Apostila Concurseiros
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T EORIA G E R A L D O D I R E I T O P E N A L
NOES INTRODUTRIAS. 1. Conceito de Direito Penal. 2. Nomenclatura. 3. Caractersticas do Direito Penal. 4. Relao do
Direito Penal com outros ramos do Direito. 5. Funes do Direito Penal. 6. A Cincia do Direito Penal. 7. Divises. 8. Fontes.
PRINCPIOS DO DIREITO PENAL. 1. Conceito. 2. Princpios em Espcie. EVOLUO HISTRICA. 1. O Direito Penal nos povos
primitivos. 2. Idade Antiga. 3. Idade Mdia. 4. Idade Moderna. HISTRIA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO. 1. Perodo Colonial. 2.
Cdigo Criminal do Imprio. 3. Perodo Republicano. ESCOLAS PENAIS. 1. Escola Clssica. 2. Escola Positiva. 3. Escola
Correcionalista. 4. Tecnicismo Jurdico-Penal. 5. Defesa Social. EVOLUO DOUTRINRIA DO DIREITO PENAL. 1. Positivismo
Jurdico. 2. Neokantismo Penal. 3. Garantismo Penal. 4. Funcionalismo Penal. DIREITO PENAL E A CRIMINALIDADE MODERNA.
1. Direito Intervencionista. 2. As Velocidades do Direito Penal. 3. Direito Penal do Inimigo. 4. Direito Penal como proteo dos
contextos da vida em sociedade.
NOES INTRODUTRIAS
1. CONCEITO DE DIREITO PENAL.
Direito Penal o conjunto de princpios e leis destinados a combater o crime e a contraveno penal,
mediante a imposio de sano penal.
Cuida-se de ramo do Direito Pblico, por ser composto de regras indisponveis e obrigatoriamente impostas
a todas as pessoas, cujo Estado o titular exclusivo do jus puniendi e figura como sujeito passivo nas relaes
jurdico-penais.
Sob uma viso formal, Direito Penal um conjunto de normas que qualificam certos comportamentos
humanos como infraes penais, definem seus agentes e fixam sanes a serem-lhes aplicadas. Sob um enfoque
sociolgico, o Direito Penal mais um instrumento (ao lado dos outros ramos do direito) de controle social de
comportamentos desviados, visando assegurar a necessria disciplina social[1].
2. NOMENCLATURA.
Em seara doutrinria, discute-se a terminologia mais adequada para esse ramo do Direito. Seria Direito
Penal ou Direito Criminal? Direito Penal induz ideia de pena e Direito Criminal traz tona um direito relativo ao
crime.
Os que preferem Direito Criminal alegam a insuficincia da denominao Direito Penal, uma vez que no
abrangeria a medida de segurana, espcie de sano penal; bem como seria mais coerente falar em Direito
Criminal, que enfatiza o crime e no a pena. Foi a opo do Cdigo Criminal do Imprio de 1830.
Contudo, manifesta a preferncia da doutrina por Direito Penal, notadamente diante do Decreto-Lei n
2.848 de 1940, recepcionado pela Constituio Federal de 1988 como lei ordinria, que instituiu o Cdigo Penal,
conjunto de leis que disciplina, portanto, o ramo do direito chamado Direito Penal. Ademais, a CF adotou a
expresso Direito Penal em seu artigo 22, inciso I.
3. CARACTERSTICAS DO DIREITO PENAL.
Segundo Magalhes Noronha, o Direito Penal uma cincia cultural, normativa, valorativa e finalista.
uma cincia porque suas normas e regras esto sistematizadas em princpios que compem a dogmtica
jurdico-penal.
cultural, pois pertence classe das cincias do dever-ser.
normativa porque tem como objeto o estudo do Direito Positivo, ou seja, a lei penal.
Valorativa, porque estabelece a sua prpria escala de valores, compondo hierarquicamente as suas normas.
finalista uma vez que se preocupa com a proteo de bens jurdicos fundamentais.
Alguns doutrinadores afirmam, ainda, que o Direito Penal teria como caracterstica a natureza constitutiva,
pois protege bens que avanam sobre os limites do mbito criminal, no regulados pelo direito; e
carter sancionador, pois estabelece sano pela ofensa a bens regulados por outros ramos do direito. Tambm
seria, ainda, fragmentrio, diante da manuteno somente de valores importantes para o desenvolvimento do
individuo na sociedade, no regulando por completo todos os interesses e valores.
4. RELAO DO DIREITO PENAL COM OUTROS RAMOS DO DIREITO.
Sabemos que o Direito uno, indivisvel, uma vez que a sua ramificao em reas distintas constitui mera
simplificao para fins didticos. Dessa forma, h correlao nos estudos de mbitos jurdicos diferentes,
interessando constatar alguns deles:
a) Direito Penal + Direito Processual Penal: O processo penal o instrumento adequado para o exerccio da
jurisdio do direito penal. o meio pelo qual as normas penais se concretizam em sua aplicao, incidindo, no
caso concreto, a justia das leis penais.
b) Direito Penal + Direito Constitucional: As regras e princpios constitucionais so os parmetros de
legitimidade das leis penais e delimitam o mbito de sua aplicao. O Direito Penal deve harmonizar com as
garantias estabelecidas pela Constituio Federal, estabelecendo como criminosas aquelas condutas que violam
valores constitucionalmente consagrados (teoria constitucionalista do delito).
c) Direito Penal + Direito Administrativo: o conjunto de princpios e normas que regulam a organizao e o
funcionamento da Administrao Pblica. O Direito Penal tutela esse valor estabelecendo os crimes contra a
Administrao Pblica (CP, art.s 312 e 359).
Tambm o Direito Administrativo se socorre aos conceitos de dolo e culpa do direito penal nas ocorrncias
de ilcitos administrativos.
d) Direito Penal + Direito Civil: Ntida se faz a correlao entre as doutrinas penais e civis nos casos de crimes
contra o patrimnio, em que conceitos como propriedade, posse, deteno e coisa so utilizados em comum.
Tambm os crimes contra o casamento dependem das regras de Direito de Famlia.
H uma diferena de grau e no de essncia. A gravidade do bem jurdico ferido atuar o direito, na esfera
penal ou civil, a exemplo do crime de dano (CP, art. 163), que pode ensejar sano penal, ou, se menor a
gravidade, reprimenda civil (CC, art. 186).
e) Direito Penal + Direito Internacional: Fala-se, hodiernamente, no tema Direito Penal Internacional e
em crimes internacionais, como corolrio do desenvolvimento tecnolgico e da globalizao, fatores modernos
que permitem um contato prximo e acelerado entre pessoas que esto espacialmente distantes entre si.
5. FUNES DO DIREITO PENAL.
O Direito Penal trata-se de um instrumento para a convivncia dos homens em sociedade possuindo, deste
modo, importantes funes.
a) Direito Penal como proteo de bens jurdicos: Tem a funo de proteger valores ou
interesses reconhecidos pelo Direito e imprescindveis satisfao do individuo ou da sociedade.
O legislador seleciona, em um Estado Democrtico de Direito, os bens especialmente relevantes para a vida
social e, por isso mesmo, merecedores da tutela penal.
b) Direito Penal como instrumento de controle social: Reserva ao Direito Penal o controle social ou
a preservao da paz pblica, compreendida como a ordem que deve existir em determinada coletividade.
c) Direito Penal como garantia: O Direito Penal tem a funo de garante, de escudo aos cidados, uma vez
que s h punio quando ocorre a violao de uma norma previamente determinada em lei como crime.
Por esse motivo Von Liszt dizia: O Cdigo Penal a Magna Carta do delinquente.
d) Funo tico-social do Direito Penal: Tambm conhecida como funo criadora ou configuradora dos
costumes, tem origem na estreita vinculao existente tradicionalmente entre a matria penal e os valores ticos
fundamentais de uma sociedade.
Desempenha uma funo educativa em relao aos cidados, fomentando valores tico-sociais, mesmo no
tocante a bens que ainda no tenham sido assumidos pela sociedade como fundamentais.
e) Funo simblica do Direito Penal: Essa funo inerente a todas as leis, no se limitando somente s de
cunho penal. Produz efeitos apenas na mente dos governantes e dos cidados, repassando para os primeiros a
sensao de terem feito algo para a proteo da paz pblica e aos segundos, a impresso de que o problema com a
criminalidade est sob o controle das autoridades.
Esse smbolo manifesta-se, comumente, no Direito Penal do Terror, que se verifica com a inflao
legislativa, criando figuras penais desnecessrias e exageradas, com o aumento desproporcional e injustificado das
penas (hipertrofia do Direito Penal).
f) Funo motivadora do Direito Penal: O Direito Penal motiva os indivduos a no violarem suas normas,
mediante a ameaa de imposio cogente de sano na hiptese de ser lesado ou colocado em perigo
determinado bem jurdico.
g) Funo da reduo da violncia estatal: O Direito Penal moderno apresenta uma nova funo, qual seja
reduzir ao mnimo a prpria violncia estatal j que a imposio de pena representa uma agresso aos cidados.
Desta forma, busca-se a incriminao de condutas somente nos casos estritamente necessrios, em
homenagem ao direito de liberdade constitucionalmente reservado a todas as pessoas.
h) Funo promocional do Direito Penal: O Direito Penal no deve preocupar-se em manter os valores da
sociedade em que se insere. Ao contrrio, deve ser um instrumento de transformao social, contribuindo para a
dinamizao da ordem social e promovendo as mudanas estruturais necessrias para a evoluo da comunidade.
6. A CINCIA DO DIREITO PENAL
No h um consenso na doutrina sobre o nmero e a variedade dos diversos objetos de estudo das cincias
penais. a chamada enciclopdia das cincias penais. Abordaremos, portanto, as mais importantes para provas e
concursos.
6.1. Dogmtica penal.
So os princpios e regras ordenados metodicamente pelo Direito Penal, de ordem absoluta a que se deve
vincular. Tem a misso de conhecer o sentido das normas e princpios jurdico-penais positivos e desenvolver de
modo sistemtico o contedo do Direito Penal.
A dogmtica penal a interpretao, sistematizao e aplicao lgico-racional do Direito Penal.
6.2. Poltica criminal.
Tem por objeto a apresentao de crticas e propostas para a reforma do Direito Penal em vigor. o filtro
das leis, propondo mudanas, incluses, excluses, a fim de adequar a lei realidade em que se insere, visando
atender a finalidade de justia, colaborando com a dogmtica penal.
Para Basileu Garcia, constitui uma ponte entre a teoria jurdico-penal e a realidade, ajustando o Direito
Penal aos ideais de justia, baseando-se em condies filosficas, sociolgicas e polticas para a anlise, de forma
crtica, da dinmica dos fatos social diante do sistema penal vigente.
6.3. Criminologia.
uma cincia que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vtima e do controle social do
comportamento delitivo. Ocupa-se das circunstncias humanas e sociais relacionadas com o surgimento, a prtica
e a maneira de evitar o crime, assim como do tratamento aos criminosos.
Preocupa-se com os aspectos sintomticos, individuais e sociais do delito propriamente dito e da
criminalidade, em seu contexto social.
[1] Pelo enfoque sociolgico, percebe-se o nascimento de uma busca pela real funo do Direito Penal. Surge ento o
funcionalismo, que busca o real desempenho do Direito Penal. Dentro do funcionalismo, surge o funcionalismo teleolgico
(para esses estudiosos, o fim do Direito Penal assegurar bens jurdicos, valendo-se das medidas de poltica criminal Claus
Roxin) e o funcionalismo sistmico (a misso do Direito Penal resguardar a norma, o sistema, o direito posto, atrelado aos
fins da pena Gnter Jakobs).
Divises do Direito Penal
7. DIVISES DO DIREITO PENAL
7.1. Direito Penal Fundamental.
composto pelas normas da parte geral do Cdigo Penal e, excepcionalmente, por algumas de amplo
contedo, previstas na parte especial, englobando o conjunto de normas e princpios gerais aplicveis, inclusive s
leis penais especiais, v.g., CP, art. 327.
7.2. Direito Penal Complementar.
o conjunto de normas que integram o acervo da legislao penal extravagante, a exemplo da Lei de
Tortura (Lei 9.455/97).
7.3. Direito Penal Comum.
Aplica-se indistintamente a todas as pessoas. o caso do Cdigo Penal e de diversas leis penais especiais
como o Decreto-Lei 3.688/1941 (Lei de Contravenes Penais), etc.
7.4. Direito Penal Especial.
Aplica-se apenas s pessoas que preencham certas condies legalmente exigidas a exemplo do Cdigo
Penal Militar (Decreto-Lei 1.001/1969), etc.
7.5. Direito Penal Geral.
Tem incidncia em todo o territrio nacional. o direito produzido pela Unio, ente federativo com
competncia legislativa para tanto (CF, art. 22, I)
7.6. Direito Penal Local.
Aplica-se somente a parte delimitada do territrio nacional. o Direito Penal elaborado pelos Estados-
membros, desde que autorizados por lei complementar a legislar sobre questes especificas (CF, art. 22, pargrafo
nico).
7.7. Direito Penal Objetivo.
o conjunto de leis penais em vigor, ou seja, todas as j produzidas e ainda no revogadas.
7.8. Direito Penal Subjetivo.
o direito de punir (jus puniendi) exclusivo[1] do Estado, o qual nasce no momento em que violado o
contedo da lei penal incriminadora. um direito condicionado, como limitao temporal, espacial e modal.
7.9. Direito Penal Material.
Tambm conhecido como Direito Penal Substantivo, por ele se entende a totalidade de leis penais em
vigor. o Direito Penal propriamente dito.
7.10. Direito Penal Formal.
Denominado tambm de Direito Penal Adjetivo, o grupo de leis processuais penais em vigor. o Direito
Processual Penal propriamente dito.
8. FONTES DO DIREITO PENAL
No Direito Penal, fonte representa no s a origem, mas tambm a forma de manifestao da lei penal. Por
isso, so dividas em fontes formais e materiais.
8.1. Fontes materiais (substanciais ou de produo).
o rgo constitucionalmente encarregado de elaborar o Direito penal, ou seja, a Unio, nos moldes da CF,
art. 22, I.
Excepcionalmente, os Estados-membros tambm podem produzir Direito Penal em questes especficas (CF,
art. 22, pargrafo nico) desde que autorizados por lei complementar.
8.2. Fontes formais (cognitivas ou de conhecimento).
o modo pelo qual o Direito Penal se revela. Subdivide-se em:
a) Fonte formal Imediata (ou primria): a lei. A regra escrita e concretizada pelo Poder Legislativo em
consonncia com a forma determinada pela Constituio Federal.
b) Fonte formal Mediata (ou Secundria): so os costumes, os princpios gerais do Direito e os atos
administrativos.
Os costumes so reiteraes de condutas, de modo constante e uniforme, por fora da convico de sua
obrigatoriedade. O que o diferencia do hbito a obrigatoriedade. Os costumes podem ser secundum legem (ou
interpretativo), quando auxiliam o intrprete a esclarecer o contedo de elementos e circunstncias do tipo
penal; contra legem (ou negativo), quando contraria a lei, mas no tem o condo de revog-la[2]; praeter
legem (integrativo), que supre a lacuna da lei e somente pode ser utilizado na seara das normas penais no-
incriminadoras. Possvel se mostra o uso do costume segundo a lei, atuando dentro dos limites do tipo penal
(costume interpretativo).
Os princpios gerais do direito so os valores fundamentais que inspiram a elaborao e a preservao do
ordenamento jurdico.
Os atos da Administrao Pblica, em sede de Direito Penal, funcionam como complemento de algumas leis
penais em branco.
H entendimentos na doutrina que aceitam como parte integrante das fontes formais mediatas a doutrina,
a jurisprudncia e os tratados internacionais. Contudo, cabem aqui algumas observaes.
A doutrina um estudo cientfico no revestido de obrigatoriedade, realizado por juristas e estudiosos do
Direito, analisando e compondo conceitos acerca das normas.
A jurisprudncia revela o entendimento dos tribunais, servindo como vetor de aplicao do direito. No tem
natureza cogente (salvo em caso de smula vinculante).
Por fim, tratados internacionais so normas externas a que o Brasil adere, ratificando e introduzindo-os em
nosso ordenamento jurdico. Dependendo da matria a que se referem, podem ingressar no direito positivo como
legislao ordinria ou de emenda constitucional (incluindo necessidade de qurum de aprovao diferenciado).
[1] Apesar de ser um direito exclusivo do Estado, h um caso (Lei 6.001/73, art. 57) no Estatuto do ndio, onde o Estado
permite a aplicao de sano penal pelos grupos tribais com suas prprias instituies.
[2] Exemplo do Jogo do Bicho, contraveno penal definida pelo Decreto-Lei 3.688/1941. O STJ j decidiu pela impossibilidade
de absolvio em razo do costume, tendo em vista que uma lei s pode ser revogada por outra lei (LICC, art. 2, 1) REsp.
30.705/SP.
H uma corrente na doutrina que defende a possibilidade de costume abolicionista desde que a norma perca sua eficcia
social. Uma segunda corrente entende que no existe costume abolicionista, porm a norma deixa de ser aplicada quando
perde a sua eficcia social. J uma terceira corrente entende que uma lei s pode ser revogada por outra lei (LICC). A terceira
prevalece.
PRINCPIOS DO DIREITO PENAL
1. CONCEITO
Princpios so valores fundamentais que inspiram a criao e a manuteno do sistema jurdico.
No Direito Penal, os princpios tm a funo de orientar o legislador ordinrio com o intuito de limitar o
poder punitivo estatal mediante a imposio de garantias aos cidados. Trata-se da funo de garantia do Direito
Penal.
A quantidade e denominao dos princpios tem uma variao enorme dentro da doutrina. Calha anotar aqui
os mais conhecidos, abarcados pela maioria e de maior incidncia em concursos pblicos.
2. PRINCPIOS EM ESPCIE.
2.1. Princpio da Reserva Legal ou da Estrita Legalidade.
Seu mais seguro antecedente histrico a Magna Carta de Joo Sem Terra, em 1215, ao estabelecer, em seu
art. 39, que nenhum homem livre poderia ser submetido pena sem prvia lei em vigor naquela terra.
Encontra-se previsto na Constituio Federal, art. 5, XXXIX, bem como no Cdigo Penal, em seu artigo 1.
Trata-se de clusula ptrea.
Preceitua a exclusividade da lei para a criao de delitos e penas, estabelecida no brocardo nullum crimen
nulla poena sine lege. Somente a lei pode criar penas[1], abrangendo tambm as contravenes penais, posto que
a palavra crime foi utilizada no sentido genrico.
2.2. Princpio da Anterioridade.
Tambm decorre da Constituio Federal, art. 5, XXXIX e do Cdigo Penal, art. 1. A lei previamente deve
estabelecer quais os comportamentos que sero considerados infraes legais e cominar penas para tais
comportamentos.
Materializa-se com a vacatio legis, que probe a aplicao da norma inclusive durante esse perodo.
2.3. Princpio da Insignificncia ou Criminalidade de Bagatela.
Surgiu no Direito Civil, no axioma minimus non curat praetor. Em outras palavras, o Direito Penal no deve se
ocupar de assuntos irrelevantes, incapazes de lesar o bem jurdico.
Funciona como causa de extino da tipicidade, desempenhando uma interpretao restritiva do tipo
penal, observando-se que h, no caso, uma adequao da conduta praticada lei penal incriminadora, mas no
existe, no entanto, a capacidade de leso ao bem jurdico tutelado pela norma.
Entendimento adotado pelo STJ e STF considera para a tipicidade quatro requisitos: (a) ofensividade da
conduta do agente; (b) periculosidade social da ao; (c) grau de reprovabilidade do comportamento; e (d)
expressividade da leso jurdica provocada. Segundo o STF, todos eles inexistentes no crime de bagatela.
O STF aceita a incidncia desse princpio nos crimes e contravenes penais cometidos por crianas e
adolescentes (atos infracionais), nos termos da Lei 8.069/90 (ECA), art. 103.
Esse princpio tem aplicao a qualquer espcie de delito que com ele seja compatvel e no apenas aos
crimes contra o patrimnio, a exemplo de um crime de peculato-apropriao de um clipe de metal ou uma folha de
papel. No admitido, contudo,nos crimes praticados com violncia ou grave ameaa, bem como no se aplica
aos delitos previstos na Lei de Drogas (Lei 11.343/06)[2].
2.4. Princpio da Individualizao da Pena.
Expressamente indicado pela Constituio Federal, art. 5, XLVI, repousa na idia de que se deve distribuir a
cada individuo o que lhe cabe de acordo com o seu comportamento.
Esse princpio se desenvolve em trs planos: no prisma legislativo respeitado quando o legislador descreve
o tipo penal e estabelece as sanes adequadas, indicando seus limites e as circunstncias de aumento e
diminuio. O plano judicial complementa o legislativo, efetivando-se na aplicao da lei ao caso concreto pelo
juiz. A individualizao administrativa efetuada durante a execuo da pena, quando o Estado deve zelar por
cada condenado de forma singular mediante tratamento penitencirio de acordo com as finalidades da pena.
2.5. Princpio da Alteridade.
Criado por Claus Roxin, probe a incriminao de atitude meramente interna do agente. A leso deve passar
da espera pessoal do agente e ser capaz de, ao menos, expor a perigo o bem jurdico tutelado pela norma penal.
Esse princpio justifica a ausncia de punio no crime da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas) em seu art. 28, diante
da atipicidade do consumo de drogas posto que o objeto jurdico da lei a sade pblica.
2.6. Princpio da Confiana.
Trata-se de requisito para a existncia do fato tpico e baseia-se na idia de que todos devem esperar por
parte das demais pessoas comportamentos responsveis e em consonncia com o ordenamento jurdico,
almejando evitar danos a terceiros, levando-se em conta as regras da experincia.
2.7. Princpio da Adequao Social.
De acordo com esse princpio, no pode ser considerado criminoso o comportamento humano que, embora
tipificado em lei, no afronte o sentimento social de justia.
Calha ressaltar que a autorizao legal para o exerccio de determinada profisso no implica no
reconhecimento de que comportamentos estabelecidos como crimes sejam socialmente aceitveis, a exemplo da
lei que regulamenta a atividade de camel e os possveis delitos de descaminho praticados.
2.8. Princpio da Interveno Mnima.
Tambm chamado princpio da necessidade, est estabelecido na Declarao dos Direitos do Homem e do
Cidado, de 1789, em seu art. 8.[3] Afirma que a interveno penal que criminaliza um fato somente se justifica
quando meio indispensvel para a proteo de determinado bem ou interesse.
DDHC. Art. 8. A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessrias e ningum pode ser
punido seno por fora de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada.
Esse princpio ampara a corrente do Direito Penal Mnimo. Decorrem dele outros dois: fragmentariedade e
subsidiariedade.
a) Princpio da Fragmentariedade: Estabelece que nem todos os ilcitos configuram infraes penais, mas
apenas os que atentam contra valores fundamentais para a manuteno e o progresso do ser humano e da
sociedade. Em suma, todo ilcito penal ser ilcito tambm para todos os ramos do direito, mas a recproca no
verdadeira. Projeta-se num plano abstrato, balizando a criao de tipos penais, somente quando os outros ramos
do direito tiverem falhado na tarefa de proteo ao bem jurdico.
b) Princpio da Subsidiariedade: Preceitua a atuao do Direito Penal quando os outros ramos do Direito e os
demais meios estatais de controle social tiveram se revelado impotentes para o controle da ordem pblica. Assim,
o Direito Penal funciona como umexecutor de reserva, como a ultima ratio. Projeta-se no plano concreto de
atuao prtica e aplicao do Direito Penal.
2.9. Princpio da Proporcionalidade.
Constitui-se na idia de que a limitao da liberdade individual imposta pela pena s se justifica para a
concretizao de interesses coletivos superiores. Funciona como uma forte barreira impondo limites ao legislador,
sendo suficiente apenas apenar para que a lei pena possa ser eficaz na tutela do bem jurdico.
2.10. Princpio da Humanidade.
Apregoa a inconstitucionalidade da criao de tipo penal ou a cominao de penas que violam a
incolumidade fsica ou moral de algum.
Decorre da dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituio Federal, em seu art. 1, III, como
fundamento da Repblica Federativa do Brasil.
2.11. Princpio da Ofensividade ou da Lesividade.
No h infrao penal quando a conduta no tiver oferecido ao menos perigo de leso ao bem jurdico
tutelado.
2.12. Princpio da Exclusiva Proteo do Bem Jurdico Tutelado.
Veda ao Direito Penal a preocupao com as intenes e os pensamentos das pessoas, seu modo de viver ou
pensar, enquanto no exteriorizada a atividade delitiva. Destina-se, exclusivamente, tutela dos bens jurdicos
fundamentais para a preservao da sociedade e o desenvolvimento do individuo e da sociedade.
2.13. Princpio da Imputao Pessoal.
O Direito Penal no pode castigar um fato cometido por agente que atue sem culpabilidade. No se admite a
punio em casos de inimputabilidade, no conscincia da ilicitude ou casos de inexigibilidade de conduta diversa.
O fundamento da responsabilidade penal pessoal a culpabilidade (nulla poena sine culpa).
2.14. Princpio da Responsabilidade pelo Fato.
O Direito Penal deve tipificar fatos, associando-lhe as penas respectivas, e no estereotipar autores em razo
de alguma condio especfica.
No se admite um Direito Penal do autor, mas somente um Direito Penal do fato.[4]
2.15. Princpio da Personalidade ou da Intranscendncia.
Ningum pode ser responsabilizado por fato cometido por outrem. E, conseqentemente, a pena no pode
passar da pessoa do condenado (CF, art. 5, XLV).
2.16. Princpio da Responsabilidade Penal Subjetiva.
Nenhum resultado penalmente relevante pode ser atribudo a quem no o tenha produzido por dolo ou
culpa. A disposio do Cdigo Penal exclui a responsabilidade penal objetiva (CP, art. 19).
A doutrina aponta alguns vestgios da responsabilidade objetiva em duas situaes no ordenamento penal
brasileiro: rixa qualificada[5] e punio da embriaguez voluntria ou culposa, decorrente da actio libera in causa[6].
2.17. Princpio do Non Bis in Idem.
No se admite, em hiptese alguma, a dupla punio pelo mesmo fato. Com base nesse princpio, o STJ
editou a smula 241.
STJ. Smula 241. A reincidncia penal no pode ser considerada como circunstncia
agravante e, simultaneamente, como circunstncia judicial.
No incorre em "bis in idem" a existncia de duas ou mais aes penais em searas judiciais diversas.
2.18. Princpio da Isonomia.
Tambm conhecido como princpio da igualdade, consagrou-se na obrigao de tratar igualmente os iguais
e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades.
[1] Nos termos da CF, art. 62, I, a, vedada a edio de medidas provisrias sobre matria penal.
[2] Em um caso isolado, o STF admitiu a aplicao desse princpio envolvendo drogas e um militar HC 92.961.
[3] Inspirada na Revoluo Americana (1776) e nas ideias filosficas do Iluminismo, a Assembleia Nacional Constituinte da
Frana Revolucionria aprovou em 26 de agosto de 1789 e votou definitivamente em 2 de outubro a Declarao dos Direitos
do Homem e do Cidado, sintetizando em dezessete artigos e um prembulo os ideais libertrios e liberais da primeira fase da
Revoluo Francesa.
[4] Historicamente pode ser lembrado o Direito Penal do Autor a Alemanha Nazista, onde no existiam crimes, mas
criminosos. Em tempos atuais ele guarda sintonia com o Direito Penal do Inimigo.
[5] Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores:
Pena - deteno, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Pargrafo nico - Se ocorre morte ou leso corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participao na rixa, a pena de
deteno, de seis meses a dois anos.
[6] Art. 28 - No excluem a imputabilidade penal:
II - a embriaguez, voluntria ou culposa, pelo lcool ou substncia de efeitos anlogos.
EVOLUO HISTRICA
1. O DIREITO PENAL NOS POVOS PRIMITIVOS.
Pode-se afirmar que a histria do Direito Penal se confunde com a histria da humanidade. Em todos os
tempos, vislumbra-se a ingerncia da pena na esfera do poder e da vontade do indivduo que ofendeu a esfera de
poder e vontade de outrem.
A pena um fato histrico e primitivo, bem como a vingana penal no se trata de uma progresso
sistemtica, mas algo natural que foi se desenvolvendo par atender as necessidades de cada poca. Assim, divide-
se a histria em trs perodos, representados pelas fases da vingana divina, vingana privada e vingana pblica.
1.1. Vingana Divina.
O homem primitivo regulava suas condutas no temor religioso ou mgico, com culto aos antepassados,
cumpridores das normas. Essa viso era nutrida por totens e tabus[1], que marcavam presena nas modalidades da
pena, com ntido carter expiatrio.
Como a lei tinha origem divina, as penas serviam exclusivamente como forma de desagravar a divindade,
punindo-se o infrator para purgar as impurezas do delito trazido ao seu grupo.
s vezes, expulsavam o infrator do grupo a que pertencia (perda da paz), perdendo a proteo e lanado
prpria sorte. Em outras, o castigo consistia no sacrifcio da prpria vida, cuja violncia com que era realizado
deveria estar em consonncia com a grandeza do deus ofendido.
1.2. Vingana Privada.
Posteriormente, em decorrncia do crescimento dos povos e da complexidade social, surge a vingana
privada. Era uma vingana entre grupos, eis que encaravam a infrao como uma ofensa ao grupo a que
pertenciam.
O homem primitivo tinha forte lao com a comunidade e, fora dela, sentia-se desprotegido. Destarte,
imperava a lei do mais forte, a vingana de sangue, em que o grupo do ofendido fazia justia com as prprias
mos contra o grupo do ofensor, ocasionando, na maioria das vezes, excessos e crueldades desproporcionais,
disseminando o dio e a guerra interminvel entre os grupos, culminando, muitas vezes, na extino completa das
tribos.
Para se evitar a dizimao dos grupos, surge a Lei de Talio, como primeira manifestao do princpio da
proporcionalidade e tentativa de humanizao da sano penal.
xodo, 21, 23-25.
23
Mas se houver morte, ento dars vida por vida,
24
Olho por olho, dente por dente, mo
por mo, p por p,
25
Queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe.
Foi acolhida pela Lei das XII Tbuas (romanos), pelo xodo (hebreus) e pelo Cdigo de Hamurabi (Babilnia).
Com o passar do tempo, diante do elevado nmero de infratores, as populaes comearam a
ficar deformadas, motivo pelo qual se evoluiu para o sistema da composio, que se tratava de uma forma de
conciliao entre ofensor e ofendido, pela prestao pecuniria como meio de reparao do dano.
1.3. Vingana Pblica.
Com a evoluo poltica da sociedade e melhor organizao comunitria, o Estado avocou o poder-dever de
manter a ordem e a segurana social, conferindo a seus agentes a autoridade de punir em nome de seus sditos. A
pena assume um carter pblico.
A pena, ainda dominada pela crueldade e desumanidade, garantia a fora do soberano que decidia,
impessoalmente, sobre as infraes. Destacavam-se o esquartejamento, a decapitao, a forca, castigos corporais,
amputaes, entre outras penas.
2. IDADE ANTIGA
2.1. Direito Penal Grego.
Na Grcia Antiga, em seus primrdios, o crime e a pena se inspiravam no sentimento religioso. Governava-se
em nome de Zeus.
A civilizao grega produziu filsofos, historiadores, escritores e grandes pensadores. Com a cincia poltica,
iniciaram-se grandes discusses sobre poltica, tica, liberdade e justia, bem como o direito de punir e a finalidade
da pena.
Toda a questo da vida girava em torno da sociedade. O homem no era considerado como indivduo, mas
como parte do meio social em que estava. A prpria democracia estava ligada integrao do homem com o
Estado.
Em Atenas, as penas passaram a ser dotadas de certas doses de humanidade. Comeou-se a pensar no
desenvolvimento da sociedade, e no propriamente no acusado.
2.2. Direito Penal Romano.
A histria do direito romano percorreu 22 sculos (de 753 a.C. a 1453 d.C.), passando por grandes
transformaes.
Em matria penal, o poder dos magistrados era intitulado coercitio, totalmente discricionrio, limitado
apenas pela apelao popular, direito do cidado romano. Face essa possibilidade, as decises passaram a ser
fundamentadas, proporcionando maior segurana jurdica aos cidados.
Com a Lei das XII Tbuas, o direito romano passou por um perodo de laicizao, deixando a lei de ser
mensagem dos deuses, prevalecendo o sufrgio popular.
Com o Cristianismo, houve maior percepo da importncia pelo respeito aos direitos fundamentais do
homem, que passou a ser visto como imagem e semelhana de Deus.
Em Roma, surgiu a primeira distino entre crimes pblicos (envolviam a traio e conspirao poltica contra
o Estado e o assassinato) e crimes privados (todos os demais crimes critrio residual).
Ao final da repblica, foram publicadas as leges coneliae e juliae, catalogando os comportamentos
criminosos, sendo uma primeira manifestao do princpio da reserva legal.
3. IDADE MDIA
3.1. Direito Penal Germnico.
Caracterizava-se como direito consuetudinrio, no possuindo leis escritas. Era uma ordem de paz. Se a
transgresso possusse carter pblico, impunha-se a perda da paz (ausncia de proteo jurdica, podendo ser
morto por qualquer pessoa); se possusse carter privado, o infrator era entregue vitima ou seus familiares para
o direito de vingana.
Mais tarde, influenciado pelo direito romano e pelo Cristianismo, o direito germnico adotou a Lei de Talio
e a composio, criando-se, posteriormente, o sistema da composio pecuniria.
Foi marcado tambm pelas ordlias ou juzos de deus, como meios de prova, caracterizados por supersties
e atos cruis.
3.2. Direito Penal Cannico.
o ordenamento da Igreja Catlica Apostlica Romana. A primeira consolidao de suas normas e regras se
deu em 1140, por decreto de Graciano.
Tinha, inicialmente, carter meramente disciplinar para com seus membros. Com o crescimento da Igreja e
enfraquecimento do Estado, estendeu-se a religiosos e leigos, desde que os fatos tivessem conotao religiosa.
Serviu-se do procedimento de inquisio.
A pena, no obstante o carter retributivo que predominava poca, tinha a finalidade de recuperao do
criminoso, objetivando o seu arrependimento perante a divindade.
Contribui com a histria do direito penal no surgimento da priso moderna, no tocante reforma do
criminoso. Do vocbulo penitncia deriva o termo penitenciria. O crcere era uma forma de, pelo sofrimento e
solido, expurgar a alma do criminoso diante de Deus.
4. IDADE MODERNA
4.1. Perodo Humanitrio.
Sob o influxo do iluminismo no sculo XVIII, a sociedade se voltava contra as barbries do absolutismo
(poder absoluto do Estado), que impunha atos de punio crudelssimos e arbitrrios. Os espritos dos indivduos
preparam-se para a ecloso da Revoluo Francesa.
Em 1764, Cesare Bonesana, Marqus de Beccaria, publica a famosa obra Dei delitti e delle pene, que abre
caminho ao movimento da Escola Clssica.
Baseia o seu pensamento no contrato social de Rousseau, onde o infrator um violador do pacto social,
sendo considerado adversrio da sociedade. A pena perdia o seu carter religioso.
Surge a questo do livre-arbtrio, pois o homem pratica o delito consciente da violao e da reprovao social
sobre seus atos. Destarte, a pena passa a ser analisada sobre a necessidade de seu prvio estabelecimento, para
que todos possam escolher o caminho a trilhar, devendo ainda, alm de anterior, guardar proporcionalidade com o
ato violador.
Conclui a ideia de que a pena deveria ser essencialmente pblica, rpida, necessria, mnima, proporcional
aos delitos e ditadas pelas leis.
[1] Os totens assumiam as mais variadas formas de animais, vegetais ou qualquer outro objeto considerado como ancestral ou
smbolo de coletividade. Os tabus consistiam na proibio dos profanos de se relacionarem com pessoas, objetos ou lugares
determinados, ou deles se aproximarem, em virtude do carter sagrado que possuam.
A HISTRIA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO
1. PERODO COLONIAL.
Antes do descobrimento do Brasil, enquanto dominava a civilizao primitiva, adotava-se a vingana privada.
Informam os historiadores que os silvcolas conheciam o sistema de Talio bem como a composio e a expulso
da tribo (perda da paz).
Predominavam as penas corporais, com regras consuetudinrias, comuns ao mnimo convvio social, quase
sempre dominadas pelo misticismo.
Com o descobrimento do Brasil, em 1500, passou a vigorar o Direito Lusitano, aplicando-se, sucessivamente:
a) Ordenaes Afonsinas: promulgadas em 1146 por D. Afonso V, vigoraram at 1514, com contedos do
Direito Romano de Justiniano e do Direito Cannico. Marcadas pela crueldade das penas, predominando a
arbitrariedade dos juzes em sua fixao.
b) Ordenaes Manuelinas: editadas em 1514 por D. Manuel, o Venturoso. Pouco se diferenciavam das
Ordenaes Afonsinas. Ainda correspondiam fase da vingana pblica.
O direito era aplicado pelos donatrios respectivos das capitanias hereditrias.
c) Ordenaes Filipinas: datadas de 1603, por medida do Rei Filipe II, mantiveram as ordenaes anteriores.
Foi sob a gide desse ordenamento que Tiradentes[1] foi executado, estendendo as conseqncias penais de
seu comportamento tambm a seus descendentes.
Todas as ordenaes, marcadas pela fase da vingana pblica, orientavam-se no sentido de uma ampla e
generalizada criminalizao, com severas punies, as quais objetivavam infundir o temor.
2. CDIGO CRIMINAL DO IMPRIO
A Constituio Federal de 1824 determinou a urgente e necessria elaborao de um Cdigo Criminal,
fundado nas slidas bases da justia e equidade.
Em 1827, Bernardo Pereira apresentou o seu projeto, que foi sancionada em 1830 pelo Imperador D. Pedro
I. Surgia o Cdigo Criminal do Imprio.
Com a elaborao desses dois ordenamentos, o Direito Penal deu ntidos sinais de evoluo em prol da
humanizao das penas.
Dispunha sobre a vedao dos aoites, tortura, marca de ferro quente e todas as penas cruis (art. 179, XIX),
bem como manifestava a necessidade da pena atingir somente o causador da infrao penal (art. 179, XX). Seria a
primeira manifestao do princpio da personalidade da pena no Brasil. Contudo, ainda sobreviviam as penas de
morte na forca, trabalhos forados, banimento.
Entre as inovaes, consagrou a instituio do sistema do dia-multa, em seu art. 55.
3. PERODO REPUBLICANO
Com o advento da repblica, Joo Baptista Pereira foi encarregado de elaborar um projeto de Cdigo Penal,
que foi aprovado em 1890. Seus equvocos e deficincias o tornaram uma colcha de retalhos, com inmeras leis
extravagantes para suprir suas lacunas. Tantas eram as leis esparsas que, em 1932, concentraram-nas
na Consolidao das Leis Penais, de Vicente Piragibe.
Durante o Estado Novo, em 1937, Alcntara Machado apresentou um projeto de Cdigo Penal Brasileiro,
que foi sancionado pelo Decreto-Lei n 2.848 de 07 de dezembro de 1940, vigorando desde 1942 at os dias
atuais.
Em 1977 houve uma atualizao das sanes penais, e, em 1984, uma reforma da parte geral, que
humanizou as sanes, adotou penas alternativas priso e reintroduziu o sistema de dias-multa.
Em 1969 o projeto de Nelson Hungria foi aprovado para a criao de um novo Cdigo Penal, contudo,
revogado ainda em vacatio legis.
[1] Joaquim Jos da Silva Xavier, o Tiradentes foi um dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista poltico que
atuou no Brasil colonial, mais especificamente nas capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro. No Brasil, reconhecido como
mrtir da Inconfidncia Mineira, que foi uma tentativa de revolta de natureza separatista abortada pela Coroa portuguesa em
1789, na ento capitania de Minas Gerais, contra, entre outros motivos, a execuo da derrama e o domnio portugus.
ESCOLAS PENAIS
1. ESCOLA CLSSICA
A nomenclatura clssica foi desenvolvida pejorativamente pelos positivistas, em face da divergncia de
pensamentos sobre os conceitos estruturais do Direito Penal.
Nasceu entre o final do sc. XVIII e a metade do sc. XIX como reao ao totalitarismo do Estado
Absolutista, filiando-se ao iluminismo.
Com fundamentos de Beccaria e Francesco Carrara, utilizavam o mtodo racionalista dedutivo (lgico) e
eram, em regra, jusnaturalistas, ou seja, aceitavam que as normas absolutas e naturais prevaleciam sobre o direito
posto.
Basicamente, suas notas fundamentais eram ter o crime como um conceito meramente jurdico, o
predomnio da concepo do livre-arbtrio e a pena como forma de retribuio pelo crime.
2. ESCOLA POSITIVA
Embora a Escola Clssica houvesse conseguido enfrentar com xito as barbries do absolutismo, os
ambientes poltico e filosfico, em meados do sc. XIX, revelavam grande preocupao com a luta contra
a crescente criminalidade. Surgia a necessidade de estudos biolgicos e sociolgicos de acordo com as doutrinas
evolucionistas de Darwin.
Nasce, ento, a Escola Positiva, tambm denominada Positivismo Criminolgico, despontando Cesar
Lombroso, Enrico Ferri e Rafael Garofalo, os trs mosqueteiros, com seu mtodo positivo criminolgico.
Cesare Lombroso iniciou a fase antropolgica, com a aplicao do mtodo experimental no estudo da
criminalidade e a teoria do criminoso nato.
Enrico Ferri empunha a bandeira da fase sociolgica, contribuindo com a defesa da tese negativa do livre-
arbtrio, fundamentando a responsabilidade penal na responsabilidade social. A pena surge como mecanismo de
defesa social interna.
Finalmente, Rafael Garofalo o baluarte da fase jurdica, imortalizando a expresso criminologia, criando o
conceito de delito natural. Influenciado pela teoria da seleo natural e dando relevo ao determinismo.
3. ESCOLA CORRECIONALISTA
Tambm chamada de Correcionalismo Penal, surgiu na Alemanha, em 1839, com Karl David August Reder.
Surgiu de forma inovadora e revolucionria, afirmando que a pena tem a finalidade de corrigir a injusta e
perversa vontade do criminoso e, assim, no pode ser fixa e determinada. A pena deve ser indeterminada e
passvel de cessao somente quando tornar-se prescindvel.
O fim da pena seria a preveno especial. O direito de punir os delitos deveria ser utilizado pelo Estado com
fins teraputicos, reprimindo e curando.
Atualmente, Luis Jimnez de Asa, o maior entusiasta dessa Escola, defende a ideia de ressocializao como
finalidade precpua do Direito Penal.
4. TECNICISMO JURDICO-PENAL
Iniciou-se na Itlia, com Arturo Rocco delimitando o estudo do Direito Penal como positivo, restrito s leis
vigentes, dele abstraindo o contedo causal-explicativo inerente antropologia, sociologia e filosofia. O jurista
deve valer-se da exegese para concentrar-se no estudo do direito positivo.
Numa segunda etapa, mais moderna, o tecnicismo jurdico, liderado por Maggiore, Bettiol e Battaglini,
acabou acolhendo a existncia do direito natural, admitindo o livre-arbtrio como fundamento do direito positivo,
voltando a pena a ter carter retributivo.
No estudo do direto penal, trs ordens de pesquisa existem: exegese, limitada ao aspecto gramatical,
buscando o alcance e vontade da lei; dogmtica, sistematizao dos princpios fundamentais como critrios para
integrao e criao do direito; e crtica, estuda o direito penal como ele deveria ser, buscando sua construo e
propondo reformas.
5. A DEFESA SOCIAL.
Surgiu no incio do sc. XX, em decorrncia dos pensamentos da Escola Positiva, contudo, com ela no se
confunde, pois, trata-se de uma reao anticlssica, reforada pelas idias dos representantes do positivismo:
Lombroso, Ferri e Garofalo. Era um momento de defesa da sociedade. O combate criminalidade tornara-se a
principal finalidade do direito penal.
Com o surgimento da Unio Internacional de Direito Penal, fundada por Von Liszt, Van Hamel e Adolphe
Prins, seus estudos consolidados por Fillipo Gramtica e Marc Ancel, via a luta contra a criminalidade como um
fenmeno social, substituindo-se a responsabilidade moral pela periculosidade do delinquente.
Aumentavam-se, frequentemente, as penas indeterminadas e as medidas de segurana, as quais subsistiam
enquanto durar a periculosidade do criminoso.
J no perodo entre as duas grandes guerras mundiais, desenvolveu-se a profilaxia criminal, baseada na
assistncia educativa e organizao de preveno, calcada no estudo completo da personalidade do delinquente,
no se esquecendo do respeito pela pessoa humana. Inicia-se uma nova fase, com a preveno do crime, o
tratamento do menor delinquente e a reforma penitenciria.
Para Gramtica, a defesa social tinha o objetivo de aprimorar o Estado, inclusive a sua defesa, sendo que o
Estado no deveria punir, pois sua funo era melhorar o indivduo. A causa do delito estaria na organizao social.
Para ele, os crceres so inteis, devendo ser abolidos, e a pena deveria ser dosada com base na personalidade, e
no no dano.
EVOLUO DOUTRINRIA DO DIREITO PENAL
1. POSITIVISMO JURDICO.
De origem alem, os estudos de Karl Binding, na dcada de 70 do sc. XIX, tinham ntida preferncia pela
cientificidade, excluindo os juzos de valor e limitando o objeto do direito positivo. Deve-se a esta teoria o conceito
clssico de delito, sem qualquer influencia filosfica, psicolgica ou sociolgica.
Constitua-se em posio extremamente normativista e formal, assim justificada pelos seus partidrios por
respeitar excessivamente o princpio da legalidade e a segurana jurdica.
2. NEOKANTISMO PENAL.
Surgiu no final do sc. XIX, atravs de Rudolf Stammler e Gustav Radbruch, propondo um conceito que
supervaloriza o dever-ser, mediante a introduo de consideraes axiolgicas.
Essa teoria permitiu graduar o injusto de acordo com a gravidade da leso produzida, incluindo elementos
normativos e subjetivos nos tipos penais.
Por fim, adotou-se a teoria psicolgico-normativa, revestindo a culpabilidade pelo juzo de reprovabilidade.
3. GARANTISMO PENAL.
Atravs de Luigi Ferrajoli, com a obra "Direito e razo", entende-se o garantismo penal um modelo universal
destinado a contribuir com a moderna crise que assola os sistemas penais, desde o nascedouro da lei at o final do
cumprimento da sano penal.
Esse sistema, tambm chamado de cognitivo ou de legalidade estrita, assenta dez axiomas, como forma de
garantia, impondo um modelo-limite, de ndole penal e processual penal, irradiando reflexos em todo o sistema:
Nulla poena sine crimine (princpio da retributividade ou da conseqncia da pena em relao ao delito);
nullum crimen sine lege (princpio da reserva legal); nulla Lex (poenalis) sine necessitate (princpio da necessidade
ou da economia do direito penal); nulla necessitas sine injuria (princpio lesividade ou ofensividade); nulla injuria
sine actione (princpio materialidade ou exterioridade da ao); nulla actio sine culpa (princpio da culpabilidade ou
responsabilidade pessoal); nulla culpa sine judicio (princpio da jurisdicionalidade); nullum judicium sine
accusatione (princpio acusatrio ou da separao entre juiz e acusao); nulla accusatio sine probatione (princpio
do nus da prova ou da verificao); nulla probatio sine defensione (princpio do contraditrio e ampla defesa ou
da falseabilidade).
4. FUNCIONALISMO PENAL.
Iniciou-se na Alemanha, em 1970, com uma forte revoluo dos penalistas, com o intuito de submeter a
dogmtica penal aos seus fins especficos.
Pretendia abandonar o tecnicismo jurdico no enfoque da adequao tpica, desempenhando uma efetiva
funo de mantenedor da paz social e aplicador da poltica criminal, em suma: funcional.
O intrprete da lei deve desempenhar seu papel de forma mxima, almejando a real vontade da lei. Contudo,
essa teoria apresenta duas concepes:
4.1. Funcionalismo Moderado, Dualista ou de Poltica Criminal.
Liderado por Claus Roxin, preocupa-se com os fins do Direito Penal, priorizando valores e princpios
garantistas, introduzindo a poltica criminal como critrio norteador para a soluo dos problemas dogmticos.
Para Roxin, o tipo objetivo no pode ser reduzido conexo de condies entre comportamentos e
resultados. Ele desenvolveu a teoria do domnio do fato, no que tange autoria delitiva, e introduziu o conceito
de imputao objetiva no campo da tipicidade.
Vinculou elementos ao delito, com diversos valores predominantes: tipicidade[1], determinao da lei em
conformidade com o princpio da reserva legal; ilicitude, espcie de elemento negativo do tipo; e culpabilidade,
necessidade da pena como preveno.
Roxin privilegia um conceito bipartido de delito em que considera o injusto penal (fato tpico + ilicitude) e
a responsabilidade(que inclui a culpabilidade) para a formao do delito.
4.2. Funcionalismo Radical, Monista ou Sistmico.
Capitaneado por Gnther Jakobs, essa teoria preocupa-se com os fins da pena, levando em considerao
apenas necessidades sistmicas, e o Direito Penal deve se ajustas a elas.
Adaptou o direito penal teoria dos sistemas sociais, com sua teoria da imputao normativa. Para ele, o
direito penal est determinado pela funo que cumpre no sistema social. Assim, quando descumprida uma norma
legal, o direito penal deve aplicar o comando contido em seu mandamento positivo, pois somente sua reiterada
incidncia lhe confere o devido respeito.
Como consectrio dessa ideia, desenvolveu a teoria do direito penal do inimigo, a ser analisada em
momento prprio.A
NOVAS PROPOSTAS: DIREITO PENAL E A CRIMINALIDADE MODERNA
PROPOSTAS: DIREITO PENAL E A CRIMINALIDADE MODERNA
As modificaes introduzidas na humanidade ao longo dos ltimos, aliados a fenmenos como a
globalizao, massificao dos problemas e configurao de uma sociedade de risco, implicariam em profundas
alteraes no Direito Penal.
A sociedade moderna destaca-se por ser uma sociedade de massas, cuja administrao recai em
comportamentos sociais distintos, porm uniformes dos cidados. Essa contradio acarreta algumas dificuldades
para o Direito Penal.
Frequentemente convocado para a resoluo dos novos problemas sociais, sua estrutura clssica sofreu
mudanas, deturpando-se at mesmo os conceitos mais arraigados. Naturalmente, denota-se a
necessria expanso do Direito Penal, ressaltando a subsidiariedade e a fragmentariedade, bem como um
equilbrio entre a adaptao aos novos tempos, sem relegar a outros ramos do Direitos a sua competncia.
Temerrios por problemas decorrentes dessa globalizao criminal, buscando-se evitar a desformalizao do
Direito Penal, a banalizao de seus tipos e conceitos, bem como protegendo a segurana jurdica advinda das
garantias asseguradas pela codificao de condutas consideradas adversas ao convvio social, a doutrina
estrangeira tem apresentado algumas formas de soluo, possveis meios aptos a salvar o Direito Penal.
1. DIREITO INTERVENCIONISTA (OU DE INTERVENO).
Seu criador, o alemo Winfried Hassemer, entende que o Direito Penal no oferece resposta satisfatria
para a criminalidade das sociedades modernas. O nico meio consistente de enfrentamento seria o direito de
interveno, que consiste na eliminao de uma parte da atual modernidade do Direito Penal, mediante a busca
de uma dupla tarefa: reduzir o Direito Penal bsico s leses de bens jurdicos individuais e sua colocao em
perigo e, num segundo momento, conceder tratamento jurdico diverso aos bens jurdicos universais, objetos dos
maiores riscos atuais.
Assim, o direito intervencionista consiste na manuteno, em mbito de Direito Penal, das condutas lesivas
aos bens jurdicos individuais e tambm as que causam perigo concreto. As demais, de ndole coletiva e difusa, por
serem apenadas de maneira mais branda, seriam reguladas por um sistema jurdico diverso, com garantias penais
e processuais mais flexveis, cuja aplicao incumbiria Administrao Pblica.
2. AS VELOCIDADES DO DIREITO PENAL.
Jess-Mara Silva Snchez, revelando grande preocupao com a consolidao de um nico Direito Penal
Moderno, apresenta as velocidades do Direito Penal, partindo do pressuposto que h dois grandes blocos,
distintos, de ilcitos: as infraes penais cominadas com penas de priso e as que se vinculam a gneros diversos de
sanes penais. Aqui, todos os ilcitos guardam natureza penal e devem ser processados e julgados pelo Poder
Judicirio.
Portanto, uma primeira velocidade do Direito Penal seria a priso, mantendo-se os princpios polticos-
criminais clssicos, as regras de imputao e os princpios processuais.
Uma segunda velocidade seria representada pelas sanes diversas da privao de liberdade, como
restrio de direitos, pecunirias, com regras flexibilizando proporcionalmente a pena com relao intensidade
da infrao, agilizando o procedimento, tendo em vista que, entre o acusado e o Estado, no h embate
envolvendo to relevante bem jurdico (liberdade).
Silva Snchez define, por fim, que haveria uma terceira velocidade do Direito Penal, definida pelo Direito
Penal do Inimigo, com a privao da liberdade e suavizao ou eliminao de direitos e garantias penais e
processuais.
3. DIREITO PENAL DO INIMIGO.
Essa teoria foi desenvolvida por Gnther Jakobs, o mesmo criador da teoria do funcionalismo radical,
monista ou sistmico, ou seja, o pensamento que reserva elevado valor norma jurdica como fator de proteo
social. Para ele, apenas a aplicao constante da norma penal que imprime sociedade as condutas aceitas e os
comportamentos indesejados.
Buscando revolucionar conceitos clssicos arraigados nas mentes dos doutrinadores do Direito Penal,
colocou em discusso a real efetividade do Direito Penal existente, pugnando pela flexibilizao ou mesmo
supresso de diversas garantias materiais e processuais, consideradas, at ento, intocveis.
O termo inimigo representa aquele que, em situao de confronto, deve ser enfrentado e, a qualquer custo,
vencido. Assim, para Jakobs, inimigo o indivduo que afronta a estrutura do Estado, pretendendo desestabilizar
a ordem reinante. Assim, age demonstrando no aceitar as normas impostas pelo Direito para o convvio social,
no querendo ser cidado e, portanto, as garantias inerentes s pessoas no podem ser a ele aplicadas.
Essa teoria baseia-se nas ideias de Jean Jacques Rousseau, onde o inimigo, ao desrespeitar o contrato social
guerreando com o Estado, deixa de ser um de seus membros. Evidente, ento, que Jakobs abraa um Direito
Penal do Autor, rotulando indivduos, em oposio a um Direito Penal do Fato, que se preocupa com a
ofensividade das aes e omisses relevantes.
Como consequncia da aplicao dessa teoria, o Estado no reconhece o delinquente como cidado,
restando-lhe inaplicveis quaisquer garantias inerentes ao homem de bem. Portanto, o inimigo no pode gozar de
direitos processuais, como a ampla defesa, entre outros, pois, o nico objetivo do Estado vencer o inimigo.
Ressalta-se a periculosidade do agente, deixando de lado o juzo de culpabilidade, em consonncia com as
penas aplicadas. Antecipa-se a tutela penal, punindo at mesmo atos preparatrios sem reduo de punio,
combatendo-se a ameaa e a opresso de sua existncia perante o Estado. Objetiva-se a garantia da paz social no
Estado.
Do Direito Penal do Inimigo decorre tambm a mitigao de princpios tais como a da reserva legal ou estrita
legalidade, pois a periculosidade do indivduo impede a previso de todos os atos que possam por ele ser
praticados. Deste modo, a narrativa dos crimes e penas aplicados depende de uma anlise vaga das condutas em
cada caso concreto, dependendo da ameaa que o indivduo representa, o que permite a inflao legislativa penal,
com criao artificial de delitos.
Possvel, ainda, a eliminao de direitos e garantias individuais, uma vez que no se observa o devido
processo legal, mas paira sobre o Estado um procedimento de guerra, de intolerncia e repdio ao inimigo.
Enfim, denota-se a convivncia, na concepo de Jakobs, de dois direitos num nico ordenamento: Direito
Penal do Cidado, dotado de garantias constitucionais, processuais e penais, tpicos de um Estado Democrtico de
Direito; e do outro lado, o Direito Penal do Inimigo, onde o sujeito ativo de uma infrao deve ser enfrentado
como fonte de perigo e, portanto, sua eliminao da sociedade o fim ltimo do Estado.
4. DIREITO PENAL COMO PROTEO DOS CONTEXTOS DA VIDA EM SOCIEDADE.
Cuida-se de uma proposta formulado por Gnter Stratenwerth que, com a finalidade de garantir o futuro da
sociedade, deixa em segundo plano a proteo dos interesses individuais, para salvaguardar imediatamente os
bens jurdicos inerentes a toda coletividade.
Ao contrrio do Direito Intervencionista, proposto por Hassemer, busca de modo precpuo a proteo dos
bens jurdicos difusos, pois seria mais importante resguardar a coletividade do que os bens de cada indivduo
isoladamente.
Como corolrio desse pensamento, antecipa-se a tutela penal nos casos de crimes de perigo abstrato,
protegendo bens jurdicos transindividuais e estabelecendo um perfil de gesto dos interesses difusos e coletivos,
legitimando a interveno do Direito Penal diante de comportamentos que exponham a perigo tais bens.
Por fim, trata-se de uma proposta audaciosa que ganhar importncia ao longo do sculo XXI, diante da
busca em enfrentar os riscos da sociedade moderna. Conforme afirma Claus Roxin, esse pensamento conduzir a
uma relativizao do bem jurdico tutelado coletivamente em face do patrimnio jurdico de cada indivduo,
isoladamente.
[1] Roxin desenvolveu aqui a teoria da imputao objetiva, a ser estudada em momento oportuno, mas desde j, podemos
nortearmos no sentido de que examina-se, nessa teoria, a criao de um risco no permitido, por meio de uma ao, dentro
da finalidade de proteo que a norma exerce.
L E I P E N A L
INTRODUO. 1. Classificao. 2. Caractersticas da Lei Penal. 3. Lei Penal em Branco. 4. Interpretao da Lei Penal. 5.
Analogia. LEI PENAL NO TEMPO. 1. Conflito de Leis Penais no Tempo. 2. Lei Penal Temporria e Lei Penal Especial. 3. Leis
Penais em Branco e o Conflito de Leis no Tempo. CONFLITO APARENTE DE LEIS PENAIS. 1. Princpios para a soluo dos
Conflitos. 2. Ausncia de previso legal. TEMPO DO CRIME. LEI PENAL NO ESPAO. 1. Princpio da Territorialidade. 2. Princpio
da Extraterritorialidade. LUGAR DO CRIME. EXTRATERRITORIALIDADE. LEI PENAL EM RELAO S PESSOAS. 1. Imunidades
Diplomticas. 2. Imunidades Parlamentares. DISPOSIES FINAIS. 1. Eficcia da Sentena Estrangeira. 2. Contagem de Prazo. 3.
Fraes no computveis na pena. 4. Legislao Especial.
INTRODUO
Lei penal a fonte formal imediata do direito penal, uma vez que tem reservado para si, por expressa
previso constitucional, o papel de criar infraes penais e cominar-lhes penas.
Sua estrutura apresenta dois preceitos, um primrio (conduta descrita) e um secundrio (pena a ser
aplicada). A nossa lei penal descritiva, ou seja, descreve a conduta, impondo a pena caso a conduta seja
praticada (proibio indireta).
Essa tcnica legislativa foi desenvolvida por Karl Binding, chamada de teoria das normas, que diferencia
norma e lei. O ilcito viola a norma penal, que o fundamento implcito da obrigatoriedade de no agir, mas no
viola a lei, pois age conforme ela descreve.
1. CLASSIFICAO.
As leis penais apresentam diversas classificaes:
a) leis penais incriminadoras: criam crimes e cominam penas. a parte especial do Cdigo Penal, bem como
a legislao penal especial.
b) leis penais no-incriminadoras: no criam crimes nem cominam penas. Subdividem-se em:
Permissivas: so as causas de excluso da ilicitude. Autorizam, permitem a prtica das condutas
tpicas (ex: CP, art. 23);
Exculpantes: estabelecem a no-culpabilidade ou impunidade de algumas condutas (ex: CP, art.
132, 3, 1 parte).
Interpretativas: esclarecem o contedo e o significado de outras leis (ex: CP, art. 327).
De aplicao, finais ou complementares: delimitam o campo de validade das leis incriminadoras
(CP, art. 2).
Diretivas: estabelecem as diretrizes, os princpios aplicveis a determinada matria (ex: CP, art. 1).
Integrativas ou de extenso: complementam a tipicidade no tocante ao nexo causal nos crimes
omissivos imprprios, tentativa e participao (ex: CP, art. 13, 2).
c) leis penais completas ou perfeitas: apresentam todos os elementos da conduta criminosa (ex: CP, art.
157).
d) leis penais incompletas ou imperfeitas: reservam a complementao da definio da conduta criminosa a
outra lei, a um ato da Administrao Pblica (lei penal em branco) ou a um julgador (tipo penal aberto).
2. CARACTERSTICAS DA LEI PENAL.
As principais particularidades de uma lei penal correspondem exclusividade (s a lei pode criar
delitos), imperatividade (o seu descumprimento acarreta sano), generalidade (imposta a todos, inclusive aos
inimputveis), impessoalidade (projeta seus efeitos a fatos futuros, para qualquer pessoa) e anterioridade (s
podem ser aplicadas se em vigor na data do fato).
3. LEI PENAL EM BRANCO.
Para Franz Von Liszt, leis penais em branco so corpos errantes em busca da alma. Existem no mundo
jurdico, mas no podem ser aplicadas em face de sua incompletude.
Tambm chamada de lei cega ou aberta, reclama complementao em seu preceito primrio, por lei ou ato
da Administrao. Subdivide-se em:
a) lei penal em branco em sentido amplo (lato sensu) ou homognea: o complemento tem a mesma
natureza jurdica e provm do mesmo rgo que elaborou a lei penal (ex: CP, art. 169, pargrafo nico, I e CC, art.
1264).
b) lei penal em branco em sentido estrito (strictu sensu) ou heterognea: o complemento tem natureza
jurdica diversa e emana de rgo distinto (Lei 11.343/06 e Portaria SVS/MS 344/1998).
c) lei penal em branco inversa ou ao avesso: neste caso, o preceito primrio completo, reclamando
complementao o preceito secundrio da norma. Nesse caso, a complementao necessariamente deve vir de lei,
sob pena de ofensa ao princpio da reserva legal (ex; Lei 2.889/56, art. 1 - Lei de Genocdio).
4. INTERPRETAO DA LEI PENAL.
a tarefa mental que procura estabelecer a vontade da lei, ou seja, o seu contedo e significado. A cincia
que disciplina esse estudo a hermenutica jurdica, atravs da prtica de interpretao da lei chamada
de exegese. Alguns critrios so adotados para que se possa realizar a interpretao da lei:
4.1. Quanto ao sujeito que a realiza: autntica, judicial ou doutrinria.
Cuida-se do responsvel pela interpretao legal, classificando-a em:
a) autntica: tambm chamada de legislativa, aquela que se incumbe o prprio legislador, quando edita
uma lei com o propsito de esclarecer o alcance e significado de outra. Pode ser contextual ou posterior. Tem
eficcia retroativa, ainda que mais gravosa ao ru. Ex: conceito de funcionrio pblico (CP, art. 327).
b) doutrinria: tambm chamada de cientfica, exercida pelos doutos, escritores, doutrinadores do texto
legal. No tem fora obrigatria ou vinculante, pois no faz parte da estrutura legal (ex: Exposio de motivos do
CP).
c) judicial: ou jurisprudencial, executada pelos membros do Poder Judicirio, aplicadores do direito, na
deciso dos litgios que lhe so submetidos. Sua reiterao constitui a jurisprudncia. Em regra, no tem fora
cogente, salvo no prprio caso concreto, onde faz coisa julgada, e em caso de smula vinculante (CF, art. 103-A).
4.2. Quanto aos meios ou mtodos: gramatical ou lgica.
Cuida-se dos meios de que se serve o intrprete para descobrir o significado da lei penal. Pode ser:
a) gramatical: tambm denominada literal ou sinttica, a que faz a acepo literal das palavras contidas no
texto normativo. Despreza quaisquer elementos no visveis na singela leitura do texto legal.
b) lgica: ou teleolgica: realizada com a finalidade de desvendar a genuna vontade manifestada na lei. O
intrprete serve-se de todos os elementos sua disposio, para encontrar o objetivo original da norma penal,
quais sejam, histrico (evoluo histrica da lei e do tema), sistemtico (anlise do sistema em que se
insere), direito comparado (tratamento do assunto em outros pases) e elementos extrajurdicos (significados fora
do contexto do direito[1]).
4.3. Quanto ao resultado: declaratria, extensiva ou restritiva.
O resultado refere-se concluso extrada pelo intrprete.
a) declaratria: ou declarativa, ou, ainda, estrita: aquela que resulta da perfeita sintonia entre o texto da
lei e sua vontade.
b) extensiva: a que se destina a corrigir uma frmula legal excessivamente estreita. Estende-se, amplia-se o
texto da lei para amold-lo sua efetiva vontade.
Divergncia doutrinria. Importante verificar que h divergncia quanto utilizao da interpretao extensiva
em normas penais. A posio doutrinria consagrada entende que, por se tratar de mera atividade interpretativa,
possvel a sua utilizao at mesmo em relao s normas incriminadoras (ex: CP, art. 159 extorso mediante
seqestro - que abrange, em interpretao extensiva, o crcere privado). Em concursos com tendncia liberal,
razovel empregar posio favorvel ao ru, no admitindo a interpretao extensiva ou analgica em normas
penais, inclusive, com deciso do STF a respeito (RHC 85.217/SP).
c) restritiva: a que consiste na diminuio do alcance da lei, concluindo que a sua vontade ultrapassou a
finalidade precpua normativa, no necessitando de aplicao integral.
4.4. Interpretao Progressiva.
Tambm chamada de adaptativa ou evolutiva, a que busca amoldar a lei realidade atual. Evita
constantes reformas legislativas, acompanhando as mudanas sociais.
4.5. Interpretao Analgica.
Ou intra legem, a que se verifica quando a lei contm em seu bojo uma frmula casustica, seguida de uma
frmula genrica. necessria para possibilitar a aplicao da lei aos inmeros e imprevisveis casos que as
situaes prticas podem apresentar.
5. ANALOGIA.
A analogia no se trata de interpretao da lei penal. , na verdade, um meio de colmatao ou integrao
normativa do ordenamento jurdico.
Tambm conhecida como integrao analgica ou suplemento analgico, a aplicao, ao caso no
previsto em lei, de lei reguladora de caso semelhante, sob o fundamento do axioma ubi eadem ratio ibi eadem
iuris dispositio (onde h a mesma razo, aplica-se o mesmo direito). Somente podem ser utilizadas em normas
penais no-incriminadoras, em razo do princpio da reserva legal. Pode ser:
a) analogia in malam partem: aquela pela qual aplica-se ao caso omisso uma lei malfica ao ru,
disciplinadora de caso semelhante. No admitida em nosso ordenamento[2].
b) analogia in bonam partem: aquela pela qual se aplica ao casso omissivo uma lei semelhante, favorvel
ao ru. aplicvel no ordenamento ptrio, salvo em casos de leis excepcionais, que no admitem analogia pelo
seu carter extraordinrio, de especialidade.
c) analogia legal ou legis: aquela que se aplica ao caso omisso uma lei que trata de caso semelhante.
d) analogia jurdica ou juris: aquela em que se aplica ao caso omisso um princpio geral do direito.
[1] Exemplificamos com o conceito de veneno, que no deve ser buscado no direito, mas no mbito da qumica.
[2] o entendimento do STF e STJ. A ttulo de curiosidade, o STF julgou atpica a conduta que praticava, em concurso, a cola
eletrnica, face falta de previso legal e a impossibilidade de analogia in malan partem.
LEI PENAL NO TEMPO
Depois de cumprir todas as fases do processo legislativo previsto na Constituio Federal, a lei penal ingressa
no ordenamento jurdico e, assim como as demais leis, vigora at ser revogada por outro ato normativo de igual
natureza. Trata-se do princpio da continuidade das leis.
Salvo as leis excepcionais e as leis temporrias, todas as leis podem ser revogadas, ou seja, ter a sua vigncia
retirada. Mas somente uma lei poder revogar a outra. Os costumes, comportamentos reiterados aceitos pela
sociedade, no podem revogar leis. Nem mesmo as decises judiciais. No caso de declarao de
inconstitucionalidade de uma lei por controle concentrado realizado pelo STF, a deciso limita-se a retirar a eficcia
da lei contrria ao texto constitucional, mas no a revoga.
Essa revogao, dependendo do seu alcance, pode ser absoluta (ab-rogao) ou parcial (derrogao). No
que tange ao modo, pode ser expressa (lei revoga outra lei mencionando expressamente), tcita (lei anterior se
revela incompatvel com a lei nova) ou global (nova lei regula inteiramente a matria da lei anterior, tornando-a
desnecessria).
Importante lembrar que, de acordo com as regras de hermenutica, lei especial no revoga lei geral e lei geral
no revoga lei especial. So matrias diversas em diferentes mbitos de atuao. Contudo, h de se verificar a
aplicabilidade da lei quando regulada por duas normas, de acordo com o princpio da especialidade.
1. CONFLITO DE LEIS PENAIS NO TEMPO. DIREITO PENAL INTERTEMPORAL.
Diante da possibilidade de a lei ser revogada, situaes de conflito podem se instaurar. Surge, assim,
o direito penal intertemporal, para dirimir os problemas de aplicao da lei no tempo.
A regra geral a aplicao da lei vigente quando da prtica da conduta (tempus regit actum). Assim,
resguardam-se a reserva legal e a anterioridade da lei penal em cumprimento as diretrizes constitucionais.
Na hiptese da sucesso de leis penais que disciplinem a mesma matria, total ou parcialmente, observando
que o fato foi praticado sob a gide da lei anterior, algumas situaes excepcionais podem surgir:
1.1. Novatio Legis incriminadora.
a lei que tipifica como infraes penais comportamentos at ento considerados irrelevantes. Diante de
mandamento constitucional (CF, art. 5, XL), a neocriminalizao somente poder atingir fatos ocorridos aps a
sua entrada em vigor, no alcanando os fatos praticados anteriormente.
1.2. Lei penal mais grave (Lex gravior).
a que, de qualquer modo, implica em tratamento mais rigoroso s condutas j classificadas como infraes
penais, com aumento de pena, agravante, supresso de atenuante, aumento de prazo, etc. Por ser mais grave,
tambm s se aplica a fatos futuros, ou seja, aps a sua entrada em vigor.
1.3. Abolitio criminis.
Abolitio criminis a nova lei que exclui do mbito do Direito Penal um fato at ento considerado criminoso.
Prevista no CP, art. 2, tem natureza jurdica de causa de extino da punibilidade.
Alcana todos os efeitos penais da norma, revogando totalmente o preceito penal. Sobrevm, contudo, os
efeitos civis de eventual condenao.
1.4. Lex Mitior, novatio legis in mellius ou lei posterior benfica.
a que se verifica quando, ocorrendo sucesso de leis penais no tempo, o fato previsto como crime ou
contraveno penal tenha sido praticado na vigncia de lei anterior, e o novel instrumento legislativo seja mais
vantajoso ao agente.
A retroatividade automtica, dispensando clusula expressa e alcanando, inclusive, fatos j
definitivamente julgados.
A competncia para a aplicao da Lex mitior bem como da abolitio criminis, do rgo do Poder Judicirio
em que a ao penal estiver em trmite[1].
Alm da retroatividade, pode ocorrer tambm a ultratividade da lei benfica, ou seja, quando o crime foi
praticado durante a vigncia de uma lei, posteriormente revogada por outra prejudicial ao agente, subsistem os
efeitos da lei anterior, mais favorvel.
1.5. Lei posterior e vacatio legis.
Durante o perodo de vacatio legis, a lei penal no poder ser aplicada, ainda que favorvel ao agente.
Enquanto no entrar em vigor, a lei penal no tem eficcia, sendo impossvel a sua incidncia no caso prtico.
1.6. Lex tertia.
Tambm pode ocorrer o conflito entre duas leis penas sucessivas no tempo, cada uma com partes favorveis
e desfavorveis ao agente. Discute-se a possibilidade de o juiz aplicar uma combinao de leis, buscando a parte
favorvel dos dispositivos, extraindo o mximo de benefcio ao ru, ou seja, se seria possvel a criao de uma lei
hbrida.
A doutrina se divide. Nelson Hungria, Heleno Cludio Fragoso e Anbal Bruno no admitem essa
possibilidade, ensinando que o membro do Poder Judicirio no pode legislar, pois violaria a regra constitucional
da separao dos Poderes. J Jos Frederico Marques, Basileu Garcia, Damsio de Jesus, Magalhes Noronha
entendem que o juiz estaria apenas se movimentando dentro dos quadros legais para uma tarefa de integrao
normativa, perfeitamente legtima.
Historicamente, o STF sempre se posicionou pela impossibilidade da combinao, entendendo que a
extrao de partes da norma alterariam por completo o esprito normativo intentado pelo legislador. Contudo,
rompendo com o entendimento da teoria da ponderao unitria, o STF chegou a decidir sobre a possibilidade de
se combinar a aplicao de partes de dispositivos legais, filiando-se, desse modo, teoria da ponderao
diferenciada. Mas essa posio no se firmou e logo o STF voltou a adotar a teoria da ponderao unitria ou
global, repelindo a combinao de leis sob o argumento de violao ao princpio da separao dos Poderes e da
reserva legal.
Esse tambm o entendimento jurisprudencial do STJ. Em seara militar, o CPM probe expressamente a
combinao de lei (Decreto-Lei 1.001/1969, art. 2, 2).
1.7. Lei penal intermediria.
possvel, segundo entendimento firmado pelo STF, a aplicao de uma lei intermediria mais favorvel ao
ru, ainda que no seja a lei em vigor quando da prtica do delito e quando da sentena. Desde que seja mais
favorvel ao agente e tenha sido vigente ao longo de todo o perodo pelo qual o crime se estendeu, ser aplicvel
ao agente.
2. LEI PENAL TEMPORRIA E LEI PENAL EXCEPCIONAL.
Lei penal temporria aquela que tem a sua vigncia predeterminada no tempo, isto , o seu termo final
explicitamente previsto em data certa pela norma.
A lei penal excepcional se verifica quando a sua durao est relacionada com situao prpria, especfica,
geralmente em momentos de anormalidade social.
Essas leis so autorrevogveis, uma vez que so classificadas como leis intermitentes, basta que alcance o
termo final previsto (lei temporria) ou cesse a situao que ensejou a sua vigncia (lei excepcional), alcanando
todos os fatos praticados enquanto esteve em vigncia (ultratividade).
3. LEIS PENAIS EM BRANCO E O CONFLITO DE LEIS NO TEMPO.
Como j visto, lei penal em branco aquela cujo preceito primrio reclama complementao, de outra lei
ou ato da administrao.
O problema surge ao saber se, uma vez alterado o complemento da lei penal em branco, aps a sua
aplicao, deve operar-se a retroatividade. A doutrina se divide[2].
A despeito dos renomados doutrinadores, a questo parece simples, quando colocada em consonncia com
o CP, art. 3.
Assim, em situao de normalidade, a alterao do complemento da norma penal em branco favorecendo
ao ru modifica o tratamento penal dispensado ao caso, devendo retroagir. Exemplo do crime de porte de drogas,
cujas drogas so descritas pelo Ministrio da Sade. Se, aps o delito, a substncia deixa de ser considerada como
ilegal, opera-se a retroatividade, uma vez que no havia situao de anormalidade e o mesmo fato, ocorrido
atualmente, no seria considerado delito.
Contudo, quando o complemento da norma penal em branco se insere em uma situao de anormalidade,
de excepcionalidade, a sua modificao, ainda que benfica, no pode retroagir, uma vez que ocorrer a
ultratividade da lei excepcional. Exemplo do caso onde o comerciante comete crime contra a economia popular
por transgredir tabelas oficiais de mercadorias.
Esse o entendimento do STF lanado na anlise de caso relativo ao art. 269 do CP, por ter ocorrido
alterao na relao de doenas de notificao compulsria pelo mdico.
[1] STF. Smula 611. Transitada em julgado a sentena condenatria, compete ao juzo das execues a aplicao de lei mais
benigna.
[2] Basileu Garcia favorvel retroatividade e Magalhes Noronha e Jos Frederico Marques, oposio.
CONFLITO APARENTE DE LEIS PENAIS
O conflito aparente de leis penais ocorre quando a um nico fato se revela possvel, em tese, aplicar dois ou
mais tipos legais, ambos oriundos de lei hierarquicamente equiparadas e originrias da mesma fonte de produo,
e em vigor ao tempo da prtica da infrao penal.
Despontam-se diversos tipos legais aplicveis ao caso concreto, com a existncia de apenas um fato punvel.
Outrossim, o conflito apenas aparente, pois desaparece com a correta interpretao da lei penal, com a utilizao
dos princpios adequados.
Os requisitos para a sua caracterizao so: unidade de fato, pluralidade de leis penais e vigncia simultnea
de todas elas.
O objetivo de se solucionar o conflito de leis penais dedica-se a manter a coerncia sistemtica do
ordenamento jurdico, preservando a vedao do bis in idem.
1. PRINCPIOS PARA A SOLUO DO CONFLITO.
Em geral, a doutrina indica quatro princpios para a soluo do tema em comento:
1.1. Princpio da Especialidade.
Originrio do Direito Romano, aceito de forma unnime. Assim, a lei especial, que possui sentido
diferenciado, particularizado, prevalece sobre a lei geral (Lex specialis derogat generali). A lei contm todos os
dados tpicos de uma lei geral e mais alguns, denominados especializantes, o que a torna aplicvel em detrimento
lei geral.
A aplicao da lei penal especializada no se faz em comparao gravidade da sano, ou seja, no ser
aplicvel a lei mais branda, pois o conflito no temporal, mas sim com relao aplicao de duas leis vigentes ao
tempo de uma nica conduta.
1.2. Princpio da Subsidiariedade.
Esse princpio estabelece que a lei primria tem prioridade sobre a lei subsidiria (Lex primaria derogat
subsidiarie). H subsidiariedade quando a lei disciplina de modo diverso, em estgios ou graus diferentes, o
mesmo bem jurdico, de forma que a lei primria, por ser mais ampla e dotada de maior gravidade, engloba a
menos ampla, contida da subsidiria, cuja aplicao fica condicionada incidncia ou no do fato na lei primria.
o exemplo do crime de roubo, que contm em seu tipo primrio os delitos de ameaa e furto, que, de
maneira secundria, somente sero aplicados no caso de o fato no configurar o roubo, atuando como soldado de
reserva.
A subsidiariedade pode ser expressa ou tcita. Ser expressa (ou explcita) quando a prpria lei declarar
formalmente a subsidiariedade da norma, com expresses como se o fato no constituir crime mais grave, etc.
Ser tcita (ou implcita) quando a lei residual no condiciona a sua aplicao, verificada atravs da analise
interpretativa do caso concreto, a exemplo do constrangimento ilegal, subsidirio diante do crime de estupro.
1.3. Princpio da Consuno (ou da absoro).
De acordo com esse princpio, o fato mais amplo e grave consome, absorve os demais fatos, menos amplos e
graves. Aplica-se o brocardo lex consumens derogat consumptae, ou seja, a lei consuntiva prefere a lei consumida.
Funda-se na ideia de que o bem jurdico resguardado pela lei penal menos vasta j est protegido pela lei
penal mais ampla, tornando os atos delituosos da lei penal menos grave apenas atos preparatrios da mais grave.
Esse princpio se aplica em quatro situaes: crime complexo, crime progressivo, progresso criminosa e atos
impunveis.
a) crime complexo: tambm chamado de crime composto, a modalidade que resulta da fuso de dois ou
mais crimes, que passam a desempenhar a funo de elementares ou circunstancias daquele, a exemplo do roubo,
que o resultado da juno de furto e ameaa.
b) crime progressivo: o que se opera quando o agente, almejando desde o incio alcanar o resultado mais
grave, pratica, mediante a reiterao de atos, crescentes violaes ao bem jurdico. O ato final consome os
anteriores, denominados crimes de ao de passagem.
c) progresso criminosa: d-se quando o agente pretende inicialmente produzir um resultado e, depois de
alcan-lo, opta por prosseguir na prtica ilcita e reinicia outra conduta, produzindo um evento mais grave. O
sujeito guiado por uma pluralidade de desgnios, com alterao em seu dolo, destacando-se uma crescente leso
ao bem jurdico.
d) atos impunveis: so divididos em trs grupos: anteriores, simultneos e posteriores, todos previstos
como infraes penais, onde o agente os realiza em virtude de uma nica finalidade, qual seja, praticar o fato
principal. Os atos anteriores funcionam como meio de execuo do tipo principal, ficando por estes absorvidos,
desde que seja de menor ou igual gravidade que o delito principal[1]. Os atos concomitantes tambm so
consumidos pelo fato principal, pois so a essncia da realizao deste. Por fim, os fatos posteriores, so
considerados meros exaurimentos dos delitos, tambm absorvidos pela conduta principal.
Fatos anteriores e posteriores impunveis e o crime conexo. A palavra conexo utilizada para definir o elo
objetivo ou subjetivo entre duas ou mais infraes penais. Pode ser teleolgica, quando o crime praticado para
assegurar a execuo de outro, ou consequencial, praticado para garantir a ocultao, impunidade ou vantagem do
delito anterior. Os fatos anteriores e posteriores no punveis no constituem, por si s, delitos autnomos. So
penalmente tipificados, contudo, encontram na norma penal, abrangncia maior em outra tipificao.
Assim, os fatos anteriores e posteriores impunveis so consequncias lgicas da prtica do delito-fim, diferente
da conexo, cuja prtica de outros delitos independem da finalidade intentada, restando concurso material de
delitos.
1.4. Princpio da Alternatividade.
Define-se com a situao em que duas ou mais disposies legais se repetem diante do mesmo fato. Por esse
princpio, a aplicao de uma norma a um fato exclui a aplicabilidade de outra que tambm o prev como delito.
Relevante parcela da doutrina entende inaplicvel esse princpio, posto que estaria sua funo vazia diante
da aplicao do princpio da consuno. Entendem ainda que a alternatividade seria a consuno
instrumentalizada dentro de um mesmo tipo penal, entre condutas integrantes de leis de contedo variado,
alternativo ou de ao mltipla.
2. AUSNCIA DE PREVISO LEGAL.
O Cdigo Penal no disciplinou expressamente o conflito aparente de leis penais. Seria oportuno que o tema
fosse desenvolvido expressamente pelo legislador ordinrio, a fim de solucionar problemas com a taxatividade de
regras sistemticas, possibilitando a segurana jurdica em tamanhas controvrsias doutrinrias e jurisprudenciais.
[1] H equvoco tcnico no STJ, Smula 17 (QUANDO O FALSO SE EXAURE NO ESTELIONATO, SEM MAIS POTENCIALIDADE
LESIVA, POR ESTE ABSORVIDO), uma vez que o delito de falsificao, constante do CP, art. 267, 2, mais grave que o delito
de estelionato, no podendo ser por ele absorvido. H um bvio concurso material de delitos, devendo a smula, em seu rigor
cientfico, ser rejeitada, restando aplicvel somente por questes de poltica criminal, aproximando cada vez mais este tipo
penal da seara civil.
TEMPO DO CRIME
Para que se faa a correta aplicao da lei penal necessria a identificao do momento em que se
considera praticado o crime. Trs teorias buscam explicar o momento em que o delito se praticou:
a) Teoria da Atividade: por essa teoria, considera-se praticado o crime no momento da conduta (ao ou
omisso), pouco importando o momento do resultado.
a teoria adotada pelo ordenamento penal brasileiro. CP, art. 4.
b) Teoria do Resultado (ou do Evento): reputa praticado o crime no momento em que ocorre a
consumao, sendo irrelevante a ocasio da conduta. a teoria adotada pelo Cdigo Penal em tema de prescrio,
conforme art. 111, I.
c) Teoria Mista (ou da Ubiquidade): busca conciliar as teorias anteriores. Para ela, o momento do
crime tanto o da conduta quanto do resultado.
Diante da aplicao da Teoria da Atividade em nossa legislao ptria, algumas relevantes consequncias
decorrem:
Aplica-se a lei em vigor ao tempo da conduta, salvo se a lei em vigor ao tempo do resultado for mais
benfica;
A Imputabilidade apurada ao tempo da conduta;
Em crime permanente, onde a conduta se arraste pelo perodo de vigncia de duas leis, aplica-se a lei
vigente no momento em que cessam os atos delitivos, ainda que malfica, posto que a violao ao
bem jurdico continuou ocorrendo quando lex gravior entrou em vigor;
Tambm ocorre como acima em casos de crime continuado, desde que sob a vigncia da lei que
agrave a situao do agente, seja praticada ao menos uma conduta[1];
No crime habitual em que haja sucesso de leis, deve ser aplicada a lei nova, ainda que mais severa,
uma vez que o agente insiste em reiterar a conduta criminosa. PE
LEI PENAL NO ESPAO
ESPAO
O Cdigo Penal Brasileiro limita o campo de validade da lei penal com observncia de dois vetores
fundamentais: a territorialidade e a extraterritorialidade. Com base neles, estabelecem-se princpios que buscam
solucionar conflitos de leis penais no espao.
Regra geral, adota-se o princpio da territorialidade (CP, art. 5), excepcionalmente admitindo-se a aplicao
da extraterritorialidade (personalidade, domiclio, defesa, justia universal e representao), o que chamamos
de territorialidade temperada (ou mitigada). Essa matria relaciona-se com o Direito Penal Internacional, ramo do
Direito Internacional Pblico que estabelece regras de determinao da lei penal aplicvel na hiptese de a
conduta criminosa violar o sistema jurdico de mais de um pas.
1. PRINCPIO DA TERRITORIALIDADE.
Trata-se da principal forma de delimitao do espao geopoltico de validade da lei penal na relao entre
Estados Soberanos. A soberania do Estado fundamenta o exerccio da competncia de todos os crimes praticados
em seu territrio, com base no princpio da igualdade soberana de todos os membros da comunidade internacional
(ONU, art. 2, 1).
Aplica-se a lei brasileira a todos os delitos prticos em territrio nacional, admitindo-se excees em casos de
extraterritorialidade. Assim, denota-se que o Cdigo Penal adotou o sistema da territorialidade
temperada ou mitigada.
Territrio o espao que o Estado exerce a sua soberania poltica (CP, art. 5). Nos termos do CP, art. 5,
1, aplica-se tambm a lei brasileira em crimes cometidos em territrios brasileiros por extenso.
2. PRINCPIO DA EXTRATERRITORIALIDADE.
A regra geral adotada pelo ordenamento ptrio a territorialidade. Contudo, exceo se faz pela adoo da
extraterritorialidade, com a aplicao dos princpios que seguem:
2.1. Princpio da Personalidade (ou da nacionalidade).
Autoriza a submisso lei brasileira dos crimes praticados por brasileiro (personalidade ativa), ou contra
brasileiro (personalidade passiva), em territrio estrangeiro.
De acordo com a personalidade ativa, o agente brasileiro punido de acordo com a lei brasileira,
independentemente da nacionalidade da vtima ou do bem jurdico protegido (art. 7, II, b). Em casos
de personalidade passiva, restar aplicvel a lei brasileira quando a vtima brasileira. O autor do delito que se
encontrar em territrio nacional ser julgado de acordo com a lei penal brasileira (art. 7, 3).
2.2. Princpio do Domiclio.
De acordo com esse princpio, o autor do crime deve ser julgado em consonncia com a lei do pas em que
for domiciliado, pouco importando a sua nacionalidade (art. 7, I, d).
2.3. Princpio da Defesa, Real ou da Proteo.
Permite submeter lei brasileira os crimes praticados no estrangeiro que ofendam bens jurdicos
pertencentes ao Brasil, qualquer que seja a nacionalidade do agente e o local do delito (art. 7, I, a, b e c).
2.4. Princpio da Justia Universal[2].
Caracterstico da cooperao penal internacional, permite a punio dos autos de delitos cujos Estados se
comprometeram a reprimir, em tratados ou convenes, pouco importando a nacionalidade do agente, o local do
crime ou o bem atingido (art. 7, II, a).
2.5. Princpio da Representao.
Tambm denominado princpio do pavilho, da bandeira ou da substituio, permite aplicar a lei brasileira
aos crimes cometidos em aeronaves ou embarcaes brasileiras, mercantes ou de propriedades privadas quando
estiverem em territrio estrangeiro e a no sejam julgados (art. 7, II, c).
E se a aeronave ou embarcao brasileira for pblica ou estiver a servio do governo brasileiro? Aqui no
incide o princpio da representao, mas sim o da territorialidade, constituindo territrio nacional por extenso
(art. 5, 1).
O que se entende por "passagem inocente"? Esse instituto, previsto na Lei 8.617/93, disciplina uma exceo
aplicao do princpio da territorialidade no Direito Penal. Trata-se de um instituto jurdico prprio do Direito
Internacional Martimo que permite a uma embarcao de propriedade privada, de qualquer nacionalidade, o
direito de atravessar o territrio de uma nao, com a condio de no ameaar ou perturbar a paz, a ordem e a
segurana do Estado costeiro. Todos os crimes cometidos a bordo dessa embarcao, desde que no envolva
brasileiros, devero ser tratados como se aqui no estivesse.
[1] STF. Smula 711. A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigncia anterior
cessao da continuidade ou da permanncia.
[2] Esse princpio tambm conhecido como princpio da justia cosmopolita, da competncia universal, da jurisdio
universal, da jurisdio mundial, da represso mundial ou da universalidade do direito de punir.
LUGAR DO CRIME
Assim como a busca por encontrar o momento certo do crime, visando a correta aplicao da lei penal,
tambm se faz necessria a identificao do lugar onde o delito ocorreu, para que se verifique a lei a ser aplicada
ao crime. Vrias teorias buscam estabelecer o correto lugar do crime, com destaque para trs:
a) Teoria da Atividade (ou da ao): lugar do crime aquele em que foi praticada a conduta (ao ou
omisso).
b) Teoria do Resultado (ou do evento): lugar do crime aquele em que se produziu ou deveria produzir-se
o resultado, pouco importando o local da prtica da conduta.
c) Teoria Mista (ou da Ubiquidade): para essa teoria, lugar do crime tanto aquele em que foi praticada a
conduta quanto aquele em que se produziu ou deveria produzir-se o resultado. a unio da atividade com o
resultado.
a teoria adotada pelo Cdigo Penal, art. 6[1].
A discusso acerca do local do crime somente tem relevncia nos delitos que envolvem pluralidade de
pases, ou seja, nos crimes distncia, onde a conduta praticada em um pas e o delito em outro.
De acordo com a teoria adotada pelo legislao ptria, basta que um nico ato executrio atinja o territrio
nacional para que seja cabvel a aplicao da lei penal brasileira.
Contudo, essa teoria comporta algumas excees:
Crimes Conexos: so aqueles que esto relacionados entre si. No comportam a ubiquidade por no
constiturem unidade jurdica. Cada delito ser julgado no local em que foi cometido.
Crimes Plurilocais: so aqueles em que a conduta e o resultado ocorrem em comarcas diversas, mas
no mesmo pas. Somente importa para fins de competncia processual, cuja aplicao do CPP, art. 70
soluciona a questo[2].
Infraes Penais de Menor Potencial Ofensivo: a Lei 9.099/95, art. 63, determina a aplicao da teoria
da atividade nesses casos.
Crimes Falimentares: nos termos da Lei 11.101/05, art. 183, ser competente o foro do local em que
foi decretada a falncia, concedida a recuperao judicial ou homologado o plano de recuperao
judicial.
Atos Infracionais: para os crimes ou contravenes penais praticados por crianas ou adolescentes,
ser competente a autoridade do lugar da ao ou omisso, conforme ensina o ECA (Lei 8.069/90), art.
147, 1.
EXTRATERRITORIALIDADE
Trata-se da aplicao da lei penal brasileira aos crimes[3] cometidos no exterior. Justifica-se pelo fato de o
Brasil ter adotado, pela aplicao da lei penal no espao, o princpio da territorialidade temperada (ou mitigada),
que autoriza, excepcionalmente, a incidncia da legislao penal brasileira aos crimes praticados fora do territrio
nacional.
A extraterritorialidade pode ser condicionada ou incondicionada.
a) Extraterritorialidade Incondicionada: a aplicao da lei brasileira no est sujeita a nenhuma condio.
Conforme determinao legal, a mera prtica do crime em territrio estrangeiro autoriza a aplicao da lei penal
brasileira, independente de qualquer outro requisito, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. As
hipteses esto previstas no CP, art. 7, 1.
Observe-se que o art. 8 veda a incidncia do bis in idem. Importante lembrar, tambm, que a Lei 9.455/97
(Lei de Tortura) tambm estabeleceu mais uma hiptese de extraterritorialidade incondicionada.
b) Extraterritorialidade Condicionada: aplica-se a lei brasileira aos crimes cometidos no estrangeiro, desde
que preenchidos os requisitos legais previstos no art. 7, II e 3, CP. Os requisitos para a aplicao, previstos no
2, so cumulativos.
Calha anotar aqui que, em caso de crime cometido por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil, exige-se,
ainda, que a extradio do estrangeiro no tenha sido pedida, ou, se pedida, ter sido negada; e que haja requisio
do Ministro da Justia, para que o estrangeiro cumpra pena em territrio nacional.
[1] Para uma fcil assimilao das teorias adotadas, basta utilizar o termo LUTA. Assim, Lugar=Ubiquidade e
Tempo=Atividade.
[2] O CPP determina a competncia do juzo pelo lugar onde se consumar a infrao, ou onde ocorrer o ultimo ato executrio.
Em casos de crimes dolosos contra a vida, contudo, aplica-se a teoria da atividade, entendimento pacfico na jurisprudncia
em razo de facilitar a apurao de evidncias do delito, tribunal do jri local, etc., com base no princpio da verdade real ,
informador do Processo Penal.
[3] De acordo com a Lei de Contravenes Penais (Decreto-Lei 3.688/41), art. 2, no se admite a aplicao de lei brasileira em
contravenes cometidas no exterior.
LEI PENAL EM RELAO S PESSOAS
Diante da relativizao da teoria adotada pelo Brasil quanto Lei penal aplicvel no espao, a territorialidade
temperada (ou mitigada) permite que, por meio de tratados, convenes e outras regras de direito internacional,
criem imunidades na aplicao da lei penal, chamadas de imunidades diplomticas e de chefes de governos
estrangeiros. E at mesmo as regras constitucionais instituram as imunidades parlamentares.
1. IMUNIDADES DIPLOMTICAS E DE CHEFES DE GOVERNOS ESTRANGEIROS.
Em funo de garantir os meios necessrios para que os representantes diplomticos dos pases, bem como
seus chefes de governo, desempenhem satisfatoriamente seus papis, permite-se um tratamento especial a essas
pessoas, quo mais em atos ilcitos por eles praticados. Fundam-se no princpio da reciprocidade, no violando o
princpio da isonomia, pois a imunidade dada ao cargo e no pessoa.
A Conveno de Viena, incorporada legislao ptria pelo Decreto 56.435/65, assegura ao diplomata (e a
seus familiares) a imunidade de jurisdio penal, sujeitando-o jurisdio do Estado que representa, abrangendo
toda e qualquer espcie de delito.
Essa imunidade irrenuncivel, salvo quando feita pelo Estado acreditante, conforme entendimento do
STF. As imunidades no se aplicam aos funcionrios particulares, ainda que oriundos dos Estados representados.
Aos Cnsules, por serem indicados para a realizao de determinadas funes, tm a imunidade limitada aos atos
de ofcio.
As sedes diplomticas no admitem qualquer tipo de medida de execuo de natureza penal, como busca,
apreenso, embargo, etc. No que cerne s sedes de embaixadas, malgrado opinies em contrrio, no so
extenses do territrio estrangeiro, so apenas locais comuns, considerados territrios nacionais, com alguns
privilgios em razo de tratados e concesses recprocas.
2. IMUNIDADES PARLAMENTARES.
Esse tema encontra melhor aparato em Direito Constitucional. Contudo, sua sistemtica produz reflexos na
aplicao da lei penal, o que justifica o nosso estudo.
O Poder Legislativo, constitudo pela Cmara dos Deputados e pelo Senado, em mbito nacional, tem suas
funes determinadas pela CF, art. 44 e seguintes, onde, precipuamente, importam na atividade legislativa e na
funo fiscalizadora do Poder Executivo. Como representantes do povo e dos Estados, respectivamente,
necessitam de uma srie de direitos, deveres e, claro, algumas prerrogativas para o desempenho de suas funes.
O Estatuto dos Congressistas, responsvel por disciplinar as questes aludidas, produzem importante
relevncia na aplicao da lei, notadamente no que cerne s imunidades parlamentares e a lei penal.
Assim, imunidades parlamentares so prerrogativas ou garantias inerentes ao exerccio do mandato
parlamentar, preservando-se a instituio de ingerncias externas. Prevista pela CF, art. 53, subdivide-se em
imunidade absoluta (material, real, substantiva ou inviolabilidade) e imunidade processual (formal, adjetiva ou
propriamente dita).
2.1. Imunidade Absoluta (material ou inviolabilidade).
Essa imunidade protege o parlamentar em suas opinies, palavras, votos, desde que relacionadas s suas
funes, conexas aos seus interesses constitucionais, em qualquer lugar que forem proferidas. CF, art. 53, caput.
Natureza Jurdica da imunidade. Surge uma enorme discusso doutrinria acerca da natureza jurdica da
imunidade material. No obstante diversos posicionamentos interessantssimos[1], o STF tem considerado a
manifestao parlamentar, nas hipteses abrangidas pela inviolabilidade, como fato atpico.
2.2. Imunidade Formal (processual ou imunidade propriamente dita).
Essa imunidade envolve a disciplina da priso e do processo contra o parlamentar. CF, art. 53, 1 a 5.
a) Imunidade formal para a priso: regra geral, os parlamentares no podero ser presos, seja qual for a
priso, em qualquer de suas modalidades. O STF denomina essa imunidade de relativa incoercibilidade pessoal
dos congressistas. A nica exceo admitida a hiptese de priso em flagrante por crime inafianvel. CF, art. 53,
2.
b) Imunidade formal para o processo: h necessidade de prvia licena da casa para a instaurao da ao
penal contra parlamentar. O STF entende que essa regra no se aplica aos processos em curso. Importante notar,
tambm, que no h necessidade de comunicao em casos de crimes praticados antes da diplomao. Em casos
de crime praticado em concurso com agente no congressista, o processo deve ser desmembrado, em razo da
prescrio diferenciada que abrange o parlamentar. CF, art. 53, 3 a 5.
2.3. Pessoas abrangidas pela imunidade.
As imunidades em comento abrangem os Deputados Federais e Senadores. No so extensveis aos
suplentes, pois estes no esto em exerccio, e a imunidade no pessoal, mas funcional.
So extensveis aos Deputados Estaduais, conforme CF, art. 27, 1. Com relao ao Poder Legislativo
Municipal, a CF determina, em seu art. 29, III, que os municpios sero regidos por Lei Orgnica, que dever
obedecer, entre outras regras, a inviolabilidade. Contudo, no h imunidade formal ou processual para os
vereadores, ou de foro por prerrogativa de funo, diante da legislao no poder prever tais garantias.
2.4. Suspenso e renncia da imunidade.
Como a imunidade parlamentar funcional, objetivando somente o desempenho da funo tcnico-
legislativa ou fiscalizadora do Poder Executivo, os parlamentares afastados para o exerccio de outros cargos no
mantm as imunidades. O STF entende que a CF, ao dispor no art. 56 que o parlamentar no perder o mandato,
supe que o mandato no est em exerccio, quando o congressista se afasta para desempenhar outra funo.
Assim tambm no possvel que o parlamentar renuncie a essas prerrogativas.
2.5. Imunidades e Estado de Stio.
Conforme art. 53, 8, as imunidades subsistiro durante o Estado de Stio, somente suspensas em crimes
cometidos fora do Congresso, incompatveis com a medida especial, e aps votao de 2/3 dos membros da Casa
respectiva.
Insta salientar que, se o crime foi cometido no recinto do Congresso, a imunidade absoluta, conforme CF,
art. 139, pargrafo nico.
DISPOSIES FINAIS SOBRE A APLICAO DA LEI PENAL
O Cdigo Penal, em seus artigos 9, 10 e 11, apresenta as disposies finais sobre a aplicao da lei penal,
discorrendo acerca da eficcia de sentena estrangeira, contagem de prazo de natureza penal, fraes no
computveis da pena e aplicao da legislao penal especial. Vejamos cada uma dessas hipteses:
1. EFICCIA DE SENTENA ESTRANGEIRA.
A sentena judicial, emanada de Poder Constitudo do Estado, o ato representativo de sua soberania. Para
que seja valorada a sua autoridade de modo eficaz, a sentena deve ser executada, em regra, no pas em que foi
proferida.
Contudo, os delitos no se adstringem aos limites fronteirios de um Estado, devendo, portanto, haver uma
comunho de atos de soberania das naes, a fim de reprimir a conduta contrria s leis sociais. Desse modo, o
Estado homologa a sentena penal estrangeira, mediante procedimento constitucionalmente previsto, a fim de
constitu-la em ttulo executivo com validade no territrio nacional.
A competncia para a homologao da sentena estrangeira e a concesso do exequatur s cartas rogatrias
do STJ, conforme CF, art. 105, I, i.
2. CONTAGEM DE PRAZO.
O dispositivo legal do CP, art. 10, contm duas partes:
A primeira parte que discorre sobre o prazo. Prazo o intervalo de tempo dentro do qual se estabelece a
prtica de determinado ato. Deve ser calculado entre dois termos, o inicial (a quo) e o final (ad quem). Qualquer
que seja a frao do dia do comeo, contado como um dia inteiro.
Os prazos de natureza penal so improrrogveis, portanto, caindo em dias no teis, devem ser cumpridos
no dia til anterior. Mas a impossibilidade de prorrogao no impede a suspenso ou interrupo da contagem
dos prazos. Essa contagem em sede penal diverge da contagem de prazos processuais penais, cujo cmputo se d
excluindo o dia do comeo e incluindo o do vencimento.
Importante notar que o prazo deve favorecer o ru. Em sede penal, mais benfico iniciar-se a contagem o
quanto antes, para fins de prescrio, trmino da pena mais cedo, etc. em sede processual, melhor que se demore,
pois o ru ter mais tempo para se defender. O prazo sempre ter natureza penal quando guardar pertinncia com
o jus puniendi do Estado, ainda que esteja previsto no Cdigo de Processo Penal.
A segunda parte disciplina o modo de contagem e o calendrio comum, tambm chamado gregoriano, que
conceitua dia como o hiato temporal entre o dia e a noite.
Assim, por esse calendrio, os meses so calculados em consonncia com o nmero correspondente do ms
seguinte, e no como perodo de trinta dias. O ano contado at o mesmo ms do no seguinte, terminando s 24
horas da vspera do dia idntico ao incio.
3. FRAES NO COMPUTVEIS NA PENA.
Conforme determinado pelo CP, art. 11, desprezam-se as fraes de dia nas penas privativas de liberdade e
restritivas de direitos e as fraes de cruzeiro na pena de multa.
Fraes so as partes que compe um inteiro. As fraes de dias so as horas. Estas devem ser desprezadas
numa eventual contagem onde se totaliza a pena de 10 dias + 1/3 = 13 dias, e no 13,33 dias. A mesma
correspondncia ocorre com a pena de multa. 10 dias-multa + 1/3= 13 dias-multa.
4. LEGISLAO ESPECIAL.
O CP, em seu art. 12, acolheu o princpio da convivncia das esferas autnomas, segundo o qual as regras
gerais do CP convivem em sintonia com as regras previstas na legislao especial. Contudo, havendo algum
preceito geral na lei especial, prevalece esta sobre a lei geral, devido ao seu carter especfico, prprio, especial
sobre o tema que disciplina.
[1] Celso Ribeiro Bastos entende ser causa de atipicidade. Nelson Hungria, Jos Afonso da Silva e Pontes de Miranda: causa
excludente de crime. Basileu Garcia: causa que se ope formao do crime. Anbal Bruno: causa pessoal e funcional de
iseno de pena. Heleno Cludio Fragoso: causa de irresponsabilidade.
T E O R I A G E R A L D O C R I M E
NOES INTRODUTRIAS. 1. Conceito de Crime. 2. Ilcito Penal e Outros Ilcitos. 3. Sujeitos do Crime. 4. Objetos do
Crime. CLASSIFICAO DOS CRIMES.
NOES INTRODUTRIAS
1. CONCEITO DE CRIME.
O conceito de crime o ponto de partida para a compreenso dos principais institutos do Direito Penal.
Aparentemente simples, sua definio pormenorizada apresenta questes complexas com vrias consequncias ao
seu estudo. Enfim, a anlise do conceito de crime pode ser feita atravs de trs aspectos:
1.1. Critrio Material (ou Substancial).
De acordo com esse critrio, crime toda ao ou omisso humana que lesa, ou expe a perigo de leso,
bem jurdico penalmente tutelado. Refere-se materializao da conduta, ou seja, a prtica delituosa deve, ao
menos, expor materialmente a perigo bem protegido.
Essa frmula leva em conta a relevncia do mal produzido aos interesses e valores selecionados pelo
legislador, servindo como fator de legitimao do Direito Penal, justificando a sano, num Estado Democrtico de
Direito.
1.2. Critrio Legal.
Nesse critrio, o conceito de crime fornecido pelo legislador. Ante a inexistncia de conceito no Cdigo
Penal, tal tarefa ficou a cargo da Lei de Introduo ao Cdigo Penal (Decreto-Lei n 3.914/1941), em seu art. 1.
Art. 1 Considera-se crime a infrao penal que a lei comina pena de recluso ou de deteno, quer
isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contraveno, a infrao penal a que a
lei comina, isoladamente, pena de priso simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente.
Cuida-se, deste modo, da espcie de gnero de infrao penal, diferenciando crime e contraveno quanto
gravidade da sano, mediante valores escolhidos pelo legislador.
O Direito Penal acolheu um sistema dicotmico ao fracionar o gnero infrao penal em duas
espcies: crime e contraveno penal, diferenciando-os apenas com relao gravidade do mal causado e a
proporcional sano penal imposta pela conduta.
Os termos crime e delito so equivalentes, ambos correspondem espcie de infrao penal, cuja violao do
bem jurdico de maior gravidade.
E art. 28 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas)? Diante da definio do crime previsto no art. 28 da Lei de
Drogas, algumas discusses surgiram a respeito, atinente natureza jurdica do ato de consumo, pois, no h
previso de pena de recluso ou deteno (no seria crime), e nem mesmo de priso simples (tambm no seria
contraveno).
A imposio de advertncia sobre os efeitos da droga e medida educativa cria dvidas quanto pena imposta,
e a sua classificao no conceito de infrao penal. H entendimentos no sentido de que, no sendo crime nem
contraveno, seria ento uma espcie de infrao penal "sui generis"[1].
Um segundo posicionamento, mais acertado, sustenta a manuteno do carter criminoso da conduta, com a
cominao das penas previstas em lei.[2] Argumenta-se, nesse pensamento, que a lei, ao tratar do tema,
classificou a conduta como crime; que o processo e o julgamento devem observar o rito do Jecrim (Lei 9.099/95);
que a finalidade da LICP era apenas diferenciar crime de contraveno; e tambm determinou a aplicao das
regras de prescrio do art. 107 reservada s infraes penais; e, por fim, no existiam penas alternativas quando
foi editada a LICP.
O entendimento da 1 Turma do Supremo Tribunal Federal, com argumentos semelhantes ltima posio,
decidiu no ter havido a descriminalizao da conduta, ou seja, existe crime, mas o que ocorreu foi apenas uma
despenalizao, diante da supresso da pena privativa de liberdade. Rejeitou-se o entendimento doutrinrio de
que seria infrao "sui generis", diante dos problemas que poderiam advir desse conceito, tal como a dificuldade
de verificao do regime jurdico da conduta.
Assim, surge uma nova questo: o art. 28 da Lei de Drogas criou uma nova espcie de crime? No! A LICP
apenas adotou um critrio genrico de crime, estabelecendo uma diferenciao entre crime e infrao penal. Mas
trata-se de lei ordinria, que pode ser alterada por outra lei, bem como haver o surgimento de novos critrios. O
que a Lei 11.343/2006 criou foi apenas um novo conceito para o crime de posse de drogas para consumo pessoal,
estabelecendo uma sano diferenciada em razo da violao do bem jurdico penalmente tutelado e sua
relevncia social.
1.3. Critrio Analtico.
Tambm chamado de critrio formal ou dogmtico, funda-se nos elementos que compe a estrutura do
crime. Sobre essa estrutura, novas divergncias insurgem:
Basileu Garcia sustentava uma posio quadripartida na estrutura do crime, ou seja, seria o crime composto
por quatro elementos: fato tpico, ilicitude, culpabilidade e punibilidade. Essa posio claramente minoritria e
deve ser afastada, pois punibilidade trata-se da consequncia da prtica do ilcito penal. possvel a existncia de
crime ainda que o agente no seja punvel.
Nelson Hungria, Magalhes Noronha, Anbal Bruno, Cezar Roberto Bitencourt, Luiz Regis Prado, entre outros,
adotam uma posio tripartida, compondo o crime: fato tpico, ilicitude e culpabilidade[3].
Outros, como Damsio de Jesus, Julio F. Mirabete, entre outros, entendem o crime numa posio bipartida,
composto de fato tpico e ilcito. A culpabilidade, nessa teoria, seria um mero pressuposto para aplicao da pena.
Qual o critrio adotado pelo Cdigo Penal? Em verdade, no h uma resposta segura para a questo. A
redao original do Cdigo Penal de 1940 acolhia um conceito tripartido, entendendo o crime como fato tpico,
ilcito e culpvel. Com a reforma da parte geral do cdigo, com a Lei 7.209/1984, fica a impresso de ter sido
adotado um conceito bipartido, ligado, obrigatoriamente, teoria finalista da conduta.
Entende-se bipartida a estrutura do crime, pois, o ttulo II da parte geral do CP trata: do crime e o ttulo III
trata da imputabilidade penal. Assim, a imputabilidade segue o crime, sendo um elemento do fato tpico e
ilcito. O crime existe, ainda que no haja culpabilidade. Ao tratar das causas de excluso de ilicitude, o Cdigo
Penal fala no h crime. Ao relacionar-se s causas de excluso da culpabilidade, o Cdigo Penal fala isento de
pena, ou seja, h crime, mas no se aplica a pena.
Tambm o art. 180, 4 do CP preceitua a receptao punvel, ainda que desconhecido ou isento de pena o
autor do crime. Assim, h crime, ainda que no seja o autor culpvel, tornando desnecessria a existncia da
culpabilidade para a caracterizao de crime.
2. ILCITO PENAL E OUTROS ILCITOS.
Ilicitude a relao de contrariedade entre o fato praticado por algum e o ordenamento jurdico. Assim,
h ilcitos penal, administrativo, tributrio, civil, ambiental.
O critrio para a distino do ilcito penal dos demais meramente poltico, de acordo com a gravidade e a
relevncia da conduta praticada, bem como a importncia do bem jurdico tutelado.
Assim, o Direito Penal deve preocupar-se apenas com os interesses mais importantes para o
desenvolvimento e manuteno do indivduo em sociedade, deixando os demais ilcitos sob o crivo dos outros
ramos do Direito (princpio da fragmentariedade).
3. SUJEITOS DO CRIME.
Sujeitos do crime so as pessoas ou entes relacionados prtica e aos efeitos da empreitada criminosa.
Dividem-se em sujeito ativo e passivo.
3.1. Sujeito Ativo.
a pessoa que realiza, direta ou indiretamente, a conduta criminosa, seja isoladamente ou em concurso
com outras.
A realizao do crime, diretamente, d-se atravs do autor e coautor. De maneira indireta, temos o delito
praticado pelo autor mediato e partcipe.
Inmeras denominaes so dadas, de acordo como o momento processual e o critrio posto em
exame: agente (geral), indiciado (no inqurito policial), acusado (aps a denncia ou queixa), ru (aps o
recebimento da inicial acusatria), sentenciado (com a prolao da sentena), condenado (aps o trnsito em
julgado da sentena), reeducando (durante a execuo penal), egresso (aps o cumprimento da pena)
e criminoso ou delinquente (objeto de estudo nas cincias penais).
Em regra, somente o ser humano pode praticar infrao penal[4]. Porm, discute-se sobre
a responsabilidade penal da pessoa jurdica. Para uma melhor compreenso, necessrio de faz a verificao da
natureza jurdica desse ente.
Savigny, com a teoria da fico jurdica, entende que a pessoa jurdica no possui existncia real, no tem
vontade prpria, no se podendo imaginar o cometimento de crimes por tais entes fictcios. Apenas o homem
pode ser sujeito de direitos.
De outra banda, Otto Gierke, com a teoria da realidade, orgnica ou organicista, sustenta a pessoa jurdica
ser um ente autnomo e distinto de seus membros, dotado de vontade prpria. , portanto, sujeito de direitos e
obrigaes, tal qual a pessoa fsica. a teoria mais aceita no Direito.
Verificando-se a adoo dessa teoria, e entendendo que a pessoa jurdica trata-se de ente autnomo,
discute-se acerca da possibilidade de a pessoa jurdica tornar-se sujeito ativo de uma infrao penal. Duas
correntes se formam:
RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURDICA
Impossibilidade de a Pessoa Jurdica ser sujeito
ativo
Possibilidade de a Pessoa Jurdica ser sujeito
ativo
1. Desde o Direito Romano j se sustentava o
postulado societas delinquere non potest.
1. Constitui ente autnomo, dotado de
conscincia e vontade, podendo praticar
condutas.
2. No tem vontade prpria, portanto, no pode
praticar condutas.
2. Possui vontade prpria, razo pela qual o
Direito Penal reserva tratamento isonmico ao
dispensado pessoa fsica.
3. No dotada de conscincia prpria pra
compreender o carter da pena.
3. Deve responder por seus atos, adaptando-se a
culpabilidade s suas caractersticas.
4. No imputvel, pois somente o ser humano 4. Constitui ente autnomo, dotado de
Optando pela segunda corrente, a Constituio Federal, em seu art. 173, 5 e 225, 3, admite a
responsabilidade penal da pessoa jurdica nos crimes contra a ordem econmica e financeira, contra a economia
popular e contra o meio ambiente.
Contudo, trata-se de norma constitucional de eficcia limitada, exigindo-se, para a sua aplicao, a edio de
lei regulamentadora. Apenas no que cerne ao meio ambiente, com a edio da Lei 9.605/1998, em seu art. 3,
pargrafo nico, a responsabilizao penal da pessoa jurdica tornou-se aplicvel efetivamente. O entendimento
do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justia pela possibilidade de responsabilidade penal da
pessoa jurdica, em todos os crimes ambientais, dolosos ou culposos.
Importante anotar que alguns interpretam o art. 225, 3 de maneira respectiva, ou seja, s pessoas fsicas,
sanes penais, e s pessoas jurdicas, sanes administrativas. No o entendimento predominante.
Por fim, ao aceitar a responsabilidade penal da pessoa jurdica, no podemos esquecer que tambm h a
responsabilidade da pessoa fsica coautora ou partcipe do delito. Observado pelo pargrafo nico do art. 3, o
que constitui o sistema paralelo de imputao (teoria da dupla imputao).
3.2. Sujeito Passivo.
o titular do bem jurdico protegido pela lei penal, que violada por meio da conduta criminosa.
Tambm denominado de vtima ou ofendido, o sujeito passivo pode ser: indireto, mediato (formal, geral,
genrico ou constante), no caso do Estado, pois a ele pertence o direito pblico subjetivo de exigir o cumprimento
da legislao penal e a tutela dos bens jurdicos; ou direto, imediato (material particular, acidental ou eventual),
que o titular do bem jurdico especificamente tutelado pela lei penal violada.
O Estado sujeito passivo mediato constante. Pode ser tambm eventual, em casos de crimes contra a
Administrao Pblica.
A pessoa jurdica tambm pode ser sujeito passivo, sendo vtima de diversos delitos, desde que compatveis
com a sua natureza.
Pode ocorrer ainda que o crime seja cometido contra vtima destituda de personalidade jurdica, como no
caso dos crimes vagos. Assim, fala-se em sujeito passivo indeterminado.
Os mortos e animais tambm no podem figurar polo passivo da conduta criminosa. J no caso calnia
contra os mortos, o sujeito passivo recai sobre os familiares do morto, pois sero os titulares da ao penal. Nos
capaz de entender o carter ilcito de um fato.
conscincia e vontade, podendo assimilar a
natureza da pena.
5. Seus atos esto vinculados ao estatuto social,
no podendo conter crimes em seu rol.
5. No conter crimes em seu estatuto social no
impede que sejam realizados.
6. A punio alcanaria seus integrantes,
ofendendo o princpio da personalidade da pena.
6. No h violao ao princpio da personalidade
da pena. Deve-se distinguir a pena dos efeitos da
condenao, que tambm atingem outras
pessoas em penas aplicadas s pessoas fsicas.
7. No se pode aplicar pena privativa de
liberdade pessoa jurdica.
7. O Direito Penal no se limita pena de priso.
Ademais, a pena privativa de liberdade deve ser
a ultima ratio, preferindo-se a aplicao de penas
alternativas.
crimes contra a fauna, sujeito passivo no o animal que sofre a conduta, mas sim a coletividade, que detm o
interesse de ver preservado todo o patrimnio ambiental.
Importante lembrar tambm que, de acordo com o princpio da alteridade, ningum poder praticar crime
contra si mesmo, a exemplo do crime de autoacusao falsa; nesse caso, a vtima o Estado, que ludibriado.
Finalmente, tambm se deve diferenciar sujeito passivo do sujeito prejudicado com a infrao penal. Muitas
vezes recaem essas caractersticas sobre a mesma pessoa. Outras vezes, os malefcios causados pela conduta ilegal
atingem terceiros, a exemplo da esposa de quem foi vtima de homicdio.
4. OBJETO DO CRIME.
o bem ou objeto contra o qual se dirige a conduta criminosa. Pode ser jurdico (interesse protegido pela
lei penal) ou material (pessoa ou coisa que suporta a infrao penal).
H crime sem objeto? Depende! No existe crime sem objeto jurdico, mas pode haver crime sem a presena
de objeto material, a exemplo do ato obsceno (CP, art. 233).
[1] Interessante posio a ser adotada para provas de concursos pblicos para Advocacia, Defensoria Pblica, etc. assim
entendem Luiz Flavio Gomes, Rogrio Sanches, Alice Bianchini.
[2] Posio adotada por Vicente Greco, Cleber Masson. Entendimento ideal para concursos do Ministrio Pblico, Polcia Civil,
Polcia Federal, etc.
[3] Cuidado! A adoo do critrio tripartido de crime no importa, necessariamente, na adoo da teoria clssica ou causal da
conduta (a ser posteriormente estudada). Tambm o finalismo penal, de Hans Welzel, aceitava a tripartida conceituao de
crime.
[4] Em que pesem as reminiscncias histricas, animal jamais ser sujeito ativo de infrao penal.
CLASSIFICAO DOS CRIMES
A classificao dos crimes pode ser legal ou doutrinria. Legal o nome atribudo ao delito pela lei.
tambm chamada de rubrica marginal. Doutrinria o nome dado pelos estudiosos do Direito s infraes penais.
o objeto de estudo do presente tpico.
Segundo a doutrina, as classificaes podem utilizar alguns critrios:
1. QUANTO QUALIDADE DO SUJEITO ATIVO:
a) Crimes comuns ou gerais: so aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa, no se exigindo
condio especial[1]. Ex.: homicdio.
b) Crimes prprios ou especiais: so aqueles em que o tipo penal exige uma situao ftica ou jurdica
diferenciada por parte do sujeito ativo[2]. Admitem coautoria a participao. Ex.: peculato, somente praticado por
funcionrio pblico.
Os crimes prprios podem ser divididos em puros, que so aqueles cuja ausncia da qualidade especial do
sujeito ativo leva atipicidade do fato; e impuros, cuja ausncia da elementar diferenciada desclassifica o delito.
c) Crimes de mo prpria, de atuao pessoal ou de conduta infungvel: so aqueles que somente podem
ser praticados pela pessoa expressamente indicada no tipo penal. Ex.: falso testemunho. Apenas admitem
participao, no aceitando coautoria, pois no de delega a prtica da conduta infracional a terceira pessoa.
2. QUANTO ESTRUTURA DA CONDUTA DELINEADA PELO TIPO PENAL:
a) Crime simples: aquele que se amolda em um nico tipo penal. Ex.: furto.
b) Crime complexo: resulta da unio de dois ou mais tipos penais. Ex.: roubo (furto + ameaa; furto + leso
corporal).
3. QUANTO A RELAO ENTRE A CONDUTA E O RESULTADO NATURALSTICO:
a) Crimes materiais ou causais: so aqueles em que o tipo penal aloja em seu interior uma conduta e um
resultado necessrio, cuja consumao reclama esse resultado. Ex: homicdio (necessita da morte).
b) Crimes formais, de consumao antecipada ou de resultado cortado: o tipo penal contm em seu
bojo uma conduta e um resultado naturalstico, mas este ltimo desnecessrio para a consumao. Ex: extorso
mediante sequestro (no necessita a efetiva vantagem sobre a extorso), ameaa, extorso.
STJ. Smula 96. O Crime de extorso consuma-se, independentemente da obteno da vantagem indevida.
c) Crimes de mera conduta ou de simples atividade: o tipo penal se limita a descrever uma conduta sem
resultado algum. Ex: Ato obsceno.
4. QUANTO AO MOMENTO EM QUE SE CONSUMA O CRIME:
a) Crime instantneo ou de estado: a consumao se verifica em um momento determinado, no se
prolonga no tempo. Ex: furto.
b) Crime permanente: a consumao se prolonga no tempo, por vontade do agente. O ordenamento
jurdico agredido reiteradamente.
Subdividem-se em: necessariamente permanentes, que exige, para a consumao, a manuteno da ao
contrria ao Direito por tempo relevante, v.g., sequestro; e eventualmente permanentes, que so crimes
instantneos, mas a ofensa ao bem jurdico tutelado se prolonga no tempo, v.g., furto de energia eltrica.
c) Crime instantneo de efeitos permanentes: os efeitos de delito subsistem aps a consumao,
independentemente da vontade do agente. Ex: bigamia, homicdio.
d) Crime a prazo: a consumao exige a fluncia de determinado perodo. Ex: sequestro em que a privao
de liberdade dura mais de quinze dias (CP, art. 148, 1, III).
5. QUANTO AO NMERO DE AGENTES ENVOLVIDOS:
a) Crimes unissubjetivos, unilaterais, monossubjetivos ou de concurso eventual: so praticados por um
nico agente, admitindo-se concurso. Ex: homicdio.
b) Crimes plurissubjetivos, plurilaterais ou de concurso necessrio: o tipo penal reclama a pluralidade de
agentes, que podem ser coautores ou partcipes.
Esses crimes subdividem-se em: (1) crimes bilaterais (ou de encontro), onde o tipo penal reclama dois
agentes cujas condutas tendem a se encontrar, ex: bigamia; (2) crimes coletivos (ou de convergncia), onde o tipo
penal reclama a existncia de trs ou mais agentes, ex: rixa (condutas contrapostas) ou quadrilha ou bando
(condutas paralelas).
No se deve confundir os crimes plurissubjetivos com os crimes de participao necessria. Estes podem ser
praticados por uma nica pessoa, no obstante o tipo penal reclame a participao necessria de outra pessoa,
que atua como sujeito passivo e no punido, ex: rufianismo, CP, art. 230.
c) Crimes eventualmente coletivos: so aqueles em que, no obstante o seu carter unilateral, a diversidade
de agentes atua como causa de majorao da pena. Ex: furto qualificado.
6. QUANTO AO NMERO DE VTIMAS:
a) Crime de subjetividade passiva nica: tipo penal tem uma nica vtima. Ex: estupro.
b) Crimes de dupla subjetividade passiva: o tipo penal prev a existncia de duas ou mais vtimas. Ex:
violao de correspondncia (remetente e destinatrio).
7. QUANTO AO GRAU DE INTENSIDADE DO RESULTADO:
a) Crime de dano ou de leso: a consumao somente se efetiva com a leso do bem jurdico tutelado. Ex:
leses corporais.
b) Crime de perigo: consumam-se com a mera exposio do bem jurdico tutelado a uma situao de
perigo.
Subdividem-se em: crime de perigo abstrato (basta a prtica da conduta, havendo presuno juris et de
jure de exposio a perigo de dano, ex: trfico de drogas), de perigo concreto (consuma-se com a efetiva
comprovao da exposio a perigo, ex: crime de perigo para a vida ou sade de outrem, art. 132), de perigo
individual (atinge uma pessoa ou um determinado nmero de pessoas, ex: perigo de contgio venreo), de perigo
comum ou coletivo (o perigo j est ocorrendo, ex: abandono de incapaz), de perigo iminente(o perigo est
prestes a ocorrer) e de perigo futuro ou mediato (o perigo se projeta para o futuro, ex: porte ilegal de arma).
8. QUANTO AO NMERO DE ATOS EXECUTRIOS QUE INTEGRAM A CONDUTA:
a) Crime unissubsistente: a conduta se revela mediante um nico ato de execuo, capaz, por si s, de
produzir a consumao. No admite tentativa. Ex: crimes contra a honra praticados com o emprego da palavra.
b) Crime plurissubsistente: a conduta se exterioriza por meio de dois ou mais atos, que devem somar-se
para produzir a consumao. Ex: homicdio praticado com golpes de faca.
9. COM RELAO FORMA COMO PRATICADO O CRIME:
a) Crime comissivo ou de ao: praticado mediante conduta positiva. Ex: roubo.
b) Crime omissivo ou de omisso: cometido por meio de uma conduta negativa, uma inao. Subdividem-se
em:
Crime omissivo prprio ou puro: a omisso est contida no tipo penal, prevendo a conduta negativa
como forma de praticar o delito. No h dever jurdico de agir, portanto, qualquer pessoa que se
encontre na posio indicada pelo tipo penal responder apenas pela omisso, e no pelo resultado
naturalstico. Ex: omisso de socorro, art. 135.
Crime omissivo imprprio, esprio ou comissivo por omisso: o tipo penal aloja uma conduta positiva,
e o agente, que tem o dever jurdico de evitar o resultado, realiza uma conduta negativa, respondendo
penalmente pelo resultado naturalstico. Ex: me que mata filho por no amament-lo.
Crime omissivo por comisso: nesse caso, h uma ao provocadora da omisso. Grande parte da
doutrina no reconhece essa categoria de delito.
Crime omissivo "quase-imprprio": essa classificao, ignorada pelo direito penal ptrio, diz respeito
omisso que no produz leso ao bem jurdico, mas apenas um perigo de leso, abstrato ou concreto.
c) Crime de conduta mista: o tipo penal composto de duas fases distintas, uma inicial positiva e outra final,
omissiva. Ex: apropriao de coisa achada e omisso em devolv-la (CP, art. 169, pargrafo nico, inciso II).
10. QUANTO AO MODO DE EXECUO:
a) Crime de forma livre: admitem qualquer meio de execuo. Ex: ameaa, art. 147.
b) Crime de forma vinculada: somente pode ser praticado atravs dos meios indicados pelo tipo penal. Ex:
perigo de contgio venreo (CP, art. 130).
11. QUANTO AO NMERO DE BENS JURDICOS ATINGIDOS:
a) Crimes mono-ofensivos: ofendem a um nico bem jurdico. Ex: furto (viola o patrimnio).
b) Crimes pluriofensivos: atingem dois ou mais bens jurdicos. Ex: latrocnio (vida e patrimnio).
12. QUANTO EXISTNCIA AUTNOMA DO CRIME:
a) Crimes principais: aqueles que possuem existncia autnoma, independendo da prtica de crime
anterior. Ex: estupro.
b) Crimes acessrios, de fuso ou parasitrios: dependem da prtica de crime anterior para a sua
existncia. Ex: receptao (CP, art. 180).
Segundo o Cdigo Penal, a extino da punibilidade do crime principal no se estende ao acessrio (CP, art.
108).
13. QUANTO NECESSIDADE DE EXAME DE CORPO DE DELITO COMO PROVA:
a) Crime transeunte ou de fato transitrio: so aqueles que no deixam vestgios materiais. Ex: ameaa,
calnia, desacato. Nesse caso, no se realiza percia.
b) Crime no transeunte ou de fato permanente: deixam vestgios materiais. Ex: homicdio. Nesse caso, a
falta de exame de corpo de delito acarreta a nulidade da ao penal.
14. QUANTO AO LOCAL EM QUE O CRIME PRATICADO:
a) Crimes distncia: so aqueles em que conduta e resultado ocorrem em pases diversos. Ante a adoo
da teoria da ubiquidade quanto ao lugar do crime, a conduta ou o resultado ocorrendo em territrio nacional,
aplica-se a legislao penal ptria.
b) Crimes plurilocais: a conduta e o resultado se desenvolvem em comarcas diversas, sediadas no mesmo
pas. Nesse caso, opera-se a teoria do resultado adotada pelo CPP, em seu art. 70, como competncia para
aplicao da lei penal.
c) Crimes em trnsito: somente uma parte da conduta ocorre em outro pas, sem lesionar ou expor a perigo
bem jurdicos das pessoas que nele vivem. Ex: Argentino envia carta com ofensa a americano, e a carta passa por
territrio brasileiro.
15. QUANTO AO VNCULO EXISTENTE ENTRE OS CRIMES:
a) Crimes independentes: no apresentam nenhuma ligao com outros delitos.
b) Crimes conexos: ocorre uma ligao dos delitos entre si. Essa conexo pode ser penal ou processual. A
conexo penal, que nos interessa, divide-se em:
Conexo teleolgica ou ideolgica: o crime praticado para assegurar a execuo de outro delito.
Conexo consequencial ou causal: o crime cometido na sequncia de outro, para assegurar a
impunidade, ocultao ou vantagem de outro delito.
Essas duas espcies possuem previso legal, servindo como agravantes do crime (em caso de homicdio,
servem como qualificadoras), CP, art. 61.
Conexo ocasional: o crime praticado como consequncia da ocasio, proporcionada pela prtica do crime
antecedente. Ex: estupro praticado aps o roubo. Trata-se de criao doutrinria, sem amparo legal.
16. QUANTO LIBERDADE PARA INICIAR A AO PENAL:
a) Crimes condicionados: a inaugurao da persecuo penal depende de uma condio objetiva de
procedibilidade. A legislao expressamente indica essa hiptese.
b) Crimes incondicionados: a instaurao da persecuo penal livre, podendo o Estado inici-la sem
nenhuma autorizao.
No direito penal e processual penal em nosso ordenamento ptrio que, quando o tipo penal estabelecer
espcie de crime condicionado, ou seja, que depender de condio objetiva de procedibilidade para a instaurao
da ao penal, ele mesmo expressamente o indicar. No havendo meno expressa a respeito, aplica-se a regra
geral de crime incondicionado, ou seja, a ao penal ser pblica incondicionada, no requerendo nenhuma
condio para que o Estado inicie a persecuo penal.
17. OUTRAS CLASSIFICAES:
Crime gratuito: o crime praticado sem motivo conhecido. No se confunde com motivo ftil, pois neste
h motivao, porm, desproporcional ao crime praticado.
Crime de mpeto: o cometido sem premeditao, como decorrncia da reao emocional repentina.
Crime exaurido: aquele que o agente, aps alcanada a consumao, insiste em agredir o bem jurdico j
ferido. No constitui novo crime, mas apenas no desdobramento da conduta perfeita e acabada.
Crime de circulao: o praticado em veculo automotor, a ttulo de dolo ou culpa.
Crime de atentado ou de empreendimento: aquele que a lei pune igualmente o delito consumado e sua
forma tentada. Ex: CP, art. 352 evadir-se, ou tentar evadir-se....
Crime de opinio ou de palavra: cometido com excesso abusivo na manifestao do pensamento, seja
pela forma escrita ou verbal.
Crime multitudinrio: aquele praticado pela multido, em tumulto. A lei no define o que seria
multido, assim, analisa-se o caso concreto. No direito cannico, exigia-se, no mnimo, 40 pessoas.
Crime vago: aquele em que o sujeito passivo destitudo de personalidade jurdica, como a famlia,
sociedade, etc.
Crime internacional: aquele que o Brasil, por tratado ou conveno devidamente incorporado ao
ordenamento ptrio, se comprometeu a punir. Ex: CP, art. 231 trfico de pessoas.
Crime de mera suspeita, sem ao ou mera posio: o agente no realiza a conduta, mas punido pela
suspeita despertada em seu modo de agir[3]. No encontrou amparo em nossa doutrina. De forma temerria,
exemplifica-se a contraveno penal do art. 25 posse de instrumento usual na prtica de furto.
Crime inominado: aquele que ofende regra tica ou cultural consagrada pelo Direito Penal, embora no
definido como infrao penal. No aceito por ferir o princpio da reserva legal[4].
Crime habitual: o que se consuma com a prtica reiterada e uniforme de vrios atos que revelam um
indesejvel estilo de vida do agente. Ex: CP, art. 282 medicina ilegal.
Crime profissional: o crime habitual cometido com finalidade lucrativa. Ex: CP, art. 230 rufianismo.
Quase-crime: na verdade, no h crime. o nome doutrinrio do crime impossvel e da participao
impunvel.
Crime subsidirio: o que somente se verifica se o fato no constituir crime mais grave. Ex: CP, art. 163
crime de dano. Nelson Hungria o chama soldado de reserva.
Crime hediondo: todo delito que se enquadra no art. 1 da Lei 8.072/1990, na forma consumada ou
tentada. Adoo do critrio legal.
Crime de expresso: o que se caracteriza pela existncia de um processo intelectivo interno do autor.
Ex: CP, art. 342 falso testemunho.
Crime de inteno: aquele que o agente quer e persegue o resultado que no precisa ser alcanado para
a sua consumao. Ex: CP, art. 159 extorso mediante sequestro.
Crime de tendncia ou de atitude pessoal: aquele que a atitude pessoal e a tendncia interna do agente
delimitam a tipicidade ou no da conduta praticada. Ex: toque do ginecologista.
Crime mutilado de dois atos ou tipos imperfeitos de dois atos: aquele que o sujeito pratica o delito com
a finalidade para obter um benefcio posterior. Ex: falsidade para cometer outro crime.
Crime de ao violenta: o cometido mediante o emprego de violncia ou grave ameaa. Ex: roubo.
Crime de ao astuciosa: o praticado por meio de fraude, engodo. Ex: estelionato.
Crime falho: a denominao doutrinria da tentativa perfeita ou acabada. O agente esgota os meios
executrios, mas a consumao no se d por circunstancias alheias sua vontade.
Crime putativo, imaginrio ou erroneamente suposto: aquele onde o agente acredita ter realmente
praticado um crime, mas na verdade, houve um indiferente penal. Trata-se de um no-crime por erro de tipo, erro
de proibio ou por obra de agente provocador.
Crime remetido: o que se verifica quando o tipo penal faz referencia a outro crime, que passa a integr-
lo. Ex: CP, art. 304 fazer uso de documento falso.
Crime de responsabilidade: dividem-se em prprios (crimes comuns ou especiais) e imprprios (infraes
administrativas), que redundam em sanes polticas.
Crime obstculo: aquele que retrata atos preparatrios, mas foram tipificados como crimes autnomos
pelo legislador. Ex: CP, art. 288 quadrilha ou bando.
Crime progressivo: aquele que enseja sucessivas violaes a bens jurdicos, de maneira gradativa, at
chegar ao mais grave. Observa-se, nesse caso, o princpio da consuno, havendo a absoro do menos grave pelo
mais grave[5]. Ex: leso corporal e homicdio.
Progresso criminosa: verifica-se com a mutao do dolo do agente, que, inicialmente, desejava o delito
menos grave, mas, aps a sua consumao, decide progredir na conduta, praticando o mais grave. Tambm aplica-
se o princpio da consuno.
Crime de impresso: so aqueles que provocam determinado estado de nimo, de impresso na vtima.
Subdividem-se em crimes de inteligncia (praticados mediante o engano), crimes de vontade (recaem na vontade
da vtima quanto sua autodeterminao) ou crimes de sentimento (incidem nas faculdades emocionais da
vtima).
Crimes militares: so os tipificados pelo Cdigo Penal Militar (Decreto-Lei 1.001/1969). Subdividem-se
em prprios[6] (exclusivamente militares, ex: desero) e imprprios (previstos tanto no CPM quanto no CP, ex:
furto). H tambm os crimes militares em tempo de paz (CPM, art. 9) e os crimes militares em tempo de
guerra (CPM, art. 10).
Crimes falimentares: so os tipificados pela Lei de falncias (Lei 11.101/2005).
Crimes funcionais ou delicta in officio: so aqueles que o tipo penal exige seja o autor funcionrio pblico.
Dividem-se em prprios (cuja condio funcional indispensvel para a tipicidade do ato) e imprprios (se ausente
a qualificao funcional, desclassifica-se para outro delito).
[1] Fala-se em crimes bicomuns, que so aqueles que no exigem qualquer condio especial, tanto para quem os pratica
quanto para quem seja o sujeito passivo.
[2] Existem, ainda, os crimes biprprios, que exigem condio especial tanto do sujeito ativo quanto do sujeito passivo, v.g.,
infanticdio.
[3] Esse conceito foi idealizado por Vicenzo Manzini, na Itlia.
[4] Idealizado pelo uruguaio Salvagno Campos.
[5] Nesses casos, os delitos menos graves, absorvidos pelo delito de maior monta, so chamados de crimes de ao de
passagem.
[6] H entendimentos na doutrina afirmando que crime militar prprio seria aquele cuja ao penal somente possa recair
sobre um militar.
F A T O T P I C O
INTRODUO. 1. Conduta. 2. Resultado Naturalstico. 3. Relao de Causalidade. 4. Tipicidade.
INTRODUO
Fato tpico todo fato humano[1] que se enquadra com perfeio aos elementos descritos no tipo penal.
A contrario senso, fato atpico a conduta que no encontra correspondncia alguma no tipo penal.
O fato tpico possui quatro elementos: conduta, resultado naturalstico, relao de causalidade (nexo causal)
e tipicidade. Esses quatro elementos acham-se presentes nos crimes materiais consumados. Nos crimes formais de
e mera conduta, prescinde-se do resultado naturalstico e do nexo causal.
Em suma, a conduta produz o resultado naturalstico, ligados entre si pela relao de causalidade. E, para ter
relevncia penal, opera-se o juzo de tipicidade, ou seja, anlise da ao ou omisso praticada e o modelo previsto
no Cdigo Penal.
1. CONDUTA
Nesse tema reside uma das maiores discusses do Direito Penal. A forma como se encontra a teoria geral do
crime, atualmente, se deve evoluo do conceito doutrinrio de conduta. Vrias teorias buscam defini-la:
a) Teoria Clssica, Naturalstica, Mecanicista ou Causal.
Conduta o comportamento humano voluntrio que produz modificao no mundo exterior.
Essa teoria, idealizada por List, Beling e Radbruch no sc. XIX, e recepcionada no Brasil por Anbal Bruno,
Magalhes Noronha, Jos Frederico Marques, Basileu Garcia, Nelson Hungria, entre outros, submete o Direito
Penal s regras inerentes s cincias naturais, orientadas pelas leis de causalidade.
Assim, para a caracterizao da conduta, basta uma fotografia do resultado, pois depende somente de o
agente produzir fisicamente um resultado previsto em lei, realizado por sua prpria vontade, independentemente
de dolo ou culpa quanto ao resultado atingido.
Diante disso, questiona-se: a teoria clssica consagra a responsabilidade penal objetiva? No. Os
elementos dolo e culpa, nessa teoria, se alojam no interior da culpabilidade, momento em que se analisa o
"querer" do agente. Por essa razo, os adeptos dessa teoria entendem que o conceito de crime fato tpico, ilcito
e culpvel, sob pena de restar caracterizada a responsabilidade penal objetiva.
Essa teoria tem sido cada vez mais abandonada uma vez que separa a conduta praticada e a relao psquica
do agente. Assim, no se distingue a forma dolosa da culposa, no se convence quanto aos crimes omissivos,
tentados, de mera conduta, pois em todos estes no h resultado naturalstico.
b) Teoria Finalista ou Final.
Criada por Hans Welzel, na dcada de 30 do sculo XX, acolhida nacionalmente por Heleno Cludio Fragoso,
Damsio de Jesus, Julio F. Mirabete e Miguel Reale Junior.
Parte de uma concepo onde o homem um ser livre, responsvel por seus atos. Portanto, o Direito deve
se preocupar somente com os atos ou omisses dirigidos a um fim.
Essa teoria preservou os postulados da teoria clssica, acrescentando-lhes a finalidade. Contudo, dentro do
mesmo conceito de crime como fato tpico, ilcito e culpvel, deslocou a anlise de dolo e culpa para o interior da
conduta, diante do necessrio aferimento do objetivo do comportamento do agente.
Desta forma, o partidrio da teoria finalista pode adotar um conceito tripartido (fato tpico + ilicitude +
culpabilidade) ou bipartido (fato tpico + ilicitude), conforme repute a culpabilidade como elemento do crime ou
mero pressuposto de aplicao da pena.
O Cdigo Penal em vigor, conforme ser art. 20, caput, parece ter manifestado sua preferncia pelo finalismo
penal. Ora, se a ausncia de dolo acarreta a excluso do fato tpico, porque o dolo acha-se na conduta, que deixa
de ser dolosa para culposa.
Essa teoria resta bastante criticada por no satisfazer quanto aos crimes culposos. Alega que no crime
culposo tambm h vontade dirigida a um fim, embora esse fim pode ou no ser conforme o Direito. Mas a
finalidade reside na conduta do agente, escolhida para atingir a finalidade desejada, com imprudncia, negligencia
ou impercia.
Por isso, nas ultimas etapas de seus estudos, Welzel vislumbrou uma possvel substituio da teoria finalista
pela teoria ciberntica, visando sanar essa necessidade.
c) Teoria Ciberntica.
Essa teoria leva em conta o controle da vontade, presente tanto nos crimes dolosos quanto culposos.
Buscava compatibilizar o finalismo penal com os crimes culposos.
Apenas intentava, com a nova denominao, abranger o conceito de direo, posto que a ao ciberntica
compreenderia, claramente, o dolo e a culpa, e suas finalidades juridicamente relevantes.
Destarte, por ter sido consagrada no mbito jurdico e mostrar-se mais pertinente ao estudo do Direito
Penal, manteve-se a denominao finalismo penal.
d) Teoria Social.
Para essa teoria, os ideais clssico e finalista so insuficientes para disciplinar a conduta, pois desconsideram
uma nota essencial do comportamento humano: o aspecto social.
Johannes Wessels, criador dessa teoria, entende que o comportamento humano a resposta do homem a
exigncias em certas situaes, posto que lhe dada a liberdade. Assim, a conduta somente seria socialmente
relevante quando capaz de afetar o relacionamento do agente com o meio social em que se insere. Utiliza-se os
conceitos causal e final da ao, acrescendo-lhes a relevncia social da conduta.
Em suma, para que o agente pratique uma infrao penal, necessrio que, alm de realizar todos os
elementos previstos no tipo, tenha a inteno de produzir resultado socialmente relevante, objetivando uma
mudana no meio social.
A principal crtica dessa teoria reside no fato de que a transcendncia ou relevncia social tambm est
associada a qualquer fato jurdico, inclusive fenmenos naturais.
e) Teoria Jurdico-penal.
a teoria sustentada por Francisco de Assis Toledo, visando superar os entraves travados entre as vertentes
clssica, finalista e social. Busca conciliar todos os pontos positivos de cada uma.
Assim, a ao o comportamento humano, dominado ou dominvel pela vontade, dirigido para a leso ou a
exposio de um bem jurdico a perigo, ou ainda, para causar uma previsvel leso. Emprega-se o termo ao em
sentido genrico, como sinnimo de conduta, englobando ao e omisso.
f) Apontamentos gerais.
A posio mais utilizada em provas e concursos a teoria finalista, ou finalismo penal, que define a conduta
como toda ao ou omisso humana, consciente e voluntria, dirigida a um fim, consistente em produzir um
resultado tipificado em lei como crime ou contraveno.
No h crime sem conduta[2]. Quando o agente pratica uma infrao penal, viola o preceito proibitivo
(crimes comissivos) ou preceptivo (crimes omissivos) contido na lei.
1.1. Formas de Conduta.
A conduta pode se exteriorizar atravs da ao ou da omisso.
A ao consiste num movimento corporal exterior, uma postura positiva do ser humano. Relaciona-se com a
infrao penal por meio de uma norma proibitiva, na maioria dos delitos.
A omisso, por outro lado, no se trata de um mero comportamento esttico. a conduta de no fazer
aquilo que podia e devia ser feito, referindo-se s normas preceptivas. Pode ocorrer tanto quando o agente nada
faz, bem como quando faz algo diferente do que lhe impunha o dever jurdico de agir. Duas teorias analisam a
omisso.
A teoria naturalstica sustenta ser a omisso um fenmeno causal que pode ser constatado no mundo ftico,
pois se trata de uma espcie de ao.
Para a teoria normativa, a omisso um indiferente penal, pois no produz efeitos jurdicos. O omitente no
pode ser responsabilizado pelo resultado, pois no o causou. Contudo, se h o dever jurdico de agir, o omitente
dever ser responsabilizado. a teoria adotada pelo Cdigo Penal.
Nos chamados crimes omissivos prprios (ou puros) a norma impe o dever de no agir no prprio tipo penal
(preceito preceptivo). Nos crimes omissivos imprprios (ou impuros) ou comissivos por omisso, o tipo penal
descreve uma ao (preceito proibitivo), mas a omisso descumpre o dever jurdico de agir (CP, art. 13, 2).
1.2. Caracteres da Conduta.
A conduta se reveste das seguintes caractersticas:
a) somente o ser humano pode praticar condutas penalmente relevantes[3]. Os atos de seres irracionais e os
acontecimentos naturais no tem importncia para o Direito Penal.
b) somente a conduta voluntria interessa ao Direito Penal.
c) apenas os atos lanados no mundo exterior ingressam no conceito de conduta. A cogitao e preparo so
desprezados pelo Direito Penal.
d) a conduta composta de dois elementos: um ato de vontade dirigido a um fim; e a manifestao dessa
vontade no mundo exterior, por uma ao ou omisso dominvel pela vontade.
1.3. Excluso da Conduta.
Apresentam-se, no Direito Penal, quatro causas de excluso da conduta:
a) Caso fortuito e fora maior: so os acontecimentos imprevisveis e inevitveis, que fogem do domnio da
vontade do ser humano. E, se no h vontade, no h dolo ou culpa. Como dolo e culpa integram a conduta, no se
configura a conduta do fato tpico.
Caso fortuito o acontecimento imprevisvel e inevitvel provocado pelo homem; e fora maior o evento,
com iguais predicados, provocado pela natureza.
b) Atos ou movimentos reflexos: consistem na reao motora ou secretora do corpo humano em
consequncia de uma excitao dos sentidos. O movimento corpreo se d no pelo elemento volitivo, mas pelo
fisiolgico. Ausente a vontade, ausente a conduta.
No se confundem com as aes em curto circuito, atos impulsivos fundamentados em emoes ou paixes
violentas. Tambm se diferenciam dos atos habituais, mecnicos ou automticos, que consistem na reiterao de
um comportamento. Nos dois casos h elementos volitivos e, consequentemente, responsabilizao pela conduta.
c) Coao fsica irresistvel: tambm chamada de vis absoluta, ocorre quando o coagido no tem liberdade
para agir. No lhe resta alternativa seno praticar o ato de acordo com a vontade do autor. No h vontade,
portanto, no h conduta.
Diverge da coao moral irresistvel (vis compulsiva), pois esta o coagido pode escolher o caminho a ser
seguido, contudo, de forma viciada, pois est moralmente coagido a agir conforme o autor do ilcito. H vontade e
h conduta, porm exclui-se a culpabilidade.
d) Sonambulismo e hipnose: nesses casos tambm no h conduta, pois o comportamento foi praticado em
pleno estado de inconscincia.
2. RESULTADO
a consequncia provocada pela conduta do agente. Nada obstante algumas divergncias, tambm pode ser
encontrada na doutrina a utilizao da palavra "divergncia", contudo, o uso mais comum no Brasil o "resultado".
2.1. Espcies.
Em Direito Penal, o resultado pode ser naturalstico ou jurdico.
Resultado Jurdico (ou normativo) a leso ou exposio a perigo de leso do bem jurdico tutelado pela lei
penal. a agresso do valor ou interesse protegido pela norma.
Resultado naturalstico (ou material) a modificao no mundo exterior provocada pela conduta do agente.
Existe Crime sem resultado?
R: Depende. No h crime sem resultado jurdico, pois toda infrao penal deve agredir bem jurdico
tutelado. Contudo, pode haver crime sem resultado naturalstico, a exemplo dos crimes formais ou de mera
conduta.
3. RELAO DE CAUSALIDADE.
Emprega-se, comumente, o termo "nexo causal" para referir-se a essa ligao entre a conduta e o resultado.
O Cdigo Penal, em seu art. 13, preferiu a expresso "relao de causalidade" para definir o vnculo formando
entre a conduta praticada pelo autor e o resultado por ele produzido.
A utilizao da relao de causalidade (nexo causal) se faz presente nos crimes de resultado naturalstico,
onde preciso verificar a relao de causa entre a conduta e o resultado para a responsabilizao do agente,
dispensvel esse estudo nos crimes formais ou de mera conduta, que no possuem resultado naturalstico, mas
apenas o resultado jurdico (ou normativo).
3.1. Teorias.
So trs as teorias desenvolvidas pela doutrina que buscam definir a relao de causalidade:
a) Teoria da Equivalncia dos antecedentes[4]: tambm chamada de teoria da conditio sine qua non, foi
idealizada por Glaser e desenvolvida por Von Buri e Stuart Mill, em 1873.
Para essa teoria, causa todo fato humano sem o qual o resultado no teria ocorrido, quando ocorreu e
como ocorreu.
b) Teoria da causalidade adequada[5]: originou-se dos estudos de Von Kries, filsofo. Para ele, causa o
antecedente necessrio e adequado para a produo do resultado.
A conduta praticada deve ser idnea a gerar o efeito, baseando-se na regularidade estatstica. Portanto, a
causa adequada aferida de acordo com o juzo do homem mdio e com a experincia comum. A contribuio
para o resultado deve ser eficaz.
c) Teoria da Imputao Objetiva: desenvolvida por Claus Roxin, em 1970, enuncia um conjunto de
pressupostos genricos que tornam a causa do delito uma causa objetivamente tpica.
Introduo: numa viso clssica, o tipo penal apresentava alguns aspectos objetivos na relao de
causalidade. Assim, de acordo com a teoria da equivalncia dos antecedentes, considerava-se realizado o tipo toda
vez que algum causava o resultado nele previsto.
Essa causalidade gerava o problema do regressus ad infinitum, cuja responsabilidade do agente era restrita
somente no mbito da ilicitude ou da culpabilidade. O sistema finalista, para resolver esse problema, conferiu ao
tipo penal uma feio subjetiva, incluindo o dolo e a culpa na conduta.
Contudo, outros problemas surgem sem soluo pelo sistema finalista. Assim, a teoria da imputao objetiva
acrescenta duas novas elementares no tipo objetivo, alm da causalidade. Assim, a relao de causalidade estaria
caracterizada em trs etapas: teoria da equivalncia dos antecedentes, imputao objetiva e dolo e culpa.
Conceito: a teoria da imputao objetiva o conjunto de pressupostos genricos (criao de um risco
proibido e a realizao desse risco no resultado) que fazem da relao de causalidade uma causa objetivamente
tpica.
Pressupostos: o primeiro pressuposto a criao ou o aumento de um risco, onde o Direito Penal objetiva
proibir aes perigosas, que coloquem em risco os bens juridicamente tutelados pela sociedade; o risco criado
deve ser proibido pelo Direito, ou seja, o Direito deve proibir certos riscos, somente permitindo algumas condutas
atravs do princpio da confiana; risco realizado no resultado, onde a leso de determinado bem jurdico ocorra
ferindo a norma que probe a conduta perigosa.
Claus Roxin: na linha de pensamento do alemo (Escola de Munique), a teoria visa determinar um critrio
de imputao capaz de concretizar a finalidade da norma penal. Assim, o resultado somente seria imputado ao
agente quando (1) o comportamento do autor cria um risco no permitido para o objeto da ao; (2) o risco se
realiza no resultado concreto; e (3) este resultado se encontra dentro do alcance do tipo penal.
Gnther Jakobs: esse alemo (Escola de Bonn) acrescenta ao conceito de imputao objetiva o elemento
da imputao objetiva do comportamento. Assim, entende pela ausncia de imputao em quatro hipteses: (1)
risco permitido; (2) princpio da confiana; (3) proibio do regresso; e (4) competncia ou capacidade da vtima.
Concluses: percebe-se que a proposta dos defensores dessa teoria a incluso de novas elementares no
tipo objetivo, criando-se o conceito da causalidade normativa, em oposio causalidade natural da teoria
finalista. A incluso de tais elementos resolveria os problemas no mbito do fato tpico, sendo que as outras teorias
o fariam no mbito da ilicitude ou da culpabilidade. Rogrio Grecco compila com maestria as concluses:
A imputao objetiva uma anlise que antecede imputao subjetiva;
A imputao objetiva pode dizer respeito ao resultado ou ao comportamento do agente;
A expresso apropriada seria "teoria da no-imputao", pois visa evitar a imputao objetiva
do tipo penal a algum;
Foi criada, inicialmente, para se contrapor aos dogmas da teoria da equivalncia dos antecedentes,
erigindo uma relao de causalidade jurdica ou normativa; e
Uma vez concluda pela no-imputao objetiva, afasta-se o fato tpico.
d) Teoria adotada pelo Cdigo Penal: como regra, nos termos do CP, art. 13, caput, o Direito Penal acolheu
a teoria da equivalncia dos antecedentes, sendo causa todo comportamento humano, comissivo ou omissivo,
que de qualquer modo concorrer para a produo do resultado naturalstico.
Para constatar se o acontecimento insere-se ou no no conceito de causa, emprega-se o "processo
hipottico de eliminao", desenvolvido pelo sueco Thyrn, em 1894. Assim, suprime-se mentalmente
determinado fato que compe o histrico do crime; se desaparecer o resultado naturalstico, causa. Se o
resultado material permanecer ntegro, o acontecimento irrelevante para o Direito Penal.
Parte da doutrina critica essa teoria baseando-se no fato de que seria uma teoria cega, pois permitiria o
regresso ao infinito. Contudo, essa crtica despropositada, pois no basta a mera dependncia fsica do
acontecimento para que ingresse na relao de causalidade, mas se faz necessria a causalidade psquica, ou seja,
reclama-se do agente da conduta, o dolo ou culpa em relao ao resultado.
Excepcionalmente, o Cdigo Penal adota, em seu art. 13, 1, a teoria da causalidade adequada, o que nos
remete ao estudo das concausas.
3.2. Concausas.
Concausa a convergncia de uma causa externa vontade do autor da conduta, influindo na produo do
resultado naturalstico por ele desejado e posicionando-se paralelamente ao seu comportamento, comissivo ou
omissivo.
a) Causa dependente: a causa que emana da conduta do agente, razo pela qual se insere no curso normal
do desenvolvimento causal. No exclui a relao de causalidade, pois h relao de dependncia entre os fatos,
cujo acontecimento posterior no ocorreria sem o anterior.
b) Causa independente: o acontecimento que foge da linha normal de desdobramento da conduta. Seu
aparecimento inesperado e imprevisvel, capaz de produzir, por si s, o resultado. Pode ser absoluta ou relativa.
Causa absolutamente independente: so aquelas que no se originam da conduta do agente, isto , so
absolutamente desvinculadas da sua ao ou omisso ilcita, rompendo o nexo causal. Dividem-se
em preexistente[6] (j existe anteriormente prtica da conduta), concomitante[7] (ocorre simultaneamente
prtica da conduta) e superveniente[8] (concretiza-se posteriormente conduta do agente).
Em todas as modalidades, o resultado naturalstico ocorre independentemente da conduta do agente,
produzindo, por si s, a ocorrncia do resultado. Assim, diante da quebra de relao de causalidade entre a
conduta do agente e o resultado, que ocorreria de qualquer forma, devem ser imputados ao agente somente os
atos praticados.
Causa relativamente independente: origina-se da prpria conduta praticada pelo agente, contudo, no se
situa no trmite normal do desenvolvimento causal, podendo, por si s, produzir o resultado. Pode
ser preexistente[9] (existe previamente prtica da conduta), concomitante[10] (ocorre simultaneamente
conduta do agente) ou superveniente (ocorrem depois da conduta do agente).
Com relao s causas relativamente independentes preexistentes e supervenientes, em obedincia teoria
das equivalncias dos antecedentes adotada pelo Cdigo Penal, o agente responde pelo resultado naturalstico,
pois o resultado material no teria ocorrido sem o seu comportamento.
No que tange s causas relativamente independentes supervenientes, duas situaes podem ocorrer: incide
a teoria daconditio sine qua non nas causas relativamente independentes supervenientes que no produzem, por si
s, o resultado. Assim, suprimindo mentalmente a conduta, o resultado naturalstico no teria ocorrido sem o
comportamento do agente e seu animus necandi[11]. Nas causas relativamente independentes supervenientes
que produzem, por si s, o resultado, adota-se a teoria da causalidade adequada, imputando ao agente somente os
atos anteriormente praticados[12].
Apesar de muitas crticas da doutrina, o CP entende que a causa relativamente independente superveniente
capaz de produzir, por si s, o resultado, rompe a relao de causalidade entre a conduta e o resultado
naturalstico, em razo de um acontecimento inesperado e imprevisvel que produz o resultado, tornando ineficaz
a conduta do agente.
3.3. Omisso.
a conduta de no agir. a inrcia do agente diante de um fato que lei determina que se faa alguma coisa.
A omisso penalmente relevante acha-se disciplinada no CP, art. 13, 2. Assim, aplica-se a lei penal aos
crimes omissivos imprprios, esprios, tambm chamados de comissivos por omisso, ou seja, aqueles em que o
tipo penal descreve uma ao, mas a inrcia do agente, que podia e devia agir para impedir o resultado
naturalstico, conduz sua produo.
Os crimes omissivos prprios, ou puros, no alojam em seu bojo um resultado material, mas apenas um
resultado jurdico (ou normativo). A omisso descrita pelo tipo penal e o crime se consuma com a simples inrcia
do agente.
Portanto, a omisso prpria sempre relevante penalmente, pois se acha descrita no tipo penal. A omisso
imprpria, por seu turno, pode ser penalmente relevante, desde que haja o dever de agir por parte do agente
omissivo.
Observa-se que o Cdigo Penal adotou a teoria normativa, onde a omisso independente no relevante
para o Direito Penal, somente importante quando h o dever jurdico de agir, fazer algo, imposto pelo
ordenamento jurdico (critrio legal[13]).
A lei define o "devia e podia" agir para evitar o resultado como a possibilidade real e efetiva de ao. No
ser punido o homem que tinha o dever de agir, mas achava-se impossibilitado de atuao no momento do
acontecimento.
3.4. Dupla causalidade.
A questo da dupla causalidade de difcil ocorrncia prtica. Trata-se de uma situao onde duas ou mais
condutas, que no se encontram subjetivamente ligadas, produzem simultaneamente o resultado naturalstico por
ela desejado.
A conduta unitria, por si s, produziria o resultado material objetivado. Contudo, h simultaneidade de
aes, independentes, que do causa ao resultado. Qual o crime deve ser imputado aos agentes?
No Brasil, atualmente, inclina-se pela punio de ambos os autores pelo delito praticado. Suprimindo a
conduta de um dos agentes, restaria suficiente a outra para a consumao da infrao penal.
4. TIPICIDADE.
ltima etapa do fato tpico, o juzo de subsuno entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o
modelo hipottico descrito pelo tipo penal.
4.1. Evoluo doutrinria.
A atual definio de tipicidade deriva das ideias do alemo Ernst Von Beling, de 1906.
Antes de Beling, o crime se dividia em dois blocos: ilicitude, de ordem objetiva, e culpabilidade, de ordem
subjetiva. Aps seus estudos, o crime passou a ter trs partes: tipicidade e ilicitude, de ordem objetiva, e a
culpabilidade, de ordem subjetiva. Iniciava-se a fase da independncia do tipo, desvinculando a tipicidade da
ilicitude, com funo meramente descritiva, sem contedo valorativo.
Essa teoria, intimamente ligada teoria clssica, natural ou causal da conduta, perdeu espao com o
surgimento do finalismo ou teoria finalista da conduta e com o descobrimento dos elementos subjetivos do tipo.
Em 1915, Max Ernst Mayer, conferiu teoria da tipicidade a funo de indcio de ilicitude, nascendo a fase da
tipicidade como indcio da ilicitude, consagrando um conceito tripartido de crime, com anlise de trs fases
distintas: tipicidade, ilicitude e culpabilidade.
, desde ento, a teoria mais aceita em Direito Penal.
Em 1931, Edmund Mezger apresenta novos conceitos, introduzindo a faze da tipicidade como essncia da
ilicitude, onde o tipo penal passa a ser conceituado como a ilicitude tipificada. Foi alvo de imensas crticas, pois
veda a correta separao dos juzos de tipicidade e ilicitude do delito.
4.2. Teoria dos elementos negativos do tipo.
Preconizada pelo alemo Hellmuth Von Weber, prope o tipo total de injusto, por meio do qual os
pressupostos de causa de excluso da ilicitude compe o tipo penal como seus elementos negativos.
Tipicidade e ilicitude integram o tipo total, analisando o crime, no como fato tpico e ilcito, mas como tipo
completo conforme descrio do tipo total do injusto. No foi acolhida pelo Direito Penal Ptrio, que
explicitamente, distinguiu os tipos incriminadores dos tipos permissivos ou causas de excluso da ilicitude.
4.3. Teoria da tipicidade conglobante.
Criada pelo argentino Eugenio Ral Zaffaroni, sustenta que todo fato tpico se reveste de antinormatividade,
pois, embora o agente atue em consonncia com o tipo incriminador, na verdade, contraria o tipo legal.
O termo "conglobante" deriva da necessidade de o tipo penal ser contrrio a todo ordenamento jurdico,
conglobado, e no somente ao Direito Penal. Assim, a tipicidade penal resulta da juno da tipicidade legal com a
tipicidade conglobante.
Entende-se por tipicidade legal a adequao da conduta do indivduo descrio do tipo penal, com seus
elementos objetivos e normativos.
Por tipicidade conglobante, comprova-se que a conduta praticada, tipicamente legal, tambm est proibida
pela norma jurdica como um todo.
Verificada a tipicidade legal da conduta praticada e antinormatividade, ou seja, tipicidade conglobante,
presente est a tipicidade penal, caracterizando a infrao penal.
4.4. Adequao Tpica.
o procedimento pelo qual se enquadra uma conduta individual e concreta na descrio genrica e abstrata
da lei penal. o meio pelo qual se constata se existe ou no tipicidade entre a conduta praticada na vida real e o
modelo definido pela lei penal.
Essa adequao tpica pode se apresentar de duas maneiras: subordinao imediata e subordinao mediata.
Na adequao tpica de subordinao imediata, a conduta humana se enquadra diretamente na lei penal
incriminadora, sem necessidade de interposio de qualquer outro dispositivo legal.
J na adequao tpica de subordinao mediata, a conduta humana no se enquadra prontamente na lei
penal incriminadora, reclamando-se, para completar a tipicidade, a interposio de um dispositivo contido na parte
geral do Cdigo Penal. Ocorre nos casos de tentativa, participao e nos crimes omissivos imprprios.
Esses dispositivos penais so chamados de normas integrativas, de extenso ou complementares da
tipicidade.
[1] Ou tambm fato praticado por pessoa jurdica em crimes ambientais para os que se filiam a esse entendimento.
[2] Vicenzo Manzini supe a existncia dos crimes de mera suspeita, onde o agente no punido pela conduta, mas pela
suspeita despertada em seu modo de agir. De acordo com o Dec-Lei 3.688/91(Lei de Contravenes Penais), art. 25, h
divergncia doutrinria sobre essa contraveno penal, uma vez que o Direito Penal no consagra o "Direito Penal do Autor",
no podendo ser punido sem a prtica de um fato concreto capaz de lesar ou expor a perigo bem jurdico penalmente
tutelado.
[3] Calha observar os que se filiam pela possibilidade de responsabilizao penal da pessoa jurdica em crimes ambientais.
[4] Tambm chamada de teoria das equivalncias da condies, teoria da condio simples, teoria da condio generalizadora
ou, por fim, teoria da conditio sine qua non.
[5] Tambm chamada de teoria da condio qualificada ou teoria individualizadora.
[6] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que j estava envenenado por "C".
[7] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que alvejado ao mesmo tempo por "C".
[8] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", mas o teto da casa desaba sobre "B" antes do efeito morte intentado pelos
disparos.
[9] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que atingido de raspo, mas vem a falecer em virtude da diabetes que
possua agravada pelos disparos.
[10] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que para desviar dos tiros, corre assustado para a avenida, onde morre
atropelado por um nibus.
[11] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que no morre imediatamente, mas vem a falecer em cirurgia mdica para
a retirada da bala, por impercia.
[12] "A" efetua disparo de arma de fogo contra "B", que no morre, mas vem a falecer em incndio no hospital em que se
encontrava internado.
[13] Alberto Silva Franco e Rui Stoco defendem a existncia de um critrio judicial para a aferio da relevncia penal da
conduta omissiva, devendo o magistrado analisar cada caso, decidindo pela presena ou no do dever de agir.
TEORIA DO TIPO
Tipo o modelo genrico e abstrato, formulado pela lei penal, descritivo da conduta criminosa ou da
conduta permitida.
No se confunde com a tipicidade, pois o tipo penal resulta da imaginao do legislador e o juzo de
tipicidade a adequao de uma conduta real aos fatos imaginados pela lei.
Os tipos penais se apresentam em duas categorias: tipos permissivos e tipos incriminadores.
1. TIPOS PERMISSIVOS (ou JUSTIFICADORES).
So os tipos que contm a descrio legal da conduta permitida, ou melhor, as situaes em que a lei
considera lcito um comportamento que se amolda ao fato tpico. So as chamadas causas de excluso de ilicitude
ou eximentes, ou ainda, causas justificativas.
2. TIPOS INCRIMINADORES (ou LEGAIS).
So os tipos penais propriamente ditos, consistentes na sntese legal da definio da conduta criminosa
(crime ou contraveno).
Esto definidos na parte especial do Cdigo Penal e na legislao penal especial.
2.1. Funes do Tipo Legal.
O tipo legal no se destina simplesmente a criar infraes penais. Ao contrrio, possui relevantes funes:
a) Funo de garantia: funciona como uma garantia do indivduo, conhecendo todas as condutas que o
Estado repudia, podendo exercer sua liberdade de maneia inequvoca. Trata-se de direito fundamental de 1
gerao, limitando a atuao do poder estatal.
b) Funo fundamentadora: a previso de uma conduta criminosa pelo Estado fundamenta o seu direito de
punir quando h violao da norma.
c) Funo indiciria da ilicitude: o tipo legal delimita a conduta penalmente ilcita, autorizando a presuno
de uma ao ou omisso ser ilcita, contrria ao ordenamento. Essa presuno relativa (juris tantum), pois admite
prova em contrrio (CP, art. 23).
d) Funo diferenciadora do erro: o dolo do agente deve alcanar todas as elementares do tipo legal,sendo
responsabilizado somente quando houver conhecimento de que sua atitude compe todos os elementos do tipo
legal (CP, art. 20).
e) Funo seletiva: cabe ao tipo penal selecionar as condutas que devero ser proibidas (crimes comissivos)
ou ordenadas (crimes omissivos) pela lei penal, levando em conta os princpios vetores do Direito Penal em um
Estado Democrtico de Direito.
2.2. Estrutura do Tipo Legal.
O tipo penal, qualquer que seja, composto por um ncleo e elementos. Nas formas qualificadas e
privilegiadas so acrescentadas as circunstncias.
O Ncleo, representado pelo verbo, a primeira etapa do tipo incriminador.
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia mvel:
Em torno do ncleo, se agregam elementos (ou elementares), objetivando proporcionar a perfeita descrio
da conduta criminosa. Podem ser objetivos, subjetivos e normativos.
Elementos objetivos (ou descritivos) so as circunstancias da conduta criminosa que podem ser constatados
por qualquer pessoa, exprimindo um juzo de certeza.
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia mvel:
Elementos normativos so aqueles cuja compreenso reclama uma interpretao valorativa, necessita de um
juzo de valor da situao, visando o destinatrio da lei penal.
Podem ser jurdicos, traduzindo conceitos prprios do Direito ("indevidamente", "documento", "funcionrio
pblico", "duplicata"); ou culturais (extrajurdicos), que envolvem conceitos prprios de outras disciplinas ("pudor",
"libidinoso", "arte", etc.).
Por fim, elementos subjetivos so os que dizem respeito ao nimo do agente, isto , finalidade de agir,
tendncias e intenes. A doutrina utiliza a expresso "elementos subjetivos do injusto", reservando-a aos
elementos que sustentam identidade entre a tipicidade e a ilicitude.
Parte da doutrina entende, ainda, haver uma quarta espcie de elemento do tipo penal, relativo aos
elementos modais. Estes seriam os elementos do tipo que expressam as condies especficas de tempo, local ou
modo de execuo da infrao penal, indispensveis para a caracterizao do crime.
Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tcita de
quem de direito, em casa alheia ou em suas dependncias:
2.3. Classificao Doutrinria do Tipo Legal.
A doutrina classifica o tipo legal em diversas maneiras:
a) Tipo Normal e tipo anormal: norma o que prev elementos de ordem objetiva. Anormal o que prev
elementos subjetivos, normativos, acarretando a tipicidade anormal.
b) Tipo fundamental e tipo derivado: fundamental ou bsico aquele que retrata a forma mais simples da
conduta criminosa. chamado de crime simples, em regra, contido no caput do tipo legal[1]. Tipo derivado
aquele que se estrutura com base no tipo fundamental, a ele se somando as circunstancias que aumentam ou
diminuem a pena. So as qualificadoras, causas de aumento e causas de diminuio de pena.
c) Tipo fechado e tipo aberto: fechado (ou cerrado) o que Possi descrio minuciosa da conduta criminosa.
Aberto o que no possui, cabendo ao Poder Judicirio, na anlise do caso concreto, complementar a tipicidade
mediante um juzo de valor (CP, art. 137).
d) Tipo de autor e tipo de fato: tipo de autor o que se relaciona ao direito penal do autor, onde no se
pune a conduta, mas a pessoa em razo de circunstncias pessoais. Tipo de fato o que tem por objeto a
incriminao da conduta criminosa, vigente no Brasil.
e) Tipo simples e tipo misto: simples o que abriga em seu interior um nico ncleo (CP, art. 157). Misto o
que tem na descrio tpica dois ou mais ncleos, representando crimes de ao mltipla ou de contedo variado.
Pode ser um tipo misto alternativo (CP, art. 180) ou cumulativo (CP, art. 244).
f) Tipo congruente e tipo incongruente: congruente aquele em que h perfeita coincidncia entre a
vontade do autor e o fato descrito na lei penal (crime material consumado). Incongruente aquele em que no h
coincidncia, o resultado diverso (crime tentado, crime culposo e preterdoloso).
g) Tipo complexo: o tipo possui uma parte objetiva, consistente na descrio da conduta criminosa e uma
parte subjetiva, consistente no dolo e na culpa (concepo finalista).
[1] H uma exceo no Cdigo Penal, art. 316, 1, delito de excesso de exao, trata-se de crime simples que se acha no
pargrafo, e no no caput.
CRIME DOLOSO
Trata-se de um elemento subjetivo do tipo penal, integrante da conduta. Consiste na vontade e conscincia
de realizar os elementos do tipo penal.
1. TEORIAS DO DOLO.
Acerca do dolo, h trs teorias:
a) Teoria da Representao: a configurao do dolo exige apenas a previso do resultado. No se preocupa
com o aspecto volitivo do agente, bastando que o resultado tenha sido antevisto.
b) Teoria da Vontade: ultrapassa a teoria da representao, pois alm de exigir a previso do resultado,
reclama tambm a vontade de produzir o resultado.
c) Teoria do Assentimento: tambm chamada teoria do consentimento ou da anuncia, complementa a
teoria da vontade, caracterizando o dolo quando o agente, prevendo o resultado, assume o risco de produzi-lo.
A teoria adotada pelo Cdigo Penal, conforme preceito do art. 18, I, a juno da teoria da vontade com a
teoria do assentimento, ou seja, dolo a vontade do resultado ou anuncia em produzi-lo.
2. ELEMENTOS DO DOLO.
O dolo composto por dois elementos: conscincia e vontade.
A conscincia o elemento intelectual ao passo que a vontade o elemento volitivo.
Esses elementos se desenvolvem em trs momentos: (1) na conscincia do agente entre a conduta a ser
praticada e o resultado querido; (2) na conscincia do agente sobre a relao de causalidade entre a conduta que
ser praticada e o resultado que pretende atingir; e (3) a exteriorizao da vontade de realizar a conduta e produzir
o resultado.
No preciso que o iter criminis transcorra da forma idealizada pelo agente. Subsiste o dolo se o objetivo
almejado foi alcanado em decorrncia da conduta praticada.
3. DOLO NATURAL E DOLO NORMATIVO.
A diviso do dolo natural e do dolo normativo relaciona-se com a teoria adota pela definio de conduta.
Na teoria clssica (causal) o dolo e a culpa estavam alojados no interior da culpabilidade, que abrigava trs
elementos: imputabilidade, dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa. Esse dolo era chamado de dolo
normativo, pois abrigava a conscincia da ilicitude do fato.
Com o surgimento do finalismo penal, o dolo foi transferido da culpabilidade para a conduta, elemento do
fato tpico. Assim, o dolo, livre da conscincia da ilicitude, passou a ser chamado de dolo natural.
4. ESPCIES DE DOLO.
a) Dolo Direto: Tambm chamado de dolo determinado, intencional, imediato ou incondicionado, aquele
em que a vontade do agente voltada para o resultado.
b) Dolo Indireto: ou indeterminado, aquele em que o agente no tem vontade dirigida a um resultado
determinado. Subdivide-se em dolo eventual e dolo alternativo.
Dolo alternativo: o que se verifica quando a gente deseja, indistintamente, um ou outro resultado. De
acordo com a teoria da vontade, o agente sempre responder pelo crime mais grave querido.
Dolo eventual: a modalidade em que o agente no quer o resultado, previsto, mas assume o risco de
produzi-lo. Responder pelo crime em razo da teoria do assentimento, adotada pelo ordenamento penal ptrio.
Um critrio prtico e til para a verificao do dolo eventual a utilizao da teoria positiva do
conhecimento, onde o agente revela a sua indiferena ante o resultado previsto, no deixando de agir.
Dolo eventual e os crimes de trnsito: a jurisprudncia atual entende possvel a aplicao do dolo eventual
em crimes praticados na direo de veculo automotor. O STJ e o STF entendem, pacificamente, que a direo
perigosa, desajustada socialmente, revela a vontade do agente, ou a anuncia em produzir resultados danosos.
c) Dolus bnus e Dolus malus: essa classificao refere-se, com maior intimidade, ao Direito Civil. Diz
respeito aos motivos do crime, que podem aumentar a pena (motivo torpe) ou diminu-la (relevante valor social ou
moral).
d) Dolo de propsito: ou dolo refletivo, o que emana da reflexo do agente, ainda que pequena, acerca da
prtica criminosa. o crime premeditado.
e) Dolo de mpeto: ou repentino, o que se caracteriza quando o autor pratica o crime motivado por paixo
violenta ou excessiva perturbao de nimo. Geralmente, so os crimes passionais.
f) Dolo genrico: era a expresso utilizada pela teoria causalista da conduta, para verificar na vontade de o
agente produzir o resultado, sem nenhuma finalidade especfica. Atualmente, com a supervenincia da teoria
finalista, apenas o dolo.
g) Dolo Especfico: com a teoria causal, era o crime onde a vontade do agente era acrescida de uma
finalidade especial. Trata-se, pelo finalismo penal, do elemento subjetivo do dolo, ou elemento subjetivo do
injusto.
h) Dolo presumido: tambm chamado de dolo in re ipsa, a espcie que dispensa comprovao do caso
concreto. Seria o dolo aceito pela responsabilidade penal objetiva.
i) Dolo de dano: ou de leso, ocorre quando o agente quer ou assume o risco de lesionar um bem jurdico
penalmente tutelado.
j) Dolo de Perigo: ocorre quando o agente quer ou assume o risco de expor a perigo de leso um bem
jurdico penalmente tutelado.
k) Dolo de primeiro grau: consiste na vontade do agente, direcionada a determinado resultado,
efetivamente perseguido, englobando os meios necessrios para tanto.
l) Dolo de segundo grau: ou de consequncias necessrias, a vontade do agente dirigida a determinado
resultado, efetivamente desejado, em que a utilizao dos meios para alcan-lo inclui, obrigatoriamente, efeitos
colaterais de verificao praticamente certa.
m) Dolo geral por erro sucessivo: tambm chamado de aberractio causae, o engano no tocante ao meio de
execuo do crime, relativamente forma pela qual se produz o resultado inicialmente desejado pelo agente. O
sujeito acredita ter alcanado o resultado com as prticas realizadas, e pratica nova conduta com finalidade
diversa, e acaba atingindo o resultado por esta ltima prtica.
n) Dolo antecedente: conhecido como inicial ou preordenado, o que existe desde o incio da execuo do
crime. No necessrio estar presente no momento da prtica da conduta, basta que tenha existido para que haja
a responsabilizao do agente.
o) Dolo atual: ou concomitante, o que persiste durante todo o desenvolvimento dos atos executrios.
p) Dolo subsequente: ou sucessivo, o que se verifica quando o agente, aps iniciar uma ao com boa-f,
passa a agir de forma ilcita e, por corolrio, pratica um crime ou, conhecendo posteriormente a ilicitude de sua
conduta, no busca evitar seu resultado.
q) Dolo nas contravenes penais: de acordo com o Decreto-Lei n 3.688/1941 (Lei das Contravenes
Penais), em seu art. 3, para a existncia de contraveno penal, basta a ao ou omisso voluntria, levando-se
em conta, o dolo ou a culpa.
Essa concepo revela ntima ligao das contravenes penais com a teoria clssica ou causal da conduta. A
maioria das contravenes penais no reclama resultado naturalstico, motivo pelo qual somente a ao ou
omisso voluntria, onde o agente quer o resultado, basta para a configurao da infrao penal.
Assim, somente se verifica a anlise de dolo ou culpa em casos onde a lei expressamente exige o resultado
para a configurao da contraveno penal. No mais, no h diferena entre o tipo subjetivo do crime o tipo
subjetivo da contraveno penal, pois ambos reclamam a vontade do agente em produzir, ou assumir o risco de
produzir, o resultado.
CRIME CULPOSO
Dentro de uma concepo finalista da conduta, culpa ume elemento normativo, pois sua aferio depende
da anlise do caso concreto.
Em regra, os crimes culposos esta previstos por tipos penais abertos, permitindo ao magistrado valorar a
culpa na conduta do agente. Nada impede, contudo, a definio das condutas culposas num tipo penal fechado
(CP, art. 180, 3).
Historicamente, culpa sempre foi muito criticada, tida como intil a aplicao da pena em crimes culposos
por diversos autores. Na Itlia, alguns autores verificavam que essa modalidade no provm de uma conduta
contrria ao Direito, mas de uma atitude que no se podia prever, cuja pena se tornaria ineficaz diante da no
periculosidade desses agentes.
Com o advento da Escola Positiva, a punio da culpa passou a ser reclamada por necessidade social, por ser
a sano uma reao constante, independente da vontade.
Atualmente, acha-se encerrada essa discusso, uma vez que o interesse pblico impe consequncias penais
queles que lesam ou expe a perigo bens penalmente tutelados, intencionalmente ou apenas por agir com
negligncia, imprudncia ou impercia.
Por bvio que, diante do menos desvalor da conduta, os crimes culposos so apenados de modo mais
brando do que os dolosos.
Para que se facilite a compreenso, o conceito de culpa pode ser fracionado por diversos elementos, que a
compe, tornando mais tranquila a assimilao da matria.
Assim, crime culposo o que se verifica quando o agente, deixando de observar o dever objetivo de cuidado,
por imprudncia, negligencia ou impercia, realiza voluntariamente uma conduta que produz resultado
naturalstico indesejado, no previsto, nem querido, mas objetivamente previsvel, e excepcionalmente previsto e
querido, que podia, com a devida ateno, ter evitado.
1. ELEMENTOS DO CRIME CULPOSO.
Diante do conceito apresentado, possvel extrair os seguintes elementos:
1.1. Conduta Voluntria.
A culpa a vontade do agente, limitada prtica de uma conduta perigosa, por ele aceita e desejada. Pode
ser praticada por ao ou omisso, que no se destina produo do resultado material, porm, conhecia a sua
possibilidade de ocorrncia.
1.2. Violao do dever objetivo de cuidado.
A vida em sociedade retira do homem o direito de fazer tudo o que desejar, quando e onde, do modo que
quiser. Os interesses das outras pessoas bem como a vida em comunidade lhes impem limites intransponveis.
Assim, o dever objetivo de cuidado trata-se de um comportamento imposto pelo ordenamento jurdico a
todas as pessoas, visando o regular e pacfico convvio social.
O crime culposo, nesse contexto, ocorre quando o agente, com uma prtica de uma conduta descuidada,
desrespeita tal norma, por imprudncia, negligncia ou impercia, as trs modalidades de culpa existentes em
nosso ordenamento.
a) Imprudncia: a forma positiva (in agendo) que consiste na atuao do agente sem observncia das
cautelas necessrias. uma ao, intempestiva e irrefletida.
b) Negligncia: a inao, modalidade negativa de culpa (in omitendo), consistente na omisso em relao
conduta que se devia praticar.
c) Impercia: tambm chamada de culpa profissional, a culpa que ocorre no exerccio de arte, profisso ou
ofcio. No se confunde com o erra profissional, onde o agente age conforme manda o dever objetivo de cuidado,
contudo, a falha da cincia, no devendo ser responsabilizado.
1.3. Resultado naturalstico involuntrio.
Trata-se de elementar do tipo penal, ou seja, a modificao do mundo exterior com a prtica da conduta
culposa.
Todo crime culposo, por consequncia, integra o grupo dos crimes materiais. O sistema penal brasileiro no
admite crimes culposos de mera conduta.
1.4. Nexo causal.
Como ocorre nos demais crimes materiais, verifica-se a relao de causa e efeito da conduta culposa
praticada em consonncia com o resultado naturalstico involuntrio.
Aplica-se a teoria conditio sine qua non, CP, art. 13, verificando que o resultado material ocorrido, ainda que
involuntrio, no teria ocorrido se o agente houvesse observado as normas de cuidado objetivo.
1.5. Tipicidade.
Sendo elemento do fato tpico nos crimes materiais consumados, a tipicidade precisa ser verificada tambm
nos crimes culposos, fazendo-se um juzo de subsuno da conduta praticada no mundo real e a descrio tpica
contida na lei penal.
1.6. Previsibilidade objetiva.
a possibilidade de uma pessoa comum, com inteligncia mediada, prever a possibilidade de ocorrncia do
resultado. o chamado homem mdio (homo medius).
Portanto, verifica-se que a previsibilidade do resultado objetiva, por levar em conta o fato concreto e um
elemento padro (homem mdio) de aferio, e no o agente.
Importante anotar que o estudo em questo se faz perante a teoria do crime: fato tpico + ilicitude +
culpabilidade. Assim, quando se analisa o crime em seara de fato tpico e ilicitude, observam-se as condies do
fato, com a anlise sob um paradigma padronizado, o homem mdio. As condies especficas do agente sero
analisadas em seara de culpabilidade.
1.7. Ausncia de previso.
Em regra, o delito culposo ocorre porque o agente no consegue enxergar aquilo que o homem mdio
consegue prever, atingindo, assim, o resultado material involuntrio.
Excepcionalmente, h a previso do resultado (culpa consciente).
2. ESPCIES DE CULPA.
2.1. Culpa inconsciente e culpa consciente.
Baseia-se na previso do agente acerca do resultado naturalstico, provocado por sua conduta.
Culpa inconsciente, sem previso ou ex ignorantia aquela em que o agente no prev o resultado
objetivamente previsvel.
Culpa consciente, com previso ou ex lascvia a que ocorre quando o agente, aps prever o resultado,
objetivamente previsvel, realiza a conduta acreditando em sua habilidade, acreditando que no ocorrer.
Essa espcie de culpa representa o estgio mais avanado da culpa, aproximando-se do dolo eventual. Na
culpa consciente o sujeito no quer o resultado, nem assume o risco de produzi-lo. Ele espera, sinceramente, que
no ocorra, apesar de saber que possvel. No dolo eventual, o agente no somente prev o resultado, mas,
apesar de no querer, aceita-o como uma das alternativas possveis. A diferena reside no subjetivo do agente.
2.2. Culpa prpria e culpa imprpria.
Baseia-se na inteno de produzir o resultado naturalstico.
Culpa prpria a que se verifica quando o agente no quer o resultado, nem assume o risco de produzi-lo.
a culpa propriamente dita.
Culpa imprpria, tambm chamada de culpa por extenso, por equiparao ou por assimilao, aquela em
que o sujeito, aps prever o resultado, realiza a conduta por erro inescusvel quanto ilicitude do fato.
A gente incide em erro, supondo uma situao ftica que, se existisse, tornaria a ao lcita. Contudo, como
esse erro poderia ter sido evitado pela prudncia de um homem mdio, responder pelo delito na modalidade
culposa. Na verdade, a conduta do agente em produzir o resultado naturalstico revela o dolo, contudo, por razes
de poltica criminal, e punido na modalidade culposa, pois, se soubesse da real situao de fato, no teria agido.
Essa espcie de culpa a nica que comporta a tentativa, justamento por seu carter hbrido, a culpa
imprpria possui um dolo tratado como culpa, admitindo-se a tentativa.
2.3. Culpa mediata ou indireta.
a espcie de culpa que ocorre quando o sujeito produz o resultado indiretamente a ttulo de culpa.
Essa culpa consiste em fato com relao estreita e realmente eficiente no tocante ao resultado naturalstico,
no podendo se confundir com a mera condio ou ocasio do ocorrido.
2.3. Culpa presumida.
Tambm chamada de culpa in re ipsa, tratava-se de espcie de culpa admitida pela legislao penal anterior
ao Cdigo Penal vigente.
Foi abolida do atual ordenamento por constituiu uma verdadeira responsabilidade penal objetiva.
3. GRAUS DE CULPA.
No passado, buscou-se dividir a culpa em graus, quanto sua intensidade. Assim, seria culpa grave aquela
onde qualquer agente era capaz de prever o resultado; leve aquela que ocorreria nos casos em que um homem de
inteligncia mediana poderia antever os resultados; e, por fim, levssima, aquela em que o resultado se afigura
perceptvel somente a pessoas de excepcional cautela e inteligncia, aproximando-se do caso fortuito.
O Direito Penal brasileiro refuta a diviso da culpa em graus. Ou h a culpa, e, por corolrio, a
responsabilizao do agente; ou no h culpa, sendo o fato irrelevante.
4. COMPENSAO DE CULPAS.
O Direito Penal no admite a compensao de culpas. Diante do carter pblico da sano penal como
consequncia da conduta ilcita, a culpa do agente no pode ser anulada pela culpa da vtima.
Essa compensao tem incidncia apenas no direito privado. Em seara penal, a culpa da vtima apenas
funciona como circunstancia favorvel ao acusado, sopesada pelo magistrado na fixao da pena (CP, art.
59, caput).
Somente h excluso da culpa do agente quando h a culpa exclusiva da vtima. Denota-se que houve
observncia ao dever objetivo de cuidado pelo agente, que agiu prudentemente, sem negligencia ou impercia.
5. CONCORRNCIA DE CULPAS.
o que se verifica quando duas ou mais pessoas concorrem, contribuem culposamente, para a produo do
resultado naturalstico.
Respondem pelo resultado em face da teoria da conditio sine que non, CP, art. 13, contudo, no havendo
coautoria ou participao, em razo da ausncia de vnculo subjetivo.
6. CARTER EXCEPCIONAL DO CRIME CULPOSO.
Nos termos do CP, art. 18, h consagrado em nosso ordenamento o princpio da excepcionalidade do crime
culposo, ou seja, ningum poder ser punido por fato previsto como crime, seno quando o pratica dolosamente.
Assim, a modalidade culposa deve ser prevista pela lei. Havendo silncio legislativo, no h que se falar em
crime, restando ao crime somente a modalidade dolosa.
7. EXCLUSO DA CULPA.
Exclui-se a culpa do agente na produo do resultado material nos casos de:
a) Caso fortuito ou fora maior: so acontecimentos imprevistos, imprevisveis e inevitveis, que escapam
do controle da vontade do homem.
b) Erro profissional: a culpa pelo resultado naturalstico no do homem, que fez tudo o que estava ao seu
alcance, mas da cincia, que se mostrou inapta para enfrentar determinadas situaes.
c) Risco tolerado: por diversas maneiras, necessrias para a evoluo do homem e da prpria humanidade,
podem ser efetuadas atividades que proporcionam riscos calculados para bens jurdicos penalmente protegidos.
Assim, esses fatos se tornam impunveis diante da aceitao da sociedade.
d) Princpio da confiana: como o dever objetivo de cuidado se dirige a todas as pessoas, pode-se esperar
que cada um se comporte de forma prudente e razovel, necessria para a coexistncia pacfica em sociedade.
Presume-se a boa-f do todo o indivduo, no cumprimento das regras jurdicas impostas pelo Direito. Assim,
no haver culpa nos crimes eventualmente produzidos pela conduta ilcita praticada por outrem.
CRIME PRETERDOLOSO
O termo preterdolo emana do latim praeter dolum, ou seja, alm do dolo. Destarte, crime doloso ou
preterintencional, o que se verifica quando a conduta dolosa acarreta a produo de um resultado mais grave do
que o desejado pelo agente.
O propsito do autor era praticar um crime doloso, mas por culpa, sobreveio um resultado mais gravoso do
que o inicialmente pretendido. Resta caracterizada, portanto, a figura hbrida do crime preterdoloso, com dolo no
antecedente (minus delictum) e culpa no consequente (majus delictum).
Diante no misto entre dolo e culpa, o preterdolo classificado como um elemento subjetivo-normativo do
tipo penal, uma vez que o dolo atinge o elemento subjetivo do agente e a culpa reside num juzo de valor,
entendido como elemento normativo.
Nos termos do CP, art. 19, o agente somente responder pelo resultado mais grave se a culpa for provada, se
era previsvel, ainda que absoluta ou relativa. No se admite a figura da versari in re illicita que proclamava o
brocardo: qui in re illicita versatur tenetur etiam pro casu, ou seja, quem se envolve com coisa ilcita responsvel
tambm pelo resultado fortuito.
1. CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO.
aquele que possui uma conduta bsica, definida e apenada como delito de forma autnoma, nada obstante
ainda ostente um resultado que o qualifica, majorando-lhe a pena por fora da sua gravidade objetiva, desde que
exista entre eles relao causa fsica e subjetiva.
Todo crime qualificado pelo resultado representa um nico crime, crime complexo, pois resultado da juno
de dois ou mais delitos.
Alm do crime preterdoloso, existem outros crimes qualificados pelo resultado:
a) Dolo no antecedente e dolo no consequente: a exemplo do crime de latrocnio (CP, art. 157, 3, in fine).
A morte que sobrevm ao roubo pode ser culposa (crime preterdoloso) ou dolosa.
b) Culpa no antecedente e culpa no consequente: a conduta bsica e o resultado agravador so previstos na
forma culposa (CP, art. 258, in fine).
c) Culpa no antecedente e dolo no consequente: Lei 9.503/97 (Cdigo de Trnsito Brasileiro), art. 303,
pargrafo nico. O motorista culposamente dirige embriagado, mas dolosamente foge ao atropelar uma pessoa.
Calha anotar aqui a viso de Cezar Roberto Bitencourt, que distingue os crimes preterdolosos dos crimes
qualificados pelo resultado com fundamento diverso: "no crime qualificado pelo resultado, ao contrrio do
preterdoloso, o resultado ulterior, mais grave, deriva involuntariamente da conduta criminosa, lesando um bem
jurdico diverso do bem jurdico precedentemente lesado. Assim, enquanto a leso corporal seguida de morte seria
preterintencional (CP, art. 129, 3), o aborto seguido da morte da gestante seria crime qualificado pelo resultado
(CP, art. 125, 126 c/c 127).
ERRO DE TIPO
Erro a falsa percepo da realidade ou o falso conhecimento de determinado objeto. Ignorncia o
completo desconhecimento da realidade ou de algum objeto. O Cdigo Penal, entretanto, trata de forma idntica
esses institutos.
Portanto, estabelecido pelo CP, art. 20, erro de tipo a falsa percepo da realidade acerca dos elementos
constitutivos do tipo penal.
Para parte da doutrina, v.g., Damsio de Jesus, o erro de tipo o que incide sobre elementares e
circunstncias da figura tpica, tais como qualificadoras e agravantes genricas.
1. ESPCIES.
O erro de tipo pode ser escusvel ou inescusvel:
a) Erro de tipo escusvel, inevitvel, invencvel ou desculpvel: a modalidade de erro que no deriva de
culpa do agente, ou seja, mesmo que houvesse agido com as cautelas do homem mdio, no poderia evitar a falsa
percepo da realidade.
b) Erro de tipo inescusvel, evitvel, vencvel ou indesculpvel: a espcie de erro que provm da culpa do
agente, pois se houvesse agido com a cautela necessria, no teria incorrido no erro.
2. EFEITOS.
O erro de tipo, seja escusvel ou inescusvel, sempre exclui o dolo. Para caracterizar o crime doloso, devem
estar presentes todas as elementares do tipo penal.
No obstante, os efeitos da "cara negativa do dolo[1]" variam conforma a espcie. O erro escusvel exclui o
dolo e a culpa, acarretando impunidade total do fato. O erro vencvel, por sua vez, exclui o dolo, mas permite a
punio por crime culposo, se previsto em lei.
Excepcionalmente, pode haver o erro de tipo escusvel que no exclui a criminalidade do fato, operando a
desclassificao para outro delito. Ex: agente ofende pessoa, desconhecendo sua condio de funcionrio pblico.
O erro sobre a elementar do tipo afasta o crime de desacato (CP, art. 331) subsistindo, contudo, a injria (CP, art.
140).
3. ERRO DE TIPO E DELITO PUTATIVO POR ERRO DE TIPO.
Em que pese a proximidade terminolgica, esses institutos no se confundem:
Erro de tipo o desconhecimento ou falso conhecimento que o agente tem sobre as elementares do tipo
penal, no sabendo que o fato que pratica um ilcito penal.
J o crime putativo por erro de tipo o imaginrio ou erroneamente suposto, que existe exclusivamente na
mente do agente. Ele quer praticar o crime, mas por erro, pratica um ilcito penal. Ex: vende talco imaginando ser
cocana.
4. DESCRIMINANTES PUTATIVAS.
Nos moldes do CP, art. 20, 1, descriminante a causa que descrimina a conduta, exclui o crime, retirando o
carter ilcito do fato tpico praticado por algum. Trata-se de causa de excluso de ilicitude. Putativa o aparente,
parecido, algo imaginrio, erroneamente suposto.
Assim, descriminante putativa a causa de excluso de ilicitude que no existe concretamente, mas apenas
na mente do autor de um fato tpico. Nos termos do CP, art. 23, as causa de excluso da ilicitude tambm podem
ocorrer com o agente imaginando situao que no existe, erro justificvel pelas circunstncias: estado de
necessidade putativo, legtima defesa putativa, etc.
As descriminantes putativas relacionam-se com a figura do erro, de trs espcies:
a) erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de excluso da ilicitude: o agente encontra o seu
desafeto, que j o ameaou de morte, percebendo que ele coloca a mo no bolso, saca de um revlver o mata
antes. Supe achar-se em legtima defesa, mas errou sobre o elemento "agresso injusta".
b) erro relativo existncia de uma causa de excluso de ilicitude: sujeito flagra esposa em adultrio e
mata ambos, crendo que estaria acobertado pela legtima defesa da honra. O erro incide aqui sobre a
descriminante, no acolhida pela legislao ptria.
c) erro relativo aos limites de uma causa de excluso da ilicitude: o fazendeiro que resolve matar todos que
invadirem a sua propriedade. O erro repousa no excesso entre os bens jurdicos tutelados e a desproporcional
valorao.
Nas hipteses das letras "b" e "c", temos uma modalidade de erro de proibio. Assim, subsiste o dolo e a
culpa, excluindo-se a culpabilidade em caso de erro escusvel. Em caso de erro inescusvel, no se afasta a
culpabilidade, respondendo o agente nos termos do CP, art. 21, caput.
No que tange letra "a", a natureza da descriminante depende da teoria da culpabilidade adotada.
Para a teoria limitada da culpabilidade, trata-se de erro de tipo, onde se o erro foi escusvel, exclui-se o dolo
e a culpa, acarretando a atipicidade do fato (pois o dolo e a culpa residem na conduta, elemento do fato tpico); se
inescusvel, afasta-se o dolo subsistindo a responsabilidade pelo crime culposo, se houver (CP, art. 20, 1)[2].
Para a teoria normativa da culpabilidade, trata-se de erro de proibio. Logo, subsiste o dolo e a culpa,
excluindo-se a culpabilidade, se o erro foi inevitvel. Se evitvel, responde o agente por dolo, diminuindo-se a pena
de 1/6 a 1/3, conforme CP, art. 21, caput[3].
5. ERRO DETERMINADO POR TERCEIRO.
Cuida-se da hiptese na qual quem pratica a conduta tem uma falsa percepo da realidade no que diz
respeito aos elementos constitutivos do tipo penal em decorrncia da atuao de uma terceira pessoa, chamada
de agente provocador.
Assim, o agente no erra por conta prpria, mas por erro determinado por terceiro, de forma provocada, por
dolo ou culpa.
Conforme preceitua o CP, art. 20, 3, o agente provocador do erro responder conforme a sua conduta,
culposa ou dolosamente. O provocado, quando escusvel o erro em que incorreu, ser impune; quando
inescusvel, responder por culpa, se houver.
5.1. Erro determinado por terceiro e concurso de pessoas.
possvel que o agente provocador e o provocado pelo erro atuem dolosamente quanto produo do
resultado. Nesse caso, ambos respondero pelo crime praticado, na modalidade dolosa.
Se, contudo, o agente provocador atua culposamente, e o provocado dolosamente, inexiste concurso de
pessoas, uma vez que no h participao culposa em crime doloso. Assim, cada um responder por um delito
autnomo, na modalidade em que agiu.
6. ERRO DE TIPO ACIDENTAL.
o que recai sobre diversos dos elementos constitutivos do tipo penal, ou seja, sobre as circunstncias e
fatores irrelevantes da figura tpica. Nesse caso, a infrao penal subsiste e o erro no afasta a responsabilidade
penal.
Pode ocorrer nas seguintes situaes:
6.1. Erro sobre a pessoa (error in persona).
o que se verifica quando o agente confunde a pessoa visada para o crime, com pessoa diversa. Ex: quer
matar o "pai", mas o confunde com o "tio" e acaba por exterminar este ltimo.
Nos termos do CP, art. 20, 3, no importa as condies da vtima real, o agente ser responsabilizado como
se houvesse praticado o crime contra a vtima pretendida, isto , a vtima virtual, inclusive com as circunstncias
que qualificam o crime.
6.2. Erro sobre o objeto.
Nesse caso, o sujeito cr que a conduta recai sobre um determinado objeto, mas na verdade incide sobre
objeto diverso. Ex: querer furtar um "rolex", mas furtar um "ching ling".
O erro irrelevante e no interfere na tipicidade penal.
6.3. Erro sobre as qualificadoras.
O sujeito age com falsa percepo da realidade no que diz respeito a uma qualificadora do crime. Ex: furta
um carro com uma chave que achava ser falsa, mas era a verdadeira. O tipo permanece ntegro, mas a
qualificadora desaparece[4].
6.4. Erro sobre o nexo causal (aberractio causae).
Tambm chamado de dolo geral por erro sucessivo, o engano no tocante ao meio de execuo do crime,
que efetivamente determina o resultado almejado pelo agente.
O sujeito acredita ter alcanado o resultado e pratica nova conduta, com finalidade diversa, a sim atingindo
o resultado anteriormente pretendido. Trata-se de erro sobre a relao de causalidade. O dolo geral, irrelevante
para o Direito, devendo o agente responder pelo resultado naturalstico alcanado. Ex: sujeito ministra veneno ao
inimigo e, acreditando ter alcanado seu objetivo (morte), enterra o corpo tentando ocultar o cadver. A vtima,
contudo, falece em razo da asfixia por soterramento. O autor responder pelo homicdio qualificado mediante
emprego de veneno.
A despeito da posio acima, amplamente dominante na doutrina, h entendimentos diversos com base no
princpio do desdobramento, sustentando a ciso do elemento volitivo, devendo ao agente ser imputados dois
crimes distintos. No caso acima, responderia pela tentativa qualificada pelo veneno e pelo homicdio culposo pelo
soterramento.
6.5. Erro na execuo (aberracti ictus).
Previsto no CP, art. 73, consiste na aberrao no ataque, em relao pessoa atingida pela conduta
criminosa. O agente no se engana com relao pessoa, mas erra na execuo da conduta, atingindo pessoa
diversa.
Responder nos termos do art. 20, 3, considerando as condies da vtima que pretendia atingir.
O erro na execuo pode ocorrer com unidade simples, tambm chamado de resultado nico, quando o
agente atinge vtima diversa da pretendida; ou com unidade complexa, ou com resultado duplo, quando o agente,
alm da vtima pretendida, atinge tambm pessoa diversa, culposamente. Responder nos termos do CP, art.
70, caput.
Se, contudo, o erro na execuo com unidade complexa consistir numa atitude de dolo eventual por parte do
agente, responder pelos delitos em concurso formal imprprio ou imperfeito, pois a pluralidade de resultados
deriva de desgnios autnomos, ou seja, dolos diversos para a produo de resultados.
6.6. Resultado diverso do pretendido (aberractio delicti ou aberractio criminis).
Acha-se previsto no CP, art. 74, que disciplina a situao em que, por acidente ou erro na execuo do crime,
sobrevm resultado material diverso do pretendido. O erro no crime cometido. Ex: o sujeito atira uma pedra pra
quebrar uma janela (CP, art. 163) e atinge uma pessoa que passava pela rua (CP, art. 129).
Essa espcie de erro de tipo acidental pode ser, tambm, com unidade simples (resultado nico), onde o
agente realiza crime diverso do pretendido, respondendo por culpa; e com unidade complexa (resultado duplo),
onde o agente atinge tambm o fim desejado, dolosamente, utilizando-se a regra do concurso formal (CP, art. 70).
Importante anotar que, se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou o crime no tiver
modalidade culposa, deve-se desprezar o art. 74. Ex: sujeito atira contra desafeto e acaba por quebrar uma janela.
O crime de dano restaria absorvido pela tentativa incruenta (ou branca) de homicdio, se houvesse modalidade
culposa desse crime.
[1] Nome dado ao erro de tipo por Eugenio Ral Zaffaroni.
[2] Filiam-se a esse entendimento Damsio de Jesus e Francisco de Assis Toledo. Tambm acolheu essa teoria o Cdigo Penal,
com a reforma da parte geral trazida pela Lei 7.209/94, conforme art. 19 da Exposio de Motivos do Cdigo Penal.
[3] Partilham desse ensinamento Cezar Roberto Bitencourt e Guilherme de Souza Nucci.
[4] Importante lembrar que alguns autores, v.g., Damsio de Jesus, consideram o erro sobre as qualificadoras como erro de
tipo essencial.
ITER CRIMINIS
o caminho do crime, ou seja, as etapas percorridas pelo agente para a prtica de um fato previsto em lei
como infrao penal. Possui uma fase interna e uma externa.
1. FASE INTERNA: COGITAO.
Repousa na mente do agente, nela se formando a ideia de envereda pela empreitada criminosa. Acha-se
num claustro psquico, no se revelando em atos externos.
Por ser inofensivo a qualquer bem jurdico, o pensamento no alcanado pelo Direito Penal, conforme
brocardo: pensiero non paga gabela ou cogitationis poenan nemo partitur.
A cogitao se distribui em trs momentos: idealizao, deliberao e resoluo.
2. FASE EXTERNA.
2.1. Preparao.
A etapa da preparao consiste nos atos indispensveis prtica da infrao penal, municiando-se, o agente,
dos elementos necessrios para a concretizao da sua conduta ilcita, criando condies para a efetivao da
infrao penal.
Geralmente, os atos preparatrios no so punidos, nem mesmo de forma tentada, conforme CP, art. 14, II.
Excepcionalmente, podem ser punidos nas formas em que a lei optou por incrimin-los de forma autnoma. So os
chamados crimes-obstculo (CP, arts. 253, 286, 288, 291 e outros).
2.2. Execuo.
Inicia-se com a agresso efetiva ao bem jurdico tutelado por meio da realizao do ncleo do tipo penal. O
agente comea a realizar o verbo descritivo do crime, tornando o fato punvel. Este ato deve ser idneo e
inequvoco.
Idneo por se revestir da capacidade suficiente de lesar o bem jurdico por si s, de modo concreto.
Inequvoco por se direcionar ao ataque direto do bem jurdico almejado, fornecendo certeza da vontade ilcita.
2.3. Transio dos atos preparatrios para os atos executrios.
Um dos maiores problemas do Direito Penal estabelecer o momento exato de transio dos atos
preparatrios para os atos executrios.
Diante das inmeras teorias que intentam solucionar os impasses do tema, ainda no se tem um mtodo
infalvel para essa distino. Portanto, nos casos de irredutvel dvida, o magistrado dever pronunciar o non
liquet, ou seja, a falta de provas, negando a existncia da tentativa.
Vejamos as teorias:
a) Teoria Subjetiva: no h transio dos atos preparatrios para os atos executrios. O que interessa o
plano interno do autor, a sua vontade. Logo, punvel tambm a cogitao.
b) Teoria Objetiva: os atos executrios dependem do incio da realizao do tipo penal. imprescindvel a
exteriorizao dos atos preparatrios, idneos e inequvocos para a produo do resultado naturalstico. Essa
teoria se divide em:
Teoria da hostilidade ao bem jurdico: atos executrios so aqueles que atacam o bem jurdico[1].
Teoria objetivo-formal ou lgico-formal: ato executrio aquele que se inicia com a realizao do verbo
contido na conduta criminosa. Exige a penetrao no ncleo do tipo penal. a preferida pela doutrina ptria[2].
Teoria objetivo-material: atos executrios so aqueles em que se comea a prtica do ncleo do tipo e
tambm os imediatamente anteriores ao incio da conduta tpica, do ponto de viso de uma terceira pessoa, alheia
aos fatos[3].
Teoria objetivo-individual: atos executrios so os relacionados ao incio da conduta tpica e tambm os
imediatamente anteriores, em conformidade com o plano concreto do autor[4].
2.4. Consumao.
Ocorre o crime consumado quando nele se renem todos os elementos de sua definio legal (CP, art. 14, I).
Trata-se de um crime completo, perfeito.
Nos crimes materiais aperfeioa-se com a supervenincia do resultado naturalstico. Nos crimes formais ou
de mera conduta, com a simples atividade do agente.
Nos crimes qualificados pelo resultado, incluindo os preterdolosos, ocorre com a produo do resultado
agravador, doloso ou culposo.
Nos crimes de perigo concreto, com a mera exposio a perigo do bem jurdico tutelado. Nos crimes de
perigo abstrato, com a mera prtica de conduta considerada pela lei como perigosa.
Os crimes permanentes, a consumao se arrasta no tempo. Nos crimes habituais, a consumao se d
reiteradas vezes, pois cada ato representa um indiferente penal.
3. EXAURIMENTO.
Tambm chamado de crime exaurido ou crime esgotado, o delito que, posteriormente consumao,
subsistem efeitos lesivos derivados da conduta do autor.
No terreno da tipicidade, o exaurimento no compe o iter criminis, que se encerra com a consumao. Influi
apenas da dosimetria da pena, notadamente na aplicao da pena-base, como circunstncia judicial, conforme CP,
art. 59, caput.
Em alguns casos, o exaurimento pode funcionar como qualificadora (CP, art. 329, 1) u como causa de
aumento de pena (CP, art. 317, 1).
[1] Idealizada por Max Ernst Mayer e aceita por Nelson Hungria e Jos Frederico Marques.
[2] Surgiu dos estudos de Fran Von Liszt.
[3] Criada por Reinhart Frank e adotada pelo Cdigo Penal Portugus, art. 22.
[4] Remonta a Hans Welzel e defendida por Eugenio Ral Zaffaroni e Jos Henrique Pierangeli.
TENTATIVA
Como bem define o CP, art. 14, II, tentativa o incio de execuo de um crime que somente no se consuma
por circunstncias alheias vontade do agente.
tambm conhecida por outros rtulos como: conatus, crime imperfeito ou ainda, como define Zaffaroni,
crime incompleto.
A tentativa composta de trs elementos: (1) incio da execuo; (2) ausncia de consumao por
circunstncias alheias vontade do agente; e (3) dolo de consumao.
Com relao sua natureza jurdica, a tentativa trata-se de uma norma de extenso ou ampliao da
conduta, uma vez que no goza de autonomia dentro das definies do Cdigo Penal. Ela reclama um tipo penal
especfico, na modalidade consumada, em combinao com o art. 14, II, antecipando a tutela penal em relao aos
atos executrios prvios consumao do resultado naturalstico intentado.
1. TEORIAS SOBRE A PUNIBILIDADE DA TENTATIVA.
Dentre as inmeras teorias que buscam fundamentar a punibilidade da tentativa, quatro se destacam:
a) Teoria subjetiva, voluntarstica ou monista: ocupa-se da vontade criminosa, que pode se revelar tanto na
fase dos atos preparatrios como tambm durante a execuo. O sujeito punido pela inteno, importando o
desvalor de sua ao.
b) Teoria sintomtica: idealizada por Ferri, Lombroso e Garofalo, sustenta a punio em razo da
periculosidade objetiva, isto , do perigo representado pelo agente, permitindo a punio de atos preparatrios.
c) Teoria objetiva, realstica ou dualista: a tentativa punida em face do perigo proporcionado ao bem
jurdico tutelado pela lei penal. Sopesam-se o desvalor da ao e o desvalor do resultado. Pune-se a tentativa com
pena inferior do crime consumado.
d) Teoria da impresso ou objetivo-subjetiva: representa um limite teoria subjetiva, evitando o alcance
desordenado dos atos preparatrios. Pune-se a tentativa somente quando os atos preparatrios so suficientes
para ferir o sentimento de segurana jurdica e comover a confiana na vigncia do ordenamento normativo.
Nos termos do CP, art. 14, II, denota-se que o ordenamento penal ptrio adotou a teoria objetiva, realstica
ou dualista ao determinar que a pena de tentativa deve corresponder do crime consumado, diminuda de 1/3 a
2/3.
De modo excepcional, aceita-se a aplicao da teoria subjetiva, voluntarstica ou monista, consagrada pela
expresso "salvo disposio em contrrio". So os casos de crime de atentado ou de empreendimento, cujas
modalidades tentada e consumada comportam punies equivalentes (CP, art. 352 e Lei 4.737/65 Cdigo
Eleitoral art. 309).
2. CRITRIO PARA DIMINUIO DE PENA.
A tentativa constitui causa obrigatria de diminuio da pena. Incide na terceira fase da aplicao da pena
privativa de liberdade e sempre a reduz.
O critrio decisivo para a diminuio corresponde distncia percorrida no iter criminis, conforme
entendimento do STF. Quanto mais distante da consumao, maior ser a diminuio.
3. COMPETNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS.
Para verificar se o crime tentado se enquadra no conceito de infrao penal de menor potencial ofensivo, a
causa de diminuio de pena deve ser aplicada em sua frao mnima sobre a pena mxima. Se o resultado for
inferior a dois anos, competente o Juizado Especial Criminal para o julgamento da causa.
4. CDIGO PENAL MILITAR.
O Cdigo Castrense orienta-se tambm pela aplicao da teoria objetiva, com nica exceo apresentada no
art. 30.
5. ESPCIES DE TENTATIVA.
a) Tentativa branca (incruenta): a modalidade onde o objeto material no atingido pela conduta
criminosa.
b) Tentativa vermelha (cruenta): nesta espcie, o objeto material atingido pela atuao do agente, porm,
a consumao no ocorre.
c) Tentativa perfeita, acabada (crime falho): nesta tentativa, o agente esgota todos os meios executrios
que estavam sua disposio, e mesmo assim no sobrevm a produo do resultado naturalstico, por
circunstancias alheias sua vontade. Pode ser cruenta ou incruenta.
d) Tentativa imperfeita, inacabada (tentativa propriamente dita): o agente inicia a execuo sem, contudo,
utilizar todos os meios que tinha ao seu alcance. O crime tambm no se consuma por circunstancias alheias ao
seu intento.
6. TENTATIVA E CRIME DE MPETO.
Crimes de mpeto so os cometidos sem premeditao, como decorrncia de reao emocional repentina.
H argumentos na doutrina no sentido de que o mpeto afastaria a viabilidade de anlise do iter criminis,
ante sua atuao repentina e a impossibilidade decorrente de fracionamento dos atos executrios.
No o entendimento que prevalece. Nelson Hungria, com peculiar competncia, repele esse entendimento,
acreditando ser possvel o conatus tanto nos crimes de mpeto quando nos crimes refletidos, posto que a
indagao do animus no pode deixar de ser feita ab externo, diante das circunstncias objetivas.
7. TENTATIVA E DOLO EVENTUAL.
A doutrina admite a tentativa nos crimes cometidos com dolo eventual, equiparando a conduta, nos termos
do CP, art. 18, I, ao dolo direto, consignando que a necessidade de provar o incio da execuo de um crime que
no se consuma de ordem processual, em nada interferindo na tipicidade do fato, que resta provado.
Entretanto, parte respeitvel da doutrina defende posio contrria, inadmitindo a tentativa nos crimes com
dolo eventual, fundamentando a tese no sentido de que o art. 14, II baseou a tentativa na teoria da vontade (CP,
art. 18, I, 1 parte), excluindo-a do alcance do dolo eventual, acolhido pela teoria do assentimento ou
consentimento (CP, art. 18, I, in fine).
8. INADMISSIBILIDADE DA TENTATIVA.
Regra geral, os crimes dolosos so compatveis com a tentativa, pouco importando sejam materiais, formais
ou de mera conduta.
A admissibilidade ou no da tentativa tem a ver, de fato, com a plurissubsistncia do delito, isto , na
possibilidade de fracionamento da conduta em diversos atos executrios.
Assim, os crimes formais e de mera conduta, desde que plurissubsistentes, admitem o conatus. Algumas
espcies, contudo, no admitem a tentativa. Vejamo-las:
a) Crimes culposos: nesses crimes, o resultado material involuntrio, contrrio inteno do agente. Essa
regra se excepciona no que diz respeito culpa imprpria, que se trata, na verdade, de dolo, punido a ttulo de
culpa por razes de poltica criminal.
b) Crimes preterdolosos: nestes crimes o resultado agravador culposo, no desejado pelo agente. Assim,
no se compactua a tentativa.
c) Crimes unissubsistentes: so aqueles em que a conduta exteriorizada mediante um nico ato, suficiente
para alcanar a consumao. Ou alcana e configura o crime, ou no alcana e se revela um fato atpico.
d) Crimes omissivos prprios (ou puros): ingressam no grupo dos crimes unissubsistentes. Ou h crime ou
no h fato tpico. Os crimes omissivos imprprios admitem a tentativa, ante a possibilidade de fracionamento da
conduta.
e) Crimes de perigo abstrato: tambm se enquadram no bloco acima. Os crimes de perigo concreto
comportam tentativa.
f) Contravenes penais: no h tentativa por expressa previso legal. Decreto-Lei 3.688/1941, art. 4.
g) Crimes condicionados: so aqueles cuja punibilidade est sujeita produo de um resultado legalmente
exigido (CP, art. 122).
h) Crimes subordinados a condio objetiva de punibilidade: tal como ocorre em relao aos crimes
falimentares (Lei 11.101/05, art. 180).
i) Crime de atentado (ou de empreendimento): no h tentativa uma vez que a figura tentada recebe pena
igual destinada ao crime consumado (CP, art. 352).
j) Crimes com tipo penal composto de condutas amplamente abrangentes: nesses casos, impossvel
dissociar a tentativa da consumao (Lei 6.766/79, art. 50, I).
k) Crimes habituais: so aqueles compostos por reiterao de atos que demonstram um estilo de vida do
agente. Cada ato isolado representa um indiferente penal (CP, art. 284, I).
DESISTNCIA VOLUNTRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ
Trata-se da composio do dispositivo do art. 15 do Cdigo Penal.
So formas de tentativa abandonada, onde a consumao do delito no ocorre por vontade do prprio
agente, que interrompe o processo executrio ou, esgotada a execuo, emprega diligncias eficazes para impedir
o resultado.
O fundamento poltico-criminal da desistncia voluntrio e do arrependimento eficaz o estmulo ao agente
para evitar a produo do resultado de um crime cuja execuo j se iniciou, onde lhe perfeitamente possvel
alcanar o resultado material.
Por esse motivo, Franz von Liszt se referia a eles como a "ponte de ouro" do Direito Penal, pios era a forma
capaz de o agente retornar seara da licitude. De fato, esses institutos originam-se do direito premial, onde o
Estado concede ao criminoso tratamento penal mais favorvel, como um prmio, em face da no produo do
resultado voluntrio.
1. NATUREZA JURDICA.
Acerca da natureza jurdica, trs correntes dissentem sobre o tema:
a) Causa pessoal de extino da punibilidade: embora no prevista pelo CP, art. 107, a desistncia voluntria
e o arrependimento eficaz retiram o jus puniendi estatal[1].
b) Causa de excluso da culpabilidade: se o agente no produziu o resultado voluntariamente o resultado
desejado, afasta-se o juzo de reprovabilidade em relao a este, respondendo pelo crime mais brando
cometido[2].
c) Causa de excluso da tipicidade: afasta-se a tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente,
subsistindo apena a tipicidade dos atos j praticados. a posio dominante na jurisprudncia e mais aceita pela
doutrina[3].
2. DESISTNCIA VOLUNTRIA.
Na desistncia voluntria, o agente, por ato voluntrio, interrompe o processo executrio do crime,
abandonando a prtica dos demais atos necessrios sua disposio para a consumao do delito.
Nos crimes omissivos imprprios, a desistncia voluntria reclama uma atuao positiva, pela qual o autor do
delito impede a produo do resultado, deixando de no agir.
3. ARREPENDIMENTO EFICAZ.
Tambm chamado de resipiscncia, ocorre quando depois de praticados todos os atos executrios
suficientes consumao do crime, o agente adota providncias aptas a impedir a produo do resultado.
Revela-se possvel somente nos crimes materiais, visto que a legislao penal consagra a expresso "impede
que o resultado se produza". Ademais, nos crimes formais, a mera realizao da conduta implica na consumao
automtica do delito.
4. REQUISITOS.
Para a caracterizao da desistncia voluntria e do arrependimento eficaz, so comuns os requisitos da
voluntariedade e eficcia.
Assim, os atos que desistem de prosseguir na conduta ou impedem que o resultado acontea devem ser
voluntrios, livres de coao fsica ou moral, ainda que a ideia venha de terceira pessoa; tambm devem ser
eficazes, ou seja, o resultado naturalstico efetivamente no deve ocorrer, sob pena de subsistncia da
responsabilidade pelo crime consumado.
Os motivos que levaram o agente a evitar o resultado so irrelevantes para o Direito, bastando a
voluntariedade e a eficcia para a excluso da tipicidade.
5. EFEITOS.
O agente no responde pela forma tentada do crime inicialmente desejado, mas somente pelos atos j
praticados.
Esses institutos so incompatveis com os crimes culposos, salvo na culpa imprpria, uma vez que nesses
tipos de conduta, o resultado material involuntrio.
Em caso de adiamento da empreitada criminosa para posterior continuao, prevalece o entendimento de
que h desistncia voluntria. Contudo, no caso de execuo retomada, onde o agente visa dar sequencia aos atos
criminosos em momento posterior, sem desistir da conduta, no h desistncia voluntria.
6. COMUNICABILIDADE.
No caso em que "A" contrata "B" para matar "C". "B", quando est para consumar o delito, desiste ou se
arrepende, contra a vontade de "A". Questiona-se se os efeitos da desistncia voluntria e do arrependimento
eficaz so comunicveis no concurso de pessoas,
A doutrina no unnime:
Uma primeira corrente, defendida por Heleno Claudio Fragoso, sustenta o carter subjetivo desses
institutos, defendendo a manuteno da responsabilidade do partcipe no tocante tentativa abandonada pelo
autor.
Uma segunda corrente, ensinada por Nelson Hungria, apregoa o carter misto objetivo e subjetivo da
desistncia voluntria e do arrependimento eficaz, com a consequente aplicao da regra prevista pelo CP, art. 30,
excluindo a responsabilidade do partcipe. a posio dominante em nossa legislao.
7. TENTATIVA QUALIFICADA.
A tentativa chamada de qualificada quando contm em seu bojo outro delito, de menor gravidade, j
consumado.
Na desistncia voluntria e no arrependimento eficaz opera-se a excluso da tipicidade do crime inicialmente
desejado pelo agente. Resta, contudo, a responsabilidade penal pelos atos j consumados, que configuram um
crime autnomo, de menor gravidade.
ARREPENDIMENTO POSTERIOR
Conforme preceitua o CP, art. 16, causa pessoal e obrigatria de diminuio da pena que ocorre quando o
autor de um crime, praticado sem violncia ou grave ameaa pessoa, voluntariamente e at o recebimento da
denncia ou queixa, restitui a coisa ou repara o dano provocado por sua conduta.
Por no influir na adequao tpica do fato concreto, seria melhor tratar desse tema em sede de teoria da
pena. Contudo, o legislado inseriu o arrependimento posterior na teoria geral do crime visando diferenci-lo do
arrependimento eficaz.
O arrependimento posterior, pela sua natureza jurdica de causa pessoal e obrigatria de diminuio de
pena, tem incidncia na terceira fase de aplicao da pena privativa de liberdade.
Esse instituto alcana qualquer crime que com ele seja compatvel, incluindo a reparao em sede de dano
moral.
1. REQUISITOS.
Lendo o art. 16, possvel extrair os seguintes requisitos:
a) Natureza do crime: O crime deve ser praticado sem violncia ou grave ameaa pessoa. A violncia
contra a coisa ou a violncia culposa no excluem o benefcio.
Nos crimes praticados com a violncia imprpria, a doutrina se divide: parte da doutrina entende ser
aplicvel o arrependimento posterior, pois a lei somente exclui a violncia prpria; outra banda no admite o
benefcio, entendendo que violncia imprpria a violncia dolosa, reduzindo a possibilidade de resistncia da
vtima.
b) Reparao do dano ou restituio da coisa: Essa atitude deve ser voluntria, pessoal e integral.
c) Limite temporal: a reparao do dano ou restituio da coisa deve ocorrer at o recebimento da denncia
ou queixa.
Se ocorrer aps esse momento, mas antes do julgamento, aplica-se a atenuante genrica do CP, art. 65, III,
"b", in fine.
2. COMUNICABILIDADE.
O arrependimento posterior possui natureza objetiva. Por corolrio, comunica-se aos demais coautores e
partcipes do crime, na forma do CP, art. 30.
3. CRITRIOS PARA A REDUO DA PENA.
Conforme preceitua o dispositivo legal, a reduo da pena deve ocorrer, obrigatoriamente, de 1/3 a 2/3,
devendo ser calculado com base na celeridade e na voluntariedade da reparao do dano ou restituio da coisa.
4. RECUSA DO OFENDIDO EM ACEITAR.
Ainda que a vtima no aceita a reparao do dano ou a restituio da coisa, seja qual for o motivo, o agente
no estar privado do benefcio.
Poder o agente entregar a coisa a autoridade policial ou em juzo, reparando o dano e consignando a
atitude judicialmente, ainda que a vtima rejeite tal conduta.
5. DISPOSITIVOS ESPECIAIS ACERCA DA REPARAO DO DANO.
5.1. Peculato Culposo.
Nos termos do CP, art. 312, 3, a reparao do dano, se anterior sentena irrecorrvel, extingue a
punibilidade; se lhe posterior, reduz de metade a pena imposta.
Note-se que essa regra afasta a aplicabilidade do arrependimento posterior no caso.
5.2. Juizados Especiais Criminais.
A composio dos danos civis entre o autor do fato e o ofendido, em casos de crimes de ao penal privada
ou ao penal pblica condicionada representao, acarreta na renncia ao direito de queixa ou representao,
com a consequente extino da punibilidade, conforme estabelecido pela Lei 9.099/95, art. 70, pargrafo nico.
5.3. Apropriao indbita previdenciria.
Aqui tambm se torna inaplicvel o instituto do arrependimento posterior, conforme preceito do CP, art.
168-A, que extingue a punibilidade do agente quando se repara o dano antes da ao fiscal.
5.4. Smula 554 do Supremo Tribunal Federal.
Conforme disposto pelo STF, na smula 554, "o pagamento de cheque emitido sem proviso de fundos, aps
o recebimento da denncia, no obsta ao prosseguimento da ao penal".
A interpretao dessa smula, a contrario sensu, permite verificar que, havendo o pagamento do cheque at
o recebimento da denncia, impede o prosseguimento da ao penal. Atualmente, o STJ limita a aplicao desse
smula ao art. 171, 2, VI.
Importa destacar que o STJ j decidiu que o pagamento da dvida resultante da emisso dolosa de cheques
sem fundos, ainda que posteriormente ao recebimento da denncia ou queixa, importa na extino da
punibilidade.
[1] Adotadas por Nelson Hungria, E. Magalhes Noronha, Anbal Bruno, Eugenio Ral Zaffaroni, etc.
[2] Comungam desse entendimento Hans Welzel e Claus Roxin.
[3] Filiam-se a essa posio Jos Frederico Marques, Heleno Cludio Fragoso, Basileu Garcia e Damsio E. de Jesus.
CRIME IMPOSSVEL
Preceito fixado no CP, art. 17, que se verifica quando, por ineficcia absoluta do meio ou absoluta
impropriedade do objeto, jamais se possvel ocorrer a consumao do delito.
A doutrina tambm chama o crime impossvel de tentativa inadequada, tentativa inidnea ou tentativa
impossvel. De fato, esse instituto guarda relao com a tentativa, todavia, o emprego de meios ineficazes ou o
ataque a objetos imprprios inviabilizam a produo do resultado, inexistindo exposio do bem jurdico tutelado a
perigo.
Assim, trata-se de causa de excluso da tipicidade, eis que o fato praticado pelo agente no se enquadra em
nenhum tipo penal[1].
1. TEORIAS SOBRE O CRIME IMPOSSVEL.
1.1. Teoria Objetiva.
Essa teoria apregoa que a responsabilizao de algum pela prtica de determinada conduta depende de
elementos objetivos e subjetivos (dolo e culpa).
Assim, quando a conduta no tiver o mnimo de potencialidade para lesar o bem jurdico, em razo do meio
empregado pelo agente ou pelas condies do objeto material, no se configura a tentativa. o que se chama de
inidoneidade (absoluta ou relativa).
Essa teoria se subdivide em duas:
a) Teoria Objetiva Pura: por esse vertente, o Direito Penal somente pode proibir condutas lesivas a bens
jurdicos, devendo apenas se preocupar com os resultados produzidos no mundo exterior. Assim, se a conduta foi
incapaz de lesar o bem jurdico, independentemente se a inidoneidade absoluta ou relativa, o fato impune.
b) Teoria Objetiva Temperada ou Intermediria: para a caracterizao do crime impossvel e, por corolrio,
afastamento da tentativa, os meios empregados ou o objeto material do crime devem ser absolutamente
inidneos. Se a inidoneidade for relativa, restar caracterizada a tentativa. a teoria consagrada pelo CP, art. 17.
1.2. Teoria Subjetiva.
Leva em conta a inteno do agente, manifestada por sua conduta, pouco importando se os meios por ele
empregados ou o objeto do crime eram idneos ou no.
Assim, mesmo havendo idoneidade absoluta ou relativa, haver a tentativa.
1.3. Teoria Sintomtica.
Essa teoria preocupa-se com a periculosidade do autor e no com o fato praticado. Assim, mesmo diante da
tentativa ou do crime impossvel, percebe-se a manifestao temerria do agente, que incapaz de obedecer s
regras jurdicas impostas. Destarte, justifica-se, em qualquer caso, a aplicao de medida de segurana.
2. ESPCIES.
A simples leitura do CP, art. 17,revela a existncia de duas espcies de crime impossvel:
a) Crime impossvel por ineficcia absoluta do meio empregado: ocorre quando o meio de execuo
escolhido pelo agente incapaz de alcanar o resultado pretendido.
A inidoneidade absoluta do meio deve ser verificada especificamente em cada caso concreto, jamais em
abstrato.
b) Crime impossvel por impropriedade absoluta do objeto: trata-se do objeto material, compreendido
como a coisa ou pessoa sobre a qual recai a conduta criminosa.
A impropriedade absoluta do objeto deve restar caracterizada antes do incio da execuo do crime, ou o
tempo suficiente para tornar impossvel a sua consumao.
A mera existncia do objeto material j suficiente, por si s, para a existncia do conatus, que tambm se
vislumbra no caso de impropriedade relativa do objeto.
O momento adequado para a aferio da inidoneidade absoluta do meio ou objeto depois da prtica da
conduta com a qual se deseja consumar o crime.
3. ASPECTOS PROCESSUAIS.
A comprovao do crime impossvel acarreta a ausncia de tipicidade do fato, ou seja, torna o fato atpico.
Em seara de investigao criminal, o Ministrio Pblico deve requerer o arquivamento do inqurito policial.
Se j oferecida a denncia, esta deve ser rejeitada, nos termos do CPP, art. 395, III. Se j recebida a denncia,
o ru dever ser absolvida, nos termos do CPP, art. 386, III.
Em se tratando de crime de competncia do tribunal do jri, o acusado dever ser absolvido sumariamente,
conforme CPP, art. 415, III.
Calha anotar que o habeas corpus no instrumento adequado para o trancamento da ao penal que tenha
como objeto crime impossvel, pois nessa ao constitucional no cabvel a produo de provas para aferir a
inidoneidade do meio ou do objeto.
4. CRIME PUTATIVO.
Putativo deriva do latim putativus, que significa imaginrio. Trata-se de algo aparente, mas no real. Logo,
crime putativo, tambm chamado de crime imaginrio ou erroneamente suposto, o que existe apenas na mente
do agente, que acredita violar a lei penal, mas a sua conduta, na verdade, no constitui adequao tpica.
Diferencia-se do crime impossvel pelo fato de que, enquanto no crime impossvel a absoluta ineficcia do
meio ou a absoluta impropriedade do objeto retira a tipicidade da conduta, no crime putativo a tipicidade sequer
chega a existir, repousando somente no estado psquico do agente.
Pode ocorrer de trs formas:
a) Crime putativo por erro de tipo: o crime imaginrio que se verifica quando o autor acredita ofender
uma lei penal incriminadora efetivamente existente, mas faltam sua conduta elementos do tipo penal. Ex: vender
talco achando que droga.
b) Crime putativo por erro de proibio: a equivocada crena do agente recai sobre a ilicitude do fato, pois
supe violar uma lei penal inexistente. Ex: bater o carro num poste e fugir, achando que cometeu uma infrao
penal.
c) Crime putativo por obra do agente provocador: tambm chamado de crime de ensaio, crime de
experincia ou flagrante provocado, verifica-se quando algum, insidiosamente, induz pessoa a cometer conduta
criminosa e, simultaneamente, adota medidas para impedir a consumao.
A consumao, nesse caso, deve ser absolutamente impossvel, sob pena de configurao da tentativa.
Esse crime putativo compe-se de dois atos> induo e impedimento. Conforme Nelson Hungria, o crime
ocorre somente na aparncia. Na realidade, o autor apenas o "protagonista inconsciente de uma comdia".
Conforme sumulado pelo STF, sob o n 145, no h crime quando a preparao pelo agente provocador do
crime torna a sua consumao impossvel.
Contudo, importante verificar a diferena do crime putativo por obra do agente provocador, ou flagrante
provocado, com o flagrante esperado. Nesse caso, a deflagrao do processo executrio do crime
responsabilidade do agente, razo pelo qual a conduta se torna punvel.
[1] Ante da reforma da parte geral do Cdigo Penal, a doutrina chamava o crime impossvel de "quase-crime", uma vez que
impunham ao autor do crime impossvel a medida de segurana de liberdade vigiada. Embora ainda utilizado por parte da
doutrina, o termo "quase-crime" no mais se faz conveniente, ante a configurao de atipicidade da conduta realizada.
I L I C I T U D E
Decreto-Lei n 2.848 de 7 de dezembro de 1940.
ILICITUDE
Ilicitude a contrariedade entre o fato tpico praticado por algum e o ordenamento jurdico, capaz de
lesionar ou expor a perigo de leso bens jurdicos penalmente tutelados.
Diante do conceito bipartido de crime, adotado pelo Cdigo Penal, trata-se da segunda anlise para a
existncia do delito, aps o juzo de tipicidade.
1. ILICITUDE FORMAL E ILICITUDE MATERIAL.
Ilicitude formal a mera contradio entre o fato praticado pelo agente e o sistema jurdico em vigor.
Ilicitude material (ou substancial) o contedo material do injusto, que reside no carter antissocial do
comportamento, na ofensa aos valores sociais.
Em sede doutrinria, prevalece o entendimento de que a anlise do crime em nosso ordenamento se faz pela
ilicitude formal, consistindo no exame da presena ou ausncia das causas de excluso da ilicitude. O aspecto
material se reserva ao campo da tipicidade.
Com o escopo de encerrar essa discusso, surgiu na Alemanha uma concepo unitria de ilicitude,
afirmando que o comportamento humano que se coloca em antagonismo com o ordenamento jurdico jamais
deixar de ofender seus bens tutelados.
Assim, surge a lio de que a ilicitude uma s, pois ou h leso ao bem jurdico ou no h ilicitude na
conduta.
2. TERMINOLOGIAS.
Grande parte da doutrina utiliza o termo "antijuridicidade" como sinnimo de ilicitude.
Data vnia os ilustres pensadores criminais, no se faz correta tal assertiva. Com efeito, no universo da teoria
geral do direito, a infrao penal constitui um fato jurdico, j que sua ocorrncia provoca modificaes no mundo
exterior e no mbito jurdico.
Assim, no seria certo que um fato jurdico (crime) poderia ser, ao mesmo tempo, antijurdico. O Cdigo
Penal tambm preferiu o termo "ilicitude", conforme art. 23.
De outra banda, tambm se faz uso do termo "injusto", assemelhando ilicitude. Aqui tambm no se
acerta.
A ilicitude o antagonismo entre um fato tpico e o ordenamento jurdico. Injusto, por seu turno, a
contrariedade entre o fato tpico e o comportamento social acerca da justia. Assim, ser possvel a existncia de
um fato tpico, ilcito, mas considerado justo pela sociedade, como o linchamento de um estuprador de crianas.
3. ILICITUDE GENRICA E ILICITUDE ESPECFICA.
Ilicitude genrica a que se posiciona externamente ao tipo penal incriminador. O fato tpico se encontra, de
maneira genrica, contrrio ao ordenamento jurdico, a exemplo do homicdio.
Ilicitude especfica aquela que se alojam em seu interior elementos atinentes ao carter ilcito do
comportamento, exemplo do crime de violao de correspondncia.
4. ILICITUDE OBJETIVA E ILICITUDE SUBJETIVA.
Essa classificao diz respeito ao carter da ilicitude.
Deste modo, para a ilicitude subjetiva, a proibio ou o mandamento da lei penal dirige-se apenas s pessoas
imputveis, que tem capacidade mental para compreender as vedaes impostas pelo ordenamento jurdico.
Notria a confuso dessa classificao com a culpabilidade.
Para a ilicitude objetiva suficiente a contrariedade entre o fato tpico praticado e o ordenamento jurdico.
As notas pessoais do agente sero verificadas no mbito da culpabilidade, restando at aqui caracterizada a
ilicitude do fato. a forma utilizada pelo Direito Penal em vigor.
5. ILICITUDE PENAL E EXTRAPENAL.
Essa classificao guarda relao com o carter fragmentrio do Direito Penal, onde todo ilcito penal
tambm ato ilcito perante os outros ramos do Direito, mas nem todo ato ilcito guarda essa natureza no campo
penal.
6. CAUSAS DE EXCLUSO DA ILICITUDE.
O Direito Penal acolhe a teoria da tipicidade como indcio da ilicitude, ou seja, presume-se que todo
comportamento humano previsto em lei como infrao penal seja ilcito.
Trata-se de uma presuno relativa (juris tantum), pois o fato tpico poder ser lcito, desde que o agente
esteja acobertado por uma das causas de excluso da ilicitude.
Vrias so as denominaes usadas pela doutrina para se referir s causas de excluso da ilicitude,
destacando-se: causas de justificao, justificativas, descriminantes, tipos penais permissivos e eximentes[1].
O Cdigo Penal estabelece as causas de excluso de ilicitude no art. 23, utilizando a expresso no h
crime (nas causas de excluso da culpabilidade o tipo penal prev a expresso isento de pena). Estas so as
chamadas causas genricas de excluso da ilicitude, aplicveis a qualquer espcie de infrao penal, pois esto
previstas na parte geral.
As causas especficas ou especiais de excluso da ilicitude esto previstas na parte especial do Cdigo Penal,
com aplicao nica a determinados crimes, ou seja, queles que especificamente se referem. Ex: art. 128, 142,
146, 3, I, 150, 3, I e II e 156, 2. Tambm podem estar previstas na legislao extrapenal, conforme Lei
6.538/78, art. 10, Cdigo Civil, art. 1210, 1 ou Lei 9.605/98, art. 37, I.
6.1. Elementos objetivos e subjetivos das causas de excluso de ilicitude.
A doutrina discute se o reconhecimento de uma causa de excluso da ilicitude depende somente dos
requisitos legalmente previstos, relacionados ao aspecto exterior do fato, ou se est condicional tambm a um
requisito subjetivo, atinente ao psiquismo do agente, que deve ter conscincia que age sob a proteo da
justificativa.
A concepo objetiva, mais antiga, alega que o direito positivo no exige o requisito subjetivo. Basta que a
finalidade atual do agente esteja conforme a norma jurdica[2].
A concepo subjetiva, que, aos poucos, foi tomando espao da anterior, reconhece que uma causa de
excluso de ilicitude reclama o conhecimento da situao justificante pelo agente[3].
6.2. Causas de excluso de ilicitude e aspectos processuais.
A comprovao de uma causa de excluso da ilicitude acarreta a ausncia de uma condio da ao penal.
Em seara de investigao criminal, o Ministrio Pblico deve requerer o arquivamento do inqurito policial.
Se j oferecida a denncia, esta deve ser rejeitada, nos termos do CPP, art. 395, II. Se j recebida a denncia,
o ru dever ser absolvido sumariamente, nos termos do art. 397, I.
Em se tratando de crime de competncia do tribunal do jri, o acusado dever ser absolvido sumariamente,
conforme CPP, art. 415, IV.
6.3. Causas supralegais de excluso da ilicitude.
Prevalece na doutrina e na jurisprudncia o entendimento de que as causas de excluso da ilicitude no se
limitam s hipteses previstas em lei. Estende-se quelas situaes que resultam do direito em vigor e suas fontes.
Trata-se de uma eximente que no ofende o princpio da reserva legal, uma vez que no agrava o poder
punitivo do Estado, mas operam em sentido contrrio.
Essa causa supralegal de excluso de ilicitude chamada de consentimento do ofendido, entendido como a
anuncia do titular do bem jurdico ao fato tpico praticado por algum.
Trs teorias buscam fundamentar o consentimento do ofendido:
Ausncia de interesse: no h interesse do Estado em aplicar o Direito Penal quando o prprio titular do
bem jurdico disponvel no tem essa vontade.
Renncia proteo do Direito Penal: o sujeito passivo renuncia proteo do Direito Penal em favor do
sujeito ativo da infrao.
Ponderao de valores: a teoria mais aceita. O consentimento funciona como causa de justificao
quando o Direito concede prioridade ao valor da liberdade de atuao da vontade frente ao desvalor da conduta e
do resultado causado.
O consentimento cabvel unicamente em relao a bens jurdicos disponveis, sendo que o titular desse
bem deve ser pessoa fsica ou jurdica. No se faz presente a causa supralegal de excluso da ilicitude por
consentimento do ofendido quando o interesse metaindividual ou pertence sociedade ou ao Estado.
Para ser eficaz, o consentimento do ofendido h de preencher os seguintes requisitos: expresso, livre, moral
(respeitando os bons costumes), prvio e sujeito passivo plenamente capaz.
No h obstculo excluso da ilicitude nos crimes culposos como decorrncia do consentimento do
ofendido. Ex: vtima de acidente de trnsito que aquiesceu imprudncia do agente.
No Brasil no h que se falar em consentimento presumido, posto que tais situaes se amoldam
perfeitamente ao estado de necessidade, a ser visto posteriormente.
Tambm possvel que o consentimento do ofendido afaste a tipicidade da conduta, ocorrendo nos crimes
onde o comportamento humano se revele como requisito do tipo penal. Ex: CP, art. 148, 150 e 213.
[1] Importante anotar que o termo "dirimente" nada tem a ver com o campo da ilicitude. Em verdade, significa causa de
excluso da culpabilidade.
[2] A essa posio filiaram-se Jos Frederico Marques e E. Magalhes Noronha.
[3] A essa posio filiam-se Anbal Bruno, Heleno Cludio Fragoso, Julio Fabbrini Mirabete, Francisco de Assis Toledo e Damsio
de Jesus.
ESTADO DE NECESSIDADE
Conforme preceito do CP, art. 24, estado de necessidade a causa de excluso da ilicitude que depende de
uma situao de perigo, caracterizada pelo conflito de interesses lcitos que se soluciona pela autorizao do
ordenamento jurdico para o sacrifcio de um deles em preservao do outro.
Tem natureza jurdica de causa de excluso da ilicitude, A despeito da divergncia doutrinria que discute se
o estado de necessidade seria uma faculdade (Nelson Hungria) ou um direito (Anbal Bruno), trata-se de direito
subjetivo do ru, pois, presentes os requisitos legais, o juiz deve conceder a benesse, comunicvel a todos os
coautores e partcipes.
1. TEORIAS.
a) Teoria unitria: para essa teoria, o estado de necessidade causa de excluso da ilicitude, desde que o
bem sacrificado seja de igual valor ou de valor inferior ao bem jurdico preservado. Assim, exige-se a razoabilidade
na conduta do agente.
Foi a teoria adotada pelo CP, art. 24. Se o interesse sacrificado for superior ao preservado, subsiste o crime,
diminuindo-se a pena (CP, art. 24, 2).
b) Teoria diferenciadora: com alicerce no princpio da ponderao de bens e deveres, diferencia o estado de
necessidade justificante (excludente da ilicitude) e o estado de necessidade exculpante (excludente da
culpabilidade).
H estado de necessidade justificante com o sacrifcio de bem jurdico de menor relevncia do que o bem
protegido. No estado de necessidade exculpante, o bem jurdico sacrificado pode ser de valor igual ou at mesmo
superior ao bem protegido. Configura a inexigibilidade de conduta diversa. No Brasil, o estado de necessidade
exculpante somente foi adotado pelo CPM, art. 39.
c) Teoria da equidade: prega a manuteno da ilicitude e da culpabilidade. A ao em estado de necessidade
no correta, mas no pode ser punida por razes de equidade.
d) Teoria da escola positiva: pugna pela manuteno da ilicitude. Todavia, o ato deve permanecer impune
por ausncia de perigo social e temibilidade do agente.
2. REQUISITOS.
A anlise dos dispositivos penais que instituem o estado de necessidade no ordenamento penal ptrio
revelam alguns requisitos cumulativos para a sua configurao.
2.1. Situao de necessidade.
a) Perigo atual: o perigo a exposio do bem jurdico a uma situao real de probabilidade de dano,
oriunda da natureza, seres irracionais ou mesmo de atividade humana[1]. Esse perigo deve ser atual ou iminente
(h dissenso na doutrina quanto ao iminente, pois alguns no admitem sua presena, posto que a lei no dispes
expressamente, como fez no art. 25).
b) Perigo no provocado voluntariamente pelo agente: no caber estado de necessidade no caso em que o
prprio sujeito, voluntariamente, provocou o perigo.
Aqui a discusso reside no termo "voluntariamente". Essa conduta voluntria abrange a forma dolosa e
culposa?
Parte da doutrina entende que a palavra 'voluntrio' requer conhecimento, vontade, dolo. Assim, quem age
culposamente criando uma situao de perigo poderia valer-se do estado de necessidade[2].
Outra banda sustenta que a atuao culposa tambm voluntria em sua origem, diante da imprudncia,
negligncia ou impercia, com as quais o Direito no pode cooperar[3]. Ademais, em interpretao sistemtica do
Cdigo Penal, art. 13, 2, "c", vislumbra-se tal assertiva.
c) Ameaa a direito prprio ou alheio: no Brasil, qualquer bem jurdico, desde que legtimo, pode ser
protegido quando enfrentar um perigo concreto, capaz de configurar o estado de necessidade.
d) Ausncia do dever legal de enfrentar o perigo: o disposto no CP, art. 24, 1. Fundamenta-se apenas na
vontade de evitar que pessoas que tem o dever legal de enfrentar situaes perigosas se esquivem de faz-lo
injustificadamente.
Aqui h uma celeuma doutrinria com relao expresso "dever legal".
Para uma primeira corrente, a expresso deve ser interpretada restritivamente, cuja abrangncia do termo
decorre de lei[4].
Uma segunda corrente afirma que a expresso h de ser interpretada extensivamente, compreendendo
qualquer espcie de dever jurdico[5]. Parece ser a mais acertada.
2.2. Fato necessitado.
a) inevitabilidade do perigo por outro modo: o fato necessitado, isto , a conduta lesiva ao bem jurdico,
deve ser absolutamente imprescindvel para evitar a leso ao bem jurdico.
Apresenta, assim, um ntido carter subsidirio, uma vez que o estado de necessidade deve ser utilizado em
ultimo caso, se no houver outro modo de se proteger o bem ameaado.
b) proporcionalidade: tambm chamado de razoabilidade, refere-se ao cotejo de valores, ou seja, relao
de importncia entre o bem jurdico sacrificado e o bem jurdico preservado no caso concreto.
Conforme teoria unitria adotada pelo CP, art. 24, o bem preservado deve ser de valor igual ou superior ao
bem sacrificado.
3. ESPCIES.
A diviso do estado de necessidade leva em conta alguns critrios:
3.1. Quanto ao bem sacrificado:
Justificante: o bem sacrificado de valor igual ou inferior ao bem preservado. Exclui a ilicitude.
Exculpante: o bem sacrificado de valor superior ao bem preservado. A ilicitude mantida, mas pode
afastar a culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa.
3.2. Quanto titularidade do bem jurdico preservado:
Prprio: protege-se bem jurdico pertencente ao autor do fato necessitado.
De terceiro: o autor do fato necessitado tutela bem jurdico alheio.
3.3. Quanto origem da situao de perigo:
Agressivo: aquele em que o agente pratica o fato necessitado contra bem jurdico pertencente a
terceiro inocente. O autor deve indenizar o dano suportado por terceiro (CC, art. 929) cabendo ao
de regresso contra o causador do perigo (CC, art. 930).
Defensivo: aquele em que o agente pratica o fato necessitado contra bem jurdico pertencente
quele que causou o perigo.
3.4. Quanto ao aspecto subjetivo do agente:
Real: a situao de perigo efetivamente existe. Exclui a ilicitude.
Putativo: a situao no existe, mas o autor do fato necessitado a considera presente. A ilicitude
mantida, podendo ser afastada a culpabilidade em caso de erro escusvel. Se inescusvel, subsiste a
culpabilidade, responsabilizando o agente por crime culposo (CP, art. 20, 1).
4. ESTADO DE NECESSIDADE RECPROCO.
a ocasio em que duas ou mais pessoas, simultaneamente, acham-se em estado de necessidade, umas
contra as outras. Afasta-se a ilicitude do fato. Um grande exemplo desse caso a obra "o caso dos exploradores de
caverna", ou ainda a famosa "tbua de salvao", no caso de nufragos, narrado por Basileu Garcia.
5. CASOS ESPECFICOS DE ESTADO DE NECESSIDADE.
Alm da regra geral delineada pelo CP, art. 24, o ordenamento prev, na parte especial do cdigo, outros
casos de estado de necessidade.
CP, art. 128, I, permitindo o aborto necessrio ou teraputico;
CP, art. 146, 3, inexistindo constrangimento ilegal em interveno mdica-cirrgica necessria.
CP, art. 150, 3, II, inexistindo violao de domiclio quando adentra-se a residncia para resguardar
interesse maior;
CP, art. 151, 153 e 154.
6. SITUAES EXCEPCIONAIS.
6.1. Estado de necessidade e crimes permanentes e habituais.
Em regra, no se aplica a justificativa no campo dos crimes permanentes e habituais, uma vez que no h
atualidade do perigo e inevitabilidade do fato necessitado.
Num caso isolado, a jurisprudncia reconheceu essa possibilidade em crime habitual de exerccio de arte
dentria (CP, art. 282) em zona rural carente de profissional habilitado.
6.2. Estado de necessidade e erro na execuo.
O estado de necessidade compatvel com a aberractio ictus (CP, art. 73), onde o agente, visando afastar o
perigo, erra nos meios de execuo e atinge pessoa ou objeto diverso do desejado.
6.3. Estado de necessidade e dificuldades econmicas.
A dificuldade econmica, inclusive com a miserabilidade do agente, no comporta estado de necessidade.
Em casos excepcionais, admite-se a prtica de fato tpico como medida inevitvel para a satisfao de
necessidade estritamente vital que a pessoa, no obstante o seu empenho, no conseguiu alcanar de forma lcita.
[1] Pode advir at mesmo do prprio agente. Ex: suicida pula no mar, se arrepende e rouba barco pra no morrer afogado.
[2] Compartilham desse entendimento Anbal Bruno, Basileu Garcia, Damsio de Jesus e Heleno Cludio Fragoso.
[3] Aqui esto E. Magalhes Noronha, Jos Frederico Marques, Francisco de Assis Toledo e Nelson Hungria.
[4] Nelson Hungria.
[5] Bento Faria, Costa e Silva e Galdino Siqueira.
LEGTIMA DEFESA
O instituto da legtima defesa corresponde a um comportamento de defesa inerente ao humana quando
injustamente agredido. Em razo de sua compreenso como direito natural, esse instituto foi aceito por
praticamente todos os sistemas jurdicos, quase sempre como causa de excluso da ilicitude, desde as mais
remotas civilizaes.
sabido que o Estado avocou para si a funo jurisdicional de proteger os direitos, contudo, seus agentes
no podem estar em todos os lugares ao mesmo tempo, razo pela qual no possvel exigir-se o sacrifcio do
direito protegido pela inao do indivduo, para buscar a reparao em momento posterior.
Acha-se previsto no CP, art. 25, sendo uma causa de excluso da ilicitude (CP, art. 23, II), onde h uma
conduta que, ao repelir injusta agresso, atual ou iminente, visa assegurar direito prprio ou alheio.
1. REQUISITOS.
A anlise do art. 25 revela a dependncia da legtima defesa dos seguintes requisitos cumulativos: (1)
agresso e (2) reao.
1.1. Agresso.
toda ao ou omisso exclusivamente humana, consciente e voluntria, que lesa ou expe a perigo de
leso um bem ou interesse consagrado pelo ordenamento jurdico.
No pode ser efetuada por animal, pela falta de conscincia e voluntariedade. Assim, repelir agresso de
animal recai na excluso da ilicitude pelo estado de necessidade. Nada impede, contudo, que os animais sejam
utilizados como instrumentos do crime, ocasio em que a legtima defesa ser contra o dono do animal.
A agresso pode emanar de um inimputvel, posto que o fato agressor por ele cometido tpico e ilcito,
faltando-lhe apenas a culpabilidade[1].
A agresso tambm pode ocorrer por meio de omisso, quando esta se apresenta idnea a causa dano,
quando o omitente tinha o dever jurdico de agir. Ex: carcereiro que tinha o dever de libertar o preso cuja pena
havia vencido.
No obstante o requisito "agresso", ela deve vir acompanhada de trs elementos:
a) agresso injusta: aquela de natureza ilcita, contrria ao direito. No se exige que seja contrria ao
ordenamento penal, mas apenas que o ofendido no esteja obrigado a suport-la. Ex: furto de uso. aceita, ainda
que de forma culposa.
b) agresso atual ou iminente: atual a agresso presente, j iniciada e no concretizada. Iminente a
agresso prestes a ocorrer. A agresso futura (remota) ou passada (pretrita) no autoriza a ao em legtima
defesa.
c) agresso a direito prprio ou alheio: qualquer bem jurdico pode ser protegido pela legtima defesa, ainda
que pertencente a outra pessoa, com amparo no princpio da solidariedade humana.
A reao contra a legtima defesa de terceiros pode atingir at mesmo o prprio titular do bem jurdico
protegido. Ex: "A", percebendo que "B" est prximo de uma overdose, o atinge com uma madeira para deix-lo
desacordado e, assim, salv-lo.
Em suma, todo patrimnio jurdico do indivduo que se deve ter por inviolvel, deve ser defendido, repelindo
a injusta agresso com a fora necessria, seja de pessoa fsica, jurdica, de um feto (direito do nascituro) ou at
mesmo de um cadver (respeito famlia).
1.2. Reao.
Reao a conduta que repele a agresso, utilizando-se dos meios necessrios para defender o bem jurdico
tutelado.
a) reao com os meios necessrios: so os meios de que dispe o ofendido para repelir a injusta agresso,
atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, no momento em que praticada. A reao trata-se de uma medida
protetiva destinada aos bens jurdicos, portanto, no deve funcionar como uma punio ao agente agressivo, mas,
como forma de defesa, deve ser a menos lesiva possvel.
A anlise do cabimento dos meios necessrios deve ser feita caso a caso. Muitas vezes no se pode calcular a
resposta do ofendido, visto que at mesmo pode ser a reao totalmente desproporcional agresso, contudo, era
a nica defesa disponvel no momento. Assim, restar caracterizada a legtima defesa.
Se o meio empregado for desnecessrio, estar configurado o excesso, doloso culposo ou exculpante.
Tambm no se impe ocommodus discessus, ou seja, o agredido no est obrigado a procurar a sada mais
cmoda e menos lesiva para escapar do ataque injusto.
b) Uso moderado dos meios necessrios: o emprego dos meios necessrios para repelir a injusta agresso
deve ser caracterizado pelo uso moderado desses meios, ou seja, suficientemente proporcional para que se possa
cessar o ataque. Assim como no estado de necessidade, tambm na legtima defesa se reclama a
proporcionalidade entre os bens jurdicos em conflito, cujos bens sacrificados devem ser iguais ou de valores
inferiores ao bem protegido, sob pena de se configurar o excesso.
2. LEGTIMA DEFESA E ALGUMAS SITUAES.
2.1. Legtima Defesa e a Vingana.
A legtima defesa possui um carter de reao que deve estar presente nos momentos objetivo e subjetivo
da conduta.
A agresso deve estar configurada e a reao deve estar consciente na mente do ofendido. Contudo, nada
impede que se ajunte ao seu psquico um desejo pessoal de vingana, desde que no exceda os limites da
necessidade de defesa.
2.2. Legtima Defesa e o Desafio.
Nesse caso, no h que se falar em legtima defesa. Falta o elemento "injusta agresso", devendo os
contendores responder pelos crimes praticados.
2.3. Legtima Defesa contra a Multido.
Prevalece o entendimento pela sua admissibilidade, pois o instituto no limita a conduta humana a um s
indivduo.
Importante anotar que h entendimento contrrios que inserem no contexto uma conduta em estado de
necessidade, diante do comportamento grupal da agresso.
2.4. Legtima Defesa contra Pessoa Jurdica.
perfeitamente possvel, uma vez que a pessoa jurdica exterioriza suas vontades atravs de representantes,
humanos, que podem praticar agresses injustas.
2.5. Legtima Defesa nas relaes familiares.
Nesse caso, duas situaes distintas podem ser visualizadas: (1) agresses dos pais contra filhos; e (2)
agresses entre cnjuges.
Na relao entre pais e filhos, os castigos moderados inserem-se no campo do exerccio regular de direito,
impedindo a interveno de terceiras pessoas. Se, entretanto, forem imoderados e excessivos, caracterizam
agresso injusta, possibilitando a legtima defesa.
Nas relaes conjugais, cabvel a legtima defesa por qualquer um deles contra agresso injusta, em face da
igualdade prevista pela CF, art. 226, 5.
2.6. Legtima Defesa e aberractio ictus.
Se, ao repelir injusta agresso, o agente atinge pessoa diversa da que pretendia ou alm da pessoa diversa,
tambm a pessoa pretendida, subsiste a seu favor a legtima defesa.
A regra do CP, art. 73 aplicvel tambm em efeitos de excluso da ilicitude.
2.7. Legtima Defesa de terceiro e consentimento do ofendido.
Questiona-se: par ao exerccio da legtima defesa de terceiro necessrio o seu consentimento para ser
protegido de uma injusta agresso?
Depende da natureza do bem jurdico atacado.
Se o bem jurdico em risco indisponvel, ser prescindvel o consentimento do ofendido, diante da
valorao entre os bens em questo.
Diversa concluso, porm, quando se tratar de bem jurdico disponvel, impondo-se o consentimento do
ofendido, se possvel a sua obteno. Se essa no for obtida, restar caracterizada a legtima defesa putativa.
3. ESPCIES.
Para a diviso da legtima defesa, alguns critrios se fazem presentes:
3.1. Quanto forma de reao:
a) agressiva (ou ativa): aquela em que a reao contra a agresso injusta configura um fato previsto em
lei como infrao penal.
b) defensiva (ou passiva): a conduta que repele a injusta agresso no constitui fato tpico.
3.2. Quanto titularidade do bem jurdico protegido:
a) prpria: o agente defende os bens jurdicos de sua titularidade.
b) de terceiro: o agente protege bens jurdicos alheios.
3.3. Quanto ao aspecto subjetivo de quem se defende:
a) real: a espcie em que se encontram todos os fatos previstos no CP, art. 25. Essa conduta exclui a
ilicitude do fato.
b) putativa (ou imaginria): aquela em que o agente, por erro, acredita existir uma situao de
agresso injusta.
A anlise aqui se protrai para o campo da culpabilidade. O fato tpico permanece ilcito, mas se o erro for
escusvel, operar-se- a iseno de pena, excluindo-se a culpabilidade. Se inescusvel, subsistir a culpabilidade,
devendo o agente responder por delito culposo, se previsto em lei (CP, art. 20, 1).
c) subjetiva (ou excessiva): aquela em que o agente, por erro de tipo escusvel, excede os limites da
legtima defesa. tambm chamada de excesso acidental. No responde pelo excesso, por sua natureza acidental.
3.4. Legtima Defesa da honra.
A honra constitui direito fundamental do homem, inviolvel por expressa disposio constitucional (CF, art.
5, X).
O CP, em seu art. 25, no faz distino entre os bens jurdicos, concluindo-se, portanto, admissvel o alcance
da legtima defesa pela honra. Entretanto, ela no pode ser isoladamente considerada, ma destacada em trs
aspectos:
a) respeito pessoal: engloba a dignidade e o decoro, admitindo-se a legtima defesa com o emprego de
fora fsica, necessria e moderada para que cesse os ataques por meio de injria, difamao e calnia.
b) liberdade sexual: em outras palavras, na livre disposio do corpo para fins sexuais, tambm se
autoriza a legtima defesa.
c) infidelidade conjugal: no passado, admitia-se a excluso da culpabilidade para os crimes passionais
motivados pelo adultrio. Atualmente, aps muita discusso e com a evoluo da sociedade, prevalece o
entendimento que a traio no humilha o cnjuge trado, mas o traidor, que no se mostra preparado para o
convvio familiar.
Assim, diante do carter fragmentrio e subsidirio do Direito Penal, o ordenamento jurdico prev outras
formas menos gravosas de resoluo desse impasse, como a separao, divrcio e ate mesmo indenizao, no
sendo necessria a atuao do Direito Penal. Esse entendimento se reforou pela descriminalizao do adultrio
(Lei 11.106/05).
3.5. Legtima Defesa Presumida.
A tipicidade funciona como indcio da ilicitude. Assim, todo fato tpico presume-se ilcito. Quem alega
qualquer excluso da ilicitude, tem invertido a seu desfavor o nus da prova, devendo provar a sua ocorrncia.
Por esse motivo, no se admite a legtima defesa presumida.
3.6. Legtima Defesa Sucessiva.
Constitui em legtima defesa contra o excesso de legtima defesa. possvel a sua ocorrncia, posto que o
excesso sempre caracteriza uma agresso injusta.
3.7. Legtima Defesa Preordenada.
???
4. ESTADO DE NECESSIDADE vs LEGTIMA DEFESA.
Ambas so causas legais de excluso da ilicitude, previstas no CP, art. 23, I e II, respectivamente.
Contudo, diferenciam-se claramente.
Na legtima defesa o perigo provm de uma agresso ilcita do homem e a reao dirigida contra seu autor.
No estado de necessidade agressivo o perigo originrio da natureza, se seres irracionais ou mesmo de ser
humano, mas a conduta defensiva lesiona bem jurdico de terceiro. No estado de necessidade defensivo, contudo,
o agente sacrifica bem de titularidade do causador do perigo.
No estado de necessidade tambm possvel que as agresses, em muitos casos, sejam lcitas, que no
exclui a possibilidade de eventual reao em defesa de direito.
possvel a existncia da legtima defesa simultnea com o estado de necessidade. Ex: "A", para defender-se
de "B", que injustamente buscava mat-lo, subtrai uma arma de fogo de "C", utilizando-a para matar seu agressor.
5. RELAO COM OUTRAS EXCLUDENTES: ADMISSIBILIDADE.
Conforme a disposio do CP, art. 25, a legtima defesa se faz admissvel nos seguintes casos:
a) Legtima defesa real contra Legtima defesa putativa: a legtima defesa real pressupe uma agresso
injusta, o que ocorre na legtima defesa putativa.
Ex: "A" caminha pela rua e v "B" com a mo sob a blusa. Acreditando ser um assalto, saca de uma arma
tentando se defender (legtima defesa putativa). "B", que buscava o celular em seu bolso, consegue desviar dos
tiros e saca de seu revlver para se defender (legtima defesa real).
Esse raciocnio aplicado a todas as demais excludentes da ilicitude putativas.
b) Legtima defesa putativa contra Legtima defesa putativa (Legtima defesa recproca): ocorre quando
dois ou mais agentes acreditam, erroneamente, haver uma agresso injusta contra o outro.
Ex: "A" encontra "B", antigo inimigo na rua. Ambos esto com as mos nos bolsos. Acreditando que sero
atacados, atacam um ao outro. Contudo, ambos tinham um bilhete com pedidos de desculpas nos bolsos.
c) Legtima defesa real contra Legtima defesa subjetiva: subjetiva (ou excessiva), ou excesso acidental,
aquela que o agente, por erro escusvel, ultrapassa os limites da legtima defesa. A partir do excesso, a agresso
torna-se injusta, permitindo a legtima defesa real.
d) Legtima defesa real contra Legtima defesa culposa: para a legtima defesa real importa somente o
carter injusto da agresso, independentemente do carter subjetivo do agente. Se a agresso trata-se de uma
suposta legtima defesa, onde o agente equivocou-se de forma culposa, permite-se a legtima defesa do ofendido.
e) Legtima defesa contra conduta amparada por causa de excluso da culpabilidade: cabvel a legtima
defesa contra qualquer agresso injusta, ainda que esteja amparada pela excluso da culpabilidade.
6. RELAO COM OUTRAS EXCLUDENTES: INADMISSIBILIDADE.
a) Legtima defesa real contra Legtima defesa real (Legtima defesa real recproca): no cabvel, pois o
pressuposto da legtima defesa a agresso injusta. A legtima defesa real no caracteriza agresso, mas defesa
justa de um bem jurdico injustamente agredido.
b) Legtima defesa real contra qualquer outra excludente real: se a outra excludente real, no h injustia
na agresso causada, motivo pelo qual se repele qualquer atitude em legtima defesa.
[1] Nelson Hungria defendia posicionamento contrrio, adotando a ideia de que os inimputveis seriam como os seres
irracionais, cuja conduta em defesa de suas agresses configuraria estado de necessidade.
ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL
Cuida-se de mais uma causa de excluso da ilicitude, prevista no CP, art. 23, III, 1 parte.
Diversamente do estado de necessidade e da legtima defesa, o Cdigo Penal no apresentou o conceito do
tema em comento. Contudo, podemos definir o estrito cumprimento do dever legal como a causa de excluso da
ilicitude que consiste na prtica de um fato tpico, em razo de cumprir o agente uma obrigao imposta por lei, de
natureza penal ou no.
A conduta tpica praticada pelo agente resta caracterizada como ltica diante da permisso do Estado em seu
comportamento. O agente no o faz porque quer, mas porque obedece a uma norma mandamental que engloba o
ordenamento jurdico, regras de organizao da sociedade em geral.
O dever legal engloba qualquer obrigao direta ou indiretamente resultante de lei. Assim, o
comportamento tpico estar acobertado pela excluso da ilicitude na modalidade de estrito cumprimento do
dever legal quando oriundo de lei, decreto, regulamentos e at mesmo atos administrativos. O dever moral, social
ou religioso no autoriza a excludente.
O destinatrio da excludente qualquer pessoa, agente pblico ou particular, que atua no cumprimento do
dever imposto por lei.
A excludente limitada e disciplinada em sua execuo. Portanto, o ato no poder exceder em nada os
limites legais a que est subordinado.
A excludente incompatvel com os crimes culposos, pois a lei no obriga ningum a agir com imprudncia,
negligncia ou impercia. Se houver, normalmente, a conduta se resolve pelo estado de necessidade.
Em caso de concurso de pessoas, o estrito cumprimento do dever legal estende-se aos demais envolvidos no
fato tpico, sejam coautores ou partcipes.
EXERCCIO REGULAR DE DIREITO
Trata-se de causa de excluso da ilicitude, conforme previso no CP, art. 23, III, in fine.
A doutrina costuma conceituar essa excludente como o fato que a norma, apesar de constitu-la como tpica,
outra norma a torna lcita, permitindo a sua conduta.
Em suma, conforme ensina Nelson Hungria, o direito um complexo harmnico de normas, no sendo
admissvel um real conflito entre estas. Assim, se uma norma jurdica incrimina um fato que, em determinados
casos, outra norma jurdica, penal ou extrapenal, permite ou impe, no h de se reconhecer, nesses casos, a
existncia de crime.
Funciona como o estrito cumprimento do dever legal, contudo, a norma no impe uma conduta ao agente,
mas lhe confere um direito, que deve ser exercido nos limites legais.
1. COSTUMES.
Costume, como se sabe, a reiterao uniforme de uma conduta, em face da convico de sua
obrigatoriedade.
Predomina o entendimento na doutrina de que o direito, cujo exerccio regular de direito autoriza a excluso
da ilicitude, deve estar previsto em lei.
No obstante a maioria doutrinria, h posicionamentos diversos[1].
2. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL vs EXERCCIO REGULAR DE DIREITO.
Em que pese ambas constiturem causas de excluso da ilicitude, ntidas divergncias podem ser
apresentadas:
De acordo com a sua natureza, o estrito cumprimento do dever legal compulsrio. O exerccio regular de
direito facultativo, pois ordenamento autoriza o agente a agir.
No que tange a sua origem, o estrito cumprimento do dever legal tem origem na lei, exclusivamente. O
exerccio regular de direito pode advir da lei, regulamentos e, para alguns, at mesmo do direito consuetudinrio.
3. LESES EM ATIVIDADES ESPORTIVAS.
A prtica de determinadas atividades esportivas pode resultar em leses corporais e, excepcionalmente, at
mesmo a morte.
O fato tpico decorrente da realizao de um esporte, configura exerccio regular de um direito, desde que
respeitadas as regras dos regulamentos, uma vez que o esporte no s permitido pela Constituio, como h
incentivo sua prtica.
Se, todavia, houver excesso na conduta do agente, resultando em leso decorrente da violao das regras
esportivas, responder pelo crime, doloso ou culposo.
4. INTERVENES MDICAS OU CIRRGICAS.
A atividade mdica ou cirrgica indispensvel para a sociedade e, por isso, regulamentada pelo Poder
Pblico, exigindo-se habilitao, atestada por rgos oficiais, par ao seu adequado exerccio.
Para a caracterizao da excludente em leses nesses casos, indispensvel o consentimento do paciente ou
de quem tenha qualidade para represent-lo, quando no puder faz-lo. Caso contrrio, restar caracterizado o
constrangimento ilegal (CP, art. 146).
Somente nos casos em que a interveno se d para salvar a vida do ofendido, ainda que sem o seu
consentimento, caracterizando a excludente em estado de necessidade.
Especialmente nos casos das "testemunhas de Jeov", a atuao do mdico que, independentemente de
autorizao judicial ou dos pais, efetua a transmisso de sangue para salvar a vida do paciente, estar acobertado
pela excludente do exerccio regular de direito. Com efeito, o direito vida deve sobrepor-se s posies religiosas.
5. OFENDCULAS.
Cuida-se dos meios defensivos utilizados para a proteo da propriedade e de outros bens jurdicos, tais
como a segurana familiar e a inviolabilidade do domiclio.
O titular do bem jurdico prepara previamente a defesa de perigo, remoto e incerto, deixando o seu
funcionamento posto somente em face da agresso atual ou iminente. Devem ser visveis, funcionando como meio
de advertncia.
A doutrina se divide acerca da espcie de excludente das ofendculas.
Uma primeira corrente entende trata-se de exerccio regular de direito, destacando-se o CC, art. 1210, 1.
a ideia de Anbal Bruno, Vicenzo Manzini e Giuseppe Bettiol.
Um segundo entendimento situa o tema como legtima defesa preordenada, alegando que o meio
predisposto somente funciona no momento da agresso, proporcionalmente, conduta lesiva. Jos Frederico
Marques e Magalhes Noronha.
Com relao aos meios mecnicos predispostos de defesa de propriedade, so aparelhos ocultos com a
mesma finalidade das ofendculas. Contudo, diante da emboscada preparada e a impossibilidade de defesa,
acarretam excesso punvel, por dolo ou culpa.
6. UTILIZAO DE CADVER PARA ESTUDOS E PESQUISAS CIENTFICAS.
Permitida a aplicao do exerccio regular de direito, excluindo a ilicitude da conduta tpica de vilipendio ou
destruio de cadver, diante da Lei 8.501/92, que permite a utilizao de cadver para estudos e pesquisas
cientficas, desde que atendidos os requisitos nela previstos.
[1] Jos Frederico Marques sustenta que o direito consuetudinrio pode justificar o fato tpico, excluindo a sua ilicitude.
EXCESSO
O Cdigo Penal, atendendo aos princpios do bom senso e da justia, estabeleceu as causa gerais de excluso
da ilicitude em seu art. 23, colocando em relao a cada uma delas os seus exatos limites.
Quando o agente ultrapassar esses limites, ou seja, exceder na conduta necessria na prtica do fato tpico,
cuja ilicitude seria apagada pela eximente, h o excesso, que acarreta a responsabilidade do agente, por dolo ou
culpa, conforme CP, art. 23, pargrafo nico.
Portanto, excesso a desnecessria intensificao de um fato tpico inicialmente amparado por uma causa
de justificao.
1. ESPCIES.
a) Doloso: ou consciente, o excesso voluntrio e proposital. O agente responder pelo crime autnomo
causado.
b) culposo: ou inconsciente, o excesso resultante de imprudncia, negligncia ou impercia, respondendo o
agente pelo crime culposo praticado.
c) acidental: ou fortuito, a modalidade que se origina de caso fortuito ou fora maior, eventos imprevisveis
e inevitveis. O excesso penalmente irrelevante.
d) exculpante: o excesso decorrente de profunda alterao de nimo do agente, isto , medo ou susto
provocado pela situao. O agente responde pelo excesso, no havendo previso legal que sustentaria uma
excludente.
e) intensivo: ou prprio, o que se verifica quando ainda esto presentes os pressupostos das causas de
excluso da ilicitude. a defesa de forma desproporcional. Trata-se de um crime autnomo, fora do contexto
ftico da excludente da ilicitude[1].
f) extensivo: ou imprprio, aquele e que no mais presentes esto os pressupostos das causas de excluso
da ilicitude. No h mais perigo e o agente ofende bem jurdico alheio, respondendo penalmente, por dolo ou
culpa, pelo excesso extensivo[2].
[1] Defendem essa tese Francisco de Assis Toledo, Nelson Hungria e Alberto Silva Franco.
[2] A essa vertente filiam-se E. Magalhes Noronha e Celso Delmanto.
I M P U T A B I L I D A D E P E N A L
Decreto-Lei n 2.848 de 7 de dezembro de 1940.
CULPABILIDADE
Numa concepo clssica, causalista, causal ou mecanicista da conduta, dolo e culpa se alojam no interior
da culpabilidade. Destarte, com a finalidade de evitar a responsabilidade penal objetiva, a culpabilidade
elemento do crime.
Assim, para a teoria causalista, o conceito de crime tripartido, sendo: "fato tpico, ilcito, praticado por
agente culpvel".
Sob uma viso finalista, o dolo e a culpa foram retirados da culpabilidade e inseridos no plano da conduta,
dentro do fato tpico, restando uma culpabilidade vazia. Assim, a teoria finalista, no campo analtico, analisa o
crime por dois critrios: bipartido e tripartido.
Para os que adotam a teoria tripartida, o crime continua sendo um fato tpico, ilcito e culpvel, mas o dolo e
a culpa so analisados na conduta e no na culpabilidade.
J de acordo com o conceito bipartido, crime todo fato tpico e ilcito. A culpabilidade deixa de ser
elemento do crime para funcionar como pressuposto de aplicao da pena[1].
1. CONCEITO.
Diante de uma viso finalista, trata-se de um pressuposto de aplicao da pena, que realiza um juzo de
censura e reprovabilidade, que incide sobre a formao e exteriorizao da vontade do responsvel pelo fato tpico
e ilcito, aferindo a necessidade da pena[2].
2. CULPABILIDADE PELO FATO.
No Estado Democrtico de Direito vigente, impera o Direito Penal do Fato, e no do autor. Assim, a
culpabilidade recai sobre o autor para aferir se deve ou no suportar a pena pelo fato cometido, pelo seu
comportamento, e jamais por quem ele .
3. FUNDAMENTO DA CULPABILIDADE.
A culpabilidade a responsvel por diferenciar a conduta do ser humano normal, apto ao convvio social, do
comportamento realizado por pessoas que no possuem a capacidade de discernir o carter ilcito de suas
condutas.
Essa anlise da culpabilidade leva em conta o perfil subjetivo do agente, e no a figura do homem mdio,
que analisado no fato tpico e na ilicitude.
4. EVOLUO DO CONCEITO.
O conceito de culpabilidade no foi apresentado pelo Cdigo Penal. Assim, essa tarefa ficou a cargo da
doutrina que, ao longo dos tempos, formulou diversas teorias:
4.1. Teoria Psicolgica.
Para essa teoria, idealizada por Franz von Liszt e Ernst von Beling e intimamente ligada teoria causal da
conduta, o pressuposto fundamental da culpabilidade a imputabilidade, ou seja, a capacidade do ser humano de
entender o carter ilcito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento.
Revela-se atravs do vnculo psicolgico entre o sujeito e o fato tpico e ilcito. Esse vnculo analisado pelo
dolo (normativo, pois guarda em seu interior a conscincia da ilicitude) e pela culpa, que aqui residem na
culpabilidade.
No aceita diante de vrios fundamentos, dentre os quais, a impossibilidade de resolver as situaes de
inexigibilidade de conduta diversa, ou fatos praticados com a culpa inconsciente.
4.2. Teoria Normativa (ou psicolgico-normativa).
Reinhart Frank, com o propsito de adequar a teoria psicolgica exigibilidade de conduta diversa,
aprofundou seus estudos no sentido de que a culpabilidade deixa de ser um fenmeno natural, atribuindo-lhe o
elemento normativo.
O conceito de culpabilidade passa a ter um perfil complexo, com a unio de elementos naturalsticos (vnculo
psicolgico, representado pelo dolo e pela culpa) e normativos (circunstncias concomitantes).
Assim, passa-se a exigir trs elementos: imputabilidade, dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa.
Essa teoria no prosperou, apesar de ter sido um grande avano poca. Soobrou com a supervenincia do
finalismo por duas razes: (1) manuteno do dolo e culpa na culpabilidade e (2) tratamento do dolo como
normativo.
4.3. Teoria Normativa Pura, Extrema ou Estrita.
Surgiu com o finalismo de Hans Welzel e assim chamada porque os elementos psicolgicos (dolo e culpa)
foram transferidos para o fato tpico, alojando-se no interior da conduta.
Assim, a culpabilidade se torna um simples juzo de reprovabilidade que incide sobre o autor do fato tpico e
ilcito. O dolo passa a ser natural, ou seja, sem a conscincia da ilicitude. Essa conscincia permanece na
culpabilidade e passa a ser potencial, ou seja, o agente deveria ter a possibilidade de conhecer o carter ilcito do
fato praticado.
4.4. Teoria Limitada.
Nessa teoria, a culpabilidade composta pelos mesmos elementos da teoria normativa pura: (1)
imputabilidade, (2) potencial conscincia da ilicitude e (3) exigibilidade de conduta diversa.
A distino entre elas, porm, repousa no tratamento dispensado s descriminantes putativas, que consiste
no erro plenamente justificado pelo agente que supe situao ftica que, se realmente existisse, tornaria a sua
ao legtima.
Na teoria limitada, as descriminantes putativas so dividas em dois blocos: (1) descriminantes putativas de
fato, tratados como erro de tipo e (2) de descriminantes putativas de direito, disciplinadas como erro de proibio.
Conforme possvel observar no CP, art. 20 e 21, o nosso ordenamento penal ptrio acolheu a teoria
limitada como atual definio da culpabilidade.
4.5. Teoria funcional.
Uma corrente capitaneada por Gnter Jakobs sustenta um conceito funcional de culpabilidade.
Trata-se de uma nova proposta, consistente em substituir a culpabilidade fundada em juzo de
reprovabilidade por necessidades reais de preveno.
Assim, no se verifica o valor da conduta do agente e seu livre arbtrio, analisando o potencial conhecimento
da ilicitude do fato e se era exigvel que agisse de outro modo, mas sim se a finalidade da pena se faz necessria,
diante do desrespeito do sujeito perante o ordenamento jurdico. Busca-se, de acordo com a poltica criminal do
Estado, resguardar o fim de preveno geral da pena.
Tipo positivo e tipo negativo de culpabilidade.
Com o escopo de justificar um tipo total de culpabilidade, em sintonia com o seu conceito funcional, Jakobs
criou o tipo positivo e o tipo negativo de culpabilidade.
Deste modo, a culpabilidade pressupe o injusto (fato tpico e ilcito) e seu autor somente ser responsvel
se ao tempo do fato era imputvel (tipo positivo) e se seu comportamento no tivesse motivo exculpante (tipo
negativo).
5. COCULPABILIDADE.
Trata-se de uma atenuante inominada que atua em prol do ru, nos moldes do CP, art. 66, tendo em vista
uma carga social de valores negativos diante das desigualdades sociais que moldam a personalidade do agente de
acordo com as oportunidades oferecidas a cada indivduo, para orientar-se, ou no, de acordo com o ordenamento
jurdico.
Essa teoria apresenta uma parcela de responsabilidade social do Estado pela no insero social e falta de
oportunidades que leva a um comportamento desviado, resultante das concausas socioeconmicas da
criminalidade urbana e rural.
6. CULPABILIDADE FORMAL E CULPABILIDADE MATERIAL.
Culpabilidade formal a definida em abstrato, ou seja, o juzo de reprovabilidade realizado em relao ao
provvel autor do fato tpico e ilcito, desde que presentes os elementos da culpabilidade. Destina-se ao legislador,
impondo limites cominao da pena.
A culpabilidade material estabelecida em concreto, dirigida a um agente culpvel que cometeu um fato
tpico e ilcito. Destina-se ao magistrado, na aplicao concreta da pena.
7. GRAUS DE CULPABILIDADE.
A maior ou menor culpabilidade do autor constitui circunstncia judicial, destinada dosimetria da pena de
acordo com as regras do CP, art. 59, caput.
8. DIRIMENTES.
Assim so chamadas as causas de excluso da culpabilidade. Podem ser assim sintetizadas:
a) Imputabilidade: doena mental, desenvolvimento mental retardado ou incompleto e embriaguez
acidental completa.
b) Potencial conscincia da ilicitude: erro de proibio inevitvel (escusvel).
c) Exigibilidade de conduta diversa: coao moral irresistvel e obedincia hierrquica ordem no
manifestamente ilegal.
[1] Esse o conceito adotado pelo STF e pelo ordenamento ptrio.
[2] No se pode esquecer que a culpabilidade, para a teoria causalista, ou para a teoria finalista tripartida, elemento do
crime.
IMPUTABILIDADE PENAL
um dos elementos da culpabilidade. a capacidade mental, inerente ao seu humano de, ao tempo da ao
ou omisso, entender o carter ilcito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento.
Deste modo, a imputabilidade penal depende de dois elementos: (1) intelectivo, que consiste na perfeita
sade mental que permite ao indivduo o entendimento do carter ilcito do fato; e (2) volitivo, que o domnio da
vontade, onde o agente, conhecendo a ilicitude do fato, determina-se de acordo ou no com esse entendimento.
O Brasil adotou o critrio cronolgico, entendendo imputvel todo aquele que completa 18 anos de idade.
1. MOMENTO PARA A CONSTATAO DA IMPUTABILIDADE.
Conforme o CP, art. 26, caput, a imputabilidade deve ser analisada no momento da ao ou da omisso da
conduta.
2. CRITRIOS PARA IDENTIFICAO DA INIMPUTABILIDADE.
Como j mencionado, todo seu humano, ao completar 18 anos de idade, presume-se imputvel. Essa
presuno, contudo, relativa (juris tantum). Assim, trs critrios so usados para aferir a inimputabilidade:
a) Critrio Biolgico: para a inimputabilidade, basta a presena de um problema mental representado por
uma doena, ou pelo desenvolvimento mental incompleto ou retardado.
No importa a condio mental do agente ao tempo da conduta, bastando, como fator decisivo, a formao
e o desenvolvimento mental do agente, ainda que posterior ao crime. Esse sistema atribui demasiado valor ao
laudo pericial.
b) Critrio Psicolgico: para esse critrio, pouco importa se o indivduo apresenta ou no deficincia mental.
Basta se mostrar incapacitado para entender o carter ilcito do fato ou determinar-se de acordo com esse
entendimento. Cabe ao magistrado verificar tal fator.
c) Critrio Biopsicolgico: resulta da fuso dos dois anteriores. Diante da presuno relativa de
imputabilidade, conjuga os trabalhos do perito e do magistrado, analisando se, ao tempo da conduta, o agente era
capaz de entender o carter ilcito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento.
o critrio adotado pelo Direito Penal, conforme se verifica no art. 26. No que toca aos menores de 18 anos,
foi adotado o critrio biolgico.
3. CAUSAS DE INIMPUTABILIDADE.
3.1. Menoridade.
Com relao aos menores de 18 anos, adotou-se o critrio biolgico para a constatao da inimputabilidade.
A presuno da inimputabilidade absoluta (juris et de jure), decorrente da CF, art. 228 e CP, art. 27.
A prova da menoridade do agente se faz atravs de documento hbil, conforme entendimento do STJ,
Smula 74.
Calha anotar aqui que o menor emancipado permanece inimputvel, pois a capacidade civil no se confunde
com a capacidade penal.
Reduo da maioridade penal.
Diante do atual contexto social, muito se discute a diminuio da maioridade penal e qual seria o
instrumento necessrio para faz-lo, posto que a inimputabilidade se d pelo critrio biolgico adotado pela
Constituio Federal. Diante disso, duas posies surgem:
(1) a reduo da maioridade penal somente seria possvel com o advento de uma nova Constituio, fruto do
Poder Constituinte Originrio, pois constitui clusula ptrea implcita.
(2) suficiente uma emenda constitucional, por no se tratar de clusula ptrea, mas de norma
constitucional inserida no mbito da famlia[1].
Crimes permanentes e a supervenincia da maioridade penal.
Crimes permanentes so aqueles em que a conduta se prolonga no tempo. Sobrevindo a maioridade penal
em crime iniciado em estado de inimputabilidade, o agente responder a partir da imputabilidade, desprezando-se
os atos anteriores, para fins penais.
Crimes Militares e menoridade penal.
O CPM, em seu art. 50, dispe uma ressalva sobre a imputabilidade penal dos maiores de 16 anos. Contudo,
esse artigo no foi recepcionado pela CF, art. 228.
3.2. Inimputabilidade por doena mental.
A expresso doena mental deve ser interpretada em sentido amplo, englobando os problemas patolgicos e
tambm os de ordem toxicolgica. Enfim, entende-se por qualquer doena mental, permanente ou transitria, que
seja capaz de suprimir do ser humano a capacidade de entender o carter ilcito do fato e determinar-se de acordo
com esse entendimento.
A inimputabilidade aferida de acordo com o critrio biopsicolgico, ou seja, o entendimento do carter
ilcito do fato deve se dar no momento da ao ou omisso. Diante disso, os intervalos de lucidez so tratados com
a imputabilidade penal comum.
3.3. Inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto.
O desenvolvimento incompleto abrange os menores de 18 anos e os silvcolas.
Para os menores, a regra incua, diante do mandamento constitucional do art. 225.
Para os silvcolas, a inimputabilidade depende do grau de assimilao dos valores sociais, a ser revelado pelo
exame pericial. Se integrado vida em sociedade civil, ser imputvel; pode ser semi-imputvel se divido entre a
tribo e a sociedade; ou inimputvel quando incapaz de conviver em sociedade com as regras que lhe so inerentes.
3.4. Inimputabilidade por desenvolvimento mental retardado.
Desenvolvimento retardado o que no se compatibiliza com a fase da vida em que se encontra o indivduo.
De acordo com a sua idade cronolgica, o indivduo no se comporta de maneira condizente.
Retardo mental a condio de desenvolvimento interrompido ou incompleto da mente, especialmente
caracterizada por um comprometimento de habilidades manifestadas durante o desenvolvimento, contribuindo
para um nvel global de inteligncia, ou seja, aptides cognitivas, de linguagem, motoras e sociais.
Com relao ao surdo-mudo, este no automaticamente inimputvel. Compete percia aferir o grau de
prejuzo causado pela falha biolgica, podendo ser inimputvel, semi-imputvel ou imputvel.
4. PERCIA.
Salvo no que diz respeito aos menores de 18 anos (critrio biolgico), o Direito Penal adotou o critrio
biopsicolgico para verificao da inimputabilidade. Aqui, o juiz afere a aptido psicolgica, reservando percia o
exame biolgico.
Atravs do laudo mdico que se comprova a doena mental. Trata-se de meio legal de prova da
inimputabilidade. A percia , pois, fundamental para a aferio da inimputabilidade.
Contudo, o juiz o peritum peritorum, no estando adstrito ao laudo pericial, conforme preceito do CPP, art.
182.
5. EFEITOS DA INIMPUTABILIDADE.
Os menores de 18 anos sujeitam-se legislao especial: Lei 8.069/90 (ECA), conforme predeterminado pela
CF, art. 228.
Os demais inimputveis esto sujeitos justia penal comum, onde sero processados e julgados. Contudo,
diante da ausncia de culpabilidade, no podem ser condenados. Com efeito, a culpabilidade pressuposto de
aplicao da pena.
Assim, os inimputveis sero absolvidos (sentena de absolvio imprpria), restando contra eles uma
medida de segurana, nos termos do CPP, art. 386, pargrafo nico, III.
O CP, art. 97 substitui o juzo de culpabilidade pelo juzo de periculosidade, com a presuno juris et de
jure de periculosidade do inimputvel, ordenando a imposio de medida de segurana.
6. IMPUTABILIDADE DIMINUDA OU RESTRITA.
Determinada pelo CP, art. 26, pargrafo nico, tambm chamada de imputabilidade reduzida ou semi-
imputabilidade[2].
Refere-se perturbao da sade mental, doena mental mais suave, que no elimina totalmente a
capacidade de inteleco do agente, apenas reduzindo-a.
Com efeito, nesse caso o sujeito encontra-se em posio biopsicolgica inferiro a um imputvel, tendo a
reprovabilidade de sua conduta diminuda, determinando a reduo da pena de 1/3 a 2/3.
Trata-se de uma causa obrigatria de diminuio da pena, cuja aferio se d tambm pelo critrio
biopsicolgico, subsistindo a culpabilidade, ou seja, no h absolvio imprpria, mas condenao com menor
apenamento. Contudo, o semi-imputvel poder ter a sua pena substituda por medida de segurana, se o exame
pericial assim recomendar.
7. EMOO E PAIXO.
No Cdigo Penal de 1980, a perturbao dos sentidos e da inteligncia afastava a culpabilidade. Atualmente,
no mais se admite a emoo ou paixo como excludente da imputabilidade penal, diante do estabelecido pelo CP,
art. 28, I.
Trata-se de um critrio legal, taxativo, que determina a imputabilidade daquele que agente em descontrole
emocional, diante de uma situao em que se dispe a agir mediante a emoo ou a paixo que o fato lhe aflora.
Emoo o estado afetivo que acarreta na perturbao transitria do equilbrio psquico, tal como na ira,
medo, alegria, clera, prazer ertico, surpresa, etc.
Paixo a emoo mais intensa, ou seja, perturbao duradoura do equilbrio psquico, a exemplo do amor,
inveja, cime, vingana, dio, fanatismo, ambio, etc.
Ensina Enrico Altavilla, "a emoo uma embriaguez; a paixo uma doena".
A despeito da norma penal que determina a imputabilidade daquele que age com emoo ou paixo, estas
sero capazes de retirar a imputabilidade do agente quando configurarem um estado de morbidez ou patologia,
compreendida como uma verdadeira psicose, indicativa de doena mental. Assim, a conduta achar respaldo na
inimputabilidade (CP, art. 26, caput) ou na semi-imputabilidade (CP, art. 26, pargrafo nico).
A emoo e a paixo podem ser sociais (amor), antissociais (dio), astnicas (debilidade orgnica, v.g., medo,
pavor) ou estnicas (pessoa ativa que provoca irritao, desespero). Funcionam como circunstncia judicial na
aplicao da pena-base (CP, art. 59, caput).
Homicdio Passional.
No Direito Penal Ptrio poca da Repblica, os criminosos passionais no eram apenados, sob o pretexto
de que, diante do flagrante adultrio, ou movidos por elevado cime, restavam privados da inteligncia e dos
sentidos.
Com a evoluo social, dinamizando o Direito Penal, no mais possvel admitir essa possibilidade. A
emoo e paixo decorrentes de momentos conjugais no excluem a imputabilidade penal do agente, mormente
quando o crime for motivado por "amor".
Nada obstante, vez ou outra possvel visualizar a absolvio de homicidas passionais confessos. Isso se d
diante do tribunal do jri, que composto por pessoa leigas que decidem pela ntima convico, muitas vezes at
se identificando com a figura do ru.
8. EMBRIAGUEZ.
a intoxicao aguda produzida no corpo humano pelo lcool ou por substncia de efeitos anlogos, apta a
provocar a excluso da capacidade de entender o carter ilcito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.
Essa embriaguez, chamada de embriaguez aguda, simples ou fisiolgica, no exclui a imputabilidade penal,
conforme CP, art. 28, II.
8.1. Embriaguez crnica, patolgica (alcoolismo crnico).
Cuida-se da embriaguez que compromete total ou parcialmente a imputabilidade penal, caracterizada pela
desproporcional intensidade ou durao dos efeitos inerentes intoxicao alcolica.
Equipara-se s doenas mentais, considerando o brio inimputvel ou semi-imputvel, conforme laudo
pericial.
8.2. Perodos, fases ou etapas da embriaguez.
So cientificamente reconhecidas trs fases:
a) 1 fase Eufrica: as funes intelectuais mostram-se excitadas e o indivduo particularmente eufrico. A
capacidade de julgamento se compromete. H certo grau de erotismo. O brio fala acima do normal, apresenta
desinibio e comporta-se de forma cmica e indecorosa. a chamada "fase do macaco".
b) 2 fase Agitada: perturbaes psicossensoriais profundas. Alteram-se as funes intelectuais, o juzo
crtico, ateno e memria. Os delitos so praticados com agresses e contra a liberdade sexual. H perda do
equilbrio. Ocorrem perturbaes visuais. O sujeito fica agitado e agressivo. chamada de "fase do leo".
c) 3 fase Comatosa (coma): inicialmente h sono e o coma se instala progressivamente.o estado comatoso
pode torna-se irreversvel e causar a morte do brio. Nessa fase, somente podem ser praticados crimes omissivos,
prprios ou imprprios (comissivos por omisso). a "fase do porco".
8.3. Espcies de embriaguez.
A embriaguez aguda, simples ou fisiolgica pode ser classificada mediante dois critrios: quanto
intensidade e quanto origem.
a) Quanto intensidade: a embriaguez, de acordo com a intensidade, pode ser completa,
total ou plena (aquela que chegou segunda ou terceira fase) ou pode ser incompleta,
parcial ou semiplena (limitou-se primeira fase).
b) Quanto origem: pode ser voluntria ou intencional (aquela que o indivduo inegere bebidas com a
inteno de embriagar-se, apenas), culposa (a vontade do agente somente beber, mas acaba se
excedendo), preordenada ou dolosa (o sujeito bebe para cometer infrao penal) ou acidental ou fortuita (resulta
de caso fortuito ou fora maior).
No que tange embriaguez preordenada, alm de no excluir a imputabilidade, funciona como agravante
genrica (CP, art. 61, II, "l"). j quanto embriaguez acidental, quando completa, exclui a imputabilidade penal (CP,
art. 28, 1), se incompleta, autoriza a diminuio da pena, correspondendo semi-imputabilidade (CP, art. 28,
2).
Calha anotar aqui que, a embriaguez acidental ou fortuita, completa no autoriza a imposio de medida de
segurana, diante da iseno de pena que lhe caracteriza. Destarte, o sujeito no inimputvel, mas sim
imputvel. Apenas a situao em que se encontrava tornava a sua conduta inimputvel.
8.4. Prova da embriaguez.
Diante do sistema da livre apreciao da prova, da persuaso racional e do livre convencimento motivado,
adotado pelo CPP, art. 155, caput, a embriaguez admite qualquer meio probatrio.
Contudo, trs formas probantes da embriaguez se destacam:
a) exame laboratorial: revela a quantidade de lcool no sangue. O agente, entretanto, no obrigado a fazer
o exame, diante do princpio do nem tenetur se detegere, ou seja, ningum obrigado a produzir prova contra si
mesmo.
b) exame clnico: a anlise pessoal do indivduo, evidenciando dados caractersticos da embriaguez, tais
como hlito, controle emocional, fala etc.
c) prova testemunhal: pessoas que relatem acerca da alterao do comportamento de quem se submeteu
lcool ou substncia de efeitos anlogos.
Prova da embriaguez e o Cdigo de Trnsito Brasileiro.
O Estado autoriza administrativamente as pessoas a conduzirem veculos automotores. Assim, tem o direito
de impor as condies necessrias para a manuteno dessa prerrogativa, destacando-se o art. 227 da Lei
9.503/97, que determina a submisso do indivduo aos exames para comprovao de eventual uso de lcool ou
substncia de efeitos anlogos.
quele que no se submeter ao teste, ser-lhe-ia aplicada uma pena de multa e suspenso do direito de dirigir
por 12 meses.
Diante da impossibilidade produzir prova contra si mesmo, princpio do Processo Penal, uma vez que a
infrao administrativa de trnsito traz consequncias penais (Lei 9.503/97, art. 306), sustenta-se inaceitvel essa
regra.
Assim, comprovao desse crime depende de prova pericial (exame de sangue) ou mtodo equivalente
(etilmetro ou teste em aparelho ar alveolar "bafmetro"), nicos meios suficientes para verificar a dosagem de
lcool no sangue.
8.5. Teoria da actio libera in causa.
Conforme dispe o CP, art. 28, II, a embriaguez, voluntria ou culposa, no exclui a imputabilidade penal.
No que cerne embriaguez preordenada, contudo, no somente subsiste a imputabilidade como tambm
funciona como agravante genrica, exasperando a pena.
Assim, indaga-se: Como seria possvel a punio do agente em embriaguez no acidental? No estaria
privado da capacidade de entender o carter ilcito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento?
Surge, ento, a teoria da actio libera in causa, ou melhor, ao livre em causa.
Fundamenta-se no princpio segundo o qual a "causa da causa tambm a causa do que foi causado", ou
seja, afere-se a imputabilidade penal no momento em que o agente do delito se embriagou voluntariamente,
desprezando-se o tempo em que o crime foi praticado.
Essa teoria justifica a punio do sujeito que, ao tempo da conduta, encontrava-se em estado de
inconscincia. Mas a anlise do dolo e da culpa recaem no momento em que se embriagou, com o propsito de
produzir resultado lesivo, ou, ainda que sem essa inteno, tendo previsto a possibilidade de sua ocorrncia,
quando podia ou devia prever.
Essa teoria foi desenvolvida para a embriaguez preordenada (ou dolosa), nela se encaixando perfeitamente.
Posteriormente, sua aplicabilidade se estendeu embriaguez voluntria e embriaguez culposa, bem como aos
demais estados de inconscincia.
Assim, surge a crtica de que o Cdigo Penal teria adotado a responsabilidade penal objetiva, tendo adotado
uma fico jurdica para construir a figura do crime praticado, por motivos de poltica criminal[3].
Existem, porm, posies doutrinrias diversas, sustentando a no caracterizao da responsabilidade penal
objetiva no tocante incidncia dessa teoria na embriaguez voluntria e na embriaguez culposa.
Nelson Hungria defende essa teoria, afirmando que a ameaa penal constitui mais um motivo inibitrio para
prevenir a embriaguez e seus eventuais efeitos malficos. Ademais, entende que a embriaguez sempre revela a
verdadeira personalidade do agente, que se faz justa a aplicao, uma vez que o objetivo da teoria da culpabilidade
tornar responsvel o indivduo pelos atos que so expresso de sua personalidade.
Cumpre destacar que, na embriaguez acidental ou fortuita, no se aplica a teoria da actio libera in causa,
porque o indivduo no tinha a opo de ingerir o lcool ou substncia de efeitos anlogos.
[1] Tramita no Senado Federal uma PEC (26/2002) nesse sentido.
[2] Cezar Roberto Bitencourt utiliza a expresso "culpabilidade diminuda".
[3] Paulo Jos da Costa Jnior.
POTENCIAL CONSCINCIA DA ILICITUDE
A aplicao da pena ao autor de uma infrao penal somente justa e legtima quando ele, no momento da
conduta, era dotado, ao menos, da possibilidade de compreender o carter ilcito do fato praticado.
Exige-se, para a configurao da imputabilidade penal do acusado, a potencial conscincia da ilicitude de sua
conduta.
1. EVOLUO HISTRICA.
O sistema clssico ou causal, por alocar o dolo na culpabilidade, considerava a conscincia da ilicitude como
integrante do dolo, que era normativo.
No sistema finalista, o dolo e a culpa foram transferidos para a conduta, passando a compor a estrutura do
fato tpico. O dolo, agora, natural desprovido da conscincia da ilicitude, que permanece na culpabilidade.
O finalismo tambm transforma a conscincia da ilicitude em potencial. A falta da conscincia da ilicitude, no
sistema clssico, exclua o dolo. No sistema finalista, o dolo permanece ntegro, afastando-se a culpabilidade.
2. CRITRIOS PARA DETERMINAO DO OBJETO DA CONSCINCIA DA ILICITUDE.
Juan Crdoba Roda, em trabalho especfico do tema, apresenta trs critrios para determinao do objeto da
conscincia da ilicitude:
a) Critrio Formal: proclama ser necessrio o conhecimento do agente sobre a violao de alguma norma
penal. Desenvolvido por Binding, Beling e von Liszt, no encontrou acolhimento, pois somente os juristas,
conhecedores do direito, poderiam cometer crimes.
b) Critrio Material: baseia-se numa concepo material do injusto, exigindo o conhecimento da
antissociabilidade, da injustia e da imoralidade de uma conduta. Defendido por Max Ernst Mayer e Kaufmann,
esbarrou na existncia de infraes penais de pura criao legislativa, que no correspondem ao conceito de
injusto material, bem como em condutas reconhecidamente danosas, embora no tipificadas pelo Direito Penal.
c) Critrio Intermedirio: sustenta que o conhecimento da ilicitude no importa em conhecimento da
punibilidade, nem em conhecimento da lei que probe o seu comportamento. O sujeito deve apenas, com o
esforo de sua conscincia, conhecer ou poder conhecer, o carter ilcito de sua conduta. o critrio de maior
aceitao.
Em suma, basta o esforo normal da inteligncia do agente para aferio da potencial conscincia da
ilicitude.
3. EXCLUSO: ERRO DE PROIBIO ESCUSVEL.
A potencial conscincia da ilicitude afastada pelo erro de proibio escusvel (CP, art. 21, caput).
No Direito Romano falava-se em erro de direito, referindo-se ignorncia ou falsa interpretao da lei. Era a
opo acolhida pelo Cdigo Penal de 1940.
Coma reforma da parte geral, o erro de direito cedeu espao sobre o erro sobre a ilicitude do fato,
disciplinado pelo art. 21, chamado erro de proibio.
Para possibilitar a convivncia harmoniosa de todos em sociedade, o direito organiza normas de conduta que
devem ser observadas. Trata-se do ordenamento jurdico, que impe uma presuno absoluta acerca do
conhecimento da lei por todas as pessoas.
Ademais, a Lei de Introduo s normas do Direito Brasileiro, em seu art. 3, determina que ningum poder
alegar desconhecimento da lei, cujo conhecimento geral de todos comea com a sua publicao.
Entretanto, o conhecimento da lei no significa o conhecimento do seu contedo. E nesse caso que surge o
instituto do erro de proibio.
O erro de proibio, ou erro sobre a ilicitude do fato, pode ser definido como a falsa percepo do agente
acerca do carter ilcito do fato tpico por ele praticado, de acordo com um juzo profano[1].
Trata-se de causa de excluso da culpabilidade, quando o erro for escusvel, ou causa de diminuio da
pena, quando inescusvel.
3.1. Efeitos.
O erro de proibio (ou erro sobre a ilicitude do fato) relaciona-se com a culpabilidade, podendo exclu-la ou
no, se escusvel ou inescusvel, respectivamente.
O erro de proibio escusvel, inevitvel ou invencvel compreende no equvoco do agente sobre a ilicitude
de sua conduta que, contudo, ainda que houvesse se esforado, empregando as diligencias necessrias, no
poderia evit-lo.
Nesse caso, exclui-se a culpabilidade em face da ausncia de um de seus requisitos: a potencial conscincia
da ilicitude, conforme CP, art. 21, caput.
J o erro de proibio inescusvel, evitvel ou vencvel poderia ser evitado diante de maior cuidado, com as
diligncias normais, seria possvel compreender o carter ilcito do fato. Assim, subsiste a culpabilidade, mas a
pena pode ser diminuda, em face da menor censurabilidade da conduta, conforme CP, art. 21, caput.
O critrio para aferir se o erro era escusvel ou inescusvel o perfil subjetivo do agente. Com efeito, com
relao matria culpabilidade, levam-se em conta as particularidades do responsvel pelo fato tpico e ilcito,
com a finalidade de se alcanar a sua culpabilidade[2].
3.2. Espcies de erro de proibio.
O erro de proibio (ou erro sobre a ilicitude do fato) pode ser direto, indireto ou mandamental.
a) Erro de proibio direto: o agente desconhece o contedo de uma lei penal proibitiva, ou, se o conhece,
interpreta de forma equivocada.
b) Erro de proibio indireto: tambm chamado de descriminante putativa por erro de proibio, o agente
conhece o carter ilcito do fato, mas, no caso concreto, acredita putativamente estar presente uma causa de
excluso da ilicitude de sua conduta, ou se presente a causa justificante, se equivoca quanto aos seus limites.
c) Erro de proibio mandamental: o agente, envolvido em uma situao de perigo a determinado bem
jurdico, erroneamente, acredita estar autorizado a livra-se do dever de agir para impedir o resultado, nos termos
do CP, art. 13, 2.
3.3. Crime putativo por erro de proibio.
Nesse caso, tambm chamado de delito putativo por erro de proibio, o agente atua acreditando que seu
comportamento constitui infrao penal, quando, na verdade, sua conduta penalmente irrelevante.
3.4. Erro de tipo vs Erro de proibio.
ERRO DE TIPO
DIFERENAS
ERRO DE PROIBIO
O Agente desconhece a situao ftica. No
conhece um dos elementos do tipo penal.
O Agente conhece a situao ftica, mas
desconhece a ilicitude de sua conduta.
Erro de tipo escusvel: exclui o dolo e a culpa.
Erro de proibio escusvel: exclui a
culpabilidade.
Erro de tipo inescusvel: exclui o dolo, mas
subsiste a culpa, se prevista em lei.
Erro de proibio inescusvel: no afasta a
culpabilidade, diminui a pena, de 1/6 a 1/3.
3.5. Erro de tipo que incide sobre a ilicitude do fato.
O erro sobre a ilicitude do fato caracteriza o erro de proibio, relacionando-se com o terreno da
culpabilidade.
Excepcionalmente, todavia, o preceito primrio de um tipo penal inclui na descrio da conduta criminosa
elementos normativos de ndole jurdica, atinentes ilicitude. Ex: CP, art. 151, 153, caput, 154, 244, etc., utilizando
os termos "indevidamente", "sem justa causa".
E, tais hipteses, o erro sobre a ilicitude do fato caracteriza erro de tipo, com todos os seus efeitos.
[1] A simples omisso ou conivncia do Poder Pblico no autoriza o reconhecimento do erro de proibio, a exemplo da
manuteno de uma casa de prostituio em que o Estado no se movimenta contrariamente.
[2] Importante lembrar que, sempre quando se analisa os elementos fato tpico e ilicitude do crime, leva-se em conta a figura
do homem mdio diante da conduta praticada, pois o que tem valor a anlise do fato. Quando se fala em culpabilidade,
entretanto, considera-se a figura do agente responsvel pelo fato no caso concreto, aferindo as suas condies pessoais para
resolver sobre a sua culpabilidade.
EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA
o elemento da culpabilidade consistente na expectativa da sociedade acerca da prtica de uma conduta
diversa daquela que foi deliberadamente adotada pelo autor de um fato tpico e ilcito.
Destarte, quando o caso concreto indicar a prtica de uma infrao penal em decorrncia de inexigibilidade
de conduta diversa, estar excluda a culpabilidade, pela ausncia de um de seus elementos.
A insero da exigibilidade de conduta conforme o direito no juzo da culpabilidade atribuda a Reinhart
Frank, em 1907, com sua teoria da normalidade das circunstncias concomitantes.
Esse tratamento normativo da culpabilidade, no Cdigo Penal vigente, restou manifesto nos institutos da
coao moral irresistvel e da obedincia hierrquica, causas legais de excluso da culpabilidade motivadas pela
inexigibilidade de conduta diversa.
1. COAO MORAL IRRESISTVEL.
Determinada pelo CP, art. 22, sustenta a causa de excluso da culpabilidade diante de uma coao moral
(embora a lei no defina desse modo), onde o coator, para alcanar o resultado ilcito desejado, ameaa o coagido,
que, por medo, age conforme o tipo penal.
A intimidao recai sobre a vontade do agente, viciando-a, de modo a retirar a exigncia legal de agir de
maneira diversa. Diante da inexigibilidade de conduta diversa, resta excluda a culpabilidade, isentando de pena o
coagido.
Esse artigo no inclui a coao fsica, uma vez que essa retira por completo a vontade do coagido. Seu
aspecto volitivo no meramente viciado, mas suprimido, passando o coagido a ser um instrumento do crime.
Assim, diante da inexistncia de dolo ou culpa, retira-se a conduta e, consequentemente, a tipicidade do fato.
1.1. Requisitos.
A coao moral irresistvel depende dos seguintes requisitos:
a) Ameaa do coator de mal grave e iminente que o coagido no obrigado a suportar.
b) inevitabilidade do perigo na posio em que se encontra o coagido.
c) carter irresistvel da ameaa.
d) presena de, ao menos, trs pessoas envolvidas: devem estar presentes o coator, o coagido e a vtima.
Podem ocorrer casos em que o prprio coagido figure tambm como vtima.
1.2. Efeitos.
A coao moral irresistvel afasta a culpabilidade do coagido. Contudo, subsiste a responsabilidade pela
prtica do fato tpico e ilcito, que recai na pessoa do coator.
Trata-se de manifestao da autoria mediata. O autor responder pelo delito praticado pelo coagido em
concurso material com o delito de tortura (Lei 9.455/97, art. 1, I, "b").
Inexiste concurso de pessoas entre o coator e o coagido, ante a ausncia de vnculo subjetivo, salvo no caso
de a coao moral ser resistvel. Nessa ultima hiptese, a pena do coator ser agravada (CP, art. 62, II) e a do
coagido ser atenuada (CP, art. 65, III, "c", 1 parte).
1.3. Temor reverencial.
o fundado receio de decepcionar pessoa a quem se deve elevado respeito. No se equipara coao
moral, pois no h ameaa, apenas receito.
Ademais, na seara do Direito Civil, o temor reverencial sequer permite a anulao dos negcios jurdicos, que
dir em esfera penal, no podendo elidir a culpabilidade.
2. OBEDINCIA HIERRQUICA.
a causa de excluso da culpabilidade, fundada na inexigibilidade de conduta diversa em decorrncia do
cumprimento de uma ordem de um superior hierrquico, no manifestamente ilegal.
Fundamenta-se, basicamente, na impossibilidade de conhecer a ilegalidade da ordem no caso concreto e na
inexigibilidade de conduta diversa.
2.1. Requisitos.
a) Ordem no manifestamente ilegal: trata-se de uma ordem com legalidade aparente.
b) Ordem originria de autoridade competente.
c) Relao de Direito Pblico: a posio de hierarquia que autoriza o reconhecimento da excludente de
culpabilidade somente existe no Direito Pblico.
d) Presena de trs pessoas: mandante da ordem, executor e a vtima.
e) Cumprimento estrito da ordem.
2.2. Efeitos.
???
C O N C U R S O D E P E S S O A S
Decreto-Lei n 2.848 de 7 de dezembro de 1940.
INTRODUO
Este instituto, tambm chamado de concurso de agentes, codelinquncia, concurso de delinquentes,
cumplicidade, coautoria e participao lato sensu, acha-se disciplinado no Cdigo Penal, art. 29 a 31.
Entende-se por concurso de pessoas a colaborao empreendida por duas ou mais pessoas para a realizao
de um crime ou contraveno penal.
1. REQUISITOS.
O concurso de pessoas depende de cinco requisitos:
1.1. Pluralidade de agentes culpveis.
Deve haver, no mnimo, duas pessoas e, consequentemente, ao menos, duas condutas penalmente
relevantes, dotadas de culpabilidade. Essas condutas podem ser principais (coautoria) ou um principal (coautor) e a
outra acessria (partcipe).
A teoria do concurso de pessoas desenvolveu-se para solucionar os problemas envolvendo os crimes
unissubjetivos ou de concurso eventual, que so aqueles cometidos, em regra, por uma nica pessoa, mas que
admitem o concurso de pessoas. Nesses delitos a culpabilidade fundamental, sob pena de caracterizar a autoria
mediata.
No tocante aos crimes plurissubjetivos, plurilaterais ou de concurso necessrio, no se faz necessria a
utilizao da norma de extenso do art. 29, uma vez que o tipo penal determina que, para a configurao do crime,
imprescindvel a existncia de duas ou mais pessoas. Para tanto, basta que um dos agentes seja culpvel.
Assim tambm ocorre nos crimes eventualmente plurissubjetivos, que so praticados por uma s pessoa,
mas, quando praticados em concurso, o prprio tipo penal determina um aumento de pena.
Em todos esses casos (crimes necessariamente ou eventualmente plurissubjetivos) h um pseudo-concursos,
concurso imprprio ou concurso aparente de pessoas.
1.2. Relevncia causal das condutas para a produo do resultado.
Deve haver uma contribuio fsica ou moral, direta ou indireta, comissiva ou omissiva, anterior ou
simultnea execuo, influindo efetivamente no resultado criminoso.
Anote-se que a causa relevante deve ser anterior ou concomitante consumao. Se posterior, configura
crime autnomo, salvo no caso de previamente ajustada entre os agentes.
1.3. Vnculo subjetivo.
Tambm chamado de concurso de vontades, esse requisito impe estejam todos os agentes do crime ligados
entre si por um vnculo de ordem subjetiva. Devem revelar uma vontade homognea. o que se convencionou
chamar de princpio da convergncia.
Esse vnculo no depende de prvio ajuste entre os agentes, basta a cincia por parte de um agente no
tocante concorrncia para a produo do resultado naturalstico.
1.4. Unidade de infrao penal para todos os agentes.
O CP, em seu art. 29, caput, adotou a teoria unitria, monstica ou monista, onde todos os coautores e
partcipes se sujeitam a um nico tipo penal.
Excepcionalmente, o CP admite, expressamente, a teoria pluralista, pluralstica, da cumplicidade do crime
distinto ou, ainda, autonomia da cumplicidade, pela qual se separam as condutas, com a criao de tipos penais
diversos para os agentes que buscam o mesmo resultado. o que se d, v.g., nos seguintes casos:
Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante: art. 126 para o executor e art. 124, in
fine, para a gestante;
Bigamia: quem j era casado pratica o crime do art. 235, caput, e a outra pessoa, no casada, incide no 1
do dispositivo citado.
Corrupo passiva e ativa: funcionrio pblico que aceita propina comete o art. 317 e o particular que
oferece, art. 333.
Em sede doutrinria, despontam ainda outras duas teorias.
Para a teoria dualista, no caso de pluralidade de agentes e condutas diversas, h dois crimes distintos: um
para coautores e um para partcipes.
Enfim, para a teoria mista, o delito praticado em concurso o resultado de diversos delitos singulares. O
delito em concurso no seria, portanto, uma entidade autnoma, mas parte de um todo, chamado delito
concursal, resultado da soma dos delitos em concurso.
1.5. Existncia de fato punvel.
O concurso de pessoas depende da punibilidade do crime, diante do princpio da exterioridade. Conforme
disposio do CP, art. 31, o delito precisa ultrapassar a esfera pessoal do agente, atingindo o mundo exterior.
AUTORIA
Existem diversas teorias que buscam estabelecer o conceito de autor. Vejamo-las:
a) Teoria Subjetiva ou Unitria: no diferencia o autor de partcipe. autor do crime aquele que, de
qualquer modo, contribui para a produo de um resultado material.
Seu fundamento repousa na teoria da equivalncia dos antecedentes ou conditio sine qua non, onde
qualquer colaborao, independente do grau, d causa ao resultado.
b) Teoria Extensiva: tambm se fundamente na teoria da equivalncia dos antecedentes, no distinguindo
autor de partcipe.
Contudo, mais suave, porque admite causas de diminuio de pena diante dos diversos graus de autoria.
Aqui surge a figura do cmplice (autor com menor participao).
c) Teoria Objetiva ou Dualista: opera ntida distino entre autor e partcipe. Foi adotada pela Lei 7.209/84
que reformou a parte geral do Cdigo Penal de 1940.
Essa teoria subdivide-se em outras trs:
Teoria objetivo-formal: para essa teoria, autor quem realiza o ncleo (verbo) do tipo penal. Partcipe
quem, de qualquer modo, concorre para o resultado sem praticar o ncleo do verbo. a teoria preferida pela
doutrina nacional, contudo, deixa em aberto o instituto da autoria mediata.
A autoria mediata a modalidade de autoria em que o autor realiza indiretamente o ncleo do tipo, valendo-
se de pessoa sem culpabilidade ou que age sem dolo ou culpa.
Teoria objetivo-material: aturo quem preta contribuio objetiva mais importante para a produo do
resultado. Partcipe quem concorre de forma menos relevante.
Teoria do domnio do fato: criada por Hans Welzel em 1939, visando ocupar posio intermediria entre as
teorias subjetiva e objetiva, define que autor quem possui o controle sob o domnio do fato criminoso. Para essa
teoria, o conceito de autor resta ampliada para todos aqueles que tm o domnio da situao, apesar de no
realizarem condutas descritas no tipo, abrangendo o autor propriamente dito, o autor intelectual, o autor mediato
e os coautores.
Essa teoria tambm admite a figura do partcipe, sendo aquele que, de qualquer modo, concorre para o
crime, desde eu no realize o ncleo do tipo penal nem possua controle sobre o fato.
Diante da sua finalidade, essa teoria somente se aplica aos crimes dolosos, no se encaixando aos culposos,
onde o autor da conduta no concebe o controle final do fato, pois, sequer deseja esse final.
O Direito Penal Brasileiro adota a teoria restritiva, no prisma objetivo-formal. Todavia, essa teoria
deve ser complementada pela teoria da autoria mediata.
PUNIBILIDADE NO CONCURSO DE PESSOAS
De acordo com a teoria monista adotada pelo CP, art. 29, caput, no concurso de pessoas h pluralidade de
agentes e unidade de crime.
Assim, todos os envolvidos em uma infrao penal so por ela responsveis. Contudo, a identidade de crimes
no importa em identidade de penas. O CP, art. 29 curvou-se ao princpio da culpabilidade, empregando o termo
"na medida da sua culpabilidade".
Nesses termos, as penas devem ser individualizadas na anlise do caso concreto, levando-se em conta o
sistema trifsico delineado pelo CP, art. 68, onde as penas sero aplicadas de acordo com a culpabilidade de cada
agente.
COOPERAO DOLOSAMENTE DISTINTA
tambm chamada pela doutrina de desvios subjetivos entre os agentes ou participao em crime menos
grave.
Trata-se de um corolrio lgico da teoria unitria ou monista, adotada pelo CP, art. 29, visando afastar a
responsabilidade objetiva no concurso de pessoas.
Assim, se um dos concorrentes para a infrao penal quis participar do crime, mas este se desenvolve e
acaba se tornando outro, e um dos agentes no quis participar desse crime mais grave, no haver vinculo
subjetivo nesse delito, respondendo somente pelo menos grave, o qual quis participar.
Entretanto, se a ocorrncia do crime mais grave for previsvel, o agente continuar respondendo pelo crime
menos grave, contudo, poder ter sua pena aumentada.
ESPCIES DE CONCURSO DE PESSOAS
1. COAUTORIA.
a forma de concurso de pessoas que ocorre quando o ncleo do tipo penal executado por duas ou mais
pessoas.
A coautoria pode ser parcial (ou funcional), quando diversos autores praticam atos de execuo diversos
que, somados, produzem o resultado almejado; ou direta (ou material), onde todos os autores efetuam a mesma
conduta criminosa.
1.1. Coautoria nos crimes prprios e nos crimes de mo prpria.
Crimes prprios (ou especiais) so aqueles em que o tipo penal exige uma situao de fato ou direito
diferenciada por parte do sujeito ativo, ou seja, exige-se uma condio especial de autoria.
possvel que mais de uma pessoa com a mesma condio exigida pela lei pratique o crime, revelando a
coautoria em crimes prprios.
Nos casos em que somente um dos autores do crime possui a condio especial, nos moldes do CP, art. 30, a
condio especial, se for elementar do tipo, comunica-se ao terceiro, desde que dela esse ultimo tenha
conhecimento.
Crimes de mo prpria (de atuao pessoal ou de conduta infungvel) so os que somente podem ser
praticados pelo sujeito expressamente indicado no tipo penal.
Esses crimes so incompatveis com a coautoria. Diante da exclusividade reservada pelo tipo penal para a sua
prtica, somente o autor definido pela lei que poder pratic-lo.
1.2. Executor de reserva.
Trata-se do agente que acompanha, presencialmente, a execuo da conduta tpica, ficando disposio
para, se necessrio, nela intervir.
Se intervier, ser tratado como coautor. Em caso de inao, ser partcipe.
1.3. Coautoria sucessiva.
Ocorre quando a conduta, iniciada em autoria nica, se consuma com a colaborao de outra pessoa, sem
prvio ajuste entre elas.
1.4. Coautoria em crimes omissivos.
A admissibilidade de coautoria em crimes omissivos divide a doutrina em duas vertentes:
Uma primeira corrente admite a coautoria em crimes omissivos, prprios (ou puros) ou imprprios (esprios
ou comissivos por omisso). Para tanto, basta que dois ou mais agentes, vinculados pela unidade de propsitos
prestem contribuies relevantes para o resultado, realizando os atos de execuo omissivos previstos em lei[1].
Um segundo entendimento no admite a coautoria em crimes omissivos, de qualquer natureza.
Essa teoria entende que cada um dos sujeitos detm o dever de agir d modo individual. Esse dever, imposto
pela lei a todos nos crimes omissivos prprios, ou de forma determinada, nos imprprios, indivisvel, indelegvel,
restando caracterizada duas ou mais condutas autnomas[2].
1.5. Autoria mediata.
Esse tema no se acha expressamente disciplinado na lei. Trata-se de uma construo doutrinria.
Entende-se por autoria mediata a conduta do agente que, para a consumao do crime, se utiliza de uma
pessoa inculpvel ou que atua sem dolo ou culpa. Dois sujeitos esto aqui presentes: (1) autor mediato, que
ordena a prtica do crime; e (2) autor imediato, que executa a conduta criminosa.
O autor imediato, que atua sem culpabilidade, funciona como mero instrumento do crime, sendo
irresponsvel pelo resultado. Assim, no h que se falar em concurso de pessoas. A propriedade do crime ser
atribuda somente ao autor mediato.
possvel a participao ou coautoria na autoria mediata. Ex: "A" e "B" pedem a "C", inimputvel, que mate
"D".
Autoria mediata nos crimes culposos.
A autoria mediata incompatvel com os crimes culposos. Por bvio, nos crimes culposos o resultado
naturalstico involuntrio, sendo inconcebvel a utilizao de um terceiro sem conscincia disso.
Autoria mediata nos crimes prprios e nos crimes de mo prpria.
Crimes prprios (ou especiais) so aqueles em que o tipo penal exige uma situao de fato ou direito
diferenciada por parte do sujeito ativo, ou seja, exige-se uma condio especial de autoria.
possvel que o autor mediato rena as qualidades especficas descritas pelo tipo penal, permitindo a
ocorrncia da autoria mediata nos crimes prprios.
Crimes de mo prpria (de atuao pessoal ou de conduta infungvel) so os que somente podem ser
praticados pelo sujeito expressamente indicado no tipo penal.
Esses crimes so incompatveis com a autoria mediata. Diante da exclusividade reservada pelo tipo penal
para a sua prtica, somente o autor definido pela lei que poder pratic-lo. No obstante, a doutrina comporta
algumas excees que podem surgir no caso concreto, mas de difcil visualizao.
1.6. Autoria por determinao.
o sujeito que determina outro ao fato, mas que conserva o seu domnio, posto que, se o perde, j no
mais autor, mas mero instigador.
Autor por determinao , portanto, quem se vale de outro, que no realiza conduta punvel por ausncia de
dolo, em um crime de mo prpria, ou ainda o sujeito que no rene as condies legalmente exigidas para a
prtica de um crime prprio, quando se utiliza de tais qualidades e se comporta de forma atpica, ou acobertado
por uma causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade.
Ao autor por determinao dever ser imputado o resultado produzido.
1.7. Autoria de escritrio.
Cuida-se de uma autoria mediata particular ou autoria mediata especial.
Assim, autor de escritrio o agente que transmite a ordem a ser executada por outro autor direto, dotado
de culpabilidade e passvel de ser substitudo a qualquer momento por outra pessoa, no mbito de uma
organizao ilcita de poder. Ex: lder de organizao criminosa que d ordens a seus "soldados".
2. PARTICIPAO.
a modalidade de concurso de pessoas em que o sujeito no realiza diretamente o ncleo do tipo penal,
mas, de qualquer modo, concorre para o crime.
um comportamento acessrio que colabora efetivamente com o resultado naturalstico visado pelo autor
principal da infrao penal.
Portanto, a participao reclama dois requisitos: (1) propsito de colaborar para a conduta principal; e (2)
colaborao efetiva, por meio de um comportamento acessrio que concorra para a produo do resultado
material.
2.1. Espcies.
A participao pode ser moral ou material.
a) participao moral: aquela em que a conduta do agente restringe-se a induzir (fazer surgir a ideia) ou
instigar (reforar ideia j existente) terceira pessoa a cometer uma infrao penal.
b) participao material: a conduta do sujeito consiste em prestar auxlio ao autor da infrao penal. Auxiliar
consiste em facilitar, viabilizar materialmente a execuo, sem realizar a conduta descrita no ncleo do tipo penal.
Nesse caso, o partcipe chamado de cmplice.
2.2. Punio do partcipe: teorias da acessoriedade.
A natureza jurdica da conduta do partcipe acessria, uma vez que no realiza atos de execuo contidos
no tipo penal, mas apenas auxilia o autor principal.
Deste modo, a conduta do partcipe somente adquire eficcia quando adere conduta principal do autor,
subordinando-se mediatamente adequao tpica do delito, conforme norma de extenso prevista no CP, art. 29.
Nos termos do CP, art. 31, exige-se para a configurao da participao e consequente punio do partcipe
que a conduta criminosa chegue, ao menos, a ser tentada.
Acerca dessa acessoriedade, diversas teorias so formuladas de acordo com o grau de participao do
agente partcipe. So elas:
a) teoria da acessoriedade mnima: para a punibilidade da participao, basta que o autor tenha praticado
um fato tpico. Equivoca-se por punir sempre o partcipe, ainda que o autor tenha agido acobertado por alguma
excludente.
Ex: A contrata B para matar C. Contudo, B estava no banco depositando o dinheiro do acordo
quando atacado por C, e, em legtima defesa, mata C. A seria partcipe do crime cometido por B.
b) teoria da acessoriedade limitada: para a punio do partcipe suficiente que o autor tenha praticado um
fato tpico e ilcito.
Ex: A contrata B, inimputvel, para matar C. B efetiva o crime. A partcipe do crime cometido por
B, em concurso de pessoas.
a posio preferida pela doutrina brasileira. Contudo, no resolve os problemas referentes autoria
mediata.
No exemplo em questo, no h vinculo subjetivo entre as condutas, diante da inimputabilidade de B.
assim, A seria o autor mediato da conduta, que reclama ao por agente sem culpabilidade.
c) teoria da acessoriedade mxima ou extrema: reclama para a punio do partcipe que o fato praticado
tenha sido tpico, ilcito por agente culpvel.
Ex: A contrata B para matar C. B, imputvel, efetiva o contratado. B autor do crime e A
partcipe.
d) hiperacessoriedade: para a punio do partcipe, necessrio que o autor, revestido de culpabilidade,
pratique um fato tpico e ilcito, e seja efetivamente punido no caso concreto.
Ex: A contrata B para matar C. B, aps o crime, suicidou-se. A no responder pela participao.
O Cdigo Penal no adotou expressamente nenhuma das teorias. De acordo com a sua sistemtica,
no entanto, afasta-se a aplicao das teorias da acessoriedade mnima e da hiperacessoriedade.
A maioria da doutrina nacional inclina-se pela aplicabilidade da teoria da acessoriedade limitada, mas
quedando-se inerte quanto a autoria mediata, igualmente aceita. Em provas e concursos, afigura-se a teoria da
acessoriedade mxima como a mais coerente, uma vez que no se confronta com a autoria mediata.
2.3. Participao de menor importncia.
Cuida-se de uma causa de diminuio de pena estabelecida pelo CP, art. 29, 1, aplicvel na terceira fase de
fixao da pena.
Trata-se de um direito subjetivo do ru, determinando a reduo da pena quando comprovada que a
conduta praticada pelo partcipe foi de reduzia eficincia causal, contribuindo para o resultado de forma menos
decisiva.
O melhor critrio para aferir essa modalidade de participao atravs da teoria da equivalncia dos
antecedentes (conditio sine qua non).
Prevalece, ainda, na doutrina o entendimento de que esse dispositivo legal no se aplica ao autor intelectual
que, embora seja partcipe, no se compreende como ao de menor importncia.
Importante diferenciar tambm a participao de menor importncia da participao incua. Esta em nada
contribui para o resultado. penalmente irrelevante.
2.4. Participao impunvel.
Conforme preceitua o CP, art. 31, cuida-se de uma causa de excluso da tipicidade da conduta do partcipe.
Assim, diante do carter acessrio da participao, a conduta do partcipe s adquire relevncia penal
quando o autor inicia a execuo do crime.
Portanto, se o ajuste (acordo traado entre duas ou mais pessoas), a determinao (deciso de algum
almejando uma finalidade), a instigao (reforo para a realizao de uma ideia preexistente) e o auxlio
(colaborao material para o objetivo) no chegam a ser tentados, o fato atpico.
o chamado quase-crime.
Com efeito, a lei declarou expressamente que, em situaes taxativas, possvel a punio do ajusta,
determinao, instigao ou auxlio como crime autnomo. Ex: CP, art. 286 e 288.
2.5. Participao por omisso.
A participao possvel, desde que o omitente, alm de poder agir no caso concreto, tivesse ainda o dever
de agir para evitar o resultado, amoldando a sua conduta em uma das hipteses do CP, art. 13, 2.
2.6. Conivncia.
tambm chamada de participao negativa, crime silente ou concurso absolutamente negativo. o mero
conhecimento de um crime por parte de um sujeito que no est vinculado conduta criminosa e no tem o dever
de agir para impedir o resultado.
No configura participao.
2.7. Participao sucessiva.
Ocorre nos casos em que um mesmo sujeito instigado, auxiliado ou induzido por duas ou mais pessoas,
cada qual desconhecendo o comportamento alheio no mesmo sentido, para executar uma infrao penal.
2.8. Participao em cadeia ou participao da participao.
possvel e punvel de acordo com as regras do Cdigo Penal. Verifica-se nos casos em que algum instiga,
auxilia ou induz uma pessoa para que essa, por sua vez, auxilie, induza ou instigue algum a praticar uma infrao
penal.
2.9. Participao em ao alheia.
Diante da teoria monista ou unitria adotada pelo Cdigo Penal no tocante ao concurso de pessoas, exige-se,
para a configurao da participao uma homogeneidade do elemento subjetivo, vinculando-os concorrncia do
crime.
Deste modo, no se admite participao culposa em crime doloso e nem participao dolosa em crime
culposo.
Entretanto, possvel o envolvimento de terceira pessoa em ao alheia, com elemento subjetivo distinto,
nos casos em que a lei cria casos para dois crimes diferentes, mas ligados um ao outro.
Nesse caso, no haver concurso de pessoas, ante a ausncia de liame subjetivo, mas subsistir a
responsabilidade pelos crimes autnomos.
[1] Filiam-se a esse entendimento Cezar Roberto Bitencourt e Guilherme de Souza Nucci.
[2] Essa vertente defendida por Nilo Batista.
CIRCUNSTNCIAS INCOMUNICVEIS
De acordo com o CP, art. 30, circunstncias incomunicveis so as que no se estendem aos coautores e
partcipes de uma infrao penal, pois se referem a determinado agente, incidindo em relao a ele.
A compreenso desde dispositivo depende, da verificao das elementares e circunstancias do tipo penal.
Elementares so os dados fundamentais de uma conduta criminosa. So os fatores que integram a
disposio bsica do tipo.
Circunstancias so os fatores que se agregam ao tipo fundamental, para o fim de qualificar o crime,
aumentar ou diminuir a pena. So exteriores ao tipo penal.
O melhor critrio para aferio desses circunstancias utilizado na excluso ou eliminao desses elementos.
Assim, se excluda uma elementar do tipo penal, teremos uma atipicidade ou uma desclassificao para outro
crime. Por outro lado, a excluso de uma circunstancia no elimina o crime, que permanece intacto, porm
influencia na quantidade da reprimenda a ser aplicada.
1. ESPCIES.
Diante do disposto no CP, art. 30, verifica-se que as elementares e circunstancias podem ser de carter
pessoal (ou subjetivo). Consequentemente, tambm existem as circunstancias de carter real (ou objetivo).
As circunstancias ou elementares de carter pessoal ou subjetivo dizem respeito pessoa do agente e no ao
fato por ele praticado. o funcionrio pblico no crime de peculato (art. 312), elementar de carter pessoal; ou os
motivos do crime de homicdio (art. 121, 1 e 2, I, II e V), circunstncias agravantes da pena.
J as de carter real ou objetivo so as elementares ou circunstancias que dizem respeito ao fato, infrao
penal cometida e no ao agente. o emprego de violncia no roubo (art. 157), como elementar objetiva; ou meio
cruel no homicdio (art. 121, 2, III) circunstancia de carter real.
2. CONDIES DE CARTER PESSOAL.
Paralelamente s elementares e circunstncias, o CP, art. 30 traz ainda as condies de carter pessoal. So
as qualidades, os aspectos subjetivos inerentes a determinado indivduo que o acompanham sempre,
independentemente da prtica de infrao penal.
o caso da reincidncia ou da menoridade.
3. REGRAS DO ART. 30.
Diante dos conceitos at aqui analisados, pode-se entender algumas regras colocadas pelo dispositivo penal
do art. 30.
a) Circunstancias e condies de carter pessoal (ou subjetivas) no se comunicam: exemplo de pai, cuja
filha foi vtima de estupro, que contrata pistoleiro. A condio pessoal de relevante valor moral, que atenua a pena
em face do pai jamais se comunicar ao pistoleiro.
b) Circunstancias de carter real (ou objetivas) se comunicam: desde que os demais agentes possuam
conhecimento da condio.
Exemplo: A contrata B para matar C. B avisa que usar de meio cruel e A aceita. A circunstncia
qualificadora pelo meio cruel se comunica.
c) Elementares, subjetivas ou objetivas, se comunicam: ocorre por expressa determinao legal. Tambm
aqui necessrio que a elementar tenha ingressado na esfera de conhecimento dos demais agentes.
Ex: A, funcionrio pblico, convida B para praticar um furto no rgo em que trabalha. B conhece a
condio de A. Ambos respondero por peculato (crime prprio)[1].
QUESTES DIVERSAS
1. AUTORIA COLATERAL.
Tambm conhecida como coautoria imprpria ou autoria aparelha, ocorre quando duas ou mais pessoas
intervm na execuo de um crime, visando o mesmo resultado, embora cada uma delas ignore a conduta alheia.
No h concurso de pessoas, mas crimes autnomos, diante da ausncia de liame subjetivo entre os agentes.
2. AUTORIA INCERTA.
Surge no campo da autoria colateral, quando mais de uma pessoa indicada como autora do crime, mas no
possvel precisar qual a conduta que, efetivamente, originou o resultado naturalstico.
Ex: A e B querem matar C. ambos esto escondidos e no se conhecem. C alvejado por um tiro,
mas A e B atiraram ao mesmo tempo. No se consegue precisar de quem foi o tiro que atingiu C.
No h concurso de pessoas. Ambos respondero por tentativa, posto que no h duvida sobre ela. Quanto
ao homicdio, diante do princpio in dbio pro reo, no poder ser imputado a nenhum, sob pena de se fazer
injustia.
Importante anotar que h casos de maior estranheza: Imagine que A tinha duas esposas. B e C descobriram a
traio de A e colocaram veneno em sua comida, sem conhecer a outra. A morre. Contudo, no possvel verificar
qual o veneno que causou a sua morte. Assim, restar caracterizado dois crimes: homicdio e crime impossvel.
Mas no se pode punir as duas. Ento, ambas estaro beneficiadas pela duvida, arquivando-se o processo.
Em suma, se no bojo da autoria incerta todos os envolvidos praticaram atos de execuo, devem responder
pela tentativa. Mas se um deles incidiu em crime impossvel, a causa de atipicidade a todos se estende.
3. AUTORIA DESCONHECIDA.
Cuida-se de instituo ligado ao processo penal, que ocorre quando um crime foi cometido, mas no se sabe
quem foi seu autor.
[1] Nelson Hungria, apos a entrada em vigor do Cdigo Penal, em 1940, sustentou a existncia de elementares
personalssimas, que no se confundiam com as pessoais e eram, portanto, incomunicveis. Exemplificava com o crime
praticado sob a influncia do estado puerperal, estado de privilgio personalssimo concedido me da criana, vitima do
infanticdio. Porem, diante da redao do art. 30, constatou seu equvoco e alterou o seu entendimento.
CRIMES MULTITUDINRIOS
A cada dia cresce a relao entre o concurso de pessoas e os delitos multitudinrios, ou seja, praticados por
multides.
Atento s peculiaridades desse fato, diante da proporo de violncia desencadeada nos grupos sociais, o
direito penal cuidou de regular o assunto, agravando a pena de quem provoca o tumulto (CP, art. 62, I) com
agravante genrica e atenuando para aqueles que no deram causa ao fato, mas participaram sob a influncia da
multido (CP, art. 65, III, e).
O dissenso da doutrina reside, contudo, na caracterizao ou no do concurso de pessoas numa integrao
de uma multido criminosa.
Mirabete e Cezar Roberto Bitencourt entendem que h concurso de pessoas e todos respondem pelo
resultado produzido. A prtica do delito nessas circunstancias no afasta a existncia de vnculos psicolgicos entre
os integrantes da multido criminosa, caracterizadores do concurso de pessoas.
Rogrio Greco, de outra banda, sustenta que os crimes multitudinrios dependem, para a sua configurao,
da comprovao efetiva da contribuio causal de cada envolvido no tumulto.
H decises do STF e do STJ nos dois sentidos.
CONCURSO DE PESSOAS NOS CRIMES CULPOSOS
Crime culposo aquele que se verifica quando o agente, deixando de observar o dever de cuidado, por
imprudncia, negligencia ou impercia, realiza voluntariamente uma conduta que produz um resultado
naturalstico indesejado, mas previsto ou previsvel e que, com a devida ateno, poderia ser evitado.
A admissibilidade do concurso de pessoas em crimes culposos deve ser abordada em seus dois elementos:
coautoria e participao.
1. CRIMES CULPOSOS E COAUTORIA.
A doutrina nacional pacfica ao admitir o concurso de pessoas quando duas ou mais pessoas,
conjuntamente, violam o dever objetivo de cuidado a todos imposto, por negligencia, imprudncia ou impercia,
produzindo um resultado material.
2. CRIMES CULPOSOS E PARTICIPAO.
Na doutrina ptria firmou-se o entendimento de rejeio da admissibilidade de concurso de pessoas, na
participao em crimes culposos.
Com efeito, o crime culposo definido por um tipo penal aberto, nele se encaixando todo e qualquer
comportamento que viole o dever objetivo de cuidado. Assim, todo aquele que viola esse dever, contribui para a
produo do resultado naturalstico.
Importante frisar, ainda, que a unidade do elemento subjetivo exigida para o concurso de pessoas no
admite a participao dolosa em crime culposo. Se algum concorre dolosamente para a prtica de um crime
culposo, haver pluralidade de delitos, autnomos e apenveis individualmente.