Reformador 2000 04
Reformador 2000 04
Reformador 2000 04
ISSN 1413-1749
REVISTA DE ESPIRITISMO CRISTÃO
FUNDADA EM 21-1-1883
ANO 118 / ABRIL, 2000 / Nº 2.053
Fundador: Augusto Elias da Silva
Propriedade e orientação da INTERNET
PÁGINA NA WEB:
http://www.febrasil.org.br
E-MAIL:
FEDERAÇÃO ESPÍRITA [email protected]
BRASILEIRA
DIREÇÃO E REDAÇÃO
1
Editorial
Bezerra de Menezes
e
O Livro dos Espíritos
2
Primórdios do Movimento Espírita
no Brasil
JUVANIR BORGES DE SOUZA
I
A história do Espiritismo no Brasil é muito rica de fatos, de personagens e de
realizações. Um vasto documentário esparso está à espera de quem o reúna e
aprecie, com sensibilidade e conhecimento.
Ao contrário do que ocorreu nos países da Europa, nos quais os movimentos
oriundos da Nova Revelação cresceram rapidamente, nas primeiras décadas que
se seguiram aos trabalhos da Codificação, para depois estacionarem ou fenece-
rem, o Movimento Espírita no Brasil cresceu continuamente, apesar das muitas vi-
cissitudes que teve de enfrentar.
II
É interessante observar que, antes do advento do Espiritismo, com a primeira
edição de “O Livro dos Espíritos”, em Paris, em 1857, já existiam idéias espíritas
irradiadas a partir de 1847-1848, nos Estados Unidos, com os fenômenos de
Hydesville.
III
Os primeiros experimentadores da mediunidade, no Brasil, saíram dos culto-
res da homeopatia, com os médicos Bento Mure, francês, e João Vicente Martins,
português, aqui chegados em 1840, que aplicavam passes em seus clientes e fala-
vam em Deus, Cristo e Caridade, quando curavam.
José Bonifácio, o patriarca da Independência, cultor da homeopatia, é tam-
bém dos primeiros experimentadores do fenômeno espírita.
Em 1844, o Marquês de Maricá publicou um livro com os primeiros ensina-
mentos de fundo espírita divulgados no Brasil (REFORMADOR de 1944, p. 207).
IV
Entretanto, o grupo mais antigo que se constituíra no Rio de Janeiro, para cul-
tivar o fenômeno espírita, foi o de Melo Morais, homeopata e historiador, por volta
de 1853, conforme registrado em Reformador de 1º de maio de 1883.
Freqüentavam esse grupo o Marquês de Olinda, o Visconde de Uberaba e
outros vultos do Império.
Os fenômenos das mesas girantes são noticiados pela primeira vez no Brasil
em 1853, pelo jornal O Cearense.
V
Assim, quando “O Livro dos Espíritos”, em sua edição original francesa, che-
gou ao Brasil, encontrou meio favorável ao seu entendimento e divulgação, especi-
almente na elite social da Capital do Império.
3
VI
Em 1860 surgiram os dois primeiros livros espíritas em português: “Os tempos
são chegados” do professor Casimir Lieutaud, francês radicado no Rio de Janeiro,
e “O Espiritismo na sua expressão mais simples”, tradução do professor Alexandre
Canu, cujo nome só aparece na terceira edição, em 1862.
VII
Em 1863 o Espiritismo já era comentado com seriedade.
O Jornal do Commercio, o maior órgão da imprensa da Capital do Império de
então, publicava, em 23 de setembro, artigo favorável à nova Doutrina.
No ano de 1865, surge a primeira contestação de espíritas a comentários
desfavoráveis ao Espiritismo. O Diário da Bahia, de Salvador, transcrevera artigo
extraído da Gazette Médicale. Esse artigo, desfavorável e mordaz, assinado pelo
Dr. Déchambre, foi contestado pelos Drs. Luís Olímpio Teles de Menezes, José Ál-
vares do Amaral e Joaquim Carneiro de Campos, em réplica publicada em 28 de
setembro de 1865, artigo que mereceu comentários favoráveis de Allan Kardec na
Revue Spirite (vol. 8, pág. 334).
VIII
Os primeiros centros espíritas nos moldes preconizados por Kardec surgem
na Bahia (Grupo Familiar do Espiritismo), no Rio de Janeiro e em outros Estados, a
partir de 1865.
IX
Em 1869 é editado em Salvador O Eco d’Além-Túmulo, “Monitor do Espiritis-
mo no Brasil”, sob a direção de L. O. Teles de Menezes, que teve efêmera duração.
X
Em novembro de 1873 funda-se em Salvador, Bahia, a Associação Espírita
Brasileira, continuação do Grupo Familiar de Espiritismo.
Alguns membros dessa Associação fundaram, em 1874, em Salvador, o Gru-
po Santa Teresa de Jesus.
XI
A 2 de agosto de 1873 é fundada a Sociedade Grupo Confúcio, primeira enti-
dade jurídica do Espiritismo no Brasil, com estatutos impressos, amplamente noti-
ciada na imprensa nacional e estrangeira.
Nomes como os dos Drs. Siqueira Dias, Silva Neto, Joaquim Carlos Travas-
sos, Casimir Lieutaud, Bittencourt Sampaio fizeram parte dessa sociedade, cuja
divisa era “Sem caridade não há salvação”.
A esse Grupo, de curta existência de menos de três anos, deve o Espiritismo
no Brasil: a primeira tradução das obras de Kardec, por Joaquim Carlos Travassos
(Fortúnio); a primeira assistência gratuita homeopática; a primeira revelação do
Espírito Guia do Brasil — o Anjo Ismael.
XII
Vale a pena rememorar, para a edificação das novas gerações, as previsões
de Ismael, em rara e eloqüente mensagem de transcendente significação no Grupo
Confúcio, eis que ela resume a orientação espiritual no que diz respeito à missão
do Brasil:
“O Brasil tem a missão de cristianizar. É a Terra da Promissão. A Terra de to-
dos. A Terra da fraternidade. A Terra de Jesus. A Terra do Evangelho...
“Na Era Nova e próxima, abrigará um povo diferente pelos costumes cristãos.
4
Cumpre ao que ouve os arautos do Espaço, que convocam os homens de boa-
vontade para o preparo da Nova Era, reconhecer em Jesus o chefe espiritual. Com
o Evangelho explicado à luz do Espiritismo, a moral de Jesus, semeada pelos jesu-
ítas e alimentada pelos católicos, atingirá a sua finalidade, que é rejuvenescer os
homens velhos, que aqui nascerão ou para aqui virão de todos os pontos do Globo,
cansados de lutas fratricidas e sedentos de confraternidade. A missão dos espíritas
no Brasil é divulgar o Evangelho em espírito e verdade. Os que quiserem cumprir o
dever, a que se obrigaram antes de nascer, deverão, pois, reunir-se debaixo deste
pálio trinitário: Deus, Cristo e Caridade.
“Onde estiver esta bandeira, aí estarei eu, Ismael.”
XIII
Ao Grupo Confúcio seguiu-se a Sociedade Espírita “Deus, Cristo e Caridade”,
fundada em março de 1876, com programação francamente evangélica cumprida
até 1879.
Mas, cindida a Sociedade, passou a denominar-se Sociedade Acadêmica,
em processo de seleção natural e de acordo com as inclinações dos elementos
humanos. Uma ala da entidade, tendo à frente Bittencourt Sampaio, Antônio Luiz
Sayão e Frederico Junior, destacou-se para fundar a “Sociedade Espírita Fraterni-
dade”, em 1880.
A “Fraternidade” subsistiu com a orientação evangélica até transformar-se em
“Sociedade Psicológica”, desaparecendo em 1893.
Observe-se a definição de rumos, com a preocupação de alguns adeptos de-
savisados, suprimindo o qualificativo “Espírita” e substituindo-o por “Acadêmica” e
“Psicológica” nas duas Sociedades.
Em 6 de agosto de 1880 era criada, em Campos, Estado do Rio de Janeiro, a
Sociedade Campista de Estudos Espíritas.
XIV
É criado em janeiro de 1881, na cidade de Areias, São Paulo, o Grupo Espí-
rita Areense, que lançou, no mesmo ano, o jornal União e Crença.
É no ano de 1881 que o Espiritismo é perseguido pela polícia, pela primeira
vez, sendo proibidas as sessões da “Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Cari-
dade”, a Sociedade de maior prestígio à época.
XV
Em 6 de setembro de 1881, instalou-se, no Rio de Janeiro, o primeiro Con-
gresso Espírita do Brasil, do qual resultou o Centro da União Espírita do Brasil,
dentro da Sociedade Acadêmica.
XVI
Ainda em 1881, a 21 de novembro, instalou-se no Rio de Janeiro a “Associa-
ção Amor e Caridade”; em março de 1882, a “Sociedade Espírita Allan Kardec” e
em setembro de 1882 o “Grupo Espírita Santo Antonio de Pádua”.
XVII
Augusto Elias da Silva, fotógrafo português radicado no Rio de Janeiro, ob-
servando as difíceis condições para se fazer a defesa do Espiritismo pela impren-
sa, contra os ataques impiedosos e insultuosos do Catolicismo, a religião oficial do
Estado, funda, em 21 de janeiro de 1883, o jornal Reformador.
Esse órgão, que recebeu o apoio de espíritas militantes de grande prestígio
na época, como Bezerra de Menezes e o Major Francisco Raimundo Ewerton Qua-
5
dros, procedeu à análise serena e segura de uma Pastoral católica que pregava o
ódio aos espíritas.
Por essa época já existiam várias Sociedades Espíritas na Capital do Império
e em algumas províncias.
XVIII
Em 2 de janeiro de 1884 é fundada a Federação Espírita Brasileira. A iniciati-
va coube a Augusto Elias da Silva, que recebeu o apoio de Ewerton Quadros, Xavi-
er Pinheiro, Fernandes Figueira, Silveira Pinto e outros.
Instalada a novel Sociedade, com a eleição da primeira diretoria, uma das
primeiras resoluções foi a incorporação do órgão Reformador à nova Sociedade.
É interessante frisar que, apesar de sua denominação — Federação — não
contava a instituição com nenhuma filiação de qualquer outra entidade, inicialmente.
Torna-se, pois, evidente, que os objetivos da Sociedade, no campo federativo,
projetava-se no futuro, sendo seus fundadores os instrumentos de uma planificação
maior da Espiritualidade.
XIX
Ainda em 1883, surge em Campos (no atual Estado do Rio de Janeiro), em
fevereiro, a “Sociedade Espírita Concórdia” e em outubro do mesmo ano, em Ma-
caé, a “Sociedade Espírita Luz Macaense”.
O “Grupo Ismael” (Grupo de Estudos Evangélicos do Anjo Ismael), célula de li-
gação entre os trabalhadores dos dois planos da vida, funciona desde 15 de julho
de 1880, fundado por Antônio Luiz Sayão e Bittencourt Sampaio. Dele fizeram parte
Bezerra de Menezes, Frederico Junior, Domingos Filgueiras, Pedro Richard, Alba-
no do Couto e muitos outros companheiros provindos de diversos núcleos.
Acedendo Bezerra de Menezes em aceitar a presidência da Federação em
1895, o “Grupo Ismael” acompanhou o apóstolo do Espiritismo no Brasil, apoiou-o
na direção da Casa e integrou-se nela, até os dias atuais.
XX
Alguns grupos espíritas da Capital aderiram à Federação, a partir de 1885,
como o “Grupo Espírita Menezes” (REFORMADOR de 15-2-1885) e elementos
prestigiosos na sociedade fluminense: o Dr. Francisco de Menezes Dias da Cruz,
homeopata, o Dr. Castro Lopes, filólogo e escritor, e vários outros.
XXI
Mas o fato de maior significação nos arraiais espiritistas foi, sem dúvida, a
adesão ao Espiritismo do eminente político, médico e católico, Dr. Adolfo Bezerra
de Menezes Cavalcanti, perante um auditório de 2.000 pessoas, no salão de honra
da Guarda Velha, no dia 16 de agosto de 1886.
A impressa registrou o acontecimento, o telégrafo levou a notícia às Provín-
cias, a Federação recebeu muitas adesões e os círculos católicos agitaram-se.
De novembro de 1886 a dezembro de 1893, Bezerra escreveu ininterrupta-
mente, aos domingos, sob o pseudônimo de Max, os célebres artigos sobre o Espi-
ritismo, no jornal O Paiz, o mais lido no Brasil, na época.
Ao mesmo tempo que escrevia, Bezerra pregava a união dos espíritas e con-
citava os confrades à harmonia e à fraternidade.
É, por isso, considerado o campeão da unificação do Movimento Espírita,
com base na união e na tolerância entre os espíritas.
6
XXII
Em meados de fevereiro de 1889, previamente anunciado pela Espiritualida-
de, o Espírito Allan Kardec viria “fazer uma análise da marcha da doutrina no Rio de
Janeiro, dirigindo-se a todos os espíritas”.
Através do notável médium Frederico Junior, da Sociedade Fraternidade,
Kardec ofereceu as conhecidas “Instruções” para o Movimento Espírita de então.
XXIII
Bezerra de Menezes vê na Federação, nos anos de 1888-89, então sob sua
presidência, a organização ideal onde se poderia unificar o Movimento Espírita. Por
isso nela instalou, em 1889, o Centro da União Espírita do Brasil, com a aprovação
dos grupos espíritas então existentes no Rio de Janeiro.
Mas a união dos espíritas não foi conseguida, apesar dos esforços de Bezer-
ra e do apelo do Espírito Allan Kardec.
Prevalecia a divergência entre “místicos” e “científicos”.
XXIV
Em São Paulo, Batuíra fundara, em 1890, o maior núcleo espírita do País, com
sede própria, e um órgão de divulgação, o Verdade e Luz, de grande tiragem. Deu
seu apoio à Federação e tornou-se o representante dela em São Paulo.
XXV
Em maio de 1887, foi fundada em Porto Alegre (Rio Grande do Sul) a Socie-
dade Espírita Rio Grandense.
XXVI
Em fevereiro de 1890 surge em Maceió, Alagoas, o Centro Espírita das Ala-
goas.
XXVII
Em 1890, o Dr. Polidoro Olavo de São Thiago trouxe à Federação Espírita
Brasileira uma iniciativa feliz: a criação da Assistência aos Necessitados, em mol-
des espíritas.
E o Dr. Pinheiro Guedes, em 1890, incorporou à pequena biblioteca da FEB
um acervo importantíssimo de livros sobre todos os ramos do conhecimento.
XXVIII
Proclamada a República em 1889, em 1890 surge o novo Código Penal, no
qual o Espiritismo era enquadrado como transgressão à lei, em alguns de seus dis-
positivos dúbios.
O fato serviu para que os espíritas de todas as tendências se unissem contra
tais dispositivos, do que resultou a explicação do autor do Código, Dr. Antônio Ba-
tista Pereira, de que tais disposições não atingiam o Espiritismo filosófico, religio-
so, moral, educativo, mas o espiritismo criminoso, expressão infeliz então usada.
XXIX
Em compensação, o grande acontecimento que favoreceu o Espiritismo,
como também a todas as religiões praticadas no Brasil, foi a Constituição Republi-
cana, de 24 de fevereiro de 1891, que constituiu o Estado leigo, sem os liames que
o ligavam à Igreja Católica Romana.
XXX
Já por essa época fundavam-se, por todos os Estados brasileiros, núcleos
espíritas.
7
Em 1892 era fundada em Natal, Rio Grande do Norte, a Sociedade Natalense
de Estudos Espíritas.
Em maio de 1893 surgiu, na Bahia, o Grupo Espírita Amor e Caridade.
Nesse mesmo ano funda-se em Cuiabá, Estado de Mato Grosso, a Socieda-
de Espírita Cristo e Caridade, com seu órgão A Verdade.
Em 1894 é criado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, o Grupo Espírita Allan
Kardec.
Em outubro de 1894 instala-se em Lavras, Estado de Minas Gerais, o Centro
Espírita Luz e Caridade.
Em julho de 1895, funda-se em São Francisco do Sul, Santa Catarina, o Cen-
tro Espírita Caridade de Jesus.
Em julho de 1897 instalou-se em Cáceres, Mato Grosso, o Grupo Espírita
Apóstolos de Cristo e da Verdade.
Nesse mesmo ano de 1897 é organizada a Livraria da FEB, por abnegados
espíritas.
XXXI
Bezerra de Menezes, aceitando a presidência da Federação Espírita Brasilei-
ra, é empossado em 3 de agosto de 1895.
Começa uma nova fase para a Instituição, cuja influência se estende por todo
o território nacional.
Em 1897 são transferidos à Federação os direitos autorais, para a língua
portuguesa, de todas as obras de Allan Kardec, fato de suma importância para a
difusão da Doutrina Espírita no Brasil.
XXXII
Os inimigos e dissidentes internos do Movimento Espírita no Brasil sempre se
firmaram no divisionismo, no personalismo, no despreparo e nas interpretações
pessoais de determinados adeptos e nas vaidades individuais, em contraposição
aos princípios doutrinários.
Desde os primórdios do Espiritismo esses fatores estiveram presentes no
seio de seus movimentos, por toda parte. No Brasil não seria diferente.
Já os inimigos externos são conhecidos por suas atuações, desde meados do
século XIX, no Brasil: a) o positivismo, de grande influência nos primórdios da Re-
pública; b) o materialismo, opositor permanente; c) a classe clerical obscurantista.
XXXIII
Enquanto a Europa recebeu o Espiritismo nas suas expressões fenomênicas
e experimentais, não excluindo a remuneração pelos trabalhos mediúnicos, o que
desvirtua o caráter e a índole da Doutrina Espírita, no Brasil cultiva-se o Espiritismo
em seus múltiplos aspectos, mas com ênfase nos seus aspectos morais-religiosos,
com base no Evangelho de Jesus.
A expressão “Pátria do Evangelho”, usada pelo Espírito Humberto de Campos
em seu livro, é a reafirmação desse fato.
Para combater a tendência desagregadora do Movimento, de parte de alguns
adeptos, o grande remédio é a transformação interior do espírita, através da edu-
cação do pensamento pela Mensagem do Evangelho do Cristo.
A grande tarefa a ser realizada pelo Movimento, antes da reforma das institui-
ções, é a regeneração moral do espírita, para que suas instituições reflitam seu
progresso individual e coletivo.
8
XXXIV
Desaparecendo Bezerra de Menezes do cenário dos encarnados, em 11 de
abril de 1900, após quatro anos e meio de intenso trabalho de persuasão, de paci-
ência e de exemplificação, deixava consolidada a Federação Espírita Brasileira,
com a orientação doutrinária que as administrações posteriores seguiriam.
Ficaram superadas as divergências internas, o academicismo, para cuidar-se
do estudo sério da Doutrina e do Evangelho, com o fortalecimento dos sentimentos
de solidariedade e de fraternidade.
Findara o século, desencarnara o ínclito timoneiro, mas as bases da grande
obra da união entre os espíritas ficaram delineadas.
É certo que um dos objetivos de Bezerra e de seus seguidores — a unificação
de todas as entidades espíritas em torno de uma instituição representativa dos ide-
ais de fraternidade entre os espíritas — não pudera concretizar-se.
A união pela harmonia e coesão preconizada por Allan Kardec nas célebres
mensagens de 1889 só seria conseguida quase meio século depois, em 1949.
XXXV
O sucessor de Bezerra de Menezes na presidência da FEB, um jovem de 30
anos, Leopoldo Cirne, seguiu o roteiro de seu antecessor, reajustando pormenores
impostos pelas circunstâncias.
Em 1901, procedeu-se à revisão dos Estatutos, com inovações de alto inte-
resse para o Movimento Espírita, destacando-se a filiação das instituições espíritas
de todo o Brasil aos quadros da Federação Espírita Brasileira, com vistas à unifi-
cação, sob a forma federativa, plenamente aprovada na prática.
Multiplicaram-se desde então os atos de adesão, sem prejuízo da autonomia
administrativa e patrimonial das entidades adesas — Centros, Grupos, Uniões, Fe-
derações — de todo o vasto território do País continental.
XXXVI
A 3 de outubro de 1904, a FEB organizou um intenso programa de três dias,
comemorativo do centenário de nascimento de Allan Kardec.
O convite dirigido a todas as entidades espíritas do País foi bem recebido.
Reuniram-se na então Capital da República os representantes de Centros e
Sociedades Espíritas do Amazonas, Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso,
Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São
Paulo, além das Casas Espíritas da Capital Federal.
O ponto mais importante desse Congresso foi o congraçamento geral e a
aprovação das “Bases de Organização Espírita”, documento que passou a orientar
a marcha do Movimento Espírita de nosso País, até nossos dias.
O desenvolvimento do Movimento, sua expansão com a criação de inúmeras
Instituições Espíritas, tornou-se notório, desde então.
As “Bases” preconizaram a criação de uma Instituição na Capital de cada
Estado brasileiro, a qual ficaria incumbida de filiar os Centros e Associações esta-
duais, formando assim, com a FEB, uma rede de entidades fortalecidas na solida-
riedade e na fraternidade, sob a inspiração e a égide da Doutrina Espírita.
As obras de Allan Kardec, em edições especiais e populares, foram publica-
das pela FEB nesse mesmo ano de 1904.
XXXVII
9
No período de 1905 a 1930, continuou expandindo-se o Movimento Espírita,
por todo o Brasil, com a criação de Grupos, Centros e Federações nos Estados,
além de periódicos espíritas, para a divulgação da Doutrina.
Queremos destacar, nesse período, dois fatos importantes, dentre os inúme-
ros acontecimentos ocorridos:
O primeiro foi a mensagem, de alta significação, recebida em 9 de março de
1920, do Espírito de Verdade, que se manifestou através do Anjo Ismael, pelo mé-
dium Albino Teixeira, então secretário da FEB.
Nela está prevista a missão do Brasil, antecedendo as páginas proféticas do
Espírito Humberto de Campos em “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evange-
lho”, como se pode observar no pequeno trecho abaixo transcrito:
“A Árvore do Evangelho, plantada há dois mil anos na Palestina, eu a trans-
plantei para o rincão de Santa Cruz, onde o meu olhar se fixa, nutrindo o meu espí-
rito a esperança de que breve ela florescerá estendendo a sua fronde por toda a
parte e dando frutos sazonados de amor e perdão.” (Grifos nossos.)
O segundo fato foi a convocação de uma “Constituinte do Espiritismo” para se
reunir no Rio de Janeiro, idéia esdrúxula pelo seu próprio conteúdo, que não vingou.
Mas do encontro resultou a criação da Liga Espírita do Brasil, que se propôs a filiar
Centros Espíritas em âmbito nacional, em trabalho semelhante e concorrente ao da
FEB, dividindo o Movimento.
A Liga Espírita do Brasil subsistiu por mais de duas décadas, transformando-
se em entidade estadual com o “Pacto Áureo”, em 1949.
XXXVIII
Era chegado o tempo de ampliar a divulgação da Doutrina Espírita pelo livro e
pela imprensa.
Impunham-se novas traduções das obras da Codificação e de clássicos do
Espiritismo.
A essa tarefa gigantesca dedicaram-se espíritas de escol, dentre os quais
destacamos a figura de Guillon Ribeiro, o grande presidente da FEB no período de
1930 a 1943.
Suas traduções primorosas das obras de Allan Kardec continuam sendo as
melhores na língua vernácula.
Inúmeras outras obras clássicas da Doutrina foram traduzidas para o portu-
guês.
Ao mesmo tempo, a FEB cogitava da montagem de uma oficina gráfica pró-
pria para a edição das obras espíritas, o que conseguiria, por etapas, a partir de
1939.
XXXIX
A partir de 1930 o Movimento Espírita Brasileiro, que desde os fins do século
XIX contou com médiuns notáveis, como Frederico Junior, João Gonçalves do Nas-
cimento, Bittencourt Sampaio, Zilda Gama, Albino Teixeira, e muitos outros, vê sur-
gir o mais notável medianeiro do século XX: Francisco Cândido Xavier.
Sua primeira obra psicografada, lançada pela FEB em 1932 — “Parnaso de
Além-Túmulo” — causou verdadeiro impacto nos meios culturais brasileiros. Essa
obra de poetas brasileiros e portugueses desencarnados, sui generis, confundiu os
céticos e agraciou os adeptos e simpatizantes do Espiritismo.
O moço humilde de Pedro Leopoldo começava sua missão de médium espí-
rita e de homem, que se prolongaria até nossos dias, contribuindo de forma extra-
10
ordinária para que a Doutrina Espírita e o Evangelho de Jesus fossem divulgados
de forma correta, persistente, admirável.
Emmanuel, André Luiz, Humberto de Campos e uma plêiade de Espíritos de
escol lançaram-se a um trabalho de longo curso junto aos homens, de esclareci-
mento e de fraternidade através do livro espírita.
XL
Em julho de 1944, a viúva de Humberto de Campos, D. Catarina Vergolino de
Campos, ingressou em juízo com uma ação declatória contra a Federação Espírita
Brasileira e o médium F. C. Xavier, visando a obter, por sentença judicial, a decla-
ração de que a obra literária do Espírito Humberto de Campos era ou não do bri-
lhante escritor. O interesse era, no fundo, utilitarista, tendo em vista os direitos auto-
rais.
A decisão judicial foi justa, precisa, e estabeleceu uma diretriz segura para a
questão da psicografia, declarando a autora carecedora da ação, com ganho de
causa para a Federação e o médium.
XLI
Autores espirituais como Emmanuel e André Luiz têm importância muito gran-
de no desdobramento da Codificação Espírita, pelo fato de suas obras esclarece-
rem e complementarem as obras básicas da Doutrina Espírita, sem prejuízo ou
contraposição dos princípios fundamentais da Terceira Revelação.
Sínteses históricas da Terra e do Brasil, ensaios sociológicos, romances his-
tóricos, comentários evangélicos à luz do Espiritismo e, a partir de 1943, toda a
série de André Luiz, iniciada com “Nosso Lar”, enriqueceram extraordinariamente a
literatura espírita no Brasil, que se vai expandindo para além-fronteiras em inúmeras
traduções para diversas línguas.
XLII
Fato que não poderíamos deixar de mencionar nesta pequena resenha é o da
instalação, em 1948, do Departamento Editorial da FEB.
Já que a Espiritualidade realizava sua parte, fazendo chegar aos homens as
lições mais belas, claras e úteis através de livros de grande importância para o es-
clarecimento e edificação da Humanidade, era necessário que alguém cuidasse da
parte que competia aos encarnados.
O Presidente Wantuil de Freitas cuidou de dotar a FEB de uma editora à altu-
ra das necessidades.
Posteriormente, outras editoras seguiram o exemplo, ampliando-se enorme-
mente a capacidade de editoração de livros, revistas e jornais no Movimento Espí-
rita nacional.
XLIII
Não obstante o lado positivo do Movimento em constante expansão, o divisio-
nismo no seu seio continuava, alimentado pelo personalismo, pelas vaidades e pe-
las interpretações infelizes da Doutrina.
Mas muitos espíritas estavam atentos à necessidade da união fraterna e da
unificação do Movimento.
Surge então a oportunidade do entendimento entre correntes diversas, repre-
sentadas por espíritas conscientes de seus deveres perante a Doutrina.
A ocasião para esse entendimento ocorreu no mês de outubro de 1949, por
ocasião da realização de um Congresso da Confederação Espírita Pan-Americana.
11
Após tentativas de aproximação dos responsáveis por diversos segmentos do
Movimento Espírita de diversos Estados brasileiros, encontram-se todos na sede
da Federação Espírita Brasileira no Rio de Janeiro, no dia 5 de outubro de 1949.
Esse encontro, que ficou conhecido como a Grande Conferência Espírita do
Rio de Janeiro, posteriormente denominado “Pacto Áureo”, pelos seus resultados e
importância, é um marco decisivo na história do Espiritismo no Brasil, pelas suas
conseqüências, pelas suas disposições e sobretudo pelo induzimento à concórdia,
à fraternidade, ao trabalho útil, à tolerância, à solidariedade entre os cultores de
uma Doutrina Superior, que precisa ser entendida em sua verdadeira índole e finali-
dade e que induz os homens aos sentimentos do Amor e da Justiça.
XLIV
Entendemos que os primórdios do Movimento Espírita no Brasil poderiam ser
situados nos primeiros anos do Espiritismo em nossa Pátria, nos meados do sé-
culo XIX.
Mas poderiam ser entendidos também em face de determinados aconteci-
mentos marcantes.
Preferimos esta última hipótese, escolhendo o “Pacto Áureo” como o fato in-
confundível que divide duas fases do Movimento. l
12
O Brasil e a sua Missão Histórica de
“Coração do Mundo e Pátria do Evangelho”
MENSAGEM DE BEZERRA DE MENEZES
Meus filhos:
13
momento de ilusório poder, porém, milênios de fracassos bélicos e desgraças polí-
ticas.
As maravilhas da Humanidade reduziram-se a escombros: o Colosso de Ro-
des foi derrubado por um terremoto; o Túmulo de Mausolo arrebentou-se, passados
os dias de Artemísia; o Santuário de Zeus, em Olímpia, e a estátua colossal foram
reduzidos a poeira; os jardins suspensos de Semíramis arrebentaram-se e ficaram
cobertos da sedimentação dos evos e das camadas de areia sucessivas da histó-
ria. Assim, aconteceu com outros tantos monumentos que assinalaram uma época,
porém foram fogos-fátuos de um dia ou névoa que a ardência da sucessão dos sé-
culos se encarregou de demitizar e de transformar.
Mas, o Herói Silencioso da Cruz, de braços abertos, transformou o instru-
mento de flagício em asas para a libertação de todas as criaturas, e a luz que fulgu-
rou no topo da cruz converteu-se em perene madrugada para a Humanidade de
todos os tempos.
O Brasil recebeu das Suas mãos, através de Ismael, a missão de implantar no
seu solo virgem de carmas coletivos, com pequenas exceções, a cruz da libertação
das consciências de onde o amor alçará o vôo para abraçar as nações cansadas
de guerras, os povos trucidados pela violência desencadeada contra os seus ir-
mãos, os corações vencidos nas pelejas e lutas da dominação argentária, as men-
tes cansadas de perquirir e de negar, apontando o rumo novo do amor para que
restaurem no coração a esperança e a coragem para a luta de redenção.
Permaneçam confiantes, os espíritas do Brasil, na missão espiritual da “Pátria
do Cruzeiro”, silenciando a vaga de pessimismo que grassa e não colocando o
combustível da descrença, nem das informações malsãs, nas labaredas crepitantes
deste fim de século prenunciador de uma madrugada de bênçãos que teremos en-
sejo de perlustrar.
Jesus, meus filhos, confia em nós e espera que cumpramos com o nosso de-
ver de divulgá-LO, custe-nos o contributo do sofrimento silencioso e das noites in-
dormidas em relação à dificuldade para preservar a pureza dos nossos ideais, ante
as licenças morais perturbadoras que nos chegam, sutis e agressivas, conspirando
contra nossos propósitos superiores.
Divulgá-LO, vivo e atuante, no espírito da Codificação Espírita, é compromisso
impostergável, que cada um de nós deve realizar com perfeita consciência de de-
ver, sem nos deixarmos perturbar pelos hábeis sofistas da negação e pelas aren-
gas pseudo-intelectuais dos aranzéis apresentados pela ociosidade dourada e pela
inutilidade aplaudida.
Em Jesus temos “o ser mais perfeito que Deus nos ofereceu para servir-nos
de modelo e guia”; o meio para alcançar o Pai, Amorável e Bom; o exemplo de
quem, renunciando-se a si mesmo, preferiu o madeiro de humilhação à convivência
agradável com a insensatez; de quem, vindo para viver o amor, fê-lo de tal forma
que toda a ingratidão de quase vinte séculos não lhe pôde modificar a pulcridade
dos sentimentos e a excelsitude da mensagem.
Ser espírita é ser cristão, viver religiosamente o Cristo de Deus em toda a in-
tensidade do compromisso, caindo e levantando, desconjuntando os joelhos e retifi-
cando os passos, remendando as carnes dilaceradas e prosseguindo fiel em favor
de si mesmo e da Era do Espírito Imortal.
Chamados para esta luta que começa no país da consciência e se exterioriza
na indimensionalidade geográfica, além das fronteiras do lar, do grupo social, da
Pátria, em direção do mundo, lutai para serdes escolhidos. Perseverai para rece-
14
berdes a eleição de servidores fiéis que perderam tudo, menos a honra de servir;
que padeceram, imolados na cruz invisível da renúncia, que vos erguerá aos pára-
mos da plenitude.
Jesus, meus filhos — que prossegue crucificado pela ingratidão de muitos
homens — é livre em nossos corações, caminha pelos nossos pés, afaga com nos-
sas mãos, fala em nossas palavras gentis e só vê beleza pelos nossos olhos fulgu-
rantes como estrelas luminíferas no silêncio da noite.
Levai esta bandeira luminosa: “Deus, Cristo e Caridade” insculpida em vossos
sentimentos e trabalhai pela Era Melhor, que já se avizinha, divulgando o Espiritis-
mo Libertador onde quer que vos encontreis, sem o fanatismo dissolvente, mas,
sem a covardia conivente, que teme desvelar a verdade para não ficar mal coloca-
da no grupo social da ilusão.
Agora, quando se abrem as portas para apresentar a mensagem do Cristo e
de Kardec ao mundo, e logo mais, preparai-vos para que ela seja vista em vossa
conduta, para que seja sentida em vossas realizações e para que seja experimen-
tada nas Casas que momentaneamente administrais, mas que são dirigidas pelo
Senhor de nossas vidas, através de vós, de todos nós.
O Brasil prossegue, meus filhos, com a sua missão histórica de “Coração do
Mundo e Pátria do Evangelho”, mesmo que a descrença habitual, o cinismo rotulado
de ironia, o sorriso em gargalhada estrídula e zombeteira tentem diminuir, em nome
de ideologias materialistas travestidas de espiritualismo e destrutivas em nome da
solidariedade.
Que nos abençoe Jesus, o Amigo de ontem — que já era antes de nós —, o
Benfeitor de hoje — que permanece conosco —, e o Guia para amanhã — que nos
convida a tomar do Seu fardo e receber o Seu jugo, únicos a nos darem a plenitude
e a paz.
Muita paz, meus filhos!
São os votos do servidor humílimo e paternal de sempre,
BEZERRA
15
A Qualificação de Pessoas na Casa Espírita
CEZAR BRAGA SAID
16
(Psicologia, Antropologia, Sociologia, Filosofia, Administração, etc.), como subsídi-
os valiosos para auxiliarem nesse programa de preparação dos espíritas, a fim de
que desempenhemos melhor o nosso papel nas casas onde atuamos.
Essa prática de preparação de tarefeiros não só é recomendada pelos Espí-
ritos amigos, mas também executada por eles no mundo espiritual. Vejamos o que
o benfeitor Tobias narra para o Espírito André Luiz, no Centro de Mensageiros2:
“Este serviço é a cópia de quantos se vêm fazendo nas mais diversas cidades
espirituais dos planos superiores. Preparam-se aqui numerosos companheiros para a
difusão de esperanças e consolos, instruções e avisos, nos diversos setores da evolução
planetária. Não me refiro tão só a emissários invisíveis. Organizamos turmas compactas
de aprendizes para a reencarnação. Médiuns e doutrinadores saem daqui às centenas,
anualmente. Tarefeiros do conforto espiritual encaminham-se para os círculos carnais,
em quantidade considerável, habilitados pelo nosso Centro de Mensageiros.”
Considerando a multiplicidade de talentos que todos possuímos e que preci-
sam ser desenvolvidos, se tivermos uma prática constante de preparação de cola-
boradores para atuarem em nossa casa espírita, com oportunidades de trabalho
sendo dadas, mais facilmente essas potencialidades poderão ser afloradas e
aperfeiçoadas.
Pode-se aproveitar melhor o potencial dos pedagogos, psicólogos, adminis-
tradores, assistentes sociais, fonoaudiólogos e demais profissionais que freqüen-
tam a casa espírita, no sentido de permitir que as experiências que possuam sejam
úteis na elaboração de um programa permanente de qualificação dos colaborado-
res para atuarem na evangelização infanto-juvenil, no atendimento fraterno, na coor-
denação das aulas do estudo sistematizado, na gestão e secretaria dos departa-
mentos, na exposição doutrinária, na assistência social espírita e demais ativida-
des.
É importante ressaltar que não só esses profissionais possuem algo a ofere-
cer na melhor estruturação da casa espírita. Inúmeros são os companheiros que
não tendo cursado nenhuma faculdade, já colaboram com excelente qualidade. Isto
se dá em razão das aquisições feitas em outras vidas, valiosas experiências adqui-
ridas no mundo espiritual, além do autodidatismo da presente existência.
Essa mescla de experiências haverá de impedir que se crie uma elitização
ou um simplismo que sejam contraproducentes, evitando que venhamos a nos con-
siderar “profissionais em Espiritismo”, esquecidos do quanto é importante a pre-
sença da boa vontade. Mas já é hora de adicionarmos conhecimentos à boa vonta-
de, para que ela continue boa e não se transforme, com o tempo e com o desprepa-
ro, em má vontade.
Também não nos esquecemos aqui dos cursos intensivos e extensivos, que
já ocorrem em muitas casas. Mas nos referimos a algo anterior a eles e que se faça
presente neles, permitindo ter-se uma visão sistêmica da casa espírita, dos objeti-
vos de cada departamento, da sistemática de avaliação das tarefas, das formas e
recursos de manutenção da casa, do calendário de atividades, dos procedimentos
para se associar e se candidatar a cargos na diretoria, dos pré-requisitos para
cada tarefa ou reunião, das relações mantidas com outras instituições, a história da
casa espírita, etc.
Esse trabalho, no entanto, implica uma profunda reflexão sobre os objetivos
do Espiritismo e da casa espírita, considerando-se naturalmente o contexto social
onde esta esteja inserida, o perfil e o número de trabalhadores que possua e aquilo
que os freqüentadores buscam em suas dependências.
Levando em conta o caráter essencialmente educativo do Espiritismo e ba-
17
seando-se na Codificação, Ney Lobo3 aponta-nos alguns dos seus fins:
• Fim imediato individual: desenvolvimento da espiritualidade.
• Fim imediato social: transformação da Terra em mundo de regenera-
ção.
• Fim intermediário: formação do aristocrata intelecto-moral.
• Fim supremo subjetivo: o puro Espírito pensante e a conquista da feli-
cidade integral.
Esses fins perseguidos pelo Espiritismo são os que devem nortear o traba-
lho dos departamentos da casa espírita.
O desenvolvimento da espiritualidade através dos estudos, dos trabalhos,
dos cursos de capacitação e da convivência fraterna é que permite a essa célula do
Movimento Espírita cumprir seus sublimes objetivos junto aos que compartilham
esse espaço de aprendizado mútuo.
Um programa permanente de capacitação não visa apenas a oferecer me-
lhores e mais eficientes técnicas de liderança, de planejamento estratégico e ope-
racional; não apenas a utilização precisa e criativa dos recursos da informática; não
só a busca pela qualidade em moldes espíritas; nem unicamente modelos moder-
nos de gestão e administração do patrimônio; mas um programa centrado na pes-
soa, nas necessidades do Espírito imortal reencarnado, procurando desentranhar e
aperfeiçoar todo o seu potencial.
Allan Kardec4, referindo-se à Sociedade Espírita de Paris, afirmou que a sua
missão não era a de “fazer adeptos por si mesmo”, ou seja, não se preocupava o
Codificador com um número expressivo de pessoas freqüentando aquela que foi a
primeira casa espírita da história do Espiritismo: ele vislumbrava finalidades maio-
res para ela.
Algumas dessas finalidades traduzem-se nos objetivos estabelecidos no
opúsculo Orientação ao Centro Espírita5, quando se delineiam alguns objetivos para
a casa espírita:
6) (...) deve proporcionar aos seus freqüentadores oportunidades de exercitar o seu aprimo-
ramento íntimo (...);
7) (...) deve criar condições para um eficiente atendimento a todos os que o procuram com o
propósito de obter orientação, esclarecimento, ajuda ou consolação (...);
10) (...) deve organizar-se não apenas para desenvolver com eficiência as suas atividades
básicas, mas também para cumprir as suas obrigações legais.
E ainda em nível administrativo:
b) — estabelecer metas (...) planejando periodicamente suas tarefas e avaliando seus resul-
tados;
c) — facilitar a efetiva participação dos freqüentadores (...);
d) — estimular o processo de trabalho em equipe.
A respeito da existência de um norte para balizar qualquer programa que se
desenvolva dentro da casa espírita, o Codificador assim se expressou na Revista
Espírita 6 :
“Procurai no Espiritismo aquilo que vos pode melhorar. Eis o essencial. Quando os homens
forem melhores, as reformas sociais realmente úteis serão uma conseqüência natural. Trabalhando
pelo progresso moral, lançareis os verdadeiros e mais sólidos fundamentos de todas as melhoras.”
A qualificação, assim, torna-se uma ferramenta, um meio para aperfeiçoar as
possibilidades intelectuais e morais de cada tarefeiro e não um fim em si mesmo. O
fim maior é o de auxiliar o espírito a descobrir e aperfeiçoar seus talentos, de modo
a utilizá-los dentro e fora da casa espírita, em sua vida de relação com um todo.
18
Um programa nesses moldes pode ser elaborado em cada casa, sem uni-
formidade, mas, mantendo-se a unidade através dos fins aos quais todo planeja-
mento e operacionalização estarão subordinados: fins estabelecidos de forma clara
e precisa pelos Espíritos superiores e pelo lúcido pensamento de Allan Kardec, o
nosso primeiro grande dirigente espírita. l
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
1. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 1987, 68. ed., p. 31.
2. XAVIER, Francisco Cândido. Os Mensageiros. Pelo Espírito André Luiz. Rio de Janeiro:
FEB, 1987, 21. ed., p. 22.
3. LOBO, Ney. Filosofia Espírita da Educação. Rio de Janeiro: FEB, 1989, vol. 2, p. 214.
4. KARDEC, Allan. Revista Espírita. São Paulo: Edicel, volume do ano de 1864, p. 142.
5. ORIENTAÇÃO AO CENTRO ESPÍRITA. Rio de Janeiro: FEB, 4. ed., 1996, p. 14 e 16.
6. KARDEC, Allan. Revista Espírita. São Paulo: Edicel, volume do ano de 1862, p. 35.
19
Parábola do Ovo de Páscoa
PASSOS LÍRIO
20
indeterminado, os dadivosos bens da ventura interior que estiveram um dia tão ao
alcance de nossas mãos.
Deus, que é soberanamente justo e bom, faculta-nos o reencontro do precioso
achado de nossa felicidade espiritual, quando nos apresentamos sinceramente
animados do desejo de buscá-la.
Para tanto, favorece-nos por todos os meios e modos de sua infinita bondade,
permitindo junto a nós o concurso fraterno de amoráveis Emissários, sem os quais
em vão procuraríamos adquirir hoje o bem relegado ontem.
Só aí, então, é que poderemos prelibar as alegrias de uma vida nova, em cujo
gozo completo entraremos depois de consumada a nossa passagem de mortos no
pecado para redivivos da luz, numa gloriosa ressurreição do espírito.
Bendita Páscoa que o Evangelho do Reino nos propicia! l
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Homenagens a Bezerra de Menezes
BENVINDO MELO
22
Orgulho
WASHINGTON BORGES DE SOUZA
23
ta. Sua relumbrante personalidade é a maior expressão do Divino Amor.
Há em todo o curso da História dos povos notícias da existência de coletivi-
dades que gozam de regalias e privilégios e que aparecem como condutoras das
pessoas. Constituem maneiras escravizadoras de variadas feições: econômicas,
financeiras, profissionais, políticas, científicas, acadêmicas, religiosas, etc. Mas, o
posicionamento mais pretensioso parece ser o das que se intitulam intelectualiza-
das. Elegem-se guias do pensamento humano. Muitas vezes ocorre que essas
pretensas lideranças acham-se tão afastadas da verdade que chegam a se emba-
raçar em seus próprios erros.
Alguns integrantes das respectivas categorias profissionais entendem enga-
nosamente que todas as soluções se encontram no âmbito de suas atividades. Ig-
noram a preciosa lição de Kardec, segundo a qual um bom médico, por exemplo,
não será, necessariamente, um bom matemático, engenheiro, mecânico, e tudo se
subordina aos atributos peculiares à alma humana e às leis naturais.
Algumas elites presunçosas não se conciliam com a população. Outras que
deveriam captar a simpatia da alma popular estão, ao contrário, dela desvinculadas
inteiramente, seja em razão do conflito de interesses ou simplesmente em decor-
rência da linguagem de que se servem. Embora elite seja o pressuposto do melhor,
há certos indivíduos que supõem representá-la, e que, para se fazerem compreen-
didos, seus pronunciamentos exigem esforço, verdadeiramente ginásticas intelec-
tuais. Por isso pouca coisa de seus misteres tem proveito. O desdém para com os
semelhantes chega a ser afronta ridícula.
Dentre a variada atividade humana a ação religiosa também não está isenta
das vaidades deploráveis. Dirigentes e adeptos são igualmente atingidos. Uns se
postam como donos de destinos. Outros acham que dominam a inteireza de suas
doutrinas colocando-se em pedestais. É profundamente desagradável quando
constatamos que a pessoa se julga acima das outras, das consciências alheias.
Jamais nos enganamos quando alguém se dirige à nossa razão ou ao nosso cora-
ção com o intuito ou não de servir e ajudar. Basta que nossa alma saiba discernir.
Exemplos de elitismo baseado na bondade, na fraternidade, na solidarieda-
de, no amor ao próximo não são, por enquanto, muito numerosos, mas podem ser
citados sem dificuldade: Chico Xavier, Ghandi, Irmã Dulce, Irmã Thereza de Calcu-
tá. Todavia, no íntimo de outras criaturas está resguardado com certeza o senti-
mento que enobrece essas vidas.
É, também, o orgulho o grande responsável pela rebeldia da criatura em se
submeter ao Criador, levando-a igualmente a não aceitar a existência do Espírito e
a sua imortalidade. Não entende que a alma é a essência da vida e que seus legí-
timos anseios não findam junto do sepulcro. São verdades contra as quais os orgu-
lhosos se insurgem, decorrendo disso a impossibilidade de poderem conhecer ou-
tras realidades fundamentais para seu progresso.
A vida encarnada mostra a posição social da pessoa mas exibe, por outro
lado, a condição moral da alma. A morte física é a ceifeira que separa uma situação
da outra.
O orgulho acompanha o ser humano desde eras antigas mas não faz parte
nem do corpo físico nem do Espírito. O primeiro é restituído à Natureza de onde
provém e tem existência transitória, enquanto que o segundo é eterno mas criado
simples e ignorante, ou seja, sem sabedoria, maldades, virtudes ou vícios. É no cur-
so de sua existência que pode ser impregnado de más tendências das quais terá
de se desfazer em sucessivas reencarnações, até atingir a perfeição.
24
O Pai Eterno tem-nos enviado, em todas as épocas, os Seus mensageiros.
O próprio responsável pelo nosso Planeta, o Divino Mestre, veio até nós. Na segun-
da metade do século XIX chegou o Consolador prometido. À frente dos trabalhos
de implantação da Boa Nova postou-se a personalidade insigne de Allan Kardec.
Humilde, valoroso, incansável, procurou encobrir o próprio nome. A nobreza desse
Espírito está impressa na Eternidade pela lealdade com que desempenhou a mis-
são divina de que foi incumbido, pela simplicidade com que penetrou no imo da
consciência e do coração humanos para
implantar a verdade. O Codificador da Doutrina Espírita, embora sendo ho-
mem de ciência, alertou a Humanidade com altivez própria das almas elevadas:
“Desde que a Ciência sai da observação material dos fatos, em se tratando de os
apreciar e explicar, o campo está aberto às conjecturas. (...) E ainda “(...) que o Es-
piritismo não é da alçada da Ciência”. (Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita)
em “O Livro dos Espíritos”.
O Espiritismo é a luz divina que ilumina a senda da evolução. Adverte a cria-
tura humana que o egoísmo e o orgulho constituem as principais chagas morais
capazes de levá-la aos escombros de sua própria vida de onde erguer-se-á a alma
imortal para reconstrução de nova existência encarnada, até que aprenda a servir,
amar e alcançar a perfeição. l
25
Bezerra de Menezes
Feliz quem segue da virtude os passos.
(A. V. de C. e SOUSA)
CASIMIRO CUNHA
26
Francisco Cândido Xavier
90 Anos Vividos com Humildade e Dedicação ao Próximo
73 Anos de Mediunidade Missionária, Fiel a Jesus e a Kardec
27
Chico Xavier
“Na tarefa cristã, começar é fácil, continuar é difícil e chegar ao fim é crucificar-se.”
Emmanuel
MÁRIO FRIGÉRI
28
Esflorando o Evangelho - EMMANUEL
Purificação Íntima
“Alimpai as mãos, pecadores; e, vós de duplo ânimo, purifi-
cai os corações.” — (Tiago, 4:8.)
Cada homem tem a vida exterior, conhecida e analisada pelos que o rodeiam,
e a vida íntima da qual somente ele próprio poderá fornecer o testemunho.
O mundo interior é a fonte de todos os princípios bons ou maus e todas as ex-
pressões exteriores guardam aí os seus fundamentos.
Em regra geral, todos somos portadores de graves deficiências íntimas, ne-
cessitadas de retificação.
Mas o trabalho de purificar não é tão simples quanto parece.
Será muito fácil ao homem confessar a aceitação de verdades religiosas,
operar a adesão verbal a ideologias edificantes... Outra coisa, porém, é realizar a
obra da elevação de si mesmo, valendo-se da autodisciplina, da compreensão fra-
ternal e do espírito de sacrifício.
O apóstolo Tiago entendia perfeitamente a gravidade do assunto e aconse-
lhava aos discípulos alimpassem as mãos, isto é, retificassem as atividades do pla-
no exterior, renovassem suas ações ao olhar de todos, apelando para que se efetu-
asse, igualmente, a purificação do sentimento, no recinto sagrado da consciência,
apenas conhecido pelo aprendiz, na soledade indevassável de seus pensamentos.
O companheiro valoroso do Cristo, contudo, não se esqueceu de afirmar que isso é
trabalho para os de duplo ânimo, porque semelhante renovação jamais se fará tão-
somente à custa de palavras brilhantes.
(Do livro “Caminho, Verdade e Vida”, psicografado pelo médium Francisco Cândido Xavier,
cap. 18, p. 51-52, 18. ed. FEB.)
29
Bezerra de Menezes
Centenário da Desencarnação
AFFONSO SOARES
30
canti, filho de Antônio Bezerra de Menezes e Fabiana de Jesus Maria Bezerra.
Sua educação se fez sob a influência de princípios severos, em ambiente pa-
triarcal, os quais encontrariam plena ressonância numa alma naturalmente inclinada
ao rigoroso cumprimento dos deveres morais e materiais.
As primeiras letras ele as recebe de 1838 a 1842, ano em que a família, por
motivos políticos, deve transferir-se para o Rio Grande do Norte, Serra do Martins,
na Vila da Maioridade, hoje cidade de Martins, onde freqüenta aulas públicas de
latim e, após dois anos de estudo da língua, chega a substituir o professor. Em
1846, regressa com a família ao Ceará, fixando-se na capital da Província. No Liceu
ali existente, completa, sob as vistas e a orientação do irmão mais velho, o ilustrado
Dr. Manuel Soares da Silva Bezerra, seus estudos preparatórios, sendo sempre
considerado o primeiro aluno daquele estabelecimento.
O ano de 1851 assinala um dos passos decisivos na vida de Bezerra de Me-
nezes. Certamente impelido pelo secreto impulso de uma vocação que já lhe ca-
racterizava a reta trajetória de múltiplas encarnações dedicadas aos serviços da
Caridade, embarca para o Rio de Janeiro com a nobre inspiração de seguir a car-
reira médica. Em novembro do ano seguinte ingressa, como praticante e interno, no
Hospital da Misericórdia, logo conquistando a estima e a confiança do conselheiro
Dr. Manuel Feliciano Pereira de Carvalho, professor de clínica cirúrgica.
Nesse período, experimenta as agruras da solidão e das privações materiais,
sendo obrigado a buscar recursos com que pudesse viver e custear os estudos,
dando aulas de Filosofia e de Matemática. Apesar de as influências do meio estu-
dantil o haverem feito abandonar o credo católico e professar o ceticismo em maté-
ria de religião, não renunciou, todavia, à crença em Deus e na existência da alma,
permanecendo a sua conduta sempre norteada pelos superiores princípios morais
que a educação no lar apenas evocara, pois já os trazia impressos nos refolhos da
própria alma.
Aos superiores dotes morais aliava invulgar capacidade intelectual, sempre
obtendo a primeira nota nos exames anuais da Faculdade — “Optima cum laude”.
É em 1856, com a defesa da tese “Diagnóstico do cancro”, que conquista o
grau de doutor em Medicina, ingressando no ano seguinte no quadro dos membros
titulares da Academia Imperial de Medicina com a memória: “Algumas considera-
ções sobre o cancro, encarado pelo lado do seu tratamento”.
1858 é um ano muito significativo na fase, por assim dizer, leiga da vida de
Bezerra de Menezes: amenizam-se as dificuldades materiais em que até então se
debatia, graças à nomeação para os quadros do Corpo de Saúde do Exército nas
funções de assistente do cirurgião-mor Manuel Feliciano Pereira de Carvalho, com
a patente de cirurgião-tenente. Os vencimentos que passa a auferir dão-lhe possibi-
lidade de se estabelecer, as novas funções lhe permitem o exercício da clínica, e
seu coração, diante de tão favoráveis condições, o impele a concretizar os nobres
anseios da família, da vida conjugal, da paternidade: em 6 de novembro de 1858,
Bezerra contrai núpcias com D. Maria Cândida de Lacerda.
Em 1860, ante os apelos de clientes e amigos da Freguesia de São Cristó-
vão, onde residia e clinicava, e depois de muito resistir, alegando as pesadas ocu-
pações da clínica, bem como evocando prudentes conselhos do velho pai, já faleci-
do, consente que seu nome figure na lista de candidatos à Câmara Municipal do
Rio de Janeiro, pelo Partido Liberal, sendo eleito em 1861. Impugnada a sua elei-
ção pelo chefe conservador da Câmara, o Dr. Roberto Jorge Haddock Lobo, em
virtude de ser ele um médico militar, Bezerra de Menezes faz o primeiro sacrifício
pelo seu partido político, renunciando às funções no Corpo de Saúde do Exército,
31
sendo então empossado naquele mesmo ano.
Sua vida política, sempre marcada pela coragem indomável, pela veemência
na defesa dos fracos, pelas atitudes firmes e inflexíveis em favor da justiça e da ho-
nestidade no trato da coisa pública, o obrigaria a pagar amargo tributo ao despeito,
à inveja, ao ciúme, à calúnia, à ingratidão, sem que, contudo, se houvesse jamais
podido provar um ato sequer que lhe desabonasse a conduta invariavelmente reta.
Em 1863, ainda no exercício do primeiro mandato como vereador, perde, viti-
mada por súbita e galopante enfermidade, a querida esposa, que o deixa com dois
filhos pequenos, um de três anos e outro de um ano. O golpe foi profundo, abalan-
do-o de tal forma, física e moralmente, que o leva a um estado de prostração, abor-
recido das glórias mundanas que por ela, a amada esposa, vinha conquistando.
Mas, como tudo tem a sua razão de ser, e Bezerra de Menezes era um enviado do
Senhor para semear a luz na escuridão moral das plagas terrenas, a viuvez o atrai
mais fortemente para as cogitações de ordem espiritual. Um seu companheiro de
consultório lhe oferece belo exemplar da Bíblia, e nas fontes das letras sagradas o
entendimento e o sentimento do grande missionário se dessedentam, se assere-
nam.
“ — Li toda a Bíblia, e quanto mais lia, mais vontade tinha de continuar, sentin-
do doce consolação com aquela leitura.
Quando acabei, eu sentia necessidade de crer, não dessa crença imposta à
fé, mas da crença firmada na razão e na consciência.
Onde descobrir-lhe a fonte?
Atirei-me à leitura dos livros sagrados, com ardor, com sede; mas sempre
uma falha, ao que meu espírito reclamava.
Começaram a aparecer as primeiras notas espíritas no Rio de Janeiro; mas
eu repelia semelhante doutrina sem conhecê-la nem de leve! Somente porque temia
que ela perturbasse a tal ou qual paz que me trouxera ao espírito a minha volta à
religião de meus maiores, embora com restrições.”2
Ainda não era a hora oportuna para o projetado encontro! Ainda lutas de outra
consistência lhe haveriam de temperar o espírito para os formidáveis embates que
deveria travar na arena específica de sua mais alta missão.
Permanece no cenário político, reelege-se vereador em 1864 e, em 21 de ja-
neiro de 1865, casa-se em segundas núpcias com D. Cândida Augusta de Lacerda
Machado, irmã materna de sua primeira esposa, que lhe daria cinco filhos.
Em 1867 é eleito deputado geral pelo Rio de Janeiro, mas em 1868, pela as-
censão dos conservadores ao poder, a Câmara é dissolvida e Bezerra se retira,
não se candidatando à legislatura de 1869-1872 para a Câmara Municipal. Até
1873, quando se reelegeria para vereador, transcorre um período de fecundos em-
preendimentos materiais em favor das coletividades: cria a Companhia de Estrada
de Ferro Macaé a Campos, empenha-se na construção da via férrea de Santo An-
tônio de Pádua que estenderia a Macaé-Campos até o Rio Doce, dirige a Compa-
nhia Arquitetônica que, em 1872, abriu o “boulevard” 28 de Setembro no então novo
bairro de Vila Isabel, e em 1875 exerceria a presidência da Companhia Carris Ur-
banos de São Cristóvão.
Por essa época, e até mesmo antes, Bezerra foi ardoroso abolicionista, apre-
sentando, em livro, medidas que extinguissem a escravidão no Brasil, sem maiores
danos para a Nação. Também apresentaria, em 1877, soluções para o problema
das secas no nordeste brasileiro.
Já ressoavam no país os primeiros ecos das clarinadas que em França anun-
32
ciaram o advento do Consolador: o Jornal do Commercio divulga notícias, circulam,
desde 1860, o folheto “Os tempos são chegados”, de Casimir Lietaud, e a tradução
da obra de Kardec “O Espiritismo na sua mais simples expressão”, feita por Ale-
xandre Canu (1862), e na Bahia, por iniciativa de Luís Olímpio Teles de Menezes,
fundam-se o “Grupo Familiar do Espiritismo”, em 1865, e o periódico O Eco
d’Além-Túmulo, em 1869.
Em 1873, enquanto Bezerra de Menezes se reelege para a Câmara Municipal
do Rio de Janeiro, onde permaneceria até 1881, é criado nesta mesma cidade, em
2 de agosto, o “Grupo Confúcio”, a base sobre a qual se assentaria a obra tangível
de Ismael no Planeta, na expressão do Espírito Humberto de Campos em “Brasil,
Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”. Ali o angélico servo de Jesus define o
caráter cristão dos trabalhos do Espiritismo no Brasil:
“A missão dos espíritas no Brasil é divulgar o Evangelho em espírito e verda-
de. Os que quiserem bem cumprir o dever, a que se obrigaram antes de nascer,
deverão, pois, reunir-se debaixo deste pálio trinário: Deus, Cristo e Caridade. Onde
estiver esta bandeira, aí estarei eu, Ismael.”
No “Confúcio” servia, entre tantos outros trabalhadores de grande envergadu-
ra moral, a personalidade de Joaquim Carlos Travassos, responsável pela primeira
tradução portuguesa de “O Livro dos Espíritos” e pela inspirada iniciativa de ofere-
cê-la ao Dr. Bezerra de Menezes. A leitura da obra básica por excelência do Espiri-
tismo iria suprir em seu entendimento e em seu coração as lacunas que o estudo da
Bíblia não conseguira preencher. As grandes linhas da nova revelação, as idéias,
os princípios expostos pelos Espíritos Superiores não lhe eram absolutamente es-
tranhos, pelo que nenhuma dificuldade se levanta contra o seu convencimento da
verdade do Espiritismo. Era a secreta e ainda imprecisa acolhida à convocação
aos compromissos com Ismael, cujo cumprimento seria a razão de ser de sua
existência.
Em 1878, com a queda dos conservadores, Bezerra reelege-se deputado ge-
ral pelo Rio de Janeiro, mandato que exerce até 85, sendo ao mesmo tempo mem-
bro da Câmara Municipal, da qual é eleito presidente efetivo de 1878 a 7-1-1881,
assim também respondendo pela administração da cidade, como os prefeitos atu-
ais.
Entrementes, desde a fundação do “Grupo Confúcio”, esboçam-se no nas-
cente movimento espírita, no Rio de Janeiro, as linhas de divergência que viriam a
exigir a pronta ação de Bezerra de Menezes no momento aprazado. Por discórdias
intestinas, nascidas principalmente da resistência de adeptos contra o caráter cris-
tão do Espiritismo, alguns dissidentes se retiram para fundar, em 1876, a “Socie-
dade de Estudos Espíritas Deus, Cristo, Caridade”, cujo programa incluía o estudo
dos Evangelhos e onde Bittencourt Sampaio, intermediando receitas homeopáticas
dos Espíritos, atrairia valorosos adeptos para o círculo dos discípulos de Ismael,
entre os quais a vigorosa personalidade de Antônio Luiz Sayão, com quem mais
tarde fundaria, em 1880, o “Grupo Ismael”. Pelas mesmas influências, a divisão se
instala na Sociedade “Deus, Cristo, Caridade”, que se transforma em “Sociedade
Acadêmica Deus, Cristo, Caridade” com programa mais inclinado ao estudo dos
aspectos científicos do Espiritismo. Os dissidentes dessa orientação fundam em
1880 a “Sociedade Espírita Fraternidade” que, mais tarde, ainda e sempre pela
mesma influência, se transformaria na “Sociedade Psicológica Fraternidade”.
Em 1882, embora já convencido das verdades espíritas, Bezerra de Menezes
recebe provas tais da intervenção dos Espíritos em frisantes fenômenos mediúni-
cos, que passa também a fazer investigações experimentais sobre vários pontos da
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ciência espírita, assim completando a construção intelecto-moral que o conheci-
mento da Bíblia e a leitura das obras doutrinárias haviam iniciado. Com esse arse-
nal estaria apto às liças que o aguardavam. O fato é que, em 1882, se havia curado,
em três meses, de uma enfermidade que se arrastava por cinco anos, bem como vê
a esposa resgatada de morte iminente, graças aos tratamentos que a ambos foram
ministrados através do conhecido médium João Gonçalves do Nascimento.
Apesar de não haver ainda confessado publicamente a sua crença, Bezerra
era bastante conhecido e respeitado nos círculos espíritas do Rio de Janeiro, como
o prova o fato de que o fundador de REFORMADOR, Augusto Elias da Silva, bate à
sua porta, naquele ano de 1882, em busca de orientação para a linha que o novo
periódico deveria seguir. Então, a Igreja Católica assestava suas baterias contra o
Espiritismo e contra os espíritas, instigando os católicos, em Pastoral daquele ano,
a que, por dever de consciência, odiassem a Doutrina Espírita e os seus seguido-
res. Bezerra, tocado certamente pelas inspirações de Ismael, recomenda-lhe mode-
ração, prudência e, acima de tudo, amor: jamais revidar com as mesmas armas.
Estava definido o caráter, mantido até hoje, do secular órgão da Federação, funda-
do em 1883. Não se limita Bezerra, porém, ao simples aconselhamento. Dá-lhe
corpo por meio de artigos impressos no próprio REFORMADOR, em que comenta,
com profundidade e serenidade, as linhas gerais do Catolicismo, ao mesmo tempo
em que a mencionada Pastoral recebe judiciosas análises, igualmente serenas, de
Antônio Pinheiro Guedes, sob o pseudônimo Guepian, e de Francisco Raimundo
Ewerton Quadros, sob o pseudônimo Freg. Bezerra subscreve seus artigos com as
iniciais A.M.
A Federação Espírita Brasileira, que surge no cenário terreno em 2 de janeiro
de 1884, não vê Bezerra de Menezes entre os seus fundadores, mas assim convi-
nha aos superiores interesses da causa do Espiritismo no Brasil. O evento, não
obstante sua relevância no desdobramento do programa concebido por Ismael, era
uma dentre as muitas etapas do arroteamento do campo em que Bezerra promove-
ria semeadura definitiva, no tempo oportuno, quando se serviria das potencialida-
des da Federação já cultivadas por desbravadores que, segundo a inspirada pala-
vra de Canuto Abreu:
“(...) reuniam, na inconsciência dos que obedecem aos desígnios divinos, os
materiais necessários ao chefe. Elias levara para o campo a sua ferramenta: o Re-
formador; Pinheiro Guedes, a sua, a homeopatia; Quadros, a sua, a esperança ge-
ral de harmonia; Figueira, a sua, a intuição, que está no nome da sociedade. Essas
dádivas de primeira hora seriam nas mãos de Bezerra de Menezes os elementos
da vitória, e ainda o são hoje, da sua conservação.”3
As conferências públicas para a difusão do Espiritismo que a Federação pas-
sa a promover, a partir de 1885, por iniciativa de seu primeiro presidente, Ewerton
Quadros, movimentam multidões atraídas pelo verbo de eminentes vultos do meio
espírita e do meio social, mas nenhuma delas atingiria a espetacular repercussão
da que havia sido programada para o dia 16 de agosto de 1886, no grande salão
da Guarda Velha: Bezerra de Menezes, perante um auditório de quase 2.000 pes-
soas, sacode os arraiais da política, da religião e da medicina, proclamando sole-
nemente a sua adesão ao Espiritismo, após dez anos de amadurecimento intelec-
tual e moral, durante os quais amealhou cabedais e ofereceu testemunhos para, só
então, enfrentar desassombradamente as tremendas responsabilidades de condu-
tor do Movimento Espírita do Brasil, missão aliás que absolutamente não cessaria
com a sua desencarnação.
Em 1887, dá início, nas páginas de O Paiz, um dos mais conceituados órgãos
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da imprensa carioca, com o pseudônimo Max, a uma série de artigos doutrinários
sob a epígrafe “Espiritismo — Estudos Filosóficos”, sem que fosse interrompida a
sua colaboração em REFORMADOR. Seus escritos continuaram no Jornal do Bra-
sil (1895) e na Gazeta de Notícias (1895-1897). Ao mesmo tempo produz livros que
muito contribuiriam para o enriquecimento da literatura espírita. Dessas obras, du-
as, atravessando o século como fontes constantes de estudo, ainda hoje permane-
cem na linha editorial da FEB: “Uma Carta de Bezerra de Menezes” e “A Loucura
sob Novo Prisma”.
Bezerra trazia indelevelmente impresso na alma o programa que o Alto lhe
confiara:
“(...) concentrar as nossas energias no país do Cruzeiro, dirigindo-as para o
alvo sagrado dos nossos esforços. (...) Arregimentarás todos os elementos disper-
sos, com as dedicações do teu espírito (...), com a plena observância do código de
Jesus e com a nossa assistência espiritual, pulverizarás todos os obstáculos, à for-
ça de perseverança e de humildade (...).”
E o que era esboço assume contornos nítidos e precisos.
A desarmonia existente entre os espíritas, divididos em diversos grupos isola-
dos, dá ensejo, nos anos de 1888 e 1889, a que o Alto permita a manifestação do
próprio Codificador do Espiritismo, através do médium Frederico Júnior, na “Soci-
edade Espírita Fraternidade”. Allan Kardec exorta os adeptos à união, à harmonia,
na prática do estudo, da caridade e da unificação, e tais idéias, por evocarem a
própria missão de Bezerra de Menezes, encontram nele fervorosa acolhida. Vê na
Federação, então sob a sua presidência, o órgão ideal para que se concretize a
unificação dos espíritas, pelo que nela instala, em 1889, com a aprovação de todos
os grupos existentes no Rio de Janeiro, o “Centro da União Espírita do Brasil”, revi-
vendo uma iniciativa que, com idêntico objetivo e a mesma denominação, havia
surgido nos quadros da “Sociedade Acadêmica Deus, Cristo, Caridade”, no ano de
1881.
Mas ainda seriam baldados os esforços de Bezerra: não obstante os apelos
de Allan Kardec, lastreados na essência mesma do Evangelho, os espíritas ainda
se obstinavam nas divergências que os dividiam nas duas grandes correntes dos
“científicos” e dos “místicos”, e, como em 1881 na “Acadêmica”, fracassa a iniciati-
va do “Centro”.
Prossegue, porém, o grande missionário no devotamento à obra de dotar o
Movimento com os instrumentos que o haveriam de conduzir à união e à unificação.
Institui na Federação, durante sua gestão de 1889, o estudo semanal de “O Livro
dos Espíritos”, até hoje mantido, e mais adiante, traduz o livro “Obras Póstumas”, de
Allan Kardec, cuja publicação se daria em 1892, ao mesmo tempo em que vai con-
quistando o honroso título de “Médico dos Pobres” na eterna gratidão das legiões
de necessitados que, em sua abençoada clínica médica, colhiam alívio, consolo e
auxílio, material e espiritual. Ainda em 1889, Bezerra ocupa em REFORMADOR o
cargo de chefe de redação.
Em 1890, na vice-presidência de Bezerra de Menezes, funda-se na Federa-
ção, por iniciativa do Dr. Polidoro Olavo de São Thiago, a “Assistência aos Neces-
sitados” que, na justa expressão do Espírito Humberto de Campos, vincularia a ins-
tituição, no plano material, a todos os corações infortunados e sofredores, ajudan-
do-a a conservar-se no programa do Evangelho em meio às ideologias novas e às
perigosas ilusões do campo social e político. No ano seguinte, ainda sob a vice-
presidência de Bezerra de Menezes, busca-se montar uma oficina tipográfica pró-
pria, para impressão de REFORMADOR e de obras de propaganda, tentativa que
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não chegou a se concretizar.
Segue-se, a partir de 1891 e até 1895, um período de obscuras influências no
seio de todas as organizações e grupos espíritas. Inclinam-se muitos adeptos cultos
a um presunçoso cientificismo no estudo das revelações espíritas, pondo-se de
lado quaisquer cogitações em torno dos aspectos filosófico e religioso. O quadro
político, social e cultural da época vê-se conturbado pela influência conjunta do que
Canuto Abreu com razão identifica como os quatro inimigos do Espiritismo: Positi-
vismo, Materialismo, Racionalismo e o clero católico. A inclusão do Espiritismo no
novo Código Penal, surgido com o advento da República, faz com que o Centro da
União Espírita, do qual era presidente Bezerra de Menezes, dirija, em 22-12-1890,
um memorial ao Presidente da República em defesa do Espiritismo, contra certos
artigos do novo Código Penal. Não surtindo efeito, Bezerra, junto com Pinheiro
Guedes, Dias da Cruz, Almeida Nogueira, Aristides Spínola Zama e outras ilustres
personalidades, assinam representação ao Congresso Nacional, datada de 10-8-
1893, pedindo que se reconheça a inconstitucionalidade do Código Penal nos arti-
gos que punham em risco os direitos e as liberdades dos espíritas. Tudo isso dá ao
Movimento Espírita uma consciência mais clara da necessidade de união, e, pelos
judiciosos argumentos de Augusto Elias da Silva, todos se voltam para a Federa-
ção. A primeira sociedade a se aproximar é a própria “Fraternidade” que, em ofício
de 4 de janeiro de 1891, declara:
“Já é tempo, com efeito, de abandonarmos as quimeras e os desvios por
onde falsos profetas, encarnados e desencarnados, nos têm dirigido; e convictos,
como devemos estar, de que só a união faz a força e que só pela fraternidade po-
demos obter mais e melhor, unamo-nos de uma vez, para que a luz de um supra a
de outro, para que ao menos possamos sair do a-bê-cê. Se o ‘Centro’ não pôde
fazer o que tanto aconselhou o Mestre pela ‘Fraternidade’, faça-o a ‘Federação’,
para onde convergem todas as esperanças e que, mantendo-se firme pela perseve-
rança e pelo trabalho, sustenta, além disso, um órgão que, devendo ser auxiliado
por todos, está no caso de difundir e propagar a luz”.
À adesão da “Fraternidade” à FEB seguiu-se a de muitos outros grupos, ven-
do-se nesse alvitre a providencial intervenção de Ismael que, assim, fortalecia a
célula doutrinária que havia escolhido para ser “a depositária e diretora de todas as
atividades evangélicas da Pátria do Cruzeiro”.
Novas e mais terríveis vicissitudes, externas e internas, abatem-se sobre as
fileiras espíritas, e seus sombrios efeitos não poupam sequer a Federação em que
Ismael depositava suas esperanças. Sempre o velho e venenoso fermento do per-
sonalismo, do apego a vaidosas interpretações particularistas em prejuízo do fun-
damental, desprezando-se a segurança da harmonia pelos descaminhos da confu-
são, da cizânia... Bezerra mantém-se firme no cumprimento de seus deveres, divul-
gando a Doutrina na coluna dominical de O Paiz e nas páginas de REFORMADOR,
vivendo em honrada pobreza, recebendo alento espiritual nas reuniões do “Grupo
Ismael”, havendo nessa época, no espaço de apenas um ano e meio, experimenta-
do o testemunho da perda de três filhos. Jamais lhe faltou, com efeito, o conforto de
inúmeras mensagens mediúnicas de amigos, familiares, dos próprios filhos, mes-
cladas de conselhos, advertências, palavras de coragem e ânimo, buscando suavi-
zar a dor e a tristeza por que passava. Tudo isso ocorre de 1887 a 1894, como que
a fortalecê-lo para os novos embates que se aproximavam.
Em 1895, a Federação atravessa grave crise interna que, graças à zelosa e
providencial intervenção de quatro fiéis discípulos de Ismael — Alfredo Pereira, Di-
as da Cruz, Elias da Silva e Fernandes Figueira —, culmina com o convite a Bezer-
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ra de Menezes para que assuma, com poderes absolutos, a sua presidência. Be-
zerra reluta, mas antes de uma formal recusa decide ouvir a opinião dos compa-
nheiros do “Grupo Ismael” e dos Espíritos Superiores que ali mantinham erguido o
estandarte “Deus, Cristo e Caridade”. Todos o estimulam a que assuma a grave
responsabilidade, e de seu Guia Espiritual, Santo Agostinho, por intermédio de
Frederico Junior, recebe a definitiva exortação:
“ — Aceita o convite. É um chamado. Já te dissemos mais de uma vez que a
união dos espíritas e a sua orientação te foram confiadas. Não duvides nem te pre-
ocupes com as dificuldades. Faze o trabalho do homem, sem cuja boa-vontade
nada podemos. Cumpre o teu dever e cumpriremos o nosso.”
Bezerra, emocionado, testemunha sua humildade:
“ — Neste caso, aceitarei e espero não me faltem o amparo de Jesus, a pro-
teção de nossos guias, assim como o concurso de todos os companheiros do Gru-
po.”
E Santo Agostinho encerra o decisivo diálogo com a mais expressiva das
promessas:
“ — Iremos todos contigo!”
Bezerra de Menezes é eleito presidente da Federação em 3 de agosto de
1895, com o que se estabelece a vinculação indissolúvel do Grupo Ismael, da Fede-
ração e da Assistência aos Necessitados à imortal divisa de Ismael, “Deus, Cristo e
Caridade”, que até hoje norteia as atividades da Casa de Ismael.
Fiel às orientações mediúnicas dos grandes Espíritos que protegiam e cultiva-
vam a Árvore do Evangelho transplantada da Palestina para o Brasil, Bezerra logo
cuida de imprimir orientação evangélica aos trabalhos da Federação, tendo em
mente estas basilares recomendações superiores: “A missão dos espíritas, no Bra-
sil, é divulgar o Evangelho em espírito e verdade” (Ismael); “ A cada um a sua tarefa.
A vossa, a maior, é o Evangelho: tendes de educar os corações” (Urias); “Reunidos
em nome de Ismael, não tendes outros deveres senão estudar os Evangelhos à luz
da Santa Doutrina” (Allan Kardec).
Na presidência da FEB, Bezerra logo restabelece o estudo sistemático, em
sessões públicas semanais, de “O Livro dos Espíritos”, prática seguida até hoje.
Sua presença e o caráter evangélico que imprime às atividades da Casa estabele-
cem laços sempre mais fortes entre os adeptos e grupos entre si e entre estes e a
Federação, preparando-se assim o terreno para vindouras semeaduras e colheitas
em prol da tão desejada união, no rumo da unificação. É desse período a criação
na FEB da Livraria Espírita (31-3-1897), já se cogitando da aquisição de um prédio
próprio para a sua sede (Reformador, 1899, 15 de fevereiro, p. 2).
Em 1894, o “Centro da União Espírita do Brasil” entrou em nova fase, reinsta-
lado pelo Prof. Afonso Angeli Torteroli, fazendo suas reuniões a princípio na sede
da FEB. Denominou-se então “Centro da União Espírita de Propaganda no Brasil” e
dele participavam presidentes e representantes de várias agremiações espíritas,
com o propósito de trabalhar por uma unificação doutrinária do Espiritismo no Bra-
sil. Foram diretores desse “Centro” conhecidos e respeitados vultos espíritas da
época, como Bezerra de Menezes, Elias da Silva, Pinheiro Guedes, Ernesto dos
Santos Silva, Lima e Cirne, Júlio César Leal e outros. Com o passar do tempo, tais
foram os propósitos e absurdos ali levantados, que Bezerra, em primeiro lugar
(1896), e depois outros diretores, num total de seis, se desligaram do referido
“Centro”, que entrou em decadência no último trimestre de 1897. O “Centro” fracas-
sara em sua missão: em vez de unir, estava desunindo! Pretendeu-se até definir o
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que é o Espiritismo!
As associações espíritas que deixaram o “Centro” passaram a eleger a Fede-
ração Espírita Brasileira como o centro do Espiritismo no Brasil, ao que a Casa de
Ismael, pelo Reformador de 15-3-1897, declarou que, no posto que lhe assinala-
vam, ela seria feliz com poder concorrer em tal sentido, aceitando a filiação de to-
dos os Grupos.
Alguns focos de dissidência, contrários à superior orientação, ainda se arre-
gimentam em torno do grande missionário, mas são neutralizados por sua autori-
dade moral indiscutível.
Em 1899, Bezerra se inclina a instituir na FEB mais uma reunião pública se-
manal, destinada ao estudo dos Evangelhos à luz do Espiritismo, mas é atingido,
em dezembro daquele ano, por violenta congestão cerebral que o levaria à desen-
carnação. A iniciativa, porém, foi concretizada e, como a outra em torno de “O Livro
dos Espíritos”, mantém-se até hoje, evidenciando a solidez de critérios do grande
missionário para estabelecer rumos ideais às atividades espíritas em nosso país.
O ano de 1900 inicia-se para a Federação e para os espíritas em geral sob o
peso de tristes apreensões. A assembléia marcada para o dia 5 de janeiro, que
certamente reconduziria Bezerra de Menezes à presidência, é adiada pela espe-
rança em seu restabelecimento. Na data aprazada — 30 de março — seu estado
físico, que só havia piorado, impõe nova dilação. Mas a missão de Bezerra havia
efetivamente chegado ao termo nas regiões da vida física. O missionário desencar-
naria no dia 11 de abril, em meio à consternação geral, só amenizada pela certeza
de sua permanência espiritual junto aos caros irmãos de fé e às legiões de homens,
mulheres e crianças de todos os credos religiosos que se socorriam de sua inexce-
dível generosidade. Essas mesmas legiões, nos quatro meses de sua invalidez,
acorreram à sua modesta casa na rua 24 de Maio nº 93 para lhe renderem o tributo
do reconhecimento.
Agora, essas legiões de almas agradecidas afluíam ao Cemitério de São
Francisco Xavier para a simbólica despedida a seu benfeitor, cujo corpo é sepulta-
do em 12 de abril, em meio ao carinho de homenagens provindas de todos os cír-
culos da sociedade, como o noticiaria, entre tantos outros informativos, espíritas e
não espíritas, o importante periódico O Paiz, em suas edições de 12, 13 e 14 de
abril.
Homens ilustres, como o Conde de Afonso Celso, o Barão de Studart, o es-
critor Artur Azevedo, emitiram conceitos enaltecedores ao político e homem de
bem.
Dos círculos políticos também nasceram justas e sinceras manifestações,
destacando-se a homenagem que lhe foi prestada pelo Conselho Municipal do Rio
de Janeiro, na 23ª Sessão Ordinária do dia 16 de abril, sob a presidência do 1º
Secretário, o Intendente Rodrigues Alves. Por unanimidade são acolhidos requeri-
mentos dos Srs. Honório Gurgel e Leite Borges para que se levante a sessão em
sinal de pesar pelo falecimento do Dr. Bezerra e para que se nomeie uma comis-
são que represente o Conselho Municipal “nos sufrágios que se celebrarem por sua
alma, bem como para dar pêsames à sua desolada família”.
Da França, Léon Denis, o grande discípulo de Allan Kardec, ao saber da de-
sencarnação de Bezerra, declarou, emocionado: “Lorsque de tels hommes dispa-
raissent, c’est un deuil, non seulement pour le Brésil, mais pour les spirites du mon-
de entier.” (Quando tais homens deixam de existir, enluta-se não somente o Brasil,
mas os espíritas de todo o mundo.) Era uma voz a mais, e que voz!, no reconheci-
mento das qualidades do valoroso seareiro do Cristo.
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Nenhum evento, porém, superaria em glória e consolação, o que, ainda em 12
de abril, sem que houvessem transcorrido 31 horas sobre sua desencarnação, se
concretizaria em modesto sobrado da Rua do Rosário no 141 (depois no 177),
onde a Federação tinha a sua sede. Reuniam-se os adeptos, às 19 horas, para
comemorarem a Ceia do Senhor, quando, pelas faculdades mediúnicas de Frede-
rico Júnior, ouve-se a palavra do amado Bezerra de Menezes, agora na plena liber-
dade dos Espíritos redimidos pela abnegação e pelo devotamento nos serviços do
Senhor:
“Baixai vossos olhos sobre os meus amigos, ó Virgem Gloriosa! São também
vossos filhinhos, como eu, que aflito gemi e padeci na Terra, sempre com os olhos
cravados em vós. (...) Que eles possam compreender esse — amai-vos uns aos
outros —, certos, convencidos de que o amor que desdobrarem de suas almas,
para os seus irmãos, evola-se, libra-se aos páramos onde está o vosso amado Fi-
lho — é o amor elevadíssimo que nos vem com Jesus.
“Meus caros companheiros, meus amigos, é demais a recompensa! Sauda-
des! ouvi, de mais de um, essa palavra, mas saudades por quê?
“Vê tu, meu velho amigo (para Sayão), vêem todos vocês como é fraco o espí-
rito humano! (...) Eu estou junto de vocês, meus caros companheiros. Eu lhes peço:
não quebrem essa cadeia sagrada (...)
“Bezerra estará sempre unido aos vossos corações. O Bezerra pede a Deus,
e Deus há de permitir que ele continue a trabalhar, a produzir na seara bendita.”4
E o nobre pedido encontrou, como seria de esperar, a favorável acolhida do
Alto. O valoroso discípulo de Ismael, agora na plena liberdade espiritual dos que
venceram o mundo, havendo nele cumprido de forma irrepreensível sua missão su-
perior, renuncia às glórias de uma merecida ascensão a esferas felizes, preferindo
permanecer nas regiões próximas à Terra, e, assim, dedicar-se aos serviços que
seriam um verdadeiro desdobramento de sua última migração terrena: socorrer os
sofredores, em nome da Caridade, e promover a união dos espíritas rumo à unifi-
cação de seus trabalhos, dentro dos superiores princípios da liberdade e da res-
ponsabilidade, que tão fortemente caracterizam o ideário da Revelação dos Espí-
ritos.
Com efeito, de 1900 até os nossos dias, não há um momento sequer da vida
espírita em nosso país que não receba a salutar, a caridosa influência desse vene-
rável Espírito, desde receitas e conselhos amorosos aos mais humildes necessita-
dos até as mais graves comunicações relacionadas aos problemas do Movimento
Espírita. Sempre a sua palavra nobre, impregnada dos superiores sentimentos
cristãos, aponta para a incondicional aplicação do “amai-vos uns aos outros” como
fundamento de todo e qualquer esforço em favor da unificação, pois somente à luz
dessa exortação do Divino Mestre as naturais divergências, as interpretações so-
bre as questões não essenciais, tão variadas quanto são os diversos graus de
compreensão dos adeptos, se esmaecem para ceder lugar à fidelidade aos princí-
pios fundamentais da Revelação, à fraternidade, à tolerância, à união enfim.
E não somente através de mensagens o grande apóstolo tem fecundado os
corações, tanto de iniciantes como de adeptos mais experimentados, para que os
espíritas formem aquele núcleo da coletividade em vias de regeneração em que
efetivamente se viva como “um só rebanho, sob um único Pastor”. Através de médi-
uns especialmente dotados, Bezerra de Menezes não deixou de produzir literatura
de invulgar qualidade.
Ultimamente, sua presença se tem feito ostensiva nas reuniões do Conselho
Federativo Nacional, pelas belas faculdades de Divaldo Pereira Franco, sempre
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enfatizando a união em torno dos ideais cristãos, a fraternidade acima de quaisquer
divergências particularistas e personalistas, a necessidade de se preservar o ca-
ráter evangélico do Espiritismo.
Que nossas homenagens ao venerando Mentor dos trabalhos espíritas em
nossa terra não se limitem à imobilidade de um artigo, de uma palestra, de uma
citação, mas se traduzam em esforços sinceros e perseverantes por nos manter-
mos fiéis ao programa superior que ele recebeu de Jesus pelas mãos de Ismael.
Sua missão, em poucas palavras, foi exatamente dar início à unificação da
família espírita no Brasil, sob a direção e a orientação da Federação Espírita Bra-
sileira, “para que a obra de Ismael pudesse ser livremente cultivada no século XX. E
essa obra prossegue sempre. Podem as inquietações da Terra separar, muitas
vezes, os trabalhadores humanos no seu terreno de ação; mas a sociedade bene-
mérita, onde se ergue a flâmula luminosa — “Deus, Cristo e Caridade” — permane-
ce no seu porto de paz e de esclarecimento”5, tendo Bezerra de Menezes como um
de seus mais venerandos diretores espirituais. l
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. XAVIER, Francisco Cândido. Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, p.179-180.
Ditado pelo Espírito Humberto de Campos, 24. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1977.
2. Evolução Religiosa de Bezerra de Menezes. In REFORMADOR de abril/1951. p. 81-84, ex-
traído de REFORMADOR de 1982.
3. ABREU, Canuto. Bezerra de Menezes. (Subsídios para a História do Espiritismo no Brasil
até o ano de 1895.) 3. ed., 137. São Paulo: FEESP, 1987.
4. SOARES, Sylvio Brito. Vida e Obra de Bezerra de Menezes, p.123-124, 9.ed., Rio de Ja-
neiro: FEB, 1991.
5. XAVIER, Francisco Cândido. Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, p. 222. Dita-
do pelo Espírito Humberto de Campos, 24. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1977.
Além das obras e periódicos mencionados nas Notas, também foram consultadas as seguin-
tes fontes:
WANTUIL, Zêus. Grandes Espíritas do Brasil. Rio de Janeiro: FEB, 3. ed., edição revista e
corrigida pelo autor.
Esboço Histórico da Federação Espírita Brasileira. Rio de Janeiro: FEB, 1924 (esgotada).
Bezerra de Menezes. 1900 11 de Abril 1950. REFORMADOR de maio/1950, p. 97-99.
Uma fase da vida de Bezerra de Menezes. REFORMADOR de agosto/1952, p. 177-180.
Bezerra de Menezes. REFORMADOR de julho/1966, p. 162.
40
A FEB e o Esperanto
41
O Esperanto é o remédio. Antes de aplicá-lo, devemos conhecer um pouco
sobre suas propriedades, seus efeitos. Efeito colateral indesejável, podemos afir-
má-lo com segurança, o Esperanto não apresenta. Ele só faz bem, porque une os
povos. Tanto é assim que Emmanuel, através da psicografia de Francisco Cândido
Xavier, sempre se referiu a Zamenhof como sendo “o missionário da união e da
solidariedade, da concórdia e da paz”.
Eis as propriedades da Língua Internacional:
• regular, porque sua gramática se resume em 16 regras fundamentais sem ex-
ceções;
• rica em literatura, porque as principais criações literárias de todas as nações
já estão traduzidas para o Esperanto, além daquelas produzidas originalmente
na língua;
• viva, porque é falada por milhares de pessoas e utilizada em Encontros e Con-
gressos nos vários ramos do saber; é importante ressaltar que em tais encon-
tros internacionais todos os eventos acontecem sem a necessidade de tradu-
ção simultânea, e todos se compreendem;
• fonética, porque a cada som corresponde uma única letra e a cada letra só
corresponde o respectivo som, qualquer que seja a sua posição na palavra.
Além dessas propriedades, que são do conhecimento geral, os espíritas dis-
põem de uma informação adicional bastante significativa: ela faz parte do plano
divino de evolução do Planeta, como já foi demonstrado pelas inúmeras comunica-
ções recebidas através de médiuns de reconhecido valor.
Já vimos que o Esperanto é o instrumento ideal para levarmos a Doutrina a
outros povos, bem como que ele conta com o endosso da Espiritualidade.
Como então concretizar esse Plano Divino? Será que todo espírita tem que
estudar o Esperanto? Para ser espírita tem que ser esperantista? Claro que não!
Aliás, nem é mesmo necessário ser espírita para evoluir espiritualmente. Basta
amar a Deus e ao próximo como a si mesmo. No entanto, o Espiritismo tem sido
bom para todos nós, porque esclarece, porque consola. Então, estendamos os be-
nefícios do Espiritismo a todos os povos. Se não somos esperantistas, podemos
apoiar a edição de livros em Esperanto, ou nas línguas nacionais, ou apoiar as Ins-
tituições que trabalham na divulgação dessas obras em outros países.
Como exemplo de Instituição pioneira nesse campo citamos, em primeiro lu-
gar, a Federação Espírita Brasileira.
A FEB iniciou seus cursos de Esperanto em 1912. Criou um serviço de divul-
gação do idioma em 1937. A partir daí, começou a editar livros didáticos e livros
espíritas na Língua Internacional. Nessa época, já vários confrades, tendo à frente
Ismael Gomes Braga, divulgavam o Esperanto no Brasil e o Espiritismo no Exterior.
Descobriram que o Esperanto era um excelente meio de divulgação da Doutrina.
Granjearam muitos simpatizantes do Espiritismo em outras terras, graças à corres-
pondência epistolar em Esperanto. Nada obstante, o Plano Espiritual mantinha-se
em silêncio: nenhuma mensagem de estímulo, nenhum apoio explícito a tais ativida-
des.
Somente depois dessa fase é que surgiu, em janeiro de 1940, a famosa men-
sagem A Missão do Esperanto, ditada pelo venerando Espírito Emmanuel ao Chico
Xavier.
Após essa mensagem, que se constituiu em efetiva sanção do Plano Espiritu-
al às atividades dos espíritas em favor do Esperanto, manifestaram seu entusiasmo
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e carinho pela iniciativa os Espíritos Bezerra de Menezes, Charles, Victor Hugo,
Frederico Chopin, Leon Tolstoi, Camilo Castelo Branco, Lázaro Luís Zamenhof,
Cruz e Souza, Castro Alves, Abel Gomes, entre muitos outros, através da psicogra-
fia de Chico Xavier, Divaldo Pereira Franco, Yvonne do Amaral Pereira, Dolores
Bacelar e Francisco Valdomiro Lorenz.
Naquela mensagem, o Espírito Emmanuel afirma que o Esperanto faz parte
dos Planos Divinos da evolução do Planeta, que o Esperanto propicia a união e a
fraternidade que levam à unidade universalista, que o Esperanto facilita a permuta
dos valores universais do pensamento, e termina a mensagem com o seguinte
apelo: “Aprendamos o Esperanto, de modo a organizar, na Terra, os melhores mo-
vimentos de unificação.”
Não estaria Emmanuel, com esta frase, já anunciando também que o Espiri-
tismo iria crescer, espalhar-se por muitos países, e daí a necessidade de uma lín-
gua internacional para facilitar a comunicação entre os espíritas do mundo inteiro?
O Conselho Espírita Internacional certamente evidencia o início da concretização
desse ideal de unificação do Movimento Espírita Internacional.
Entre os livros editados pela FEB na Língua Internacional — atualmente em
torno de 30 títulos — destacamos: “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, “O
Evangelho segundo o Espiritismo”, “O Céu e o Inferno” (foi iniciada a tradução de “A
Gênese”), de Allan Kardec, “Há 2000 anos...” e “Paulo e Estêvão”, de Emmanuel,
“Nosso Lar” e “Ação e Reação”, de André Luiz.
Desde que iniciou seu trabalho no campo do Esperanto, em 1909, a FEB tem
até hoje o seu Departamento de Esperanto em franca atividade.
Outra Instituição que tem desenvolvido excelente trabalho, no campo do Espe-
ranto a serviço da divulgação do Espiritismo, é a Sociedade Editora Espírita F. V.
Lorenz, fundada em 1975. A Societo Lorenz, como é carinhosamente conhecida no
Brasil e no Exterior, já editou mais de uma dezena de obras espíritas em Esperanto,
as quais estão percorrendo os meios esperantistas do Brasil e de além-fronteiras.
Destacamos duas de grande importância, recentemente publicadas: “Memórias de
Um Suicida”, de Yvonne do Amaral Pereira, e “O Esperanto na Visão Espírita”, de
Ismael Gomes Braga.
Quando se fala em divulgar a Doutrina Espírita no Exterior, mesmo que não se
trate de divulgação pelo Esperanto, que é o tema deste seminário, não se pode
deixar de mencionar o Grupo de Ipatinga, de Minas Gerais, e o “Mensaje Fraternal”,
da Venezuela. Em Ipatinga, vários espíritas se cotizaram e começaram a traduzir e
enviar livros espíritas a outros países. Este trabalho já se desenvolve há alguns
anos, tendo sido enviados, às centenas, livros para a América Latina e para a Eu-
ropa. O mesmo trabalho tem sido realizado pelo “Mensaje Fraternal”, sob a presi-
dência de Alipio González.
Em Brasília, a Associação Mundo Espírita, fundada com a finalidade de divul-
gar o Esperanto no Brasil e a Doutrina Espírita no Exterior, já enviou cerca de
12.000 exemplares de livros, bem como também editou obras espíritas nas línguas
húngara, albanesa e búlgara, usando o Esperanto como língua-ponte. Apareceram
nessas línguas nacionais as obras “O Porquê da Vida”, “Introdução ao Estudo da
Doutrina Espírita”, “O Semeador” e “Vida Feliz”. O Esperanto também funcionou
como ponte para as versões em japonês de “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos
Médiuns” e “Nosso Lar”.
Como vêem, o trabalho está sendo realizado, ainda que em escala reduzida,
seja por uma menor participação dos espíritas em geral, seja por falha na divulga-
ção dessa iniciativa no seio do Movimento Espírita. Fazemos o serviço da formigui-
43
nha que carrega a folha; no caso, a folha do livro espírita, que liberta consciências.
Concluiremos nossa exposição com a leitura de pequeno trecho do artigo
editorial de REFORMADOR de julho de 1999, o qual nos dá a nítida compreensão
de que chegou o momento em que devemos envidar todos os esforços no sentido
de expandir a Doutrina Espírita para todo o Planeta:
“Se a Doutrina Espírita é patrimônio comum dos habitantes deste orbe, cum-
pre que seja ela difundida por toda parte, a fim de ser conhecida por todos. (...)
A Espiritualidade Superior fez o que lhe competia, trazendo ao nosso mundo
áspero o Consolador prometido por Jesus.
Aos homens, beneficiários da Nova Revelação, cumpre realizar sua parte, di-
fundindo-a por toda a Terra.” l
__________
* Trabalho apresentado no 1º Congresso Brasileiro de Espiritismo, em Goiânia
(GO), out.99.
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O Preço da Felicidade
CARLOS AUGUSTO ABRANCHES
Felicidade tem preço? Para o personagem deste artigo, sim. Ele é Alfredo, e
o caso pode ser conhecido em detalhes pelo leitor no livro “Os Mensageiros”, de
André Luiz, por Francisco Cândido Xavier (ed. FEB).
A dramática experiência de Alfredo e Ismália está narrada a partir do capítulo
16. Em poucas palavras, revela o resultado da convivência do casal com a calúnia
de um falso amigo, Paulo, que tudo fez para separar o casal, por não ter consegui-
do concretizar suas intenções sensuais junto a Ismália.
Após algum tempo, o caluniador consegue o objetivo de provocar a separa-
ção, ao minar a confiança que Alfredo depositava na esposa.
Ismália morre distante do ex-marido e dos filhos. Alfredo é chamado, tempos
depois, ao leito de morte de Paulo, que não resiste ao remorso de ter destruído um
lar e lhe confessa o crime perpetrado, rogando-lhe um perdão que o ex-colega não
consegue dar.
No plano espiritual, Alfredo demorou longo tempo para recuperar-se. Assim
que o consegue, vai às regiões inferiores em busca de Paulo. A vítima da calúnia
esforça-se para colaborar na recuperação de quem lhe destruiu o projeto familiar da
vida anterior.
Por causa do esforço reconhecido, o ex-marido de Ismália recebe a incum-
bência de dirigir um posto de socorro de Campo da Paz, instituição espiritual ligada
a Nosso Lar.
l
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mente comigo; entretanto, é necessário que eu aprenda a subir e, por este motivo,
ainda não recebemos a devida permissão para o definitivo consórcio espiritual. (Os
grifos são meus.)
l
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Falando ao Brasil
Fim do milênio. Anoitece.
No fulvo céu do Oriente,
A sombra avança envolvente,
Surgem sinistros bulcões;
No alto, lampejam raios,
O ódio se descortina,
Lembrando cinza e ruína,
Tumultos... Gritos... Canhões...
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Por isso, Brasil, enquanto
Nas urzes do sofrimento,
Sopra o ciclone violento
Temor e desolação,
Levanta o próprio futuro
No trio que te ilumina:
Justiça, Escola e Oficina,
Burilando o coração.
Recordemos a epopéia
Dos antigos bandeirantes,
Conquistadores gigantes,
Plantando o País no chão,
E os nobres Inconfidentes,
Atormentados em bando,
Mortos-vivos, mas buscando
A paz da libertação.
CASTRO ALVES
(Mensagem recebida por Francisco Cândido Xavier, no Centro Espírita “União”, em São
Paulo-SP, em 14-10-1981. Transcrito de REFORMADOR de maio de 1982.)
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18 de Abril
As luzes do conhecimento são outorgas divinas do Senhor de toda a Sabe-
doria, e estão sempre brilhando nos Universos sem fim, à disposição de todos os
seres da Infinita Criação.
Entretanto, cada Espírito alcançará apenas a luz que a sua capacidade de vi-
são puder identificar.
No mundo em que vivemos há também escolas para todos os tipos de alunos,
desde os Jardins de Infância até as mais requintadas Academias de Cientistas e
aos mais especiais laboratórios de sábios investigadores.
E é normal e comum que os mais desafeitos à aquisição de conhecimentos
façam pouco caso dos que preferem o esforço do aprendizado às fugazes satisfa-
ções dos sentidos materiais.
Para esses, os ainda inaptos à busca do saber, a Filosofia e a Ciência são
simples perda de tempo e desperdício de vida, senão rematada loucura de gente
insensata.
No tocante à revelação dos conhecimentos superiores da Vida Esplendente e
Imortal é igualmente assim.
Espiritismo, como Doutrina Reveladora, é curso avançado de verdades subli-
mes, ainda fora do alcance de consideráveis multidões de seres terrestres.
Nada, pois, a estranhar na atitude de incompreensão ou de agressividade dos
adversários da Terceira Revelação.
Devemos entendê-los e desculpá-los, dedicando-nos com gratidão e serieda-
de, ao aproveitamento da imensa caudal de ensinamentos novos que o Espírito da
Verdade derrama incessantemente em todas as direções.
Louvemos e agradeçamos ao Pai e ao Cristo pelo advento de “O Livro dos
Espíritos” e procuremos vivenciar suas lições sem nos preocuparmos com a indife-
rença ou o vozerio dos irmãos que, por enquanto, se satisfazem somente com o pó
do chão em que pisam, desprezando, por demasiado longínquas, as estrelas fulgu-
rantes que brilham na vastidão dos Céus.
ANDRÉ
(Transcrito do livro “Amar e Servir”, por diversos Espíritos, psicografado pelo mé-
dium Hernani Trindade Sant’Anna, p. 137-138, 2. ed. FEB.)
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A Educação da Criança
ANDRÉ LUIZ A. R. RABELLO
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prega? Simples. O prazer não se resume apenas nas manifestações fisiológicas,
efêmeras, que não plenificam. O prazer encontra-se na emoção profunda do ser. A
emoção que alguém sente ao ler o lindo Soneto da Fidelidade, de Vinícius de Mo-
rais. A sensação de tranqüilidade quando ouvimos a linda Sonata ao Luar, de Be-
ethoven. A boa sensação de ler uma obra de Machado de Assis. É o prazer sentido
em ajudar alguém, em ver alguém de que gostamos muito galgando os degraus
altos do sucesso, o prazer de ver alguém que amamos chegar perto de nós. E
quantos outros poderíamos citar!
Esses prazeres são o motivo da vida, é por eles que devemos procurar sem-
pre e não o prazer da sensação que proporciona minutos de felicidade, mas perío-
dos longos de amargura, nesta vida e na outra.
Agora é justo que os leitores perguntem o que isso tem a ver com a educação
infantil. Tudo a ver. Sabemos que no período da infância o Espírito está iniciando o
trabalho de reencarnação e por isso possui o cérebro muito sensível, guardando
nele as impressões que lhe são incutidas pelos pais e pela sociedade. Por isso,
quando vemos que os projetos educacionais estão voltados para preparar o ser
para viver no mundo alucinante das sensações desordenadas, é óbvio que se
aposse de todos os pais interessados na felicidade dos filhos uma preocupação
natural.
Vemos que a criança só é educada para entender o seu corpo de forma su-
perficial e para encaixar-se na sociedade como um elemento a mais, sem consci-
ência do que pode lhe fazer mal ou bem, sem saber que valores preservar e quais
aqueles que devem ser abandonados. Com isso, quando adolescente, não sabe
administrar as mudanças que se operam em sua psicologia e, aturdidas pela irrup-
ção vulcânica dos conteúdos liberados pelo inconsciente, atordoa-se e, não raro, se
entrega ao culto do prazer alucinante, pois não tem estrutura para aspirar algo mais
sublime, por falta de conhecimento sobre os intricados mecanismos que lhe regem
a maquinaria orgânica.
Com isso, vemos que a filosofia educacional hodierna precisa ser modificada.
Para tanto precisamos de um conjunto de idéias que nos auxilie a educar os pe-
queninos visando à sua felicidade plena.
Nesse momento surge a Doutrina Espírita para nos ajudar, e dizer-nos que
devemos enxergar o educando de forma integral, não apenas o corpo físico, mas
também como realidade espiritual. Deve-se ensinar-lhe, desde pequeno, as luzes
do Evangelho, o maior código moral de que a Humanidade tomou conhecimento até
hoje. Daí a necessidade da evangelização infantil, como meio de propiciar à crian-
ça bases sólidas de comportamento e uma visão otimista da realidade. E, com o
auxílio dos pais, que devem exemplificar para os filhos como se deve viver de acor-
do com o que ensina o Evangelho, chegará à adolescência sabendo que direcio-
namento deve dar à sua vida, saberá o que veio fazer na Terra, aceitar os proble-
mas e, como foi educada em bases de amor, não precisará recorrer ao tabagismo,
ao álcool, às drogas, ao sexo desvairado para encontrar felicidade. Pelo contrário,
canalizará suas energias para as expressões celestiais da vida, pois saberá con-
quistar a verdadeira felicidade, perseverando sempre, lutando para domar as más
inclinações e progredir sempre.
Portanto, é papel dos pais, dos evangelizadores e de todos os profissionais
da área infantil ensinar à criança o caminho da ventura, impedindo que ela caia nos
abismos da ilusão e que, quando adulta, possa caminhar com segurança rumo a
Jesus. l
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Sepulcros Caiados
MAURO PAIVA FONSECA
52
Seara Espírita
PARANÁ: ENCONTRO DE JUVENTUDES ESPÍRITAS
A Federação Espírita do Paraná realiza nos dias 21 a 23 de abril corrente, em Curiti-
ba, o 6º Encontro Confraternativo de Juventudes Espíritas do Paraná, com a abordagem do
tema — “Reeducando-se para o 3º Milênio”.
*
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PERNAMBUCO: INTECEPE 2000
A Federação Espírita Pernambucana e o seu Conselho Federativo Estadual estão rea-
lizando o INTECEPE 2000 — Integração dos Centros Espíritas de Pernambuco —, com o
tema “O Passe Espírita”, pelo expositor Luiz Carlos de M. Murgel, autor do livro, com o
mesmo título, editado pela FEB. O INTECEPE desenvolve-se nas seguintes regiões: Área
Metropolitana — Recife (19 e 20 de fevereiro); Mata Norte — Goiana (18 e 19 de março);
Mata Sul — Ribeirão (15 e 16 de abril): Agreste Norte — Surubim (30/abril e 1º/maio); Agres-
te Central Meridional — Caruaru (20 e 21 de maio); Sertão — Afogados da Ingazeira (17 e
18 de junho).
A FEP realizou, também, o I Encontro Estadual de Diretores de DIJ nos dias 19 e 20 de feve-
reiro.
*
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REFORMADOR
PEDIDO DE ASSINATURA: ALTERAÇÃO DE ENDEREÇO:
Nome ..............................................................................................................................
Endereço .........................................................................................................................
Bairro ............................................... CEP .......................................................................
Cidade ............................................. Estado ....................................................................
País ................................................. Tel.: .......................................................................
* Se você deseja oferecer uma assinatura de presente a alguém preencha o quadro acima com os dados do
presenteado e o quadro abaixo com seus dados.
NOTA: O pedido de assinatura deve vir acompanhado do comprovante do pagamento da assinatura anu-
al, no valor de R$ 24,00.
O pagamento pode ser feito através de cheque nominal à Federação Espírita Brasileira, ou de or-
dem de pagamento, vale postal ou depósito na conta 9062-X — Agência 0265-8, do Banco do
Brasil (enviando-nos o comprovante).
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