Roxo, Pedro.2010.JazzMusImpr2000 2010

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Roxo, Pedro (2010) Do sculo XX ao sculo XXI: processos, prticas

musicais e msicos emergentes: 6. Jazz e msica improvisada: Expanso


das prticas e descentramento do mercado in Salwa Castelo-Branco
(coord.) Enciclopdia da Msica em Portugal no Sculo XX. Vol. 4,
pp.1372-1378.

dana se mantm presentes e constantes, independentemente do tempo, do lugar ou


da plataforma de comunicao e suporte em que assentam. 6. Jazz e msica improvisada: Expanso das prticas e descentramento do mercado. (i) Jazz. A primeira
dcada do sc. XXI foi marcada pela emergncia e afirmao de uma nova gerao de
msicos, crticos, divulgadores e promotores de jazz, e pela produo de diversidade
estilstica e discursiva em tomo desse domnio musical. Beneficiando de uma conjuntura que j se vinha acentuando desde pelo menos a dcada de 1990, es!e perodo
foi tambm caracterizado pela institucionalizao do jazz no sector acadmico e educativo, com a multiplicao de workshops e de escolas de jazz um pouco por todo o
pas e a introduo de cursos e disciplinas dedicadas ao jazz em vrios conservatrios e escolas profissionais, tendncia que foi acompanhada ao nvel universitrio
com a introduo do jazz nos curricula de vrias escolas superiores de msica e a
criao de cursos e de centros de estudo de jazz em vrias universidades (Centro de
Estudos de Jazz da Universidade de Aveiro, desde 2002 - fundado com a colaborao de Jos *Duarte, com base no seu esplio discogrfico ,e bibliogrfico; Curso de
Msica, Ramo de Formao em Jazz, da *Universidade de Evora, desde 2008; Curso
de Jazz e Msica Modema da Universidade Lusada, desde 2010). A disseminao
do ensino do jazz contribuiu para o surgimento de uma nova massa crtica de adeptos
e para a formao de vrios contingentes de novos msicos terica e tecnicamente
apetrechados para se enquadrarem no mercado profissional da msica. O acesso
educao, a circulao massificada de fonogramas e de formatos digitais de msica
jazz, conjugado com o acesso facilitado a informao sobre estilos e domnios da
msica, beneficiou o surgimento de mltiplas identidades musicais. Nesse sentido,
vrios msicos das geraes mais recentes deixaram de sentir a necessidade de centrar a sua carreira em referenciais musicais impostos por estruturas ordenadoras do
domnio (p.ex.: categorias musicais impostas pela indstria ou por crticos musicais),
para reflexivamente construrem a sua prpria identidade musical adoptando subjectivamente, de modo significativo e at mesmo estratgico, elementos musicais, estticos ?u
composicionais de provenincias mltiplas (incluindo elementos externos ao convencionado domnio do jazz, apropriados dos domnios da msica tradicional e pop-rock, e.o.).
A esta propenso no ser tambm alheia a crescente promoo do esbatimento de fronteiras (estticas, tisicas, raciais, etc.) por parte das polticas da multiculturalidade e da
influncia do transnacionalismo econmico das ltimas dcadas. A multiplicao de festivais de jazz em Portugal ao longo da dcada espelha no apenas o crescente interesse
e visibilidade social que o domnio passou a deter, como tambm o aproveitamento poltico, econmico e turstico deste tipo de eventos , nomeadamente por parte dos pode.res
autrquicos que capitalizaram no jazz uma parte da programao cultural dos municpios, tirando assim partido de infra-estruturas como a rede nacional de teatros, cineteatros e equipamentos culturais polivalentes (p.ex.: bibliotecas com auditrio), edificadas
no mbito do POC (Plano 'Operacional de Cultura) (AAVV 2005). Esta circunstncia
promoveu a descentralizao da oferta cultural e, a promoo do jazz fora dos principais
centros urbanos. Para juntar ao rol de festivais que transitaram do sc. XX, neste perodo
foram fundados novos festivais internacionais, com orientaes estticas bastante diversificadas: Allgarve Jazz (desde 2008), Braga Jazz (desde 2006), Cascais Jazz (retomado em 2009, aps um interregno desde 1984), Douro Jazz (desde 2004), Festival
Internacional de Dixieland de Cantanhede (desde 2004), Festival Jazz.pt (desde
2008), Festival de Jazz da Alta stremadura (de de 2007), Funchal Jazz (desde
2000), Jazz ao entro ncontro Interna ci nais de Jazz de oimbra (de d 2003),
ag Jazz (desde 2002), Portal' 'r Jazz ,. 'st (d .sdc 2002 ), Portu 'ai Jazz (desde
007 , .stc ltimo um festival itin .rnnt ' qu ' abran ,ia v rios muni .ipios portu iu 's is ),

e.o. O desinvestimento geral na edio de fonogramas de jazz por parte das ed itoras
multinacionais a operar em Portugal aliado crescente democratizao dos meios de
gravao, produo e promoo no mbito da indstria musical potenciou o surgim mto de vrias editoras independentes que , tirando partido do estabelecimento de relaes pessoais e comerciais densas com msicos, promotores, crticos e distribuidores,
e aproveitando as potencialidades de compresso do espao e do tempo susc itadas
pelos media digitais (nomeadamente a Internet), ampliaram o seu mbito de aco a
um nvel internacional - circunstncia que evidencia simultaneamente um descentramento dos plos tradicionais de disseminao do ja zz. Esta propenso seria particularmente visvel na editora Clean Feed (CF) , fundada em Lisboa em 2001 enquanto
empresa familiar pelo divulgador e promotor Pedro Costa e seus irmos Nuno e arlos. Centrando-se na documentao de vrias vertentes do jazz contemporneo, com
particular incidncia em projectos musicais associados (por crticos, editores e msicos) a conceitos de inovao, actualidade e experimentao, a CF inaugurou uma
tendncia inovadora na edio do jazz em Portugal, ao procurar editar de forma con sistente e continuada no apenas msicos portugueses e estrangeiros, como tambm
colaboraes entre ambos, inclusivamente numa perspectiva intergeracional. Nessa
perspectiva, publicou no apenas msicos consagrados (Carlos *Barreto, Mrio
*Delgado, Jos *Eduardo, Bernardo *Sassetti, *Telectu, Carlos *Zngaro, Joo *Pau lo Esteves da Silva, e.o.) como tambm novos valores ou msicos at ento com menos oportunidades de edio (formaes do saxofonista Alpio C. Neto ; pianista Jlio
Resende; e guitarrista Lus Lopes ; o quarteto Lisbon Improvisation Player ; Red
Trio ; e.o.) . As actividades da CF articulavam-se com a da empresa Trem Azul , que
alm da edio de fonogramas atravs da CF, se dividia ainda noutros ramo s de actividade: comercializao de fonogramas e videogramas de jazz; distribuio (incluindo a representao de catlogos em regime de exclusividade); organizao de concerB
tos, (frequentemente em eolaborao com outras empresas e instituies, como
e Culturgest); e o agenciamento de artistas. A centralizao e a articulao numa nica empresa de vrios sectores de actividade da indstria musical de modo a melhor
aproveitar as potencialidades do mercado, constituiu uma postura comercial pouco
comum no mbito do mercado do jazz em Portugal, Em 2010, a CF exibia um catlogo com c. 180 edies que , alm de evidenciarem dinamismo e vigor editorial, patenteavam igualmente uma das tendncias que marcaram a indstria ao longo da dcada e que passava pela contribuio financeira dos prprios msicos (usualmente
msicos em incio de carreira ou com menor visibilidade artstica/comercial) para a
edio dos seus fonogramas. Procurava-se deste modo capitalizar no mOme1l111111 da
editora, tirando partido da sua integrao na indstria (espao nos media, distribuio
nacional e internacional, partilha de um catlogo com nomes sonante ), de modo a
conquistar uma projeco comercial que no seria possvel atravs da mera edio de
autor (Costa 2010. Ver Entrevistas..., p. 1449). J com uma linha esttica mais dirc 'cionada para a explorao harmnica e estrutural das composi es, mas igualrncnt '
preocupada pela documentao do jazz contemporneo, a editora Tone of a Pit ' h foi
fundada em 200 I pelo guitarrista Andr Fernandes. entrou a sua estratgia na edi o
de msicos de jazz emergentes, em forma es que frequentement e juntavam msicos
nacionais e/ou estrang eiros (por vezes de vrias geraes), como os agrupam mlos li '
A. Fernandes, Andr Matos (guitarra), Bruno antos (guitarra), I nnian 'abnud ( xmtrabaixo), Jcffcry I avis (vibraf onc marimba), Joana Ma .hudo ( oz), Mar 'o Franco
(bateria), Mi 'li '\ Amado (ha i. o 'I " .tri 'o ), N i lso n Cus 'ais (contrabai xo) , Nuno 'os la
(guitarra), Paulo Bande i.a (luu 'ria), Vas 'o 1\ iostinh ('uilarra), ..u, I{ 'ai " ainda pu
ra a a 'I i idade (1Il 'nll, .lo l 11 1.1) das 'di(unis EIII opcn1\ Er \tOl' S (fundada '11\ 00(, P ,
I

lo saxofonista Rodrigo Amado para a edio de fonogramas das diversas formaes


cm que participou); David Ferreira Investidas Editoriais (edio de Antnio Pinho
*Vargas); Discaudio (pianista Paulo Gomes, e.o.); e iPlay, ex-editora Som Livre, estabelecida em 1994 (Carlos *Martins, Laurent *Filipe e a cantora Maria Anadon,
e.o.). Nalguns casos, o reconhecimento internacional de msicos portugueses encontrou eco na edio de fonogramas em editoras estrangeiras, como a Blue Note (Jacinta);
Enja (Afonso Pais Trio, Carlos *Bica & Azul); Fresh Sounds New Talent (A. Matos,
Joo Lencastre's Communion, Orquestra Jazz de Matosinhos, e.o.); Inner Circle Music (Sara Serpa, A. Matos); L'Empreinte Digitale (1. Paulo); Omnitone (Orquestra
Jazz de Matosinhos), e.o. Msicos como Gonalo Prazeres (saxofone), Jorge Moniz
(bateria) e Pedro *Madaleno (guitarra) publicaram tambm fonogramas em edio d '
autor. Uma percentagem significativa dos msicos da nova gerao receberam ou
completaram a sua formao musical no estrangeiro, sobretudo nos EUA e na Holanda, propenso que se tomou mais acentuada neste perodo por via do estreitar de relaes entre a Escola de Jazz Lus Villas-Boas e instituies acadmicas estrangeira:
[ V 'R Jazz, 7.]. Esses msicos tiraram partido de redes pessoais e artsticas para de
envolverem e projectarem o seu trabalho alm-fronteiras, o que favoreceu a sua integrao no circuito internacional (p.ex.: Francisco Pais, guitarra; Joo Lobo, bateria;
ara Serpa, voz; Sofia Ribeiro, voz, e.o.). Estes msicos viriam a adicionar represcntatividade ao grupo de msicos portugueses que frequentavam o circuito internacional, como C. Bica, Jacinta, 1. Paulo, Maria *Joo e Mrio *Laginha, e.o. Alm dos
supra-citados, ao longo da dcada destacaram-se ainda outros msicos, como Eduardo Laia (trombone), Filipe Melo (piano), Hugo Alves (trompete), Hugo Antun 's
(contrabaixo), Joana Rios (voz), Joo Guimares (saxofone), Jos Pedro Coelho (saxofone), Marcos Cavaleiro (bateria), Ricardo Pinheiro (guitarra), Ricardo Freitas
(baixo elctrico), Rodrigo Gonalves (piano), Ruben Alves (piano), Sara Valente
(voz), Srgio Carolino (tuba), e.o. A nova vaga de msicos viria a juntar-se aos instrumentistas que iniciaram actividade nas ltimas dcadas do sc. xx [VER Jazz, 7.1 '
que se mantiveram activos ao longo deste perodo. Destaque tambm para as formaes de maior dimenso, como Big Band de Jorge Costa Pinto, Big Band do Muni '\
pio da Nazar, Lisbon Underground Music Ensemble, Orquestra de Jazz de Lagos,
rquestra Jazz de Matosinhos e a Tora Tora Big Band. A acompanhar o crescente di
namismo em tomo da prtica do jazz, alguns espaos de actuao e de diverso no '
turna surgidos ao longo da dcada comearam a incluir o jazz na sua agenda de pro
gramao de espectculos. Porm, o *Hot Clube de Portugal (HCP) continuou as'
o espao de actuao dominante para o jazz em Portugal at madrugada de 22 d
ezembro de 2009, ocasio em que o clube foi obrigado a encerrar actividades d 'vi
do ao facto de ter sofrido danos irreparveis associados a um incndio ocorrido no.
andares superiores do prdio que o alojava. Em Abril de 2010 circulava a notcia da
cedncia de um espao por parte da Cmara Municipal de Lisboa para a reabertut
do H P, prximo do local em que se situava. Algumas instituies tambm inclui
ram o jazz na sua programao regular, como o Centro Cultural de Belm ( CH)
(que albergava eventos de jazz desde a dcada de 1990), a Culturgest, o Teatro d
. o uiz, em Lisboa, e a Casa da Msica no Porto, e.o. Alguns dos eventos or nm
zados nestas instituies vieram a constituir-se como marcantes por terem estrutu n
do parte das narrativas sobre o jaz: ao vivo nn Portugal fora do I-I P, sobretudo n
F esta do Jazz, no Teatro d ao l.uiz (d isdc (02), que, alm das forma 's .ou
vidadas, in .luia a apr 's mtao de cotnbo .unstituidos por alunos de vrias 's .olu
d i j a na .ionais: mas lamb '11\ o rido '1 'Z s Quintas. no " H (d .sd ' _OO? ); o ' I
' 10 Islo 'Jazz' , nu Culun " sI (d ' cI' OOH) : r id o Dose Dupla, ('CB (d .sdc 00')),
I

e.o. No mbito dos media tradicionais, a presena do jazz foi irregular. Ao longo
da dcada foi praticamente inexistente a programao de jazz nos canais nacionais de
televiso, com excepo de alguns concertos ou actuaes registados pela RTP em
festivais nacionais ou em antigos programas televisivos de dcadas anteriores, retransmitidos pelo canal RTP Memria. Todavia, a emergncia e consolidao da televiso por cabo facultou o acesso a canais estrangeiros onde a presena do jazz era
bastante mais assdua, com particular destaque para o canal francs Mezzo. Na rdio,
verificou-se a continuidade dos programas de Manuel Jorge *Veloso (Um Toque de
Jazz, Antena 2) e Jos Duarte (A Menina Dana?, Antena 1, *Cinco Minutos
de Jazz , Antena 1; Jazz com Brancas, Antena 2), mas foram tambm assinaladas
emisses regulares dedicadas ao jazz (com orientaes estticas bastante diversificadas) em vrias estaes de rdio de diversos pontos do pas (Rdio Europa Lisboa,
Rdio Marginal, Rdio Oxignio, Rdio Universidade de Coimbra, Rdio Universidade do Minho, etc.). No que respeita imprensa escrita, a dcada foi sobretudo
marcada pela existncia de duas revistas dedicadas ao jazz em perodos diferenciados: a AIUazz (2002-2004) e a Jazz.pt (desde 2005). Com um design inovador que
dividia a revista em dois cadernos, a revista AIUazz debruava-se sobre vrios estilos
de jazz, com algumas incurses msica pop e a world musico A revista juntou criticos e divulgadores de vrias geraes, circunstncia que pode ser encarada como
uma espcie de passagem de testemunho, uma vez que o projecto editorial que se seguiu, a revista Jazz.pt , seria maioritariamente dominada por uma nova gerao de colaboradores (Antnio Branco, Joo Aleluia, Nuno Catarino, Abdul Moimme, e.o.).
Fundada por iniciativa do Jazz ao Centro Clube e do seu fundador, Pedro Rocha Santos, e com uma periodicidade bimestral, a Jazz.pt tornara-se no final da dcada o peridico portugus dedicado ao jazz a atingir maior longevidade, circunstncia a que
certamente no ter sido alheia a contribuio militante e no remunerada da esmagadora maioria dos seus colaboradores (Moimme 2010, Costa 2010. Ver Entrevistas..., p. 1449). Os contedos da revista centravam-se nas mltiplas tendncias do
jazz contemporneo, com especial incidncia nas propostas consideradas mais inovadoras do jazz e da msica improvisada. Esta poltica editorial, aliada promoo tanto de msicos jovens como de msicos com carreiras consolidadas, contribuiu para a
dinamizao do meio musical portugus nessas reas e para o esbatimento de fronteiras estticas e geracionais. Por outro lado, o-fto de este peridico funcionar igualmente como meio de promoo das actividades da editora CF em funo da colaborao estreita entre os fundadores da revista e da editora, impele a considerar o peso
das solidariedades pessoais na anlise da reconfigurao do mercado do jazz em Portugal ao longo deste perodo. A circulao de informao e de reflexo sobre jazz foi
ainda complementada pela actividade de alguns crticos/divulgadores na imprensa escrita (p.ex.: os emergentes Rodrigo Amado e Rui Horta Santos/Abdul Moimme, no
jornal Pblico ; Raul Vaz *Bernardo, no jornal Expresso , M. 1. Veloso, no jornal Dirio de Notcias , at 2007, e.o.), e na Internet pela profuso de blogues com contedos dedicados divulgao do jazz em Portugal (p.ex.: Jazz no Pas do Improviso ,
desde 2003; Improvisos ao Sul , 2004-2010; Jazza-me Muito, desde 2006, e.o.). Uma
parte significativa dos crticos e divulgadores das geraes mais antigas passaram
precisamente a exercer actividade de crtica em blogues pessoais na Internet (JazzLogical, desde 2006; JazzPortu Tal, desde 1997; Jazz XXI, desde 2009; Jazz 6/4 , desde
2009; O Stio do Jazz, desde 2007), em larga medida por opo prpria, mediante alteraes das polti 'as xlitoriais laborais/financeiras op erudas na imprensa em ieral
e nos p iri di 'os sobre i I '11\ parti .ular (p.c .: a .m 'r' n 'ia do r .n m 110 da 'olalx rano tratuitu. a rcdu lO do ' SpllO .oncrido i\ 'rli 'a d';a na impr msu di ria.

etc.). Sobretudo a partir da segunda metade da dcada, as actividades dos agentes e


dos media indicados, a par da produo escrita de divulgadores (p.ex.: Rubio e Santos 2008; Santos 2007, 2009) e acadmicos (Martins 2006; Roxo 2009; Roxo e Castelo-Branco no prelo), garantiu a diversificao dos discursos relativamente prtica
e percepo do jazz em Portugal. Todavia, de um modo geral, continuou a verificar-se a tendncia para a perpetuao de mistificaes de carcter histrico sobre a
recepo e a prtica daquele domnio musical no territrio portugus, e para a manuteno de discursos de carcter primordialista e de teor valorativo, frequentemente
ancorados na velha questo da identidade do jazz (o que pode ou no ser considerado
jazz , ou jazz verdadeiro). (ii) Msica improvisada. O permanente cruzamento,
trnsito e diluio de fronteiras entre o jazz e outros domnios e estilos musicais foi
ao longo da dcada particularmente evidente entre os domnios do jazz e da msica
improvisada. Neste perodo proliferaram inmeras formaes (de constituio varivel e frequentemente de durao efmera) que juntavam msicos com formao musical diversificada, desde o percurso de aprendizagem em escolas de jazz ou de msica erudita, at formao autodidacta. A Variable Geometry Orchestra (fundada em
2000 pelo violinista e violetista Ernesto Rodrigues) constitui provavelmente o melhor
paradig~a desta tendncia, mas so tambm de destacar formaes como Alpio C.
Neto Tno e Quarteto, Fanfarra Recreativa Improvisada Colher de Sopa, Lisbon Improvisation Players, Red Trio, e.o. Frequentemente estas formaes partilhavam os
mesmos espaos de actuao das formaes de vrios estilos de jazz, e de outros domnios musicais, o que pode ser perspectivado como um indicador da aproximao
de pblicos e de msicos, embora a msica improvisada tenha mantido, de modo geral, uma audincia reduzida, apesar do aumento do nmero de praticantes. Aproveitando as potencialidades dos media digitais e a democratizao dos meios de produo,
foram tat?bm vrios os msicos da rea da msica improvisada que optaram por
fundar editoras, de modo a conferirem maior visibilidade ao seu trabalho e ao de msicos do seu crculo de afinidades. Podem integrar-se nesta tendncia as editoras
<;reative Sources (CS - fundada em 1999 tambm por Ernesto Rodrigues), Highhghts (fundada em 1998 pelo guitarrista Manuel Mota), PlanctonMusic (fundada
c. 2002 . pe~o gui~arrista Rafael ToraI), Rudimentol Records (fundada em 2003 pelo
percussionista MIguel Cabral) e a SIRR (fundada em 2001 pelos msicos de electrnica Carlos Santos e Paulo Raposo). Foram tambm publicados fonogramas de msica
i~provisada em editoras no directamente associadas com o jazz ou a msica improVIsada, como a Bor Land (fundada em 2000), a Grain of Sound (fundada em 2001),
ou a Crnica (desde 2003), alm das editoras com percursos iniciados na ltima dcada do sc. xx [VER Msica improvisada]. O surgimento de netlabels dedicadas
msica improvisada constituiu outro dos fenmenos que marcaram a dcada. Frequentemente estas editoras publicaram tambm projectos musicais de origens diversificadas e colaboraes entre msicos de diversas nacionalidades, incluindo nacionais,
como a portuguesa Test Tube (fundada em 2004 e associada editora de msica
electrnica Monocrornatica) ou a sua Insubordinations Netlabel (desde 2006), e.o.
De facto, uma parte substancial das actividades em tomo da msica improvisada centrou-se precisamente em tomo das actividades das editoras, com especial destaque
para a CS, cujo catlogo de fonogramas de m icos portugueses, estrangeiros e d '
colaboraes entre msicos de vrias nacionalidade ' atingia quase as duas centenas
em 20 IO, o que proporcionou ai iuma visibilidade int 'ma ional. Revelando uma tendncia do mercado comum ao se .tor do jaz - , o su - 'sso 'a lon ' .vidadc desta xlitora
(!eveu-s' no ap nas a uma 'stral " ria -~Iilorial .laram 'nl ' d 'tinida por parte do s 'II
funda 101', io mo tamh I'm :\ .outrihui IIUHl -Iaria dos msi -os para a xlio dos

seus prprios fonogramas. Tambm no domnio da msica improvisada o -r 's .im .nto exponencial de msicos e da oferta musical no foi necessariamente acompanha lo
pelo crescimento de consumidores e de editores dispostos a investirem, fazendo xun
que o mercado se reorientasse grosso modo para o fenmeno daquilo que na pr ti -a
funciona como auto-edio, apesar de mediada pelo editor. Alm da publicao d
fonogramas, a CS e E. Rodrigues dinamizaram o circuito da msica improvisada
atravs da criao de inmeras formaes musicais com constituies bastante div -1'sificadas, organizao de concertos avulsos, e a criao de um festival anual ( 'r 'alive Sources Fest, desde 2007). Outros eventos estruturantes neste perodo foram: Encontros de Msica Experimental (desde 2000), festival Sonic Scope (dcsd 00 I,
programado pela editora Grain of Sound desde 2002); Out.Fest Mu ic Festival (d 'sd '
2006, organizado em colaborao com a editora Searching Records); iclo M itaso nic (organizado intermitentemente pela associao Granular desde 2005), Encontros
de Msica Improvisada de Atouguia da Baleia (2010), e.o. Uma parte signili 'ati a
dos eventos ao vivo na segunda metade da dcada ficou documentada no podcast
Freemusic (http://freemusic.podomatic.com/), fundado em 2006 pelo tarnbm msi -o
A. Moimme. Tal como sucedeu no circuito do jazz, o circuito da msica improvisada foi igualmente caracterizado pela colaborao entre vrias geraes de msi 'os.
Se uma larga maioria dos msicos que iniciaram actividade no sc. xx [ VER Msi .n
improvisada] continuaram actividade regular desde 2000, a dcada foi tamb "m marcada pelo surgimento de uma fornada de msicos, no necessariamente todos da nova gerao, mas obtendo maior visibilidade neste perodo, sendo de destacar (ai nu
dos nomes acima mencionados): na bateria, Gabriel Ferrandini; no c1arinet " Bruno
Parrinha e Joo Pedro Viegas; no contrabaixo, Hernni Faustino, Margarida iar -ia '
Miguel Leiria; na electrnica, Adriana S, Andr Gonalves, Joo a tro Pinto, Jo o
Silva, Jorge Mantas, Miguel Carvalhais, Miguel S, Nuno Moita, Pedro Tud ' Ia, Travassos e Vtor Joaquim; na flauta, Jorge Lampreia (tambm saxofone); na ruitarru
elctrica, Antnio Chaparreiro, Emdio Buchinho, Filipe Leote e Gonalo Fal 'ao; na
percusso, Jos Oliveira, Monsieur Trinit e Nuno Moro (tambm electrni .a ): no
piano, Joo Lucas, Manuel Guimares e Rodrigo Pinheiro; no saxofone, Jos I m -aslr "
Nuno Torres, Paulo Chagas e Paulo Curado; na trompete, Johanne Krieger, Mar .cllo
Maggi e Lus Vicente; na tuba, Gil Gonalves; no violoncelo, Guilherme Rodri 'U 's,
Miguel Mira e Ulrich Mitzlaff; e na voz, Amrico Rodrigues. Em termos int 'ma 'io
nais, foram vrios os msicos que conheceram algum protagonismo, como E. Rodrigues, Manuel Mota, Rafael Torai, Victor Gama, Vtor Joaquim, Andr onulvcs,
e.o., alm dos consagrados Carlos *Zngaro e *Telectu. O circuito da msica 'I' '1Inica foi particularmente activo, com o surgimento de inmeros novos praticam s 'o
estabelecimento de vrias parcerias com outros domnios artsticos (vdeo, dunu.
etc.), incluindo colaboraes com msicos e/ou instituies estrangeiras. asso .intivismo organizado entre msicos ( semelhana do que sucedera no domnio da dunu
contempornea na dcada de 1990) constituiu uma novidade relevante ncst ' p .rlodo.
com a fundao da Associao Granular, em 2003. Dedicada prornoao daquilo
que o seu programa designa como arte experimental, nomcadamcnt ' nos domnios
sonoro e visual, esta associao contribuiu tambm substan .ialmcntc para a dinumi
zao do circuito da msica improvisada, atravs da organizao de .onc .rtus, i 'Ios
temtico e debate. No mbito terico, apesar de t 'rem S Ul' rido novos divul indor 's
a e creverem sobre msica improvisada (p.c: .: Eduardo 'ha 'as, tamh nu fundadrn
em 2004 do blo rue Ja zz e Arredores ), a produo dis .ursi :t de Jor ' ' I ima Ban 'lo
" sobr 'ludo, do -rili .o ' di uI unlor Rui Eduardo Pa 's (uuuh ' 111 'ditO! da I ' i:la
Jn__ .pl) .ontinuou a s 'r doruinantc ' r ' .onh 'ida pOI unia Iiii pa muiru i I do: apl'lIl ':

do domnio no que se refere produo de significados, sendo inclusivamente utilizada como meio legitimador de prticas e de msicos (p.ex.: livros sobre msica improvisada, textos de sala de concerto, textos de booklets de CD). 7. Msica erudita:
() incremento da criao e da prtica interpretativa da msica antiga e contempornea. A dcada de 2000-2010 ficou marcada pela inaugurao da Casa da Msi'a, no Porto, instituio que rapidamente se imps como uma referncia no domnio
da promoo de concertos, como suporte de uma srie de agrupamentos residentes e
como plo de formao e criao artstica. Concebida para assinalar o ano de 200 I,
em que a cidade do Porto foi Capital Europeia da Cultura, teve como principal mentor o pianista Pedro *Burmester. O projecto foi definido em 1999, como resultado de
um concurso internacional de arquitectura que seleccionou a soluo apresentada por
Rem Koolhaas - Office for Metropolitan Architecture. Inaugurada no dia 15 de
Abril de 2005, foi concebida como a casa de todas as msicas, acolhendo um projecto cultural abrangente em diferentes domnios: da msica erudita ao jazz, do fado
ii electrnica, da grande produo internacional aos projectos mais experimentais,
A rquestra Nacional do Porto, cujo nome foi alterado em 2010 para Orquestra Sinfnica do Porto - Casa da Msica, converteu-se num dos agrupamentos residentes
da asa da Msica, juntamente com o Remix Ensemble, grupo especializado na msica contempornea, formado no ano 2000, ainda antes da concluso do edificio. Na
mesma poca, tendo em vista o programa da Capital Europeia da Cultura e o projecto da Casa da Msica a longo prazo, foi posto a funcionar um Estdio de pera (extinto em 2005) e o Servio Educativo. Entretanto, foi criada a Orquestra Barroca Casa da Msica (formada em 2003 a partir de um ncleo de instrumentistas do Remix
~ nsemble, mas adquirindo apenas um perfil mais especializado depois de 2006 com
a introduo de instrumentos com cordas de tripa e a colaborao com maestros como Lawrence Cummings, Fabio Biondi, Harry Christophers, Antonio Florio ou Rinaldo Alessandrini) e o Coro Casa da Msica (2009), tendo como maestro titulai
Paul Hillier. Com um nvel de qualidade internacional que tem sido reconhecido pela
crtica portuguesa e estrangeira, o Remix Ensemble tem actuado nos principais festivais de msica contempornea europeus e em importantes salas de concertos de cidades
como Amesterdo, Anturpia, Barcelona, Berlim, Bourges, Budapeste, Estrasburgo,
lluddersfield , Roterdo, Madrid, Norrkping, Orlees, Paris, Reims, Valncia, Viena,
Witten, e.o. Apresentou em estreia absoluta mais de 60 obras e tem sete discos gravados (com obras de *Azguime, Crte-Real, James Dillon, Klaus Ib Jorgensen, Bcrnhard Lang, Wolfgang Mitterer, Emmanuel *Nunes, Pauset, Peixinho, Staud e Pinho
*Vargas e.o.). O seu maestro titular Peter Rundel, que sucedeu a Stefan Asbury em
005. A Casa da Msica veio colmatar uma lacuna no mbito dos equipamentos culturai especializados na rea da msica no Norte do pas ao mesmo tempo que se as
sumiu como um projecto de mbito nacional e internacional. O seu reconhecimento
alm-fronteiras teve como principal motor a peculiar dimenso arquitectnica do edill
.io, a qualidade do Remix Ensemble e a integrao no Rseau Varse a partir de 200 ,
Antnio Jorge Pacheco, director artstico da Casa da Msica desde Janeiro de 2009,
ano em que sucedeu a P. Burmester, tambm secretrio desta rede europeia desde
004. entre 2000 e 2010, a Casa da Msica encomendou um total de 123 novas obra.
(de forma autnoma ou em parceria) a 73 compositores diferentes, 31 portugueses
_ istran zciros (dois deles residentes em Portu 'ai) . A difuso e promoo da msi 'U
.ont .mpornca portuguesa contou tumbm .um um relevante impulso atravs das a '
tividades da Asso .iao ultural Miso MIIsi " fundada por Paula Az ruimc c Mi 'U ,I
I\z mime 'orno urna ' t insno do Mi..o lins .mblc. Entre 'Ias .n .ontrn-sc a 01' mui
zuuo d - .onc -rtos (qu -r 110 1I111hilo cio ,. '.li ai Msi 'a Viva, qu 'r de t nnporudn:

realizadas no Instituto Franco-Portugus desde 2007), a promoo de aces de formao especializada e actividades para o pblico infantil, a realizao de residncias
para compositores, concursos de composio, a edio de CD (Miso Records) e um
programa de encomendas. A filiao em redes internacionais (International Society
for Contemporary MusicIUNESCO; Confderation Internationale de Musique ElectroacoustiquelUNESCO; European Conference of Promotors of New Music; International Association of Music Information Centres; International Computer Music Association) tem permitido a apresentao no estrangeiro de numerosas obras de compositores
portugueses. Um projecto crucial da Miso Music foi a criao em 2002 do Cen~o de
Informao da Msica Portuguesa (CIMP), cujo portal na Internet (http.z/wwwmic.pt/),
dotado de uma base de dados interactiva sobre compositores e obras dos scs. XIX e xx,
foi inaugurado em 2006 e passou a permitir (a partir de 2009) a edio e distribuio de
partituras. O CIMP inclua em Abril de 2010, um total de 156 compositores activos.
Das 7311 obras referenciadas, 401 tm partitura editada e distribuda pelo CIMP e esto
ainda presentes na base de dados 97 intrpretes (grupos e solistas). Em 2007 a Mis.o
Music promoveu ainda a criao do Sond' Ar-te Ensemble, agrupamento que combina instrumentos acsticos e electrnicos, e do Teatro Electroacstico. Esta ltima
rea e o desenvolvimento de um novo conceito de pera tm sido uma das linhas de
fora da actividade criativa de M. Azguime e de P. Azguime de que exemplo a
pera multimdia Itinerrio do Sal, distinguida em 2008 com o prmio Music Theatre NOW do International Theatre Institut da UNESCO. A *Fundao Calouste Gulbenkian continuou tambm a investir na encomenda de obras. Na primeira dcada do
sc. XXI encomendou 35 novas partituras, 22 a compositores portugueses e 13 a compositores estrangeiros, incluindo, neste ltimo caso Stockhausen (nomeadamente a
criao de Schnheit, 6.a hora do ciclo Klang) , Thomas Ades, Peter Etvs e Kaja
Saariaho. Face a uma oferta mais diversificada em termos de promoo e divulgao
da nova msica em Portugal, deixou de realizar os Encontros Gulbenkian de Msica
Contempornea em 2002 (~ extinguiu tambm as Jornadas der Msica Antig~), passando a integrar esses repertrios no seio da temporada, mas em menor quantidade e
normalmente sem uma temtica aglutinadora, conforme sucedia nos ciclos anteriores.
Em contrapartida, comeou a organizar em 2003 workshops anuais da Orquestra
Gulbenkian destinados a jovens compositores portugueses. Paralelamente, a temporada regular de concertos manteve os mais elevados tpadres,internacio?ais, traze~do a
Lisboa alguns dos melhores solistas e agrupamentos a mvel mundial. A partir de
2008, a Gulbenkian reforou a sua aco pedaggica e conferiu-lhe uma maior visibilidade e diversidade atravs do Programa Gulbenkian Educao para a Cultura DESCOBRIR, que integrou o projecto educativo associado ao Servio de Ms~ca
juntamente com os projectos que j existiam em cada sector da Fundao num mco
bloco, dirigido por Rui Vieira Nery. Em 2009, o finlands Risto Nieminem .foi seleccionado no mbito de um concurso internacional para ocupar o cargo de director do
Servio de Msica, sucedendo a Lus Pereira *Leal, que tinha assumido essas funes nas ltimas trs dcadas (desde 1978). No *Teatro Nacional de So Carlos, a direco artstica foi assumida em 200 I pelo italiano Paolo Pinamonti, antigo director
do Teatro La Fenice de Veneza. Pinamonti procurou reforar a reputao internacional
do teatro atravs de co-produes, combinou ttulos clebres com estreias em Portugal
de peras menos conhecida ' - por exemplo Four Saint s in Three A ts (Virgil
Thom on), harodeika (Tchaikov. ky), O 'aval iro aval' nto (Rachmaninov), Ein
flor tntinis 'h ts Tragodie (Zemlinsky) ou N th r (Morton eldman) - e deu espao
'a produ es cnc 'nadas de p .rus portu iu .sus 'orno ti serrana, de Alfredo *K .il (na
versao ori iinal) ou l.aurianr, d Au insto *Ma .hudo. Tiv irum lu 'ar d - d istuqu

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