Capacidade de Leitura Textos Multimodais

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CAPACIDADES DE LEITURA DE TEXTOS MULTIMODAIS

Cludia Graziano Paes de Barros1

RESUMO: Na atualidade, as demandas sociais de leitura e escrita tm exigido dos sujeitos capacidades de letramento cada vez mais avanadas. Estudos recentes tm apontado para a necessidade de se atentar para as diferentes linguagens presentes em um texto, quer seja impresso ou digital. Neste artigo, discutiremos as capacidades que se mobilizam na leitura de textos em que essas diferentes linguagens se fazem presentes textos multimodais (VAN LEEUWEN, 2004; DIONSIO, 2005; PAES DE BARROS, 2005) a partir de dados por ns coletados em ambiente escolar, com alunos da oitava srie (nono ano) do Ensino Fundamental. PALAVrAS-cHAVE: letramento, textos multimodais, ensino fundamental ReadinG capacities of mUltimodal texts ABSTrAcT: Currently, the social demands of reading and writing are required of the subjects of increasingly advanced literacy skills. Recent studies have pointed to the necessities of paying attention to the different languages in a text, whether printed or digital. In this article, we discuss the capabilities that are mobilized in the reading of texts in which these languages are present - multimodal texts (VAN LEEUWEN, 2004; DIONSIO, 2005; PAES DE BARROS, 2005) - from the data we collected elementary schools with eighth-grade students. KEYWOrDS: literacy, mutimodal texts, elementary schools As atuais demandas de leitura e escrita tm exigido dos leitores capacidades cada vez mais avanadas de letramento, por exemplo, atribuir sentidos a textos multimodais, quer sejam impressos ou digitais. Em nossas pesquisas,
1 Professora do Departamento de Letras e do Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem MeEL/ UFMT.

POLIFONIA

CUIAB

EDUFMT

N 19

P. 161-186

2009

iSSn 0104-687X

observamos muitos trabalhos que tratam das capacidades de leitura relacionadas aos textos verbais, mas, para que pudssemos observar o aprendizado dos alunos quanto leitura dos textos no-verbais e daqueles que aliam o verbal ao no-verbal (textos multimodais), tivemos que recorrer literatura da Semitica Social e da Psicologia Cognitiva para refletir sobre esse aprendizado e elaborar as capacidades de leitura desses textos. Assim, neste artigo, apresentamos alguns dados selecionados a partir de uma pesquisa por ns realizada com alunos de Ensino Fundamental de escola pblica brasileira, que objetivou trabalhar a leitura em uma perspectiva enunciativa bakhtiniana, utilizando a primeira pgina de jornal impresso, considerada como um gnero multimodal e, como no dizer de Schneuwly (1994/2004), como um megainstrumento para o ensino-aprendizagem de lnguas. Segundo a semitica social, a lngua faz parte de um contexto sociocultural no qual a cultura produto de um processo de construo social. Nessa medida, nenhuma modalidade de linguagem pode ser inteiramente estudada de maneira isolada. A lngua falada ou escrita no pode ser entendida seno ligada a outros modos de representao que participam da composio de um texto. De acordo com essa teoria, os textos so construtos multimodais, sendo que a escrita to somente uma das modalidades de representao. Essas, por sua vez, so culturalmente determinadas e constantemente redefinidas no interior dos grupos sociais em que esto inseridas. Assim, o ato de ler no deve se centralizar apenas na escrita, j que esta se constitui como um elemento representacional que coexiste com a presena de imagens e de diferentes tipos de informao. Delphino (2005), baseando-se em Kress & Van Leeuwen (1996), pondera que: 1. Um nmero variado de modos semiticos est sempre envolvido em uma determinada produo textual ou leitura, pois todos os signos so multimodais ou signos complexos, existindo num nmero de modos semiticos diferentes;

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2. Cada modo tem sua representao especfica, produzida culturalmente, alm de seu potencial comunicacional; 3. necessrio um entendimento sobre como ler estes textos. Para a semitica social, o texto escrito per si multimodal, isto , tambm se compe por mais de um modo de representao. Numa pgina, por exemplo, alm da linguagem escrita, outras formas de representao, como a diagramao, a qualidade do papel, o formato e a cor das letras, entre outros elementos, contribuem e interferem nos sentidos dos textos. Dessa forma, nenhum sinal ou cdigo pode ser entendido em sua amplitude quando estudado isoladamente, j que os elementos se complementam na composio dos sentidos. A opo pelo emprego de certos elementos e no de outros, de certas formas de representao e no de outras, deve ser entendida em relao ao seu uso e em situaes de circulao e de interlocuo especficas. Desse modo, Van Leeuwen (2004) defende que os gneros da fala e da escrita so, de fato, multimodais: os gneros da fala combinam a linguagem oral e a ao, num conjunto integrado. Os gneros da escrita combinam a linguagem escrita, imagens e grficos, tambm compondo um conjunto integrado. O autor defende que os gneros da fala podem ser chamados de performed e os gneros da escrita de inscribed. No caso de nosso objeto de estudo, o jornal impresso, podemos refletir, com o autor, que este se constitui em um gnero inscribed inscrito, ou seja, que suas significaes se constituem a partir do entalhe dos elementos verbais e no-verbais presentes em suas pginas. Em pesquisa realizada com alunos de oitava srie (nono ano) de escola pblica (PAES DE BARROS, 2005), buscamos no somente observar as capacidades de leitura que os estudantes j traziam, como tambm desenvolver um projeto de ensino-aprendizagem de leitura da primeira pgina de jornal impresso, tomando-o como um gnero discursivo multimodal no qual encontramos a linguagem visual em fotografias, grficos, infogrficos, que aliam a materialidade visual escrita, diagramao, ao tamanho e formato de tipos, constituindo-a em um gnero multimodal.
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Pensando no ensino de leitura de um gnero multimodal como este, remetemo-nos a Dionsio (2005, p. 160), quando afirma que, na sociedade contempornea, a prtica de letramento da escrita, do signo verbal deve ser incorporada prtica de letramento da imagem, do signo visual. A autora ressalta que a multimodalidade um trao constitutivo tanto do discurso oral como do escrito e que a escrita tem apresentado cada vez mais arranjos no-padres em funo do desenvolvimento tecnolgico, o que requer dos leitores modificaes em seus modos habituais de ler. Com a autora (2005, p. 161), levamos em considerao, neste trabalho, que: 1. As aes sociais so fenmenos multimodais; 2. Gneros textuais orais e escritos so multimodais; 3. O grau de informatividade visual dos gneros textuais da escrita se processa num contnuo; 4. H novas formas de interao entre o leitor e o texto, resultantes da estreita relao entre o discurso e as inovaes tecnolgicas. Com a autora tambm consideramos que os gneros orais e escritos se constituem em fenmenos multimodais, porque, quando falamos ou escrevemos um texto, usamos pelo menos dois modos de representao: palavras e gestos, palavras e entonaes, palavras e imagens, palavras e tipogrficas, palavras e sorrisos, palavras e animaes etc (DIONSIO, 2005, p. 161-162). Desse modo, ao utilizarmos a linguagem, realizamos operaes individuais e sociais que so manifestaes scio-culturais, materializadas em gneros. Em uma primeira pgina de jornal impresso, os aspectos verbais e visuais se aliam e se complementam de um modo tal que se tornam uma unidade textual, cada elemento contribuindo para um todo de significao. Dionsio (2005) tambm defende a idia que os meios de comunicao de massa escritos e a literatura so espaos sociais muito produtivos para a experimentao de arranjos visuais. A autora refora que at mesmo a disposio grfica dos textos no papel ou na tela do computador igualmente se constitui como fenmeno multimodal. Para discorrer sobre as estratgias utilizadas para a construo dos sentidos de textos multimodais, levamos
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em considerao os achados de pesquisa do grupo de Richard E. Mayer (2001), da Universidade da Califrnia. Seus estudos sobre a psicologia cognitiva e educacional tm se centrado na aprendizagem dos multimedia. Concordando com Dionsio (2005, p. 173) ao afirmar que a Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimdia (TCAM) pode ser inserida na elaborao e anlise de materiais didticos como suporte para o tratamento da multimodalidade dos gneros textuais no contexto de ensino-aprendizagem, recorremos a Mayer (2001). O pesquisador define como multimedia o material que associa palavras ao material pictogrfico, sendo que palavras designam os textos verbais (tanto em impressos como em textos orais) e o material pictogrfico inclui grficos, ilustraes, fotografias, mapas. Assim, o termo multimedia abrange no somente os textos digitais como tambm os textos impressos. Mayer realizou uma srie de estudos experimentais que se basearam em testes de reteno e transferncia das informaes a partir de textos instrucionais. Esses testes foram baseados em sete princpios e seus resultados demonstraram que h especifidades na leitura de materiais visuais e escritos. De seus resultados, apontaremos trs que, a nosso ver, aplicam-se leitura de textos jornalsticos: Princpio multimdia - os estudantes aprendem melhor atravs das palavras e das imagens do que apenas pelas palavras; Princpio da contiguidade espacial - os estudantes aprendem melhor quando as palavras esto perto das imagens correspondentes; Princpio da contiguidade temporal: os estudantes aprendem melhor quando palavras e imagens so apresentadas simultaneamente. O autor ilustra cada princpio, observando a aprendizagem tanto em materiais impressos como por computador. Ele esboa tambm uma estrutura terica para uma teoria cognitiva da aprendizagem dos multimedia, segundo a qual o sistema humano de processamento de informaes possui dois canais: um para o material verbal e outro para o material visual.
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Segundo o autor, ambos os canais tm capacidade limitada. A aprendizagem dos multimedia superaria essa limitao, pois se dirigiria a ambos os canais simultaneamente. Mayer (2001) considera, portanto, que uma aprendizagem realmente significativa envolve uma conexo de ambos os canais de processamento cognitivo. Desse modo, selecionar, organizar e integrar a informao de ambos canais a chave para uma aprendizagem realmente significativa dos textos que aliam a materialidade visual escrita. Poderamos refletir, ento, que a construo dos sentidos na leitura desses textos deve ativar outras capacidades cognitivas, alm daquelas j descritas. Podemos concluir, ento, que os leitores tm de recorrer ao que nomeamos (PAES DE BARROS, 2005) de estratgias de observao da multimodalidade, estratgias que utilizam na reconstruo dos sentidos dos textos multimodais. A seguir, ser exposto um esquema que elaboramos, objetivando desvelar o processo cognitivo desenvolvido na leitura dos textos que aliam a materialidade visual escrita: 1. Seleo e verificao das informaes verbais refere-se ativao das capacidades de compreenso e apreciao da leitura dos textos verbais, como parte do processo de compreender a significao do texto como um todo. 2. Organizao das informaes da sintaxe visual tratase da observao dos elementos pictogrficos de modo a selecionar e organizar as informaes relevantes construo da significao. 3. Integrao das informaes verbais e no verbais trata-se da capacidade de observar e conjugar as informaes da materialidade verbal pictogrfica, relacionando-as no ato de construo dos sentidos dos textos. 4. Percepo do todo unificado de sentido que se compe atravs da integrao dos materiais verbais e no verbais trata-se da ativao de diversas capacidades lingustico-discursivas e de leitura aliadas organizao e observao das informaes, atravs das quais o leitor constri um todo de significao.
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Desse modo, as especificidades dos textos que aliam a materialidade verbal pictogrfica exigem que o leitor recorra no somente s estratgias de compreenso e apreciao, mas tambm a estratgias particulares de observao multimodal que o levam a selecionar e verificar as informaes verbais e organizar as informaes da sintaxe visual. Estas ltimas proporcionam a integrao dos materiais verbais e pictogrficos que, por sua vez, ocasiona a percepo do todo unificado de sentido que se compe atravs da integrao dos materiais verbais e visuais. A compreenso desses processos cognitivos complexos que se realizam na leitura dos textos multimodais (de materiais impressos e tambm digitais) levou-nos a refletir sobre a importncia do ensino-aprendizagem da leitura de textos multimodais na escola. A partir dessas consideraes, elaborou-se um plano de curso para trabalhar a leitura da primeira pgina do jornal impresso, tomada como um gnero discursivo multimodal, com alunos de duas salas de 8 srie (nono ano) do Ensino Fundamental, em um percurso didtico que partiria da identificao e reconhecimento de cada um dos componentes da primeira pgina: fotografias, manchetes, diagramao, observando-se tambm aspectos lingsticos, como os tempos verbais presentes nas manchetes, por exemplo, - entre outras etapas de ensino -, com o objetivo de levar os alunos a lerem o jornal impresso, desvelando o no-dito presente nas primeiras pginas e percebendo que a compreenso de um texto necessita de diferentes recursos (inclusive no-lingusticos) para ter eficcia. Essas aulas compreenderam um perodo de dois meses e totalizaram dezoito em cada turma. Para este trabalho2, selecionamos apenas alguns dos episdios coletados, a partir dos quais discutimos as capacidades de leitura mobilizadas pelos estudantes na leitura de textos multimodais. A introduo do jornal impresso na escola pblica no fato novo. Os alunos, sujeitos de nossa pesquisa, tinham contato com jornais impressos em seu ambiente escolar
2 Para os objetivos deste artigo, selecionamos apenas alguns dos episdios por ns analisados. Para uma melhor compreenso das diferentes etapas que constituram o curso, sugerimos a leitura da nossa tese de doutorado (PAES DE BARROS, 2005).

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diariamente, j que a escola escolhida como locus da pesquisa fez parte, naquele ano, do projeto Correio Escola, uma parceria da Rede Anhangera de Comunicaes e escolas da rede pblica de Campinas. Este projeto previa a entrega de exemplares dirios do jornal Correio Popular, e a capacitao de professores, em que estes recebiam instrues variadas de desenvolvimento de trabalhos com o jornal de maneira interdisciplinar. Alm disso, os exemplares eram expostos no ptio escolar, o que colocava os alunos em contato com o jornal impresso diariamente. Mesmo com este contato constante com o jornal, a cada aula de leitura, os alunos se mostravam sempre interessados e participativos. Desde o momento em que recebiam os jornais, j comeavam a ler suas manchetes, viravam as pginas, discutiam seus contedos. Nas aulas iniciais, que foram dedicadas principalmente ao conhecimento do gnero escolhido, particularidades de sua construo composicional, de sua esfera de produo e circulao, observvamos os alunos preocupados com as questes que levantvamos (oralmente ou por escrito). Nesses momentos, muitas eram suas perguntas quanto ao tipo de resposta que deveriam dar. Organizamos os alunos em pares, buscando, com Vygotsky (1930), observar como a interao com o outro (par mais avanado) interferia na construo dos significados dos textos. Cada dupla recebia um exemplar de jornal diferente do de seus colegas; dessa forma, as respostas no se repetiam, o que gerava certa insegurana nos alunos, e, provavelmente, tambm um maior interesse pelas atividades:
Episdio 7 - 07/10/2003

Os alunos esto divididos em duplas e observam diferentes primeiras pginas do jornal Folha de S. Paulo e o exerccio solicita que observem manchetes, os ttulos das chamadas, legendas, cabealho dos jornais, fotografias, atentando para sua localizao nas pginas e seu contedo (uma pgina fotocopiada com os verbetes legenda, manchete, olho, fotomanchete etc., extrados de um manual de redao de jornal, foi entregue a cada dupla para que observasse os verbetes e os relacionasse aos componentes das pginas):
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Cam. dona, precisa copiar? P. (dirigindo-se a todos) ... vocs poderiam colocar a data do jornal que esto observando e que manchete ele traz, tambm dizer quais so as fotografias... Coloquem tambm o que o jornal traz no cabealho...
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Olhem na folha que eu dei para conferir se vocs esto dando os nomes corretos s partes do jornal... And. Mas o que pra falar da foto? pra copiar o que t embaixo...? P. Como o nome do que vem escrito embaixo de uma foto? Lembra? A gente j viu... Als. respondem: legenda... P. Ento interessante colocar tambm o contedo das legendas... P. As fotografias... seria legal se vocs conseguissem descrever o que elas trazem, qual o seu assunto... (...) Adel. dona, esse jornal aqui, a foto t mais em cima... a...como chama mesmo?... T debaixo da foto... P. Interessante isso, Adel. Algum mais tem um jornal assim? Vamos olhar os jornais, levantem as pginas... Olha, o que aparece mais em cima? (aponta para a manchete de um deles) Como mesmo o nome disso aqui? Als. Manchete... P. Essa foto do jornal do Adel. est no lugar da manchete, chamada foto-manchete... (...) P. Vocs esto vendo algo em comum nesses jornais? Qual o principal assunto dessas pginas? Al.1 Guerra.. Als. Quase todos to falando da guerra... L. Do Iraque... P. Vocs tm acompanhado as notcias sobre o que est acontecendo no Iraque? Adel. a reao dos Estados Unidos ao ataque... Al.1 o assunto mais falado quando teve o ataque do 11 de setembro, os Estados Unidos procurando os culpados... (vozes se misturam). Os alunos passam a debater as questes que envolvem a invaso ao Iraque.
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(...) A professora seleciona dois dos jornais e leva ao quadro, chamando a ateno dos alunos para eles. P. Pessoal, preste ateno nesses jornais... Qual o assunto das manchetes? Ju. ONU... Jac. Crescem as reaes anti-EUA no Iraque! Fla. Estados Unidos... Al.3 EUA devem in..ten...sificar ao di...plo...mtica na ONU... L. To falando dos Estados Unidos e do Iraque... Inicialmente, o que chama a ateno nesse episdio a famosa frase modelar das prticas escolares: Precisa copiar? De tal modo habituados a atividades escolares que envolvem a reproduo pela cpia, os alunos tendem a reproduzir, mesmo nas aulas de um projeto de leitura, aquilo que compreendem faa parte de uma atividade escolar: o exerccio de copiar informaes. Outro dado que se pode observar nesse episdio os alunos procurarem alicerar a construo dos sentidos dos textos principalmente em seu conhecimento de mundo, levantado a partir das perguntas da professora e da corrente discursiva gerada nas discusses do grupo; alm disso, procuravam fundamentar seus construtos na localizao das informaes nos textos das chamadas. Alguns deles extraem palavras das manchetes; outros repetem, revozeando, aquilo que est escrito: Ju. ONU... Jac. Crescem as reaes anti-EUA no Iraque! Fla. Estados Unidos... Al.3 EUA devem in..ten...sificar ao di...plo... mtica na ONU... L. To falando dos Estados Unidos e do Iraque... No se observa, nesse evento, a construo dos sentidos desses textos por parte dos alunos: como se estivessem passivos diante daquilo que tm de compreender, j que apenas reproduzem o j dito. Bakhtin (1934-1935/1975, p. 90), discutindo esse tipo de leitura, defende que
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A compreenso passiva do significado lingstico de um modo geral no compreenso; apenas seu momento abstrato, mas tambm uma compreenso passiva mais concreta do sentido da enunciao, da idia do falante. Permanecendo puramente passiva, receptiva, no trazendo nada de novo para a compreenso do discurso, ela apenas o dubla, visando, no mximo a reproduo completa daquilo que foi dado de antemo num discurso j compreendido: ela no vai alm do limite do seu contexto e no enriquece aquilo que foi compreendido (nfase adicionada).

Quando as questes da professora se dirigiram s fotografias, os alunos parecem hesitar um pouco mais em responder:
Episdio 8 - 07/10/2003

P. E as fotografias?... O que vocs me dizem dessas fotos? (aponta para as foto-manchetes) L. (apontando para um dos jornais) Nessa da tem um homem em cima dum troo. Al.1 Na outra tem batata frita... (risos) Al. 2 O que isso na cara do cara? Adel. uma mscara... A.P. Parece com a propaganda do Mc Donalds... Al.3 uma fotografia do Mc Donalds!... And. O homem daquela t em cima duma bota... P. Vocs no viram na televiso nenhuma imagem parecida com essa? No se lembram de ter visto? (os alunos levantam-se, observam as fotografias e do risadas, falam frases inaudveis... voltam aos seus lugares) Adel. O cara t em cima de uma esttua do Saddam... P. Muito bem, Adel...(o garoto continua falando) Adel. Dona, tipo assim, eu li n... (o garoto d risadas) T escrito a do lado...

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Como se v, ao falar do contedo temtico das fotografias, os alunos se atm a descrev-las, focalizando os elementos das imagens de maneira isolada; no parecem observar as fotografias como textos que trazem um contedo de significao e um tema, nem fazem comentrios que revelem terem visto a relao da ironia presente na fotografia da propaganda do Mc Donalds e a legenda: Soldado americano passa por estande de fast food no Kuait, durante treinamento para possvel ao no Iraque. Quando Adel descreve o que viu na fotografia da esttua, d risadas, porque leu o que estava escrito ao lado do homem retratado, em uma legenda deslocada para dentro do corpo da fotografia. Provavelmente, o menino ri porque seus colegas j tinham olhado para a fotografia e no tinham visto a legenda. A risada do garoto parece ironizar o fato de que a compreenso do contedo da fotografia poderia estar na leitura do texto escrito, ignorado por seus colegas. Percebe-se, nessa sequncia, que os alunos buscam a compreenso alicerada naquilo que reconhecem, sobre o que tm segurana. Tambm na observao das fotografias, eles aliceram seus construtos de sentido sobre o conhecimento de mundo que trazem: A.P. Parece com a propaganda do Mc Donalds... Al.3 uma fotografia do Mc Donalds!... necessrio comentar que o objetivo das aulas desse dia era colocar os alunos em contato com os componentes particulares do gnero, para que percebessem seu papel e para que tambm fossem atentando para os aspectos composicionais da primeira pgina. Dessa maneira, no era nosso objetivo especfico, nesse momento, preocuparmo-nos com o que os alunos conseguiam ou no ler. Era preciso constituir as diferentes etapas de ensino-aprendizagem traadas, para que eles relacionassem os textos verbais aos no-verbais e fossem se apropriando das caractersticas do gnero, at que pudessem chegar a ler o todo enunciado formado nas primeiras pginas e a desvelar o no-dito, muitas vezes a presente. Uma dessas etapas de ensino-aprendizagem consistia na observao dos tempos e modos verbais presentes nas
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manchetes e ttulos. Como expusemos anteriormente, essas aulas tinham, como atividades preparadas pela professora, a observao, seleo e reflexo sobre os tempos e modos verbais. Todavia, no momento de se realizar a tarefa, os alunos demonstraram no conhecer ou ter dvidas sobre esta categoria lingstica. Assim, novas aulas foram desenvolvidas, nas quais, a partir das dvidas e colocaes dos alunos, pde-se ensinar o contedo gramatical. Por no ser foco especfico deste trabalho, no discorreremos sobre esse contedo.
Episdio 10 - 28/11/2003

Nessas aulas, algumas primeiras pginas so expostas no quadro negro e a professora vai lendo, em voz alta, suas manchetes e chamadas, solicitando aos alunos que procurem relacionar as fotografias aos textos verbais presentes nas pginas: P. Pessoal, observe esta manchete: Cresce a aprovao do governo Lula... Agora vejam a fotografia... Le. dona, uma foto bonita... enorme, mas o que t escrito na legenda? P. Muito bem, Le. Voc lembrou bem... importante observar a legenda... (alunos levantam-se e observam atentamente a pgina e seus enunciados) Le. l em voz alta: Grvidas da campanha - Mulheres que apareceram grvidas em pea de propaganda do ento candidato Lula, veiculada na televiso em 2002; agora, quando o governo petista entra no nono ms, elas fazem crticas, mas revelam pacincia com a situao do pas e tambm esperana no futuro (Aps a leitura, alguns dos alunos comeam a expressar frases de reconhecimento, como se tivessem j compreendido o que a professora ainda no havia perguntado) (A.P. se aproxima de L e ambos vo fazendo a leitura, o resto da sala ouve e interrompe com frases de concordncia:)
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A.P. Ah, dona, esse t fcil: olha... (fala baixinho) L. auxilia a colega: mesmo dona, olha s...tipo assim: A manchete diz que o povo t aprovando o governo do Lula, n? A.P. E da aparece essa foto bem bonita, cheia de mulher com bebezinhos no colo e o povo, tipo assim, bate o olho e pensa: hum o governo t bom... Le. Interrompe a colega e diz: S que isso num verdade, dona... Por que se olhar a legenda da foto... (Faz-se um alvoroo na sala e Ju. l a legenda novamente:) Ju. Grvidas da campanha - Mulheres que apareceram grvidas em pea de propaganda do ento candidato Lula, veiculada na televiso em 2002; agora, quando o governo petista entra no nono ms, elas fazem crticas, mas revelam pacincia com a situao do pas e tambm esperana no futuro... A.P. , dona, se olhar bem, o jornal quer passar a idia pro povo de que o governo ta bom, mas quem ler pra valer, vai ver que num isso... Andri. por que tem essa foto bonitinha, mas a legenda fala que elas no to contente com o governo... L. , elas to criticando... Esse episdio, diferentemente dos anteriores, mostra os alunos em um outro nvel de domnio de certas caractersticas composicionais do gnero primeira pgina de jornal impresso; no hesitam mais em nomear gneros que o compem: Le. dona, uma foto bonita... enorme, mas o que t escrito na legenda? Com Bakhtin (1974/1979, p. 412), vemos que a compreenso tambm ocorre quando o alheio se transforma em pessoal:
Palavra do outro e palavra pessoal. A compreenso concebida como transmutao em alheio-pessoal. O
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princpio de exotopia. A complexa relao entre o sujeito compreendente e o sujeito compreendido, entre o cronotopo do criado e o cronotopo do compreendente que introduz a renovao.

Podemos perceber, no exemplo acima, que os alunos comeam a reproduzir aquilo que efetivamente aprenderam: a fala da professora transparece na do aluno, aquilo que Vygotsky (1930) chamou de processo de internalizao - no discurso do aluno o desvelar de seu aprendizado. Com o autor, percebemos o aluno sendo afetado pelos signos e sentidos produzidos nas relaes com os outros (VYGOTSKY, 1930, p. 75). Alm disso, pode-se observar a facilidade com que vo relacionando o contedo da legenda ao que se encontra na fotografia. Nesse evento, diferentemente dos anteriores, quando o colega l a legenda em voz alta, ouvem-se expresses de concordncia, interjeies, risadas: os alunos respondem ao enunciado, mesmo antes de a professora formular claramente o que espera que eles percebam nas relaes de significao entre manchete, fotografia e legenda. A.P. Ah, dona, esse t fcil: olha... (fala baixinho) Esse exemplo tambm nos desvela outro nvel de aprendizado. Inicialmente, os alunos se restringiam a reproduzir aquilo que enxergavam nas imagens ou a repetir o que estava escrito. Nesse momento, a leitura dos alunos passa de mera reproduo (verbalizao) do que veem para uma leitura inferencial, j que vo construindo os sentidos atravs da reflexo sobre as relaes entre a imagem e os textos escritos, relacionando-os tambm ao contexto de produo dos textos. O tema surgido do dilogo entre os textos verbais e no-verbais s passvel de ser apreendido atravs de uma leitura que desvela a dialogia entre eles e o contexto de produo em que foram criados. Nesse evento, vemos os alunos apreendendo o tema, respondendo ativamente a ele, lanando mo, mais uma vez, da capacidade de rplica. No momento da compreenso ativa, o ato de ler se torna fcil. Observa-se, tambm, que a dupla A.P. e Le. vai construindo conjuntamente os sentidos dos textos, em um
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processo que possibilita e facilita a construo dos conhecimentos. esse processo interacional que faz com que eles possam ir se constituindo como sujeitos de seu aprendizado, j que, de acordo com Vygotsky (1930, p. 117-118), este [o aprendizado] desperta vrios processos internos de desenvolvimento, que so capazes de operar somente quando a criana interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperao com seus companheiros. (A.P. se aproxima de L e ambos vo fazendo a leitura, o resto da sala ouve e interrompe com frases de concordncia:) A.P. Ah, dona, esse t fcil: olha... (fala baixinho) L. auxilia a colega: mesmo dona, olha s...tipo assim: A manchete diz que o povo t aprovando o governo do Lula, n? A.P. E da aparece essa foto bem bonita, cheia de mulher com bebezinhos no colo e o povo, tipo assim, bate o olho e pensa: hum... o governo t bom... Le. Interrompe a colega e diz: S que isso num verdade, dona... Por que se olhar a legenda da foto... Faz-se um alvoroo na sala (...) De acordo com o autor, essa interao importante, pois atravs dela que o homem se comunica e vai se constituindo atravs das relaes interpessoais. Essas relaes permitem a categorizao do mundo, a possibilidade de abstrao e generalizao dos objetos. Esse processo interacional de construo de conhecimentos promove a compreenso: o alvoroo que se ouve na sala revela a atitude responsiva dos alunos frente ao que esto compreendendo; , no dizer de Bakhtin (1970-1971, p. 382), o encontro com o que grande, concebido como encontro com o que determina, obriga, envolve, o momento supremo da compreenso. Refletindo mais detidamente sobre as capacidades de leitura a que os alunos recorrem nesses eventos, observamos como o aprendizado interferiu para a construo dos significados. Em primeiro lugar, temos o conhecimento dos alunos sobre o gnero primeira pgina de jornal impresso. Nesse evento, os alunos, alm de nomearem mais adequadamente os gneros intercalados na primeira pgina, j
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demonstram reconhecer as caractersticas peculiares dessa intercalao. Percebem, ento, que esse gnero se compe de outros intercalados que dialogam ativamente entre si e que esse dilogo entre os gneros produz novos significados que precisam ser apreendidos. Em segundo lugar, vemos a capacidade de relacionar as informaes, daquelas que vo lendo no jornal s que se referem ao contexto de circulao do gnero no momento de produo e circulao da pgina, comea no pas um certo desagrado com relao ao governo Lula. Em terceiro lugar, vemos a capacidade de inferncia dos alunos quando apreendem, na leitura das informaes verbais e no-verbais, a apreciao valorativa do jornal sobre seus leitores: A.P. , dona, se olhar bem, o jornal quer passar a idia pro povo de que o governo t bom, mas quem ler pra valer, vai ver que num isso...

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Episdio 11 - 28/11/2003

Algumas primeiras pginas dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo esto expostos no quadro negro. Os alunos comeam falar sobre o que veem estampado nas pginas. Leo. pergunta: Leo. O que isso a, um barco? P. um barco... P. Eu vou ler as manchetes e as legendas das fotos... (...) P. Olha s, vocs lembram aquela aula, que a gente discutiu, sobre o mito da notcia?... Se ela isenta... ou no isenta... Pensa agora, constri na sua cabea uma relao entre essa manchete e essa foto aqui... Al.1 o que est escrito ali... se tem a ver...??? P. No t escrito... Quero que vocs vejam o que no est escrito... A inteno por trs do jornal... Ed. Bancada do PT... Al.1 um barco, n? (referindo-se fotografia). Num t vendo nada de barco, ali... (referindo-se manchete). Ed. ... os projetos de Lula indo por gua abaixo... P. Muito bemmmm!!!!!! Als. Ehhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!! Al.2Olha s que menino inteligente!! (grande algazarra) P. Olha s, moada... Na verdade, se a gente for observar, nas coisas escritas... O que est escrito, no tem relao nenhuma realmente, mas essa no relao, feita de propsito, para aparecer um outro texto, que esse texto que o Ed. acabou de falar, que o qu? Que os projetos de Lula esto naufragando... O episdio transcrito acima apresenta um pequeno trecho de aula em que os alunos vo atribuindo sentidos aos textos verbais e no-verbais, procurando desvelar o
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no-dito como um elemento de tema nas primeiras pginas de jornal. J mais acostumados a observar as fotografias e manchetes, os olhares dos alunos se direcionam no somente ao contedo das fotografias, mas tambm procuram estabelecer relaes entre as informaes da materialidade verbal e a pictogrfica. Conforme expusemos anteriormente, uma aprendizagem realmente significativa dos gneros multimodais ocorre quando os leitores so capazes de aliar a materialidade verbal pictogrfica. Assim, podemos notar nestes episdios que os alunos recorrem a outras estratgias de compreenso: Al.1 um barco, n? (referindo-se fotografia). Num t vendo nada de barco, ali... (referindo-se manchete). Na atitude responsiva do Al.1 ao observar a fotografia e a manchete, podemos notar que o garoto de modo totalmente diverso do que ocorria no episdio 8, em que os alunos se atinham a descrever as imagens presentes nas fotografias observa a fotografia, procurando construir sentidos no somente naquilo que est explcito e que pode descrever, mas tambm aliando o que v (a imagem de um barco) ao que est escrito na manchete. Observamos, neste evento, que a localizao de informaes se torna mesmo uma estratgia de construo de significados. Como um degrau que se alcana mais facilmente e que conduz a outro no processo de atribuio dos sentidos. Observando a fotografia, o aluno procura galgar um outro degrau que o auxilie a compreender o que l. Este episdio revela a localizao de informaes no somente como reproduo, mas como uma etapa da construo da compreenso dos textos. Inicialmente, vamos os alunos localizando informaes, atendo-se somente a verbalizar aquilo que viam. De diferente modo ocorre nesse momento: a localizao a base que os levar a desvelar a intertextualidade dos textos. Na leitura de textos multimodais, a construo dos sentidos parte de estratgias de observao da multimodalidade, que envolvem a seleo, verificao e organizao das informaes da sintaxe visual, para que ocorra a integrao das informaes verbais e no-verbais.
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Observamos, recorrendo literatura acerca da multimodalidade, que a leitura de textos multimodais requer do leitor a capacidade de observar e conjugar as informaes da materialidade verbal pictogrfica, relacionando-as no ato de construo dos sentidos dos textos. A partir dessa integrao e conjugao dos sentidos dos textos verbais e no-verbais, os leitores podem perceber o todo unificado de sentido que se compe atravs da integrao dos materiais verbais e no-verbais, ou seja, a leitura dos textos multimodais requer do leitor a ativao de diversas capacidades de leitura aliadas organizao e observao das informaes, atravs das quais o leitor constri um todo de significao. Quando observamos, no episdio acima, o aluno Ed. expressar a sua compreenso daquilo que apreende da pgina analisada ... os projetos de Lula indo por gua abaixo..., podemos refletir que o aluno inferiu o tema do texto no mais preso ao lxico utilizado nas manchetes, nem tentando reproduzir o que se achava escrito na legenda, mas foi capaz de perceber a ambigidade presente entre os enunciados verbais em relao com o contedo temtico da fotografia. De acordo com Brait (1996, p. 71),
possvel flagrar a ambigidade, reconhecendo um efeito de sentido irnico, humorstico, desde que seja estabelecida uma relao literal entre a foto e a imagem, ou seja, que se leia o texto como legenda da foto ou a foto como ilustrao do texto.

A expresso esto indo por gua abaixo, que no est escrita em nenhum lugar da pgina, desvela o todo de significao composto por ambos os enunciados que o aluno foi capaz de apreender no seu ato de compreenso. Retomando Bakhtin (1970-1971, p. 382), refletimos que a compreenso completa o texto: exerce-se de uma maneira ativa e criadora. essa compreenso ativa e criadora que vemos os alunos irem exercendo durante as aulas ministradas. Se pensarmos com Schneuwly & Dolz (1997/2004) sobre as prticas de linguagem desenvolvidas e aquilo que se pode ensinar durante as aulas, poderamos dizer que estas se constituram como um espao de construo conjunta
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de significados e temas dos textos atravs da interao, de forma que o outro interferiu de maneira fundamental nesses construtos e o gnero primeira pgina de jornal impresso atuou como um instrumento de ensino-aprendizagem de leitura que possibilitou a ampliao das capacidades de leitura dos alunos, atravs da observao e integrao dos materiais verbais e pictogrficos.
Episdio 12 - 28/11/2003

Os alunos observam vrios jornais, a professora pede Cam. que leia um deles: (A aluna, intimidada, responde, baixinho) Cam. s pra ler, n, professora? A professora chama a ateno dos alunos: Moada, ajuda aqui a Cam. Pedi a ela que lesse aqui (aponta para o jornal, afixado no quadro negro) e ela disse: s pra ler n, professora?... Eu disse: ... na minha concepo de leitura... Como que eu concebo a leitura? O que ler... pra mim? Nesses meses que vocs esto comigo... O que ler? Cam. Vai gente, me ajuda aqui... Al.1 entender... Al.2 entender o que t escrito... Al.3 compreender ... do meu jeito... (os alunos do essas respostas quase simultaneamente) P. Escrito? (vozes se misturam)... Als. No... Al.3 No.... no s... isso... Dan. entender... o que t e o que no t escrito tambm... compreender... Inicialmente conforme demonstram os episdios 7 e 8 os alunos aliceravam a construo dos significados dos textos em duas capacidades de leitura principais: o conhecimento de mundo que traziam e a localizao de informaes. No transcorrer do curso, pudemos observar como o conhecimento sobre o gnero foi promovendo novas
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possibilidades de leitura, indicando novos caminhos para as reflexes que iam sendo tecidas no ato de compreender. Nesses momentos de interao onde melhor notamos o ato de leitura como um processo de compreenso ativa, em que as palavras do outro colega ou professora constituram elos na cadeia da enunciao verbal que se ligavam e construam novos sentidos. Inicialmente, notou-se que os alunos ainda no habituados observao e anlise de textos no-verbais quando liam uma imagem, como as foto-manchetes, apenas se atinham a descrever o que estava retratado, sem atribuir uma unidade de significao s imagens. Refletindo sobre os dados, referentes s capacidades de leitura, aliados aos que correspondem s prticas letradas dos alunos dentro e fora da escola (dados coletados durante a realizao da pesquisa, atravs de questionrios e entrevistas), podemos concluir que essas prticas ler jornais, revistas e livros, ainda que eventualmente contriburam para que os alunos se envolvessem com o projeto de leitura que desenvolvemos. Poderamos refletir sobre os dados de suas capacidades letradas como o seu nvel de desenvolvimento real (VYGOTSKY, 1930). Sua participao interessada que, muitas vezes, ampliava a leitura prevista (da primeira pgina para as demais), promoveu muitos debates e ampliou as possibilidades de ensino-aprendizagem. Pudemos observar o gnero primeira pgina de jornal impresso atuando como instrumento mediador da aprendizagem e vimos os alunos avanar em seu conhecimento. O desenvolver do processo de ensino-aprendizagem procurou proporcionar as possibilidades de aprendizado dos gneros no-verbais, intercalados na primeira pgina do jornal impresso, e ali-los tambm aos textos verbais para que os alunos conseguissem construir os sentidos dos textos e chegar a entender... o que t e o que no t escrito tambm... (a) compreender...

Referncias
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Recebido em 16/11/09 Aceito em 19/12/09

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