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23

DIFERENCIAO
SEXUAL ANORMAL:
ESTADOS
INTERSEXUAIS

ALBANY BRAZ
906 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS


CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 907

Captulo 23

DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL:


ESTADOS INTERSEXUAIS
ALBANY BRAZ

INTRODUO

O recm-nascido (RN) com genitlia ambgua (GA) constitui uma


emergncia mdica ou mesmo clnico-psicolgica, que deve ter diagnstico rpido
e preciso. Caso contrrio, podero ocorrer conseqncias graves, de imediato e
no futuro, tanto na esfera individual como na familiar.
A genitlia ambgua (Figura 23.1) resultado de uma alterao durante o
desenvolvimento embrionrio-fetal e pode ser caracterizada por erros de
embriognese, anormalidades de cromossomos ou erros bioqumicos, ocorrendo
aproximadamente numa proporo de 1:10.000 nascimentos. Por ocasio do
nascimento, a genitlia est incompleta ou ambgua, caracterizada pela presena
de componentes masculinos e femininos, resultando numa posio intermediria
(intersexuada) entre os dois sexos.

FIGURA 23.1: Desenhos da expressividade clinica variada dos diferentes estgios dos estados inter-sexuais
onde observa-se fuses lbio-escrotais variadas com pertuito do seio urogenital e situao de assimetria.

A determinao e diferenciao sexual um processo seqencial que


envolve, no mnimo, quatro estgios:

1. Sexo gentico determinado na fertilizao (gentipo).


2. Sexo gonadal determinado pelo sexo gentico (ovrio ou testculo); este
processo regulado por 30 genes especficos, localizados nos cromossomos
sexuais e autossomos.
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3. Sexo fenotpico determinado pelo sexo gonadal, diferenciando as genitlias


interna e externa, em feminina e masculina.
4. Sexo psicolgico adquirido depois do nascimento, atravs do desenvolvimento
social da personalidade, conjuntamente com influncias hormonais pr-natais
e identificao sexual ps-natal.

O processo de desenvolvimento do sexo feminino autnomo e passivo,


isto , no requer a presena de gnadas nem de hormnio algum. Por volta da
nona semana de vida embrionria, devido ausncia do hormnio ou fator ou
substncia inibidora Mlleriana (SIM) - Mller inhibiting substance (MIS), os ductos
de Mller se desenvolvem e apresentam como resultado final as trompas de
Falpio, o tero, a crvix e o tero superior (proximal) da vagina e h,
automaticamente, regresso dos ductos de Wolff. A formao da genitlia externa
ocorre como conseqncia da falta de estmulo hormonal, isto , o tubrculo
genital forma o clitris, as pregas genitais (urogenitais) se convertem em pequenos
lbios, as eminncias ou tumefaes genitais (pregas lbio-escrotais) se
transformam em grandes lbios e o sulco urogenital permanece aberto e forma o
vestbulo da vulva e tero inferior (distal) da vagina.
No sexo masculino, o processo de desenvolvimento que se inicia por volta
da stima semana de vida intra-uterina depende, inicialmente, do antgeno H-Y
(antgeno de histocompatibilidade Y, que uma protena de superfcie celular
produzida pelas clulas de Sertoli, contendo 162 aminocidos e com peso
molecular entre 16.500 e 18.000) ou do fator ou gene de diferenciao testicular,
conhecido tambm como gene SRY (Sex-determining Region of the Y), para
diferenciar a gnada primitiva em testculo; secundado por um hormnio
placentrio, denominado de gonadotrofina corinica, para realizar a sntese da
testosterona (T) e estimular a migrao destes testculos aos escrotos e
posteriormente de trs outros hormnios testiculares com aes sobre o
desenvolvimento das genitlias interna e externa:

1. A MIS ou SIM (glicoprotena de peso molecular 124.000, produzida pelas clulas


de Sertoli) responsvel pela regresso dos referidos ductos Mllerianos
(paramesonfricos).
2. A testosterona, produzida pelas clulas de Leydig, responsvel pela
diferenciao dos ductos de Wolff (mesonfricos) em epiddimos, ductos
deferentes, vesculas seminais e ductos ejaculatrios.
3. A diidrotestosterona (DHT), resultante da reduo perifrica da testosterona
pela 5-redutase, que se liga a um receptor citoplasmtico nas clulas-alvo
da genitlia externa, promovendo a virilizao e, conseqentemente, a
transformao do tubrculo genital em glande do pnis, do sinus urogenital
(SUG) em prstata e uretra prosttica, das pregas urogenitais ou genitais em
uretra e corpo do pnis e as tumefaes ou eminncias urogenitais em escrotos.

CLASSIFICAO

Devido evoluo, nestas duas ltimas dcadas, no campo da gentica,


da bioqumica e da embriologia experimental foram descritos novos tipos de

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estados intersexuais. Assim, vrias classificaes vm sendo propostas, que
utilizamos com modificaes da classificao de Braz (1998) Quadro 23.1.

Quadro 23.1:
CLASSIFICAO DAS ANORMALIDADES DA DIFERENCIAO SEXUAL

DISGENESIA GONADAL (erros no sexo gonadal)


1. Aneuploidias: Sndrome de Turner (ST) e sndrome de Klinefelter (SK).
2. Disgenesia gonadal pura (DGP) com caritipo 46,XX ou 46,XY (sndrome de Swyer: nesta ltima se
inclui a sndrome da agenesia testicular, familiar ou espordica, com antgeno H-Y negativo).
3. Disgenesia gonadal unilateral ou assimtrica ou mista (DGM).
4. Hermafroditismo verdadeiro (HV).
5. Sndrome do sexo reverso (SSR) ou Homem XX.
PSEUDO-HERMAFRODITISMO FEMININO (PHF)
1. ADRENAL (defeito da sntese do cortisol, causando hiperplasia congnita da adrenal - HCA)
a) Deficincia da 21-hidroxilase (forma pura ou completa);
b) Deficincia da 21-hidroxilase com perda de sal (forma incompleta);
c) Deficincia da 11--hidroxilase (forma hipertensiva arterial devido ao acmulo do composto S ou
da 11-deoxicorticosterona);
d) Deficincia da 3--ol-hidroxiesteride deidrogenase (forma com insuficincia adrenal).
2. NO ADRENAL
a) Hormonal: devido produo de hormnios atravs de tumores materno (ovariano ou adrenal) ou
iatrognico, que decorrente da ingesto materna de hormnio sinttico;
b) Idioptico (etiologia desconhecida);
c) Outros distrbios masculinizantes no induzidos por hormnios e associados a malformaes
urinrias
PSEUDO-HERMAFRODITISMO MASCULINO (PHM)
1. Defeitos na ao perifrica da testosterona
a) Forma completa resistncia ou insensibilidade perifrica total testosterona
(antiga sndrome de Morris);
b) Forma incompleta e suas variantes:
Tipo I - resistncia ou insensibilidade perifrica parcial a testosterona
(antigas sndromes de Lubs, Gylbert-Dreyfus, Reifenstein e Rosewater);
Tipo II - diminuio na sntese da diidrotestosterona (deficincia da 5--redutase).
2. Erros inatos da biossntese da testosterona
(Deficincias da 3--hidroxesteride deidrogenase; 17-hidroxesteride deidrogenase;17--hidroxilase;
colesterol desmolase; 17,20-desmolase).
3. Alterao na sntese ou na secreo ou da resposta ao fator ou substncia inibidora dos ductos Mllerianos
(sndrome da persistncia dos ductos Mllerianos ou hrnia tero-inguinal - HUI).
4. Sndrome da regresso testicular (SRT)
a) Precoce (forma pura);
b) Tardia (Anorquia congnita bilateral).
5. Sndrome dos testculos disgenticos, displsticos ou rudimentares.
6. Agenesia ou hipogenesia (displasia) das clulas de Leydig.
7. Idioptico: sem causa aparente, em pacientes com criptorquia uni ou bilateral, hipospadia e uretra
contendo vagina em fundo cego, ou melhor, remanescente Mlleriano ou utrculo prosttico persistente.

8. Ingesto materna de progestgenos ou estrgenos- devido interferncia transplacentria.


FORMAS NO CLASSIFICADAS
1. SEXO MASCULINO
a) Genitlia ambgua associada com anomalias mltiplas: sndromes malformativas (sndrome de
Aarskog, sndrome de Optiz etc.);
b) Agenesia de pnis (afalia) associado a anomalia ano-retal (AAR);
c) Transposio penescrotal (TPE), com ou sem remanescentes Mllerianos e (ou) AAR;
d) Micropnis;
e) Epispdias e hipospadias?;
f) Pnis bifendido ou duplo que pode estar associado a extrofia de bexiga ou de cloaca;
g) Outras sndromes de causas gnicas ou de cromossomos, ver Quadro 2.
2. SEXO FEMININO
Defeito hereditrio dos ductos de Mller ou agenesia vaginal: sndrome de Mayer-Rokitansky-Kster-
Hauser.

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DIAGNSTICO

A avaliao do RN com genitlia ambgua constitui uma emergncia,


devendo seu diagnstico, portanto, ser feito nas primeiras horas de vida; do
contrrio, poder at levar ao xito letal (HCA com perda de sal). De incio, devero
ser feitos uma anamnese e um exame fsico detalhado. A anamnese deve ser
dirigida para obteno dos seguintes dados (Quadro 23.2):
a) Ingesto de medicamentos pela me durante a gravidez, no intuito de saber se
houve ingesto de testosterona, progestgenos ou estrgenos (por exemplo,
orexgenos, anabolizantes, anticoncepcionais, medicamentos para atraso
menstrual, abortivo ou antiabortivo, principalmente no perodo entre a 8 e
14 semana de gestao);
b) Histria de tumor adrenal ou ovariano na genitora;
c) Ocorrncia de abortos ou de bito, em partos prvios, nas primeiras semanas
de vida, fato que se verifica nos portadores de HCA com perda de sal;
Histria familiar materna, inquirindo sobre parentes (do pai e da me do RN),
consanginidade, esterilidade, amenorria ou presena de hrnia, contendo
gnada anormal no sexo feminino, uma vez que certas sndromes so
autossmicas recessivas (Quadro 23.3).

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Quadro 23.3:
PROTOCOLO-HOSPITAL INFANTIL DARCY VARGAS (HIDV).(NASC= NASCIMENTO)

O exame fsico da genitlia externa o que desperta ateno. Durante o


exame se nota um falo em geral hipoplstico com hipospadia (o pnis tem apenas
um frnulo na superfcie ventral medial) ou micropnis (o meato da uretra est
situado no pice da glande e as gnadas so palpveis) ou uma clitoromegalia (o
clitris tem, na superfcie ventral, duas pregas que descem lateralmente linha
mediana). As pregas lbio-escrotais podem ser simtricas ou assimtricas, com
maior ou menor grau de enrugamento, fundidas na linha mediana ou bifendida,
tendo um ou dois orifcios para a genitlia. Quando da presena de apenas um
orifcio genital, deve-se assinalar a sua correta posio: peniana, peniano-escrotal,
escrotal ou perineal. Orifcio nico pode representar o meato da uretra ou abertura
do sinus urogenital e seu dimetro ser tanto maior quanto mais posterior for
sua localizao (Figura 23.2).
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FIGURA 23.2: Exame da


genitlia ambgua: apresenta
orifcio perineal nico,
clitoromegalia (falo encurvado
e com duas pregas laterais na
superfcie ventral). Notar a
assimetria e uma gnada na
prega lbio-escrotal.

Pela inspeo e palpao das pregas lbio-escrotais e regies inguinais,


procura-se verificar a presena de gnadas. Quando presentes (geralmente
testculo), anotar a consistncia, tamanho, forma, mobilidade, nmero e
localizao. A ausncia (gnadas impalpveis) interpretada como de localizao
intra-abdominal e, neste caso, se a genitlia for masculinizada ou masculina
(fentipo masculino externo), deve ser diagnosticado como estado intersexual, o
mesmo ocorrendo quando se palpa(m) gnada(s) nas regies inguinais ou lbio-
escrotais numa genitlia feminina (fentipo feminino externo). Para reforar estas
premissas, podemos mentalizar que toda gnada intraperitoneal, at que se prove
o contrrio, ovrio; a recproca tambm verdadeira, isto , toda gnada palpvel,
at que se prove o contrrio, testculo (Figura 23.2).
O falo ser examinado quanto: a) implantao alta (pubiana) ou baixa
(entre as pregas lbio-escrotais, nestas com freqncia alojam gnadas) (Figura
23.3); b) ao grau de curvatura ventral, aspecto trfico da glande e formato do
prepcio; c) ao ndice clitoriano ou flico, obtido pela medida em centmetros do
comprimento e largura. O ndice resultante do produto destas duas medidas e
dever ser igual a 6cm2 (o pnis normal no RN deve medir mais que 2,5cm e o
clitris at 1cm de comprimento).

FIGURA 23.3: Inspeo


da genitlia externa: falo
hipodesenvolvido com
implantao baixa e
localizado entre as pregas
lbio-escrotais contendo
gnadas.

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CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 913
A avaliao da genitlia interna ser feita pelo toque retal bimanual,
sentindo-se a dimenso, a localizao, a consistncia e o nmero de gnadas.
o exame mais simples e precoce para descobrir tumor gonadal e determinar
tambm a presena e tamanho do crvix (tero), em geral, bem desenvolvido no
RN. A compresso do tero de encontro ao pube, ao toque bimanual no RN,
promove a eliminao de uma secreo branca-amarelada pelo orifcio genital
(ao dos estrgenos maternos intra-tero sobre o feto, estrinizao materno-
fetal), sinal de presena da crvix (fentipo feminino interno).
O primeiro exame complementar a determinao da cromatina sexual,
ou melhor, a cromatina de Barr, facilmente visvel nas clulas obtidas do esfregado
da mucosa oral. As clulas dos indivduos que contm dois cromossomos X
possuem uma partcula extra, o corpsculo de Barr. Assim, em geral, o sexo
feminino denominado de cromatino-positivo (gentipo feminino), porm esta
cromatina no serve para fazer diagnstico nem para designar sexo, serve
apenas para orientao. Segue-se a dosagem, no plasma, da 17- -
hidroxiprogesterona: ndice acima de 3,6g/ml no RN confirma a suspeita do
diagnstico de HCA, fato que ocorre em 70% dos casos de GA investigados no
perodo neonatal. Na impossibilidade de se obter a dosagem no plasma de 17--
hidroxiprogesterona, procede-se ento dosagem urinria de 24 horas de 17-
cetoesterides (17-KS) e 17-hidroxiesterides (17-OH) e do pregnanetriol (nveis
elevados tambm so indicativos de doena adrenal).
O RN, nas primeiras semanas de vida (entre 6o e 14o dias de vida), deve ser
mantido sob rgida vigilncia clnica e laboratorial, enquanto se aguardam as
provas laboratoriais, como dosagens no plasma de sdio e potssio (quadros
clnicos de HCA com perda de sal, ou melhor, diabetes sdio pode apresentar-se
com anorexia, vmitos persistentes, diarria e desidratao grave; o achado
laboratorial o de uma hipernatriria, hiponatremia, hipercalemia e acidose
metablica. A forma grave deve ser rapidamente reconhecida e tratada com
urgncia, caso contrrio o bito ocorre subitamente na maioria dos casos). Para
se identificar corretamente as formas de HCA, sero dosados os precursores do
cortisol, estabelecendo-se desta forma o nvel do bloqueio metablico. Isto ser
feito pelo mtodo do radioimunoensaio e compreende dosagens de
androstenediona ( 4), 11-desoxicortisol (composto S), sulfato de
diidroepiandrosterona (DHEA-S), desoxicorticosterona (DOC) e, tambm,
testosterona, aldosterona, cortisol e renina.
Os defeitos de bloqueio enzimtico na sntese hormonal dos esterides
podem resultar em deficincia da 21-hidroxilase, 11--hidroxilase; 3--ol-
hidroxiesteride deidrogenase; 17--hidroxilase; 17--hidroxiesteride xido-
redutase; 3--hidroxiesteride deidrogenase; 17-20-desmolase e colesterol-
desmolase, que contribuem para a produo de vrias sndromes (erros inatos
de biossntese da testosterona).
Demais exames, sendo alguns obrigatrios, outros de conformidade com
cada caso, so:
a) caritipo - indispensvel na determinao do sexo gentico e cromossmico;
b) exame de urina: tipo I e (ou) cultura - para avaliar a presena de infeco
urinria, quase sempre presente em conseqncia da comunicao entre o
trato urinrio e o genital, ou seja, atravs do SUG ou tambm decorrente de
anomalias do trato urinrio alto;
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c) exame radiogrfico simples de trax e abdome, para diagnosticar anomalias


associadas (p. ex. vertebrais etc.) e raios X de mo, para determinar a idade
ssea, este ltimo s tem utilidade aps seis meses de idade;
a) exame ultra-sonogrfico ou urografia excretora, para diagnosticar provvel
anomalia do trato urinrio alto (Quadro 23.2).

A uretrocistografia miccional ou genitografia ou sinografia ou vaginografia serve


para melhor estudar as relaes anatmicas entre o trato urinrio baixo e o genital. Nem
sempre se consegue avaliar com exatido as relaes anatmicas por estes exames, mas
atravs da uretrocistovaginoscopia estas relaes so possveis de se obter (Figuras 23.4,
23.5, 23.6 e 23.7). O exame conduzido sob anestesia geral e simultneo com o radiolgico
e, assim, pode-se determinar a presena do SUG, o comprimento e o tipo da uretra, o
canal vaginal e sua relao com a uretra e, finalmente, a visualizao ou no da crvix.

FIGURA 23.4:
Uretrocistografia mic-
cional: observa-se
abaixo bexiga a vagi-
na em fundo cego que
se comunica com a
uretra longa (tipo
masculina).

FIGURA 23.5: Genito-


grafia: obtida com injeo
de contraste com uma
seringa aplicada direta-
mente no orifcio perineal.
Pode-se observar a vagi-
na por trs da bexiga, es-
tas se comunicam adian-
te para constituir o sinus
urogenital.

FIGURA 23.6: Vagi-


nografia: realizada
atravs da injeo de
contraste por sonda.
Vagina em fundo
cego.

FIGURA 23.7:
Uretrovaginocis-
toscopia: atravs
deste aparelho e
exame contrasta-
do, consegue-se
medir a distncia
da confluncia do
sinus urogenital
ao orifcio peri-
neal.
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CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 915
A ultra-sonografia para encontrar tero, gnadas intra-abdominais e
estruturas do SUG ainda tem-se mostrado inadequada em nosso meio, com alto
ndice de resultados falso-positivo e falso-negativo, muitas vezes dificultando o
diagnstico e (ou) a conduta a ser adotada, tanto para se designar o sexo como
para indicar alguma cirurgia (por exemplo, laparotomia). Em geral poder at
ser dispensado, porque, na maioria das vezes, no toque retal possvel a palpao
de alguma dessas estruturas.
A tomografia computadorizada e (ou) ressonncia magntica tm se
mostrado teis na confirmao da presena de estruturas j percebidas ao exame
fsico ou atravs da ultra-sonografia.
A laparoscopia ou a videolaparoscopia um mtodo simples e eficiente,
mas o custo operacional (material descartvel etc.) ainda se torna alto em nosso
pas, alm de ser um processo que despende de relativo tempo na sala de cirurgia
e necessita de trs pequenas incises no RN para se fazer uma simples biopsia
gonadal, ou gonadectomia e (ou) histerectomia. Por sua vez, nos hospitais que
no possuem esta aparelhagem a minilaparotomia tem-se mostrado uma
alternativa simples, rpida e tambm eficiente, sendo possvel realizar os mesmos
procedimentos atravs de uma pequena inciso de Pfannensteil e ter alta
hospitalar dentro de 24 horas. Por outro lado, em determinados casos, como,
por exemplo, nas meninas com pseudo-hermafroditismo masculino, a laparotomia
ou laparoscopia dispensvel, bastando apenas inguinotomias (Figuras 23.8 e
23.9) para se efetuar as gonadectomias (Quadro 23.2).

FIGURA 23.9: Inguinotomia por meio de uma inciso de


1,5cm, para extirpao de gnada inadequada ao sexo
de designao.

FIGURA 23.8: Minilaparotomia por meio da inciso


de Pfannensteil.
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Aps execuo da anamnese, exame fsico, laboratorial ou


anatomopatolgico, devemos fazer o diagnstico diferencial entre as diversas
formas de estados intersexuais e subsequente designao sexual. Foram
elaborados dois algoritmos para se chegar aos diagnsticos e designaes sexuais,
mas apenas e exclusivamente na GA, tomando-se como ponto de partida a
pesquisa da cromatina sexual ou a palpao de gnadas (Quadros 23.4 e 23.5).

Quadro 23.4: ALGORITMO DO DIAGNSTICO DIFERENCIAL E DESIGNAO SEXUAL NA GA, BASEADO


NO EXAME INICIAL DA CROMATINA SEXUAL (OH= hidroxi; FAM= familial; ID= idioptico; INC= incompleto;
ESP= espordica; = no; HORM= hormonal; TEST.= testculo; OV= ovrio; OT= ovotstis; GN= gnada; (F/
M)= sexo de designao (feminino ou masculino); (+) ou (-)= cromatina positiva ou negativa)**.

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CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 917
Quadro 23.5: ALGORITMO DO DIAGNSTICO DIFERENCIAL E DESIGNAO SEXUAL NA GA, BASEADO
NO EXAME INICIAL DA PALPAO DE GNADAS. (OH= hidroxi; ID= idioptico; INC= incompleto; = no;
HORM= hormonal; FAM= familial; INGUIN= inguinotomia; TEST.= testculo; GN= gnada; OV= ovrio; OT=
ovotstis; (F/M)= sexo de designao (feminino ou masculino); (+) ou (-)= cromatina positiva ou negativa)**.

Outras formas de estados intersexuais, alm das j descritas, necessitam de


orientao do diagnstico. Para tal, seguimos a classificao de Braz (1996) com
modificaes, que est descrita neste artigo. Distrbios da diferenciao sexual no
envolvendo ambigidade genital, tais como sndrome de Klinefelter, sndrome de Turner,
HCA no sexo masculino e micropnis no sero discutidos (Figura 23.10).
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918 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

FIGURA 23.10: Micropnis:


pnis diminuto e com
conformao anatmica normal.
Notar os escrotos hipoplsticos
e embutidos no excesso de
adiposidade perineal, que so
caractersticas desta anomalia.

DIAGNSTICOS ESPECFICOS DAS SNDROMES

1. A DGP uma entidade rara e o diagnstico no RN extremamente difcil, a


no ser que apresente GA (somente naqueles casos em que h alguma sntese de
testosterona persistente), mas caracterizada pela presena de duas gnadas
em fita (banda de tecido fibroso sem clulas germinativas) ou duas gnadas
displsticas ou tumor, tero rudimentar (hipoplstico) e a genitlia externa pode
se apresentar hipoplstica, com ou sem clitoromegalia e raramente ambgua.
A cromatina ser positiva ou negativa, como tambm o antgeno H-Y, que
pode ser negativo (sndrome da agenesia testicular familial) ou positivo, nesta
ltima condio (20% a 30% dos casos) apresenta alta incidncia de tumores
nas gnadas (gonadoblastoma ou disgerminoma). O caritipo dever ser 46,XX
ou 46,XY. Quando apresentar o caritipo 46,XX, se for familial, a transmisso
autossmica recessiva ou de outra forma espordica. Por outro lado, se tiver o
caritipo 46,XY a transmisso gentica ou , autossmica dominante limitada
ao sexo masculino (neste caso familial) ou, devido a um locus ligado ao
cromossomo X ou, em algumas vezes espordica. Nos pacientes com caritipo
46,XY existe duas formas: a completa (sndrome de Swyer) e a incompleta, esta
tem ambigidade genital.
Na DGP as dosagens do LH e FSH sempre esto elevadas, entretanto, a
testosterona baixa naquelas com caritipo 46,XY e o estradiol baixo naquelas
com caritipo 46,XX. Quando a genitlia externa feminina e normal, se diferencia
clinicamente da sndrome de Turner por no apresentar os estigmas desta ltima.
Os pacientes portadores de DGP na puberdade apresentam: amenorria primria,
mamas hipoplsticas, infantilismo genital, proporo eunucide, altura elevada
ou normal e escasso desenvolvimento de plos axilares e pubiano.

2. A DGM conceituada pela evidncia de um testculo com aplasia germinativa


e uma gnada em fita ou tumor, cromatina negativa, caritipo 45,X/46,XY (s
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 919
vezes 46,XY), sempre existe a presena de tero unicrnio (fentipo interno
sempre feminino), SUG e uma trompa situada no lado da banda fibrosa, algumas
vezes pode apresentar resqucios dos ductos de Wolff ipsilateral ao testculo. A
genitlia externa se apresenta desde um fentipo feminino normal at um fentipo
masculino normal, passando por graus variveis de ambigidade genital. Esta
forma de estado intersexual habitualmente tem fentipo feminino externo e
apresenta clitoromegalia, no entanto, em casos mais raros, quando o caritipo
46,XY e tem dois testculos displsticos (ou tumor), pode ocorrer que a genitlia
externa pode estar mais prxima do fentipo masculino, inclusive com uma das
gnadas palpveis (genitlia assimtrica); embora possa existir esta correlao
entre o achado citogentico e o grau de ambigidade genital, muitos autores no
tm aceito esta condio (Figura 23.11).

FIGURA 23.11: Disgenesia


gonadal mista: genitlia
externa feminina assim-
trica, sem gnadas palp-
veis e com discreta clitoro-
megalia.

Tanto o testculo como a banda fibrosa apresentam potencial de


malignidade (15% a 20% com caritipo 45,X/46,XY e numa maior incidncia
com o caritipo 46,XY e antgeno H-Y positivo). Com relao aos hormnios, LH
e FSH esto elevados. Na puberdade pode haver virilizao ou feminizao; em
ambas as situaes, quando ocorrer, dever ser pesquisado a presena de tumor
gonadal. Talvez a DGM (testculo e vestgio de uma gnada ou dois testculos
displsticos) seja um ponto de juno ou uma forma intermediria entre o HV
(testculo e ovrio - 45,X) a ST (dois vestgios de gnadas - 45,X) e o PHM (dois
testculos displsticos - 46,XY).

3. O diagnstico do HV se baseia na presena de tecido histologicamente ovariano


e testicular no mesmo indivduo, em gnadas distintas ou coexistindo numa
mesma gnada, ou seja, um ovotstis (44% a 66% dos casos), que podero ser
palpveis ou no. A genitlia externa freqentemente ambgua e assimtrica
(45% dos casos apresentam hrnia inguinal unilateral) e 75% a 80% tm
caracterstica externa mais para o sexo masculino, mas, poder tambm ter um
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
920 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

espectro desde uma genitlia feminina normal at uma genitlia masculina normal
(Figura 23.12 e 23.13).

FIGURA 21.12: Hermafroditismo verdadeiro: genitlia


externa masculinizada assimtrica e com uma gnada na
regio lbio-escrotal.

FIGURA 21.13: Conformao


macroscpica tpica de um
ovotstis.

Com relao cromatina, apresenta-se positiva (70% a 80%) ou negativa,


quanto ao caritipo pode ser 46,XX (60% a 80%) ou 46,XY ou mosaicos (10%),
por exemplo, 45,X/46,XY. Por outro lado, quase sempre esto presentes o tero
(pelo menos rudimentar) e o antgeno H-Y ou o gene SRY, principalmente nos
casos com caritipo 46,XY. A degenerao maligna freqente, mas somente
quando h a presena de tecido testicular e do cromossomo Y. O HV reponde por
10% dos estados intersexuais e provavelmente pode ser determinado por gene
autossmico recessivo; mutao de um gene autossmico; quimerismo ou
translocao de genes do cromossomo Y ou para um autossomo ou um
cromossomo X. Na puberdade, 75% a 80% dos pacientes apresentam
ginecomastia, a virilizao insuficiente e mais de 50% menstruam; com
referncia a este ltimo sintoma, ocorre em dois teros dos casos com tero e
podero ser frteis ou no.

4. Na SSR (homem XX) h uma incidncia de 1/20.000 nascimentos, no


apresenta retardo mental e 80% a 90% dos casos no tm ambigidade genital.
No entanto, em dois teros dos pacientes apresentam GA o antgeno H-Y ou gene
SRY esto presentes e o fentipo interno masculino. Pode resultar da
transposio do gene do antgeno H-Y para um cromossomo X ou decorrente de
um gene autossmico recessivo ou dominante. Na puberdade no apresenta
propores eunucides, mas a distribuio da pilosidade pubiana, em geral,
do tipo feminino, 30% dos pacientes desenvolvem ginecomastia e os testculos
so hipoplsticos e infrteis.
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 921
5. O PHF por definio a combinao da presena de dois ovrios, tero e
trompas normais, cromatina positiva e caritipo 46,XX. Ao exame da genitlia
externa verifica-se que as gnadas no so palpveis, apresenta-se simtrica e
sempre feminina virilizada. Esta virilizao pode variar num espectro desde
uma genitlia feminina com clitoromegalia e discreta fuso lbio-escrotal (neste
caso a exposio a testosterona ocorreu aps a 12a semana de gestao) at uma
genitlia masculina e com o meato uretral localizado no pice da glande (ao da
testosterona antes da 12a semana de vida embrionria). Por outro lado, poder
estar associada pilificao pubogenital e ao aumento da impregnao
melanocitria (mamilos e genitlia externa), fatos estes que no ocorrem nas
outras formas de estados intersexuais, como tambm a maturao ssea e
fertilidade, esta ltima pode estar presente em 100% dos casos (Figura 23.14).

FIGURA 23.14: Pseudo-hermafroditismo feminino devido a hiperplasia congnita adrenal.


Observar a pilificao pubogenital, clitoromegalia, gnadas no palpveis e aumento
das pregas lbio-escrotais.

O PHF est representado principalmente pela HCA (80% a 90% dos casos
de PHF), caracterizada por um defeito enzimtico da sntese do cortisol (deficincia
da 21-hidroxilase na camada fasciculada da adrenal- forma pura ou completa),
com aumento do ACTH e ocasionando insuficincia de glicocorticides (17--
hidroxiprogesterona elevada e cortisol baixo), associada ou no a uma deficincia
de mineralo-corticides denominada de forma perdedora de sal (50% a 80% dos
casos de HCA - forma incompleta). No entanto, pode haver tambm casos com
insuficincia da 11--hidroxilase (hipertenso arterial) e deficincia da 3--
hidroxiesteride deidrogenase (insuficincia adrenal). O padro gentico de
herana autossmica recessiva (brao curto do cromossomo 6). Em contraposio,
no homem com HCA a genitlia externa normal para este sexo (fentipo
masculino), mas apresenta macrogenitossomia e maturao ssea.
A HCA com perda salina (deficincia da 21-hidroxilase nas camadas
fasciculada e glomerulosa da adrenal - diabetes sdio) apresenta valores elevados
da 17--hidroxiprogesterona no plasma e da atividade da renina, associados a
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
922 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

hipernatriria, hiponatremia, hiperpotassemia e aldosterona diminuda. O quadro


clnico relacionado ao episdio de perda de sdio (50% dos casos ocorre entre o
6 e 14 dia de vida) : observao do comprometimento do dbito ponderal <
10g/dia entre o 10 e o 15 dia de vida, anorexia, vmitos com desidratao,
acidose metablica e choque hipovolmico.
Na HCA com hipertenso arterial, alm dos precursores da testosterona
estarem elevados (17--hidroxiprogesterona), o composto S e a DOC esto tambm
aumentados e h queda de atividade da renina plasmtica e, conseqentemente,
reduo na secreo de aldosterona.
O PHF idioptico ser diagnosticado quando a dosagem da 17- -
hidroxiprogesterona for normal, na ausncia de qualquer padro familiar, histria
negativa de ingesto ou exposio hormonal pela me durante a gravidez, falta
de progresso ps-natal da virilizao e tambm o fentipo interno sempre
feminino.

6. O PHM caracteriza-se pela presena de dois testculos, cromatina negativa,


caritipo 46,XY e a genitlia externa poder tambm variar, dentro de um espectro
desde uma genitlia feminina normal com gnadas palpveis (testculos infrteis)
ou com virilizao incompleta (10% dos casos) at uma genitlia masculina normal
com hrnia inguinal contendo tero (HUI), mas, habitualmente, apresenta-se
com fentipo feminino externo, porm sem tero (fentipo masculino interno) e
vagina hipoplstica em fundo cego abrindo-se na vulva ou fazendo parte do
SUG, s vezes, pode estar ausente (Figura 23.15).

FIGURA 23.15:
Pseudo-hermafro-
ditismo masculino
decorrente da sn-
drome completa de
insensibilidade perif-
rica a testosterona.
Notar a genitlia
feminina, sem clitoro-
megalia e gnadas
palpveis nas regies
lbio-escrotais.

O PHM decorrente dos defeitos da ao perifrica da testosterona (formas


completa e incompleta) ocorre numa proporo de 1/60 mil nascimentos em
geral, embora em um tero dos pacientes a histria familiar seja negativa (mutao
gentica); a transmisso de herana recessiva ligada ao cromossomo X ou
autossmica dominante ligada ao sexo. As gonadotrofinas (LH e FSH) esto
elevados e devido presena dos testculos os nveis de testosterona e estrgenos
so elevados para o sexo feminino. Nestes casos, quando designados ao sexo
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 923
feminino, a gonadectomia dever ser indicada ao diagnstico. Na puberdade em
geral so eunucides, com amenorria primria, escassez ou ausncia de plos
axilares ou pubiano, haver desenvolvimento normal de mamas, com mamilos
pequenos e no produziro leite e, portanto, no depender da presena dos
testculos para o desenvolvimento das mamas (Figuras 23.16 e 23.17).
Na deficincia da 5-redutase, que decorrente de mutao gentica ou
transmisso autossmica recessiva, a genitlia externa ambgua e tende a
desenvolver-se para o sexo feminino, embora apresente pregas lbio-escrotais

FIGURA 23.16: Pseudo-hermafroditismo


masculino decorrente da sndrome
incompleta de insensibilidade perifrica a
testosterona. Observar a genitlia feminina,
clitoromegalia e uma gnada palpvel.

FIGURA 23.17: Pseudo-


hermafroditismo masculino:
testculos extirpados no
condizentes com o sexo de
criao.

enrugadas e gnadas inguinais ou escrotais. O clitris sempre est aumentado


(falo hipodesenvolvido com hipospadia perineal) e tem vagina em fundo cego ou
abrindo-se no SUG, porm o fentipo interno sempre masculino. O diagnstico
feito atravs das dosagens da T e DHT (estrgenos, T e o LH e FSH so normais)
feitas antes e aps administrao do hormnio gonadotrfico corinico (HGC),
na dosagem de 400UI por kg de peso corpreo, divididas em quatro aplicaes
IM a cada quatro dias; como resultado, a relao T/DHT tem de ser sempre
maior que 75. Esta sndrome difere dos outros tipos de PHM, porque na puberdade
no desenvolve ginecomastia, os pacientes no apresentam acne nem barba,
mas virilizam incompletamente, com engrossamento da voz e desenvolvimento
muscular, podendo at ser homens frteis, apesar de haver hipoplasia prosttica.
Na HUI ou sndrome da persistncia dos ductos Mllerianos ou sndrome
da ausncia ou deficincia de sntese do MIS, a transmisso gentica
autossmica recessiva ligada ao sexo ou ao cromossomo X. A caracterstica
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
924 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

principal a presena de tero rudimentar e trompas num paciente com genitlia


externa masculina normal (fentipo externo masculino), portador de hrnia
inguinal e (ou) criptorquia. Os testculos freqentemente so hipoplsticos, mas
podero ser frteis ou no (por exemplo, so infrteis quando h agenesia de
epiddimo, embora haja virilizao normal).
Na SRT (forma pura e precoce) a genitlia externa feminina ou ligeiramente
hipoplstica ou raramente virilizada com clitoromegalia. A genitlia interna,
quando presente, est representada por tero rudimentar, s vezes apresenta
ductos de Wolff rudimentares. Provavelmente, a SRT de herana autossmica
recessiva, com manifestao limitada ao sexo masculino e penetrao incompleta;
por outro lado, o antgeno H-Y est freqentemente presente e as gonadotrofinas
esto elevadas. Na puberdade ficam eunucides. Na anorquia congnita bilateral
(forma tardia), a atrofia do testculo acorre aps a 14a semana de gestao.
O PHM idioptico se caracteriza pela presena de GA sem causa aparente,
cujos pacientes so portadores de criptorquia uni ou bilateral, hipospadia e a
uretra pode ter uma vagina em fundo cego, ou melhor, com remanescente
Mlleriano ou utrculo prosttico persistente. Para melhor diagnosticar o PHM
idioptico, estabelecemos alguns critrios que serviro, tambm, para alertar
sobre a possibilidade de outras formas de estados intersexuais (Quadro 23.6).
Outras formas de PHM, como as sndromes decorrentes da agenesia das
clulas de Leydig, dos defeitos da sntese de testosterona e tambm outras formas
no classificadas, como micropnis, agenesia de pnis, sndromes malformativas
etc., em virtude da extrema raridade no sero abordadas neste artigo.
Quadro 23.6: CRITRIOS PARA SE DIAGNOSTICAR O PHM IDIOPTICO E OUTROS
EVENTUAIS ESTADOS INTERSEXUAIS
- VEROMONTAMUM (VM) INDISTINGUVEL OU BIFENDIDO
- PRESENA DE UTRCULO PROSTTICO (REMANESCENTE MLLERIANO OU DIVERTCULO DE URETRA NO VM OU
VAGINA EM FUNDO CEGO OU PSEUDOVAGINA)
- PERSISTNCIA DOS DUCTOS DE MLLER- COM OU SEM VAGINA
- GENITLIA AMBGUA COM OU SEM REMANESCENTES MLLERIANO
- CRIPTORQUIA UNILATERAL (TESTCULO NO PALPVEL) COM HIPOSPADIA
- CRIPTORQUIA BILATERAL COM PSEUDOVAGINA- COM OU SEM HIPOSPADIA
- GENITAL EXTERNO ASSIMTRICO COM HIPOSPADIA- SEM UTRCULO PROSTTICO
- PRSTATA SUBDESENVOLVIDA (HIPOPLSTICA) OU AUSENTE
- TRANSPOSIO PENESCROTAL COM OU SEM HIPOSPADIA E VAGINA EM FUNDO CEGO

Finalizando, devemos sempre estar alertas para outros diagnsticos que


podem ser confundidos com os estados intersexuais, os quais esto relacionados
ao comportamento psquico-sexual dos pacientes que durante o desenvolvimento
fsico-psquico passaram a ter comportamento inadequado ao sexo de criao. O
diagnstico diferencial dos estados intersexuais com esses distrbios, que por
sinal independe da vontade dos pacientes, segundo Money (1981) so definidos
da seguinte forma:
1- Intersexuado: so aqueles nos quais o desenvolvimento dos rgos sexuais
tomou um rumo incompatvel numa das encruzilhadas do caminho antes do
nascimento.
2- Homossexual: so aqueles que tem a resposta ertica a indivduos com o
mesmo tipo de anatomia sexual externa que a prpria pessoa.
3- Travesti: so aqueles que tem a necessidade compulsiva de vestir as roupas e
assumir a personalidade do sexo oposto.
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 925
4- Transexual: so aqueles cuja identidade sexual voltou-se totalmente contra a
sua anatomia, onde o tpico transexual homem-para-mulher possui um corpo
masculino normal.

Outro diagnstico diferencial que deve ser feito, agora com relao a
semntica, entre bissexual e ambissexual, segundo Aurlio (Ferreira, 1995) o
bissexual o ser que rene os dois sexos (hermafrodita, ou melhor, intersexuado)
e, ambissexual o que participa dos dois sexos (indivduos que apresentam
problemas psquico-sexuais). Um resumo do diagnstico diferencial e das variveis
de comportamento entre estas afeces foi elaborado por Braz (1995) (Quadro
23.7).

Quadro 23.7: DIAGNSTICO DIFERENCIAL DOS ESTADOS INTERSEXUAIS COM


DISTRBIOS OU AFECES RELACIONADAS AO COMPORTAMENTO SEXUAL.
(HOMO= HOMOSSEXUAL; HETERO= HETEROSSEXUAL).

ORIENTAO E CONDUTA

No RN com genitlia ambgua se deve procurar estabelecer o mais


precocemente possvel a natureza exata da deficincia. Desta forma pode-se
orientar o tratamento mdico e o familial, com o objetivo de se atribuir o sexo
correto antes da alta do Servio de Neonatologia ou berrio. A orientao paterna
deve abordar os seguintes pontos:
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
926 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

1. Informao correta do problema que afeta a criana;


2. Solicitar que no faam o registro civil, este procedimento evita que se designe
o sexo civil, que pode no ser o definitivo, trazendo implicaes jurdicas futuras,
se houver necessidade de redesignao do sexo. Em caso de transferncia
para um centro especializado, o encaminhamento deve ser processado como
recm-nascido de...(nome da genitora); riscar apenas o nome sexo, mas sem
mencionar sexo indefinido, indeterminado ou o diagnstico, por exemplo
hermafroditismo. No fornecer documento algum que possibilite o registro da
criana - com este procedimento, os pais se vero obrigados a procurar o
servio indicado;
3. Examinar a genitlia da criana juntamente com os pais, a fim de que possam
entender e colaborar, sempre que necessrio. De maneira simples, descrever
as estruturas anatmicas interna e externa, para melhor compreenso por
parte dos pais;
4. As explicaes sero simplificadas ao mximo; a linguagem acompanhar o
nvel sciocultural, como por exemplo: os genitais no se desenvolveram por
completo, estamos investigando para saber se existe um pnis que no se
desenvolveu ou se um clitris com crescimento aumentado;
5. No usar os termos intersexo, hermafrodita ou sexo ambguo, nem tampouco
fazer comentrio algum de ordem mdica diante dos pais. Eles se comportam
psicologicamente como ambguos e qualquer observao que no entendam
aumentar a ansiedade e a dvida;
6. No permitir que seja dado nome algum criana antes do diagnstico e da
designao sexual. Jamais consentir com ou sugerir a escolha de um nome
neutro, que na verdade representa identidade ambgua, prejudicando de certa
forma a designao futura do sexo. Quando forem orientados a fazer o registro
civil, o mdico dever incentivar que se d o nome escolhido antes do
nascimento, para o sexo esperado, porm no permitir que este nome faa
parte daqueles que, para passar de masculino para feminino, basta ser
substitudo O pelo A, por exemplos: Marcelo/Marcela, Claudio/Claudia.

O ideal, tambm, que estas crianas sejam acompanhadas por um equipe


multidisciplinar. O contato com os pais sempre dever ser feito atravs do clnico
e do psiclogo conjuntamente. Estes sero os responsveis por todas as
informaes, assim como pela integrao das opinies da equipe para com os
pais. Devero expressar sempre a verdade, de maneira clara e precisa, dentro do
limite de compreenso e entendimento dos genitores, usando termos acessveis
a estes. Tal atitude facilitar, no futuro, que os pais aceitem: a) o sexo sugerido
pela equipe; b) a orientao de tratamento; c) as cirurgias que forem necessrias;
d) o envolvimento mdico-legal que, eventualmente, possa surgir.
Para atingirmos estas metas, acreditamos que, de acordo com o diagnstico
e o aspecto da genitlia externa, podemos designar o sexo seguindo o esquema
adaptado de Federman (1968) e Jones (1971) (Quadro 23.8). Para aquelas
GA difceis de avaliar, para saber exatamente qual sexo seria o mais adequado
e apropriado para a designao sexual, principalmente nas DGM, PHM e HV,
importante e devemos sempre levar em considerao o tamanho do falo e
no o tipo de gnada ou caritipo e muito menos a cromatina sexual; sendo
assim, o ideal para todos estes pacientes que suscitem dvidas que sempre
deveriam ser designados para o sexo feminino, porque a transformao do falo
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 927
em clitris de fcil execuo (clitoroplastia redutora), como tambm
mais simples construir uma vagina do que alongar um falo hipoplstico ou
um micropnis, alm de haver, no sexo masculino, a possibilidade de no ter
ejaculao e tambm o pnis no se desenvolver o suficiente para poder
realizar satisfatoriamente o ato sexual. Dinner (1979) enfatizou que errneo
acreditar que um pnis pequeno (menor do que 2cm de comprimento no RN)
venha a se desenvolver adequadamente na vida adulta.

Quadro 23.8: CRITRIOS PARA DIAGNSTICO DA GENITLIA AMBGUA E


RESPECTIVAS CONDUTAS PARA DESIGNAO OU REDESIGNAO SEXUAL.
(FEM= feminino; MASC= masculino). Adaptado e atualizado de Federman DD - Abnormal Sexual
Development. Philadelphia & London, W. B. Saunders Co., 1968, pp. 135, e de Jones HW & Scott
WW - Hermaphroditism, Genital Anomalies and Related Endocrine Disorders. Baltimore, Williams
& Wilkins Co., 1971, pp. 75.

GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS


928 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

Desta forma, podemos propor as condies primordiais para se designar


um paciente ao sexo masculino:

a) Aps estmulo com teste hormonal (HGC ou T, este ltimo na dosagem de 25


a 50mg mensais, num total de at trs aplicaes IM) haver suficiente aumento
do falo e apresentar caractersticas de pnis de que futuramente venha a ter
em repouso, no mnimo, cerca de 10cm de comprimento;
b) Presena da prstata, verificada atravs de ultra-sonografia, para poder ter
ejaculao;
c) Ter pelo menos um testculo;
d) Falo com condies propcias para a reconstruo, a fim de se obter aparncia
esttica mais prxima do normal e possibilitar ao paciente ter uma boa imagem
de sua genitlia externa, vindo assim ter condies para realizar o ato sexual
satisfatoriamente, para manuteno do equilbrio psicolgico (isto igualmente
importante, mesmo em pessoas normais) e levar uma vida ativa, saudvel e
feliz;
e) A fertilidade desejvel, porm no fator determinante para designao
sexual e pode ser prescindvel a qualquer sexo designado, ou mesmo
redesignado.

Em virtude de haver grande chance destes pacientes serem estreis,


Newman (1992) recomenda evitar comparaes da criana com caractersticas
geneticamente transmissveis de parentes, como ele tem os olhos se sua me
ou ele tem o nariz do seu pai ou do tio etc. Por que, futuramente, haver uma
srie de famlias de adultos estreis e a probabilidade de adoo ser uma
alternativa constante.
Estudos tm demonstrado que pacientes designados para o sexo imprprio
ou com genitlia externa inadequada ao coito e (ou) sem acompanhamento
psicolgico podero apresentar, na vida adulta, distrbios psicolgicos graves e
irreversveis, que eventualmente podero, inclusive, conduzir ao suicdio.
Quanto ao tratamento cirrgico, importante que alguns procedimentos
sejam realizados durante ou logo aps a elaborao do diagnstico, como biopsia
gonadal, gonadectomia etc.; por outro lado, as correes das genitlias externas
podero ser realizadas no perodo de RN ou em idades posteriores, isto , at os
seis meses de idade (clitoroplastia), primeiro ano de vida (orquiopexia), aps o
primeiro ano de vida (neofaloplastia) e puberdade (neovaginoplastia); esta ltima,
eventualmente e dependendo do nvel da implantao da vagina no SUG e das
condies socioeconmicas, poder ser efetuada na poca da clitoroplastia. Por
sua vez, na agenesia vaginal ou naquelas vaginas pequenas e de implantao
alta poder ser substituda por ala intestinal (leo ou sigmide) em qualquer
idade (Figuras 23.18, 23.19, 23.20 e 23.21).

Nos ltimos 28 anos, foram registrados 250 pacientes, assim distribudos,


de acordo com o diagnstico: PHF, PHM, DGM, HV, ST, SK, SSR, DGP, TPE,
micropnis, anomalias de cloaca e outros diagnsticos (Quadro 23.9).
Relaciona tambm as estatsticas das principais cirurgias, das designaes e
redesignaes do sexo, seguimento, bitos, alta, casamento e prole nesses
pacientes (Quadros 23.10 e 23.11).

GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS


CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 929

FIGURA 23.18: Clito-


rolabioglandoplastia
realizada numa menina
portadora de pseudo-
hermafroditismo mas-
culino.

FIGURA 23.19: Orquiopexia,


neofaloplastia e escrotoplastia reali-
zadas num menino pseudo-
hermafrodita masculino idioptico,
que apresentava criptorquia bilate-
ral, hipospadia perineal e escroto
bifendido. Notar a cicatriz escrotal e
o meato uretral no pice da glande.

FIGURA 23.20: Pseudo-hermafroditismo mas-


culino numa menina na puberdade e com
agenesia vaginal.

FIGURA 23.21: Neovagi-


noplastia: resultado est-
tico obtido.

GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS


930 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

Quadro 23.9: DIAGNSTICO E CASUSTICA DOS 250 PACIENTES REGISTRADOS

Quadro 23.10: ESTATSTICA DAS PRINCIPAIS CIRURGIAS REALIZADAS NESSES


PACIENTES COM GENITLIA AMBGUA

Analisando os diagnsticos, houve alguma concordncia entre nossa


estatstica e a literatura pesquisada; assim o PHF foi o diagnstico mais freqente
(32,4%) seguindo-se do PHM (29,6%); no entanto, o HV (3,6%) no correspondeu
aos 10% citado por Damiani (1995), porm foi proporcionalmente menos freqente
que a DGM (5,6%). Com relao ao PHF, realmente a HCA foi a anomalia mais
freqente (82,7%) (existe uma variao de 80% a 90% dentre os casos de PHF),
como tambm nas pacientes perdedoras de sal, que incidiu em 50,7% (h uma
variao de 50% a 80% nos casos de HCA).
Quanto ao PHM, 52,7% dos pacientes eram portadores da sndrome de
resistncia perifrica e 35,1% eram idiopticos. Com referncia TPE (forma
no classificada dos estados intersexuais), tivemos uma incidncia relativamente
alta, de 13,2% (33 casos), superior literatura pesquisada. Sobre a SRT, houve
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS 931
dois casos e um deles foi o 21o da literatura pesquisada. Apenas 52 casos de
SSR foram descritos na literatura mundial, onde est includo um caso nosso.
Para complementar, das duas pacientes com DGP uma tinha disgerminoma
bilateral, por sinal muito raro e tivemos tambm um paciente portador de
DGM com gonadoblastoma bilateral, os tumores foram extrados e os dois
pacientes esto vivos (Quadro 23.11).

Quadro 23.11: ESTATSTICA QUANTO DESIGNAO E


REDESIGNAO SEXUAL, MATRIMNIO, PROLE, ALTA E BITO

O PHM idioptico e tambm a TPE, esta ltima, principalmente, nas


formas incompletas (com ou sem remanescentes Mllerianos e (ou) AAR),
responderam por um nmero aprecivel de casos. Esses diagnsticos diferem,
no entanto, das estatsticas de outros autores; porm, se a maioria deles
passarem de incio a considerar como estado intersexual, as TPE, todo
paciente ou RN com gnadas no palpveis e tambm aqueles portadores de
hipospadia com criptorquia, pelo menos unilateral (30% deles esto associados
aos estados intersexuais), vero que suas estatsticas passaro a ter outros
ndices. Provavelmente, nesta ltima situao (hipospadia com criptorquia),
no mnimo o diagnstico de PHM idioptico ser confirmado em maior escala,
principalmente aps ser submetido aos exames subsidirios, como, por
exemplo, a genitografia. Neste exame ser visualizado o utrculo prosttico,
nos seus mais variados tamanhos e localizaes ao longo da uretra
(classificao de Ikoma, 1985), como tambm outras estruturas dos derivados
Mllerianos, como vagina com sua desembocadura no SUG (Figuras 23.2 e
23.3), nos seus mais variados tipos (classificao de Newman, 1992).
GENTICA BASEADA EM EVIDNCIAS SNDROMES E HERANAS
932 CAPTULO 23 - DIFERENCIAO SEXUAL ANORMAL: ESTADOS INTERSEXUAIS

CONCLUSO

Os diagnsticos nos portadores de GA foram estabelecidos segundo a


classificao de Krebs, de acordo com seu sexo gonadal. Assim, a DGM apresenta
um testculo e uma gnada em fita ou dois testculos displsticos, ou tumor. O
HV contm tecido ovariano e testicular no mesmo indivduo. O PHM aquele que
apresenta dois testculos. O PHF aquela que apresenta dois ovrios. Somente
nas duas formas de pseudo-hermafroditismo que existe concordncia entre o
sexo gonadal e o cromossmico.
Com relao aos caritipos, os diagnsticos no 46,XX (cromatina positiva)
so DGP, PHF, SSR e HV; aqueles com 46,XY (cromatina negativa) so DGP, HV,
PHM e DGM. Nos casos com 45,X/46,XY (cromatina negativa) o diagnstico
pode ser uma DGM ou HV. Assim sendo, o diagnstico da GA, de uma maneira
geral, ser orientado pela cromatina sexual, caritipo, palpaes de gnadas e
do tero, mas alguns casos somente sero confirmados atravs da histologia
das gnadas (laparotomia, laparoscopia ou inguinotomia), excetuando-se as
sndromes decorrentes dos erros de biossntese dos esterides, as formas de
estados intersexuais no classificadas e principalmente a HCA, cujo diagnstico
determinado atravs da dosagem da 17--hidroxiprogesterona e se possvel,
que seja feito na vida intra-uterina (Quadro 23.4).
Em concluso, os diagnsticos nos RN portadores de GA podero ser
estabelecidos a partir da cromatina sexual ou da palpao (ou no) de gnadas
(Quadros 23.4 e 23.5). Nesta ltima eventualidade, em gnadas no palpveis os
principais diagnsticos so DGP, SRT, PHF (genitlia externa simtrica), HV e
DGM (genitlia externa em geral assimtrica, sendo mais freqentemente
desenvolvido o lado direito) e naquelas palpveis so SSR, PHM, DGM e HV.
Quando as duas gnadas so palpveis e tambm o tero, apenas a hiptese de
diagnstico provvel em GA de HV e afastar por completo a DGM; porm,
uma gnada palpvel exclui apenas o PHF, mas mantm a hiptese de DGM;
neste caso, apenas uma gnada ser palpvel ou no (Quadro 23.5).
Para melhor entendimento, os algoritmos contidos nos quadros 4 e 5
serviro de roteiros para se chegar aos diagnsticos e designaes sexuais na
GA. Estes dados somados a padronizao de inmeras condutas, de diagnsticos,
de redesignaes ou designaes sexuais, que, devidamente catalogadas, podero
contribuir em muito para a literatura mdica.

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