Lideranca FGV PDF
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ARTIGO
* Ceclia Whitaker
Bergamini
Uma reviso da evoluo histrica dos estudos e pesquisas sobre liderana enfatiza a importncia de lderes organizacionais eficazes.
A review of ihe historical eoolution of the studies and surveys on leadership strengh the imporiance of effective organizacional leadere.
PALAVRAS-CHAVE: Liderana, interao, poder, Jttuncie, autoridade, carisma, cultura organizacional, motivao, atitude. KEY WOROS: Leaders/Jip, interaction, power, inttuence. authority, cnerism, organizationa/ cu/ture, motivation, altitude.
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o tema da liderana tem um forte apelo tanto para aqueles que dirigem como para aqueles que so dirigidos. Muitas vezes esse conceito assume uma conotao de "dom" mgico, responsvel por uma espcie de atrao inexplicvel que certas pessoas exercem sobre as outras. A imaginao daqueles que se envolveram com o assunto fez com que ele fosse investigado a partir dos mais diferentes enfoques, trazendo luz do conhecimento da cincia comportamental as mais variadas inferncias. No de estranhar, portanto, que a palavra "liderana" reflita conceitos aparentemente diferentes para diferentes pessoas. Os pesquisadores passam, assim, a definir liderana partindo de uma perspectiva individual, ressaltando aquele aspecto do fenmeno que lhes parea mais significativo. Devido ao grande interesse despertado pelo tema da liderana, nota-se, no momento atual, o aparecimento de incontveis conceitos emitidos pelos pesquisadores em comportamento organizacional, o que permite afirmar: "Assim como o amor, a liderana continuou a ser algo que todos sabiam que existia, mas ningum podia definir". 1 Dois aspectos parecem ser comuns grande maioria das definies de liderana existentes na atualidade. Em primeiro lugar, elas conservam o denominador comum de que a liderana esteja ligada a um fenmeno grupal, isto , envolve duas ou mais pessoas. Em segundo lugar, fica evidente tratar-se de um processo de influenciao exercido de forma intencional por parte dos lderes sobre seus seguidores. Hollander consegue abranger a grande maioria desses aspectos propondo: "O processo da liderana normalmente envolve um relacionamento de influncia em duplo sentido, orientado principalmente para o atendimento de objetivos mtuos, tais como aqueles de um grupo, organizao ou sociedade. Portanto, a liderana no apenas o cargo do lder mas tambm requer esforos de cooperao por parte de outras pessoas". 2 Dentro desse processo considera-se que, embora o lder seja quem geralmente inicia as aes, os seus seguidores precisam ser sensveis a ele, isto , lev-lo em conta naquilo que diga respeito s suas idias e programas. Embora ainda se continuem publicando trabalhos inditos dentro do campo da
liderana, indispensvel que se conhea o que veio sendo pesquisado anteriormente. importante que se tenha em mente os trabalhos especiais publicados pela literatura sobre o assunto a partir do incio do presente sculo. Conhecendo como se deram as tentativas anteriores voltadas explicao do fenmeno e do processo de liderana que se poder caracterizar mais precisamente o mrito das obras divulgadas na atualidade, atribuindo a elas o verdadeiro grau de confiana que merecem receber.
o COMEO DA HISTRIA
Embora o termo liderana venha sendo usado h aproximadamente duzentos anos na lngua inglesa, Stogdill (1974) acredita que ele tenha aparecido por volta do ano 1300 da era crist. Fiedler afirma que: "A preocupao com a liderana to antiga quanto a histria escrita: A repblica de Plato constitui um bom exemplo dessas preocupaes iniciais ao falar da adequada educao e treinamento dos lderes polticos, assim como da grande parte dos filsofos polticos que desde essa poca procuraram lidar com esse problema". 3 Isso permite dizer que a liderana tem sido investigada desde h muito e, como tal, justo que apresente as mais variadas interpretaes. Somente o conjunto de todos esses pontos de vista oferece a possibilidade de uma viso mais abrangente a respeito do tema. Dentro de toda multiplicidade de aspectos sob os quais se estudou liderana, percebe-se que alguns tericos preocuparam-se em especial com aquilo que o lder , procurando retratar traos ou caractersticas de personalidade que sejam os responsveis por sua eficcia. Outros imprimiram maior dinmica quanto concepo do lder, buscando investigar aquilo que o lder faz, isto , procuraram delinear diferentes estilos de liderana. Um terceiro grupo de pesquisadores em liderana procura analis-la em funo daquelas circunstncias que determinam a eficcia do lder, buscando conhecer que variveis do meio ambiente podem influir no desenvolvimento do vnculo lder-seguidor. Existe tambm um grupo representativo de tericos que se dedicou ao estudo das motivaes subjacentes s atividades de dirigir pessoas.
1. BENNIS, W., NANUS, B. Lderes: estratgias para assumir a verdadeira liderana. So Paulo: Harbra, 1988, p. 5. 2. HOLLANDER, E. P. Leadership dynamics - a praticai guide to efectve relatonshps. New York: lhe Free Press, 1978. 3. FIEDLER, F. A theory of leadershp effectiveness. New York: McGraw-Hill Book Company, 1967, p. 3.
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Cronologicamente, a seqncia histrica do estudo da liderana mostra vrias etapas. A teoria dos traos originou-se de pesquisas disponveis a respeito de liderana dentro dos perodos compreendidos entre 1904-1948.Uma reviso dessas pesquisas conseguiu isolar cerca de 34 traos de personalidade considerados como tpicos de bons lderes. O enfoque dos estilos de liderana aparece logo no incio da dcada de 50. Nesse momento, um grande esforo de pesquisa foi mobilizado buscando saber como o bom lder deve agir. Essa segunda etapa da histria da liderana inicia-se no ps-guerra, especialmente nos Estados Unidos. Nesse momento foram criados inmeros instrumentos de anlise do comportamento em liderana, representados principalmente pelos questionrios. Como testemunha Guiot: "Numerosas pesquisas foram levadas a efeito tendo em vista colocar em evidncia as relaes entre os tipos de comportamento do lder e a eficcia de sua liderana. A hiptese subjacente, orientadora da pesquisa, aquela que prope ser o estilo de liderana manifesto pelo lder, o determinante do nvel de desempenho atingido pelo grupo (ou unidade organizacional por ele comandada)". sabido que nesse momento todo o esforo de pesquisa contava com ambientes onde havia maior controle das variveis. A liderana tem sido tambm estudada como um processo de interao que envolve trocas sociais. Sob esse aspecto, o lder visto como algum que traz um benefcio, no s ao grupo em geral, como a cada membro em particular, fazendo nascer desse intercmbio o valor que seus seguidores lhe atribuem. Em troca, os membros do grupo devolvero ao lder seu reconhecimento e aceitao como forma de lhe conferir a autoridade para dirigir pessoas. Dentro desse apanhado de estudos mais sistemticos, alguns nomes se destacam. Nas pesquisas sobre traos de personalidade surgem Stogdil e Mann. Lewin, Fleshman, Coons, Likert e outros conhecidos, como os pesquisadores dos grupos das Universidades de Ohio e Michigan, foram os principais responsveis pelas investigaes feitas em tomo dos estilos de liderana. McClellan e Minner investigaram a motivao para a liderana. Todos eles so reconhecidamente considerados como os responsveis pelos primeiros passos rumo sistematizao do estudo em liderana. A contribuio desses pesquisadores ficou, por assim dizer, mais restrita ao estudo do lder em si, tendo suas pesquisas se omitido na considerao de aspectos ligados s circunstncias ambientais que envolvem o vnculo lderseguidor. Avaliando o trabalho desenvolvido dentro desses primeiros enfoques, Smith e Peterson comentam: "Esses pesquisadores em liderana agiam como se eles fossem alquimistas medievais procura da pedra filoeofal", 5 Est subentendido nessa crtica que esses pesquisadores pretendiam como que" destilar a essncia" da liderana para encontrar aquilo que pudesse distinguir os lderes como pessoas especiais, diferentes, portanto, do restante dos mortais. Numa etapa subseqente surgem as teorias situacionais que possuem como principal foco de interesse o estudo do comportamento contingente em liderana. A nfase j no mais colocada unicamente sobre uma varivel isolada circunscrita ao do lder sobre um tipo de atitude passiva do subordinado. De maneira um pouco mais complexa, a principal preocupao desse novo grupo de estudos ser dirigida tambm s caractersticas comportamentais dos liderados. Os defensores das proposies conhecidas como contingenciais levantam novas variveis que passam a ser objeto de investigao. Esse posicionamento determina o carter de maior abrangncia dessas teorias com relao s anteriores. O ambiente organizacional, bem como as caractersticas comportamentais dos seguidores, passa agora a fazer parte integrante do quadro geral das investigaes voltadas ao estudo sistemtico da cincia da liderana. Os enfoques contingenciais propuseram que as organizaes poderiam contar com bons lderes desde que lhes dispensassem treinamento adequado e promovessem um ambiente favorvel onde pudessem agir com eficcia. Hampton, Summer e Weber assim resumem a contribuio oferecida nessa fase do estudo da liderana: "Os trs enfoques situacionais acrescentam muito nossa atual compreenso de liderana. O modelo contingencial de Fiedler mostra que existe situaes favorveis e desfavorveis para o lder RAE. v.34 n.3 Mai./Jun.1994
4. GUIOT, J. M. Organisations socia/es et comportements. Montreal: Les ditions Agenee d'Are INC, 1987, p. 142. 5. SMITH, R., PETERSON, M. F. Leadership, organization andcu/ture. London: Sage Publication, 1989, p. 11.
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e que alguns tipos de lderes saem-se melhor em situaes favorveis, enquanto que outros, em situaes desfavorveis. O enfoque do caminho-objetivo deu vida noo de que os subordinados tentam ser pessoas bem-intencionadas e que o lder que puder ajud-las nesse processo ter sucesso. Finalmente, os enfoques de Tannembaum/Schimit e Vroom/Yetton mostram como realmente podem ser complexas asforas que esto em jogo na tentativa do lder em adequar seu comportamento situaCom isso, maior profundidade acrescentada ao estudo da liderana. Se, para as colocaes tericas iniciais, o trao de liderana era inato, agora, com os tericos da contingncia, essa caracterstica pode ser desenvolvida. Instala-se, a partir desse novo enfoque, a crena de que qualquer um pode ser um bom lder, basta que seja preparado para tanto. A partir desse momento que comea a surgir um grande nmero de programas de treinamento e desenvolvimento em liderana, avidamente consumido pelas organizaes empresariais do mundo todo.
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A funo motivacional do lder reside nas crescentes recompensas pessoais dos subordinados no sentido da chegada aos objetivos do trabalho, fazendo com que o caminho para essas recompensas se torne mais fcil de ser percorrido ao deix-lo mais evidente, reduzindo os bloqueios do percurso e as armadilhas, bem como aumentando as oportunidades de satisfao pessoal em curso", 7 O papel do lder,
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conforme o enfoque do caminho-objetivo, caracteriza-se como aquele de agente a quem cabe desbloquear a fora motivacional contida no interior do seguidor.
A contribuio feita pelas teorias que ressaltaram a importncia da motivao dentro do processo de liderana inestimvel. J foi possvel perceber que, na busca da eficcia, no cabe ao lder motivar seus seguidores. Quando aceitam um novo emprego, as pessoas, em geral, esto cheias de esperanas e acalentam expectativas, sendo, por isso, depositrias de um rico manancial de motivao. O potencial sinergtico contido nas necessidades motivacionais constitui um repertrio bsico de foras pessoais que inerente a cada um. Desconhecer essa fonte natural de motivao representa um impulso fatal rumo desmotivao. Ignorar essa predisposio natural como assumir a filosofia taylorista que preconiza a indolncia natural do ser humano. Ao descobrir que a motivao representa um elemento-chave eficcia do lder, entende-se que, talvez, o maior de todos os desafios que ele enfrenta seja inviabilizar o processo de degenerescncia
6. HAMPTON, D. R., SUMMER, C. E., WEBER, R. A. Organizational behavior and pratice of management. USA: Sccot Foresman and Company, 1978, p. 615. 7. HOUSE, R. J. A path-goal theory of leader etteciiveness. USA: Adminlstrative Science Quartely, 1971, p. 324.
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do potencial da sinergia motivacional. Pode-se perceber, atravs desse novo enfoque, que o ingnuo" chefe" esteja invariavelmente procura de regras para motivar seu novo funcionrio, enquanto o lder eficaz estar atento para que a riqueza contida nas necessidades de cada um no seja drenada e se perca, talvez para sempre. Cada vez com maior freqncia, os autores contemporneos mostram-se unnimes ao enfatizar a necessidade de se ter clara a diferena entre o comportamento simplesmente condicionado por motivadores extrnsecos ao indivduo e aquele que tipifica as aes do empregado realmente motivado. A motivao intrnseca orienta cada um na busca daquilo que valorizado pelas suas predisposies internas. Ao considerar a liderana como sinnimo de motivao, o lder percebe esse claro divisor de guas no fluxo das aes humanas. Muito daquilo que se tem produzido na literatura atual em administrao aponta como praticamente invivel liderar sem distinguir o comportamento estimulado de fora para dentro das aes emitidas pela fora das pulses motivacionais interiores. Aqueles que acreditam que se possa motivar as pessoas esto partindo do pressuposto de que elas devam ser chefiadas e no lideradas. Isso estabelece um importante diferencial entre o clssico chefe, que, por fora da sua autoridade formal tem recursos para distribuir prmios e punies ao acaso, e o verdadeiro lder. Este ltimo percebe com clareza que o mundo exterior, cheio de benefcios e restries, no tem sentido para o indivduo. Aquilo que qualificar tais elementos como verdadeiros prmios ou castigos reais o tipo de carncia existente, naquele momento, no interior de cada um. Por exemplo, o prmio de um trabalho mais complexo s visto como tal pela pessoa que sinta real necessidade de livrar-se da aborrecida rotina de tarefas repetitivas. A motivao est, portanto, contida nas necessidades de cada um. Sendo assim, ao se aceitar que a motivao seja sinnimo de necessidades, s se conseguir trabalhar com pessoas realmente motivadas caso se tenha suficiente sensibilidade para conhecer tais necessidades. Se alm de conhec-las o lder for capaz de oferecer fatores complementares de satisfao dessas necessidades, poder ento ser considerado como um importante agente na construo de climas mais favorveis de trabalho. Kouzes e Posner deixam bem evidente a ligao entre liderana e motivao quando propem: "A motivao absoluta a motivadores extrnsecos limita severamente a habilidade de uma organizao ultrapassar-se. Ela limita a habilidade dos gerentes de usar o potencial integral dos empregados. Desperdia o talento humano e drena os recursos organizacionais. certo que se deva pagar aos empregados com justia e oferecer benefcios eqitativos. Isso, definitivamente, est fora de cogitao. Todavia, a nfase sobre incentivos externos e pr.esses constrange as pessoas. Isso no as libera para darem o melhor de si. Constrange tambm os gerentes em conseguir aprender como conseguir que os outros queiram fazer aquilo que necessita ser feito. E, caso no se consiga aprender a conseguir que as pessoas queiram, nunca se poder liderlas". 8 No h dvida que liderar sendo capaz de conhecer, valorizar e satisfazer os apelos vindos das necessidades interiores exige muito maior percia do que manipular prmios e castigos disponveis no ambiente da empresa. Os tericos da motivao intrnseca destacam a importncia da percepo no processo de satisfao dos desejos interiores, embora considerem, tanto um quanto outro, como elementos pertencentes ao mundo subjetivo. "Uma vez que a satisfao envolva a interao entre a pessoa e seu ambiente, sua valorizao liga-se, em parte, natu reza objetiva do mundo exterior da pessoa. A satisfao depende de ambos, a forma real do mundo ser e como essa realidade percebida pela pessoa"." A percepo exerce, assim, funo importante na valorizao dos traos do meio ambiente, mas para tanto, retira dos desejos no satisfeitos as informaes necessrias para atribuir sentido ao mundo objetivo. LIDERANA COMO ADMINISTRAO DO SENTIDO Considerando liderana e motivao como dois assuntos to entrelaados, possvel concluir que guardam uma ligao de parentesco forte entre si, a ponto de serem considerados como sinnimos. RAE. v.34 n.3 Mai./Jun.1994
como conseguir feitos extraordinrios em organizaes. Rio de Janeiro: Campus, 1991, p. 34. 9. ALDERFER, D. P. Existence, relatedness and growth - numan needs in organizational settings. London: Collier-McMillan, 1972, p. 8.
Z. O desafio da liderana -
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Assim, a figura do lder toma novo aspecto, como prope Pondy: "A eficcia do lder repousa na sua habilidade de tornar uma atividade significativa para aqueles que esto nesse conjunto de papis - no mudar comportamentos, mas dar aos outros o senso de compreenso daquilo que esto fazendo e especialmente articul-los para que possam comunicarse sobre o sentido do comportamento deles (...). Essa dupla capacidade, dar sentido s coisas e coloc-las em linguagem significativa para um grande nmero de pessoas, d ao lder enorme alatancagem"." Para administrar o sentido que as pessoas do ao trabalho que fazem, necessrio conhecer como suas necessidades motivacionais o valorizam. Durante muitos anos, a forma pela qual os candidatos a cargos de chefia, gerncia ou administrao foram escolhidos baseou-se em padres que pouco tinham a ver com o futuro papel de liderana a ser desempenhado por essas pessoas. Assim sendo, a realidade atual das organizaes empresariais brasileiras acusa uma ausncia marcante daqueles que, no exerccio de tais cargos, poderiam ser qualificados como verdadeiros lderes. Por outro lado, os programas de treinamento e desenvolvimento dos novos chefes foram principalmente planejados para oferecer pesadas doses de conhecimentos tcnicos e administrativos e muito pouco era mencionado sobre aquilo que dizia respeito ao processo de interao pessoal no contexto da liderana. Sem os cuidados necessrios, instaurou-se em pouco tempo um clima de desmotivao generalizada. Conseguir que a motivao no desaparea fazer com que se continue vendo sentido naquilo que se est fazendo no trabalho, como salienta Sievers ao propor que "a motivao s passou a ser um tpicotanto para as teorias organizacionais, quanto para a organizao do trabalho em si - quando o sentido do trabalho desapareceu ou ento foi perdido (...) Como conseqncia, as teorias motivacionais se tm transformado em sucedneos do sentido do trabalho". 11 O desaparecimento desse sentido pode ser atribudo principalmente ao descaso das organizaes quanto motivao para o trabalho. A maioria daqueles que ocupam cargos que deveriam ser preenchidos por lderes nem mesmo acredita que para trabalhar seja necessrio estar motivado. O panorama organizacional lembra a descrio feiRAE v. 34 n. 3 Mai./Jun. 1994
ta por Tack: "Os gerentes, muitas vezes, gerenciam departamentos, gerenciam pessoas, mas no as lideram. A liderana eficaz os motiva voluntariamente, e esta a palavra-chave, a dedicarem suas mentes e atributos fsicos para um objetivo maior". 12 Para o autor axiomtico que o valor da boa liderana esteja com freqncia esquecido, para que o valor da boa administrao seja, guase que inevitavelmente, enaltecido. E por isso que para ele gerncia e liderana no so necessariamente parentes, embora acredite que a liderana seja sinnimo de motivao.
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Em que pese as diferenas individuais entre o lder e seus seguidores, pela conscincia dessas diferenas que a ao do lder reconhecidamente eficaz faz sentir a importncia da sua presena. Sob esse aspecto, o lder sabe que pode contar com as necessidades interiores originrias da busca de realizao pessoal e da preservao da auto-imagem daqueles que aceitam ser dirigidos por ele. Essas predisposies naturais so interpretadas pelo lder como "foras que organizam nossas percepes, julgamentos e aes para atingir a competncia. A existncia de um estado de necessidades pressupe que haja uma condio a ser preenchida. Todos tm necessidades complexas que pedem satisfao e que so a expresso das personalidades nas quais existem. A ampla gama de comportamentos humanos composta de mltiplos padres de necessidades. Interpretar esses padres individuais um dos desafios para compreender e aceitar as diferentes necessidades das pessoas e
10. SMITH, P., PETERSON, M. F. Op. cit., p. 10. 11. SIEVERS, S. Alm do sucedneo da motivao. In: SER GAMINI, C., CODA, R. Psicod nmica da vida organizacional: motivao e liderana. So Paulo: Biblioteca Pioneira de Acministrao de Negcios, 1990, p. 117, 12. TACK, A. A liderana motivacional. So Paulo: Siamar, Servio Cultural Interamericano e Editora ttda, 1989, p. 26.
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pode abrir um longo percurso no sentido de apreci-las bem como resolver dificuldades administroiioas"." A utilizao dos recursos pessoais de cada um envolve aquele aproveitamento produtivo que se possa fazer das diferenas individuais caractersticas dos estilos comportamentais. Esse uso implica como se percebe e se configura o mundo volta de cada um, como se chega ao sentimento de identidade, satisfao e competncia pessoal, alm de como se capitalizam sobre as foras pessoais para lidar com situaes conflitantes nisso reside a essncia bsica da administrao do sentido. Propondo que o lder tenha oportunidade de administrar o sentido que as pessoas do ao seu trabalho em particular e organizao como um todo, aceita-se seu poder de interferir junto cultura organizacional. Esta maneira de conceber a liderana reclama no somente a incluso dos seguidores, como tambm dos pares e superiores, pois muito raramente o sentido percebido pode ser definido de maneira unilateral. Isso pode ultrapassar os limites da vida consciente, como coloca Burns: "Mas o processo fundamental, um pouco mais amplo, , em larga escala, tomar consciente aquilo que permanece inconsciente em seus seguiores"." A eficcia do lder, enquanto administrador do sentido e conseqentemente agente de mudana, apia suas bases no profundo conhecimento no somente do contexto cultural da organizao, mas tambm na sua habilidade interpessoal em conhecer aqueles que dependem dele, facilitando sua chegada at a auto-realizao. ADMINISTRADORES E LDERES
13. BENFARI, R., KNOX, J. Understanding your management sty/e - beyond the MeyersBriggs type indicators. USA: Lexington books, 1991, p. 25. 14. BURNS, J. M. Leadership. New York: Harper & Raw Publishers, 1978, p, 40. 15. LAPIERRE, L. Imaginrio, Administrao e Liderana. In: BERGAMINI, C., CODA, R. Op. cit. p. 129. 16. BENNIS, W. On becaming a /eader. New York: Reading Ass., Adilson Wesley, 1989, p. 45.
zo de ser identificar e responder s necessidades manifestas ou latentes dos consumidores. O administrador levar em conta, principalmente, os recursos disponveis dentro da empresa e as oportunidades ou ameaas existentes em um determinado mercado. Na outra extremidade, o lder, no entanto, apresenta-se como uma pessoa que dirige e inicia a empresa, centrada, antes de mais nada, em sua viso pessoal. Este indivduo reagir de acordo com a sua realidade interior, pro-agindo posteriormente em um ambiente ou em determinado mercado. Isto pode implicar - e geralmente implica - que o lder acabe levando menos em conta os recursos disponveis, ou ento, que inicie ou leve a efeito as mudanas necessrias no ambiente ou em determinado mercado. O modo de estruturao freqentemente mais orgnico, mais centrado na pessoa do prprio lder, menos regulamentado e hierarquizado. Utilizando a tipologia elaborada por Reisman (1964), Zalesnick e Ketz de Vries (1975), h de um lado o dirigente heterodeterminado (ou extradeterminado), que corresponde ao conceito de administrador e, de outro, o dirigente intradeterminado, representando aqui a definio adotada de lder". 15 De maneira mais ampla, o administrador parece fazer uso mais intenso dos processos racionais, enquanto o lder, na maior parte do tempo, nutre-se da sua prpria intuio. Esclarecer as diferenas entre os tipos de aes administrativas e de liderana tem sido alvo de destaque por parte de importantes autores em administrao, como foi recentemente publicado por Bennis: "o gerente administra; o lder inova; o gerente uma cpia; o lder original; o gerente focaliza-se em sistemas e estruturas; o lder focaliza-se nas pessoas; o gerente tem uma viso a curto prazo; o lder tem a perspectiva do longo prazo; o gerente pergunta como e quando; o lder pergunta o que e por qu; o gerente tem seus olhos sempre nos limites; o lder tem seus olhos sempre nos horizontes; o gerente limita; o lder d origem; o gerente aceita o status quo; o lder o desafia; o gerente o clssico bom soldado; o lder a prpria pessoa; o gerente faz certo as coisas; o lder faz as coisas certas". 16 RAE. V.34 n.3 Mai./Jun.1994
Embora o pensamento leigo nem sempre o admita, importante que se ressalte a diferena j sacramentada por muitos autores no tocante ao que se entende por lderes e administradores. Lapierre coloca essa distino nos seguintes termos: "Numa extremidade do contnuo, o administrador caracterizado como uma pessoa que reage, sobretudo em resposta situao exterior. Trata-se de algum que dirige uma empresa (aqui considerada na acepo mais ampla do termo) de maneira a procurar eficincia e eficcia dentro de uma estrutura interna ordenada, regulamentada e hierarquizada. A ra-
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LIDERANA: A ADMINISTRAO
DO SENTIDO
Diferentemente do administrador que necessita de grande quantidade de conhecimentos tcnicos e administrativos, o lder eficaz se louva, antes de mais nada, no seu prprio autoconhecimeto como ponto de partida para o desenvolvimento da sua habilidade interpessoal. Essa caracterstica no s prov os lderes de controle interno, como tambm os habilita a no projetar nos seguidores e nas situaes que geralmente enfrenta distores da realidade prprias sua maneira pessoal de ser. Freqentemente se v destacado o fato de a influncia que pode exercer um lder fluir tanto mais facilmente quanto mais apto ele esteja em apoiar suas aes no conhecimento to prximo quanto possvel das crenas, valores e expectativas dos seus seguidores. Apoiando-se nesse conhecimento, ele ter capacidade de facilitar as pessoas a atingirem seus prprios objetivos. Tal predisposio pode implicar eventualmente mudanas no prprio contexto da cultura organizacional. Freqentes pesquisas mostram que os lderes mais favoravelmente avaliados so aqueles que possuem mais ampla abrangncia de influenciao, o que necessariamente inclui superiores e colaterais. Kouzes e Posner afirmam: "As pessoas preferem trabalhar para gerentes que sejam influentes para cima e para fora. Os lderes de sucesso sabem que necessrio e importante fazer os outros saberem o que podem e usam seu poder para conseguir que completem seu trabalho". 17 O poder de influncia, paradoxalmente, nasce da percepo e do respeito s caractersticas individuais daqueles que circundam o lder. Os gerentes e administradores, de uma forma geral, nem sempre apresentaro atributos comportamentais que os caracterizem como lderes eficazes. Isso tambm equivale a dizer que verdadeiros lderes, na maioria das vezes, podem no possuir caractersticas gerenciais ou de administradores. Portanto, trata-se de uma espcie RAE. v.34 n.3 Mai./Jun.1994
de erro grosseiro confundir ou pressupor que toda pessoa em posio de direo na empresa seja, necessariamente, lder. TRANSAO E TRANSFORMAO Embora apresentada em 1978, a teoria de Bums que distingue dois importantes aspectos da liderana ainda pouco conhecida, especialmente dentro das empresas brasileiras. Como prope textualmente: "Tratarei a liderana como algo distinto do mero detentor de poder e oposto fora bruta. Sero identificados dois tipos bsicos de liderana: a transacional e a transformacioa: Essa diferenciao no deve ser considerada como uma simples sutileza semntica, mas como uma importante separao entre duas filosofias frontalmente discordantes em termos da teoria e da prtica administrativa. Os estudos de [ames McGregor Burns inspiraram diferentes autores como, por exemplo, Smith: "Na liderana transacional, uma troca ocorre entre o lder e o seguidor. A troca poder ser econmica, poltica ou psicolgica, mas no existiria ligao duradoura entre as partes. Essa troca continua somente medida que ambas as partes acham que isso vem em benefcio prprio. Tais relacionamentos de troca so difundidos em muitas organizaes de trabalho, nas quais os subordinados concordam em aceitar a liderana por parte dos lderes especficos em bases de seu emprego remunerado". 19 Esse tipo de liderana aproxima-se muito mais das formas de comportamento anteriormente caracterizadas como condicionantes. Seguindo essa estratgia, o tpico administrador consegue manter o subordinado preso a si pelo poder formal que possui, habilitado, por ele, a oferecer vantagens. Trata-se, nesses casos, de uma transao pura e simples, envolvendo, na maioria das vezes, benefcios de carter extrnseco. O poder exercido pelo superior, enquanto lder transacional, desaparecer medida que no for mais detentor
17. KOUZES, J. M., POSNER, B. Z. Op. cit., p. 117. 18. BURNS, J. M. Op. cit., p. 4. 19. SMITH, P., PETERSON, M. P. Op. cit., p. 115.
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da prerrogativa de conceder benefcios ou infligir punies. Dentro de uma perspectiva nitidamente oposta, o prprio Bums se refere liderana transformadora propondo: "A liderana transformadora uma necessidade existente ou solicitao de um seguidor potencial. Mas alm disso, o lder transformacional procura motivos potenciais nos seguidores, procura satisfazer necessidades de alto nvel e assume o seguidor como uma pessoa total. O resultado da liderana transformacional o relacionamento de estmulo mtuo e a elevao que converte os seguidores em lderes (... )".20 Neste caso, est implcita a existncia da grande sensibilidade com relao aos desejos e necessidades dos seguidores. Pela prpria definio, o lder transformacional exemplifica com suas aes o verdadeiro modelo motivacional de relacionamento interpessoal. Supe-se ento que o lder eficaz conhea as autnticas necessidades dos seus seguidores, estando, assim, em condies de interferir com maior acerto ao facilitar a satisfao motivacional. A liderana transformacional prope que a influncia ocorra em dupla direo para que se estabelea o clima de respeito ao outro enquanto pessoa integral. da convivncia com o seguidor que o lder retira a maior fonte de informaes de que necessita para o exerccio do seu papel; portanto, no somente o influencia como tambm influenciado por ele, como diz o prprio Bums: "Lderes reais, lderes que ensinam e so ensinados por seus seguidores adquirem muitas das suas habilidades na experincia do dia-a-dia, no treinamento em situao de trabalho ao liderarem com outros lderes e seguidores".21 Colocando-se praticamente no papel de parceiro do liderado, o lder no necessita de sua autoridade formal, o subordinado voluntariamente o segue pelo vnculo tipicamente afetivo que se estabelece entre os dois. Devido a uma srie de contingncias dos mais diferentes tipos, o ser humano sozinho tem mostrado uma espantosa vulnerabilidade quanto ao seu equilbrio pessoal. Quando ele adota caracteristicamente uma atitude indefesa, a desorganizao intrapsquica ocorre, principalmente frente a solicitaes conflitantes vindas, de um lado, do seu mundo interior e de outro, do mundo em que vive, em especial do seu mundo de trabalho. esse mundo que se consubstancia e materializa o principal fator de satisfao das necessidades de segurana daqueles que vivem na sociedade industrial contempornea. Confrontado pelas diferentes solicitaes oriundas desses dois mundos, interior e exterior, na maioria das vezes o indivduo levado a questionar a validade daquelas crenas que nele j se achavam enraizadas. Nesse processo, no raro as pessoas podem acabar sucumbindo diante da necessidade de fazer uma opo pessoal em favor de apenas uma dessas propostas que lhe parecem dissonantes, seno at mutuamente excludentes. Surge a necessidade de distanciar-se do problema para poder v-lo por inteiro e por isso cada pessoa sai busca de uma terceira opinio. nessa oportunidade que o lder pode administrar o significado das opes com as quais se defronta o seu seguidor. No se pode, no entanto, confundi-lo com a figura de pai, terapeuta ou conselheiro, embora esses personagens tambm possam ser, sua maneira, lderes especiais. Ao assumir o papel que lhe prprio, o lder natural aparece como algum que est apto a equacionar as duas realidades existentes no mundo e na vida pessoal de cada um, naquilo que tanto um como outro possuem de fantasias, de imaginrio e de simblico. No somente Bums, mas quase todos os tericos defensores dos enfoques contingenciais em liderana so unnimes em afirmar que lderes e seguidores exercem papis ativos na transformao e mudana organizacional. Essa proposio comea com Hollander e a teoria das trocas. Isso fica tambm evidente no modelo de Fiedler ao ressaltar que h condies especiais que asseguram a eficcia do lder. Igualmente, os pontos de. vista da teoria caminho-objetvo de House e Mitchel ratificam a hiptese de que o lder tem papel decisivo na conciliao daqueles objetivos eleitos pelos subordinados e aqueles propostos ou implcitos cultura organizacional. Para o conjunto desses tericos, ater-se ao estudo do lder simplesmente questionvel e precrio. Assim como os seguidores precisam forosamente conhecer as intenes dos lderes, esses lderes; por sua vez, encontram-se diante da contingncia de considerar atentamente os RAE. v.34 n.3 Mai./Jun.1994
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propsitos delineados pelos seguidores. Algum s se deixar liderar por pessoas a quem qualifique favoravelmente. Isso permite afirmar que o lder depende da aquiescncia do seguidor para exercer sobre ele qualquer influncia. Portanto, antes de mais nada, a eficcia do processo tem que se louvar na autorizao explcita ou implcita do liderado. CULTURA, CARISMA E PODER Dentro desse contexto de influncia mtua que o lder desempenha tambm um importante papel junto cultura organizacional. Diferentemente dos administradores e dos consultores externos, aqueles que assumem papis de liderana conseguem mudar a cultura organizacional devido ao profundo conhecimento que tm dela. Embora de maneira lenta, a ao empreendida por eles modificando o status quo se far sentir de forma profunda e duradoura. Tericos e pesquisadores da atualidade enfatizam cada vez mais insistentemente que a cultura organizacional seja, na sua essncia, o conjunto de realidades socialmente construdas. Esse enfoque admite que os significados a ela atribudos esto muito mais nas cabeas e mentes dos seus membros do que explicitadas em conjuntos concretos de regras ou formas especficas de relacionamento. Os aspectos muito mais caracteristicamente operacionais so o reflexo daquilo que se encontra dentro do pensamento comum, como prope Morgan: "A estrutura organizacional, regras, polticas, objetivos, misses, descries de cargos e procedimentos operaconais padronizados desempenham igualmente uma fimo interpretativa. Isso porque atuam como pontos primrios de referncia devido maneira pela qual as pessoas pensam neles e do sentido aos contextos nos quais trabalham. Embora tipicamente vistos entre as caractersticas mais objetivas de uma organizao, uma viso representada enfatiza que eles so artifcios culturais que ajudam a esboar a realidade habitual dentro de uma organizao". 22 Isso permite concluir que cada aspecto integrante do todo organizacional conserva uma respeitvel dose de significado imaginrio e implcito que pode ser entendido como o sentido dado realidade que , por sua vez, compartilhado por todos os integrantes dessa cultura.
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A possibilidade de interferir na cultura da organizao confere ao lder qualidades carismticas que o torna mestre da mudana, inspirando as pessoas a correrem riscos pelo fato de possuir acentuado senso de oportunidade estratgica. Conger, no entanto, prope que esse tipo de ao do lder carismtico pode se perder, caso as organizaes no ofeream condies favorveis s mudanas. NA grande tragdia da administrao atualmente a falta de liderana em muitas de nossas or-
o gerentes e
caractersticas
, comportamentals
que os
ganizaes. Devido escassez de boa liderana, a maioria de ns supe que ela seja algo que poucas pessoas podem exercer. No entanto, o potencial para liderar encontra-se latente em muitos de nossos administradores, mais do que julgamos. A liderana no uma habilidade mgica limitada a uns poucos. Na verdade, a capacidade e o desejo de liderar com freqncia se perdem por falta de oportunidade e pouco investimento nos processos e recompensas que incentivam o seu crescimento. Assim, uma questo de extrair, desenvolver e fomentar essas capacidades latentes. Contudo, muitas organizaes, o mais das vezes, fazem o oposto, ativamente desestimulando as qualidades de liderana com sua negligncia e preocupao com a 'administrao' e preservao do status quo. O preo que pagam uma grande perda de potencial de liderana e, por sua vez, de eficcia organizacional, que jamais se materializam".23 Talvez, por isso, na maioria das organizaes se tenham dificuldades de assistir mudanas organizacionais conduzidas por verdadeiros lderes.
22. MORGAN, G. Images of 0[ganization. London: Sage Publications, 1986, p. 132. 23. CONGER, J. A. Lder carismtico. So Paulo: Makron Books, 1991, p. 167.
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Aceitar que os administradores qualificados como verdadeiros lderes possam influenciar na mudana da cultura organizacional pelo fato de conhecerem as conseqncias simblicas de suas aes no admitir que sejam capazes de manipular a realidade das pessoas ou das organizaes atravs dos valores por ele promovidos. possvel construir ou modificar a realidade, mas sempre e em ltima anlise, ser essa realidade que ditar as linhas mestras das aes organizacionais que no necessariamente seguem o curso da prpria escolha do lder. Administrar atravs da liderana modifica a perspectiva de uma filosofia organizacional de maior rigidez. A sofisticao tecnolgica no tem deixado lugar para a adoo de sistemas de controle como aqueles que foram originalmente recomendados pelos representantes da antiga escola de Administrao Cientfica. A produo totalmente automatizada e eletronicamente controlada vai expulsando das organizaes as to conhecidas, ultrapassadas e desgastadas figuras do capataz, do contramestre, do chefe e, finalmente, do patro. Surgem modelos administrativos que enfatizam no s a importncia como tambm a oportunidade de uma administrao 'flexvel, Dentro de muitas outras recomendaes sugerido, de forma enftica, o achatamento da pirmide de comando. Com isso incentivada a eliminao da maior quantidade possvel de nveis intermedirios de controle e tomada de deciso. Por fora do ambiente de urgncia instaurado pelo ritmo acelerado de mudanas, a empresa que se proponha a assegurar a sua sobrevivncia tem que necessariamente agilizar seus procedimentos administrativos. Um testemunho concreto dessa renovao dado pelo crescente nmero de organizaes que vm procurando adotar modelos participativos de gesto. A reviso atual dos modelos de liderana tem permitido a retomada do conceito de carisma, bem como uma reavaliao das fontes de pderdentro das organizaes. A simples posio hierrquica no parece garantir mais a obedincia dos seguidores. Inquestionavelmente, o poder maior do lder emana do fato de que seus seguidores o acompanham de maneira habitual sem se sentirem diminudos por isso, invadidos em suas individualidades ou ameaados em sua auto-estima. O vnculo da liderana assim visto como um relacionamento de duplo sentido e feito em p de igualdade sem que a ao de um jamais pressuponha a passividade do outro. Os autores, em geral, concordam que o carisma seja uma qualidade atribuda ao lder pelos subordinados e no uma caracterstica inerente sua personalidade. "Acredita-se que o carisma seja resultado das percepes que os seguidores tm sobre as qualidades e comportamentos dos lderes. Essas percepes so influenciadas pelo contexto da situao de liderana, assim como pelas necessidades dos seguidores individuais e coletivos". 24 Trata-se, portanto, de uma atribuio feita pelos seguidores que toma como base certos comportamentos manifestos do lder. Quanto mais se aprofundam as pesquisas a respeito das caractersticas do vnculo lder-seguidor, mais se evidencia o peso praticamente igual que possuem esses dois elementos integrantes de um mesmo e nico processo. Aceitar isso, na prtica, uma questo que pode determinar, em grande parte, o sucesso organizacional. "A confuso entre liderana e autoridade oficial tem efeito letal sobre as grandes organizaes. Corporaes e reparties governamentais, em toda parte, tm executivos que imaginam que o lugar que ocupam nas organizaes lhes deu um corpo de seguidores, e isso, evidentemente, no acontece. Eles ganharam subordinados. Se os subordinados se tornaro seguidores, depender do fato de o executivo agir como lider"," Inmeros exemplos prticos confirmam a importncia de aceitar a veracidade dessa suposio. O verdadeiro poder est vinculado habilidade interpessoal, sendo assim anterior ao poder formal e no podendo ser confundido com autoritarismo. Personalidades autoritrias tendem naturalmente a reagir atravs de aes que privilegiam esquemas punitivos, tais como penalidades financeiras ou avaliaes negativas dos subordinados. Esse poder se liga, portanto, credibilidade que o administrador consegue construir em tomo de si. "Credibilidade, como reputao, algo conseguido com o tempo. Ela no vem automaticamente com o cargo ou ttulo. Comea cedo em nossas vidas e carreiras. As pessoas tendem a assumir, de incio, que algum que foi elevado
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a um certo status na vida, galgou degraus, ou atingiu objetivos significativos, merece a sua confiana. Mas a confiana completa assegurada (ou no) somente depois que as pessoas tiveram a oportunidade de conhecer mais o indivduo. Os alicerces da credibilidade so construdos tijolo por tijolo". 26 Esse clima de credibilidade pressupe transparncia e honestidade de princpios evidentes nas aes do lder em qualquer momento e diante de qualquer desafio. O autoconhecimento, a segurana pessoal e a maturidade emocional parecem ser ingredientes indispensveis ao lder. importante que no se sinta ameaado ao admitir a influncia ascendente que emana do seguidor sobre ele. A influenciao exercida em duplo sentido e a transformao mtua so requisitos de valor inquestionvel quando se pretende liderar eficazmente."Nunca deveramos fingir sobre aquilo que no sabemos, no deveramos ter medo de perguntar e aprender com pessoas inferiores e deveramos ouvir cuidadosamente os quadros de pessoal nos mais baixos nveis. Ser um aluno, antes de tornar-se professor, aprender com os quadros de nveis inferiores antes de expedir ordens" . 27
no existem lderes universais que se saiam bem em qualquer circunstncia, com qualquer tipo de grupo ou em qualquer espcie de ambiente organizacional. Num exame mais amplo do histrico da liderana possvel destacar trs grandes aspectos que podem ser considerados como verdadeiramente relevantes. Numa primeira fase, atribui-se figura do lder traos pessoais especficos, certos tipos de motivaes e determinados estilos comportamentais considerados como elementos-chave do processo de liderana. Para os primeiros tericos, os subordinados so entendidos como sujeitos que sofrem passivos a ao do lder.
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CONCLUSES
Como foi possvel acompanhar atravs da evoluo histrica pela qual passaram os principais estudos e pesquisas sobre liderana, muitos trabalhos sistemticos foram desenvolvidos. Cada um desses diferentes enfoques foi responsvel pelo entendimento de aspectos indispensveis ao processo de interao e influncia entre o lder e seu seguidor, tanto no sentido descendente como ascendente. A principal lio que se pode extrair dessas inmeras abordagens continua sendo aquela que, de maneira geral, aplica-se grande maioria dos temas que compem o corolrio dos assuntos ligados s cincias comportamentais. A liderana, como tantos outros aspectos, guarda dimenses profundas que nascem das caractersticas prprias s personalidades de cada um. No pode existir, portanto, uma frmula nica, uma receita pronta ou uma soluo geral que fornea com preciso matemtica aquelas recomendaes capazes de promover a indiscutvel eficcia dos lderes. A proposta de que
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da mudana. ~
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Em segundo lugar na seqncia de estudos, surge a figura do liderado como uma importante varivel interferindo decisivamente no contexto da eficcia dos lderes. Os seguidores so reconhecidos como possuidores de necessidades, motivaes e expectativas que devem ser conhecidas pelo lder, cabendo a ele facilitar que esse seguidor chegue aos fins que deseja. Passa-se a aceitar que liderar eficazmente esteja ligado aquiescncia dos liderados. Os lderes precisam ser favoravelmente percebidos por seus seguidores a fim de exercerem sua influncia. Finalmente, depois de explorados os aspectos que dizem respeito complementaridade do vnculo lder-subordinado, so levantadas as variveis e principais caractersticas do ambiente que podem facilitar ou comprometer a eficcia
26. KOUZES, J. M., POSNER, B. Z. CredilJitity - how leaders gain and tose it, why peopte demand it. San Francisco: Jossey-Bass Publishers, 1993. 27. BURNS, J. M. Op. ct., p. 238.
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da liderana. Descobre-se que as organizaes podem treinar seus lderes, mas que alm disso precisam garantir condies para que os potenciais de liderana se transformem em aes efetivas. Em condies organizacionais propcias, os lderes so aqueles que tm o poder de atuarem como reais agentes da mudana organizacional. Sendo profundos conhecedores do significado contido na rede de simbologias dessa cultura, possuem condies de agir sintonizando as expectativas dos contribuintes individuais e grupais com o sentido dessa dimenso organizacional percebida por eles. Cabendo ao lder eficaz administrar o sentido que seus seguidores atribuem cultura organizacional, ele pode interferir no status quo. Sua ao na mudana da cultura, diferentemente daquela empreendida por consultores externos e administradores em geral, se faz sentir de maneira duradoura, embora gradual e lenta. O mais importante em todas essas constataes no apontar aquilo que ainda est por ser feito dentro do campo de estudo da liderana. J existem condies suficientes para retirar de todas essas descobertas o produto que podem oferecer em termos do que representam de verdadeiramente cientfico a respeito do assunto. preciso compreender a importncia de se contar com lderes realmente eficazes para que as organizaes possam se suplantar.
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Artigo recebido pela Redao da RAE em maro/94, avaliado e aprovado para publicao em maio/94.