Discipulado 3

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O DISCIPULADO DE ACORDO COM O EXEMPLO E ENSINO DE JESUS

REGISTRADOS NO EVANGELHO SEGUNDO MATEUS - Parte III

Reginaldo Corrêa de Carvalho

2. O ENSINO DE JESUS COMO MODELO PARA O DISCIPULADO.

Nesta época, bem como em todas as demais épocas no decorrer da história, o ser
humano encontra-se alienado de Deus, sozinho sem o seu criador. A solidão do ser
humano não é culpa de Deus, mas sim dele próprio que continua a se afastar dEle
vivendo uma vida de pecados e rebeldia.
Não apenas isto, mas o ser humano sem Deus é egocêntrico. Pensa só em si
mesmo e é muitíssimo inclinado para o conforto e bem estar próprio. Suas maiores metas
são: ter dinheiro, saúde, longevidade e uma vida sem problemas. Traduzindo em uma
palavra, o ser humano deseja “sucesso.”1
Muitos líderes religiosos sabedores do problema e ambição humanas, tentam de
todas as formas, arrebanhar o maior número possível de pessoas para as suas
comunidades religiosas. “Sem se importar com o que é certo ou errado, eles querem
mesmo é o sucesso”. (ROMEIRO, 1995, p. 28). Neste afã de encher os seus templos,
muitos líderes valem-se de técnicas e recursos os mais diversos e pregam sobre os
objetos da ambição humana. Muitos usam até mesmo de experiências as mais
sincréticas e esdrúxulas para alcançarem os seus objetivos.
No que diz respeito à Palavra de Deus, tais pregadores quase sempre distorcem o
conteúdo e mensagem primária da Bíblia - quando ela não é ignorada. Por mais que se
diga que o verdadeiro cristianismo seja o pregado por estes líderes, o fato é que quando
se estuda os evangelhos e particularmente o evangelho de Mateus, descobre-se que o
exemplo e ensino de Jesus são deixados para segundo plano por estes pregadores.
Desta maneira, a Igreja de Cristo deveria estar estudando não só o conteúdo da
mensagem de Jesus, como também, o modo e o estilo de ensino de Jesus. Todas as
técnicas e recursos que a Igreja usa ou queira usar (talvez para imitar os “pregadores de
sucesso”), se não for eticamente correta e se não tiver respaldo bíblico, por mais
vantajoso que seja, deve ser rejeitado. Isto porque mais cedo ou mais tarde, os
malefícios serão trazidos à tona.
É fundamental que a Igreja recorra à Palavra de Deus e ao exemplo de Jesus para
a prática do ensino e do discipulado nesta época. Neste sentido, não apenas a pessoa de
Cristo é tomada como exemplo, mas também todas as nuanças do ministério educacional
de Jesus devem ser levadas em consideração e devem ser alvo de detalhado estudo e
assimilação.
Algumas razões podem ser dadas para esta imitação do modelo educacional de
Jesus. Primeiro, analisando a sua pessoa, constata-se um envolvimento quase simbiótico
dEle com o seu ensino. Desde a sua meninice, Ele esteve envolvido com o ensino (Lc
2.46-47). Já adulto, os evangelhos narram que, até mesmo os pequenos detalhes e
experiências de Jesus eram expressões do seu ensino (Mt 21.18-22) . Segundo: ele foi
quem, de fato, investiu intensamente a sua vida, tempo e energias durante três anos de
sua existência nesta tarefa, particularmente com os seus discípulos. Terceiro: nenhuma
outra atividade de Jesus foi tão intensa ou maior do que o ensino. Quarto: O ensino de
Cristo é diversificado e completo. O Senhor não tocou em um ou apenas alguns temas de
ensino. Ele ensinou sobre assuntos ligados a ética, soteriologia, relacionamentos e

1
Este tipo de mentalidade pode ser visto em diversos livros e pensadores modernos. Mas, talvez o que mais tenha
contribuído para a propagação dos ideais de “sucesso” no Brasil seja o neurolingüista Lair Ribeiro. No meio
religioso, nomes como Edir Macedo e R. R. Soares, despontam como os maiores articuladores da chamada Teologia
da Prosperidade no Brasil.
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escatologia. Tudo quanto o ser humano necessita saber e experimentar acerca de sua
espiritualidade e vida terrena, pode ser ensinado por meio da vida, obra e palavras de
Cristo.
Resumidamente, então, pode-se dizer que Jesus dedicou-se de maneira
inigualável à tarefa de educar e transformar homens comuns em seus discípulos. As
atividades dele aqui na terra visavam a transformação por meio do ensino.
Assim sendo, se uma Igreja quer ser fiel em seu ministério educacional, necessita
em primeiro lugar, seguir as mesmas pegadas do seu Senhor e Mestre. Ainda que essa
Igreja possa se valer das modernas práticas educacionais, sem, todavia, olhar para
Jesus e discernir e aprender dEle, estará a Igreja fadada ao fracasso ou, o que é pior, a
uma prática educacional divorciada do modelo bíblico-cristocêntrico. Se a Igreja não olhar
para Jesus, preterindo-o, e se valer de qualquer outro modelo e exemplo, estará
defraudando-se e ministrando uma sabedoria puramente humana e, portanto, inútil para
transformação espiritual de que todos os seres humanos necessitam.
Jesus é modelo não só de vida, mais de mestre. O fato de se olhar somente para
Jesus na tarefa de ensinar não subtrai ou se deixa de acrescentar nada. Jesus foi quem
magistralmente ministrou às pessoas. Sua pedagogia, seu procedimento, suas
estratégias, enfim, tudo aponta para se ver em Jesus um grandioso exemplo a ser
seguido. A Igreja que não seguir os seus exemplos estará furtando de suas atividades
ministeriais uma preciosa oportunidade de ser bem sucedida em sua missão.
E dentro desta visão, o evangelho segundo Mateus encaixa-se perfeitamente bem.
Nenhum outro evangelho enfatiza tanto a atividade educacional de Jesus como este.
Além disto, este evangelho é apresentado no mínimo como, “um manual de discipulado”
(WILKIAS, 1992, p. 183).
Por este motivo, então, é imprescindível a leitura e estudo deste evangelho para
uma compreensão maior e melhor das atividades docentes de Jesus. E, a partir desta
compreensão, a Igreja pode absorver um modelo e um referencial de ensino inigualável.
Na percepção de Champlim, “as técnicas por ele usadas, como o Grande Mestre que ele
foi, até hoje são o mais excelente modelo a ser seguido por aqueles que querem
aprender a ensinar. A didática de Jesus era perfeita” (CHAMPLIN, 1991, p. 393).

2.1 A relação entre o discipulado e o ensino de Cristo.

A importância do ensino dentro do ministério discipulador de Jesus não pode ser


medido e avaliado de forma modesta e inexpressiva. Ensino e discipulado andam juntos,
bem perto um do outro, no ministério desenvolvido por Ele. Deste modo, não seria uma
hipérbole afirmar que sem o ensino, não há discipulado. De igual forma, não seria
exagero dizer que todo verdadeiro discípulo tem como característica, a afinidade e o
conhecimento dos ensinos de Cristo.
Para Mateus, “ser um discípulo significa aprender, e ele torna claro que os
discípulos aprenderam muitos ensinos importantes de Jesus” (MORRIS, 1990, p. 137).
O próprio Senhor Jesus associa o ser discípulo com o recebimento do seu ensino,
com o aprender a “guardar todas as coisas que vos tenho dito” (Mt 28.20). No projeto de
transformação de vidas e inserção destas no Reino de Deus, obrigatoriamente, estas
pessoas devem receber o ensino de Cristo. Só pode ser considerada cristã e discípula de
Cristo a pessoa que é ensinada nos caminhos do Senhor.
Por esta razão, três grupos distintos nos evangelhos são diferenciados. A classe
religiosa que é antagônica a Cristo e seu ensino - ainda que muitas vezes reconheça a
autenticidade e poder com que Ele ministra. A multidão, que é neutra e constitui-se em
alvo para Jesus. E os discípulos, que são os verdadeiros aprendizes do Senhor, aqueles
que recebem os ensinos do Mestre (WILKIAS, 1992, p. 183).
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Os discípulos não apenas recebem os ensinamentos de Cristo, pois isto não é
tudo; é necessário praticar. Mateus 7.24-27 deixa claro que ser mero ouvinte não é de
qualquer valia, pois, o que importa é ouvir e praticar os ensinamentos do Senhor.
A conclusão do sermão do Monte é um apelo à obediência prática de todas as
proposta de discipulado feitas por Jesus. A prática do ensino recebido é que fará a
diferença na vida daqueles que ouvem as palavras de Cristo. John Stott assim observa:
A verdade sobre a qual Jesus está insistindo nestes dois parágrafos finais do
Sermão é que nem um conhecimento intelectual dele, nem uma profissão de fé
verbal, embora ambos sejam essenciais em si mesmos, podem substituir a
obediência. A pergunta não é se nós dizemos coisas bonitas, polidas ortodoxas e
entusiásticas sobre Jesus; nem se ouvimos suas palavras, se prestamos atenção,
se estudamos, se meditamos e se memorizamos até empanturrar as nossas
mentes com os seus ensinamentos, mas se nós fazemos o que dizemos e se
fazemos o que sabemos; em outras palavras, se o senhorio do Jesus que
professamos é a grande realidade de nossa vida. (1993, p. 221).

A prática do ensino constitui-se no caminho de radicalidade daqueles que


entraram no discipulado. Todos aqueles que entraram no caminho do discipulado devem
saber que não é fácil, mas, ao mesmo tempo devem saber que é imprescindível praticar
os ensinamentos de Jesus. Nas palavras de John Stott:
Assim, o Sermão termina com a mesma nota de escolha radical da qual
estivemos conscientes o tempo todo. Jesus não coloca diante de seus discípulos
uma lista de regras éticas fáceis de obedecer, mas um conjunto de valores e
ideais que é totalmente diferente do caminho do mundo. Ele nos incentiva a
renunciarmos a cultura secular prevalecente em favor da contra-cultura cristã.
(1993, p. 222).

O verdadeiro discípulo ouve e pratica. Sem a obediência ética e comportamental,


o ensino recebido pelos discípulos não tem o poder de autenticar o discipulado. Esta é a
conclusão a que se chega quando se analisa o término do livro.
Comentando o final do livro, Giuseppe Barbaglio afirma:
Estas palavras descrevem com precisão a Igreja. Ela não é somente comunidade
dos santificados pelo sacramento, mas também praticantes de uma nova
obediência. O discípulo se qualifica como tal pela tradução na prática do
ensinamento do mestre (7.24-27). Mateus insiste sobre isto em todo o seu
evangelho. A revelação de Jesus não é tanto revelação de mistérios à mente,
quanto proposição de uma vontade precisa do pai. Ele não veio trazer uma
doutrina esotérica, destinada a enriquecer a nossa inteligência. Sua palavra é mais
um mandato, e como tal, dirigi-se ao homem como ser operativo, pondo-o perante
novas tarefas. (BARBAGLIO, 1990, p. 419).

Desta forma, fica revelado que a mola mestra na tarefa de fazer discípulos recai
sobre a tarefa de ensinar. E, este ensino não significa mera compreensão intelectual ou
uma confissão de fé verbal e destituída de prática.
O verdadeiro discípulo de Jesus recebe e pratica os seus ensinamentos. Sem
ensino e a prática deste, não há genuíno discipulado. A conscientização deste fato
constitui-se no primeiro passo rumo à concretização de um discipulado forte e autêntico.

2.2 O lugar do ensino no ministério discipulador de Cristo.


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Acima viu-se que a relação entre o ensino e o discipulado é de aproximação,
quase uma fusão entre os dois. Há uma simbiose entre ensino e discipulado. Um não
vive sem o outro.
Percebe-se nos evangelhos, e particularmente em Mateus, que o ensino era a
principal tarefa de Jesus. Tudo quanto ele fazia desembocava no ensino das vidas. Nas
palavras de Champlim:
Nenhum outro aspecto do ministério de Jesus é tão freqüentemente salientado nos
evangelhos como o seu ensino. Até mesmo questões como a pregação e os
milagres envolviam, necessariamente, o ato de ensinar. Em certo sentido, pode-se
afirmar que tudo quanto Jesus dizia e fazia tinha por finalidade dar-lhe a
oportunidade de apresentar o seu ensino (CHAMPLIN, 1991, p. 392).

Além disto, numa leitura sensível dos evangelhos, pode-se constatar que Jesus é
muito mais conhecido como Mestre do que como executor de qualquer outro ofício. Este
é um dado revelador. Nas palavras de Price:
Nos evangelhos, Jesus é chamado mestre nada menos que quarenta e cinco
vezes, e nunca se fala nEle como pregador. Somando-se todos os termos
equivalentes a mestre, temos o total de sessenta e um. O vocábulo mestre é
usado sessenta e seis vezes na versão King James; cinqüenta e quatro vezes é
derivada da palavra grega que significa professor ou mestre. Fala-se de Jesus
ensinando, quarenta e cinco vezes; e onze apenas pregando, e mesmo assim,
pregando e ensinando (PRICE, 1993, p. 15,16).

Junte-se a isto o fato de que no evangelho de Mateus toda a sua estrutura


corrobora para o discipulado. Este evangelho contém cinco grandes discursos que,
quanto ao término de cada um destes (Mt 7. 28-29; 11.1; 13.53; 19.1; 26.1), a expressão
ensino ou uma equivalente é assinalada (CARSON, MOO & MORRIS, 1997, p. 69).
Coleman, comentando sobre o ensino de Cristo, afirma que ele era respeitado
sobretudo como mestre. Ele diz que “é provável que a maioria das pessoas o visse mais
como professor do que como o messias, pois questionavam suas afirmações de que era
o cristo. O fato é que as multidões reconheciam sua grande habilidade para ensinar e
comunicar.” (PRICE, 1991, p. 133).
Resumidamente falando, o ensino assume uma posição central dentro do escopo
do evangelho segundo Mateus. Ele ensinou mais do que desenvolveu qualquer outra
realidade do seu ministério. E, mais ainda, ele ensinou com vistas a formar discípulos
especialmente preparados. Eles receberam ministração intensa e especial.
Sem o ensino não há verdadeiro discipulado. Pode-se experimentar o poder do
Reino, as bênçãos do ministério de Jesus, porém, se não se recebe a ministração do
ensino, as pessoas que foram atingidas por alguma atuação dadivosa de Jesus são
consideradas apenas personagens coadjuvantes no cenário deste evangelho.
O ensino é, portanto, central e sua importância incalculável. Nos dois resumos ou
sumários encontrados no evangelho (Mt 4.23-25; 9.35-38) (BARBAGLIO, 1990, p. 102,
175), o ensino encabeça a lista de atividades de Jesus. Antes de qualquer outra tarefa, o
ensino aparece. Ele é imprescindível no ministério discipulador de Cristo.

2.3 A metodologia pedagógica do discipulado de Cristo.

O ensino ministrado por Jesus era atraente e arrebatador; suas palavras e


ensinamentos causavam êxtase aos seus ouvintes Prova disto, é a atitude demonstrada
por aqueles que ouviam as suas palavras. O texto de Mateus 7.28, por exemplo, revela
que: “quando Jesus acabou de proferir estas palavras, estavam as multidões
5
maravilhadas da sua doutrina.” Mateus 13. 53-54, mostra o mesmo espanto e
magnetismo exercido por Ele, quando assevera: “Tendo Jesus proferido estas parábolas,
retirou-se dali. E, chegando à sua terra, ensinava-os na sinagoga, de tal sorte que se
maravilhavam, e diziam: donde lhe vem esta sabedoria e poderes miraculosos?”
Mas, como Jesus conseguia exercer todo este controle e domínio de seu público?
Alguns poderiam argumentar dizendo que o espanto, magnetismo e sensação exercidos
por Jesus deviam-se aos poderes sobrenaturais e aos milagres que realizava. Em parte
pode-se dizer que sim. Porém, na seção do sermão do monte (Mt 5-7) nenhum sinal ou
maravilha tinha sido operado por Ele. Somente instrução fora ministrada naquele
momento que ele com seus discípulos e multidões estavam assentados.
O texto de Mateus 7.28-29 deixa claro que o fator de diferença entre o ensino de
Jesus e o de seus opositores religiosos estava na autoridade com que Ele ministrava.
Mateus deixa isto inequivocamente registrado quando diz que a razão da diferença era
“porque Ele (Jesus) as ensinava como que tem autoridade, e não como os escribas.” (Mt
7.29).
Em diversos momentos do evangelho, os escribas e fariseus são assinalados
como hipócritas, pessoas meramente apegadas a normas e leis sem todavia cumprirem
ou praticarem os próprios ensinamentos ministrados. Por esta razão, conclui-se que no
evangelho de Mateus, a autoridade com que Jesus ensinava tem ligação com o fato dEle
não divorciar a palavra da prática.
No capítulo 23 de Mateus, Jesus censura veementemente os escribas e fariseus
por suas posturas e hábitos não piedosos. Eles não tinham o requisito básico para a
ministração do ensino, que é a autoridade.
Todavia, num certo sentido, existiu uma prática metodológica comum a Jesus e
aos mestres de sua época. Se, por um lado faltava autoridade aos fariseus e escribas e
sobrava para Jesus, é certo, como assevera Coleman que, tanto Jesus como estes
mestres, valeram-se da memorização na tarefa de educar:
Sem dúvida alguma, o método de ensino mais usado para a educação era o da
memorização. Qualquer outra forma de instrução que não adotasse a recitação era
olhada com suspeita.
Para a avaliação da aprendizagem, os alunos tinham que recitar longas passagens
das Escrituras, com perfeição. É por isso que tanto Jesus como outros conheciam
tão bem a Bíblia. (PRICE, 1991, p. 131).

Jesus, de muitas maneiras, fixou os seus ensinamentos por meio de métodos que
permitiam aos seus ouvintes, guardarem tudo quanto ele ministrava. As histórias, a
interatividade com seus discípulos, o uso de símbolos e objetos, enfim, todo um aparato
metodológico, permitiu que os seus ouvintes guardassem em sua memória as palavras
dele por toda a vida. Prova deste fato podemos encontrar no texto de Atos 20.35, na
qual o Apóstolo Paulo cita um dito de Jesus que ele, com certeza não havia ouvido da
própria boca de Cristo, mas recebera como tradição dos discípulos mais antigos. O texto
fala: “... e recordar as palavras do Senhor Jesus que disse: mais bem-aventurada coisa é
dar do que receber.” Assim como este dito, haviam outras palavras, outros ensinamentos
que estavam na mente e no coração dos discípulos e que, entretanto, não foram escritos
e registrados (Jo 21.25).
Além deste, Price dá uma lista com algumas das metodologias empregadas por
Jesus (1993, pp. 115-144). Tais métodos, ajudaram aos seus ouvintes a memorizarem os
seus ensinamentos. Mais especificamente, os seus discípulos foram impactados com
eles. Os métodos que Price observa na prática pedagógica de Jesus são estes que
seguem:
Uso de objetos e coisas. A mentalidade judaica não é dada a abstrações e
filosofias. Coleman afirma que “Israel tinha pouco ou quase nenhum apreço pela filosofia
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antiga ou mesmo a de seu tempo, e sua inclinação para a matemática ou engenharia
também não era grande” (PRICE, 1993, p. 121). O pensamento do povo e o ensino que
estes recebiam tocavam mais nas realidades concretas do que abstratas. Desta forma,
Jesus faz uso do pão e do vinho para ilustrar a realidade do seu corpo e sangue que
estavam sendo oferecidos em sacrifício a Deus (Mt 26. 26ss). Da mesma forma Jesus
toma uma criança para ensinar acerca dos valores e atitudes que os seus discípulos
deveriam ter dentro do Reino de Deus (Mt 18. 1-4). Quando Jesus foi abordado pelos
discípulos de João quanto à sua messianidade, Jesus provou, de forma concreta e
palpável, mostrando os seus feitos e obras poderosas (Mt 11.2-6).
Em suma, os ensinamentos de Cristo eram concretos e muitas vezes valiam-se de
objetos e coisas para tornar tangível a sua mensagem.
Histórias ou parábolas. Dentre os métodos usados por Jesus, este foi o de que
Ele mais lançou mão. Bailey diz que “um estudioso admitirá haver mais de setenta
parábolas nos evangelhos sinóticos, enquanto que outros as limitará a trinta” (BAILEY,
1985, p. 12). Price observa que “cerca de um quarto das palavras de Jesus registradas
por Marcos, e cerca da metade das registradas por Lucas têm a forma de parábolas”
(PRICE, 1993, p. 126). Não se encontram tantas parábolas em Mateus como em Marcos
e Lucas. Mas, há um bom número (Mt 7.15-23; 13.1ss; 22.1-14).
As parábolas geralmente eram histórias contadas, cujo objetivo principal era
revelar alguma verdade. Algumas parábolas, às vezes enigmáticas, não eram entendidas
a priori pelos discípulos. Porém, no evangelho de Mateus, discípulo é aquela pessoa a
quem é dado conhecer os mistérios do Reino dos céus (Mt 13.11). Zumstein, tratando da
Igreja, e mais propriamente dos discípulos no evangelho de Mateus, afirma que para o
autor “os discípulos são, por excelência, aqueles que compreendem” (ZUMSTEIN, 1990,
p. 59). Por esta razão, as parábolas eram usadas por Jesus por ser, via de regra, um
método simples e elucidativo. Os seus ouvintes tinham muito mais facilidades em
compreender os seus ensinamentos ministrados por este método. Sobre as vantagens
deste, Champlim observa que:
Era através das parábolas que, por muitas vezes, Jesus obtinha e conservava a
atenção dos seus ouvintes. Ele falava ao coração das pessoas, em palavras que
se repetiriam com sentidos cada vez mais profundos quando elas meditavam
sobre a comparação ou comentário interessante. Desta forma, era possível dizer
coisas, nas entrelinhas, sob a capa de uma figura simbólica, como não se poderia
fazê-lo em um discurso mais direto. (CHAMPLIN, 1991, p. 395).

Jesus se valia deste recurso pedagógico para ensinar e não para Ilustrar. Price,
entretanto, pensa o contrário. Ele afirma que a parábola “é uma história ou ilustração
tirada de algum caso conhecido ou comum da vida, para lançar luz sobre outro caso não
muito conhecido” (PRICE, 1993, p. 95). Bailey assevera que “...torna-se imediatamente
claro que as parábolas não são ilustrações” (1985, p. 13).
Bailey vai mais além e garante que a parábola é um meio pelo qual o discípulo
interage e reage aos ensinamentos do mestre: “as parábolas de Jesus são uma forma
concreta e dramática de linguagem teológica que força o ouvinte a reagir. Elas revelam a
natureza do reino de Deus e/ou indicam como um filho do reino deve agir” (BAILEY,
1985, p. 14).
Analisando as parábolas proferidas por Jesus tem-se a percepção de que Bailey é
que tem razão ao afirmar que elas não são molduras ilustrativas, mas sim ensinos vivos e
profundos de Jesus.
A propósito, é o próprio Price que faz a seguinte observação: “se dos ensinos de
Jesus tirássemos as parábolas, muito desse ensino se perderia. E, se ele não tivesse
lançado mão desse método, não teria encontrado nada tão eficiente como as parábolas”
(PRICE, 1993, p. 127).
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Perguntas e/ou questionamentos. Dentre os métodos que visam a interação
professor aluno, o método de perguntas e/ou questionamentos é um dos mais antigos e
proveitosos. Price afirma que ele é “um dos mais antigos e mais empregados. Sócrates
se tornou famoso por tê-lo usado. Este método era muito usado tanto nos dias do Velho
como do Novo Testamento, e vem sendo empregado quase sempre. Hoje é ainda um
dos métodos de ensino mais usados” (PRICE, 1993, p. 135).
Jesus valeu-se imensamente deste método. Price informa que:
Um dos primeiros quadros que temos do Mestre, após seu nascimento e infância,
nos mostra Jesus fazendo perguntas. Com doze anos, tendo ficado na cidade de
Jerusalém, longe dos pais, que já estavam de volta, foi achado no templo, sentado
no meio dos professores, ouvindo-os e fazendo-lhes perguntas (Lc 2.46, tradução
de Moffatt). Essa tendência parece ter acompanhado Jesus durante a sua vida. O
Sunday School Times afirma que Jesus fez 154 perguntas. Outros dizem que se
acham nos evangelhos, mais de 100 perguntas diferentes (PRICE, 1993, p. 137).
A importância deste método jaz no fato dele criar uma série de vantagens para
quem ensina. Através dele, Jesus conseguia “atrair a atenção e estabelecia um ponto de
contato” bem como preparava a mente das pessoas para aquilo que ele iria dizer
(id.,ibid., p. 137). As perguntas trazem objetividade às reflexões que se querem fazer.
Além de chamar a atenção, os alunos se detêm num determinado tema ou assunto mais
facilmente. Preleções, muitas vezes extensas e cansativas, dispersam com facilidade a
concentração dos alunos. No método de perguntas, o aluno se torna ativo e participante
na tarefa de construção do aprendizado.
Além disto, este método provoca a reflexão e o pensamento. Quando se faz uma
pergunta a uma determinada pessoa, ela, automaticamente, necessita se colocar num
estado de reflexão. Isto a levará a refletir sobre o tema de maneira, no mínimo, mais
profunda.
Num processo de massificação de idéias, nunca a reflexão é exigida, pelo
contrário, ela é abominada; e quando há perguntas, surgem as respostas pré-concebidas
que devem ser guardadas pelos ouvintes. É inquestionável que Jesus doutrinou os seus
discípulos, revelando-lhes sempre a vontade do Pai. Seu objetivo era este. Mas, nos
evangelhos, Jesus é mostrado como alguém que, embora sendo a encarnação da
verdade, e por isso não necessitava perguntar nada a ninguém, fez uso deste método
para o proveito maior de seus discípulos.
Jesus poderia iniciar um ensinamento perguntando aos seus discípulos acerca de
determinado tema e logo em seguida revelava uma verdade (Mt 16. 13-15). Também
podia silenciar os seus opositores com perguntas inquietantes (Mt 21.25). Enfim, Jesus
soube valer-se deste método e o fez como ninguém. Suas perguntas eram sempre claras
e objetivas; não eram perguntas para longas elucubrações, elas sempre desembocam
num propósito bem específico.
Geralmente as perguntas trazem consigo a discussão e o debate. Quando se
consegue levar os alunos a este estágio de aprendizado, dá-se início a uma educação
criadora e transformadora. A diferença deste método reside no fato de que quando os
alunos não debatem, discutem ou refletem sobre os assuntos tratados, eles apenas estão
recebendo informações de conteúdos mecânicos e sem aplicabilidade.
O que mais os discípulos precisam fazer é interagir com os ensinos de Jesus e um
bom método para que isto aconteça é o método de perguntas, reflexão e respostas.
Todos estes métodos empregados por Jesus possuem uma certa simplicidade.
Não são nada sofisticados. Todavia, não se pode confundir simplicidade com
superficialidade. Jesus não foi superficial, pelo contrário, Jesus foi profundo e revelou
verdades profundas que nem mesmo os sábios e entendidos puderam perscrutar e
descobrir com as suas ciências (Mt 11.25-27).
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É preciso desenvolver-se uma pedagogia que induza o interlocutor a perguntar, a
questionar, pois só assim se estará desenvolvendo um ensino relevante e pertinente ao
discipulando. Se se souber interagir com o discipulando por meio de perguntas
inteligentes e penetrantes, que o obrigue a estar diante de si mesmo e com as questões
que se lhe apresentam, ele certamente há de lograr êxito.

2.4 À guisa de conclusão.

Ao se olhar para a prática de anúncio do evangelho e discipulado em Jesus de


Nazaré, tem-se a nítida impressão de que a Igreja hodierna tem pecado e negligenciado
grandemente os princípios e modelos bíblicos deixados para ela.
Tem-se dado pouca ênfase ao ensino como o princípio de transformação de vida
do ser humano em um discípulo autêntico de Jesus. Acredita-se que apelos ou
freqüência aos templos religiosos, manifestação de curas, entusiasmo litúrgico ou megas
programações são fatores suficientemente fortes para considerar alguém um discípulo de
Cristo.
Quando se fala em ensino, deve-se ter em mente o genuíno e verdadeiro ensino,
aquele que é instrumento de Deus para a transformação do ser humano. Sobre o ensino
que é ministrado hoje, Bruce H. Wilkson afirma que “O que se vê hoje - seja em
escolas, Igrejas, templos, seminários - não é ensino, mas apenas apresentação de um
conteúdo programático. Por causa disto os alunos se acham desmotivados.”
(HENDRICKS, 1991, p. 9).
Falta aos professores e mestres de hoje aquela autoridade que se via em Jesus e
que faltava aos escribas e fariseus do Novo Testamento (7.28-29). A Igreja necessita
compreender que uma ministração autêntica e transformadora tem como base a unção
do Espírito Santo. É por meio dela que o ensino exorta, confronta e edifica as vidas que
estão se aproximando de Jesus ou já pertencem a Ele.
Falta também acreditar que sem ensino não há discipulado. Falta enxergar o
ensino como tarefa central e imprescindível do discipulado. Sem o ensino a Igreja pode
desviar-se para muitos erros sérios e fatais. Sem uma boa metodologia pedagógica pode
a Igreja tornar o ensino de Jesus que é maravilhoso e imprescindível à vida humana, num
amontoado de informações áridas, pesadas e dispensáveis.
É preciso ensinar e dar a devida importância ao ensino bem como é necessário
um bom preparo e metodologia que sejam usados pelo Espírito Santo, o eterno
ensinador dos discípulos.
A Grande Comissão para se fazer discípulos de todas as nações encontra o seu
ápice, indiscutivelmente, na tarefa de ensinar a todos os ouvintes e inseridos na
comunidade cristã a guardar todas as coisas que Jesus ensinou (Mt. 28.20).

“Respondeu-lhe Jesus: Amarás o Senhor Teu


Deus de todo o teu coração, de toda a tua
alma, e de todo o teu entendimento”.
Mt. 22.37.

Reginaldo Corrêa de Carvalho é Pastor auxiliar da Igreja Presbiteriana Jardim de


Oração em Santos - São Paulo. Tem Mestrado em Educação Cristã pelo Centro de
Pós-graduação "Andrew Jumper" da Igreja Presbiteriana.

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