Salmo 30
Salmo 30
Salmo 30
(Salmo 30)
Muitos escritores, poetas e filsofos, homens e mulheres do presente e do passado, construram para nossa sociedade um certo campo simblico em torno das estaes do ano. Desta forma, podemos at achar estranho que algum se sinta alegre quando chove ou fique triste diante de um pr-do-sol. Criamos uma srie de sensaes e sentimentos, relacionados com o clima e o tempo, mais por associao afetiva, de cores ou de palavras do que exatamente por um fenmeno observvel. Contudo, c estamos, diante da primavera e sendo convidados a refletir sobre a alegria e o contentamento. Portanto, vamos dar nossa contribuio construo do sentido de alegria! Uma alegria resistente que rompe Talvez uma associao que podemos fazer entre a primavera e a alegria, luz do salmo que escolhi para meditarmos hoje, seja o fato de que esta estao do ano nos fala que as flores e os frutos so gerados em um ambiente de muita dificuldade. O salmista faz isso tambm quando ele conta, ainda que de modo genrico, suas tribulaes: a oposio dos inimigos (v.1); algum tipo de enfermidade sria (v.3; v.9); algum problema sbito que o surpreendeu e desorientou (v.6-7) e sua tristeza diante dos acontecimentos (v.11). Tudo isso entremeado de narrativas de oraes feitas e do livramento concedido. Jesus mesmo disse que se o gro de trigo cair na terra e no morrer, ficar s, mas se morrer, dar muito fruto (Jo 12.24). A primavera nos fala das sementes que vm, desde o outono, meio dormentes, venceram as baixas temperaturas do inverno e agora rompem suas prprias cascas para germinar. Depois de crescidinhas, outra ruptura, em caules, folhas e brotos, para que as flores nasam, por sua vez, abrindo caminho aos frutos. So muitas rupturas e transformaes que podemos facilmente associar s nossas vidas. As alegrias devem ser sempre celebradas, pequenas ou grandes, porque, em geral, elas representam perodos de rompimentos, de perdas que eventualmente foram superadas ou de esperas que chegam ao fim. Uma alegria exuberante que floresce O autor de Cantares descreve a chegada da primavera: O meu amado fala e me diz: Levantate, meu amor, formosa minha, e vem. Porque eis que passou o inverno; a chuva cessou, e se foi; aparecem as flores na terra, o tempo de cantar chega, e a voz da rola ouve-se em nossa terra. A figueira j deu os seus figos verdes, e as vides em flor exalam o seu aroma; levanta-te, meu amor, formosa minha, e vem (Cantares 2.10-13). Este vicejar da vida encontra eco no Salmo 30, quando o escritor descreve os sentimentos de que tomado aps as dificuldades enfrentadas: ele exalta a Deus (v.); sente-se em folguedos e usando a alegria como cinto (v.11) e deseja cantar louvores sem se calar, para sempre (v.12). Essas descries nos falam que a alegria no pode ser contida. Assim como quando vemos flores, em geral nossos olhos so tomados pelo encantamento, pela visualidade dessas cores que explodem, que invadem, que esto em toda parte. Elas enchem o olhar, aguam os sentidos, convidam contemplao e ao xtase.
Tambm parece haver um equilbrio que vem da natureza para dentro de ns. Na primavera, dia e noite so iguais... nem dias to longos quanto no vero, nem noites to compridas quanto no inverno. Equilbrio um termo que nos remete sade, no ? Estamos sendo convidadas pela estao e pelo salmo a encontrar o florescimento de nosso equilbrio interior, pois ao mesmo tempo em que o salmista expe suas dores, tormentos e problemas, ele recorre orao, ao clamor, f e esperana para manter-se em atitude de ansiosa e alegre expectativa pelo futuro, pois a morte no serve para nada (v.9), mas a vida, em sua plenitude, exalta a Deus... Sua alegria deve ser convidada a florescer. Talvez voc no seja uma pessoa muito expansiva e sua alegria seja pequenina e colorida como a violeta. Talvez voc seja mais emotiva e temperamental e sua alegria seja como grandes rosas vermelhas, penduradas na ponta de ramos fortes e verdes, mas um pouco espinhosos... Ou ainda voc seja uma riqueza particular, como uma tulipa, uma orqudea, com flores raras e imaginativas... No importa sua personalidade, voc pode florescer em alegria. Assim como no importa que qualidades ou que caractersticas a planta tenha, sua flor sempre encontrar um olhar disposto contemplao. Mas preciso a coragem de mostrar-se, mesmo em meio s dificuldades, crendo que o inverno, ao menos desta vez, passou. Uma alegria simples que celebra O bispo Josu Adam Lazier escreveu, certa vez, que o salmo 30 trata-se de uma orao simples. Do ponto de vista do gnero literrio, trata-se de um salmo de ao de graas. Eram canes usadas no culto domstico ou nas reunies pblicas. Para o bispo, esta uma orao simples porque ela tem trs caractersticas: a pessoa confia em Deus; a pessoa reconhece as aes divinas e a pessoa agradece a Deus. A primavera uma estao do ano que nos convida tambm simplicidade, item necessrio para a celebrao. Se procurarmos demais, se atentarmos por demais aos detalhes, vamos ser como aquela noiva que preparou o casamento dos sonhos, mas estava to ansiosa que a festa passou sem que ela mesma aproveitasse. Agora, diante das fotos, certa nostalgia lhe vem... certo vazio... Nossa vida no pode passar diante dos nossos olhos sem que nos atentemos a ela. A alegria genuna, muita gente atesta ao longo da histria, est reservada nos momentos singelos. Grandes acontecimentos nos fazem pular de jbilo de vez em quanto, mas so as alegriazinhas que brotam pelos cantos da existncia que nos sustentam e nos lembram o cuidado amoroso de Deus diariamente. preciso celebrar, parar e sorrir, observar, cheirar as flores, antecipar os frutos. E recordar que no preciso muita preocupao, nenhum mal durar para sempre, pois vem a noite e depois a manh, vem a noite e depois a manh... Mas hoje, neste momento exato, manh de primavera e preciso aproveitar o dia, com essa alegria que vem tomar caf com a gente (v.5). Hideide Brito Torres Cataguases, MG, 4 Regio [email protected] hideide.blogspot.com