Pietro Ubaldi - 13 Problemas Atuais
Pietro Ubaldi - 13 Problemas Atuais
Pietro Ubaldi - 13 Problemas Atuais
Traduo:
NDICE
Captulo I .................................................... Os Guias do Mundo
Captulo II ................................................... O Chefe Crtica de Maquiavel
Captulo III .................................................. O Novo Homem
Captulo IV .................................................. O Problema da Estabilidade Monetria
Captulo V .................................................... Orientaes Teraputicas e Patognese do Cncer
Captulo VI .................................................. A Teoria da Reencarnao (1 parte)
Captulo VII ................................................. A Teoria da Reencarnao (2 parte)
Captulo VIII ................................................ O livro Tibetano dos Mortos (Tcnica da Reencarnao)
OS GUIAS DO MUNDO
Tudo luta na vida. Esta parece querer exprimir-se sobretudo em forma de
luta, e exercitar desta maneira a sua maior atividade. a vida uma contnua tenso para
vencer em qualquer plano. Nas sua fases mais primitivas, vencer a fera inimiga, na atual fase
de vida em sociedade, vencer o prximo a fim de suplant-lo; no bitipo do super-homem
vencer para subjugar e superar as leis inferiores da animalidade e dar ao mundo novas
diretrizes. Luta para vencer, ou seja, para elevar-se, ascender, evolver. A lei suprema da
evoluo toma a forma de luta desesperada, para remir-se da dor e do mal e conquistar a
felicidade. Esta encontra-se escrita e arde perenemente no fundo da alma humana, como um
instinto, um anseio inextinguvel, um sonho, uma f, como uma utopia que sabemos fugir
longnqua e inatingvel, mas na qual o homem obrigado a crer, contra todas as aparncias e
dificuldades, at ao desespero. Isto porque, sem tal f num futuro melhor, mesmo que parea
loucura, no teria o homem mais conforto na fadiga de ascender, nem mais finalidade na sua
caminhada, nem luz alguma de esperana no amanh.
Esta a luta trgica dos mais evoludos contra os menos evoludos, a fim de
faz-los progredir. Mesmos estes ltimos desejariam dominar e se julgam modelo de vida,
bitipo exemplar. O tipo normal, ainda hoje, de valor to duvidoso, no considerado como o
que todos deveriam ser? E quem no assim, anormal. E todos apressam a entrar nas filas
da normalidade, pouco importando quanto valha ela, contanto que no fiquem isolados, e,
portanto fora da lei e condenados. O peso tremendo da ignorncia da grande massa humana,
o lastro enorme que pende dos ombros do mais evoludo que tenta novos caminhos, com
riscos e perigos seus apenas, ao passo que os outros ficam a olhar, prontos para conden-lo
logo que caia, prontos para agredi-lo por inveja, logo que ele triunfe. Com esse peso s
costas, que representa o misonesmo, inrcia do passado, deve ele subir os ngremes degraus
da evoluo sozinho. A seu lado esto apenas as foras da vida, o pensamento da histria, a
vontade de Deus que impe o progresso.
Deve esse homem enfrentar e conseguir superar todas as resistncias que lhe
opem os seus semelhantes, nem mesmos eles sabem porqu, mas que a vida usa como
meio de verificao do valor do escolhido, que deve dar prova de saber vencer, dado que o
alto monte da evoluo tem que ser escalado mediante esforo nosso. Quando, vencendo
tudo com suas foras, tiver o homem superior dado prova de o ser verdadeiramente, ento as
multides ignaras, tambm dessa vez sem saber porqu, o aprovam e exaltam, por um
instinto profundo comandado pela vida. Ento, aquela mesma distancia que antes as afastava
do tipo mais eleito, essa mesma que agora as atrai, pois neste caso distncia significa
justamente posio mais avanada, que a vida, em seu instinto, aceita, respeita e exalta. As
multides, ento, aceitam, respeitam e exaltam. Tudo na vida utilitrio. Elas fazem isso,
porque precisam do super-homem e o buscam porque ele a nica antena da vida e o
pioneiro do porvir, o pastor nico que as pode guiar. As multides esto sempre espera de
chefes, de modeladores, de condutores em qualquer campo, para saberem o que devem fazer.
Necessitam e procuram um modelo para imitar, um legislador que estabelea a norma que
devem seguir na vida, pois bem poucos sabem agir sozinhos. Por isso, sempre esto
espera, observam e, se o acham, ouvem, recebem, bebem e assimilam. E se o homem
escolhido adequado, e se com a sua vitria deu prova de valor, ento as multides o
constituem seu modelo ideal, sua bandeira e dolo sobre o qual projetam e concentram as
suas aspiraes, que a vida faz nascer em seu instinto naquela hora, com o seu fim de obter
progresso. Forma-se ento desse homem, a lenda, o mito, a divinizao, em que permanece o
essencial dele, o valor biolgico, o impulso vital. Morre o homem, mas fica sua imagem, at
que tenha cumprido a sua funo biolgica. E desse homem permanece um smbolo, uma
bandeira, a idia, ativos at sua completa atuao na vida dos povos.
Vimos a tcnica usada pela vida para atingir essas formaes. toda ela o
desenvolvimento de uma semente, isto , de um estado de latncia, da qual, parece, podem
revelar-se todas as possibilidades. A existncia no s vontade de viver. tambm e
sobretudo vontade de evoluir. Na vida h uma Lei, que no s o pensamento que dirige, mas
tambm vontade que impe a sua atuao. Vontade fundamental desta Lei o evoluir,
porque o universo cado deve voltar perfeio de Deus. Por isso se vive, por isso a
insaciabilidade no subir representa o instinto fundamental da vida. Indivduo mais adiantados
neste caminho seguem frente, no caminho ascensional de todos. Inspira-os o pensamento
da vida, a sua vontade impele-os e os ajuda. Com a tcnica acima examinada, as multides
seguem, assimilam avanam, e assim se cumpre a evoluo.
Serviu assim a sua boa f pouca controlada para dar razo aos cticos.
Sabemos bem que os nobres apelos virtude, religio, ao dever, ao sacrifcio,
fraternidade, ao progresso, foram explorados com freqncia por gente astuta, para satisfazer
os seus prprios interesses e conseguir melhor lugar na vida. Conhecemos muito bem os
truques de tantos pseudo-super-homens que se arvoram em condutores apenas para chegar
s honras e ao bem-estar, que abraam os prprios companheiros, amam os prprios
proslitos, apenas para fazer deles um pedestal ao seu poder, e depois os abandonam, aps
hav-los explorado apenas em sua exclusiva vantagem. Conhecemos tudo isso e no nos
iludimos, julgando que na vida acharemos homens diferentes. Esquecer os fatos e pedir o
impossvel o que faz naufragar os ideais. No queremos, pois, construir sobre o sonho, mas
no terreno slido da dura, ainda que hostil, realidade da vida.
Foram escritos muitos livros como este, que pregam belas coisas. Mas aqui
oferecemos uma coisa nova e a demonstrao racional da vantagem de fazer o bem, assim
como o grave dano pessoal de fazer o mal. Oferecemos, pois, ao leitor sbio, de um lado, a
perspectiva real de uma vantagem e do outro de um dano para si. Conhecemos o homem e
sabemos que estas so as nicas molas que o movem, os nicos impulsos a que obedece.
Sabemos que esses livros, que falam de belos ideais, so depois explorados por homens
camuflados de idealistas, para seus interesses. Muitas vezes aconteceu isto, e poder ocorr-
lo tambm com este volume e com os demais da nossa obra. Mas podemos advertir a esses,
que nossos princpios se baseiam na presena demonstrada de uma Lei, de cujas reaes
no h distancia de tempo nem de espao, nem fora ou astcia que os possa salvar, se a
violarem. Ns s possumos as armas do amor e da inteligncia, prprias aos planos
superiores. Avisamos, porm, que, contra os transgressores da Lei, h uma polcia do
impondervel, armada de reaes fatais das quais no se escapa. Ns, que no temos poder
algum e nem direito de julgar quem o merea ou no, queremos apenas mostrar aos cegos
como funciona a Lei, e com que terrveis conseqncias pode ela golpear-nos se o
merecemos, pouco importando se nela no cremos e se dizemos que nada disso verdadeiro.
Reconhece-se assim que o poder devia ser misso mas que no entanto, dado
que a vida de hoje exige uma compensao, natural que o homem, que se esforou para
chegar, sinta o direito de gozar, na posio conquistada, o fruto de seu esforo. Ele no pode
ento ocupar-se do bem do povo, mas s de seu bem, dado que o povo faz o mesmo com ele,
e a lei de explorao universal. Mas tambm se reconhece que, fora de abusar e errar, e
portanto de pagar, o homem tem por fim que aprender, ainda que sua custa e, aprendendo,
tem que evolver, isto , caminhar para a realizao do ideal. J mais do que sabido agora, o
velho sistema de que os ideais so pregados com o fito de explorao. Mas, se um interesse
no houvera, quem faria alguma coisa no mundo? No se pode pretender que a vida no seja
utilitria. Preciso reconhecer-lhe esse direito, que est na sua lgica e em seus equilbrios.
O que preciso apenas passar a um utilitarismo mais inteligente e mais universal, que no
constitua dano para ningum e seja vantagem para cada vez maior nmero de pessoas.
No se pode demolir o velho com agresso, para destru-lo, pois tudo que
existe quer viver e, se for agredido reage. O que preciso transformar o velho fazendo-o
evoluir. No se pode pretender sufocar a vida, nem se devem utilizar os princpios ideais para
esmagar o prximo, para venc-lo na luta pela vida,, e para substituir-se a ele em posies
vantajosas. Ao pedir-se duros sacrifcios natureza humana, em favor da evoluo, preciso
ter em conta que ela deve tambm viver, e no pode ficar sufocada. E, infelizmente, muitas
vezes se estabelece a tbua de valores s em funo da prpria utilidade, e com freqncia a
pregao dos ideais se faz apenas em favor prprio, para a vitria dos interesses da prpria
casta. indispensvel recordar que a luta pela vida invade e penetra tudo no mundo, e
portanto, se quisermos obter e construir com justia e ento em forma durvel, porque
equilibrada, isto , sem as inevitveis reaes teremos que levar em conta o direito vida
que existe tambm do lado oposto, essa vida que s vezes queremos esmagar em nome de
virtudes, que naturalmente supomos dever existir antes nos outros que em ns. Se tantos
timos princpios so infelizmente sustentados no mundo, por vezes calorosamente, isto
acontece, porque o homem conseguiu transform-los em armas de ataque contra o prximo,
na luta pela vida.
II
O chefe condutor de povos, deveria ser um tipo biolgico, mais evoludo que
a mdia, emergindo, portanto, da massa do povo, mas apto ao mando sobre ele, a fim de
dirigi-lo para metas superiores. Ele deveria ser como uma ponte entre a terra e o cu, pois que
deveria estar em contato com o pensamento e a vontade da histria, obrando como intrprete
seu e instrumento de execuo; e ao mesmo tempo deveria saber descer ao contato com a
massa do povo para conhecer as suas necessidades e cuidar de sua vida e progresso.
Apresenta-nos Maquiavel em seu Prncipe, uma figura que est nos antpodas
da que acima traamos, um tipo diablico, de astuto e prepotente, de falso e traidor,
aproveitador de tudo e desprovido de qualquer moral. Aproximemos as duas concepes
situadas nos antpodas. Certamente no pode negar-se que se Maquiavel escandalizou o
mundo, foi s porque mostrou desnudado o verdadeiro rosto de muitos chefes e a baixeza e
verdadeira natureza dos meios que eles usam para guiar a vida social. Maquiavel no quis
dar-nos um tipo ideal para ser imitado, porque nobre e belo, mas apenas quis verificar e
mostrar-nos a dura realidade. Como homem positivo, limitou-se o que esta lhe oferecia nos
fatos. Os governantes da terra, desde que existem governos, sabiam bem as doutrinas de
Maquiavel e bem o demonstra o fato de que muitas vezes as aplicaram. Mas eles tinham uma
moral, que consistia em ocultar os seus verdadeiros princpios, para dominar melhor os
sditos, escondendo seu rosto verdadeiro de lobos sob a mscara de cordeiro. E eles s se
insurgiram contra Maquiavel porque este lhes violara essa moral, expondo sinceramente a
triste realidade qual ela . Em ltima anlise, em seu livro O Prncipe, realiza Maquiavel um
ato de grande, mas de incmoda franqueza, descobrindo os segredos que movem o homem
que permaneceu lobo, que ainda funciona em cheio com as leis do plano animal, mesmo
quando sobe aos mais elevados planos de comando e s honras da glria de vencedor e de
chefe. Esse livro foi um ato de grande bom senso e um corajoso reconhecimento da dura
realidade dos fatos. E foi tambm uma grande bofetada no gnero humano, descoberto em
sua vergonha e ferocidade, tanto considerado na hipocrisia dos governantes, quanto na
imbecilidade das massas.
Sem falar nas leis biolgicas, sem dar-se conta das profundas razes pelas
quais ainda hoje se comportam assim o homem, sem estudar o modo de sair do pntano.
Maquiavel expe claramente, sem o querer, a natureza bestial do homem, porque essa era a
verdade que lhe caa sob os olhos. Nietzche estabelecia, no plano filosfico, os mesmos
conceitos que Maquiavel estabelecera no plano poltico. Tiveram ambos o merecimento de pr
a nu o que se esconde atrs da hipocrisia e a coragem de fazer aparecer o homem como fera
que . O mundo gritou, porque se viu descoberto; protestaram os poderosos porque se lhes
arrancava o nobre manto que lhes cobria as vergonhas, e assim se tentou tambm justificar a
velhacaria humana, mas dessa forma fez-se luz sobre a verdadeira natureza do ser humano e
sobre a importncia preponderante da luta pela vida em todas as suas manifestaes.
Apareceu assim, no condutor, a sua verdadeira face de dominador, qualidade sem a qual nem
sequer se podem fazer as grandes coisas. E o mundo dirigido por condutores e avana por
meio deles, sejam eles escolhidos pelas revolues, que desembocam no absolutismos
totalitrios, sejam, ao invs, escolhido pelo sistema eletivo nas livres democracias. Qualquer
que seja a estrada pela qual cheguem ao poder, os povos, para poderem progredir, deveriam
ser sempre guiados por um tipo biolgico mais adiantado que a mdia. Mas, infelizmente, os
fatos at hoje, do razo a Maquiavel e a Nietzche, porque o tipo biolgico do condutor tem
sido, com freqncia, o que eles descreveram. O mundo tem o instinto de ansiar como chefe
um ser superior, que pertena a planos biolgicos mais elevados do que o seu, que animal,
mas tudo permanece sonho vo, diante da dura realidade dos fatos, pelo que, para vencer e
dominar, indispensvel a fora, e para criar, mesmo no bem, mister que esse bem seja
imposto.
O chefe, como homem, pai de sua grande famlia que seu povo, como a
locomotiva de um trem, abre o caminho para a frente, diante do comboio. como o indivduo
escolhido, que guia as migraes das aves. Reis, imperadores, presidentes de repblica etc.
todos existiram e existem porque a vida precisa deles para cumprimento de uma funo
biolgica necessria, a da guia. Ao chefe, todas as honras, a riqueza, a obedincia. Mas a vida
no d coisa alguma para o nada, e o instinto dos povos o sabe. Essa homenagem no
gratuita para o chefe, mas apenas uma parte de um contrato bilateral, e por isso o povo exige
do lado oposto capacidade, justia, defesa. O povo obedece, paga as taxas, d seus filhos
para que a ptria os sacrifique em defesa prpria, mas quer ser pago de tudo o que d para o
bem de todos, com a ordem interna (defesa contra as minorias agressivas), com a garantia da
propriedade e da famlia, com sua liberdade nos limites do que lcito, com a defesa contra os
inimigos externos. A propaganda pode criar uma psicologia artificial a seu modo, mas apenas
dentro desses limites. Por mais que se alardeie que um povo navega na abundncia, ele
compreender sempre que ao invs o devora a misria; por mais que se lhe queira convencer
que ele vence, ele sempre perceber quanto perde.
Esta a realidade mais verdadeira, que se acha escrita no fundo das leis
biolgicas. Diante desses, muitos problemas polticos so questes de forma, modalidades de
superfcie, luta para que vena um homem ao invs de outro. Por trs de tudo est a realidade
biolgica, que o sustenta, explica e justifica, sempre pronta vir a tona dgua, saindo de sua
profundidade. Diante dela, o sistema representativo que a alguns parece hoje a panacia para
todos os males polticos, questo de forma. Ao contrrio, biologicamente, substituir ao
nico chefe de famlia, pai de seus filhos, uma assemblia eletiva de pais-de-famlia,
escolhidos pelos filhos, que deveriam ao invs obedecer ao pai, mais velho e mais sbio,
parece um erro. A vida se apega de preferencia ao princpio absolutista e totalitrio, que o
princpio teocrtico da autoridade, do poder absoluto, concedido ao melhor, que o pelo
prprio plano de vida ao qual ele pertence. Mas a vida faz tudo isso apenas subordinadamente
a uma funo, de que, depois exige o desempenho. As leis biolgicas concedem poderes
absolutos, mas experimentam e examinam o indivduo a cada momento, e os retiram logo que
este no os utilize para os devidos fins e trai assim a funo para a qual aqueles poderes lhe
foram concedidos. O sistema representativo, despersonalizando o poder, procura evitar essas
sanes ferozes. Os sistemas totalitrios e de poder absoluto presumem um chefe
relativamente perfeito. Sendo isto muito raro, eles se transformam muitas vezes em tirania ou,
por inaptido, em runa. Diante dessas perspectivas, resultantes de experincias bem duras
da histria, que nasceu a justa reao contra os governos absolutos e totalitrios. Mas, um
partido poltico, em pleno sistema parlamentar, se obtiver a maioria (que, com o sistema de
propaganda eleitoral e a inconscincia das massas, nunca se sabe se realmente corresponde
a uma vontade da nao) pode exercer a mesma tirania ou por inaptido levar mesma runa.
Por isso, Maquiavel nem sequer conta com a bondade de sentimento do povo,
e aconselha ao chefe basear-se mais no temor que possa inspirar, do que no amor. mais
seguro ser temido do que amado. O amor diz ele um vnculo que bem depressa
quebrado, por utilidade prpria, pelos homens que so malvados; mas o temor mantido pelo
medo do castigo, que jamais desaparece. Na mesma ordem de idias, desenvolvidas por
Nietzche, moveu-se Hitler, seu discpulo, em seu livro Mein Kampf und Leben, onde diz: O
terror no vencido pelo esprito, mas por outro terror igual. Pois bem, hoje a completa
derrota da Alemanha ensina a todos que crem no terror, que este no basta para vencer. Mas
haver algum que jamais tenha aprendido as lies da histria? Falou-se tanto de
impondervel, na ltima guerra, sem compreender que ele to pondervel que pode destruir
as naes, quando estas violam os princpios da Lei. Por esses princpios, logo que nasce um
terror, surge, por equilbrio, um contra-terror, e ambos tendem a matar-se reciprocamente,
para serem auto-eliminados. A Lei penetra tambm no mundo poltico, e a Lei consiste no
seguinte: quem faz o mal, o faz a si mesmo, e quem faz o bem, o faz a si mesmo. A religio do
dio um suicdio. A histria uma cadeia interminvel de vinganas e contra-vinganas, que
por isso jamais se resolvem e geram apenas um contnuo sofrimento. Torna-se indispensvel,
porm, uma humanidade mais inteligente e evoluda para compreender tudo isso. Pode haver,
em sociedades mais civilizadas, outras relaes, que no sejam as atuais de esmagamento
mtuo, que predominam nos planos inferiores da vida. Nos planos mais elevados, entram em
ao outras foras e outros elementos. Com a evoluo as relaes se tornam mais suaves, e
se aperfeioam, a vida se apura e pode triunfar de outros modos. S os primitivos acreditam
que se pode vencer apenas com a ferocidade.
Nos governos dos povos hoje necessrio um duplo trabalho: o terico, que
v ao longe, que descobre e indica a meta; depois o prtico, analtico, que realiza a ao. So
necessrias duas vistas, uma para os horizontes longnquos, outra para o contigente prximo.
A primeira revela os princpios universais, dando as grandes linhas de orientao; a Segunda
entra nos particulares, ocupando-se da atuao. A primeira a bssola; a segunda o leme.
Esta deve conhecer a verdade de Maquiavel, que est na realidade da vida, a outra deve
conhecer os conceitos-base, que explicam tudo isso e da qual tudo deriva. Um trabalho
exterior de atuao, o outro um trabalho interior de compreenso. Para agir, indispensvel a
mente que dirige e o brao que executa.
certo que na prtica, o xito de um homem poltico ser tanto mais fcil e
rpido, quanto mais se ocupar ele de resolver os problemas pequenos e tangveis que as
massas melhor compreendem. Essas, satisfeitas, aclamam-no ento. por esse xito
contigente que so atrados os chefes de menor alcance visual, porque vo pelo visvel e
imediato. Mas se esse triunfo pode nascer da satisfao dos desejos do povo, ignaro dos
grandes fins da histria, ele de efeito transitrio, proporcional ao valor do trabalho realizado.
Mas h outro xito, o de quem se dirige para as grandes metas longnquas da nao, mesmo
se no puder satisfazer, de momento, as massas. Este outro xito bem mais duradouro e
muito mais importante, porque, abarcando horizontes mais vastos e longnquos, e operando
realizaes maiores e mais profundas, proporcional ao valor do trabalho executado. Mas o
primeiro condutor ser apreciado imediatamente, e o segundo muito ao fim da vida ou depois
de morto, s quando essas coisas futuras tiveram podido realizar-se.
Os sditos sonham com um chefe bom, mas para explor-lo, agredi-lo, tirar-
lhe o poder; e s param quando o homem duro que Maquiavel nos descreve. Fala-se: o poder
deve servir para o povo. Mas que faz o povo para que o chefe seja bom? Agride-o ao primeiro
sinal de fraqueza. Diz-se que o poder entendido como explorao egosta do chefe, e no
como funo social. Mas como pode pretender-se o contrrio, quando sua primeira
necessidade a auto-defesa? Ir ao encontro do povo deve ser, pois, apenas uma bela frase.
Na realidade ocupao do que detm o poder deve ser defender-se dos rivais, que tendem a
agredi-lo, para tirar-lho. Mas o povo gosta do lindo sonho de crer que os governantes s tem
uma coisa a fazer: proteg-lo, pois est no poder por graa de Deus. To imensas
ingenuidades coletivas, que tambm sabem fazer-se to exigentes e ferozes, que chefes
podem atrair para si? Como pretender que uma corrente to universal, sejam eles diferentes
do tipo dominante? intil inventar sistemas, quando o nvel mdio da raa humana o que
.
E se o chefe deve ser assim feito, como pretender dele aquele comportamento
ideal, que a negao da realidade da vida, tal como ela hoje no mundo humano? Deste
modo, o homem chega ao poder emergindo das camadas sociais inferiores, com seu esforo
e risco, contra todos. Com isto, quer ele satisfazer a seu instinto de subir, seu anseio de
poder, de riqueza, de grandeza. Quando chega assim, vencendo aps dura luta, como poder
transformar-se em outro homem e seguir outro sistema? Como poder deixar de pensar, em
primeiro lugar, em gozar o merecido prmio de seus esforos e de sua habilidade? Mas, dado
o que ele , faz-se natural que utilize o poder antes de tudo em sua vantagem e satisfao,
procure defender-se dos seus inimigos e submeter os seus semelhantes, porque so estas as
necessidades que a vida impe, e no h outro meio de reforar aquilo que pedestal do seu
poder. Como pode a luta pela vida desaparecer logo no vrtice da pirmide social? E como,
num mundo egosta, poderia ser o poder algo diferente de uma afirmao do eu, que se impe
no ambiente social para dominar todos? Tudo isto um derivado lgico da estrutura do
sistema psicolgico que dirige a humanidade. Sem dvida, que deveria ser diferente, e caro se
pagar o ser assim. Mas enquanto o homem pensar desse modo, as coisas no podero ser
diferentes. E a psicologia da fora no pode ter como resultado seno traio, iluses e dor.
Quem est de fora, fica a olhar de estmago vazio. Quem pertence a planos
biolgicos mais evoludos se surpreende de ver que, diante de um poder exercido como
explorao e esmagamento e no como misso, no se rebelam os povos. Mas se isto
injustia feroz nos planos superiores da vida, coisa normal nos inferiores. Nestes, justo
que os povos escravos, que no tm fora, no se rebelem contra os dominadores. As
massas dominadas sabem que os fracos no tm direitos contra os mais fortes, e que por
isso tm de calar. Sabem que no merecem a vitria, porque no conseguem impor com a sua
prpria prepotncia, e que por isso tm de suportar. Sabem que, segundo a lei de seu plano,
os fracos sero justamente esmagados at aprenderem a ser mais fortes. Com efeito, s
agora, quando as massas, por sua organizao, aprenderam a fazer-se valer, que os
dirigentes as tomam em considerao. Assim os deserdados sofrem, no porque aceitem,
mas porque esperam uma ocasio para fazer pior, pois a lei dos vencedores e dos vencidos
a mesma: a do mais forte. O problema um s para todos: vencer esmagando.
Dir-se-: Mas o mundo foi sempre assim. No. O progresso um fato real. O
homem pr-histrico, podemos bem imagin-lo, foi na poca o modelo da raa humana. Se
estabelecermos uma proporo, podemos imaginar o homem futuro. Ento diremos: o homem
pr-histrico est para o homem de hoje como o homem de hoje est para X. ser fcil, dada a
relao, achar o valor da incgnita. No afirmao gratuita dizer que a forma da seleo
animal ter que mudar no porvir. Sem dvida, at hoje esteve no sentido de produzir o tipo
mais prepotente, porque isto era indispensvel para conquistar o domnio do planeta,
mormente sobre as outras espcies. Mas, conquistado esse domnio, surge na terra outro tipo
de vida, a vida social do homem coletivo, pela qual as qualidades de fora, ferocidade e
agressividade, outrora preciosas, se tornam cada dia mais contraproducentes, pois
desagregam a primeira qualidade de uma comunidade, que dever ser a organicidade.
natural ento que a vida, que to sbia, renove os seus mtodos de construo do tipo
biolgico melhor, atravs da seleo, e lance ento uma nova tcnica. O melhor que a vida
querer ento produzir ser outro tipo biolgico, em que predominar a inteligncia, pois num
mundo mais evoludo vencer-se- mais com a inteligncia do que com a fora. Hoje j se
guerreia mais com a cincia que com a ferocidade. J comea a desenvolver-se mais essa
inteligncia, e quanto mais se desenvolver, mais se compreender a vantagem utilitria de
todos e de cada um, de ser honestos fraternalmente, como o quer o Evangelho, pois numa
humanidade orgnica, esta ser a linha de maior rendimento. Por isso, Maquiavel ficar com
suas doutrinas, atrasado no tempo, como o hoje o homem das cavernas. Mas as geraes
futuras compreendero melhor estas coisas, pois para elas, principalmente, foram escritos
estes livros.
Aos que gritam que utopia, respondemos que muitas vezes os jovens tm
feito o que os velhos julgavam impossvel, inoportuno, desaconselhvel; respondemos que o
mundo, a despeito de todas as resistncias, caminhou sempre, e que freqentemente a utopia
de hoje a realidade de amanh. A intuio d-nos a sensao viva imediata da presena de
uma inteligncia e vontade na histria, como momento da imanncia de Deus no mundo. Aos
historiadores presos apenas ao fato exterior, aos filsofos hiper-crticos e cticos, capazes de
destruir at seu pensamento fora de discusses, controles e anlises, opomos a nossa
percepo da realidade do mundo interior do esprito, presente em toda a parte, em todo
fenmeno, mesmo no histrico e social. Procuramos fazer com que o leitor sentisse essa
realidade na nica forma possvel, ou seja, atravs da lgica e da demonstrao racional.
No plano de vida que Maquiavel descreve, o que ele indica a lei, a regra, a
justia. Em seu orgulho, o homem se auto-declara ser superior, ltima finalidade da criao, a
mais bela flor da vida no planeta. Mas devia tudo isso ao ter sabido triunfar a despeito de tudo
e de todos, exterminando os inimigos sem bondade nem piedade. Os idlicos pensadores do
ideal afirmaram que Deus criara todas as coisas apenas para prazer do homem. Na realidade,
o homem s conseguiu possuir aquilo que pde arrancar vontade inimiga; usando todos os
meios. A vida s se inclina e oferece regalias diante do homem forte, violento, vencedor. Nada
gratuito diante dela. Nenhum escrpulo ou piedade a impediu de condenar extino raas
mais fracas. E t-lo-ia tambm feito com o homem, fora ele menos forte e violento.
Continua Maquiavel: O chefe deve manter fidelidade enquanto lhe for til, e
deixar de observ-la quando terminadas as razes que o fizeram prometer. No seria
necessrio isso se os homens fossem bons. Mas, sendo maus, da mesma forma que eles no
manteriam fidelidade, assim no deve o chefe mant-la com eles. Assim Maquiavel aconselha
a astcia, pela qual saiba o chefe, com razes legtimas, colorir a no observncia dos
pactos. Eis como se comporta o involudo. Sua miopia psquica ou imbecilidade f-lo
acreditar que a traio, como a ferocidade sejam foras. Em outros termos, em sua ignorncia
das leis da vida, levado a procurar o poder preferindo descer aos planos biolgicos
inferiores (isto , ao inferno), em vez de subir aos planos superiores (ou seja, o paraso).
Quanto seja tola essa crena, deduzimos do fato de que, mesmo aplicando esses critrios a
seu prprio comportamento, continuaram chover sempre derrotas e desastres sobre o gnero
humano. Isso prova que esse sistema no resolve absolutamente nada. O poder est no alto e
no em baixo, e a apenas iluso e dor. Por isso, encontra-se hoje a humanidade numa
encruzilhada: ou ela compreende que o problema da convivncia, na forma menos dolorosa
possvel, s pode ser resolvido aplicando o mtodo do Evangelho, por mais que parea
utopia; ou ento continua indefinidamente o atual estado infernal. Mas, no h dvida, a
soluo uma s: tanto durar e martelar esse tormento, que h de o homem um dia
compreender e decidir-se a civilizar-se. No h outra hiptese. A presena destes sofrimentos
justamente justificada por isso, e tem por fim levar o homem a achar o caminho para sair
deles, evoluindo para um plano de vida mais elevado.
Nada se perde em olhar com coragem a realidade biolgica tal qual ela
verdadeiramente. Maquiavel tem razo, mas no podemos deter-nos a, s com esse trecho
limitado do terreno explorado por ele. Aquele mundo, observado assim isoladamente, e aceito
como verdade nica, e no como fase de evoluo, no suficiente para, sozinho fazer-nos
compreender a sabedoria da vida, que sbia mesmo nas suas fases involudas, e tende para
o que melhor, utilizando, naturalmente, os meios do plano em que opera no momento.
Maquiavel escandaliza-nos, porque aceita e sustenta o involudo, e nada nos explica. Mas a
vida no nos escandaliza nada, porque conhecemos seus mtodos e fins e sabemos onde
tudo ir acabar. Temos de admitir que, num plano primitivo e feroz, a luta pela vida no pode
assumir outra forma, em vista de ser o homem o que , forma que mais tarde, ao evolver,
parece tola e contraproducente. A vida quer viver, e nos planos inferiores s pode viver
assim. E nesse nvel, isso justo e equilibrado. Mas logo que se suba, como comea a faz-lo
o homem de hoje, percebe-se a injustia daquilo e sente-se o escndalo, porque os pontos de
referncia foram colocados mais no alto. Para o animal, que ainda amoral, sua lei de bicho
lei justa. preciso olhar tudo isso de frente, corajosamente, como faz Maquiavel, mas do
ponto mais alto, abarcando horizontes mais vastos, pois s assim se pode compreender tudo
e permanecer-se orientado. E ento evitaremos protestos inteis de pessoas, ofendidas pela
nudez da crua verdade e, ao contrrio, admiraremos a sabedoria da vida, isto , do
pensamento de Deus, que de tal estrumeira sabe tirar a flor de amanh, do mal o bem, e da
ferocidade, a ascenso.
Isto porque o animal tambm ascende. E isto ocorre por meio das foras
disponveis em ao em seu plano de vida, sem necessidade do concurso de utpicos
sentimentos de bondade e altrusmo, que intil pedir e ingnuo esperar naquele nvel. Mais
de que elemento de transformaes, invocado em vo, so eles, pelo contrrio, o ponto de
chegada de novo trecho percorrido no caminho evolutivo, so o resultado do embate das
foras pertencentes ao plano inferior.
Tudo lgico, claro, em seu lugar justo. A luta um exerccio com finalidade
seletiva; o esforo para evolver o pagamento devido pelo homem, dvida que ele contraiu
com a queda (veja o volume Deus e Universo), que o preo de seu resgate. A dor uma
escola salutar para aprender a eliminar o erro. E quanto mais se sofre, mais se aprende; e
quanto mais erros se eliminam, mais a dor diminui. Ao invs de colher escndalo e
pessimismo da leitura de Maquiavel nasce aqui um hino a evoluo e sabedoria da vida. O
homem no est ainda maduro para conceber e exercitar o poder como funo social, para o
bem coletivo. Governantes e governados tm todos conceitos diferentes. Exercita o poder
quem venceu na luta e o exerce para sua vantagem, dominando o povo. S essa vantagem
egostica e imediata explica a luta de tantos para atingir os postos de mando. De fato, o poder
no gera colaboradores, como deveria, e como aconteceria num plano superior, mas inimigos
e rivais; requer fora, e o prmio egosta para o mais forte e no um servio reconhecido
pelos governados que o aceitam com gratido.
O NOVO HOMEM
Quando vem viver na terra algum exemplar raro do tipo biolgico do santo, ou
de algum que a isso tende, verifica-se um espetculo que relembra o da descida dos mrtires
inermes jaula dos lees. Ele desce ao mundo que Maquiavel ps a nu, com cruel verdade,
como vimos nas pginas precedentes. Observemos. Que acontece com o cordeiro quando
desce entre os lobos? Este, naturalmente comeam a rode-lo, farejando a presa. Num mundo
cuja maior atividade consiste em viver dilacerando o prximo, porque esse trabalho que a
seleo impe no plano animal, a primeira manifestao da vida representada pela
agresso. Em vista dessa psicologia base, comeam os lobos a farejar, a fim de conhecer a
fora do inimigo, para calcular se convm realizar o esforo de agredi-lo, de maneira que seja
compensado pela segurana da vitria. Esta a principal forma de atividade, no plano em que
vive hoje o homem, tanto como indivduo, quanto como povo. Intil, pois pensar na abolio
da guerra enquanto a maioria humana continuar a pertencer, prevalentemente, ao mundo
animal.
Ento o pobre pssaro exilado chorar sua bela ptria longnqua e dir que
um crime produzir filhos porque lhe duro demais viver assim. No entanto, para os peixes,
nascidos em seu ambiente e a ele proporcionados, a vida pode ser a coisa mais adequada at
bela. Assim, para os seres do tipo comum corrente, a vida terrestre, feita de mentira, de luta
feroz, de dores contnuas, pode ser o necessrio. Poderamos perguntar, com efeito: se estes
homens no tivessem to desgraadas ocupaes, que saberiam fazer melhor do que isso? E
como tirar-lhas se, sem elas, s saberiam morrer de tdio ou destruir-se com toda a espcie
de abusos? Se no houvera esse freio de tantas dificuldades na terra, quem moderaria sua
insacivel sede de gozos? Se no houvera o recproco assalto contnuo, quem arrancaria o
homem sua preguia, para obrig-lo a evoluir?
Vimos que Maquiavel nos descreve o mundo inferior dos peixes, sem
conhecer o dos pssaros. Ele tem razo, entre os peixes. Mas entre os pssaros, erra. Quando
nos diz que mister mostrar-nos externamente virtuosos, mas que perigoso s-lo de fato,
permanece fechado nos limites de um mundo inferior. necessria muita ignorncia das leis
da vida para errar tanto, e muita insensibilidade para suportar as reaes da Lei ao erros que
so assim perpetrados. Mentir esforo; indispensvel sermos dotados do instinto da
mentira, isto , sermos ignorantes e involudos, para suport-los. Tudo sacrificar em troca de
vantagens efmeras de um mundo inferior coisa triste, e s almas ignorantes, capazes de se
iludirem, podem fazer to mau negcio. muito triste viver e agir assim, sem uma meta mais
alta e mais segura, que nos garanta a conquista de valores que no sejam mentira, como na
terra. Logo que progride um pouco, precisa o homem de um po mais nutritivo. Chegar a ser
exmio na arte de enganar o prximo no pode satisfazer nenhuma conscincia bem formada.
O homem fica imensamente mais satisfeito e consegue resultados muito maiores, ao
contrrio, se conseguiu compreender uma lei completamente diversa do princpio de
Maquiavel, ou seja: quem faz o bem aos outros, o faz a si mesmo, e quem faz o mal aos
outros, a si mesmo o faz. Aqui j samos do mundo dos peixes e entramos no dos pssaros.
Mas tudo na terra quer ficar no primeiro desses dois mundos, e todo o universo visto, na
terra, desse ponto de vista e reduzido aos termos desse ambiente.
Esta a contoro que tem que sofrer o princpio da virtude, para descer
terra, no campo em que se debate o problema da conservao individual. Nada disso
ocorreria, na aplicao da virtude, o homem amasse o seu prximo, isto , levasse em conta
os direitos que tambm seu semelhante tem vida, respeitando-o, ao invs de servir-se da
virtude alheia para dominar. S h uma soluo para o problema: a de fazer viver, ou melhor,
a de ajudar todos a viver. O homem quer, antes de tudo, viver. Se isso pode desagradar ao
inimigo, que ento o condena, no por certo culpa, diante de Deus. Em nosso plano, quando
algum quer sufocar-nos no direito de viver e nos asfixia tirando-nos o ar, o espao e aquilo
que necessitamos. Deus no desce a ajudar-nos diretamente, mas faz atravs de nos mesmos
e diz-nos: defende-te, ajuda-te, porque o esforo de defender a nossa vida deve ser nosso.
Se esse o abuso que se pode fazer, das normas que pretendem regular a
vida humana, no se pode negar sua utilidade como normas de vida para a maioria, e quo
grande conhecimento da natureza humana elas exprimam, em vista dos instintos animais de
revolta e luta, de egosmo e avidez do tipo biolgico dominante, qualidades que aquelas
normas presumem nele. Elas so feitas para a maioria no nvel animal. Para uma minoria mais
evoluda, em que os instintos j esto transformados, certas normas podem no ter sentido e,
se aplicadas a personalidades fracas, podem at provocar complexos de inferioridade. um
fato positivo que o ambiente terrestre representa uma fora, tem suas leis e seus direitos.
Quando o cu desce terra, para aqui enxertar uma vida nova, tem que levar em conta tudo
isso, deve suportar o choque da reao por parte das foras ativas neste ambiente. Aqui,
onde reinam os princpios de vida de um plano inferior, o santo aparece como um intruso e
um violador. S pode ser um mrtir destinado destruio, um utopista tolerado apenas
enquanto no agride nem prejudica e, depois da morte, enquanto dele se pode tirar proveito.
Se olharmos bem, poderemos ver que a exaltao que se faz a tantos grandes homens, pode
s vezes ocorrer tambm em funo de sua capacidade de ser explorados. Seria possvel que
o tipo biolgico involudo, como , exalte outro homem se isto no lhe servir para qualquer
vantagem sua egostica? No dizemos que tenha que ser o dinheiro. H tantos desejos e
tantas vantagens na terra! Como poderia ser diferente num mundo em que cada posio, pela
necessidade de uma luta universal sem trguas, h de transformar-se numa trincheira ou
refgio, para ataque e defesa? Ento, a prpria posio social, qualquer que ela seja, pode
representar o castelo do ataque e da defesa, pois o involudo sabe que o animal sem toca,
est perdido.
A vida no pode oferecer em cada plano uma perfeio maior que aquela que
pode suportar naquele plano. uma me que ocultamente e to misteriosamente nos protege,
que por vezes nos parece cruel. Mas, nada faz ela no vcuo, inutilmente, sem finalidade
benfica, mesmo quando nos faz sofrer. Verificando estas lealdades, apenas contemplamos
os erros dos planos inferiores, ou seja, os mais afastados de Deus. Mas isto nos leva sempre
em direo ao centro, Deus, e faz-nos ver como, com sua sabedoria, Ele permanece sempre
presente, mesmo nesses planos. A natureza justa quando, dando a todos uma arma para
defender-se, quer que todos vivam. A quem mais no tem, d a fuga ou a mentira. quando
ns, escandalizados, quisermos em nome de uma lei mais alta que ainda um absurdo
nesse plano tirar ao indivduo a nica arma que ele tem para defender sua vida, podemos
perguntar-nos se temos o direito de despoj-lo daquela sua nica proteo, impondo-lhe
renncias, sem antes lhe garantir pacificamente o que aquela defesa queria defender. A
desobedincia a uma verdadeira chamada do Alto para nos elevarmos , sem dvida, um erro
que se paga. Mas a resistncia contra a tentativa de estrangulamento da vida, ainda que feita
em nome do ideal, legtima defesa que a vida impe ao homem, atravs do instinto.
difcil dar normas particulares para a aplicao dos princpios em cada caso
prtico. necessrio ver, caso por caso, levando em conta sobretudo o tipo biolgico a que
tudo isso se aplica. A maioria involuda precisa da virtude imposta e do terror do inferno,
porque, sem o imprio de uma autoridade, e sem o medo da prpria condenao, nada de
bom faria. Mas, para os mais evoludos, esses mtodos so inaceitveis e produzem o
afastamento da f. Tudo o que se faz na terra, feito em relao e proporo s qualidades
dominantes da maioria. s minorias compete apenas adaptar-se, num mundo que no feito
para as suas medidas. Ainda aqui o mais forte que vence, sendo a fora, neste caso,
representada pelo nmero.
Tudo luta pela vida, de todos contra todos. Tudo na terra pode ser
transformado de bem em mal. Assim, a defesa dos princpios pode, ao invs, constituir de fato
uma busca de proslitos, sobre os quais mais tarde se possa elevar o prprio trono, e
transformar-se desse modo na caa aos mais sugestionveis e fracos. Estes, por sua vez,
aceitam os princpios para achar um refgio, um po, uma defesa. Quantos vezes uma
profisso de f pode servir para resolver o to difcil problema da vida! Esse problema o que
todos bem compreendem, e que a realidade impe que compreendam. Mas ter uma f, crer,
talvez uma ato em que poucos esto em grau de compreender totalmente, e que, para eles,
tem valor relativo ao passo que aquela realidade tem, para eles, um valor muito mais real e
tangvel. Tal a vida, que uma luta muito dura para todos, para que posam permitir-se o luxo
de uma f que pese. Aceita-se uma f que ajude, mas no h margem para uma f que onere.
As necessidades materiais so espicaantes, as grandes verdades esto longe, os cus so
difceis de escalar, s os fortes , os inteligentes, os bem dotados e afortunados, pode permitir-
se ter uma personalidade prpria e imp-la. Muitas vezes, misria material soma-se a
misria espiritual, incapaz de qualquer coisa.
1
- Personagem do romance Os Noivos, de Manzoni. (N.T.)
s da compreenso do estado real das coisas pode nascer uma tentativa de remdio e uma
esperana de um futuro melhor. Atravs destes volumes, pedimos prpria voz da vida nos
expusesse suas leis, ou seja, uma moral biolgica que racionalmente mostre sua razo de ser
at aos pormenores e at s suas razes. Honestamente, temos que ser utilitrios como a
vida, secundando-a nesta sua caracterstica fundamental. Jamais devemos agredir, nem
mesmo em nome da virtude, se no quisermos oprimir e ser causa de revolta. Trata-se de nos
tornarmos mais inteligentes. Tanto que chegamos a compreender qual o nosso interesse, e
assim estancar a intensiva produo de tantas dores, que por meio de sua ignorncia o
homem provoca em seu prejuzo. Quisemos apelar apenas para a razo e a vantagem
egostica, evitando qualquer ternura, sentimentalismo de f, apelos a ideais que podem
parecer utopias. Desse modo no se poder dizer que no conhecemos a vida e que somos
sonhadores idealistas. Ao contrrio, quisemos ficar desumanamente apegados ao terreno
positivo da crua realidade biolgica. Ela dura e assustadora. Mas agora a conhecemos sem
iluses. Pois bem, agora podemos concluir: nessas bases se elevar a civilizao futura,
como do estrume faz Deus nascer os frutos e, da lama, uma flor. Isto porque o progresso lei
de vida, isto o que quer a hora que vivemos e isto que nos diz o estudo positivo que vimos
conduzindo at aqui.
Eis o que deve fazer o novo homem, eis como deve conceber a vida. Colocou-
nos Deus os olhos frente para ir adiante e no para retroceder. O problema refazer o
homem, e a hora soou. No se pode chegar renovao da sociedade, j o dissemos, seno
atravs da renovao de cada indivduo. intil gritar que utopia. Os tempos esto
maduros. Para quem no queira renovar-se, h a possibilidade de ser definitivamente
eliminado da vida. O novo mundo veloz no pode caminhar na estrada dos velhos mtodos e
conceitos. Quem compreendeu que a lei da luta e da seleo do mais forte impera na terra,
sabe que o choque entre as duas grandes potncias que hoje sobraram inevitvel, e que,
portanto, no se pode escapar a uma destruio gigantesca. Dada a estrutura psicolgica
humana atual e os meios blicos hoje j preparados, uma fatalidade de que se tenha que
concluir desse modo. Isto est implcito no sistema social-poltico hoje vigente no mundo.
Este, ento, se encaminha para ter que compreender fora e atravs da dor, que tem que
renovar-se. Ento, a humanidade melhorar, porque os piores tero se destrudo mutuamente,
e a dor ter aberto a inteligncia dos sobreviventes. Nada desenvolve tanto a inteligncia
como a dor. Estamos s portas de grandes transformaes. Renovam-se os tempos e j
passou a hora da aceitao passiva e da cega repetio por inrcia, dos tradicionais
conceitos do passado. Quem em primeiro lugar se encaminhar para a renovao, quem
souber caminhar mais rapidamente pela novas estradas da vida, este que estar mais pronto
para entrar no novo mundo que nos espera, esse que ter mais probabilidades de ser salvo,
porque ele representar o novo tipo biolgico selecionado pela vida, com o qual esta, por lei
de evoluo, querer construir a mais adiantada humanidade do porvir.
IV
Tanto nos pases livres como nas ditaduras, a realidade biolgica, feita de luta
desapiedada de todos contra todos, sempre a mesma. Em qualquer parte o peixe maior
come o menor, o mais forte esmaga o mais fraco. A mesma coisa feita em nome dos
princpios e ideais mais diferentes. Por vezes pode reduzir-se a liberdade para os mais fracos,
os vencidos, apenas liberdade de morrer de fome. So gigantescas e tremendas coligaes
de interesses que regem o mundo. Acusa-se justamente o comunismo de explorar os
instintos rapaces das massas, mas isto prova que as massas j tem esses instintos em sua
alma. Eis uma qualidade em que, tanto no alto como em baixo, muitos homens so
verdadeiramente iguais. Eis onde est a igualdade humana para todas as raas: ilimitada
cobia. E no entanto, possvel, no mundo econmico, morrer no de fome, mas tambm de
indigesto. Quando caminhamos com tais mtodos, o prprio aumento da produo deveria
produzir abundncia e bem estar, oferecendo tudo a menor preo, aumentando o consumo e
elevando o nvel de vida. Mas ento a mercadoria se desvaloriza, valoriza-se e desaparece a
moeda, e os produtores, para salvar-se da queda dos preos, no produzem mais. Ento, para
elevar os preos, eles chegam a queimar a mercadoria. E assim, com o sistema do egosmo e
da avidez, chega-se ao absurdo, isto , que enriquecer com maiores bens mediante o trabalho
no uma vantagem, mas um prejuzo. No se chega ento ao bem estar, mas crise. E, no
entanto, no nos damos conta de quanto isto seja providencial. Se as leis da vida tendem a
nivelar o homem mais num plano de misria que de riquezas, acontece isto como
conseqncia automtica da psicologia de abuso que rege o mundo econmico; e um bem,
porque esse homem no deve possuir o poder econmico, dado que s saberia fazer dele
pssimo uso, em seu prejuzo.
At aqui estamos diante de valores reais, ainda que de carter diverso, desde
que no possvel comer ouro, ao invs de gro. Reais, pois haver sempre quem aceite, nas
trocas humanas, ouro em troca de outra mercadoria. Mas o homem no parou aqui. Esses
metais preciosos foram transformados em moeda cunhada, em que eles eram unidos a ligas
de outros metais de valor menor. Depois para subtrair essas moedas deteriorao e ao
perigo dos desvios, substituiu-se-lhes o papel-moeda, ao qual, ao menos em teoria, deveria
corresponder uma equivalente reserva de ouro. Assim, tudo se foi transformando,
substituindo-se cada vez mais valores fictcios e convencionais ao primitivo de utilidade
imediata. Isso tudo principalmente porque o poder poltico se apossou deste terreno para seu
uso e consumo. Pde chegar-se assim a valores nominais a que bem pouco corresponde de
real. Na luta econmica universal, a interveno estatal pde com isso coagir a seu favor os
equilbrios naturais e alterar ao valores reais. Desse modo, em pleno regime de tanta liberdade
trombeteada, a interveno estatal paralisou o jogo da oferta e da procura. Por isso, a
violao dos equilbrios, que naturalmente se formam num regime de liberdade econmica,
conduz a regimes econmicos falsos, a inflaes monetrias, a crises contnuas, delcia de
nossos tempos. . .
Deveria haver equilbrio e unio entre os dois termos: bens e moeda, para que
fecundassem em colaborao com a vida humana. Ao invs, eles se combatem e afugentam
mutuamente. Deveriam estar abraados, e ao contrrio so rivais. Quando um precisa do
outro, este o abandona. H luta e anttese entre bens e moeda, pelo que, quando os bens
abundam no mercado, a moeda desaparece; e ao contrrio esta sai a procurar
desesperadamente os bens, quando estes escasseiam, por qualquer motivo. Acontece assim
que, quando os armazns esto cheios, os bolsos aparecem vazios; e quando os armazns
esto desprovidos de mercadoria, ento os bolsos mostram-se cheios.
Eis, ento, que o sistema, ao invs de conter foras que tendam a rep-lo em
equilbrio, resulta das foras que tendem a ampliar e agravar sempre mais o desequilbrio. Em
outras palavras: ao verificar-se uma descida dos preos, o produtor ou o possuidor da
mercadoria, temendo sempre maior desvalorizao da mesma, ao invs de retir-la do
mercado, principalmente se deteriorvel, levado a satur-lo sempre mais, aumentando seu
depreciamento e a revalorizao e fuga da moeda. De outro lado, no caso oposto de aumento
de preos, o consumidor ou possuidor da moeda, temendo sempre maior escassez de
mercadoria, pelo medo de ficar desprevenido do necessrio, ao invs de retirar o dinheiro do
mercado, levado a lan-lo a cada vez mais, aumentando assim seu depreciamento e a
valorizao ou aumento de preo das mercadorias. Ento a posio de desequilbrio inicial,
em que se baseia e surge o sistema, arruina-o, e consome-o todo at o fim. Os impulsos dos
dois egosmos que contrastam, tendendo a sobrepor-se e a eliminar-se, porque um quer
vencer esmagando o outro, no podem dar-nos um equilbrio entre eles como dois pontos
eqidistantes, mas apenas um constante acavalar-se de desequilbrios e um agravamento de
crise, pelo fato de que eles procuram ao contrrio resolver seu embate s com a vida de um,
pondo como condio a morte do outro. por isso que, logo que se verifica um desequilbrio
inicial, todo o sistema tende a ampli-lo e agrav-lo, ao invs de resolv-lo. Mas, dada a
psicologia anticolaboracionista em que se funda nossa economia, ela s pode ter uma
fisiologia cancerosa, s pode ser economia de crise; como o de fato.
***
Ao verificarmos isto, uma coisa nos surpreende: ver como, apesar de tudo, o
organismo social tenha podido sobreviver. Parece que os recursos primrios da vida tenham
sido calculados de modo que pudessem resistir a todos os assaltos destruidores. O
organismo social sobrevive, mas mister verificar quando dores custam humanidade tais
erros. Entretanto, a ignorncia e a insensibilidade humanas parecem proporcionadas s
dores. E assim, o sofrimento constitui uma das principais ocupaes do mundo.
Tudo o que existe vivo, e a cincia no sabe o que seja a vida, porque esta
o princpio espiritual que anima tudo e que a cincia ignora. Assim, tudo o que existe um
organismo a funcionar, que traz escrita nele a sua lei. Quem se afasta dessa ordem, a ela volta
reconduzido pelo sofrimento. Ningum nega o valor dos novos meios diagnsticos e
teraputicos. Entretanto, muitos progressos no particular so anulados em parte, pela
desorientao no conjunto. Alm disso, errada a psicologia espiritualmente anrquica, de
que eles se valem, com a pretenso de tomarem o lugar da ordem natural e de dobr-la
vontade humana. Vem isso como conseqncia do princpio to instintivo e axiomtico, da
luta pela vida, que a cincia inadvertidamente usa, sem discuti-lo; e, no entanto, quanto mais
se eleva algum em conhecimento, mais deixa ela de ser imposio pelo domnio, e se torna
adeso, em obedincia a uma sabedoria que j est atuando na vida. Princpio da luta que
pertence aos planos mais baixos da vida, onde ecoa ainda mais viva a posio luciferiana da
revolta ordem de Deus, posio psicolgica que leva a cincia a tornar-se, no meio de
civilizao e bem-estar, mas antes de tudo instrumento de destruio blica.
Doutro lado, como impedir, dada a psicologia dominante, que se forme sobre
ela uma indstria farmacutica que satisfaa esse estado de nimo? natural que a procura
provoque a produo e a oferta. Aparece assim no mercado, um acervo de produtos j
confeccionados para cada tipo de doena. Desse modo, prescindindo das particulares
condies do enfermo, acha-se automaticamente pronto o remdio. E porque tudo seja
acessvel a todos, mesmo s classes menos favorecidas, mecaniza-se a vida em servios
simplificados e administrados em srie. Essa industrializao , na verdade, economicamente
rendosa e mais realizvel, porque praticamente mais fcil, mas no , sem dvida, o meio
mais apto finalidade de curar. Todavia, como se v, existe uma cadeia de exigncias de todo
o gnero; dessa forma, elas so satisfeitas, e assim explica tudo. H somente um pequeno
erro. A soluo do problema da sade fsica e espiritual, problema nico, no pode alcanar-
se por esse caminho. A sade no se conquista com o produto farmacutico, mas com um
regime so de vida, fornecido pela compreenso de suas leis e a obedincia a elas. A sade
um estado de equilbrio que s pode ser conquistado pelo esforo do autodomnio, para
manter-nos disciplinados na ordem, tanto espiritual como material. E uma medicina enferma
de analitismo, de microbismo, de laboratorismo, etc., no poder de modo algum, por meio da
indstria farmacutica, realizar o milagre do absurdo de curar um pblico de doentes
desorientados, ignaros das regras do sadio viver.
***
Essa reao tem a sua razo de ser, sua estrutura, seu ciclo, sua durao, seu
individual tempo interior, sua soluo. A natureza viva , sem dvida, inteligente e finalstica,
tendendo prpria conservao. natural, ento, que em tais processos reativos realizem
operaes de acmulos, de transformao, de eliminao de substncias txicas, de detritos
celulares, operaes que s os micrbios podem realizar, porque a eles que, no terreno
agrrio como no animal, est confiada a funo desintegradora das substncias
desvitalizadas. So eles ento atrados, como por uma chamada, acorrem e realizam sua
funo auxiliar e integradora, pela soluo do processo morboso. Assim como os micrbios
do terreno se lanam sobre as matrias em decomposio, para transform-las e torn-las
assimilveis s plantas, assim tambm os micrbios que se acham incuos, espera no
ambiente ou em ns, quase que sentindo a presa, se lanam sobre as matrias em
decomposio que se acumularam, para transform-las e elimin-las.
Ento, no o micrbio que atenta vida celular, mas a clula organizada
que, desorganizando-se, decompondo-se e dissolvendo-se, permite ao micrbio viver e
cumprir sua funo csmica proteoltica. Nada h de funesto e mortal nas coisas da natureza.
A doena muitas vezes uma experincia de salvao e a morte a passagem a outra forma
de vida. As prprias doenas epidmicas, como peste e clera, so conseqncias da
resposta do organismo s causa patognicas. Assim no fora, numa epidemia deveria perecer
a totalidade.
Cada princpio espiritual (no sentido mais amplo, de princpio que anima
qualquer forma de vida), tem seu tipo biolgico ao qual ele est proporcionado, em que possa
encarnar-se, e no qual acha sua adequada expresso e gnero de experincia adaptada,
necessria para sua evoluo. Quanto menos evoludo for esse princpio, tanto mais
elementar ser sua veste corprea, descendo no mundo animal at ao vegetal, at ao mineral
(cristais) e atmicos. Mas quanto mais se desenvolver esse princpio, tanto mais tender a
superar a expresso de forma humana e a emigrar em ambientes onde lhe ser possvel
construir para si uma habitao mais perfeita, adaptada ao seu novo desenvolvimento e ao
seu gnero de experincias, necessrias a ele para continuar a evolver. Mas esta uma cincia
que aprendida gradualmente e que no pode ser usada seno quando conquistada por
merecimento. Recordemos que os fatos nos mostram reinar no universo um princpio de
ordem, segundo o qual, apesar de todas as revoltas, cada coisa est contida em seu devido
posto, nos limites que lhe dizem respeito. Mesmo se, em casos particulares, pode ocorrer o
contrrio, nos princpios diretivos reina inviolvel a disciplina.
***
O fato de que o cncer aumenta proporo que nos afastamos da vida sadia
segundo a natureza, numa sociedade tambm espiritualmente corrompida, o fato de que ele
aumenta com a corrupo desta, faz pensar que o cncer seja o resultado de um
desconjuntamento dos ritmos vitais e exprima um estado patolgico de todo o complexo
humano. Seu modo de comportar-se faz pensar, de acordo com a lgica que at aqui
desenvolvemos, em um relaxamento do poder diretivo central, que espiritual e, por
conseguinte, um regresso involutivo dos elementos que compem sua veste corprea.
Significa isto que algumas clulas escapam assim disciplina que as dirige, e por
conseguinte, recaem em sua fase involuda e desorganizada de reproduo indisciplinada. A
ordem uma conquista da evoluo, como o o entrosar-se em unidades mltiplas coletivas,
que aquela ordem aceita em sua construo. E a clula que escapa a um poder central
coordenador s pode ter sua diretivas individuais, uma independente da outra, sem
capacidade para formar qualquer estrutura orgnica. No caso do cncer, achamo-nos ento,
no mesmo indivduo, diante de duas unidades biolgicas diferentes, que convivem nas
mesmas bases fundamentais da vida, isto , a colnia celular anrquica do cncer e a
estrutura disciplinada do organismo humano. Explicaremos abaixo por que a clula rebelde
neoplstica se comporta assim. Ela derivada de um micrbio que, aps longussima estada
e adaptao, conseguiu desindividualizar-se e assumir caracteres afins aos das clulas dos
evoludos organismos policelulares.
Mas antes de explicar tudo isso, paremos para algumas observaes. Parece
que, mesmo no campo biolgico, as foras do mal assumem as mesmas caractersticas que o
individuam no campo moral. A desordem e a revolta pertencem aos planos mais involudos da
vida, cujas formas inferiores tentam sempre agredir as formas mais evoludas, desde que
estas relaxem o controle e a defesa, que s pode ser exercitada pela fora e inteligncia do
poder central. Repete-se esse fenmeno no campo social, quando vemos que, logo que se
corrompe e enfraquece um governo, imediatamente das camadas inferiores da sociedade
emerge a rebelio, para apoderar-se do poder. Leva-nos isto a ver uma relao entre o
difundir-se do cncer e o crescente relaxamento moral de nossos tempos. Quando a
desordem chega at ao poder central que o esprito, ele perde os meios diretivos at da
disciplina orgnica. O funcionamento e a estrutura das clulas se ressentem de estados de
nimo prolongados, habitudinrios, que tendem a imprimir-se nelas, projetando as prprias
deformaes do plano espiritual at o plano orgnico. essa transmisso do subconsciente,
e da, por ideoplastia, estrutura orgnica, que explica a evoluo das formas como
conseqncia da evoluo do esprito, que a causa dela. Ento natural que, quando do
centro se inicia esse processo de depurao, se verifique um regresso geral involutivo.
Compreende-se ento como uma clula inferior e degenerada de origem micrbica, possa
tentar revolues no seio de um organismo relaxado pelo poder central. Este, ento, no
merecendo mais ficar no plano evolutivo atingido, justo que, de acordo com os equilbrios
da vida, aparea agredido pelos inferiores e que seja eliminado, se no der prova de possuir
em si o poder do comando e defesa que lhe d o direito de viver.
Essa ntima conexo entre o prprio tipo espiritual e a forma orgnica que o
reveste, induz-nos a admitir que, na reencarnao, o esprito deva escolher um organismo do
seu tipo, que tenha suas qualidades, boas como ms, porque de outro modo no pode formar
a sintonizao necessria para a fuso. Como poderia essa realizar-se sem uma semelhana?
Na unio da alma com o corpo, claro que devem funcionar as leis de afinidade, que operam
por atrao e repulso. Desse modo, para poder conseguir realizar uma vida inteira de to
ntima convivncia, devemos admitir identidades fundamentais de qualidades entre esprito e
organismo, e que este ltimo represente a verdadeira expresso do primeiro no plano fsico.
Leva-nos isto a admitir outro fato que aperfeioa mais ainda a teoria da reencarnao. Quando
um esprito vem inserir-se numa clula prolgena hereditariamente tarada, da qual s pode
retirar um organismo com certas predisposies patolgicas congnitas, no ocorre isto por
acaso, mas segundo a lei de justia que d a cada um o que lhe cabe por seu merecimento.
Ser atrado por afinidade, para uma determinada estrutura orgnica, o tipo correspondente
de personalidade, e no qualquer outro, ou seja, aquele tipo que tem um comprimento de
onda que esteja em sintonia com a onda biolgica da clula prolgena. Poderemos ento dizer
que os pontos vulnerveis, as predisposies este ou quele ataque patolgico, esto antes
de tudo no esprito; a no ser assim, mesmo se verificasse excepcionalmente o ataque contra
um esprito so, a prpria natureza diversa deste representaria um impulso contrrio,
tendente cura. As exigncias da lgica, os princpios de ordem e equilbrio, um instintivo
sentido de justia, confirmam estas concluses.
Mas a atividade anrquica e separatista das clulas do cncer levam-nos
ainda a outras consideraes. O homem atual pode considerar-se como clula de um novo
grande organismo, a humanidade, hoje em formao. Como tal, acha-se o homem hoje
socialmente na fase involuda das clulas desorganizadas, no ainda disciplinadas por um
poder central e a ele obedientes. Assemelha-se a nossa sociedade mais massa desordenada
celular do cncer, do que estrutura ordenada de um organismo policelular. Como no perodo
paleontolgico, as novas formas de vida de nosso mundo esto na fase embrional da
tentativa. O poder central deve formar-se por seleo, com a destruio das formas
fracassadas, imaturas, no bastante slidas para saberem resistir. E, formando ele, deve
impor e manter com sua real superioridade, a ordem entre os menos evoludos, porque, ao
primeiro sinal de inferioridade ou fraqueza dele, estes se sublevaro para destruir o poder
central e tentar uma forma sua diferente. S assim poder formar-se o novo organismo social
humanidade, segundo a lei geral das unidades coletivas, com a coordenao e unio de cada
uma das individualidades humanas.
Representa assim o homem atual a clula anrquica que, tal qual a do cncer,
se reproduz sem disciplina nem freio. Esse o estado das unidades primitivas, muito mais
prolficas que evoludas, a fim de que um grande nmero possa ser sacrificado, sem dano
para a vida, em tentativas procura de formas melhores. Quantas existncias so sacrificadas
com essa finalidade, desapiedadamente ceifadas pela seleo! O mais idneo, s ele que
sobrevive. Por isso, nesta fase, prolificar fcil e abundante, proporcionado a inconscincia
do homem que no percebe que, de acordo com a sabedoria da Lei, est gerando para a dor e
a morte. E isto um bem, seno quem o levaria a procriar para atingir to duro sacrifcio e
fadiga, embora tudo isto seja necessrio para eu se cumpra a evoluo? Mas, no futuro,
dever ocorrer ao organismo social o que hoje sucede no organismo humano, e mesmo na
sociedade de alguns animais (abelhas, formigas), onde os nascimentos so controlados em
relao aos meios de subsistncia e s possibilidades de educao. A moral evolve com a
vida e justifica-se com as exigncias supremas dela. Hoje imoral o controle dos
nascimentos, porque contrrio aos interesses da vida na fase atual, como vimos agora
mesmo. Nem podia isso ser concedido a um homem desprovido de conscincia coletiva, de
conscincia eugentica, cego diante dos remotos fins da vida, um homem que ainda no
transformou em automatismos, isto , em instinto natural, mediante longa repetio, o estado
de absoluta adeso Lei e obedincia a ordem. S a esse tipo biolgico pode conceder-se
tais liberdades. Hoje seriam usadas apenas para fins de abuso, para fraudar a natureza,
buscar gozos, fugindo aos sagrados deveres impostos pela prole. E hoje, a vida quer que se
procrie em abundncia, para que haja bastante gente para sacrificar, a fim de resistir s
guerras e s suas grandes destruies, misria, a tantas doenas novas criadas pela
civilizao, sobretudo seleo dos mais dbeis e feroz luta corpo a corpo de todos contra
todos, na qual tantos perecem sem derramamento de sangue. Enquanto no se passar desta
atual fase catica a uma fase de ordem, o sistema de colaborao e disciplina que se realiza
em nosso organismo no poder ser alcanado pelo organismo coletivo. Mas, atingida uma
fase de ordem, em que a atual disperso da vida no mais for requisitada pelas formas
caticas de existncia, no permitir mais a natureza um desperdcio que ento ser intil, e
disciplinar o esforo gentico em proporo as suas novas condies. O homem evoludo,
civilizado e consciente no procriar mais apenas para seu gozo egostico, para abandonar os
filhos lei feroz da seleo do mais forte; mas procriar apenas quando souber que a vida
garantida e assegurado um mnimo indispensvel de bem-estar.
***
Eis como nasce o hbrido neoplstico, contexto celular todo sui generis,
que obedece a leis suas, no s do organismo em que se abriga, obedece primeiro quela
imposta pela tendncia ultra-reprodutiva do vrus. Por isso ocorre que, enquanto as clulas
dos organismos policelulares se reproduzem em proporo aritmtica, as monoclulas
micrbicas se reproduzem em proporo geomtrica. O prurido reprodutivo das primeira
contido pela leis rgidas centrpetas da associao e organizao, ao passo que nas segundas
ele extravasa soba elstica lei da reproduo, eminentemente centrfuga. Alm disso, a
reproduo celular constrangida dentro dos limites da configurao anatmica dos tecidos
e rgos, ao passo que a reproduo micrbica pode dilatar-se indefinidamente. Assim,
enquanto a clula orgnica, por memria ancestral, habituou-se disciplina, com a qual freia
o prprio mpeto reprodutivo, proporcionado-o s exigncias de toda a sociedade das clulas,
sob diretivas unitrias de um eu central, a clula micrbica, ignara de qualquer disciplina
finalstica coletiva, trata apenas de reproduzir loucamente, no sendo nisto vigiada por
nenhum poder coordenador. Esta observao confirma tudo quanto dissemos acima, em
relao ao controle dos nascimentos, ou seja, explica-nos como, numa humanidade
desorganizada e involuda como a atual, deve vigorar o princpio da prolificao livre e
incontrolada. E explica-nos como, numa futura humanidade orgnica e evoluda, a vida impor
uma disciplina ao mpeto reprodutivo, de modo que ele obedea s exigncias de toda a
coletividade.
Eis de onde deriva o cncer. Formada a clula simbitica pela unio de dois
elementos heterogneos e antagonistas, ela se torna a cabea do tronco genealgico de um
novo ser desmentado que, por sua origem, s obedece sua lei e finalidade, que no so de
maneira nenhuma as do organismo no seio do qual se desenvolve. Assim essa clula, pela
desistncia do organismo a reagir, gera uma populosa colnia celular, organizao
histolgica disforme, avulsa de unidade orgnica e inimiga dela. Este o cncer.
Assim, a doena dada no pelo assalto atual de um micrbio, mas por uma
geral incapacidade congnita do organismo de defender-se, incapacidade j revelada, pelo
fato de ter o organismo permitido o estabelecimento dele e sua colnia inicial. A tragdia no
reside tanto, ento, no fato, de apresentar-se o tumor, quanto no ter sido permitido o advento
dele. Portanto, o problema cifra-se todo em saber-se colocar algum em condies de no
permitir esse advento. E vimos de que depende isso. A extirpao do tumor, por qualquer
meio que seja, no pode recompor a unidade vital em sua harmnica submisso s leis que
presidem ao equilbrio da economia normal. Nem o cirurgio, nem os raios X, nem o rdio,
nem outros medicamentos aparecidos hoje, podero fazer voltar um poder central decado e
incapaz de governar. Assim acontece com todos os governos fracos e ineptos, que o primeiro
sopro de revoluo derruba. Este o triste destino das sociedades civilizadas que se
tornaram, como a nossa, insensibilizadas e anrgicas em suas virtudes reativas,
discrasizadas pelo materialismo edonstico e tendente ao paganismo, poludas em tudo o que
surge no esprito por saprofitismo psquicos, que ecoam no plano orgnico com
saprofitismos celulares. indispensvel compreender que, no conceito unitrio da natureza,
mesmo se a cincia no admite isso, a sade dirigida tambm pelas qualidades de ordem,
equilbrio e sabedoria de um poder central, que em tudo se prende ao princpio orgnico da
vida. Isto reconduz-nos aos conceitos, com que iniciamos este captulo.
A TEORIA DA REENCARNAO
( 1a Parte)
Seria loucura acreditar que o exame, que neste volume procedemos, das
condies atuais do mundo, possa ser suficiente para modific-lo e salv-lo. To vasto
fenmeno no poder ser feito seno pelas poderosssimas foras, que s Deus pode
dominar. Ns, desprovidos de todo poder, somos apenas simples observadores. Mas
conseguimos ascender, por meio da inspirao, a uma torre, de que so vistos os longnquos
horizontes. Pudemos assim narrar aos que em baixo haviam permanecido, que aquelas
poderosssimas foras que esto nas mos de Deus, esto prontas a mover-se, e qual a sua
direo; e tambm as razes e o significado de tudo isso.
Que o inferno e que o paraso? Pela queda, de que nasceu nosso universo
material, o princpio da unidade que lhe constitui a base podia ser emborcado, mas no
destrudo. Resta assim por toda parte um vnculo entre todos os seres. No alto, esse vnculo
que une o amor, em baixo permanece ele, mas s avessas, como dio. Num todo orgnico,
nem um ser pode viver isolado. No paraso, isto , nas fases biolgicas mais evoludas, para
as quais caminhamos, esto os seres abraados para amar-se e fazer o bem, que a todos d
alegria. No inferno, ou seja, nas fases biolgicas menos evoludas, de que provimos e em que
nos achamos ainda, abraam-se os seres para se estrangular, para fazer o mal mutuamente, o
que dor para todos. Anttese perfeita, avesso completo, que, com a evoluo, se vai
endireitando. No paraso, a vida de um condio para a vida do outro. No inferno, a morte de
um condio para a vida do outro, e ao contrrio. No mundo dos animais, com efeito, a
carne de cada ser alimento para nutrir outro, a derrota de um a vitria do outro. Princpios
estes que todos conhecem bem e que, no mundo humano, s mudam de forma,
permanecendo os mesmos na substncia. De fato, regulam eles a seleo sexual, a conquista
da vida, o xito em cada coisa; representam o mtodo para chegar s riquezas, aos gozos,
glria, ao poder.
Pouco basta para compreendermos a qual dos reinos pertence nosso mundo.
Permaneceremos todos amarrados por uma cadeia de rivalidades, luta e terror, bem infernal.
E ningum poder negar que isto seja o resultado da lei vigente no mundo animal e humano, a
da luta pela vida e da seleo do mais forte, nem que esta seja a lei vivida pelo homem de
hoje. O indivduo, que consiga apenas superar sozinho essa fase animal, fica aterrorizado por
to completa ausncia de senso coletivo, necessrio para poder compreender e dar valor a
utilitarismos mais vastos e de to grande vantagem; fica aterrorizado pela estupidez deste
contnuo agredir-se um a outro; aterrorizado fica tambm, pela to grande ignorncia das
mais elementares leis da vida, razo pela qual se chega a acreditar no absurdo: que seja
possvel colher flores semeando veneno. As geraes mais civilizadas do futuro
compreendero o significado destas palavras.
Por mais que se queira ting-la de civilizao, certo que a nota fundamental
de nosso mundo o esprito de domnio e de ferocidade, que persiste, por atavismo tenaz, em
nossa formas de vida. Essa ferocidade, todavia, tanto mais se torna perceptvel e salta aos
olhos, quanto mais se vai o homem sensibilizando por evoluo. Esse o inimigo que est em
ns e que em ns precisamos vencer. Tal a lei satnica do caos, lei de luta, desordem e
dio. Mister acordar de novo nosso eu involudo, at sentirmos como, pelo contrrio, a vida
vibra de outras foras, que nos parecem no existir, s porque ainda no conseguimos
perceb-las. Revelam elas, entre ns, a operante presena de Deus. Verifica-se, ento, uma
transformao milagrosa, e tudo muda. isto possvel, porque tudo o que conhecemos, se
nos revela s em funo de nossas capacidades perceptivas. Poderemos ento compreender
ser verdadeiras palavras to estranhas como estas: A privao e a dor no so, em realidade,
aquela derrota que parecem ser em nosso mundo de ferocidade. Mas se Deus, presente como
bondade e amor, nos tira qualquer coisa e por isso nos deixa sofrer, s para fazer-nos subir
e depois dar-nos mais, em plano mais elevado, em forma de alegria maior. E isto possvel,
porque a dor a experincia que mais amadurece a alma e afina nossa sensibilidade, de
forma que possa assim gozar vibraes que antes no podiam ser percebidas. Poderemos
assim, pois, imergir-nos consciente na divina harmonia universal. Entraremos ento no reino
do paraso, porque sentiremos o paraso nascer dentro de ns.
2
Conferncia na Federao Esprita do Estado de So Paulo 5 de Outubro de 1951
Vimos que o conceito da evoluo a espinha dorsal de todo o sistema,
como segundo tempo da subida aps a queda3. No podemos parar na simples evoluo da
forma, no sentido Darwiniano. Pois esta mesma s se explica como evoluo do princpio
espiritual que rege todas as formas, do qual estas so expresso. Por aqui se compreende a
utilidade da dor ao lado da bondade de Deus, e tantas outras coisas. Suprimamos esses
conceitos e cairemos num caos de contradies, em que triunfa no Deus, mas o mal. Ora,
evoluo espiritual s pode significar reencarnao. S a eterna existncia de um eu pessoal
pode permitir seu progresso, sua responsabilidade e correo pela dor. Fora desse ponto de
vista, a estrutura orgnica do todo perde seu significado e a grande marca para a redeno
em que tudo caminha, perde sua meta. A eterna existncia de um eu pessoal imposta ainda
por sua intrnseca natureza divina; isto quer dizer reconhec-la e respeit-la, porque tudo o
que divino no pode ter princpio nem fim.
Alm disso, deve haver proporo entre causa e efeito. Ento, no possvel
que uma causa limitada no tempo (uma s vida) possa produzir um efeito de natureza
ilimitado (eternidade). Essa causa s poder produzir um efeito a ela proporcional, da mesma
ordem, isto , limitado por natureza. Ora, um pedao de tempo e eternidade, ou seja, finito e
infinito, so entidades de ordem diversa. A eternidade jamais se poder conseguir somando
nmeros finitos, por maiores que sejam, de unidades limitadas de tempo.
3
UBALDI, Pietro. Deus e Universo
Mas h outra razo em favor da reencarnao. Em nosso universo, a
existncia de cada ser toma a forma do tornar-se ou transformismo, de modo que existir
s pode significar tornar-se. Ora, fixar o ser num estado definitivo, no mais sujeito ao
caminho evolutivo ou involutivo, como o estado para sempre imutvel do paraso ou do
inferno, significa paralisar o tornar-se, que quer dizer paralisar a existncia, ao menos qual
a encontramos em nosso universo em evoluo e enquanto ele existir em tal forma. Se o ser
quer continuar a existir, deve pois continuar seu transformismo ou caminho evolutivo, mesmo
depois da morte, como nos indica a reencarnao. H um termo ao tornar-se, mas s no fim
do processo evolutivo, e com a perfeio atingida no regresso a Deus.
* * *
Procuremos encarar o problema mais de perto, em seus pormenores. No
basta, s vezes, que verdadeira seja uma teoria para que se possa apresent-la a todos. Pode-
se ento assistir, nos pases reencarnacionistas ao triste espetculo da caa ao prprio
passado, feita como um jogo, por leviandade e curiosidade v, s para saber quais foram as
prprias encarnaes anteriores. Afirmar a teoria como princpio, significa sustentar uma
verdade.. abandonar-se a uma pesquisa de advinhos, na qual pode-se esconder o orgulho e
dominar a fantasia, , pelo contrrio, mais condizente a desacreditar que confirmar a teoria da
reencarnao. Muitos, com efeito, pretendem rever-se de preferncia no nos comuns
desconhecidos, mas em personagens histricas, o que pouco provvel, pois estes
representam muito poucos lugares vagos em relao ao nmero de pretendentes. Verifica-se
o caso de vrias pessoas vivas afirmarem ter sido a mesma personagem do passado. E tudo
isso feito sem possibilidade de controle; mas elementar e mesmo regra de honestidade,
que se no tenha o direito de fazer nenhuma afirmao gratuitamente, isto , quando no se
no possam aduzir provas tanto para os outros como para si mesmos. Assim, o povo simples
e fantasioso, ainda que sem malcia e certamente de boa f, pode construir lendas destitudas
de qualquer fundamento e s a base de vagos indcios, hipteses e elementos incontrolveis.
A teoria da reencarnao uma coisa sria e no deve ser usada para satisfazer v
curiosidade. Quem chega a ter intuies a respeito, estude a si mesmo, faa pesquisas
ntimas para conhecer-se e reconstruir a histria de seu destino, para melhor trabalhar de
acordo com a lei de Deus. Mas bom no divulgar isto, ao menos at achar confirmaes em
provas positivas, por todos aceitveis.
A teoria da evoluo, em que se baseia o sistema das duas Obras que estou
escrevendo, teoria que o mundo admite, implica a conservao dos valores que o ser adquire,
atravs da experincia da vida. Vive-se para aprender e s o aprender valoriza o viver. Ora,
diz-nos a lgica que, sem reencarnao, a conservao dos maiores valores da vida
impossvel, porque lhes falta o fio condutor da evoluo. Ento, sem reencarnao, perderia o
sistema do universo todo o poder de recuperao, para corrigir sua imperfeio e voltar
perfeio, e a dor seria um tormento sem sentido, nem escopo til. Ora, no possvel to
flagrante contradio, logo no centro de um sistema que sabemos ser lgico e estritamente
utilitrio. absurdo que ele, em seu ponto mais vital, renegue seus princpios fundamentais.
Herdar todo o passado, sem que nada se perca de tudo o que se viveu, sem que nada se
desperdice desse trabalho fundamental ao qual foi confiada a reconstruo do eu, essa uma
necessidade absoluta e insuprimvel, porque sem ela no desaba uma religio, uma filosofia,
ou um grupo humano que lhes est conexo, mas desaba a lgica de todo o universo.
***
Mas focalizemos de novo, em particular, o problema da reencarnao. S esta
teoria nos deixa aberto o canal de transmisso dos resultados da experincia da vida.
Totalmente insuficiente a hereditariedade fisiolgica para os filhos que nascem, sobretudo
quando os pais so ainda jovens, e portanto possuem quantidade mnima de experincia a
transmitir. Para que pudesse ser transmitida aos filhos, ao menos a maior parte dela, seria
indispensvel que os pais gerassem em avanada idade, quase no fim de suas vidas. Ao
contrrio, a reproduo confiada aos jovens, mais aptos materialmente, e menos maduros
espiritualmente. A hereditariedade fisiolgica no pode, pois, ser o caminho para a
transmisso das qualidades intelectuais e morais que so as mais importantes. Deve ento
haver outro caminho que no possibilita a perda de nenhuma experincia.
evidente que a alma que se encontra na Terra demonstra, por suas atitudes,
que provm de uma experincia terrestre e no celeste. Os meninos, guiados por um instinto
de luta, so turbulentos, audaciosos, levados a brincar com armas (conquista violenta). As
meninas, levadas pelo instinto materno, so tranqilas, afetuosas, inclinadas a brincar com
bonecas (cuidado dos filhos). E estas so qualidades da personalidade, no do corpo fsico.
As almas so diferenciadas segundo tipos diversos, e demonstram conhecer e saber aplicar
as fundamentais leis biolgicas, isto , a luta pela seleo do mais forte e a reproduo e
defesa da vida. A alma aparece na Terra como uma entidade fundida com a realidade
biolgica, e no como um produto abstrato metafsico. Dizem que as almas no tem sexo, e
isto verdadeiro no sentido terreno, mas possuem as qualidades que depois, na Terra,
formam o substrato prprio ao bitipo de um sexo ou do outro. Assim, no esprito macho
dominar o instinto de domnio, a inteligncia, a vontade; no esprito feminino a obedincia, a
intuio, o amor. As qualidades fundamentais que depois formaro o bitipo masculino ou
feminino, esto antes de tudo na alma que, embora no tenha sexo, dele possui os elementos
basilares. Vemos assim na Terra almas do tipo masculino encarnadas em corpos sexualmente
masculinos, da mesma forma que em corpos sexualmente femininos: e ao contrrio, almas do
tipo feminino, encarnadas em corpos sexualmente femininos, como tambm em corpos
sexualmente masculinos. E tudo isto, permanecendo na normalidade, sem que implique de
modo algum inverso sexual; mostra-nos isto que a personalidade espiritual independente
da veste orgnica que vem assumir no corpo. Um esprito dotado de qualidades viris assim
permanece, qualquer que seja o tipo de corpo que para si escolha, e assim para um esprito
dotado de qualidades femininas, mesmo mantendo-se eles no mbito da normalidade sexual,
de acordo com o tipo masculino ou feminino de seu corpo. Tudo isto explicvel e
compreensvel, porque a evoluo tende unificao da unidade quebrada no dualismo
universal, e neste caso formao de um bitipo completo, em que se refundam as duas
metades, macho e fmea. Para atingir essa reunificao, ambos os bitipos espirituais, com
as qualidades masculinas e femininas precisam atravessar todas as experincias, tanto do
prprio tipo sexual como do oposto, pois s assim, somando-se e completando mutuamente
suas complementaes. Podem fundir-se e assim formar o bitipo completo, em que
coexistem todas as qualidades do ser, e da a ciso, devida queda do sistema, pode resultar
sanada.
Mas ainda h mais. As profecias j tudo haviam predito como deveria isto
ocorrer, mesmo em suas modalidades. O Evangelho de So Mateus, explica. Como pois se
cumpririam as Escrituras, que dizem assim deve suceder? . . . Mas tudo isso aconteceu, a
fim de que as Escrituras dos profetas se cumprissem. E isto tudo a propsito do beijo de
Judas e da priso de Cristo. Pouco depois acrescenta: Assim se cumpre o que foi anunciado
pelo profeta, que disse e apanharam trinta moedas de prata preo daquele que foi vendido. .
.. Por sua vez confirma-o So Marcos em seu Evangelho: Certamente vai embora o Filho do
Homem, como dele foi escrito mas ai do homem, pela qual trado o Filho do Homem! Melhor
lhe fora jamais ter nascido, em primeiro lugar, no podemos deixar de observar aquele
jamais ter nascido, que d impresso de um ato escolhido e querido pelo prprio sujeito,
que o teria podido evitar. Sem a reencarnao, Cristo com essas palavras s poderia ter
expresso: seria melhor que Deus no tivesse criado este. Ora, inconcebvel que Deus tenha
errado, pensar que teria podido fazer melhor agindo de outra forma, e que Cristo tenha
salientado esse erro.
As profecias, pois, dizem tudo com preciso. Fica claro, dos textos citados,
que qualquer que fosse o homem chamado para entregar o Cristo, j devia existir um
predestinado para isso e j sobre a sua cabea pesava a priori essa condenao. Ora, como
pode ser considerado responsvel, culpvel e punvel um ser que, sendo criado por Deus,
no podia deixar de nascer, um ser cuja ao, de uma ou de outra forma, era indispensvel
realizao da paixo de Cristo, e cuja traio, j tendo sido profetizada, era um ato inevitvel?
O verdadeiro culpado, ento, teria sido Deus que, mesmo sabendo tudo, e sem deixar-lhe a
liberdade alguma, havia criado e feito nascer um predestinado a esse ato.
A TEORIA DA REENCARNAO
( 2a Parte)
assim que cada vida forma, durante sua existncia, uma memria sua,
separada das precedentes, dando dessa forma a cada vida a sensao de ser a nica. Os
resultados de todas so registradas no esprito, mas estando este ainda involudo,
adormecido, adormecido no estado de inconscincia, a memria do passado permanece
profundamente sepultada no inconsciente, que ainda no despertou e, se pode aparecer em
relampejos nos estados hipnticos ou medinicos, nas intuies ou na fase de
desencarnao, perde-se essa memria de modo absoluto no perodo da vida no corpo,
quando a vitalidade deste assume a predominncia. Somente nos casos de seres muito
evolvidos pode o esprito manter-se desperto mesmo no crcere, debaixo do vu da vida
fsica, com fora de lanar at ao plano cerebral jorros de intuio que revelem, com uma
memria diferente da normal, lembranas da vida anterior.
* * *
Vistas assim as relaes entre a psicanlise e a reencarnao, enfrentemos
outro aspecto da questo.
* * *
Os problemas no podem ser esgotados e resolvidos s do ponto de vista
positivo cientifico. Esta tcnica, agora examinada, da encarnao do esprito num corpo, no
seu tipo especifico e adaptado de corpo, corresponde alm disso a uma necessidade lgica e
filosfica, segundo o plano de criao, exposto no nosso volume: Deus e Universo.
Demonstramos a, que nosso universo fsico o resultado da queda do esprito, da qual
nasceu a matria e a forma. A encarnao repete essa queda cada vez que uma alma retorna
ao corpo; e cada vida representa uma etapa da subida, ao longo do caminho da evoluo, e
uma poro de fadiga e de dor com que ele percorrido, assim, realizando progressivamente
a prpria redeno. E assim, o homem recair tantas vezes no corpo e em seus castigos,
repetindo o motivo da primeira revolta do ser rebelado, que fez ruir o universo na forma fsica;
e assim, permanecer o homem tanto tempo submetido ao ciclo vida-morte, at que
evolvendo e reespiritualizando-se, tenha queimado, ardendo na chama de sua dor, a forma
material que o aprisiona, e tenha voltado sua primitiva posio de puro esprito. S as o
ritmo vida-morte, iniciado com a primeira queda, poder ser lentamente absorvido e esgotar-
se, at o regresso a Deus, l onde se extingue a reencarnao.
Ora, um trabalho to sbio, no pode ser produto do acaso, tanto mais que
ele se reproduz exata e regularmente para cada ser que vem nascer na Terra. Quem os dirige,
pois? No suficiente a ao dos hormnios para explicar tudo isso. Mais do que a causa
ltima das especializaes, representam eles antes as alavancas de comando, que fazem
disparar um mecanismo j preexistente. Eles no bastam para dar-nos a formao dos
rgos, mas apenas podem acionar alguns mecanismos que levam a esse resultado. H,
portanto, independente deles uma forca diretriz inteligente que, segundo um seu plano ou
esquema preestabelecido, produz isso tudo. A morfognese, ou seja, a origem das formas,
mediante a qual a vida assume seus modelos predeterminados, depende pois de esquemas
preexistentes no mundo espiritual, sem o que essa morfognese no se explica.
No se pode negar que existe neste pequeno ser uma vontade precisa e uma
inteligncia que dirige sua ao. Demonstra ele, no trabalho em que est todo empenhado,
que sabe superar no poucas dificuldades que lhe armam ciladas, pondo obstculos ao seu
xito. Os espermatozides que vencem as varias centenas de milhes de irmos, deve t-las
superadas todas. Aqui tambm est em vigor a lei da seleo do mais forte, como nos animais
e no homem, demonstrando-nos que essa uma lei geral. Quando enfim o espermatozide
alcana o vulo, perfura a barreira externa dele para penetr-lo. Para consegui-lo melhor,
trouxe consigo pequena quantidade de uma substancia que tem a propriedade de dissolver
esse invlucro protetor.
Como pode esse ser monocelular ter tal providencia, demonstrando saber
tantas coisas? E esta uma inteligncia especifica e especializada, prpria dele e preexistente
a ao. Vemos aqui a execuo de uma serie de atos coordenados, tendentes a alcanar um
escopo preciso. Alm disso, no pode negar-se que esse ser esteja vivo; e vida quer dizer
vontade e ao dirigida por uma inteligncia. H, pois, neste ser um centro inteligente, seu
prprio, que constitui a vida dele. Temos, pois, que admitir nele uma como pequena alma,
ainda que elementar, mas da natureza imaterial de que feita a vida.
Creio que para responder, mister se torna recorrer lei das unidades
coletivas, que alhures mostramos constituir o meio para formao unificadora das unidades
menores, na construo das unidades orgnicas maiores. Ocorre isto tambm na sociedade
humana, nos sistemas planetrios e estelares, assim, como nos atmicos, moleculares, etc.
Ento o eu humano que quer reencarnar-se, avizinha-se gradualmente, no como espao, mas
por afinidade vibratria, isto , aos poucos se vai sintonizando como princpio espiritual, com
o princpio espiritual que rege, organizando o material molecular atmico que as constitui,
estas primeiras clulas do feto em formao, logo elas comeam a constru-lo. Estas
representam o terreno que o eu humano utiliza para a sua manifestao futura. as duas
primeiras clulas germinais, a resultante da sua fuso e as outras que dela derivam depois,
so como que os tijolos do edifcio que aquele eu vai construir para si, ou como os soldados
do seu exrcito. Ele como o engenheiro construtor, pe em ordem o material da edificao
para fazer a sua construo ou, como um general, disciplina seus soldados para deles fazer
um todo orgnico. A comparao poderia repetir-se com o caso de um diretor de um negocio,
que enquadra os seus trabalhadores, etc., isto , em todos os casos em que um chefe assume
a direo, coordenando os elementos de que dispe, para fins superiores vida e ao trabalho
deles como indivduos.
Eis ento que esse eu superior, tendo em mira fins mais complexos, que no
so alcanveis pelas limitadas inteligncias de cada clula que quando ficam abandonadas
a si mesmas, como no cncer, se arruinam), comear a guia-las, a coordenar seu
agrupamento proporo que elas se produzem, ou organiz-las em tecidos diferenciados
destinados a funes especificas. Acontece ento que, enquanto o feto cresce e se define em
suas varias partes, se a inteligncia celular que prov multiplicao do material, e se o
incnscio materno que a dirige e que preside o funcionamento elementar mecnico como um
prolongamento prprio, quem dirige a diferenciao em vrios tipos de tecidos e a guia
formao dos vrios rgos, preparando seu funcionamento, independente do da me,
unicamente a inteligncia do eu humano que se apresta para a nova reencarnao. Assim, a
determinao do sexo, feita pelo esprito, conforme ele, dadas as suas qualidades, ache
mais adequado para si viver num corpo masculino ou num feminino.
assim, que este se fabrica, sob sua prpria direo, como um seu casulo;
corpo do qual o esprito vai tomando posse gradativamente, numa espcie de temporria
colaborao com a me; corpo em que crescer definitivamente, tomando posse
independente e destacando-se da colaborao materna, quando o feto nascer, completamente
construdo, luz. Ento o corpo pertencer todo e exclusivamente ao novo eu que se
encarnou e, como corpo foi formado imagem e semelhana daquele eu que o plasmou,
assim, tambm continuar a desenvolver-se sob sua contnua influencia diretriz, para tornar-
se cada vez mais sua prpria forma, isto , sua mais exata manifestao exterior no plano da
matria.
Nesta sua forma fsica, pois, nosso eu se encontra sem recordar. Tudo se
passou na zona dos automatismos conquistados pela repetio muito longa e abandonados
ao subconsciente. Acima destes, a grande lei estabelece os ritmos maiores. Segundo esses
ritmos, o eu vem depois, no fim da vida, executar o processo inverso, e quando o organismo
que se construiu se estraga, o esprito desprende-se dele, desencarnando. Logo que este
falta, e cessa sua ao diretriz aquele organismo abandonado a si mesmo, se desagrega.
Achamo-nos assim, donos de um corpo temporariamente, e no fim despojados dele. Ele
tomado como emprstimo terra, qual devemos restitu-lo no fim, constitudo de um
material comum, que de todos, e que ns mesmos amanha poderemos tomar de novo por
emprstimo, para uma nova reencarnao. S o esprito individualmente nosso. A cincia
no nos d nenhuma explicao desse jogo. S a teoria da reencarnao faz dele um
processo lgico, dando-lhe um significado profundo e uma meta final.
Podemos todos verificar que a personalidade algo de muito mais vasto que
as funes racionais e cerebrais, contendo qualidades e elementos que as superam de muito.
Dizer que o pensamento uma secreo do crebro, como dizer que a matria seja a fonte
da vida, a mquina eltrica a causa da eletricidade, que o violino crie a musica e o relgio
construa o tempo. No fundo de cada questo de fisiologia h, ao invs, algo de impalpvel
que recua a medida que avanamos. No pode ela reduzir-se aos fenmenos positivos da
fsica e da qumica. H um elemento que no matria e que se chama vida, h o pensamento
que no pode limitar-se a um efeito mecnico. A teoria materialista da biologia no aceitvel,
portanto. No podem ser entendidos os rgos do corpo seno como instrumentos e
condies, organizados por um princpio superior para sua manifestao. No ser humano h
um centro e h rgos perifricos. Estes fazem o trabalho de anlise e de transmisso
centrpeta. Aquele faz o trabalho de sntese e de emisso centrifuga. Assim, o eu faz contato
com o mundo externo, chega a conhec-lo e reage sobre ele. Esse eu no apenas a central
de recepo, repartio, controle psquico e julgamento das mensagens recebidas, mas
tambm a central diretriz das reaes correspondentes a cada estmulo e transmitidas aos
rgos do corpo. Tambm aqui aparece o dualismo, isto , mecanismo equilibrado no binmio
ao-reao, ou seja, circuito constitudo por dois semi-circuitos inversos e complementares:
percepo e ao. A central do eu transmissora e receptora. Sem os sentidos, no poderia o
esprito ler as mensagens que atravs deles lhe manda o mundo externo. Se o esprito no
fosse transmissor, no poderia enviar para o exterior, atravs dos rgos de seu corpo, as
suas reaes. alma desencarnada, faltam os meios para perceber nosso mundo como o
percebemos ns, para fazer-se perceber por ele e para agir sobre ele.
Por essa estrada poder chegar descoberta cientfica da alma, de uma alma
que demonstra saber viver mesmo sem corpo, alm de saber viver na forma que todos
conhecemos, em sua vida unida ao corpo. Ver-se-, ento, que a alma no uma abstrao
filosfica, teolgica metafsica, mas uma realidade objetiva com a qual a medicina,
proporo que se aprofunda, ter que fatalmente que encontrar-se e que contar com ela. S
sendo assim, compreendida, poder a alma reentrar no mbito dominado pelos mtodos da
cincia mdica. A observao anatmica dos corpos mortos no suficiente. Trata-se aqui do
fenmeno da vida, de que a anatomia apenas a casca e a conseqncia. preciso remontar
os caminhos sensriais at o centro conscincia. Sobrepujadas a anatomia e a histologia, o
segredo est na cintica atmica dos corpos qumicos que compem as ltimas e mais
apuradas clulas, do sistema, as nervosas, ou seja, nos equilbrios que se renovam sempre
daquela qumica instvel; e subindo mais ainda, nas emanaes dinmicas, lanadas no
espao por aquela cintica atmica. Entramos no terreno extra-sensrio do telepsiquismo.
preciso alcanar essas radiaes-pensamento que esto conexas com aquela cintica
atmica Nesta devem fixar-se movimentos rtmicos ligados s leis cclicas, em que deve
basear a memria, o registro das impresses, a formao dos automatismos e a aquisio das
qualidades instintivas ou inatas. Deve aqui o mdico aliar-se ao rdio-tcnico para
individualizar essas radiaes pelas caractersticas da onda (ultra-curta) e examinar seu modo
de comportar-se. Do estudo analtico desse feixe de ondas, reconstruir analtica e
cientificamente a sntese psquica do eu que, mais acima ainda, escapa no impondervel.
Poder-se-, ento, acompanhar o fenmeno com o mtodo da intuio nas dimenses
superiores, que esto fora do domnio da cincia positiva. Para os primeiros passos, situa-se
o problema nas profundidades da qumica orgnica, da cintica atmica, de que deriva uma
diferente orientao das vibraes das correntes noricas: ou seja, problema de movimento
nas trajetrias internas dos tomos componentes. Essas trajetrias so linhas de forca das
quais se desenvolvem as emanaes noricas e nas quais se inserem as recepes noricas,
imprimindo-lhes modificaes que formaro os novos caracteres adquiridos pela
personalidade.
Na Grande Sntese foi sustentada a tese das origens eltricas da vida, pela
qual a matria evolvendo atravs das formas dinmicas, da fase da energia (beta), ascende,
com a vida fase (alfa), o esprito. Esta a atual ascese evolutiva que, como vimos no
volume Deus e Universo, implica e pressupe a inversa descida involutiva da queda e
desmoronamento do sistema, do estado de esprito ao estado da energia, e neste caso da
eletricidade, que continuar na forma de sistema nervoso a dirigir os organismos dessa vida;
assim, no processo inverso da queda que o fenmeno da reencarnao repete em cada caso
individual o crebro constitui o rgo de insero do esprito no mundo da matria, o que
quer dizer que o esprito, ao fazer-se um corpo, se insere primeiramente no organismo eltrico
deste. Com efeito, pelo crebro comea a construo orgnica do feto. A primeira
manifestao fsica do esprito no tero materno comea, pois, na forma dinmica que, por
ser a mais evoluda, lhe mais afim. Ela, depois, recolhe em torno de si os materiais
orgnicos fornecidos pela clula paterna e pelo tero materno. H, assim, uma lgica
construtiva, dada pela prpria estrutura do sistema do universo, na operao que o esprito
realiza, de revestir-se de uma casca sempre mais densa; isto at que, no nascimento do feto, a
forma fsica da matria est completa e pode comear a funcionar, como acima vimos, por
meio dos sentidos, recebendo e transmitindo. No h outros meios, e o esprito no pode
receber nem transmitir seno o que lhe permitem as possibilidades da mquina fsica em que
ele se consubstanciou. No fim da vida verifica-se o processo inverso, da libertao da casca
por parte do esprito, que leva consigo, registrados em seu sistema de foras como trajetrias
dinmicas, os resultados da sua experincia na vida, transformados, dessa forma, em
qualidades suas pessoais.
O esprito extravasa por todos os lados os limites se seu meio, que ele utiliza
e dirige. O crebro empregado nos usos da vida, no contigente do ambiente animal. O
esprito sabe as coisas profundas e distantes, domina um campo muito mais vasto, de
dimenses superiores s do espao e do tempo. Conhece a telepatia e a profecia. As funes
cerebrais so de ordem inferior s espirituais. O funcionamento cerebral no cobre
absolutamente a totalidade do consciente. Pensar com o crebro, isto , racionalmente,
significa pensar de forma muito mais limitada, do que pensar com o esprito, ou seja,
intuitivamente. E quando se acreditou, por terem sido ofendidos os meios nervosos e
cerebrais, que tivesse sido lesado o esprito, porque se viam alteradas as funes espirituais,
no se compreendeu que tinham sido ofendidos e estragados apenas os intermedirios de
sua expresso em nosso mundo. No , ento, o esprito que fica alterado, mas s suas vias
de comunicao e manifestao, s a mecnica de sua insero em nosso mundo material.
Assim, os materialistas, vendo o rgo do esprito e no o esprito, e vendo na morte a
destruio desse rgo cerebral, crem que, com isso, termine tambm o esprito. Mas a
realidade que este no se desorganiza absolutamente, pelo simples motivo que seu rgo
se perca. Se o esprito tem necessidade dele para manifestar-se, pode entretanto existir sem
esse meio de expresso, isto , morre apenas para nossos sentidos. Sabemos bem como
restrita a gama de vibraes que estes podem perceber. Eles no so, de certo, a medida de
todas as coisas. Ento, o esprito pode muito bem existir em formas no perceptveis para
nossos sentidos fsicos, e continuar bem vivo, ainda quando a ns possa parecer morto. E
que coisa poder fazer ento esse esprito, que se elaborou com a vida no ambiente terrestre,
se no continuar depois a sua elaborao aqui regressando?
VIII
O LIVRO TIBETANO DOS MORTOS
(Tcnica da Reencarnao)
No fundo do ser h esse ncleo central, o ego, centelha divina, que a queda
no pde destruir e permanece como um conjunto de potencialidades latentes, comprimidas,
adormecidas mas ansiosas para se tornarem ativas, para expandir-se, despertando. Nesse
ego, apesar de tudo, Deus permaneceu como centelha animadora. DEle, a espera de
infinitos desenvolvimentos, nasce o impulso ntimo e instintivo da evoluo, que forma, desse
modo, o movimento ascensional de todos os seres do universo. Nesse fenmeno da evoluo
enxerta-se, como necessidade absoluta, o fenmeno da reencarnao, sem o qual no seria
possvel a reconstruo do eu. Desse modo, a vida nica, pulsando do seu lado material para
o seu lado espiritual dois aspectos inversos e complementares, sem os quais seria
incompleto o fenmeno - vai vivendo momentos diferentes, em que prossegue o
desenvolvimento das mesmas foras em evoluo. No fim de cada ciclo, a alma deposita nos
braos do ciclo seguinte os resultados alcanados, e crava no caminho da evoluo o marco
de seu percurso. Tudo funciona obedecendo a uma lei de harmonia. Assim como no estado
embrional humano, o feto passa por todas as formas de estrutura orgnica, desde a ameba
at o homem, da mesma forma, no estado posterior morte deve a alma retomar, tanto mais
conscientemente quanto mais for evoluda, todas as experincias vividas em suas existncias
passadas, para a elas acrescentar os resultados da ltima. Na terra a cincia v apenas um
lado da existncia, a metade somente do fenmeno da vida. Nosso mundo fsico e biolgico
deve ser completado com o mundo espiritual, que lhe forma o substrato e do qual fornece a
explicao, e se isso no for feito, nada se compreender.
Essa a doutrina do Livro Tibetano dos Mortos. Quer ele avisar-nos que, no
estado de desencarnado, essas vises no so realidade, mas apenas reflexos das prprias
formas-pensamento. Os pensamentos so como germens concretos, sementes que podem
ser plantadas no terreno de nossa conscincia. Se encontram terreno favorvel, isto , afim,
de modo a poder sintonizar com ele, lanam razes, sejam eles bons ou maus, crescem e
formam a personalidade, ou natureza espiritual de um homem, da qual, mais tarde, depender
seu destino e tambm sua forma fsica, especialmente a da face. Nessas sementes, imprimem-
se os pensamentos dominantes na vida de um homem. Quando olhamos a face de um
semelhante nosso, atravs das formas materiais, vislumbramos sua alma. Esta que nos
interessa acima de tudo, porque ela que tudo. Caso eliminada seja, ns nos distanciamos
com repugnncia do cadver, que somente o despojo morto, sem qualquer valor ulterior.
Essa alma que procuramos no rosto alheio um corpo sutil, uma espcie de organismo
dinmico de determinadas vibraes de natureza especifica, cujo conjunto define aquele feixe
de formas-pensamento e tendncias, que se chama personalidade. Essas formas-pensamento
so inseparveis da alma, representam sua prpria natureza, de modo que seguiro o
indivduo em qualquer lugar em que ele se encontre. So forcas ativas, cujo movimento fatal
no pode ser detido, e que tem que desenvolver-se deterministicamente at o fim, de acordo
com a lei crmica de causa e efeito.
Depois da morte, o que o indivduo pensou e fez torna-se objetivo. Tudo o que
nele viveu, volta a ele na forma de reflexos crmicos. As formas-pensamento visualizadas em
sua conscincia, que ele deixou enraizar-se, crescer e expandir-se, vivem agora diante dele,
tomando forma concreta naquele ambiente mais sutil, em que isso se torna possvel. De fato a
tendncia de todo pensamento de atingir a sua manifestao. E isto, repetindo o motivo
fundamental da criao, do primeiro ato gentico operado por Deus, do qual desceu a
construo do universo fsico. Aquele o primeiro grande modelo; esta a repetio. E o
universo funciona Atravs de modelos nicos e de sua repetio em todas as dimenses e
graus de evoluo. Assim, a vida encontrado um caminho, tende a passar por ele infinitas
vezes, at que encontre uma estrada melhor. Quando a cincia psicolgica estiver mais
evoluda, esses fenmenos mentais tornar-se-o claramente compreensveis, e compreender-
se- como nossos impulsos mentais, em vida, possam, depois, personificar-se em formas, no
estado depois da morte.
* * *
Neste ponto ingressamos na parte que mais interessa teoria da
reencarnao. Chega o momento em que o impulso das foras, postas em movimento na vida,
se esgota, cessando seus efeitos de alegria ou de dor, segundo sua natureza boa ou m.
Desperta ento o ser, alcanando a compreenso de seu novo estado, isto , do fato de ter
morrido e de se encontrar sem corpo fsico. Ento, diz o Livro Tibetano dos Mortos, o ser
ingressa no estado transitrio da procura do renascimento, fenmeno do qual aquele livro
oferece as diretrizes, ensinando as modalidades do processo para reencarnar-se bem.
Alcanando a certeza de encontrar-se sem corpo, por ter este morrido, nasce ento na alma,
o desejo de formar novo corpo para si. Procura ento o lugar onde reencarnar, para
recomear nova vida.
Por que acontece isto? Porque a vida contnua e no pode parar. H entre
uma vida e outra, um elo de conexo causal, pelo qual, as causas devem extinguir-se em seus
efeitos, e o que foi iniciado num ciclo tem que cumprir-se no seguinte. O impulso irrefrevel
da vida no pode parar, e forosamente tem que seguir adiante nessa linha, que lhe foi
determinada pela Lei. A vida no pode parar, e deve continuar seu caminho ao longo da trilha
crmica. Mas, por que que o esprito deve tender a reencarnar-se, isto , a descer na matria
nela construindo para si uma forma fsica? H um conceito profundo na base dessa
necessidade, que no apenas a tendncia que todo pensamento tem, como j vimos, de
atingir sua manifestao, como repetio do motivo fundamental da criao. J explicamos,
no volume Deus e Universo, como o universo fsico, que nos circunda, , no a verdadeira
criao de Deus, porque sua criao foi espiritual, mas uma queda, uma descida dela na
matria, como conseqncia de uma revolta da criatura contra o Criador.
Do mesmo modo que todos chegam escolha sexual por instinto, sem saber
o porqu de certas preferencias, ainda que razes profundas existam, assim tambm quase
todos chegam a escolha da reencarnao por instinto, sem saber o motivo, embora existam
razes especificas para isso. No por acaso que um esprito nasce aqui ou ali; a sabedoria
da Lei guia tudo harmonicamente e, por meio dos instintos, sabe conduzir o indivduo para
onde deve ir, aonde a sua ignorncia no lhe permitiria chegar. H equilbrios de foras que
determinam o tempo, a raa, os pas, a famlia, a mulher e, com isto, o ambiente em que o
indivduo deve nascer. Antes de mais nada, tudo isso obedece natureza do bitipo
espiritual, que deve encontrar o terreno apropriado para nele colher os materiais a fim de
construir uma forma adequada no plano fsico. As atraes e repulses so foras que
constituem liames invisveis, que mantm coesos os mais distantes elementos constitutivos
do universo. Tudo se movimenta ao longo desses fios, que formam uma rede que intimamente
une tudo a tudo. H trilhos invisveis, de natureza dinmica e psquica, que guiam o caminho
das almas para determinados pontos, de preferncia a outros. O que as impele a seguir esse
trilho , como na vida, o instinto, o desejo. Essas ansiedades representam o im que atrai os
seres para certos ambientes. Nascem de um estado de afinidade, de co-vibrao, dando lugar
a atos inconscientes, instintivos. Mais as maiores atividades da vida, sabmo-lo, no so
confiadas sabedoria humana, demasiado fraca e pequena, para que se lhe possa confiar
algo de importncia. Mais do que conscincia do indivduo, so elas confiadas sabedoria
das leis da vida, a uma maior conscincia universal que, sabendo tudo, tudo dirige.
O Livro Tibetano dos Mortos no explica tudo isso com clareza, com estes
termos e referencias prprios da nossa psicologia ocidental, mas se exprime com estranha
linguagem simblica, que, sem o sentido da intuio que nos fornea a chave em muitos
pontos permaneceria obscuro. Continuando em seu ponto de vista, de que a salvao esteja
em evitar a reencarnao, aconselha ao esprito diversos modos para fechar, como diz o livro,
as portas das matrizes, isto , para impedir a si mesmo a queda no grmen embrional do feto.
Aconselha, assim, uma espcie de castidade ao esprito, com a qual deveria evitar a
conjuno carnal com a primeira semente do corpo. Pode tudo isso ter profunda significao,
dando-nos a compreenso do fenmeno da castidade voluntria. Certo que a unio normal
entre homem e mulher corresponde s leis da natureza. Mas sabemos, tambm, que esta
natureza a lei de um mundo que resultado da queda, a disciplina do estado de involuo.
Se o rebelar-se a esta lei da natureza, desviando de suas normas, constitui erro, todavia
possvel sobrepor-se a elas, mas isto to s quando seguem, em seu lugar, as normas de uma
lei superior quelas leis da natureza, lei indicada pela evoluo e situada num plano mais
elevado. A unio normal a regra sadia para os seres que precisam de todas as provas e
dores inerentes vida, necessria para evolver. O caminho da ascenso deve passar por esta
rota, e portanto bom que a grande maioria por ela se lance, ainda que esta seja a estrada da
dor. Alm disso existe, sem dvida, a iluso da alegria, convidando-os a realizao de um ato
de que se retrairiam se pudessem calcular suas dolorosas conseqncias.
Mas aqui acresce outra circunstncia. H outra fatalidade que prende o ser, o
seu Carma. O ser irresistivelmente dominado pelas foras crmicas. Estas o impelem a
tomar um corpo, porque foi no terreno fsico que ele semeou (com pensamentos e atos), e
nesse terreno deve ele agora colher. Essas foras o impelem a encarnar-se em determinado
grmen, porque esse o ambiente que lhe afim, o ambiente de suas afinidades
sintonizaes e atraes. A capacidade de escolha est em proporo ao desenvolvimento de
conscincia, qualidade que o bitipo humano comum est longe de ter adquirido. Tambm
neste campo, tmo-lo observado, o ser obedece a impulsos instintivos, manobrado por
princpios diretivos, diante dos quais sua mente cega. As leis da vida comandam o ser
ignorante e o canalizam pelos trilhos obrigatrios, conforme suas qualidades. Nossas obras
nos seguem, nosso passado sempre ressurge em ns e em torno de ns. da Lei que esses
impulsos causais no podem aquietar-se at sua exausto no terreno dos efeitos:
desencadeamento de foras, boas ou ms, de alegria ou de dor, encerradas no campo de
foras da esfera do eu. Aquele livro chama, com expresso imaginosa, de frias crmicas
tormentosas ou tempestades crmicas., o desencadeamento das formas malficas.
Constituindo o nascimento na terra, em geral, um impulso para a expiao, pois que a terra
lugar de provas e de dor, onde se nasce para aprender e pagar, so as foras trevosas que
predominam geralmente. por isso que as frias crmicas perseguem o esprito, para fora-lo
a ingressar numa matriz, ainda que o esprito veja que esta da piores, que no promete
seno dores. Essas foras crmicas personificam-se em formas-pensamento, quais demnios
ferozes, subverso dos elementos, tempestades terrificantes, perseguies e torturas.
Amedrontado, o esprito procurar um refgio, mas a ventania terrvel do Carma, irresistvel,
tudo arrastando, fora pelas costas com golpes insistentes. O esprito, sobrepujado por
vises espantosas, que para ele so realidade, procura esconder-se e joga-se no primeiro
grmen que encontra, o pior, o mais merecido, aquele que as inteligentes e justas forcas da
vida lhe puseram ao alcance. Assim que aquele esprito toma um corpo miservel de baixeza
e sofrimento. Aquele ser nasce neste mundo, mas ele nasceu no inferno que traz consigo.
Assim termina o Barbo Thdol ou Livro Tibetano dos Mortos. Dele tratamos
porque, como j o dissemos, ele confirma muitos conceitos aqui afirmados, antes de
tomarmos conhecimento desse livro. No presente volume ns demonstramos que nas mais
diversa ramificaes particulares dos princpios gerais do sistema. Mas o adentramo-nos na
complexidade dos pormenores, confirmou-nos a verdade destes princpios nicos e simples,
que tudo regem. Para confirmao deles, quisemos escutar tambm esta voz que nos chega
do longnquo passado e do remotssimo Tibete.
FIM