Revista Marduk
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Madonna no livro Sex, de 1992
farol
quemquem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 04
oque? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 05
imagensdeum . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 06
oua . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 12
leia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 16
prosaoupoesia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 20
assista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 23
imagensdooutro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 26
Madonna no livro Sex, de 1992
quemquem
ito Souza estudante de jor-
nalismo. Colaborador constante
da Marduk, dele a resenha sobre
o flme Imprio dos sentdos, cls-
sico do cinema de arte e pioneiro
na discusso sobre os limites entre
erotsmo e pornografa no cinema.
T
ilipe Bezerra colabora com
a Marduk desde seu primeiro
nmero, dedicado a Hilda Hilst.
Apaixonado pela obra da autora
paulistana, dele a resenha sobre
a fase pornogrfca dela, de onde
surgiram livros to belos e intensos
quanto sua vida.
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arcos Cesrio flsofo e fot-
grafo. Com um estlo carrega-
do de lirismo, so deles as fotos da
seo imagensdooutro.
M
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o que?
limites entre o erotsmo e a pornografa?
Se existem, at que ponto o que ertco passa
a ser pornogrfco? Indo um pouco mais longe, a
partr de onde o que antes era pornogrfco passa
a ser ertco? sob tais questonamentos que a
Marduk deste ms traz a questo da pornografa
beirando-se com o erotsmo. Fruto de anlises e
devoo por gente como Bataille e Hilda Hilst, tal
tema ainda hoje mexe com opinies e crenas de
inmeras pessoas e reas.
Devido a isso, esta edio traz anlises
de algumas obras que, em dada poca, foram
consideradas como pornografa e hoje ocupam
um status de arte, como o caso dos catecismos
de Carlos Zfro, que mexeu com o desejo de
geraes ao longo dos anos de 1950 at 1980,
ou de O imprio dos sentdos, polmico desde
seu lanamento, nos anos de 1970, pois era
exibido como um flme de arte que no sugeria,
mas expunha o sexo sem disfarces associado a
prtcas de perverso, como bem ilustra Tito
Souza em sua resenha.
Sob tais anlises do erotsmo-pornografa
nas artes, h ainda uma resenha de Filipe
Gonalves sobre a fase pornogrfca de Hilda Hilst,
perodo no qual ela fez a chamada concesso ao
mercado, produzindo obras que atraa leitores
exatamente por trazer o sexo de modo explcito
e sem meias palavras ou metforas, exatamente
como se v na resenha sobre o erotsmo nas
canes nacionais e de l fora.
Fechando essa edio, h ainda sonetos
de Pietro Aretno, poeta italiano do sculo XVl
que fez poemas cuja mistura de alta literatura a
termos chulos ainda hoje nos surpreende, e fotos
de Marcos Cesrio sobre corpos nus. Depois da
leitura dessa edio ainda fca a dvida: h arte
puramente ertca?
H
EDITORIAL
Afonso Henrique Novaes Menezes
05
O catecismo do ertico
Por Afonso Henrique Novaes Menezes
Quadrinhista carioca, Carlos Zfro criou uma obra
que moldou o imaginrio sexual do brasileiro por
anos e se tornou uma referncia da arte ertca
mundial
maginemos a cena: um adolescente vai a uma ban-
ca de revista, um pouco assustado e ansioso. Pede ao
jornaleiro um catecismo e este, um pouco desconfa-
do, tra uma pequena revista com aspecto de edio
caseira e lhe d rapidamente, como se ali contvesse
um segredo partlhado apenas por ambos. O adoles-
cente sai, de incio a passos lentos, olhando para os
lados e guardando seu desejado livrinho em meio aos
cadernos escolares. Os passos lentos tornam-se rpi-
dos, a vontade se fcar s no quarto de casa aumenta
o desejo e a curiosidade em ver o que ali est.
O jovem rapaz enfm chega ao destno. Entra
rpido, vai ao quarto, tranca a porta chave e com
cuidado e sobre o colcho de sua cama que guarda
tantos outros catecismos abre aquele que no lhe exi-
ge reza, mas lhe sombreia a culpa por estar observan-
do, desejando e imaginando coisas proibidas porque
ligadas ao sexo e tudo o que ele pode trazer de gozo e
medo.
Esta cena, to comum no cotdiano de muitos
brasileiros nos anos 50, seria impensvel agora, onde
a nudez banalizou-se e o sexo pode ser encontrado
em um clique sob variadas formas, em fotos, vdeos
e webcams de annimos ou famosos tornados pbli-
cos em sua nudez. Se antes o garoto ingenuamente
buscava a banca de revista para descarregar o seu de-
sejo nascente pelo corpo do outro (seu refexo ou seu
contraponto), hoje esse ritual se dilui em uma sexu-
alidade cada vez mais banal e s vezes opaca de to
comum.
Ainda assim, tal imagem acima descrita persis-
te nas lembranas de quem viveu na era printernet,
provavelmente at meados dos anos 90. O persona-
gem acima descrito provavelmente teria vivido entre
os anos 50 e 80. O catecismo que ele desejava, vido,
no contnha rezas,mas desenhos; no havia oraes,
mas palavras imersas no desejo, no sexo sem tarja
preta e sem temores. O autor desses catecismos ain-
da hoje um mito, talvez porque sua obra mesma te-
nha sado dos fundos obscuros das bancas de revista
para estudos acadmicos e mostras em museus. Tal
autor: Carlos Zfro.
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O prprio nome Carlos Zfro esconde
outro, Alcides Caminha, funcionrio pblico
que necessitava de um outro nome para expor
sua arte, poca vista apenas como pornogra-
fa, fato comum num Brasil ainda marcado por
regras rgidas de valores, especifcamente os li-
gados moralidade e ao sexo, e que exigia uma
ambigidade tambm no mascaramento do de-
sejo e de seu escoamento.
Devido a isso, seu nome se manteve ocul-
to por anos e ele contnuava a se dividir entre sua
funo de funcionrio pblico, ligado ao Minis-
trio do trabalho, e de criador dos quadrinhos.
evidente que, ao longo dos anos, se especulou
quem seria o autor de tais histrias e, na dcada
de 1970, os militares chegaram a prender Hlio
Brando, editor e amigo de Zfro, como suspeito
da autoria, mas o liberaram trs dias depois.
Os temas dos catecismos eram bem varia-
dos, indo de jovens que buscavam novas experi-
ncias a pessoas que inesperadamente caam em
situaes que as levavam ao sexo. Tais casos po-
dem ser vistos na narratva de Penso familiar ou
O fugitvo. Na primeira, um jovem rapaz, Carlos,
recm chegado a So Paulo, hospeda-se numa
penso cuja dona uma jovem senhora, Ros-
ria. L ele conhece Renatnho, amante noturno
de Rosria, Dora e Masa, colegas de quarto. No
demora muito at ele namorar Dora e se envol-
ver sexualmente com Rosria e, o mais surpreen-
dente, com Renatnho e com Dora e Masa,mais
tarde descobertas como amantes. Em tal histria,
j se faz notar algo de naturalmente transgressor
em que num ambiente familiar, como sugere o
ttulo, haja tantas formas de exerccio da sexuali-
dade onde reine apenas o prazer sem pecado.
A outra histria trata de Severino, fugitvo
da cadeia que encontra abrigo numa fazenda de
um coronel rico. L, ele se faz passar por um ser-
tanejo que acaba por se relacionar com a flha
da empregada, uma jovem moa de 16 anos, e
a liberada flha do coronel, vinda da cidade. Am-
bas terminam por engravidar dele, que foge mais
uma vez.
Tais histrias servem tambm como pe-
quenas crnicas sexuais de um Brasil ainda in-
gnuo. Afora o fato de uma menor de idade se
envolver com um homem sem que se faam mui-
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zfiro
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tos alardes, notvel nos traos de Zfro e em
seu texto uma poca onde o imaginrio sexual
do brasileiro se concentrava nas mulheres de cin-
turas fnas e seios fartos com um corpo moldado
por um vesturio tpico do perodo dos anos 50 e
60 e os homens eram naturalmente fortes, com o
rosto moldado por um bigode e sempre elegan-
tes com seus ternos cheirando a Lancaster, sem
falar na narratva oscilante entre uma descrio
sem pretenses dos espaos e objetvidade nos
atos (sexuais) dos personagens.
Devido a isso, o trao de Zfro tambm
se tornou uma referncia, a qual pde servir de
inspirao a outros desenhistas. Curiosamente,
o nome Carlos Zfro veio de um autor mexica-
no e as inspiraes do estlo e das histrias vie-
ram tanto do prprio Mxico quanto das revistas
pornogrfcas suecas. No entanto, as situaes,
a sensualidade e o modo como os personagens
atuam so claramente brasileiros, destoando in-
clusive dos chamados tjuana bibles, quadrinhos
ertcos norteamericanos que circularam naque-
le pas dos anos de 1930 at os anos de 1950.
Para fazer seus mais de 800 catecismos,
Zfro usava papel vegetal e poduzia revistas
com at 32 pginas e dois quadros por folha. A
impresso era feita em vrias grfcas do pas, o
que garanta sua circulao em nvel nacional e,
obviamente, sua fama entre os consumidores
de seus catecismos, como o fctcio personagem
que abre este texto. Certamente, se ele existsse,
hoje estaria com netos, vendo-os espreita faze-
rem pouco caso dessas revistnhas, trocando-as
por Playboys e sites de sexo mo e sem contro-
le em qualquer computador que tenha acesso
net.
Ao ver essa variao de tempo, dos de
1950 a hoje, obviamente que o tratamento dado
ao sexo e o que ele traz mudou, at porque os
quadrinhos de Zfro surgiram na fase pr-revo-
luo sexual e SIDA. No entanto, algo neles ainda
se mantm intacto, seja na sugesto de realidade
que os desenhos passam, seja no modo como os
personagens se encontram, se tocam e gozam.
De qualquer modo, Alcides Caminha mor-
reu em 1992 para dar lugar ao nome de Carlos
Zfro, tornado pblico como a mesma pessoa
uma ano antes pelo jornalista Juca Kfouri. Alm
disso, a cantora Marisa Monte estampou em um
cd, Barulhinho bom, imagens dos catecismos,
realando ainda mais o carter agora artstco
do que pornogrfco da obra de Zfro, o que
se comprovou este ano com uma exposio sua
no Museu do sexo de Nova York. Nada mal para
quem temia perder o emprego por conduta es-
candalosa devido aos seus catecismos.
oque: zfro, Carlos. Carlos Zfro - In black and
white. Ed. Plugin (esgotado)
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Carlos Zfro
Canes e erotismo
Por Afonso Henrique Novaes Menezes
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Com sugestes de relao sexual ou atravs de
apelos diretos, a cano popular do sculo XX
ao XXl passou por intensas mudanas ao retra-
tar o erotsmo, refetndo o modo como cada
poca tratou desse tema
relao entre msica e erotsmo mais
antga do que nos faz supor Madonna. Um
dos pontos indicatvos de que canes pop e in-
sinuao sexual podem ser um bom casamento
j remonta ao fnal dos anos 50 (especifcamen-
te 1959) com a sussurrada Teach me Tiger, que
muitos atribuem erroneamente a Marylin Mon-
roe, mas que, na verdade, foi lanada por April
Stevens, cantora americana de relatvo sucesso
nessa poca e que causou alvoroo com seus
sussurros entoando a letra cheia de sugestes:
teach me Tiger how i kiss you teach me Tiger i
would Kiss you But teach me frst, teach what to
do But show me frst, oh, show me what to do
(...) or ill teach you (Ensine-me, tgre, como eu
te beijo Ensine, tgre,eu gostaria de te beijar Mas
me ensine primeiro,oh, Me mostre o que fazer
(...) ou eu te ensinarei). bvio que causou escn-
dalo, at porque na era pr-revoluo sexual nos
EUA uma moa cantar daquele jeito e
fazer a contraproposta de ensinar ao tgre (sm-
bolo da macheza) o que ele talvez no soubesse
seria (com as devidas propores) o mesmo que
ela ilustrar em imagens o que causava os gemi-
dos.
Da a 10 anos outra cano igualmente
sussurrada completaria o clima de sexo em quar-
tos de amantes. Era o auge da liberdade e da
revoluo ps-maio de 68 e Serge Gainsbourgh,
um mito at hoje na Frana, lanava com Jane
Birkin, sua mulher poca, Je taime moi non
plus, na qual se ouvia uma relao sexual acon-
tecer com direito a orgasmos gemidos em meio
letra, potca e at mesmo sutl em seu erots-
mo: comme la vague irresolue je vais je vais Et
je viens Entre te riens Et je me retens (Como
a onda irresoluta Eu vou eu vou e volto Em teu
dorso Eu me retenho).
Serge causar um escndalo atravs de
outra cano, mas desta vez nos anos de 1980,
com Lemon incest, dueto dele com sua flha,
Charlote (hoje atriz) na poca com 13 anos, lan-
ando seu primeiro disco. As insinuaes na letra
de que havia uma relao entre uma menina e
um homem mais velho causaram reaes adver-
sas, principalmente porque no refro ela sonori-
zava papapa inmeras vezes. Ou seja, incesto e
pedoflia foram demais para quem anos antes se
escandalizava (ou gostava e gozava) com canes
que falavam metforas de ondas de prazer em
corpos nus embalados por vozes gemidas.
oua
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caneserticas
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April Stevens
Jane Birkin e SerfeGainsbourgh
evidente que estas canes acabam por
refetr seu tempo e, de algum modo, como cada
poca foi tratando do ertco no campo das ar-
tes. O que fca claro, ao ouvir tais canes e loca-
lizar o tempo em que elas foram lanadas, que
o sugerido sempre mais efcaz que o exposto
ou dito sem sutlezas. Nesse caso, mostrar, desta-
car ou indicar sem sombras ou metforas aquilo
que o prazer e o sexo trazem pode ser cansatvo,
morre em seguida de seu nascimento, como bem
salientou Roland Barthes a respeito da diferena
entre o erotsmo e a pornografa. Tome-se ainda
o fato de que as metforas podem ser poderosas
em driblar qualquer possibilidade de censura,
no importando o perodo.
Caso comum a isso foi o que ocorreu no
Brasil dos anos de 1970, onde os militares re-
primiam qualquer indicao de desordem, seja
no campo poltco e sexual. Contra isso conta-
-se muito o surgimento dos Secos e molhados,
ainda hoje farol para quem quer transgredir os
costumes, se que ainda isso possa acontecer
nos nossos tempos, e que acabou tendo verses
bizarras e declaradamente escrachadas como a
banda recifense Textculos de Mary, misto de tra-
vestsmo e teatro.
Em carreira solo, Ney Matogrosso, que ha-
via sado dos Secos e molhados aps dois discos
lanados, enfatzou ainda mais sua ambigidade,
no s na postura de palco, ainda hoje hipnt-
ca, mas tambm nas letras de canes como Ho-
mem com H ou na verso nonsense de Telma eu
no sou gay, clssica da verso pardia de suces-
sos americanos dos anos de 1980.
No entanto, em um rock setentsta cha-
mado Acar candy h um erotsmo cuja letra
corajosa parecia desafar todas as formas de
represso do perodo, pois, alm de haver os
j comuns gemidos de Gainsbourgh e April Ste-
vens, havia uma letra que mostrava uma relao
homossexual cheia de prazer, exaltando o pnis
do homem que o dominava em sua potncia e
tamanho: as balas de seu 38 me matam de pra-
zer (...) Meu corpo estremece Meu corpo falece
Crivado de fechas venenosas Sua pistola dispara
baunilha Na minha boca No meu dorso Ai preci-
pcio Ai que poo de delcias.
Com tais palavras, certamente os france-
ses e americanos iriam corar diante de imagens
to diretas quanto verdadeiras, a tal ponto de se
imaginar a luta entre dominador e dominado no
jogo da pistola que atra baunilha na boca e cor-
po do vencido.
Ainda na esteira do erotsmo em letras de
canes, Chico Buarque foi inquestonavelmente
o mestre de dar forma a sentmentos e prazeres
em palavras feitas versos. Sem contar a alarde-
ada viso de mulher que ele tem em muitas de
suas canes (onde o erotsmo subjaz no discur-
so de todas elas), letras de canes como Eu te
amo nos do a medida exata de como ter um
equilbrio entre o erotsmo e a poesia sem decair
no lugar comum e ainda assim expor a intensida-
de de uma relao sexual, como trazem os versos
dessa msica, que dizem: Como se nos amamos
como dois pagos Teus seios ainda esto nas mi-
nhas mos Me explica com que cara eu vou sair.
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Ney Matogrosso
Mas o erotsmo plstco, aquele que, de
to fake e calculado, atrai nosso olhar encontrou
em Madonna a sua mais completa traduo. Vin-
da de fases distntas, como, alis, sempre foi sua
carreira, ela saltou de uma bombshell misterio-
sa, tpica do cinema noir, no flme Dick Tracy para
bobagens libertrias de Na cama com Madonna.
Musicalmente, Ertca, um disco que lhe abriu os
anos de 1990, foi lanado com estardalhao jun-
to ao livro de fotos chamado de Sex.
Pornografa sof, aliada a batdas eletrni-
cas e uma verso sussurrada (jeito de cantar sen-
sual que nunca cai de moda) do clssico Fever
fzeram dela um smbolo da sexualidade libera-
da, com indicaes bobas de total transgresso
vigiada, como a famosa entrevista a David Leter-
man em que ela lhe entregou uma calcinha.
No Brasil, quando ela veio divulgar o disco
com o espetculo The Girlie Show vrias meninas
mostraram-lhe os seios como forma de tambm
serem transgressoras. Certamente Madonna no
esperava por isso. O choque de realidade de um
erotsmo quase porn contra um comportamen-
to calculadamente com data para acabar deve
ter sido demais para ela. Sinal de tempos em que
simular melhor que sugerir e que sutlezas e
ambigidades safadas so derrubadas pela puta-
ria sem disfarces.
O melhor exemplo disso so os proibi-
des, msicas do funk carioca cujas letras tratam
de violncia e drogas sem meios termos e, obvia-
mente, apresentam o sexo de uma maneira to
crua quanto chocante. Um exemplo disso so as
letras de A gaiola das popozudas ou do funk Na
arte do sexo, da MC Kata, de onde se ouve: Na
arte do sexo Pode crer que eu esculacho Fao
tudo o que ele gosta E ainda dou o meu cu de
cabea pra baixo.
Com tal letra, os ttulos dos proibides j
remetem a uma realidade que ora fascina, ora
escandaliza a classe mdia que ainda permite as
letras bobinhas de Madonna ou se diverte com a
inteligncia marota de Genival Lacerda ou San-
dro Becker. Sinal dos tempos.
oque: matogrosso, Ney. Metamorfoses. Box
com 16 cds. Grav. Universal, r$ 300,00
madonna, ertca. Grav. Warner. R$ 27,90
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Capa do cd Ertca de Madonna
A santa que levantou a saia
Por Filipe Bezerra
A santa que levantou a saia
Por Filipe Bezerra
Criadora de uma das obras mais completas da
literatura contempornea brasileira, Hilda Hilst
escreveu uma tetralogia pornogrfca, onde tra-
ta, entre outras coisas, do fazer literrio.
um ato de agresso. No um livro, uma
banana a Lori Lamby,que eu estou dando para
os editores, pro mercado editorial. Porque du-
rante quarenta anos eu trabalhei a srio, tive
um excesso de seriedade, de lucidez e no
aconteceu absolutamente nada. Agora eu acho
que as pessoas precisam ser acordadas. muito
importante se a pessoa est dormindo h muito
tempo voc fazer uma ao vigorosa para que
a pessoa se levante., debocha Hilda Hilst numa
entrevista TV Cultura, em 1990, na ocasio do
lanamento de O caderno rosa de Lori Lamby,
seu primeiro livro pornogrfco, ou de banda-
lheiras, como ela mesma nomeava.
resposta revela no apenas o ressen-
tmento da escritora com a ento pouca re-
percusso de suas obras em meio ao grande p-
blico vaidosa, sem falsa modsta ela afrmava
que tudo o que escreveu era deslumbrante , re-
vela tambm que seu projeto obsceno se erigia
sob a tradio de nomes como D. H. Lawrence,
escritor ingls que defendia a literatura grotesca,
que causava choque nos leitores, como uma das
maneiras possveis de derrubar as mentras que
sustentam a sociedade.
Mais adiante, ainda explicando as ra-
zes que a levaram enveredar pelo gnero, ela
comenta: h uma tristeza muito profunda no
mundo e o riso uma soluo muito grande para
uma sade mental geral, para a minha foi exce-
lente, explicitando da mesma maneira sua flia-
o ao pensamento de Georges Bataille, famoso
escritor francs que costumava abordar em seus
escritos temas como o erotsmo, a transgresso
e o religioso; e para quem o riso compreendi-
do como um compromisso que o homem adota
diante de algo que o repugna, quando esse algo
no lhe parece to grave.
Hilda escreveu quatro livros tdos como
pornogrfcos. O caderno rosa de Lori Lamby,
inaugurando essa tetralogia, se insere numa tra-
dio de novelas francesas do sculo XVIII, escri-
tas em forma de dirios ou epstolas, de forma
irnica: num caderno rosa, Lori Lamby, a prota-
gonista de oito anos de idade, anota com sua
linguagem infantl seu dia-a-dia vendendo o pr-
prio corpo a homens, sendo agenciada pela sua
me e seu pai um escritor considerado genial,
que escreve textos deslumbrantes, mas sem su-
cesso algum de vendas e, por isso, sofre presso
de seu editor para escrever bandalheiras, que,
segundo ele, o que vende. Eu contei pro papi
que gosto muito de ser lambida, mas parece que
ele nem me escutou, e se eu pudesse eu fcava
muito tempo na minha caminha com as pernas
abertas, escreve Lori Lamby em um dos vrios
trechos onde ela deixa claro que gosta e sente
prazer no que faz.
Lori tambm reconhece as questes prt-
cas que esto por trs do que faz: Tudo isso que
eu estou escrevendo no pra contar pra nin-
gum porque se eu conto pra outra gente, todas
as meninas vo querer ser lambidas e tem umas
meninas mais bonitas do que eu, a os moos vo
dar dinheiro pra todas e no vai sobrar dinheiro
pra mim, pra eu comprar coisas que eu vejo na
televiso e na escola. Aquelas bolsinhas, blusi-
nhas, aqueles tnis e a boneca da Xoxa. O fnal
inesperado endossa, ainda que mantendo todo
o clima de leveza da narratva autobiogrfca de
Lori, a opresso de uma sociedade materialis-
ta de consumo, onde se vale o que se tem ou o
que se pode gerar de lucro, que conhece preos
e desconhece valores e onde no esto imunes
nem mesmo as crianas.
O segundo livro, Contos de escrnio e tex-
tos grotescos, inicia-se tambm com um deboche
ao mercado editorial e aos leitores comuns. Cras-
so, autor fccional do roteiro de fornicaes,
um escritor iniciante que se diverte escrevendo
um conjunto catco de textos que ali se unem
numa confuso de gneros (prosa, receitas, tea-
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leia
hildahilst
A
tro, poesia), baseados em sua movimentada vida
sexual: Resolvi escrever este livro porque ao
longo da minha vida tenho lido tanto lixo que re-
solvi escrever o meu. Sempre sonhei ser escritor.
Mas tnha tal respeito pela literatura que jamais
ousei. Hoje, no entanto, todo mundo se diz es-
critor. E os outros, os que leem, tambm acham
que os idiotas o so. tanta bestagem em letra
de frma que pensei, por que no posso escrever
a minha.
Tendo no por acaso um nome que reme-
te aos adjetvos grosso, grosseiro e burro,
Crasso se inscreve nos clichs heterossexuais ma-
chistas, segundo os quais a mulher est subjuga-
da s vontades do homem:O que eu podia fazer
com as mulheres alm de foder? E sua narrat-
va no ser diferente, cheia de lugares-comuns
do gnero pornogrfco: seu envolvimento com
Lina, uma virgem deforada; com Otvia, adepta
ao sadomasoquismo; com Flora, uma advogada
culta e insacivel; entre outras. Carregado de
descries denotatvas dos atos sexuais, o leitor
convidado a se pr num papel de voyeure, ao
mesmo tempo, caso tenha tal discernimento, de
crtco do tpo do texto que l, para que ento
possa responder a si mesmo: vale mais a litera-
tura de mercado ou a que possui qualidades es-
ttcas?
Cartas de um sedutor,que d sequncia
tetralogia, um livro produzido a partr de uma
multplicidade de vozes narratvas. E mais uma
vez a questo editorial emerge: Stamatus um
escritor que se autoexilou da classe mdia bur-
guesa aps ter sua produo literria recusada
pelo mercado editorial (aqui, ao contrrio do pai
de Lori, por serem escrachados demais) e vive
em condies deplorveis, como mendigo, pelas
ruas com Eullia, unidos quase que exclusiva-
mente pelo desejo que um sente pelo outro. E
esse desejo obsessivo que um tem pelo outro
que serve de inspirao para muitas narratvas
que Stamatus escreve, incluindo a as cartas do
sedutor que do ttulo e principiam o livro.
Karl escreve uma srie de cartas para sua
irm, Cordlia (que tambm lhe manda cartas,
mas o seu contedo ns apenas sabemos me-
diante aluses feitas nas cartas de Karl),com uma
srie de refexes feitas a partr de sua viso de
homem culto, amoral e rico sobre a vida, que
ele tenta responder atravs do sexo. As cartas
so provocatvas e revelam a bissexualidade de
Karl, suas relaes incestuosas com Cordlia e a
constante dvida se ela transou ou no com o pai
deles, que ele prprio tambm desejava e sabia
que mantnha um caso com outro homem. Ces-
sadas as cartas, o livro segue com contos trgicos
que Stamatus cria a partr do discurso de Eullia.
Encerrando a quadra de ttulos pornogr-
fcos, Buflicasj traz em seu ttulo a sugesto do
burlesco, cmico e farsesco que perpassa toda
a inteno do livro. Ao longo dos sete poemas
narratvos que o compem, desflam persona-
gens do imaginrio fabulesco e infantl: fada,
bruxa, rei, Chapeuzinho Vermelho, ano, etc.,
todos deslocados de suas representaes mais
comuns, em situaes erotzadas, escrachadas
e pattcas, que causam o riso sugerido por Ba-
taille. De pau em riste / O ano Cido / Vivia
triste. / Alm do chato de ser ano / Nunca podia
/ Meter o ganso na ta / Nem na rodela do ne-
gro. / que havia um problema: / O porongo
era longo / Feito um basto. / E quando atvado
/ Virava... a terceira perna do ano. E nesse tom
jocoso, Hilda discute de forma sarcstca temas
como homossexualidade, sexualidade reprimida,
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Hilda Hilst
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violncia sexual, explorao fnanceira do sexo,
represso e autoritarismo.
Ainda na mesma entrevista j citada, Hil-
da comenta: a verdadeira natureza do obsceno
a vontade de converter. (...) de certa forma, se
voc for consideravelmente repugnante, voc
faz com que o outro comece a querer a nostal-
gia da santdade. O desejo de ter cada vez mais
leitores, de ser lida, de fazer ecoar o que tnha
a dizer, fez com que ela, j respeitada pela aca-
demia, pelos intelectuais paulistas, dona de uma
produo sempre encarada como sria, tomasse
tal attude.Parece que a santa levantou a saia,
ria a respeito da recepo de seu ento limitado
pblico sua nova postura. Mas, para elao es-
critor deseja ser lido. Essa a vontade e a meta
do escritor. No adianta nada para mim dizerem
que sou excelente e eu perguntar: o senhor leu?
No senhora, nunca li. Ento eu espero que des-
sa vez me leiam na cpsula, no bonde, e nos ba-
nheiros tambm.
Entretanto, engana-se quem deseja nos
banheiros fustgar efeitos hormonais no corpo
com a leitura de tais textos. Sob a perspectva
das breves snteses expostas sobre cada um dos
ttulos da literatura pornogrfca de Hilda Hilst,
fca claro que seus textos contrariam a regra pri-
meira da pornografa medocre: a simulao re-
alista. Percorrendo um caminho inverso, eles se
desdobram incansavelmente sobre si prprios
revelando sua condio de expresso literria
tornando, desse modo, vazia a superfcie de seu
contedo sexual.
oque: hilst,hilda o caderno rosa de lory lambi.
ed. Globo r$ 35,00
hilst,Hilda buflica. ed. globo. r$ 21,00
hilst, hilda cartas de um sedutor ed. globo
(esgotado)
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Pietro Aretino
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Pietro Aretno por Ticiano
Pietro Aretino
Aretno - poeta das palavras chulas e vs
Pietro Aretno viveu no sculo XVl na It-
lia. Filho de um sapateiro e de uma prosttuta,
passou do ofcio de encadernador de livros a es-
critor com um estlo que misturava erudio e
pornografa.
Devido a tal estlo, foi temido por uns e
admirado por outros, como o pintor Ticiano que
lhe fez retratos, sendo chamado em sua poca
de Flagelo dos prncipes.
Os poemas abaixo fazem parte de sua
obra Sonetos luxuriosos, polmica e rejeitada
em seu tempo, e hoje referncia de qualidade
da chamada literatura pornogrfca, assim como
sua outra obra O dilogo das cortess.
Sonetos luxuriosos de Pietro Aretno
Soneto 11
Para provar to clebre caralho,
Que me derruba as orlas j da cona,
Quisera transformar-me toda em cona,
Mas queria que fosses s caralho.
Se eu fosse toda cona e tu caralho,
Saciaria de vez a minha cona,
E trarias tu tambm da cona
Todo o prazer que ali busque o caralho.
Mas no podendo eu ser somente cona,
Nem inteiro fazeres-te caralho,
Recebe o bem querer da minha cona.
E vs tomai, do no assaz caralho,
O nimo pronto, baixai a vossa cona,
Enquanto enfo fundo o meu caralho.
Depois, sobre o caralho
Abandonai-vos toda com a cona,
Que caralho eu serei, vs sereis cona.
Soneto 12
Mete e volta a meter o teu caralho
No cu desta que em cona no o goza
Porque esta fodedura mais gostosa:
Praz mulher a quem praza o caralho.
Vs podeis ver com quanto ardor batalho.
Pois em foder no h mais valorosa.
Quase toda hoje em dia viciosa.
Que deleite encontrar de melhor talho?
Certo, meu bem, mas mexe mais depressa.
Mete o caralho atrs, a! mexe, avante!
Que eu mexo sem parar, de amor possessa.
Oh, bela prova de um fel amante!
prosaoupoesia
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sonetosluxuriosos
Duas vezes cumprir, pressa, pressa,
Com ele sempre rgido e constante.
Caralho de diamante!
Posso dizer que gozo-te, alma minha.
Amor te guarde e te honre em toda linha.
Soneto 17
Fica quieto, meu velho, sobrest.
Enfa, mestre meu, enfa at
O cabo, d-me a lngua, eu morro, ol!
Teu caralho minha alma chegar.
Senhora, agora mesmo ele entrar
Todo em vs; sobre a terra ponde o p.
Bom servio ser, por minha f,
Este que ora faremos. Vamos l.
De satsfeito, vou e volto, vou
E volto. Faz o mesmo: mexe e sua.
Mame! bem perto de acabar estou.
No acabes, contm a pressa tua.
Tal doura esta foda me brindou
Que anseio por que nunca se conclua.
Eia, Madona, e ua
Merc - a de acabar - fazei por mim:
Eu acabo e tu no? Senhora, sim.
Soneto 26
Estes nossos sonetos do caralho,
Que falam s de cu, caralho, cona,
E feitos a caralho, a cu, a cona,
Semelham vossas caras de caralho.
Trouxestes c, poetas do caralho,
As armas para pr em cu e cona.
Sois feitos a caralho, a cu, a cona,
Produtos de gr cona e gr caralho.
E se furor, oh gente do caralho,
Vos falta, fcareis no pica-cona,
Como acontece amide coo caralho.
Aqui termino essa questo da cona
Pra no entrar no bando do caralho,
E, caralho, vos deixo em cu e cona.
Quem perverses tenciona
Aqui nestas asneiras logo as l.
Que mau ano e mau tempo Deus lhe d.
oque:aretino,pietro. sonetos luxuriosos, ed. m
companhia, r$ 19,00
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Amor, erotismo e morte
Por Tito Souza
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assista
Produo franco-japonesa traz para as telas
uma polmica histria de amor e sexo sem
limites entre uma ex-prosttuta e seu patro.
e o prazer existe para (tentar) satsfazer o
desejo, o que se pode dizer quando este adquire
uma dimenso irrefrevel a ponto de se tornar
uma obsesso? Seria possvel controlar a volpia
dos sentdos quando eles se tornam a nica lei
que rege a prpria existncia? Tais indagaes,
embora paream um tanto intrincadas, no tm
a pretenso de serem aqui respondidas. Alis,
nem parece ter sido essa a inteno do diretor
japons Nagisa Oshima, em seu controverso
Imprio dos Sentdos, verdadeira obra-prima
cinematogrfca que apresenta limites bastante
tnues com a pornografa.
Lanado mundialmente em 1976,
Imprio dos Sentdos tornou-se polmico pela
naturalidade com que abordou o desconcertante
envolvimento afetvo e sexual entre os
protagonistas. Na poca em que foi produzido,
Nagisa Oshima teve que realizar as flmagens
na Frana para escapar da rgida censura do
seu pas de origem. Ambientado em 1936,
o flme baseado em uma histria real que
chocou a opinio pblica no Japo, fato que
provavelmente contribuiu para reforar o seu
carter transgressor e justfcar a sua proibio
em diversos pases.
Sada (Eiko Matsuda), ex-prosttuta que
se torna empregada de uma tpica propriedade
familiar japonesa, passa a se relacionar
sexualmente com o seu patro, Kitsan (Tatsuya
Fuji). Embora seja casado, Kitsan sente-se cada
vez mais atrado pela jovem Sada, e em pouco
tempo os dois iniciam um romance de entrega
total. Passam, ento, a viver uma paixo sem
limites, deixando-se guiar completamente pelos
sentdos, a ponto de pratcarem sexo de maneira
quase ininterrupta, incontrolvel, obsessiva.
Os encontros amorosos, inicialmente
furtvos, tornam-se cada vez mais frequentes e
intensos. A certa altura, Sada e Kitsan recusam-
se a aceitar quaisquer convenes. No fazia
mais diferena se eram vistos ou critcados
pelo comportamento nada puritano. Tudo o
que faziam era externar seus desejos e pulses
sexuais, que cresciam furiosamente.
Para Sada, o que mais importava era estar
sempre prxima de Kitsan, especialmente atravs
da unio carnal. J no podia sequer admitr a
ideia do seu amante se relacionar sexualmente
com a prpria esposa, chegando a amea-lo de
morte caso o fzesse. Meu prazer lhe dar prazer
e obedecer aos seus desejos, afrma Kitsan,
aceitando a sua completa submisso aos desejos
libidinosos de Sada. Ela, portanto, quem passa
a ditar as regras do romance, invertendo assim
a clssica tendncia da dominao masculina na
cultura oriental.
Em sua busca incessante pelo gozo, o
casal pratca no apenas o voyeurismo, partndo
tambm para os fagelos fsicos. Ao perceberem
que a dor poderia ser um estmulo excitao,
aderem defnitvamente ao sadomasoquismo,
utlizando o estrangulamento como artfcio para
obteno do prazer. A partr desse momento,
como se os corpos de Sada e Kitsan no mais lhes
pertencessem: so as foras de Eros e Tnatos
manifestando-se cada vez mais intensamente,
numa espcie de duelo entre amor e destruio.
O curioso elo que se estabelece entre
Sada e Kitsan certamente o que chama a
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imperiodossentidos
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Cena do flme
ateno na narratva. O permanente desejo de
estarem ligados, quase sempre fsicamente,
o que mobiliza a ao dos personagens. Em
um frenesi constante, seus corpos deslizam em
cena, movimentando-se em contraes rtmicas
e sensuais. Imersos nessa total embriaguez dos
sentdos, os amantes vivem dionisiacamente, at
culminar no desfecho surpreendente.
Em Imprio dos Sentdos, mesmo as cenas
de sexo explcito so realizadas de maneira bela
e potca. Nele, o ato sexual no o fm em si,
mas o meio pelo qual o desejo se faz comunicar.
E apesar do forte realismo presente nas telas
(os atores de fato fzeram sexo), no se trata
de um flme propriamente pornogrfco. Talvez
seja mais adequado situ-lo como uma obra
do gnero drama ertco, considerando a sua
atmosfera densamente lbrica.
Outro aspecto marcante do longa-
metragem o contexto histrico que lhe serve
de pano de fundo. O enredo, que se passa
poucos anos antes da ecloso da Segunda Guerra
Mundial, pode ser considerado um refexo das
tenses sociais existentes no Japo daquele
perodo, ainda que no seja esta a perspectva
central da narratva. De qualquer modo, Imprio
dos Sentdos uma obra to impactante quanto
atemporal. Um flme fantastcamente ertco e
assustadoramente intenso.
oque: oshima,Nagisa. o imprio dos sentdos.
spectra nova. r$ 14,90
Cena do flme
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imagensdooutro
As imagens de Marcos Cesrio guardam algo de onrico, como um segredo que quase se mos-
tra. Talvez por isso, ao v-las, sempre h algo que nos captura o olhar, seja a cor que toma as formas
que ele registra, seja o signifcado do que aquela imagem pode trazer. No por acaso, ele d outros
tantos sentdos a cenas cotdianas, como nas fotos das mulheres e homens da comunidade de Ti-
juau ou na nudez de corpos que no nos despertam seno o desejo de entender a beleza que dali
brota.So essas imagens que esto presentes na Marduk deste ms.
Subvertendo os conceitos de erotsmo, mesmo usando elementos que poderiam ser facilmen-
te identfcados por ele, Cesrio amplia as possibilidades de classifcao de sua obra, principalmente
por no buscar a obviedade to comum a cenas de nu. Nesse caso, ao contrrio de haver a nudez de
um corpo por si mesma, h algo de secreto que nos escapa o entendimento toda vez que olhamos
tais imagens. Isso certamente o que faz um fotgrafo ser mais do que algum que capta a vida. A
sensualidade de suas fotos natural sem que se force o espectador a perceb-la. E da fca apenas a
beleza, isenta de julgamentos.
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marcoscesario
A nudez onrica das fotos de Marcos Cesrio
O pescador
O reflexo
O reflexo
O sono
MARDUK #08
MARDUK
ISSN 2237-0447
Direo geral
Afonso Henrique Novaes Menezes
Editores
Afonso Henrique Novaes Menezes
Filipe Gonalves
Washington Lacerda
Consultoria Tcnica:
Renato Alves
Diagramao
Washington Lacerda
Realizao:
Assessoria de Cultura
Universidade Federal do Vale do So Francisco
Reitor em exerccio
Paulo Csar Silva Lima
email: [email protected]
Vol. 8, n. 8 - Dezembro de 2011
Esta revista de circulao exclusivamente on line e gratuita, no gerando
lucro nem para seus editores nem para seus colaboradores
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