Sincronicidade e Realidade Transpsíquica
Sincronicidade e Realidade Transpsíquica
Sincronicidade e Realidade Transpsíquica
SINCRONICIDADE
E
REALIDADE TRANSPSÍQUICA
Um estudo de algumas relações entre a Psicologia Junguiana e a Física
Moderna
FACIS/IBEHE
São Paulo
2005
Adalberto Ricardo Pessoa
SINCRONICIDADE
E
REALIDADE TRANSPSÍQUICA
Um estudo de algumas relações entre a Psicologia Junguiana e a Física
Moderna
Monografia apresentada à
FACIS/IBEHE como exigência parcial
para a obtenção do título de especialista
em Psicologia Junguiana
FACIS/IBEHE
São Paulo
2005
Não apenas as descobertas da parapsicologia, mas minhas
próprias reflexões teóricas... levaram-me a certos postulados que
tocam o reino da física nuclear e o conceito do espaço-tempo
contínuo. E isso abre toda a questão da realidade transpsíquica
imediatamente na base da psique.
concepção de Jung sobre o que ele denominou de Realidade Transpsíquica. Esse trabalho
também pode ser compreendido como uma pesquisa sobre algumas relações entre a
trabalhado pelos pós-junguianos, mas parece se tratar de um conceito fundamental por estar
envolvido com uma dimensão muito particular que estrutura simultaneamente a realidade
Além disso, como veremos, há indícios que parecem apontar para a comprovação
assim descreve uma visão da realidade muito diferente da adotada pelo senso comum ou
A motivação por trás dessa pesquisa envolve o questionamento sobre uma visão de
ser humano e universo que considere um fator de significação por trás daquilo que
questionamento que pode ser considerado como pertencente ao âmbito cosmológico, por
envolver uma reflexão sobre a organização estrutural do próprio universo, bem como
ciência contemporânea.
Logicamente, a ambição não é esgotar essa temática, que em si, é inesgotável, mas
implicitamente) diferentes disciplinas – psicologia, física, filosofia, entre outras – que são
Do ponto de vista metodológico, essa monografia pode ser caracterizada como uma
Esse estudo possui a sua importância coletiva e social ao oferecer uma pequena
denunciam que a realidade se organiza de uma forma muito diferente do que comumente
(ou classicamente) pensamos. Essa pesquisa pode assim, representar uma contribuição sutil,
Serão definidos a partir de agora alguns conceitos da teoria analítica que serão
I) A consciência
A consciência pode ser definida como função ou atividade que mantém a relação
entre os conteúdos psíquicos e o ego, enquanto puderem assim ser entendidas pelo ego.
Relações com o ego, porém não percebidas pelo mesmo, são inconscientes1.
Jung distingue conceitualmente consciência de psique, sendo que esta engloba tanto
Consciência não é a mesma coisa que psique, pois a psique representa o conjunto de todos
os conteúdos psíquicos; estes não estão todos necessariamente vinculados ao eu (ego), isto é,
relacionados de tal forma com o eu que lhes caiba a qualidade de conscientes. Existe uma boa
quantidade de complexos psíquicos que não estão necessariamente vinculados ao eu 2.
superestrutura que tem por base e origem o inconsciente. Além disso, não há consciência
1
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 401, 402.
2
Ibidem.
3
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 48.
4
Ibid., p. 57.
Entendo o “eu” como um complexo de representações que constitui para mim o centro de
meu campo de consciência e que me parece ter grande continuidade e identidade consigo mesmo.
Por isso, falo também de complexo do eu. O complexo do eu é tanto um conteúdo quanto uma
condição da consciência, pois um elemento psíquico me é consciente enquanto estiver relacionado
com o complexo do eu. Enquanto eu for apenas o centro do meu campo consciente, não é idêntico ao
todo da minha psique, mas apenas um complexo entre outros complexos. Por isso distingo entre eu e
si-mesmo. O eu é o sujeito apenas da minha consciência, mas o si-mesmo é o sujeito do meu todo,
também da psique inconsciente. Neste sentido o si-mesmo seria uma grandeza (ideal) que encerraria
dentro dele o eu5.
confundido com o conhecimento do self (si-mesmo). Assim, uma pessoa que possua
alguma consciência de sua identidade de ego, pode achar que conhece a si mesma de
maneira completa, quando na verdade, o ego conhece apenas seus próprios conteúdos, e
III) O Inconsciente
Teoricamemte é impossível fixar limites no campo da consciência, uma vez que ela pode
estender-se indefinidamente. Empiricamente, porém, ele sempre atinge seus limites, ao atingir o
desconhecido. Este último é constituído por tudo aquilo que ignoramos, por aquilo que não tem
qualquer relação com o eu, centro dos campos de consciência 8.
mas inclui os conteúdos que podem ou que irão se tornar conscientes 9. O inconsciente é “a
5
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 406.
6
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 57.
7
Ibid., p. 86.
8
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 354.
9
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 87.
10
Carl Gustav JUNG, A Natureza da psique, p. 95.
Além disso, Jung aponta a necessidade de se acrescentar ao conceito de inconsciente
o sistema psicóide, que não é capaz de se tornar consciente, e do qual apenas temos algum
espírito11.
Assim definido, o inconsciente retrata um estado de coisas extremamente fluido: tudo o que
eu sei, mas em que não estou pensando no momento; tudo aquilo que um dia eu estava consciente,
mas de que atualmente estou esquecido; tudo o que meus sentidos percebem, mas minha mente
consciente não considera; tudo o que sinto, penso, recordo, desejo e faço involuntariamente e sem
prestar atenção; todas as coisas futuras que se formam dentro de mim e somente mais tarde chegarão
à consciência; tudo isto são conteúdos do inconsciente 12.
Como Freud, Jung usa o termo inconsciente tanto para descrever conteúdos
psíquicos que estão fora do campo de acesso do ego, como para delimitar um lugar psíquico
... de acordo com a experiência, o processo inconsciente traz à luz material subliminal
constelado pela situação da consciência, portanto todos aqueles conteúdos que não poderiam faltar
no cenário consciente, se tudo fosse consciente. A função compensatória do inconsciente se
manifesta com tanto maior clareza quanto mais unilateral for a atitude consciente; e disso dá muitos
exemplos a patologia14.
classificação geral que distingue um inconsciente pessoal que engloba todas as aquisições
sentido – e ao lado desses, a existências de outros conteúdos que não provêm das aquisições
11
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 87.
12
Carl Gustav JUNG, A Natureza da psique, p. 123.
13
Andrew SAMUELS, Dicionário crítico de análise junguiana, p. 104.
14
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 426.
estrutura cerebral herdada: são as conexões mitológicas, os motivos e imagens que podem
nascer de novo, a qualquer tempo e lugar, sem tradição ou migração históricas. Jung
denominou esses conteúdos como pertencentes ao inconsciente coletivo 15, uma camada
Se essa divisão é válida teoricamente, por outro lado essas duas camadas do
inconsciente não devem ser entendidas como divisões estanques. Como os conteúdos do
(percepções dos sentidos que não são suficientemente fortes a ponto de atingir a
consciência) e, finalmente, conteúdos que ainda não estão maduros para a consciência 17.
V) Inconsciente Coletivo
Segundo Jung,
15
Ibid.
16
Andrew SAMUELS, Dicionário crítico de análise junguiana, p. 105.
17
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 90.
18
Ibid., p. 89.
... encontramos também no inconsciente propriedades que não foram adquiridas
individualmente; foram herdadas, assim como os instintos e os impulsos que levam à execução de
ações comandadas por uma necessidade, mas não por uma motivação consciente. Nesta camada
“mais profunda” da psique encontramos os arquétipos. Os instintos e os arquétipos constituem,
juntos, o inconsciente coletivo. Eu o chamo coletivo porque, ao contrário do inconsciente pessoal,
não é constituído de conteúdos individuais, mais ou menos únicos e que não se repetem, mas de
conteúdos que são universais e aparecem regularmente.
Os conteúdos do inconsciente pessoal são parte integrante da personalidade individual e
poderiam, pois, ser conscientes. Os conteúdos do inconsciente coletivo constituem como uma
condição ou base da psique em si mesma, condição onipresente, imutável, idêntica a si própria em
toda parte19.
VI) Psique
inconscientes.
VII) Arquétipos
podem ser encontrados nos seres humanos em todos os tempos e lugares 20, e constituem
ação e, ao mesmo tempo, imagens e emoções 22. São herdados junto com a estrutura
cerebral – constituem, de fato, o seu aspecto psíquico. Não se tratam de idéias herdadas,
imagens, da mesma forma que tudo o que se torna conteúdo da consciência. Jung esclarece
que,
19
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 355.
20
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 205.
21
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 28.
22
Ibid., p.28, 29.
ao sistema axial de um cristal que preconfigura, de algum modo, a estrutura cristalina na água-mãe,
se bem que não tenha por si mesmo qualquer existência material. Esta só se verifica quando os íons e
moléculas se agrupam de uma suposta maneira. O arquétipo em si mesmo é vazio; é um elemento
puramente formal, apenas uma facultas praeformandi (possibilidade de preformação), forma de
representação dada a priori. As representações não são herdadas; apenas suas formas o são 23.
que podem ser reconhecidas somente pelos efeitos que produzem. Nas palavras de Jung,
VIII) Complexos
idéias que lhe estão associadas por um vínculo energético, portanto, de natureza emocional.
acompanhar invariavelmente pelo afeto. São sempre relativamente autônomos, tanto que
23
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 352, 353.
24
Ibid., p. 352.
25
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 353.
Jung afirmava que não somos exatamente nós que temos complexos, mas sim que são os
imagens relacionadas entre si, formadas em torno de um núcleo central de significado que,
invisíveis dos objetos físicos, os complexos são os blocos de construção da psique e a fonte
negativos. Jung salientou bastante isso, embora o imaginário popular aparentemente tenha
Jung, ter complexos não significa necessariamente possuir uma neurose, e o fato de alguns
sofrimento, em si mesmo não é sinônimo de doença, mas apenas o pólo oposto normal da
não o temos (ou que o mesmo não nos possuiu). A finalidade da análise ou da terapia não é
livrar-nos dos complexos – como se isso fosse possível – mas apenas minimizar seus
26
Carl Gustav JUNG, A Natureza da psique, p. 30.
27
James A. HALL, Jung e a Interpretação dos sonhos, p. 18.
28
O autor explica que desde o momento da primeira tomada de consciência, essas possibilidades arquetípicas
da psique se enchem de experiência pessoal, de modo que o ego adulto sente que o conteúdo consciente,
subjetivo, é simplesmente a soma de suas próprias experiências pessoais passadas. Com freqüência, é somente
em análise, em sonhos ou em experiências emocionais muito comoventes que o ego desenvolvido pode
experimentar os verdadeiros alicerces arquetípicos dos complexos.
29
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 38.
reações emocionais. De qualquer forma, um complexo só pode ser realmente superado se
IX) Instintos
Para Daryl Sharp, o instinto pode ser definido como “um impulso involuntário para
certas atividades”31.
Stein, por sua vez, define instinto como “uma fonte inata, fisicamente baseada, de
energia psíquica (ou libido) que é formada e estruturada na psique por uma imagem
arquetípica”32.
Jung entendeu por instinto, “uma coação para certas atividades” 33, ou
Todo fenômeno psíquico que ocorre sem a participação intencional da vontade, mas por
simples coação dinâmica, podendo esta nascer diretamente de fonte orgânica, portanto,
extrapsíquica, ou ser condicionada essencialmente por energias simplesmente liberadas pela intenção
voluntária, e, neste caso, com a restrição de que o resultado obtido ultrapasse o efeito intencionado
pela vontade34.
Vemos que para o autor, a coação pode vir de estímulos internos ou externos que
soltam o mecanismo psíquico do instinto ou de fatores orgânicos que estão fora da esfera
das relações psíquicas de causalidade, e assim, sob o conceito de instinto estão todos os
processos psíquicos cuja a energia a consciência não controla. Nesse contexto, os afetos são
vistos tanto como processos instintivos como sentimentais (ou pertinentes à função
sentimento).
30
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 38, 39.
31
Ibid., p.96.
32
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 206.
33
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 428.
34
Ibid., p. 428, 429.
de fadiga, sobrevêm intoxicações ou processos cerebrais patológicos em geral, um “abaissement du
niveau mental” (Janet), quando, pois, em uma palavra, a consciência já não controla ou ainda não
controla os processos mais acentuados.
Não gostaria de denominar de instintivos, mas automáticos, aqueles processos que uma vez
foram conscientes num indivíduo e que se automatizaram com o tempo. Normalmente também não
se comportam como instintivos porque, em circunstâncias normais, nunca aparecem como coações.
Só o fazem quando lhes advém uma energia estranha 35.
psiquificação, o que explica porque a sua energia puramente biológica pode ser tão
gosto pela mudança, na inquietação e no jogo. Como reflexão, Jung incluiu o impulso
religioso e a busca de significado. A criatividade era uma classe à parte para Jung, cuja
X) Self ou Si-Mesmo
35
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 429.
36
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 97.
37
Ibid., p. 97.
O Self é o arquétipo central da ordem, da totalidade do homem 38. É o centro
regulador da psique, e ao mesmo tempo o poder transpessoal que transcende o ego 39. Como
devido à sua participação inconsciente, só pode ser consciente em parte, o conceito de Si-
experimentado)40.
XI) Campo
Stephen Hawking42 define campo “como algo que existe por todo o espaço e tempo,
autor, o termo “campo de força” se refere “ao meio pelo qual uma força comunica sua
influência”.
Capra se refere ao campo como uma condição ou uma “perturbação” no espaço, que
apresenta o potencial de produzir uma força de influência (de atração ou de repulsão, por
38
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 358.
39
Daryl SHARP, Léxico Junguiano, p. 142.
40
Carl Gustav JUNG, Tipos Psicológicos, p. 442, 443.
41
Carl Gustav JUNG, Memória, Sonhos, Reflexões, p. 358.
42
Stephen HAWKING, O Universo uma casca de noz, p. 202.
exemplo)43. Nesse sentido, o campo é uma região de influência física. Sabemos que a física
campo mental ou campo da mente para designar o “campo de percepção onde surgem os
43
Fritjof CAPRA, O Tao da Física, p.52.
44
Amit GOSWAMI, O universo autoconsciente, p. 317.
Capítulo 2 – O conceito de Sincronicidade
Jung agrupa três classes possíveis de fenômenos que podem ser designados como
(mais ou menos simultâneo), que tem lugar fora do campo de percepção do observador,
Estocolmo, que ocorreu longe do seu campo consciente de visão, e foi identificado
no tempo e ainda não presente, e que só pode ser verificado também posteriormente.
Sincronicidade, portanto, foi um termo criado por Jung, para exprimir uma
acontecimento físico não ligados por uma relação causal. Tais fenômenos aparecem quando
45
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p.89.
46
Esse caso foi testemunhado pelo famoso filósofo Immanuel Kant.
realidade exterior, e a imagem interior ou a premonição se mostra “verdadeira”. O termo
também designa correspondências entre sonhos e idéias análogas ou idênticas que ocorrem
em lugares diferentes, sem que a causalidade possa explicar umas e outras manifestações.
É através de seu contato pessoal com o físico Albert Einstein que Jung tem sua
associação com a física moderna que fornece o contexto histórico apropriado para a sua
teorização sobre o mesmo. As relações entre Jung e os grandes gênios da física fazem parte
de uma história pouco conhecida, e que ainda tem de ser contada na íntegra. Muitas vezes,
existencialistas e orientais é mais estudada, do que as influências que ele recebeu da Física
Moderna, algo que apenas modernamente está começando a mudar. Mas, o fato é que
em seu começo, como na sua conclusão. Além de Einstein, havia também muitas outras
figuras destacadas da Física Moderna que habitavam Zurique na primeira metade do século
professor de psicologia na década de 1930. Segundo Stein 48, Zurique era um autêntico
viveiro da física moderna nas primeiras décadas do século XX, e seria quase impossível
ignorar o estimulante fermento criado por esses intelectos. Havia a clara impressão de que a
desde cedo a meditar sobre as semelhanças entre a física moderna e a psicologia analítica.
47
Carl Gustav Jung, Memórias, Sonhos, Reflexões, p.358.
48
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 179.
Jung foi o pioneiro em estabelecer a comunicação entre as duas ciências – a Psicologia e a
Física Moderna.
paradigma científico49. Por outro lado, esse conceito encerra em si, as pesquisas de Jung em
estudo comparativo das religiões, e dos métodos mânticos (como por exemplo, a
... poucos psicólogos se sentem à vontade em todas as áreas requeridas para abranger essa
teoria em toda a sua plenitude – psicologia, física e metafísica. É um nível intelectual que poucos
pensadores modernos podem nutrir a esperança de alcançar. Os mestres universitários mostram-se
sumamente cautelosos em dar um passo além dos limites das especialidades de seus respectivos
departamentos. A teoria da sincronicidade ajusta-se à visão de Jung do si-mesmo como uma
característica de radical transcendência sobre a consciência e a psique como um todo, e desafia as
linhas de fronteira comumente traçadas para separar as faculdades de psicologia, física, biologia,
filosofia e espiritualidade50.
49
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 189.
50
Ibid., p. 180.
organizados, por vezes, em configurações claramente definidas, embora não ocorram em
virtude de uma cadeia causal de eventos precedentes. Jung, então, aponta que
acontecimentos acidentais têm uma tendência a formar grupos aperiódicos. Von Franz a
num paradigma que pode oferecer uma completa descrição da realidade, tal como é
experimentada pelos seres humanos e medida por cientistas. Segundo suas palavras, o fator
sincronístico postula
despoticamente sobre a imagem do mundo macrofísico (ou seja, visível aos sentidos
físicos), e cujo domínio universal se acha abalado apenas em certas ordens de grandeza
segundo Jung, com certa regularidade e freqüência nos procedimentos mânticos intuitivos,
51
Carl Gustav JUNG, O homem e seus símbolos, p. 211.
52
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 76.
onde são subjetivamente convincentes, mas extremamente difíceis de verificar
Seja como for, Jung declara que a sincronicidade não é uma teoria filosófica, mas
Espaço
Causalidade Sincronicidade
Tempo
Jung explica que a sincronicidade, aqui, está para os três outros princípios, assim
mesma forma que a introdução do tempo como quarta dimensão na Física Moderna implica
53
Ibid., p. 76.
54
Ibid., p. 77.
o postulado de um contínuo espaço-tempo irrepresentável, assim também a idéia de
sincronicidade com seu caráter próprio de significado produz uma imagem do mundo de tal
acrescentar este conceito é que ele torna possível uma maneira de ver que inclui o fator
entendido em sua plenitude. Do lado psicológico e psicóide das coisas, cumpre investigar
os padrões arquetípicos que são evidentes numa situação constelada, pois eles fornecerão os
estrutural. Se a sincronicidade pode, nesse sentido, abrir espaço para uma grande
importantes, a causalidade também não deixa de abrir uma vasta gama de opiniões, como se
Para Stein55, o que Jung está fazendo nesse caso é inserir a psique na descrição
qual, sem o concurso desse elemento, continua sem referência à consciência humana ou ao
valor do significado. Jung está propondo que uma descrição completa da realidade deve
55
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 189.
Essa concepção parece estar presente nas idéias de autores contemporâneos da
Física Moderna como Fritjof Capra56, David Bohm57, e Amit Goswami58. No Brasil, o
professor Dr. José Pedro Andreeta, físico livre-docente da USP, segue essa mesma linha de
Nesse contexto Jung chega a citar – em nota de rodapé61 – a idéia do físico Sir
James Jeans que acha possível que as origens dos acontecimentos no substrato para além do
espaço e do tempo incluam também as nossas atividades mentais, de sorte que o curso dos
substituição da oposição entre espaço e tempo (que ainda estaria mais coerente com
espaço como separada ou distinta do tempo), pela relação (conservação da) energia –
vistas a estabelecer uma certa ligação entre os dois conceitos heterogêneos. A representação
quaternária elaborada pela colaboração mútua de Jung e Pauli, satisfaz de um lado aos
maneira63:
56
Cf. Fritjof CAPRA, passim.
57
Cf. David BOHM, passim.
58
Cf. Amit GOSWAMI, passim.
59
Cf. José Pedro ANDREETA, passim.
60
David J. CHALMERS, Scientific American Brasil, p. 40-49.
61
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 78.
62
Essa consideração será retomada posteriormente, por ser importante para debatermos a noção da existência
de uma realidade transpsíquica.
63
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 79.
Energia indestrutível
Conexão inconstante
Conexão constante através do através da contingência
efeito (causalidade) ou da equivalência ou
“significação”
(Sincronicidade)
Contínuo espaço-tempo
Ao propor esse esquema, Jung enfatiza a exclusão de uma explicação causalista para
serem “portados” por eles, contudo estão continuamente ultrapassando os seus próprios
arquétipos não se acham de maneira certa e exclusiva na esfera psíquica, mas podem
este último assume o aspecto específico de uma modalidade que tem o significado
sincronicidade nesses termos, Jung começa a traçar relações entre a Psicologia Profunda e
64
Ibid., p. 80.
65
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 80.
uma área da Física denominada Cosmologia (a ciência que estuda o universo como um
todo, sua origem, constituição, estrutura e organização). É nesse contexto que poderemos
A noção de uma realidade transpsíquica foi uma idéia proposta por Jung, porém
pouco trabalhada por ele ou pelos pós-junguianos, de maneira direta, enquanto um conceito
técnico da teoria analítica. Isso torna difícil entender o que Jung queria dizer ao utilizar o
termo realidade transpsíquica. Esse conceito parece ter surgido das reflexões de Jung sobre
abrindo todo um leque de questões sobre o que ele chama de uma “realidade transpsíquica
na base da psique”.
suas próprias intuições psicológicas, Jung tomou como referência em física moderna o
prêmio Nobel Wolfgang Pauli, um físico quântico. Para Zohar, uma das poucas autoras a
parapsicologia,
Jung via a parapsicologia como uma ponte natural entre a física e a psicologia, e Pauli, que
concordava com esse ponto de vista, esperava que, trabalhando com Jung, poderia encontrar um
caminho para expressar em maior escala, no nível da realidade cotidiana, alguma extensão natural do
fenômeno da mecânica quântica que ajudara a descobrir 66.
... expunham a idéia de que existe um cosmos absolutamente sem espaço e sem tempo em
que se manifestam a alma (ou psique) e o universo material. Pauli argumentava que esse cosmos
tinha sua própria ordem, independente da vontade humana, de categorias humanas perceptivas ou de
nossas supostas leis da causalidade. Nele todos os limites aceitos entre o conhecedor e o conhecido
são rompidos, e a mente e a matéria são vistas como extensão uma da outra 67.
A autora conclui,
66
Danah ZOHAR, Através da barreira do tempo, p. 137.
67
Ibid., p. 137, 138.
Jung chamou a esta um tanto mística e absoluta de “realidade transpsíquica”. E também
argumentava que ali, num reino além da nossa psique consciente, com suas divisões entre mente e
matéria e suas percepções causais manifestadas no espaço e no tempo, há uma unidade sem tempo,
onde o passado, o presente e o futuro se fundem, e onde a matéria e a psique não passam de
manifestações de uma única realidade68.
Podemos especular que Jung chegou a tais conclusões, em grande medida, apoiado
por seus estudos de parapsicologia. Na verdade, para Jung a prova decisiva da existência de
ESP (extra-sensory-perception), embora ele tenha achado que esses autores não
descobertas69.
25 cartas, divididas em 5 grupos de 5, cada um dos quais com um desenho próprio (estrela,
retângulo, círculo, cruz, duas linhas onduladas). A descrição dos seus experimentos é a
800 vezes seguidas, mas de modo que o sujeito (ou pessoa testada) não pudesse ver as
cartas que iam sendo retiradas. Sua tarefa era adivinhar o desenho de cada uma das cartas
obtido com um número muito grande de cartas foi de 6,5 acertos em 25 cartas (ou seja, 1,5
68
Danah ZOHAR, Através da barreira do tempo, p. 137, 138.
69
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p.10.
acertos em cada 25 cartas (o dobro, portanto, do número provável), de uma vez acertou
1/298.023.223.876.953.12570.
dotes específicos de cada sujeito experimental. Por outro lado, foram realizados
poucos metros até 4.000 léguas, sem afetar os resultados. Por exemplo, quando aumentada
resultado médio de numerosas tentativas foi de 10,1 acertos em 25 cartas. Em outra série de
tentativas, quando ambos se achavam na mesma sala, o resultado foi de 11,4 acertos;
quando o sujeito experimental estava numa sala vizinha, foi de 9,7, e quando as duas salas
uma distância de mais de 960 léguas. Com a ajuda de relógios sincronizados, fizeram-se
princípio não tem influência no resultado, isso é prova de que o objeto aqui em estudo não
a difusão (da energia ou suposta força) no espaço deveriam causar uma diminuição do
efeito final resultante, onde segundo cálculos físicos e matemáticos reconhecidos, o número
70
Ibid., p.11.
71
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p.11.
de acertos deveria ser inversamente proporcional ao quadrado da distância. Como isto não
Jung argumentou que mais notável ainda é o fato de a variável tempo, em princípio,
não ser um fator negativo, isto é, a leitura antecipada de uma série de cartas a serem tiradas
previamente a carta que iria ser retirada no futuro próximo ou distante. A distância no
tempo foi aumentada de alguns minutos até duas semanas. O resultado desta experiência
Para Jung, os resultados da experimentação com o fator tempo apontam para uma
ainda não ocorreram. Em tais circunstâncias parece que o fator tempo foi eliminado por
uma função psíquica, ou melhor, por uma disposição psíquica que é capaz de eliminar
Se já nas experimentações com o fator espaço éramos obrigados a constatar que a energia
não diminuía com a distância, nas experimentações com o fator tempo é totalmente impossível
pensar sequer em uma relação energética qualquer entre a percepção e o acontecimento futuro. Por
isto, devemos renunciar a todos os tipos de explicação em termos de energia, o que equivaleria a
dizer que os acontecimentos desta natureza não podem ser considerados sob o ponto de vista da
causalidade, pois a causalidade pressupõe a existência do espaço e do tempo, uma vez que todas as
observações se baseiam, em última análise, sobre corpos em movimento 73.
Rhine. Aqui, o sujeito experimental deve lançar dados, e ao mesmo tempo desejar que uma
72
ibid., p.12.
73
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p.10
das faces com um número específico (por exemplo, o três) apareça o maior número
possível de vezes. Os resultados foram positivos, e tanto mais vezes, quanto maior era o
corpo em movimento deve possuir também uma relatividade ou deve estar sujeito a ela.
eliminar o fator espaço até certo ponto. A experimentação com o tempo nos mostra que o
fator tempo (pelo menos na dimensão futuro) pode ser relativizado psiquicamente. A
experimentação com os dados, nos indica que os corpos em movimento podem ser
do espaço e do tempo. Por sua vez, para Jung, o postulado da energia é inaplicável no
experimento de Rhine, o que exclui a idéia de transmissão de força, bem como a aplicação
seja capaz de influir num outro acontecimento já no presente, ou em outros termos, seria
absurdo admitir que uma situação ainda não existente, e que só se dará no futuro, possa
transferir-se como fenômeno energético para um receptor do presente. Para Jung, parece
mais indicado dizer que a explicação deve começar, de um lado, com uma crítica ao nosso
conceito de tempo e lugar e, do outro lado, com o inconsciente. Além disso, como
atualmente é impossível qualquer explicação causal, forçoso é admitir, pelo menos, a título
acausal. Por causa dessa simultaneidade, Jung escolheu o termo sincronicidade para
psiquicamente74.
comportam, por assim dizer, “elasticamente” em relação à psique, podendo ser reduzidos,
dependessem de condições psíquicas, ou como se não existissem por si mesmos, mas sim,
Ou seja, como afirma o próprio autor, “em si, o espaço e o tempo consistem em
dos corpos em movimento. O tempo e o espaço são, para Jung, conceitos de origem
se o espaço e o tempo são propriedades aparentes dos corpos em movimento, criadas pelas
necessidades intelectuais do observador, então sua relativização por uma condição psíquica, em
qualquer caso, já não é algo de miraculoso, mas situa-se dentro dos limites da possibilidade76.
Contudo, Jung assevera que essa possibilidade ocorre, quando a psique observa não
o corpo exterior, mas a si própria. Ele salienta, por exemplo, que as respostas dos sujeitos
nos experimentos de Rhine, não são produtos das cartas materiais, mas sim da pura
complexos) que, por si, revelam a estrutura do inconsciente que as produz. Nesse ponto,
Jung complementa,
74
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 87.
75
Ibid., p.14.
76
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p.14.
... são os fatores decisivos da psique inconsciente, os arquétipos, os que constituem a
estrutura do inconsciente coletivo. Este último, porém, representa uma “psique” idêntica em todos os
indivíduos, e não pode ser percebida nem observada diretamente, ao contrário dos fenômenos
psíquicos perceptíveis; por esta razão eu a chamei de psicóide77.
campo de significado) são atraídos um para o outro quase como imãs, embora não seja
necessário haver nenhum relacionamento ortodoxo causal entre esses fatores. Tais
compreender três outros conceitos que lhes são implicados: (1) a natureza psicóide dos
Stein define psicóide como “um adjetivo referente às fronteiras da psique, uma das
quais estabelece o contato direto com o corpo e o mundo físico, e a outra com o domínio do
77
Ibid., p.14.
78
Danah ZOHAR, Através da barreira do tempo, p. 138.
´espírito`”79. Para o autor, o conceito de sincronicidade de C. G. Jung, representa uma linha
de pesquisa sobre o Self, que demarca um ponto de transgressão da fronteira entre psique e
não-psique. Como o arquétipo per se é psicóide e não se encontra rigorosamente dentro dos
limites fixados pelas fronteiras da psique, serve de ponte entre os mundo interior e exterior,
Para Stein, a curiosidade acerca das fronteiras da psique levou Jung a formular uma
teoria que procura articular um único sistema unificado que abrange matéria e espírito e
lança uma ponte entre tempo e eternidade 80. Nesse sentido, a teoria da sincronicidade é
ordem e unidade entre tudo o que existe, e também revela, segundo Stein, C. G. Jung
enquanto um metafísico (uma identidade que ele teria procurado negar em si mesmo, pelo
segundo Jung, são passíveis de transferência, ou seja, não estão limitados à esfera psíquica.
79
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 206.
80
Ibid., p.176.
81
Ibid., p.177.
controlados. Ou seja, a compensação pode chegar, às vezes, do mundo exterior. É o que
entra no consultório pela janela, no momento em que ela relatava o referido sonho a Jung.
“sentido” como um processo ou um conteúdo psíquico, então relutamos em admitir que ele
possa existir também fora de nossa psique. Mas, a teoria da sincronicidade mostra que isso
pode acontecer.
psicológica a noção de que existe um alto grau de continuidade entre a psique e o mundo,
de tal modo que imagens psíquicas podem revelar também verdades sobre a realidade no
espelho refletor da consciência humana. Assim, a psique não é algo que começa e
Esse fenômeno também não seria uma novidade para o pensamento oriental. Jung
conta que dois sábios chineses no século XII, baseando-se na hipótese da unidade de toda a
82
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p.178.
83
Ibid., p.178.
84
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 67,68
natureza, procuraram explicar a simultaneidade de um estado psíquico com um processo
físico como uma equivalência de sentido. Em outras palavras eles supõem que o mesmo
Segundo suas observações, até o século XVIII, o pensamento filosófico admitia uma
Essa hipótese – que irá originar a idéia que Jung denominou como o Unus Mundus - tem a
vantagem de não entrar em choque com o princípio da causalidade (que como sabemos é
quase universalmente aceito na ciência), e pode ser considerado como um princípio sui
generis. Isso obriga não há uma correção dos princípios da explicação natural, mas a uma
Jung conseguiu apoio para todas essas idéias na Física Moderna, onde a visão de
universo estava em fase de mudança e expansão de modo a acomodar a sua tese. Tanto que
Interpretação da Natureza e a Psique”, que como o título mesmo sugere, foi uma tentativa
de elucidação das possíveis relações entre natureza e psique. Não foi à toa que Jung
publicasse essa obra em conjunto com um cientista vencedor do Nobel e não com um
filósofo, um teólogo ou um mitologista. De toda a obra teórica de Jung, seu estudo sobre a
sincronicidade é o que está mais vulnerável a interpretações distorcidas. Ele queria evitar
ser visto como um místico ou um excêntrico, e se preocupava com a maneira como iria
expor essa parte do seu pensamento aos olhos do público científico moderno. Para o
temerárias. Por exemplo, supõe-se tradicionalmente que a psicologia se limita ao que ocorre
85
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 29.
analítica de Jung desafiou essa segmentação arbitrária. Quando estudantes perguntaram
certa vez a Jung onde termina o Si-mesmo e quais as suas fronteiras, sua resposta foi que
não tem fim, é ilimitado. Para se entender o que ele quis dizer com esse comentário, tem
parecem fornecer cada vez mais elementos que ajudam a corroborar a cosmovisão oferecida
por sua teoria da sincronicidade. A teoria quântica, por exemplo, afirma que pode haver
ou sinal intermediário, e que essa “ação à distância” será instantânea. Esse “Princípio da
Não-localização” (segundo o qual alguma coisa pode ser afetada na ausência de qualquer
sugerido pelas equações de onda da teoria quântica 86. Segundo Zohar, a teoria quântica
indica que não existem coisas como partes isoladas da realidade, mas antes, apenas
inseparáveis. Essa visão sustenta que nosso mundo físico “... não é uma estrutura feita de
entre elementos cujos significados se elevam de seus relacionamentos ao todo” 87. Para a
autora, essa visão, “com suas nuances evidentemente místicas”, vai diretamente contra não
apenas o bom senso e a física clássica, mas também contra a Teoria da Relatividade, tanto
86
A demonstração matemática do Teorema de Bell excede os objetivos dessa monografia, e por isso, nos
contentaremos por hora, apenas com a providencial citação de sua existência, que para nossos fins já é o
suficiente.
87
Danah ZOHAR, Através da barreira do tempo, p. 163.
que Einstein, e mais dois pesquisadores – Boris Podolsky e Nathan Rosen – uniram-se e
direções opostas e com spins88 opostos. Sabe-se que um observador que olhe apenas uma
partícula não consegue prever se ela estará girando para a direita ou para a esquerda. Mas,
se as medições (ou seja, se as equações matemáticas) do observador mostrarem que ela está
girando para a direita, ele poderá prever que a outra partícula estará girando para a
esquerda, e vice-versa. A outra partícula poderia estar agora do outro lado da galáxia, mas
ainda assim saberíamos instantaneamente em que direção estava girando. Einstein achava
essa possibilidade, proposta pela teoria quântica, como sendo ridícula, pois para ser
verdadeira, precisaria ser necessário haver troca de informações entre as partículas numa
velocidade maior que a da luz, algo proibido pela teoria da relatividade. Porém a maioria
Rosen e Podolsky não mostra que seja possível enviar informações mais rapidamente que a
luz89. Uma interpretação mais condizente com a teoria quântica é a de que o experimento
calcular a posição da outra90. Segundo o físico Amit Goswami essa última linha de
88
Segundo Stephen Hawking, o spin é uma propriedade interna das partículas elementares, relacionada, mas
não idêntica, ao conceito comum de rotação.
89
Stephen HAWKING, O Universo numa casca de noz, p. 123, 124.
90
Cf. Danah ZOHAR, passim.
interpretação seria comprovada pelo denominado experimento de não-localidade de Alain
que todas as interações ou comunicações entre objetos ocorrem através de campos ou sinais
instantânea, entre elementos quânticos, sem qualquer troca de sinais através do espaço-
fenômeno da Não-localidade92.
realidade que opera num nível não-local, e que pode influenciar eventos no espaço-tempo,
ao tornar possíveis conexões, porém sem comunicação por sinais, através do espaço-tempo.
Jung tinha um termo para o domínio transcendente da consciência, onde reside a causa
comum de todos os eventos síncronísticos – o inconsciente coletivo. Foi denominado inconsciente
porque, normalmente, não estamos cientes da natureza não-local desses eventos. Empiricamente,
Jung descobriu que além do inconsciente pessoal freudiano, há um aspecto coletivo transpessoal de
nosso inconsciente que tem que operar fora do espaço-tempo, tem que ser não-local, uma vez que
parece ser independente de origem geográfica, cultura, ou tempo.
91
Amit GOSWAMI, O Universo Autoconsciente, p. 144-170.
92
Amit GOSWAMI, passim.
93
Amit GOSWAMI, O Universo Autoconsciente, p. 318.
As correlações não-locais do teorema de Bell e do experimento de Aspect são coincidências
acausais e seu significado – tais como os eventos de sincronicidade – segue o padrão de emergir
sempre após o fato, quando os observadores comparam dados. Se essas correlações são exemplos da
sincronicidade junguiana, então o aspecto de consciência não local aqui envolvido terá que ser
relacionado com o conceito de Jung relativo ao inconsciente coletivo 94.
Goswami deve corresponder, com toda a sua terminologia mais moderna, à mesma idéia ao
qual Jung queria se referir ao propor a existência de uma Realidade Transpsíquica na base
da psique, conceitos esses que por sua vez, estão diretamente relacionados ao conceito de
de nossa alma.
A hipótese da teoria quântica que compreende o universo como uma unidade básica
é correspondente na psicologia junguiana à noção de Unus Mundus 95, que por sua vez nos
leva também à noção da existência do conceito quase metafísico que Jung denominou de
quando é um arranjo inconsciente. Nesse caso, ele sugere que se deve admitir uma espécie
portanto, de informação), tal como se poderia esperar pelo pensamento comum. Segundo
ele, por mais incompreensível que isto possa parecer, nós nos vemos, afinal, forçados a
94
Ibid., p.160, 161.
95
Andrew SAMUELS, Dicionário Crítico de Análise Junguiana, p.221.
admitir que há, no inconsciente, uma espécie de conhecimento ou ´presença` a priori de
acontecimentos, sem qualquer base causal (em qualquer caso, nosso conceito de
vezes sabe mais do que a consciência. Segundo Stein, é esta concepção que leva Jung aos
coisas que estão além da nossa possibilidade consciente de conhecimento, então também
96
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p.186, 187.
Capítulo 4 – Realidade Transpsíquica e Percepções Transcerebrais
decorrente de alguma lesão cerebral. Em alguns casos – argumenta Jung – contra todas as
expectativas, uma lesão craniana grave nem sempre implica a correspondente perda de
consciência. Ao observador, a pessoa que sofreu a lesão parece apática, paralisada, “em
transe” e subjetivamente privada dos sentidos, porém a consciência não se acha extinta.
relato, os profissionais de saúde ficaram estarrecidos, mas tiveram que admitir a exatidão
de suas percepções. Durante a síncope (desmaio), a paciente tomou consciência de que, sem
sentir seu corpo e a posição em que jazia, ela olhava para baixo, de algum ponto situado
junto ao teto do quarto, e podia ver tudo o que se passava no recinto, abaixo dela, incluindo
a visão de si mesma deitada na cama, pálida e de olhos fechados, bem como a agitação dos
existência por trás dela, de um belo jardim para “outro mundo”. Jung cita outros exemplos
gerais, em que num estado semelhante de inconsciência, as pessoas têm uma sensação
nítida e impressionante de alucinação ou levitação. São casos em que a pessoa ferida tem
97
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 72, 73.
se eleva também. Pode-se perder a sensação do peso. Durante a levitação, a disposição
despreocupado, excitante`, são as palavras usadas – segundo Jung – para descrever esse
estado98.
Jung assevera que não é fácil explicar como que tais processos psíquicos
inusitadamente intensos podem ocorrer em estado de colapso grave e ser lembrados depois,
e como o paciente pode observar acontecimentos reais em seus detalhes concretos, com os
olhos fechados. Segundo todos os pressupostos, era de se esperar que uma anemia cerebral
psíquicos tão altamente complexos. Porém, estas experiências parecem mostrar que nos
estados de síncope nos quais, segundo todos os padrões de julgamento humano, há plena
Jung se questiona (1º) se não existe em nós um outro substrato nervoso ou cérebro
que possa pensar e perceber, ou (2º) se os processos psíquicos que ocorrem em nós durante
a perda de consciência não são fenômenos sincronísticos que não têm nenhuma conexão
98
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 71, 72.
... Não se deve excluir a priori esta última possibilidade, sobretudo dada a existência da
ESP, ou percepções independentes do tempo e do espaço que não podem ser explicadas
simplesmente como processos do substrato biológico. Onde percepções sensoriais são impossíveis, já
de início, só se pode pensar em sincronicidade 99.
do estado de coma”100.
tratei dessa temática a partir de outros sistemas de referências epistemológicos, que são
Espiritismo é compreendido como uma complexa doutrina que tenta integrar conceitos
99
Ibid., p. 74.
100
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 75.
101
Adalberto Ricardo PESSOA, passim.
comunicações mediúnicas, e que tratam de assuntos profundos relacionados ao homem, ao
Psicologia) não considere legítimo o aspecto científico dessa doutrina, o fato é que o
Espiritismo, assim como todas as religiões, possui uma visão específica de ser humano e
uma cosmovisão sobre o Universo102, e isso por si só, como sugeri em outra oportunidade,
O aspecto fundamental que quero destacar é que assim como Jung, a existência de
pensamentos e percepções transcerebrais também tem sido evidenciada por uma série de
pesquisadores espíritas. Um deles é o neurologista Núbor Orlando Facure 104, que em seu
livro Muito além dos neurônios – conferências e entrevistas sobre mente e Espírito,
considera que embora o cérebro seja um órgão extraordiário, a origem de nossos processos
mentais não deve se originar em seus processos biológicos. Para ele, o cérebro é o “órgão
de inserção do espírito nas coisas”, e o autor também comenta sobre a existência de uma
condições especiais105.
O médico, psiquiatra e psicanalista Sérgio Felipe de Oliveira 106, que realizou o seu
102
Esse fato é conhecido pela maioria dos psicólogos junguianos, e principalmente, pelos psicólogos
transpessoais.
103
Adalberto Ricardo PESSOA, passim
104
Núbor Orlando Facure é Membro da Associação Médico-Espírita de São Paulo e do Brasil, fez
especialização em Neurologia e Neurocirurgia no hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) e
lecionou na Faculdade de Medicina de Campinas – UNICAMP – durante 30 anos, onde fez doutorado, livre-
docência e tornou-se professor titular.
105
Núbor O. FACURE, Muito além dos neurônios, p. 80.
106
O professor Sérgio Felipe divulga seus trabalhos de pesquisa no site www.uniespirito.com.br.
pensamento não se origina, de fato, no cérebro. Para ele o cérebro é um órgão transdutor do
pensamento, ou seja, o pensamento é produzido por outro sistema, o qual ele considera
designar como sendo o Espírito. Em outras palavras, o cérebro teria a função de captar,
registrar, filtrar, processar e associar, os conteúdos psíquicos que por sua vez, seriam em
como órgão material biológico que produz o pensamento, mas é este órgão que define as
condições em que uma dada expressão da alma possa ou não, se manifestar107. O professor
Sérgio Felipe levanta alguns argumentos matemáticos para apoiar a sua hipótese 108.
espírito nos moldes da chamada Doutrina Espírita. Jung possuía o seu entendimento
cérebro, tanto na teoria da sincronicidade de Jung, quanto nos estudos de medicina 109 e
psicologia espírita.
transpsíquica. Outra evidência desse nível de realidade é a citação de Jung (já evidenciada
nessa monografia) sobre a idéia do físico Sir James Jeans que, acha possível que as origens
dos acontecimentos no substrato para além do espaço e do tempo (ou seja, no nível da
107
Adalberto Ricardo PESSOA, A Quinta Força, p. 123.
108
Adalberto Ricardo PESSOA, A matemática do Perispírito, http://www.psicologiaespirita.rg3.net.
109
Creio que vale frisar que, especialmente no Brasil, a medicina tem se mostrado mais aberta em relação aos
estudos e pesquisas das “Ciências do Espírito”, do que a psicologia.
realidade transpsíquica) incluam, também, as nossas atividades mentais, de sorte que o
curso dos acontecimentos futuros depende em parte dessa atividade mental 110.
intermediária entre o espírito e a matéria. Por trás desse conceito – para utilizar uma
... devemos ter presente que os fenômenos sincronísticos que podem ser verificados
empiricamente, longe de constituírem uma regra, são tão raros, que quase sempre se duvida de sua
existência. Na realidade, eles são, certamente muito mais freqüentes do que se pensa e se pode
provar, mas ainda não sabemos se ocorrem de modo tão freqüente e com tanta regularidade, que se
possa dizer que são fatos que obedecem a determinadas leis. (...) Aqui, devo acentuar mais uma vez a
possibilidade de a relação entre corpo e alma ser entendida como uma relação de sincronicidade. Se
esta simples conjetura um dia se confirmar, minha atual opinião de que a sincronicidade é um
fenômeno relativamente raro será corrigida 112.
110
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 78.
111
Ibid., p. 71.
112
Carl Gustav JUNG, Sincronicidade, p. 66.
Conclusão
termos, eles provam que um conteúdo percebido pelo observador pode ser representado, ao
mesmo tempo, por um acontecimento exterior, sem nenhuma conexão causal. Daí se
conclui: ou que a psique não pode ser localizada espacialmente, ou que o espaço é
relatividade do tempo. A constelação desse fato tem conseqüências de longo alcance, que
Em função de seu caráter psicóide, essa dimensão pode ser também a base da
própria realidade física que observamos, sentimos e vivemos. Inicialmente, temos que a
coletivo psicóide fornece ao gênero humano seu propósito no universo. Temos aqui, um
novo paradigma ou conceito de ciência, em que a consciência humana ganha uma grande
importância, já que para Jung, a significação da vida humana neste planeta está vinculada à
coisas e significados. Em outros termos, os humanos estão em uma posição que lhes
contemporâneo.
Como base para uma nova visão do mundo, o conceito de sincronicidade e suas
implicações funcionam com eficácia porque são bastante fáceis de entender intuitivamente
e de incorporar à vida cotidiana de cada um. Por exemplo, todos temos consciência de
acontecimentos em que a “sorte” nos bafejou e de dias de “azar” em que tudo parece correr
mal. Grupos de eventos que estão relacionados através de significado e imagem, mas
causalmente sem relação alguma entre si, podem ser facilmente experimentados e
verificados por qualquer pessoa. Mas aceitar esse conceito seriamente como princípio
científico nada tem de fácil, mas sim de revolucionário, já que a era do Iluminismo deixou
sem significação, supondo que o cosmos e a história estão dispostos pelo acaso e pelas leis
causais que governam a matéria. O paradigma da sincronicidade, por outro lado, requer
uma forma de pensar inteiramente nova acerca da natureza e da história. Se uma pessoa
que o subjacente arquétipo de ordem está organizando a mesma de tal modo a produzir
algum novo avanço da consciência da própria humanidade. Isso não significa progresso
realidade, que pode equivaler ao reconhecimento tanto do seu lado terrível quanto de sua
reflexo de realidade que a história como um todo revela. Cada história individual e a
coletiva como um todo, devem ser vistas em relação recíproca e unidas de forma
significativa113.
psicológico, uma vez que é experimentado dentro da psique na forma de imagens e idéias.
113
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 190,191.
Por outro lado, é irrepresentável em si mesmo e sua essência está fora da psique,
configurações que ocorrem na psique estão relacionadas com eventos e padrões situados
dentro e fora da psique pelo evento de sua explosão, na e através do contexto histórico
mundial em que surgiu, e por milhões de sonhos em que figurou a bomba 114.
primeiro lugar, afirma existir uma significação objetiva subjacente nas coincidências que
outro lado, ou em segundo lugar, cria a possibilidade de que exista um significado onde
intuitivamente não o enxergamos, quando por exemplo, ocorrem acidentes que nos
impressionam como meramente devidos ao puro acaso. Em ambos os casos, esse tipo de
A minha hipótese particular é que essa significação possa ter também uma
especialmente quando ainda temos alguma lição existencial importante a ser realizada
terapeuta ter entrado na vida do seu paciente exatamente naquele momento crucial de seu
114
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 192, 193.
exigência evolutiva. O próprio terapeuta pode estar passando por um momento evolutivo
arquétipos cruciais.
tem lugar por momentos de significativa coincidência (sincronicidade), assim como por
sexualidade, por exemplo, poderia ser ativado não só em virtude de uma cadeia causal de
momento, e assim, por exemplo, um encontro “ocasional” com uma pessoa converte-se
num relacionamento para a vida inteira. Nesse momento, algo do mundo psicóide (ou
115
Murray STEIN, Jung – O Mapa da Alma, p. 193.
Por que acontecem tais conexões parece um mistério se refletirmos unicamente em
significação, então, estaremos muito mais perto de uma resposta mais completa e
Universo como um todo. Apenas recentemente ela foi reconhecida como uma disciplina
livro de Jung sobre Sincronicidade inicia-se e concentra-se sobre o que o autor designou de
Mas, Jung também considera a definição mais ampla. Esta se relaciona com a organização
acausal no universo sem qualquer referência especial à psique humana. Isso corresponde,
segundo Jung, numa concepção mais geral de sincronicidade como organização acausal no
Jung não teorizou apenas sobre Psicologia, mas também sobre Cosmologia.
116
Ibid., p. 194.
117
Segundo o físico e engenheiro brasileiro Wladimyr Sanchez, PhD e doutor em ciências, a palavra princípio
significa uma proposição que se coloca no início de uma dedução e que não é deduzida de nenhuma outra
dentro do sistema considerado, sendo admitida provisoriamente, como ponto de partida para a construção de
humana de organização acausal, através do fator psicóide e da transgressividade do
outras palavras, para Jung existe um princípio particular de sincronicidade ativa no mundo,
fazendo com que fatos de certa maneira aconteçam juntos como se fossem um só, apesar de
não captarmos essa integração, e ele acreditava que um dia talvez pudéssemos descobrir
alcance de sua penetrante e unificada visão. Segundo ele, os seres humanos têm um papel
O quatérnio de relações traçadas por Jung e Pauli, para descrever o universo, como
pessoal participam da maneira mais profunda na ordem desse universo por intermédio do
e integradas. Cada pessoa pode testemunhar o Criador e as obras criativas desde dentro, por
ANDREETA, José Pedro; ANDREETA, Maria de Lourdes. Quem se atreve a ter certeza?
BOHM, David. A totalidade e a ordem implicada – Uma nova percepção da realidade. São
FACURE, Núbor Orlando. Muito além dos neurônios – Conferências e entrevistas sobre
HALL, James A. Jung e a Interpreatação dos Sonhos – Manual de teoria e prática. São
Paulo: Cultrix, 1987.
HAWKING, Stephen. O Universo numa Casca de noz. 6ª ed. São Paulo: Arx, 2002.
Vozes, 1984.
JUNG, Carl Gustav. Memórias, Sonhos, Reflexões. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira,
1975.
JUNG, Carl Gustav. O Homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira,
1964.
PESSOA, Adalberto Ricardo. A Quinta Força – Uma nova visão da Alma Humana. São
Paulo: DPL, 2003.
SHARP, Daryl. Léxico Junguiano – Dicionário de termos e conceitos. São Paulo: Cultrix,
1991
STEIN, Murray. Jung: O Mapa da Alma – uma introdução. São Paulo: Ed. Cultrix, 1998.