Introducao A Educacao Crista 15 - Final

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 14

Introdução à Educação Cristã (15)

– Reflexões, Desafios e Pressupostos –

ADENDO:

A ORIGEM DA ESCOLA DOMINICAL NO BRASIL – ESBOÇO HIS-


TÓRICO:
“Eu tenho a certeza que as escolas
dominicais são, atualmente, a melhor
instituição prática para controlar esses
elementos indisciplinados e violentos da
sociedade e providenciar-lhes uma e-
ducação básica” − Robert Raikes em au-
1
diência com a Rainha Carlota da Inglaterra.

Introdução:

A Escola Dominical foi idealizada pelo Robert Raikes (1736-1811), um jornalista


2
anglicano que no ano de 1780, em Gloucester, na Inglaterra, iniciou um trabalho de
educação cristã ministrada a crianças que não frequentavam escola. Ele começou
pelo estudo das Escrituras e depois passou também a estudar os Catecismos. A es-
te homem sem dúvida alguma, devemos o início sistemático desta escola tão singu-
3
lar, que se espalhou rapidamente por toda a Inglaterra. É verdade que teve oposi-
ção; todavia, contou também com o entusiasmo e apoio de inúmeras pessoas, tais

1
Apud Max L. Batchelder, O homem que inventou a Escola Dominical: In: Brasil Presbiteriano, setem-
bro de 1985, p. 8.
2
Ele era o proprietário e editor do Gloucester Journal que fora criado em 1722, pelo seu pai, Robert
Raikes.
3
Temos um bom esboço histórico da Escola Dominical fundada por Raikes, no artigo de Max L. Bat-
chelder, O homem que inventou a Escola Dominical: In: Brasil Presbiteriano, setembro de 1985, p. 8.
Veja-se também Carl Joseph Hahn, História do Culto Protestante no Brasil, São Paulo: ASTE., 1989,
p. 275-276. Recordemos, no entanto, que antes de Raikes houve trabalhos semelhantes, contudo,
não com a mesma desenvoltura. Em 1769, uma inglesa havia começado trabalho similar em High
Wycombe. Hannah Ball relataria o seu trabalho a John Wesley em 1770: “As crianças se reúnem
duas vezes por semana, aos domingos e segundas-feiras. É um grupo meio selvagem, mas
parece receptivo à instrução. Trabalho entre eles com a ânsia de promover os interesses de
Cristo” (Apud Duncan A. Reily, A Origem das Escolas Dominicais: In: Expositor Cristão, 10/01/1957,
p. 7. Lamentavelmente, não consegui localizar a fonte indicada pelo articulista no Diário de Wesley).
Vejam-se também: Rupert Davies, et. al. eds. A History of The Methodist Church in Great Britain,
London: Epworth Press, 1983, Vol. III, p. 283-284; W. J. Townsend, et. al. eds. A New History of
Methodism, Nashville: Publishing House of the Methodist Episcopal Church South Smith & Lamar,
Agents, [1909], Vol. I, p. 219; Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical
da Igreja Evangélica Fluminense, Rio de Janeiro: [s. Ed.] 1932, p. 144-146).
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 2

4
como, John Wesley (1703-1791) e William Fox, que “fundou a primeira organi-
5
zação para promover escolas dominicais”. Em 1788 a Escola Dominical já pos-
6
suía, só na Inglaterra, mais de 250 mil alunos matriculados. O movimento chegou
aos Estados Unidos em 1790, possivelmente por intermédio de Samuel Slater (1768-
1835), um britânico radicado nos Estados Unidos, conhecido popularmente como "O
Pai da Revolução Industrial americana”.

Neste texto queremos apresentar um esboço histórico do início da Escola Domini-


cal no Brasil, analisando também a sua importância e objetivo, para que juntos pos-
samos conhecer um pouco mais deste trabalho, que tantos benefícios espirituais
trouxe, e continua trazendo à Causa Evangélica em nossa pátria.

Quando os primeiros missionários protestantes começaram a chegar ao Brasil, o


movimento das Escolas Dominicais já estava firmado na Inglaterra, tendo também,
se tornado muito forte nos Estados Unidos. Isto explica, parcialmente, o porquê des-
te trabalho ser logo implantado no Brasil, muitas vezes, até mesmo antes de se es-
tabelecer formalmente o Culto público. Vejamos então, como a Escola Dominical
surgiu no Brasil.

1. Os Metodistas como Pioneiros:7

No dia 28 de junho de 1835 embarca em Baltimore nos Estados Unidos rumo ao


Brasil, o Rev. Fountain E. Pitts, que chegaria ao Rio de janeiro em 19 de agosto de
8
1835, permanecendo ali durante alguns meses, viajando em seguida para Montevi-
9
déu, e, depois de algumas semanas, tomou o vapor para Buenos Aires, que era o
10
objetivo final de sua vinda.

4
Veja-se por exemplo, J. Wesley, Journal, 18/07/1784 (The Works of John Wesley, edited by W.
Reginald Ward; Richard P. Heitzenrater, Nashville: Abingdon Press, 1995, Vol. 23, p. 323). A rainha
Carlota, após visitar uma Escola Dominical acompanhada de seu marido, Rei George III, tornar-se-ia
uma importante colaboradora deste trabalho através de donativos. (Cf. Max L. Batchelder, O homem
que inventou a Escola Dominical: In: Brasil Presbiteriano, setembro de 1985, p. 8).
5
Hayward Armstrong, Bases da Educação Cristã, Rio de Janeiro: JUERP., 1992, p. 74.
6
Cf. Max L. Batchelder, O homem que inventou a Escola Dominical: In: Brasil Presbiteriano, setem-
bro de 1985, p. 8. Townsend, fala de mais de 200 mil em 1786 (W. J. Townsend, et. al. eds. A New
History of Methodism, Vol. I, p. 367); Armstrong, fala-nos de 250 mil em 1797 (Hayward Armstrong,
Bases da Educação Cristã, p. 74).
7
Quanto a um resumo da “filosofia do nascente metodismo brasileiro”, veja-se: José Gonçalves
Salvador, O Metodismo brasileiro de 1836 a 1886: In: Situações Missionárias na História do Metodis-
mo, vários autores, São Bernardo do Campo, SP.: Imprensa Metodista, 1991, p. 17-18.
8
James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, São Paulo: Imprensa Metodista,
1928, p. 13; Eula L. Long, Do Meu Velho Baú Metodista, São Paulo: Imprensa Metodista do Brasil,
1968, p. 24-25.
9
Em 8/02/1836, em resposta à solicitação de Pitts, foi consignado o Decreto: “Ao rev. Fountain E.
Pitts, Presbítero da Igreja Metodista Episcopal é permitido o exercício público das funções de
ministro nesta Província” (H.C. Tucker, O Centenário Methodista Sul-Americano: In: Expositor Cris-
tão, 03/03/1936, p. 1).
10
Vd. H.C. Tucker, O Centenário Methodista Sul-Americano: In: Expositor Cristão, 31/03/1936, p. 1.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 3

O Rev. Pitts, entusiasmado com as perspectivas do trabalho evangélico, deu um


parecer favorável à implantação de uma missão Metodista no Brasil. No dia 2 de se-
tembro de 1835, ele escreve ao secretário correspondente da Sociedade Missionária
da Igreja Metodista Episcopal (IME):

“Estou nesta cidade (Rio de Janeiro) há duas semanas, e lamento que


minha permanência seja necessariamente breve. Creio que uma porta
oportuna para a pregação do Evangelho está aberta neste vasto império.
Os privilégios religiosos permitidos pelo governo do Brasil são muito mais to-
lerantes do que eu esperava achar em um país católico (...). Já realizei di-
versas reuniões e preguei oito vezes em diferentes residências onde fui res-
11
peitosamente convidado e bondosamente recebido pelo bom povo....”.

Na sequência, Pitts opina sobre o caráter e a experiência daquele que deverá ser
enviado como missionário...

“....Nosso pequeno grupo de metodistas precisará muito de um cristão


experimentado para conduzi-lo; no entanto, eles estão decididos a se uni-
rem e a se ajudarem mutuamente no desenvolvimento da salvação de
suas almas (...). O missionário a ser enviado para cá deve vir imediatamen-
12
te e iniciar o estudo do idioma português sem demora....”.

As sugestões de Pitts são aceitas. No dia 29 de abril de 1836 desembarca no Rio


de Janeiro, proveniente de New York, Estados Unidos, o missionário, Rev. Justin
13
Spaulding, acompanhado de sua esposa, o filhinho Levi, e sua empregada. Spaul-
ding demonstrou ser muito empreendedor no seu trabalho. Em carta ao secretário da
IME, datada de 5/5/1836, menciona que já organizara uma pequena escola domini-
14
cal com o grupo de metodistas que o Rev. Pitts reunira. Posteriormente, em relató-
rio ao secretário correspondente da IME, datado de 01/9/1836, acentua:

“.... Conseguimos organizar uma escola dominical, denominada Escola


Dominical Missionária Sul-Americana, auxiliar da União das Escolas Domini-
cais da Igreja Metodista Episcopal... Mais de 40 crianças e jovens se torna-
ram interessados nela (...). Está dividida em oito classes com quatro profes-
sores e quatro professoras. Nós nos reunimos às 16:30 aos domingos. Temos
duas classes de pretos, uma fala inglês, a outra português. Atualmente pa-
15
recem muito interessados e ansiosos por aprender....”.

11
Carta In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, São Paulo: ASTE.,
1984, p. 81-82. Vd. Também, José Gonçalves Salvador, História do Metodismo no Brasil, São Paulo:
Imprensa Metodista, 1982, Vol. I, p. 24ss.
12
Carta In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 82.
13
José Gonçalves Salvador, História do Metodismo no Brasil, p. 33. Ele partira de New York em 22 de
março de 1836 [Cf. Nathan Bangs, “History of the Methodist Episcopal Church,” The Master Christian
Library, Volume 4 [CD-ROM], (Albany, OR: Ages Sofware, 1998), p. 272].
14
Cf. Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 83-84.
15
Carta In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 83-84.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 4

Desta forma, baseados nos documentos que temos, podemos afirmar que a pri-
meira Escola Dominical no Brasil dirigida em português foi organizada no dia 01 de
maio de 1836. Com esta afirmação, estamos esclarecendo alguns equívocos come-
tidos, a saber: 1) A sugestão de que foi em junho de 1836 que o Rev. Spaulding teria
16
iniciado a Escola Dominical; 2) A afirmação de que foram os Congregacionais os
17
primeiros a organizarem esta escola com aula em português em 19/08/1855; 3) A
declaração de que foram os Presbiterianos que iniciaram a referida escola em
18
1860.

Voltando à nossa rota inicial, observamos que o trabalho Metodista apesar de ter
19
sido bem iniciado, teve curta duração: a missão metodista, por diversas razões,
20 21
encerrou as suas atividades no Brasil em 1841. Neste mesmo ano ou em 1842, o
Rev. Spaulding retornou aos Estados Unidos.
22
A missão Metodista só teria o seu reinício definitivo no Brasil em 05/08/1867,
com a chegada do Rev. Junius Eastham Newman (1819-1895) no Rio de Janeiro.
23
Em abril de 1869, Newman mudou-se para o interior de São Paulo, Saltinho, traba-
lhando entre os colonos americanos. Ali, junto com os imigrantes de Santa Bárbara,
24
organizou no terceiro domingo de agosto de 1871, a Primeira Igreja Metodista do
Brasil, com cultos em inglês. No entanto, o trabalho metodista só receberia converti-

16
Cf. James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, p. 14; Isnard Rocha, Histórias
da História do Metodismo no Brasil, São Paulo: Imprensa Metodista, (1967), p. 75 e Domingos Ribei-
ro, Origens do Evangelismo Brasileiro, Rio de Janeiro: Grafica “Apollo”, 1937, p. 98.
17
Cf. João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Rio de Janeiro: (edição da Igreja Evangélica
Fluminense?), (1941), Vol. I, p. 268; Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola
Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, “Prologo” e p. 39 e Rev. Nadir P. dos Santos, Uma Nota
Histórica Sobre Petrópolis: In: O Expositor Cristão, 19/12/1957, p. 2.
18
Cf. William R. Read, Fermento Religioso nas Massas do Brasil, Campinas, SP.: Livraria Cristã Uni-
da, [1967], p. 47.
19
Vejam-se as razões In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 84ss.
20
Cf. Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, São Paulo: Edição da 1ª
Egreja Presbyteriana Independente, 1938, p. 13; James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodis-
mo no Brasil, p. 15; Isnard Rocha, O Metodismo no Brasil: In: Expositor Cristão, 17/01/1957, p. 15;
José Gonçalves Salvador, História do Metodismo no Brasil, p. 44.
21
Cf. David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, Brasília, DF.:
Editora Universidade de Brasília, 1980, p. 61.
22
Isnard Rocha, Histórias da História do Metodismo no Brasil, p. 40-41. Esta data é controvertida por-
que, ao que parece, Newman não embarcou nos Estados Unidos na data que programara. Assim,
Kennedy, diz que Newman “desembarcou no Rio de Janeiro: no verão de 1867” (James L. Ken-
nedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, p. 16). Isnard Rocha elucida o possível motivo da
confusão (Isnard Rocha, Pioneiros e Bandeirantes do Metodismo no Brasil, São Bernardo do Campo,
SP.: Imprensa Metodista, 1967, p. 34-35). A carta que Newman escreveu aos metodistas do Sul dos
Estados Unidos esclarece definitivamente a questão: “No dia 5 de agosto de [1867] estávamos
entrando no porto do Rio, enquanto todos a bordo olhavam com espanto e deleite a pai-
sagem suntuosamente agreste e majestosa de ambos os lados do canal que conduz à ci-
dade” (In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 88).
23
Cidade localizada entre Limeira e Vila Americana.
24
Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 86-88; Boanerges Ribeiro,
Protestantismo no Brasil Monárquico, 1822-1888, São Paulo: Pioneira/Fundação Educacional Presbi-
teriana, 1973, p. 20; James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, p. 16.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 5

25
dos brasileiros em 9 de março de 1879, no Rio de Janeiro.

O Bispo John C. Granbery, da Igreja Metodista Episcopal do Sul, desembarcou no


26
Rio de Janeiro, sob uma “chuva fria”, no dia 4 de julho de 1886, fazendo então, a
primeira visita episcopal metodista ao Brasil. Em 15/09/1886, organizou a primeira
27
conferência anual metodista na Igreja Metodista do Catete, inaugurando o templo
28
em 05/09/1886, dias antes da Conferência.

2. Os Congregacionais: uma Escola Definitiva:

O Dr. Robert Reid Kalley (1809-1888), médico e pastor escocês, acompanhado


de sua esposa, Srª Sarah Poulton Kalley (1825-1907), desembarcou no Rio de Ja-
29
neiro no dia 10/05/1855, às cinco horas da manhã, proveniente da Inglaterra.

O Dr. Kalley tivera uma experiência intensa. Ele como missionário na Ilha da Ma-
30 31
deira – desde outubro de1838 – realizava um trabalho muito concorrido, ponti-
32
lhado por atividades de âmbito médico (fundando inclusive um hospital), educacio-
33
nal e religioso. Foi então em 1843 que a Igreja romana intensificou a perseguição
contra ele. Tendo permanecido cerca de seis meses preso,34 foi liberto em janeiro de
35
1844. Depois de alguma trégua, em 1846 a situação tornou-se insustentável; a
turba havia se voltado contra ele e, nem o consulado dava-lhe mais garantias. As au-

25
James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, p. 21; Isnard Rocha, Histórias da
História do Metodismo no Brasil, p. 76-77.
26
Eula K. Long, O Arauto de Deus – Kennedy, p. 101. Ele retornaria aos Estados Unidos em
22/9/1886, no vapor “Advance” (Cf. O Methodista Catholico, 01/10/1886, p. 3).
27
Vd. Documento In: Duncan A. Reily, História Documental do Protestantismo no Brasil, p. 91-92.
Ver também, H.C. Tucker, O Centenário Methodista Sul-Americano: In: Expositor Cristão, 03/03/1936,
p. 1; James L. Kennedy, Cincoenta Annos de Methodismo no Brasil, p. 50; Eula K. Long, O Arauto de
Deus – Kennedy, São Paulo: Imprensa Metodista, 1960, p. 105).
28
Primeiramente foi inaugurada a Capela em setembro de 1882. (Cf. Eula K. Long, O Arauto de Deus
– Kennedy, p. 63, 105).
29
João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 30; Henrique de Souza Jardim, et. al.
Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 34.
30
Chamada de “a Pérola do Atlântico” e “um jardim flutuante” (Cf. William B. Forsyth, Jornada no Im-
pério: Vida e obra do Dr. Kalley no Brasil, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2006, p. 25).
31
Inicialmente o seu trabalho era apenas como médico. Havia atividades intensas. Contudo, ele co-
meçara logo a realizar cultos em sua casa juntamente com seus empregados. Em seguida, perce-
bendo o desejo dos madeirenses pela Palavra, iniciou em dezembro um trabalho informal numa casa
alugada (Cf. William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 34). Kalley só seria ordenado pastor em Lon-
dres no dia 18 de julho de 1839 (Cf. William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 35).
32
Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 700.
33
Fundou a sua primeira escola durante o ano de 1839, tendo a Bíblia como livro-texto. Estas esco-
las logo cresceram e se multiplicaram (Cf. William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 43, 52-53).
34
Compare as informações: Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical
da Igreja Evangélica Fluminense, p. 29 e William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 60.
35
Vejam-se detalhes deste episódio In: João Fernandes Dagama, Perseguição dos Calvinistas da
Madeira, São Paulo: [s. Ed], 1896, p. 18ss e William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 57-61.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 6

toridades locais não eram confiáveis. A sua casa “foi assaltada e queimada a
36
sua biblioteca e valiosos manuscritos....”. Outras casas e escolas foram tam-
bém destruídas. O caminho foi fugir da ilha – disfarçado de mulher enferma –, jun-
37
tamente com algumas famílias de seus fiéis, sucedendo-lhe centenas de outros
38
protestantes que também fugiram dali. À época, o Dr. Kalley era casado com Mar-
39
garet Kalley, que viria falecer em 15/09/1851 em Beirute. Posteriormente
(14/12/1852), casou-se com Sarah Poulton Wilson (1825-1907), "poetisa, linguista
40
e musicista", proveniente de uma família abastada, que se tornaria nossa conhe-
41
cida como Sarah Poulton Kalley.

As perseguições sofridas na Ilha da Madeira marcaram profundamente a sua per-


sonalidade, tornando-o bastante cauteloso em sua ação missionária, embora, sem
42
jamais negligenciá-la.

Devido à dificuldade de encontrar no Rio de Janeiro um imóvel que fosse conve-


niente para residência e atendesse aos seus objetivos na obra evangélica, o casal
43
após visitar a Tijuca, Niterói e Petrópolis, decidiu-se finalmente por Petrópolis, mu-
dando-se para aquela cidade serrana em fins de julho de 1855, hospedando-se no
44
hotel Oriente (que ficava localizado na atual Rua Sete de Abril). No dia 15 de outu-
bro de 1855, finalmente o casal se mudou para a sua nova residência no distrito pe-
tropolitano de Schweizaerthal (bairro suíço), onde alugou a mansão “Gerheim” (“lar

36
Cf. Roberto Reid Kalley: In: Dr. António Mendes Correia, et. al. eds. Grande Enciclopédia Portu-
guesa e Brasileira, Lisboa: Editorial Enciclopédia, Limitada, (s.d.), Vol. XIV, p. 431; Carl Joseph Hahn,
História do Culto Protestante no Brasil, p. 139.
37
Vd. João Fernandes Dagama, Perseguição dos Calvinistas da Madeira, p. 78ss.; Henrique de Sou-
za Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 32-33;
William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 77-79.
38
Cf. Roberto Reid Kalley: In: Dr. António Mendes Correia, et. al. eds. Grande Enciclopédia Portugue-
sa e Brasileira, Vol. XIV, p. 431; Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Domi-
nical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 33.
39
Cf. Roberto Reid Kalley: In: Dr. António Mendes Correia, et. al. eds. Grande Enciclopédia Portugue-
sa e Brasileira, Vol. XIV, p. 431; Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Domi-
nical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 34; Carl Joseph Hahn, História do Culto Protestante no Bra-
sil, p. 138; William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 94.
40
Vd. Carl Joseph Hahn, História do Culto Protestante no Brasil, p. 137-138; William B. Forsyth, Jor-
nada no Império, p. 97.
41
Quanto às circunstâncias em que Robert e Sarah se conheceram, Vd. Carl Joseph Hahn, História
do Culto Protestante no Brasil, p. 149 e William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 96-97.
42
Vd. David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 113ss; Bo-
anerges Ribeiro, Protestantismo e Cultura Brasileira, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1981, p.
20ss.; Boanerges Ribeiro, O Padre Protestante, 2ª ed. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1979,
p. 95ss.; Émile G. Léonard, O Protestantismo Brasileiro, São Paulo: ASTE, (1963), p. 49ss.
43
João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 31; David G. Vieira, O Protestantismo,
A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 116.
44
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 37; Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, Rio de Janeiro: Livraria
Kosmos Editora, (1961), p. 108.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 7

45
muito amado”), de propriedade do Sr. Alexandre Fry.

A Escola Dominical foi inaugurada pelo casal Kalley em “Gerheim” na tarde de


46
19/8/1855. Isto ocorreu com a permissão do atual inquilino da mansão: o embaixa-
47
dor americano Sr. Webb, que ainda não desocupara a casa, com quem o Dr. Kal-
ley fez boa amizade. Na ocasião a Srª Kalley leu a história do profeta Jonas, ensi-
48 49
nou-lhes alguns hinos e deram graças ao Senhor.

Passados dois ou três domingos, a escola dominical passou a funcionar com uma
classe de crianças e outra de adultos, sendo esta dirigida pelo Rev. Kalley, constan-
50
do alunos negros. “As classes da escola dominical continuaram a funcionar
através de muitas dificuldades, tais como − os maus caminhos em ocasiões
de grandes chuvas, doenças, distrações sociais, festas religiosas, visitas de
amigos e, mais tarde, as ausências da amável professora, quando acompa-
nhava o seu marido ao Rio, para animar os irmãos que tinham as suas reuni-
51
ões no Bairro da Saúde”.

45
Localizada na atual Rua Benjamin Constant, 280. (Cf. Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evan-
gélica no Brasil, p. 108).
46
Conforme bem relata Henriqueta Braga, esta foi “a primeira Escola Dominical de caráter per-
manente, em vernáculo” (Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, p. 276). Ob-
serve-se a expressão: “caráter permanente”.
47
Ao que parece, o Sr. Webb era americano; no entanto, as informações de que dispomos dizem que
a escola começou com os “filhos da Srª Webb e da Srª Carpenter” (Henrique de Souza Jardim, et.
al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 38); na sequência, diz
que a Srª Kalley “instalou a escola com 5 alunos, filhos de duas famílias inglesas” (Henrique de
Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 39.
Do mesmo modo, João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 33)
48
Henriqueta R.F. Braga nos diz que “os primeiros hinos evangélicos cantados no Brasil, em lín-
gua portuguesa, foram provavelmente aqueles entoados nessa incipiente Escola Dominical”
, a saber: “Louvemos Todos ao Pai do Céu” (SH. 32); “Todos que na terra moram” (SH. 17); “O Meu
fiel Pastor” (SH. 7); “Alma! Escuta ao bom Senhor!” (SH. 33); “Cá Sofremos Aflição” (SH. 76); “Tem
compaixão de mim, Senhor!” (SH. 51); “Jesus Cristo já morreu” (SH. 26) e “Andávamos longe de
Deus” (SH. 45). (Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, p. 109).
49
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 39. Lembremo-nos que a Srª Kalley, quando solteira, fora professora de uma classe de
Escola Dominical que funcionava em sua casa, na cidade de Torquay, Inglaterra, tendo sido seu alu-
no, William D. Pitt. (João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 35; Vicente T. Lessa,
Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 26, 702). Pitt, que, a convite do Dr. Kalley, veio
dos Estados Unidos para Petrópolis em dezembro de 1855, mudou-se para São Paulo em
16/04/1863, estabelecendo-se no comércio de artigos para lavoura e querosene (Boanerges Ribeiro,
Protestantismo e Cultura Brasileira, p. 45; João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p.
202). Permaneceu como membro da Igreja Evangélica Fluminense até 30/11/1866 (Ibidem., p. 202),
quando foi-lhe concedida transferência para a Igreja Presbiteriana de São Paulo (Ibidem., p. 202).
Mesmo sem ter estudado num Seminário, Pitt, que fora um auxiliar valoroso de Kalley e depois de
Blackford, foi ordenado pastor na 5ª Reunião do Presbitério do Rio de Janeiro: em 16/08/1869 (Vicen-
te T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 68-69). Todavia, morreu pouco tem-
po depois em 13/03/1870, em casa de Chamberlain, São Paulo. (Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª E-
greja Presbyteriana de São Paulo, p. 75).
50
João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 33.
51
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 40; João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 32 e 36.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 8

Não se dispõe de dados estatísticos de matrícula e frequência desta incipiente


escola dominical; temos apenas alguns informes esparsos que nos revelam o seu
crescimento constante:

Em 11/5/1856, a Srª Kalley começou a ler a Bíblia em português a algumas crian-


52
ças e a duas de suas criadas (alemãs?).

Neste mesmo ano as reuniões passaram a ser realizadas em português, inglês e


53
alemão.

No dia 8 de junho de 1856, além da presença de adultos, a Escola Dominical con-


54 55
tava com dez crianças (quatro que falavam português ou inglês e seis que co-
56
nheciam o alemão).

Em 01/7/1856, há o registro de 13 alunos presentes. Num domingo de setembro,


compareceram 17 alunos. A partir de outubro, a frequência média passou a ser de
20 a 25 alunos, às vezes aumentando.
57
Uma aluna desta época, Christina Fernandes Braga − avó da famosa historiado-
58
ra Henriqueta Rosa Fernandes Braga −, mais tarde, em 1917, relembraria com in-
disfarçável satisfação a sua infância, quando estudou com a Srª Kalley:

“Quando eu tinha a idade de 7 anos, em 1856, frequentava a ‘Classe


Bíblica’ do Dr. Robert Reid Kalley em Petrópolis, em sua chácara, à Rua Jo-
inville, hoje Ypiranga. Reuniam-se ali, das 2 ou 3 às 4 horas da tarde, aos
domingos, para o estudo da Bíblia, sentados em volta de uma mesa gran-
de, na sala de jantar, cerca de 30 a 40 alemães, meninos e meninas, em
sua maioria, cada um trazendo seu Novo Testamento. Quem levasse de-
corados três versículos, recebia um cartãozinho com um texto bíblico;
quem conseguisse adquirir 10 cartõezinhos, recebia um cartão maior, e
quem conseguisse 3 maiores recebia um livro.

52
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 39-40; João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 36.
53
Cf. o testemunho de uma aluna desta época, Christina F. Braga, In: Henrique de Souza Jardim, et.
al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 40. (Parte deste texto
está transcrito infra); Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, p. 110.
54
João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 36.
55
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 41.
56
João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 36; Henrique de Souza Jardim, et. al.
Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 41. As informações de
ambos são conflitantes quanto ao “português” e ao “inglês”, contudo, são idênticas quando às seis
crianças que só sabiam o alemão. Acredito que entre elas havia os três idiomas representados...
57
Vd. foto In: Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja E-
vangélica Fluminense, p. 40.
58
Cf. Henriqueta R.F. Braga, Salmos e Hinos: Sua origem e desenvolvimento, Rio de Janeiro: Igreja
Evangélica Fluminense, 1983, p. 23 (nota 17).
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 9

“Em todas as reuniões, cantavam-se hinos.


“À saída, encontrávamos os que vinham para o estudo bíblico em por-
tuguês − esses eram em menor número....
“Após o estudo em português, reunia-se a ‘Classe Inglesa’”.
“(...) Deve-se notar que a ‘Classe Alemã’ era mais numerosa, pois a lín-
gua alemã era mais vulgarizada em Petrópolis, naquele tempo. Tanto o Dr.
Kalley, como sua esposa, Mrs. Kalley, falavam bem esse idioma....
“Mrs. Kalley só matriculava alunos de oito anos para cima e, no entanto,
fui matriculada antes dessa idade, devido à minha persistência e porque
59
sabia diversos capítulos de cor....”.

Em 30/5/1860, o casal Kalley mudou-se para uma propriedade mais central em


Petrópolis, denominada de “Eyrie”, pertencente ao Barão de Lucena (1835-1913),
60
localizada à Rua Joinville, n° 1 (Atual Avenida Ipiranga, 135). A Escola Dominical
continuou normalmente em sua residência.

Em 18/7/1864, nova mudança; agora o casal vai para o Rio de Janeiro, passando
a residir provisoriamente na Rua do Propósito, até que a reforma da sua nova casa
fosse concluída, o que ocorreu em 18/11/1864, quando então foram morar à Traves-
sa das Partilhas, 34 (depois 44 e 56). Nesta residência, a Escola Dominical continu-
ou funcionando na sala de jantar. “Terminada a lição, os discípulos desciam a
grande escadaria que ia ter ao salão da travessa das Partilhas, onde então
61
se realizava o culto público e a pregação do Evangelho”.

Com isso, os irmãos de Petrópolis que podiam, passaram a frequentar a Escola


Dominical do Rio de Janeiro, enfraquecendo assim, gradativamente a Escola de Pe-
62
trópolis. Por este ou por outros motivos, o fato é que este trabalho seria encerrado
63
(1871?). No jornal O Christão − Órgão da União Evangélica Congregacional
do Brasil e de Portugal −, de 15 de agosto de 1927, p. 7, encontramos um desaba-
fo de alguém que subscrevia o seu artigo com as iniciais “A.A”, lamentando pelo
término do trabalho em Petrópolis, ao mesmo tempo em que estimulava sua Igreja a

59
Carta In: Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evan-
gélica Fluminense, p. 42-44.
60
Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, p. 110; Henrique de Souza Jardim, et.
al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Fluminense, p. 81; João Gomes da
Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 127 e 270.
61
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 109.
62
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 158.
63
Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Dominical da Igreja Evangélica Flu-
minense, p. 62, 158. “Em 14 de Julho de 1871, a Igreja resolveu organizar a Escola Dominical
nos moldes modernos, compreendendo alunos de todas as idades, desde as criancinhas até
os anciãos.
“No domingo seguinte, 16 de julho de 1871, foi dado início a essa organização, tendo
comparecido 200 alunos de ambos os sexos, que foram distribuídos por 26 classes, cada
uma com o seu professor” (Henrique de Souza Jardim, et. al. Esboço Histórico da Escola Domini-
cal da Igreja Evangélica Fluminense, p. 149).
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 10

reiniciar a obra evangélica naquela cidade.

Concluindo esta parte do estudo, podemos observar que a Escola Dominical or-
ganizada pelo casal Kalley, se caracterizou pela preocupação de se ensinar a Bíblia
e hinos evangélicos. Recordemos o testemunho de sua antiga aluna: “Em todas as
reuniões, cantavam-se hinos”. É digno de menção que eles editaram em 1861 um
hinário com 50 hinos, intitulado, “Psalmos e Hinos para o Uso Daquelles que Amão
A Nosso Senhor Jesus Cristo”, hinário que seria ampliado através dos anos: 2ª edi-
ção em 1865, com 83 hinos; 3ª edição em 1868 com 100 hinos; 4ª edição em 1873,
64
130 hinos.

Creio ser oportuno mencionar um incidente de grande relevância para a questão


legal do protestantismo no Brasil. Em 1859, Kalley foi acusado pelo Núncio Apostóli-
co de, entre outras coisas, estar ultrapassando os limites da tolerância religiosa
prescrita pela Constituição de 1824. Foi então que ele formulou um questionário de
11 quesitos sobre o assunto, pedindo o parecer de três juristas de grande renome:
Dr. José Tomaz Nabuco de Araújo, Dr. Urbano Sabino Pessoa de Melo e Dr. Caeta-
no Alberto Soares. A resposta foi favorável ao Dr. Kalley; ele não quebrara a Consti-
65
tuição. Assim, “O governo Imperial resolveu nada fazer contra ele ‘enquan-
66
to não excedesse os limites sobre os quais estava bem informado’.” Aqui
temos, diríamos, o escancaramento legal das portas para a entrada de religiões aca-
tólicas no Brasil.
67
O casal retornou definitivamente para a Escócia em 1876.

No método adotado pelo casal Kalley, encontramos delineado o princípio defendi-


do por Martinho Lutero (1483-1546) em 1530, que disse: “Depois da teologia, não
existe arte que se possa equiparar à música, porque sobre ela, depois da te-
ologia, é que consegue uma coisa que no mais só a teologia proporciona:
68
um coração tranquilo e alegre”.

3. Os Presbiterianos e a Escola Dominical:

O Rev. Ashbel Green Simonton (1833-1867) foi o primeiro missionário presbite-


riano a se estabelecer no Brasil (12/8/1859) − antes dele esteve o Rev. James Coo-
ley Fletcher (1823-1901), todavia, ele não pregou em português nem fundou igreja

64
Vejam-se mais detalhes em Braga, Henriqueta R.F. Braga, Música Sacra Evangélica no Brasil, p.
125; Henriqueta R.F. Braga, Salmos e Hinos: Sua origem e desenvolvimento, 91p.
65
Vejam-se: João Gomes da Rocha, Lembranças do Passado, Vol. I, p. 92-100; David G. Vieira, O
Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 119-121; Duncan A Reily, História
Documental do Protestantismo Brasileiro, p. 96-100; William B. Forsyth, Jornada no Império, p. 144-
145.
66
Ismael da Silva Junior, Heróis da Fé Congregacionais, p. 45.
67
Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 702.
68
Martinho Lutero, Carta a Ludovico Senfl, 1530: In: Pelo Evangelho de Cristo (Selecta de textos do
Reformador), Rio Grande do Sul, Concórdia/Sinodal, 1984, p. 216.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 11

69
alguma, pois esta não era a sua missão, contudo, realizou um trabalho notável.
70
Em sua viagem de 55 dias, Simonton – mesmo sem a aprovação do Capitão,
71
”nominalmente católico” – estabeleceu uma Escola Dominical nos "aposentos
72
dos marinheiros", tendo boa aceitação e interesse; todavia, se isto o agradava, não
o iludia, conforme ele mesmo escreveu três dias antes de desembarcar no Rio de
Janeiro:

"Dois ou três (marinheiros) disseram que pretendem mudar de vida no fu-


turo mas temo que isso signifique apenas uma auto-reforma. Acham que
precisam deixar o mar para corrigir a vida. Conversei com a maioria deles,
e fiquei a par de suas vidas; todos se parecem; ou foram abandonados
sem parentes ou amigos, ou queriam ver o mundo e gozar a mocidade
(...). Mas não se podem levar a sério todas essas promessas. Eles se arre-
73
pendem no mar e pecam em terra".

Simonton, antes de vir para o Brasil estudara um pouco o português em New


74
York, no entanto, não se sentia seguro, como é natural, para pregar nesta nova e
difícil língua.

Nestes primeiros meses de Simonton no Rio de Janeiro, torna-se visível a sua


angústia por não conseguir aprender o português tão rapidamente como gostaria;
ele se ofereceu a algumas pessoas para ensinar o inglês ou outra língua morta, en-
quanto elas, no caso, ensinar-lhe-iam o português ou, se não fosse o caso, ele for-
çosamente aprenderia o português, por ser obrigado a conversar com seus alunos
na língua materna deles. Aqui dois personagens devem ser destacados. O primeiro,
é o Dr. Manuel Pacheco da Silva (1812-1889), a quem Simonton trouxera carta de
75
apresentação remetida por Fletcher. O Dr. Pacheco era um intelectual, diretor do
76
Externato do Colégio Imperial Dom Pedro II de 1855 a 1872, função que exerceu
77
com competência. Ele era amigo de Fletcher e, tornou-se amigo, aluno de inglês e
78
confidente de Simonton. No início de seus contatos, o Dr. Pacheco ofereceu-se
para ajudá-lo do estudo do português e Simonton retribuiu a oferta para o estudo do

69
Vd. Hermisten M.P. Costa, Os Primórdios do Presbiterianismo no Brasil, São Paulo, 1997, passim
70
Ashbel Green Simonton, Diário, 1852-1867, 4/7/1859.
71
Ashbel Green Simonton, Diário, 1852-1867, 19/6/1859.
72
Ashbel Green Simonton, Diário, 1852-1867, 4/7/1859; 11/7/1859; 25/7/1859; 9/8/1859.
73
Diário, 1852-1867, 9/08/1859.
74
Júlio A. Ferreira, História da Igreja Presbiteriana do Brasil, 2ª ed. São Paulo: Casa Editora Presbite-
riana, 1992, Vol. I, p. 21.
75
Cf. David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 91 e 135.
76
David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 91.
77
Veja-se Luiz Agassiz; Elizabeth C. Agassiz, Viagem ao Brasil: 1865-1866, Belo Horizonte, MG.: Ita-
tiaia/Editora da Universidade de São Paulo, 1975, p. 92.
78
David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 91. O Dr. Pa-
checo tornou-se também amigo do casal Agassiz, sendo alvo constante de referências que dignificam
a sua pessoa e amizade. Vejam-se: Luiz Agassiz; Elizabeth C. Agassiz, Viagem ao Brasil: 1865-1866,
p. 53, 75, 91, 92, 275.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 12

79
Hebraico. Foi ele quem apresentou Simonton ao segundo personagem, que desta-
co; o Dr. Teófilo Neves Leão, que era Secretário da Instrução Pública, o qual "pro-
meteu ajudá-lo a conseguir uma licença de professor, necessária para que
80
pudesse legalmente abrir uma escola particular".

Os dois tornaram-se amigos e, em dezembro de 1859, Simonton registra: "Co-


meçamos no dia seguinte (a aprender português e a ensinar inglês) e agora
vou diariamente a seu escritório às duas horas. É importante ter como profes-
81
sor alguém que tenha bom conhecimento da língua".

Apesar destes esforços, Simonton continuou tendo dificuldade com a língua e, as


duas vezes em que anunciou no jornal a sua disposição em ensinar inglês, não lhe
82
trouxe alunos.

Em 02/01/1860, Simonton mudou de residência, indo morar com uma família que
falava o português: "Muitos esforços e orações foram coroados de êxito e moro
em casa onde posso ouvir e falar o português (...). Estou bem instalado, mais
que esperava em casa de fala portuguesa; já era mais que tempo de saber
83
a língua da terra".

Finalmente, em 22 de abril de 1860, ele começou uma classe de Escola Domini-


cal no Rio de Janeiro, ao que parece na casa do Sr. Grunting, onde havia alugado
um quarto para a sua residência, desde 10/4/1860, por um período de quase seis
84
meses. Este foi o seu primeiro trabalho em português. Os textos usados com as
cinco crianças presentes (três americanas da família Eubank e duas alemãs da famí-
85
lia Knaack), foram: A Bíblia, O Catecismo de História Sagrada e o Progresso do
86
Peregrino, de Bunyan. Duas das crianças, Amália e Mariquinhas (Knaack), confes-
saram ou demonstraram na segunda aula (29/04/1860), terem dificuldade em enten-
87
der John Bunyan.

Aqui nós vemos delineados os princípios que caracterizariam a nossa Escola


Dominical: O estudo das Escrituras, o estudo da história Bíblica através do Catecis-
88
mo de História Sagrada e com uma aplicação ética e mística, através do Progresso

79
Diário, 1852-1867, 1852-1867, 08/09/1859.
80
David G. Vieira, O Protestantismo, A Maçonaria e A Questão Religiosa no Brasil, p. 135.
81
Diário, 1852-1867, 1852-1867, 02/12/1859.
82
Vejam-se: Diário de Simonton, 1852-1867, 08/09/1859; 08/11/1859; 26/11/1859; 02/12/1859;
03/01/1860; 21/01/1860; 24/02/1860; 13/08/1860, etc.
83
Diário de Simonton, 1852-1867, 03/01/1860.
84
Diário de Simonton, 1852-1867, 11/04/1860.
85
Estou convencido de que este Catecismo seja o mesmo que ele publicou parcialmente na Imprensa
Evangélica a partir da edição de 16/02/1867 até 16/11/1867.
86
Diário de Simonton, 1852-1867, 28/04/1860.
87
Diário de Simonton, 1852-1867, 01/05/1860.
88
Em 1867, A Imprensa começa publicar o Catecismo, iniciando com uma nota explicativa:
“A Bíblia em grande parte é história, e o plano da nossa redenção atravessa longos
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 13

do Peregrino.

A primeira Escola Dominical organizada em São Paulo pelos presbiterianos, ocor-


reu no dia 17 de abril de 1864, às 15 horas, com sete crianças, sob a direção do
Rev. Alexander L. Blackford (1829-1890), que se encontrava no Brasil desde
89
25/7/1860 e, em São Paulo, desde 09/10/1863. Este trabalho permaneceu e, pos-
teriormente o seu horário foi transferido para às 10 horas, sendo seguido de um ato
90
de Culto.

Anotações Finais:

No ano de 1913, Herculano de Gouvêa Jr. escreveu um artigo para a Revista de


Missões Nacionais, intitulado: “O que se deve esperar da Escola Dominical”. O arti-
culista apresentou três benefícios “que a Igreja pode receber da Escola Domi-
nical”, a saber: a) “A conservação dos filhos da Igreja no seio dela”; b) “Um
conhecimento mais metódico, regular e completo da Bíblia, ministrado aos
91
membros da Igreja”; c) “Conversões”.

Na edição de setembro da Revista de Missões Nacionaes, foram publicados cinco


92
artigos de alunos do Seminário Presbiteriano do Sul dirigidos à Escola Dominical.
Estes artigos, reunidos e prefaciados pelo professor, que suponho ser o Rev. Geor-
ge E. Henderlite (lamentavelmente não consta o nome do professor), foi publicado
sob o título: O Mestre da Escola Dominical. No prefácio, o professor diz: “Igreja que
93
não ensine não pode evangelizar o Brasil”. À frente continua: “Sem a medi-
tação na Palavra da Vida, a Igreja Reformada no Brasil será apenas um
pouco melhor do que a Igreja Romana com suas inépcias e fracassos (...).
Somente o Evangelho da graça e a verdade do Filho de Deus poderá trans-

séculos, começando a descobrir-se a Adão e Eva e alcançando o seu perfeito desenvol-


vimento com a descida do Espírito Santo no dia de Pentecoste.
“Se queremos compreender a Bíblia e torná-la compreensível aos outros, é mister dar-
mos a devida importância à sua forma histórica. É necessário acompanhar passo a passo
o desenvolvimento do plano de Deus em relação à nossa raça e comentar os fatos na
ordem em que se sucedem” (Imprensa Evangélica, 16/02/1867, p. 27).
89
Blackford (1829-1890) chegou ao Brasil, acompanhado de sua esposa, Elizabeth W. Simonton, em
25/07/1860. Ele trabalhou primeiramente no Rio de Janeiro e depois em São Paulo, organizando a
primeira igreja presbiteriana na então Província de São Paulo (05/3/1865). (Vejam-se, entre outros:
Rev. Antonio Trajano, Esboço Histórico da Egreja Evangelica Presbyteriana: In: Álvaro Reis, ed. Al-
manak Historico do O Puritano, Rio de Janeiro: Casa Editora Presbyteriana, 1902, p. 13; O Estandar-
te, 18/1/1912, p. 8; Boanerges Ribeiro, O Padre Protestante, p. 100; Boanerges Ribeiro, Protestan-
tismo e Cultura Brasileira, p. 46; Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo,
p. 24).
90
Boanerges Ribeiro, Protestantismo e Cultura Brasileira, p. 61; Carl Joseph Hahn, História do Culto
Protestante no Brasil, p. 175.
91
Herculano Gouvêa Jr., O que se deve esperar da Escola Dominical: In: Revista das Missões Nacio-
naes, Outubro de 1913, p. 1-2.
92
Galdino Moreira, Julio Nogueira, Jorge Goulart, Paschoal Pitta e João Camargo.
93
O Mestre da Escola Dominical, Campinas, SP.: Imprensa do Seminário Theológico de Campinas,
1913, p. 3.
Introdução à Educação Cristã (15) – Rev. Hermisten – 21/05/10 – 14

94
figurar o caráter nacional”.

Hoje, ainda cremos que as observações do Rev. Herculano de Gouvêa Jr. são
coerentes; a Escola Dominical se propõe a educar biblicamente os filhos da aliança,
solidificar a fé dos adultos através de um ensino sistemático das Escrituras e ser um
instrumento de evangelização para que aqueles que não conhecem a Cristo possam
fazê-lo e, pelo Espírito se renderem ao Senhor.

Somos herdeiros deste trabalho que cresceu e frutificou. Cabe-nos a responsabi-


lidade de participar, orar e usar a nossa inteligência para aperfeiçoar a Escola Domi-
nical, a fim de que partindo sempre das Escrituras Sagradas, ela continue sendo um
veículo poderoso de propagação do Evangelho e de edificação espiritual da Igreja.

Maringá, 21 de maio de 2010.


Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

94
O Mestre da Escola Dominical, Campinas, SP.: Imprensa do Seminário Theológico de Campinas,
1913, p. 7.

Você também pode gostar