Rio de
Janeiro, Francisco Alves, s.d.
ARAJO, Mozart de. A Modinha e o Lundu no sculo XVIII (uma pesquisa
histrica e bibliogrfica). Ricordi Brasileira, So Paulo,1963.
ARAJO, Mozart de. Valsa Brasileira autores e repertrio. In album Cantares
Brasileiros II a valsa brasileira, Rio de Janeiro, Cia. Internacional de Seguros,
natal de 1978.
AS VOZES DESASSOMBRADAS DO MUSEU PIXINGUINHA, DONGA E
JOO DA BAIANA - depoimentos para a posteridade realizados no Museu da
Imagem e do Som. Rio de Janeiro, Secretaria de Educao e Cultura, 1970.
BARONCELLI, Nilcia Cleide da Silva. Mulheres Compositoras elenco e
repertrio. So Paulo, Roswitha Kempf/Editores, 1987.
CABRAL, Srgio. Pixinguinha vida e obra. Rio de Janeiro, Lumiar Editora, 1997.
CMARA, Renato Phaelante da. MPB - Compositores Pernambucanos coletnea
bio-msico-fonogrfica (1920-1995). Recife, Fundaj, Editora Massangana, 1997.
148 p.
DINIZ, Andr. Almanaque do Choro a histria do chorinho, o que ouvir, o que
ler, onde curtir. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2003.
DINIZ, Edinha. Chiquinha Gonzaga uma histria de vida. Rio de Janeiro,
Codecri, 1984.
EDMUNDO, Luiz. O Rio de Janeiro do meu tempo. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1938. vol 1, 2 e 3.
EFEG, Jota. Maxixe, a dana excomungada. Rio de Janeiro, 1974.
EFEG, Jota. Ameno Resed, o rancho que foi escola Rio de Janeiro, Editora
Letras e Artes Ltda, 1965

32
 ENCICLOPDIA DA MSICA BRASILEIRA: POPULAR, ERUDITA E
FOLCLRICA. So Paulo, Art Editora: Publifolha, 1998.
FRANCESCHI, Humberto. A Casa Edison e seu tempo. Rio de Janeiro, Sarapu,
2002.
FRANCESCHI, Humberto. Registro Sonoro por meios mecnicos no Brasil. Rio de
Janeiro, 1984.
LAMAS, Dulce Martins. Msica Popular Gravada na Segunda Dcada do Sculo.
Acervo do Centro de Pesquisas Folclricas da Escola de Msica da UFRJ. Rio de
Janeiro, 1997.
LEAL, Jos de Souza e BARBOSA, Artur Luiz. Joo Pernambuco arte de um
povo. Rio de Janeiro, Funarte, 1982.
LIRA, Mariza. Chiquinha Gonzaga. Rio de Janeiro, Funarte, 1978.
MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena frica no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,
Funarte, 1995.
PINTO, Alexandre Gonalves. O Choro reminiscncias dos chores
antigos. 2.ed. Rio de Janeiro, Funarte, 1978.
RANGEL, Lcio. Sambistas e Chores aspectos e figuras da msica popular
brasileira. Rio de Janeiro, 1962.
RODRIGUES, Sonia Maria Braucks. Jararaca e Ratinho - a famosa dupla caipira.
Rio de Janeiro, Funarte, 1983.
SIQUEIRA, Batista. Trs Vultos Histricos da Msica Brasileira. Rio de Janeiro,
Editora D. Arajo,1970.
SILVA, Marlia T. Barboza da. Luperce Miranda, o Paganini do Bandolim. Niteri,
RJ. Designum Comunicao, 2004.
SOUZA, Maria das Graas Nogueira de. PEDROSA, Henrique. ALVES, Selma.
PANTOJA, Sinclair Guimares Cechine. Patpio msico erudito ou popular? Rio
de Janeiro, Funarte, 1983.
TINHORO, Jos Ramos. Pequena Histria da Msica Popular Brasileira: da
modinha lambada. 6a ed. rev. e aum. - So Paulo: Art Editora, 1991.
TINHORO, Jos Ramos. Msica Popular Teatro e Cinema. Editora Vozes,
Petrpolis, RJ, 1972.
VASCONCELOS, Ary. A nova msica da repblica velha. Rio de Janeiro, 1985.

33
 VASCONCELOS, Ary. Carinhoso etc. histria e inventrio do choro. Rio de
Janeiro, 1984.
VASCONCELOS, Ary. Panorama da msica popular brasileira na Belle poque.
Rio de Janeiro, Livraria Santana Ltda., 1977.
VASCONCELOS, Ary. Razes da msica popular brasileira. Rio de Janeiro, Rio
Fundo Editora, 1991.
VEDANA, Hardy. Octavio Dutra na histria da msica de Porto Alegre, Porto
Alegre, Proletra, 2000.
VEDANA, Hardy. Jazz em Porto Alegre, Porto Alegre. Porto Alegre, L&PM, 1987.

34