Sentimento de Culpa Freud

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O sentimento de culpa sob a tica freudiana




Out, damn'd spot! out, I say
(Shakespeare Macbeth)


O conceito de culpa perpassa praticamente toda a obra de Freud, j que sua
teoria se baseia em uma concepo do psiquismo humano onde conflito, recalque,
dipo e inconsciente so peas fundamentais.
A primeira referncia explcita de Freud ao sentimento de culpa encontra-
se na seo II de seu trabalho sobre as neuropsicoses de defesa (1894). O conceito
utilizado na descrio de um caso clnico de uma jovem que sofria de auto-
acusaes obsessivas, dizendo-se culpada de diversos crimes que lia nos jornais.
Segundo Freud, a origem deste sentimento de culpa estava relacionada prtica
excessiva de masturbao que era vivida pela jovem como um desvio ou erro de
comportamento. Neste caso, j que a fonte do sentimento de culpa era fundada em
algo escuso ou vergonhoso para a jovem, assumir a responsabilidade por crimes
que lia ou ouvia surgira como soluo para vivenciar a sensao de reconhecer-se
culpada.
Apesar de estar presente indiretamente na maioria de seus estudos, o
conceito de culpa explicitamente retomado no artigo Atos obsessivos e prticas
religiosas (1907), onde Freud sugere que, por trs dos rituais e cerimoniais
prprios da prtica religiosa e da neurose obsessiva, encontra-se um sentimento
inconsciente de culpa. A culpa experimentada precocemente por um desejo
proibido seria revivida a cada nova tentao, compelindo o sujeito a reproduzir
um ritual, ou sujeitar-se a proibies como uma medida de segurana, ou seja,
como forma de proteger-se contra a ansiedade provocada pelas tentaes. Decorre
da, tambm, a sensao de serem, tanto os obsessivos quanto os religiosos,
apenas miserveis pecadores, eternamente culpados.
Ao longo de sua obra, o sentimento de culpa associado no s neurose
obsessiva (a partir de sua auto-recriminao), como tambm s auto-acusaes e
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auto-depreciaes tpicas da melancolia (Freud, 1917), e tem papel importante no
desenvolvimento do estudo sobre masoquismo, onde a satisfao do indivduo
est ligada ao sofrimento ou humilhao (Freud, 1924). Especificamente, o
sentimento inconsciente de culpa associado ao masoquismo moral, que ocorre
quando o sujeito procura a posio de vtima sem que o prazer sexual esteja
diretamente implicado.
Em 1923, no trabalho intitulado O Ego o e Id, Freud sugere a hiptese
de que o sentimento de culpa surge simultaneamente com o Superego, herdeiro do
complexo de dipo, e assim sublinha seu carter eminentemente social. Neste
aspecto, o sentimento de culpa ocupa um lugar fundamental na articulao da vida
individual com o convvio social, ganhando um valor essencial na formao
cultural. Em vista de desenvolvermos nosso argumento para melhor discutirmos o
lugar da culpa na sociedade contempornea, iremos restringir nosso olhar aos
principais trabalhos freudianos voltados para a cultura, em que o homem
discutido em seu vis social. Portanto, no trataremos aqui do aspecto patolgico
que exerce a culpa no indivduo, investigando sua expresso em casos de neurose
obsessiva, masoquismo ou melancolia, apesar de que devemos considerar que a
culpa, ainda que tenha lugar fundamental no estudo destas patologias, esteja
presente de forma generalizada na compreenso de qualquer sintoma e situada na
origem do conflito psquico. Procuraremos, aqui, abordar o sentimento de culpa
como fenmeno necessrio organizao social, como caracterstica fundadora
dos laos sociais.
Para desenvolver tal tarefa, nos parece fundamental atentarmos para o
conceito de desamparo (Hilflosigkeit), amplamente utilizado na teoria freudiana,
que diz respeito condio de dependncia humana dos cuidados de outro devido
sua fragilidade constitucional. O estado de impotncia do beb derivado do fator
biolgico que consiste no fato de que, ao contrrio de outros animais, o ser
humano nasce prematuro, faz com que dependa inteiramente de outro ser
humano para satisfao de suas necessidades, o que implica na necessidade de ser
amado e cuidado por outro para garantir sua sobrevivncia. Assim, o nascimento
de qualquer ser humano deve ser inscrito num quadro mais amplo, que inclui um
outro indivduo, uma famlia, ou um grupo social. Dessa forma, coloca-se em
evidncia o conflito entre as exigncias individuais e as sociais.
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neste embate que se d a formao de uma sociedade, de uma cultura.
Em todo agrupamento social est em jogo a urgncia de um relacionamento
possvel entre seres humanos e a satisfao dos desejos individuais, estes muitas
vezes contrrios ao bom convvio social.
Freud elabora uma teoria sobre a cultura que poderia ser dividida em dois
momentos cruciais. O primeiro aparece em Totem e Tabu (1912-1913) e na
idia nele exposta de que a cultura funda-se na culpa resultante do assassinato do
pai primitivo e na conseqente instaurao dos dois tabus a ele associados, a
saber, a submisso autoridade do pai e a proibio do incesto. Desse modo, a
cultura nasceria da interiorizao da represso, sendo esta necessria para domar
as pulses sexuais que, caso contrrio, conduziriam mera satisfao egosta dos
indivduos. Nesse momento, Freud concebia um dualismo pulsional onde o
conflito se dava entre as pulses sexuais e as de auto-conservao, ou do ego. Para
ele, as pulses erticas, alm de fora vital, poderiam tambm se constituir como
fora disruptiva. No entanto, a partir da represso, essa fora pode se converter de
anti-social para uma fora pr-social.
O segundo momento crucial da teoria da cultura de Freud a publicao
de Para alm do princpio de prazer (1920), obra na qual reformula sua teoria
pulsional e apresenta a idia de uma pulso de morte. Freud remete o conflito
psquico, at ento relacionado ao sentimento de culpa, para um confronto entre
pulses, Eros e pulso de morte, tornando-o agora ontolgico. Com isso, situa a
destrutividade na prpria natureza humana, de onde, mais tarde (1930), justificar
a inevitabilidade do sentimento de culpa e do mal-estar em qualquer organizao
social.
Dessa forma, procuraremos trabalhar estes dois momentos de sua
concepo da formao cultural, sem perder de vista sua intrnseca relao com o
sentimento de culpa.

1.1
Os primrdios da culpa: Totem e Tabu

A fim de compreendermos a concepo da sociedade a partir da tica
freudiana, parece-nos necessrio trabalhar o que foi sua obra fundadora no que diz
respeito psicologia coletiva. Em Totem e Tabu (1913), Freud procura dar
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conta da origem da formao cultural, se fundamentando em princpios
psicanalticos e antropolgicos. Assim, uma pequena exposio descritiva de
alguns termos se faz necessria.
O conceito de tabu se refere a tudo que parea aos homens perigoso,
misterioso, proibido, impuro, mas ao mesmo tempo sagrado. Logo, o que tabu
no deve ser tocado, deve ser mantido distncia, porm constantemente
lembrado e temido. Freud sugere que estes demnios temidos que
fundamentavam o tabu so apenas projees dos prprios impulsos emocionais
dos homens, pulses presentes em todo homem que constituam um perigo para a
ordem social.
Acreditava-se que animais, pessoas, lugares ou coisas (casas, rvores,
plantas) consideradas como tabu possuam intenso efeito destrutivo, como um
poder perigoso que pudesse ser transmitido pelo contato, como uma infeco. A
crena no poder demonaco do tabu tornou-se a raiz de nossos preceitos morais e
nossas leis. As proibies do tabu caracterizam, segundo Freud, o cdigo de leis
no escrito mais antigo do homem (Freud, 1913, p.38). Em ltima instncia,
tabus so proibies que existiam com o fim de proteo, pois as restries que o
tabu provoca vo de encontro a desejos humanos anti-sociais, e, portanto, sua
violao deveria ser punida.
Inicialmente, a punio por uma violao do tabu vinha de um agente
interno o prprio tabu violado se vingava. Posteriormente, com a associao do
tabu a deuses e espritos, a penalidade vinha do poder divino. Finalmente, a
punio dos transgressores era executada pela prpria sociedade, organizando os
primrdios de um sistema penal. Se o tabu se refere quilo que provoca temor,
suas proibies normalmente dizem respeito a restries da liberdade de prazer,
de movimento e de comunicao.
A violao do tabu devia ser punida, pois correspondia a um srio perigo
social, j que a lei criada pelos homens pretendia dar conta de desejos humanos
inconscientes que, se tornados impulsos conscientes, levariam dissoluo da
comunidade. Assim, aquele que violava o tabu tornava-se, ele mesmo, tabu, pois o
perigo de que outros se sentissem incitados a transgredir corresponderia a um
grave desarranjo social.
No entanto, mesmo naqueles que obedeciam ao tabu persistia o desejo
inconsciente de viol-lo. Afinal, com a proibio surge a tentao, ou seja, o
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desejo de violar a lei do tabu que organiza a sociedade. Portanto, o tabu
paradoxal, pois ao mesmo tempo em que probe, provoca a tentao, dele
decorrendo sempre uma atitude ambivalente. A ambivalncia afetiva, ou seja, a
presena simultnea e conflitante de sentimentos opostos direcionados ao mesmo
objeto, caracterstica da condio social humana. Segundo Freud, ela est
presente em maior ou menor grau na disposio inata de cada um (Freud, 1913,
p. 82).
O conhecido mito da horda primeva confere ambivalncia lugar
fundamental na explicao da organizao social, das restries morais e da
religio. O mito relata a histria de um pai poderoso, tirnico e arbitrrio que
exigia total submisso de seus filhos e propriedade exclusiva das mulheres. Este
pai invejado e temido provocava sentimentos ambivalentes entre seus filhos
(ambivalncia extensiva a toda relao filial posterior), que num arroubo de dio
so levados a assassin-lo e com-lo na refeio totmica. No entanto, uma vez
satisfeito o dio neste festim canibalesco, ocorre a identificao dos filhos com o
pai, e a afeio recalcada faz-se sentir. A partir da, um intenso sentimento de
culpa comea a surgir.
O poder do pai morto torna-se ainda mais intenso e presente, quando
personificado na figura do totem. Sendo o animal totmico um substituto do pai, a
manuteno de uma relao com ele ultrapassa a pura exibio de remorso pelo
assassinato, pois h ainda a possibilidade de apaziguar o sentimento de culpa,
rumo a uma certa reconciliao: O sistema totmico foi, por assim dizer, um
pacto com o pai (Freud, 1913, p. 173). Assim, atravs do sentimento de culpa
filial fundamentam-se os dois tabus pelos quais a sociedade primitiva se
interessava, correspondentes aos dois desejos reprimidos do complexo de dipo:
os agressivos (o parricdio) e tambm os sexuais (o incesto).
Se a religio tem seus primrdios no sistema totmico, poderamos
acrescentar que possui sua base fundante no sentimento de culpa. Na opinio de
Freud, a religio totmica surgiu deste sentimento filial de culpa, como tentativa
de apaziguar este sentimento, e todas as religies posteriores so ainda tentativas
de resolver o mesmo problema, variando apenas de acordo com o estgio da
civilizao em que surgem e com os mtodos que utilizam. De qualquer forma,
encontramos na religio a tenso da ambivalncia e o sistema s pode se sustentar
na base de um triunfo sobre o pai remorso.
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A sociedade estava agora baseada na cumplicidade do crime comum; a religio
baseava-se no sentimento de culpa e no remorso a ele ligado; enquanto que a
moralidade fundamentava-se parte nas exigncias dessa sociedade, parte na
penitncia exigida pelo sentimento de culpa (Freud, 1913, pp. 174-175).

Na evoluo das religies, o conceito de Deus introduzido, tambm
semelhana do pai. Assim, o totem foi uma primeira forma de representante
paterno, e Deus sua forma posterior, quando a figura humana recuperada. A
glorificao e a elevao do pai assassinado ao estatuto de Deus constitui uma
tentativa de expiao mais intensa do que o primitivo pacto com o totem. Depois
de passado tempo suficiente do ato (o assassinato), o pai elevado condio de
ideal, a saudade sentida pelos filhos aumenta, e com ela o pai/Deus volta a gozar
de poder ilimitado, frente ao qual s nos resta a sujeio.
Conforme o poder de Deus foi crescendo e sendo exaltado, de forma a
ficar to distante da humanidade, fez-se necessria a figura do sacerdote. Ao
mesmo tempo, os reis divinos foram introduzidos na estrutura social de forma que
o domnio da autoridade chega a seu clmax. Neste momento, a responsabilidade e
a culpa estavam to distantes e desvinculadas do assassinato do pai que a
compreenso dos homens era de que o prprio Deus era quem exigia e
regulamentava o sacrifcio. Temos aqui a negao mais extrema do grande crime
que constituiu o comeo da sociedade e do sentimento de culpa (Freud, 1913, p.
179).
Apesar disso, a ambivalncia afetiva permanece presente e direcionada aos
dois novos representantes paternos: deuses e reis. Freud interpreta que o
sentimento de culpa do filho e sua rebeldia nunca deixaram de existir e determinar
o desenvolvimento das religies, e, segundo sua previso, nunca deixaro: Supus
que o sentimento de culpa por uma determinada ao persistiu por muitos
milhares de anos e tem permanecido operativo em geraes que no poderiam ter
tido conhecimento dela (Freud, 1913, p. 187).
Assim, Freud confere culpa lugar fundamental na relao do sujeito com
a lei e a sociedade, e tambm supe que junto com toda herana simblica
tambm seja transmitida a culpa. Neste sentido, ela fornece a filiao e a
genealogia do sujeito, sugerindo que a gnese da subjetividade s possvel no
que ela parte do sentimento de culpa.
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A culpa decorrente do assassinato do pai e fundadora da sociedade marca o
psiquismo humano de forma duradoura e indelvel como a macha de sangue que
Lady Macbeth procura incessantemente limpar aps o crime narrado por
Shakespeare. Em ambos os casos, no h sada: o sentimento de culpa est
cravado na carne humana e destinado a orientar os seus caminhos psquicos
seguintes. Veremos, em seguida, o desenvolvimento dado por Freud ao lugar da
culpa conforme elabora sua teoria sobre a cultura.

1.2
A culpa como progresso mental da civilizao

Em O Futuro de uma Iluso (1927), Freud define como cultura ou
civilizao tudo aquilo que separa o que humano da condio animal. Neste
sentido, todo conhecimento e capacidade de controlar as foras da natureza a fim
de extrair dela riquezas para a satisfao humana seriam inerentes ao mbito
cultural, assim como os regulamentos necessrios para ajustar tanto a relao
entre os homens, como a distribuio da riqueza disponvel. Vale lembrar que
mesmo um homem pode ser considerado como riqueza para outro, visto que se
pode fazer uso de sua capacidade de trabalho, ou que ele pode ser escolhido como
objeto sexual.
Dessa forma, se torna necessrio criar certos tipos de leis para regular a
convivncia, muitas vezes em detrimento da liberdade individual. Afinal, no h
leis que obriguem o homem a se alimentar, ou proibindo-o de colocar a mo no
fogo, pois, os castigos da prpria natureza, atravs da dor da fome ou da
queimadura, j garantem determinado comportamento do homem. Aquilo que a
prpria natureza probe e pune torna suprflua a existncia de uma lei proibitiva.
A tese de Freud a de que possvel supor que os crimes proibidos pelas nossas
leis so aqueles que muitos homens tm uma propenso natural a cometer. Em
termos gerais, o canibalismo, o incesto, e a nsia de matar seriam desejos
fundamentalmente humanos, que ainda nascem com cada criana e seriam ainda
operantes, se no os repudissemos conscientemente.
Freud postula, assim, que a existncia necessria de leis que procurem
sustentar a sociedade vai de encontro a pulses humanas, que devem ser contidas
em detrimento de sua urgncia individual. Isso faz com que, ainda que a
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civilizao seja de interesse universal, todo indivduo seja virtualmente seu
inimigo. No sobreviveramos individualmente, mas encaramos como um pesado
fardo os sacrifcios que a civilizao espera de ns. Esta incompatibilidade de
interesses entre o indivduo e a sociedade leva Freud a argumentar que a
civilizao tem de ser defendida contra o indivduo, e seus regulamentos,
instituies e ordens dirigem-se a essa tarefa (Freud, 1927, p. 16).
Talvez esta seja uma incompatibilidade insolvel, ou pelo menos uma
imperfeio das formas culturais at ento existentes, j que toda civilizao
conhecida se sustenta na necessidade de renncia pulso. Freud aqui sugere que
a dificuldade em se manter uma cultura livre da coero pulsional reside no fato
de que todo homem carrega consigo tendncias destrutivas, anti-sociais. Alm
deste importante fator psicolgico, tambm levado em conta o argumento de que
as massas (o grupo humano em sua maioria) so preguiosas e pouco
inteligentes (Freud, 1927, p. 18), no sentido de que no gostam ou compreendem
a inevitabilidade da coero, no so amantes do trabalho e no h argumentao
possvel frente s suas paixes.
importante ressaltar que Freud no acredita que este retrato da
civilizao seja conseqncia de uma m direo ou gesto da sociedade, nem que
outro tipo de educao, com lderes superiores, provocaria o surgimento de um
povo menos hostil diante da civilizao. Para ele, haver sempre uma
percentagem de sujeitos associais, e poderamos, no mximo, diminuir a
quantidade de pessoas hostis ao processo civilizatrio.
De qualquer forma, necessrio dispor de medidas coercitivas, assim
como recompensas pelos sacrifcios o que Freud chamar de vantagens
mentais da civilizao. Dentre as medidas coercitivas, destacam-se a proibio,
ou seja, o regulamento que impossibilita a satisfao da pulso; a frustrao,
conseqncia da impossibilidade de satisfao; e a privao, isto , a condio
provocada pela proibio. Estas medidas operam contra os desejos pulsionais
agressivos e anti-sociais humanos, exigindo a renncia a eles.
As renncias necessrias ao convvio social provocaram, segundo Freud,
um desenvolvimento, ou progresso mental, que consiste na internalizao
gradativa da coero externa sob a forma do superego. Assim como a criana
passa por este processo de transformao, e s assim se torna um ser moral e
social, tambm no mbito da cultura se d esta mudana, a qual deve transformar
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em veculos da civilizao aqueles que a princpio se opem a ela: Quanto maior
o seu nmero [daqueles que internalizaram o superego] numa unidade cultural,
mais segura a sua cultura e mais ela pode passar sem medidas externas de
coero (Freud, 1927, p. 22).
Ainda assim, Freud no deixa de admitir que a maioria das pessoas
obedece a certas proibies culturais apenas na presena de coero externa,
apesar da internalizao dos valores, como nas prticas to comuns de mentira,
fraude, calnia, impulsos agressivos ou sexuais, desde que possam permanecer
impunes.
O desenvolvimento do superego ou o desenvolvimento moral do ser
humano constitui, para Freud, o valor ou riqueza mental de uma civilizao.
No entanto, como vimos antes, grande parte da populao no encontra razes
para internalizar proibies que de forma alguma lhe parecem vantajosas.
O superego representa as exigncias da moralidade, aplicando o mais
rgido padro de moral ao ego indefeso, que a ele se submete. No entanto, apesar
da sensao de que esta conscincia moral est dentro de ns, podemos afirmar
que no foi sempre assim. Como sabemos, de incio, a criana no possui
restries aos seus impulsos, e, sem inibies, no age de acordo com valores
morais externos a ela. A funo que mais tarde ser exercida pelo superego deve
ser desempenhada por uma autoridade externa os pais. O cuidado dos pais
compreendido pela criana como expresso de amor, e os castigos ou repreenses
a levam a sentir medo ou ansiedade, diante da possibilidade de perda daquele
cuidado (inicialmente, perda do objeto cuidador e depois, perda do amor desse
objeto).
Assim, num primeiro momento, o ego frgil e dependente da criana
reconhece nos pais uma natureza moralmente elevada, e assim admirada, ainda
que tambm temida, e sente necessidade de obedec-los. A partir do processo de
identificao, ou seja, da percepo de semelhana entre dois egos, a criana
passa a se comportar como seus pais, inicialmente apenas os imitando, mas por
fim assimilando-os dentro de si. A partir deste momento, reconhecemos a criao
de uma instncia superior dentro do ego o superego, herdeiro do complexo de
dipo, fruto de uma identificao macia com as figuras parentais.
Dessa forma, possvel afirmar que, atravs da identificao, a
autoridade externa internalizada sob a forma de superego, e assim o ego ainda se
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mantm sujeito dominao moral: Tal como a criana esteve um dia sob a
compulso de obedecer aos pais, assim o ego se submete ao imperativo categrico
do seu superego (Freud, 1923, p. 64).
O superego exerce a funo de auto-observao, de julgamento, de veculo
do ideal ou censura moral, assumindo o poder, a funo e tambm os mtodos da
instncia parental, sendo, de fato, seu herdeiro. Ao longo de seu desenvolvimento,
o superego tambm assimila influncias de autoridades externas que tomaram o
lugar dos pais, como professores, educadores, e todos aqueles que lhe representam
modelos ou ideais. Dessa forma, o superego vai se afastando cada vez mais das
figuras parentais e se tornando mais impessoal, referido aos valores mais elevados
de toda uma cultura. Freud agrupa a religio, a moralidade e o senso social entre
os elementos pertencentes ao que h de superior no homem:

O superego para ns o representante de todas as restries morais, o advogado
de um esforo tendente perfeio , em resumo, tudo o que pudemos captar
psicologicamente daquilo que catalogado como o aspecto mais elevado da vida
do homem. (Freud, 1933, p. 86).

A criao desta instncia superior dentro do ego est profundamente ligada
ao destino do complexo de dipo. As tendncias libidinais incestuosas da criana,
direcionadas aos pais, so dessexualizadas e sublimadas atravs da identificao e
da introjeo da autoridade dos pais, o que leva formao do superego. Este
processo se institui para dar conta do temor da castrao e leva a criana ao
perodo de latncia. Da a vinculao entre a dissoluo do complexo de dipo e o
surgimento do superego.
No nos demoraremos mais em explicaes acerca do funcionamento
deste processo, mas um ponto nos parece importante para continuarmos nossa
investigao sobre o sentimento de culpa. Quando, atravs da identificao, os
pais so tomados pela criana como modelo ou ideal, devemos levar em conta a
existncia de afetos ambivalentes, pois o amor e a admirao dirigidos aos pais
tm tambm um colorido hostil, onde o desejo de aniquilao est presente. Esta
ambivalncia afetiva provoca um conflito, pois os afetos agressivos e hostis no
podem ser direcionados ao objeto e, sujeitos represso superegica, voltam-se
contra o ego assumindo o carter por vezes implacvel do superego. Assim, o
superego, em sua tentativa de represso dos instintos agressivos, castiga o
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indivduo com o mais severo e profundo sentimento de culpa, mas no d conta
nem pode extinguir a ambivalncia afetiva, que, refugiada no inconsciente, tentar
se tornar presente.
At agora, traamos um caminho que vai da condio de dependncia
constitutiva do ser humano, passando pelos conflitos necessrios entre o indivduo
e o social, at a formao de leis ou regras que organizem uma coero instintiva,
de forma a dar conta das tendncias agressivas, destrutivas e anti-sociais presentes
em qualquer ser humano. Por fim, tratamos da internalizao destas regras morais
atravs da formao do superego, sabendo que a presena de afetos ambivalentes
se mantm ativa no psiquismo, ainda que inconscientemente. Tendo em vista que
nosso ponto de partida e chegada deve ser a investigao sobre o sentimento de
culpa, nos permitiremos mais uma digresso em nosso caminho para avaliarmos,
mais profundamente, seu lugar dentro da organizao de uma sociedade.

1.3
Rumo inevitabilidade do mal-estar: culpados por serem desejantes

Quase vinte anos aps sua primeira vinculao da culpa com a sociedade
em Totem e Tabu, Freud elabora a sua compreenso da formao cultural em
O Mal-estar na Civilizao (1930 [1929]). Neste trabalho, sua abordagem do
sentimento de culpa est mais cuidadosa e trabalhada. O ttulo auto-explicativo
sugere a inevitabilidade da sensao de mal-estar em qualquer forma de
agrupamento social. Isto se daria pelo fato de que a organizao social vai de
encontro busca pela felicidade individual, e, portanto, esta ltima nunca poderia
ser alcanada.
Considerando a fragilidade constitucional humana, que nos faz refns do
outro desde que nascemos, pode-se inferir que a nossa necessidade de nos agrupar
implicaria numa abdicao da felicidade individual. Sabemos que, de acordo com
o princpio do prazer, a satisfao pulsional equivale felicidade. Sofremos
quando o mundo externo nos impede ou se recusa a satisfazer nossas
necessidades. Como defesa, para evitar este sofrimento, controlamos ns mesmos
os nossos instintos atravs do superego.
Mais uma vez, Freud determina como civilizao a funo de proteger os
homens contra a natureza e ajustar seus relacionamentos mtuos, ou seja, a
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civilizao se d com a primeira tentativa de regular os relacionamentos sociais.
Sem ela, rege a lei do mais forte. Com o advento da civilizao, o conjunto de
homens sempre mais forte do que qualquer indivduo isolado. O poder da
comunidade estabelecido como direito em detrimento da fora bruta.
Assim, a primeira exigncia da civilizao a justia: uma lei no deve ser
violada em favor de um indivduo. Um estatuto legal para todos, contanto que
contribuam com o sacrifcio de seus instintos, a fim de no ficarem merc da
fora bruta. Logo, o desenvolvimento da civilizao s se torna possvel a partir
da renncia a certas pulses.
A crena na base desta afirmao a de que todo ser humano possui
instintos agressivos anti-sociais e destrutivos, como vimos anteriormente. Tal
crena se explicita com clareza na citao abaixo:

O elemento de verdade por trs disso tudo, elemento que as pessoas esto to
dispostas a repudiar, que os homens no so criaturas gentis que desejam ser
amadas e que, no mximo, podem defender-se quando atacadas; pelo contrrio,
so criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em conta uma poderosa
quota de agressividade. E, resultado disso, o seu prximo , para eles, no apenas
um ajudante potencial ou um objeto sexual, mas tambm algum que os tenta a
satisfazer sobre ele sua agressividade, a explorar sua capacidade de trabalho sem
compensao, utiliz-lo sexualmente sem o seu consentimento. Apoderar-se de
suas posses, humilh-lo, causar-lhe sofrimento, tortur-lo e mat-lo. Homo
homini lupus. Quem, em face de toda sua experincia da vida e da histria, ter a
coragem de discutir essa assero? (Freud, 1930, p. 133).

Dessa forma, fica claro que Freud adota o ponto de vista de que a
inclinao para a agressividade constitui no s uma forte disposio pulsional,
como tambm representa o maior impedimento civilizao. Esta mtua
hostilidade primria dos homens mantm a civilizao sempre em risco de
desintegrao. A inclinao para a agressividade responsvel pela perturbao
das relaes entre os homens. A civilizao deve, ento, estabelecer limites para
as pulses agressivas atravs de formaes psquicas reativas.
Contar apenas com princpios como amizade, fidelidade, amor ao prximo,
no parece dar conta de coagir a agressividade, pois so mandamentos que,
segundo Freud, vo contra a natureza humana. Freud destaca algumas possveis
sadas, saudveis ou no, para o conflito entre a vida pulsional e o mundo externo.
Uma delas se refere ao controle das pulses, o que levaria o indivduo a domar
seus desejos para melhor se sujeitar ao princpio de realidade. Freud sugere que
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isto implicaria numa diminuio no potencial de satisfao. O sentimento de
felicidade derivado da satisfao de um selvagem impulso instintivo no domado
pelo ego incomparavelmente mais intenso do que (...) o que j foi domado
(Freud, 1930, p. 98). Seu comentrio no parece reforar a inteno de adotar esta
sada.
Uma alternativa possvel, a reorientao ou sublimao dos instintos,
aparentemente tambm no: ...a alegria do artista em criar, em dar corpo s suas
fantasias, ou a do cientista em solucionar problemas ou descobrir verdades (...)
no convulsiona nosso ser fsico (Freud, 1930, p. 98).
Ainda possvel rejeitar a realidade e o convvio social, considerando a
realidade externa como a verdadeira inimiga e responsvel por todo o sofrimento,
o que pode culminar tanto num isolamento que garanta a felicidade da quietude
eremita, como na insanidade: Torna-se um louco, algum que, a maioria das
vezes, no encontra ningum para ajud-lo a tornar real o seu delrio (Freud,
1930, p. 100).
Se estes caminhos surgem como possveis solues para o conflito entre a
pulso e a realidade externa, isto no significa que a harmonia impere. Assim,
Freud se pergunta: o que possvel fazer com a agressividade? H um rpido
comentrio sobre o sistema comunista, que julgaria ter encontrado a fonte de
discordncia na propriedade privada, que geraria poder e revolta. No entanto, para
Freud, a propriedade privada s um meio de escoamento da agressividade, e no
causa da mesma. Tambm so abordados os grupos culturais pequenos, que tm a
possibilidade de amar os poucos sua volta e descarregar sua agressividade sobre
intrusos ou estrangeiros (narcisismo das pequenas diferenas). Mas como lidar
com as pulses hostis numa grande comunidade; qui global?
Sabemos que a neurose se funda na frustrao pulsional. A civilizao
tambm impe restries, no s sexualidade, mas tambm agressividade do
homem. Volta-se questo: o que fazer com a agressividade? Inibi-la? Torn-la
incua? Livrar-se dela? Freud recorre histria do indivduo para entender os
mecanismos que tornam inofensivos os desejos de agresso.
No caso do desenvolvimento do indivduo, sua hiptese a de que sua
agressividade introjetada, internalizada. Impedida de se dirigir ao mundo
externo, esta retorna em direo ao prprio ego, assumida pela instncia
superegica. Dessa forma, toda a agressividade que no foi satisfeita sobre outros
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indivduos descarregada no prprio sujeito. Esta tenso entre o superego e o ego
chamada por Freud de sentimento de culpa, que seria a expresso de uma
necessidade de punio. A civilizao, portanto, consegue dominar o perigoso
desejo de agresso do indivduo, enfraquecendo-o, desarmando-o e estabelecendo
no seu interior um agente para cuidar dele, como uma guarnio numa cidade
conquistada. (Freud, 1930, p. 147)
A princpio, a origem do sentimento de culpa deriva do fato de algum
saber ter feito um mal. No entanto, algo mau no precisa ter sido
necessariamente feito, pois apenas a inteno do ato j provoca a culpa. Assim,
devemos levar em considerao que, no que concerne ao sentimento de culpa, a
inteno equivale ao ato, e que no prprio julgamento do que considerado
mau h uma influncia externa. Afinal, no h capacidade natural de distinguir
ou julgar entre bem e mal. Ambos esto sempre referidos a valores externos, e
nossa submisso e dependncia dos outros deriva de nosso desamparo
constituinte. Em ltima instncia, o que est em jogo o medo da perda de amor
daqueles que se ocupam de ns.
De incio, ... mau tudo aquilo que, com a perda do amor, nos faz sentir
ameaados (Freud, 1930, pp. 147-148). Neste primeiro momento, o sentimento
de culpa apenas o medo da perda de amor, e, neste caso, basta que a autoridade
externa nada saiba sobre a inteno ou o ato para que o sentimento deixe de
existir. quando a autoridade internalizada atravs do superego que podemos
falar em culpa. Neste caso, no se trata apenas do medo de ser descoberto: a
distino entre ato e inteno se desfaz, j que nada pode ser escondido do
superego, nem mesmo os pensamentos. O superego atormenta o ego com a mesma
ansiedade anteriormente sentida em relao autoridade, e pode vir a buscar
oportunidades de punio no mundo externo. Com relao a isso, Freud comenta
sobre um intenso sentimento de culpa anterior a certas aes criminosas. Como se
a culpa no fosse uma conseqncia do crime, mas um sentimento anterior que,
com o ato, confere algo de real e imediato ao sentimento j existente, porm
inconsciente.
O autor tambm faz referncia situao clnica em que um paciente
comea a piorar aps ouvir um elogio de seu analista sobre seu progresso. Para
alm da resistncia ou do ganho secundrio da doena, Freud acredita que isto se
deva a um sentimento inconsciente de culpa. Neste caso, a culpa encontra
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satisfao na doena, e difcil para o paciente abandonar a punio do
sofrimento.
Assim, temos duas origens para o sentimento de culpa: em primeiro lugar,
o medo da autoridade; posteriormente, o medo do superego. A primeira implica na
renncia satisfao instintiva. A segunda exige a renncia e a punio, pois o
desejo persiste e no pode ser escondido do superego.

Aqui, a renncia instintiva no possui mais um efeito completamente libertador;
a continncia virtuosa no mais recompensada com a certeza do amor. Uma
ameaa de infelicidade externa perda de amor e castigo por parte da autoridade
externa foi permutada por uma permanente infelicidade interna, pela tenso
do sentimento de culpa. (Freud, 1930, p. 151) (grifo meu).

Dada a ambivalncia afetiva, h uma agressividade da criana em relao a
seus pais que no pode ser expressa. Atravs da identificao, a criana incorpora
a autoridade externa sob a forma de superego, e toda a agressividade que no pde
ser direcionada aos objetos externos retorna, atacando agora o ego. A situao
invertida, e a severidade do superego tem mais a ver com a agressividade original
do ego do que com uma severidade da autoridade externa.
Freud fala da fatal inevitabilidade do sentimento de culpa, fazendo
referncia ao mito da horda primitiva. No importa se os filhos matam ou no o
pai, pois de qualquer forma o que h, indiscutivelmente, a ambivalncia, e o
sentimento de culpa apenas a expresso deste conflito, da eterna luta entre Eros
e o instinto de destruio ou morte.
No parece haver sada. Enquanto a sociedade continuar a se organizar
atravs de famlias, o conflito ir aparecer no complexo edipiano; haver a
formao da conscincia moral, ou superego, e se instalar o sentimento de culpa.
Aquilo que comeou em funo do pai, se expande em relao ao grupo, de forma
a continuamente fortalecer o sentimento de culpa. Portanto, o preo que pagamos
por nosso avano em termos de civilizao uma perda de felicidade pela
intensificao do sentimento de culpa (Freud, 1930, p. 158).
Tendo este cenrio a nossa frente, podemos compreender melhor a viso
de mundo que sustenta os argumentos de alguns pensadores influenciados pela
psicanlise e, portanto, a sua crtica subjetividade contempornea. Como
tentaremos mostrar em nosso segundo captulo, segundo alguns pontos de vista, o
mundo atual parece fundamentalmente diferente daquele descrito por Freud. A
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renncia ao instinto no parece fazer sentido em um mundo regido pela lgica do
consumo, do imediatismo e do culto ao gozo. A falncia das grandes instituies
sociais e o chamado declnio da moral e da lei vm conduzindo o indivduo, cada
vez mais avesso s relaes inter-subjetivas, a exercer seus instintos sexuais e
agressivos de forma no s impune como cultuada. Ou seja, sem culpa.
O sentimento de culpa, elevado em Freud categoria de inevitvel,
necessrio e condio sine qua non de qualquer civilizao ou arranjo cultural,
est em baixa no mundo contemporneo. Veremos no captulo seguinte algumas
teorias que justificam esta forma de pensar, e que conseqncias funestas se
esperam da dissoluo do sentimento de culpa. Ser que ao constatarmos a
desvalorizao da culpa estamos diante da completa abolio da renncia ao
instinto? Ser que sem a culpa nos entregaramos a um permanente estado de
natureza, numa abolio completa da civilizao? nosso intuito, portanto, nos
demais captulos, procurar investigar alguns autores que sustentam em suas
teorias formas de convvio humano que possam prescindir da culpa.
A pergunta que nos acompanha sempre a seguinte: possvel uma
sociedade sem culpa?. Conscientes de sua ambiciosa pretenso, desde j no
correremos o risco de prometer uma resposta definitiva, mas esperamos fornecer
elementos suficientes para produzir e talvez esta, sim, seja a nossa ambio
um debate entre diferentes vises de mundo, de forma a enriquecer nossa
compreenso do sentimento de culpa e, se possvel, lanar luz sobre o mundo e as
relaes humanas que nos cercam.







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