A Hora Do Mercado
A Hora Do Mercado
A Hora Do Mercado
1987
SUZANNE DE BRUNHOFF:
A HORA DO MERCADO*
Gentil Corazza e urea
Breitbach'
Assim, a autora prossegue analisando o papel do crdito e a natureza do capital financeiro, partindo da crtica noo ortodoxa, resgatando as contribuies de
Marx e Hilferding e discutindo as relaes do crdito com a taxa de juros.
Em primeiro lugar, necessrio esclarecer que Brunhoff considera a moeda
como um elemento inscrito no funcionamento do modo de produo capitalista e
no adicionado de fora. Dessa forma, crdito que considerado como emprstimo destinado ao financiamento da produo capitalista supe a existncia da
moeda como padro de preos e meio de pagamento. Entretanto o crdito no se
origina da moeda, mas, sim, de "(. ) uma relao econmica particular que imbricada na circulao do capital e afeta as modalidades da acumulao" (p. 125).
O exame dos princpios da concepo ortodoxa aponta o fato de que, estabelecendo uma ciso conceituai entre o "capital real" e o "capital financeiro", os
autores enquadrados nessa concepo enfatizam a importncia do primeiro, concebendo o segundo como "capital fictcio". Consideram que existe uma taxa de juro "real" que se refere a um mercado de capital in natura, ou seja, a ativos fsicos
e ttulos (mercado de capitais). Em contrapartida, a taxa de juros bancrios considerada como um preo fictcio, pois fixada fora de um verdadeiro mercado, vindo a representar um desequilbrio em relao a este. "Isso implica que os agentes
econmicos privados dispem livremente de seus recursos, no sendo pressionados
pelo sistema bancrio, este se apresentando exterior economia" (p.l28).
Segundo a autora, essa concepo que separa nitidamente a esfera produtiva da esfera financeira no pode dar conta da tarefa de precisar a natureza do crdito como emprstimo de dinheiro, tendo sido j questionada por Keynes e Kalecki,
os quais demonstraram como o investimento gera a poupana necessria a seu prprio financiamento. Assim, a taxa de juros no o preo de equilbrio da demanda
e da oferta de capital, mas, em ltima instncia, tem a funo de contribuir para a
preservao da propriedade privada do capital, cujas fronteiras so diludas graas
circulao do crdito.
Para Brunhoff, a grande fraqueza lgica da anlise ortodoxa deve-se ao fato de
a mesma ser praticamente reduzida a uma concepo quantitativa. Nesse ponto, ela
faz referncia a uma crtica de Keynes a Marshall, segundo a qual o ponto fraco de
Marshall seria ter utilizado o conceito de juros, que faz parte de uma economia monetria, dentro d um conjunto de idias que no leva em conta a moeda.
Uma vez constatada a insuficincia da concepo ortodoxa, a autora passa a
examinar a questo fazendo uso das categorias marxistas. Ressalta ela que
"(. ..) o capital no uma coisa ou um conjunto de objetos, mesmo
quando ele aparece sob uma forma material. Ele fundamentalmente
uma relao de produo entre capitahstas e assalariados ( . . .). Esta relao social constitui a unidade da noo de capital, atravs das diversas
formas da produo e da circulao" (p.l 29).
O "capital-dinheiro" deve ser relacionado dinmica da produo do lucro. Tanto
o "capital real" como o "capital-dinheiro" se articulam no circuito do capital, sendo que o segundo abre e fecha o circuito. o "capital-dinheiro" que permite a aquisio dos equipamentos e da mo-de-obra necessrios para dar incio ao processo.
quando considera os efeitos dessa dominao, o faz como se fossem uma simples
imperfeio do mercado. Quanto expropriao, pelo jogo do mercado financeiro,
esta aparece como uma sano econmica normal. . . A concepo ortodoxa, conclui Brunhoff,
"(. . . ) incapaz de apreender a relao entre o funcionamento do mercado e as estruturas do capital. Por outro lado, a noo marxista de capital financeiro permite efetuar a anlise das relaes entre o capital
produtivo e o sistema de crdito, uma vez que ela leva em conta as particularidades do capital-dinheiro" (p.l35).
A despeito das formas diversas de manifestao da taxa de juros taxa do sistema bancrio (controlada pelo Banco Central) e taxa de juros no bancria (mercado de ttulos) , ela deve ser compreendida como categoria nica. J vimos que,
sob o ponto de vista da origem, ela derivada do lucro capitalista; porm h que se
reconhecer a diversidade de suas manifestaes.
Entre as duas manifestaes da taxa de juros, h uma relao de mercado.
Quando a taxa bancria elevada, os financistas sO incitados a aumentar o preo
do crdito. Pode-se ento falar de taxa de juros como se houvesse um mercado financeiro nico. Longe de ser auto-regulado, ele funciona de maneira tal que a centralizao operada pelo sistema bancrio atua em conjunto com as operaes financeiras privadas, descentralizadas. Entretanto essa unificao seguidamente confundida com a unidade sob a gide da taxa de juro monetria que seria imposta pela interveno do Banco Central.
A distribuio entre o lucro da empresa e a taxa de juros baseia-se nas modalidades da distribuio do "capital-dinheiro" entre capitalistas emprestadores de fundos (financistas) e tomadores (industriais). Sem a unidade do "capital-dinheiro" e a
diversidade da propriedade de fundos no possvel compreender a relao entre o
lucro e o juro.
Com isso, a autora demonstra a fragilidade dos princpios tericos do liberalismo ora em ascenso, uma vez que eles no contemplam aspectos essenciais do
funcionamento do capitahsmo, e, portanto, suas explicaes da crise resultam inconsistentes, bem como enganadoras so suas solues propostas.
O dogma do mercado livre, regulador da economia e promotor do bem-estar
social, moribundo e desacreditado nas ltimas dcadas, renasce agora com nova fora para investir contra a classe trabalhadora, contra suas organizaes e seus direitos
duramente conquistados ao longo de sua histria. Investe, tambm, contra o Estado-Providncia e suas polticas sociais, a pretexto de uma enganadora liberalizao
mdividual e social. Essa ideologia da liberdade no tem outro objetivo que garantir
os interesses do capital financeiro internacional. As polticas de austeridade conduzidas pelos governos conservadores, como os de Reagan e Thatcher dentre outros,
exigem em contrapartida um custo social sumamente elevado para serem aceitas em
silncio.
Nesse sentido, A Hora do Mercado, de Suzanne de Brunhoff, chega no momento certo, com a lucidez de sua anlise histrica e o peso de seus argumentos l-